1 IGOR SCARPARI DE GIACOMO A CONSTITUIÇÃO DE MEIOS INOVADORES: UMA ANÁLISE DO PARQUE TECNOLÓGICO DE PIRACICABA-SP. Presidente Prudente (SP) 2021 2 IGOR SCARPARI DE GIACOMO A CONSTITUIÇÃO DE MEIOS INOVADORES: UMA ANÁLISE DO PARQUE TECNOLÓGICO DE PIRACICABA-SP. Trabalho de Graduação aprovado como pré- requisito para obtenção do título de Bacharel em Geografia, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus de Presidente Prudente Orientadora: Prof. Dra. Maria Terezinha Serafim Gomes Presidente Prudente (SP) 2021 G429c Giacomo, Igor Scarpari de A constituição de Meios Inovadores: : Uma análise do Parque Tecnológico de Piracicaba - SP / Igor Scarpari de Giacomo. -- Presidente Prudente, 2021 114 p. : il., tabs., fotos, mapas Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Geografia) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente Orientadora: Maria Terezinha Serafim Gomes 1. Inovação. 2. Território. 3. Parques Tecnológicos. 4. Piracicaba. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. 3 Em memória de meu avô, Irineu de Giacomo, Que me ensinou a levar a vida de maneira simples e alegre. 4 AGRADECIMENTOS Primeiramente devo agradecer a minha família e, em especial, ao meu pai Evandro e minha mãe Marcia. O apoio e incentivo de vocês durante toda minha vida e graduação foram a essência de tudo isso. Sou eternamente grato pelos valores que me passaram, pelos contrapontos que me fizeram e pelo carinho que me deram, sem vocês, nada disso teria sido concretizado. Agradeço enormemente à professora e orientadora Maria Terezinha, por todo suporte, atenção, disponibilidade e por toda paciência durante o longo dos últimos anos. Sua orientação foi a base para a vivência em um ambiente acadêmico e universitário. Agradeço a todos os meus mestres e professores com os quais tive o prazer de conviver e me relacionar, por meio das diversas horas em aulas acumuladas ao longo dos anos de graduação. A visão de mundo, o pensamento crítico e os olhares apaixonantes sobre a Geografia transmitido por cada um de vocês, de maneira subjetiva e heterogênea, foram fundamentais para minha formação como profissional e mais importante, como ser humano. Além de todos os professores que conheci durante a graduação, agradeço também aos bons professores que tive contato em minha trajetória, do ensino infantil ao médio. Todos desempenharam um papel transformante na minha vida. Agradeço por todas as amizades que fiz durante a graduação, por todas as conversas, das bobas às filosóficas, e por todos os momentos que vivi junto de vocês. Cada um sempre terá seu lugar especial em minha memória. Aqui deixo um agradecimento especial aos amigos: Breno Vasconcelos, Gabriel Carelli, Gustavo Lisboa, João Augusto, João Cortez, João Deangelo, Thainá Cavalleri, Tamires Aparecida, Tales Martinelli, Oliver Simonato, Pedro Henrique, Vitoria Dias e Vitor Camacho, por todas as conversas, conselhos e incentivos durante o decorrer deste ciclo. Também gostaria de agradecer aos colegas do grupo de pesquisa NUPERG (Núcleo de Pesquisas e Estudos Regionais), pela amizade, colaboração e pelas inúmeras trocas de ideias e percepções sobre a Geografia e visões de mundo. Agradeço a toda equipe que constitui o núcleo da FCT/UNESP, do corpo docente ao servidor técnico e administrativo, a presença de cada um de vocês é a chave para o funcionamento de uma faculdade pública, plural e de qualidade, mesmo diante das inúmeras dificuldades enfrentadas dia após dia. Por fim gostaria de agradecer a todos aqueles que contribuíram, direta ou indiretamente, com meu caminhar na cidade de Presidente Prudente e que aqui posso ter deixado de mencionar. Cada pessoa é um universo de sensações, experiências e perspectivas e, destes universos, que 5 exploremos aquilo o que há de melhor. Obrigado a todas e todos que fizeram parte desta trajetória! 6 “Seu lar ficou para trás agora. O mundo está à sua frente”. (Gandalf, O Hobbit de J.R.R Tolkien) 7 A CONSTITUIÇÃO DE MEIOS INOVADORES: UMA ANÁLISE DO PARQUE TECNOLÓGICO DE PIRACICABA-SP. RESUMO O processo de estruturação de Parques Tecnológicos no contexto brasileiro se inicia na década de 1980 enquanto resultado de uma série de programas, políticas e debates acerca do desenvolvimento nacional. Foi a partir da criação do Programa Brasileiro de Parques Tecnológicos pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que o cenário técnico-científico brasileiro toma suas primeiras proporções, visando modificar a realidade econômica do país na medida em que se promoviam avanços relacionados à inovação. Entretanto, frente às dificuldades de implementação da inovação e pelo baixo número de iniciativas inovadoras distribuídas sobre o território, não se obteve os resultados esperados. É, portanto, a partir dos anos 2000 durante o governo Lula, que novos projetos de parques tecnológicos surgem sob uma perspectiva amplamente estruturada, da qual se objetivou o desenvolvimento tecnológico, econômico e social das diferentes regiões que compõem o território nacional. A partir destas considerações, nos propusemos a compreender durante a pesquisa como se deu o processo de formação dos parques tecnológicos, dando ênfase ao município de Piracicaba/SP. Palavras-chave: Inovação, território, parques tecnológicos, Piracicaba. 8 THE CONSTITUTION OF INNOVATIVE MILIEUS: AN ANALYSIS OF THE TECHNOLOGY PARK IN PIRACICABA-SP. ABSTRACT The process of structuring Technology Parks in the brazilian context have begun in 1980s as result of a series of programs, policies, and debates around the national development. It is with the creation of the Brazilian Program of Technology Parks by the National Council of Scientific and Technological Development (CNPq), that the brazilian technical-scientific center takes its first proportions, aiming to modify the economic reality of the country as promoting advances to the innovation. However, in face of the difficulties at implementing the innovation and by the low number of innovative initiatives distributed over the territory, it did not have obtain the expected results. Therefore, during Lula government in 2000’s, new projects of technology parks have arisen from a broadly structured perspective, which the technological, economic and social development of different regions that compose the national territory were sign. From these considerations, we set this research with the objective of understanding the process of development and constitution of the technology parks, establishing emphasis at the municipality of Piracicaba/SP. Key Words: Innovation, territory, technology park, Piracicaba. 9 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – Localização do município de Piracicaba – SP................................................... 20 FIGURA 2 – Ciclos de Kondratiev – Ondas longas de prosperidade...................................... 27 FIGURA 3 – Artigos internacionais com o termo “innovation” no título (1956 – 2011) ....... 31 FIGURA 4 – Agentes da Inovação, Tunes (2015) .................................................................. 32 FIGURA 5 – Iniciativas de parques científicos e tecnológicos no Brasil................................ 45 FIGURA 6 – Iniciativas de parques tecnológicos no estado de São Paulo (2014) .................. 61 FIGURA 7 – Localização do município de Piracicaba – SP................................................... 63 FIGURA 8 – Engenho Central e Salto do Rio Piracicaba – 1939........................................... 68 FIGURA 9 – Usina Monte Alegre – 1939............................................................................... 68 FIGURA 10 – Modelo Piracicaba de Implementação Industrial, segundo Sampaio, 1976.... 71 FIGURA 11 – Localização dos Distritos Industriais, Parque Tecnológico e Parque Automotivo de Piracicaba – SP..................................................................................................................... 75 FIGURA 12 – Painel das empresas do município de Piracicaba- SP...................................... 76 FIGURA 13 – Perfil das empresas do município de Piracicaba- SP........................................ 77 FIGURA 14 – Reserva dos Jequitibás e o perímetro do Parque Tecnológico......................... 80 FIGURA 15 – Parque Tecnológico de Piracicaba e Empreendimentos ................................. 81 FIGURA 16 – Tramite do Processo de Análise para Ingresso ao PTP.................................... 89 FIGURA 17 – Parque Tecnológico de Piracicaba e suas múltiplas interações....................... 102 10 LISTA DE FOTOGRAFIAS FOTOGRAFIA 1 – Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba........................................ 82 FOTOGRAFIA 2 – Entrada do Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba....................... 83 FOTOGRAFIA 3 – Empresa instalada no Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba...... 83 FOTOGRAFIA 4 – Empresa instalada no Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba...... 84 FOTOGRAFIA 5 – Interior do Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba...................... 84 FOTOGRAFIA 6 – Área de Convivência do Parque Tecnológico de Piracicaba .................. 85 11 LISTA DE GRAFICOS GRÁFICO 1 – Total de iniciativas de Parques Tecnológicos no Brasil, em fase de implementação......................................................................................................................... 44 GRÁFICO 2 – Iniciativas de Parques Tecnológicos por Fase de Desenvolvimento e Região....................................................................................................................................... 46 GRÁFICO 3 – Número de Iniciativas de Parques Tecnológicos por Região ......................... 46 GRÁFICO 4 – Distribuição de Parques Tecnológicos por Região (em %)............................. 47 GRÁFICO 5 – Evolução na quantidade de iniciativas de Parques Tecnológicos no Brasil.... 50 GRÁFICO 6 – Evolução do número de empresas instaladas nos Parques Tecnológicos........ 51 GRÁFICO 7 – Número de empresas nos Parques Tecnológicos por Região.......................... 51 GRÁFICO 8 – Evolução no número de empregos gerados pelos Parques Tecnológicos ...... 52 GRÁFICO 9 – Distribuição do percentual de empregos nas empresas por Região................. 52 GRÁFICO 10 – Principais áreas de atuação dos Parques Tecnológicos no Brasil................. 53 GRÁFICO 11– Fontes de Financiamento por Fase de Desenvolvimento do Parque Tecnológico (em milhões de reais) ............................................................................................................... 54 GRÁFICO 12 – Distribuição das Fontes de recursos dos Parques Tecnológicos................... 55 GRÁFICO 13 – Piracicaba em valor adicionado ao PIB por setor de serviço (2002-2017) ... 72 GRÁFICO 14 – Piracicaba, estado de São Paulo e Brasil: participação (em %) da indústria no total do valor adicionado ao PIB (2002-2017) ......................................................................... 73 GRÁFICO 15 – Americana, Itu, Limeira, Piracicaba, Rio Claro e Sta. Bárbara do Oeste: valor adicionado pela Indústria, em milhões de reais (2002-2017) .................................................. 74 12 LISTA DE QUADROS QUADRO 1– Concepção de parque tecnológico para o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos – SPTec.............................................................................................................. 57 QUADRO 2 – Empresas e Instituições localizadas no Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba..................................................................................................................................97 13 LISTA DE TABELAS TABELA 1 – Indicadores socioeconômicos das regiões brasileiras – 2014............................ 49 TABELA 2 – Convênio estabelecido entre o Governo do Estado de São Paulo e parques Tecnológicos. Estado de São Paulo – 2014.............................................................................. 60 14 LISTA DE SIGLAS ACIPI - Associação Comercial e Industrial de Piracicaba ANPROTEC - Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores APLs - Arranjos Produtivos Locais APLA – Arranjo Produtivo Local do Álcool EBTS - Empresas de Base Tecnológica EEP – Escola de Engenharia de Piracicaba ESALQ – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz CDT/UnB - Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília CENA – Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo CIESP - Centro das Indústrias do Estado de São Paulo CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COPLACANA - Cooperativa dos Plantadores de Cana de Piracicaba COTIP – Colégio Técnico Industrial de Piracicaba CTC - Centro de Tecnologia Canavieira FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo FATEC - Faculdade de Tecnologia de São Paulo FUMEP - Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba GREMI - Groupe de Recherche Européen sur lês Milieux Innovateurs IASP - International Association of Science Parks IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICT - Instituições Científicas e Tecnológicas ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias IDHM - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal IFSP – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia São Paulo 15 MCTIC - Ministério de Ciência, Tecnologia, Comunicações e Inovações MTE - Ministério do Trabalho e Emprego P&D - Pesquisa e Desenvolvimento PIB - Produto Interno Bruto PITCE - Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior PNI - Programa Nacional de Apoio às Incubadoras de Empresas e aos Parques Tecnológicos PTP – Parque Tecnológico de Piracicaba RPCITec – Rede Paulista de Centros de Inovação Tecnológica RPNIT – Rede Paulista de Núcleos de Inovação Tecnológica SEADE – Sistema Estadual de Análise de Dados SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SEMDEC – Secretária Municipal de Desenvolvimento Econômico SIMESPI - Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas, de Material Elétrico, Eletrônico, Siderúrgicas, Fundições e Similares de Piracicaba e Região SPAI - Sistema Paulista de Ambientes de Inovação SPTec - Sistema Paulista de Parques Tecnológicos SSCI - Social Science Citation Index TI - Tecnologia da Informação UNESP - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" UNIESP - União Nacional das Instituições de Ensino Superior Privadas UNIMEP – Universidade Metodista de Piracicaba 16 SUMÁRIO A CONSTITUIÇÃO DE MEIOS INOVADORES: UMA ANÁLISE DO PARQUE TECNOLÓGICO DE PIRACICABA-SP. ................................................................................. 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 17 1- INOVAÇÃO, USO DO TERRITÓRIO E AS CONDIÇÕES GERAIS DE PRODUÇÃO .......................................................................................................................... 23 1.1 Sociedade do conhecimento e os ciclos da economia: considerações ............................... 23 1.2 O conceito de inovação ...................................................................................................... 27 1.3 O meio inovador, o uso do território para inovação e as condições gerais de produção ... 32 2- PARQUES TECNOLÓGICOS E O CONTEXTO BRASILEIRO ........................... 38 2.1 Parques Tecnológicos: breves considerações .................................................................... 38 2.2 Políticas Públicas e a formação dos Parques Tecnológicos no Brasil ............................... 41 2.3 Características Gerais: Empresas e empregos gerados; Áreas de atuação; Fontes e recursos .................................................................................................................................... 49 2.4 O Sistema Paulista de Parques Tecnológicos – SPTec ...................................................... 55 3- PARQUE TECNOLÓGICO DO MUNICÍPIO DE PIRACICABA – SP .................... 62 3.1 Piracicaba: um breve histórico e indicadores socioeconômicos ........................................ 62 3.1.1 Um breve histórico de Piracicaba ................................................................................... 63 3.1.2 Os indicadores socioeconômicos .................................................................................... 71 3.2 A formação do Parque Tecnológico “Engenheiro Agrônomo Emílio Bruno Germek” .... 79 3.3 Das características do PTP: Iniciativa, Estrutura, Incubadoras, Empresas e Ensino ......... 91 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 102 5. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 106 6. ANEXOS ........................................................................................................................... 110 17 INTRODUÇÃO O presente trabalho de conclusão de curso intitulado “A constituição de meios inovadores: Uma análise do Parque Tecnológico de Piracicaba - SP” propôs analisar o ambiente de inovação, o Parque Tecnológico, inaugurado no município de Piracicaba – SP no ano de 2012, considerando os aspectos econômicos, políticos e sociais, que contribuíram para formação deste ambiente específico. Inicialmente, faz-se imprescindível adentrar em questões que compreendem o uso do território no longo das últimas décadas, em que este passou a ser um dos condutores da inovação. Tal fato se assume diante de um cenário que é denominado de “Sociedade do Conhecimento”, no contexto do mundo globalizado. Castells (1999) definiu-a como: “[…] uma sociedade na qual as condições de geração de conhecimento e processamento de informação foram substancialmente alteradas por uma revolução tecnológica centrada no processamento de informação, na geração do conhecimento e nas tecnologias da informação” (CASTELLS, 1999, p.52). Segundo Vale (2009) o processo de globalização e a economia do conhecimento trazem novos desafios para o desenvolvimento das cidades e regiões, em virtude do surgimento de novas arquiteturas organizacionais e espaciais relativas às redes de conhecimento. Evidenciando-se assim, o surgimento de novos ambientes de inovação. É a partir de um contexto de aproximação entre inovação, território e sociedade que surgem novas respostas aos desafios trazidos por uma economia globalizada. Uma delas foi a criação de Parques Tecnológicos. De acordo com Spolidoro (1997, p. 22): Um Parque Tecnológico é uma iniciativa com base numa área física, com uma gleba ou um conjunto de prédios, destinada a receber empresas inovadoras ou intensivas em conhecimentos e de promover sua interação com instituições de ensino e pesquisa. A Associação Nacional de Entidades Promotoras de Tecnologias Avançadas (ANPROTEC, 2020), entende-se por Parque Tecnológico: [...] um complexo produtivo industrial e de serviços de base científico-tecnológica, planejado, de caráter formal, concentrado e cooperativo, que agrega empresas cuja produção se baseia em pesquisa tecnológica desenvolvida nos centros de P&D vinculados ao parque. Trata-se de um empreendimento promotor da cultura da inovação, da competitividade, do aumento da capacitação empresarial, fundamentado na transferência de conhecimento e tecnologia, com o objetivo de incrementar a produção de riqueza de uma região. Os parques tecnológicos originaram-se a partir da iniciativa “Stanford Industrial Park” 18 elaborada na Universidade de Stanford, na Califórnia, Estados Unidos. Que mais tarde se firmou como “Stanford Research Park”, também conhecido como Vale do Silício. O sucesso dessa iniciativa em 1950, serviu como um estímulo internacional de busca por ambientes de inovação e cooperação entre diferentes empresas, universidades e outros setores de produção técnico-científica (SPOLIDORIO; AUDY, 2008). Nesse sentido, a partir dos anos 1970 e influenciados pelo sucesso dos Estados Unidos, surgem várias iniciativas de parques tecnológicos na Europa, particularmente na Inglaterra (estabelecendo parcerias com as universidades Cambridge e Heriot-Watt) e na França na região de Sophia-Antipolis, tendo como objetivo promover o processo de integração entre universidade-empresa. Além dessas experiências, surgem outras na Ásia, como no Japão e Coreia do Sul, com a criação de technopolis (tecnópolos) com o objetivo de criar tecnologias e desenvolver regiões atrasadas do país (CASTELL e HALL, 1994; MELO, 2014). No Brasil, as primeiras iniciativas de parques tecnológicos surgiram na década de 80, com a criação de um Programa do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa) em 1984. Todavia, a partir dos anos 2000, é que eles passam a ganhar espaço com leis voltadas para o apoio a inovação e políticas de incentivos do governo federal (Governo Lula e Dilma), como a Lei Inovação (Lei 10.973/04); a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior – PITCE (Lei 11.020/04); o Programa Nacional de Apoio às Incubadoras de Empresas e aos Parques Tecnológicos (PNI), em 2009. Em 2011-2014, no Governo Dilma Rousseff o “Plano Brasil Maior” estimulou a inovação e produção nacional para aumentar a competitividade da indústria nos mercados interno e externo. Nesse período, ocorre uma aproximação entre a produção de inovação e o desenvolvimento de políticas públicas. Além dessas leis e políticas do governo federal, em 2006 o governo do Estado de São Paulo estabelece uma política de parques tecnológicos. Foi criado o Sistemas Paulista de Parques Tecnológicos (SPTec), com objetivo de fomentar, impulsionar e apoiar as iniciativas de Parques Tecnológicos no estado. Neste contexto, é notável que a partir dos anos 2000 a ideia de Parques Tecnológicos volta a ser fortalecida enquanto uma alternativa para promoção do desenvolvimento tecnológico, econômico e social. Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (2019), o Brasil possuía no ano de 2017, 103 iniciativas de parques tecnológicos, contando com 1.337 empresas e gerando um total de 38.365 empregos, principalmente concentrados na região centro-sul (sudeste e sul) do país. O parque tecnológico como infraestrutura inovativa vem demonstrando-se fundamental para o desenvolvimento do 19 território, atuando como um mecanismo gerador de produtos, de processos e de pesquisas. A partir das considerações apontadas, escolhemos como recorte territorial o Parque Tecnológico “Engenheiro Agrônomo Emilio Bruno Germek”, no município de Piracicaba, inaugurado em 21 de agosto de 2013. Buscamos compreender a formação do parque, bem como as condições preexistentes no município para constituição deste ambiente de inovação. O interesse pela temática surge em razão de Piracicaba firmar-se progressivamente enquanto uma região de elevada produção do conhecimento científico e industrial, tendo relativa importância no cenário nacional e que vem adquirindo destaque pelos avanços promovidos no setor sucroenergético, favorecido pela cultura canavieira, que atraiu empresas como a Hyundai, do setor automobilístico. O município de Piracicaba que está situado no estado de São Paulo, possui uma população estimada em 407.252 habitantes (IBGE, 2020), sendo o 17º mais populoso do estado (IBGE, 2010). Segundo o estudo “PIB dos Municípios Paulistas” desenvolvido pela Fundação SEADE (2017) o Produto Interno Bruto (PIB) do município era de R$ 21.896.871,50 em milhões de reais correntes, já o PIB per capita era 57.199,32 em mil reais correntes, no ano de 2017. No que se refere à distribuição do valor adicionado, o setor agropecuário representa 1.1%, o setor industrial representa 27,4% da participação total e, por fim, o setor de serviço representa 71,4% do total de atividades econômicas (Fundação SEADE, 2017). Quanto ao Índice de desenvolvimento humano (IDHM), correspondente a 0,785 (IBGE, 2010), sendo considerado alto. FIGURA 1: Localização do Município de Piracicaba - SP Fonte: Tese “Uso do território e agentes do setor sucroenergético. A relação entre a Coplacana e a empresa Raízen na organização da produção canavieira na região de Piracicaba – SP” (GADOTTI, 2019, p.58). 20 O município faz parte da Região Administrativa de Campinas e está localizado próximo às principais vias de transportes do estado de São Paulo, destacando-se que no decorrer das últimas décadas fora evidenciado uma nova dinâmica industrial nesta cidade. Este fato ocorre em virtude dos processos de desconcentração econômica e industrial da capital paulista, que possibilitou visibilidade para o desenvolvimento das cidades ao seu entorno. É, portanto, no âmbito da disputa por atração desses investimentos, que o poder municipal piracicabano se posicionou ao promover políticas de incentivos fiscais que dariam suporte e qualificação à mão de obra local, criando condições de atração para que empresas de capital internacional e nacional passassem a se organizar na cidade (EMERIQUE, 2014). Além disso, o município possui um arranjo produtivo local, o Arranjo Produtivo Local do Álcool (APLA), que atualmente administra as atividades realizadas no Núcleo do Parque Tecnológico de Piracicaba (PTP). Quanto ao número de empresas que estão integradas ao núcleo, referente à 14 empresas, propiciando além de geração de empregos, posicionamento para Piracicaba e sua região como polo de inovações tecnológicas ligadas ao setor sucroalcooleiro. Diante da soma dos aspectos que foram apresentados, nos propusemos a desvendar as seguintes problemáticas: Quais as condições preexistentes para constituição do Parque Tecnológico no município de Piracicaba? O que tem sido desenvolvido neste ambiente de inovação? Quais as vantagens para região de Piracicaba com a instalação do parque tecnológico? Nossa hipótese pressupõe que a instalação do Parque Tecnológico “Engenheiro Agrônomo Bruno Emílio Germek” é decorrente de uma série de condições preexistentes no contexto piracicabano, condições estas que geraram atratividade para aplicação de investimentos internos e externos, na produção do conhecimento no município de Piracicaba. De modo geral, é notório que parques tecnológicos se instalem em localidades que possuam aspectos estruturais e econômicos bem estabelecidos, dos quais servem de suporte para implantação de projetos deste porte. Também acreditamos que o parque vem contribuindo para o desenvolvimento econômico local e regional, na medida em que proporciona para Piracicaba e a região inovações tecnológicas voltadas ao setor sucroenergético, criando um ambiente que seja notavelmente cooperativo em parcerias entre o setor público, setor privado e instituições de ensino e pesquisa, característico do meio inovador. O objetivo geral desta pesquisa foi compreender a formação de meios inovadores, tendo como foco o Parque Tecnológico “Engenheiro Agrônomo Emílio Bruno Germek”, situado no 21 município de Piracicaba – SP. Quanto aos objetivos específicos: Analisar a formação e funcionamento do parque tecnológico de Piracicaba; Compreender o papel do parque tecnológico no processo de inovação e de desenvolvimento econômico para Piracicaba; Analisar as principais estruturas econômicas que caracterizaram e que se inserem neste meio inovador; E, por fim, compreender a sinergia, as relações estabelecidas entre o poder público, as empresas, os centros de pesquisa e outros agentes significantes que compõem este ambiente. Para responder as questões e atingir os objetivos propostos, realizamos uma revisão bibliográfica pautada nos seguintes conceitos: inovação, parques tecnológicos, território e condições gerais de produção. Além da bibliografia pautada em discutir as iniciativas de parques tecnológicos no contexto brasileiro, e do histórico de formação do município de Piracicaba. Também foi realizado um levantamento e análise dos indicadores socioeconômicos a partir de estudos do IBGE e Fundação SEADE, buscando compreender a importância do município para a região que está inserido. Na execução desta pesquisa, utilizaremos a bibliografia selecionada para organizar nosso arcabouço conceitual, tendo como base autores que trabalham os assuntos aqui retratados, tais como: Inovação: Aydalot (1986), Arbix (2010), Castells (1999, 2000), Oliveira (2014), Schumpeter (1982) Vale (2009), Melo (2014); Parques Tecnológicos: Anprotec (2008), Audy (2016), Medeiros (1997), Spolidorio (2008); Território: Santos (2002, 2004), Tunes (2015), Vale (2012) ; Condições gerais de produção: Lencioni (2007), entre outros. Com auxílio deste referencial buscaremos extrair elementos que nos façam compreender as características dos parques tecnológicos enquanto promotores de inovação, gerando embasamento para análise do parque tecnológico de Piracicaba – SP. Além disso, foi realizado pesquisas em sites como: Ministério da Ciência Tecnologia, Inovações e Comunicações; Prefeitura Municipal de Piracicaba; Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba (IHGP); Arranjo Produtivo Local do Álcool (APLA); Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Tecnológicos (ANPROTEC); Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação; Desenvolve SP; Fundação SEADE; IBGE, Data Sebrae, para obtenção de dados e informações que julgarmos pertinentes à pesquisa. Além de toda bibliografia levantada e dos sites visitados, também foi feita uma visita técnica ao Parque Tecnológico de Piracicaba (PTP), correspondendo ao trabalho de campo desta pesquisa. Também foi realizado entrevistas de roteiro semiestruturado, bem como a aplicação de questionários em órgãos públicos e privados, a fim de adquirir informações importantes à pesquisa. 22 O presente trabalho de conclusão de curso está estruturado além da introdução, em três capítulos, e sendo apresentado, por último, as considerações finais. No primeiro capítulo, intitulado “Inovação, uso do território e as condições gerais de produção” será brevemente abordado o processo suplantação da sociedade industrial para uma que se baseia no conhecimento. Juntamente disto, será analisado os conceitos de: Inovação, Meio Inovador, Território e Condições gerais de produção, consideradas aqui fundamentais na análise e compreensão dos Parques Tecnológicos. No segundo capítulo, intitulado “Parques Tecnológicos e o contexto brasileiro” será introduzido, primeiramente, conceituações acerca dos parques tecnológicos, bem como sua origem, suas características e suas reproduções mundo afora. Abordaremos, também, o processo de estruturação de parques tecnológicos no contexto brasileiro refletido à luz dos incentivos dados por meio das políticas públicas que geram apoio e incentivo à inovação do país. Posteriormente, realizando análise dos dados dos parques tecnológicos existentes em território nacional e sua distribuição por região, estabelecendo um recorte sob o Estado de São Paulo cujo concentra maior parte das inciativas e que recebe auxílio do SPTec (Sistema de Parques Tecnológicos), órgão gestor que serve de apoio aos parques tecnológicos do estado. No terceiro capítulo, intitulado “O parque tecnológico do município de Piracicaba - SP” será feita apresentação da cidade de Piracicaba, o foco de nossa pesquisa, abordando os fatores históricos que forneceram os alicerces necessários para sua formação e das suas características herdadas de um passado associado à cultura canavieira. Também será analisado quais foram as condições necessárias para que o município recebesse a implantação de um parque tecnológico, verificando os incentivos e concessões efetuados pelas esferas governamentais (municipal, estadual e federal). Por fim, realizando uma caracterização das empresas e instituições instaladas no parque tecnológico, buscando estabelecer o perfil dos agentes que integram este ambiente semelhante. Por fim, nas considerações finais apresentamos uma análise a partir dos conceitos que englobam a temática de parques tecnológicos, juntamente com a compreensão de como este se configurou no município de Piracicaba – SP. O presente trabalho de conclusão de curso fundamenta-se diante de uma graduação em bacharel de Geografia e tem como, por finalidade, propiciar a geração de debate em torno da ciência geográfica no que tange à temática proposta, aqui estando associada ao campo de estudo da Geografia Econômica e mais precisamente, Geografia e Inovação. 23 1- INOVAÇÃO, USO DO TERRITÓRIO E AS CONDIÇÕES GERAIS DE PRODUÇÃO Neste capítulo buscaremos fazer uma breve exposição acerca dos elementos que caracterizaram e firmaram base para suplantação de uma sociedade industrial para uma sociedade baseada no conhecimento. Além disso, a análise dos conceitos de inovação, meio inovador, território e condições gerais de produção, considerados aqui fundamentais na análise e compreensão dos Parques Tecnológicos. 1.1 Sociedade do conhecimento e os ciclos da economia: considerações Brevemente contextualizando o período ao qual nos referimos nesta pesquisa, inúmeros fatores podem ser elencados enquanto forças motrizes que propulsaram o surgimento de um contexto tão específico quanto ao dos Parques Tecnológicos. Deve-se deixar claro que sua origem reflete a segunda metade do século XX, período em que duas grandes guerras já haviam sido travadas e que na medida do tempo escancarou a realidade de um mundo dividido entre os países capitalistas liderados pelos Estados Unidos e, os países socialistas, pela União Soviética. Esse período da história denominado de “era dos extremos” (como fora intitulada em um dos livros escritos por Eric Hobsbawn) durou cerca de 45 anos, com seu fim marcado pela dissolução da União Soviética em 1991, contrastando ideologias, economias e culturas bastante distintas. Sob o cenário de um mundo polarizado, conflitos entre as superpotências passaram a ser indiretamente travados: Guerra da Coreia, Guerra do Vietnã e Guerra do Afeganistão. Dentre outros que exibem a instabilidade nas relações diplomáticas dos dois países e de seus respectivos parceiros. Com isso, a origem de uma corrida armamentista e espacial se manifestava, os países despendiam investimentos bilionários no desenvolvimento de novas tecnologias, associadas à guerra ou não. A economia de guerra proporciona abrigos confortáveis para dezenas de milhares de burocratas com e sem uniforme militar que vão para o escritório todo dia construir armas nucelares ou planejar uma guerra nuclear; milhões de trabalhadores cujo emprego depende do sistema de terrorismo nuclear; cientistas e engenheiros contratados para buscar aquela “inovação tecnológica” final que pode oferecer segurança total; fornecedores que não querem abrir mão de lucros fáceis; intelectuais guerreiros que vendem ameaças e bendizem guerras (BARNET, 1981, p.97). Inegavelmente, contudo, foram diversos os avanços científicos e tecnológicos desse momento na história, desde avanços no setor bélico à invenção dos sistemas satélites, das redes de comunicação via internet, do lançamento da Apollo 11 resultando na chegada do homem à 24 lua, entre outras conquistas que proporcionaram os grandes saltos da humanidade. A capacidade do país em inovar tornou-se, portanto, o motor que propulsiona à hegemonia exercida pelas superpotências, sendo esta uma tendência que se alastrou mundialmente e que perpetua até hoje na sociedade, mesmo que distribuído de forma espacialmente desigual. Tendo isso em vista, por conta das profundas transformações que decorrem sobre o longo do século XX - momento ao qual se instituiu a chamada “Sociedade do Conhecimento” - passou a verificar-se a aceleração no fluxo de mercadorias e de capital no contexto macroeconômico mundial, concebendo uma nova tendência para a reprodução econômica, na qual incentiva maior competitividade de mercados e exige busca por reestruturação e por aperfeiçoamento de seus sistemas produtivos (TUNES, 2015). Este processo vai se estabelecer através das inovações tecnológicas e também pela facilidade ao acesso à informação que se deu nesse momento, capacitando intensificação de estudos em Pesquisa & Desenvolvimento e tendo como por finalidade ampliar o avanço científico e tecnológico, concernente ao cenário da inovação. Novamente destacando a definição de Manuel Castells (1999) sobre a “Sociedade do Conhecimento”, compreendeu-a como “[…] uma sociedade na qual as condições de geração de conhecimento e processamento de informação foram substancialmente alteradas por uma revolução tecnológica centrada no processamento de informação, na geração do conhecimento e nas tecnologias da informação” (CASTELLS, 1999, p.52). Ainda segundo ele, afirma-se contundentemente, que o conhecimento esteve presente em todos os modos de desenvolvimento, desde o desenvolvimento que fora essencialmente agrário para o industrial, sendo a sociedade informacional diferente das demais “[...] é a ação de conhecimentos sobre os próprios conhecimentos como principal fonte de produtividade” (CASTELLS, 1999, p. 53-54). Uma concepção semelhante está presente no artigo de Sandra Lencioni, qual é destacada a questão da produção do conhecimento como central e diferencial na análise da sociedade atual. [...] o significado da palavra conhecimento assume um sentido específico. Não expressa, em si, cognição e sabedoria, dentre outros sinônimos que poderíamos arrolar. O significado da palavra conhecimento no termo “sociedade do conhecimento” se investe da acepção de que o conhecimento se constitui na principal força de produção dessa sociedade. Significa que o conhecimento se distância da ideia de constituição de espírito humano e se torna uma força produtiva (LENCIONI, p. 02, 2015b). Buscando compreender como se deu o contexto de suplantação de uma sociedade antes industrial para uma sociedade pautada no conhecimento e na informação, é essencial destacar 25 algumas características relativas deste momento que é característico na história do sistema capitalista, o de reestruturação produtiva. Tendo em nosso entendimento que a economia mundial é dinâmica e mutável, buscando readaptar-se diante dos avanços da sociedade e sendo direcionada para novas oportunidades de mercado, fica notável que houve, em nossa história, diferentes “ciclos” de produção. Podemos, por exemplo, retomar às manufaturas das guildas e corporações de ofícios durante a Idade Média na Europa, dessemelhando-se da economia que imperava sob a época, de caráter feudal e superlativamente exploratório. Entre outras transições que reiteram o princípio do acúmulo de riquezas e que evoluíram perante as mudanças do mundo e da sociedade. O momento ao qual nos interessa, entretanto, decorrem das mudanças já arquitetadas num contexto industrializado, refletido posterior às primeiras revoluções na Europa. Segundo a perspectiva do economista russo Nikolai Kondratiev, o conjunto de mudanças que operam sob as estruturas econômicas às tendências de consumo da sociedade, decorreriam em períodos cíclicos de aproximadamente 50 e 60 anos, conhecidos como “ondas longas” de desenvolvimento econômico. Sendo apontado pelo economista como causas para duração do ciclo, a morosidade e a complexidade das transformações derivadas da substituição de tecnologias na economia. Tem por assim, desde a introdução da máquina a vapor até a atualidade, efeito em diversas inovações tecnológicas que permitiram a obtenção de elevados ganhos de produtividade e de aumento do volume de produção no percorrer destes ciclos (VALE, 2012, p. 16). O primeiro dos ciclos citados por Kondratiev decorre nos anos de 1770 a 1840, baseando-se nas tecnologias da máquina a vapor e na energia hidráulica, sendo os principais inputs da primeira fase da Revolução Industrial: o algodão, o carvão e o ferro. A indústria de algodão afirmar-se como o principal ramo da economia britânica e constitui a base para formação das primeiras regiões industriais no mundo (Lancashire e Manchester). Já o segundo ciclo de industrialização a economia baseia-se no carvão, ferro e aço, na construção naval e especialmente, no caminho do ferro, perdurando os anos de 1840 a 1890. Neste ciclo, Liverpool, Manchester e Glasgow conduziram enquanto principais centros inovadores da economia capitalista. Entre os anos de 1880 e 1920, seguindo a tendência da sucessão de ciclos, fora culminado no desenvolvimento do motor de combustão interna, na eletricidade e na química pesada. As economias norte-americana e alemãs sendo as pioneiras deste ciclo, com destaque para as cidades de Estugarda, Nova Iorque, Pittsburgh, desclassificando da Grã-Bretanha o título de líder mundial. O quarto ciclo é correspondente ao período do pós-guerra, com término 26 nos anos 1970, sendo suas principais industriais inovadoras: a petroquímica, automobilística, aeroespacial e eletrônica. Neste período os Estados Unidos assumiram a liderança na economia mundial ao que se chamou de fordismo, assente na produção e visando o consumo de massa (Vale, 1999). As cidades que exerciam protagonismo eram Detroit, Los Angeles e Seattle. E por último, sob domínio norte-americano, o quinto ciclo teve seu início nos finais dos anos 1970, sendo caracterizado pela expansão das tecnologias de informação e comunicação (S. Francisco e Bay Area da Califórnia) e das biotecnologias (Boston e Massachusetts). FIGURA 2 – Ciclos de Kondratiev – Ondas longas de prosperidade Fonte: Allianz Global Investors (2010, p. 06). Segundo Vale (2012), foi em virtude da crise econômica dos anos setenta qual exibiu as evidências de abrandamento ou mesmo divergência regional, que a teoria de crescimento econômico neoclássica foi sendo abandonada em favor de orientações teóricas que privilegiam estudo de mudanças estruturais e a sua explicação de transição do sistema capitalista, com foco na sua influência para desenvolvimento econômico regional e local (DUNFORD, 1996). O foco destinou-se para o estudo de condições tecnológicas, sociais e institucionais que permitam um conjunto de territórios manter ritmos de crescimento econômico elevados, certamente distintos, desde sistemas locais especializados em atividades tradicionais (Terceira Itália), aglomeração de atividades high tech (Vale do Silício) ou mesmo centros financeiros (City de Londres) (PIKE et al., 2006). O ressurgimento destas regiões está associado a processos dinâmicos da inovação, tendo esta ganhado protagonismo nas teorias e políticas de desenvolvimento regional e local 27 (STORPER, 1995 e 1997; SCOTT, 1998). Diversos autores passaram a considerar, portanto, o processo de desindustrialização das economias ocidentais como uma parte inexorável da mudança para a economia centrada no conhecimento. Ao início dos anos 1970, Bell (1972) já anunciava o fim das sociedades industriais típicas do capitalismo do século XX e a irreversibilidade da emergência da ciência e da tecnologia na sociedade do conhecimento. A economia passa a depender menos do trabalho e do capital e mais do conhecimento, este assumindo-se enquanto principal recurso e a aprendizagem como principal processo (BOEKEMA et al., 2000). Resumidamente, a inovação contínua apresentar-se como indispensável para geração de competitividade nas empresas que compõem um cenário de economia do conhecimento (VALE, 1999). Como é colocado por Etzkowitz e Zhou, na medida que a sociedade industrial é suplantada por uma era que é baseada no conhecimento, o conhecimento avançado passa a ser cada vez mais expeditamente traduzido em seus usos práticos, isso devido à sua natureza polivalente, sendo esta simultaneamente teórico e prática. Desta forma, processos de transferência de tecnologia que outrora levavam gerações para ocorrer agora transcorrem ao longo da vida profissional de seus inventores, o que lhes dá a possibilidade de participarem tanto no processo de inovação como no de pesquisa (ETZKOWITZ; ZHOU, 2017). 1.2 O conceito de inovação Diante dos aspectos que foram apresentados, a inovação passa exercer grande relevância ao que tange a dinâmica produtiva de uma sociedade, servindo como princípio motivador para produção do conhecimento científico e tecnológico e se fazendo, portanto, essencial adentrar na discussão deste conceito que permeia o cenário econômico das últimas décadas. É importante ressaltar que a inovação não surge somente agora na história da sociedade. Trata-se de uma atividade que perdura toda nossa trajetória enquanto seres dinâmicos que idealizam, arquitetam e criam formas, objetos e métodos. “O renascimento das artes na Idade Média, as revoluções industriais nos séculos XVII e XIX, as revoluções científicas e tecnológicas do século XX e início do século XXI, dentre muitos outros exemplos que eximem o preceito de inventar e inovar para humanidade” (GOMES, 2019). Entretanto, o que se pode observar é que o apreço à inovação se tornou ainda mais evidente nos séculos XX e XXI, disposto de um cenário aprofundado pelas tecnologias de informação e comunicação. Sobre este aspecto Gomes (2019) pontua: Nas últimas décadas, o cenário mundial mudou com a velocidade das transformações, 28 em decorrência do aprofundamento do processo da globalização, da reestruturação produtiva e territorial, da aceleração dos fluxos (mercadorias, pessoas, capitais), dos avanços das tecnologias, da crescente financeirização da economia, da economia, da competitividade entre empresas. A inovação passou para ordem do dia (GOMES, 2019, p. 163). Quando falamos de inovação, é essencial destacar um dentre os primeiros e principais autores que discutem este conceito, já em meados do século XX. O economista austríaco Joseph Louis Schumpeter vai definir os catalisadores para geração do processo de inovação, em que este aparece associado com o princípio de evolução, como pode ser visualizado na citação abaixo: O impulso fundamental que põe e mantém em funcionamento a máquina capitalista procede dos novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização industrial criadas pela empresa capitalista. [Trata-se de um] processo de mutação industrial […] – que revoluciona incessantemente a estrutura econômica a partir de dentro, destruindo incessantemente o antigo e criando elementos novos. Este processo de destruição criadora é básico para se entender o capitalismo. É dele que se constitui o capitalismo e a ele deve se adaptar toda a empresa capitalista para sobreviver. (SCHUMPETER, 1994 [1961], p. 83). Desta forma, o autor define a inovação a partir de cinco combinações, sendo: a) novos produtos, b) novos métodos de produção, c) novas fontes de matérias-primas, d) exploração de novos mercados, e e) novas formas de organizar as empresas (SCHUMPETER, 1982). Observa-se que na concepção de Schumpeter (1911) a origem do processo de inovação está na destruição de velhas práticas e atividades e na criação de novas tecnologias e produtos, transformando, portanto, a estrutura econômica como um todo. Este processo que é denominado pelo autor de “destruição criativa”, é posto como a essência do sistema capitalista, sendo passível de observação através das ondas longas de crescimento apontadas por Kondratiev (já citadas anteriormente), e sido posteriormente discutidas por Schumpeter à luz das inovações tecnológicas. Diante desta concepção o desenvolvimento não se produz de maneira uniforme, ao decorrer do tempo, mas através de ondas ou mesmo de surtos de inovação, estando associados à introdução de novos produtos, processos ou a criação de novos mercados. A inovação é assim compreendida enquanto força propulsora para o desenvolvimento econômico. A autora Rita de Melo (2014), nos proporciona ampla reflexão a respeito do conceito “Inovação”, definindo-o como “o surgimento do novo”, podendo revelar, naquele momento, características inéditas até então. Contudo, a autora nos alerta quanto ao fato de que ineditismo e inovação não sejam sinônimos, mas que a originalidade presente nos dois revela esforços na busca do novo, de algo até então não exposto. 29 Melo (2014) ainda diz que, invenção e inovação também não são sinônimas, ela se baseia em Vale (2012), e relata que “invenção consiste numa primeira ideia para se criar um novo produto ou processo, enquanto inovação é a tentativa de concretização efetiva da ideia inicial” (MELO, 2014, p.31). Freeman (1982) também caracteriza invenção como sendo uma ideia, um esboço para um produto, processo ou sistema novo ou melhorado. Entretanto, as invenções não conduzem necessariamente as inovações. A inovação, para o economista, ocorre quando há a transação comercial envolvendo o novo produto, processo, sistema ou dispositivo. A respeito desse debate, Arbix (2010) explicita que ambas, inovação e invenção, se conectam por um continuum: Em áreas avançadas, invenções e inovações acontecem com tal frequência e velocidade que nem sempre é fácil distinguir uma da outra, como nos laboratórios de nano e biotecnologia. [...] na economia real a inovação se refere a uma primeira comercialização de uma ideia ou projeto; por isso mesmo, seu lócus privilegiado é a empresa, capaz de manter sintonia fina com a produção e a comercialização. A invenção, por sua vez, não tem o mesmo direcionamento. Realiza-se em outra esfera, ocorre em qualquer espaço – nos laboratórios, nas universidades, nos centros de pesquisa e nas firmas. (ARBIX, 2010, p. 169) O autor Glauco Arbix (2007) proporciona uma breve caracterização ao definir inovação como: “todos os processos capazes de transformar uma ideia em um produto ou processo com diferencial de mercado, seja na indústria, seja nos serviços, no comércio ou na agricultura” (ARBIX, 2007, p.29). É na mesma direção que Lencioni (2015, p.23) aponta que a ideia de novo pode estar relacionada a qualquer atividade, a qualquer bem ou a qualquer serviço tecnologicamente novo ou bastante aprimorado. Deste modo, “[...] a inovação pode se dar em relação a um produto ou a um processo” (LENCIONI, 2015, p.24). Compreende-se, portanto, que a inovação esta pautada na comercialização e produção do conhecimento e da pesquisa, considerando as potencialidades de uma ideia, criativa e inovadora, e direcionando-as de acordo com as tendências de mercado. Há uma vasta bibliografia que se dedica em discutir os processos de inovação, resultando em diferentes concepções de inovações ligadas especificamente às atividades econômicas, sendo aqui consideradas como “inovação de processo e/ou produto, inovação organizacional, inovação financeira”. É importante enfatizar que a inovação está estreitamente ligada a uma ideia de desenvolvimento que, por sua vez, passará estar associada a ideia de “modernidade”. Sendo esta concepção de “modernidade” geralmente relativa às formas particulares de organização 30 econômica e social baseadas em experiências europeias e norte-americanas. (WILLIS, 2011). A “modernidade” vai pressupor mudanças na economia, na sociedade, na cultura e na política, cujo é indispensável para o progresso tecnológico e para o desenvolvimento como um todo. Assim como observado por Vale (2009) é surpreendente que os estudos sobre a inovação só tenham recebido devida atenção muito tardiamente, por parte das comunidades acadêmicas do mundo ocidental. Tal fato pode ser evidenciado a partir da análise do gráfico abaixo, que se fundamenta a partir da base de dados da ISI Web Knowledge, Social, Sciences, Citation Index (SSCI): FIGURA 3 - Artigos internacionais com o termo “innovation” no título (1956- 2011) Fonte: ISI Web of Knowledge, Social Science Citation Index (SSCI). O papel que é tradicionalmente desempenhado pelas universidades e pela comunidade acadêmica, em geral, corresponde à um aspecto essencial para discutir a resolução dos processos de invenção. Quanto ao caso da inovação, está estreitamente vinculada, mas não exclusivamente, com o ramo empresarial que procuram colocar novos produtos nos mercados ou introduzir alterações em seus processos produtivos, formas de comercialização de bens ou de prestação de serviços (VALE, 2009). Nota-se, assim, a existência de uma forte relação que é estabelecida entre universidades e empresas para o desenvolvimento de atividades e tecnologias inovadoras, sendo estas desenvolvidas através do processo de transferência do conhecimento, que permite os agentes econômicos em cooperação de estudantes, espacializados numa empresa, possam sustentar dinâmicas de inovação. As universidades são, 31 portanto, agentes fundamentais para a geração do conhecimento, destacando-se sobretudo em setores que se baseiam na investigação científica, podendo beneficiar enormemente as economias regionais (GODDARD et al., 2012). Não só as universidades, mas o poder público em si deve estabelecer mútua cooperação com iniciativas privadas e inovadoras, dando-se por meio de investimentos na educação e na pesquisa, políticas de incentivo à inovação, concessões de áreas para empreendimentos, entre outras formas. Enquanto o capital privado propiciando investimentos em inovação, seja nas indústrias, serviços ou outros setores financeiros. A partir da Figura 4 poderemos visualizar uma relação de “complementariedade” praticada entre os diferentes agentes: FIGURA 4 – Agentes da Inovação de Tunes (2015) Fonte: Tunes, 2015, p. 29. Nesse sentido, novos desafios são trazidos para os países, regiões, localidades, empresas ou sociedades, devido ao aumento do conteúdo de conhecimento científico e tecnológico nos bens e serviços. A capacitação científica e tecnológica passa a referir-se como precondição para o sucesso produtivo e comercial (DINIZ, 2006). A este respeito Porter pontua: Uma nova teoria deve partir da premissa de que a competição é dinâmica e evolui.... Na competição real, o caráter essencial é a inovação e mudança... A vantagem competitiva é criada e mantida através de um processo altamente localizado. Diferenças nas estruturas econômicas, valores, culturas, instituições e histórias nacionais contribuem profundamente para o sucesso competitivo (PORTER, 1989, p. 35). Nessa perspectiva, o sucesso econômico de cada empresa depende da sua capacidade em especializar-se naquilo que consiga estabelecer vantagens comparativas efetivas e dinâmicas, decorrentes do seu estoque de atributos e de sua capacidade continua em inovar (DINIZ, 2006). 32 O panorama inovativo implica em significativas mudanças nas estruturas econômicas, sociais, políticas e até mesmo territoriais, das quais passam a se organizar sobre a perspectiva de lucratividade. O mercado busca as melhores formas para se organizar dentro das cidades, tendo em vista áreas com maiores taxas de rentabilidade, considerando os aspectos de segurança, público, transporte etc., desta mesma região. É sob este contexto que os processos de territorialização da inovação passam a firmar-se dentro dos grandes e médios centros urbanos (OLIVEIRA, 2014). Frente a essas particularidades, o processo de aprendizagem vai assumir o controle da sociedade, e por isto a chamada sociedade de economia ou sociedade do conhecimento (SPOLIDORIO, 1997). Desta forma, a vantagem que um país, região ou localidade adquire, estará relacionada com a sua capacidade de aprendizado e de inovação (PORTER, 1989). Encerrando a discussão acerca da inovação, Maillat (2002, p. 14) resumidamente nos proporciona uma breve definição a respeito deste conceito, sendo para ele: “um processo de integração de elementos que determinam e favorecem a dinâmica e transformação do processo do sistema territorial de produção”. E quanto ao meio inovador, definido como “organização territorial onde nascem os processos de inovação”. 1.3 O meio inovador, o uso do território para inovação e as condições gerais de produção À medida que estudamos a inovação e temos conta dos processos que são desembocados por ela, observa-se grande importância dos fatores de localização, em que esta assume papel determinante nas estruturas econômicas, que compõem o cenário de indústrias inovadoras e produtoras de conhecimento. Por meio disto, deriva-se um número considerável de concepções acerca de relações que se estabelecem entre o território e a inovação. Fala-se em meios inovadores, distritos industriais, sistemas regionais e nacionais de inovação, regiões inteligentes, novos espaços industriais, dentre outras nomenclaturas dos sistemas territoriais de inovação. Para Moulaert e Sekia (2003), o que vai se assemelhar nas diferentes concepções de sistemas territoriais de inovação será a passagem da noção de espação para a de território, partindo-se da abordagem da territorialização da produção inovadora em espaços aglomerados que podem ter sido espacialmente planejados para a instalação de empresas inovadores, sendo o caso dos parques tecnológicos e dos condomínios industriais, ou de espaços espontâneos que apresentam aglomerado empresarial, como ambientes urbanos inovadores. 33 No presente trabalho nos atentaremos a discutir, especificamente, a concepção de meios inovadores, esta que é proposta pelo economista francês Phillipe Aydalot. Aydalot (1986) introduz o conceito de meio inovador em meados dos anos 1980, sendo para ele através do meio inovador que surgem as inovações. O autor considerou o meio (caracterizado como o local de origem dos projetos inovadores) como um elemento propulsor no surgimento de inovações nas empresas, evidenciando as condições externas à empresa responsáveis pela adoção de inovações, e pelo surgimento de empresas (AYDALOT, 1986 apud MELO, 2014, p.43). Para o autor, a inovação possui ligação com o território, com características do lugar e, portanto, sua atenção recairá mais nas formas de emergência da inovação do que sobre a difusão do progresso técnico (AYDALOT, 1986 apud MELO, 2014, p.43). Desta forma, Aydalot considera que “[...] o desenvolvimento endógeno é fundamentalmente o resultado de uma sociedade inovadora. Em outros termos, a inovação é função do meio que a engendra e é o motor de seu desenvolvimento” (PEYRACHE-GADEAU, 2006, p.51). Além de Phillippe Ayadolot, outros autores desenvolveram conceituações acerca do meio inovador, são: Denis Maillat, Roberto Camagni e Michel Quévit. Para eles o meio inovador se constitui como: [...] um conjunto territorializado no qual as interações entre os agentes econômicos se desenvolvem por meio da aprendizagem que eles fazem das transações multilaterais geradoras de externalidades específicas à inovação e pela convergência dessas aprendizagens em formas cada vez mais eficientes na gestão conjunta dos recursos (MAILLAT, QUÉVIT, SENN, 1993, p.9). O ponto de partida para analisarmos os processos de inovação no cerne da Geografia centram-se, portanto, sobre as dinâmicas originadas no território, e não necessariamente da inovação em si. Aqui nos cabe compreender a produção de um território associado a atividade inovadora, aproximando-se dos estudos em torno de uma Geografia da Inovação: O desenvolvimento de uma Geografia da Inovação deve passar pelo debate que considere questões e temáticas nas quais o território adquire protagonismo, com uma participação ativa na forma com tem lugar e a produção e incorporação de inovações pelas indústrias. A Geografia da Inovação deve, assim, preocupar-se com os aspectos espaciais da inovação, as formas e os mecanismo utilizados pelas organizações no sentido da apropriação e valorização dos novos recursos chave (existentes ou criados), analisando e compreendendo a complexa rede de relações que se estabelece entre os diferentes actores e agentes, devendo ser consideradas diversas dimensões – territorial, econômica, social, institucional e política (GAMA, 2001, p.50). Tunes (2015) afirma que, a expressão territorialização refere-se à ação e processo de 34 constituição de um território. A autora ainda relata que essa ação resulta na formação de um território, o processo de territorialização, é determinada pela atuação das forças sociais que detém o poder sob aquela porção do espaço, dominando e apropriando-se dos recursos existentes nessa porção para a manutenção e (re) produção de sua hegemonia e poder. Nesse sentido, a discussão conceitual sobre o território perpassa, necessariamente, a uma questão do poder sobre essa porção do espaço. Nessa perspectiva, considera-se essencial trazer para a discussão de território uma noção baseada no tempo, da apropriação do espaço ao longo dos anos e dos processos originados por esta. Milton Santos (2002), a partir do conceito de rugosidades, nos proporciona ampla reflexão a respeito desse processo, numa linha que se aproxima de uma análise da dimensão territorial da inovação. Chamemos de rugosidade ao que fica do passado como forma, espaço construído, paisagem, o que resta do processo de supressão, acumulação, superposição, com que as coisas se substituem e acumulam em todos os lugares. (...). Ainda que sem tradução imediata, as rugosidades nos trazem os restos de divisões do trabalho já passadas (todas as escalas da divisão do trabalho), os restos dos tipos de capital utilizados e suas combinações técnicas sociais com o trabalho (SANTOS, 2002, p.140). Devemos, portanto, considerar as rugosidades, as velhas marcas que permanecem materializadas no território e que se relacionam, dialeticamente, com as novas formas de organização associadas aos desenvolvimentos do processo inovativo no território, esta que se origina em dependência do ponto de vista temporal, aos processos produtivos predecessores. Com isso, combinações técnicas e sociais do trabalho, que são um aspecto da divisão social do trabalho, ocupam e produzem rearranjos espaciais no território, diferenciando espaços e tornando-os formações heterogêneas, estas que apresentam condições em termos de recursos indispensáveis ao processo de inovação, sobretudo ligados a tecnologia e ao conhecimento como forças produtivas essenciais, hierarquizando e produzindo os territórios desiguais (TUNES, 2015). Nota-se, assim, que a diferenciação territorial se torna um aspecto comum à análise de diversos autores, admitindo-se que a distribuição das atividades inovadoras é altamente dependente das condições e recursos da tecnologia e conhecimento, e reproduzindo-se assim, uma geografia das desigualdades. Como afirmado por Lastres e Cassiolato (2005, p. 327): [...] separando países ricos e pobres em termos de Tecnologias da Informação (TIs) – digital divide – e, ainda mais grave, em termos da capacidade de aprendizado – learning divide – e de possibilidade de colocar em prática os conhecimentos apreendidos – development divide. 35 Dessa maneira, reafirma-se o papel da Geografia para análise e compreensão dos processos de inovação, de como estes se materializam e se reproduzem no território, hierarquizando o espaço de acordo com as condições materiais e imateriais relacionadas à tecnologia e ao conhecimento. Segundo Gama (2001), as pesquisas da geografia sobre o processo de inovação devem ater-se aos aspectos espaciais da inovação, partindo de uma análise dos recursos do território, pretéritos ou novos, que foram apropriados e valorizados pelo capital e pela rede de relações estabelecida entre os diversos agentes que compõem a produção inovadora. Tunes (2015) se baseia em Maillat (2002) e aborda a questão de redes de inovação, que segundo o autor podem ser definidas como as relações de cooperação e de concorrência, que geram a sinergias e as complementariedades necessárias para a efetivação do processo de inovação (MAILLAT, 2002, p.11). Ainda segundo Maillat (2002), a lógica territorial implica em um elo forte estabelecido entre as empresas e o território em que estão sendo inseridas. A lógica territorial, nesse sentido, tem por objetivo a territorialização das empresas, ou seja, sua inserção no sistema territorial de produção. As empresas, através das relações de cooperação e de concorrência que são estabelecidas, desempenham os processos de sinergia, gerando as complementariedades necessárias ao seu funcionamento. O território, desempenhando, portanto, um papel ativo. É notável que o conceito de sinergia é frequentemente utilizado nos estudos e análises da inovação, principalmente na concepção de meios inovadores, em que se destaca a importância da aglomeração e das relações de cooperação que se dão no território. Sinergia, segundo Tunes (2015), significa considerar que duas ou mais empresas que trabalham juntas podem atingir um nível de competitividade mais elevado do que se trabalhassem individualmente. A autora relata que essa é uma abordagem interessante, do ponto de vista que privilegia a ideia de aprendizagem coletiva, sendo muito utilizada na década de 1980 como justificativa e estímulo ao processo de centralização de capital através da fusão e aquisição de empresas. A sinergia e as relações de cooperação, na abordagem dos meios inovadores, podem ser formais ou informais e se dão entre as empresas e demais instituições locais, como instituições de pesquisa, financeiras, de serviços especializados e intensivos em conhecimento, instituições públicas, dentre outras. A abordagem do meio inovador, em decorrência dessa compreensão da relação entre território e inovação, reconhece que as condições materiais e imateriais das relações de aprendizagem produzem uma diferenciação territorial. 36 Com o nível territorial afasta-se a ideia de uma geografia da inovação uniforme; ao contrário, a reflexão teórica aponta para uma capacidade diferenciada dos territórios na organização dos recursos (capital, informação, competitividade, saber-fazer), e dos atores (empresas, instituições, pessoas inovadoras etc.) necessários à inovação (VALE, 2012, p.66). Considera-se, assim, as desigualdades territoriais como fundamentais para compreensão dos territórios, daqueles que possuem condições para se formaram enquanto meios inovadores e daqueles que não. Daí surgem as expressões dos grupos de regiões ganhadoras, aquelas que possuem os recursos territoriais necessários para a produção da inovação, e as regiões perdedoras, compostas pelas regiões em que há a carência das mesmas condições (TUNES, 2015). Tendo em vista as dinâmicas que foram aqui citadas, que se estabelecem no território e geram processos específicos de concentração da inovação, da consolidação de meios inovadores e de espacialização desigual desses ambientes, um outro conceito que é essencial para análise destes processos é o de condições gerais de produção, conceito que é desenvolvido por Karl Marx, recuperado por Lojkine (1995) e mais recentemente abordado na Geografia por Sandra Lencioni (2007). Para Lencioni (2007), as condições gerais de produção devem ser entendidas como a forma de articulação entre o consumo produtivo relacionado à reprodução dos meios de produção e ao processo de produção e circulação do capital em geral. São as condições gerais de produção que conformam as condições direta ou indiretamente ligadas ao processo de produção. Segundo Lencioni (2007), as condições gerais de produção articulam o particular ao geral. São denominadas de gerais porque dizem respeito às condições que viabilizam não apenas um capital em particular, mas um conjunto de capitais, sendo esse movimento o que faz com que o consumo delas se torne coletivo. Lencioni (2007) realiza um agrupamento das condições gerais de produção em dois conjuntos: [...] O primeiro, dizendo respeito àquelas condições que mantém conexão direta com o processo de produção e circulação do capital e, o segundo, relativo àquelas condições cuja conexão com o processo de produção e circulação são indiretas. Seja no primeiro conjunto ou no segundo conjunto vale advertir que o consumo das condições nos dois conjuntos se dá de forma coletiva por meio dos equipamentos coletivos de consumo (LENCIONI, 2007, p.7). 37 As seguintes condições gerais de produção são definidas como materiais e imateriais. No primeiro caso, por exemplo, se tem as vias de circulação material para o transporte de mercadorias e pessoas, os oleodutos para transporte do petróleo e de seus derivados, as hidrovias, as rodovias, os aeroportos etc. Já no segundo caso, as condições gerais de produção imateriais, como as redes de energia e telecomunicações, que embora requeiram infraestrutura material que lhe dão suporte possuem uma dinâmica que não se consubstancia em formas corpóreas, como são os fluxos de informações e comunicações (LENCIONI, 2007). Desta forma, a análise das condições gerais de produção relacionas às formações de territórios inovadores devem partir de uma reflexão histórica dos processos que antecederam o atual momento e que, certamente, tiveram influência na existência e possibilitaram a criação das condições gerais. Isso significa dizer, portanto, que as atividades intensivas em conhecimento não criam as condições gerais de produção próprias no território, mas que herdam ao que Santos e Siveira (2004, p.144) denominam de circuitos de produção anteriores, criando assim “solidariedades entre elementos novos e herdados” (TUNES, 2015). As condições gerais de produção vão ocorrer de forma seletiva no espaço, fazendo com que empreendimentos e ações políticas - como é o caso da implantação e instalação de parques tecnológicos -, sejam reciprocamente seletivas. Para a análise dos parques tecnológicos, especificamente, vale ressaltar a importância de certas condições gerais de produção que são essenciais para à sua consolidação. Este que é criado para promover e intensificar o processo inovador, dedicando-se ao auxiliar empresas inovadoras, aos parques tecnológicos torna-se imprescindível a presença de condições gerais especificas, tais como universidades, centros de pesquisa e outros serviços ligados à economia do conhecimento e inovadora (MELO, 2014). 38 2- PARQUES TECNOLÓGICOS E O CONTEXTO BRASILEIRO Tendo sido feito a introdução acerca das temáticas que circundam assuntos relativos à inovação e a formação de meios inovadores, podemos agora nos ater ao objeto de nossa pesquisa, analisando as teorias e abordagens que conceituam e caracterizam os parques tecnológicos. Nesta etapa buscaremos discutir o processo de consolidação dos parques no contexto internacional e nacional, de forma que justifique sua relevância para as economias atuais. Também será feita uma análise das iniciativas e indicadores de parques tecnológicos no âmbito brasileiro, identificando a distribuição destes ambientes sobre o território nacional. 2.1 Parques Tecnológicos: breves considerações Como forma de influenciar e acelerar os processos inovadores, a existência de localidades próprias para a inovação demonstrou-se de extrema importância para o desenvolvimento regional e para produção do conhecimento científico e tecnológico. Estas localidades que são aqui associadas aos meios inovadores surgem na década de 1950 a partir do modelo implantado na Universidade de Stanford, na Califórnia, Estados Unidos, ao que ficou conhecido como Vale do Silício. Castells e Hall (1994 apud MELO, 2014, p.87) definem parque tecnológico como “[...] um espaço privilegiado, fruto de iniciativas governamentais ou relacionadas às universidades. São locais que buscam induzir um novo crescimento industrial através da atração de empresas de produção de alta tecnologia e com vistas ao desenvolvimento econômico”. Segundo Courson (1997), o parque tecnológico pode ser definido como uma organização urbana em uma área geograficamente delimitada e construída, voltada para empreendimentos em atividades relativas ao conhecimento, que compreendem atividades de pesquisa e desenvolvimento – P&D, para a produção de bens e serviços baseados na ciência e na tecnologia. No site do Sistema Paulistas de Parques Tecnológicos (SPTec), consta a seguinte definição de parques tecnológicos: [...] empreendimentos para a promoção de ciência, tecnologia e inovação. São espaços que oferecem oportunidade para as empresas do Estado transformarem pesquisa em produto, aproximando os centros de conhecimento (universidades, centros de pesquisas e escolas) do setor produtivo (empresas em geral). Esses ambientes propícios para o desenvolvimento de Empresas de Base Tecnológica (EBTs) e para a difusão da Ciência, Tecnologia e Inovação transformam-se em locais que estimulam a sinergia de experiências entre as empresas, tornando-as mais competitivas (ESTADO DE SÃO PAULO, 2021). 39 No site da International Association of Science Parks – IASP é apresentado uma definição oficial para os parques, sendo: Um Parque Tecnológico é uma organização gerida por profissionais especializados, que tem como objetivo fundamental incrementar a riqueza da comunidade local, promovendo a cultura da inovação e a competitividade das empresas associadas e instituições baseadas em conhecimento. Para atingir tal fim, um Parque Tecnológico estimula e administra o fluxo de conhecimento e de tecnologia entre as universidades, instituições de pesquisa e desenvolvimento, empresas e o mercado; facilita a criação e o desenvolvimento de empresas baseadas na inovação através da incubação e processos de spin-off; e fornece outros serviços de valor agregado junto com espaço físico e estrutura de alta qualidade (IASP, 2021). Trata-se, portanto, de um sistema institucional que é planejado, urbano ou interurbano, que se consolida numa área geográfica específica, construída e delimitada, formando uma concentração de empreendimentos intensivos em geração de conhecimento e tecnologia. Estes ambientes se beneficiam da proximidade física com universidades, instituições de pesquisa, outras empresas e instituições, criando um ambiente de fertilização cruzada e de sinergias para disseminação e aprofundamento do conhecimento (DINIZ, 2006). Dada algumas definições de parques tecnológicos, Medeiros (1997) lista uma série de precondições para a implantação desses espaços de inovação: a) existência de instituições de ensino e pesquisa que possuam densidade tecnológica em algumas áreas; b) apoio governamental, sendo da União, Estado e/ou Município; c) existência de Empresas que se interessem pelas novas tecnologias; d) parcerias e projetos conjuntos entre academia e empresas; e) estruturas organizacionais convenientemente organizadas. Para Medeiros (1997) os objetivos do empreendimento permitem: 1) Orientar a gestão do processo de inovação tecnológica; 2) Facilitar a transferência de tecnologia; 3) Aumentar as parcerias empresa-universidade-governo; 4) Facilitar a definição de linhas de fomento financeiro apropriadas; 5) Aumentar a parceria entre empresas; 6) Facilitar a criação e consolidação de micro e pequenas empresas; 7) Oferecer espaços condominiais e promover ações associativas; 8) Oferecer infraestrutura adequada às empresas; 9) Fortalecer o espírito empreendedor; 10) Facilitar a troca de informações técnicas e gerenciais; 11) Estimular o aumento da qualidade e competividade; 12) Apoiar o desenvolvimento de áreas tecnológicas prioritárias; 13) Facilitar a criação de novos postos de trabalho; e, por último; 14) Alterar a dinâmica urbana de uma cidade ou região. Frente a variedade de fatores propiciados pela operação de Parques Tecnológicos, Spolidorio e Audy (2008, p. 36) constatam que os parques: “constituem algumas das respostas 40 significativas que têm sido estruturadas, em âmbito internacional, aos desafios trazidos pela globalização da economia – e dos problemas – nas últimas décadas, no bojo da Sociedade do Conhecimento”. Após o pioneirismo do Vale do Silício, diversos países buscaram reproduzir artificialmente ambientes favoráveis às transferências e ao desenvolvimento da inovação, tendo como exemplo profícuo o Vale do Silício. Estes novos ambientes planejados passaram a adotar outras nomenclaturas, transpondo seus objetivos e metas para o desenvolvimento (MELO, 2014). Melo (2014) também ressalta que as experiências dos parques tecnológicos idealizados a partir do modelo Vale do Silício determinaram complexidades na tentativa de implantação destes empreendimentos, tendo vista as disparidades entre os territórios, bem como a forma de administração política que cada qual se posicionava na condução destes projetos, proporcionando experiências diversas, por vezes bem-sucedidas e por outras não. Neste contexto, levando em consideração as diferentes características territoriais e únicas de cada país, podemos elencar alguns casos de parques tecnológicos nas décadas de 1970 e 1980 na Europa e na Ásia. Na França, o parque Sophia Antipolis criado em 1969, teve em seu planejamento áreas destinadas às empresas inovadoras, principalmente de alta tecnologia, moradias e “atividades diárias”. Sophia Antipolis é composto em três tipos de indústria: ciências da saúde, química fina e biotecnologia, ciências da terra e; informática, eletrônica e telecomunicações. As instituições começaram a se instalar em 1972 como, por exemplo, a École Nationale Supériore de Mines de Paris. Já o caso do Reino Unido, as primeiras experiências para se criar ambientes propícios ao desenvolvimento de indústrias de alta tecnologia ocorrem nos anos 1970, quando Universidades de Cambrigde, na Inglaterra e de Heriot-Watt Universtity, na Escócia cederam parte de seu espaço para construção de science parks (parques científicos). (MELO, 2014 p. 76). Tais projetos tinham como objetivos aproximar a indústria da universidade. O Cambridge Science Park, o maior e mais antigo parque do Reino Unido, é exemplo de parque científico que obteve crescimento baseado no estímulo ao empreendedorismo na criação de novas empresas - ligadas principalmente a software, hardware, eletrônica e biotecnologia – que surgiram a partir das pesquisas desenvolvidas na universidade (MELO, 2014, p.76). No Japão, por exemplo, que também desenvolveu esse ambiente de inovação, buscou criar ambientes similares ao Vale do Silício em seu território, inicia o programa technopolis 41 (tecnópoles) em 1979, a partir da ação no MITI – Ministério de Comércio Exterior e Indústria do Japão. Trata-se de um programa para criar novas ‘cidades da ciência’ em zonas periféricas do país, com o intuito de criar novas tecnologias e ao mesmo tempo desenvolver regiões atrasadas. O modelo proposto compreendia universidades voltadas à pesquisa, parques de pesquisa industrial, capital de risco, centros de ciência e novas cidades residenciais (CASTELLS & HALL, 1994 apud MELO, 2014, p. 77). Segundo as estimativas de Luis Sanz (2003), existiriam atualmente mais de 700 parques tecnológicos no mundo, destes, aproximadamente 300 estão localizados na América do Norte; 60 na Grã-Bretanha; 35 na Espanha; 80 na França; 25 na Itália; 31 na Suécia e 20 em outros países europeus; 25 no Japão e os restantes estão espalhados pelo mundo. 2.2 Políticas Públicas e a formação dos Parques Tecnológicos no Brasil No Brasil, os primeiros incentivos para fomentar o desenvolvimento dos meios inovadores tiveram início na década de 1980, a partir da criação do Programa Brasileiro de Parques Tecnológicos pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em 1984, esta que visava modificar a realidade econômica do país (PLONSKI, 2010). O programa objetivou-se em reproduzir, sobre a territorialidade brasileira, experiências previamente efetuadas em países já desenvolvidos nesse sentido, como é o caso dos Estados Unidos e outros países europeus, quais demonstraram-se eficazes na execução de aproximação entre empresas e instituições de ensino, alavancando no desenvolvimento regional e produtivo destas regiões. Contudo, como na grande maioria das iniciativas pioneiras o resultado demonstrou-se inconcluso no curto prazo no sentido em que, segundo a ANPROTEC (2008): [...] A falta de uma cultura voltada para a inovação e o baixo número de empreendimentos inovadores existentes na época fizeram que os primeiros projetos de parques tecnológicos acabassem dando origem às primeiras incubadoras de empresas no Brasil (ANPROTEC, 2008, p. 8). Em meados dos anos 1990 houve uma aproximação entre a inovação e desenvolvimento, e as políticas de ciência e de tecnologia em que se passou a ter uma perspectiva explicitamente regional. Estados e municípios deveriam acompanhar, portanto, a evolução no setor tecnológico e atender as demandas que essas atividades exigem. Segundo os autores Veloso Filho e Nogueira (2006): 42 Essa linha regional compreendeu, entre outros, programas de cadeias produtivas, incubadoras de empresas e parques tecnológicos; plataformas tecnológicas, arranjos produtivos locais e redes de tecnologia, implementados por todas as unidades da federação, com grandes mobilizações e expectativas de resultados promissores na promoção econômica de regiões e localidades (VELOSO FILHO e NOGUEIRA, 2006, p. 112-113 apud MELO, 2014, p.1). As retomadas dos incentivos aos parques tecnológicos vão ocorrer a partir da criação de Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia, em 1999. Todavia, somente a partir dos anos 2000, durante o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que novos incentivos foram lançados para a implantação de parques científicos e tecnológicos no Brasil com objetivos mais abrangentes em desenvolvimento – não somente tecnológico como também econômico e social (ABDI; ANPROTEC, 2010). Assim, com a criação de marcos legais e apoio ao processo de inovação, a exemplo da Lei da Inovação (Lei 10.973) em 2004, que estabelece medidas de incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, dá um novo impulso ao desenvolvimento dos parques científicos e tecnológicos nacionais. A Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior (Lei 11.020), lançada em 2004, com o objetivo de fortalecer e expandir a base industrial brasileira por meio da melhoria da capacidade inovadora das empresas, ou seja, impulsionar a competitividade brasileira. Outro importante avanço ocorreu com a instituição do Programa Nacional de Apoio às Incubadoras de Empresas e aos Parques Tecnológicos (PNI) pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), em 2009. O PNI tem por objetivos “fomentar a consolidação e o surgimento de parques tecnológicos e incubadoras de empresas que contribuam para estimular e acelerar o processo de criação de micro e pequenas empresas caracterizadas pelo elevado conteúdo tecnológico de seus produtos, processos e serviços, bem como por intensa atividade de inovação tecnológica e pela utilização de modernos métodos de gestão” (MCTI, 2009). Outro fator importante para consolidar a integração e instalação dos parques tecnológicos no Brasil foi a criação do SPTec em 2006, programa executado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo e que tem como por objetivo servir de instrumento de apoio e financiamento para estudos e infraestrutura voltados à criação de parques tecnológicos no estado, este sendo melhor abordado mais adiante. Em 2011-2014, no Governo Dilma Rousseff o “Plano Brasil Maior” estimulou a inovação e produção nacional para aumentar a competitividade da indústria nos mercados interno e externo. Consideramos, assim, a somatória das ações políticas aqui citadas como 43 fundamentais para constituição dos parques tecnológicos sobre o território brasileiro. Diante do amplo estudo que foi desenvolvido pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações no ano de 2013, o “Estudo de Projetos de Alta Complexidade – Indicadores de Parques Tecnológicos”, realizado em uma pareceria com o Centro de Apoio de Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília (CDT/UnB), muitas informações acerca do cenário inovativo brasileiro foram levantadas, estas que são fundamentais para o direcionamento de estratégias advindas da União, além das ações de apoio executadas por parte de governos municipais e estaduais e da iniciativa privada, para implementação dos meios inovadores. Neste estudo, visou-se fazer um diagnóstico acerca da situação de diversas iniciativas de implantação de parques científicos e tecnológicos no Brasil, qual foram identificadas um total de 94 iniciativas dispostas sobre o território (CDT/UnB, MCTI, 2013, p.13). Já em 2019 o MCTI realiza nova pesquisa abrangendo o período de 2017-2018, desta vez nomeada de “Estudo de Projetos de Alta Complexidade – Indicadores de Parques Tecnológicos Fase 2”. Nesta pesquisa foram elencadas 103 iniciativas de implantação de parques, sendo 43 em fase de operação, 37 em projetos e 23 em implantação (Gráfico 1), demostrando a crescente evolução na quantidade desses habitats de inovação no País (CDT/UnB, MCTIC, 2019, p.13). Fonte: CDT/UnB (2019). 37 23 43 Gráfico 1: Total de Iniciativas de Parques Tecnológicos no Brasil, em fases de implementação Projeto Implantação Operação 44 Na Figura 5, podemos observar as iniciativas de parques tecnológicos dispostas sobre o território brasileiro, em suas diferentes fases de consolidação (fase de projeto, fase de implantação e fase de operação). Diante das informações que nele se inserem, verifica-se a existência de 37 parques tecnológicos em fase de projeto, valor referente a 35,9% do número total das iniciativas; 23 parques em fase de implantação (22,3%) e 43 que já se encontram em fase de operação e com um valor percentual de 41,8% das iniciativas existentes no Brasil. FIGURA 5 - Quantidade de iniciativas de parques científicos e tecnológicos no Brasil - 2017 Fonte: Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (2019, p. 16). Através da análise da figura também é possível ser observado a distribuição das iniciativas de parques tecnológicos nas diferentes regiões brasileiras e Unidades Federativas. Dentre o total de 103 das iniciativas distribuídas no território nacional, observamos a concentração destas iniciativas nas regiões Sul e Sudeste do país, que juntas agregam um valor de aproximadamente 80 delas. Tal cenário se assume diante de uma concentração histórica da economia nesta camada do território nacional, propiciando as infraestruturas necessárias para a instalação dos meios inovadores (universidades, empresas, mão de obra etc.). Além de outras questões que envolvem a coordenação de políticas etc. O Gráfico 2 tem como por objetivo apresentar o número de iniciativas de parques 45 científicos e tecnológicos no Brasil por regiões, buscando destacar a fase de desenvolvimento e a região na qual estão inseridos: Fonte: CDT/UnB (2019). Analisando as 103 iniciativas de parques que foram registradas através da pesquisa, é possível observar maior concentração de meios inovadores nas regiões Sul e Sudeste do país. A região Sudeste possui o maior número de iniciativas, contando com 41 delas e a região Sul concentrando 37. Já nas outras regiões, o Centro-Oeste concentra 10 das iniciativas, o Nordeste, 9, e a região do Norte do país com 6 das iniciativas de parques tecnológicos (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019, p. 69). A distribuição de iniciativas de parques tecnológicos, de acordo com a região que se inserem pode ser observada nos Gráficos 3 e 4: Fonte: CDT/UnB (2019). Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Projeto 5 3 6 15 8 Implantação 0 2 3 8 10 Operação 1 4 1 18 19 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 Gráfico 2: Iniciativas de Parques por Fase de Desenvolvimento e por Região Projeto Implantação Operação 37 41 10 9 6 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 Sul Sudeste Centro-Oeste Nordeste Norte Gráfico 3: Número de Iniciativas de Parques Tecnológicos por Região 46 Fonte: CDT/UnB (2019). O Sudeste é a região que apresenta maior relevância na quantidade de iniciativas em nível nacional (40% do percentual total), observando-se a presença de parques científicos e tecnológicos em todos os estados que a integram. Entre esses estados, dois possuem iniciativas em todas as fases de desenvolvimento, Minas Gerais e São Paulo, sendo São Paulo aquele que possui maior expressividade tanto em quantidade de parques (24) quanto na quantidade de iniciativas em cada fase de desenvolvimento: projeto (7), implantação (6) e operação (11). Minas Gerais conta com 8 iniciativas: projeto (2), implantação (2) e operação (4). Rio de Janeiro conta com 7: projeto (3), e operação (3). E, por fim, Espírito Santo com 2 iniciativas ainda em fase de projeto (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019). A região Sul também apresenta iniciativas de parques em todos os seus estados e em todas as fases de desenvolvimento. A maior concentração de parques é observada no estado do Rio Grande do Sul qual detém 17 das iniciativas do estado, sendo elas: projeto (3), implantação (6) e operação (8). Já os estados do Paraná e Santa Catarina apresentam quantidades similares de iniciativas de parques, sendo, respectivamente, 11 e 9. No Paraná distribuem-se da seguinte forma: projeto (3), implantação (1) e operação (7), e, em Santa Catarina: projeto (2), implantação (3) e operação (4) (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019). Sul 36% Sudeste 40% Centro-Oeste 9% Nordeste 9% Norte 6% Gráfico 4: Distribuição de Parques Cientifícos e Tecnológicos por região (em %) Sul Sudeste Centro-Oeste Nordeste Norte 47 A região Centro-Oeste, em seus três estados (Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul) e também o Distrito Federal, possui um total de 10 iniciativas de parques científicos e tecnológicos, das quais apenas uma adentrou em estágio de operação e que está localizada no Distrito Federal. As iniciativas encontram-se distribuídas sobre o estado da seguinte forma: Distrito Federal possui 3 iniciativas, dentre elas: 1 em projeto, 1 em implantação e 1 em operação; Goiás possui 3 iniciativas: 2 em projeto, 1 em implantação e nenhuma em operação; E o Mato Grosso, também contando com 3 iniciativas: 2 em projeto, 1 em implantação. Quanto o Mato Grosso Sul, apenas 1 iniciativa de parque, ainda em fase de projeto (MCTI, CDT/BRASÍLIA, 2019). Dos nove estados que integram a região Nordeste do país, sete deles (Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Sergipe e Rio Grande do Norte) possuem iniciativas de parques, em diversos estágios. O estado de Pernambuco e Bahia são aqueles que detém a maior quantidade de iniciativas, ambos contando com 2 iniciativas de parque. No caso de Pernambuco: 1 parque está em fase de implantação e 1 já em operação; e a Bahia: 1 em fase de projeto e 1 em operação. Os estados Sergipe, Alagoas e Paraíba, possuem 1 iniciativa de parques, os três encontrando-se já em operação. E, por fim, Rio Grande do Norte e o Ceará contendo uma iniciativa cada, ambos em projeto (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019). Já a região Norte do país, que é composta por sete estados, possui em três de seus estados (Pará, Amazonas e Rondônia) cinco iniciativas de parques científicos e tecnológicos, deste total, 3 localizam-se no estado do Pará (2 em fase de projeto e 1 em fase de operação), 2 no Amazonas (em fase de projeto) e 1 em Rondônia (em fase de projeto). Os demais estados da região (Acre, Amapá, Roraima e Tocantins) ainda não possuem iniciativas de parques. Dentro do contexto da tríplice hélice (pareceria estabelecida entre governos, empresas e universidades), sob o aspecto de potencial para a geração de conhecimento, a região Norte possui 24 universidades e institutos federais, podendo-se considerar que existe estrutura acadêmica capaz de fundamentar a constituição de parques científicos e tecnológicos (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019). Desta forma, numa breve análise pode-se notar uma correlação entre a quantidade de parques instalados no território, o contingente populacional e a relevância do posto de vista econômico das regiões. Assim, as regiões Sudeste e Sul do país, que possuem um número maior de habitantes e de PIB, também concentram a maior parte das iniciativas de parques científicos e tecnológicos no Brasil. Além disso, vale ser destacado os fatores que são determinados pelas condições gerais de produção (LENCIONI, 2007) e que são decisivos para territorialização dos 48 processos ligados à inovação. Dentre as condições, aqui destaca-se a concentração de universidades, de institutos de pesquisa, de serviços especializados e a rede de circulação material e imaterial. Assim, como pontuado por Gomes (2019) a região centro-sul, denominada de “região concentrada” por Milton Santos, concentra maior densidade técnico-científica e informacional, maior participação de instituições de ensino superior e pesquisa do território brasileiro, maior número de doutores do país, o maior gasto em P&D e o maior número de patentes inseridas ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), conforme é apresentado na Tabela 1. Tabela 1: Indicadores socioeconômicos das regiões brasileiras - 2014 Fonte: ANPROTEC, 2014, organizado por Gomes (2019). 49 2.3 Características Gerais: Empresas e empregos gerados; Áreas de atuação; Fontes e recursos Ainda sob apoio do amplo estudo que foi conduzido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia Inovações e Comunicações em cooperação com o Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília (CDT/UnB) no ano de 2013 e atualizado no ano de 2017, pretendemos apresentar o panorama brasileiro dos parques tecnológicos, procurando destacar as suas características e considerar o crescimento do número de empresas instaladas nos parques, os empregos gerados, as áreas de atuação das empresas e das suas fontes de financiamento. A fim de destacar o crescimento de parques científicos e tecnológicos, o Gráfico 5 ilustra a evolução do número de parques instalados no Brasil em um período de 17 anos. Fonte: CDT/UnB (2019). Diante do Gráfico 5, podemos verificar uma exponencial evolução das iniciativas de parques científicos e tecnológicos no Brasil a partir dos anos 2000, movimento este que reflete as medidas em torno das políticas federais e estaduais relativas à Ciência, Tecnologia e Inovação. Posteriormente originando uma série de relações estabelecidas por meio dos diferentes agentes que se tornam componentes fundamentais e que integram os parques tecnológicos - empresas e a organização gestora do parque; empresas e instituição de ensino e pesquisa -, ou seja, graças a união e parcerias que passaram a ser estabelecidas entre os setores público e o privado. 10 74 94 103 0 20 40 60 80 100 2000 2008 2013 2017 Gráfico 5: Evolução na quantidade de iniciativas de parques no Brasil 50 Deste modo, no que se refere ao total de empresas conveniadas aos parques no Brasil, o estudo mostra a presença de 1.337 empresas nos parques científicos e tecnológicos do país, formando maior concentração na região Sul (35,9%), Sudeste (35,6%) e Nordeste (25,5%) do país. Já as regiões Centro-Oeste e Norte juntas congregam apenas 3% das empresas (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019, p. 52). Fonte: CDT/UnB (2019). Para ilustrar essas informações, o Gráfico 7 demonstra a quantidade de empresas instaladas nos parques científicos e tecnológicos distribuídos pelas cinco regiões do país: Fonte: CDT/UnB (2019). 933 1.337 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 2013 2017 Gráfico 6: Evolução do número de empresas instaladas nos Parques Tecnológicos 480 476 20 342 19 0 100 200 300 400 500 600 Sul Sudeste Centro-Oeste Nordeste Norte Gráfico 7: Número de empresas nos parques por regiões brasileiras Sul Sudeste Centro-Oeste Nordeste Norte 51 Para o levantamento, foram elencados um total de 38.365 mil empregos gerados nas empresas que estão anexadas aos parques, sendo eles distribuídos da seguinte maneira: Sul (15.310 empregos); Sudeste (13.484 empregos); Centro-Oeste (88 empregos); Nordeste (9.353 empregos) e Norte (130 empregos). Fonte: CDT/UnB (2019). No Brasil, onde os parques tecnológicos se concentram nas regiões Sul e Sudeste do país, centralizando-se cerca de 75% dos empregos gerados pelas empresas instaladas nos parques tecnológicos, enquanto as regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste perfazem 25% restantes (MCTIC, CDT/BRASÍLIA, 2019 p. 72). Fonte: CDT/UnB (2019). 29.909 38.365 0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 35.000 40.000 2013 2017 Gráfico 8: Evolução do número de empregos gerados pelos Parques Tecnológicos