LUANA LIMA FERNANDES Preparação e caracterização de nanocelulose a partir do bagaço de laranja pera Guaratinguetá - SP 2019 Luana Lima Fernandes Preparação e caracterização de nanocelulose a partir do bagaço de laranja pera Trabalho de Graduação apresentado ao Conselho de Curso de Graduação em Engenharia de Materiais da Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do diploma de Graduação em Engenharia de Materiais. Orientador: Dr. Paulo Henrique Fernandes Pereira Coorientadora: Dra. Maria Odila Hilário Cioffi Guaratinguetá - SP 2019 F363o Fernandes, Luana Lima Preparação e caracterização de nanocelulose a partir do bagaço de laranja pera / Luana Lima Fernandes – Guaratinguetá, 2019. 79 f. : il. Bibliografia: f. 67-79 Trabalho de Graduação em Engenharia de Materiais – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, 2019. Orientador: Prof. Dr. Paulo Henrique Fernandes Pereira Coorientadora: Profª Drª Maria Odila Hilário Cioffi 1. Fibras. 2. Materiais compostos. 3. Hidrólise. 4. Nanocompósitos (Materiais) I. Título. CDU 620.1 Bibliotecária CRB-8/3595 DADOS CURRICULARES LUANA LIMA FERNANDES NASCIMENTO 05.12.1996 – Lorena / SP FILIAÇÃO Evandro José Fernandes Patrícia Auxiliadora Lima Fernandes 2015/2019 Graduação em Engenharia de Materiais Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” dedico este trabalho de modo especial, aos meus pais, Patrícia e Evandro, e a minha irmã, Letícia, que sempre incentivaram meus estudos e confiaram no meu potencial. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar, agradeço aos meus pais por sempre me proporcionarem a melhor educação que puderam e me auxiliarem durante todos os desafios enfrentados; ao meu orientador, Prof. Dr. Paulo Henrique Fernandes Pereira, que sempre auxiliou na construção de todo o meu conhecimento e em meu crescimento ao longo dos anos que trabalhamos juntos; à Prof. Drª Maria Odila Hilário Cioffi, ao Msc. Daniel Magalhães de Oliveira e todos os membros do Grupo de Fadiga e Materiais Aeronáuticos por sempre contribuírem com o meu estudo e agregarem em meu conhecimento; aos funcionários da Faculdade de Engenharia do Campos de Guaratinguetá pelo apoio, dedicação e alegria em todos os momentos. O presente trabalho foi realizado com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) - código de financiamento 2017/19530-0. “A motivação é uma porta que se abre por dentro.” Mario Sérgio Cortella RESUMO As fibras vegetais são cada vez mais estudadas como opção de substituição a polímeros derivados do petróleo e têm sido avaliadas para aplicações tais como na indústria aeronáutica, naval, alimentícia, biomedicina, entre outras. O Brasil é um dos maiores produtores de suco de laranja, produzindo quase 10 milhões de toneladas por ano, gerando grande quantidade de resíduos. Este trabalho utilizou diferentes tipos de tratamentos químicos visando remover os componentes amorfos da biomassa a fim de obter a celulose e posteriormente preparar nanocelulose via hidrólise ácida partindo da celulose branqueada (CB). Os resíduos solúveis em álcool do bagaço de laranja pera foram removidos através do processo de extração com álcool etílico (RSA), seguido de duas etapas de branqueamento (1B e 2B) com peróxido de hidrogênio (30% v/v) em meio alcalino com uma solução de hidróxido de sódio (NaOH) 4% (m/v), seguida de solução de hidróxido de potássio 5% (m/v) (2B/KOH). Após esses tratamentos, a partir da celulose branqueada, foram isoladas as nanoceluloses através de hidrólise ácida com ácido sulfúrico (H2SO4) 64% e 50% em diferentes tempos de reação: 1 e 2h. Após o isolamento as nanoceluloses foram secas de duas formas: estufa a 50°C e por liofilização. A fibra in natura (IN), RSA, 1B, 2B e 2B/KOH foram caracterizadas através da análise de composição química, difração de raios X (DRX), infravermelho com transformada de Fourier (FTIR), termogravimetria (TGA/DTG) e microscopia eletrônica de varredura (MEV). As nanoceluloses isoladas foram caracterizadas pela técnica de potencial Zeta, análise de tamanho de partícula, microscopia eletrônica de transmissão (MET), DRX, TGA/DTG e FTIR. A nanocelulose obtida com ácido sulfúrico 64% e 1 h de reação apresentou o menor tamanho de partícula (9,48 µm), assim como melhor valor de potencial Zeta (-23,0 mV), indicando melhor dispersão da suspensão, no entanto, apresentaram tendência de aglomeração conforme a análise de TEM, valores de razão de aspecto menores em relação às outras amostras feitas com ácido 50% (L/D = 25). As nanoceluloses secas por liofilização apresentaram melhores propriedades térmicas (estabilidade térmica 250ºC) e os menores valores de tamanho de cristalito (1,5 nm), enquanto as amostras secas em estufa a 50ºC apresentaram os maiores valores de índice de cristalinidade (aproximadamente 95%). Dessa forma, obteve-se a nanocelulose a partir da celulose branqueada oriunda do bagaço de laranja pera com boas propriedades térmicas e alto índice de cristalinidade que podem ser utilizadas em diversas aplicações, como por exemplo, nanocompósitos e filmes para embalagens. PALAVRAS-CHAVE: Nanocelulose. Bagaço de laranja. Hidrólise ácida. Fibras vegetais. ABSTRACT Plant fibers are increasingly being studied as an option to replace petroleum-derived polymers and have been evaluated for applications such as aeronautical, marine, food, biomedicine, and others. Brazil is one of the largest producers of orange juice, producing almost 10 million tons per year, generating a large amount of waste. This work uses chemical methods to remove the amorphous components from biomass to obtain cellulose and later nanocellulose using acid hydrolysis. The alcohol insoluble residues from the orange bagasse are removed by the ethyl alcohol extraction process, followed by two bleaching steps with the hydrogen alcohol (30% v/v) in the alkaline solution with sodium hydroxide (NaOH) 4% (w/v), followed by potassium hydrogen solution 5% (w/v) (2B/KOH). After these chemical treatments, the bleached cellulose was obtained, and acid hydrolysis was performed isolating nanocelluloses, by using sulfuric acid (H2SO4) in different concentrations 64% and 50% in different reaction times: 1 and 2 h. After separating, the nanocelluloses were dried in two ways: oven drying at 50ºC and freeze-drying. The fibers in each step were characterized by chemical composition analysis, X-ray diffraction (XRD), Fourier transform infrared spectroscopy (FTIR), thermogravimetry (TGA), and electron microscopy scanning (SEM).Nanocelluloses were characterized by the potential Zeta technique, particle size analysis, transmission electron microscopy (TEM), XRD, TGA / DTG, and FTIR. The nanocelluloses using a concentration of sulfuric acid as 64% and 1h of reaction resulted in smallest particle sizes (9.48 µm) as well as the best Zeta potential values (-23.0 mV), show better suspension dispersion, however, for cluster analysis of TEM, fiber aspect ratio values in relation to other colors (L/D = 25). As freeze-dried nanocellulose, showed better thermal conditions (thermal stability at 250ºC) and the lowest crystal size values (1.5 nm), however, it is oven-dried at 50ºC with the highest Ic (approximately 95%). Then, a nanocellulose obtained from bleached cellulose from orange bagasse, with thermal characteristics good (thermal stability) and high crystaliniidade index which can be used in various applications such as application in nanocomposites and packaging films. KEYWORDS: Nanocellulose. Orange bagasse. Acid hydrolysis. Plant fibers. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Estrutura dos principais fenilpropanos, precursores da lignina ............................... 21 Figura 2 - Estrutura parcial da hemicelulose ............................................................................ 21 Figura 3 - Estrutura da celulose ................................................................................................ 22 Figura 4 - Estrutura de uma fibra vegetal ................................................................................. 24 Figura 5 - Produção de laranja no Brasil .................................................................................. 26 Figura 6 - Produção de laranja por região do Brasil ................................................................. 26 Figura 7 - Fluxograma da metodologia utilizada...................................................................... 32 Figura 8 - Esquema de obtenção da fibra in natura (A) representado pela cortadeira (B), pelo moinho (C) e pela fibra obtida posteriormente (D) .................................................................. 33 Figura 9 - Sistema RSA (A) e a fibra após o tratamento (B) .................................................... 34 Figura 10 - Sistema de primeiro branqueamento (A) e a fibra após o tratamento (B) ............. 34 Figura 11 - Sistema segundo branqueamento (A) e a fibra após 2B (B) .................................. 35 Figura 12 – Fibra após realizar 2B/KOH.................................................................................. 35 Figura 13 - Esquema de preparação na nanocelulose ............................................................... 37 Figura 14 - Fibra do bagaço de laranja pera: IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ............................. 42 Figura 15 - Curva TG da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ................................................... 45 Figura 16 - Curva de DTG da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ............................................ 45 Figura 17 - Espectro de FTIR para a fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ................................. 48 Figura 18 - Morfologia da fibra IN do bagaço de laranja com ampliação de 100 e 500X ....... 50 Figura 19 - Morfologia da fibra RSA do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X.... 50 Figura 20 - Morfologia da fibra 1B do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X ...... 51 Figura 21 - Morfologia da fibra 2B do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X ...... 51 Figura 22 - Morfologia da fibra 2B/KOH do bagaço de laranja com ampliação de 100 e 500X.............. ........................................................................................................................... 52 Figura 23 - MEV em modo ambiental da topografia da fibra in natura da casca ou epicarpo (1) e da polpa ou mesocarpo (2) ..................................................................................................... 53 Figura 24 – Difratograma de DRX das fibras IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ............................ 54 Figura 25 - Nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4, respectivamente, após a hidrólise. ......... 56 Figura 26 - Distribuição do tamanho de partícula das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 57 Figura 27 - Microscopia Eletrônica de Transmissão das suspensões: (a) NC1, (b) NC2, (c) NC3 e (d) NC4 .......................................................................................................................... 60 Figura 28 - Curva TGA das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa .............. 62 Figura 29 - Curva DTG das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa .............. 63 Figura 30 - Curva TGA da nanocelulose seca no liofilizador .................................................. 65 Figura 31 - Curva de DTG da nanocelulose seca em liofilizador ............................................ 65 Figura 32 – Espectro de FTIR para as nanoceluloses secas em estufa ..................................... 67 Figura 33 – Espectro de FTIR para as nanoceluloses liofilizadas ............................................ 68 Figura 34 – Difratogramas de DRX para as nanoceluloses NC1, NC2, NC3, NC4 secas em estufa........................... .............................................................................................................. 70 Figura 35 - Curva DRX para as nanoceluloses NC1, NC2, NC3, NC4 liofilizadas................. 70 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Parâmetros para obtenção de nanocelulose ............................................................. 36 Tabela 2 - Rendimento dos tratamentos ................................................................................... 43 Tabela 3 – Composição química das fibras do bagaço de laranja pera .................................... 43 Tabela 4 - Temperatura de degradação e perda de massa da fibra da laranja IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH...................... .............................................................................................................. 47 Tabela 5 - Relação entre o número de onda vibracional e o evento associado ......................... 48 Tabela 6 - Cristalinidade da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH ............................................... 54 Tabela 7 - Valores de tamanho de partículas das amostras ....................................................... 57 Tabela 8 - Valores de potencial zeta obtido para cada nanocelulose ........................................ 58 Tabela 9 – Dados do tamanho de partícula obtidos através das imagens de MET ................... 60 Tabela 10 - Temperatura de degradação e perdas de massa das nanoceluloses secas em estufa................... ...................................................................................................................... 63 Tabela 11 - Temperatura de degradação e perdas de massa das nanoceluloses secas no liofilizador .................................................................................................................................66 Tabela 12 - Relação entre o número de onda e o evento associado .......................................... 68 Tabela 13 - Cristalinidade e tamanho do cristalito das nanoceluloses secas em estufa e em liofilizador .................................................................................................................................71 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS IN Fibra in natura RSA Resíduos solúveis em álcool etílico 1B Primeiro branqueamento 2B Segundo branqueamento 2B/KOH Branqueamento com hidróxido de potássio CB Celulose branqueada TGA Termogravimetria DTG Derivada termogravimétrica FTIR Infravermelho com transformada de Fourier MEV Microscopia eletrônica de varredura DRX Difração de raios X MET Microscopia eletrônica de transmissão NC Nanocelulose Ic Índice de cristalinidade P Camada da parede celular primária S1 Camada da parede celular secundária 1 S2 Camada da parede celular secundária 2 S3 Camada da parede celular secundária 3 Ti Temperatura inicial de degradação SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 16 2 OBJETIVOS ........................................................................................................ 18 2.1 OBJETIVO GERAL ........................................................................................... 18 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................. 18 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ........................................................................... 19 3.1 FIBRAS VEGETAIS ............................................................................................. 19 3.2 PRÉ-TRATAMENTOS QUÍMICOS ..................................................................... 24 3.3 LARANJA PERA .................................................................................................. 25 3.4 NANOCELULOSE ............................................................................................... 27 4 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................... 31 4.1 OBTENÇÃO E CLASSIFICAÇÃO GRANULOMÉTRICA ............................... 33 4.2 REMOÇÃO DE RESÍDUOS SOLÚVEIS EM ÁLCOOL ETÍLICO (RSA) ........ 33 4.3 PRIMEIRO BRANQUEAMENTO (1B) .............................................................. 34 4.4 SEGUNDO BRANQUEAMENTO (2B) .............................................................. 35 4.5 SEGUNDO BRANQUEAMENTO (2B/KOH) ..................................................... 35 4.6 PREPARAÇÃO DE NANOCELULOSE .............................................................. 36 4.7 CARACTERIZAÇÃO DOS MATERIAIS PREPARADOS ................................. 37 4.7.1 Análise de composição química e rendimento dos tratamentos químicos ...... 37 4.7.2 Análise Termogravimétrica (TGA/DTG) .......................................................... 38 4.7.3 Difração de Raios X (DRX) ................................................................................. 38 4.7.4 Espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) ...... 39 4.7.5 Microscopia eletrônica de varredura (MEV) .................................................... 39 4.7.6 Potencial Zeta ....................................................................................................... 40 4.7.7 Análise de partículas ........................................................................................... 40 4.7.8 Microscopia eletrônica de transmissão (MET) ................................................. 40 5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ....................................................................... 42 5.1 FIBRAS TRATADAS ............................................................................................ 42 5.1.1 Aspecto e composição química da fibra do bagaço de laranja in natura e após tratamentos químicos ............................................................................................................. 42 5.1.2 Termogravimetria (TGA).................................................................................... 45 5.1.3 Espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) ...... 47 5.1.4 Microscopia eletrônica de varredura (MEV) .................................................... 49 5.1.5 Difração de raios X (DRX) .................................................................................. 54 5.2 HIDRÓLISE ÁCIDA PARA OBTENÇÃO DE NANOCELULOSE (NC) .......... 55 5.2.1 Aparência da suspensão ...................................................................................... 55 5.2.2 Tamanho de partículas ........................................................................................ 57 5.2.3 Potencial Zeta ....................................................................................................... 58 5.2.4 Microscopia eletrônica de transmissão (MET) ................................................. 59 5.2.5 Termogravimetria (TGA).................................................................................... 62 5.2.6 Espectroscopia de transmissão com transformada de Fourier (FTIR) .......... 67 5.2.7 Difratograma de raios X (DRX) ......................................................................... 69 6 CONCLUSÕES .................................................................................................... 73 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 75 16 1 INTRODUÇÃO A preocupação mundial em torno de questões ambientais e sustentabilidade do planeta têm gerado discussões sobre as fontes de matéria-prima alternativas que fossem renováveis e biodegradáveis, levando a um desenvolvimento sustentável. Dessa forma, as fibras lignocelu- lósicas ganharam espaço nos processos industriais, visando um melhor aproveitamento dos resíduos agrícolas gerados no beneficiamento de produtos desta origem (VASCONCELOS et al, 2017; DAI et al, 2018; PIRICH et al, 2019). Diversos trabalhos já utilizam as fibras ligno- celulósicas com o intuito de agregar valor à matéria-prima como por exemplo: bagaço de ca- na-de-açúcar (CANDIDO, GODOY e GONÇALVES, 2017), coco (SATHIPARAN, RUPA- SINGHE e PAVITHRA, 2017), abacaxi (NAKTHONG, WONGSAGONSUP e AMORN- SAKCHAI, 2017), sisal (BADIA et al, 2017), banana (ORSUWAN e SOTHORNVIT, 2017), juta (ELANCHEZHIAN, et al, 2018), algodão (PARK et al, 2019), pinheiro (PIRICH et al, 2019), entre outros. As fibras vegetais já são aplicadas nas indústrias têxtil (ARPITHA E YOGESHA, 2017), farmacêutica (LAKSHMI, TRIVEDI E REDDY, 2017) e alimentícia (GÓMEZ et al, 2016), entre outras. O Brasil é o maior produtor mundial de laranja pera e 96% dessa produção é destinada à extração do suco da fruta (REZZADORI E BENEDETTI, 2009; MACAGNAN et al, 2015; CHU et al, 2017). Durante o processo, cerca de 50% da massa seca da fruta, que corresponde ao bagaço, é descartado após este beneficiamento (REZZADORI E BENEDETTI, 2009). Es- se bagaço originado pode ser destinado para a produção de óleos essenciais, rações animais, etc. A partir desse fato, pode-se dar uma atenção especial para o aproveitamento desta bio- massa oriunda da produção de laranja pera, a fim de buscar alternativas de reaproveitamento para este resíduo, reduzindo esse acúmulo, e dando ao resíduo uma aplicação mais nobre (SILVA et al, 2014; LAM et al, 2017; NEGRO et al, 2017). As fibras lignocelulósicas são formadas, principalmente, por celulose, hemicelulose e lignina, ceras, extrativos e cinzas que são componentes considerados secundários em sua es- trutura. A remoção dos componentes amorfos, ou seja, com menor organização (lignina, he- micelulose, ceras, cinzas e extrativos) resulta na obtenção da celulose, componente com maior organização (MENDES et al, 2017). Por ser o componente que possui maior organização das cadeias em relação aos demais é a celulose, que isolada resulta em ganhos em propriedades mecânica, estabilidade térmica, entre outras (DUFRESNE, 2015). Além dessas propriedades, destaca-se o fato de que as fibras vegetais não são tóxicas para manuseio, possuem baixo cus- 17 to por serem facilmente encontradas na natureza, biodegradáveis e de fontes renováveis (LAKSHMI, TRIVEDI e REDDY, 2017; CARRERA et al, 2017; PARK et al, 2019; PIRICH et al, 2019; ZHANG et al, 2019). A obtenção da celulose pode ocorrer por diferentes meios, sendo eles por tratamentos químicos, físicos e biológicos. Tratamentos químicos, como polpação, tratamento com álcool etílico e branqueamento, promovem a remoção de componentes amorfos como ceras, extrati- vos, lignina e hemicelulose, resultando no que chamamos de celulose branqueada (NASCI- MENTO et al, 2014; RAVINDRAN E JAISWAL, 2016; KIM, LEE E KIM, 2016; ZHANG et al, 2019). A partir da celulose branqueada pode-se isolar a nanocelulose, sendo pelo menos uma de suas dimensões inferior a 100nm (PHANTHONG, et al, 2018). A nanocelulose pode ser obtida por métodos enzimáticos, mecânicos ou químicos. Sendo o último, método químico, o mais utilizado para obtenção de nanocelulose e denominado hidrólise ácida utilizando áci- dos (por exemplo H2SO4 e HCl), com a intenção de romper as regiões amorfas, sem que pre- judique a região cristalina da molécula da celulose (CHERIAN et al, 2010; CHERIAN et al, 2011; ABRAHAM et al, 2011; BENINI, 2015; PHANTHONG et al, 2018; PIRICH et al, 2019; ZHANG et al, 2019). Após a hidrólise ácida e obtenção da nanocelulose pode ocorrer um ganho em proprie- dades mecânicas, térmicas e elétricas quando comparadas à celulose branqueada. Existe na literatura diversas aplicações da celulose e nanocelulose como: indústria alimentícia (estabili- zante de emulsões, embalagem ou ingrediente), energia (produção de energia da biomassa), farmacêutica e têxtil (vestimentas) (GOMÉZ et al, 2016; MOBERG et al, 2016; GÓMEZ et al, 2016; TARRÉS et al 2017; VILAR, 2018; PARK et al, 2019; PIRICH et al, 2019). Neste trabalho, utilizou-se a celulose branqueada oriunda do bagaço de laranja pera pa- ra obtenção de nanocelulose. A fibra in natura foi submetida a dois processos de tratamentos químicos: resíduos solúveis em álcool (RSA), seguido de dois branqueamentos (1B e 2B) e tratado com uma solução de hidróxido de potássio (KOH). A celulose branqueada do bagaço de laranja pera foi utilizada para obtenção de nanoceluloses a partir da hidrólise ácida utili- zando ácido sulfúrico em diferentes concentrações (50% e 64%) e tempos de reação (1h e 2h). As suspensões de nanocelulose preparadas foram secas em estufa e por liofilização a fim de estudar a influência do processo de secagem na estrutura das nanoceluloses. A motivação principal deste trabalho foi desenvolver uma alternativa para utilizar essa biomassa e dar uma aplicação nobre, diminuindo a poluição ambiental e o desperdício uma vez que o Brasil é um dos maiores produtores mundiais. 18 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL Obter e caracterizar a nanocelulose a partir da celulose branqueada oriunda do bagaço de laranja pera (Citrus sinensis) utilizando hidrólise ácida com ácido sulfúrico (H2SO4) em diferentes concentrações e tempos de reação para definir as melhores condições de preparo de nanocelulose utilizando a celulose branqueada dessa biomassa. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Os objetivos específicos a serem desenvolvidos neste trabalho são: - Realizar o pré-tratamento para desestruturação das fibras do bagaço de laranja pera (Citrus sinensis) utilizando quatro diferentes etapas de tratamentos químicos para obtenção da celulose branqueada: remoção de resíduos solúveis em álcool (RSA), duas etapas de branque- amentos (1B e 2B) utilizando uma solução de hidróxido de sódio 4% (m/v) e peróxido de hi- drogênio 30% (v/v), seguido de um tratamento com uma solução de hidróxido de potássio 5% (m/v) (2B/KOH), obtendo a celulose branqueada (CB). - As fibras in natura (IN) e as tratadas quimicamente (RSA, 1B, 2B, 2B/KOH) foram caracterizadas por: análise da composição química, difração de raios X (DRX), termogravi- metria (TGA), microscopia eletrônica de varredura (MEV) e espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR). - As nanoceluloses foram preparadas a partir da celulose branqueada (CB), através de hidrólise ácida com ácido sulfúrico (H2SO4), variando os parâmetros de preparação como tempo de reação (1h e 2h) e concentração do ácido sulfúrico (50% e 64%). - Caracterizar as nanoceluloses em suspenção quanto ao tamanho de partículas, poten- cial zeta e microscopia eletrônica de transmissão (MET). Avaliar os métodos de secagem (lio- filização e em estufa a 50ºC) das nanoceluloses e comparar as propriedades das nanoceluloses secas através de termogravimetria (TG), difração de raios X (DRX) e espectroscopia com transformada de Fourier (FTIR). 19 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1 FIBRAS VEGETAIS Existe uma grande preocupação com o meio ambiente e com isso a utilização dos resíduos agroindustriais oriundos de fibras vegetais, relacionando-os com as questões ambientais e o desenvolvimento sustentável. De modo geral, as matérias primas agroindustriais não são totalmente aproveitadas gerando um resíduo que é descartado ao final de um processo industrial. Esse resíduo tem baixo custo em sua obtenção, é renovável, biodegradável, apresenta baixo peso, não tóxico, dentre outros (VASCONCELOS et al, 2017; DAI et al, 2018; PIRICH et al, 2019). As desvantagens são que as fibras naturais têm uma grande capacidade de hidratação, absorvem umidade com facilidade, dependendo da composição química de cada fibra, por exemplo, fibras com menor teor de lignina tendem a absorver maior quantidade de água. Este fato pode modificar suas dimensões e acarretar em alterações nas suas propriedades primárias, além disso, tendem a formar aglomerados (VASCONCELOS et al, 2017; WANG et al, 2018; PIRICH et al, 2019). A análise química das fibras vegetais leva em conta: o plantio em diferentes regiões e técnicas de plantio, resultando em propriedades diferentes da fibra, com diferentes porcenta- gens de pectina, celulose, lignina, hemicelulose, extrativos e ceras (SILVA et al, 2015). Nos últimos anos, as fibras vegetais têm sido muito estudadas e exploradas para aplicações em diversos segmentos: têxtil (ARPITHA e YOGESHA, 2017), farmacêutico (LAKSHMI, TRIVEDI e REDDY, 2017; PIRICH et al, 2019), revestimentos, alimentício (GÓMEZ et al, 2016), construção civil (PAPPU e THAKUT, 2017), produção de combustíveis (SILVA et al, 2014; ABOAGYE et al, 2017) e reforços mecânicos (PIRICH et al, 2019). São utilizados diferentes tipos de resíduos agroindustriais para a utilização científica e tecnológica, destacando sua importância e aplicação. Dentre essas fibras lignocelulósicas pode-se destacar: bagaço de cana-de-açúcar (CANDIDO, GODOY E GONÇALVES, 2017), coco (MACHADO et al, 2014; SATHIPARAN, RUPASINGHE E PAVITHRA, 2017), abacaxi (NAKTHONG, WONGSAGONSUP E AMORNSAKCHAI, 2017), sisal (BADIA et al, 2017), piaçava (MIRANDA et al, 2015), banana (ORSUWAN e SOTHORNVIT, 2017), juta (ELANCHEZHIAN, et al, 2018), algodão (PARK et al, 2019) e pinheiro (PIRICH et al, 20 2019) as quais têm sido estudadas como uma alternativa para utilização em segmentos diversos substituindo os polímeros derivados do petróleo. As fibras vegetais são compostas majoritariamente por: celulose, hemicelulose e lignina, além desses três componentes estão presentes em sua composição: ceras, extrativos e cinzas como componentes secundários (SOUZA, 2013; RODRÍGUEZ et al, 2016; FERNÁNDEZ et al, 2017; MARIÑO, REZENDE E TASIC, 2018; PARK et al, 2019). A lignina é o constituinte das fibras vegetais que garante o aroma e a cor à fibra, devido à presença de grupos cromóforos (BENINI, 2015) e corresponde de 15 a 40% da massa seca das plantas (SOUZA, 2013). A hidrofobicidade e a sua estrutura fortemente ramificada pode ser considerada um polifenol, sendo suas unidades de repetição o fenilpropano (Figura 1), onde hidroxilas e metoxilas podem substituir os grupos fenil, e sua função na estrutura das fibras vegetais é de um ligante natural nas células da parede vegetal, resultando na rigidez para esta região das fibras (SOUZA, 2013). Essa estrutura altamente ramificada torna o processo de remoção dos componentes amorfos mais complicado pela quantidade de grupos funcionais que devem ser removidos. Ela pode ser extraída da fibra in natura por diversos métodos como processos envolvendo sulfetos e sulfitos, que está entre os processos mais comuns na indústria de papel e celulose (SOUZA, 2013; RODRÍGUEZ et al, 2016; FERNÁNDEZ et al, 2017). O processo mais comum para extrair e/ou isolar a lignina é o organosolv, que consiste num processo de dissolução da lignina em uma mistura de líquidos orgânicos e água, que resulta numa lignina de maior homogeneidade, podendo haver um ganho de propriedades (SOUZA, 2013; RODRÍGUEZ et al, 2016; FERNÁNDEZ et al, 2017). Quanto às suas aplicações, a lignina esteve muito tempo apenas como resíduo do processo de isolamento da celulose, porém estudos têm sido feitos para aplicações em estruturas adesivas (WEINWURM et al., 2016) e compósitos (PANESAR et al, 2013; SOHNI et al., 2019), por exemplo. 21 Figura 1 - Estrutura dos principais fenilpropanos, precursores da lignina p-hidroxifenila guaiacila siringila Fonte: Fernández (2017). A hemicelulose (Figura 2) é um grupo heterogêneo de polissacarídeos de cadeias curtas e ramificadas, composto por diversos monômeros de açúcares, como D-xilose, D-manose, D- galactose, D-glucose e L-arabinoses, que variam de acordo com a espécie da planta e o estágio de desenvolvimento (RAVINDRAN E JAISWAL, 2016) A hemicelulose corresponde de 20 a 30% da estrutura de uma fibra natural, não é tóxica, e possuem estudos para sua aplicação na indústria alimentícia, farmacêutica, etc (SILVA et al, 2015; MENDES et al, 2017). Além disso, em algumas dosagens específicas, a hemicelulose pode conferir maior resistência à drenagem, resistência à tração, resistência térmica para a fibra vegetal, tendo um comportamento diferente para cada tipo de fibra lignocelulósica (SILVA et al, 2015; MENDES et al, 2017), sendo também responsável por aumentar a fibrilação das moléculas da celulose (TARRÉS et al, 2017). Figura 2 - Estrutura parcial de uma molécula de hemicelulose Fonte: Souza (2013). 22 A celulose é o componente principal das fibras lignocelulósicas, a qual pode ser isolada através de tratamentos químicos. É a parte mais cristalina das fibras naturais, ou seja, o constituinte com maior organização das cadeias, e possui polimorfismo, cada um de seus polimorfos são extraídos através de um pré-tratamento específico (MENDES et al, 2017). A celulose, Figura 3, é um polissacarídeo formado por unidades de monossacarídeo β- D-glicose que se ligam entre si através dos carbonos 1 e 4 após unir as ligações β-1,4 glucosídicas, constituída por seis hidroxilas, como mostra Figura 3. Duas unidades de glicose adjacentes são ligadas a partir da eliminação de uma molécula de água entre seus grupos hidroxilas ligadas ao carbono 1 e ao carbono 4. A posição β do grupo hidroxila necessita de um giro da unidade de glicose seguinte em torno do eixo C1-C4 do anel. A unidade repetitiva da cadeia de celulose é a celobiose, com um comprimento de 4,03nm. As suas ligações intramoleculares muito fortes dificultam o processamento deste polissacarídeo e também é o fator que acarreta na sua baixa solubilização na maioria dos solventes, já suas ligações intermocelulares um pouco mais fracas comparada às intra, auxiliam na obtenção de menores tamanhos de partícula, podendo ser obtida a nanocelulose, que será discutido mais à frente (LAKSHMI, TRIVEDI E REDDY, 2017; RAVINDRAN E JAISWAL, 2016; CARRERA et al, 2017, PARK et al, 2019). Figura 3 - Estrutura da celulose Fonte: Cerrera (2017). A celulose tem sido utilizada em vários âmbitos como na indústria alimentícia, farmacêutica, cosmética e outras diversas aplicações na área da saúde (LAKSHMI, TRIVEDI E REDDY, 2017; CARRERA et al, 2017; PARK et al, 2019). A celulose derivada da madeira, por exemplo, já tem sido utilizada no mercado da produção do papel de diferentes tipos como: jornais, livros, entre outros, no entanto esse processo possui limitações, pois a reciclagem desse papel não é viável economicamente e assim gera resíduos (PARK et al, 2017). 23 O eucalipto é um exemplo de vegetal que ganhou mais destaque com o passar dos anos por ter um teor alto de celulose em sua composição, fazendo dele um grande atrativo para fabricação de biocombustíveis, por exemplo (PARK E KIM, 2012). As fibras sintéticas como vidro, carbono ou Kevlar possuem elevada resistência mecânica e são comumente utilizadas em compósitos avançados. As fibras vegetais como a celulose é um alternativa de utilizar um polímero renovável e conferir maior tenacidade à fratura a esse tipo de compósito, contribuindo para a vida útil do compósito e também podendo reduzir a utilização de fibras sintéticas (LAU et al, 2018; DILAMIAN E NOROOZI, 2019). Através da estrutura das fibras vegetais (Figura 4) é possível entender seu funcionamento e suas propriedades. Percebe-se sua complexidade, por ter diferentes camadas na estrutura. O lúmen é o núcleo da fibra vegetal, envolto por camadas de microfibrilas na parede celular secundária, onde a orientação dessas microfibrilas determinará possivelmente o ângulo de maior resistência à tração da fibra vegetal. E, na menor parte das microfibrilas, observa-se a celulose semi-cristalina, onde intercala as regiões cristalinas e amorfas em sua estrutura (LAU et al, 2018; DILAMIAN E NOROOZI, 2019; PARK et al, 2019). Observando a Figura 4, o lúmen é a região mais interna da estrutura responsável pelo transporte de nutrientes nas plantas, rodeado por outras camadas que possui diferentes orientações de suas microfibrilas, garantindo melhores propriedades mecânicas para a fibra (BENINI, 2015; LAU et al, 2018). As camadas da parede secundária S1, S2 e S3 são onde se encontram a maior parte das microfibrilas de celulose e apresentam orientação destas microfibras diferentes entre si. A parede celular primária (P) é a parte que apresenta maior quantidade de hemicelulose e a lamela média é uma camada fina formada principalmente por pectina, responsável por manter as camadas unidas (CARVALHO et al, 2009; BENINI, 2015; QUINELATO, 2016; SOOD E DWIVEDI, 2018). 24 Figura 4 - Estrutura de uma fibra vegetal Fonte: Lau et al (2018). 3.2 PRÉ-TRATAMENTOS QUÍMICOS Os pré-tratamentos químicos são utilizados para remover ou isolar a fibra vegetal dos componentes que possuem menor organização, ou seja, amorfos em relação à celulose, sendo eles: ceras, extrativos, hemicelulose, lignina, pectina, entre outros (NASCIMENTO et al, 2014). Após os pré-tratamentos, é possível notar uma melhora em certas propriedades das fibras vegetais como menor porosidade, maior área de superfície, maior resistência à umidade, resistência mecânica superior e aumento da cristalinidade do material, deixando o material mais suscetível a cada tratamento químico subsequente (KIM, LEE E KIM, 2016). O pré-tratamento mais utilizado para a obtenção da celulose isolada é a lavagem das fi- bras com algum solvente orgânico (onde as misturas mais comuns são tolueno e etanol ou benzeno e etanol), seguido de um tratamento alcalino utilizando geralmente hidróxido de só- dio, hidróxido de potássio ou clorito de sódio (DUFRESNE, 2015). Porém existem outros pré- tratamentos que também podem ser utilizados dependendo do resultado esperado, tais como: acetilação, esterificação, benzoilação, tratamento com peróxidos, com permanganato, cloreto de sódio, no entanto, estes tratamentos podem acarretar na modificação da superfície das fi- bras (RAVINDRAN E JAISWAL, 2016; KIM, LEE E KIM, 2016; MARIÑO, REZENDE E TASIC, 2018; PIRICH et al, 2019). Os pré-tratamentos alcalinos são feitos, em sua maioria, utilizando hidróxido de sódio, hidróxido de potássio e hidróxido de cálcio, em que os hidróxidos contendo metais alcalinos tendem a aumentar a formação de poros intercalando o metal de sua estrutura à estrutura car- bônica da fibra e também aumentar a área superficial da fibra. Esse tipo de pré-tratamento 25 pode ser feito em temperaturas mais baixas, comparando aos pré-tratamentos ácidos, porém com maior tempo de reação. A diferença entre esses produtos alcalinos é a facilidade de ma- nuseio e sua eficiência no processo para obtenção de celulose (PARK E KIM, 2012; RABE- MANOLONTSOA E SAKA, 2015; LAM et al, 2017; PIRICH et al, 2019). Após o tratamento alcalino, faz-se os tratamentos necessários para que haja a remoção de componentes amorfos ou grupos cromóforos ainda presentes na fibra. Esse processo pode ser realizado com diversos reagentes como peróxido de hidrogênio (H2O2), hipoclorito de sódio (NaClO), mistura de ácidos nítrico (HNO3) e acético (CH3COOH), entre outros (DU- FRESNE, 2015). Os reagentes contendo cloro em sua composição têm sido menos utilizados, pois quando liberados na natureza, formam compostos organoclorados que são altamente no- civos ao meio ambiente, por isso, a utilização do peróxido de hidrogênio (H2O2) é uma alter- nativa recomendada, pois os principais produtos formados são água, oxigênio e alguns radi- cais intermediários (DUFRESNE, 2015; SILVA et al, 2015). Um ponto muito importante que deve ser considerado ao se realizar os pré-tratamentos químicos é interação entre todos os reagentes envolvidos no processo e como isso afeta a es- trutura da fibra, além de métodos de descarte e/ou reaproveitamento, pois muitos tratamentos são feitos utilizando ácidos, por exemplo, que se descartados incorretamente podem ocasionar danos ao local (CHENG, ZHAO E HU, 2018). 3.3 LARANJA PERA As frutas cítricas, como as laranjas, são as mais consumidas no mundo. A laranja pera Citrus sinensis (SANTOS E MORAIS, 2015), é produzida em países tropicais como no Brasil, onde 96% das frutas colhidas nas lavouras são transformadas em suco e, durante a produção do suco, 50% do peso da fruta é descartado como bagaço (casca, polpa e sementes) (MACA- GNAN et al, 2015; CHU et al, 2017). O Brasil é o maior produtor de laranja no mundo correspondendo a 53% do mercado mundial e a laranja pera (Citrus sinensis) corresponde a quase 50% da produção nacional de frutas (REZZADORI E BENEDETTI, 2009), produzindo 9,5 milhões de toneladas de bagaço por ano (SANTOS E MORAIS, 2015). A produção mundial, em 2017, atingiu 82 milhões de toneladas de produção de laranja pera (KWON et al, 2019). E a quantidade de resíduos da produção mundial do suco da fruta atingiu até 20 milhões de toneladas por ano (ABOAGYE et al, 2017). A Figura 5 mostra a produção de laranja no Brasil desde a década de 70 até 2015, após o último registro feito pela EMPRAPA em 2017, assim como os dados das regiões mais 26 produtoras, as quais se encontram, na região Sudeste (Figura 6) liderado pelo estado de São Paulo. Figura 5 - Produção de laranja no Brasil Fonte: Embrapa (2015/2017). Figura 6 - Produção de laranja por região do Brasil Fonte: Embrapa (2015/2017). 27 Esse tipo de resíduo agroindustrial pode ser utilizado para fabricar produtos que sejam economicamente viáveis, por exemplo: ração animal para bovinos e caprinos, óleos essenciais, polímeros biodegradáveis, biocombustíveis, fertilizantes orgânicos, pectina e enzimas, que são aplicações que exigem elevada utilização de recursos como água, energia e matéria-prima (SILVA et al, 2014; LAM et al, 2017; NEGRO et al, 2017; MARIÑO, REZENDE e TASIC, 2018). No estudo feito por Aboagye e seus colaboradores (2017), foi observado agregação de valor na fibra da laranja pera, revelando o alto potencial que essa fibra tem para a produção de biocombustíveis e que seu desempenho se equipara ao biocombustível produzido a partir do eucalipto. Atualmente, a laranja pera tem sido estudada em diversos ramos da tecnologia, como por exemplo: para a redução da temperatura de trabalho com o aumento da superfície de con- tato para obtenção de carbono ativado (LAM et al, 2017), otimização a secagem a quente combinando com a secagem a quente por micro-ondas (TALENS, GIRALDEZ E FITO, 2016), utilização dos flavonóides da laranja como meio de proteger feridas no intestino (CHEN E KITTS, 2017), como meio de absorver metais pesados utilizando resíduo do bagaço da laranja (GUIZA, 2017), produção de biocombustível através da pirólise (ABOAGYE et al, 2017; KWON et al, 2019), remoção de corantes de soluções aquosas (SUN et al, 2019). Assim, per- cebe-se que essa fibra possui características atrativas e que ainda tem potencial para ser explo- rada. Além disso, a estimativa é que a colheita de laranjas cresça em mais de 20% nas safras de 2019 e 2020, em relação à safra média da última década. Dentro desta produção, a estima- tiva é que a laranja pera (Citrus sinensis) atinja uma produção, nas próximas safras, de mais de 4,5 milhões de toneladas apenas nas regiões do Estado de São Paulo e no Sudoes- te/Triângulo Mineiro. Assim, conclui-se que o aumento da produção também acarretará no aumento da quantidade de resíduos gerados, mostrando a significância em estudar este mate- rial para aplicações tecnológicas (FUNDECITRUS, 2019). 3.4 NANOCELULOSE Um material, para ser considerado nano, deve ter, pelo menos, uma de suas dimensões inferior a 100nm (PHANTHONG, et al, 2018). Existem três tipos de nanocelulose: as nanofibriladas, bacterianas e nanocristalinas. A nanocelulose fibrilada é obtida através de métodos mecânicos que, além de quebrar as cadeias da molécula de celulose na região amorfa, também retiram resíduos de outros componentes 28 amorfos presentes na estrutura, obtendo um material longa e flexível (CHERIAN et al, 2010; PHANTHONG, et al, 2018; PARK et al, 2019). A nanocelulose bacteriana utiliza de alguns tipos de bactérias para produção da estrutura nano em cultura aquosa com fontes de açúcar e com estrutura mais pura por não conter outros componentes presentes (ABRAHAM et al, 2011; PHANTHONG et al, 2018). Nanocristais de celulose ou whiskers, são provenientes da celulose obtida através de hi- drólise ácida, onde a região amorfa da molécula é atacada e quebrada enquanto a região cris- talina permanece inalterada, seu formato final apresenta forma de bastonetes, hastes ou agu- lhas, tendo pelo menos uma de suas dimensões inferiores a 100 nm. Grande parte dos estudos sobre a obtenção de nanocelulose, evidenciam que a hidrólise ácida leva a propriedades me- cânicas, térmicas e elétricas superiores em relação aos outros tipos de processos de obtenção (CHERIAN et al, 2011; BENINI, 2015; PHANTHONG et al, 2018; PIRICH et al, 2019). Existem dois tipos de hidrólise para produzir nanocelulose ou whiskers de celulose: en- zimática e ácida, sendo a primeira feita com a utilização de enzimas que quebram as ligações glucosídicas da celulose, resultando em um material com maior regiões cristalinas, já a se- gunda é a mais utilizada onde o ácido rompe as ligações intermoleculares quebrando as regi- ões amorfas e mantendo as regiões cristalinas inalteradas (PHATHONG, et al, 2018; NADU- PARAMBATH, et al, 2018). Ao realizar a hidrólise ácida pode-se variar alguns parâmetros como o tipo de ácido ou mistura deles, concentração do ácido, tempo de reação e temperatura da reação. Estes parâme- tros influenciam diretamente nas propriedades e no tamanho final que será obtida após o pro- cessamento (PARK E KIM, 2012; RABEMANOLONTSOA E SAKA, 2015; LAM et al, 2017; NADUPARAMBATH et al, 2018; MARIÑO, REZENDE E TASIC, 2018; PIRICH et al, 2019). A obtenção da nanocelulose é normalmente feita através de hidrólise ácida, utilizando, principalmente, ácido clorídrico (HCl), fosfórico (H3PO4) e sulfúrico (H2SO4) ou mistura de ácidos (MOBERG et al, 2016; LI et al, 2019; PIRICH et al, 2019). Existe na literatura nano- celulose preparada a partir de algumas fibras lignocelulósicas utilizando ácido clorídrico, co- mo pode-se citar: curauá (CORRÊA, 2010), tronco de palmeira (LAMAMING et al., 2017), algodão (LI et al, 2019), etc. O ácido clorídrico possui grande efetividade na produção de na- nocelulose, porém esse ácido promove a formação de compostos organoclorados, que ao se- rem descartados, são altamente prejudiciais ao meio ambiente, assim, a proposta de um mate- rial sustentável se torna distante (SOUZA, 2013; BENINI, 2015). 29 O ácido sulfúrico é o mais utilizado para preparação de nanocelulose, uma vez que ele ataca as partes amorfas da fibra de maneira mais agressiva e eficiente, existem trabalhos na literatura de algumas fibras lignocelulósicas para obtenção de nanocelulose, tais como: casca de abacaxi (CHERIAN, 2010; CHERIAN, 2011), bagaço de cana-de-açúcar (MANDAL E CHAKRABARTY, 2011), algodão (MORAIS et al, 2013; PARK et al, 2019), bambu (XIE et al, 2016), madeira (YOUSEFI, AZARI E KHAZAEIAN, 2018), palha de arroz (DILAMIAN E NOROOZI, 2019), cúrcuma (ZAINUDDIN et al, 2017), pinheiro (PIRICH et al, 2019), entre outros. Durante a hidrólise ácida com ácido sulfúrico, ocorre um evento chamado sulfonação, fenômeno em que os sulfatos do ácido reagem com as hidroxilas livres da estrutura da celulo- se formando uma cadeia sulfonada. Dessa forma, as regiões em que ocorre este fenômeno possuem diferentes propriedades em relação a estrutura da celulose que não sofreu este fenô- meno. Como resultado da hidrólise, forma-se uma suspensão de nanocelulose com mais esta- bilidade, pois os sulfatos carregados negativamente geram repulsão de suas cargas negativas presentes nas superfícies das nanoceluloses. Fatores como tempo de reação, concentração do ácido e temperatura do processo de hidrólise pode afetar este processo, influenciando na esta- bilidade da suspensão. Para verificar se esse fenômeno aconteceu, são utilizadas algumas téc- nicas de análises como termogravimetria, difração de raios X, espectroscopia de infraverme- lho com transformada de Fourier, microscopia eletrônica de transmissão (TEM) e potencial Zeta (MANDAL E CHAKRABARTY, 2011; CHERIAN, 2010; CHERIAN, 2011; MORAIS et al, 2013; PIRICH et al, 2019). As concentrações utilizadas para a hidrólise ácida geralmente estão dentro de um inter- valo de 50 a 75% de ácido sulfúrico (H2SO4). No entanto, valores em torno de 50% promo- vem menor efetividade durante o processo, que possui uma duração maior e produz menor quantidade de partículas nano, já valores superiores a 60% demonstram maior produtividade, com obtenção de maiores quantidades de partículas nano em menor tempo de reação (CHEN et al, 2015). As vantagens em utilizar as nanofibras de celulose são suas boas propriedades mecâni- cas como módulo de elasticidade, a biodegradabilidade, ser de fonte renovável, possuir baixo peso, ter transparência e não ser tóxica para a manipulação (BENINI, 2015; DILAMIAN E NOROOZI, 2019; FORTES et al, 2019; PARK et al, 2019). Gómez e seus colaboradores (2016) observaram que estruturas nano têm sido utilizadas na indústria alimentícia com o objetivo de estudar o seu comportamento como estabilizador de emulsões e em embalagem. 30 Além da aplicação na área alimentícia, as nanoceluloses têm sido estudadas para aplica- ções biomédicas, como na odontologia, buscando soluções de um material mais sustentável e que promova um menor número de rejeição quando em contato com o tecido humano (VI- LAR, 2018; MARIÑO, REZENDE E TASIC, 2018). Com o avanço nos estudos de fontes renováveis, a nanocelulose ganhou espaço para estudo em diversos tipos de aplicações. Esse trabalho busca estudar e compreender as propri- edades da nanocelulose oriunda do bagaço de laranja pera, resíduo descartado no Brasil, e estudar suas possíveis aplicações a fim de estudar novas aplicações científicas. 31 4 MATERIAIS E MÉTODOS A metodologia empregada para atingir o objetivo do trabalho pode ser observada no fluxograma da Figura 7, que mostra as etapas de preparação dos materiais. 32 Figura 7 - Fluxograma da metodologia utilizada Fonte: Autor (2019). 33 4.1 OBTENÇÃO E CLASSIFICAÇÃO GRANULOMÉTRICA O bagaço da laranja pera foi coletado no restaurante (Figura 8A) da Universidade Esta- dual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” no Campus de Guaratinguetá, seco em estufa a 600C por 48h no Laboratório de Preparação de Amostras do Grupo de Fadiga e Materiais Aeronáu- ticos FEG - UNESP. Como mostra a Figura 8, as fibras foram trituradas em uma cortadeira de modelo GP1500AB (Figura 8B), seguido em um moinho de faca Tipo WILLYE TE-650 (Fi- gura 8C), e peneiradas em uma peneira de granulometria 710µm, obtendo a fibra in natura (Figura 8D). Figura 8 - Esquema de obtenção da fibra in natura (A) representado pela cortadeira (B), pelo moinho (C) e pela fibra obtida posteriormente (D) Fonte: Autor (2019). 4.2 REMOÇÃO DE RESÍDUOS SOLÚVEIS EM ÁLCOOL ETÍLICO (RSA) As fibras do bagaço da laranja in natura foram tratadas com álcool etílico para a remo- ção dos resíduos solúveis em álcool (RSA), conforme a Figura 9A. Foram adicionados 350mL de álcool etílico em três balões diferentes, e em cada um dos balões contendo o álcool etílico foram colocadas 20g de fibra, os três sistemas interligados em um sistema de extração em Soxhlet. Os balões foram submetidos a aquecimento, enquanto uma mangueira na parte supe- rior transporta água gelada fazendo com que o vapor se condensasse novamente passando pela fibra e removendo os resíduos, o procedimento foi realizado por 24h. A fibra RSA foi seca em estufa a 60ºC por 24h para ser utilizada no próximo tratamento conforme Figura 9B. 34 Figura 9 - Sistema RSA (A) e a fibra após o tratamento (B) Fonte: Autor (2019). 4.3 PRIMEIRO BRANQUEAMENTO (1B) Após o tratamento RSA, foi feito o primeiro branqueamento (1B), conforme a Figura 10, 5 g de fibra tratada (RSA) foram adicionadas em uma solução com 300 mL NaOH 4% (m/v) e 30 mL H2O2 30% (v/v), a 70°C por 1h. Decorrido esse tempo foi adicionado ao siste- ma mais 30 mL de solução de NaOH 4% (m/v) e 30 mL H2O2 30% (v/v), após 2h de reação mais uma fração de 30mL de solução NaOH 4% (m/v) e 30 mL H2O2 30% (v/v) por mais 1h. Após 3 horas de reação foi cessada e a solução foi filtrada, lavada com água até o pH neutro e seco em estufa a 60°C por 24h, que foi utilizado no próximo tratamento. Figura 10 - Sistema de primeiro branqueamento (A) e a fibra após o tratamento (B) Fonte: Autor (2019). 35 4.4 SEGUNDO BRANQUEAMENTO (2B) Após o tratamento 1B, foi feito o segundo branqueamento (2B), conforme a Figura 11. O procedimento foi idêntico ao item 4.3, porém sem a última adição de hidróxido de sódio e peróxido de hidrogênio, resultando em 2h de duração. O material seco foi utilizado no próxi- mo tratamento. Figura 11 - Sistema segundo branqueamento (A) e a fibra após 2B (B) Fonte: Autor (2019). 4.5 SEGUNDO BRANQUEAMENTO (2B/KOH) As fibras secas após 2B foram tratadas na proporção 1g de fibra para 20mL de uma so- lução alcalina de hidróxido de potássio (KOH) 5% (m/v) por 1h na temperatura de 80ºC. Figura 12 – Fibra após realizar 2B/KOH Fonte: Autor (2019). 36 4.6 PREPARAÇÃO DE NANOCELULOSE As nanoceluloses foram preparadas utilizando a celulose branqueada por meio de hidrólise ácida utilizando ácido sulfúrico, de acordo com metodologia sugerida por Rosa et al. (2010) com algumas modificações. Os parâmetros utilizados foram razão fibra/solução constante de 1/20 (g/mL), temperatura constante de 50°C, variando a concentração do ácido sulfúrico e o tempo de reação, conforme a Tabela 1. Tabela 1 – Parâmetros para obtenção de nanocelulose Nanocelulose Ácido Concentração (% m/m) Tempo (min) Razão fibra/solução (g/mL) Temperatura (°C) NC1 H2SO4 50 60 1:20 50 NC2 H2SO4 50 120 1:20 50 NC3 H2SO4 64 60 1:20 50 NC4 H2SO4 64 120 1:20 50 Fonte: Autor (2019). Após decorrido o tempo de reação de cada hidrólise, a reação foi interrompida com adição de 100mL de água destilada gelada e a suspenção resultante foi submetida a centrifugação por 3 vezes em uma centrífuga Nova Técnica (modelo MT820) disponível no laboratório de Polímeros da UNESP; Campus Guaratinguetá, a 5000rpm por 15min a temperatura ambiente. Em seguida, a solução foi submetida por mais 2 vezes em uma centrífuga a 10000 rpm por 10 min a -10 °C disponível na Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP), seguida de ultrassonificação em um ultrassom Sonics & Materials (modelo VCX750) de 20kHz de frequência com pulso de 20s e 5s de repouso, com amplitude de 35% por 5min em banho de gelo para evitar o aquecimento em solução. Após esse processo, a solução foi colocada em membrana de diálise da marca SERVA (modelo SERVAPOR® dialysis tubing MWCO 12000-14000) com diâmetro de 20mm para remoção do excesso de ácido até atingir pH 6-7, por aproximadamente 48h, como mostrado na Figura 13. 37 Figura 13 - Esquema de preparação na nanocelulose Fonte: Autor (2019). Depois desta etapa, as nanoceluloses foram secas por duas rotas de processamento: em estufa e por liofilização. Na estufa, foi utilizada temperatura de 50°C durante aproximadamente 48h. No liofilizador, as amostras foram congeladas a -80°C e secas em liofilizador modelo LT1000 da marca Terroni disponível na Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP). 4.7 CARACTERIZAÇÃO DOS MATERIAIS PREPARADOS 4.7.1 Análise de composição química e rendimento dos tratamentos químicos As fibras IN, RSA e 2B/KOH foram caracterizadas quimicamente com objetivo de quantificar os teores de celulose, hemicelulose, lignina, cinzas e extrativos presentes nas fibras. A caracterização foi feita no Departamento de Biotecnologia da Escola de Engenharia de Lorena (EEL/USP) seguindo a metodologia analítica proposta por Sluiter e colaboradores (2012). Inicialmente, as fibras foram moídas em um moinho de facas e depois peneiradas. As partículas correspondentes à fração 710µm foram separadas e utilizadas na análise de compo- sição química. Aproximadamente 3g de cada amostra foram utilizadas na determinação de extrativos na biomassa, realizada em duas extrações consecutivas em aparelho Soxhlet, uma com água e outra com álcool etílico comercial 96º GL, ambas por 24h. Para a determinação dos carboidratos estruturais e lignina, as amostras foram submetidas à hidrólise ácida com ácido sulfúrico 72% (m/m) a 30ºC por 1h (0,3g de amostra e 3,0 mL de ácido sulfúrico). Após o período de 1h, o ácido foi diluído à concentração final de 4% (adição de 84 mL de água) e a mistura foi aquecida a 121ºC em autoclave por 1h. O material resultante foi resfriado e filtra- 38 do com papel filtro e os sólidos insolúveis foram secos a 105ºC, carbonizados a 575ºC e a fração carbonizada foi denominada como lignina insolúvel em ácido. As concentrações de açúcares monoméricos na fração solúvel foram determinadas após a neutralização do filtrado com carbonato de cálcio por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE). O rendimento de cada tratamento químico foi calculado através da Equação 1 conside- rando as massas iniciais e finais a cada uma das etapas. (1) Em que: Mi = massa inicial antes do tratamento químico Mf = massa final depois do tratamento químico 4.7.2 Análise Termogravimétrica (TGA/DTG) As fibras (IN, RSA, 1B, 2B, 2B/KOH e das nanoceluloses secas em estufa a 50ºC e por liofilização NC1, NC2, NC3, NC4) foram analisadas em relação as suas propriedades térmi- cas em uma termobalança Seiko modelo TGA-50, disponível no Laboratório de Reologia e Termoanálise da FEG/UNESP, com uma razão de aquecimento de 10ºC.min-1, sob fluxo de nitrogênio, numa faixa de temperatura de 25 a 600ºC. 4.7.3 Difração de Raios X (DRX) Os difratogramas de raios X das fibras (IN, RSA, 1B, 2B, 2B/KOH e das nanoceluloses secas em estufa a 50ºC e por liofilização NC1, NC2, NC3, NC4) foram obtidos em um difratômetro de raios X da marca Shimadzu modelo XDR-6000, disponível no Departa- mento de Engenharia de Materiais da Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, com fonte de radiação CuKα, voltagem de 40 kV, corrente de 40 mA, varredura 0,05 (2θ/5s) para valo- res de 2θ entre 10 e 40°. Com os resultados obtidos foi possível calcular os índices de cristali- nidade dos materiais preparados utilizando o programa Origin. A cristalinidade foi calculada pelo método de Segal, através da Equação (2). na qual: Ic → Índice de cristalinidade em porcentagem; I (2) 39 I(002) → Pico de difração que representa o material cristalino próximo de 2θ ≅ 22º; I(am) → vale mínimo de difração que representa o material amorfo próximo de 2θ ≅ 17º. O tamanho do cristalino foi calculado através da equação de Scherrer (Equação 3) (3) na qual: L → tamanho do cristalito (diâmetro médio das partículas); λ → comprimento de onda da radiação eletromagnética; θ → ângulo de difração; β(2θ) → largura da metade da altura do pico de difração. 4.7.4 Espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) Os espectros das fibras (IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH) e das nanoceluloses secas em es- tufa a 50ºC e por liofilização NC1, NC2, NC3, NC4) foram determinados em um espectrofo- tômetro Perkin Elmer, modelo Spectrun 100, disponível no Departamento de Física da FEG/UNESP, utilizando o método de transmitância ATR sendo medido os valores no interva- lo de 600 a 4000 cm-1, com 8 varreduras, a fim de analisar os grupos funcionais presentes nas amostras. 4.7.5 Microscopia eletrônica de varredura (MEV) A análise de MEV foi utilizada para caracterizar morfologicamente as fibras (IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH). As amostras foram analisadas em um microscópio eletrônico de varredu- ra Zeiss EVO LS-15 com sistema EDS/EBDS Oxford INCA Energy 250 disponível no LAI- Mat - Laboratório de Análise de Imagens de Materiais da FEG-UNESP, operando de 15 a 20 kW e utilizando detector de elétrons secundários. As amostras foram fixadas em um suporte, com auxílio de uma fita de carbono autocolante dupla face, e submetidas ao recobrimento metálico com ouro. Além disso, foi utilizada a técnica do MEV ambiental, realizada no microscópio eletrô- nico de varredura Zeiss EVO LS-15 com sistema EDS/EBDS Oxford INCA Energy 250 dis- ponível no LAIMat - Laboratório de Análise de Imagens de Materiais da FEG-UNESP, ope- 40 rando a 20 kW e utilizando detector de elétrons secundários. A atmosfera simula o ambiente com vapor de água e umidade a 67,0%. 4.7.6 Potencial Zeta Alíquotas de suspensões das nanoceluloses após a ultrassonificação foram caracterizadas quanto à presença de cargas superficiais usando o potencial Zeta, modelo Zeta Sizer Nano Siries da MALVERN, disponível no Departamento de Engenharia Química da Escola de Engenharia de Lorena (USP). Os resultados foram calculados com uma média de três medidas analisadas nas seguintes condições: ângulo de 15º, índice de refração da água igual a 1,33, viscosidade de 0,88 mPa.s e temperatura de 25ºC. 4.7.7 Análise de partículas O tamanho de partículas e a distribuição de tamanho de partículas foram analisadas utilizando o analisador de partículas de difração de raios laser Mastersizer 3000 (Malvern Instruments). A análise foi conduzida em baixa obscuração (0,5 – 4%) isto é, medida de concentração da suspensão durante a análise com rotação de 3500 rpm. Os parâmetros de entrada foram naturalmente ajustados para assumir que era um modelo de partícula não esférica e o índice de refração para 1,46683, o índice de refração para a celulose. A distribuição final do tamanho de partícula foi reportada como densidade numérica do tamanho de partículas. Antes de cada análise a unidade de dispersão da amostra foi automaticamente lavada três vezes com água ultrapura. 4.7.8 Microscopia eletrônica de transmissão (MET) As suspensões de NC foram diluídas em água deionizada na proporção de 1:100 (v/v), ultrassonificadas por 5 min. e uma gota da solução foi transferida para a grade de cobre onde permaneceu por 1 min. e depois foi seca com papel filtro, em seguida foi transferida uma gota de solução de uranila 1% (v/v) sobre a amostra permanecendo por 5 minutos e depois foi seca com papel filtro. Foi utilizado o microscópio da marca FEI modelo Tecnai G2 20 S-TWIN operando a 200 kV, ambos disponíveis no Instituto de Estudos Avançados do Mar (IEAMar) Instituto de 41 Ciência e Tecnologia (ICT) na UNESP, Campus de São José dos Campos. Para calcular o comprimento e o diâmetro médio das partículas foi utilizado o Software ImageJ e os resultados foram baseados na média das medidas. 42 5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 5.1 FIBRAS TRATADAS 5.1.1 Aspecto e composição química da fibra do bagaço de laranja in natura e após tra- tamentos químicos A Figura 14 mostra as imagens das fibras do bagaço da laranja IN (a), RSA (b), 1B (c), 2B (d) e 2B/KOH (e). Figura 14 - Fibra do bagaço de laranja pera: IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH Fonte: Autor (2019). A Figura 14, mostra fibra in natura (IN) que apresenta coloração marrom, a qual se mantém quase inalterada após o RSA. Observa-se que após o 1B que a coloração da fibra mu- da drasticamente, indicando que este tratamento retirou grande parte dos constituintes amor- fos da fibra. A coloração após o tratamento 2B e 2B/KOH apresentou uma leve mudança na coloração da fibra, podendo ter algum resquício dos tratamentos realizados, o que será discu- tido nas caracterizações seguintes. A tendência de clareamento das fibras se deve à remoção 43 dos grupos cromóforos da estrutura, componente proveniente do ácido hexenurônicos (com- ponente da hemicelulose e da lignina residual) (BENINI, 2015). A Tabela 2 evidencia o rendimento das etapas de tratamento químico utilizadas. Tabela 2 - Rendimento dos tratamentos IN→ RSA RSA → 1B 1B → 2B 2B → 2B/KOH 61,41% 27,46% 78,03% 78,93% Fonte: Autor (2019). Como observa-se na Tabela 2, o tratamento RSA foi menos agressivo à fibra, enquanto o 1B foi mais agressivo, tendo um rendimento menor. O rendimento entre as etapas do 1B, 2B e 2B/KOH tiveram resultados muito próximos, observando que os componentes amorfos da fibra foram removidos durante estas etapas de tratamentos. Na Tabela 3, estão os valores de composição química obtidas para as fibras IN, RSA e 2B/KOH. Tabela 3 – Composição química das fibras do bagaço de laranja pera Amostra Cinzas (%) Lignina (%) Celulose (%) Hemicelulose (%) Total (%) IN 4,17 ± 0,04 6,68 ± 1,87 24,32 ± 1,26 11,05 ± 0,80 46,22 ± 4,52 RSA 6,63 ± 0,04 7,86 ± 0,71 31,05 ± 4,01 18,10 ± 3,71 63,64 ± 3,80 2B/KOH 3,07 ± 0,04 2,00 ± 0,15 79,34 ± 4,15 16,33 ± 1,94 100,74 ± 6,18 Fonte: Autor (2019). Conforme Tabela 3, observa-se que a fibra IN apresenta um teor de lignina de 6,68%, hemicelulose 11,05% e celulose 24,32%. Os resultados estão concordantes com o trabalho de Cypriano, Silva e Tasic (2018) que relatam os valores da composição química da laranja in natura de 19,73% de celulose, 6,33% de hemicelulose e 4,18% de lignina. Já os resultados encontrados no trabalho de Bicu e Mustata (2013) os valores de composição química da laranja foi de 12,9% celulose, 8,8% hemicelulose e 1,3% de lignina, valores abaixo dos valores encontrados nesse trabalho. Mariño, Rezende e Tasic (2018) obtiveram diferentes teores de material lignocelulósico para o bagaço de laranja pera, os seguintes valores foram encontrados: 11,85% de celulose, 15,58% de hemicelulose e 1,67% de lignina. Além disso, as técnicas de plantio, região, temperatura e outras variações na plantação e na produção da fruta resultam em diferenças na composição química final e na participação de cada um dos componentes (CHEN, TAIT E KITTS, 2017). 44 O fato de a porcentagem de hemicelulose ser elevada em todas as amostras e não apresentar uma redução considerável na etapa 2B/KOH, próxima ao valor encontrado por Mariño, Rezende e Tasic (2018), se deve ao fato dos pré-tratamentos realizados utilizarem reagentes de caráter básico. Caso uma etapa de tratamento tivesse utilizado uma solução ácida, como no trabalho de Bicu e Mustata (2013), seria possível encontrar valores inferiores de hemicelulose na estrutura da fibra, pois o ambiente ácido quebraria as ligações de hidrogênio da estrutura da hemicelulose. Observa-se na Tabela 3 que a somatória dos componentes da composição química (celulose, hemicelulose, lignina e cinzas) para a fibra IN e para a fibra RSA não tem a somatória próxima de 100% como é notado para a fibra 2B/KOH. Conforme mostrado por Cypriano, Silva e Tasic (2018), a fibra IN do bagaço de laranja pera apresenta na sua composição química uma variação de 20-30% de proteína, além de uma porcentagem de pectina e extrativos, que não foram analisados neste trabalho. Esse fato mostra porque a composição química feita nesse trabalho para a fibra IN e RSA, a porcentagem total foi de 46,22% e 63,64% respectivamente. Como pode ser observado, nos valores porcentagem dos componentes de celulose na Tabela 3, aumentou conforme os tratamentos químicos e que o teor de lignina diminuiu quando comparado à fibra IN com a fibra 2B/KOH, mostrando a eficiência dos tratamentos químicos para a remoção dos componentes amorfos da fibra Alinhando os dados da composição química com a coloração das amostras (IN, RSA e 2B/KOH) é possível observar o aumento da alvura da fibra com o decorrer dos processos de tratamento químico demonstrando que os componentes amorfos foram retirados, mostrando que as fibras se tornaram mais brancas. Isso ocorre porque o peróxido de hidrogênio está em solução alcalina e é formado o ânion hidroperóxido (HOO-) que ataca grupos etilênicos e carboxílicos e elimina os grupos cromóforos da lignina. No processo, também são gerados radicais, como grupos (OH-) que é responsável pela solubilização e retirada da hemicelulose (DITZEL et al, 2017). O branqueamento é apenas um método complementar que retira a composição residual da lignina e hemicelulose. 45 5.1.2 Termogravimetria (TGA) As curvas termogravimétricas (TG/DTG) das fibras do bagaço de laranja IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH estão apresentados na Figura 15 e 16. A Tabela 4 mostra os resultados da curva de TGA/DTG das fibras IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH. Figura 15 - Curva TGA da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH 0 100 200 300 400 500 600 20 30 40 50 60 70 80 90 100 IN (A) RSA (B) 1B (C) 2B (D) 2B/KOH (E) M a ss a ( % ) Temperatura (°C) A B C D E Fonte: Autor (2019). Figura 16 - Curva de DTG da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH 100 200 300 400 500 600 0 500 1000 1500 2000 4 º estágio 3 º estágio 2 º estágio IN (A) RSA (B) 1B (C) 2B (D) 2B/KOH (E) D T G ( m g .m in -1 ) Temperatura (°C) A B C D E 1 º estágio Fonte: Autor (2019). 46 A partir da Figura 15, observa-se que a estabilidade térmica das amostras aumenta a ca- da tratamento químico realizado, com uma temperatura de início de degradação na fibra 2B/KOH (em torno de 250ºC) quando comparada à fibra IN (130ºC). O aumento da estabili- dade térmica ao longo dos tratamentos é devido à remoção dos componentes amorfos, como hemicelulose, lignina, pectina, extrativos e cinzas, fato evidenciado pela composição química presente na Tabela 3. Obtendo-se celulose (2B/KOH), componente com maior estabilidade térmica quando comparado aos componentes que possuem menor grau de organização (NAKTHONG, WONGSAGONSUP E AMORNSAKCHAI, 2017; RAVINDRAN E JAISWAL, 2016). A estabilidade térmica do bagaço de laranja pera possui valor próximo ao obtido por Velazques et al (2013), em torno de 130ºC para início de degradação. A Figura 16, mostra as curvas de DTG das fibras do bagaço de laranja pera IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH e os estágios de perda de massa conforme a Tabela 4. O primeiro estágio de perda de massa, conforme mostrado na Figura 16 e na Tabela 4, ocorre no intervalo de temperatura de 25-130ºC é referente a evaporação da água absorvida e de componentes orgânicos voláteis de baixo peso molecular (VALAZQUEZ et al, 2013; DAI et al, 2018), observado em todas as fibras IN, RSA, 1B, 2B, 2B/KOH conforme a Tabela 4. O segundo e o terceiro estágio de perda de massa são referentes à degradação da pectina e hemi- celulose que corre de 130-210ºC e 210-280ºC, respectivamente, tendo uma temperatura má- xima de decomposição de 195ºC e 230ºC. Esses picos são perceptíveis apenas na curva refe- rente a IN e o mesmo pico diminuiu com o tratamento RSA e desaparece nos tratamentos 1B, 2B e 2B/KOH, o que mostra que grande parte dos componentes amorfos (hemicelulose) pre- sente nas fibras IN e RSA foi removida (OLIVEIRA et al, 2014). Esse fato está concordante com os dados de composição química (Tabela 3). O quarto estágio de perda de massa, que ocorre entre 210-280ºC, refere-se à degradação da celulose por meio da reação de despolime- rização e decomposição de unidades glicosídicas, na decomposição de celulose ocorre redu- ção do grau de polimerização e a formação de CO e CO2, formando resíduos como por exem- plo cinzas (MOUTANG E ANANDJIWALA, 2015). Pode-se observar que uma diminuição do resíduo conforme os tratamentos químicos comparando as fibras IN e 2B/KOH. A lignina é o componente que se degrada mais lentamente quando comparado à celulose e hemicelulose, precisando de uma faixa de temperatura maior para se degradar completamen- te. Este fato se deve à sua estrutura química complexa e grande peso molecular, levando a uma difícil decomposição, assim sua degradação ocorre em uma faixa de temperatura longa para as IN, ocorrendo na faixa de temperatura de 150-600ºC (DILAMIAN E NOROOZI, 2019). 47 Tabela 4 - Temperatura de degradação e perda de massa da fibra da laranja IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH Etapas Fibra Estágio Intervalo (°C) T pico (°C) Perda de massa (%) Resíduo a 600°C (%) A IN 1° 2° 3° 4° 25-130 130-210 210-280 280-600 60 195 230 320 12 12 21 25 30 B RSA 1° 3° 4° 25-130 130-280 280-600 60 230 320 14 25 29 32 C 1B 1° 3° 4° 25-215 215-265 265-600 60 250 315 12 15 42 31 D 2B 1° 3° 4° 25-130 130-270 270-600 60 250 340 13 9 51 27 E 2B/KOH 1° 4° 25-130 130-600 60 340 13 68 26 Fonte: Autor (2019). Na Tabela 4, nota-se que a porcentagem de resíduos diminui conforme os tratamentos químicos, o que ocorre com a remoção dos componentes amorfos, gerando menor quantidade de cinzas ao final da análise (BENINI, 2018). 5.1.3 Espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) O FTIR é a análise responsável por mostrar as mudanças estruturais da fibra em ques- tão, evidenciando os diferentes grupos funcionais. Esta análise mostra quais grupos funcio- nais desapareceram ou apareceram ao longo dos tratamentos químicos utilizados para obten- ção da celulose do bagaço da laranja pera. A Figura 17 apresenta as curvas de FTIR para a fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH e a Tabela 5 apresenta os eventos associados a cada número de onda. 48 Figura 17 - Espectro de FTIR para a fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH 4000 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500 1400 FIN RSA T ra n sm it ân ci a (u .a .) 1B 2B 10001200160017302900 Número de onda (cm -1 ) 2B/KOH 3300 Fonte: Autor (2019). Tabela 5 - Relação entre o número de onda vibracional e o evento associado Número de onda (cm-¹) Evento associado Referência 1000 Vibração das ligações C-O-C dos anéis aromáticos da celulose DAI et al, 2018; ZAINUDDIN et al, 2017; MARIÑO et al, 2018. 1200 Estiramento das ligações da banda de éter glocosídico do anel da celulose 1400 Dobramento das ligações presentes nos anéis aromáticos dos polissacarídeos 1600 Estiramento das ligações dos anéis aromáticos presentes na lignina 1730 Estiramento dos grupos C=O, carbonilas, presentes nas moléculas de lignina e hemicelulose 2900 Estiramento das ligações CH das moléculas de celulose 3300 Estiramento das ligações OH das moléculas de celulose Fonte: Autor (2019). 49 Através do espectro de FTIR (Figura 17), observou-se quais vibrações se mantiveram ou desparaceram após cada tratamento e os eventos foram evidenciados através da Tabela 5. As bandas referentes aos grupos laterais da celulose, sendo os números de onda de 1000, 1200, 2900 e 3300 cm-1, aparecem em todas os espectros dos tratamentos químicos (IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH). A banda de 1600 cm-1 apresentou variação mais intensa entre os tratamentos químicos, se tratando do estiramento das ligações dos anéis aromáticos presentes na lignina, reforçando a análise de remoção dos componentes de menor organização (MARIÑO, REZENDE E TA- SIC, 2018). A banda em 1400 cm-1 corresponde a ligações aromáticas de polissacarídeos e observa- se que esta banda diminui em intensidade ao longo dos tratamentos, indicando a remoção de constituintes da hemicelulose. A mesma redução de intensidade se repete na banda 1730 cm-1, representando ligações de grupos laterais da lignina e da hemicelulose. A redução mais significativa das três bandas citadas ocorreu após o tratamento 1B, mostrando a efetividade desse tratamento químico na remoção destes componentes (ARPITHA E YOGESHA, 2017; NAKTHONG, WONGSAGONSUP E AMORNSAKCHAI, 2017; MARIÑO, REZENDE E TASIC, 2018; CARRERA et al, 2017; PARK et al, 2017; ZAINUDDIN et al, 2017; LI et al, 2019; ZHANG et al, 2019). 5.1.4 Microscopia eletrônica de varredura (MEV) A MEV tem como objetivo mostrar a morfologia e o aspecto superficial das fibras após os tratamentos químicos na superfície da fibra in natura do bagaço de laranja. As Figuras 18 a 22 apresentam as micrografias da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH com ampliação de 100 e 500X. 50 Figura 18 - Morfologia da fibra IN do bagaço de laranja com ampliação de 100 e 500X 100x 500x Fonte: Autor (2019). Através da Figura 18, observa-se que a superfície da fibra apresenta elevada irregularidade, com nervuras sem um padrão seguido e com partículas de tamanhos reduzidos. Além disso, percebe-se que as fibras estão aglomeradas, devido às ceras, extrativos e lignina. Figura 19 - Morfologia da fibra RSA do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X 100x 500x Fonte: Autor (2019). A Figura 19 mostra que as partículas das fibras possuem maior granulometria e também maior número de nervuras aparentes. Mesmo assim, apresenta algumas regiões onde estas nervuras não estão tão evidentes, como apontado pela seta. 51 Figura 20 - Morfologia da fibra 1B do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X 100x 500x Fonte: Autor (2019). A Figura 20 mostra partículas da fibra 1B com uma superfície com menor irregularidade comparada à fibra RSA, realçando a severidade deste tratamento na remoção de constituintes da fibra. Essa mudança brusca revela a retirada de componentes como hemicelulose e lignina da fibra, resultado já discutido neste em outras caracterizações apresentadas. Figura 21 - Morfologia da fibra 2B do bagaço da laranja com ampliação de 100 e 500X 100x 500x Fonte: Autor (2019). Através da Figura 21, observa-se que a morfologia da fibra retorna de maneira que as fibras são expostas e é possível notar que estão mais separadas e menos aglomeradas comparada à fibra in natura, por exemplo. Além disso, esta etapa apresenta grãos menores 52 comparada à 1B, mostrando a remoção dos constituintes de menor organização da fibra. Figura 22 - Morfologia da fibra 2B/KOH do bagaço de laranja com ampliação de 100 e 500X 100x 500x Fonte: Autor (2019). A Figura 22 apresenta uma superfície mais irregular, porém com fibras mais soltas do que em qualquer outra etapa, no entanto sua morfologia possui aspecto semelhante à da fibra 2B, o que pode levar a observação de que não houve mudanças significativas na realização deste tratamento. De acordo com as micrografias das amostras de bagaço de laranja pera a cada etapa de tratamento (IN, RSA, 1B, 2B, 2B/KOH), observa-se que entre a primeira (Figura 18 a 22) há um aumento na quantidade de nervuras na superfície das amostras e também maior presença de sulcos no material, evidenciando melhor as fibras de celulose a cada tratamento. Entre as fibras IN, RSA e 1B, observa-se maior quantidade de nervuras, enquanto nas amostras 2B e 2B/KOH não se vê grandes alterações na morfologia das amostras, apenas maior presença de sulcos na fibra 2B/KOH (OZTURK, WINTERBURN E MIQUEL, 2019; DILAMIAN E NOROOZI, 2019). 53 Figura 23 - MEV em modo ambiental da topografia da fibra in natura da casca ou epicarpo (1) e da polpa ou mesocarpo (2) Fonte: Autor (2019). A Figura 23, mostra a morfologia da fibra antes do processo de secagem. A imagem mostra a parte interna do bagaço, o mesocarpo, e a parte externa dele, o epicarpo. Com essa técnica de microscopia em ambiente controlado, observou-se as fibras da parte interna da la- ranja, as quais são nervuras sem padrão que se assemelham às nervuras presentes nas imagens feitas da fibra in natura e na parte externa percebe-se uma superfície mais lisa, quando com- parada à interna, porém com algumas nervuras e presença de espécies da casca. Entretanto, não é possível obter imagens das fibras isoladas, como em outras fibras naturais, porém este fato pode ser decorrente da fibra ser originada de um bagaço, o que não nos mostra os veios de seiva e condutores de água e sais dentro das fibras (LAU et al, 2018). Comparando as micrografias aos outros tipos de fibras, observa-se que fibras mais alon- gadas como por exemplo palha de arroz resultam em fibras mais estreitas e alongadas em um mesmo sentido, enquanto que micrografias de fibras de cascas e bagaço de abacaxi e laranja apresentam-se mais largas, com as fibras não alinhadas de maneira unidirecional, as fibras estão em várias direções apresentando como nervuras na superfície da amostra, fato que se assemelha mais às micrografias de bagaço de laranja aqui mostrados (DAI et al, 2018; DI- LAMIAN E NOROOZI, 2019; OZTURK, WINTERBURN E MIQUEL, 2019). 54 5.1.5 Difração de raios X (DRX) O difratograma de raios X das fibras do bagaço de laranja IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH estão representados na Figura 24, a fim de comparar a cristalinidade da estrutura nos diferentes tratamentos químicos. A partir dos difratogramas de raios X, determinou-se a relação para encontrar o índice de cristalinidade e o tamanho do cristalito no plano (200) das fibras IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH, através do método de Segal (1959) usando as Equações 2 e 3, e os resultados estão apresentados na Tabela 6. Figura 24 – Difratograma de DRX das fibras IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40 (110) IN (am) (200) RSA In te n si d ad e (u .a .) 1B 2B 2(grau) 2B/KOH Fonte: Autor (2019). Tabela 6 - Cristalinidade da fibra IN, RSA, 1B, 2B e 2B/KOH Fibra Cristalinidade (%) Tamanho do cristalito (plano 200) (nm) IN 32,92 1,40 RSA 40,25 1,27 1B 82,33 1,37 2B 75,38 1,24 2B/KOH 88,93 1,23 Fonte: Autor (2019). Observa-se pela Tabela 6, que na sequência em que ocorre os tratamentos químicos para 55 obtenção da celulose branqueada, houve um aumento no Ic das fibras indicando que os componentes amorfos foram removidos nos tratamentos químicos. No tratamento RSA, observa-se pouca diferença quando comparada à fibra in natura, esse fato deve-se a poucos componentes da estrutura da fibra solúveis em álcool etílico que foram removidos, como cinzas, pectina e extrativos. Conforme observado pelos dados da composição química, Tabela 3, o 1B foi mais efetivo à fibra que estava mais exposta aos reagentes do branqueamento após o tratamento RSA, assim, maior quantidade de componentes amorfos foram retirados, aumentando a cristalinidade (DUFRESNE, 2015). A pequena redução na cristalinidade da fibra após o 2B pode ser explicada através do rearranjo de moléculas de celulose, fato que pode ocorrer pela entrada dos íons de sódio na estrutura da celulose inchando a estrutura das ligações intermoleculares da celulose, causando assim esse valor inferior de cristalinidade (NADUPARAMBATH et al, 2018). A fibra 2B/KOH obteve a maior cristalinidade comparada às etapas anteriores do tratamento químico, o que mostra a sua maior efetividade (NADUPARAMBATH et al., 2018; BENINI et al., 2018; PIRICH et al, 2019). No trabalho de Dai et al (2018) com casca de abacaxi, o resultado de índice de cristalinidade para a fibra in natura foi próxima ao obtido (30,72%), porém, após realizar tratamentos químicos, sua amostra obteve um índice de cristalinidade inferior (53,34%) quando comparado ao obtido neste estudo: 88,93% para a fibra 2B/KOH. Essa diferença de cristalinidade está relacionada com os tipos de tratamento químico utilizado. O tamanho do cristalito no plano (200) é um indicativo de rigidez para o material e varia conforme a quantidade de celulose presente na composição (BENINI et al, 2018). Ao contrário do estudo feito por Benini et al (2018) para a Imperata brasiliensis, neste trabalho o tamanho de L reduziu ao longo dos tratamentos utilizados. De acordo com Dufresne (2015), nestes tipos de tratamentos químicos, espera-se que o índice Ic aumente, enquanto o tamanho do cristalito diminua, porém, este número deve ser levado em consideração apenas como indicativo, pois existe dificuldade em determiná-lo com exatidão por esta técnica. 5.2 HIDRÓLISE ÁCIDA PARA OBTENÇÃO DE NANOCELULOSE (NC) 5.2.1 Aparência da suspensão Para obtenção dos nanocristais de celulose foi realizada hidrólise ácida da celulose branqueada do bagaço de laranja pera utilizando ácido sulfúrico de acordo com as condições 56 citadas na Tabela 1. Na Figura 25, são mostradas as suspensões preparadas nas diferentes condições de preparo, a fim de mostrar a estabilidade das partículas após a preparação. Figura 25 - Nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4, respectivamente, após a hidrólise. Fonte: Autor (2019). Através da Figura 25, pode-se perceber que a amostra NC2 apresentou maior decantação das partículas a olho nu após 24h, indicando que os parâmetros de hidrólise utilizados não foram suficientes para formar os grupos éster sulfatos e para remover toda a parte amorfa. As NC1 e NC3 apresentam uma solução com uma coloração turva, já a NC4, que apresenta uma coloração mais translúcida. Observa-se também que nenhuma das amostras NC1, NC2, NC3, NC4 apresentaram coloração escura, indicando que as condições de hidrólise ácida utilizadas não degradaram a estrutura principal da celulose e/ou que não há vestígios de lignina residual na celulose branqueada a partir do bagaço de laranja pera. Outro aspecto é que a decantação das partículas pode ser causada por dois motivos: pelo grande tamanho de partícula ou pela diferença de cargas na superfície das partículas, como também na concentração das partículas que estão dispersas nas amostras utilizadas para observação a olho nu (BENINI et al., 2018). Teixeira et al (2010) observou em seu estudo de nanoceluloses a partir do algodão que com o aumento da concentração do ácido, obteve-se também a suspensões menos turvas e que não apresentaram decantação. O mesmo fato pode ser observado na Figura 25, onde as amostras com concentração do ácido 64% (NC3 e NC4) foram as que apresentaram suspensões menos turvas e que não apresentaram decantação. Utilizar o ácido sulfúrico na hidrólise ácida é vantajoso comparado a outros ácidos como o ácido clorídrico, este fato é devido às hidroxilas serem substituídas pelos grupos sulfatos, removendo-as da superfície da molécula. Quando isto acontece, após cessar a hidrólise ácida, 57 as moléculas de celulose estão com cargas negativas em sua superfície toda, causando a repulsão entre as moléculas e levando a maior estabilidade da suspensão coloidal (DONG et al, 2016). 5.2.2 Tamanho de partículas A análise de tamanho de partícula tem como objetivo medir o tamanho das partículas na suspenção e avaliar se a hidrólise ácida realizada atingiu o tamanho nanométrico. Na Figura 26, está a distribuição do tamanho de partícula das nanoceluloses preparadas e, na Tabela 7, estão os resultados obtidos de tamanho de partícula para cada uma das nanoceluloses obtidas. Figura 26 - Distribuição do tamanho de partícula das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 0 5 10 15 20 25 30 35 D en si d ad e n u m ér ic a (% ) NC1 Classes de tamanho (m) NC3 NC4 NC2 Fonte: Autor (2019). Tabela 7 - Valores de tamanho de partículas das amostras Nanocelulose Tamanho de Partícula (µm) D10 D50 D90 NC1 3,13 3,85 12,30 NC2 3,05 3,79 10,60 NC3 2,94 3,64 9,48 NC4 2,67 3,38 8,15 Fonte: Autor (2019). A distribuição para todas as nanoceluloses preparadas encontra-se bem uniforme em 58 todas, mostrando que as soluções não apresentam grande distinção no tamanho das partículas. No entanto, este tamanho medido pode ser resultado de aglomerações. Percebe-se que em 10, 50 e 90% das partículas os tamanhos são bem próximos, percebe-se que os valores são ligeiramente menores nas nanoceluloses NC3 e NC4, podendo ser associado à maior concentração do ácido sulfúrico. Em adição, nota-se que todas as nanoceluloses apresentam distribuição do tamanho de partícula bimodal, ou seja, distribuída em dois picos intensos. Levando em consideração que na análise é suposto que todas as partículas são esféricas, este valor pode não ser tão confiável, tendo em vista que a orientação das partículas interfere no resultado (BENINI et al., 2018). De acordo com o estudo realizado por Benini et al (2018), observa-se que o tamanho do cristalito encontrado para a espécie Imperata brasiliens foi maior na maioria dos casos quando comparada aos valores obtidos para as nanoceluloses preparadas a partir do bagaço de laranja pera, porém algumas condições como temperatura de reação e proporção entre fibra e ácido (que foram parâmetros variáveis no trabalho citado) pode levar a estas diferenças entre os resultados obtidos. Por fim, em relação ao tamanho de partícula, ambas possuem distribuição bimodal, porém para as nanoceluloses do bagaço de laranja pera, o tamanho de partícula está distribuído em uma faixa menor de tamanho. 5.2.3 Potencial Zeta A análise do potencial Zeta foi feita para determinar a estabilidade das suspensões das nanoceluloses e os resultados obtidos estão na Tabela 8. Tabela 8 - Valores de potencial zeta obtido para cada nanocelulose Nanocelulose Potencial Zeta (mV) NC1 -18,3 NC2 -12,5 NC3 -23,0 NC4 -21,9 Fonte: Autor (2019). A análise de potencial Zeta mede a eficiência da hidrólise ácida feita. Durante a hidrólise feita com ácido sulfúrico, os íons sulfatos substituem os grupos hidroxilas da molécula de celulose. Valores, em módulo, menores que 15mV indicam princípios de aglomeração na suspensão e valores maiores do que 30mV indicam que há repulsam mútua entre as partículas da suspensão, garantindo a estabilidade coloidal desta (BENINI et al., 2018; NADUPARAMBATH et al, 2018). 59 Deste modo, a NC3 e NC4 são as amostras que mostram melhores valores em relação a estabilidade desta suspensão. Já a NC2, que apresenta um valor menor que 15mV, mostra que a amostra tem princípios de aglomerações na sua estrutura e de não ter formado uma suspensão coloidal, observação já notada na análise a olho nu da solução em que apresentou deposição na parte inferior do frasco. Estes fatores se relacionam com a concentração utilizada de ácido sulfúrico, já que as amostras feitas com concentração de 50% (NC1 e NC2) do ácido resultaram em valores que indicam aglomeração nas suspensões e as amostras preparadas com concentração de 64% (NC3 e NC4) índices com melhores níveis de repulsão entre as amostras, mostrando que os grupos sulfatos, gerados durante a hidrólise ácida, estão mais presentes na estrutura e promovem uma estabilidade maior dessas suspensões (PHANTHONG et al, 2018). Como nenhum dos valores encontrados foi superior, em módulo, a 30mV não é possível afirmar com certeza que as suspensões estão estáveis, mas ao comparar com os valores obtidos de potencial Zeta na literatura, por exemplo, os obtidos por Benini et al (2018) com a nanocelulose de Imperata brasiliens num intervalo de valores entre 22 a 31mV em módulo e o valor obtido por Dai et al (2018) com a casca do abacaxi (36,7mV em módulo), percebe-se que este o resultado obtido indica possibilidade de uma suspensão estável em relação às amostras NC3 e NC4 e as amostras NC1 e NC2 indicam princípios de aglomeração. 5.2.4 Microscopia eletrônica de transmissão (MET) Para analisar a morfologia e a dimensão das nanoceluloses, as suspensões foram analisadas por microscopia eletrônica de transmissão e as imagens são observadas na Figura 27 e os valores de tamanho de partículas calculados através do programa ImageJ estão na Tabela 9. 60 Figura 27 - Microscopia Eletrônica de Transmissão das suspensões: (a) NC1, (b) NC2, (c) NC3 e (d) NC4 (a) (b) (c) (d) Fonte: Autor (2019). Tabela 9 – Dados do tamanho de partícula obtidos através das imagens de MET Amostra Comprimento (L) (nm) Diâmetro (D) (nm) Razão de Aspecto (L/D) NC1 606 ± 144 23 ± 5 27 NC2 1354 ± 93 35 ± 11 38 NC3 632 ± 137 25 ± 6 25 NC4 500 ± 166 27 ± 8 18 Fonte: Autor (2019). A partir da fotomicrografia das suspensões obtidas apresentadas na Figura 27, observa- se que os nanocristais de celulose, apresentam-se aglomerados, amostras NC1, NC2 e NC3, o 61 que indica que partes não foram sulfonadas de maneira efetiva. A NC2 apresenta a presença de aglomerado, corroborando com o valor de potencial Zeta de -12,5mV, que mostra que valores, em módulo, menores que 15mV indicam princípios de aglomeração das partículas ou partículas maiores e uma menor superfície carregada negativamente, mostrando que a hidrólise ácida (H2SO4) da NC2 (de concentração 50% e tempo 2h) não foi efetiva para criar uma cadeia sulfonada e promover estabilidade da amostra (ZAINUDDIN et al, 2019). Na Tabela 9, nota-se que a amostra que se destacou das outras foi a NC2, apresentando maiores valores de L (1354 nm), D (35 nm) e L/D (38), reforçando a aglomeração das fibras, fato decorrente do seu tempo de hidrólise ácida e também da concentração menor do ácido, já as outras amostras apresentaram valores próximos entre si (BENINI, 2015). Outro fato que pode ter levado a essas dimensões da fibra é a não estabilidade das amostras quando em fase aquosa, como apresentada na análise de potencial Zeta, dessa forma, as amostras foram aglomeradas durante o processo de preparação das amostras para a análise, elevando as suas dimensões quando comparadas às outras amostras (BENINI et al, 2018; ZAINUDDIN et al, 2019). Já na amostra NC3, observa-se que as fibras apresentaram uma característica maior de aglomeração e aderência aos vértices do suporte de amostras. Além disso, possuem maior comprimento quando comparada às amostras NC1 e NC4. Assim, pode-se analisar que para o ácido sulfúrico com concentração de 64%, o tempo de reação de 2h (amostra NC4) resulta em melhores resultados quando comparado à 1h de reação (amostra NC3), que apresentou maior aglomeração entre as fibras, devido ao processo de sulfonação que ocorre na amostra (ZAINUDDIN et al, 2019). A partir das fotomicrografias das suspenções NC1 e NC4, pode-se observar um aglomerado de fibras que possibilita observar que o tamanho das fibras é homogêneo, não havendo grandes disparidades entre as fibras presentes, mostrando que a hidrólise ácida ocorreu de maneira homogênea nas amostras (ZAINUDDIN et al, 2019). As aglomerações presentes em diferentes intensidades nas amostras, pode ser fato decorrente da secagem das amostras, enquanto a velocidade de evaporação da água promoveu aglomeração das nanoceluloses presentes e para fins de comprovação de resultados, seria necessário submeter novamente as amostras à análise, pois essa técnica é difícil de obtenção dos resultados (ZAINUDDIN et al, 2019). Por fim, com a utilização do software ImageJ é possível perceber que todas as amostras apresentaram fibras de caráter nano, sendo pelo menos uma das suas dimensões em escala nano, no caso, o diâmetro das fibras (PHANTHONG, 2018). 62 Dai et al (2018) observou um comprimento das fibras muito inferior (189 nm) ao obtido e com diâmetro (15 nm) próximo às amostras de nanocelulose da casca do abacaxi em relação ao valor encontrado para as nanoceluloses de laranja pera, fato decorrente pelo tipo de fibra, pois o ácido utilizado foi o mesmo. Além disso, Dai utilizou a concentração de 64% durante 45min de reação, se aproximando da metodologia utilizada neste estudo. Mesmo com um valor elevado das dimensões quando comparado à outras fibras tratadas por outros tratamentos, pode-se concluir, com base nesta análise, que foram obtidas nanofibras de celulose a partir do bagaço de laranja pera devido ao diâmetro das fibras inferiores a 100nm. 5.2.5 Termogravimetria (TGA) As Figuras 28 e 29 mostram as curvas de TGA e DTG, respectivamente, das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa e as Figuras 30 e 31 as curvas TG/DTG das nanoceluloses secas por liofilização. Nas Tabelas 10 e 11, estão os estágios de perda de massa para as nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa e por liofilização, respectivamente. Figura 28 - Curva TGA das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa 0 100 200 300 400 500 600 20 40 60 80 100 M as sa ( % ) NC1 (A) Temperatura ( 0 C) NC2 (B) NC3 (C) NC4 (D) A B C D Fonte: Autor (2019). 63 Figura 29 - Curva DTG das nanoceluloses NC1, NC2, NC3 e NC4 secas em estufa 100 200 300 400 500 600 0 20 40 60 80 100 120 140 NC1 (A) D G T (  g /m in ) NC2 (B) 2º estágio 3º estágio Temperatura ( 0 C) NC3 (C) 1º estágio NC4 (D) A B C D Fonte: Autor (2019). Tabela 10 - Temperatura de degradação e perdas de massa das nanoceluloses secas em estufa Nanoceluloses Estágio Intervalo (°C) T pico (°C) Perda de massa (%) Resíduo a 600°C (%) NC1