UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS - RIO CLARO RENATA FIGUEIREDO BUFFA FORAMINÍFEROS EM UM TRANSECTO DE MANGUEZAL DA ILHA DO CARDOSO (SP): DISTRIBUIÇÃO EM FUNÇÃO DA FREQUÊNCIA DE INUNDAÇÃO E MODELOS PARA RECONSTRUÇÕES PALEOAMBIENTAIS NO SETOR DE PETRÓLEO & GÁS Rio Claro 2014 ECOLOGIA RENATA FIGUEIREDO BUFFA FORAMINÍFEROS EM UM TRANSECTO DE MANGUEZAL DA ILHA DO CARDOSO (SP): DISTRIBUIÇÃO EM FUNÇÃO DA FREQUÊNCIA DE INUNDAÇÃO E MODELOS PARA RECONSTRUÇÕES PALEOAMBIENTAIS NO SETOR DE PETRÓLEO & GÁS Orientador: Prof. Dr. Décio Luis Semensatto Junior Co-orientador: Prof. Dr. Dimas Dias-Brito Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - Campus de Rio Claro, para obtenção do grau de Ecóloga. Rio Claro 2014 574.5263 Buffa, Renata Figueiredo B929f Foraminíferos em um transecto de manguezal da Ilha do Cardoso (SP): distribuição em função da frequência de inundação e modelos para reconstruções paleoambientais no setor de petróleo & gás / Renata Figueiredo Buffa. - Rio Claro, 2014 27 f. : il., figs., gráfs., tabs. Trabalho de conclusão de curso (Ecologia) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro Orientador: Décio Luis Semensatto Junior Coorientador: Dimas Dias-Brito 1. Ecologia aquática. 2. Foraminífera. 3. Áreas estuarinas. 4. Exposição sub-aérea. 5. Impactos ambientais. I. Título. Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP 2 AGRADECIMENTOS Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus por ter me dado oportunidade e alegria de cursar uma faculdade que tanto gosto e que me faz tão bem. Ao meu pai Alexandre por ter me dado todo o apoio necessário e sempre com sorriso no rosto esperando sua filha voltar para casa para saber como foi um simples dia de aula e como andavam os foraminíferos e é claro até ele decorar essa palavra hahahaha.A minha mãe Francisca que mesmo não estando mais comigo, sei que estava presente de alguma forma me guiando ao caminho certo e melhores escolhas para a minha vida. Ao orientador Prof. Dr. Décio Luis Semensatto Junior, por toda ajuda e conhecimentos transmitidos e ao co-orientador Prof. Dr. Dimas Dias-Brito, pela ajuda e por oferecer a estrutura necessária, fazendo com que fosse possível o desenvolvimento deste trabalho. Ao Programa de Formação de Recursos Humanos em Geociências e Ciências Ambientais Aplicadas ao Petróleo – PRH 05/UNESP, ao PFRH/Petrobrás e ao PRH/ANP – FINEP/MCT, pelo apoio acadêmico e financeiro, indispensáveis à realização deste trabalho de conclusão de curso, bem como ao Hermes Dias Brito, pela obtenção das fotografias no MEV. A minha família que mesmo sem saberem ao certo o que eu estava fazendo e com que estava trabalhando se dispuseram a me ajudar, me dando apoio, mas toda vez perguntando, com o que trabalha mesmo? Foran o que? E eu respondendo... FORAMINÍFEROS!! As minhas amigas Gabi, Sandy e Niveis, companheiras de sofrimento e satisfação, passando juntas cada momento de dificuldade e alegria ao realizar esse projeto. As minhas amigas Emi e irmãzinha, Camila, por me aturarem em casa (Reptar) - viu Emi, você foi a primeira a ser colocada hahaha – proporcionando momentos de muita alegria, umas briguinhas às vezes, mas a gente sempre se resolvia, por isso amo tanto vocês. E é claro a minha querida classe ECO-09 que apesar de no começo sermos um pouco afastados, nos tornamos amigos mesmo com todas as diferenças que existia em cada um, claro que uns mais outros menos, mas o importante é que todos serão lembrados. 3 Aos meus eternos amigos itirapinenses Bi, Glau, Chulio, Chimbinha, Juninho, Dre, Tuca, Daninha e toda a Trup por compreender meus momentos de ausência e me chamar para tomar uma só para dar aquela aliviada na tensão. E aos rio clarenses provisórios Batu, Ju, Bela, Mentira, Kalinka, Marina, Xu, Sinu e sua linda Endi, Tampinha e seu lindo Angelo, Polly, Urucum, Alê meu amô, Tim Tim. A Jéssica, Alana, Laurinha e Miau que mesmo trancando o curso ainda permanecem em alma na ECO-09. Ao meu time de basquete que me entendeu sempre que precisei faltar dos treinos para fazer o TCC, e que me incentivou a não parar, e hoje estamos mais unidas, realmente formamos uma família. E por fim, à todos amigos que fiz, mas não consegui lembrar o nome agora no momento, porém estiveram ao meu lado, dividindo alegrias e tristezas, participando de momentos importantes, ou simplesmente uma conversa rápida na balada. Cada pessoa citada e não citada contribuíram para que eu não me arrependesse de nada que fiz e que tivesse os melhores anos da minha vida! Obrigada a todos! 4 RESUMO O estudo do conteúdo de foraminíferos de 8 amostras de sedimentos superficiais coletados em manguezal do norte da Ilha do Cardoso, sul do Estado de São Paulo, no verão (período chuvoso) de 2001, ao longo de um transecto no sentido da Baía de Trapandé para o interior, revelou dois segmentos distintos: a) uma planície inferior lamosa, com menor tempo de exposição sub-aérea e maior diversidade específica, dominada por Ammotiumcassis, A.salsum, Arenoparrella mexicana e Trochamminainflata, com abundância expressiva de Caroniaexilis na parte mais baixa e de Miliammina fusca na parte mais alta; b) uma planície superior arenosa, com maior tempo de exposição sub-aérea e menor diversidade, dominada por M. fusca e com abundância expressiva de T. inflatana parte mais baixa. Os sedimentos investigados são colonizados por foraminíferos exclusivamente aglutinantes, representados por 21 espécies de 16 gêneros. Dados de abundância relativa, riqueza, diversidade e equitatividade das espécies ao longo do transecto são apresentados, bem como os valores de salinidade, pH, oxigênio dissolvido e temperatura, medidos a partir da água intersticial dos sedimentos no momento da coleta das amostras. São feitas comparações com um estudo anterior, similar, que focalizou amostras coletadas, nos mesmos pontos, no inverno (período seco) de 2002. Os resultados obtidos interessam às análises de sistemas estuarinos modernos e antigos, bem como a projetos envolvidos com o diagnóstico do estado de conservação de áreas litorâneas, sendo úteis ao Setor de Petróleo e Gás. 5 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................6 2 ÁREA DE ESTUDO..........................................................................................................8 3 OBJETIVO......................................................................................................................10 4 MATERIAL E MÉTODOS..............................................................................................11 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO......................................................................................14 5.1 Variáveis Abióticas..........................................................................................................14 5.2 Variáveis Bióticas............................................................................................................16 6 CONCLUSÕES................................................................................................................23 REFERÊNCIAS.......................................................................................................................24 6 1- INTRODUÇÃO Os foraminíferos surgiram no Período Cambriano, atingindo seu apogeu durante o Cenozóico (ARMSTRONG & BRASIER, 2005). São protistas sarcodinos (Rhizopoda),predominantemente marinhose microscópicos, com tamanhos frequentemente variando entre 50 e 800 µm. Possuem pseudópodos para locomoção e alimentação e sãodotados de tecas (carapaças), passíveis de fossilização. As tecas são asprincipais estruturas para a classificação taxonômica, podendo variar nos formatos,na composição(calcárias: subordens Miliolina eRotaliina; aglutinadas com partículas do meio: Subordem Textulariina; orgânicas: Subordem Alogromiina), na quantidade eno arranjo de câmaras, que quando múltiplas (multilocular) são interligadas por uma ou várias aberturas (forâmens). Podem ser bentônicos (organismos de fundo – substrato), com tecas calcárias,protéicas ou aglutinadas, ocorrendo desde a zona costeira até pisos marinhos abissais; ou planctônicos (organismos flutuantes – superfície) exclusivos de ambientes marinhos abertos onde não ocorrem grandes variações ambientais (e. g. salinidade, pH, turbidez). Nos ambientes parálicos todas as espécies de foraminíferos são bentônicas, sendo que a presença de tecas de espécies planctônicas nestes ambientes está associada à aloctonia (MURRAY, 2006).Há uma tendência consistente em todo o globo de aumento da riqueza de espécies e de formas das tecas partindo-se dos ambientes parálicos para os oceânicos. Os estudos científicos com foraminíferos decorrem, historicamente, de sua aplicação na geologia do petróleopara a datação relativa de rochas por apresentarem vários fósseis-guia. De acordo com LOEBLICH-JR. & TAPPAN (1988), os foraminíferos são uma das melhores ferramentas para a Estratigrafia e Paleoecologia, fornecendo dados ecológicos e climáticos pretéritos relativamente precisos, devido principalmente ao seu tamanho reduzido, grande abundância em pequenas alíquotas de amostra, bom estado de preservação das tecas e relativa facilidade de classificação. Já ALVE(1995) e SANTA-CRUZ(2004) ressaltam a aplicaçãodos foraminíferos no diagnóstico e monitoramento de impactos antrópicos. YANKO et al. (1994), dizem que além das vantagens mencionadas, os foraminíferos são bons bioindicadores ambientais porque estão presentes praticamente em todos os ambientes marinhos, habitando a superfície ou o interior do sedimento, armazenado muitos poluentes; possuem grande 7 diversidade taxonômica; as tecas podem registrar evidências de estresse ambiental e sãosensíveis às rápidas mudanças ambientais. Em áreas submetidas a derramamentos de petróleo, os impactos resultam no decréscimo da densidade de indivíduos e da riqueza de espécies, inclusive podendo chegar a uma extinção temporária (SABEAN, 2001; McMILLAN, 2002). Atualmente, devido ao amplo conhecimento taxonômico e ao avanço sobre sua ecologia, estes organismos também são utilizados para a compreensão da hidrodinâmica e hidroquímica estuarina (DEBENAY et al., 2002) e dos movimentos do nível relativo do mar (HORTON & EDWARDS, 2006).Nos manguezais, em especial, as principais variáveis responsáveis pela distribuição das espécies de foraminíferos estão associadas à hidrodinâmica do estuário, incluindo a salinidade, o pH, a concentração de cálcio na água e o tempo de exposição subaérea (DEBENAY et al., 2002; HORTON & MURRAY, 2007; SEMENSATTO-JR et al., 2009). Neste ambiente, os baixos valores de pH inviabilizam a precipitação de CaCO3 e isso representa um fator limitante para a colonização de foraminíferos com teca calcária, de forma que apenas espécies aglutinantes conseguem estabelecer-se com sucesso no manguezal (DEBENAY et al., 2002). Portanto, este estudo é importante tanto para aspectos relacionados à problemasenvolvendo o meio ambiente e petróleo, como na suplantação dos desafios de reconstrução de baciassedimentares brasileiras no campo da Geologia do Petróleo. 8 2 - ÁREA DE ESTUDO A área de estudo está localizada na Ilha do Cardoso, pertencente ao município de Cananéia, litoral sul do Estado de São Paulo.Segundo SAMPAIO et al. (2005), a ilha abrange uma área de 22.500 ha, composta por Floresta Pluvial de Encosta e Planície, Manguezal e Restinga.Faz parte do sistema estuarino Cananéia-Iguape, onde se encontram quatro ilhas principais (Cardoso, Cananéia, Comprida e Iguape) separadas por sistemas de canais lagunares e rios, que se comunicam com o Oceano Atlântico. A Baía de Trapandé limita a Ilha do Cardoso ao norte, sendo sua desembocadura, a barra de Cananéia, a principal fonte de trocas de água do mar com o sistema estuarino (BÉRGAMO, 2000);é caracterizada por uma maré do tipo mista, predominantemente semidiurna, com uma altura média de 0,81 m (MESQUITA & HARARI, 1983), havendo, porém, variações das distâncias médiasquando as frentes frias mudam de direção do vento, podendo chegar à máxima de 2,0 m de maré diurna (FRANCO & MESQUITA, 1986). De acordo com SCHAEFFER-NOVELLI et al. (1990), na primavera a amplitude de marés é de 1,25 m. A Ilha do Cardoso é dominada por rochas pré-cambrianas com sedimentos quaternários restritos à linha de costa e canais adjacentes (PETRI & FULFARO, 1970; SUGUIO & TESSLER, 1992). Esses sedimentos são predominantemente holocênicos e compostos de areia fina e muito fina bem selecionada (SUGUIO & MARTIN, 1978), situando-se nas partes externas expostas ao mar aberto; nas porções internas e protegidas predominam depósitos estuarinos de natureza arenoargilosa (GOMES et al., 2007). BÉRGAMO (2000), analisando o sistema de circulação, estratificação e transporte de sal na região, em diferentes períodos do ano e em ciclos de marés completos, observa que a maior salinidade e energia hidrodinâmica está na Barra de Cananéia (verão: 2,0 m/s para marés de enchentes e 1,0 m/s para vazantes em maré de sizígia), enquanto que os menores valores de intensidade de corrente e salinidade estão na Baía de Trapandé, indicando que a mistura entre as águas oriundas da drenagem continentale plataforma continental adjacente é mais efetiva no sentido do Mar de Cananéia. SegundoSANT’ANNA NETO (1994), o clima do litoral sul do Estado de São Paulo é controlado por massas tropicais e polares, caracterizado por grande variação de pluviosidade, 9 forte participação das massas polares e passagens frontais, e distribuição quantitativa das chuvas variando com a topografia. A região possui um verão chuvoso e um inverno seco, commédias anuais de precipitação variando entre 1.800 e 2.000 milímetros (MELO & MANTOVANI, 1994). O presente estudo foi realizado em um manguezal. De acordo com SCHAEFFER- NOVELLI (1991), manguezal é um ecossistema costeiro de transição entre os ambientes terrestre e marinho, sujeito ao regime de marés, característico de regiões tropicais e subtropicais, e é constituído por espécies lenhosas típicas (angiospermas), micro e macroalgas (criptógamas) adaptadas às grandes variações de salinidade e colonizadoras de sedimentos predominantemente lodosos, com baixos teores de oxigênio. Ocorre em regiões abrigadas, oferecendo ótimas condições de alimentação, proteção e reprodução a muitas espécies, sendo considerado um importante transformador de nutrientes em matéria orgânica e gerador de bens e serviços.Para CINTRÓN & SCHAEFFER-NOVELLI (1983), os solos demangue são formados por sedimentos autóctones ou alóctones, visto que, são ambientes em geral de baixa energia com predomínio deacúmulo de frações finas (argilas e limos), podendo atingir vários metros de profundidade, sendo pobremente consolidados e semifluídos e o pH do solo é umafunção do conteúdo de umidade e das flutuações do nível freático. Os manguezais brasileiros correspondem a aproximadamente 25.000 km2, onde 24% estão no Estado de São Paulo, dos quais a maioria está na região de estudo (SAENGER et al., 1983). Os manguezais do sistema estuarino Cananéia-Iguape estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo, contribuindo significativamente para a produtividade pesqueira da região (MENEZES, 1994), mas por outro lado, também são os mais sensíveis a derrames de óleo, apresentando Índice de Sensibilidade (ISL) de valor 10 (BRASIL, 2004).Apresenta boas condições de conservação, servindo assim, como referência para regiões não impactadas pelas atividades petrolíferas.A vegetação de mangue dominante no entorno da Baía de Trapandéé Rhizophoramangle, seguido de Laguncularia racemosa e Avicenniaschaueriana; na transição de mangue-ambiente terrestre, há ciperáceas, Hibiscuspernambuscensis, Acrosthicumaureum, DalbergiaecastophyllumeAnnona glabra (SCHAEFFER-NOVELLI et. al., 1990;COELHO- JR.,2003). 10 3- OBJETIVOS Identificar as espécies de foraminíferos visando reconhecer e compreender o padrão de distribuição dos táxons neste espaço, em função de sua altura em relação ao nível do mar e ao tempo de exposição sub-aérea, e comparar os resultados obtidos nesta campanha com aqueles reportados em junho de 2002, para verificar eventuais flutuações sazonais na composição das espécies e padrões de diversidade. Assim, poder-se-á contribuir para o reconhecimento de padrões de composição de comunidades de foraminíferos que sirvam de referência para o monitoramento no nível relativo do mar, para a reconstrução de paleoambientes parálicos e para os estudos de avaliação de impactos em áreas estuarinas por atividades petrolíferas. 11 4- MATERIAL E MÉTODOS A coleta do material foi realizada em dezembro de 2001, período chuvoso, em um transecto no manguezal na margem norte da Ilha do Cardoso, Baía Trapandé, sistema estuarino Cananéia-Iguapé, Estado de São Paulo (Fig. 1). Figura 1. Área de estudo (Fonte das imagens A e B: COELHO-JR, 2003; Fonte da imagem C: SEMENSATTO-JR et al., 2009). O transecto foi delineado por COELHO-JR. (2003) para o estudo da estrutura e dinâmica fitossociológica do mangue e possui 340 m de comprimento, desde a margem da Baía de Trapandé até a transição com a restinga. Neste perfil,aquele autor estimou a altura relativa de pontos a cada 20 m de distância e, assim, calculou a proporção de tempo (%) em 12 que cada ponto fica emerso e diretamente exposto na atmosfera, o que é aqui expresso como exposição subaérea. Ao longo deste transecto foram coletadas 8 amostras de sedimento para o estudo das comunidades de foraminíferos (Fig. 2). Cada amostra foi extraída do primeiro centímetro superficial do sedimento, sendo composta por frações coletadas em uma área de aproximadamente 1 m², de onde também foram registradas,no momento da coleta, a salinidade, pH, condutividade, oxigênio dissolvido e temperatura da água intersticialdo sedimento, com auxílio de uma sonda multiparamétrica Horiba U-10. A escolha da posição das amostras no transecto se deu em função da salinidade registrada durante o monitoramento executado por COELHO-JR. (2003) no decurso da execução de seu projeto. Figura 2. Perfil esquemático do transecto e localização dos pontos de amostragem ao norte da Ilha do Cardoso, margem da Baía de Trapandé, Cananéia – SP (SEMENSATTO-JR. et al., 2009). Em laboratório, as amostras foram lavadas em peneira com malha de 63 µm e a fração retida foi acondicionada em frascos acrílicos com álcool 70% até o momento da triagem. Em cada amostra separou-se pelo menos 100 tecas, que corresponde a um tamanhoamostral que garante que espécies com pelo menos 5% em abundância relativa estejam representadas (FATELA &TABORDA, 2002) e principalmente por se adequar ao trabalho com foraminíferos em manguezais (SEMENSATTO-JR.,2006). Os resultados são referentes à fauna total (englobando tanto organismos vivos como mortos), que representa uma confiável 13 integração generalizada das condições ambientais predominantes no sistema (SCOTT e MEDIOLI, 1980; DEBENAY et al., 2002), que é o foco de análise deste projeto. O processo de triagem das tecas foirealizado a úmido sob estereomicroscópio com aumento de até100x, com o auxílio de um pincel pelo de marta nº000 e as tecas encontradas foram acondicionadas em célulasporta-foraminíferos previamente preparadas com uma fina camada de goma adragante, para garantir a boa conservação do material. A organização das tecas nas células seguiu o protocolo desenvolvido pelo Prof. DécioSemensatto, a fim de padronizar a distribuição dos espécimes e auxiliar na identificação. A identificação taxonômica foi realizada com o auxílio de referências bibliográficas específicas, taiscomo CLOSS (1962), BOLTOVSKOY et al. (1980),LOEBLICH & TAPPAN (1988), BRÖNNIMANN et al. (1992a,b),e o atlas fotomicrográfico de foraminíferos de manguezais, produzido pelo LAMBdA(Laboratório de Análises Micropaleontológicas, Microbióticas e de Ambientes, IGCE / UNESP). Os dados de comunidades foram estudados em termos de abundância relativa, riqueza, diversidade (índice de Shannon e respectiva equitatividade) e similaridade da composiçãode espécies por meio da medida de Bray-Curtis (1-B) (MAGURRAN, 2003), principalmente através da comparação direta entre as amostras deste trabalho (verão, dezembro de 2001, época chuvosa) e aquelas estudadas por SEMENSATTO-JR et al. (2009), que correspondem, exatamente, aos mesmos pontos de coleta, porém relativos a junho de 2002 (inverno, época mais seca). Todos os cálculos foram executados utilizando-se o software livre PAST (HAMMER et al., 2001). A classificação da salinidade segue aquela proposta no Simpósio de Veneza, em 1959 (apud CLOSS, 1962), detalhada na Tabela 01. Tabela 01. Classificação das águas em função da salinidade, de acordo com o Simpósio de Veneza, em 1959 (CLOSS 1962). Classificação Salinidade (‰) Hiperhalina > 40 Euhalina 30 a 40 Mixohalina 0,5 a 30 Mixo-polihalina 18 a 30 Mixo-mesohalina 5 a 18 Mixo-oligohalina 0,5 a 5 Doce < 0,5 14 5-RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 Variáveis Abióticas Dentre as variáveis abióticas analisadas, apenas a salinidade e a condutividade apresentam uma tendência de queda desde a margem da Baía de Trapandé até a transição com a restinga (terra firme, sem influência da água marinha). Esse comportamento foi observado tanto no estudo de campode dezembro/2001, como no de junho de 2002, como registrado por SEMENSATTO-JR. (2009), (Fig. 3). Em ambas as campanhas de coleta, a salinidade se manteve na faixa mixo-polihalina dos pontos P1 a P7; o valor reduziu-se drasticamente para a faixa oligohalina em dezembro/2001, e para água doce em julho/2002 no ponto P8 (ponto mais interiorano do transecto). Observa-se em ambas as campanhas que de P1 a P8, exatamente no ponto P6, houve um pico de aumento de salinidade. Neste local ocorre uma leve elevação do terreno, com consequente maior tempo de exposição sub-aérea, além do sedimento ser predominantemente arenoso e o bosque ser dominado por indivíduos de pequeno porte com dossel ralo (COELHO-JR., 2010). Portanto, é provável que aí haja maior evaporação da água do sedimento e maior acúmulo de sal (SEMENSATTO Jr. et al., 2009). Nos pontos seguintes, P7 e P8, a salinidade retomaa tendência de redução. Todas as demais variáveis permaneceram estáveis ao longo de todo o transecto, com exceção da condutividade, que seguiu a mesma tendência da salinidade por estarem conceitualmente relacionadas (Tabela 2). Contudo, observa-se uma diferença expressiva apenas entre os valores de oxigênio dissolvido e de temperatura para todos os pontos do transecto, o que deve estar relacionado a uma flutuação sazonal do ambiente (SEMENSATTO-JR. et al., 2007). 15 Figura 03. Concentração da salinidade na água intersticial do sedimento nas campanhas de dezembro/2001 (presente trabalho) e junho/2002 (SEMENSATTO-JR. et al., 2009). O perfil segue o mesmo padrão de divisão sugerido por COELHO-Jr. (1998) e SEMENSATTO-JR et al. (2007), onde o perfil é dividido em dois compartimentos. O primeiro é a planície inferior, correspondente aos 120 m iniciais (P1 a P4), onde há sedimento lamoso, rico em matéria orgânica, vegetação mais desenvolvida e elevada freqüência de inundação; já o segundo é a planície superior (P5 a P8), com sedimento arenoso, pobre em matéria orgânica, vegetação pouco desenvolvida e menor freqüência de inundação. JIMENEZ (1999), baseado na freqüência de inundação pelas preamares, índices pluviométricos e na drenagem terrestre, classificou os manguezais em duas zonas: a primeira, denominada zona externa, em que há predominância de processos estuarinos na franja do bosque, onde as componentes principais no balanço hídrico são as características da água gerada por processo de mistura entre as marés semi-diurnas e a água doce proveniente do estuário, oriunda dos rios; a segunda, zona interna, que édominada por processos terrígenos, dependendo das variações estacionais, tanto nas classes de inundação, quanto na descarga dos rios associados. Estas zonas são compatíveis com o observado neste transecto, de forma que tais características do meio abiótico representam condicionantes importantes para a estruturação das comunidades de foraminíferos, como será visto adiante. 16 Tabela 2. Valores das variáveis abióticas medidas na água intersticial dos sedimentos para as campanhas de dezembro/2001 (presente neste trabalho) e de junho/2002 (SEMENSATTO-JR. et al., 2009). Variável Campanha Ponto de coleta P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 pH Dez/01 6,9 6,8 6,7 7,2 7 6,6 7,1 7 Jun/02 6,8 7,2 7,2 6,8 7,1 6,9 7,1 6,8 Condutividade (mS/cm) Dez/01 43,4 48,6 41,7 42,0 33,3 39 29 5,1 Jun/02 - - - - - - - - Oxigênio Dissolvido (mg/L) Dez/01 1,6 1,6 1,6 1,5 1,7 1,7 1,7 1,9 Jun/02 0,1 0,1 0,1 0 0,3 0,4 0,2 0,2 Temperatura (oC) Dez/01 27 28 27 28 26 26 26 26 Jun/02 23 22 23 23 22 22 21 22 Salinidade (‰) Dez/01 28,2 31,8 26,6 27,4 21 24,9 18,1 2,6 Jun/02 27,1 22,4 26,4 25,6 23 27 17 0,09 5.2 Variáveis Bióticas Foram triados e identificados 778 espécimes de foraminíferos, representados por 21 espécies de 16 gêneros, todas aglutinantes (Tabela3).As espécies encontradas neste trabalho e não reportadas por SEMENSATTO-JR. et al. (2009) são Ammodiscus sp., Ammotiumangulatum, Ammotiumsalsum, Astramminasp., Jadamminamacrescens, Monotalea salsa,Polysaccamminahyperhalina, Trochamminita salsa e Trochamminaochracea. Por outro lado, as espécies reportadas por SEMENSATTO-JR. et al. (2009) e não observadas nas presentes amostras foram Acostatamariae, Ammoscalariasp.,Ammotiumdirectum, Glomospiragordialis, Haplophragmoideswilberti, Paratrochamminaclossi, Textulariaearlandie Warrenita palustris. No entanto,com exceção de A. salsume T. earlandi,todas apresentam uma redução de abundância relativanas suas respectivas amostras. 17 Tabela 3. Abundância relativa das espécies encontradas nas amostras coletadas em dezembro de 2001 e aqui estudadas (em negrito, valores mais altos). Atributos sinecológicos quantitativos verificados em relação às amostras coletadas em dez/2001(este trabalho) e em jun/2002 (SEMENSATTO-JR. et al., 2009). N: abundância absoluta da amostra; S: riqueza de espécies; H’: diversidade de Shannon; J: equitatividade de Pielou; 1-B: distância (similaridade) de Bray-Curtis entre as amostras deste trabalho e as correspondentes reportadas por SEMENSATTO-JR et al. (2009). Espécie P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 Ammobaculitesexiguus 0,09 0,04 0,05 0,03 0,02 0,02 · · Ammodiscussp. 0,04 0,01 · · · 0,01 · · Ammotiumangulatum 0,01 · · · · · · · Ammotiumcassis 0,15 0,19 0,13 0,13 0,08 0,02 · · Ammotiummorenoi 0,03 0,03 0,02 0,06 0,08 0,13 · · Ammotiumpseudocassis 0,01 · · 0,01 0,01 0,02 · · Ammotiumsalsum 0,26 0,18 0,15 0,02 0,07 0,06 · · Arenoparrella mexicana 0,06 0,16 0,14 0,17 0,01 0,03 · · Astramminasp. · · · 0,01 · · · · Blysmmasphera brasiliensis · · 0,01 0,01 · · · · Caroniaexilis 0,19 0,13 0,04 0,03 · 0,02 · · Haplophragmoidesmanila ensis · · · · · 0,01 · · Jadamminamacrecens · · · 0,02 · · · · Miliammina fusca 0,03 0,04 0,13 0,31 0,17 0,46 1,00 1,00 Monotalea salsa 0,02 0,02 0,00 0,01 0,06 0,02 · · Polyssaccamminahyperha lina · 0,05 0,02 · 0,03 · · · Siphotrochamminalobata · 0,01 0,01 · 0,02 0,01 · · Tiphotrochacomprimata 0,02 0,01 0,03 0,01 0,03 0,03 · · Trocamminita salsa · 0,01 0,03 · · · · · Trochamminainflata 0,09 0,15 0,25 0,19 0,41 0,18 · · Trochamminaochracea 0,01 · · · 0,03 0,01 · · N 104 108 107 104 106 114 122 13 S (dez/2001) 14 14 14 14 13 15 1 1 S (jun/2002) 17 12 12 11 9 4 7 2 H’ (dez/2001) 2,16 2,19 2,14 1,99 1,95 1,81 0,00 0,00 H’ (jun/2002) 2,07 1,75 1,34 1,75 1,63 0,67 0,87 0,00 J (dez/2001) 0,82 0,83 0,84 0,75 0,76 0,67 0,00 0,00 J (jun/2002) 0,73 0,71 0,54 0,73 0,74 0,49 0,45 0,00 1-B 0,24 0,38 0,35 0,58 0,68 0,27 0,69 1,00 O enquadramento sistemático das espécies está baseado nos trabalhos de LOEBLICH & TAPPAN (1988) e de BRÖNNIMANN et al. (1992a,b), conforme a Tabela 4. Dos 8 pontos amostrais, somente o P8 não foi levado em consideração para o estudo dos atributos 18 sinecológicos quantitativos, devido ao fato de apresentar abundância absoluta total da amostra igual a 13 indivíduos. Apesar disso, este ponto foi considerado na análise qualitativa, pois todos os indivíduos encontrados pertencem à espécie Miliammina fusca. Este ponto está localizado praticamente no limite da transição com a restinga, local significativamente estressante para a colonização dos foraminíferos, conforme observado por uma série de autores (SCOTT & MEDIOLI, 1980; JENNINGS & NELSON, 1992; SCOTT et al., 1995), e marca de modo muito consistente o limite máximo do nível da zona entremarés, independentemente do regime de salinidade do ambiente em questão. Além disso, o resultado ora reportado reforça o caráter euritópico e oportunista da espécie M. fusca, que domina ambientes desfavoráveis a praticamente todas as outras espécies de foraminíferos, mesmo que em baixa abundância. A espécie mais abundante de todas as amostras foiM. fusca, correspondendo a 32,03% do total de indivíduos encontrados, a qual é a única presente em todas as amostras e dominante em quatro amostras das oito coletadas (P4,P6,P7 e P8), seguida de Trochamminainflata, com 17,64% de todos os indivíduos, dominando as amostras P3 e P5; Ammotiumsalsum, com10,2%, representada com maior abundância relativa na amostraP1, em associação com outras espécies do gênero Ammotium, Ammotiumcassis com 9,67%, predominante na amostraP2 e, por fim, Arenoparrella mexicana com 7,84% do total de indivíduos, porém sem dominar nenhuma amostra(Tabela 04). Estas cinco espécies somadas correspondem a 77,36% do total de indivíduos, em que se observa claramente de cada uma as regiões de maior preferência para colonização (Figura 04). Enquanto o gênero Ammotium está concentrado na porção topograficamente mais baixa do perfil, próxima à margem da baía, e progressivamente reduz sua abundância em direção à transição com a restinga, a espécie M. fusca exibe comportamento diametralmente oposto, porém com maior abundância relativa do que qualquer outra espécie quando é a dominante. Já as espécies T. inflatae A. mexicana alcançam sua maior abundância na porção intermediária do perfil, sendo que T. inflata chega a dominar amostras neste intervalo. 19 Tabela 4. Enquadramento sistemático das espécies de foraminíferos encontradas no perfil ao norte da “Ilha do Cardoso”, na coleta de dezembro de 2011. Subordem Família Espécie ALLOGROMIINA Lagynidae Blysmmasphera brasiliensis Loeblich&Tappan, 1961 Schultze, 1854 Acupeinidae Ammobaculitesexiguus Brönnimann&Zaninetti, 1984 Ammotiumangulatum Ammotiumcassis Ammotiidae Ammotiummorenoi Brönnimann et al., 1992 Ammotiumpseudocassis Ammotiumsalsum TROCHAMMININA Brönnimann&Whittaker, 1988 Arenoparrella mexicana Siphotrochamminalobata Tiphotrochacomprimata Trochamminidae Trocamminita salsa Schwager, 1877 Trochamminainflata Trochamminaochracea Jadamminamacrescens Miliammina fusca Haplophragmoidesmanilaensi s Caroniinae Caroniaexilis Brönnimann, Whittaker&Zaninetti, 1988 TEXTULARIINA Delage&Hérouard, 1896 Polysaccamminidae Polysaccamminahyperhalina Loeblich&Tappan, 1984 SPIROPLECTAMMININA Textulariopsidae Monotalea salsa Brönnimann, Whittaker&Zaninetti, 1992 Brönnimann, Whittaker&Zaninetti, 1992 SACCAMMININA Saccamminidae Astramminasp. Rhumbler, 1931 Rhumbler, 1931 AMMODISCINA Ammodiscidae Ammodiscus sp. Reuss, 1862 Reuss, 1862 20 Estampa I: Foraminíferos fotografados a partir de microscópio eletrônico de varredura (MEV). 1: Ammotium cassis 2:Ammotium salsum 3: Miliammina fusca 4: Caronia exilis 5: Trochammina inflata 6: Jadamminamacrescens 7: Astrammina 8: Ammodiscus sp. 9: Blysmmasphera brasiliensis 10: Arenoparrella mexicana. 21 A abundância de T.inflataé crescente conforme se aproxima da transição com a restinga, sendo substituída no P6porM. fusca,que então domina até o P8. De acordo com HAYWARD & HOLLIS (1994) e DEBENAY et al. (2002), T.inflataé uma espécie resistente à exposição subaérea e consegue colonizar áreas mais elevadas da zona entremarés; porém, nas amostras de dezembro de 2001, a única espécie nestes níveis éM. fusca, devido principalmente aos baixos valores de salinidade. Neste sentido, M. fusca parece apresentar baixa capacidade competitiva, pois quando as condições ambientais são mais favoráveis a outras espécies, ela é substituída na dominância da comunidade. Quando as duas campanhas são comparadas em termos das espécies mais abundantes, um detalhe importante entre as proporções de M. fusca e T. inflata merece destaque. Enquanto que neste trabalho verificou-se que no verão, dezembro/2001- período chuvoso, M. fusca e T. inflata corresponderam, respectivamente, a 32,03 e 17,64% dos indivíduos, as proporções reportadas por SEMENSATTO-JR. et al. (2009) são exatamente inversas, ou seja, em junho de 2002 – período mais seco -M. fusca e T. inflata representaram, respectivamente,16,94 e 34,62% das tecas. Assim, a diferença parece ser devida à sazonalidade (diferença de pluviosidade entre o verão e o inverno). No verão, a salinidade na água intersticial dos sedimentos tende a ser mais diluída, o que deve contribuir para o avanço da colonização de M. fusca e seu expressivo aumento na abundância de tecas. Já no inverno, no período de estiagem, a diluição da salinidade na água intersticial do sedimento é menor, o que causa a redução pela metade na abundância de tecas de M. fusca e a criação de condições mais favoráveis a T. inflata. Figura 04. Abundância relativa das cinco espécies mais abundantes do perfil, distribuídas nas amostras de dezembro de 2001, verão, chuvoso. 22 Em termos de diversidade e equitatividade, o ponto P2 apresenta os maiores valores, enquanto que P7 e P8apresentam os menores valores (iguais a zero), essencialmente porque esses pontos são colonizados unicamente por M. fusca. No entanto, observa-se que, de um modo geral, ambos os índices tendem a diminuir seus valores da margem para a transição do perfil. O mesmo padrão foi encontrado por SEMENSATTO-JR. et al. (2009), porém com valores geralmente menores, o que pode estar relacionado à flutuação sazonal das variáveis abióticas, que por sua vez devem influenciar a estrutura das comunidades. O transecto é claramente dividido em dois compartimentos, assim como observado por SEMENSATTO-JR. et al. (2009): o inferior (até 120 m – P1 a P4) e o superior (de 120 m a 340 m – P5 a P8). Na planície inferior há menor exposição subaérea e o sedimento é lamoso, representado principalmente por A. cassis, A. salsum, A. mexicana, C. exilis e T. inflata. Na planície superior há maior tempo de exposição subaérea e o sedimento é arenoso, cujas espécies mais importantes sãoM. fuscae T. inflata.SCOTT et al. (1996), em estudo realizado em marismas do Oceano Pacífico, também observaram exatamente estas duas espécies como dominantes nos níveis mais altos da zona entremarés, com a ocorrência concomitante do gênero Haplophragmoides. Todavia, no perfil aqui estudado Haplophragmoidesapresenta-se com baixíssima abundância relativa. As composições de espécies principais dos dois compartimentos são praticamente as mesmas entre as duas campanhas de campo, embora haja algumas diferenças entre as espécies menos abundantes, o que interfere nos valores de diversidade, equitatividade e similaridade.Em comparação com os resultados de junho de 2002, observa-se que a planície superior manteve-se praticamente inalterada em termos de composição de espécies, o que indica não haver mudanças sazonais significativas. Neste compartimento, os valores de similaridade são mais altos, próximo a 0,7. De fato, como os níveis mais elevados da zona entre-marés com baixa salinidade apresentam condições desfavoráveis aos foraminíferos, muito poucas espécies são capazes de colonizá-los, o que redunda em pouca variação da composição de espécies nestes tipos de ambientes.Deste ponto de vista, essas comunidades são boas indicadoras do nível relativo do mar porque apresentam pouca variação tanto temporal como espacial, uma vez que o padrão se repete em um grande número de áreas. De outro lado, as amostras da planície inferior foram mais variáveis sazonalmente em termos da composição de espécies, pois os valores de similaridade em geral são bem menores do que os da planície superior. Considerando-se as espécies que ocorreram exclusivamente em dezembro/2001 e junho/2002, observa-se que é justamente nas amostras da planície inferior que elas estão mais concentradas. 23 6- CONCLUSÕES M. fuscaé a única espécie presente em todos os pontos do perfil, tanto nesta campanha como na de junho/2002. Esse fato ressalta seu caráter euritópico, além do caráter oportunista pelo padrão de ser mais abundante onde há menor riqueza de espécies. A alternância de dominância de M. fusca em dezembro/2001 para T. inflata em junho/2002, em que uma apresenta o dobro da abundância relativa da outra em cada estação, se deve provavelmente ao efeito sazonal da pluviosidade, que ora favorece M. fusca pela diluição da salinidade do sedimento no verão, e ora favorece T. inflata pela menor diluição da salinidade do sedimento no inverno. De modo geral, a diversidade de espécies diminui conforme se aproxima da transição com a terra firme. O mesmo padrão foi encontrado para as amostras de junho de 2002. A baixa diversidade e o emprobrecimento da microfauna são ocasionados pelo confinamento do ambiente e da baixa salinidade, que representam condições estressantes para os foraminíferos.A exposição subaérea e a salinidadesão os principais controladores das espécies e da estrutura das comunidades na zona entremarés. A área apresenta boas condições de conservação e os resultados aqui reportados podem oferecer informações úteis aos estudos de bacia, sobretudo quando o foco das reconstruções paleoambientais recair sobre sistemas proximais estuarinos; também podem oferecer subsídios ao diagnóstico do estado de áreas litorâneas. Estes dois aspectos interessam ao Setor de Petróleo e Gás. 24 REFERÊNCIAS ALVE, E. Benthicforaminiferal responses toestuarinepollution: a review. JournalofForaminiferalResearch, v. 25, n. 3, p. 190-203, 1995. ARMSTRONG, H. A.; BRASIER, M. D. Microfossils, 2ª edição, p. 142 – 187, 2005. BÉRGAMO, A.L.Características da hidrografia, circulação e transporte de sal: Barra de Cananéia, Sul do Mar de Cananéia e Baía de Trapandé. Dissertação (Mestrado em Oceanografia). Instituto Oceanográfico, Universidade de São Paulo, São Paulo, 254p., 2000. BOLTOVSKOY, E.; GIUSSANI, G.; WATANABE, S.; WRIGHT, R. Atlas of benthic shelf foraminifera of the Southwest Atlantic. Dr. W. JunkbvPublishers, The Hague, 147p., 1980. BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Especificações e normas técnicas para elaboração de cartas de sensibilidade ambiental para derramamentos de óleo. 107p., 2004. BRÖNNIMANN, P.; WHITTAKER, J.E.; ZANINETTI; L. Brackish water foraminifera from mangrove sediments of Southwestern VitiLevu, Fiji Island, Southwest Pacific. Revue de Paléobiologie, v. 11, n.1, p.13-65, 1992a. BRÖNNIMANN, P.; WHITTAKER, J.E.; VALLERI, G. Agglutinated foraminifera from the lagoon of Venice, Italy.Revue de Paléobiologie, v. 11, n. 1, p. 97-109, 1992b. CINTRÓN, G.; SCHAEFFER-NOVELLI, Y. Factoresabioticos. In: Introducción a la ecologia delmanglar. UNESCO-ROSTLAC. p.19-29, 1983. CLOSS, D. Foraminíferos e Tecamebas da Lagoa dos Patos (RS). Boletim da Escola de Geologia de Porto Alegre, n. 11, p. 1-130, 1962. COELHO-JR., C. Ecologia de manguezais: zonação e dinâmica da cobertura vegetal em gradientes ambientais. Tese de doutorado (Oceanografia Biológica). Universidade de São Paulo, Brasil, 166 p.,2003. COELHO-JR., C. Gradiente de inundação pelas marés e drenagem terrestre sobre o comportamento da salinidade intersticial de bosque de mangue de Cananéia, São Paulo, Brasil. Revista de Gestão Costeira Integrada, n. especial 2, p. 2 -10, 2010. COELHO-JR., C. Manguezal, desenvolvimento estrutural da cobertura vegetal ao longo de gradientes de inundação – Cananéia, Estado de São Paulo, Brasil. Dissertação (Oceanografia Biológica). Universidade de São Paulo, São Paulo, 108p., 1998. DEBENAY, J.P.; GUIRAL, D.; PARRA, M. Ecologicalfactorsactingonthe microfauna in mangrove swamps. The case of foraminiferalassemblages in French Guiana.Estuarine, Coastal and Shelf Science, v. 55, n. 4, p. 509-533, 2002. FATELA, F.; TABORDA, R. Confidence limits of species proportions in microfossil assemblages.Marine Micropaleontology, v. 45, p. 169-174, 2002. 25 GOMES, F. H.; VIDAL-TORRADO, P.; MACÍAS, F.; SOUZA-JÚNIOR, V. S.; PEREZ, X. L. O. Solos sob vegetação de restinga na Ilha do Cardoso (SP).I- Caracterização e classificação. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 31, n. 6, p. 1563-1580, 2007. HAMMER, Ø.; HARPER, D.A.T.; RYAN, P. D. PAST: Paleontological Statistics Software Package for Education and Data Analysis. Palaeontologia Electronica, v. 4, n. 1, p. 1-9, 2001. HAYWARD, B.W.; HOLLIS, C.J. Brackish foraminifera in New Zealand: A taxonomic and ecologic review. Micropaleontology, v. 40, p 05-222, 1994. HORTON, B.P., EDWARDS, R. J. Quantifying Holocene sea-level change using intertidal foraminifera: lessons from the British Isles. Special Publication No. 40, Cushman Foundation forForaminiferal Research, Washington, 97 p., 2006. HORTON, B. P.; MURRAY, J. W. The role of elevation and salinity as primary controls on living foraminiferal distributions: Cowper Marsh, Tees Estuary, UK. Marine micropaleontology, v. 63, p. 169-186, 2007. JENNINGS, A. E.; NELSON, A. R. Foraminiferal assemblage zones in Oregon tidal marshes – Relations to marsh floral zones and sea level.JournalofForaminiferalResearch, v. 22, n. 1, p. 13-29, 1992. JIMENEZ, J. A. El manejo de losmanglaresenel Pacífico de Centro América:Usostradicionales y potenciales, p. 275-290, 1999. In: Yáñez-Arancibia, A.; Lara- Domínguez, A. L.(eds) Ecosistemas de manglaren América Tropical, Instituto de Ecología, México, UICN/HORMA, Costa Rica, NOAA/ NMFS, Silver Spr MD, EUA. 380p. JIMENEZ, J. A. Ambiente, distribución y características estructuralesenlosmanglaresdel Pacífico Centro América: contrastes climáticas, p 51-70, 1999. In: Yánez-Arancibia A, Lara- Dominguez A L (eds) Ecossistemas de manglaren América Tropical. Instituto de Ecologia, México, UICN/ORMA, Costa Rica, NOAA/NMFS Silver Spring MD USA 380p. LOEBLICH-JR., A.R.; TAPPAN, H. Foraminiferal genera and their classification.New York: Van NostrandReinhlod, 1988. 970 p. + 212 p., 847 pls. MAGURRAN, A.E. Measuring Biological Diversity. Oxford: Blackwell Publishing, 264p.,2003. McMILLAN, R.A. Monitoring bioremediation after oil spills, old and new, using marsh foraminifera as indicators.60 f. + apênd. Monografia (Bacharelado em Ciências). DalhousieUniversity, Halifax, Canadá, 2002. MELO, M.R.F.; MANTOVANI, W. Composição florística e estrutura fitossociológica da mata atlântica de encosta na Ilha do (Cananéia, SP. Brasil). Boletim do Instituto de Botânica, v. 9, p. 107-158, 1994. MESQUITA, A. L.; HARARI, J. Tidesandtidegaugesof Cananéia and Ubatuba - Brasil (Lat 24◦). Relatório Interno do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, v.11, p. 1– 14, 1983. 26 MURRAY, J. Ecology and applications of benthic foraminifera. Cambridge: Cambridge University Press, 426p.2006. PETRI, S.; FULFARO, V.J. Nota sobre a geologia e terraços marinhos da Ilha do Cardoso. Notícias Geomorfológicas, v. 10, n. 20, p. 21–31, 1970. SABEAN, J.A. Monitoringoilspillbioremediationusingmarshforaminifera as indicators. 131 f. + apênd. Monografia (Bacharelado em Ciências). Dalhousie University, Halifax, Canadá, 2001. SAENGER, P.; HEGERL, E. J.; DAVIE, J. D. S. Global status of mangrove ecosystems.CommissiononEcologypapers, n.3, 1983. SAMPAIO, D; SOUZA, V. C.; OLIVEIRA, A. A.; PAULA-SOUZA, J. Árvores de restinga: guia ilustrado para identificação das espécies da Ilha do Cardoso. São Paulo, Ed. Neotrópica, 277p., 2005. SANT’ANNA-NETO, J. L. Dinâmica atmosférica e o caráter transicional do clima na zona costeira paulista. Revista Departamento de Geografia. São Paulo, v.8, p. 34-49, 1994. SANTA-CRUZ, J. Foraminíferos atuais em um manguezal impactado por petróleo 20 anos atrás: Rio Iriri,Canal de Bertioga, Santos-SP.2004, 142 f. Dissertação de mestrado (Geociências e Meio Ambiente). Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2004. SCHAEFFER-NOVELLI, Y. Manguezais brasileiros. Tese de Livre Docência. Universidade de São Paulo, Instituto Oceanográfico, 2 vols., 1991. SCHAEFFER-NOVELLI, Y.; MESQUITA, H.S. L.; CINTRÓN-MOLERO, G. The Cananéia Lagoon-Estuarine System, São Paulo, Brasil. Estuaries, v.2, n.13, p. 193-203, 1990. SCOTT, D.B., COLLINS, E.S., DUGGAN, J., ASIOLI, A., SAITO, T., HASEGAWA, S. Pacific rim marsh foraminiferal distributions: implications for sea-level studies. Journal of Coastal Research, v. 12, n. 4, p. 850-861, 1996. SCOTT, D. B.; HASEGAWA, S.; SAITO, T.; ITO, K.; COLLINS, E. Marsh foraminiferal and vegetacion distributions in Nemuro Bay wetland areas, eastern Hokkaido. Transactions and Proceedings of the Paleontological Society of Japan.N. S., n. 180, p. 282 – 295, 1995. SCOTT, D.B.; MEDIOLI, F.S. Living vs. total foraminiferal populations: their relative usefulness in Paleoecology. JournalofPaleontology, v. 54, n. 4, p. 814-831, 1980. SEMENSATTO-JR, D. L. O sistema estuarino do delta do Rio São Francisco (SE): análise ambiental com base no estudo de foraminíferos e tecamebas. Tese de Doutorado (Geociências e Meio Ambiente). Universidade Estadual Paulista, Rio Claro. 223p., 2006. SEMENSATTO-JR., D. L.; ARAÚJO, G. C. L.; FUNO, R. H. F.; SANTA-CRUZ, J.; DIAS- BRITO, D. Metais e não-metais em sedimentos de um manguezal não-poluído: Ilha do Cardoso, Cananéia (SP). Pesquisas em Geociências (Online), v. 34, p. 25-31, 2007. 27 SEMENSATTO-JR., D. L.; FUNO, R. H. F.; DIAS-BRITO, D.; COELHO-JR., C. Foraminiferalecologicalzonationalong a Brazilian mangrove transect: Diversity, morphotypesandtheinfluenceofsubaerialexposure time. Revue de Micropaléontologie, v. 52, p. 67-74, 2009. SUGUIO, K.; MARTIN, L. Formações quaternárias marinhas do litoral paulista e sul fluminense. In: International Symposium On Coastal Evolution In The Quaternary, 1., São Paulo, Anais. São Paulo, IGUSP, 55p. 1978. YANKO, V.; KRONFELD, J.; FLEXER, A. Response of benthic foraminifera to various pollution sources: implications for pollution monitoring. Jounal of Foraminiferal Research, v. 24, n. 1, p 1-17, 1994.                  Prof. Dr. Décio Luis Semensatto Junior (orientador)                  Prof. Dr. Dimas Dias‐Brito (co‐orientador)                       Renata Figueiredo Buffa (Discente)