ESTUDO DOS PROBLEMAS URBANÍSTICOS DO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA -SP Guaratinguetá - SP 2014 EDUARDO SCARPINELLI EDUARDO SCARPINELLI ESTUDO DOS PROBLEMAS URBANÍSTICOS DO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA - SP Trabalho de Graduação apresentado ao Conselho de Curso de Graduação em Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do diploma de Graduação em Engenharia Civil Orientador: Prof. Dr. Enos Arneiro Nogueira da Silva Guaratinguetá 2014 S286e Scarpinelli, Eduardo Estudo dos problemas urbanísticos do Elevado Presidente Costa e Silva – SP / Eduardo Scarpinelli – Guaratinguetá : [s.n], 2014. 74 f. : il. Bibliografia : f. 71-72 Trabalho de Graduação em Engenharia Civil – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, 2014. Orientador: Prof. Dr. Enos Arneiro N. Silva 1. Planejamento urbano 2. Transportes – São Paulo (SP) I. Título CDU 711.4 DADOS CURRICULARES EDUARDO SCARPINELLI NASCIMENTO 23.04.1991 – SÃO PAULO / SP FILIAÇÃO Antonio Sergio Scarpinelli Edna de Oliveira Santos Scarpinelli 2006/2008 Curso Técnico Gestão de Projetos Arquitetônicos – Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo 2010/2014 Curso de Graduação Engenharia Civil – Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá da Universidade Estadual Paulista de modo especial, aos meus pais Sergio e Edna, que não mediram esforços para proporcionar uma base sólida para meu desenvolvimento como profissional e como homem. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço ao meu infalível Santo Padroeiro São Jorge, por estender- me seu escudo e suas poderosas armas ao longo de minha vida. Ao meu tio Luis, à minha tia Valdirene e ao meu primo Ricardo por representarem aquilo que tenho de mais valioso: a família. À minha avó Natalina Cardoso Scarpinelli pelo exemplo de pessoa vencedora e guerreira em quem posso me espelhar. À Odecir Cosmo por ter ajudado minha mãe durante anos na tarefa de me criar. Ao meu orientador, Prof. Dr. Enos Arneiro Nogueira da Silva pela disposição e interesse em me orientar na elaboração deste trabalho. Aos ilustres e ousados moradores da República Palace II por tantos momentos inesquecíveis e sobretudo pelo companheirismo. Aos meus irmãos de vida, Alex Albertini Freixeda e Felippe Gurgel Saccab pela presença nos momentos mais alegres e sobretudo pela força nos mais difíceis. Aos amigos de cervejas e estudos da minha turma de Engenharia Civil, Ricardo Sanches, Victor Toffani, Leonardo Copelli, Vinicius Brandão, Lucas Almeida, Vitor Yamaguti, Willian Jin e Gabrielli Bertoncello, por brilharem ao meu lado nos churrascos e nas provas. Aos membros do Centro Acadêmico da Engenharia Civil pela dedicação em todos eventos e projetos realizados. Às arquitetas Amanda Bello e Nathalia Hartung pelas referências bibliográficas que foram fundamentais para elaboração deste trabalho. Aos professores do Departamento de Engenharia Civil que, de um modo geral, contribuíram para minha formação. E a todos que, de maneira direta ou indireta, me ajudaram a dar esse passo importante na minha vida. “Fear not when, fear not why Fear not much while were alive Life is for living not living up tight See ya somewhere up in the sky Fear not die I'll be alive for a million years, bye bye So not for legends, I'm forever young My name shall survive.” Shawn Corey Carter (Jay Z) SCARPINELLI, E. Estudo dos problemas urbanísticos do Elevado Presidente Costa e Silva – SP . 2014. 74 f. Trabalho de Graduação (Graduação em Engenharia Civil) – Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá, 2014. RESUMO Neste trabalho foram abordados os principais problemas urbanísticos do Elevado Presidente Costa e Silva, que é o principal alvo paulistano de críticas urbanísticas. Foram analisados também diversos fatores que estão diretamente relacionados à presença do Elevado na cidade, como sua importância viária, por exemplo. Partindo-se da história da região em torno do elevado e sua concepção, foi analisada sua disposição geográfica e sua importância viária, seguida da análise de seus problemas urbanísticos acima da via expressa, abaixo da vida expressa e a questão social acerca da presença do Minhocão. Foram ainda feitas análises sobre transporte urbano e a cultura do automóvel que levou à concepção do Elevado. Foram levantados exemplos de casos semelhantes ao redor do mundo, visando estabelecer parâmetros para posterior proposta conceitual e diretrizes para uma intervenção. Para a elaboração da intervenção foi estudada a viabilidade da demolição do elevado. Por fim foram propostas diretrizes para intervenções do elevado, bem como um modelo de planejamento utilizando a metodologia Canvas. PALAVRAS-CHAVE: Elevado Presidente Costa e Silva, Transporte Urbano, Minhocão, Urbanismo. SCARPINELLI, E. Study of urban problems of the High Expressway Presidente Costa e Silva - SP. 2014. 74 p. Graduate Work (Graduate in Civil Engineering) - Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá, 2014. ABSTRACT This work dealt with the main urban problems Elevated President Costa e Silva, who is the main target of São Paulo's urban criticism. Several factors that are directly related to the presence of the High Expressway in the city, as its road importance, for example were also analyzed. Based on the history of the area around the high and their design, we examined its geographic disposition and its road importance, followed by analysis of its urban problems above the expressway below expresses life and the social question about the presence of Minhocão . Were also made analysis on urban transport and the car culture that led to the design of the High Expressway. Were also raised examples of similar cases around the world to establish parameters for subsequent conceptual framework and guidelines for intervention. For the preparation of the feasibility of the intervention demolition of the high was studied. Finally guidelines for interventions were high bids, as well as a planning model using the methodology Canvas. KEYWORDS: High Expressway Presidente Costa e Silva, Urban Transportation, Urbanism, Minhocão. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11 2 OBJETIVO .......................................................................................................... 13 3 METODOLOGIA ................................................................................................ 14 4 TRANSPORTE URBANO ................................................................................. 15 5 A OFICIALIZAÇÃO DA DESATIVAÇÃO DO ELEVADO ........................ 20 6 HISTÓRIA ........................................................................................................... 22 6.1 A DITADURA MILITAR E A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO ............................................................................................................. 23 6.2 O CENTRO DA CIDADE DE SÃO PAULO ...................................................... 24 6.3 O BAIRRO DE PERDIZES .................................................................................. 26 7 LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA E IMPORTÂNCIA VIÁRIA .................. 28 8 ANÁLISE DOS PROBLEMAS URBANÍSTICOS CAUSADOS PELO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SIVA ................................................... 32 8.1 PROBLEMAS URBANÍSTICOS QUE OCORREM NA PARTE SUPERIOR DA VIA ELEVADA ................................................................................................... 33 8.2 PROBLEMAS URBANÍSTICOS QUE OCORREM NA PARTE INFERIOR DA VIA ELEVADA .................................................................................................... 35 8.3 QUESTÕES SOCIAIS ACERCA DO ELEVADO .............................................. 38 9 CASOS SEMELHANTES AO REDOR DO MUNDO ................................... 41 9.1 PERIMETRAL – RIO DE JANEIRO .................................................................. 41 9.2 HIGH LINE PARK – NOVA IORQUE ................................................................ 45 9.3 PROMENADE PLANTEÉ - PARIS .................................................................... 48 9.4 ESPLANADE - BOSTON .................................................................................... 50 9.5 CHEONGGYECHEON - SEUL ........................................................................... 52 10 DIRETRIZES PARA INTERVENÇÃO URBANÍSTICA NO ELEVADO ... 57 10.1 ESTUDO DA VIABILIDADE DA DEMOLIÇÃO DO ELEVADO ................... 57 10.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CASOS SEMELHANTES AO REDOR DO MUNDO... ............................................................................................................. 59 11 PROPOSTA DE DIRETRIZES E PLANEJAMENTO DA INTERVENÇÃO NO ELEVADO .................................................................................................... 61 11.1 DIRETRIZES PARA INTERVENÇÃO URBANÍSTICA NO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA ........................................................................ 61 11.2 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO PARA INTERVENÇÃO URBANÍSTICA NO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA .............................................. 63 12 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 64 11 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho consiste em um estudo dos problemas urbanísticos do Elevado Presidente Costa e Silva, analisando desde a história da concepção do Elevado, até a elaboração de diretrizes e conceitos para uma intervenção. Desde criança utilizo o Elevado Presidente Costa e Silva para me deslocar na cidade de São Paulo. A cerca de 3 anos comecei a me interessar pelo elevado e suas peculiaridades, desde o conceito de sua construção até os problemas urbanístico por ele causados. Ao ingressar no quinto ano de Engenharia Civil, idealizei o elevado com tema do meu Trabalho de Graduação por ser algo que, além de me despertar muito interesse, faz parte do meu dia a dia. Depois de muitas considerações, resolvi adotá-lo como tema do meu Trabalho de Graduação. O projeto de construção do Elevado Costa e Silva foi empreendido em 1968 pelo então prefeito José Faria Lima (1965-1969). O objetivo do elevado era aliviar o tráfego de veículos na região central da cidade, mais precisamente na Avenida General Olímpio da Silveira e na Rua Amaral Gurgel. O projeto, que posteriormente seria popularmente conhecido como Minhocão, visava ligar o Largo Padre Péricles na região de Perdizes, partindo da Avenida Francisco Matarazzo, passando pela Avenida São João, pela Rua Amaral Gurgel até a região da praça Roosevelt no centro de São Paulo. Segundo a Companhia de engenharia de Tráfego (CET), durante o pico da manhã o Elevado recebe cerca de 5400 veículos por faixa, o que proporcionalmente é um tráfego superior às faixas da Avenida 23 de Maio. Figura 1 – Artista pinta flores no Minhocão Fonte: Felipe Morozini, (2011) 12 O Elevado Presidente Costa e Silva popularmente conhecido pelos paulistanos como Minhocão, é uma via expressa da cidade São Paulo que liga a região da Praça Roosevelt ao bairro de Perdizes. O elevado foi criado com o objetivo de melhorar a vazão de veículos que circulam por tais regiões diariamente. O projeto que foi realizado durante o mandato do prefeito Paulo Maluf é um exemplo de engenharia bruta e arquitetura pouco sofisticada. Sua proximidade dos edifícios da região (distância de 5 metros em média), além da falta de iluminação solar causada por sua presença sobre a Avenida São João, acarretara em graves problemas urbanísticos, colocando sua existência em cheque. Tais problemas serão discutidos ao longo desse trabalho. Do ponto de vista ambiental, temos uma crescente preocupação com a piora da qualidade do ar e com os efeitos do aquecimento global, que têm como uma de suas principais causas, a emissão de gases poluentes provenientes de veículos movidos à combustão. Em seguida, temos as doenças respiratórias causadas pela má qualidade do ar e todos os problemas de saúde causados por acidentes no trânsito. Visto que a não utilização do elevado para tráfego de veículos deixou de ser uma idealização e passou a ser uma lei, esse trabalho de graduação tornou-se uma abordagem de um tema extremamente atual. Durante esse trabalho serão discutidos todos os problemas que levaram à desativação do elevado e os prontos cruciais que envolve qualquer projeto de intervenção no Elevado. Além disso, será analisada a viabilidade da demolição total ou parcial do elevado, bem como o aproveitamento de sua estrutura como parque. Vivemos um momento em que é preciso rever os conceitos de planejamento e prioridades urbanas, onde o replanejamento deve visar a melhora da qualidade de vida das pessoas nas grandes cidades. 13 2. OBJETIVOS i. Estudar a história da concepção do Elevado presidente Costa e Silva, bem como a história dos bairros cortados pelo mesmo. ii. Estudar os principais conceitos de transporte urbano e suas influências na qualidade de vida dos cidadãos. iii. Analisar os principais problemas urbanísticos decorrentes da presença do Minhocão, enfatizando as questões sociais que o elevado contempla. iv. Levantar casos semelhantes ao redor do mundo afim de filtrar as melhores soluções encontradas para aplica-las nas propostas de diretrizes para intervenção urbanística no Elevado. v. Elaborar diretrizes para intervenção urbanística no Elevado Presidente Costa e Silva. 14 3. METODOLOGIA O estudo inicial para elaboração do trabalho foi através do documentário ELEVADO 3.5 (2007), que retrata a vida de pessoas que vivem ao longo do Elevado, onde foi possível entender as consequências da presença do Minhocão na vida dos paulistanos. Em seguida, foram realizados estudos través da internet e principalmente livros para se entender a história da região e do elevado. A partir do estudo da história do elevado, foram realizadas visitas diárias nos horários de pico, entre picos e finais de semana para melhor compreensão do caso. Foram pesquisadas pelos meios de comunicação como revistas e Internet, as principais notícias sobre os problemas causados pelo Minhocão na região, levantando os principais problemas de forma crítica, inserindo opiniões pessoais e problemas urbanos detectados em campo. Através de livros foram estudados os principais fatores do transporte urbano que interferem na qualidade de vida dos cidadãos, visando, em um primeiro momento, detectar as falhas que a presença do elevado contempla e, posteriormente, englobar as teorias estudadas nas diretrizes para intervenção urbanística do elevado. Por meio da Internet, e de visitas técnicas presenciais (no caso do High Line) foram levantados modelos semelhantes ao redor do mundo, visando espelhar os pontos fortes de sucesso de cada caso no Elevado Presidente Costa e Silva. A etapa final do trabalho consistiu em considerar todo o material levantado para elaboração de diretrizes e conceitos para uma intervenção urbanística. A metodologia Canvas foi utilizada para elaboração do planejamento de uma possível intervenção no Elevado. O Business Model Canvas é uma ferramenta de gerenciamento estratégico, que permite desenvolver e esboçar modelos de negócio novos ou existentes. É um mapa visual pré- formatado contendo nove blocos do modelo de negócios. Business Model Generation¹. O estudo feito nesse trabalho foi inserido no modelo Canvas para que as diretrizes e premissas fossem organizadas de modo visual e prático. 1. A. Osterwalder, Yves Pigneur, Alan Smith, and 470 practitioners from 45 countries, self published, 2010 15 4. TRANSPORTE URBANO A construção do Elevado presidente Costa e Silva é fruto de uma política urbana de transporte que visa privilegiar o usuário de automóvel particular. A cultura do automóvel é um dos principais males dos grandes centros urbanos brasileiros, onde o transporte público é ineficiente e a frota de veículos particulares cresce exponencialmente. Em paralelo ao estudo sobre o elevado, devemos analisar a cultura que gerou sua existência e o transporte desumano na cidade de São Paulo. A cidade de São Paulo movimenta a economia do país, gerando muitos empregos e consequentemente, atraindo milhões de pessoas. O estado de São Paulo é a unidade federativa com o maior Produto Interno Bruto (PIB) do país, sendo responsável por 32,6% do PIB nacional (Contas Regionais do Brasil – IBGE 2013). A consequência é uma alta densidade demográfica. São Paulo possui 11.244.369 habitantes, o que corresponde a uma densidade demográfica de 7.383 habitantes por km² (Censo 2010 - IBGE). Tal densidade demográfica se aproxima a outras metrópoles como Nova Iorque (10. 725 habitantes/km² - www.nyc.gov), contudo as metrópoles de países desenvolvidos adotam uma cultura de transporte que difere da cultura adotada na cidade de São Paulo. Gráfico 1 – Tempo de acesso a pé a cada modo de transporte na região metropolitana de São Paulo (1987) Fonte: Câmara Municipal de São Paulo, Pesquisa origem-destino, 1987 16 Gráfico 2 – Região Metropolitana de São Paulo – Uso do espaço viário por pessoa em transporte motorizado (1987) Fonte: Transporte Humano: cidades com qualidade de vida (1997) O baixo investimento em transporte público provoca o declínio da eficiência do transporte público (Gráfico 1). Em paralelo, o alto investimento em vias de automóveis provoca o aumento da frota, o que por sua vez aumenta o volume de tráfego. Em um ciclo vicioso, esse volume de tráfego também prejudica o transporte público, o tornando mais lento e o desvalorizando, prejudicando a receita gerada pelo mesmo. Além disso, o baixo incentivo ao transporte público provoca uma divisão social da população, entre os que tem acesso ao transporte particular e os que dependem exclusivamente do transporte público. Em cidades com transporte público eficiente, todas as camadas sociais inevitavelmente optam pelo transporte público, tornando-o ferramenta de inclusão social. A ausência de um planejamento urbano coerente acarreta em males econômicos e ambientais. O incentivo ao uso do automóvel aumenta a emissão de gases poluentes e o consumo de energia (Gráficos 3 e 4). O aumento da poluição e a consequente falta de qualidade do ar, impactam na qualidade de vida, aumentando a incidência de doenças respiratórias, gerando gastos públicos dos órgãos públicos de saúde. Cada vez mais, as áreas verdes e calçadas perdem espaço para a construção de vias de trânsito, aumentando-se as áreas com impermeabilização do solo. 17 Gráfico 3 – Emissão de monóxido de carbono por tipo de transporte considerando 1,5 pessoas por automóvel e 50 pessoas por ônibus Fonte: Transporte Humano: cidades com qualidade de vida (1997) Gráfico 4 – Região Metropolitana de São Paulo – Condição média (porcentagem de dias) da concentração de poluentes (1994). Fonte: Cetesb, relatório de qualidade do ar no Estado de São Paulo, 1994 Os acidentes de trânsito também estão relacionados à cultura do automóvel. São Paulo apresenta índices elevados de acidentes de trânsito. Quando comparado a metrópoles de países de 1° mundo, são Paulo apresenta índices de pessoas mortas no trânsito quase 4 vezes maior. Essa alta frequência de acidentes impacta nos cofres do governo, que economiza em investimentos no transporte público mas acaba gastando com o atendimento rotineiro a pessoas acidentadas em vias de automóveis. 18 Gráfico 5 – Índice de acidentes em áreas urbanas (1994). Fonte: Denatran, acidentes de trânsito no Brasil (1995) para cidades brasileiras e CET, acidentes de trânsito (1992) para cidades de outros países. A ineficiência no deslocamento da população, seja ele utilizando transporte público ou particular, tem reflexos relevantes na economia da cidade e, consequentemente na economia do país. O grande consumo de tempo em deslocamentos acarreta em um decréscimo da produtividade das atividades urbanas, o tempo que poderia gerar riqueza, é perdido no tempo de viagem, prejudicando a economia. É estimado que são perdidas cerca de 2,4 milhões de horas/dia em deslocamentos na cidade de São Paulo, gerando um impacto enorme na economia. A construção e o uso do Minhocão são reflexos de uma cultura que visa privilegiar o automóvel (Gráfico 2). Em São Paulo o transporte particular é muito mais atrativo que o transporte público, o que acarreta em uma baixa disposição do governo a investir no transporte público, concentrando os gastos e os espaços disponíveis para o transporte particular. Novamente, detectamos um ciclo vicioso, onde aumentando investimentos para veículos particulares, são diminuídos os gastos com transporte público, os espaços para veículos particulares são maximizados, diminui a atratividade do transporte público e 19 aumenta-se a frota de veículos particulares (Fluxograma 1). O minhocão é um reflexo da cultura do automóvel no país, onde além de todos os males citados aqui, ainda destrói o patrimônio arquitetônico da cidade. Fluxograma 1 – Ciclo do investimento em vias para veículos particulares Fonte: Eduardo Scarpinelli (2014) A desativação do Elevado, apresenta a oportunidade de uma mudança radical na concepção do transporte urbano na cidade de São Paulo. Uma intervenção bem sucedida no elevado, pode abrir precedente para uma mudança geral na concepção da cidade, tornando-a mais humanizada. 20 5. A OFICIALIZAÇÃO DA DESATIVAÇÃO DO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA - SP Inúmeras especulações sobre o futuro do Elevado Presidente Costa e Silva foram feitas nas últimas décadas, contudo nenhum plano de intervenção urbana contemplando o minhocão foi formalizado pela prefeitura até julho de 2014. Em 30 de julho desse ano, foi divulgado o novo plano diretor da prefeitura de São Paulo e o mesmo inclui a desativação do Minhocão como via viária. Figura 2: O Elevado fica aberto para as pessoas o utilizarem como área de lazer aos domingos Fonte: Ardilhes Moreira (2014) A primeiras manifestações por parte dos governantes com relação à não utilização do Elevado para tráfego ou sua demolição partiu da prefeita Luiza Erundina (prefeita de São Paulo de 1989 a 1992) que trouxe proposta para demolir a estrutura. Essa proposta foi defendida também pela prefeita Marta Suplicy (prefeita de São Paulo de 2000 a 2004). José Serra (prefeito de São Paulo de 2005 a 2006) promoveu um concurso de intervenções para o elevado. A primeira manifestação formal do interesse do poder público em corrigir os males 21 causado pelo elevado, ocorreu em 6 de maio de 2010. Nesta data, o prefeito Gilberto Kassab (2006-2012) divulgou projeto visando sua demolição. Contudo, de acordo com a Folha de S. Paulo, um estudo estima que tal intervenção não ocorreria antes de 2025. A proposta do prefeito Giberto Kassab, previa a construção de uma via expressa em uma área hoje ocupada por casas (área de 2.146 hectares), ligando a Lapa e O Brás como alternativa para tráfego de veículos que atualmente utilizam o elevado. Abaixo da via expressa, seria construída uma via de trem subterrânea (Figura 3). Figura 3: Projeto apresentado pela prefeitura em 2010 que previa uma via subterrânea de 12 km para trens. Fonte: Folha de São Paulo (2010) Durante o desenvolvimento desse trabalho, foi sancionado pelo atual Prefeito da Cidade de São Paulo, Fernando Haddad, o novo plano diretor da cidade que inclui um artigo que trata especificamente da desativação do elevado. O artigo 375 da lei nº16.050, do Plano Diretor Estratégico (PDE) estabelece: “Parágrafo único: lei específica deverá ser elaborada determinando a gradual restrição ao transporte individual motorizado no elevado Costa e Silva, definindo prazos até sua completa desativação como via de tráfego, sua demolição ou transformação, parcial ou integral em parque.” A lei foi um projeto dos vereadores Nabil Bonduki (PT) e José Police Neto (PSD). Tal lei finalmente aborda um tema que foi reivindicado pelos paulistanos desde a concepção do projeto da via elevada em 1968, no mandato do então prefeito José Vicente Faria Lima. A notícia da desativação do elevado veio de encontro com o tema do trabalho e tal fato não poderia ser esquecido. A desativação do elevado repercutiu em diversas mídias, com destaque para a internet, que é a principal fonte atual de informação da população. 22 6. HISTÓRIA DO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA A história da construção do Elevado coincide com a história da cidade de São Paulo e do Brasil. Construído durante a ditadura militar, em um governo que promovia obras faraônicas visando o progresso (Figura 4), a história do Elevado Presidente Costa e Silva mistura-se com a história dos bairros que o mesmo interliga: Perdizes e Região Central de São Paulo. Figura 4 – Convite da Prefeitura de São Paulo para a inauguração do Minhocão Fonte: SP IN FOCO (2013) 23 6.1 A ditadura militar e a política de desenvolvimento urbano O regime militar no Brasil foi instaurado em 1 de abril de 1964 com o golpe militar e durou até 15 de março de 1985. O Brasil vivia o momento da ditadura militar. Esse período durou 21 anos e foi marcado pelo regime autoritário e nacionalista. As diretrizes da ditadura militar buscavam o desenvolvimento do país. Um dos generais-presidentes seria Costa e Silva, que nomearia o próximo governante a assumir o cargo de prefeito de São Paulo: Paulo Maluf. Figura 5 – Paulo Maluf, então prefeito de São Paulo, anuncia na TV aberta a construção do elevado Fonte: Vídeo do Youtube “Paulo Maluf anuncia construção do Minhocão” (1969) Paulo Maluf tentou imprimir sua marca de bom administrador público em seu primeiro cargo de expressão na política brasileira. Maluf aprovou o projeto que, segundo ele, seria “uma nova solução para o sistema viário de São Paulo” (Figura 5). O elevado foi, na época, a maior obra em concreto armado da América Latina. Sua estrutura é composta por concreto protendido e peças pré-moldadas. Paulo Maluf homenageou o general que o nomeou como prefeito, batizando a via expressa de Elevado Presidente Costa e Silva. 24 6.2 O centro da cidade de São Paulo e sua desvalorização O centro da cidade de São Paulo é uma região administrada pela Subprefeitura da Sé e engloba os bairros Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação, Liberdade, República, Sé e Santa Cecília. A região central (Figura 6) foi durante muitos anos o polo financeiro da cidade de São Paulo. Essa hegemonia levou ao centro da cidade movimentação noturna e presença marcante da elite paulistana até a metade do século XX. A partir daí o centro entrou em um processo de degradação. Atualmente, por parte dos paulistanos, existe uma forte aclamação de revitalização da região central. Figura 6 – Panorama da zona central de São Paulo vista do Edifício Altino Arantes Fonte: Wilfredo R. Rodríguez H. (2006) A partir da década de 70 com o desenvolvimento de outras áreas da Cidade de São Paulo, e principalmente com más gestões públicas, o centro da cidade entrou em um processo de degradação. As sedes de importantes empresas migraram para outras regiões da cidade, onde se formaram outros distritos financeiros. A transferência do palácio dos Bandeirantes (sede do governo de São Paulo) do centro para o Morumbi ilustra o cenário de debandada que a região sofreu. A qualidade de vida da região foi prejudicada, o que acarretou na mudança da população residente também para outras regiões da cidade. O centro da cidade que antes era icônico na vida noturna paulistana, passou a ser deserto durante a noite, atraindo moradores de rua, usuários de drogas, prostitutas e vândalos. A região tem hoje alto índice de criminalidade, grande presença de população marginalizada e excluída, caracterizando uma decadência latente. Com uma área de 27km², o centro da cidade possui Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) elevado de 0,928. Contudo, a região possui enormes centros de pobreza concentrados 25 como a Cracolândia, e presença maciça de moradores de rua, por exemplo. É uma região contemplada por uma grande oferta de transporte público com linhas do metrô, trens e ônibus. A prefeitura de São Paulo tem implantado medidas para revitalizar o centro da cidade de São Paulo, uma delas é a demolição de prédios extremante degradados (Figura 7), sem valor histórico ou arquitetônico, para venda do terreno para empreendimentos residenciais e comerciais. Outra iniciativa da prefeitura de São Paulo é a extinção da Cracolândia. A intenção da prefeitura é, por meio de descontos e créditos em tributos municipais como o Imposto predial e territorial urbano (IPTU) e o Imposto sobre serviços (ISS), incentivar a ocupação de região, tornando-a um pólo empresarial. Figura 7 – Demolições (esquerda) darão lugar à novos prédios (direita) Fonte: Revista Veja – (2005) Em entrevista à Revista Veja (Janeiro de 2006), o arquiteto e urbanista Jorge Wilheim defende que muitas vezes, o centro de uma grande cidade não consegue acompanhar o crescimento da mesma: "A intensificação do uso de automóveis como meio de transporte no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, fez com que muitas pessoas se mudassem das áreas centrais, pois os prédios em que elas moravam não tinham garagem". Os urbanistas concordam que uma das maneiras mais eficazes para recuperar regiões centrais deterioradas é atrair moradores de diversas classes sociais de volta para elas. É justamente essa uma das estratégias da prefeitura paulistana para consolidar o novo bairro da Luz. A decadência do centro de São Paulo é consequência de um conjunto de más gestões consecutivas. O Minhocão simboliza a transição de um bairro nobre como o de perdizes, à uma região degradada como o centro. 26 6.3 O bairro de Perdizes A região de perdizes (Figura 8) começou a figurar como parte da cidade de São Paulo no final do século XIX em 1897. A região cresceu a partir de uma chácara cujo proprietário era o vendedor de garapa Joaquim Alves, que criava perdizes em seu terreno. A localidade de sua casa era bem próxima do local que hoje é conhecido como Largo Padre Péricles (uma das extremidades do Minhocão). A propriedade do agricultor foi, anos depois, vendida para loteamento. Contudo o nome de Perdizes permaneceu. O crescimento do bairro foi evidente a partir de 1905 e em 1940 o bairro já se encontrava integrado a parte da região metropolitana. Figura 8 – Vista aérea do bairro de Perdizes: Alta concentração de condomínios residenciais e shoppings Fonte: José Reinaldo de Martins (2013) Atualmente, o bairro de Perdizes é o mais populoso da região oeste de São Paulo. O bairro é marcado pela forte presença do mercado de empreendimentos imobiliários, com muitos prédios residenciais de alto padrão já construído, e muitos outros em fase de projetos e obras. Além de ser uma área residencial, Perdizes também é um bairro comercial, com 2 grandes shopping centers instalados no bairro. Tais empreendimentos demandam uma alta circulação e vazão de veículos no bairro. O elevado que foi construído com o intuito de desafogar o tráfego de veículos, acabou contribuindo para a criação uma fronteira entre a alta especulação imobiliária de Perdizes, e a desvalorização dos imóveis da região central. 27 O arquiteto responsável pela concepção fazia parte do departamento de Urbanismo da Prefeitura. O projeto do prefeito José Faria Lima, contudo, não saiu do papel. A população da região por onde a via elevada passaria, teve uma reação negativa ao projeto, temendo os impactos negativos urbanísticos. O prefeito então arquivou o projeto, mas encaminhou um projeto à Câmara reservando as áreas do projeto para obras futuras. 28 7. LOCALIZÇÃO GEOGRÁFICA E IMPORTÂNCIA VIÁRIA DO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA - SP O Elevado Costa e Silva corta a cidade de São Paulo interligando a região Oeste ao Centro da cidade. Sua função é interligar o Largo Padre Péricles (Centro) à região da Praça Roosevelt (Bairro Barra Funda). Adotando como início do trajeto a região central, o Minhocão parte da Rua da Consolação, próximo ao acesso da Avenida Radial Leste e da Avenida 23 de maio. Em seguida, passa sobre a Rua Marquês de Itu, Largo do Arouche, próximo à Avenida Duque de Caxias e à Avenida São João (Figura 9). Ao longo dos seus mais de dois kilômetros de extensão, a via passa próxima de duas estações do metro: primeiro o metrô Santa Cecília na região Central e mais à frente passa sobre a estação Marechal Deodoro do metrô. Em seu trajeto o elevado passa ainda sobre a Avenida Angélica e a Avenida Pacaembu. Nessas duas avenidas nos deparamos com a seguinte ironia: ambas são avenidas com comércios cujo público alvo é de classe alta, contudo ao se aproximarem da região do elevado, os comércios vão se tornando mais simples e populares. No fim de seu trajeto o Minhocão conduz os automóveis na Avenida Matarazzo, caracterizada pelo comércio consumido pelo bairro de perdizes, shoppings centers e casas noturnas. Gráfico 1 – Velocidade média na cidade, em km/h Fonte: Folha de São Paulo (2012) 29 Em matéria da Folha de São Paulo em 04/11/2012, a CET atribuiu o esgotamento das vias, principalmente, ao crescimento da frota de veículos. O aumento da frota de veículos está diretamente ligado ao desenvolvimento econômico do país, quando o poder aquisitivo da população é maximizado. Na mesma matéria o Professor Persival Bisca do Departamento de Transportes da UNICAMP afirma: “A velocidade média só diminui porque a cada dia entra um novo contingente de carros em circulação e isso não é acompanhado pelo sistema viário. “ Hoje constata-se que ao longo do tempo a situação não melhorou, pelo contrário, ela piorou e caminha para o caos (Gráfico 1). Ao ligar a Zona Oeste à Leste, o elevado “desafoga” o trânsito na Marginal Tietê, sendo um caminho alternativo. Quem deseja ir para a Zona Leste de São Paulo partindo ou passando pela Zona Oeste (e vice versa), pode utilizar 2 vias expressas: Marginal Tietê ou Elevado Costa e Silva. Pelo elevado, o motorista se desloca da Avenida Francisco Matarazzo até o Acesso à Radial Leste (Figura 9). O elevado também é uma alternativa para um cidadão que deseja se deslocar da Zona oeste à Zona Sul (e vice versa). Esse trajeto poderia ser feito, dentre outras combinações de trajetos em São Paulo, pela Marginal Tietê, Avenida Tiradentes e Avenida 23 de Maio respectivamente. Utilizando o minhocão, o motorista segue pelo Elevado e na região da Rua Consolação acessa a Avenida 23 de Maio. Em entrevista à Folha de São Paulo, em maio de 2010, o professor de engenharia de transportes da Universidade Presbiteriana Mackenzie, João Virgílio Merighi, afirmou que a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) é capaz de solucionar o possível gargalo no deslocamento de veículos causados pela não utilização do Elevado para transporte viário. “Não é difícil, é possível uma demolição relativamente rápida”, - afirmou Merighi em entrevista à Folha de São Paulo publicada em 06 de maio de 2010. O especialista em engenharia de tráfego e professor da Fundação Educacional Inaciana (FEI) Cresto de Franco Peixoto, em entrevista à Folha de São Paulo 06/05/2010, aponta como uma possível solução a construção de um túnel que desempenharia a mesma função viária do Minhocão. Contudo, coloca como empecilho o custo de tal obra. “Quando se pensa na demolição de uma obra de tal impacto, temos que pensar em condições alternativas para resgatar a capacidade 30 de tráfego. Nós passaríamos a pensar em túnel? Um túnel tem custo comparado a viaduto, normalmente, dez vezes mais.” Também em entrevista à Folha de São Paulo, Nilson Ghirardello, coordenador da Câmara de Arquitetura do CREA-SP e professor da UNESP – Campus de Bauru, defende a remoção do Minhocão para que haja uma melhora urbanística da região: “Resolvido o problema viário, o centro de São Paulo só tem a ganhar.(...)Hoje há uma sensibilidade maior para o espaço urbano, coisa que na época quando o Minhocão foi construído não havia”. Durante esse trabalho, irão ser propostas soluções e analisar a viabilidade de algumas alternativas para solucionar a” cicatriz urbana” causada pela presença do minhocão. Nessa análise, deve-se ser céticos a respeito da importância viária do elevado para a cidade de São Paulo. Visto que o transporte público em São Paulo é insuficiente e ineficaz para atender toda a demanda de deslocamento nos horários de pico, muitos motoristas optam por utilizar o veículo particular. 31 Figura 9 – Croqui de trajeto do Elevado Presidente Costa e Silva Fonte: Eduardo Scarpinelli (2014) 32 8. ANÁLISE DOS PROBLEMAS URBANÍSTICOS CAUSADOS PELO ELEVADO PRSIDENTE COSTA E SILVA Nesse capítulo serão analisados os problemas urbanísticos e sociais decorrentes da construção do elevado, acima e abaixo da via elevada. A construção do elevado, desde sua concepção de projeto até os dias atuais, teve como consequência uma deterioração progressiva da região recortada pela via. Uma região que no passado era caracterizada pela forte presença comercial, valorização imobiliária, intensa vida noturna paulistana, se tornou com o passar do tempo uma região deteriorada e desvalorizada. Essa deterioração já era prevista antes de sua construção, uma vez que o prefeito responsável pela concepção do projeto não o executou devido às inúmeras críticas sobre o conceito da obra. Contudo Paulo Maluf, ao assumir a prefeitura de São Paulo, executou o projeto. A região acerca do elevado é utilizada pelos paulistanos apenas para o deslocamento entre regiões da cidade, de modo que o comércio da região é pouco movimentado e as pessoas que ali residem possuem baixíssimo poder aquisitivo. Figura 11 – Largo Padre Péricles Fonte: Google Streetview (2014) 33 8.1 Problemas urbanísticos que ocorrem na parte superior da via elevada A principal causa dos problemas urbanísticos do elevado é devido à sua proximidade aos edifícios que o cercam (Figura 12). A construção da via com mais de 3,5 kilômetros de extensão, recortou a região por onde passou, de modo que todo o percurso ao longo da via elevada, os automóveis percolam por entre os prédios, num fluxo conflitante com a qualidade de vida da população que ali vive. Essa convivência forçada entre veículos e edifícios acarreta em inúmeros transtornos visuais, sonoros e sanitários. Figura 12 – Proximidade da via dos prédios Fonte: Google Streetview (2014) Os problemas decorrentes da presença do minhocão acima da via elevada começam devido a mesma estar, em média, à uma distância de cinco metros das fachadas dos edifícios. O funcionamento do elevado para tráfego de veículos é restrito à segunda a sábado, das 6h30 às 21:30h, sendo que aos domingos o mesmo fica fechado para veículos e é utilizado para lazer dos paulistanos. Mesmo não sendo utilizado durante a maior parte da noite, a sua presença causa inúmeros transtornos para os moradores vizinhos. Um deles é a poluição sonora. O intenso tráfego de veículos e os frequentes congestionamentos, provocam inúmeros ruídos. Buzinas, colisões e xingamentos são a trilha sonora da vida de quem alí reside. Pessoas vivem em apartamentos onde a vista das janelas de suas residências coincidem com a visão das janelas dos automóveis. Essa é a falta de privacidade causada pelo elevado. Ao abrir a janela de sua casa, as pessoas além de terem uma vista desagradável, ainda perdem 34 toda sua privacidade (Figura 13). A condição melhora nos apartamentos mais altos, porém os impactos são relevantes em todos os níveis. Outro ponto crucial é a poluição do ar. Talvez esse seja o fator que mais prejudica a qualidade de vida dos vizinhos do elevado. Os veículos liberam altos níveis de gás carbônico, além de foligem. Esses fatores geram condições críticas, comprometendo a saúde pública. Figura 13 – A proximidade do Elevado e das casas chega a ser de apenas 4 metros. Fonte: Google Streetview (2014) O Minhocão é a rota diária de milhares de paulistanos. E se restringe a isso: ser uma via de passagem. O Minhocão é utilizado para o deslocamento urbano por todas as camadas sociais da cidade que possuem acesso ao automóvel. A utilização do elevado para o tráfego de veículos é tão democrática quanto o acesso à compra de veículos pelos cidadãos paulistanos. Contudo quem ali vive e, consequentemente não o utiliza apenas para passagem, é uma camada carente da população, que por não ter acesso às melhores condições acaba residindo ali por condição. É por isso que a vizinhança do elevado é uma parcela exclusa da sociedade. Um travesti em depoimento ao documentário Elevado 3.5 (2007) afirma: “Aqui em todo o prédio tem um, se não tem, vai ter!” - a respeito da presença de travestis nos edifícios ao redor do elevado. A afirmação do cidadão caracteriza a presença maciça de pessoas exclusas da sociedade nos edifícios ao redor. Segundo ele, ali na vizinhança ele é bem recebido, pois as pessoas estão acostumadas a conviver com travestis na região. Essa conclusão do cidadão avalia que a população que ali reside é uma parcela da população exclusa socialmente: como 35 lamentavelmente são os travestis. Esse abrigo aos menos favorecidos e segregados é reflexo dos inúmeros problemas que as pessoas que se sujeitam à ali viverem enfrentam. Essa recepção aos exclusos da sociedade tem reflexos na segurança da região. Os moradores, chegam a preferir o barulho latente proveniente da circulação de veículos durante o dia do que a via obscura que o elevado se torna durante a noite. Ao impedir a circulação de veículos durante a noite, a via se tornou reduto de traficantes, prostitutas e usuários de drogas. Os moradores chegam a ser surpreendidos quando a poucos metros de suas janelas pessoas fazem sexo na via. Em depoimento ao documentário Elevado 3.5, uma moradora de um dos prédios vizinhos ao Elevado, relata que foi surpreendida por vândalos em na sacada de seu apartamento. Segundo ela, eram grafiteiros que estavam ali para pixar o prédio e que não fizeram mal algum à ela. Essas situações caracterizam a precariedade da segurança pública da região, e comprovam que a região do elevado abriga os exclusos da sociedade. 8.2 Problemas urbanísticos que ocorrem na parte inferior da via elevada A construção da superestrutura de concreto de elevado acarretou em dois mundos de problemas urbaníscos. O primeiro é, como foi analisado anteriormente, acima da via elevada. O segundo é abaixo da via elevada. A cerca de seis metros de altura a presença do elevado criou uma cobertura que acarretou em diversos problemas para a região (Figura 14). Figura 14 – Estrutura do Elevado no nível da Rua São João Fonte: Google Streetview (2014) 36 A iluminação natural é totalmente prejudicada pela presença do Minhocão. A sua estrutura gigantesca de concreto acaba impedindo a infiltração de luz solar nas ruas, calçadas e comércio abaixo do elevado. Essa falta de iluminação e falta da presença solar acaba sendo uma das principais protagonistas acerca dos males causados pelo Minhocão. Abaixo da via elevada, é evidente o ambiente sujo, desde as fachadas até as calçadas. A visão de quem caminha abaixo do elevado é das piores possíveis: sujeira, tráfego intenso de veículos, moradores de rua, comércios desvalorizados e botecos decadentes. A falta de iluminação natural foi um convite para a intensa degradação que se instalou na maior “cicatriz” paulistana. Figura 15 – Moradores de rua adotaram o elevado como teto. Circulação intensa de ônibus automóveis contribuem para a má qualidade do ar, junto à falta de iluminação natural. – Praça Marechal Deodoro. Fonte: Google Streetview (2014) Já durante a noite, a situação é diferente. O tráfego de veículos tem sua intensidade exponencialmente reduzida, os poucos pontos de comércio sobreviventes fecham, travestis e prostitutas se posicionam ao longo das ruas, traficantes sorrateiros assumem seus postos atraindo consequentemente usuários de drogas. A parte inferior da estrutura brutal de concreto do elevado, foi adotada por muitos como teto. A estrutura do elevado acolheu inúmeros sem teto que pernoitam diariamente na região central da cidade. Ao adotarem o elevado como moradia, os moradores de rua circulam pela região, durante o dia e durante a noite, o que também prejudica o comércio e o mercado imobiliário. 37 A presença da organização não governamental Clube de Mães do Brasil (Figura 16) na Avenida São João (abaixo do elevada), ilustra bem a demanda de desassistidos que cerca o Minhocão. A ONG oferece refeições aos moradores de rua, bem como a oportunidade dos mesmos virarem artesãos: Figura 16 – ONG Mães do Brasil – A instalação da ONG na região caracteriza a demanda de pessoas carentes, desassistidas pela sociedade. Fonte: Google Streetview (2014) Outro ponto crucial é o fato de a parte inferior do elevado prejudicar a dispersão dos poluentes emitidos pelo tráfego dos ônibus e carros. Abaixo do minhocão existem duas pistas para a circulação de veículos: uma para carros e um corredor para ônibus, apesar de o corredor para ônibus ser utilizado abaixo de sua capacidade. Esse tráfego constante tem como resultado a emissão de altos níveis de gás carbônico e foligem. Essa má qualidade do ar e falta de iluminação prejudicam o comércio local, principalmente o comércio da indústria alimentícia, onde a sujeira e o mau cheiro não são bem aceitos. Tais problemas urbanos causados pela construção do elevado, foram se caracterizando durante anos, em um processo constante de deterioração da região. Essa deterioração, só poderá ser revestida com intervenções pontuais e precisas, com uma visão global dos problemas desde o sistema viário, transporte público, questões sociais, inclusão social e sobretudo, qualidade de vida dos paulistanos. 38 8.3 Questões sociais acerca do Elevado O Elevado Costa e Silva foi criado como uma das principais soluções viárias para a cidade de São Paulo que vivenciava (e ainda vivencia) um alto crescimento na frota de veículos particulares. Desde a concepção do projeto até os dias atuais muito foi discutido em todas as mídias brasileiras e sobretudo paulistanas sobre a “cicatriz” causada pelo elevado na cidade de São Paulo. Um dos principais pontos negativos do elevado, é a sua proximidade com as residências ao seu redor. Bem como grande parte do centro da cidade, a região do elevado é extremamente desvalorizada no mercado imobiliário (Figura 17). Uma intervenção urbanística no elevado contém uma questão social sublime que será discutida a seguir. Figura 17 – Imóveis extremamente humildes abrigam parcela exclusa da população ao redor do Elevado Fonte: Rodolfo Lucena (2014) Ao trafegar pelo Elevado Costa e Silva o cidadão paulistano visita a residência de todos os moradores dos edifícios que se situam no bairro recortado pelo Minhocão. As janelas dos apartamentos estão localizadas a uma média de cinco metros de distância da extremidade do elevado. Em situações frequentes de trânsito lento e engarrafamentos os motoristas dos veículos ficam tão próximos dos prédios que é possível observar toda a movimentação no interior dos apartamentos. Além da privacidade outros problemas como a poluição do ar na 39 região, a alta emissão de partículas como foligem e o barulho causado pelo tráfego são os principais fatores que levaram à uma desvalorização imobiliária da região. Entre as soluções urbanísticas mais viáveis estão a demolição parcial ou total do elevado e/ou a criação de um parque, seja ele suspenso ou não. O que deve ser enfatizado é: qualquer solução urbanística empregada no Elevado irá gerar uma valorização imobiliária da região. E não é para menos. Grandes investimentos em obras públicas em infraestrutura têm a premissa de gerar investimentos particulares na mesma região e consequentemente gerar empregos. Em todos os exemplos de soluções urbanísticas para casos similares ao redor do mundo que serão ilustrados posteriormente neste trabalho (High Line Park, Promenade Planteé, Esplanade, etc..), as intervenções foram eficazes na valorização imobiliária das regiões onde as vias se situavam. O High Line Park de Nova Iorque por exemplo, gerou investimentos de 4 bilhões de reais desde sua inauguração. Solucionar os problemas urbanísticos do Minhocão é uma tarefa que gera estudos em diversas áreas, de forma muito abrangente. O mercado imobiliário irá sentir os efeitos da desativação do minhocão, muitos investidores irão enxerga-lo como uma grande oportunidade e a região irá atrair muitos investimentos. Figura 18 – Moradores de rua encontram abrigo abaixo da via elevada Fonte: Sintufsc (2013) 40 A população que vive no entrono do elevado atualmente é predominantemente de classe baixa e vive na região não por opção, mas por condição. A presença do elevado e do consequente tráfego de veículos deprecia os imóveis, atraindo pessoas humildes que não podem comprar ou alugar imóveis em regiões mais valorizadas. A partir do momento que os investidores forem atraídos à localidade, essa parcela da população não poderá mais arcar com os valores da região. Situado próximo às avenidas como a Pacaembu e Angélica, marcadas pela alta especulação imobiliária de centros empresariais, comércios e residências, com uma intervenção urbanística de sucesso, a região do elevado tende a se integrar com tais regiões e ter a mesma valorização das mesmas. A partir desse momento, o governo, mediante políticas públicas, deveria planejar e transferir as pessoas com baixa renda que hoje vivem na região para locais com infraestrutura própria para moradia. Os pontos de comércio, por outro lado, seriam beneficiados. Uma melhora urbanística da região impulsionaria o comércio local, atraindo paulistanos e turistas. 41 9. CASOS SEMELHANTES AO REDOR DO MUNDO 9.1 Perimetral – Rio de Janeiro Sua construção foi iniciada em 1950 e sua obra foi faseada até ser entregue dez anos depois, em 1960. A estrutura do elevado é composta por concreto e vigas de aço cortem em uma extensão de 5,5 km, com acesso para avenidas arteriais do Rio de janeiro como a Avenida Brasil, o Aeroporto Santos Dumont a Ponte Rio-Niterói. Figura 20 – A vista do continente para o oceano era prejudicada pela presença da via. Fonte: wikipedia.org (2013) A presença do Elevado foi foco de inúmeras críticas durante anos, do ponto de vista urbanístico e viário. Do ponto de vista viário, a via elevada não comportava mais o alto fluxo de veículos na zona portuária do Rio de Janeiro, com pontos de afunilamento nas pinças de acesso (erro de projeto). A principal crítica urbanística do elevado era que sua presença bloqueava a vista da cidade para quem se deslocava por mar, e impedia a vista do mar para quem se deslocava por terra, prejudicando a estética local (Figuras 20 e 21). 42 Figura 21 – Praça 15 de Novembro com vista para o porto antes da construção da perimetral. Fonte: www.dw.de/ (Século XX) Visto que o Elevado da Perimetral não tinha um papel harmônico em inúmeros pontos de vista, a sua presença causou debates entre lideranças políticas urbanistas durante décadas. O Elevado da Perimetral do Rio de Janeiro é um caso rotineiramente citado quando o assunto é o Elevado Presidente Costa e Silva de São Paulo. Ambos os elevados são casos de obras idealizadas para suprir uma demanda decorrente de aumento de automóveis nas grandes cidades brasileiras nos anos 60 e 70. O Elevado do Rio de Janeiro também foi por muitos anos criticado, até que, em uma grande obra de intervenção iniciada em 2012 (com término previsto para 2016), teve sua demolição decretada. A Via Elevada da Perimetral foi construída com o intuito de complementar a Avenida Rodrigues Alves, contribuindo para dar vazão ao intenso tráfego da região. O elevado interligava os bairros da Baixada fluminense, Zona Norte, Zona Sul, Zona Oeste e Centro Carioca, permitindo a conexão ente o Aeroporto Santos Dumont com a Ponte Rio Niterói, por exemplo. A circulação do elevado antes de sua desativação era estimada em 4.753 mil veículos/dia, sendo que o ideal, segundo o relatório da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do porto do Rio de Janeiro (CDURP) , seria de 2.000 veículos/dia na região. 43 Figura 19 – Perimetral do Rio de Janeiro Fonte: fotos.estadao.com.br (2013) O Projeto Porto Maravilha, que é um programa de revitalização da Zona portuária da prefeitura do Rio de Janeiro, nasceu com o intuito de revitalizar a Região Portuária, prevendo principalmente a restruturação da infraestrutura local, com premissas sustentáveis que promovam a qualidade de vida da população das regiões locais e vizinhas. As principais intervenções previstas em projetos contemplam a demolição do Elevado, a conversão da Avenida Rodrigues Alves em via expressa e a construção da via Binário do Porto. A Via Binário recebeu 70% do tráfego proveniente da desativação do elevado, sendo liberada ao trânsito no dia 2 de novembro de 2013 (mesma data do fechamento definitivo da Perimetral). O conjunto da Avenida Rodrigues Alves e Binário irão comportar 10.500 veículos/hora a partir de 2016, sendo que o antigo conjunto composto pela Via Elevada da Perimetral e a Avenida Rodrigues Alves recebiam 7.600 veículos por hora em horários de pico. Principais obras previstas na operação urbana consorciada da área de especial interesse urbanístico da região portuária do Rio de Janeiro: • Construção de 4 km de túneis; • Reurbanização de 70 km de vias e 650.000 m² de calçadas; • Reconstrução de 700 km de redes de infraestrutura urbana (água, esgoto, drenagem); 44 • Implantação de 17 km de ciclovias; • Plantio de 15.000 árvores; • Demolição do elevado da Perimetral (4 km); • Construção de três novas estações de tratamento de esgoto. Vale ressaltar que o Projeto Porto Maravilha possui a premissa de preservar a identidade da região, respeitando a cultura e a história, sem comprometer o meio ambiente. Além disso o projeto visa melhorar a qualidade de vida dos moradores da região. Tais valores são importantes e devem ser ponderados em qualquer intervenção no Elevado Presidente Costa e Silva. A demolição do Elevado da Perimetral (Figura 22) foi contestada por muitos urbanistas que propunham o aproveitamento da estrutura para implantação de um parque suspenso. A operação de demolição do Elevado contou com o deslocamento de 130 pessoas, número baixo pois os bairros não são residenciais. Além disso, inúmeros desvios e adaptações das linhas de ônibus e vias da região causaram transtorno durante todo o processo de demolição. O Estudo de casos como o do Elevado da Perimetral são extremamente importantes para entendermos de modo global o caso do Elevado Presidente Costa e Silva. Figura 22 – Demolição de trecho da Via Elevada Perimetral. Fonte: www.ebc.com.br (2013) 45 9.2 High Line Park – Nova Iorque A cidade de Nova Iorque ostenta uma das intervenções urbanísticas em vias elevadas mais bem sucedida e comentada da atualidade. O High Line Park (Figura 23)é, sem dúvidas, um exemplo de intervenção urbanística a ser estudado e por que não, aplicado em outras partes do mundo. Figura 23 – High Line Park Fonte: http://www.novayork.com/high-line (2013) Percorrendo dezenove quadras predominantemente em Downtown, bairro de Manhatan, o parque suspenso foi criado em uma região que há pouco tempo atrás era dominada por armazéns, depósitos e indústrias. Após a construção do parque, se desenvolveram em seu entorno galerias de arte, empresas de design, lojas de grife, restaurantes e muitos espaços que promovem a cultura. 46 Figura 24 – Trajeto High Line Park Fonte: Google Maps (2014) A ideia de implantar um novo uso do elevado surgiu a partir de uma linha de trem desativada que recortava edifícios de Nova Iorque. Em 1999 a prefeitura de Nova Iorque propunha a demolição de uma ferrovia elevada abandonada com 2,6 km de extensão. Uma fundação chamada “Friends of High Line”, fundada por dois jovens, propôs a ideia da transformação da estrutura em parque, descartando a demolição do mesmo. O projeto foi dividido em três fases, sendo que a primeira foi entregue em 2009. Em 2011 foi concluída a segunda parte e neste ano será entregue a terceira parte completa. Todo o design e layouts do parque foram inspirados na essência da linha ferroviária, onde trilhos foram mantidos contracenando com um tratamento paisagístico que preservou a vegetação que ali se desenvolveu durante os anos de abandono (Figura 25). Além dos trilhos, os bancos e espreguiçadeiras remetem à uma linha ferroviária, tudo isso com vista para o ritmo alucinante de Manhatam e a paisagem do Rio Hudson. Manter a raiz histórica do parque foi um dos seus principais trunfos: a cidade evolui, proporcionou uma melhor na qualidade de vida para seus moradores, mas sem esquecer de suas raízes, da linha ferroviária que se confunde com tudo que cerca a cidade de Nova Iorque. O monumento remete à ilustre história industrial de Nova Iorque. 47 Figura 25 – Antes da intervenção: A via encontrava-se abandonada tomada por vegetação Fonte: http://www.novayork.com/high-line (2008) O parque surgiu de forma tímida mas atualmente já figura entre uma das milhares de atrações turísticas da cidade. Entre os visitantes locais, caminham turistas apreciando o parque e toda a arte que o cerca. Hoje o parque conta com 30 galerias de arte e a área onde ele se situa já recebeu mais de 4 bilhões de reais em investimentos desde a inauguração. Resultados (www.cidadessustentaveis.org.br): • De 2009 até agora, o Parque já recebeu mais de 8 milhões de visitantes, em proporções quase iguais de nova-iorquinos e de outros lugares, sendo um dos parques públicos mais procurados da cidade (dados de 2013); • Atualmente, o High Line possui mais de 300 espécies de plantas perenes, gramíneas, arbustos e árvores; • Desde o novo zoneamento da área em 2005, combinado com a abertura do Parque em 2009, já foram criados mais de 12 mil empregos, 2.558 novas residências e 1.000 quartos de hotéis; • A prefeitura já arrecadou R$ 1,8 bi com a valorização da área. Apenas em construções autorizadas com o novo zoneamento, que permitiu prédios mais altos na vizinhança, surgiram 35 edifícios residenciais e comerciais. Outros 12 estão em construção (dados de 2013); • Só em 2012, o Parque atraiu 3,7 milhões de visitantes - 1 milhão a mais do que o MoMA (The Museum of Modern Art). 48 9.3 Promenada Planteé - Paris Bem como o High Line é uma intervenção urbanística fantástica e bem sucedida para a cidade de Nova Iorque, o Promenade Planteé é para Paris (Figura 26). Construído a partir de uma linha ferroviária abandonada, o parque suspenso convive harmonicamente com o bairro residencial da cidade por ele cortado. O Promenade Plantée foi concebido a partir da linha de Vincennes que funcionava desde 1859 desde a estação Bastille (atual Opera Bastille) até Verneuil-l’Étang. A linha ferroviária foi desativada em 1969 e, em 1988, a prefeitura de Paris em conjunto com a SEMAEST (Société d’Economie Mixte d’Aménagement de l’Est Parisien, concebeu a ideia da criação do parque suspenso. Em 1993 foi entregue o parque suspenso, fruto da parceria entre a paisagista Jacque Vergely com o arquiteto Philippe Mathieux. Figura 26 – Promenade Planteé Fonte: Valentina Joaquina (2013) Ao longo de seus 4,7 km o parque não nega a paixão francesa pela jardinagem. Em toda a França é possível observar praças e parques com um tratamento paisagístico especial. O Promenade Planteé não poderia ser diferente. O parque poderia ser facilmente definido como o jardim dos prédios que o cercam, que o cercam pois a intervenção urbanística foi tão bem 49 sucedida que uma linha ferroviária que no passado cortava as edificações por onde passava, se tornou parte integrante das construções, sendo sua presença complementar ao bairro. O parque abriga 3 hectares de jardins, com esculturas e fontes. Além de promover o passeio de pedestres que desejam simplesmente caminhar pelo parque e admirá-lo, o parque possibilita a prática de esportes como corrida e ciclismo. Outro ponto interessante do parque (que também se assemelha ao High Line Park) é sua integração com a cultura. O Viaduc dês Arts é o trecho do Promenade Plantée que foi restaurado e hoje abriga ateliês de arte, comércio de instrumentos musicais, designers de roupas da lata costura internacional, e muitas obras de arte. O viaduto ainda conta com bares e restaurantes. A cultura local está distribuída ao longo de todo o percurso, inclusive na arquitetura parisiense ao redor da antiga estrada de ferro. Figura 27 – Promenade Planteé Fonte: Valentina Joaquina (2013) 50 9.4 Esplanade - Boston Boston vivia um momento onde era preciso encontrar uma solução viável para desafogar o tráfego de veículos, construindo túneis que se tornaram as artérias viárias da cidade. O elevado de Boston, nos anos 90, já transportava mais que o dobro da capacidade de veículos para a qual foi projetado. O tráfego era tão intenso que, em período integral, a via se encontrava congestionada A cidade de Boston, nos Estados Unidos, sofreu uma grande e custosa reforma viária na última década. Além dos problemas urbanísticos causados por longas vias elevadas, tais vias não suportavam mais o intenso tráfego de veículos. A solução encontrada foi a de implodir a via elevada, construindo um parque onde a mesma se situava, e túneis abaixo do parque. O Esplanade em Boston (Figura 28) é uma das obras mais caras da história dos Estados Unidos. Com o custo de aproximadamente quinze bilhões de dólares, a obra do Esplanade mobilizou longos canteiros de obra ao longo da cidade durante anos. A complexidade da obra, que foi iniciada em 1991, se deve principalmente à implosão da estrutura existente e da escavação dos túneis. A obra ficou conhecida na época como “A grande escavação” (The Big Dig). Figura 28 – Esplanade – Boston – As vias elevadas deram lugar a túneis e parques Fonte: Loodog (2014) 51 O principal objetivo da obra foi a valorização imobiliária da região acerca da via elevada que sofreu (como em outros casos) um cruel processo de desvalorização e deterioração. O projeto se baseou em um estudo o qual apontava uma valorização da região com o parque, atraindo investimentos que gerariam mais de vinte mil postos de trabalho. "Rebaixar a artéria central para o subsolo é importante porque vai ajudar a reagrupar Boston. A via elevada é uma grande barreira entre as comunidades. Agora, a cidade poderá voltar a se ver como uma só", Barry Bluestone - diretor do Centro para Política Urbana da Northeastern University, em Boston. (Folha de São Paulo 27 de julho de 2003). Figura 29 – Esplanade – Boston – As vias elevadas deram lugar a túneis e parques Fonte: Ingfbruno (2013) 52 9.5 Cheonggyecheon - Seul Em Seul, na Korea, temo-se um exemplo épico sobre intervenção urbanística. O Cheonggycheon é o grande ícone de uma intervenção urbanística emblemática em Seul. O que antes eram vias elevadas que cobriam um rio extremamente poluído e degradado, se transformaram em um parque agradável, símbolo de um novo conceito para a cidade de Seul: O conceito de cidades para pessoas. Figura 30 – O parque linear é convidativo aos pedestres e a pequenos animais Fonte: equiperomanna.wordpress.com (2013) Como o Minhocão e outros exemplos citados nesse trabalho, os governantes de Seul construíram vias elevadas na cidade para atender as demandas do crescimento econômico. O Riacho de Cheonggyecheon era foco de doenças e mal cheiro devido ao alto fluxo de lixo e esgoto que nele eram despejados. Em 1960, com o objetivo de esconder o esgoto a céu aberto que o riacho havia se transformado, ele foi canalizado com concreto. Em 1968, o rápido crescimento da Korea e o aumento do tráfego de veículos impulsionou um grande lote de obras viárias, entre elas a de um elevado acima do Riacho de Cheonggyecheon (Figura 32). 53 Soterrar o riacho foi a solução encontrada na época para atender ao aumento da população, crescimento econômico e a consequente maior demanda de fluxo de tráfego, como o Elevado Presidente Costa e Silva. Figura 31 – Vista em planta do projeto: um parque linear que acompanha o rio em meio a metrópole Seul. Fonte: lafoundation.org (2014) Em 2003 foi iniciado um vasto projeto de revitalização urbana, onde o objetivo era tornar a cidade mais agradável para os pedestres e menos refém da estrutura viária. O principal ponto dessa intervenção foi que, com a redução gradual do número de vias, os cidadãos gradualmente abandonaram os automóveis, reduzindo exponencialmente o número de carros na cidade. A via elevada de 5,8kms foi demolida, sendo que 75% do material demolido foi reutilizado na construção do novo parque. As obras duraram 2 anos e 3 meses e o custo foi cerca de 500 milhões de reais (280 milhões de dólares). A intenção do projeto era de reinstalar a identidade natural do local e impulsionar o comércio e a especulação imobiliária local. Vale ressaltar que o projeto de intervenção urbanística foi discutido inúmeras vezes pelas lideranças, com milhares de reuniões para que todos os aspectos fossem considerados. Esses estudos e discussões devem ser dotados em uma intervenção no Minhocão, de modo que as lideranças políticas devem se basear em estudos concretos e análises globais críticas que cercam o elevado. 54 Figura 32 –Antes da intervenção: Córrego enterrado Fonte: www.kcet.org/ (2011) Figura 33 –Depois da intervenção Fonte: bluebalu.files.wordpress.com (2013) 55 A intervenção urbanística que resultou no parque ao longo do Riacho de Cheonggyecheon, teve como aliados o remanejamento de boa parte do complexo viário da cidade de Seul, e principalmente investimentos maciços em transporte público. É importante ressaltar que para que a população tenha uma adesão em massa do transporte público, é necessário que o mesmo suporte a população e tenha padrões mínimos de qualidade. Cheonggyecheon é hoje o maior parque horizontal do planeta. Esse parque segue o fluxo de um riacho que passa pelo meio da cidade de Seul, e torna a cidade atrativa aos pedestres. Com a revitalização da área, o local tem uma temperatura, em média, 3,6ºCelsius mais baixo que outros pontos da cidade. O fluxo de água aliado à presença de vegetação, convida os pedestres a caminhar. Para mais, toda a história regional foi preservada em um museu inaugurado em 2005: O Museu de Cheonggyecheon. O museu, localizado na ponta leste do rio, conta toda a história do córrego e o bairro ao seu redor. Um exemplo de uma intervenção urbanística moderna com a manutenção da cultura e história. Figura 34 – A água ao longo do parque além de ser limpa, diminui a temperatura na região ao redor. Fonte: ://www.universojatoba.com.br/ (2013) O caso do Riacho de Cheonggyecheon tem muitos pontos altos que podem ser aproveitados no Elevado Presidente Costa e Silva. O parque é emblemático no que se diz 56 respeito a regressão da “cultura do carro”. Um espaço antes ocupado por vias expressas, hoje é preenchido com vegetação e água limpa e cristalina no meio da cidade (Figura 34). Onde antes trafegavam milhares de veículos por dia, hoje é um espaço com peixes e insetos, além de convidativo aos pássaros. O projeto de intervenção da cidade de Seul, não é referência apenas para o Elevado paulistano, mas sim para o mundo. 57 10. DIRETRIZES PARA INTERVENÇÃO URBANÍSTICA NO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA - SP 10.1 Análise da viabilidade da demolição do Elevado Presidente Costa e Silva - SP Uma das soluções urbanísticas mais comentadas por especialistas da área é a demolição total ou parcial do Elevado Presidente Costa e Silva. A sua demolição devolveria a privacidade e a tranquilidade aos moradores dos prédios adjacentes, valorizando a região do ponto de vista imobiliário. Contudo, a sua demolição gera outros problemas a serem solucionados como por exemplo, o gargalo viário gerado pela sua ausência (como discutido anteriormente neste trabalho). Outro fator preocupante são os impactos gerados pela demolição no ponto de vista residual, além dos certos transtornos causados pela implosão. Esses itens serão discutidos a seguir. O Minhocão, quando apresentado pelo prefeito Paulo Maluf, foi definido em seu slogan como “A maior obra de concreto protendido da América Latina”. Além dos impactos urbanísticos, o tamanho volume de concreto ao longo de seus 3.5 km de extensão é desafiador para qualquer solução viável. As preocupações são econômicas e sobretudo ambientais. Do ponto de vista econômico, a implosão do elevado requer técnicas modernas e um alto grau intelectual na tomada de decisões, dada a proximidade do elevado com os prédios vizinhos (5 metros em média). Além disso, a sua implosão geraria um grande montante de resíduos que levariam muito tempo e dinheiro para serem transportados. Já do ponto de vista ambiental, a geração de resíduos é uma das maiores preocupações modernas na construção civil. Desde 2002 vigora a RESOLUÇÃO NÚMERO 307 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) que estabelece critérios e procedimentos para gestão de resíduos na construção civil. A indústria da construção civil polui o ar, solo e água e é a que mais utiliza recursos naturais e gera resíduos, no caso da demolição em questão, resíduos de Classe A definidos como resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados pelo CONAMA (mma.gov.br). Estima-se que são gerados 500kg de resíduos por habitante por ano na construção civil no Brasil (Ministério Público). O desenvolvimento sustentável é uma premissa que ganhou muita força nas últimas décadas. A construção civil está diretamente relacionada ao desenvolvimento econômico do nosso país. Qualquer intervenção executada no elevado deve ser avaliada do ponto de vista ambiental. Entre os principais impactos causados pela demolição do Minhocão pode-se listar: bloqueio do tráfego de veículos nas ruas abaixo do 58 Minhocão, bloqueio do tráfego de pedestres, poluição visual, obstrução de sistemas de drenagem potencializando enchentes, entre outros. A reciclagem de resíduos da construção civil é viável e tem sido uma prática adotada para se preservar os recursos naturais do planeta. Ao se cogitar a demolição total ou parcial do elevado, a reciclagem dos resíduos gerados é imprescindível. Figura 35 - Demolição da Perimetral do rio de Janeiro Fonte: G1 (2014) 59 10.2 Considerações sobre os casos semelhantes ao redor do mundo As soluções urbanísticas ao redor do mundo, apresentadas anteriormente possuem algumas divergências. A única convergência em comum é que todas, sem exceção, procuram (ou procuraram) melhorar a qualidade de vida da população. Contudo, deve-se filtrar as informações importantes de cada um dos modelos para inspirar e definir as diretrizes e conceitos a serem adotados no Elevado Presidente Costa e Silva. O High Line Park (Nova Iorque) e o Promenade Planteé (Paris) foram soluções urbanísticas inteligentes que ao mesmo tempo que revigora a região onde se situa, mantém as raízes históricas da área. Esse é o desafio para qualquer intervenção urbanística em qualquer lugar do mundo. No caso do Elevado Costa e Silva abrir mão de sua presença física seria abrir mão de parte integrante da história do desenvolvimento de São Paulo. Já as obras da Perimetral (Rio de Janeiro) e Esplanade (Boston) caminham em direção oposta às propostas do High Line e do Promenade. Não acredito que essa seja a solução urbanística mais viável para qualquer situação, principalmente para o atual objeto de estudo do trabalho: o Elevado Costa e Silva. O custo da obra é exorbitante e a mobilização urbana para execução da mesma é gigantesca. Escavar imensos túneis ao longo de uma metrópole pune a população que mora e que frequenta o entrono do canteiro. Sujeitar a população que coexiste há anos com uma aberração urbanística, a mais anos de transtornos (mesmo que visando a melhoria) é inviável. A solução implantada tem que ser prática e com o menor prazo possível. O principal ponto é que vivemos em tempos, principalmente no Brasil, em que o governo deve investir no transporte público, não no transporte privado. Gastar bilhões em uma obra de infraestrutura privilegiando o transporte particular não é a solução contemporânea mais inteligente. As grandes cidades precisam investir em parques para melhorar a qualidade de vida de seus moradores, mas devem também investir no transporte público para desafogar o trânsito. Um transporte público de qualidade, além de ser mais viável economicamente, é a melhor alternativa do ponto de vista ambiental, uma vez que diminui os gastos energéticos a as emissões de gases poluentes. Na tabela a seguir (Tabela 1), podemos observar que como fator preponderante ao custo das obras, a construção de túneis figura como principal vilã. A Tabela 1 foi confeccionada visando comparar o custo/km das intervenções, uma vez que se tratam de parques lineares, além da duração das obras. Outro fator preponderante que podemos observar é a demolição da via, que acarreta em maiores custos, além de demandar maior prazo. 60 Tabela 1 – Comparativo entre os modelos apresentados OBRA EXTENÇÃO (KM) CUSTO PREÇO/KM DURAÇÃO ANOS/KM DEMOLIÇÃO CRIAÇÃO DE TÚNEIS High Line Park 2,6 R$ 490 milhões 188 milhões/km 5 anos 1,92 anos/km Não Não Esplanade 4,8 R$ 37 bilhões 7,7 bilhões/km 14 anos 2,91 anos/km Sim Sim Promenade Planteé 4,7 - - 5 anos 1,06 anos/km Não Não Perimetral 5,5 R$ 8 bilhões 1,45bilhões/km 4 anos (previsto)0,72 anos/km sim Sim Cheonggyecheon 5,8 R$ 500 milhões 86 milhões/km 2 ano 0,34 anos/km Sim Não Fonte: Eduardo Scarpinelli (2014) Enquanto as Obras de do High Line e Cheonggyecheon apresentam custos na casa dos milhões, A Perimetral e Esplanade apresentam custos na casa dos bilhões. Isso se deve à construção de túneis, que além do custo elevado, acarretam em obras mais longas e demoradas. Uma das muitas especulações que cercam o Elevado Presidente Costa e Silva é de que o mesmo seria demolido e sua função viária seria desempenhada por túneis. Com as informações levantadas nesse trabalho, acredita-se que essa é uma solução equivocada. O grande desafio para solucionar problemas urbanos é o combate à cultura do automóvel. Uma vez que, com a construção de novas vias a utilização do carro é estimulada, esse trabalho defende a não criação de túneis, e sobretudo o conceito de cidades mais agradáveis para pessoas, não para carros. 61 11. PROPOSTA DE DIRETRIZES E PLANEJAMENTO PARA INTERVENÇÃO URBANISTA NO ELEVADO PRESIDENTE COSTA E SILVA - SP 11.1 Diretrizes para intervenção urbanística no Elevado Presidente Costa e Silva -SP O Elevado Presidente Costa e Silva representa fisicamente a cultura do automóvel consagrada nas políticas urbanas brasileiras. A base de sua concepção é o conceito de via expressa para facilitar o deslocamento urbano dos paulistanos, tornando-o mais rápido e eficiente. Contudo muitos países desenvolvidos caminham na direção contrária: menos investimentos para automóveis e maior concentração de investimentos no transporte público. Os benefícios do transporte público para a sociedade foram discutidos neste trabalho anteriormente, podendo ser detectados em muitos países de primeiro mundo. Ao analisar o material levantado ao longo desse trabalho, é fundamental o investimento maciço do governo no transporte público para que qualquer intervenção urbanística seja bem sucedida. Aliado ao investimento em transporte público, tem-se como diretriz englobar o conceito de cidade-parque como ponto de partida do elevado. A presença de áreas verdes melhora a qualidade de vida da população, convidando-a a interagir com a cidade, caminhando, e utilizando a área urbana como espaço, não só para deslocamento ou atividade econômica, mas como área de lazer. Implantar o conceito de parques urbanos no Elevado Presidente Costa e Silva pode ser um projeto que abra portas para novos investimentos do mesmo gênero em outras áreas da cidade, desde que seja aplicado de forma correta, oferecendo lazer, ambientes agradáveis e sobretudo segurança. A bicicleta é o meio de transporte alternativo que mais tem crescido na cidade São Paulo. Muitas pessoas devido ao trânsito intenso e a falta de qualidade de oferta de transporte público, adotaram a bicicleta como a válvula de escape para o deslocamento urbano. Na análise de possíveis soluções urbanísticas para o elevado, deve-se estudar o uso da bicicleta na cidade. O planejamento público paulistano falha ao planejar a mobilidade urbana. A grande maioria das obras em São Paulo visa aumentar a vazão de veículos criando-se mais vias em um processo que é um ciclo vicioso. Mais vias aumentam o número de veículos particulares, que por sua vez aumentam o tráfego, gerando congestionamentos e novamente a necessidade da construção de mais vias. O planejamento público baseia-se no conceito de que a cidade pode se expandir continuamente, promovendo a circulação de automóveis. 62 É preciso uma visão mais ampla sobre o deslocamento urbano, onde deve-se implantar melhorias necessárias para o que já existe e não impulsionar um crescimento desordenado. Uma análise que parta de premissas ambientais e que visem a qualidade de vida da população é algo básico que deve ser aplicado imediatamente. Os novos investimentos públicos devem adotar uma política pró-bicicleta para que os cidadãos tenham um melhor uso do espaço urbano. Atualmente a prefeitura de São Paulo tem investido em ciclovias ao longo da cidade. Contudo, o investimento ainda é muito tímido e não impulsiona o uso da bicicleta como meio de transporte alternativo. O ciclista divide espaço com automóveis, pedestres e motociclistas, o que torna o uso da bicicleta arriscado. Inúmeros casos de atropelamento têm sido noticiados nos últimos anos, o que ressalta a necessidade de um investimento em um plano ciclo viário na cidade de São Paulo. Algumas ciclovias só funcionam aos domingos (como a que interliga o Parque Vila Lobos ao parque Ibirapuera), quando na verdade, poderiam ser utilizadas ao longo da semana, desafogando o transporte particular e público. Uma possível intervenção no Elevado Presidente Costa e Silva, ao englobar em seu projeto espaços para os ciclistas e pedestres em meio à uma área verde, promove a qualidade de vida da população, a utilização de meios alternativos e limpos de locomoção, promove o esporte e, sobretudo, a substituição do automóvel por meios alternativos de locomoção. 63 11.2 Planejamentos estratégico para intervenção urbanística no Elevado Presidente Costa e Silva Visando organizar as informações que foram estudadas ao longo desse trabalho, foi elaborado um planejamento estratégico com a metodologia Canvas, sendo mapeados os principais escopos e restrições que devem ser levados em consideração em uma possível intervenção urbanística no Elevado Presidente Costa e Silva de modo visual e objetivo. Vale ressaltar que a estimativa de custo é fictícia, sendo a mesma obtida através do custo por km do High Line Park, por se tratar de um caso semelhante. Figura 36 – Planejamento Estratégico Canvas para intervenção no Elevado Fonte: Eduardo Scarpinelli (2014) 64 12. CONCLUSÃO Durante o desenvolvimento deste Trabalho de Graduação (TG) notou-se uma grande variedade de assuntos que estão diretamente relacionados ao elevado Costa e Silva. Sem dúvida o problema viário é primordial, entretanto, também foi necessário analisar a questão, social, cultural e ambiental. Embora relevante, a análise econômica não foi considerada devido a complexidade do assunto e ao tempo disponível para a realização do TG. Hoje, ao estudar os problemas viários da cidade de São Paulo, percebeu-se que a utilização do Elevado Costa e Silva (Minhocão) se tornou complicada para tráfego de veículos. Uma vez que a política de transporte brasileira impulsiona a utilização de veículos particulares, relegando a segundo plano o transporte coletivo. O Elevado trouxe diversos males à cidade de um modo geral, prejudicando a qualidade de vida e levantando discussões sociais, urbanísticas e ambientais. O Elevado Presidente Costa e Silva representa a valorização da cultura do automóvel adotada no planejamento urbano de São Paulo e representou também a degradação da região em seu entorno. Possui uma função fundamental considerando o sistema viário paulistano e a sua não utilização para tráfego de veículos pode comprometer ainda mais o já caótico trânsito de São Paulo, uma vez que liga a Zona Oeste à Região Central, à Região Sul (via Avenida 23 de maio) e à Região Leste (via Radial Leste). Do ponto de vista viário, o Minhocão é uma das principais rotas diárias de um grande número de paulistanos, contudo, do ponto de vista urbanístico o Elevado é uma catástrofe, sendo muito criticado devido ao seu impacto urbano negativo, embora a sua função viária seja muito eficaz, dando importante contribuição na vazão do trânsito na cidade de São Paulo. Após a sua criação, a via expressa, apesar de desafogar o tráfego de veículos, causou grande impacto negativo na região. O Elevado ao “costurar” os prédios do centro, promoveu uma desvalorização dos imóveis. A antiga via local foi mantida e devido a construção do elevado houve grande prejuízo da iluminação e ventilação natural, assim sendo, abaixo do elevado as ruas são escuras e dominadas por andarilhos e moradores de rua. As reflexões acerca do Elevado Costa e Silva geram um leque enorme de discussões e empecilhos, contudo a situação atual é uma aberração que deve ser solucionada. Também vale ressaltar o papel do poder público em enxergar as demandas sociais que a desativação do elevado irá gerar. A região carece de uma atenção especial do Estado com objetivo de gerar a sua valorização dos imóveis, bem como trazer benefícios às pessoas que ali vivem atualmente. 65 Do ponto de vista ambiental, temos uma crescente preocupação com a qualidade do ar, com a poluição sonora e visual. Uma das principais causas da desvalorização dos imóveis é a emissão de gases poluentes provenientes de veículos movidos à combustão, o que tem provocado doenças respiratórias à população causadas pela má qualidade do ar. Vivemos em um mundo onde a cultura do automóvel é valorizada. Deve-se reverter esta situação. A utilização de conceitos sustentáveis é fundamental para proporcionar qualidade de vida às pessoas. Deve-se aumentar as áreas verdes e as áreas para circulação de pedestres. Com tais conceitos, a população ganha qualidade de vida, tempo. Do ponto de vista social, ainda hoje, a grande maioria da população não possui renda suficiente para utilizar o carro diariamente, assim sendo, o incentivo do uso da bicicleta teria impacto positivo e promoveria a inclusão social. É imprescindível o investimento, por parte dos órgãos públicos, no transporte coletivo. As novas políticas de planejamento urbano devem contemplar mais projetos para o transporte púbico e menos projetos para atender as demandas de veículos automotores particulares. A alta concentração populacional e a área da cidade de São Paulo exigem planejamento urbano e investimentos maciços para que a demanda de deslocamento seja melhorada. Historicamente, os investimentos públicos são concentrados em vias para automóveis e pouco aplicados na estruturação do transporte público. As verbas de órgãos governamentais são sugadas para adaptar espaços urbanos com o objetivo de maximizar o uso do automóvel. Por outro lado, preservar a estrutura de concreto é preservar a história da cidade, uma vez que o elevado Presidente Costa e Silva é parte integrante da cidade de São Paulo. A execução de pequenos vãos na laje do elevado, poderá melhorar a iluminação natural da via que se encontra abaixo do elevado, tornando as ruas mais agradáveis. A intervenção mais rápida e econômica seria transformar o Minhocão em um parque elevado, assim evitaria a demolição do elevado e a construção de túneis. Vale ressaltar que cada cidade possui condições peculiares e específicas. O planejamento do sistema urbano de transporte bem feito tornaria a cidade de São Paulo mais receptiva. A desativação do Elevado é uma oportunidade para se introduzir, na cidade São Paulo, uma política pró-bicicleta e uma valorização das questões ambientais. As criações de ciclovias ao longo do elevado impulsionariam um movimento cultural a favor do uso da bicicleta, o qual já existe em São Paulo. Acredita-se que é possível transformar o Elevado Costa e Silva em um espaço urbano moderno e contemporâneo onde os pedestres e os ciclistas seriam privilegiados. 66 Para revitalizar o centro de São Paul é necessário intervir no elevado Costa e Silva de forma à humanizá-lo, seja demolindo-o ou revitalizando-o, é um importante avanço que trará benefícios a todos. 67 13. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, Carlos, Antes elevados e pontes, hoje parques e túneis, 2013. Disponível em < http://www.dw.de/antes-elevados-e-pontes-hoje-parques-e- t%C3%BAneis/g-17056555 > Acesso em Agosto de 2014. American Public Transportation Association, Public Transportation: On the Move..., 2005 Associação Nacional de Transportes Públicos, Transporte Humano: Cidades com Qualidade de Vida, 1997. Associação Parque Minhocão, A história do Minhocão, 2014. Disponível em < http://minhocao.org/a-historia-do-minhocao/ > Acesso em Abril de 2014. BANDEIRA, Olivia, Derrubada da Perimetral reformulará sistema viário do centro do Rio, 2012. Disponível em < http://infraestruturaurbana.pini.com.br/solucoes- tecnicas/17/repaginacao-viaria-no-porto-carioca-derrubada-do-elevado-da-263021- 1.aspx > Acesso em Setembro de 2014. Conexão Paris, Você conhece um jardim suspenso chamado Promenade Planteé?, 2014. Disponível em < http://www.conexaoparis.com.br/2014/05/23/voce-conhece-uma- jardim-suspenso-chamado-promenade-plantee/ > Acesso em Agosto de 2014. DIAS, Roberto, Boston tenta revolucionar o trânsito urbano, 2003. Disponível em < http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2707200308.htm > Acesso em Agosto de 2014. Encontra Perdizes, História de Perdizes, 2014. Disponível em < http://www.encontraperdizes.com.br/perdizes/historia-de-perdizes.shtml > acesso em Abril de 2014. Friends Of High Line, 2000-2014, Disponível em < www.thehighline.org/ > Acesso em Julho de 2014. 68 GIARETTA, Rafael, Uma impressionante renovação urbana em Seul, 2011. Disponível em: < http://portalarquitetonico.com.br/uma-impressionante-renovacao-urbana-em-seul/ >. Acesso em Agosto de 2014. GRANJEIA, Julianna, Especialistas em tráfego e arquitetura apoiam possível demolição do minhocão, 2010 Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2010/05/731288-especialistas-em-trafego-e- arquitetura-apoiam-possivel-demolicao-do-minhocao.shtml > Acesso em Junho de 2014. HERCE, Manuel, Sobre la Movilidad em la ciudad: Propuestas para recuperar um derecho ciudadano, Editorial Reverté, 2009. Prefeitura da Cidade de São Paulo: Departamento de Estatística e Produção de Informação – DIPRO, Caminhos do Elevado: Memória e Projetos, 2008. Revista Veja. A solução é derrubar - A prefeitura de São Paulo vai demolir a parte mais degradada do centro da cidade e oferecer os terrenos à iniciativa privada, 2010. SODRÉ, João; BUHLER, Maíra; PASTORELO, Paulo. Elevado 3.5, 2007. 69 14. ANEXO A – DEPOIMENTO DE MORADORES VIZINHOS AO ELEVADO “Acostumada ao canto dos pássaros quando morava em Interlagos, Edilen Oliveira, 31 anos, teve de se adaptar à nova realidade, com sua janela do primeiro andar a cerca de 4 m do elevado. Tão perto que ela prefere manter janelas e cortinas fechadas, tanto pelo barulho quanto pela privacidade. “Só tem uma árvore aqui. Estamos no meio do concreto”, reclama. Seu apartamento chamou a atenção da banda CPM22, que filmou o clipe Nossa Música, usando-o como cenário. Também foi usado em minissérie da Rede Globo e Edilen já foi entrevistada para programa televisivo e vídeo- documentário sobre a região. Seu marido um dia estava tomando sua cerveja tranquilamente na varanda, quando viu uma menina se jogar de um prédio em frente. Desde então, fica um pouco preocupado em repetir seu ritual. Outros casos de suicídio e violência na vizinhança do elevado torna o casal cada vez mais isolado. “Antes se vendiam os apartamentos pelo barulho, agora é pela insegurança.” (...) Não me incomoda o barulho”, sugere Evandro Ferreira Costa, 56 anos, dono de uma mecânica na São João. “Tem coisa pior do que carro passando aí em cima.” Ele mora no prédio ao lado desde 1978 e costumava fechar a oficina à uma da manhã. Mas já foi cinco vezes assaltado e agora funciona das 6h40 às 19 horas. Nos dias de jogo de futebol, a violência cresce e ele chega a deixar as portas fechadas por todo o dia. Conta que muitos carros já caíram do elevado na curva em frente de sua mecânica, até que subiram o muro de proteção.” – Texto de Claudio Belli – Revista Brasileiros – 21 de fevereiro de 2011. 70 15. ANEXO B – CLUBE DAS MÃES “O Clube de Mães foi criado por Maria Eulina, uma ex- moradora de rua, para resgatar a dignidade das pessoas que vivem numa situação que ela bem conhece. Fundado em 1996, em São Paulo, essa ong começou abrigando moradores de rua, hoje tem mais de 70 moradores. Além de servir 280 refeições por dia em almoços e jantares, para seus moradores e passantes, mantém o projeto Família Trabalhando, com diversos núcleos profissionalizantes. Uma parceria com o Senai possibilita algumas vagas em seus cursos, além do próprio Clube de Mães já contar com uma escola de informática e idiomas. O principal objetivo dessa ong é tirar as pessoas da rua e promover sua cidadania e sua capacidade produtiva.” –Site Ajude Fácil