UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” – (UNESP) FACULDADE DE ENGENHARIA CAMPUS DE ILHA SOLTEIRA – (FEIS) PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DOS MATERIAIS – (PPGCM) DEPARTAMENTO DE FÍSICA E QUÍMICA (DFQ) Ricardo Hidalgo Santim Síntese e caracterização de blendas borracha natural/polianilina e borracha natural/polipirrol obtidas por polimerização in situ Ilha Solteira – SP 2015 RICARDO HIDALGO SANTIM Síntese e caracterização de blendas borracha natural/polianilina e borracha natural/polipirrol obtidas por polimerização in situ Tese apresentada à Faculdade de Engenharia – UNESP – Campus de Ilha Solteira, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ciência dos Materiais. Área de conhecimento: Física da Matéria Condensada. Orientador: Professor Dr. José Antônio Malmonge Ilha Solteira – SP 2015 À memória de Adelino Santim, meu avo, que não teve a oportunidade de estudar, mas nos deixou um grande legado, que a escola da vida lhe ensinou: “estude para ir além... o seu sucesso será do tamanho do seu esforço... o conhecimento é algo que ninguém pode tirar de você. ” Agradecimentos Primeiramente agradeço a Deus pela minha vida, oportunidade, fé, força, calma e todas as graças e bênçãos a mim concedidas. A minha amada esposa Máira P. A. Santim, minha companheira, que sempre me incentivou, foi compreensiva em minhas ausências em casa e sempre esteve em oração por mim. Pelos meus pais Sebastião Santim e Neusa H. B. Santim, minha irmã Jaqueline B. Santim, meu irmão Adalberto J. Santim e sua esposa Franciele G. Santim que me apoiaram sempre. Agradeço ao apoio e orações do meu sogro Francisco A. Alves, minha sogra Marilena Ap. Peres Alves, meus cunhados(as) Rafael P. Alves, Aline Oliveira e Gisele P. Alves. Ao professor José Antonio Malmonge que me concedeu essa oportunidade e acreditou no meu trabalho. Aos professores: Luiz F. Malmonge, Walter Sakamoto, Darcy H. Kanda, Haroldo N. Nagashima, Hermes A. de Aquino, Edinilton M. Cavalcante, Márcia R. de Moura Aouada, Fauze A. Aouada e Rafael Zadorosny. Aos amigos do GPol: Alex O. Sanches, Lincon Zadorosny, Gabriel Dias, Tiago Gimenes, Michael Jones da Silva, Cícero R. Cena, Leila, Willian Bastos que proporcionaram momentos agradáveis de discussões e amadurecimento científico. Aos técnicos: Élton, Gilberto, Mário, Levi e Erlon. Aos secretários: Thiago e Solange. Aos amigos do Grupo de Partilha de Profissionais (GPP) de Ilha Solteira, especialmente a Dona Pierina, Diego, Daniel, Michael Jones, Leandro Costa e Família e Renan e Família. Aos amigos do Grupo de Profissionais do Reino (GPR) de Montes Claros, especialmente, Jeanete, Leda, Willian, Denise, Ana Clara, Thiago, Mady, Felipe, Thaisa, Léo, Vanessa, Rachel, Gustavo, Douglas, Mariana, Douglinhas, Tatyana, Jhonny, Renata e Família. Aos amigos do GOU Ângelus da Unesp e do GOU da UFMG. As agências de financiamento CAPES, CNPQ e FAPEMIG que tornaram essa pesquisa possível. Ao Instituto de Ciências Agrárias da UFMG que me concedeu o afastamento para concluir essa tese. Em fim, a todos que direta e indiretamente contribuíram para o desenvolvimento desse trabalho. “Eu me vejo naquilo que faço, não naquilo que penso.” (Qual é a tua obra? – Mário Sergio Cortella) RESUMO Os polímeros geralmente são muito conhecidos por serem materiais leves, flexíveis e de fácil processamento. Cada vez mais a área tecnológica tem a demanda dessas propriedades associadas a condutividade elétrica ajustável. Nessa perspectiva, há trabalhos que se empenham em associar Polímeros Condutores Intrínsecos (PCI) com matrizes de boa propriedade mecânica. Entre os PCI, o polipirrol (PPy) e a polianilina (PAni) têm se destacado devido à fácil síntese, alta estabilidade ambiental, alta condutividade (102 S/cm) e baixo custo dos monômeros. Uma das limitações nas aplicações tecnológica desses polímeros condutores está na sua pobre propriedade mecânica e baixa solubilidade. Uma das alternativas para contornar esses problemas é fazer a polimerizão in situ dos polímeros condutores na presença de um polímero com boas propriedades mecânicas. Dessa forma, o objetivo desse trabalho foi preparar blendas de borracha natural (BN) com PAni e BN com PPy através da polimerização in situ da anilina e do pirrol, respectivamente, no látex de seringueira, natural e prevulcanizado. Foram estudadas as propriedades morfológicas, estruturais, elétricas, mecânicas e térmicas dessas amostras. As análises dos espectros de infravermelho e UV-Vis- NIR evidenciaram a síntese, em meio látex, da polianilina no estado sal de esmeraldina (dopada) e do polipirrol no estado dopado. As blendas apresentaram condutividade elétrica na faixa de 10-14 a 10-2 S/cm que variou em função da razão borracha/monômero. Na maioria dos casos, obteve-se maior condutividade elétrica quando utilizou-se o látex prevulcanizado. A tensão na ruptura aumentou com a diminuição da razão de BN/monômero para as blendas obtidas a partir de látex natural e também de látex prevulcanizado. Para a mesma condição de síntese, a tensão de ruptura foi superior para as blendas obtidas a partir do látex prevulcanizado. Nas imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV), ficou evidente em alguns casos, a ocorrência de encapsulamento das partículas de borracha natural prevulcanizada com a PAni e com o PPy. Palavras-Chave: Polímeros Condutores Intrínsecos. Polianilina. Polipirrol. Borracha Natural. Látex prevulcanizado. Blendas. Polimerização in situ. ABSTRACT The polymers are generally known to be very lightweight materials, flexible and easy processing. Each year, more and more the technology area has the demand for these properties associated with adjustable electrical conductivity. From this perspective, there are studies that seek to associate intrinsically conducting polymers (ICP) with polymer matrices that has good mechanical property. Among those ICP, polypyrrole (PPy) and polyaniline (PAni) has received much attention due to easy of synthesis, high environmental stability, high conductivity (102 S/cm) and low cost of monomers. However, they have poor mechanical property and low solubility. An alternative to overcome these problems is to make in situ polymerization of the conductive polymer in the presence of another polymer that possesses good mechanical properties. In this way, the aim of this study was to obtain natural rubber (NR) composites with PAni and NR with PPY by in situ polymerization of aniline and pyrrole, respectively, in the natural and prevulcanized natural rubber latex. Morphological, structural, electrical, mechanical and thermal properties these samples were studied. Analysis of infrared and UV-Vis-NIR spectra showed the polyaniline and polypyrrole are in doped state. The electrical conductivity of the composites showed to be dependent on the ratio rubber/ monomer, staying in the range of 10-14 to 10-2 S/cm. In most cases, higher conductivity occurred when prevulcanized latex was used. The strain at break of the composites increases with decreasing rubber/monomer ratio. For the same synthesis conditions the strain at break was higher to the composites obtained from prevulcanized latex. In some polymerization condition it was evident the occurrence of encapsulation of prevulcanized rubber particles with the conducting polymers mainly to low rubber/monomer ratio. Keywords: Intrinsically Conducting Polymers. Polyaniline. Polypyrrole. Natural rubber. Prevulcanized latex. Composite. Polymerization in situ. Lista de Figuras Figura 1: Esquema de partículas de borracha, (A) modelo mais conhecido e (B) modelo proposto considerando a ligação entre os grupos terminais com as proteínas e fosfolipídios. ................................................................................................................. 19 Figura 2: Estrutura dos fosfolipídios mais encontrados no látex de BN, (A) α-fosfatidilcolina e (B) fosfatidiletanolamina, onde R e R’ são longas cadeias alquilas. ............................... 19 Figura 3: Panorama mundial da produção e consumo de borracha natural. ........................... 21 Figura 4: Relação entre produção, importação e consumo de borracha natural no Brasil nas duas últimas décadas. .................................................................................................... 22 Figura 5: Perspectiva da produção e do consumo de borracha natural no Brasil até 2020. ..... 22 Figura 6: Estrutura química da molécula de borracha natural. ............................................... 23 Figura 7: Esquema do emaranhamento para borracha natural (BN) não-vulcanizada (esquerda) e vulcanizada (direita). .................................................................................................. 24 Figura 8: Mecanismo proposto de prevulcanização de látex. ................................................ 26 Figura 9: Possíveis aplicações de polímeros condutores. ...................................................... 28 Figura 10: Configuração da ligação dupla carbono-carbono. ................................................ 29 Figura 11: Esquema da formação das ligações π e σ, através de dois átomos de carbono com hibridização sp2. ............................................................................................................ 29 Figura 12: Diagrama de orbitais moleculares ligantes e antiligantes de uma ligação dupla entre carbonos. ...................................................................................................................... 30 Figura 13: Formação de bandas de energia em PCI a partir da combinação dos orbitais moleculares (OM) π e σ, devido às interações intramoleculares das cadeias poliméricas. ..................................................................................................................................... 31 Figura 14: Esquema para exemplificar a formação de um pólaron na estrutura polimérica: (A) oxidação; (B) defeito carregado; (C) pólaron e (D) mobilidade do pólaron. ................... 32 Figura 15: Estrutura de bandas da cadeia de um polímero condutor elétrico: (a) estado pólaron, (b) estado bipólaron e (c) banda bipolarônica. ................................................. 33 Figura 16: Fórmula geral da estrutura básica da PAni. .......................................................... 34 Figura 17: Os três estados de oxidação da PAni: (a) base leucoesmeraldina (LEB), (b) base pernigranilina (PEB) e (c) base esmeraldina (EB). ........................................................ 34 Figura 18: Fórmula química do DBSA. ................................................................................ 35 Figura 19: Formação da PAni no estado dopado com ácido dodecil benzeno sulfônico (DBSA): (a) base esmeraldina (EB), (b) PAni dopada com DBSA e (c) camadas organizadas de PAni dopada com DBSA. B = Anéis Benzenóides e Q = Anéis Quinóides. ..................................................................................................................................... 35 Figura 20: Espectro de UV-Vis da polianilina na forma base esmeraldina (EB) e sal esmeraldina (ES). .......................................................................................................... 36 Figura 21: Aumento de publicações que envolvam a PAni nas pesquisas desenvolvidas nos últimos 5 anos. .............................................................................................................. 37 Figura 22: Estrutura heterogênea da PAni: cristalina (ordenada) amorfa (desordenada). ....... 39 Figura 23: Espectroscopia de UV-Vis de amostras de PAni dopada. ..................................... 40 Figura 24: Escala de condutividade elétrica de materiais que vão de isolantes a supercondutores. ........................................................................................................... 42 Figura 25: Aumento de publicações que envolvam o PPy nas pesquisas desenvolvidas nos últimos 5 anos. .............................................................................................................. 42 Figura 26: Estrutura aromática do polipirrol. ........................................................................ 43 Figura 27: Estruturas para o polipirrol: (a) polímero neutro na forma aromática; (b) pólarons e (c) bipólarons nas formas quinóides. ............................................................................. 43 Figura 28: Estrutura química do dodecil sulfato de sódio (SDS). .......................................... 46 Figura 29: Polimerização do PPy pelo processo químico em microemulsão com micelas esféricas. ....................................................................................................................... 46 Figura 30: Clones RRIM 600 da plantação de seringueira (Hevea brasiliensis) da Fazenda experimental da Unesp (esquerda) e coleta do látex da seringueira (direita). .................. 51 Figura 31: (A) Aparato experimental para prevulcanização do látex: sistema convencional (70 oC – 2 h) e (B) sistema de agitação mecânica do látex antes e após prevulcanização. ..... 54 Figura 32: Aparato experimental para destilação de anilina e pirrol. ..................................... 55 Figura 33: Etapas da síntese química da PAni. ..................................................................... 55 Figura 34: Etapas da síntese química do PPy em microemulsão. .......................................... 57 Figura 35: Mudança de coloração da solução imediatamente após adicionar o oxidante APS na blenda BNPVAn8. .................................................................................................... 58 Figura 36: Etapas da síntese das blendas (A) BNAn e BNPVAn e (B) BNPy e BNPVPy ..... 59 Figura 37: (A) Processo de agitação na síntese das blendas e (B) blenda obtida após a secagem. ....................................................................................................................... 60 Figura 38: Mudança de coloração da solução imediatamente após adicionar o oxidante APS na blenda BNPy8. ......................................................................................................... 61 Figura 39: Pastilha de PPy feita na prensa para medidas de condutividade elétrica. .............. 62 Figura 40: Prensa hidráulica MA 098 da MARCONI utilizada para fazer as pastilhas de PAni e PPy e filmes das blendas. ........................................................................................... 62 Figura 41: Blenda BNPVPy12 antes (esquerda) e depois (direita) da prensagem. ................. 63 Figura 42: Circuito com um resistor R composto por um fio de comprimento L e área de seção transversal de área A. .......................................................................................... 67 Figura 43: Foto de cinco corpos de provas da blenda BNPVPy12 com as respectivas espessuras em milímetros. ............................................................................................. 67 Figura 44: Imagens de MEV dos polímeros condutores (A) PAni e (B) PPy (C) Imagem ampliada do PPy. .......................................................................................................... 69 Figura 45: Imagens de MEV das fraturas dos filmes (A) BN e (B) BNPV e das blendas (C) BNAn4, (D) BNPVAn4, (E) BNAn8, (F) BNPVAn8, (G) BNAn12 (H) BNPVAn12. ... 71 Figura 46: Imagens de MEV da fratura das blendas (A) BNPy4, (B) BNPVPy4, (C) BNPy8, (D) BNPVPy8 (E) BNPy12 e (F) BNPVPy12. .............................................................. 72 Figura 47: Espectros de FTIR dos filmes de BN e BNPV. .................................................... 74 Figura 48: Espectros de FTIR das blendas de BNAn, da PAni e do filme de BN. ................. 75 Figura 49: Espectros de FTIR das blendas de BNPVAn, da PAni e do filme de BNPV......... 76 Figura 50: Espectros de FTIR das blendas de BNPy, da PPy e do filme de BN. .................... 78 Figura 51: Espectros de FTIR das blendas de BNPVPy, da PPy e do filme de BNPV. .......... 79 Figura 52: Espectro no UV-Vis-NIR (A) da PAni; e das blendas (B) BNAn4; (C) BNPVAn4 e (D) BNPVAn8 .............................................................................................................. 81 Figura 53: Espectro no UV-Vis-NIR (A) do polipirrol e (B) da blenda BNPy4. .................... 82 Figura 54: Condutividade elétrica das blendas de borracha natural e prevulcanizada com polianilina, (BNAn e BNPVAn). ................................................................................... 84 Figura 55: Condutividade elétrica das blendas de borracha natural e prevulcanizada com polipirrol (BNPy e BNPVPy). ....................................................................................... 85 Figura 56: Comparação da condutividade elétrica das blendas: BNAn, BNPy, BNPVAn e BNPVPy. ...................................................................................................................... 86 Figura 57: Curvas representativas de tensão-deformação dos filmes de BN e BNPV. ........... 88 Figura 58: Comportamento da Tensão (MPa) e da Deformação (%) no momento da ruptura em função da razão das blendas (A) BNAn e (B) BNPVAn. ......................................... 89 Figura 59: Comportamento da Tensão (MPa) e da Deformação (%) no momento da ruptura em função da razão das blendas (A) BNPy e (B) BNPVPy. ........................................... 90 Figura 60: Comportamento do Módulo elástico a 100% de deformação em função da Razão borracha/monômero. ..................................................................................................... 91 Figura 61: Termograma de DSC das blendas: (A) BNAn e BNPVAn; (B) BNPy e BNPVPy. ..................................................................................................................................... 92 Figura 62: Curvas de TG das blendas (A) BNAn e (C) BNPVAn. Curvas de DTG das blendas (B) BNAn e (D) BNPVAn. ........................................................................................... 94 Figura 63: Curvas de TG das blendas (A) BNPy e (C) BNPVPy. Curvas de DTG das blendas (B) BNPy e (D) BNPVPy.............................................................................................. 96 Figura 64: Comportamento do resíduo a 550 oC em função da razão das blendas. ................ 97 Lista de Tabelas Tabela 1: Composição média do Látex recém-coletado. ....................................................... 20 Tabela 2: A estrutura, condutividade, estabilidade e processabilidade de alguns PCI dopados. ..................................................................................................................................... 27 Tabela 3: Propriedades das amostras de PAni dopadas com diferentes dopantes. .................. 40 Tabela 4: Dispersão de Enxofre a 50%. Tempo no moinho de bolas: 72 horas. ..................... 52 Tabela 5: Dispersão de ZnO a 50%. Tempo no moinho de bolas: 24 horas. .......................... 52 Tabela 6: Dispersão de ZDEC a 50%. Tempo no moinho de bolas: 48 horas. ....................... 53 Tabela 7: Formulação utilizada para prevulcanizar o látex proveniente de seringueira. ......... 53 Tabela 8: Blendas obtidas e suas respectivas razões (m/m) borracha natural e monômeros. .. 61 Tabela 9: Porcentagem dos sólidos totais do látex antes e depois da prevulcanização. .......... 61 Tabela 10: Principais bandas de absorção de FTIR da PAni, da BN e das blendas BNAn. .... 75 Tabela 11: Principais bandas de absorção de FTIR da PAni, da BNPV e das blendas BNPVAn. ..................................................................................................................... 77 Tabela 12: Principais bandas de absorção de FTIR da BN, do PPy e das blendas BNPy. ...... 78 Tabela 13: Principais bandas de absorção de FTIR da BNPV, do PPy e das blendas BNPVPy. ..................................................................................................................................... 80 Tabela 14: Resumo da condutividade elétrica das blendas obtidas. ....................................... 83 Tabela 15: Valores da tensão de ruptura (σr), deformação de ruptura (εr) e o módulo de força a 100% de deformação obtido dos ensaios de tensão-deformação. ................................... 87 Tabela 16: Valor da temperatura de transição vítrea (Tg) das blendas. .................................. 92 Tabela 17: Resumo dos processos de decomposição dos filmes e das blendas BNAn e BNPVAn. ..................................................................................................................... 94 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS An Anilina APS Persulfato de Amônia BN Borracha Natural BNAn Blenda de borracha natural com polianilina a partir da razão BN/An BNPV Borracha natural Prevulcanizada BNPVAn Blenda de borracha natural prevulcanizada com polianilina a partir da razão BNPV/An BNPVPy Blenda de borracha natural prevulcanizada com polipirrol a partir da razão BNPV/Py BNPy Blenda de borracha natural com polipirrol a partir da razão BN/Py CV Sistema convencional de vulcanização DBSA Ácido dodecil benzeno sulfônico DRC Dry rubber content (conteúdo de borracha seca) HCl Ácido clorídrico LA Ácido láurico LN Látex Natural LPV Látex Prevulcanizado ME Microemulsão PAni Polianilina PCI Polímeros Condutores Intrínsecos PPy Polipirrol PTSA Ácido p-tolueno sulfônico Py Pirrol SDS Dodecil sulfato de sódio ZDEC dietilditiocarbamato de zinco ZnO óxido de zinco SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO........................................................................................................... 16 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ................................................................................... 18 2.1 O LÁTEX ................................................................................................................... 18 2.2 BORRACHA NATURAL E SUA PRODUÇÃO ......................................................... 21 2.3 PREVULCANIZAÇÃO DO LÁTEX .......................................................................... 24 2.4 POLÍMEROS CONDUTORES INTRÍNSECOS (PCI) E SUAS PERSPECTIVAS ...... 27 2.5 ESTRUTURA DOS PCI E O MODELO DE BANDAS ............................................... 29 2.6 PÓLARONS E BIPÓLARONS ................................................................................... 32 2.7 A POLIANILIA (PANI) .............................................................................................. 34 2.8 FATORES QUE INFLUENCIAM A CONDUTIVIDADE ELÉTRICA DA PANI ...... 38 2.9 O POLIPIRROL (PPY) ............................................................................................... 41 2.10 FATORES QUE INFLUENCIAM A CONDUTIVIDADE ELÉTRICA DO PPY ...... 45 2.11 BLENDAS POLIMÉRICAS E SUA IMPORTÂNCIA .............................................. 48 3. OBJETIVO GERAL ................................................................................................... 50 3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................................... 50 4. MATERIAL E MÉTODO .......................................................................................... 51 4.1 MATERIAIS E REAGENTES UTILIZADOS ............................................................ 51 4.2 LÁTEX DE BORRACHA NATURAL ....................................................................... 51 4.3 DETERMINAÇÃO DO CONTEÚDO DE BORRACHA SECA NO LÁTEX (DRC) ... 52 4.4 PREVULCANIZAÇÃO .............................................................................................. 52 4.5 DESTILAÇÃO DOS MONÔMEROS ANILINA E PIRROL....................................... 54 4.6 SÍNTESE DA POLIANILINA .................................................................................... 55 4.7 SÍNTESE DO POLIPIRROL....................................................................................... 56 4.8 OBTENÇÃO DAS BLENDAS ................................................................................... 57 4.9 OBTENÇÃO DAS AMOSTRAS NA FORMA DE FILME ......................................... 62 4.10 CARACTERIZAÇÃO DAS AMOSTRAS ................................................................ 64 4.10.1 Microscopia eletrônica de varredura (MEV) ....................................................................64 4.10.2 Espectroscopia de infravermelho (FTIR-ATR Fourier Transform Infrared - Attenuated Total Reflectance) .....................................................................................................................64 4.10.3 Espectroscopia no ultravioleta na região do visível e infravermelho próximo (UV-vis-NIR) .................................................................................................................................................65 4.10.4 Condutividade Elétrica pelo método de duas pontas ........................................................66 4.10.5 Ensaios de Tração ...........................................................................................................67 4.10.6 Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) ..................................................................68 4.10.7 Medidas Termogravimétricas ..........................................................................................68 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................. 69 5.1 ESTUDO DA MORFOLOGIA ................................................................................... 69 5.2 ANÁLISE ESTRUTURAL ......................................................................................... 74 5.3 ESTUDO DA CONDUTIVIDADE ELÉTRICA .......................................................... 83 5.4 ENSAIOS DE TRAÇÃO............................................................................................. 87 5.5 ESTUDO DO COMPORTAMENTO TÉRMICO ........................................................ 92 6. CONCLUSÕES ........................................................................................................... 98 7. REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 100 Introdução 16 Ricardo Hidalgo Santim 1. INTRODUÇÃO A importância do estudo e desenvolvimento de materiais foi fortemente motivada pelas necessidades sentidas pelo homem no seu dia a dia. O homem começou a dominar técnicas para a utilização dos materiais encontrados na natureza como borrachas, cerâmicas e metais e assim, evoluiu no sentido de produzir materiais sintéticos, como por exemplo, os polímeros. Constituídos por unidades químicas repetitivas chamadas meros, os polímeros são muito conhecidos por suas características físicas e estruturais: leves, flexíveis e isolantes. 1, 2 Um avanço importante nessa área foi o desenvolvimento de blendas e compósitos poliméricos. No que se refere a condutividade elétrica, foram desenvolvidos os compósitos condutores extrínsecos, dado pela adição de carga condutora a matrizes isolantes. 3, 4 O desenvolvimento de polímeros condutores intrínsecos teve início na década de 70, quando o poliacetileno submetido a vapores de iodos apresentou uma condutividade elétrica da ordem de até 105 S/cm. Os estudos desse polímero renderam o prêmio Nobel de Química no ano de 2000 para os pesquisadores Alan G. MacDiarmid, Alan J. Heeger e Hideki Shirakawa. Essa descoberta foi um avanço importante para se obter e entender os vários polímeros condutores atuais. 3, 5 Nos últimos anos, o desenvolvimento de polímeros condutores tem sido muito promissor no ramo tecnológico, inclusive na proteção de equipamentos eletrônicos a interferência eletromagnética, principalmente na região de microondas, sensores etc. 6, 7, 8 Dentre os polímeros condutores intrínsecos, a polianilina (PAni) e o polipirrol (PPy) se destacam, principalmente pela alta estabilidade química, baixo custo dos monômeros e por apresentarem valores de condutividade elétrica variável, de 10-10 a 103 S/cm, que pode ser controlada pela rota de síntese e/ou dopagem. 9 O PPy, por exemplo, faz parte dos avançados instrumentais utilizados na engenharia biomédica como sensores em exames de glicose, colesterol, L-lactato, uréia e hibridização de DNA. 10 Uma das limitações nas aplicações tecnológicas dos polímeros condutores está na sua pobre propriedade mecânica e baixa solubilidade. Uma maneira de contornar esses problemas é através da mistura desses polímeros com outros que apresentem boas propriedades mecânicas, obtendo assim as conhecidas blendas condutoras. Existem alguns métodos de se obter blendas, tais como, eletroquímico, por solução (casting), polimerização do monômero dentro da matriz polimérica (polimerização in situ) entre outros. Por casting resulta em filmes finos tendo em vista a baixa solubilidade desses polímeros. A polimerização in situ é um método bastante Introdução 17 Ricardo Hidalgo Santim eficiente que contorna o problema de baixa solubilidade e também permite obter-se uma grande quantidade de material, que depois pode ser processado. Dentre os polímeros que possuem boa propriedade mecânica e estabilidade química, encontra-se a borracha natural (BN) extraída da seringueira (Hevea brasiliensis). Composta pela estrutura poli(cis-1,4-isopreno), a BN é um elastômero que se destaca por apresentar boa flexibilidade, elasticidade, resistência à corrosão e à abrasão, impermeabilidade e por ser um produto natural. Todas essas características permitem várias aplicações que se fazem indispensáveis no cotidiano como luvas, material cirúrgico, preservativos, pneus, adesivos, pisos, revestimentos e impermeabilização de tecidos e materiais elétricos etc. 11, 12 Quando a aplicação tecnológica demanda boas propriedades mecânicas e ao mesmo tempo moldes complexos, a prevulcanização do látex é uma alternativa. Esse método promove a reticulação das partículas de borracha e ao mesmo tempo, mantém a dispersão do látex em solução, podendo assim obter peças complexas e resistentes. Assim, uma solução possível na perspectiva de desenvolver materiais poliméricos condutores flexíveis, é associar as vantagens da borracha natural com as propriedades elétricas da polianilina 13 ou do polipirrol 14, a fim de favorecer o avanço tecnológico principalmente na área de sensores, dissipadores eletrostáticos entre outros. 15, 16, 17 Diante dessa perspectiva, nesse trabalho obteve-se blendas de borracha natural com polianilina e borracha natural com polipirrol, por meio da polimerização in situ da anilina ou do pirrol em solução de látex antes e depois da prevulcanização. Utilizar a borracha natural como matriz foi motivada por ser elastomérica e apresentar boas propriedades mecânicas, e por ser um produto natural de origem renovável. As blendas obtidas foram caracterizadas segundo as propriedades morfológicas, estruturais, elétricas, mecânicas e térmicas. Revisão bibliográfica 18 Ricardo Hidalgo Santim 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 O LÁTEX Existem mais de 2500 espécies de plantas que produzem látex. Dentre essas, a Hevea brasiliensis, também conhecida como seringueira, destaca-se por ser a principal fonte comercial devido à excelente qualidade, à alta produtividade e à quantidade de borracha natural, que a torna responsável por quase toda produção mundial. 18 O látex provém de minúsculos vasos no córtex interno da casca da árvore, logo abaixo do córtex externo. A coleta do látex é feita por um processo chamado sangria (tapping). Neste processo, uma faca específica é usada para arrancar fatias da superfície da casca a uma profundidade de cerca de 1,0 mm do câmbio vascular da planta, camada depois do Floema. No caso da Hevea, o látex é uma solução coloidal polidispersa, na qual partículas negativamente carregadas de vários tamanhos estão dispersas em um meio aquoso. A borracha se encontra nas partículas de borracha citoplasmáticas. Após a coleta, o látex pode coagular espontaneamente ou com o auxílio de coagulantes como soluções ácidas. Porém, para armazenar o látex em solução deve- se adicionar solução básica para elevar o pH e assim evitar a coagulação. 19 O modelo mais conhecido dessas partículas de borracha está ilustrado na Figura 1 (A), dado por uma camada interna de fosfolipídios e outra externa de proteínas, que determina a carga elétrica negativa da partícula. Seu diâmetro varia de 5 a 3000 nm, sendo que para maioria delas se encontram na faixa de 1000 nm. 18, 20, 21 No látex são encontrados cerca de 3- 5% m/v de substâncias “não borracha” tais como: aminoácidos, sais inorgânicos, ácidos nucléicos, lipídeos, proteínas, carboidratos, ácidos graxos etc. A maioria destas substâncias é extraída por centrifugação a alta velocidade, permanecendo somente as proteínas e os lipídeos quimicamente ligados ao polímero. 22, 23 Na Figura 1 (B) é proposto um novo modelo que considera os grupos terminais α e ω ligados com os fosfolipídios e proteínas, respectivamente. 21 Os grupos α são constituídos por unidades mono ou difosfato, ligados a fosfolipídios que são principalmente os α-fosfatidilcolina e fosfatidiletanolamina, em destaque na Figura 2 (A) e (B) respectivamente, que atuam como protetor na estabilização do terminal fosfato. 21 O grupo ω é constituído de um dimetilalil modificado e ligado a grupos funcionais que interagem com as proteínas formando ligações cruzadas resultantes de ligações de hidrogênio. 24, 25 As partículas de borracha também estão associadas com outros grupos químicos como Revisão bibliográfica 19 Ricardo Hidalgo Santim triglicerídeos, esteróis e outros lipídios integradas aos fosfolipídios, α-fosfatidilcolina e fosfatidiletanolamina. 25 A molécula de borracha natural é composta por um terminal-ɷ, duas unidades trans-1,4-isopreno, cerca de 1000 a 3000 unidades cis-1,4-isopreno e a cadeia termina com um terminal-α. 26, 27, 28 Figura 1: Esquema de partículas de borracha, (A) modelo mais conhecido e (B) modelo proposto considerando a ligação entre os grupos terminais com as proteínas e fosfolipídios. Fonte: Adaptado de NAWAMAWAT (2011). 21 Figura 2: Estrutura dos fosfolipídios mais encontrados no látex de BN, (A) α-fosfatidilcolina e (B) fosfatidiletanolamina, onde R e R’ são longas cadeias alquilas. Fonte: NAWAMAWAT (2011). 21 No caso do látex de seringueira, o teor de borracha seca geralmente se encontra em torno de 25 a 45%, o que depende de diversos fatores como: clone, estação do ano, solo etc. Revisão bibliográfica 20 Ricardo Hidalgo Santim 12, 29 O maior constituinte do látex é a água, variando entre 49 a 71% m/v, como resume a Tabela 1. Os demais são substâncias solúveis chamadas de não-borracha que são os aminoácidos, sais inorgânicos, ácidos nucléicos, carboidratos, ácidos graxos etc. Tabela 1: Composição média do Látex recém-coletado. Constituinte Proporção/%em massa no látex Borracha 25-45 Proteína 1-1,8 Carboidratos 1-2 Lipídios neutros 0,4-1,1 Lipídios polares 0,5-0,6 Inorgânicos 0,4-0,6 Aminoácidos, aminas etc. 0,4 Água 49-71 Fonte: RIPPEL (2005). 12 Revisão bibliográfica 21 Ricardo Hidalgo Santim 2.2 BORRACHA NATURAL E SUA PRODUÇÃO A Borracha Natural (BN) é um produto de interesse mundial e seu consumo está crescendo ano após ano e para tanto, os países como Tailândia, Malásia, Indonésia, Índia e China suprem grande parte dessa demanda, como indicado na Figura 3. Esses dados são referentes a principal fonte de BN, o látex da seringueira (Hevea brasiliensis), responsável por 99% da produção mundial. 30 Pode-se verificar também, por esses dados que o Brasil apresenta um déficit na produção de borracha natural, de onde entende-se que, atualmente tem necessidade de importar boa parte do que é consumido, apesar do aumento do cultivo de seringueira Hevea brasiliensis nos últimos anos ter permitido uma redução na importação de BN desde o ano de 2011, como é possível observar na Figura 4. Figura 3: Panorama mundial da produção e consumo de borracha natural. Fonte: Instituto Agronômico de Campinas (2014). 30 Revisão bibliográfica 22 Ricardo Hidalgo Santim Figura 4: Relação entre produção, importação e consumo de borracha natural no Brasil nas duas últimas décadas. Fonte: Instituto Agronômico de Campinas (2014). 30 Ainda assim, de acordo com o gráfico da Figura 5, a perspectiva é que após 2015, haverá outro aumento do consumo no Brasil de BN em função de novas tecnologias desenvolvidas a partir da borracha e que a produção não irá acompanhar. Figura 5: Perspectiva da produção e do consumo de borracha natural no Brasil até 2020. Fonte: Instituto Agronômico de Campinas (2014). 30 Revisão bibliográfica 23 Ricardo Hidalgo Santim A BN extraída do látex da seringueira (Hevea brasiliensis) é um polímero linear, composto essencialmente de poli(cis-1,4-isopreno), com configuração do tipo cabeça-cauda de alta massa molecular é um hidrocarboneto insaturado de fórmula (C5H8)n, com n de até 3000, Figura 6. 31 Figura 6: Estrutura química da molécula de borracha natural. Fonte: TANAKA (1991). 31 A elevada massa molecular e temperatura de transição vítrea (Tg) em torno de -64 oC confere alta flexibilidade às cadeias na temperatura ambiente (25 oC). Quanto a condutividade, ela é considerada um bom isolante elétrico, com valores em torno de 10-15 S/cm 13. Por ser um produto natural, favorece a biocompatibilidade com animais e seres humanos. A alta aderência com metais e outros materiais favorece a interação para revestimentos de superfícies como, por exemplo, pisos, adesivos e proteção anti-impacto. 20 A resistência a tração e altas deformações podem ser conseguidas ao trabalhar com a vulcanização das cadeias. 32, 33 Por isso, a borracha natural é muito utilizada na indústria pneumática, automobilística, construção civil, medicina etc. Existem estudos da BN como biomaterial em procedimentos médicos, ou seja, a fim de ser colocada em contato ou até mesmo dentro do corpo humano visando a regeneração de pele e em angiogênese (mecanismo de crescimento de novos vasos sanguíneos a partir dos já existentes). 34 Essas e outras aplicações são possíveis devido a propriedades específicas da BN. CH2CH2CH2 CH2 CH2CH2 CH3 CH3CH3 CHCH CHC C C Revisão bibliográfica 24 Ricardo Hidalgo Santim 2.3 PREVULCANIZAÇÃO DO LÁTEX A borracha natural crua é pegajosa à temperatura ambiente e sofre degradação quando submetida a variações climáticas abruptas. Esses fatores exigem tratamentos prévios para viabilizar muitas das aplicações. Nesse sentido, utiliza-se o procedimento de vulcanização e inserção de aditivos. A vulcanização é o processo de formação de ligações químicas cruzadas entre as cadeias poliméricas da borracha, formando uma rede tridimensional de ligações covalentes, intermoleculares e intramoleculares. 11, 35 Na Figura 7 é apresentado um esquema representativo do emaranhamento da borracha natural não vulcanizada (a esquerda) e um outro para a borracha vulcanizada (a direita), em que os pontos escuros representam a reticulação entre as cadeias de borracha após a vulcanização. 24 Figura 7: Esquema do emaranhamento para borracha natural (BN) não-vulcanizada (esquerda) e vulcanizada (direita). Fonte: Adaptado de CARDOSO (2010). 36 Os avanços de pesquisas relacionadas à vulcanização de borracha permitiram chegar a três principais sistemas de vulcanização que essencialmente controlam a natureza das ligações cruzadas com a relação entre as quantidades de enxofre e de acelerador: Sistema Eficiente (EV), Sistema Semi-Eficiente (SEV) e Sistema Convencional (CV). 37, 38 O sistema EV, utiliza alta quantidade de acelerador (2,0 a 6,0 phr) e relativamente baixa quantidade de enxofre (0,3 a 1,0 phr). Esse sistema induz principalmente a formação de ligações mono e dissulfídicas que aumentam a resistência ao envelhecimento térmico e reduz o tempo de vulcanização. No sistema SEV utiliza-se um teor de enxofre entre 1,0 e 2,0 phr e de acelerador entre 1,0 e 2,5phr. Este sistema apresenta maior numero de ligações mono e dissulfídicas do que ligações polissulfídicas, mas diferentemente do sistema EV, as ligações Revisão bibliográfica 25 Ricardo Hidalgo Santim polissulfídicas são mais elevadas. Nesse trabalho foi empregado o sistema CV, pois utiliza menor teor de acelerador (0,5 a 1,0 phr) e maiores teores de enxofre (2,0 a 3,5 phr). 37, 38, 39 A vantagem deste sistema é que ocorre uma melhora principalmente nas propriedades mecânicas, ocasionada pela maior densidade de ligações cruzadas do vulcanizado devido à maior quantidade de enxofre empregada. 40 A prevulcanização é um sistema utilizado industrialmente, que consiste de uma solução de látex, em que as partículas de borracha são quimicamente reticuladas de modo que, após a secagem do látex, um filme vulcanizado é obtido sem mais aquecimento. 41 Este processo é empregado na fabricação de chupetas, luvas, bexigas, preservativos, adesivos, espumas e tecidos. A prevulcanização apresenta algumas vantagens quando se trata de certas particularidades como: as características iniciais do látex permanecerem inalteradas, por exemplo, o estado de dispersão que facilita a produção dos produtos descritos acima; e ainda, o baixo custo de energia devido o processo ocorrer em baixas temperaturas, 20 oC a 90 oC, quando comparado com a vulcanização, entre 140 e 230 oC, que influencia diretamente no grau de reticulação das cadeias de borracha. 39, 42 O processo de formação das ligações cruzadas durante a prevulcanização ocorre dentro das partículas de borracha que estão dispersas na solução de látex. Estudos iniciais sugeriam que a prevulcanização ocorriam devido o contato direto entre os agentes de vulcanização e as partículas de borracha, considerando que os agentes de vulcanização utilizados como o enxofre, o óxido de zinco e o dietilditiocarbamato de zinco (ZDEC) são todos insolúveis em água. No entanto com a evolução dos estudos, observou-se que o enxofre e o ZDEC reagem inicialmente na fase aquosa para formar, assim como no processo da vulcanização, intermediários reativos antes de serem transportadas para as superfícies das partículas de borracha através de difusão, sendo desta maneira, o início da formação das ligações cruzadas. 43 Em 1999, Ho e Khew notaram experimentalmente que a formação de ligações cruzadas é mais rápida do que a taxa de difusão dos reagentes, as ligações cruzadas se formam inicialmente na superfície da partícula da BN e posteriormente no núcleo dela, acarretando diferentes concentrações de ligações na partícula da BN, além da existência de partículas com o núcleo não-vulcanizado rodeado por uma camada com um alto valor de ligações cruzadas. 43 Na Figura 8 ilustra-se esse processo. Vale ressaltar que, as proteínas e os fosfolipídeos, influenciam significativamente no processo de formação de filmes de látex de BN. 21 Dado que, a presença do acelerador ZDEC, durante a prevulcanização, provoca a hidrólise das proteínas e dos fosfolipídeos adsorvidos sobre a superfície das partículas de borracha, produzindo assim, sabões e ácidos graxos Revisão bibliográfica 26 Ricardo Hidalgo Santim superiores. 41 Isso pode influenciar diretamente na interação físico-química desses produtos com surfactantes, eventualmente inseridos em meio látex para uma reação in situ. Figura 8: Mecanismo proposto de prevulcanização de látex. Fonte: Adaptado de HO (1999). 43 Revisão bibliográfica 27 Ricardo Hidalgo Santim 2.4 POLÍMEROS CONDUTORES INTRÍNSECOS (PCI) E SUAS PERSPECTIVAS Os PCI são uma classe de polímeros condutores que está sendo bastante estudada nos últimos anos, devido à boa propriedade de condução elétrica inerente ao material. Tendo como referência o poliacetileno que apresenta alta condutividade, comparável com a do cobre, considera-se os PCI como de alto potencial tecnológico. No entanto, a baixa estabilidade química e as propriedades mecânicas do poliacetileno 10, 44 deixam a desejar, Tabela 2 45. Isso tem direcionado a pesquisa em busca de outros materiais que apresentem melhores propriedades. Tabela 2: A estrutura, condutividade, estabilidade e processabilidade de alguns PCI dopados. Polímero Condutividade (S/cm) Estabilidade Processabilidade Poliacetileno 103 – 106 Pobre Limitada Polianilina 10 – 103 Bom Bom Polipirrol 10 – 102 Bom Bom Politiofeno 10 – 102 Bom Excelente Fonte: Adaptado de FAEZ (2000) e BHADRA (2009). 3. 45 Além do poliacetileno, a polianilina, o polipirrol e o politiofeno são os PCI mais conhecidos. A estrutura molecular e a condutividade desses polímeros estão apresentados na Tabela 2. 3 Esses PCI são muito versáteis quanto a obtenção, de tal forma que, podem ser sintetizados em forma de partículas, fibras, filmes, com porosidade, sozinhos ou com vários outros polímeros para formar blendas e compósitos com diferentes propriedades. 46 Assim, como destacado na Figura 9, essas propriedades dos PCI possibilitam várias aplicações tecnológicas como blindagem a interferência eletromagnética 47, 48, sensores químicos e biológicos, camadas de proteção a corrosão, diagnósticos e tratamentos na biomedicina, microeletrônica, diodo emissor de luz orgânico (OLEDs), entre outras áreas 49, 50, 51. Revisão bibliográfica 28 Ricardo Hidalgo Santim Figura 9: Possíveis aplicações de polímeros condutores. Fonte: Adaptado DE ABREU (2010) 52. Revisão bibliográfica 29 Ricardo Hidalgo Santim 2.5 ESTRUTURA DOS PCI E O MODELO DE BANDAS A conformação alternada das ligações duplas e simples em PCI é a principal responsável por suas propriedades ópticas e elétricas. Essa estrutura caracteriza esses materiais como “polímeros conjugados” 53. Ao longo da cadeia principal de um PCI conjugado, a ligação dupla carbono-carbono apresenta pelo menos uma ligação “sigma” (σ), que forma uma ligação química forte e uma ligação “pi” (π) mais fraca, conforme a Figura 10 54. Para o átomo de carbono isolado, em seu estado fundamental, a configuração eletrônica é 1s2 2s2 2p2, mas em sistemas conjugados a configuração de menor energia é aquela no qual o átomo de carbono apresenta três orbitais híbridos sp2 (com três elétrons por orbital) e um orbital remanescente pz que se localiza perpendicularmente ao plano dos orbitais sp2, como ilustrado na Figura 11. Este fenômeno de hibridização ocorre devido à diferença de energia ser muito pequena entre os orbitais 2s e 2p. Com a sobreposição desses orbitais ocorre a formação de orbitais híbridos com configurações: sp, sp2 e sp3. 55, 56. Figura 10: Configuração da ligação dupla carbono- carbono. Figura 11: Esquema da formação das ligações π e σ, através de dois átomos de carbono com hibridização sp2. Fonte: ROCHA-FILHO (2000). 53 Fonte: DEICHMANN (2010). 4 Ao analisar o diagrama de orbitais ligantes e antiligantes de dois átomos, representados na Figura 12, verifica-se que as ligações π são mais fracas que as σ devido à menor sobreposição dos orbitais atômicos (OA) do tipo p em comparação aos OA do tipo s, durante a formação dos respectivos orbitais moleculares (OM) π e σ. No caso da formação da ligação do tipo π a sobreposição dos orbitais p ocorre lateralmente, enquanto que naquela do tipo σ a sobreposição ocorre no eixo internuclear, embora os orbitais p também possam formar ligação do tipo σ. A diferença de energia entre os OM (ligante (π) e antiligante (π*)) numa ligação π é menor àquela da ligação σ que estão mais espaçadas, e por isso, as transições π → π* precisam de uma energia menor para ocorrerem se comparadas com as Revisão bibliográfica 30 Ricardo Hidalgo Santim transições σ → σ*. Dessa forma, os orbitais mais afastados são conhecidos como HOMO (do inglês highest occupied molecular orbital), para o orbital molecular ocupado de maior energia, e LUMO (do inglês lowest unoccupied molecular orbital), para o orbital molecular desocupado de menor energia. A diferença de energia entre o HOMO e o LUMO é conhecida como gap (intervalo de energia). Em materiais que contém somente ligações do tipo σ (onde o HOMO = σ e LUMO = σ*) o gap será grande, comparando àqueles contendo ligações do tipo π (onde o HOMO = π e LUMO = π*), ou seja, o gap dependerá da disposição das ligações. 4 A configuração mais estável é aquela em que dois elétrons ocupam os orbitais moleculares σ e π. 57 Figura 12: Diagrama de orbitais moleculares ligantes e antiligantes de uma ligação dupla entre carbonos. Fonte: MACHADO (2008). 54 Os polímeros conjugados são muito organizados a nível molecular, o que possibilita estudar o mecanismo de condução em PCI pelo modelo de bandas. As interações intramoleculares, dos átomos de carbono ao longo da cadeia polimérica, formam um sistema com N ligações do tipo π que estão deslocalizadas ao longo dessa cadeia, formando as bandas de energia, conforme mostrado na Figura 13. As bandas formadas pelos orbitais ocupados de maior energia recebem o nome de banda de valência (BV, formada a partir dos orbitais ligantes, ou níveis eletrônicos ocupados de maior energia – HOMOs) e banda de condução (BC, formada a partir dos orbitais antiligantes, ou níveis eletrônicos desocupados de menor energia – LUMOs). Esses níveis são separados por um intervalo de energia proibida (Eg) chamado band gap. A largura dessa faixa proibida determina as propriedades elétricas intrínsecas do material, ou seja, quanto mais espaçada mais isolante é o material e à medida que o espaçamento diminui o material passa a ter condutividade cada vez maior. 3, 52 Revisão bibliográfica 31 Ricardo Hidalgo Santim Figura 13: Formação de bandas de energia em PCI a partir da combinação dos orbitais moleculares (OM) π e σ, devido às interações intramoleculares das cadeias poliméricas. Fonte: Próprio autor. Revisão bibliográfica 32 Ricardo Hidalgo Santim 2.6 PÓLARONS E BIPÓLARONS Somente o modelo de bandas não é suficiente para explicar a condutividade em PCI. É necessário um modelo complementar, baseado na existência de defeitos estruturais, como distorções ocasionadas durante a polimerização, com formação de radicais no estado não dopado. 3 Esses defeitos surgem durante a oxidação da cadeia (remoção de elétrons). Para balancear a carga polimérica, há a inserção de contraíons (dopantes). 3, 46 Esse processo é conhecido como dopagem, que será discutido com detalhes mais adiante no caso da PAni e do PPy. A remoção de um elétron da estrutura polimérica por oxidação, Figura 14 (A e B), ocasiona a formação de um pólaron, Figura 14 (C), definido como um íon radical com carga unitária ±e e spin = 1/2, associado à distorção do retículo e a presença de estados localizados no band gap, Figura 15 (a). Este pode ser interpretado como a redistribuição dos elétrons π, que polariza a cadeia polimérica localmente, produzindo uma modificação de curto alcance na distribuição espacial dos átomos. O pólaron pode se deslocar ao longo da cadeia, permitindo a condutividade elétrica, Figura 14 (D). 51 Ao remover um segundo elétron da cadeia polimérica pode originar um novo estado pólaron ou ainda um estado bipólaron, Figura 15 (b), caso o elétron seja removido de um estado pólaron já existente. O bipólaron é definido como um par de cargas iguais ±2e, dicátions de spin = 0, associadas a uma forte distorção da rede. 3 Figura 14: Esquema para exemplificar a formação de um pólaron na estrutura polimérica: (A) oxidação; (B) defeito carregado; (C) pólaron e (D) mobilidade do pólaron. Fonte: BALINT (2014). 51 A sobreposição de estados bipólarons leva a formação de bandas bipolarônicas no interior do gap, Figura 15 (c). Com isso, há um aumento da largura do band gap no estado dopado em relação ao estado fundamental. No caso de uma alta concentração de dopante, essa Revisão bibliográfica 33 Ricardo Hidalgo Santim estrutura da banda justifica o fato de que, ao aplicar um campo elétrico, os bipólarons (que possuem duas cargas) podem tornar-se móveis, devido à atração coulômbica em resposta ao campo elétrico aplicado. Os bipólarons podem ser entendidos como portadores de cargas spinless (spin = 0), por não apresentarem um momento de dipolo resultante em regime de alta condutividade (Figura 15 (b)). Assim, se as bandas estão totalmente preenchidas ou vazias, o transporte de corrente acontecerá pela mobilidade dos bipólarons e não simplesmente dos elétrons como se está acostumado a atribuir em semicondutores inorgânicos. 58 Figura 15: Estrutura de bandas da cadeia de um polímero condutor elétrico: (a) estado pólaron, (b) estado bipólaron e (c) banda bipolarônica. Fonte: Adaptado de FAEZ (2000) e BREDAS (1995). 3, 58 Dessa forma, quando se trata de PCI os portadores de carga não são apenas elétrons ou buracos localizados no interior de bandas e sim defeitos carregados, os pólarons e bipólarons, localizados no gap devido às distorções da cadeia polimérica. Essa deformação local da cadeia associada a um pólaron ou bipólaron consiste do alongamento das ligações duplas e encurtamento das ligações simples. O alongamento da dupla ligação faz com que a ligação π, que é mais fracamente ligada, fique suscetível a uma perturbação externa (campo elétrico, por exemplo) e encontre outra forma de ressonância para a cadeia polimérica, de tal maneira que a outra ligação σ (simples), mais curta, acomodará a ligação π como π*, esse processo é conhecido como o aparecimento das transições π - π*, ou seja, a excitação de orbitais ligantes π para orbitais antiligantes π*. Quando aumenta a dopagem há um aumento da intensidade das transições π - π*, detectado em espectros ópticos associados a essas energias de transição, algo em torno de 2,7 eV. 7, 59 Revisão bibliográfica 34 Ricardo Hidalgo Santim 2.7 A POLIANILIA (PAni) A polianilina destaca-se dentre os polímeros condutores devido a sua estabilidade química no estado dopado em condições ambientais e também por ser facilmente sintetizada quimicamente. 60 Figura 16: Fórmula geral da estrutura básica da PAni. N H N H N N ( [ ) Y ( ) ] 1 - Y Fonte: KANG (1998). 60 As condições Y e (1-Y) da Figura 16, correspondem à fração das unidades repetidas das espécies reduzidas e oxidadas, respectivamente. O valor de Y pode variar continuamente de 0 a 1. Quando Y assumir o valor 1 tem-se o polímero completamente reduzido, contendo apenas nitrogênio amina (-N-), conhecido como base leucoesmeraldina. No caso do polímero estar completamente oxidado, Y = 0, apresentando apenas nitrogênio imina (-N=), ele é conhecido como base pernigranilina. 60 O estado mais estável e que apresenta maior condutividade elétrica depois de protonado é quando Y é igual a 0,5, que é conhecido como base esmeraldina (EB). Esses estados de oxidação da polianilina estão destacados na Figura 17. A PAni apresenta a cor azul escuro quando está na base esmeraldina. O seu espectro de absorção na região UV-visível apresenta duas bandas de absorção, uma em 320 nm (3,87 eV) atribuída à transição π-π* dos anéis benzenóides e a segunda em torno de 620 nm (2,0 eV) devido à transição do éxciton molecular que está relacionada com a transferência de cargas dos anéis benzenóides para os anéis quinóides. 61 Figura 17: Os três estados de oxidação da PAni: (a) base leucoesmeraldina (LEB), (b) base pernigranilina (PEB) e (c) base esmeraldina (EB). Fonte: BHADRA (2009). 45 Revisão bibliográfica 35 Ricardo Hidalgo Santim A dopagem, da polianilina e seus derivados é um processo reversível que ocorre por meio de protonação, quando na presença de ácidos. A protonação dos nitrogênios imina da base esmeraldina (EB) ocorre na presença de ácidos como: ácido clorídrico (HCl) ou ácido dodecil benzeno sulfônico (DBSA), com fórmula molecular, ilustrado na Figura 18. 13 Figura 18: Fórmula química do DBSA. Fonte: SIGMA-ALDRICH (2015). 62 Na Figura 19 (a) tem-se a PAni no estado EB e com a adição de DBSA na solução ocorre a liberação de íons H+ que quebram as ligações dos nitrogênios imina, resultando na formação de defeitos na cadeia (pólarons), como em (b), que atraem contraíons ^^^^^^B-SO� � (B = anel Benzênico) para essas regiões, esse efeito é conhecido como dopagem da PAni com DBSA. Em (c) o excesso de DBSA leva a formação de camadas organizadas de PAni dopada com DBSA, tal organização localizada é conhecida como regiões cristalinas que apresentam alta condutividade. 63 Figura 19: Formação da PAni no estado dopado com ácido dodecil benzeno sulfônico (DBSA): (a) base esmeraldina (EB), (b) PAni dopada com DBSA e (c) camadas organizadas de PAni dopada com DBSA. B = Anéis Benzenóides e Q = Anéis Quinóides. Fonte: RAY (2009). 63 Revisão bibliográfica 36 Ricardo Hidalgo Santim No caso do ácido HCl ocorre algo semelhante; os íons H+ dispersos na solução quebram as ligações dos nitrogênios imina e os contraíons Cl– são atraídos para os defeitos carregados. O espectro da polianilina dopada apresenta bandas de absorção em 325 nm (3,8 eV) atribuídas à transição π - π* dos anéis benzenóides e em 439 nm (2,9 eV) e em 860 nm (1,5 eV), correspondentes às bandas que são interpretadas como excitação para a banda de pólarons formados pela protonação. 64, 65 A energia necessária para ocorrer às transições π – π* estão intimamente ligadas ao band gap. O deslocamento relativo dessas bandas significa que amostras de PAni, no estado de oxidação sal esmeraldina, desempenha melhor condutividade quanto maior for o comprimento de onda associado as bandas de absorção. No estado dopado a polianilina apresenta a cor verde escura. 66 A Figura 20 apresenta os espectros de absorção eletrônica na região do Ultravioleta-Visível (UV-Vis) do espectro eletromagnético para a polianilina no estado sal esmeraldina. A característica desse perfil para a PAni é de ser melhor condutora do que no estado base esmeraldina. 67 Figura 20: Espectro de UV-Vis da polianilina na forma base esmeraldina (EB) e sal esmeraldina (ES). Fonte: WALLACE (2009). 67 A polianilina é usualmente obtida por meio da síntese química oxidativa da anilina usando um oxidante forte como persulfato de amônio (APS) em solução aquosa ácida de HCl 1,0 mol/L. 68 Pesquisas focando outros ácidos e oxidantes sempre aparecem relatados nas revistas científicas, onde na maioria das vezes procura-se obter uma polianilina mais solúvel com alto valor de condutividade. Pelo método de síntese química, a polianilina é obtida na forma de pó com tamanho de grãos irregulares 69. Filmes de PAni sintetizada num meio bifásico, a temperatura ambiente, apresentaram condutividade próxima a 800 S/cm. 70 Revisão bibliográfica 37 Ricardo Hidalgo Santim A polianilina destaca-se por certas características superiores quando comparadas as de outros PCI como: fácil síntese, baixo custo de monômeros, propriedades ajustáveis, melhor estabilidade (oxidação) que lhe possibilita numerosas aplicações dentre as destacadas na Figura 9. 45 Em uma busca feita no site Web of Knowledge sobre trabalhos que apresentem no título a palavra Polyaniline obteve-se o gráfico da Figura 21, que apresenta um aumento do número da produção bibliográfica envolvendo a PAni nos últimos 5 anos. Dado que motiva o desenvolvimento de novos materiais que utilizam esse polímero. 71 Figura 21: Aumento de publicações que envolvam a PAni nas pesquisas desenvolvidas nos últimos 5 anos. Fonte: WEB OF KNOWLEDGE (2015). 71 Revisão bibliográfica 38 Ricardo Hidalgo Santim 2.8 FATORES QUE INFLUENCIAM A CONDUTIVIDADE ELÉTRICA DA PANI Existem estudos que destacam alguns fatores que influenciam diretamente na condutividade elétrica da PAni como: massa molecular; cristalinidade e separação intercadeias; nível de oxidação e arranjo molecular; dopagem e tipo de dopante. Massa Molecular Quando a massa molecular é muito baixa não há formação de ligações duplas conjugadas e no caso de massa molecular muito alta ocorrem muitas distorções na cadeia. Nessas duas situações a condutividade elétrica do material é baixa. 45 De maneira geral, condutividade elétrica total da PAni é dada pelas contribuições intramolecular, intermolecular e entre os domínios condutores como mostrado na equação 1. A contribuição intramolecular da condutividade é dependente dos defeitos na estrutura que dificulta a mobilidade dos portadores ao longo da cadeia. A condutividade intermolecular depende da organização das cadeias, de tal maneira que, quanto melhor for a organização menor será a energia necessária para os portadores saltarem de um cadeia polimérica a outra. E por fim, a quantidade e organização dos domínios condutores influenciam diretamente na magnitude da condutividade total da PAni. 45 ���� = ��� �� + ��� �� + ����í���� (1) Cristalinidade e separação intercadeias Em PCI, como é o caso da PAni, a cristalinidade está associada a regiões em que as cadeias estão organizadas paralelamente uma em relação à outra, Figura 22. Assim, quanto maior for a cristalinidade melhor será o empacotamento das cadeias, o que proporciona maior mobilidade dos portadores de carga intra e intercadeias. Associado a esse fator, o distanciamento cada vez menor entre as cadeias aumenta a probabilidade de saltos (hopping) dos portadores de carga intercadeias, o que proporciona um aumento da condutividade. Esses fatores podem ser determinados com medidas de difração de raios-X (DRX). 45 Revisão bibliográfica 39 Ricardo Hidalgo Santim Figura 22: Estrutura heterogênea da PAni: cristalina (ordenada) amorfa (desordenada). Fonte: BHADRA (2009) 45. Nível de oxidação e arranjo molecular Um dos fatores mais importantes para se obter a PAni com alta condutividade é controlar o nível de oxidação para se obter a estrutura base esmeraldina (50% oxidada e 50% reduzida), destacada na Figura 17 (c), e arranjo alternado de anéis quinóides e benzenóides com 50% de dopagem da região cristalina. Esses fatores contribuem significativamente para a equação 01, associado à condutividade intramolecular (��� ��).45 Para determinar o nível de oxidação são feitas análises dos espectros na região do infravermelho (FTIR), comparando as bandas 1600 e 1500 cm-1 referentes as vibrações dos anéis quinóides e benzenóides, respectivamente. No caso da PAni dopada com DBSA os picos dessas bandas associadas as vibrações dos anéis são deslocadas para valores em torno de 1564 e 1458 cm-1, respectivamente. 63 Dopagem e tipo de dopante A dopagem da PAni é o segundo mais importante fator que proporciona altas condutividades e pode ser feita de diversas maneiras, inclusive durante a polimerização por métodos de síntese: química, eletroquímica, térmica ou radiação. 10, 45 A protonação da PAni ajuda na estruturação da forma dos pólarons, onde a corrente é dada por buracos (portadores de cargas). 10 Quando a PAni tem a forma EB, 50% de dopagem resultarão na protonação de todo anel quinóide. Isso levará a formação de pólarons e conjugação perfeita da cadeia, importante para obter altas condutividades. Porém, com o aumento do grau de dopagem para além de 50% levará à redução da condutividade devido à Revisão bibliográfica 40 Ricardo Hidalgo Santim formação de bipólarons. O grau de dopagem pode ser determinado por análise termogravimétrica (TGA) para as diferentes perdas de massa para dopante e PAni. 45 Na Tabela 3 destaca-se alguns fatores associados à PAni que influenciam diretamente na condutividade como é o caso do tipo de dopante: HCl, PTSA (ácido p-tolueno sulfônico), DBSA e LA (ácido láurico). Para esses quatro tipos de dopante foram obtidos valores diferentes de condutividade. Quanto maior a cristalinidade, assim como é o caso da separação intercadeias, observa-se na tabela que a condutividade aumenta. Outro fator é o band gap que está diretamente associado aos deslocamentos das bandas dos espectros de UV-Vis da Figura 23, de tal maneira que, quanto menor o gap de energia maior será a condutividade. 72 Tabela 3: Propriedades das amostras de PAni dopadas com diferentes dopantes. Propriedades PAni-HCl PAni- PTSA PAni-DBSA PAni-LA Condutividade DC (S/cm) 1,6 x 10-1 4,8 x 10-2 3,4 x 10-2 2,6 x 10-2 Band gap (eV) 4,48 4,50 4,51 4,53 Cristalinidade (%) 59 47 39 42 Separação intercadeias (Å) 4,36 4,37 4,42 4,40 Solubilidade em DMF a T.a.* (G/L) 3 11 16 13 * T.a = Temperatura ambiente Fonte: Adaptado de SINHA (2009). 72 Figura 23: Espectroscopia de UV-Vis de amostras de PAni dopada. Fonte: Adaptado de SINHA (2009). 72 Revisão bibliográfica 41 Ricardo Hidalgo Santim 2.9 O POLIPIRROL (PPy) O polipirrol (PPy) é um PCI bastante conhecido. Ele foi sintetizado pela primeira vez em 1916 pela oxidação do pirrol em água oxigenada (H2O2), originando um pó amorfo chamado “pirrol black”. 73 Em 1968, foi sintetizado, eletroquimicamente, em solução de ácido sulfúrico pelo físico nuclear francês Attílio Dall'olio. 74 Porém, somente em 1979 os filmes de PPy crescidos eletroquimicamente pelo americano A. F. Diaz receberam certa atenção devido a obtenção de melhores condutividades e estabilidade. 73 Em 1973 o químico italiano Gian Piero Gardini foi o primeiro a obter o PPy pela síntese química. 75 Para os dois estudos foi obtido como produto final PPy em forma de pó preto insolúvel e infusível devido as interações inter e intramolecular, como a formação de ligações cruzadas. 76, 77 Atualmente são consideradas como principais, duas formas de sintetizar o PPy: a polimerização eletroquímica e a química. A primeira permite obter a polimerização in situ (importante na confecção de biossensores), maior condutividade elétrica, porém a produção em grande escala é limitada pela área do eletrodo. Com a síntese química é possível a produção em larga escala por um baixo custo, facilidade na preparação de blendas com outros polímeros e melhor processabilidade. Embora o produto final seja o mesmo e os mecanismos de polimerização semelhantes, a morfologia depende da rota de síntese. 76 A síntese do PPy na presença de surfactantes é uma rota que permite obter um polímero condutor por meio de um processamento mais fácil e melhor controle de suas propriedades como condutividade, estrutura e morfologia. 78, 79 Nesse caso, também é possível realizar a polimerização química in situ em matrizes isolantes, como é o caso de algumas blendas de condutividade controlada. 14 No entanto, vem sendo desenvolvida nos últimos anos, pesquisas voltadas a uma terceira forma de síntese para o PPy, conhecida como síntese fotoquímica. 80 Esse método é muito interessante numa perspectiva ecológica pelo fato de que é possível poupar o uso de alguns reagentes que podem ser prejudiciais ao ser humano e à natureza, se não forem manuseados e descartados corretamente. Porém, a condutividade nesse caso, ainda é muito baixa em relação à síntese eletroquímica e química. 81 Vários estudos são realizados com PPy na tentativa de viabilizar algumas aplicações tecnológicas em diversas áreas da ciência, devido a alta condutividade, Figura 24, e a boa estabilidade química comparadas com outros materiais. O polipirrol é bastante citado, dentre outros PCI, em perspectivas tecnológicas como telecomunicações, protegendo os sinais de interferências eletromagnéticas; armazenamento de Revisão bibliográfica 42 Ricardo Hidalgo Santim energia com baterias orgânicas e diodos poliméricos eletrônicos emissores de luz na microeletrônica etc. 3, 59, 82 Figura 24: Escala de condutividade elétrica de materiais que vão de isolantes a supercondutores. Fonte: Adaptado de LIRA (2007). 83 Na área médica, por exemplo, o PPy tem despertado interesse considerável, devido as suas potencialidades em aplicações como biossensores, que possibilitam diagnosticar doenças in vivo como o câncer, que apresenta diferentes respostas elétricas em relação as células saudáveis, na detecção de glicose e colesterol; 49, 50, 76 imobilização de enzimas, anticorpos e ácido nucléicos e liberação controlada de medicamentos. 84, 85 A importância desse PCI no desenvolvimento de novos materiais, pode ser constatado pelo aumento do número de publicações que apresentem a palavra polypyrrole em seus títulos, observado no gráfico da Figura 25 gerado a partir do site Web of Knowledge, onde se nota um aumento da produção bibliográfica envolvendo o PPy nos últimos 5 anos. 86 Figura 25: Aumento de publicações que envolvam o PPy nas pesquisas desenvolvidas nos últimos 5 anos. Fonte: WEB OF KNOWLEDGE (2015). 86 Revisão bibliográfica 43 Ricardo Hidalgo Santim O polipirrol é um tipo de polímero cíclico que possui duas possíveis formas de ressonância: aromática e quinônica, que não são energeticamente equivalentes, conhecidas como não-degenerados. Análoga a PAni, a condutividade elétrica do PPy no estado não- degenerado, se dá via pólarons e bipólarons. 87 A Figura 26 apresenta a estrutura aromática primária da unidade de repetição (monômero pirrol) do PPy. Figura 26: Estrutura aromática do polipirrol. Fonte: XIA (2010). 88 Assim, para que o PPy torne-se condutor é necessário que ele passe por processos reversíveis de remoção de elétrons (oxidação) ou inserção de elétrons (redução) do sistema π conjugado. 53 No caso da dopagem por oxidação da cadeia aromática neutra do polipirrol, Figura 27 (a), ocorre a formação de um estado eletrônico denominado pólaron, associado à distorção da cadeia e redistribuição dos elétrons π, produzindo uma modificação na distribuição espacial dos elétrons ao longo de quatro meros, Figura 27 (b). À medida que mais elétrons são retirados da cadeia principal do PPy, próximo a região do estado pólaron, mais provável será criar um estado bipólaron (Figura 27 (c)) do que um novo pólaron, pois a estrutura quinóide possui energia de ionização menor e mais afinidade eletrônica do que a aromática. 46 Figura 27: Estruturas para o polipirrol: (a) polímero neutro na forma aromática; (b) pólarons e (c) bipólarons nas formas quinóides. Fonte: ZOPPI (1993). 46 Revisão bibliográfica 44 Ricardo Hidalgo Santim Dessa forma, dado que os portadores de carga são os defeitos carregados do PPy na forma quinóide, ao aplicar uma diferença de potencial em uma amostra obtém-se como resposta uma corrente elétrica gerada pelo movimento dos pólarons e/ou bipólarons ao longo das cadeias, por meio do rearranjo das ligações duplas e simples (as transições π-π*). É possível também, que ocorra o movimento de cargas elétricas entre as cadeias de PPy por hoppings, ou seja, saltos intermoleculares, que contribuem para a condutividade elétrica. 46, 89, 90 Revisão bibliográfica 45 Ricardo Hidalgo Santim 2.10 FATORES QUE INFLUENCIAM A CONDUTIVIDADE ELÉTRICA DO PPy Quanto maior o nível de dopagem do polipirrol maior será a condutividade elétrica resultante. Existem trabalhos com amostras de PPy dopadas que chegaram a condutividade de até 103 S/cm. 91 Em polímeros condutores, a condutividade elétrica é uma propriedade que depende de quatro fatores principais: as condições de síntese como a temperatura de polimerização, o iniciador (oxidante), o dopante e o estabilizador da cadeia polimérica. A temperatura influencia diretamente no tamanho das partículas por causa da energia termodinâmica da solução. A quantidade de iniciador provoca variações estruturais quanto ao tamanho e a conjugação da cadeia. O dopante, que também funciona como surfactante, fornece contraíons aos defeitos carregados do polímero, além de controlar a morfologia da amostra pela emulsificação. Os estabilizadores que, alguns são utilizados como co-surfactante geralmente possuem grupos hidroxilas que interagem com a cadeia principal do polímero condutor, aumenta o nível de dopagem e consequentemente a condutividade elétrica. Outros estabilizadores são utilizados como matriz, para contribuir significativamente nas propriedades mecânicas, porém, desempenham menor condutividade. 92 Para ajustar a morfologia de acordo com o interesse de pesquisa, o PPy pode ser sintetizado pelo processo de polimerização química em microemulsão (ME), afim de obter nanocápsulas, nanopartículas, nanofitas, nanocompósitos e estruturas mesoporosas, devido o controle da automontagem gerada pelas micelas. 78 Nesse processo de microemulsão existem três principais fatores que influenciam a condutividade elétrica do PPy: o surfactante (que também funciona como dopante), condições de polimerização e estabilizador (ou matriz). 52, 93 Os surfactantes ou tensoativos são compostos orgânicos, constituídos por moléculas anfifílicas contendo partes polares (cabeça) e apolares (cauda), como é o caso do dodecil sulfato de sódio (SDS), em destaque na Figura 28. Suas propriedades de atividade superficial e interfacial de substâncias emulsificam matérias orgânicas em solução aquosa, devido a parte hidrófila das moléculas, atraída pelo ambiente aquoso (polar), e uma parte hidrófoba, que não tem afinidade com as moléculas de água, mas interagem com a matéria orgânica, ou simplesmente se volta para dentro da micela, a fim de distanciar da superfície de contato com a água. 94 Revisão bibliográfica 46 Ricardo Hidalgo Santim Figura 28: Estrutura química do dodecil sulfato de sódio (SDS). Fonte: DA SILVA (2009). 95 Para a síntese em ME do PPy, o surfactante mais utilizado é o SDS, de fórmula molecular CH3(CH2)11OSO3Na, cuja fórmula estrutural é apresentada na Figura 28, um surfactante aniônico, que fornece contraíons para balancear os defeitos carregados na cadeia do PPy. Em solução aquosa, essa molécula se dissocia em ânion CH3(CH2)11OSO3 - e cátion Na+. A parte hidrófoba é CH3(CH2)11 e a hidrófila é o grupo OSO3 -.96 Essa estrutura favorece a formação de agregados, chamados de micelas, formadas em solução aquosa, a partir da concentração micelar crítica (CMC),97 que é de 0,008 mol/L à temperatura de 25 oC, para o surfactante SDS. 92, 95 Nesse caso, os ânions dodecil sufato se agregam em micelas esféricas, carregadas negativamente, devido a repulsão eletrostática ser superada entre os grupos de cabeça iônica, os quais estabilizam a micela. 96 Quando adicionado monômeros de Py nesse tipo de solução (>CMC), as micelas os envolvem. Ao adicionar o oxidante a polimerização ocorrerá dentro da micela. Isso influencia diretamente na morfologia e geometria das partículas do PPy. A Figura 29 representa esse processo com micelas esféricas. 88, 98, 99 Figura 29: Polimerização do PPy pelo processo químico em microemulsão com micelas esféricas. Fonte: Adaptado de XIA (2010). 88 A polimerização do pirrol em microemulsão proporciona uma polimerização bastante efetiva e com produção de partículas com tamanho e geometria controlados, no caso de partícula esféricas, o diâmetro pode ser obtido entre 2 e 100 nm. 100, 101 O surfactante em Revisão bibliográfica 47 Ricardo Hidalgo Santim solução pode gerar algumas formas distintas de micelas como: esféricas, cilíndricas ou fitas. Essas geometrias dependem de alguns fatores básicos, como o tamanho, a forma e a concentração do surfactante. 96, 102 O tamanho e a geometria das partículas do polímero condutor podem ser influenciados pela temperatura da emulsão, devido a mobilidade das cadeias do surfactante. 92, 103 A condutividade do polímero condutor é diretamente influenciada pelo surfactante (dopante). O tamanho do contraíon utilizado na dopagem define a distância intermolecular das cadeias. Se este for grande, a ponto de dificultar o salto eletrônico (hopping) entre as cadeias, prejudicará a condução elétrica. 3 Revisão bibliográfica 48 Ricardo Hidalgo Santim 2.11 BLENDAS POLIMÉRICAS E SUA IMPORTÂNCIA Blendas poliméricas podem ser definidas como a mistura física de dois ou mais polímeros, a fim de associar as propriedades características de cada polímero individual. As misturas poliméricas podem gerar sistemas homogêneo (unifásico) ou heterogêneo (multifásico), contudo, as propriedades dependem da compatibilidade entre os sistemas, da forma de processamento e da morfologia das fases. De maneira geral, o objetivo é desenvolver novos materiais, com propriedades superiores a dos materiais utilizados, através do efeito cooperativo decorrente da mistura polimérica. 104, 105, 106 Assim, estudar a condutividade elétrica da polianilina e do polipirrol é de fundamental importância para entender os efeitos desse polímero, como fase condutora, em blendas poliméricas, a base de Borracha Natural (BN). A PAni é um PCI, que assim como o PPy, apresenta ótimas propriedades de blindagem a interferência eletromagnética (IE), 107, 108 também são promissores para uso em sensores como a língua eletrônica, músculos artificiais, além de revestimentos antiestáticos, baterias, diodos emissores de luz (LEDs), células solares etc.109 Porém, esses PCI não apresentam boas propriedades mecânicas, limitando assim a sua aplicação tecnológica. Na literatura existe alguns trabalhos de blendas que abordam as características elétricas, dielétrica e mecânicas da PAni em matrizes como poliuretano (PU), politereftalato de etileno (PET), polipropileno (PP), silicone, entre outros. 110, 111, 112, 113 Visto que esses materiais são de fontes não renováveis, matrizes a base de borracha natural, também têm sido estudadas utilizando a PAni como fase condutora, no qual observou-se resultados tão bons quanto em matrizes sintéticas. 13, 14, 114 Na literatura encontra-se também alguns trabalhos que visam associar as vantagens da BN com as propriedades elétricas do PPy, 14 afim de favorecer o avanço tecnológico principalmente na área de sensores, que combinam a boa processabilidade e excelentes propriedades mecânicas com a condutividade elétrica controlada. 115 Em 2012, Omastová e Mičušík fizeram uma revisão de trabalhos sobre os materiais orgânicos e inorgânicos recobertos com PPy e a importância disso no desenvolvimento de dispositivos flexíveis e inteligentes, novas categorias de sensores em elementos de próteses, no caso de deformação (atuadores mecânicos), dentre outras aplicações na engenharia e medicina. 91 Vários trabalhos utilizaram do PPy para o recobrimento de materiais orgânicos como poliacrilatos, poliuretanos, poli(cloreto de vinila), poliestireno, polietileno e polipropileno. Em 2002, Bunsomsit e colaboradores discutiram a adsorção de Py e SDS pelas partículas de BN, porém, Revisão bibliográfica 49 Ricardo Hidalgo Santim o recobrimento dessas partículas não ficou evidente. 116 Em 2009, Pojanavaraphan e colaboradores utilizaram da síntese eletroquímica para recobrir as partículas de BN com PPy e camadas de silicato (Na-MMT), no qual obteve melhorias das propriedades mecânicas do compósito. 15 De maneira geral, na literatura não há trabalhos que evidenciem o recobrimento das partículas de Borracha Natural utilizando da síntese química em microemulsão in situ do PPy. O que fica bastante evidente nesses trabalhos é que a rota de síntese e as razões molares favorecem muito as características elétricas e mecânicas desses compósitos, mas, a maioria desses artigos que estudam blendas BN/PAni e BN/PPy concentra-se nos estudos dessas propriedades 117, 118 e não chegam a desenvolver blendas com a polimerização in situ da PAni e do PPy em solução de látex prevulcanizado. Nessa perspectiva, esse trabalho teve como objetivo, desenvolver blendas condutoras via polimerização in situ dos monômeros de anilina e de pirrol, na presença do látex natural e também prevulcanizado. Várias condições de síntese foram estudadas e as blendas obtidas foram avaliadas segundo as propriedades morfológicas, estruturais, elétricas, mecânicas e térmicas. Objetivos 50 Ricardo Hidalgo Santim 3. OBJETIVO GERAL O objetivo geral desse trabalho foi obter blendas Borracha Natural/Polianilina e Borracha Natural/Polipirrol por meio da polimerização in situ da anilina e do pirrol na presença do látex natural (LN) e do látex prevulcanizado (LPV). Caracterizar essas blendas quanto as propriedades morfológicas, estruturais, elétricas, mecânicas e térmicas. 3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Obter blendas de Borracha Natural/Polianilina (BNAn) por meio da polimerização in situ da anilina no meio látex variando as diferentes razões mássica BN/Anilina; Obter blendas de Borracha Natural/Polipirrol (BNPy) por meio da polimerização in situ do pirrol no meio látex variando as diferentes razões mássica BN/Pirrol; Prevulcanizar o látex de Borracha Natural utilizando o sistema convencional; Obter blendas de BNPVAn e BNPVPy por meio da polimerização in situ da anilina e do pirrol no meio látex prevulcanizado, respectivamente, variando as diferentes razões mássica BNPV/Anilina e BNPV/Pirrol; Estudar as propriedades morfológicas, estruturais, elétricas, mecânicas e térmicas das blendas obtidas, utilizando as técnicas de microscopia eletrônica de varredura (MEV), espectroscopia no infravermelho por refletância total atenuada (FTIR–ATR), espectroscopia no ultravioleta-visível e infravermelho próximo (UV-vis-NIR), condutividade elétrica pelo método de duas pontas, ensaios de tensão-deformação, calorimetria exploratória diferencial (DSC) e termogravimetria (TGA e DTG). Material e Método 51 Ricardo Hidalgo Santim 4. MATERIAL E MÉTODO Neste capítulo serão apresentados os materiais e métodos utilizados nos processos de síntese e caracterização das blendas de borracha natural (BN) e borracha natural prevulcanizada (BNPV) com os PCI polianilina e polipirrol. 4.1 MATERIAIS E REAGENTES UTILIZADOS Para as sínteses das amostras foram utilizados os reagentes: anilina (An), pirrol (Py), ácido dodecil benzenosulfonico (DBSA), dodecil sulfato de sódio (SDS) e persulfato de amônia (APS) adquiridos da Sigma-Aldrich e o hidróxido de amônia (NH4OH) adquirido da MERCK. O látex foi extraído das seringueiras (Hevea brasiliensis), clone RRIM 600, da Fazenda Experimental da Unesp, campus de Ilha Solteira, situada na cidade de Selvíria-MS. Para a prevulcanização foram utilizados os reagentes químicos: enxofre (S), bentonita, óxido de zinco (ZnO) e o dietilditiocarbamato de zinco (ZDEC), os quais foram cedidos pela empresa ORBITALL Aditivos para Látex Ltda. O agente dispersante Emulvin AS foi cedido pela LANXESS Ind. de Produtos Químicos e Plásticos Ltda. 4.2 LÁTEX DE BORRACHA NATURAL O látex de borracha natural coletados das seringueiras, clones RRIM 600 da Fazenda Experimental da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, Unesp, Figura 30, foi estabilizado com hidróxido de amônia em pH entre 10,20 e 10,30, filtrado em peneira para eliminar possíveis impurezas da coleta e armazenado em um refrigerador a temperatura de aproximadamente 5 oC. Figura 30: Clones RRIM 600 da plantação de seringueira (Hevea brasiliensis) da Fazenda experimental da Unesp (esquerda) e coleta do látex da seringueira (direita). Fonte: Próprio autor. Material e Método 52 Ricardo Hidalgo Santim 4.3 DETERMINAÇÃO DO CONTEÚDO DE BORRACHA SECA NO LÁTEX (DRC) O conteúdo de sólidos totais, o qual adotamos como sendo igual a de borracha seca, no látex foi determinado pela relação massa/volume (m/v). Para determinar o DRC, do inglês dry rubber content, foram realizados ensaios da massa inicial de 2,0 mL de látex em recipientes previamente pesados utilizando uma balança analítica. Essas amostras, em triplicata, foram levadas a uma estufa a 60 oC por 24 h. Após a secagem as massas dos sólidos totais foram medidas e o DRC foi determinado a partir da equação 2: % �ó����� = �� ∗"## $,# (2) onde a mfs é a massa final dos sólidos após 24 h de secagem a 60oC. O conteúdo de borracha seca foi a referência para preparação das blendas com os polímeros condutores: polianilina e polipirrol. 4.4 PREVULCANIZAÇÃO As dispersões de enxofre (S), óxido de zinco (ZnO) e dietilditiocarbamato de zinco (ZDEC) foram preparadas, cada qual, em um moinho de bolas com rotação constante e utilizando dezesseis bolas de alumina, sendo metade delas com massa de 7,53 g e a outras oito com massa de 3,36 g. A quantidade de cada reagente e o tempo utilizado para a produção de cada dispersão estão indicados nas Tabelas 4, 5 e 6. Tabela 4: Dispersão de Enxofre a 50%. Tempo no moinho de bolas: 72 horas. Produto Peso (g) – seco Enxofre (S) 50,00 Emulvin AS (dispersante) 2,00 Bentonita 0,50 Água destilada 47,50 Fonte: GOMES (2013). 40 Tabela 5: Dispersão de ZnO a 50%. Tempo no moinho de bolas: 24 horas. Produto Peso (g) – seco Oxido de Zinco (ZnO) 50,00 Emulvin AS (dispersante) 1,50 Amônia 0,15 Material e Método 53 Ricardo Hidalgo Santim Agua destilada 48,85 Fonte: GOMES (2013). 40 Tabela 6: Dispersão de ZDEC a 50%. Tempo no moinho de bolas: 48 horas. Produto Peso (g) – seco Dietilditiocarbamato de zinco (ZDEC) 50,00 Emulvin AS (dispersante) 2,00 Bentonita 0,75 Água destilada 47,50 Fonte: GOMES (2013). 40 Preparou-se o sistema convencional de vulcanização (CV) para a prevulcanização do látex de seringueira com diferentes quantidades de reagentes, conforme a segunda coluna da Tabela 7. 40 Esses valores foram ajustados para as medidas obtidas dos sólidos totais de borracha seca, que variaram entre 42 e 47%. Essa mudança ocorreu em função do clima e da época do ano em que foi realizada a coleta do látex. Tabela 7: Formulação utilizada para prevulcanizar o látex proveniente de seringueira. Reagentes Sistema Convencional (CV) (phr)* Sólidos totais (BN seca) 100 ZnO – 50% 1,50 Enxofre – 50% 2,80 ZDEC – 50% 0,80 *Valores dados em phr (parts per hundred rubber = parte por cem de borracha) Fonte: GOMES (2013). 40 As dispersões de Enxofre, ZnO e ZDEC foram adicionadas no látex, estabilizado em pH entre 10,20 e 10,30, antes do aquecimento, Figura 31 (B), de acordo com as quantidades indicadas na Tabela 7, onde ficou sob agitação de 90 rpm por 15 minutos. Em seguida, a solução foi aquecida em banho-maria a base de água, a uma temperatura de 70 oC, por 2 horas, sob agitação (linear horizontal) de 80 ciclos por minuto. Na Figura 31 (A) ilustra-se o aparato para a prevulcanização do látex. Após esse tempo cessou o aquecimento e sob temperatura ambiente (28 oC) foi iniciado o resfriamento com agitação de 90 rpm, Figura 31 (B). Em seguida o látex prevulcanizado foi armazenado em recipiente hermeticamente fechado e sob temperatura de 5 oC no refrigerador. Material e Método 54 Ricardo Hidalgo Santim Figura 31: (A) Aparato experimental para prevulcanização do látex: sistema convencional (70 oC – 2 h) e (B) sistema de agitação mecânica do látex antes e após prevulcanização. Fonte: Próprio autor. 4.5 DESTILAÇÃO DOS MONÔMEROS ANILINA E PIRROL Os monômeros de anilina (An) de pureza 99,50 %, com estrutura química C6H5NH2, temperatura de fusão -6 oC e temperatura de ebulição 182 oC e pirrol (Py) de pureza 99,98 %, com estrutura química C4H5N, temperatura de fusão -23 oC e temperatura de ebulição 131 oC foram destilados, separadamente, antes da polimerização. Para tal, utilizou-se uma coluna de destilação acoplada a um condensador. A coluna também foi acoplada a um balão e o condensador a outros dois, como ilustrado na Figura 32. No balão da direita foram inseridos os monômeros como recebidos, e este por sua vez, foi submetido a banho-maria com óleo. A temperatura desse óleo foi de 65 oC para a anilina e de 70 oC para o pirrol. Foi inserida água corrente, a temperatura ambiente (28 oC), no condensador. A esquerda há uma mangueira que foi acoplada a uma bomba de vácuo. Na extremidade esquerda do aparato foram utilizados dois pequenos balões; um para armazenar os monômeros do início da destilação, ainda com impurezas e outro para estocar os monômeros destilados. Ao fim do processo, esse último balão foi desacoplado do sistema, envolvido com papel alumínio para proteger os monômeros da luminosidade e levado a um refrigerador com temperatura de aproximadamente -10,0 oC. Material e Método 55 Ricardo Hidalgo Santim Figura 32: Aparato experimental para destilação de anilina e pirrol. Fonte: Próprio autor. 4.6 SÍNTESE DA POLIANILINA Na síntese da PAni, utilizou-se o ácido dodecil benzeno sulfônico (DBSA) como surfactante e dopante e o persulfato de amônia (APS) como oxidante. A razão molar monômero/oxidante/dopante foi de 1:1,5:1 (An/APS/DBSA), proporções obtidas em trabalhos anteriores. 119 Na Figura 33 ilustra-se o procedimento utilizado. Figura 33: Etapas da síntese química da PAni. Fonte: Próprio Autor. Material e Método 56 Ricardo Hidalgo Santim Inicialmente preparou-se uma solução (solução 1) adicionado 7,60 mL de DBSA em 42,60 mL de H2O, que ficou sob agitação de 750 rpm por 15 min, a temperatura ambiente (28oC). Em seguida, adicionou-se 2,0 mL de anilina na solução 1 e esta (solução 2) foi mantida em um refrigerador sob agitação mecânica constante ( ̴750 rpm) por mais 1 hora e a temperatura de aproximadamente 5oC. Paralelamente foi preparada outra solução (solução 3) dissolvendo 7,01 g de APS (oxidante) em 15 mL de H2O. Para iniciar a polimerização, diminuiu-se a agitação da solução 2 para 500 rpm e adicionou-se lentamente a solução 3 na solução 2. Em seguida, a agitação foi ajustada em 300 rpm, e deu-se o início a contagem do tempo da síntese. Nesse processo, evidenciou-se o início da polimerização com a transição de cores, desde o branco da emulsão, passando por uma verde clara até a cor verde escura. Após aproximadamente 14 horas, a PAni foi precipitada com a adição de 100 mL de acetona. Depois disso, a solução final foi filtrada e lavada em um funil de Buchner, aplicando- se água e acetona alternadamente com duas pissetas. A acetona tem a função de retirar os resíduos de matéria orgânica (oligômeros e resíduo do DBSA) e a água solubilizar os resíduos do oxidante. A PAni obtida foi levada a estufa para secar a 60 oC durante 48 h, tempo suficiente para estabilizar a perda de massa (água e acetona). A Pani assim obtida, na forma de um pó escuro, foi então armazenada para posterior caracterização. 4.7 SÍNTESE DO POLIPIRROL A polimerização do polipirrol foi realizada pelo processo químico em microemulsão 47, 50, 92 e o procedimento utilizado foi similar ao descrito na síntese da PAni. Baseado em estudos anteriores, 103, 120 a razão molar monômero/oxidante/dopante (Py/APS/SDS) foi ajustada para 1,0:1,0:0,5, a fim de se adequar a situação de polimerização in situ no látex. As etapas desse processo estão ilustradas na Figura 34. Inicialmente preparou-se uma solução adicionado 4,12 g de SDS em 50,60 mL de H2O (solução 1), que ficou sob agitação de 750 rpm por 15 min, a temperatura ambiente (28 oC), dando início a emulsão. Em seguida, adicionou-se 2,0 mL de monômero pirrol na solução, agitou-se essa solução por mais 1 h a 950 rpm (solução 2). Paralelamente, foi preparada outra solução com 6,57 g de APS (oxidante) em 20 mL de H2O, sob agitação de 300 rpm (solução 3). Para iniciar a polimerização, baixou-se a agitação da solução 2 para 750 rpm em ambiente refrigerado (5 oC) e adicionou-se lentamente a solução 3 com o oxidante. Nesse processo, Material e Método 57 Ricardo Hidalgo Santim evidenciou-se o início da polimerização com a transição de cores, desde o branco da emulsão, passando por uma verde clara, escurecendo até chegar à cor preta. Após aproximadamente 14 horas, sob agitação de 300 rpm, o PPy foi precipitado com a adição de 100 mL de acetona, obtendo-se um pó preto em solução, desestabilizando a emulsão. Depois disso, essa solução final foi filtrada e lavada em um funil de Buchner, aplicando-se água e acetona alternadamente com duas pissetas. Assim como explicado anteriormente, a acetona teve a função de retirar os resíduos de matéria orgânica e a água solubilizar os resíduos do oxidante. O PPy obtido foi levado a estufa para secar a 60 oC durante 48 h, tempo suficiente para estabilizar a perda de massa (água e acetona), para posteriormente ser caracterizado. Figura 34: Etapas da síntese química do PPy em microemulsão. Fonte: Próprio autor. 4.8 OBTENÇÃO DAS BLENDAS As blendas foram preparadas a partir da polimerização in situ da An e do Py no látex de Borracha Natural, antes e depois da prevulcanização. O procedimento adotado esta ilustrado na Figura 36 (A) e (B). Em (A) está indicado os procedimentos realizad