UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro AS LETRAS DE RAP DO MOVIMENTO HIP-HOP COMO DESDOBRAMENTO DO PROCESSO DE SEGREGAÇÃO SÓCIO- ESPACIAL: ANTIGAMENTE QUILOMBOS, HOJE PERIFERIA. Luiz Henrique dos Santos Orientador: Prof. Dr. Paulo Roberto Teixeira de Godoy Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa de Pós Graduação em Geografia – Área de contração em organização do Espaço, para obtenção do Título de Mestre em Geografia. Rio Claro (SP) 2013 2� � Luiz Henrique dos Santos AS LETRAS DE RAP DO MOVIMENTO HIP-HOP COMO DESDOBRAMENTO DO PROCESSO DE SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL: ANTIGAMENTE QUILOMBOS, HOJE PERIFERIA Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa de Pós Graduação em Geografia – Área de contração em organização do Espaço, para obtenção do Título de Mestre em Geografia Comissão Examinadora _______________________________________ Prof. Paulo Roberto Teixeira de Godoy Departamento de Geografia- Unesp Rio Claro _________________________________________ __________________________________________ Rio Claro, ____, _________________________, 2013 3� � 4� � Dedico este trabalho a memória de minha avó materna Leontina Amaral Martins, mulher negra e guerreira, que me ensinou a ser gente. In memorian 5� � AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço a toda força espiritual e divina que move os dias vividos. Agradeço a toda minha família, em especial a minha mãe: Luciângela Martins dos Santos A minha irmã Layane Aparecida Martins dos Santos, por sua doçura, carinho e compreensão. A querida amiga Celeste Pieri pelos momentos de euforia e sorrisos; Ao querido amigo Pedro Henrique Ferreira Costa, pelo incentivo contínuo para que eu permanecesse na Universidade. Ao querido amigo Dener Toledo Matias, por me mostrar os caminhos da luz e transcendência. A queridos amigos paulistanos geógrafos Camila Canuto, Wagner Nostório, Leia Cherif e Abbul, por terem me ajudado a desbravar a periferia com sabedoria e humildade; A professora Bernadete de Castro Oliveira por toda sua criatividade e generosidade; Ao professor Roberto Braga por sua amizade e admiração; A todos os B. Boys que de Rio Claro, em especial, o B. Boy “Índio”; Ao Luiz Fernando Porfírio, vulgo Kamarão, por toda sabedoria sobre Hip Hop; Aos velhos e novos amigos, em especial ao Eder Merino. A família xamânica Morada do Sol de Araraquara. Ao coordenador do Programa de Pós Graduação em Geografia Professor José Gilberto de Souza. A Capes- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de nível superior. Ao financiamento do CNPQ – Conselho Nacional de Pesquisa, sem o qual a exequidade deste trabalho não seria possível; E por fim ao meu ao meu orientador Paulo Roberto Texeira de Godoy por sua dedicação no ofício de orientar essa pesquisa. 6� � “Equilibrado num barranco incômodo, mal acabado e sujo, porém, seu único lar, seu bem e seu refúgio. Um cheiro horrível de esgoto no quintal, por cima ou por baixo, se chover será fatal. Um pedaço do inferno, aqui é onde eu estou. Até o IBGE passou aqui e nunca mais voltou.” Um homem na estrada (Racionais MC’s) 7� � SUMÁRIO Resumo.................................................................................................................................8 . Abstract...............................................................................................................................9 Introdução...........................................................................................................................10 Capítulo I - Movimento Hip Hop, das Paisagens sonoras dos EUA para o BRASIL: um modo de vida adotado pelas periferias............................................................................16 1.1.A população Negra: Resquícios da escravidão, revolta e traumas no século XXI........16 1.2. Compreendendo os elementos da Cultura Hip Hop......................................................22 1.3. Cultura Hip Hop dos Estados Unidos da América para o Brasil: um modo de vida adotado pelas periferias.....................................................................................................................30 Capítulo 2- As letras de Rap que representa as minorias étnorraciais: encontros e desencontros no processo de Segregação Sócio Espacial................................................32 2.1. Ativismo Urbano Brasileiro..........................................................................................32 2.2 Contribuições da teoria da análise de discurso para uma análise geográfica das letras de rap: Língua, Cultura e Espaço na perspectiva discursiva....................................................36 2.3 Da metrópole para a tribo indígena: As minorias sendo representadas nas letras de rap denunciando o processo de Segregação Sócio Espacial.......................................................40 Considerações Finais............................................................................................................61 Referências Bibliográficas...................................................................................................63 Bibliografia Geral.................................................................................................................65 Anexos..................................................................................................................................68 8� � RESUMO O rap é um gênero musical de protesto que tem buscado valorizar a cultura popular do lugar onde é produzido: A periferia. Este trabalho foi o resultado da análise das letras de RAP produzidas no Brasil, pelos grupos musicais mais influentes do momento. Considerado por muitos como um movimento político, e por outros como apenas uma simples manifestação artística das culturas juvenis, é fato que esse gênero musical se tornou uma apreciação global. Durante a realização da pesquisa foi detectado a expansão do hip hop em lugares bastante incomuns do Brasil, como é o caso de uma aldeia indígena. Dar visibilidade para a identidade social e espacial das populações que habitam os espaços segregados foi um dos princípios norteadores dessa pesquisa. Por meio de análises das letras de rap tivemos como suporte a análise de discurso e conteúdo das músicas previamente selecionadas. Para comprovarmos esse processo optamos por utilizar um corpus teórico bem diversificado que contemplasse nossas inquietações. Foram utilizadas para fins de amostragem as letras de rap de 10 grupos musicais produzidas em diferentes contextos geográficos. A escolha dos grupos teve como norteador principal a diversidade dos lugares de onde estas composições foram elaboradas, tornando possível demonstrar que tais culturas juvenis urbanas já estão sendo absorvidas fora do eixo metropolitano Rio – São Paulo. Foi possível elaborar uma reflexão e análise sobre as práticas discursivas que estes grupos de rap contemporâneos estão adotando no Brasil, as quais são indissociáveis ao processo de produção desigual do espaço. A ideia do trabalho foi dialogar sobre os aspectos das condições de produção que estas músicas tiveram, bem como o resgate de suas memórias, com intenção de compreender os sentidos que essas narrativas constroem em relação à população que habita esses espaços segregados. PALAVRAS CHAVE: movimento hip-hop, Rap, Globalização, periferia. � 9� � ABSTRACT Rap is a genre of protest that seeks to enhance the local popular culture of the place where it is produced: The low-income communities. This research is result of the analysis of the lyrics of RAP produced in Brazil by the most influential bands of the moment. Considered by many as a political movement, and by others as just a simple artistic expression of youth culture, is the fact that this musical genre has became an overall assessment. During the research developments was detected the expansion of hip hop in quite unusual places in Brazil, as in the case of an native village.Give visibility to the social and spatial identity of populations who inhabit segregated spaces was one of the guiding principles of this research. The method had as support the analysis of speech and content of lyrics previously selected. To prove this process we chose to use a very diverse body of theory that encompassed our inquietude. Lyrics of ten groups of rap produced in different geographical contexts were chosen for sampling. The groups’ choice had as main guiding the diversity of the places where these compositions were made, where it was possible to demonstrate that such urban youth cultures has already become absorbed off-axis metropolitan Rio - São Paulo. It was possible to develop a reflection and analysis of the discursive practices that these contemporary rap groups are adopting in Brazil, which are inextricably linked to the uneven production process of space. The idea of the study was a dialog about the aspects conditions of production that these songs were made, as well as the rescue of its memoirs, with the intention of understanding the meaning of these tales built in relation to the population that inhabits these segregated spaces. KEYWORDS: hip-hop, Rap, Globalization, low-income communities. � � 10� � Introdução 1.A motivação para esta pesquisa. Sempre admirei a capacidade que a ciência geográfica tem no aspecto de poder observar as transformações que ocorrem no espaço e suas possíveis contribuições para nossa sociedade. Confesso que sempre tive um grande interesse também por outras áreas do conhecimento que trabalham em terrenos mais subjetivos, como por exemplo a música e o teatro, e sempre esperei ansiosamente um momento que eu pudesse demonstrar essa possível articulação de linguagens dentro da academia. Muito antes de ingressar na universidade eu já havia vivenciado algumas práticas com grupos de teatro amador, e sempre pensei na possibilidade concreta de que um dia, em uma única oportunidade eu poderia somar a prática dos conhecimentos teatrais que possuo adquiridos ao longo da experiência vivida, com os conhecimentos teóricos que foram transmitidos através da minha formação acadêmica no curso de Licenciatura em geografia. O passo inicial foi dado no ano de 2010 através do Projeto de Extensão Universitária “Cia. Teatral Bumba-Meu-Baco”1, coordenado pela professora antropóloga Dra. Bernadete de Castro2, que possibilitou a criação de uma peça de teatro e tinha como foco as “relações sociais contraditórias”. Na ocasião o trabalho finalizado chamava-se “Algumas tramas urbanas” (figura 1) Foi neste momento de criação da peça, com um grupo de alunos do Campus da Unesp, que nos debruçamos sobre a cultura do Movimento Hip Hop. Foi uma troca bastante rica, onde aprendi coisas incríveis sobre a periferia através do material que coletamos durante esse ano para produzirmos a peça. Figura 1: Cartaz da peça “Algumas Tramas Urbanas (Fonte: Cia. Teatral Bumba-Meu-Baco Unesp) ������������������������������������������������������������ 1 Grupo de teatro que foi criado e articulado na Unesp Campus de Rio Claro por mim no ano de 2005, e que posteriormente foi oficializado enquanto projeto de extensão oficial no ano de 2006. 2 Professora Antropóloga Docente do DEPLAN-IGCE (Departamento de Planejamento e Geoprocessamento Territorial), responsável pelo projeto de teatro “Cia. Teatral bumba-meu-baco”. 11� � É notório o quanto a extensão universitária ainda não é uma prioridade nas Universidades, tendo em vista toda a demanda que existe nas áreas de pesquisa e ensino. Por essas razões as apresentações da peça não tiveram continuidade, acabou sendo apresentada poucas vezes apenas para a comunidade acadêmica, e uma única apresentação para a comunidade da cidade de Rio Claro. Além disso, os integrantes do grupo naquele momento (ano de 2010) eram estudantes de diversas áreas, não só do Curso de geografia, o que foi muito rico para nosso processo de criação, fazendo parte também do coletivo integrantes dos Cursos de Graduação de Física, Matemática, Ecologia, Biologia. Nesse sentido um aspecto a ser apontado é que a ausência de uma maior afinidade sobre temas prioritários (luta de classes, produção do espaço, desigualdade de renda) por parte de todos os integrantes, resultou no desinteresse de muitos, sendo que predominou em sua maioria os estudantes Geografia. O processo de montagem da peça foi registrado, e teve como encaminhamento meu trabalho de conclusão de curso (TCC), orientado pelo professor Dr. Roberto Braga (Docente do DEPLAN-IGCE-Departamendo de Planejamento e Geoprocessamento Territorial), que foi intitulado de “Algumas tramas urbanas: Geografia, teatro e movimento hip hop como linguagens ,estratégias e possibilidades dramáticas no estudo da segregação sócio-espacial”. Após o término da graduação e escrita do TCC, que de certa forma tinha alguma proximidade com as questões do Hip Hop, sua relação com temas geográficos e pude constatar que ainda faltavam elementos para serem investigados, e que avia ainda muito material para trabalhar. E foi justamente nesse movimento de visão e amadurecimento da minha trajetória acadêmica e pessoal que eram indissociáveis, que se sobrepôs uma vontade imensa de continuar com a pesquisa sobre o movimento hip hop, agora focando apenas com as letras de rap, por apresentar um corpus teórico mais acessível e não depender necessariamente de todo um grupo de extensão universitária, devido aos problemas citados anteriormente. Outro fator determinante para que a pesquisa se desenvolvesse em torno dos assuntos referentes as culturas urbanas , decorre da influência que a cidade de Rio Claro possui no contexto paulista da cena do Movimento Hip Hop. Percebi que a própria cidade em que eu havia passado ao menos 5 anos cursando a graduação em geografia, já tinha me dado material suficiente para começar a despertar minhas inquietações acerca dos elementos da cultura hip hop e a possibilidade de abordagem destes em uma pesquisa acadêmica, entretanto ainda não tinha definido qual objeto de estudo em específico para me aprofundar na pós graduação. 12� � Consequentemente após essa fase de experimentação de linguagens, acreditei que as letras de rap seriam uma seara fértil para discutir algumas questões sobre a produção do espaço urbano a partir do ponto de vista dos pobres, dos excluídos socialmente e é a partir desses estímulos iniciais que tive curiosidade em continuar a pesquisar as letras de rap e elaborar esta dissertação. 2.Metodologia e distribuição dos capítulos Levando em consideração diferentes contextos geográficos do Brasil, este trabalho tem como principal objetivo a investigação das canções de 10 grupos de rap, que fazem parte da atual cena contemporânea Hip Hop do país, sendo eles: 1)Racionais MC´s, 2)Z’africa Brasil, 3)Projota, 4)Emicida e 5)Criolo (Grupos referentes a realidade urbana da cidade de São Paulo), 6) Faces da Morte, 7) Sub louco Coletividade (Grupos referentes a realidade urbana de cidades do interior do Estado de São Paulo), 8)Brô MC´s (Grupo referente a reserva indígena de Dourados no Estado de Mato Grosso do Sul), 9)Opanijé (Grupo referente a realidade urbana de Salvador, Estado da Bahia) e 10)Rapadura Xique-Chico (Rapper proveniente da cidade de Brasília, Distrito Federal).Foram ao todo pesquisadas um total de 397 músicas, sendo que 30 foram utilizadas no corpus desta pesquisa. Todas as letras foram pesquisadas em um site específico, que possui um enorme acervo musical de letras musicais: http://letras.mus.br/ , que foi acessado no período integral da pesquisa entre março de 2010 até janeiro de 2013. Tais grupos foram selecionados com a intenção de contemplar a própria diversidade geográfica do país, sendo que tais coletivos musicais provém de diferentes contextos culturais e econômicos do Brasil. Não descartamos aqui também o uso dos materiais que foram acumulados anteriormente no TCC e que de certa forma também vieram a anteceder essa pesquisa. Serão utilizados alguns trechos de entrevistas que foram cedidas durante o processo de montagem da peça de teatro citada anteriormente. Durante o desenvolvendo do texto, iremos perceber que o Rap produzido no Brasil possui como característica que é peculiar, pois diferentemente do rap produzido nos EUA, os brasileiros se apropriaram da estética de uma forma bastante original, trazendo a tona em sua grande maioria uma insatisfação devido à desigualdade social. Uma atividade especificamente humana, não encontrada em nenhuma outra espécie animal é a comunicação pela linguagem falada. Para se expressar através da fala, o homem 13� � criou palavras, frases, metáforas e outras construções linguísticas; desenvolveu a linguagem verbal, utilizando códigos e símbolos, interagindo com o mundo e conquistando sua história. A linguagem movimentou o homem e possibilitou a comunicação entre os povos, mediando as relações em múltiplos espaços simultâneos, manifestando e transmitindo de forma específica seus pensamentos, transformados em mensagens. Tendo em vista todo o “universo paralelo” – a periferia – de onde provêm as inspirações para a produção dos Raps, para efeito de entendimento de suas inquietações, devemos olhar o movimento Hip Hop de uma forma mais abrangente a partir da “questão da linguagem”. Podemos considerar o movimento Hip Hop como uma ferramenta, que pode auxiliar na abertura de um diálogo mais sincero e direto com as minorias, compreendendo melhor a própria realidade das comunidades periféricas, através das produções das letras de rap, considerando essas experiências em sua maior parte como traumáticas, de um povo pobre e excluído. O rapper não fala sobre a cidade de um lugar externo a ela. Como arte, o rap é uma “instalação” no domínio da música: ela ao mesmo tempo se estampa e é parte do urbano (ORLANDI, 2004, p.31) Em sua grande maioria, as letras de rap trazem à tona um discurso insatisfeito, evocado na voz de um narrador testemunho. Uma regularidade presente na maior parte das letras são denúncias referentes ao processo de segregação socioespacial, fenômeno típico do meio urbano, que consiste em uma separação social e espacial, conforme determinados níveis de renda e, consequentemente, seus agrupamentos relativos. Atualmente, as principais áreas de concentração humana são os espaços urbanos. É notório que a discussão teórica sobre a segregação socioespacial, feita por especialistas, tem uma visão muito parcial do problema em si e, também, muito técnica e distante da realidade da periferia. Em contraponto com essa prática acadêmica, que é muito hermética, os rappers oriundos do Movimento Hip Hop, fazem críticas bastante coerentes ao processo de segregação sob outra perspectiva, utilizando como estratégia de comunicação as letras de rap. Assim, no primeiro capítulo faremos um percurso para entendermos como o movimento hip hop dos EUA foi absorvido pela cultura brasileira. Para entendermos esse processo será necessário recorrermos um pouco à historiografia a fim de resgatarmos o legado do povo afro-brasileiro e sua mestiçagem, os quais irão influenciar nos objetivos e anseios do rap genuinamente brasileiro, com feições brasileiras. 14� � Neste sentido, em relação aos problemas que emergem, ressoam e ecoam dentro da periferia brasileira, podemos considerar que a Universidade (Academia) possui uma visão de fora para dentro, a respeito do processo de segregação socioespacial, enquanto que os ativistas do movimento Hip Hop observam o processo de dentro para fora. Eles têm, efetivamente, mais condições críticas de analisar essa situação, uma vez que são os seus atores principais. O rap funcionando como flagrante, tomado como instalação, é uma modalidade narrativa urbana, cujo lugar é o gueto. Tem sua forma material: o gesto, o lugar, a cena, as palavras, o som, os corpos. Sítio de significação. Concreto. Novo (ORLANDI, 2004, p. 31). É através dos discursos proferidos pelos Mc’s nos shows de Rap que esse estilo musical apresenta um instigante conteúdo para ser debatido e refletido pela população pobre; o rap nacional é direto, sem “rodeios” para denunciar as mazelas das minorias excluídas. Para os ouvidos mais sensíveis e requintados, o rap pode soar como uma agressão, mas essa nova forma de protesto pela linguagem musical está ganhando cada vez mais espaço nas mídias, principalmente nas independentes. Até meados da década de 90, para se veicular um CD ou algo similar, era necessário o apoio de uma gravadora, e contar com a propaganda das rádios. Hoje, entretanto, com as grandes mídias digitais assessoradas pela internet, basta apenas ter um pouco de desenvoltura tecnológica para produzir seu próprio CD, além de poder postar as faixas gravadas em sites de divulgação específica como o “myspace”, e nas “redes sociais”. No capítulo 2, iremos discorrer sobre todas essas novas artimanhas e facetas da produção cultural contemporânea que está vinculada ao processo de globalização, e assim dialogaremos com as ideias do geógrafo Milton Santos, o qual sempre expôs o processo de Globalização com maestria, com um pensamento crítico. A globalização é um tema polêmico abrangendo vários níveis tais como o econômico, tecnológico, cultural e político. Embora seja um grande anseio da humanidade uma possível comunhão universal, ela está muito distante ainda de ser executada de uma forma que não seja perversa. A priori, toda a temática que será desenvolvida aqui nesta dissertação, parte da curiosidade de investigação que temos pelos desdobramentos contemporâneos que o gênero musical “RAP” vem provocando na sociedade, como uma grande narrativa de insatisfação dos pobres e dos excluídos em nossa sociedade, representando neste sentido as minorias dos povos negros e indígenas no Brasil. Sabemos que desde os anos de 1980, as inquietações desse movimento político e cultural já circulavam pelo Brasil, através da indústria cultural, em demasia nas periferias das 15� � cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, que de certa forma foram as primeiras cidades brasileiras a absorverem a ideologia importada dos Estados Unidos da América. Mas qual é a atual cena do Rap brasileiro? Aquele produzido no século XXI? Pois bem, passaram-se 30 anos e os desdobramentos que Movimento Hip Hop, em específico o Rap, assumiram formas e projeções incríveis no território brasileiro. O Rap brasileiro é engajado, politizado, e sabe muito bem aonde quer chegar. Basta analisarmos o próprio contexto das letras produzidas atualmente para entendermos sua proposta. O Hip Hop tornou-se tão globalizado quanto os problemas sociais atuais. Tais problemas ocorrentes no momento atual que o planeta vive, devem-se em grande medida ao fato de às normas virem de cima para baixo, dos que têm para os que não têm. Existe pobreza no mundo todo, ela se apresenta em escalas maiores ou menores de acordo com o nível de perversidade dos efeitos da globalização que estão impregnados em cada lugar. 16� � Capítulo I - Movimento Hip Hop, das Paisagens sonoras dos EUA para o BRASIL: um modo de vida adotado pelas periferias. 1.1.A população Negra: Resquícios da escravidão, revolta e traumas no século XXI. “Eu tenho orgulho da minha cor, Do meu cabelo e do meu nariz. Sou assim e sou feliz. Índio, caboclo, cafuso, criolo! Sou brasileiro!” Rapper Criolo O Território paulista, ocupado inicialmente pelos indígenas, foi colonizado pelos portugueses. Não é também nenhuma novidade que no século XVI os colonizadores trouxeram para cá os negros à força, que vieram trabalhar na condição de escravos. Posteriormente, vieram os imigrantes. No Brasil, o movimento hip hop e o rap vão tomar feições particulares, próprias de demandas específicas apresentadas pelos afro-descendentes e pelo contexto brasileiro. Os raps podem ser entendidos como um tipo de apropriação que o rapper faz da palavra para poder tornar sua comunidade e suas histórias visíveis (VIANNA, 2008, p. 9) Para pensarmos sobre a influência das letras de rap na sociedade atual é preciso refletir sobre a condição do povo negro no Brasil, retomando aqui um pouco sobre o legado dessa população remanescente de um intenso processo de escravidão . Nossa sociedade foi formada por uma grande mistura de elementos étnicos e culturais. Sem qualquer condição prévia as populações negra e indígena de antemão já tiveram como experiência traumática seus primeiros contatos com os europeus: A resistência dos povos indígenas ao processo de escravidão teve duas consequências notáveis: a sua massiva exterminação e a busca dos africanos que aqui foram deportados para cumprir o que os índios não puderam fazer. Assim abriu-se caminho ao tráfico negreiro que trouxe ao Brasil milhões de africanos que aqui foram escravizados. (...) A escravidão foi o meio que os portugueses encontraram para tirar mais lucro do Brasil. Além do tráfico e do comércio de algumas essências naturais, em especial o pau-brasil (que deu origem ao nome do país), eles recorreram também à agricultura de açúcar, na época um produto raro, comercializado pelos árabes e vendido em gramas a preço de ouro, como se vendem hoje os remédios nas farmácias. (MUNANGA, 2004, p. 16) 17� � Posteriormente a cafeicultura, concentrada em São Paulo passou a receber muitos imigrantes, principalmente italianos, portugueses, alemães espanhóis e alemães. Mais tarde, a industrialização atrairia para o estado novos imigrantes. O Brasil é uma enorme mistura. Para tratar os aspectos fundamentais da enorme mestiçagem brasileira, Ribeiro (1995, p.19) já havia se referido ao Brasil como “um povo novo”: Novo porque surge como uma etnia nacional, diferenciada culturalmente de suas matrizes formadoras, fortemente mestiçada, dinamizada por uma cultura sincrética e singularizada pela redefinição de traços culturais dela oriundos. Também novo porque se vê a si mesmo e é visto como uma gente nova, um novo gênero humano diferente de quantos existam. Além da “mão-de-obra serviçal”, vieram também agregadas a esse “povo novo” uma cultura que simplesmente transborda, um verdadeiro legado que ultrapassou barreiras continentais e ainda resiste na contemporaneidade: De modo geral, o atual povo brasileiro é oriundo de quatro continentes: América, Europa, África e Ásia. Quando os primeiros portugueses pisaram nesta terra em 1500, eles encontraram no local u mosaico de centenas de nações ou grupos nativos a quem denominaram indistintamente de índios. (MUNANGA, 2004, p. 17) Talvez seja esse o motivo de tantas lutas e pontos de vista que divergem bastante nos aspectos mais diversos desse povo tão misturado, que é o povo brasileiro. O artista Cândido Portinari retratou perfeitamente na sua obra “O Mestiço” (figura 2), os traços e fisionomia de quem seria esse povo novo e misturado, que não era genuinamente negro, nem índio muito menos europeu, mas sim o brasileiro que é fruto dessa mestiçagem: Figura 2: O mestiço – Cândido Portinari, 1934, óleo sobre tela. Fonte: http://www.tumblr.com/tagged/mesti%C3%A7o� 18� � Em qualquer parte do país, onde se olha, sempre é notória a presença do negro no dia- a-dia. Os negros tem presença marcante em várias manifestações culturais brasileiras, sendo o símbolo maior da luta contra a escravidão no Brasil, Zumbi dos Palmares, que acabou se transformando herói do povo negro. Mesmo após abolição da escravatura os negros sofreram com o preconceito, com a pobreza e com a imposição de baixos salários. Mesmo sabendo de toda essa negritude brasileira, quando os dados censitários são sistematizados pelo IBGE algo estranho acontece, sabemos que existe uma população negra, mas ela é tímida quando necessita se “autodeclarar” nos censos, vejamos o gráfico abaixo: Gráfico 1: População residente por cor ou raça (percentual) Brasil e Grandes Regiões - 2010 Fonte: IBGE Devido a todo apagamento da cultura afrobrasileira, os negros não se autodeclaram como negros, e os pardos irão acabar aparecendo em maioria, devido a “falta de identificação com as próprias origens”. Com toda essa mistura, algo ficou opaco na memória desse povo novo, suas próprias raízes. Veremos a seguir que além de retomar a sua própria memória ancestral representada em algumas letras de rap, essas minorias tanto a indígena, quanto a população negra vai passar por um processo de revalorização das próprias origens, de seus próprios espaços que foram apagados pelas políticas de branqueamento racial do País. 19� � Sobre esses mecanismos dos valores da cultura negra Souza (2007), com muita propriedade nos trás alguns apontamentos possíveis sobre essa retomada de consciência, dessas minorias, vejamos: Os afrobrasileiros que tinham mais estudo e consciência das desigualdades sociais, e que geralmente moravam nas cidades maiores, se afastaram, porém, das tradições dos seus antepassados e assimilaram os valores dos grupos sociais aos quais queriam se integrar. Para conquistar lugares equivalentes aos que os ditos brancos ocupavam, os negros assumiam os valores dominantes, deixavam de lado suas tradições com características africanas e se desinteressavam de coisas que um dia fizeram parte de sua história.(p. 126) Neste sentido, o movimento hip hop em específico em suas letras de rap vai cumprir um papel social fenomenal retomando as memórias que ora foram apagadas pelo processo doloroso que a população negra passou, fazendo com que essas novas memórias sejam selecionadas de uma forma positiva, se não pelo menos convidativa para uma reflexão, vejamos a transcrição da letra “Voz Ativa3” do grupo Racionais Mc’s: Não quero ser o Mandela Apenas dar um exemplo Não sei se você me entende Mas eu lamento que, Irmãos convivam com isso naturalmente Não proponho ódio, porém Acho incrível que o nosso compromisso Já esteja nesse nível Mas Racionais, diferentes nunca iguais Afrodinamicamente mantendo nossa honra viva Sabedoria de rua O RAP mais expressiva(E ai...) A juventude negra agora tem a voz ativa(Pode crer) A voz ativa se faz presente, convidando, cobrando lembrando um despertar de consciência da autoimagem do povo negro. Consecutivamente vai ser essa dinâmica que assumiremos aqui, a de dar um tom explicativo as letras, analisá-las, comentá-las. Sequencialmente aqui nesta pesquisa, iremos apontar como que através dessas produções e criações artísticas das letras de rap poderão aparecer basicamente 3 aspectos em seus conteúdos: ������������������������������������������������������������ 3 Todas as letras apresentadas em fragmentos ao longo do trabalho aparecerão integralmente transcritas na sessão de anexos dessa dissertação. 20� � 1) Produção artística (caráter estético) 2) Conduta social (caráter ideológico) 3) Produção do espaço (aspecto geográfico). Ao testemunhar, o rapper narrador anseia pela inclusão de seu interlocutor em suas violentas que, ao serem narradas passam a ocupar a condição de experiência vivida e tornam o indivíduo capaz de, ao mesmo tempo, contruir-se e destruir-se. (VIANNA, 2008, p.7).Nessa retomada de memórias que posteriormente será melhor detalhada no 2.3, onde será feito a análise das musicas selecionadas. Segundo Hall (2011, p. 51), as culturas nacionais são compostas não apenas de instituições culturais, mas também de símbolos e representações. No caso da linguagem que é utilizada na produção dos raps brasileiros, esse exemplo cabe perfeitamente, tendo em vista as condições em que foi produzido tal material artístico: A periferia. Um espaço com amostras infindáveis de símbolos e representações. Tais símbolos e representações costumar vir a tona, de uma forma traumática. Pois, a maior parte dos relatos são de sofrimento, relatos de memórias de um povo sofrido que habita os espaços segregados no Brasil . Quais histórias sobram para contar nesses espaços segregados no Brasil? Quem conta muito bem esses relatos hoje em dia são os Rappers. Sim , esses jovens com microfone na mão que cantam músicas agressivas com batidas de samplers, sintetizadores e as vezes acompanhados de dançarinos que se mexem como que se seus corpos fossem quebrar. A idéia geral aqui nesta pesquisa foi tecer aqui situações que percorrem entre memórias e espaços. Tentar dialogar com as paisagens sonoras contemporâneas que habitam o Brasil globalizado do século XXI. Considerando que, segundo o IBGE (Instituto de Geografia e Estatística), cerca de 50,5 milhões de brasileiros têm entre 15 e 29 anos, representando ¼ da população do país. Destes, 45 milhões de jovens estão nas classes C, D e E imersos em realidades sócio- econômicas desfavoráveis que impactam fortemente em suas potencialidades de vida. Até a década de 1930 do século XX a juventude foi considerada uma categoria de pouca relevância social, contudo, a popularização do rádio, da indústria fonográfica e do cinema ajudou a fazer das experiências juvenis um novo e inquietante estilo de vida. De acordo com a lei 10.639, que prevê o ensino de historia e cultura afro-brasileiras (nos níveis médio e fundamental das escolas publicas e particulares), acreditamos que ser coerente associar uma pesquisa que remete as linguagens das culturas juvenis 21� � contemporâneas, como o movimento hip hop, tendo em vista que os conteúdos das letras produzidas em sua grande maioria gravitam em torno de problemas do cotidiano exatamente destes mesmos jovens e excluídos que habitam essas periferias, sendo na maioria negros e invisíveis. Podemos considerar o movimento Hip Hop como uma ferramenta, que pode auxiliar a abrir um diálogo mais sincero e direto com as minorias, neste contexto compreendendo melhor a própria realidade das comunidades periféricas através das produções das letras de rap. No Brasil, a música impôs também sensíveis alterações na agenda pública e apresentou, no final do século XX, os rappers como os principais porta-vozes das demandas dos jovens periféricos. O debate sobre a segregação sócio-espacial é um tema que tem muitas possibilidades de abordagem , por ser uma temática que pode dialogar com várias áreas correlatas do conhecimento.A Geografia, é uma dessas áreas do conhecimento, que pode colaborar muito com essa discussão, devido ao seu ponto de vista diferenciado do qual é seu objeto de estudo: o espaço geográfico. Podemos considerar a rotina da periferia urbana brasileira, como o “espaço do acontecer”, uma espécie de matéria prima para a criação de raps, transformando a experiência vivida em poesia musical, utilizando como estratégia de comunicação a os “eventos” que são produzido nesses lugares. A música nesse contexto é uma forte estratégia para denunciar e reivindicar os problemas mais clássicos desses subúrbios, que são: o combate a violência, tráficos de drogas, preconceito racial, falta de saneamento básico, moradias inadequadas além da falta atividades culturais oferecidas pelos órgãos públicos cabíveis. De acordo com SOUSA (2009, p.9): Ao cantar as mazelas e o desconforto do mundo circundante, os rappers encontram ressonância junto as suas comunidades para criticar alguns dos pilares de sustentação da cultura Ocidental: Democracia, Liberdade, Justiça e Cidadania. Evidenciam, assim, a pouca importância e o pouco significado que estes conceitos têm para as suas vidas. Através da experiência vivida pelos adeptos do Movimento Hip-Hop residentes nas comunidades periféricas, a utilização de uma linguagem do cotidiano, como gírias e expressões locais podem causar estranheza para quem ouve a música: afinal, toda produção 22� � artística origina-se de um determinado lugar, logo, a linguagem do hip hop é a linguagem do seu lugar, do seu território. 1.2. Compreendendo os elementos da Cultura Hip Hop O hip hop é uma corrente cultural profundamente dominada por homens. As concepções desse universo possuem claras tendências machistas, dado que raramente surge uma mulher como figura principal no texto de um rap. A violência que de fato fazia parte do cotidiano nos bairros de Nova Iorque nos anos 60-70 estava mais do que presente, afastando um pouco também as garotas desse contexto. No Brasil a realidade não vai ser muito diferente da norte americana. É comum encontrarmos publicações sobre juventude e culturas juvenis que compreendem a categoria de juventude como um todo, ou seja, não fazem distinção entre jovens adolescentes do sexo feminino e masculino. (WELLER, 2006, p. 112). Um fato bastante interessante a se pensar, é que os 4 elementos da cultura hip hop estavam acontecendo simultaneamente nos EUA, mas os americanos não haviam notado com clareza a somatória de todas essas atividades, as quais são: 1) Mc+ Rap, 2) DJ, 3) Graffite, 4) Break (dança). Tal somatória caracteriza a cultura hip hop, portanto nos EUA tudo estava acontecendo, mas ninguém tinha atribuído ainda o nome de “movimento hip hop” a todos esses fatores culturais que estavam surgindo nas ruas de Nova Iorque. É então posteriormente que o DJ “Afrika Bambaataa” vai oficialmente “batizar” essa cena cultural, intitulando-a de “Movimento Hip Hop”, que é praticamente uma onomatopeia com a intenção de querer dizer “mexa os quadris”. O Mc, o Dj e o Rap A palavra rap vem do inglês rythm and poetry, que significa “ritmo e poesia”. O ritmo é dado pela base musical, enquanto a melodia é dada pelo rap, que depende diretamente da forma como a letra vai ser construída. No caso dos raps, vale destacar que é como se, ele se posicionasse como observador daquilo que relata e, por vezes, fosse parte integrante de suas observações. Ao manter certa distância do narrador, é possível observar-lhes os traços conhecidos com mais facilidade, os traços que se destacam nele. O rapper-narrador construído pelo grupo vai colocar a necessidade de aceitação da condição de negro, a exaltação da cultura negra, e finalmente, a consciência da alteridade constitutiva existente entre brancos e negros que 23� � impossibilita a existência de uma identidade negra “pura”, isolada do contato ou da contaminação pela cultura branca e vai também tornar pública a vivência cotidiana de toda a comunidade negra periférica que representa.(VIANNA, 2008, p. 17) Os pioneiros do Movimento Hip Hop nos Estados Unicos da América, foram os maiores agitadores culturais desta “cena da cultura de rua”, podemos dizer que eles são considerados os precursores do rap, em que se destacam: Kool Herc, Grandmaster Flash e Afrika Bambaataa (figuras 3,4 e 5). Os três desempenhavam simultaneamente as funções de DJ (Disc Jockey) e MC (mestre de cerimônias). Afrika Bambaataa (figura 5) e Grandmaster Flash (figura 4), foram os primeiros a pensar em produzir material sonoro e veiculá-los nas rádios nos Estados Unidos da América, através do lançamento de LP (Long Plays), sendo que a partir dessa iniciativa se tornaram conhecidos devido a repercussão que os discos tiveram nas rádios. Figura 3: : Kool Herc Fonte: http://bboylegends.com/the-legend-of-dj-kool-herc/ 24� � Figura 4: Grandmaster Flash Fonte: http://lumdimsum.com/tag/grand-master-flash/ Figura 5: Afrika Bambaata . Fonte:� http://namiradogroove.com.br/showsfestivais/urban-music-festival-traz-afrika-bambaataa-john-legend-cee-lo- green-e-quem-sabe-primal-scream Posteriormente a indústria cultural vai absorver a prática dos DJ’s como profissão muito ligada ao entretenimento e festas chamadas de Raves a partir dos anos 90, fazendo uma transição da Black music original para a música eletrônica. O primeiro Rap que veio a ser gravado no Brasil, foi uma versão de Rapper’s Delight do Sugarhill Gang, gravado pelo comediante Mielle. (VIANNA, 2008, p. 36). 25� � O Graffite O graffiti (figura 4) é uma forma de apropriação da cidade. É a maneira pela qual o Movimento Hip Hop se mostra mais claramente e de modo mais duradouro para toda a população. Mas ainda não existe efetivamente uma articulação dos artistas, no sentido de lutar pela permanência dessas obras de arte, principalmente nos espaços privados. Figura 4: “RG EXPO LIVE ART”, cidade de Rio Claro Fonte: Acervo do autor Polêmicas a parte principalmente para os leigos que confundem os graffites feitos pelos integrantes do movimento hip hop com o vandalismo das pichações, ainda há muita falta de informação para que as pessoas da sociedade civil possam compreender melhor essa situação: A pichação e o graffiti usam o mesmo suporte, a cidade, e o mesmo material, tintas. Assim como o graffiti, a pichação interfere no espaço, subverte valores, é espontânea, gratuita e efêmera. As pichações são freqüentemente encontradas em espaços internos, como pátios escolares e banheiros públicos1, além de ambientes freqüentados por uma coletividade, tais como escolas e centros comunitários. Uma das diferenças fundamentais entre o graffiti e a pichação é que o primeiro advém das artes plásticas e o segundo da escrita, ou seja, o graffiti privilegia a imagem, enquanto a pichação, a palavra e/ou a letra. (GARCIA, 2007, p. 4) Aqui no Brasil ficou marcado em nossa memória o incidente que aconteceu durante a Bienal de Artes plásticas do ano de 2008, que na ocasião foi invadida por um grupo de pichadores que fizeram uma intervenção de protesto, escrevendo nas belas curvas arquitetônicas de Oscar Niemeyer palavras de protesto, exigindo a legitimação de sua arte, conforme ilustrado na figura 5. 26� � Figura 5: Pichação na Bienal de Artes Plásticas de 2008 Fonte:�http://www.estadao.com.br/noticias/geral,pichadora-da-bienal-e-condenada-a-4-anos-de- detencao,441491,0.htm Os desenhos de graffiti também se tornaram enfoque de pesquisas acadêmica, como objetos de investigação devido a uma série de fatores. Atualmente a arte de grafitar é considerada uma forma de expressão artística, mas já foi duramente reprimida no Brasil: A arte de grafitar foi, durante muito tempo, duramente combatida, pois era vista como um ato de vandalismo e um crime contra o patrimônio público ou privado, sofrendo, por causa disso uma forte repressão policial. Essa situação encontra-se hoje bastante amenizada, pois o grafite conseguiu ganhar legitimidade como arte, e por isso, é mais tolerado, tanto pelas administrações públicas como pelos proprietários particulares. Um dos fatores que levou a criminalização do grafite foi o fato de ele ser confundido com a simples pichação, que é uma atividade muito diferente do grafite e que pouco ou nada tem a ver com arte.4 Se compararmos as clássicas obras de arte do pintor alemão Johann Moritz Rugendas (figura 7), que já ilustraram muitos livros didáticos no Brasil, com a atual produção de graffites, chegaremos a conclusões bem interessantes: na obra de Rugendas podemos notar a presença de “imagens estigmatizadas” dos maus tratos sofridos pela população negra ������������������������������������������������������������ 4 SOUZA , Marcelo Lopes de & RODRIGUES, Glauco Bruce . Planejamento Urbano e ativismos sociais. Rio de Janeiro, Editora Unesp, 2005. 27� � escravocrata , enquanto que nos populares graffitis atuais, o negro coloca-se como protagonista de sua arte, e não apenas como mero coadjuvante (figura 8). Figura 7: Punições Públicas Fonte: http://www.projetomemoria.art.br/JoaoCandido/biografia4.html Figura 8:TÍTULO DA FIGURA Fonte:http://funwebtest.epfl.ch/site2005/Smayemba/images/multiple-rappers.gif O grafite que até então emergiu no contexto do Movimento Hip Hop, ainda é uma forma de extrapolar e desencouraçar as qualidades estéticas e artísticas dos excluídos, expondo com cores, traços e linhas toda a auto-estima subjetivada nessa técnica. 28� � A arte de graffitar se explica como a própria persistência e afirmação estética de uma cultura (excluída) que se impôs para modificar seu passado , transformando-o num presente muito mais colorido e próspero. Nesse processo de exclusão, como alternativa de protesto o Movimento Hip Hop através dos militantes engajados tornou-se uma ferramenta essencial de reivindicação e protesto, sendo uma voz popular representativa, uma espécie de tribuna popular contemporânea, mesmo que eventualmente tenha que se impor espacialmente, afinal de contas é um saber urbano contemporâneo e criativo. O Break No Brasil, especificamente, a apropriação da cidade alcançou proporções que extravasaram o limite da periferia. O dançarino de rua conquistou livre aceso às localidades populares urbanas, invadindo centros culturais, espaços artísticos, áreas de lazer e locais centrais de trânsito urbano (ALVES, F. S. 2004, p. 4) Percebe-se no contexto da dança do movimento hip hop que existe uma ocupação simbólica feita pelos dançarinos, os quais muitas vezes se descolam da periferia para ocupar as regiões centrais, o dançarino de rua experimenta a cidade à sua maneira, entrelaçando sua forma autêntica de expressão corporal com a sensação de estranhamento que ele sente na sua relação com a cidade e na sua relação com seu próprio corpo.(idem, p. 3) Tendo em vista a ocupação simbólica que este momento de dançar permite acontecer em sua subjetividade, podemos considerá-lo como a instância mais efêmera do movimento Hip Hop. Sem dúvida, a criatividade e resistência máxima do movimento hip hop está inserida no contexto vivenciado pelos B. Boys que praticam a dança break . “Sendo um dos componentes fundamentais do movimento hip hop pelo fato de que “O b-boy (dançarino de break), ocupa um espaço da cidade, reafirmando, com o corpo, sua existência. O break deixa as favelas e periferias e vai se apropriar dos espaços públicos da cidade: praças, ruas, estações de metrô” (SOUZA e RODRIGUES, 2005). Um dos motivos do surgimento do break, deve-se a importância análoga que foi atribuída a alguns de seus movimentos, inspirados em fatos marcantes para a humanidade, diz-se por exemplo que alguns de seus passos foram inspirados na Guerra do Vietnã, como, por exemplo, a maneira de os dançarinos mexerem os membros inferiores e superiores, como se estivessem quebrados. Com essa coreografia eles lembravam os mutilados daquela guerra, 29� � mas de uma maneira bastante criativa. O rodopio de cabeça para baixo, por exemplo, tinha como objetivo remeter à imagem dos helicópteros que foram muito utilizados nos ataques americanos ao território do Vietnã do Norte. É importante ressaltar, que esta atividade de dança está impregnada de reforços positivos, proporcionando sempre um novo caminho de abertura para que os praticantes tenham uma vida mais saudável e demarquem subjetivamente seus territórios existenciais, além de ser muito prazerosa para quem é espectador de uma manifestação cultural tão dinâmica e empolgante como essa, como encontra-se evidenciado na figura 9. Figura 9: B. Boys reunidos no coreto da praça central em Rio Claro (Fonte: Jornal da Cidade 02/02/2011) 30� � 1.3. Cultura Hip Hop dos EUA para o BRASIL: um modo de vida adotado pelas periferias. O processo de globalização está cada vez mais notório em nossa sociedade, interferindo em vários aspectos econômicos, políticos e culturais. Basta andarmos por alguns instantes em qualquer metrópole do mundo para vermos esses efeitos se concretizarem, uma mistura total de estilos, vestuário, indumentárias, sotaques, tudo pulverizado. Em meados de 1970, em um cenário hostil de crises políticas e econômicas, a guerra no vietnã levou jovens jamaicanos aos Estados Unidos – principalmente para os bairros pobres de grandes cidades como Nova York e Los Angeles - , somando esses jovens aos latinos e aos descendentes de escravos africanos. Em sua bagagem, os jamaicanos traziam o toasting, um estilo musical semelhante ao reggae. Na Jamaica esse estilo era disseminado unindo pessoas em locais públicos com carros equipados com um som potente; as letras consistiam em pequenas rimas improvisadas (free style) , com um certo teor político.Nesta época, a insatisfação dos imigrantes e do povo marginalizado era traduzida em manifestações como a de pegar aparelhos de som e coloca-los em frente de suas casas, nos quais gritavam ao microfone palavras de ordem pautadas principalmente nas idéias de Malcom X, Martin Luther King, Panteras Negras, e ao som de bases contínuas de discos como os de James Brown. Surge o RAP, que significa “batida” em inglês.. O rap é responsável por dois elementos do hip-hop: o que pega no microfone para rimar – MC (mestre de cerimônia) – e o que cuida do som para garantir a base contínua – o DJ (disk jockey). Essa difusão cultural da estética do hip hop dos EUA para o Brasil pode ser associada ao conceito de paisagem sonora que SCHAFER (2001, p. 23) utiliza: “A paisagem sonora é qualquer campo de estudo acústico. Podemos referir-nos a uma composição musical, a um programa de rádio ou mesmo um ambiente acústico como paisagens sonoras”. Além da questão artística, temos que agregar a este conceito de paisagem sonora a produção do espaço urbano também, que é o lado crítico da questão. Nesse sentido, para o presente estudo foram imprescindíveis as leituras dos autores FELIX (2005),SOUSA (2009) e HERSCHMANN, (2005), que trazem um panorama bastante preciso sobre a atual cena musical do RAP Brasileiro. É unânime entre os que se debruçaram para pesquisar o movimento hip hop no Brasil, que a principal cidade que influenciou esse estilo ligado as culturas juvenis em nosso país foi a cidade de São Paulo, inclusive a primeira tentativa de reunir um coletivo com a intenção de lançar um disco de Rap, foi na metrópole paulista. “Hip Hop Cultura de Rua” (figura 10) foi a primeira coletânea de rap brasileira, lançada em 1988. Além da famosa dupla Thaíde e DJ 31� � Hum, foram lançados os grupos Código 13, MC Jack, e o Credo. Os produtores da dupla citada foram Nasi e André Jung, ambos da banda de rock Ira , Akira S produziu MC Jack e código 13. O Credo havia sido convidado pela gravadora Eldorado para gravar um LP Solo, como não haviam músicas suficientes, convidaram mais grupos para participarem da coletânea. Os idealizadores do LP foram Ruberval Marcelo (MC Who, d’o Credo), Gilson Fernandes e Vagner Garcia, da Gravadora Eldorado. É curioso perceber que o primeiro disco de rap no Brasil foi produzido tecnicamente por roqueiros, demonstrando nitidamente que as coisas ainda estavam por vir aqui no Brasil. Figura 10: Capa do Disco “Hip Hop Cultura de Rua”, de 1988. Fonte:http://3.bp.blogspot.com/_76hc1HkzNCo/S601-u49rZI/AAAAAAAACCc/-038rbPJBLk/s1600/hip_hop_cultura_de_rua.jpg � � � 32� � Capítulo 2- As letras de Rap que representam as minorias étnorraciais, encontros e desencontros no processo de Segregação Sócio Espacial. 2.1. Ativismo Urbano Brasileiro Compreendemos que a paisagem urbana é a forma pela qual o fenômeno urbano se manifesta. E são exatamente estes fenômenos que nos interessam, em específico quando compreendemos o espaço urbano também como um espaço de “produto de lutas” (CARLOS,1994),: Nesse contexto a discussão do urbano transcende a idéia de cidade enquanto aglomeração de capitais, supera a discussão da cidade e/ou espaço do capital. Esse encaminhamento permite pensar o espaço também como produto de lutas, fruto de relações sociais contraditórias, criadas e aprofundadas pelo desenvolvimento do capital. Assim, no embate entre o que é bom para o capital e o que é bom para a sociedade hoje, o urbano se produz, a cidade se estrutura e a paisagem urbana ganha sua configuração. (idem, p. 71) No final dos anos 70, a imunização contra o pragmatismo descritivo da Geografia assume a forma de uma concepção estrutural de sociedade e de espaço cujo foco das análises dirigia-se para as contradições, os conflitos e os antagonismos inerentes aos movimentos da estrutura social. (GODOY, 2005, p. 44). SOUZA (2006, p. 273-274) retoma o debate sobre esses “antagonismos” presentes no contexto dos ativismos sociais, e traz para esta discussão o ponto de vista da sociedade civil que reivindica e se opõe aos planejadores e gestores como um importante agente modelador do espaço urbano, e nos traz algumas considerações muito importantes sobre as literaturas produzidas em torno deste assunto, vejamos: No Brasil, em particular, onde a literatura sobre os movimentos sociais urbanos produzida nos anos 70 e 80 caracterizou-se fortemente por empirismo e escassez (ou rarefação analítica) de referenciais teóricos, além de inconsistências e pouco vigor político-filosófico (simpatia um tanto ingênua por quase quaisquer “movimentos populares urbanos”), praticamente “tudo” passou a ser denominado movimento social: de uma organização paroquial e puramente reivindicativa de bairro ou favela, às vezes até criada e/ou manipulada por políticos clientelistas, até organizações e mobilizações muito mais abrangentes, contestarias e capazes de contextualizar os problemas urbanos dentro de preocupações com a política e a economia em escalas supralocais. 33� � Com a tentativa de fazer uma reorganização conceitual , o autor citado nos chama a atenção para algumas diferenças tênues que existem entre ativismos sociais e movimentos sociais: Os ativismos sociais (ou ativismos, simplesmente para evitar redundância) são um conjunto mais amplo de ações públicas organizadas, do qual os movimentos sociais seriam um subconjunto. Os ativismos, como ações públicas organizadas e relativamente duradouras, diferenciam-se de ações coletivas efêmeras e pouco organizadas ou desorganizadas, como quebra- quebras (“vandalismo de protesto”), saques e outras; e, como ações públicas, em sentido forte, diferenciam-se tanto da criminalidade ordinária (mesmo organizada) e de organizações terroristas, quanto de grupos de pressão e lobbies em sentido restrito, que tendem a atuar nos “corredores do poder estatal”, pressionando parlamentares ou administradores públicos e articulando tráfico de influências, entre outras atividades que não são propriamente públicas. Os movimentos sociais, de sua parte, seriam uma modalidade especialmente crítica e ambiciosa de ativismo social, distinta de ativismos “paroquiais”. Estes encaminham reivindicações pontuais, sem articula-las com questionamentos mais profundos, relativos a problemas nacionais e internacionais, e sem construir pontes entre a conjuntura, cujo domínio não ultrapassam, e as estruturas, que não chegam a tematizar. São, não raro, prisioneiros do ou contaminados pelo clientelismo. (SOUZA, 2006, p. 278) Toda ação relacionada a palavra “movimento” já está previamente associada ao “ato de mover-se”, ou então “deslocamento”, “revolta”, já existe um contexto do “mexer-se”. Sob o ponto de vista da insatisfação das camadas populares menos favorecidas, a idéia de mobilização aparece como uma constante. Entretanto, a idéia neste capítulo não é fazer uma cronologia da história dos ativismos sociais. Para pontuar como aconteceu o surgimento do movimento hip hop, enquanto uma forma de protesto e insatisfação dos pobres, reafirmamos o sentido critico e ambicioso que o autor supramencionado propõe quando se refere aos movimentos sociais, criticando ainda a questão dos movimentos de bases locais que apresentam um tom paroquial, limitados em si mesmos, e nos chama a atenção para o movimento hip hop, vejamos: Um ativismo de base local pode ter uma agenda manifesta ou latente bastante crítica. E mais: um ativismo de base local pode ter como veículo de protesto manifestações culturais, em vez de ser, em sentido banal, “reiveindicativo”. Tome-se como, ilustração, um grupo jovem qualquer, dos vários que existem 34� � nas favelas e periferias das grandes cidades brasileiras, que, embebido na cultura hip-hop, se organiza para compor, discutir e, a partir daí divulgar suas mensagens anti-racistas e de protesto por meio da música e do grafite. (p.280) Os ativismos urbanos se manifestam de formas diferenciadas na contemporaneidade, em diferentes escalas de mobilizações, podendo variar entre ativismos urbanos com sentido “estrito e forte”, ou mesmo ativismos urbanos em sentido “amplo ou fraco”, de acordo com Souza (2006, p. 280-281): Ativismos urbanos em sentido estrito e forte giram muito nítida e explicitamente em torno de problemas diretamente vinculados ao espaço social. A questão do acesso a equipamentos de consumo coletivo e, mais abrangentemente, as condições de reprodução da força de trabalho assumem, aqui, importância central. Trata-se de um tipo de ativismo que tem origem em um clamor pelo direito a cidade: luta por moradia5 e por infra-estrutura técnica e social, luta por regularização fundiária e desestigmatização de espaços segregados6, luta por um maior acesso a equipamentos de consumo coletivo; enfim, luta por um espaço urbano mais agradável, mais “convivial” e menos injusto. Exemplos de ativismos urbanos stricto sensu são o ativismo de bairro convencional e os ativismos de ocupantes de imóveis (terrenos, casas ou apartamentos) vazios ou abandonados (squatting movement). Ativismos urbanos em sentido amplo e fraco, de sua parte, são aqueles que, embora tenham as cidades como seu palco preferencial (e, às vezes, quase exclusivo), se referenciam apenas indiretamente pela espacialidade urbana.Sua existência gravita em torno de questões “setoriais” (melhores condições de trabalho e resistência contra a exploração e a opressão na esfera da produção, luta contra as desigualdades e injustiças de gênero etc) ainda que a organização espacial dos ativismos possa ser sofisticada e os vínculos com as questões diretamente espaciais possam vir a ser bem percebidos (por exemplo, no caso do ativismo negro que não deixa escapar a relação discriminação social/segregação e estigmatização espaciais). Nas definições conceituais apresentadas por Souza (2006), podemos conceber então que o movimento hip hop, é um ativismo estrito e forte, pelo fato de que a sua grande bandeira de luta são fatos e ações correlatas a um cotidiano que é vinculado ao espaço social. Avançando ainda mais esta discussão, o autor nos apresenta outros possíveis desdobramentos conceituais, em relação a esta “escala” dos ativismos urbanos, classificando- os da seguinte forma: ������������������������������������������������������������ 5 Grifo nosso. 6 Grifo nosso. 35� � 1) “Mero” ativismo urbano em sentido fraco (por exemplo, um sindicato operatório afinado com o estilo do “sindicalismo de resultados”, desinteressado de ou não sintonizado com uma crítica social ampla). 2) “Mero” ativismo urbano em sentido forte (por exemplo, uma associação de moradores completamente paroquial e refém de clientelismo). 3) Movimento social urbano em sentido fraco (por exemplo, um movimento organizado em torno da resistência contra a globalização capitalista, seus pressupostos e seus efeitos). 4) Movimento social urbano em sentido forte (por exemplo, um squatting movement capaz de costurar diferentes questões, politizando amplamente a problemática da ocupação de imóveis mantidos vazios por razões especulativas e lutando para humanizar o espaço urbano e desenvolver um novo tipo de vinculo entre os moradores e seus espaços residenciais). (SOUZA, 2006, p. 281) Para contextualizar historicamente o Brasil nos movimentos sociais urbanos, é necessário recorrermos à essência de suas temporalidades, fazendo uma análise entre a prática desses atores em contraponto com os momentos históricos vivenciados pela população brasileira, SOUZA (2006, p. 182). Assim, Buscando periodizar, extrair algumas lições de experiência brasileira da prática dos ativismos sociais e do seu estudo acadêmico, identificam- se os seguintes quadros conjunturais: 1) Dos anos 70 até a primeira metade dos anos 80 tem-se o auge dos chamados “novos movimentos”. A “abertura política” durante os governos dos generais Geisel e Figueredo dá ensejo a uma retomada dos protestos e a uma (re) constituição da mobilização social, de favelas e periferias a bairros e classe média. 2) Na segunda metade dos anos 80 o sentimento de crise se instala, crise essa motivada por uma confluência de variados fatores (vide SOUZA, 2000ª: 145 e segs.). A essa crise muitos pesquisadores universitários começaram a responder desinteressando-se do tema dos ativismos (vide crítica em SOUZA, 1988b) ou, também, simplesmente substituindo o estudo dos ativismos pela análise das políticas públicas e dos canais participativos estatais e trocando a reflexão sobe as práticas sociais pelo exame dos formatos organizativos (temática das redes), conforme apontou RIBEIRO (1991:96 e 2001:10). 3) Dos anos 90 em diante alastra-se a crise, que, poderia talvez, ser caracterizada com um “estado de coma”. As organizações dos ativismos, quando não definida, entram em colapso e retrocedem a uma espécie de miserável “vida vegetativa” (caso não apenas de incontáveis associações em escala microlocal, mas também de federações municipais e estaduais), começando a tentar mimetizar o “formato ONG” (Caso de algumas federações 36� � de associações de moradores) ou escorar-se em articulações com o Estado e em canais participativos oficias para tentar sobreviver. (p.282) É possível perceber que não é gratuitamente que exatamente nos anos 80, o movimento hip hop vai poder criar suas raízes aqui no Brasil, devido aos movimentos populares de redemocratização do país, onde as massas estavam em ebulição por conta do movimento que foi alavancado pelas diretas já. 2.2 Contribuições da teoria da análise de discurso para uma análise geográfica das letras de rap: Língua, Cultura e Espaço na perspectiva discursiva Nossa intenção aqui não foi realizar um estudo específico sobre linguística, mas sim verificar as aproximações que a teoria de análise de discurso e análise de conteúdo podem fazer com a ciência geográfica interpretarmos as condições de produção dessas letras de rap, originadas nos espaços periféricos, tendo em vista que todo saber tem em específico alguma relação de poder, optamos aqui por usar como escopo a teoria de análise de discurso para analisarmos as letras, lembrando que o que vai predominar na questão da análise são as subjetividades presentes nas entrelinhas das músicas, sua relação entre o inconsciente e a ideologia dos interlocutores que estamos analisando: as letras de rap. Essa questão do saber e do poder tem uma conexão muito forte com nossa sociedade, ora podermos dar visibilidade a determinados assuntos, ora podemos apagá-los. Em nossa pesquisa temos a intenção de dar visibilidade a rap, propor aqui encaminhamentos dentro da universidade para que as elites pensantes enxerguem a produção cultural e artística das minorias de uma forma positiva, valorizando esse processo de criação da periferia, e desconstruam o olhar viciado que possuem sobre a favela. Um conceito importante é o do silenciamento, que consiste no apagamento da presença negra na memória da história brasileira. Orlandi (1995, p. 58) fala sobre o silêncio e a exclusão, focalizando outro apagamento: o do indígena. Ela se pergunta: “como o índio foi excluído da língua e da identidade nacional brasileira?”. De fato, assegura Orlandi, o índio é silenciado, não fala nos textos tomados como documentos. No entanto, é mencionado pelos missionários, cientistas e políticos. Para compreender o silêncio, é preciso compreender o discurso desses atores do longo da história (500 anos), ou seja, é pela historicidade que se poderá compreender o discurso e o silêncio. 37� � Para nos situarmos sobre as primeiras experiências empíricas nos aspectos de investigação de análise de discurso e conteúdo, iremos aqui fazer um panorama rápido sobre os primórdios dessa teoria: De forma bastante sintética, pode-se situar o surgimento da chamada Análise do Discurso no fim dos anos 1960, em decorrência de insuficiências de uma análise de texto que se vinha praticando e que se pautava prioritariamente por uma visão conteudista, característica central das práticas de leitura que localizamos nos estudos em Análise de Conteúdo. De um lado, imperava nas ciências humanas e sociais um contexto marcadamente orientado pelos desenvolvimentos de uma dada psicologia social em sua versão behaviorista – perspectiva desenvolvida nos Estados Unidos a partir da primeira metade do século XX (ROCHA, 2005, 307); No Brasil, a inspiração nos estudos sobre análise de discurso de linha francesa que remetem aos ideais de Michel Pêcheux tem muita representatividade através das pesquisas de ORLANDI no Labeurb, vejamos: Nos estudos e pesquisas realizados nesse Laboratório, introduzimos uma nova área de conhecimento que chamamos Saber Urbano e Linguagem. Esta área de conhecimento, por sua vez, se faz através da metodologia discursiva que analisa os movimentos políticos, sociais e econômicos; o planejamento, a administração e a organização do espaço urbano pelo Estado; as práticas de memória, a cultura e a arte; a linguagem urbana e a escrita; a mídia e a computação assim como as relações do dia-a-dia. É esta forma de conhecimento -Saber Urbano e Linguagem - sustentada pela análise de discurso, que dá a especificidade dos estudos e pesquisas que desenvolvemos em nosso Laboratório.7 Essa aproximação entre o saber urbano e a linguagem que Orlandi pesquisa, associadas a análise de discurso é bastante adequado para nossa proposta de análise, pelo fato de que o rap provém dos espaços urbanos segregados. Para Orlandi (2006), a análise de discurso tal como a conhecemos no Brasil, parte da perspectiva que trabalha o sujeito, a história, a língua. Dai dizemos que na análise de discurso não podemos deixar de relacionar o discurso com as suas condições de produção, sua exterioridade. E são exatamente estes desdobramentos dos entremeios da teoria da análise de discurso que irão revelar a importância das conexões estabelecidas entre Língua e fala, língua e discurso. Segundo Saussure a língua é o sistema onde tudo se mantém. É social, é constituída de constantes. De seu lado, a fala é ocasional, histórica, é individual e constituída de variáveis. ������������������������������������������������������������ 7 Fonte: http://www.labeurb.unicamp.br/portal/pages/home/index.lab 38� � Ao separar língua e fala, separa-se ao mesmo tempo o que é social e o que é histórico. (ORLANDI, 2006, p. 14). Assim como já nos referimos anteriormente, irão aparecer basicamente 3 quest~ees no sobre as letras analisadas: o caráter estético, ideológico e geográfico. Não existe uma fórmula pronta para se fazer análise de discurso ou conteúdo, mas podemos apontar algumas situações que são comum de uma forma geral, segundo Orlandi: Na realidade todo sujeito interpreta a partir de um dispositivo ideológico que o faz interpretar de uma maneira e não de outra. Pelo processo de identificação, como sabemos, o sujeito se inscreve em uma formação discursiva para que suas palavras tenham sentido. E isto lhe aparece como natural, como o sentido lá, transparente. Ele não conhece o movimento de interpretação, ao contrário, ele se reconhece nele. Ele não reconhece nos sentidos que produz. É no entanto, a possibilidade de contemplar o movimento de interpretação, de compreende-lo, que caracteriza a posição de analista. A própria definição do que é “Discurso”, proposta por M. Pêcheux (1969), vai dizer que “o discurso mais do que transmissão de informação (mensagem) é efeito de sentido entre seus locutores”. (ORLANDI, 2006, p.14). Nesta situação, podemos pensar na questão do sistema clássico de comunicação: emissor, canal e receptor de informação. Isso faz sentido se pensarmos que, da perspectiva da área Saber Urbano e linguagem, trata-se de uma abordagem discursiva de um espaço particular (a cidade) para compreender o social, o que coloca a linguagem (o discurso) para compreender o espaço (urbano) e a sociedade (urbana). (RODRIGUEZ-ALCALÁ, 2003, p. 68). O primeiro passo concreto para se trabalhar com a análise de discurso é elaborar o corpos teórico que vai delimitar a análise, podendo ser esse corpus homogêneo ou heterogêneo pode-se trabalhar com diversas camadas. Vianna (2008) quando analisou a produção artística do grupo “Racionais Mc’s”, nos apontou resultados de um corpos homogêneo, mas aqui em nossa pesquisa cabe a diversidade de informações, optaremos então por analisarmos diversos grupos, sendo assim nosso corpus é heterogêneo. Sabemos que a unidade de análise de discurso é o “texto”, tomaremos como nossa referência textual, as “letras de rap” que foram escolhidas para montarmos o “corpus teórico” de nossa pesquisa. Esse “corpus teórico”, pode ser homogêneo ou heterogêneo, neste caso, partindo do princípio que são diversas letras de rap, que foram produzidas com condições de produções completamente diferentes, tanto ideologicamente quanto geograficamente, podemos considerar que nosso “corpus teórico” é heterogêneo. 39� � Basicamente quando o corpus teórico é analisado iremos pontuar os seguintes aspectos: a) O que mais se repete com frequência, que aqui chamaremos de “regularidades”; b) O que é sublimado através da ideologia dos interlocutores, que aqui chamaremos de “não ditos” ou “apagamentos” do discurso. c) Um aspecto bastante relevante em análise de discurso também são as “marcas textuais”, daquele determinado grupo que está se comunicando. No próximo item do capítulo 2.3 iremos dar inicio a análise do corpus teórico, mas antes disso chamo a atenção aqui para outro aspecto. Iremos analisar como partitura de nosso trabalho as músicas, mas é bastante interessante perceber que além da prática discursiva das letras os rappers e as pessoas ligadas ao movimento hip hop estão “inscritas” também num outro discurso que é quase velado, mas bastante notório para quem é do movimento. As vestimentas, roupas, acessórios já carregam uma carga discursiva bastante forte, podemos fazer análise de discurso de elementos que fogem da questão escrita, existem também outras materialidades, veremos isso a seguir, quando relataremos como foi efetivamente a expansão do hip hop de São Paulo pro resto do Brasil. 40� � 2.3 Da metrópole para a tribo indígena: As minorias sendo representadas nas letras de rap denunciando o processo de Segregação Sócio Espacial. Calçada pra favela, avenida pra carro, céu pra avião, e pro morro descaso. Cientista social, Casas Bahia e tragédia, Gostam de favelado mais que Nutella Quanto mais ópio você vai querer? Uns preferem morrer ao ver o preto vencer Sucrilhos- Rapper Criolo Podemos atribuir a chegada do movimento hip hop no Brasil ao processo de “Difusão cultural”, entendendo que uma das características deste fenômeno globalizante é a movimentação de elementos culturais. A difusão cultural pode se dar por contato direto entre as pessoas ou por meios de comunicação como livros, jornais e revistas, rádio, cinema e atualmente Internet: Os inúmeros movimentos de transformação social, sejam eles radicais ou utópicos, que as últimas décadas viram surgir tiveram como principais articuladores os jovens. Isso se deve não apenas ao seu poder de mobilização, que não foi nada pequeno, mas principalmente, à natureza de ideias que colocaram em circulação, ao modo como as veicularam e ao espaço de intervenção crítica que abriram. Os jovens não foram apenas novos atores históricos que surgiram na cena do que já tumultuado debate político-cultural das últimas décadas. Com um novo discurso e uma nova prática social, eles possibilitaram o exercício mais sistemático de crítica social que, até então, nunca se vira ou ouvira.(BRANDÃO, 2004, p. 7) Durante o processo de elaboração desta pesquisa conversando informalmente com pessoas ligadas ao movimento hip hop tanto aqui no interior de São Paulo, quanto na própria capital, é muito corriqueiro elas falarem sobre a importância que um determinado filme norte americano chamado “Beat Street” teve no processo de assimilação da cultura norte americana aqui no Brasil, muitos até dizem que tal filme foi um grande modismo nos anos 80. 41� � Figura 11: Cartaz do filme beat street. Fonte:�http://www.clubecinema.com/filme.asp?filme=25998 Beat Street foi um ícone para o hip hop no Brasil, principalmente para os dançarinos, sendo que muitos chegavam a ir nas sessões de cinema num mesmo dia várias vezes para poder tentar imitar os passos de dança, que até então eram desconhecidos aqui no Brasil. A história do filme é bem despretenciosa, mas a forma que é contada é muito cativante. Durante a elaboração da dissertação assisti ao filme para ver qual era esse dinâmica que tanto impactou os brasileiros que estavam aderindo ao hip hop. A história de Beat Street é contada por dois irmãos negros que são muito cúmplices, ambos praticam todos os elementos do hip hop, dançam, graffitam e produziam músicas, mostra basicamente essa rotina das festas no bronx, e da chegada dos latinos imigrantes ilegais nos EUA. O filme mostra um tom de acolhida que os negros tinham em relação aos latinos, acontecia uma espécie de solidariedade entre essas duas minorias. Os Djs que iniciaram o movimento hip hop nos EUA, principalmente Africa Bambaata faz participações na película interpretando ele mesmo.e A respeito dessa interação sobre os negros e latinos pobres nas periferias dos Estados Unidos da América, Felix (2005, p. 59) nos diz que: O Hip Hop nos EUA é atualmente considerado uma prática de negros e latinos pobres, que se contrapõem, por meio do rap, ao jazz e ao blues, pois esses ritmos são muito apreciados pelos afro-norte-americanos de classe média, com o intuito de se ’distinguirem’ dos black poor. Neste sentido, podemos dizer que o Hip Hop tem uma origem e ligação étnicoracial e econômica. Trata-se, assim, de uma construção social que mistura origem social, econômica e também cultural e reelabora uma nova diferença. 42� � Com um olhar um pouco mais crítico podemos perceber que o filme Beat Street, foi a primeira tentativa global da “indústria cultural” capturar essa cultura de uma forma mercadológica. Posteriormente algumas multinacionais irão começar a produzir em séries agasalhos coloridos para os dançarinos de break também, principalmente a “adidas”. Do ponto de vista de mercantilização da cultura, através da massificação da mesa, Xavier (2005, p. 59) nos propõe algumas reflexões bastante adequadas sobre essa massificação da cultura: A cultura de massas como um vetor vertical e embuido da racionalidade instrumental incide sobre os lugares buscando homogeneizar e impor-se sobre a cultura popular, sendo indiferentes as heranças e realidades da sociedade e do lugar. Esse mercado que se cria a partir de elementos e símbolos globais são mais ou menos eficazes segundo os lugares e as sociedades, mas sempre incompleta por que há uma cultura que se constrói a partir das relações de proximidade, no lugar. Essa cultura pré-existente transforma-se em resistência à tentativa de homogeineização das culturas de massa. Logo essa mercantilização da cultura hip hop no Brasil começou tomar uma forma ascendente, no centro de São Paulo em alguns lugares como a Galeria 24 de maio, que começaram a se especializar na estética Black, com várias situações de consumo sendo praticadas, como a venda de LP’s do gênero, além de moda especifica e também penteados afro em salões de beleza. Toda essa movimentação começou a atrair alguns dançarinos neste espaço que de forma simbólica começaram a ocupar esses espaços e já sofriam represálias por alguns comerciantes das redondezas: Como a maioria desses grupos se compunha de office-boys, as apresentações se davam normalmente no horário do almoço. Posteriormente, outros conjuntos começaram a se exibir em outros horários e após as suas performances .passava-se o chapéu., na tentativa de arrecadar algum recurso. A justificativa oficial era que essas apresentações se realizavam para angariar fundo para ajudar na sobrevivência daqueles artistas mambembes. Entretanto, alguns grupos confidenciavam que o dinheiro arrecadado seria aplicado, fundamentalmente, na compra de pilhas grandes para o .box. - um rádio enorme utilizado para as execuções das músicas que acompanhavam aquelas apresentações dançantes. A ocupação do calçadão da Rua 24 de Maio não foi tranqüila. Segundo Nelson Triunfo, depois de, aproximadamente, uns três meses de apresentações na esquina da loja Mesbla, eles começaram a perceber que todos os dias, no período da manhã, existia um cheiro de creolina. Este odor a cada dia foi se tornando cada vez mais constante e forte, o que incomodava demais suas performances. Para descobrir a origem daquele fenômeno, Nelson Triunfo decide passar a noite dormindo em um pequeno jardim suspenso, onde há uma escultura de arte moderna, no cruzamento da 43� � Rua Dom José Gaspar com a Rua 24 de Maio. Segundo ele, por volta das sete horas da manhã sai um funcionário da limpeza da loja Mesbla e começa a espalhar creolina nos locais em que ocorriam as exibições dos breakers. (FELIX, 2005, p. 59) de Antônio João Ribeiro, quando ocorreu a invasão paraguaia. Por este fato, a região Com uma trajetória significativa possuindo mais de 30 anos de existência, os elementos culturais do Movimento Hip-Hop, foram articulados também no Brasil, tomando proporções homéricas nas periferias das cidades. Foi se espalhando do centro para a periferia de São Paulo, e através deste fluxo a própria periferia começou a ocupar as centralidades da cidade de São Paulo para “ver o que estava acontecendo”, é bem neste momento que vai entrar em cena a importância do metrô, em específico a estação “São Bento”, que posteriormente iria acabar se transformando num ponto de encontro de rappers, e dançarinos, um marco espacial e simbólico do movimento hip hop na cidade de São Paulo. Todos os elementos do hip hop foram também apropriados, ganhando a essência do povo brasileiro através da produção do Rap nacional. As bandas de rap brasileiro, através de suas composições musicais fazem uma forte denúncia em relação a um dos maiores problemas de ordem social do Brasil: a segregação sócio-espacial. É, portanto, conveniente a periferia reivindicar o rap como seu legítimo ritmo musical, tendo em vista suas condições de produção, expressas na realidade que é contada em narrativas na forma de protesto. Mas esse gênero musical, que na maior parte das vezes é visto como uma provocação marginal de mau gosto tem muito a ensinar para as elites dominantes. Neste estudo foram bastante inspiradores e elucidativos os textos e as contribuições dos geógrafos SANTOS, (2011), CARRIL (2006) e XAVIER (2005), além dos textos de outras áreas que também puderam se inserir nesse diálogo e tiveram sua contribuição, sendo eles FELIX (2005), VIANNA (2008) e CEERT (2010). CARRIL (2006), procura conceber a presença da universalidade/particularidade nas relações sociais na metrópole que manifesta frações territoriais separadas como periferia, e estuda essa fração procurando compreender o todo, pois nenhum processo social pode ser analisado separadamente, uma vez que traduz o sentido das relações sociais. A autora propõe a analisar as representações atribuídas por moradores à periferia do Capão redondo, na cidade de São Paulo, que na ocasião é uma parcela bastante significativa no que se refere a “´periferia” na cidade de “São Paulo”. A hipótese de CARRIL (2006) é a de que, no processo da formação social e econômica brasileira, o fator etnorracial reaparece continuamente como reposição de fatores coloniais para alimentar a acumulação do capital. 44� � Neste sentido, um dos fundamentos teóricos sobre a cidade e o urbano é o entendimento de que o uso da cidade está circunscrito no espaço urbano por formas preexistentes às novas relações econômicas, que se instalam e impõem demandas espaciais modernas e, por isso, geram conflitos entre a apropriação e a propriedade. (CARRIL, 2006) As minorias se fazem presentes cada vez mais no mundo, e através dos movimentos com base na cultura reivindicam seus direitos, vejamos sob o ponto de vista de CARRIL, os principais apontamentos nessa questão: Os enfoques do corpo- gênero, etnia e sexualidade, são elementos importantes que os movimentos culturais trouxeram. São categorias pertencentes ao mesmo estatuto que a questão da classe social. Porém, a crítica com base na cultura concluiu que o marxismo não abrangia esses níveis de formulação alternativa, traduzindo-os como antagônicos. Assim os movimentos com base na cultura, entre os quais estão a mulher, do negro, dos homossexuais, apresenta-se como paradigma para a compreensão das sociedades modernas do período. Por sua vez, as temáticas culturais nascidas no seio de novas demandas que a sociedade apresenta se mostram reveladoras de um mundo em constante transformação, mais aberto a essas solicitações, menos conservador do que no passado. Por essa época, o debate põe em cheque as determinações econômicas que certos autores marxistas pressupunham para explicar o caráter das sociedades contemporâneas. (p.26) Neste sentido, as minorias enxergam alguma possibilidade de levar sua luta adiante de uma forma que envolva suas produções artísticas e suas inquietações, os quais virão a se tornar globalizadas, ecoando de formas diferentes por todo mundo. No Brasil a periferia não vai exatamente copiar ou plagiar as inquietações dos Rappers das periferias de Nova York nos EUA, e sim utilizar dessa estética do gueto americano para ter uma voz e abrir possibilidades de visibilidade aqui nas terras tupiniquins. O território, visto como unidade e diversidade, é uma questão central da história humana e de cada país e constitui o pano de fundo do estudo das diversas etapas do momento atual. (SANTOS, 2011, p.20). Para XAVIER (2005, p. 87), que também tem uma literatura bastante inspirada nas ideias de SANTOS (2000), o território onde acontecem as ações da periferia sob o ponto de vista de uma suposta racionalidade deste espaço, leva em conta o modelo econômico dominante e também as novas condições técnicas que estão sendo absorvidas pelos pobres no suposto “período popular da história”: 45� � A periferia é um lugar em que se aproximam e se associam saberes cotidianos, apreendidos na luta pela sobrevivência. É nesse cotidiano que se revelam as já muitas manifestações de insatisfação e desconforto com a realidade seletiva e com a rigidez das normas férreas, exclusivas da racionalidade econômica e política da globalização ora em curso. Há a produção de um fermento político, resultante da própria vida local que desafia as denifições e relações estabelecidas e propõe atitudes novas, com busca premente, as vezes ainda cega de representatividade, já que a economia, a política instituicionalizada não representam os interesses coletivos. Assim, no Brasil, o Rap “é uma música de pobre feita para pobre” (Happing Hood, 2005 apud Xavier). Apesar disso devemos considerar também a existência dos rappers Americanos que são descontextualizados do movimento hip hop e já sofreram influências do mercado e da mídia, neste casos os interesses “financeiros” desses músicos que servem a cultura de massa são completamente diferentes dos interesses dos rappers da “periferia” Brasileira.l Habitualmente afastadas da área central das cidades, as periferias acabam sendo estigmatizadas, devido a todos os problemas peculiares relacionados à violência e criminalidade, num processo de exclusão cíclico. Como uma amostra inicial vejamos o trecho da letra da música “Sucrilhos” do Rapper Criolo, que é um maiores fenômenos atuais do rap brasileiro: Calçada pra favela, avenida pra carro céu pra avião, e pro morro descaso. Cientista social, Casas Bahia e tragédia, Gostam de favelado mais que Nutella Quanto mais ópio você vai querer? Uns preferem morrer ao ver o preto vencer Existe uma íntima relação entre o hip hop e o lugar onde ele se desenvolve, o que permite dizer que ele é uma produção política e cultural dos guetos, das periferias e das favelas (SOUZA, 2004, p. 101). Santos (1993, p. 115) é um dos autores que melhor ponto de vista crítico sobre o processo de globalização, é muito precisa também suas idéias no que se refere sobre a própria perifeira também, vejamos: Morar na periferia é se condenar duas vezes a pobreza. À pobreza gerada pelo modelo econômico, segmentador do mercado de trabalho e das classes sociais, superpõe-se a pobreza 46� � Gerada pelo modelo territorial. Este afinal, determina quem deve ser mais ou menos pobre somente por morar neste ou naquele lugar. Onde os bens sociais existem apenas na forma mercantil, reduz-se o número dos que potencialmente lhes têm acesso, os quais se tornam ainda mais pobres por terem de pagar o que, em condições democráticas normais, teria de lhe ser entregue gratuitamente pelo poder público. E assim, como existe no espaço geográfico uma imensa diversidade de paisagens e lugares, também é considerável que existam uma gama de estilos sonoros dentro do próprio gênero musical do RAP. Nota-se que não existe uma única unidade, e sim um mosaico expressivo de histórias para contar sobre diversos assuntos, vejamos a tabela a seguir: Tabela 1: Os diferentes estilos que perfazem o gênero RAP ESTILOS CARACTERÍSTICA Estilo Cronista São rimadores que geralmente descrevem os fatos e acontecimentos em suas músicas no mais original estilo repórter policial. Estilo Intelectual São Rappers que costumam usar palavras consideradas difíceis com temas profundos e de difícil assimilação popular. Estilo Romântico Rimas que falam de amores perdidos e casos amorosos. Estilo Livre São músicas e rimas despreocupadas com grande ênfase em coisas futurísticas. Geralmente o assunto não tem compromissos com os problemas sociais e vão de filmes a super – heróis. Estilo Rua São Rappers que tem influências nos elementos da cultura Hip-Hop. Estilo Raga São as rimas com levadas meio Raga, falando de mulheres e festas. Estilo Radical (Gangstas) São músicas consideradas de estilo Gangstas, que falam das histórias do bairro e seus conflitos. Estilo Festa Músicas que falam de baladas, sexo, mulheres, roles e festas em geral. Estilo Gospel Músicas com rimas que falam de paz, esperança, evangelho, e assuntos bíblicos em geral. Fonte: Disponível em http://www.realhiphop.com.br/. Acesso em: 23/01/2006. Em nossa pesquisa selecionamos 10 grupos de rap, que apresentam um repertório enorme de composições, e que são a grande sensação da juventude brasileira no cenário musical do Rap, desde o primeiro grupo que representa a maior vanguarda nacional do Rap “Racionais Mc’s”(figura 12), até outros menos conhecidos, mas que possuem letras bastante instigantes para nossa investigação. 47� � Figura12: Grupo Racionais Mc’s. Fonte: http://dicasdacapital.com.br/veja-tambem/6813/racionais-mc-s-em-brasilia/ Mas o que nos interessa para essa pesquisa em específico são as letras que podem gerar alguma reflexão no ambito da produção desigual do espaço. Sendo assim para podermos delimitar essa imensa produção musical, optamos por utilizar apenas as letras que se enquadram no estilo Gangsta Rap, as quais foram analisadas. Na tabela no. 2 podemos ver a lista dos grupos que foram selecionados para contribuírem com nossa pesquisa: Tabela 2: Título Corpus Teórico Analisado: As Bandas de Rap Tabela 2: Corpus teórico analisado Rapper ou Grupo de Rap Letras Pesquisadas Letras Analisadas Racionais MC’s 116 5 Z’africa Brasil 11 1 Criolo 10 5 Emicida 107 5 Projota 83 5 Brô MC´s 5 4 Opanijé 5 2 Rapadura Xique-Chico 8 1 Sub louco Coletividade 1 1 Faces da Morte 51 2 Total: 10 grupos Total de letras: 397 letras Total: 31 48� � Os rappers da atualidade no Brasil utilizam da mesma estratégia das narrativas orais, fazendo um paralelo entre a tradição oral dos griots africanos, e os atuais manos da periferia. Sousa (2009, p.18-19), nos traz algumas reflexões interessantes sobre esse ponto de vista, vejamos: Os rappers representam, então, uma continuidade da tradição da oralidade que permeou as relações culturais de seus ancestrais na África Ocidental. Por isso, são apresentados por vezes como uma espécie de griots modernos. Essa mesma tradição, isto é, o grito seria mais tarde um dos principais elementos aglutinador dos negros nas Américas. Argumenta-se, pois, que essa tradição oral teria logrado continuidade na diáspora e marcado a experiência cultural dos afro-americanos não apenas nos EUA, mas em diferentes regiões, como o Brasil e o Caribe. Daí os traços de semelhanças entre a tradição da oralidade africana com muitas manifestações da cultura negra norte americana como, por exemplo, os storyteller (contador de história) e os prayer (pastores negros), no Brasil essa tradição estaria mais comumente associada aos repentes do nordeste. (SOUSA, 2009, p.18-19)) Uma regularidade presente na maior parte das letras, são as denúncias referentes aos processos de segregação sócio-espacial e etnorracial. A segregação sócio-espacial é um fenômeno típico do meio urbano, ela consiste numa separação social e espacial conforme determinados níveis de renda, e conseqüentemente seus agrupamentos relativos. Atualmente as principais áreas de concentração humana são os espaços urbanos, que acabam reproduzindo em seus espaços todas as relações sociais contraditórias. Iremos começar nossas apontamentos de análise do corpus teórico selecionado, mas antes é preciso pensarmos aqui um pouco sobre o “valor testemunhal dos raps”. Para compreensão dos raps como relato ou testemunho de uma realidade particular vivida pelo jovem afro-descendente brasileiro, ou indígena, habitante de grandes centros urbanos como é o caso de São Paulo, ou uma aldeia indígena, cabe uma breve discussão sobre a conceituação proposta pela literatura de testemunho, na tentativa de estabelecer alguns liames entre esse gênero e os raps. (VIANNA, 2008) A classificação de literatura de testemunho, de certa maneira, induz o leitor a buscar por um texto autobiográfico, construído a partir de relatos da verdade. Nesse caso, colocar-se ia em foco, entre outras coisas, o que é verdade no cerne desse tipo de texto, muitas vezes, mediado pela intervenção de um gestor ou relator, ou ainda, como formula Benjamim (1994), de um narrador que marca aquilo que conta. (idem). 49� � Através das letras selecionadas dos grupos: Racionais Mc’s, Z’africa Brasil, Criolo, Emicida, Projota, Sub louco coletividade, Rapadura Xique Chico, Opanijé, Faces da Morte e Brô Mc’s (figura 12), iremos ver como acontece esse processo de análise . Figura 13: Grupo de Rap Indígena “Brô MC’s” Fonte:�https://www.facebook.com/bromc.rapindigena 50� � 1)São Paulo: eterna contradição: Racinais Mcs, Criolo, Projota, Emicida e Z’africa Brasil São Paulo (figura ) maior cidade do Brasil, atualmente com uma população de 11.253.503 habitantes segundo o IBGE. Certa vez o rapper Mano Brown disse numa entrevista na TV8 “Muita gente e pouco espaço é problema”. Figura 14: Localização da cidade de São Paulo Fonte: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?codmun=355030� Com uma população enorme, é o cartão postal econômico do Pais, cidade mais do que globalizada cultural e financeiramente. A cidade de São Paulo absorveu de uma forma muito rápida e dinâmica a cultura do movimento hip hop. Temos a qui o grupo de Rap que representa a vanguarda musical desse gênero: Racionais MC’s, como já dissemos anteriormente. Mas atualmente existem outros talentos. Se nos anos 80 e 90 a bola da vez foi a estação de metrô São Bento, agora nos anos 2000 surge uma outra geração, que participa ativamente todo sábado a noite a partir das 20h na Estação de Metrô Santa Cruz. A Estação de Metrô Santa Cruz atualmente faz tanto sucesso que é de lá que saíram os novos talentos do rap que foram muito rápido absorvidos pela industria cultural: Emicida e Projota. Além desses MC’s estão fazendo muito sucesso atualmente também um outro rapper que provém do bairro do Grajaú: Criolo, antes Criolo Doiodo, agora apenas Criolo. Não iremos analisar os grupos isoladamente e sim buscar algumas aproximações de acordo com as cidades de onde as letras foram escritas, analisaremos também os fragmentos ������������������������������������������������������������ 8 Entrevista concedida para a TV cultura. 51� � que nos interessam apenas pra essa discussão. A letra “Periferia é Periferia” de Racionais Mc’s, contempla bastante nossas inquietações, vejamos: Periferia é periferia. Periferia é periferia.(que horas são? Não precisa responder...) "Milhares de casas amontoadas" Periferia é periferia. "Vacilou, ficou pequeno. Pode acreditar" Periferia é periferia. "Em qualquer lugar. Gente pobre" Periferia é periferia. "Vários botecos abertos. Várias escolas vazias." Periferia é periferia. "E a maioria por aqui se parece comigo" Periferia é periferia. "Mães chorando. Irmãos se matando. Até quando?" Periferia é periferia. "Em qualquer lugar. É gente pobre." Periferia é periferia. "Aqui, meu irmão, é cada um por si" Periferia é periferia. "Molecada sem futuro eu já consigo ver" Periferia é periferia. "Aliados, drogados, então..." Periferia é periferia. "Deixe o crack de lado, escute o meu recado." Com uma regularidade exacerbada o nome “periferia” é repetida muitas vezes com a intenção de deixar claro que aquele lugar vivido é único, é peculiar somente para quem tem que passar por ele. A letra é tão descritiva a ponto de se tornar quase um guia turístico, um outdoor, uma propaganda sobre a periferia. Continuaremos com os Racionais Mcs, com outro fragmento que pode dialogar com o anterior “Um homem na estrada”: Até o IBGE passou aqui e nunca mais voltou. Numerou os barracos, fez uma pá de perguntas. Logo depois esqueceram, filhos da puta! Acharam uma mina morta e estuprada, deviam estar com muita raiva. "Mano, quanta paulada!". Estava irreconhecível, o rosto desfigurado. Deu meia noite e o corpo ainda estava lá, coberto com lençol, ressecado pelo sol, jogado. O IML estava só dez horas atrasado. Se anteriormente os autores estavam destacando o próprio espaço físico, com suas materialidades da periferia, agora aqui veremos um pouco mais do lado humano sofrido, da 52� � falha de algumas instituições, surge uma crítica na letra até ao próprio IBGE, IML isso é muito significativo. Aqui os rappers fazem uma denúncia ao próprio descaso que vem sofrendo. A violência é uma constante também, onde é narrado mortes violentas que acontecem nesse espaço. Falando um pouco agora sobre a nova geração de rappers, Criolo, Projota e Emicida, iremos encontrar algumas afinidades entre ambos. A música de Criolo “Não existe amor em SP”, se tornou um clássico desde então que foi escrita, já está para a periferia de São Paulo, como a letra “Sampa” de Caetano Veloso está para os intelectuais. Não existe amor em SP Um labirinto místico Onde os grafites gritam Não dá pra descrever Numa linda frase De um postal tão doce Cuidado com doce São Paulo é um buquê Buquês são flores mortas Num lindo arranjo Arranjo lindo feito pra você Em “Não existe amor em SP”, criolo faz uma descrição, que mesmo sendo apenas um recorte de alguns lugares, cita elementos do prórprio hip hop, como os grafites. Comparando a cidade a um “labirinto místico”, a ironia se faz presente com as “flores mortas”, e o próprio título da canção também. Emicida também nos traz um outro cartão postal da cidade em Rua Augusta: As maquiagem forte esconde os hematoma na alma. Fumando calma ela observa os faróis que vem e vão, viver em vão. Os que vem e não te tem são se necessário homem de bem fujão. Que não agüentou ser solitário. Mema grana que compra sexo, mata o amor. Traz a felicidade, também chama o rancor. As madruga que testemunho vermelho sangue na unha. Sem nome varias "alcunha" dentro da bolsa de punho. Garota propaganda da cidade fria em seus caminhos. 1 milhão de seres 1 milhão de seres sozinhos. Analisando esse fragmento de “Rua Augusta”, podemos ver que o rapper vai fazer uma descrição mais subjetiva do próprio paulistano que frequenta esse rua, essa região da cidade, fala de solidão de “hematomas na alma”. Essa percepção de estar numa multidão mas se sentir sozinho ao mesmo tempo é uma fala bastante em comum sobre São Paulo. 53� � Projota, também mais um rapper que teve uma carreira musical decolar depois das batalhas de rima da estação Santa Cruz, nos trás também algumas provocações mais nos aspectos da política brasileira: No país do mensalão, dim na cueca, no avião Quem tem menos paga imposto, quem tem mais sonega em vão Nega não, roubam nosso hectares, hectares do pré sal Não sei quem vai faturar mais com nossos mares. Pare e repare, bebem campari em paris, Everybody sofre mas cê tende a ver só seu nariz O safari que era calmo, virou selva Nos chama atenção para mensalão, pré-sal, e sonegação de impostos. Podemos ver aqui que o rap pode também começar a despertar o interesse da população para assuntos que também estão externos a ela, de forma indireta. Para finalizar, quase todas os rappers de São Paulo que selecionamos aqui também irão fazer uma retomada de sua memória ligada a ancestralidade afrodescendente: NEGRO DRAMA, Eu sei quem trama, E quem tá comigo, O trauma que eu carrego, Pra não ser mais um Preto Fudido, O drama da Cadeia e Favela, Tumulo, sangue, Sirene, choros e velas, Passageiro do Brasil Os Racionais em sua primeira fase musical, tinham como a negritude, aspecto que se dissolveu posteriormente na produção dos discos futuros. 2)A cidade de São Carlos e o Sub louco Coletividade A cidade de São Carlos (figura ) nasceu em terras da antiga Sesmaria do Pinhal, em virtude de uma via de penetração nos “sertões de Araraquara” .Atualmente é um significativo polo de pesquisas avançadas tendo algumas universidades importantes como a USP e UFSCAR além da EMBRAPA. 54� � Figura 15: Localização de são Carlos Fonte:�http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?codmun=354890 Com uma população de 221.950 habitantes, São Carlos é muito conhecida no estado de São Paulo devido sua influência nas pesquisas tecnológicas. Neste sentido é impactante a interpretação que esta banda de rap, o Sub louco Coletividade faz sobre a cidade vejamos: Na c