Gabriel Gouvêa Slade Modelos mecânicos para o estudo da dinâmica do DNA São José do Rio Preto - SP 2013 Gabriel Gouvêa Slade Modelos mecânicos para o estudo da dinâmica do DNA Tese apresentada como parte dos requisitos para a ob- tenção do t́ıtulo de Doutor em Biof́ısica Molecular, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biof́ısica Molecular, Área de Concentração - Biof́ısica Mole- cular, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Orientador: Prof. Dr. José Roberto Ruggiero Coorientador: Prof. Dr. Elso Drigo Filho São José do Rio Preto - SP 2013 Slade, Gabriel Gouvêa. Modelos mecânicos para o estudo da dinâmica do DNA / Gabriel Gouvêa Slade. -- São José do Rio Preto, 2013 56 f. : il., gráfs., tabs. Orientador: José Roberto Ruggiero Coorientador: Elso Drigo Filho Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas 1. Biologia molecular. 2. Biofísica. 3. Dinâmica molecular. 4. DNA. 5. DNA superhelicoidal. I. Ruggiero, José Roberto. II. Drigo Filho, Elso. III. Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho". Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas. IV. Título. CDU – 577.3 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IBILCE UNESP - Campus de São José do Rio Preto Modelos mecânicos para o estudo da dinâmica do DNA Tese apresentada como parte dos requisitos para a ob- tenção do t́ıtulo de Doutor em Biof́ısica Molecular, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biof́ısica Molecular, Área de Concentração - Biof́ısica Mole- cular, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Comissão Examinadora Prof. Dr. José Roberto Ruggiero UNESP - São José do Rio Preto Orientador Prof. Dr. Gerald Weber UFMG - Belo Horizonte Prof. Dr. Antonio Caliri USP - Ribeirão Preto Prof. Dr. Edson Denis Leonel UNESP - Rio Claro Prof. Dr. Jorge Chahine UNESP - São José do Rio Preto São José do Rio Preto - SP 13 de Setembro de 2013 Agradecimentos A minha esposa Natália por todo o seu incentivo, carinho e paciência durante esta jornada, além do pequeno Estevão, que é uma graça em nossas vidas. Aos meu pais, avós e irmão que não mediram esforços para me dar toda a educação necessária para chegar até aqui, além de serem um exemplo para mim. Aos meus amigos que sempre estiveram presentes nessa caminhada e compartilharam das minhas alegrias e tristezas ao longo desses anos. Aos professores do departamento, que foram fundamentais na minha formação. Aos meus orientadores Prof. Dr. José Roberto Ruggiero e Prof. Dr. Elso Drigo Filho, por toda amizade e dedicação durante esses anos, sempre buscando o meu melhor aprendizado. A Dra. Sarah Harris, Dra. Agnes Noy e ao Thana Sutthibutpong (James), pelo acolhimento, aprendizado e amizade durante minha estadia na University of Leeds. Ao CNPq e a CAPES pelo suporte financeiro. A Deus por tudo que tem feito na minha vida. Resumo O comportamento dinâmico do DNA apresenta movimentos de grande amplitude e loca- lizados ao longo da cadeia, contendo inclusive aberturas locais de pares de bases. Esse comportamento está relacionado com aspectos funcionais da molécula, como por exem- plo a transcrição e a replicação. Neste trabalho, procuramos compreender essa dinâmica através da criação e estabilidade de breathers no modelo de Peyrard-Bishop. Estudamos a influência da variação de energia em uma estrutura de breather estável e por meio da dinâmica do modelo, inferimos a densidade de energia necessária para que ocorra a transição de fase do sistema, ou seja, a desnaturação do DNA de forma minimalista. Na sequência do trabalho, utilizamos de dinâmica molecular no ńıvel de representação atômica para relacionar o modelo mecânico com a dinâmica in silico do sistema. Por fim, verificamos a instabilidade da dupla hélice do DNA, quando a molécula é submetida a um estresse torcional. Palavras chaves: Breather, modelo de Peyrard-Bishop, transição de fase, dinâmica molecular do DNA, DNA super enrolado. I Abstract The dynamic behavior of the DNA shows motions of great amplitude and localized by the chain. The motions are even capable to open a single base pair on its biological tempe- rature. This behavior is related to functional aspects of the molecule, like transcription and replication. In this work, we aim to understand this dynamic through the creation of breathers and its stability in the Peyrard-Bishop model. We study the influence of the energy change in a stable breather solution. By the dynamic of the model, we infer the energy density that is needed to happen the phase transition in the system, that is, the DNA denaturation in a minimalistic view. In the sequence, we use atomistic molecular dynamics to relate the mechanical model with the in silico dynamic of the system. In the end, we verify the DNA double helix instability through induced torsional stress. Keywords: Breather, Peyrard-Bishop model, phase transition, DNA molecular dy- namics, DNA supercoiling. II Lista de Figuras 2.1 Parâmetros internos para a caracterização de um par de bases (esquerda - cada base é tratada como um corpo ŕıgido) e entre pares de bases adjacentes (direita - cada par de bases é tratado como um corpo ŕıgido). Figura adaptada de [32]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 2.2 Duas curvas fechadas com Lk = 7. Esse número de ligação é encontrado contando o número de cruzamentos existente entre as curvas e dividindo esse valor por dois. Figura adaptada de [33]. . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 2.3 DNA modelado como uma única fita. Na primeira imagem a fita está torcida com Tw = 1. Em seguida, se une as pontas formando uma curva fechada com Lk = 1. Sem desconectar as pontas, é posśıvel formar uma figura em oito Wr = 1, convertendo a torção em contorção. . . . . . . . . . 8 3.1 Representação do modelo de Peyrard-Bishop. . . . . . . . . . . . . . . . . 10 3.2 Representação do modelo que emerge do Lagrangiano Ly. . . . . . . . . . . 11 3.3 Representação do potencial de Morse. Valor assintótico da energia, ou seja, D = 0, 5u.a.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 3.4 Amplitude de cada oscilador no instante t = 0. Frequência wb = 0, 8 e acoplamento igual a: a) C = 0 e b) C = 0, 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 4.1 Valor absoluto dos multiplicadores de Floquet em função do parâmetro de acoplamento C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 4.2 Representação dos multiplicadores de Floquet, com as respectivas assina- turas de Krein (+ → κ = +1, X → κ = −1 e O → κ = 0), para os diferentes valores de acoplamento. a) C = 0, b) C = 0,1, c) C = 0,1297 (casos estáveis) e d) C = 0,13 (caso instável). . . . . . . . . . . . . . . . . 22 4.3 Energia de cada oscilador em função do tempo. C = 0,1 e wb = 0,8. . . . . 23 III 4.4 a) Fração de osciladores com valores de energia significativa em função da energia do sistema. b) Detalhe da Figura “a”. . . . . . . . . . . . . . . . . 24 4.5 Módulo G(w) da transformada complexa de Fourier do décimo primeiro oscilador. a) E = 0,0556, nosc = 0,684 e C = 0,1; b) E = 1,5, nosc = 0,251 e C = 0,1; c) A representação do ramo óptico e d) A representação do ramo acústico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 4.6 a) Posição de cada oscilador sobreposta como função do tempo. b) Detalhe da região onde ocorre a quebra do potencial onsite. N = 21 e E N = 0,7857. 27 4.7 Potencial onsite de cada oscilador. A coloração preta indica que o oscilador está ligado pelo potencial de Morse, enquanto que a branca representa que o oscilador atingiu o platô do potencial. N = 21 e E N = 0,881. . . . . . . . 27 4.8 Tempo necessário para ocorrer a transição de fase em função da densidade de energia. N = 21. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 6.1 Taxa de crescimento dos parâmetros rise e stretch em função da tempera- tura, para as sequências poli(TA) e poli(CG). . . . . . . . . . . . . . . . . 36 6.2 Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 30◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. . . . . . . 38 6.3 Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 29◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. . . . . . . 39 6.4 Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 28◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. . . . . . . 39 6.5 Visualização inicial da estrutura circular do DNA com diferentes densidades de super hélice. a) Molécula relaxada (σ = 0) com 108 pares de base e dez voltas, b) Molécula com σ = −0.05 contendo 102 pares de base e nove voltas e c) Molécula com σ = −0.1 contendo 108 pares de base e 9 voltas. . 40 6.6 Visualização inicial da estrutura circular do DNA para as diferentes si- mulações realizadas para a estrutura com 108 pares de base e 9 voltas. A seta indica a região que contêm a sequência ...TATATA... (região 1). a) Sequência g108A, b) Sequência g108B e c) Sequência g108C. A cor laranja representa nucleot́ıdeos formados por Adenina, a cor verde para Timina, a cor azul para Citosina e a cor vermelha para Guanina. . . . . . . . . . . . 41 IV 6.7 Gráfico de superf́ıcie em escala de cores que mostra a evolução temporal da porcentagem de ocupação das ligações de hidrogênio de cada par de bases. A cor vermelha indica que todas as ligações estão formadas durante cada nano segundo de simulação. Já a cor azul indica que todas as ligações que formam o par de bases estão desfeitas. As figuras a), b) e c) representam estruturas relaxadas (σ = 0, 0). Para as figuras d), e) e f) representam estruturas com σ = −0, 05. Enquanto que as figuras g), h) e i) são de estruturas com σ = −0, 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 6.8 Visualização dos defeitos estruturais gerados na dupla hélice do DNA du- rante a simulação por dinâmica molecular. a) Estado transiente, b) Kink do tipo II, c) Bolha de Desnaturação e d) Despareamento dos pares de base. 46 V Lista de Tabelas 5.1 Protocolo para equilibração das simulações. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 6.1 Sequências das cadeias de DNA utilizadas nas simulações . . . . . . . . . . 42 VI Sumário Resumo I Abstract II Lista de Figuras III Lista de Tabelas VI 1 Introdução 1 2 Aspectos estruturais do DNA 4 2.1 Caracteŕısticas gerais da molécula . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 2.2 Descritores da estrutura em hélice e Parâmetros dos pares de base . . . . . 5 2.3 Empacotamento e aspectos topológicos do DNA . . . . . . . . . . . . . . . 7 3 Modelos mecânicos para o DNA 9 3.1 O modelo de Peyrard-Bishop . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 3.2 Potencial de Morse . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 3.3 Criação do Breather . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 3.4 Estabilidade do breather . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 4 Resultados para modelos mecânicos do DNA 20 4.1 Influência da variação de energia no breather . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 4.2 Densidade de energia e transição de fase no modelo de Peyrard-Bishop . . 25 5 Dinâmica molecular atomı́stica do DNA 29 5.1 Dinâmica molecular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 5.2 Metodologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 VII 6 Resultado das simulações do DNA por dinâmica atomı́stica 35 6.1 Relacionando dinâmica molecular com modelos minimalistas para o DNA . 35 6.2 Bolhas de desnaturação por estresse torsional induzido . . . . . . . . . . . 37 7 Conclusões 47 Referências Bibliográficas 50 A Parâmetros do Modelo de Peyrard-Bishop 57 B Publicações 58 VIII Caṕıtulo 1 Introdução O DNA é a molécula que contém a informação genética e é responsável pela transmissão da hereditariedade [1]. A determinação da estrutura em dupla hélice [2] é considerada um marco para o desenvolvimento da biologia molecular. Contudo estudos nas últimas décadas têm revelado que a dinâmica do DNA é rica e essencial para suas funções. A informação genética está armazenada na sequência de pares de bases que, na estrutura de dupla hélice, ficam escondidas no seu interior. As sequências que codificam as protéınas têm que ser lidas, o que exige a exposição das bases à solução. Isso implica movimentos de grande amplitude e uma dinâmica não linear. A estrutura em dupla hélice é, em parte, mantida pelas pontes de hidrogênio entre as bases nitrogenadas, os pares de Watson-Crick: Adenina-Timina (A-T) e Citosina- Guanina (C-G). A absorção na região do UV de uma solução de DNA é fortemente dependente da quantidade de pares de base formados. Isso proporciona uma forma simples de monitorar a separação das fitas, ou a desnaturação do DNA, que pode ocorrer por um ou pela combinação de fatores como a temperatura, pH, concentração salina ou de outros desnaturantes, como a uréia, por exemplo [3]. O modelo de Ising, com dois estados - o par de bases está fechado, ou seja, as pontes de hidrogênio formadas, ou está aberto, com as pontes quebradas - foi proposto há quase meio século [4] e continua sendo implementado e estudado até hoje para explicar a desnaturação do DNA [5]. A desnaturação térmica do DNA representa um problema interessante para os f́ısicos, pois permite ser modulada através de uma transição de fase em uma cadeia unidimensional em termos mesoscópicos [6, 7, 8]. A formação das chamadas bolhas de desnaturação envolvem o rompimento das pontes CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 2 de hidrogênio em regiões localizadas do DNA. Experimentos de troca de prótons [9, 10] re- velam que as flutuações podem ser altamente localizadas, com a possibilidade de abertura de um único par de bases. Estas informações indicam que a dinâmica do DNA, em parti- cular o estudo de modos de vibração localizados em poucos pares de base, é importante para a compreensão destes aspectos. Em sistemas não lineares, breathers são soluções espacialmente localizadas e periódicas no tempo [11, 12]. Esse tipo de solução é gerado pela combinação da discretização e da não linearidade do sistema [13]. A discretização faz com que a banda de dispersão (modos lineares de vibração) seja finita e descont́ınua, enquanto a não linearidade faz com que a frequência passe a ser dependente da amplitude. A existência dessas estruturas localizadas foi demonstrada por Mackay e Aubry [14] e é válida para redes Hamiltonianas de osciladores não harmônicos com acoplamento fraco. Essa prova é baseada no limite do anticont́ınuo, onde inicialmente a interação entre osciladores vizinhos é nula. Mostra- se que a solução encontrada persiste em um espaço de soluções periódicas com o tempo de peŕıodo fixo, além de decáırem exponencialmente no espaço. Em suma, as condições necessárias para a existência de um breather é que nenhum múltiplo inteiro de frequência da solução coincida com algum modo linear de vibração da rede. Soluções do tipo breather têm sido alvo de diversos estudos nas últimas duas décadas [15]. Esses estudos, analisam tanto numérica como analiticamente modos de criar o bre- ather e estudar sua estabilidade para variados sistemas discretos. Além disso, existem alguns trabalhos [16, 17] que estudam o comportamento da interação entre breathers, es- tudando a colisão entre eles, ou a interação dos mesmos com alguma impureza na cadeia, o que pode gerar o aprisionamento desse tipo de solução em uma região espećıfica da rede. Simulação por dinâmica molecular é uma outra ferramenta que vem sendo utilizada para estudar o DNA desde 1983 [18]. Essa técnica permite um olhar microscópico sobre os aspectos estruturais da molécula. Além disso, a análise de dados provenientes da simulação pode fornecer informações a respeito da termodinâmica, cinética e flexibilidade do sistema. Por essa razão, a simulação por dinâmica molecular tem se tornado uma ferramenta extremamente popular para o estudo de biomoléculas [19, 20]. Um dos tópicos que vem sendo estudado por dinâmica molecular do DNA diz res- peito ao DNA super enrolado[21, 22, 23]. Uma vez que o DNA raramente existe como uma molécula linear e relaxada no ambiente celular, este tipo de estudo se torna impor- CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 3 tante para compreender aspectos dinâmicos relacionados ao comportamento desta macro- molécula. O estresse torcional nas estruturas super enroladas é capaz de desestabilizar a estrutura em dupla hélice do DNA [24], podendo promover inclusive o rompimento localizado de alguns pares de base. Este comportamento pode influenciar no reconheci- mento das protéınas em sequências espećıficas do DNA durante os processos de replicação, transcrição e recombinação [25]. Na parte inicial deste trabalho, revisamos aspectos do modelo minimalista de Peyrard- Bishop (PB) [26] e apresentamos formas de estudar a criação e a estabilidade de breathers neste tipo de sistema [27]. Exploramos a influência da variação de energia em uma solução de breather estável e os motivos para a perda da estabilidade [28]. Em seguida, revisamos a transição de fase que ocorre neste modelo unidimensional do ponto de vista dinâmico e inferimos a densidade de energia necessária para ocorrer esse fenômeno [29]. Na continuação do trabalho, estudamos aspectos relativos ao DNA por meio da dinâmica atomı́stica molecular. Em um primeiro momento, procuramos caracterizar os tipos de movimento (transversal ou longitudinal) em diferentes temperaturas e relacionar os re- sultados obtidos in silico com o modelo minimalista estudado nos caṕıtulos iniciais. Em seguida, avaliamos a instabilidade da dupla hélice quando submetida a uma tensão torci- onal e a dependência comportamental do sistema com relação ao tipo de sequência que compõe a macromolécula. Caṕıtulo 2 Aspectos estruturais do DNA Neste caṕıtulo abordamos alguns dos aspectos estruturais e topológicos do DNA. O intuito é propiciar a familiarização de conceitos referentes a essa molécula, que são utilizados nos caṕıtulos seguintes. Para uma compreensão mais aprofundada desses aspectos é recomen- dado os livros textos de Alberts [1] e Schlick [30], diversas vezes citados na escrita desse caṕıtulo. 2.1 Caracteŕısticas gerais da molécula A partir do clássico trabalho de Watson e Crick [2], o modelo em dupla hélice tornou-se base para o estudo do DNA. Cada fita é um poĺımero formado por repetições de nu- cleot́ıdeos unidos por ligações fosfodiesteres. Os nucleot́ıdeos, por sua vez, são compostos por um açucar, a desoxirribose, um grupo fosfato e uma base nitrogenada. Essa última pode ser de dois tipos: as purinas (estruturas com dois anéis aromáticos), a Adenina (A) e a Guanina (G), e as pirimidinas (estrutura com apenas um anel aromático), Citosina (C) e Timina (T) [1]. Os nucleot́ıdeos são covalentemente ligados formando cadeias polinucleot́ıdicas, com um esqueleto fosfato-açúcar a partir da qual as bases se estendem. Esse esqueleto é responsável por manter a estrutura da cadeia externa do DNA. Já as bases encontram-se no interior da dupla hélice e mantém as fitas unidas através de ligações de hidrogênio. As bases purinas preferencialmente se pareiam com a pirimidinas de modo que no DNA natural temos os pares de Adenina e Timina, ligados por duas pontes de hidrogênio, e os de Guanina e Citosina, ligados por três pontes. Esse pareamento de base complementar 4 CAPÍTULO 2. ASPECTOS ESTRUTURAIS DO DNA 5 faz com que o arranjo formado seja o mais favorável energeticamente no interior da dupla hélice. A estrutura helicoidal do DNA ocorre graças a esse pareamento de bases, pelas in- terações existentes entre as bases adjacentes ao longo da cadeia devido a elétrons π dos anéis aromáticos e à hidrofobicidade das bases. Além disso, surgem também as interações com o meio ambiente, como por exemplo, a blindagem eletróstatica dos grupos fosfatos que auxiliam na manutenção da dupla fita. 2.2 Descritores da estrutura em hélice e Parâmetros dos pares de base Apresentamos nesta seção algumas definições e parâmetros utilizados para se obter uma descrição global da estrutura helicoidal do DNA [30]. Os descritores da estrutura em hélice do DNA levam em conta as caracteŕısticas básicas da dupla fita e dentre eles podemos destacar: - Passo de hélice (Ph): mede a distância ao longo da hélice para uma volta completa. - Número de reśıduos por volta (nb): é o número de pares de base para cada volta de hélice completa. -Rise axial ou aumento axial (h): é a distância vertical caracteŕıstica entre os pares de base adjacentes ao longo do eixo da dupla hélice. - Unidade de twist ou rotação por reśıduo (Ω): descreve a rotação caracteŕıstica sobre o eixo global da hélice entre dois pares de base vizinhos. A unidade de twist é definida como Ω = 360◦/nb. As variáveis geométricas apresentadas acima, são necessárias para descrever arranjos locais dos pares de base na dupla hélice do DNA. Esses arranjos formam os chamados parâmetros internos do par de base e os parâmetros entre os pares de base. Pelo fato das bases serem internamente ŕıgidas, é apropriado tratá-las como corpos ŕıgidos, ou seja, sem CAPÍTULO 2. ASPECTOS ESTRUTURAIS DO DNA 6 graus de liberdade internos. Do mesmo modo, apesar da menor rigidez, o par de bases também pode ser tratado como um corpo ŕıgido. Assim, é posśıvel descrever a molécula através da orientação e posição relativa das bases pareadas e dos pares de base vizinhos ao longo da cadeia. Para quantificar estes parâmetros helicoidais, é colocado um conjunto de três eixos ortogonais (base vetorial unitária) para cada corpo ŕıgido. Assim, para as bases de um par de bases ou para o passo entre dois pares de base vizinhos pode ser definido três parâmetros de translação e três parâmetros de rotação para cada eixo ortogonal, como apresentado na figura 2.1. Existem vários programas computacionais que calculam esses parâmetros para as estruturas atômicas, entre eles se destacam o 3DNA e o Curves+ (utilizado nos cálculos realizados na seção de resultados) [31, 32]. Figura 2.1: Parâmetros internos para a caracterização de um par de bases (esquerda - cada base é tratada como um corpo ŕıgido) e entre pares de bases adjacentes (direita - cada par de bases é tratado como um corpo ŕıgido). Figura adaptada de [32]. CAPÍTULO 2. ASPECTOS ESTRUTURAIS DO DNA 7 2.3 Empacotamento e aspectos topológicos do DNA Um dos fatos mais intrigantes com relação ao DNA, diz respeito a alta compactação e organização da molécula no meio celular. Se o conteúdo genômico de cada cromossomo humano for esticado, resulta em 4cm de DNA; e, esticando todos os cromossomos exis- tentes no núcleo celular se obtém um tamanho de quase 2 metros [30]. Lembrando que o tamanho do núcleo eucarioto possui aproximadamente 5µm, nota-se a extrema neces- sidade de ocorrer a condensação do DNA. Esta alta condensação é obtida através do chamado super enrolamento, onde a dupla fita é enrolada no seu próprio eixo. A topologia é uma das principais ferramentas que auxiliam na caracterização ma- temática da estrutura super enrolada do DNA. Uma propriedade topológica importante é o número de ligação (linking number, Lk), que caracteriza a ordem de ligação de duas curvas fechadas e orientadas no espaço. O número de ligação é o número de vezes que duas curvas estão entrelaçadas e pode ser obtido através da contagem do número de cruzamen- tos existente entre as curvas e dividindo esse valor por dois. Na figura 2.2, temos quatorze cruzamentos existentes entre as curvas, portanto Lk = 7. Uma caracteŕıstica importante do número de ligação é o fato de ele ser um invariante topológico, ou seja, mudanças feitas na forma das curvas como esticando ou puxando elas, não altera o número de ligação. Essa quantidade, varia apenas quando as fitas são cortadas e ligadas novamente. Para o DNA em seu estado relaxado, o número de ligação (Lk0) é igual ao número de voltas formadas pela dupla hélice, ou seja, Lk0 = n/nb onde n é o número de pares de bases da molécula. Figura 2.2: Duas curvas fechadas com Lk = 7. Esse número de ligação é encontrado contando o número de cruzamentos existente entre as curvas e dividindo esse valor por dois. Figura adaptada de [33]. CAPÍTULO 2. ASPECTOS ESTRUTURAIS DO DNA 8 Em particular, uma identidade atribúıda a Calugareanu [34] e White [35] é funda- mental para o estudo do DNA super enrolado. Esta identidade relaciona o invariante topológico Lk com as quantidades geométricas torção (twist, Tw) e contorção (writhe, Wr), equação 2.1. A torção mede o número de vezes que a hélice gira em torno do seu eixo. Já a contorção descreve a geometria global da hélice e é dado, essencialmente, pela contagem do número de cruzamentos realizados pela molécula no eixo principal da hélice [36]. A figura 2.3 ilustra essas quantidades geométricas e mostra a conversão de uma torção em uma contorção, para o caso de uma curva fechada com Lk = 1. Lk = Tw +Wr. (2.1) Geralmente, o DNA não é encontrado na sua forma relaxada no núcleo celular, de modo que existe então uma diferença no seu número de ligação, ∆Lk = Lk − Lk0. Essa diferença é frequentemente descrita como uma quantidade normalizada e é conhecida como a densidade de super hélice: σ = ∆Lk Lk0 = Lk − Lk0 Lk0 . (2.2) Figura 2.3: DNA modelado como uma única fita. Na primeira imagem a fita está torcida com Tw = 1. Em seguida, se une as pontas formando uma curva fechada com Lk = 1. Sem desconectar as pontas, é posśıvel formar uma figura em oito Wr = 1, convertendo a torção em contorção. Caṕıtulo 3 Modelos mecânicos para o DNA 3.1 O modelo de Peyrard-Bishop Existem inúmeros modelos mecânicos para descrever a molécula do DNA, cada um con- siderando caracteŕısticas particulares para simular um aspecto espećıfico a ser estudado [37]. Como estamos interessados na formação de estruturas com energia localizada prove- nientes de movimentos de grande amplitude precisamos de um modelo capaz de descrever o afastamento entre os nucleot́ıdeos de um mesmo par de base. O modelo de Peyrard- Bishop (PB) preenche de forma minimalista estas condições. Este modelo foi introduzido no final da década de 1980 para estudar a desnaturação do DNA por meio da mecânica estat́ıstica. Nele, cada fita do DNA é mimetizada por uma cadeia de osciladores acoplados harmonicamente. As fitas interagem uma com a outra por meio de um potencial não li- near. Assim, cada nucleot́ıdeo de uma fita é representado por uma massa m. Cada massa está ligada a duas vizinhas, adjacentes, por uma mola de constante k, que representa um potencial efetivo que contém as interações de empilhamento entre pares da mesma fita, efeitos estéricos da distribuição atômica e efeitos do ambiente. As duas fitas são mantidas “paralelas”por um potencial não linear que mimetiza as pontes de hidrogênio entre as bases nitrogenadas A-T e C-G. Aspectos tridimensionais da estrutura helicoidal não são considerados e o movimento analisado é perpendicular ao eixo principal da dupla fita. As posições dos nucleot́ıdeos das fitas são rotuladas uj e vj, respectivamente; com o ı́ndice j = 1, ..., N enumerando os nucleot́ıdeos. Por simplicidade, estudaremos esse modelo so- mente para cadeias homogêneas (homopoĺımero), ou seja, as massas e as constantes de acoplamento elástico de cada fita são iguais. Da mesma forma, o potencial que une as 9 CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 10 duas fitas é o mesmo para todos os pares de base. Esse modelo está esquematizado na figura 3.1. Figura 3.1: Representação do modelo de Peyrard-Bishop. O Lagrangiano do modelo de PB para uma cadeia homogênea é descrito por: LPB = N∑ i=1 {mu̇2 j 2 + mv̇2 j 2 − k 2 (uj+1 − uj)2 − k 2 (vj+1 − vj)2 − V (uj − vj) } (3.1) Podemos desacoplar o Lagrangiano introduzindo as variáveis xj = uj+vj√ 2 e yj = uj−vj√ 2 e descrevê-lo como a soma de dois termos Lx e Ly, que são expressos pelas equações 3.2 e 3.3 respectivamente. A parte do Lagrangiano dependente apenas de x representa uma cadeia harmônica de osciladores e não é importante na discussão que fazemos aqui, uma vez que não apresenta modos localizados de vibração. Lx = N∑ i=1 {mẋ2 j 2 − k 2 (xj+1 − xj)2 } (3.2) Por outro lado, a parte dependente de y representa uma cadeia de osciladores harmônicos CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 11 com um potencial não linear adicional, on site (local), importante para gerar estruturas localizadas no sistema. Ly = N∑ i=1 {mẏ2 j 2 − k 2 (yj+1 − yj)2 − V (yj √ 2) } . (3.3) Uma representação esquemática de uma cadeia descrita pelo Lagrangiano Ly está na figura 3.2. Para determinar as equações de movimento desse sistema, temos que ∂Ly ∂yj = d dt ∂Ly ∂ẏj e ao resolvê-la encontramos: mÿj + k(2yj − yj+1 − yj−1) + V ′(yj √ 2) = 0, (3.4) com j = 1, 2, ..., N . Devido à presença dos termos yj±1 nas equações de movimento 3.4, devemos introduzir condições de contorno para tratar os efeitos de borda. Aqui vamos restringir às situações descritas pelas condições periódicas de contorno, ou seja, y0 = yN e yN+1 = y1. Figura 3.2: Representação do modelo que emerge do Lagrangiano Ly. 3.2 Potencial de Morse Originalmente o potencial utilizado para descrever as pontes de hidrogênio no modelo PB foi o potencial de Morse, que é dado pela função V (y) = D(e−ay − 1)2, (3.5) onde D é a profundidade do poço do potencial e representa a energia de dissociação (ener- gia necessária para a quebra da ligação), a possui dimensão do inverso do comprimento e está relacionado à largura do poço e y representa o deslocamento do par de base em relação à posição de equiĺıbrio (uj − vj). CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 12 Figura 3.3: Representação do potencial de Morse. Valor assintótico da energia, ou seja, D = 0, 5u.a.. O potencial de Morse é não confinante e, por isso, simula de maneira satisfatória as pontes de hidrogênio existentes entre as bases nitrogenadas. Na situação de equilibrio, y = 0, a ponte de hidrogênio está em configuração ótima, para y < 0 a aproximação das cadeias gera uma repulsão devido aos impedimentos estéricos existentes e para y > 0 primeiramente o afastamento das fitas faz com que haja uma atração entre elas, entretanto a partir de um determinado valor de y as pontes de hidrogênio podem ser consideradas rompidas e ocorre a desnaturação local da estrutura em dupla hélice do DNA. Substituindo o potencial de Morse no Lagrangiano 3.3 temos: Ly = N∑ i=1 {mẏ2 j 2 − k 2 (yj+1 − yj)2 −D[e−ayj √ 2 − 1]2 } . (3.6) É conveniente para o desenvolvimento tanto anaĺıtico quanto computacional deixar as equações dependentes do menor número posśıvel de parâmetros. Pode-se reduzir o modelo a dependência de um único parâmetro utilizando variáveis adimensionais, definidas por: ξj = ayj √ 2 e τ = 2 √ Da2 m t, e assim, reescrever o Lagrangiano como função de um único parâmetro, C. L = N∑ i=1 { ξ̇2 j 2 − C 2 (ξj+1 − ξj)2 − 1 2 [e−ξj − 1]2 } , (3.7) onde ξ̇ = dξ dτ , C = k 4Da2 e Ly ≡ 2DL. CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 13 3.3 Criação do Breather Nesta seção apresentamos o método para obtenção de breathers em cadeias harmônicas com potencial de interação on site (como a cadeia descrita na seção anterior). Para isso, seguimos a aproximação do limite do anticont́ınuo de MacKay e Aubry [14] e que foi implementada por Marin e Aubry [38] e Cuevas [39]. O Lagrangiano desse tipo de sistema é dado por: L = N∑ j=1 { 1 2 u̇2 j − 1 2 C(uj+1 − uj)2 − V (uj) } , (3.8) onde C é o parâmetro de interação harmônico e V (uj) o potencial on site não linear. As equações de movimento correspondentes ao Lagrangiano 3.8, obtidas por ∂L ∂uj = d dt ∂L ∂u̇j , são: Fj ≡ üj + C(2uj − uj+1 − uj−1) + V ′(uj) = 0. (3.9) Como procuramos por soluções periódicas, podemos tratar o problema no espaço de Fourier e escrever a solução do sistema em termos de uma série de Fourier em funções cosseno: uj(t) = z0 j + 2 km∑ k=1 zkj cos(kwbt), (3.10) onde wb é a frequência do breather, zkj e km são, respectivamente, os coeficientes e o número total de termos da série. Substituindo a expressão 3.10 na equação de movimento 3.9 e colecionando os termos correspondentes ao k-ésimo elemento, encontramos N(km + 1) equações algébricas do tipo: F k j ≡ −k2w2 bz k j + C(2zkj − zkj+1 − zkj−1) + V ′k j = 0, (3.11) onde V ′k j é o k-ésimo coeficiente de Fourier de V ′(uj). O cálculo de V ′k j é realizado através da Transformada Discreta de Fourier (DFT). A partir de zkj se calcula uj(t) como sequência de km + 1 termos usando DFT-cosseno inversa: uj(ti) = z0 j + 2 km∑ k=1 zkj cos(kwbti), (3.12) CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 14 onde ti = 2πi wb(2km+1) , para i = 0, 1, ..., km. Assim, V ′k j = 1 2km+ 1 [V ′ (uj(0)) + 2 km∑ i=1 V ′ (uj(ti))cos(kwbti)]. (3.13) Uma aproximação linear da equação 3.11 nos leva à: F k j (Z) = F k j (X) + ∂F k j (X) ∂z0 1 (z0 1 − x0 1) + ...+ ∂F k j (X) ∂zkm1 (zkm1 − xkm1 ) + ...+ ∂F k j (X) ∂z0 2 (z0 2 − x0 2) + ...+ ∂F k j (X) ∂zkm2 (zkm2 − xkm2 ) + ...+ ∂F k j (X) ∂z0 N (z0 N − x0 N) + ...+ ∂F k j (X) ∂zkmN (zkmN − xkmN ), (3.14) onde Z = [z0 1 ... z km 1 z0 2 ... z km 2 ... z0 N ... zkmN ]T é o vetor dos coeficientes de Fourier das N oscilações e Z = [x0 1 ... x km 1 x0 2...x km 2 ... x0 N ... xkmN ]T representa um ponto na vizinhança de Z. Considerando F k j como F = [F 0 1 ... F km 1 F 0 2 ... F km 2 ... F 0 N ... F km N ]T e considerando o sistema de equações 3.14, temos: 0 = F (Z) = F (X) + [JF ](X)(Z −X), (3.15) onde [JF ](X) é o Jacobiano da função F determinado no vetor X. Rearranjando a equação 3.15, podemos encontrar a solução X dos coeficientes Z do sistema através de: Z = X − ([JF ](X))−1F (X), (3.16) que representa uma generalização do método de Newton para sistemas de equações. Os coeficientes Z são considerados satisfatórios quando a norma de F (Z) dividido pela norma de Z é menor que ε, onde ε << 1. O procedimento numérico para gerar o breather é, em um certo sentido, perturbativo. Inicialmente cria-se o perfil do breather considerando a cadeia no limite em que C = 0, ou seja, os osciladores estão desacoplados. Esse é o limite do anticont́ınuo. Nas situações que abordamos são criados 1-site breathers, o que significa que somente um oscilador tem elongação diferente de zero nesse estágio do procedimento. O perfil obtido é utilizado como semente para a resolução do sistema de equações 3.16 quando o acoplamento é CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 15 “ligado”. Para que possa ser tratado como uma perturbação do perfil inicial, trabalha-se com aĺıquotas de incremento de C pequenas, δC. A solução obtida para δC serve como semente para o próximo valor de C, ou seja, C = 2δC. O procedimento é repetido até que o valor desejado de C seja obtido. Exemplos de breathers criados podem ser vistos na Figura 3.4, onde mostramos o perfil do breather em t = 0 para duas situações: (a) C = 0 e (b) C = 0, 1; utilizando o potencial de Morse. A semente inicial foi Z = [0,3 0,4 0 ... 0 ]T e a frequência de oscilação do breather wb = 0, 8. A partir dessa configuração inicial é realizado tanto a análise de Floquet, como as simulações de dinâmicas apresentadas. Figura 3.4: Amplitude de cada oscilador no instante t = 0. Frequência wb = 0, 8 e acoplamento igual a: a) C = 0 e b) C = 0, 1. Quando utilizamos o potencial de Morse, podemos relacionar a energia inicial para a criação de um breather (C = 0) com a sua frequência de vibração wb. A energia do 1-site breather é dada por: E = 1 2 ξ̇2 + 1 2 (e−ξ − 1)2. (3.17) Como inicialmente a velocidade do oscilador é nula podemos determinar os pontos de retorno de ξ, que são equivalentes à ξ1 = − ln (1 + √ 2E) e ξ2 = − ln (1− √ 2E). Considerando a solução ξ(0) = ξ1, t(ξ) é dado por t(ξ) = ∫ ξ ξ1 dx√ 2(E− (e−x−1)2 2 ) , que implica: t(ξ) = 1√ 1− 2E { π 2 − arcsen[ 1√ 2E (1 + 2E − 1 e−ξ )] } . (3.18) CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 16 Fazendo t = T 2 = π wb e ξ = ξ2 obtemos a seguinte relação entre a frequência do breather e a energia: wb = √ 1− 2E. (3.19) 3.4 Estabilidade do breather Além da formação, é necessário estudar a estabilidade do breather. Sendo uj(t) uma solução periódica da equação 3.9, introduzimos uma perturbação por meio de ψj(t) = uj(t) + ζj(t) para analisar o comportamento próximo a essa solução. Exigimos que ψj(t) também seja solução do sistema e expandimos a equação em torno da solução de uj(t): ζ̇j(t) + C[2ζj(t)− ζj+1(t)− ζj−1(t)] + V ′′ (uj)ζj(t) = 0, (3.20) que é a equação linearizada do sistema (Equação de Hill). A equação 3.20 pode ser reescrita como o seguinte sistema de equações: ζ̇j(t) = πj(t) (3.21) π̇j(t) = −C[2ζj(t)− ζj+1(t)− ζj−1(t)]− V ′′(uj)ζj(t), (3.22) ou ainda, escrevendo Ω(t) = [ζ(t) π(t)]T , onde ζ(t) = {ζj(t)} e π(t) = {πj(t)}, ou seja, Ω(t) é um vetor coluna com dimensão 2N , sendo N o número de graus de liberdade do sistema, temos: Ω̇(t) = A(t)Ω(t), (3.23) onde A(t) =  0 I J 0 . Cada elemento de A(t) são matrizes N × N e a matriz J tem elementos Ji,j = −(2C+V ′′ (uj))δi,j+C(δi+1,j+δi−1,j) com δi,j sendo o delta de Kronecker e para i = 1 temos δi−1,j = δ0,j = δN,j e para i = N temos δi+1,j = δN+1,j = δ1,j (condição de contorno periódica). Como tratamos de equações periódicas podemos analisar a estabilidade do sistema através da teoria de Floquet [40]. Nesse contexto, considerando que seja φ(t) uma matriz 2N×2N em que cada coluna representa uma solução linearmente independente do sistema CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 17 dado pela equação 3.23, correspondente as diferentes condições iniciais e definidas em t = 0 como um vetor com 2N − 1 zeros e 1 na i-ésima posição (i =1, 2, ... , 2N). Essa matriz é conhecida como matriz fundamental e satisfaz: φ̇(t) = A(t)φ(t). (3.24) Como A(t) é periódica de peŕıodo T , φ(t + T ) também é solução da equação 3.24 e consequentemente cada coluna de φ(t+ T ) é uma combinação linear de φ(t), ou seja: φ(t+ T ) = φ(t)M, (3.25) onde M é uma matriz constante. Como φ(0) = I, temos que φ(T ) = M e M é conhecida como a matriz monodromia ou matriz (operador) de Floquet F . O operador de Floquet F determina a evolução do sistema em um peŕıodo T e é expresso da seguinte forma: Ω(T ) = FΩ(0). (3.26) Para sistemas periódicos regidos por um potencial que apresente segunda derivada cont́ınua, o teorema de Bloch garante autofunções da forma ζ(t) = eiθ t T ν(t), com ν(t) periódica com peŕıodo T . Essas autofunções correspondem a autovalores de F na forma λ = eiθ, (θ ∈ C). Esses autovalores são conhecidos como multiplicadores de Floquet, enquanto que θ é chamado de argumento de Floquet. O operador de Floquet é real e simplético, ou seja, suas propriedades f́ısicas são invariantes no tempo. Isso implica que se λ é autovalor, então λ∗, 1 λ e 1 λ∗ também são autovalores. Pela teoria de Floquet a órbita de u(t) é linearmente estável se nenhum dos multi- plicadores de Floquet tiver módulo maior do que 1, assim uma condição necessária para a estabilidade linear é que todos os multiplicadores de Floquet estejam sobre o ćırculo unitário, ou seja, que θ seja real. Para que ocorra a instabilidade do sistema, um par ou mais de autovalores deve co- lidir e sair do ćırculo unitário gerando assim uma bifurcação, responsável pela troca de estabilidade. Se os autovalores saem em θ = 0 temos uma bifurcação harmônica, se saem em θ = π bifurcação sub-harmônica e em θ 6= 0, π bifurcação oscilatória. Uma ferramenta útil para o estudo da estabilidade é a assinatura de Krein (κ) [41] defi- nida inicialmente como o sinal do produto simplético da parte real com a parte imaginária CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 18 do vetor posição-velocidade. Pelo critério de Krein para que uma colisão de autovalores gere uma instabilidade, as respectivas assinaturas de Krein deverão ser distintas. κ(θ) = sgn([Re{Ω(t)}, Im{Ω(t)}]) = sgn[i ∑ j (ζj(t)ζ̇j ∗ (t)− ζ∗j ζ̇j(t))]. (3.27) No limite do anticont́ınuo, Cuevas mostra em sua tese [39] que a assinatura de Krein passa a ser: κ(θ) = sgn(senθ). (3.28) Para o potencial de Morse, quando C = 0, obtemos da equações 3.22 que oscilador inicialmente excitado (n) obedece a seguinte relação: ζ̈n(t) + (2e−2un(t) − e−un(t))ζn(t) = 0, (3.29) enquanto que os osciladores em repouso são ditos como osciladores lineares são descritos por: ζ̈j(t) + ζj(t) = 0. (3.30) As soluções da equação 3.29 são ζn(t) = ξ̇n(t) e ζn(t) = ξw(t) = ∂ξ ∂wb que são deno- minadas modo de fase e modo de crescimento, respectivamente. Isso pode ser verificado derivando a equação de movimento 3.9 com relação tanto ao tempo como à frequência. Esses modos correspondem a autovetores do tipo Ωf (t) =  ξ̇(t) ξ̈(t)  e Ωc(t) =  ξw(t) ξ̇w(t) , e estão relacionados com a evolução de um peŕıodo da seguinte forma: Ωf (T ) = Ωf (0) Ωc(T ) = Ωc(0) + T wb Ωf (0) (3.31) Tanto {Ωf (0),Ωc(0)}, como {Ωf (T ),Ωc(T )} são bases do espaço formado pelas soluções da equação 3.29. Então Ω(T ) = a(T )Ωf (0)+b(T )Ωc(0) ou Ω(T ) = a(0)Ωf (T )+b(0)Ωc(T ). Utilizando a equação 3.31, podemos escrever Ω(T ) = (a(0) + T wb b(0))Ωf (0) + b(0)Ωc(0), assim: CAPÍTULO 3. MODELOS MECÂNICOS PARA O DNA 19  a(T ) b(T )  = F  a(0) b(0)  (3.32) onde F =  1 T wb 0 1  é o operador de Floquet com autovalor duplamente degenerado e igual a 1. No caso da equação 3.30, temos como solução o autovetor ζj(t) = e±itζj(0) que está N − 1 vezes degenerado e corresponde a argumentos de Floquet θ = ±T . Estes modos correspondem a oscilações lineares. Os autovalores em θ = nπ, sendo n um número inteiro, tem assinatura de Krein nula, enquanto que os autovalores em θ = ±T tem assinatura de κ = 1 se θ ∈ (0, π) e κ = −1 se θ ∈ (π, 2π). Para os autovalores dos osciladores lineares não coincidirem com o autovalor do oscilador inicialmente excitado é necessário cumprir a seguinte condição de não ressonância: n 2 wb 6= 1, (3.33) com n = 0, 1, 2, ... . Caṕıtulo 4 Resultados para modelos mecânicos do DNA 4.1 Influência da variação de energia no breather Neste caṕıtulo mostramos o comportamento de um breather sob a influência da variação de energia. Para isso, inicialmente criamos uma solução do tipo breather e estudamos sua estabilidade através da teoria de Floquet. Após determinar uma estrutura estável verificamos seu comportamento dinâmico e como esta estrutura se comporta ao se variar a energia do sistema. Os resultados apresentados a seguir foram obtidos usando cadeias com 21 osciladores (N = 21). Esse número de osciladores é compat́ıvel com o utilizado na literatura [39]. Os coeficientes da série de Fourier são lm = 17 e o incremento no parâmetro C, δC, utilizado para se obter o valor desejado do acoplamento, aplicando o método de Newton para resolução das equações algébricas foi da ordem de 10−3. A convergência foi considerada satisfatória para ε = 10−4. Na figura 4.1 mostramos os resultados referentes aos valores absolutos dos multiplica- dores de Floquet em função do parâmetro de acoplamento C. A frequência do breather criado é wb = 0,8. Nota-se que para pequenos valores do acoplamento C todos os mul- tiplicadores de Floquet tem módulo igual a um, assim a estabilidade é garantida. Após um determinado valor de C (C = 0,1297), algumas bifurcações ocorrem e a estabilidade é perdida. Uma outra forma de ilustrar a estabilidade de uma solução do tipo breather é através 20 CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 21 Figura 4.1: Valor absoluto dos multiplicadores de Floquet em função do parâmetro de acoplamento C. da distribuição dos diferentes autovalores λ = eiθ da matriz de Floquet e suas respectivas assinaturas de Krein. Isso pode ser visto na figura 4.2 para quatro valores do parâmetro de acoplamento C: (a) C = 0; (b) C = 0,1; (c) C = 0,1297 e (d) C = 0,13. Nota-se que, para a situação (a), os autovalores são θ = 0 (referente ao autovalor do oscilador excitado) e θ = ±π 2 (equivalente aos osciladores em repouso). Acoplar os osciladores faz com que os autovalores caminhem sobre o ćırculo unitário. Quando dois autovalores com assinaturas de Krein distintas colidem eles podem sair do ćırculo e causar instabilidade no sistema (Figura 4.2d). Um breather linearmente estável pela análise de Floquet apresenta em sua dinâmica uma estrutura espacialmente localizada, bem definida e que persiste pelo tempo. Isso pode ser visto pela figura 4.3, onde ilustramos a evolução temporal da energia de cada oscilador utilizando padrões de cores com oito ńıveis. A cor vermelha representa as maiores energias e a azul escuro energia praticamente nula. Esse gráfico foi criado através da integração das equações de movimento do sistema utilizando o método de Runge-Kutta de quarta ordem [42]. Como condição inicial, temos para as posições o perfil do breather obtido com o método demonstrado no caṕıtulo 3 e as velocidade iniciais iguais a zero. O tempo de integração foi de 104 unidades arbitrárias de tempo (u.a.). A análise de Floquet nos permite conhecer o comportamento do sistema como função CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 22 Figura 4.2: Representação dos multiplicadores de Floquet, com as respectivas assinaturas de Krein (+ → κ = +1, X → κ = −1 e O → κ = 0), para os diferentes valores de acoplamento. a) C = 0, b) C = 0,1, c) C = 0,1297 (casos estáveis) e d) C = 0,13 (caso instável). do parâmetro de acoplamento, mas não fornece diretamente qualquer informação a res- peito da influência da variação de energia no breather. Para testar isto, utilizamos uma solução estável, C = 0, 1, e variamos sua energia através do aumento e diminuição das posições iniciais de todos os osciladores, mas mantemos as proporções entre eles iguais. Dessa forma, usamos essas novas soluções como condições iniciais e integramos novamente as equações de movimento para verificar o comportamento dinâmico do sistema. O critério para analisar o comportamento do sistema relativo a localização de energia CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 23 Figura 4.3: Energia de cada oscilador em função do tempo. C = 0,1 e wb = 0,8. é baseado na entropia informacional e medidas do número de osciladores com energia significativa do sistema, Nosc. Isso pode ser visto em trabalhos anteriores, como o de De Luca et al. [43] e Silva et al. [44], que usaram esse conceito para caracterizar a localização de energia em cadeias do tipo Peyrard-Bishop. A entropia informacional é definida como: S = − N∑ j=1 ej ln (ej), (4.1) onde ej = Ej E e representa uma probabilidade de energia. Supondo que a energia esteja distribúıda uniformemente (equipartida) entre r osciladores e r < N , cada um desses r osciladores tem energia ej = 1 r , e a energia dos demais pode ser desprezada. Nessa situação S pode ser escrita como S ≈ ln r. Invertendo essa relação se obtem r ≈ eS. Vê-se então, que a entropia informacional é uma medida do número de osciladores que tem uma quantidade de energia significativa, ou seja, Nosc = eS. Se todos os osciladores tivessem a mesma energia, obviamente Nosc = N . Na Figura 4.4 mostramos a fração de osciladores com valores de energia significativa (nosc = Nosc N ) em função da energia. Nota-se a existência de um valor mı́nimo de nosc para a energia equivalente ao breather estável com C = 0, 1, (E = 0, 645). Se olharmos CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 24 cuidadosamente os valores de energia próximos ao do breather, notamos que os valores de nosc são menores que 0,2 no intervalo de energia entre 0,291 - 1,203. Isso significa que para o tempo observado (t = 10000u.a.) a energia não se espalha pela rede e permanece localizada em um número pequeno de osciladores. Figura 4.4: a) Fração de osciladores com valores de energia significativa em função da energia do sistema. b) Detalhe da Figura “a”. Entretanto, para valores de energia fora dessa faixa de energia (0,291 - 1,203), os valores de nosc começam a crescer e a localização de energia é perdida. Nestas situações o sistema apresenta o comportamento de cadeias harmônicas, onde a energia se difunde pela cadeia. Uma análise de Fourier nos permite racionalizar uma explicação para esse fato. A figura 4.5 mostra o módulo G(w) da transformada complexa de Fourier do décimo primeiro oscilador (N = 11) para duas energias do sistema: a) E = 0,0556 e b) E = 1,5. No caso de baixas energias, a análise de Fourier (figura 4.5a) mostra que o sistema apresenta oscilações dentro do ramo óptico, 1 ≤ w ≤ √ 1 + 4C (figura 4.5c). Então, nesse caso, não temos localização de energia porque os modos não lineares não foram excitados. Quando lidamos com altas energias, (figura 4.5b), todas as frequências com intensidades significativas estão dentro do ramo acústico, 0 ≤ w ≤ √ 4C (figura 4.5d), então novamente o valor de nosc aumenta. Isto ocorre pois alguns osciladores possuem energia suficiente para superar a barreira do potencial de Morse e o sistema se comporta como uma cadeia puramente harmônica. Estes resultados concordam com a conjectura que para a existência de modos localizados, o sistema deve oscilar fora do espectro linear CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 25 de frequência. Figura 4.5: Módulo G(w) da transformada complexa de Fourier do décimo primeiro osci- lador. a) E = 0,0556, nosc = 0,684 e C = 0,1; b) E = 1,5, nosc = 0,251 e C = 0,1; c) A representação do ramo óptico e d) A representação do ramo acústico. 4.2 Densidade de energia e transição de fase no mo- delo de Peyrard-Bishop Nesta seção vamos abordar a transição de fase no modelo de Peyrard-Bishop conside- rando os aspectos dinâmicos do comportamento da rede. Para isso, propomos observar a evolução temporal da posição dos osciladores para diferentes energias. CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 26 O estudo termodinâmico do modelo de Peyrard-Bishop através do método do operador integral de transferência, mostra que quando todos os osciladores da rede têm energia acima da barreira do potencial de Morse, ou seja, a energia de cada par de base é igual ou superior ao parâmetro D, a função de onda não é mais quadraticamente integrável e a transição de fase ocorre [29]. Em suma, tem-se que a desnaturação ocorre quando a energia por oscilador é no mı́nimo igual à profundidade do poço do potencial de Morse. Com o adimensionamento realizado no lagrangiano do modelo de Peyrard-Bishop, equação 3.7, a altura do poço passa a ser equivalente à 0,5. Assim para densidades de energia (E/N) iguais ou superiores a 0,5 é esperado que ocorra a transição de fase do modelo estudado. Nas simulações apresentadas, integramos as equações de movimento derivadas do La- grangiano 3.7 utilizando o método de Runge-Kutta Nystrom de décima ordem [45]. Nas condições iniciais, o oscilador central da cadeia é excitado de modo a conter somente ener- gia cinética. Então, em t = 0 todos os osciladores estão em suas respectivas posições de equiĺıbrio e em repouso, exceto o oscilador central que possui velocidade inicial. Condições periódicas de contorno são utilizadas, ou seja, ξ0 = ξN e ξN + 1 = ξ1. A idéia é verificar como a energia concentrada na cadeia se espalha até atingir a “desnaturação”. A figura 4.6 mostra as posições ξ de todos os osciladores sobrepostas como função do tempo. Na simulação utilizamos novamente uma rede de 21 osciladores e a densidade de energia é 0,7857. Quando todos os osciladores adquirem energia referente ao termo do potencial de Morse equivalente a profundidade do poço, as posições de todos os osciladores começam a crescer constantemente, então a cadeia adquire um movimento translacional constante. Uma vez que ξ representa a separação do par de base, este comportamento caracteriza qualitativamente a quebra das ligações de hidrogênio e consequentemente a desnaturação do DNA. Outra análise que pode ser feita diz respeito ao comportamento da cadeia próximo ao momento da transição de fase. Na figura 4.7 temos representado na forma de um gráfico de superf́ıcie os osciladores que atingem o platô do potencial de Morse em função do tempo. Para os osciladores que estão confinados no poço do potencial, temos a co- loração preta. Já para aqueles que atingiram o platô, temos a coloração branca. Nota-se que, inicialmente, todos os osciladores estão confinados no potencial de Morse. A partir de aproximadamente t = 880u.a., uma região de osciladores começa a atingir o platô do potencial, região entre os osciladores 15 e 20. Já próximo de 900u.a., três regiões apresen- CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 27 Figura 4.6: a) Posição de cada oscilador sobreposta como função do tempo. b) Detalhe da região onde ocorre a quebra do potencial onsite. N = 21 e E N = 0,7857. tam esse comportamento e começam a se juntar até que toda a cadeia adquira energia de Morse suficiente para se “desconectar”do potencial on site, caracterizando a transição de fase no modelo. Qualitativamente, esse comportamento assemelha-se com a desnaturação do DNA, onde existe a formação das chamadas bolhas de desnaturação que vão crescendo e se somando até que ocorra a separação da dupla fita [46]. Figura 4.7: Potencial onsite de cada oscilador. A coloração preta indica que o oscilador está ligado pelo potencial de Morse, enquanto que a branca representa que o oscilador atingiu o platô do potencial. N = 21 e E N = 0,881. Por fim, analisamos o comportamento da rede em função da energia por oscilador. CAPÍTULO 4. RESULTADOS PARA MODELOS MECÂNICOS DO DNA 28 O intuito é encontrar o valor mı́nimo necessário para ocorrer a transição de fase da ca- deia unidimensional através da dinâmica do modelo. Para isso simulamos o sistema com diferentes densidades de energia e verificamos o tempo necessário para ocorrer a “des- naturação”. Esse resultado pode ser visto na figura 4.8. Nota-se que, altas densidades de energia promovem a transição de fase de maneira rápida. Conforme essa densidade diminui, maior é o tempo necessário para ocorrer a transição de fase. O resultado sugere também um comportamento assintótico próximo a uma densidade de energia de 0,5, que corresponde à profundidade do poço do potencial (D = 0, 5), concordando qualitativa- mente com o resultado termodinâmico citado. Figura 4.8: Tempo necessário para ocorrer a transição de fase em função da densidade de energia. N = 21. Apesar da transição de fase ocorrer para densidades de energia tendendo ao valor do poço do potencial D, ela não atinge esse valor para a análise dinâmica. A causa para esse comportamento, consiste no fato da energia na simulação dinâmica não estar localizada apenas no potencial de Morse, mas também no termo harmônico. Isto gera uma situação única para a transição nessa densidade de energia, na qual a cadeia deveria estar em repouso, todos os osciladores com energia igual ao platô do potencial e em suas respectivas posições de equiĺıbrio. Caṕıtulo 5 Dinâmica molecular atomı́stica do DNA 5.1 Dinâmica molecular Simulação por dinâmica molecular (DM) tem sido uma ferramenta importante para o estudo de biomoléculas em geral [30]. O conceito de DM foi originalmente desenvolvido na década de 50, como uma técnica para simular sistemas de colisão de esferas ŕıgidas [47] e a partir da década de 70, começou a ser utilizada para o estudo de macromoléculas biológicas, como protéınas e DNA [48, 49, 50]. Essa técnica consiste em calcular a força momentânea existente em cada átomo e integrando as equações de movimento determinar as posições dos átomos para um pequeno intervalo de tempo. Repetindo esse procedi- mento é posśıvel construir a trajetória dos átomos constitúıntes da molécula que se deseja estudar. A energia potencial do sistema em simulações atomı́sticas é calculada através de funções potenciais clássicas, que são dependentes apenas das posições entre núcleos dos átomos envolvidos na dinâmica, de modo que os elétrons são tratados de maneira impĺıcita. O termo da energia potencial é escrito por: V (rN) = ∑ ligação hi 2 (li − li,0)2 + ∑ ângulos ki 2 (θi − θi,0)2 + ∑ torção kφi 2 (1 + cos(nω − γ)) + N∑ i=1 N∑ j=i+1 4εij [( ωij rij )12 − ( ωij rij )6] + N∑ i=1 N∑ j=i+1 qiqj 4πε0rij . (5.1) Devido ao fato dos elétrons serem tratados de maneira impĺıcita, todas as ligações 29 CAPÍTULO 5. DINÂMICA MOLECULAR ATOMÍSTICA DO DNA 30 covalentes devem ser pré definidas e não podem ser quebradas ou formadas durante a simulação. Os três primeiros termos da equação 5.1 representam a interação entre átomos ligados (átomos separados por até três ligações qúımicas) e estão relacionados com o estiramento da ligação entre dois átomos, o ângulo entre duas ligações e o ângulo torcional entre quatro átomos em sequência (ângulo diedral), respectivamente. Já os últimos dois termos da equação 5.1 modelam as interações entre átomos não ligados. São considerados não ligados todos os átomos separados por mais de três ligações covalentes. Um é o potencial de Lennard-Jones e o outro a interação eletrostática entre átomos carregados (Potencial de Coulomb). O potencial de Lennard-Jones contém um termo repulsivo ( 1 r12 ), que está relacionado ao impedimento da interpenetração das nuvens eletrônicas dos átomos envolvidos e outro atrativo ( 1 r6 ), que é devido a dispersão de London (interação dipolo-induzido dipolo-induzido). Os parâmetros envolvidos para o cálculo da energia potencial do sistema estão rela- cionados diretamente com os tipos de átomos presentes na simulação e são determina- dos tanto pelo conjunto de dados experimentais, como também por cálculos de mecânica quântica [30]. Os termos que descrevem as interações entre as part́ıculas de uma simulação, juntamente com a parametrização espećıfica dos átomos que a compõem, formam o cha- mado Campo de Força. A partir desse campo de forças é posśıvel determinar as forças que atuam em cada átomo e consequentemente as equações de movimento do sistema a ser estudado. Os termos não ligados da função energia potencial devem ser calculados para todos os posśıveis pares de átomos do sistema a ser estudado. Isso demanda um alto custo computacional para a sua realização. Em resposta a esse problema, métodos foram de- senvolvidos para a otimização destes cálculos. Entre eles, se destacam a utilização de uma distância de raio de corte (cut-offs) e o somatório de Ewald [51]. As interações de Van der Waals decaem rapidamente com a distância, assim, uma aproximação razoável é utilizar a técnica do raio de corte. Quando a distância entre os átomos é maior que o tamanho do raio de corte, a energia de Van der Waals muda imediatamente para zero. Entretanto, para a energia eletroestática que decai mais lentamente com a distância é necessário uma outra alternativa. Nesse caso, o método de particle-mesh Ewald (PME) é empregado [52]. Neste método, a soma das energias de interações no espaço real é substitúıda por uma soma equivalente no espaço de Fourier [53]. Dado que a energia eletroestática é composta CAPÍTULO 5. DINÂMICA MOLECULAR ATOMÍSTICA DO DNA 31 por uma interação de curto alcance e outra de longo alcance, a convergência máxima é obtida quando a interação de curto alcance é somada no espaço real e a de longo alcance no espaço de Fourier. Antes de iniciar a dinâmica propriamente dita, realizando a integração das equações de movimento e construindo as trajetórias dos átomos da molécula, se faz necessário realizar um processo de minimização da energia potencial do sistema. Isso porque a estrutura utilizada pode apresentar problemas com relação ao posicionamento dos átomos e consequentemente distorções nas ligações entre eles, uma vez que essa estrutura é obtida através de dados de cristalografia, ressonância nuclear magnética (RNM) ou por meio de construções arbitrárias. Assim, os métodos de minimização visam otimizar ângulos e comprimentos de ligações qúımicas, caracterizando o processo como uma otimização geométrica. Os métodos geralmente utilizados para realizar a minimização são conhecidos como métodos gradientes e trabalham com as derivadas da função de energia potencial. A magnitude da primeira derivada é utilizada para determinar a direção de um passo que nos guia para uma configuração de menor energia potencial e um mı́nimo local próximo é alcançado quando as primeiras derivadas tenderem a zero. Os algoŕıtimos aqui utili- zados são o Steepest Descent e o Gradiente Conjugado. O primeiro deles é muito eficaz para trazer configurações distantes para próximas do mı́nimo local, entretanto converge lentamente nas vizinhanças dele. Já o segundo, é empregado quando o sistema está em uma configuração geométrica em que a energia potencial está próxima do mı́nimo local. Esse último método, além de utilizar a informação da primeira derivada, utiliza também informações da interação anterior, como direção e tamanho do passo. Uma vez obtida a estrutura da molécula minimizada, é necessário integrar as equações de movimento do sistema. Como tratamos de um problema de muitos corpos, as soluções das equações devem ser obtidas através de integração numérica. Um dos mais simples e melhores métodos de integração numérica para a dinâmica molecular é o algoŕıtmo de Verlet [54], que possui boa estabilidade temporal e mantém a energia do sistema conservada [52]. CAPÍTULO 5. DINÂMICA MOLECULAR ATOMÍSTICA DO DNA 32 5.2 Metodologia As simulações em sua maioria foram realizadas com o pacote computacional de dinâmica molecular AMBER 10 [51]. O campo de força utilizado foi o PARM94 [55] com as mo- dificações para a melhoria da rigidez dos ângulos de torção no backbone PARMM99 e PARMBSC0 [56, 57]. A parametrização desenvolvida recentemente por Cheatham et al. foi empregada para evitar a cristalização dos sais de maneira não natural, uma vez que observações em longas simulações de biomoléculas em soluções salinas com os campos de força do AMBER, mostram a formação de cristais de sal abaixo do seu limite de solubi- lidade [58]. As simulações foram realizadas no supercomputador Arc1 da University of Leeds e foram paralelizadas utilizando de 8 a 64 processadores. Para construir as estruturas lineares do DNA utilizamos o Nucleic Acid Builder (NAB), que é uma ferramenta do AMBER. O NAB é uma linguagem computacional de alto ńıvel que permite a criação e manipulação de moléculas e seus fragmentos. Com essa ferramenta é posśıvel criar estruturas de DNA nas suas diferentes formas (A-DNA, B-DNA, etc), com a sequência desejada e inclusive alterar os valores dos parâmetros entre pares de base (como o rise e o twist, por exemplo). No caso das moléculas circulares de DNA, utilizamos um programa em Fortran criado por Charles Laughton que a partir de um arquivo em PDB da estrutura linear permite criar o DNA circular com o linking number desejado [22]. Nele, cada par de bases é tratado como um corpo ŕıgido. Através de translações e rotações, os pares de bases são colocados de modo a formar uma ćırculo e o passo de torção entre eles é definido como entrada do programa. Uma vez que a estrutura não apresenta contorção, o valor do linking number é simplesmente o valor do twist total. Todas as simulações apresentadas foram realizadas com solvente expĺıcito. Contra ı́ons de sódio (Na+) foram adicionados utilizando o módulo tleap do AMBER para neutralizar o sistema. Moléculas de água foram adicionadas usando o modelo TIP3P formando caixas retangulares ( DNA linear) e octaédricas (DNA circular). Concentrações de 0,1mol de sal (́ıons de Na+ e Cl−) foram colocadas de maneira randômica. Para minimizar os efeitos das superf́ıcies das caixas contendo água e simular o com- portamento de um sistema real, foram utilizadas condições periódicas de contorno. Esse método consiste basicamente em replicar várias vezes o sistema de modo que não haja espaços não preenchidos entre as caixas, ou seja, o sistema é transladado nas três direções espaciais, formando uma rede. Quando uma part́ıcula sai de um lado da caixa, ela entra CAPÍTULO 5. DINÂMICA MOLECULAR ATOMÍSTICA DO DNA 33 pela face oposta com a mesma velocidade, mantendo constante o número de átomos do sistema original. Os processos de minimização e aquecimento foram realizados baseando-se no protocolo desenvolvido por Shields et al. [59] para tripla hélice de DNA e modificado para DNA circulares por Harris et al. [22]. Os passos podem ser vistos na tabela 5.1. Inicialmente, temos 4 etapas para a minimização. Em cada uma delas, são realizados 10000 passos de minimização sendo que nos 5000 primeiros são utilizados o método do Steepest Descent e nos passos restantes o método do Gradiente Conjugado. Durante cada uma dessas etapas, os átomos que compõem o DNA estão sujeitos a uma restrição de posição, que visa restringir o movimento desses átomos em torno de uma posição de referência. Esse procedimento evita que ocorram rearranjos drásticos nos átomos da molécula alvo de estudo. A cada etapa da minimização, a intensidade da constante de força da restrição diminui, até ser nula na última etapa. Terminada a minimização do sistema, inicia-se a fase de aquecimento e equilibração do sistema, que consiste em mais 8 etapas com a duração de 10ps cada. Novamente, restrições de posição são utilizadas nos átomos que compõem o DNA e a cada etapa, essa restrição diminui até ser anulada. O aquecimento do sistema se dá em duas fases. Na primeira, as velocidades dos átomos são distribúıdas de modo aleatório e proporcionando um temperatura de 100K. Já na segunda, durante a dinâmica a temperatura aumenta de forma gradativa até atingir a temperatura final desejada (300K). A temperatura é mantida constante pelo acoplamento de Berendsen [60] que mimetiza um acoplamento à um banho térmico através de um fator de escala. A pressão de 1 atm também é mantida constante através do escalonamento das coordenadas cartesianas de todos os átomos [61], via acoplamento de Berendsen. As interações eletroestáticas de longo alcance são tratadas com o método de particle mesh Ewald e contam com um raio de corte de 12Å. O algoŕıtimo SHAKE foi utilizado para restringir a liberdade do estiramento das ligações covalentes envolvendo hidrogênio, o que permite a utilização de um passo de integração de 2fs sem comprometer a estabilidade das trajetórias. Completada a equilibração do sistema inicia- se a dinâmica propriamente dita, salvando as posições e velocidades a cada 1ps. CAPÍTULO 5. DINÂMICA MOLECULAR ATOMÍSTICA DO DNA 34 Tabela 5.1: Protocolo para equilibração das simulações. Estágio da equilibração Protocolo de Simulação 1 Minimização com restrição de posição no DNA 10000 ciclos (K=500 kcal/Mol/Å2) 2 Minimização com restrição de posição no DNA 10000 ciclos (K=50 kcal/Mol/Å2) 3 Minimização com restrição de posição no DNA 10000 ciclos (K=25 kcal/Mol/Å2) 4 Minimização, sem restrição de posição 10000 ciclos 5 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=100 kcal/Mol/Å2, Tfinal=100K) 6 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=50 kcal/Mol/Å2, Tfinal=300K) 7 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=50 kcal/Mol/Å2, T=300K) 8 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=25 kcal/Mol/Å2, T=300K) 9 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=10 kcal/Mol/Å2, T=300K) 10 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=5 kcal/Mol/Å2, T=300K) 11 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=2,5 kcal/Mol/Å2, T=300K) 12 DM com restrição de posição no DNA 10ps (K=1 kcal/Mol/Å2, T=300K) Caṕıtulo 6 Resultado das simulações do DNA por dinâmica atomı́stica Neste caṕıtulo apresentamos os estudos realizados por meio de simulações por dinâmica molecular. Em um primeiro momento, procuramos relacionar aspectos da dinâmica do DNA por simulação molecular atomı́stica com o comportamento previsto por modelagem minimalista. Aspectos de como o movimento interno dos pares de base se comporta em função da temperatura foram abordados. Em seguida, estudamos a formação de bolhas de desnaturação sob uma outra perspectiva, o estresse torcional induzido. 6.1 Relacionando dinâmica molecular com modelos minimalistas para o DNA Na seção 2.2 apresentamos os seis tipos de movimentos internos do par de bases e os seis tipos de movimentos entre os pares de bases. Estes movimentos caracterizam a dinâmica dos nucleot́ıdeos que compõem o DNA. Se observarmos a figura 2.1, podemos relacionar os movimentos de rise e stretch como sendo longitudinal e transversal ao eixo da molécula, respectivamente. Os modelos mecânicos minimalistas geralmente descrevem a dinâmica do DNA sob uma ótica unidimensional. O modelo de Peyrard Bishop, por exemplo, simula a separação da dupla hélice considerando apenas os movimentos na transversal ao eixo do DNA. Assim, os movimentos mimetizados pelo modelo PB poderiam estar relacionados com o movimento interno do par de bases do tipo stretch. Lembrando-se que esse modelo descreve corretamente a desnaturação do DNA, é esperado que para altas temperaturas 35 CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 36 o movimento de stretching seja relevante na dinâmica da macromolécula para que assim, ocorra a separação da dupla fita. Com intuito de caracterizar os tipos de movimento no DNA em diferentes temperaturas e relacioná-los com posśıveis modelos minimalista, realizamos simulações de duas cadeias de DNA para quatro temperaturas distintas. As estruturas contém 30 pares de bases e as sequências estudadas foram uma poli(CG) e outra poli(TA). As simulações foram realizadas nas temperaturas de 283K, 300K, 310K e 353K e o tempo de simulação foi de 2ns. Os resultados foram analisados utilizando o programa Curves+ [32] que analisa a estrutura de ácidos nucleicos e, dentre outras funções, calcula os parâmetros internos do par de bases e entre os pares de base. Na figura 6.1 temos representado a taxa de crescimento do módulo da amplitude máxima dos parâmetros rise e stretch em função da temperatura para as duas sequências estudadas. Os valores foram obtidos considerando os pares de base da faixa central da molécula (do 13◦ ao 17◦) para se evitar interferência das bordas. Nota-se que, em geral, o aumento da temperatura confere ao movimento do tipo stretching um crescimento muito maior do que para o tipo rise. Esses resultados, qualitativamente reforçam a aproximação do modelo de Peyrard-Bishop que considera o movimento transversal mais relevante em temperaturas próximas a desnaturação. Figura 6.1: Taxa de crescimento dos parâmetros rise e stretch em função da temperatura, para as sequências poli(TA) e poli(CG). CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 37 6.2 Bolhas de desnaturação por estresse torsional in- duzido Nesta parte do trabalho abordamos os efeitos causados pela tensão torcional induzida no DNA. Em um primeiro momento, exploramos os resultados obtidos para cadeias lineares visando obter informações a respeito do efeito gerado por diferentes graus de tensão em sequências distintas de pares de base. Em seguida, partimos para o estudo de estruturas circulares do DNA, que além de fornecerem uma melhor investigação sobre o estresse torcional, também levam em conta os efeitos da curvatura da molécula. O intuito é verificar a dependência da formação de bolhas de desnaturação em relação à sequência de pares de base. Para as simulações com o DNA linear utilizamos 30 pares de base. A tensão torcional foi introduzida da seguinte forma: constrúımos a molécula com valores do parâmetro he- licoidal twist diferente do encontrado na estrutura da forma B-DNA (por volta de 36◦) e fixamos as bordas da molécula. Assim variamos o número de pares de base por volta da hélice e consequentemente produzimos um efeito de torção na estrutura do DNA. No pro- tocolo adicionamos em cada etapa da equilibração um v́ınculo com K = 100kcal/Mol/Å2 nos pares de base 1, 2, 29 e 30 para fixar as bordas. Simulamos duas moléculas com diferentes sequências de pares de base, uma ATAT... e a outra CGCG... . Para cada uma delas, estudamos o comportamento do sistema para três parâmetros de twist iniciais: 28◦, 29◦ e 30◦. O tempo de simulação foi da ordem de 10ns. Quanto menor o valor do twist inicial, maior a diferença entre a estrutura criada e a estrutura relaxada encontrada no DNA na forma B e consequentemente, maior é a tensão torcional produzida na molécula. Na sequência de figuras 6.2, 6.3 e 6.4 mostramos as representações da molécula para cada uma das simulações em tempos distintos. Nota-se pela figura 6.2, que para o DNA com um twist inicial de 30◦, a tensão produzida não induziu efeito de desestabilização da dupla hélice na sequência formada por pares CG, entretanto na molécula formada por AT nota-se um despareamento de um par de base. Para o DNA com twist inicial de 29◦, figura 6.3, temos novamente que, para a sequência CG, não há desestabilização da dupla hélice, mas para a sequência AT temos que após 1,5ns de simulação ocorre a ruptura de um par de base e a abertura daquela região. Esse efeito persiste por toda a simulação. CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 38 Por fim, na figura 6.4, temos o DNA com twist inicial de 28◦. Em ambas as sequências o efeito do estresse torcional induz a desestabilização da dupla hélice, criando estruturas abertas no DNA. No caso da sequência AT o efeito é ainda maior e ocorre a ruptura de dois pares de base. Figura 6.2: Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 30◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. Em suma, os resultados obtidos estão de acordo com o esperado. As cadeias que apresentam maior variação no valor do twist com relação a estrutura relaxada, sofrem um estresse torcional maior e geram, portanto, estruturas abertas no DNA para aliviarem essa tensão induzida. Um outro aspecto que pode ser notado é o fato de que as sequências do tipo AT são mais suscet́ıveis ao efeito torcional, uma vez que a energia de ligação relativa a ligação de hidrogênio é menor. Em seguida, estudamos os efeitos do estresse torcional no DNA circular. Para isso, analisamos estruturas com diferentes densidades de super hélice σ: σ = 0, 0 (estrutura relaxada), σ = −0, 05 e σ = −0, 1. Essas estruturas continham, respectivamente, 108 pares de base e dez voltas; 102 pares de base e nove voltas e 108 pares de base e 9 voltas (figuras 6.5 a, b e c, respectivamente). As estruturas com menor número de voltas, possuem uma quantidade maior de pares de base por volta. Esse fato acarreta a diminuição do valor do parâmetro entre os pares de base twist e consequentemente, ocorre o estresse CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 39 Figura 6.3: Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 29◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. Figura 6.4: Representação inicial e final das cadeias com twist inicial de 28◦. A cor verde se refere a sequência CG e a cor vermelha à sequência AT. CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 40 torcional na molécula. Uma vez que a estabilidade relativa da dupla hélice do DNA dependem não só da composição dos pares de base, mas também da sequência de pares que a formam [62]; as cadeias foram criadas de modo a conter diferentes regiões com sequências distintas. Desse modo, podemos relacionar a dependência da formação de estruturas abertas no DNA com o tipo de sequência que o compõe. Todas as estruturas contêm quatro regiões ricas em AT e obedecem as seguintes sequências: ...TATATA... (região 1), ...ATATAT... (região 2), ...AAAAAA... (região 3) e ...CACACA... (região 4). Essas regiões estão separadas por quatro trechos contendo apenas a sequência ...CGCGCG... . A idéia de se construir a molécula obedecendo essa sequência de pares de base, é baseada nos artigos de Breslauer [62] e SantaLucia [63] que medem, por meio de cálculos de energia livre, o grau de estabilidade da dupla hélice do DNA de acordo com a sequência de pares de base. Segundo esses estudos, a ordem crescente de estabilidade consiste nas sequências, TATATA, ATATAT, AAAAAA, CACACA e CGCGCG. Assim, a estrutura criada possui regiões com diferentes estabilidade, sendo a região 1 a mais suscet́ıvel para ocorrer a separação da dupla fita e a região com a sequência CGCG sendo a mais estável. Figura 6.5: Visualização inicial da estrutura circular do DNA com diferentes densidades de super hélice. a) Molécula relaxada (σ = 0) com 108 pares de base e dez voltas, b) Molécula com σ = −0.05 contendo 102 pares de base e nove voltas e c) Molécula com σ = −0.1 contendo 108 pares de base e 9 voltas. Para cada densidade de super hélice realizamos três simulações distintas. Em cada uma delas a sequência utilizada é a mesma, entretanto transladamos os pares de base que formam a dupla hélice em cinco posições, de modo que o par de base de número N da primeira simulação (cadeia A), passa a ser o N−5 em uma repetição (cadeia B) e N+5 na CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 41 outra repetição (cadeia C). As sequências podem ser vistas pela tabela 6.1. O intuito de realizar essas repetições de maneira distinta é verificar se, além do tipo de sequência que compõe a cadeia, existe a influência da alça maior ou menor do DNA na desestabilização da dupla fita. Na figura 6.6 mostramos as três estruturas utilizadas nas simulações da cadeia com 108 pares de base e 9 voltas. Nota-se que na figura 6.6a, a alça maior da região 1 (indicada por uma seta na figura) está voltada para o interior da dupla fita, enquanto que nas figuras 6.6b e c, a alça maior está voltada para o exterior do ćırculo. Figura 6.6: Visualização inicial da estrutura circular do DNA para as diferentes simulações realizadas para a estrutura com 108 pares de base e 9 voltas. A seta indica a região que contêm a sequência ...TATATA... (região 1). a) Sequência g108A, b) Sequência g108B e c) Sequência g108C. A cor laranja representa nucleot́ıdeos formados por Adenina, a cor verde para Timina, a cor azul para Citosina e a cor vermelha para Guanina. Os resultados foram obtidos utilizando o pacote computacional GROMACS. Tanto o procedimento realizado para a construção das estruturas de DNA, como também o campo de forças foram os mesmos que os utilizados com o AMBER. A troca do pacote computa- cional se deve ao fato do GROMACS realizar os cálculos das trajetórias mais rapidamente. Nessas simulações, acrescentamos mais uma etapa no protocolo de simulação, uma vez que as estruturas do DNA circular, muitas vezes, já apresentavam algum tipo de defeito (quebra da ligação de hidrogênio, despareamento de pares de base, etc) após o passo md8 da tabela 5.1. Essa nova etapa consistiu em colocar restrições de distância entre as fitas, para manter as ligações de Watson-Crick formadas. Essa etapa durou 100ps e a restrição era de 20kcal/mol/Å. Assim, quando a dinâmica de produção era iniciada, a estrutura da molécula estava completamente formada de modo a podermos analisar o efeito do estresse torcional induzido no DNA. CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 42 Tabela 6.1: Sequências das cadeias de DNA utilizadas nas simulações N◦ de pares de base Sequência 102A CGCGCGCGTATATATATATACGCGCGCGCGCGCATAT ATATATATCGCGCGCGCGCGCAAAAAAAAAAAACGC GCGCGCGCGCCACACACACACACGCGCGC 102B GCGTATATATATATACGCGCGCGCGCGCATATATATA TATCGCGCGCGCGCGCAAAAAAAAAAAACGCGCGCG CGCGCCACACACACACACGCGCGCCGCGC 102C CGCGCCGCGCGCGTATATATATATACGCGCGCGCGCG CATATATATATATCGCGCGCGCGCGCAAAAAAAAAA AACGCGCGCGCGCGCCACACACACACACG 108A CGCGCGCTATATATATATACGCGCGCGCGCGCGCATA TATATATATCGCGCGCGCGCGCGCAAAAAAAAAAAA CGCGCGCGCGCGCGCCACACACACACACGCGCGCG 108B GCTATATATATATACGCGCGCGCGCGCGCATATATAT ATATCGCGCGCGCGCGCGCAAAAAAAAAAAACGCGC GCGCGCGCGCCACACACACACACGCGCGCGCGCGC 108C GCGCGCGCGCGCTATATATATATACGCGCGCGCGCGC GCATATATATATATCGCGCGCGCGCGCGCAAAAAAA AAAAACGCGCGCGCGCGCGCCACACACACACACGC CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 43 As análises são feitas através de gráficos de superf́ıcie que mostram a porcentagem de ocupação das ligações de hidrogênio de cada par de bases para cada nano segundo, cálculado a cada 100ps. Dessa forma, podemos acompanhar a evolução temporal da quebra das ligações de hidrogênio e a consequente formação de bolhas de desnaturação. Os cálculos foram realizados utilizando a função hbond da ferramenta PTRAJ do pacote computacional AMBER. Essa função determina a existência da ligação através de uma distância de corte (3,5Å), entre os átomos pesados que formam o par doador-aceitador e de um ângulo de corte (120◦), entre aceitador, hidrogênio e doador. Na figura 6.7 temos os gráficos de superf́ıcie para cada uma das nove simulações rea- lizadas, que tiveram duração de 50ns. Para as estruturas relaxadas (figuras 6.7a, 6.7b e 6.7c), nota-se que na maior parte do tempo as ligações de hidrogênio estão formadas (cor vermelha). Existem alguns pequenos trechos em que observa-se a quebra parcial de uma ou mais ligações de hidrogênio que formam um par de bases (cor amarela), mas sem a separação completa do par de bases. Entretanto, na figura 6.7a nota-se que nos últimos nano segundos da simulação tem-se a quebra de todas as ligações existentes (cor azul) no par de base TA (38), pertencente à segunda região rica em AT. Para as estruturas com densidades de super hélices σ = −0, 05 nota-se que a ocorrência de trechos com alguma quebra de ligação de hidrogênio é maior do que para a estrutura relaxada. Além disso, observa-se o despareamento de um par de base AT (95), pertencente à quarta região rica em AT. Essa separação dura cerca de 5ns e após esse peŕıodo, o par de bases é refeito. As estruturas com maior estresse torcional induzido , σ = −0, 1, apresentam regiões onde há a separação de um ou mais pares de base e geralmente após ocorrer a quebra das ligações, essa queda persiste até o final da simulação. Na figura 6.7g, nota-se em um primeiro instante a separação do par de bases TA (36) pertencente à segunda região rica em AT, que após alguns nano segundos é refeito. Instantes depois, ocorre a quebra dos pares e base AT (100) e CG (101), que estão localizados na interface da região quatro com a região que contém apenas pares CG. Essa quebra persiste até o final da simulação. Já na figura 6.7h, observa-se que as quebras ocorrem entre os pares AT (32), TA (33) e AT (34) pertencentes a região dois; e temos separações entre o par de bases AT (93) da quarta região que são refeitos e no final da simulação tornam a se desfazer. Por fim, na figura 6.7i nota-se a ocorrência da separação dos pares de base AT (24) e GC (25), na CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 44 interface da região um; e dos pares CG (60) e CG (61) que não pertencem a nenhuma região rica em AT. Desse modo, como visto também nas cadeias lineares, quanto maior o estresse torcional induzido no DNA, mais facilmente ocorre a formação de estruturas abertas na molécula. A maioria das quebras de ligações de hidrogênio ocorreram em sequências contendo TA/AT, que além de possuir apenas duas ligações, apresentam o menor grau de estabilidade para a formação da dupla hélice quando considerada a interação entre vizinhos mais próximos [62]. Entretanto, observa-se também estruturas abertas contendo pares CG/GC, que pelo fato de possuir três pontes de hidrogênio e ter um grau de estabilidade maior, seria menos provável de ocorrer. Isso indica, que a formação de estruturas abertas no DNA dependeriam não somente do tipo de sequência que compõe a molécula, como também a flexibilidade geral da estrutura helicoidal. Vale ressaltar, que ao verificar as regiões onde ocorreram a desestabilização da dupla fita, elas ocorreram tanto onde a alça maior da molécula estava voltada para fora do ćırculo, como também para dentro do ćırculo. Sendo assim, não foi posśıvel verificar a influência deste aspecto estrutural na ruptura das ligações de hidrogênio. Através da análise da figura 6.7 podemos inferir onde o estresse torcional ocasiona a quebra das ligações de hidrogênio, entretanto ela não possibilita identificar como ocorre essa quebra. Na figura 6.8 mostramos os diversos tipos de defeitos na estrutura que causam as quebras das ligações de hidrogênio e a consequente separação dos pares de base. Na figura 6.8a temos um estado transiente, onde a quebra das ligações de hidrogênio ocorrem pelo afastamento dos nucleot́ıdeos, entretanto não envolvem grandes ditorções na estrutura da molécula. Encontramos esse caso, por exemplo, na estrutura relaxada e uma continuação da simulação mostra que a ligação é refeita. Um outro defeito encontrado foi um kink do tipo II, figura 6.8b. Esse caso é caracterizado pela separação de um único par de bases e existe uma desestruturação da interação de empilhamento com os vizinhos próximos. Houve também a formação de bolhas de desnaturação (figura 6.8), onde mais de um par de bases é rompido sucessivamente e nota-se uma estrutura aberta na dupla fita. Por fim, temos o caso do despareamento dos pares de base, onde nucleot́ıdeos de pares vizinhos fazem ligação de hidrogênio entre si e sobram dois nucleot́ıdeos sem par, figura 6.8. Esses três últimos casos foram observados nas estruturas com σ = −0.1. CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 45 Figura 6.7: Gráfico de superf́ıcie em escala de cores que mostra a evolução temporal da porcentagem de ocupação das ligações de hidrogênio de cada par de bases. A cor vermelha indica que todas as ligações estão formadas durante cada nano segundo de simulação. Já a cor azul indica que todas as ligações que formam o par de bases estão desfeitas. As figuras a), b) e c) representam estruturas relaxadas (σ = 0, 0). Para as figuras d), e) e f) representam estruturas com σ = −0, 05. Enquanto que as figuras g), h) e i) são de estruturas com σ = −0, 1. CAPÍTULO 6. RESULTADO DAS SIMULAÇÕES DO DNA POR DINÂMICA ATOMÍSTICA 46 Figura 6.8: Visualização dos defeitos estruturais gerados na dupla hélice do DNA durante a simulação por dinâmica molecular. a) Estado transiente, b) Kink do tipo II, c) Bolha de Desnaturação e d) Despareamento dos pares de base. Caṕıtulo 7 Conclusões O trabalho consiste no estudo do comportamento dinâmico no DNA. Em particular, pro- curamos analisar o comportamento de estruturas localizadas espacialmente, que podem estar relacionadas com as funções de transcrição, replicação e recombinação dessa impor- tante macromolécula. A prinćıpio, tratamos o problema através de um modelo mecânico, o modelo de Peyrard-Bishop, que mimetiza o comportamento do DNA. Estudamos o método de criação de 1-site breathers para cadeias não lineares homogêneas, utilizando o procedimento numérico sugerido inicialmente por Marin e Aubry. Após a criação deste tipo de solução localizada, verificamos a sua estabilidade através da teoria de Floquet. A partir do mo- mento que obtivemos uma estrutura do tipo breather e linearmente estável, discutimos a influência da variação de energia no comportamento dinâmico do breather, utilizando como critério um parâmetro baseado na entropia informacional. Observamos que a variação de energia, em um determinado intervalo, permite a lo- calização da energia em um pequeno número de osciladores (menor que 20% do total da rede). Entretanto, quando a energia do sistema é menor que este intervalo, a localização de energia é perdida devido ao fato do modos não lineares não serem excitados e o sistema oscilar no ramo ótico. Já para energias superiores ao intervalo mencionado, a localização é perdida, pois o sistema possui energia suficiente para um ou mais osciladores atingirem o platô do potencial de Morse e consequentemente passa a se comportar como uma cadeia puramente harmônica. Pelo fato de obtermos para altas energias o comportamento puramente harmônico, verificamos a densidade de energia necessária para obter a transição de fase do sistema 47 CAPÍTULO 7. CONCLUSÕES 48 em termos dos aspectos dinâmicos. Pudemos verificar que para densidades de energia superiores ao platô do potencial de Morse, obtemos a transição de fase do sistema que está relacionado com a desnaturação do DNA. Observamos que essa transição ocorre através de um movimento de translação da cadeia de osciladores e que devido a forma como o lagrangiano é escrito, representa a separação da dupla fita. Os resultados mostram a transição de fase do sistema para densidades de energia superiores à profundidade do poço do potencial de Morse D. Entretanto, diferentemente do caso termodinâmico, para E/N = D não foi posśıvel obter a transição de fase. Apesar disso, o comportamento qualitativo encontrado para o modelo está de acordo com a fenomenologia do DNA. Em um segundo momento, começamos a estudar o comportamento dinâmico do DNA por meio de simulações atomı́sticas. Este tipo de estudo, nos permite obter uma visão microscópica do comportamento dessa macromolécula. Procuramos inicialmente relacio- nar os tipos de movimentos presentes no DNA em diferentes temperaturas com as apre- sentadas no modelo minimalista. Nota-se que para altas temperaturas os movimentos relacionados com o stretch tornam-se mais relevantes na dinâmica da molécula. Este fato corrobora com o modelo de Peyrard-Bishop para temperaturas próximas à temperatura de desnaturação. Entretanto para temperaturas mais baixas, os resultados sugerem que para mimetizar a dinâmica do DNA, os modelos mecânicos devem conter movimentos longitudinais e/ou rotacionais. Por fim, estudamos o efeito gerado pelo estresse torcional induzido no DNA. Os resul- tados obtidos indicam, para cadeias lineares, que quanto maior o grau de tensão induzida mais fácil ocorre a formação de bolhas de desnaturação. Sequências do tipo AT demons- tram maior propensão a desnaturar, uma vez que a energia de ligação relativa à ponte de hidrogênio é menor. Para o DNA circular, encontramos também que o aumento no grau de torção confere maior quebra das ligações de hidrogênio e, consequentemente, estruturas abertas na molécula. Como esperado, as quebras geralmente ocorreram em sequências do tipo TA/AT, entretanto elas também ocorreram nos pares CG/GC. Esse fato, indica que não somente a sequência de pares de base que compõem a molécula, mas também outros fatores como a flexibilidade geral do DNA, são responsáveis pela formação de estruturas abertas. Através da dinâmica molecular podemos inferir detalhes atomı́sticos do DNA, como a forma que ocorre a quebra das pontes de hidrogênio e a consequente abertura dos pares CAPÍTULO 7. CONCLUSÕES 49 de base. Entretanto, devido ao alto custo computacional, esse tipo de simulação não fornece estat́ıstica suficiente para quantificar os efeitos da dependência com relação ao tipo de sequência para a formação de bolhas de desnaturação na molécula. Dessa forma, a união desse tipo de análise com o de modelos simplificados poderiam ser úteis para a compreensão deste e de outros fenômenos relacionados com a dinâmica do DNA. 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