RESSALVA Atendendo solicitação da autora, o texto completo desta dissertação será disponibilizado somente a partir de 15/12/2014. 1 KÁTIA HATSUE ENDO INDISCIPLINA NO ENSINO MÉDIO E TÉCNICO: representações sociais de professores ASSIS 2012 2 KÁTIA HATSUE ENDO INDISCIPLINA NO ENSINO MÉDIO E TÉCNICO: representações sociais de professores Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista para a obtenção do título de Mestre em Psicologia (Área de Conhecimento: Psicologia e Sociedade) Orientadora: Profa Dra Elizabeth Piemonte Constantino ASSIS 2012 3 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca da F.C.L. – Assis – UNESP Endo, Kátia Hatsue E56i Indisciplina no ensino médio e técnico: representações sociais de professores / Kátia Hatsue Endo. Assis, 2012 120 f. : il. Dissertação de Mestrado - Faculdade de Ciências e Letras de Assis - Universidade Estadual Paulista. Orientadora: Dra. Elizabeth Piemonte Constantino 1. Representações sociais. 2. Ensino médio. 3. Ensino técnico 4. Professores. I. Título. CDD 370.19 158.2 4 Aos professores Que se empenham diariamente a ensinar e educar nossos jovens. Dedico meu esforço aos educadores, pois reconheço as dificuldades que enfrentam na caminhada educacional brasileira. 5 AGRADECIMENTOS Agradeço à minha querida orientadora, Elizabeth Piemonte Constantino, que dedicou seu precioso tempo e seus conhecimentos para participar comigo nesta caminhada acadêmica tão importante para mim. Agradeço as valiosas contribuições da Profª Drª Maria Suzana de Stefano Menin e do Dr. Leonardo Lemos de Souza por ocasião do Exame Geral de Qualificação. Agradeço aos meus pais e avós que sempre tão dedicados e esforçados me ensinaram o valor do respeito, da honestidade, do amor, da compreensão. Ao meu querido e amado Carlinhos pela paciência e amor. Obrigada por me incentivar e compartilhar comigo tantas vivências importantes. Aos queridos docentes e funcionários da UNESP - Faculdade de Ciências e Letras de Assis. Aos colegas da escola em que trabalhei e realizei a pesquisa pelo apoio e carinho. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior – CAPES pelo financiamento à pesquisa. Agradeço ainda a todos que possibilitaram de forma direta ou indireta a realização deste trabalho. Muito obrigada, Deus, por me orientar em cada momento de minha vida! 6 ENDO, K. H. INDISCIPLINA NO ENSINO MÉDIO E TÉCNICO: representações sociais de professores. 2012. 122f. Dissertação (Mestrado em Psicologia). - Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Assis, 2012. RESUMO O presente estudo teve como objetivo identificar as representações sociais de professores sobre indisciplina em sala de aula. Adotamos uma abordagem quali-quantitativa de pesquisa e a teoria das Representações Sociais como referencial teórico. Os dados foram coletados por meio de entrevistas individuais semiestruturadas. Os participantes foram três professores do ensino técnico, três do ensino médio e três de ambos os tipos de ensino, totalizando nove docentes de uma Escola Técnica Estadual (ETEC) do interior paulista, pertencente ao Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza. Utilizando a análise de conteúdo, definimos três eixos temáticos para tratamento dos dados, a saber: causas atribuídas à indisciplina, alternativas para lidar com a questão e concepção de indisciplina, para os quais caracterizamos categorias, em que obtivemos a frequência de respostas. Na análise dos resultados, podemos indicar que a representação social da indisciplina parece estar objetivada, principalmente, nas questões individuais dos alunos. Os professores relataram diferentes causas da indisciplina para os ensinos médio e técnico. As atitudes observadas nos colegas docentes para lidar com a indisciplina foram vistas de forma autoritária, mas quando se trata das próprias atitudes, os entrevistados equilibraram ações autoritárias, democráticas e ambíguas. Foram indicadas algumas diferenças na maneira de lidar com o aluno adolescente e adulto e entre as causas e as alternativas para lidar com a indisciplina. As causas foram atribuídas ao aluno, à família e ao professor, culpabilizados isoladamente. Por outro lado, as alternativas envolveram um sistema de relações sociais e aspectos didático-pedagógicos, tais como a maior interação entre professor e aluno, assuntos de interesse dos alunos, outro sistema de aulas, acompanhamento e orientação do professor em relação ao aluno. As representações sociais dos professores sobre a indisciplina ancoraram-se, em sua maior parte, num referencial tradicional, associado à responsabilização do aluno e da família. A partir desses resultados, percebemos que há grande necessidade de possibilitar o acesso aos educadores às informações e às discussões sobre o tema, para que recebam orientações e esclarecimentos sobre as possibilidades de compreender e lidar com a indisciplina. A escola precisa lidar com a questão de forma coletiva, envolvendo todos os atores educacionais, evitando ações isoladas, individuais e fragmentadas. Palavras–chave: Indisciplina; Representações Sociais; Professores 7 ENDO, K. H. INDISCIPLINE IN HIGH SCHOOL AND TECHNICAL EDUCATION: teachers’ social representations. 2012. 122f. Dissertation (Mastersin Psychology). – Faculty of Sciences and Letters, São Paulo State University, Assis, 2012. ABSTRACT This study intends to identify teachers’ social representation of indiscipline in the classroom. We adopted a quantitative and qualitative approach as well as the Social Representation theory. The data was collected through semi-structured interviews. The subjects were three High School teachers, three technical education teachers and three that work on both types, with a total of nine teachers from a State Technical School (ETEC) in the interior of São Paulo state, which is part of the Paula Souza State Center of Technological Education. During the content analysis, we devised the three following thematic axes: causes of indiscipline, alternatives on how to deal with the problem and the concept of indiscipline, all of which we organized in categories that made possible to obtain the frequency of answers. During the data analysis, we can indicate that the social representation of indiscipline is centered on the individual issues of the students. Teachers reported different causes of indiscipline in high school and technical education. The actions taken to deal with indiscipline that were observed on colleagues were perceived as authoritarian, but when it comes to their own actions, the interviewed showed a balance between authoritarian, democratic and ambiguous. Differences between the treatment of adults and adolescents were noted, as well as the causes and alternatives to deal with indiscipline. Causes were attributed to the student, to the family and to the teacher separately. On the other hand, the alternatives involved a system of social relationships and socio-pedagogical aspects, such as more interaction between teacher and student, class subjects of interest to students, an alternate system of classes, monitoring and supervision of the student by the teacher. The teachers’ social representation on indiscipline were based mostly on traditional grounds, associated to the student and family responsibility. Based on these results, we perceived the need to provide educators with the access to information and discussion on the subject, in order for them to receive guidance and clarifications on understanding and dealing with indiscipline. The school needs to deal with the issue in a collective way, involving all educational actors, avoiding individual, isolated and fragmentary actions. Keywords: Indiscipline; Social Representations; Teachers. 10 INTRODUÇÃO O presente trabalho é uma investigação das representações sociais de professores sobre a indisciplina em sala de aula. A pesquisa foi realizada em uma Escola Técnica Estadual (ETEC) do interior paulista. Focalizamos o ensino médio e técnico devido nossa experiência profissional nesses contextos, percebendo assim a possibilidade de contribuir para a compreensão desse fenômeno. Os contatos que tivemos no estudo da indisciplina em sala de aula foram em pesquisas realizadas durante a graduação em Psicologia, na Faculdade de Ciências e Letras de Assis da Universidade Estadual Paulista - Unesp, que suscitaram nosso interesse sobre o tema. Em 2004, foi realizado o primeiro trabalho de Iniciação Científica, intitulado Indisciplina e Juízo Moral em Sala de Aula: um estudo exploratório com alunos da 4ª série do Ensino Fundamental, como parte de um Projeto Interdisciplinar de Iniciação Científica da mesma universidade. Realizamos essa pesquisa inicial com um grupo de cinco alunos do curso de Psicologia, sob a orientação do Prof. Dr. Mário Sérgio Vasconcelos. O objetivo desse estudo foi investigar as representações de alunos sobre a indisciplina no contexto da sala de aula. Para atingir esse objetivo, entrevistamos 10 alunos (9 meninos e 1 menina), todos da 4ª série do ensino fundamental, de 5 escolas municipais da cidade de Assis (SP), sendo 2 alunos de cada escola: um indicado como disciplinado e outro como indisciplinado. Para a coleta de dados, apresentamos aos alunos uma historieta hipotética que continha uma situação de conflito envolvendo a indisciplina em sala de aula, acompanhada de três pranchetas com desenhos coloridos retratando-a. Os dados foram categorizados e analisados numa perspectiva qualitativa, considerando a recorrência interpretativa ao referencial piagetiano. Nessa investigação, concluiu-se que: os alunos souberam distinguir os atos disciplinados dos atos indisciplinados; a ação dos alunos indisciplinados não correspondeu ao juízo moral abstraído, pois esses sujeitos consideraram a indisciplina como errada, mas, segundo os professores e/ou diretores, eles agem de modo indisciplinado; os alunos atribuíram juízo de valor moral mesmo nas respostas às questões que não exigiam o aspecto valorativo; os alunos indisciplinados e disciplinados fizeram julgamentos morais semelhantes, 11 considerando a indisciplina errada; a maioria dos juízos de valor presentes no julgamento moral das crianças da pesquisa se encontrava na fase de heteronomia1. No ano seguinte, participamos da pesquisa Modelos Organizadores do pensamento: um estudo evolutivo a partir de representações sobre indisciplina no contexto escolar2, cujo objetivo foi identificar os modelos organizadores de pensamento que alunos do ensino fundamental e médio utilizavam diante de um conflito hipotético envolvendo a indisciplina no contexto escolar. As principais autoras da teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento são Montserrat Moreno, Genoveva Sastre e Aurora Leal. A teoria procura destacar o papel dos conteúdos na elaboração de modelos que permitam a organização das representações mentais do indivíduo e a construção de seu conhecimento. Modelos organizadores são representações elaboradas sobre uma determinada situação, compostos pelos elementos destacados pelo sujeito, os significados atribuídos a esses elementos, as implicações estabelecidas entre os elementos e os significados. São construções mentais que permitem ao sujeito elaborar suas explicações e pautas de conduta. Para atingir nossos objetivos, investigamos os modelos organizadores abstraídos por 100 participantes de cinco idades distintas: 8, 10, 12, 14 e 16 anos (20 em cada grupo de idade), pertencentes a duas escolas públicas da cidade de Assis (SP). Foram alunos das 2ª, 4ª, 6ª e 8ª séries do ensino fundamental ou da 2ª série do ensino médio, escolhidos aleatoriamente, perfazendo um total de 50 alunos de cada escola (entre meninos e meninas). Utilizamos como instrumentos de pesquisa, principalmente, a entrevista e a apresentação de dois conflitos hipotéticos relacionados a uma situação de indisciplina no contexto escolar. Alguns resultados desta pesquisa foram os modelos abstraídos, que refletiram diversidade e regularidade presentes nos raciocínios elaborados para resolver os conflitos apresentados e variedade de modelos organizadores identificados, evidenciando a importância dos conteúdos sociais na construção dos raciocínios morais. Na graduação em Psicologia, durante a realização de estágio curricular, pudemos nos aproximar de professores do ensino fundamental, que relatavam que alunos os incomodavam com conversas paralelas às atividades, atrapalhavam as aulas e eram inquietos. Os contatos 1 Fase do desenvolvimento moral, por vezes denominada moral do dever, em que o indivíduo segue regras “de modo imitativo, por imposição dos mais velhos e sem ter consciência das origens e funções que as mesmas podem ter; a consciência é mais rígida que a prática e as regras permanecem exteriores à criança” (MENIN, 2000, p. 23-24). 2 Iniciação Científica financiada pelo PIBIC/CNPq/UNESP, orientada pelo Prof. Dr. Mário Sérgio Vasconcelos (pesquisador responsável do projeto). 12 com os alunos e professores e as discussões realizadas nesse estágio possibilitaram reflexões acerca da indisciplina em sala de aula. As experiências, aqui brevemente mencionadas, a respeito de trabalhos que vivenciamos, foram apresentadas para justificar a maneira como nos envolvemos com o tema da indisciplina. Novas indagações emergiram, tendo em vista que, em 2010, trabalhamos como orientadora educacional numa Escola Técnica Estadual (ETEC), que mantinha o ensino médio e técnico. Neste contexto, durante conversas informais sobre questões que envolviam alunos indisciplinados em sala de aula, os professores afirmavam que a indisciplina dos alunos do ensino médio era diferente quando comparada com os alunos do ensino técnico. Tal comentário instigou nossa curiosidade, já que alguns alunos do ensino técnico eram os mesmos que estudavam no ensino médio. E, ainda, alguns professores atuavam em ambos os tipos de ensino e outros em apenas um. Isso nos levou a questionar sobre quais fatores poderiam estar determinando essas diferenças na visão dos professores. Elas estariam relacionadas aos tipos de ensino, às características pessoais dos alunos, às relações professor-aluno em sala de aula, ou ao conjunto desses fatores? Partimos da hipótese de que as diferenças nas representações sociais dos professores poderiam estar relacionadas principalmente às características de cada tipo de ensino, tais como: faixa etária dos alunos, obrigatoriedade, os conteúdos curriculares e outros, as quais poderiam determinar diferentes práticas nos contextos de sala de aula, em termos de metodologia, de linguagem e formas de lidar com os alunos. A possibilidade de convivência entre alunos jovens e adultos poderia influenciar o comportamento dos mais jovens, tornando-os mais “responsáveis” e mais próximos do mundo dos adultos quanto à profissionalização. Segundo Motta (2012), a escolha de uma profissão possui um significado importante para os jovens, por tratar-se de um rito de passagem, no qual ele transpõe a barreira para a vida adulta. “Como se adentrar num curso que, possivelmente, irá lhe proporcionar um emprego, lhe fosse concedido os direitos que até então não podiam ser-lhe outorgados” (p.23). As diferenças nos conteúdos curriculares também poderiam explicar as diferenças na indisciplina, uma vez que, no ensino técnico, as aulas são mais direcionadas para conhecimentos e habilidades necessárias ao desempenho de atividades profissionais3, aliando 3 BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 4, de 8 de dezembro de 1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 dez. 1999. 13 a teoria à prática. Piletti e Rossato (2010) afirmam que, em 1996, a LDB atribuiu um caráter de formação geral ao ensino médio e a formação profissional deveria ser realizada em cursos específicos, ligados ou não ao ensino médio. Outra diferença poderia estar vinculada à obrigatoriedade do ensino médio, pois o mesmo tornou-se a etapa final obrigatória da educação básica, tendo como objetivo a formação dos adolescentes (Ibid). Assim, os alunos do ensino médio são jovens com idade entre 14 e 18 anos, enquanto, conforme Heméritas e Maia (2005), o conjunto de alunado dos cursos técnicos do Centro Paula Souza é “mais pobre, mais velho e constituído por mais pessoas que trabalham” (p.81). Talvez tais características da escola e diferenças entre os alunos de cada período pudessem influenciar na indisciplina escolar, pois, durante nossa atuação profissional na escola, os professores relatavam que havia diferença entre a indisciplina no ensino médio e no técnico. A partir das considerações acima, supomos que essas diferentes formas de ensino poderiam produzir divergências nas representações dos professores sobre a indisciplina. Desse modo, definimos como objetivo geral da presente pesquisa identificar as representações sobre indisciplina em sala de aula dos professores que atuam no ensino médio ou técnico e em ambos, a partir do referencial da teoria das Representações Sociais. Mais especificamente, propomos comparar as representações sociais desses três grupos de professores (professores do ensino médio, do ensino técnico e de ambos os tipos de ensino). Acreditamos que a abordagem dessas questões contribuiria para o entendimento sobre o tema e à formulação de propostas concretas de intervenção, a fim de produzir melhoria das relações no contexto da sala de aula. Além disso, uma investigação desse tipo representaria uma colaboração importante no sentido de oferecer subsídios aos professores e funcionários da escola para lidar com a indisciplina na escola. Para o desenvolvimento desse estudo, trabalhamos com as concepções da indisciplina sob a abordagem psicológica e sociológica, visando traçar um panorama sobre o tema, discutindo as causas e alternativas para lidar com o problema, conteúdos esses que compõem o primeiro capítulo. No segundo capítulo, discutimos a teoria das Representações Sociais e seus conceitos principais, referencial utilizado para iluminar nosso olhar sobre essa investigação. Relatamos, ainda nesse capítulo, pesquisas a respeito da indisciplina na perspectiva de professores. No terceiro capítulo, descrevemos a metodologia utilizada, apresentando um breve histórico do ensino médio e técnico no Brasil, caracterizando cada tipo de ensino nos dias 14 atuais, situando a escola pesquisada, os participantes, o instrumento e os procedimentos de pesquisa, bem como o tratamento dos dados. No quarto capítulo, realizamos a análise e discussão dos resultados, sendo que, neste momento, optamos por trabalhar com parte dos relatos dos professores para ilustrar as análises realizadas a partir dos dados representados em tabelas. Por último, são esboçadas as considerações finais, nas quais se destacam os principais resultados desse estudo, as sugestões de futuras investigações para a abordagem do problema, bem como de enfrentamento do mesmo. Nosso estudo pretende, a partir dos dados analisados e da literatura, auxiliar os professores a refletir e redirecionar as ações no contexto escolar. 106 CONSIDERAÇÕES FINAIS O principal objetivo deste trabalho foi investigar e comparar as representações sociais sobre a indisciplina em sala de aula na perspectiva de professores que atuam no ensino médio, técnico e em ambos, de uma Escola Técnica Estadual (ETEC) do interior paulista, pertencente ao Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza. A investigação e comparação foram feitas a partir de três eixos de análise: causas, alternativas e concepção de indisciplina. As causas da indisciplina foram atribuídas a um conjunto de fatores isolados, principalmente o aluno, a família e o professor. As respostas que atribuíram as causas a um conjunto de fatores sociais, nas quais se considerava o contexto social, foram pouco frequentes. Portanto, a representação social da indisciplina parece estar objetivada na figura do aluno, da família e do professor, mas principalmente, atrelada às questões individuais dos alunos, dados presentes nos eixos temáticos sobre as causas e a concepção de indisciplina. Quando se comparam as causas da indisciplina apontadas pelos professores, a maioria deles indicou haver diferenças entre um e outro, principalmente para aqueles que atuavam ou no médio ou no técnico. Tais diferenças foram relativas à faixa etária, à obrigatoriedade do ensino médio, aos conteúdos específicos de cada um, à relação teoria e prática e às relações interpessoais em cada contexto de ensino. A diferença de faixa etária foi bastante discutida ao longo desse trabalho. Os adolescentes que cursam o ensino médio são rotulados pelos professores como indisciplinados e rebeldes, com a simples justificativa de que estão na fase da adolescência. Não se trata de culpabilizar o adolescente, mas considerar o contexto no qual o indivíduo se insere. O mesmo aluno pode ser visto de formas diferentes no ensino médio e técnico, como constatado neste estudo. Isso pode estar relacionado à visão de que a rebeldia é natural ao adolescente, fato que o desqualifica, não permitindo que se visualize o indivíduo, mas sim, a adolescência estigmatizada. Para os professores, a obrigatoriedade do ensino influencia a indisciplina no ensino médio, pois não são permitidas escolhas para os alunos desse tipo de ensino, somente os alunos do técnico têm a oportunidade de optar por um direcionamento na área de interesse. Com isso, podemos questionar a forma como o ensino médio acontece nas escolas, pois o aluno é obrigado a manter-se sentado por horas, ouvindo o professor, visto que geralmente as aulas são pouco participativas, o que incentiva a passividade do aluno. Como afirmam Piletti 107 e Rossato (2010), os currículos são impostos nacionalmente de forma ampla, vaga e descontextualizada e, assim as escolas passam a focar o conteúdo de vestibular, um concurso meritocrático, que exige estudos enciclopédicos. As aulas práticas e o conteúdo de ensino foram citados como uma diferença entre as causas da indisciplina, pois os cursos técnicos articulam a teoria com a prática e os assuntos abordados despertam maior interesse nos alunos, por se tratar de aulas mais direcionadas à escolha profissional. Por outro lado, o ensino médio descontextualiza os conteúdos escolares do cotidiano dos alunos, apesar dos documentos curriculares oficiais estabelecerem o contrário. Assim, podemos repensar o modo como o ensino é realizado, na tentativa de articular propostas em que as aulas, muitas vezes teóricas e expositivas, possam ser condizentes com a realidade dos alunos, articulando os assuntos escolares ao interesse deles. A convivência entre alunos adolescentes e adultos pode possibilitar, no ensino técnico, a troca de experiências, ideias e conhecimento, permitindo que um contribua com o desenvolvimento do outro. Tais relações interpessoais comprovam a possibilidade de mudança do adolescente, de acordo com o contexto em que vive. De modo geral, as atitudes observadas nos colegas docentes para lidar com a indisciplina são vistas de forma autoritária, mas quando se trata das próprias atitudes, eles equilibram ações autoritárias, democráticas e ambíguas. A diferença na maneira de falar e lidar com o aluno adolescente e adulto pode estar relacionada a uma concepção naturalizada do adolescente, como afirmam Aguiar, Bock e Ozella (2001). Os professores que atuam em apenas um tipo de ensino, no médio ou no técnico, apresentaram mais diferenças entre um e outro a respeito da indisciplina do que os professores que ministram aulas nos dois tipos de ensino. Talvez, esses últimos, tenham evitado fazer comparações da indisciplina entre um e outro, para que um não seja visto como melhor ou pior que o outro. De modo abrangente, podemos dizer que houve diferenças entre as causas e as alternativas para lidar com a indisciplina, tanto para o ensino médio como para o técnico. As causas da indisciplina foram atribuídas a um conjunto de fatores isolados, principalmente, às questões individuais dos alunos. Por outro lado, quanto às alternativas para lidar com a indisciplina, os dados mostraram que as atitudes relatadas pelos entrevistados envolvem um sistema de relações sociais e aspectos didático-pedagógicos, tais como a maior interação entre 108 professor e aluno, assuntos de interesse dos alunos, outro sistema de aulas, acompanhamento e orientação do professor em relação ao aluno. Concluímos que as representações sociais dos professores sobre a indisciplina ancoram-se, em sua maior parte, num referencial tradicional, que concebe a indisciplina associada à atribuição da responsabilidade ao aluno e à família, talvez construído pela experiência cotidiana em sala de aula. Há também a possibilidade de ancorar-se numa visão naturalista, por entender a adolescência como uma fase da natureza humana, pressupondo uma etapa de crise e turbulência preexistente no adolescente. Tal ideia pode estar relacionada às teorias psicológicas que apresentam uma concepção naturalista e universal do adolescente (AGUIAR, BOCK E OZELLA, 2001). E, ainda, a representação dos professores pode ancorar-se na visão da mídia, pois as notícias sobre indisciplina escolar geralmente culpabilizam os alunos. Os dados foram limitados às representações contidas nos relatos dos professores, que no caso da presente pesquisa abrangeu um pequeno número de sujeitos, que podem não corresponder às ações concretas no contexto da escola. Portanto, avaliamos que estudos posteriores poderiam considerar um número maior de participantes e confrontar os dados com a prática docente, já que nossa proposta foi limitada à identificação das representações presentes no discurso dos professores. A partir dos resultados, percebemos que os professores não possuem um preparo suficiente para lidar com a indisciplina, talvez por serem oferecidos poucos cursos e capacitações, assim como discussões e reflexões sobre o tema. Apesar da produção acadêmica sobre o assunto, as pesquisas não têm alcançado os mais interessados, os professores. Nesse sentido, há grande necessidade de possibilitar aos educadores o acesso às informações e discussões sobre o tema. A escola precisa lidar com a indisciplina de forma coletiva, envolvendo todos os professores, funcionários e alunos, evitando ações isoladas, individuais e fragmentadas. Ela deve abrir espaços para discussão sobre o assunto, todos os atores escolares precisam debater sobre o tema, receber orientações e esclarecimentos sobre as possibilidades de compreender e lidar com a indisciplina. A indisciplina parece apresentar, para os professores, um sentido de desajuste e rebeldia. Talvez, por isso, a forma de lidar com ela seja por meio de atitudes repressivas. Entretanto, a indisciplina apresenta um sentido que geralmente as pessoas não percebem. Ela pode indicar criatividade, espontaneidade, olhar crítico e afinidade com atividades que a 109 escola quase não valoriza, como a arte, a música, o esporte. Neste sentido, relatamos aqui, um exemplo de um aluno da escola pesquisada: conhecido como indisciplinado, praticamente o pesadelo da escola. Ele escrevia músicas com conteúdo de crítica social, tocava violão, cantava e dançava muito bem, e, fora da escola, ensinava capoeira para crianças. Mas não gostava da escola, não estudava, tirava notas baixas e era repetente. Tal aluno era pouco valorizado no ambiente escolar, porque o que é valorizado é a reprodução de conhecimentos e não o pensar sobre eles. É ficar quieto, copiar, tirar nota e não questionar a escola, nem a sociedade. Com este exemplo, podemos destacar que a indisciplina pode ser trabalhada como forma de identificar as potencialidades dos alunos. A escola possui um papel importante no que se refere à indisciplina, no sentido de adotar novas atitudes, diferentes das medidas repressivas, que por si próprias reproduzem a indisciplina. É preciso negociar com a indisciplina, compreender o que os alunos buscam transmitir por meio dela (ZECHI, 2008). Concordamos com as ideias de Longarezi (2001), ao afirmar a importância de trabalhar as noções de liberdade e democracia, juntamente com as noções de responsabilidade e respeito, como condições orientadoras de ações de educadores e alunos, incluindo a família e a escola como parceiras para a construção de uma educação que possibilite uma sociedade mais justa. Para ela, não adianta mais culpar a família. A escola e a família devem trabalhar em cooperação. A educação deve favorecer práticas menos vinculadas aos interesses de poder e mais comprometidas com as necessidades educacionais da população. Neste sentido, a Psicologia pode evitar ações de reparos e consertos e contribuir para a construção de um olhar que considera a complexidade humana, sem reducionismos ou generalismos que impossibilitem a capacidade de compreender o ser humano, para que possamos construir práticas que respeitem a pluralidade humana, com a finalidade de garantir o direito à educação para todos, sejam eles alunos considerados disciplinados ou indisciplinados. Para finalizar, reafirmamos o posicionamento de Zechi (2008) no que se refere ao cuidado e atenção para não reduzir o tema a explicações de uma única dimensão, agrupando a problemática da indisciplina em uma causa única e isolada, desconsiderando o contexto em que está inserida, como características sociais, culturais e históricas. Desse modo, é importante reconhecer a complexidade da temática com suas inúmeras variáveis e interferências que abrangem seu entendimento. RESSALVA CAPA FOLHA DE ROSTO FICHA CATALOGRÁFICA DEDICATÓRIA AGRADECIMENTOS RESUMO ABSTRACT INTRODUÇÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS