UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO unesp PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÂO PRÁTICAS DE UMA DIRETORA DE ESCOLA INICIANTE ATUANTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL KARINA CÉLIA BIANCHINI TORRES Rio Claro – SP 2024 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO unesp PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PRÁTICAS DE UMA DIRETORA DE ESCOLA INICIANTE ATUANTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL KARINA CÉLIA BIANCHINI TORRES Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientadora: Dra. Laura Noemi Chaluh Rio Claro – SP 2024 T693p Torres, Karina Célia Bianchini Práticas de uma diretora de escola iniciante atuante na educação infantil / Karina Célia Bianchini Torres. -- Rio Claro, 2024 153 f. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Instituto de Biociências, Rio Claro Orientadora: Laura Noemi Chaluh 1. Diretora de Escola substituta iniciante. 2. Educação Infantil. 3. Gestão escolar democrática. 4. Escuta ativa. 5. Pesquisa narrativa. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Dados fornecidos pelo autor(a). UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Câmpus de Rio Claro CERTIFICADO DE APROVAÇÃO TÍTULO DA DISSERTAÇÃO: PRÁTICAS DE UMA DIRETORA DE ESCOLA INICIANTE ATUANTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL AUTORA: KARINA CÉLIA BIANCHINI TORRES ORIENTADORA: LAURA NOEMI CHALUH Aprovada como parte das exigências para obtenção do Título de Mestra em Educação, pela Comissão Examinadora: Profa. Dra. LAURA NOEMI CHALUH (Participaçao Virtual) Departamento de Educação / UNESP - Instituto de Biociências de Rio Claro - SP Profa. Dra. MARIA APARECIDA GUEDES MONÇÃO (Participaçao Virtual) Faculdade de Educação / Universidade Estadual de Campinas – SP Profa. Dra. SILMARA DE OLIVEIRA GOMES PAPI (Participaçao Virtual) Departamento de Educação - Setor de Ciências Humanas / Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG Rio Claro, 30 de setembro de 2024 Instituto de Biociências - Câmpus de Rio Claro - Av. 24-A no. 1515, 13506900 ib.rc.unesp.br/#!/pos-graduacao/secao-tecnica-de-pos/programas/educacao/CNPJ: 48.031.918/0018-72. Dedico este trabalho a Ricardo Henrique Torres e a Thifany Helena Torres que estiveram comigo em meus piores momentos de dores físicas e emocionais, sem soltarem jamais as minhas mãos. AGRADECIMENTOS Sou profundamente grata... A Deus, que me fortaleceu para que eu pudesse trilhar esse caminho com sabedoria e coragem... Aos meus pais, Cesar e Solange que me deram a vida. Ao meu marido, companheiro, parceiro, amor da minha vida, Ricardo Torres, que sempre incentivou meus estudos, me apoiando incondicionalmente. À minha filha, Thifany, amiga, cúmplice, que sempre está ao meu lado, que compartilha comigo as melhores risadas... À minha irmã, Káthia, que me dá a mão nos momentos mais difíceis... À minha sobrinha, Yasmin, e ao meu sobrinho, Ian, que me deram a alegria de ser tia... À minha cachorrinha, Cherry, que me ensinou o amor incondicional e o real significado da palavra doação. Saudades eterna... À minha orientadora, mestre e amiga, Laura Chaluh, que sempre foi tão competente, ágil, compreensiva, carinhosa e humana. Ao meu amigo Jeferson, que generosamente me confiou a direção da escola afim de substituí-lo. À minha amiga de mestrado, Gabriela Caritá, cuja aproximação deu-se pelos estudos. Aos colegas do GREEFA que, através dos estudos e da pesquisa, me fazem ser uma educadora e pessoa cada dia melhor. À Keila, aquela que me incentivou a ser pesquisadora e trilhar o caminho acadêmico. À Josiane, minha primeira Diretora de Escola, exemplo de profissional e mulher, que me inspira todos os dias. À minha Vice-Diretora e amiga, Simone, que compartilha comigo a aventura em gerir uma escola democraticamente. À minha amiga e Professora Coordenadora, Thaís Helena, um exemplo de profissional a seguir, que deixa os meus dias mais leves... À Daniele, a auxiliar administrativa da escola, uma profissional comprometida, um grande presente que a escola me deu... Ao Gamaliel, meu psicólogo e amigo, que me incentivou e me auxiliou a acreditar em mim e a construir ferramentas para que eu conseguisse trilhar meu caminho com alegria e audácia... Sem você acredito que nada disso seria possível. Ao neurocirurgião Wellingson Paiva, profissional que me apresentou o pior lado da vida, os meus momentos mais desafiadores, que me proporcionou dar valor aos momentos e não às coisas e que me devolveu a alegria em viver com qualidade e sem dores... Ao cirurgião plástico Daniel Lazo, que está auxiliando-me em reconstruir minha autoestima e meu amor-próprio. À Delaine, minha fisioterapeuta, exemplo de profissional, comprometida, humana, que compartilha comigo cada vitória que alcançamos juntas em busca de um sorriso, de um movimento facial... Às crianças, cuja luz e brilho não se apagam e que são a razão pela qual luto todos os dias e cujos olhinhos me fazem acreditar que dias melhores virão... Enfim, a todos os passageiros e passageiras que, de alguma forma, estiveram presentes no meu trem e compartilharam momentos ao meu lado nessa viagem extraordinária. Meu muito obrigada... Concluo os meus agradecimentos, refletindo que a vida é uma viagem de trem, na qual os passageiros, cada qual em sua particularidade, são as pessoas com as quais dividimos os momentos. Algumas pessoas viajam conosco do início ao fim, outras só passam por nós, mas nos tocam de maneira tão profunda que deixam marcas eternas. Cada estação é um episódio, um capítulo do nosso livro da vida. E durante nossa viagem aprendemos, rimos, choramos, compartilhamos, enfim, vivemos episódios somente nossos, intransferíveis... E, se não for para viver intensamente cada segundo, inclusive os mais rotineiros, não faz sentido estar nesse trem. Que possamos sempre sentir a emoção de novos lugares, diferentes paisagens, variados aromas, cores, sabores... Sensações presentes quando nos aventuramos em conhecer outros territórios... Que a vida se apresente sempre surpreendente!!! Maior Eu sou maior do que era antes Estou melhor do que era ontem Eu sou filho do mistério e do silêncio Somente o tempo vai me revelar quem sou [...] As cores mudam As mudas crescem Quando se desnudam Quando não se esquecem Daquelas dores que deixamos para trás Sem saber que aquele choro valia ouro Estamos existindo entre mistérios e silêncios Evoluindo a cada lua, a cada sol Se era certo ou se errei Se sou súdito ou se sou rei Somente atento à voz do tempo, saberei [...] Somente o tempo vai me revelar quem sou (Black, 2015) RESUMO O presente trabalho objetiva compreender os aspectos constitutivos do Gestor Educacional - Diretora Iniciante da Educação Infantil - no cotidiano escolar do município de Rio Claro a fim de analisar as práticas que exigem a atuação desse profissional. A função do Diretor de Escola é ampla e complexa. Nesse percurso deparo-me com desafios referentes às tarefas desenvolvidas no cotidiano do ofício de ser Diretora de Escola Iniciante durante o ano de 2022. Tratando-se de uma pesquisa narrativa, com fundamentos teóricos em Lima, Geraldi e Geraldi (2015), trago como objeto de estudo minha atuação na função de Diretora de Escola aproximando-me da vivência experienciada com a teoria estudada. Os dados são produzidos a partir de: a) minha agenda pessoal; b) meu diário reflexivo; c) atas das HTPC e, d) atas das reuniões de Conselho de Escola. Dessa forma, inspirada em Ginzburg (1989), procuro indícios e pistas que, lidas e interpretadas em tais documentações, vão tecendo a colcha de retalhos da pesquisa, construindo a trama do vivido, capturando e costurando os acontecimentos e extraindo as lições obtidas ao longo do processo. As discussões teóricas acerca da temática se deram através de levantamento de pesquisas recentes sobre o tema, selecionadas na CAPES, considerando o período de 2018 a 2022, documentos oficiais normativos nacionais, municipais e institucionais. Ser autora-criadora (Bakhtin, 2003) é uma experiência única e intransferível. Nesta obra, na qual contei o meu cotidiano como Diretora de Escola Iniciante através de uma narrativa, desvelei o ser gestora por meio de um olhar exotópico (Bakhtin, 2003) e reflexivo sobre minha prática. Dessa forma, como considerações finais da referida dissertação, extraí quinze lições do tempo que o meu eu-Diretora-pesquisadora vivenciou. Nas lições abordo as inúmeras responsabilidades e atribuições do Diretor de Escola, a impossibilidade de neutralidade desse profissional, a importância do Diretor ser firme e ter ciência de que não agradará todos. Falo sobre a importância do gestor ser acolhedor e oportunizar formação de qualidade para todos os profissionais da escola, a necessidade em dizer as obviedades em palavras e em não ser impulsivo ao tomar decisões. Abordo também o quanto é fundamental manter Parceria com a Professora Coordenadora para realizar um trabalho pedagógico de qualidade e a importância do Diretor delegar e dividir tarefas. Legitimo a importância da escola funcionar em função das crianças e que o Diretor precisa escolher as lutas a enfrentar. Abordo ainda a necessidade em acompanhar o trabalho que os professores realizam e o estabelecimento de parcerias com os familiares. E, finalizo as lições colocando como objetivo da escola de Educação Infantil a criação de memórias felizes na vida das crianças. Almejo, com ousadia, que tais lições tragam para meus colegas de profissão, em especial os Diretores de Escola Iniciantes, a possibilidade em construírem uma escola democrática, que tenha como horizonte a educação de qualidade para todas as crianças e que os educandos, familiares, professores e funcionários possam ser agentes ativos dentro da instituição na qual atuam. Palavras-chave: Diretora de Escola substituta iniciante; Educação Infantil; Gestão escolar democrática; Escuta ativa; Pesquisa narrativa. ABSTRACT The current study aims to understand the constitutive aspects of the Educational Manager - Beginner Principal of Early Childhood Education - in school’s daily life in the city of Rio Claro, in order to analyze the practices that require this professional’s activity. The School Principal role is wide and complex. On this path I came across challenges related to the daily activities developed in the routine of being a Beginner School Principal during the year of 2022. In the case of a narrative research, which is based theoretically on Lima, Geraldi and Geraldi (2015), I bring my performance as a School Principal as my object of study, bringing me closer to the perceptions experienced with the theory studied. The data is produced as of: a) my personal agenda; b) my reflexive journal; c) records of Hours of Pedagogical Collective Work; and d) School Council meeting records. Therefore, inspired by Ginzburg (1989), I look for evidence that, when read and interpreted on those documents, weave the research’s patchwork quilt, building the lived plot, capturing and sewing the events, extracting lessons obtained through the process. The theoretical discussion involving the theme was developed through the mapping of recent research about the topic, selected on CAPES considering the period from 2018 to 2022, and on national, municipal and institutional normative official documents. Being an author-creator (Bakhtin, 2003) is an unique and non-transferable experience. In this essay I talked about my daily life as a Beginner School Principal through a narrative, exhibiting the routine through a reflexive and exotopic glance (Bakhtin, 2003) about my practice. Hence, as final considerations about the said dissertation, I drew fifteen lessons from the time that my I-principal-researcher experienced. In those lessons I address the countless responsibilities of a School Principal, the impossibility of neutrality for this professional, as well as the importance of a Principal to be firm and be conscious that they won’t be able to please everybody. I talk about the importance of a welcoming manager, interested in giving opportunities for all the school professionals to have quality training, and the necessity of showing the obvious through words, not being impulsive when making decisions. I also address how it is fundamental to secure a partnership with the Coordinator Teacher in order to achieve quality work, and how it is important to delegate and divide tasks. I recognize the importance of the school to work for the children, and that the Principal needs to choose the battles they want to face. In addition, I discuss the necessity of closely following the teachers’ work and to establish partnerships with the families. And I end those lessons by saying that creating happy memories in children’s life is the primary objective of an early childhood school. I aim, boldly, that those lessons bring to my professional colleagues, specially the Beginner School Principals, the possibility of building a school that is democratic, and has as its horizon quality education for all the kids. And that learners, families, teachers and employees can be active agents inside the institution in which they perform. Key-words: Beginner Substitute School Principal, Early Childhood Education, Democratic school management, Active listening, Narrative research. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Arquivo elaborado com os dados divididos em documentos e categorias .............. 41 Figura 2 - Carta Polvo......................................................................................................................... 55 Figura 3 - Casinha de Bonecas ........................................................................................................ 65 Figura 4 - Festa de Inauguração da Casinha de Bonecas ........................................................... 66 Figura 5 - Quadro de calendário mensal com tarefas da gestão referente ao mês de outubro/2023 ........................................................................................................................................ 75 Figura 6 - Espaço destinado ao jardim sensorial antes da revitalização do espaço................ 83 Figura 7 - Jardim Sensorial Finalizado ............................................................................................ 83 Figura 8 - Cartaz fixado no refeitório da escola com fragmentos das avaliações preenchidas pelos familiares para reunião de equipe ........................................................................................ 104 Figura 9 - Cartaz fixado no refeitório da escola com fragmentos das avaliações preenchidas pelos familiares para reunião de equipe ........................................................................................ 104 Figura 10 - Cartaz fixado no refeitório da escola com fragmentos das avaliações preenchidas pelos familiares para reunião de equipe ........................................................................................ 104 Figura 11 - Cartaz fixado no refeitório da escola com fragmentos das avaliações preenchidas pelos familiares para reunião de equipe ........................................................................................ 105 Figura 12 - Cartaz fixado no refeitório da escola com fragmentos das avaliações preenchidas pelos familiares para reunião de equipe ........................................................................................ 105 Figura 13 - Espaço coletivo multifuncional - mesas coloridas ................................................... 108 Figura 14: Orquidário ........................................................................................................................ 134 Figura 15: Polvo................................................................................................................................. 136 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Dissertações - Resultado obtidos através de pesquisa bibliográfica realizada no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES em julho/2023 .................................................... 45 Quadro 2 - Teses - Resultado obtidos através de pesquisa bibliográfica realizada no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES em julho/2023 ..................................................................... 47 Quadro 3 - Breve análise dos trabalhos pesquisados no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES – Dissertações e Teses ....................................................................................................... 49 LISTA DE ABREVIATURAS APM Associação de Pais e Mestres CAP Centro de Aperfeiçoamento Pedagógico CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CE Conselho de Escola COMERC Conselho Municipal de Educação de Rio Claro CSU Centro Social Urbano FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação GREEFA Grupo de Estudos, Escola, Formação e Alteridade H/a Hora aula HTP Hora de Trabalho Pedagógico HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo HTPI Hora de Trabalho Pedagógico Individual HTPL Hora de Trabalho Pedagógico Livre LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ONG Organização Não Governamental PC Professor (a) Coordenador (a) PDDE Programa Dinheiro Direto na Escola PEB I Professor de Educação Básica I PPP Projeto Político Pedagógico PR Projeto Recriando SME Secretaria Municipal da Educação de Rio Claro U.E. Unidade Escolar UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio de mesquita” UTI Unidade de terapia Intensiva SUMÁRIO MEMORIAL ............................................................................................................................................. 15 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 28 2. METODOLOGIA .............................................................................................................................. 37 3. SER DIRETORA DE ESCOLA – O QUE É ESTAR NESTA FUNÇÃO? ........................................................ 55 3.1 O QUE É SER DIRETORA DE ESCOLA? DIALOGANDO COM AUTORES ..................................... 57 4. NA GESTÃO NÃO EXISTE SOLIDÃO – PARCERIAS DE SUCESSO .......................................................... 81 4.1 PARCERIA DA DIRETORA COM A VICE-DIRETORA ........................................................................ 84 4.2 PARCERIA DA DIRETORA COM A PROFESSORA COORDENADORA .............................................. 87 4.3 PARCERIA DA GESTÃO COM FAMILIARES, CE E APM. .................................................................. 96 5. GESTÃO DEMOCRÁTICA – UTOPIA OU CONSTRUÇÃO? ................................................................... 111 6. ANGÚSTIAS E INCERTEZAS ............................................................................................................... 117 7. SITUAÇÕES INUSITADAS E DESAFIOS ............................................................................................... 124 8. COMO ESTOU APRENDENDO A SER DIRETORA DE ESCOLA ............................................................ 131 8.1 AS LIÇÕES ................................................................................................................................... 135 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................ 143 15 MEMORIAL Acredito ser importante narrar como cheguei até aqui, por quais trajetos percorri, as pedras, flores, subidas, descidas e obstáculos com que me deparei ao longo de vinte e três anos na educação e, em especial, na Educação Infantil. Venho de uma família muito simples, composta por quatro pessoas. Eu, meu pai, minha mãe e minha irmã. Meus pais sempre lutaram muito para oferecer-nos o melhor. Sou natural da cidade de São Carlos. Morei lá até oito anos de idade e, por questões profissionais do meu pai, mudamos para Rio Claro. Sempre estudei em escola pública. Ao ingressar na Educação Infantil não tive uma experiência muito positiva, pois tive uma professora com uma prática muito agressiva e ostensiva, que gerou em mim um medo tremendo da escola. Após o afastamento dessa professora retornei para o Pré III1, criando boas lembranças dessa fase da minha escolaridade. Uma lembrança bem latente que tenho é do dia do brinquedo, em que cada um poderia levar um brinquedo. Eu sempre levava a minha boneca Barbie e me recordo que adorava brincar com a boneca no tanque de areia, que visualizo como um lugar muito grande de areia branquinha. Talvez, se retornasse a esse espaço hoje, provavelmente não seria tão grande assim. Na primeira série do Ensino Fundamental (atual 2º ano), mudei para uma escola bem maior. Essa escola de Ensino Fundamental, a qual frequentei o 1º e o 2º ano na cidade de São Carlos, em minhas lembranças, era uma escola bem grande, gigante. Após o portão de entrada, havia um caminho largo até o pátio, que parecia não ter fim. O pátio era pouco iluminado, havendo somente a luz natural que o iluminava. Era lá que fazíamos filas para aguardar a professora após o sinal de entrada. A fila sempre era realizada por ordem do tamanho da estatura, sendo o mais baixo na frente e o mais alto por último. Desta forma, cada um tinha seu lugar fixo na fila. Para irmos à sala de aula, a professora era quem direcionava a fila, estando à frente e seguindo nos levando. Para adentrar à sala de aula havia três lances de escadas bem largas, um corredor bem grande e a minha sala era a última do referido corredor. Não havia banheiros no andar superior. Para o recreio e para a saída a professora também direcionava a fila até o pátio. 1Isso foi no ano de 1988. Nos anos atuais o Pré III seria correspondente ao 1º ano do Ensino Fundamental, por se tratar de crianças de 6 anos. 16 Me recordo que, dentro da sala, havia duas lousas, nas quais os alunos ficavam divididos em duas turmas, sendo uma turma dos alunos “fortes”, e a outra turma dos alunos “fracos” - acredito eu que estas eram as crianças que tinham mais dificuldade de aprendizagem. No início do ano letivo, lembro-me de ter tido crises de ansiedade e ir embora constantemente com episódios recorrentes de vômitos, o que me ocasionou uma gastrite desde os 7 anos. Levou um tempo até que eu me adaptasse nessa escola, mas acabei me acostumando e inclusive, gostando da mesma. Estudei nesta escola até a segunda série e, posteriormente, ocorreu a mudança de município da minha família. Minha vida escolar passou a ser rotineira e mudei algumas vezes de escola em decorrência das mudanças de residência. Na oitava série tive uma professora de geografia que me despertou a vontade pela vida acadêmica e passei a sonhar em realizar o Ensino Superior. Possibilidade esta que parecia muito distante em decorrência de, em toda a minha família, tanto por parte de mãe como de pai, ninguém ter cursado o ensino superior; o máximo de escolaridade que atingiram foram cursos técnicos. Então, até aquele momento, não havia pensado na possibilidade. No primeiro ano do Ensino Médio comecei a namorar meu atual marido e, no ano seguinte, engravidei. Foi um choque bem grande, pois sabia da responsabilidade em ser mãe e ter um bebê para cuidar. Eu e meu namorado nos casamos e após quatro meses de casados nossa bebê nasceu. Eu, uma menina de dezessete anos com uma bebezinha no colo, diante da maior responsabilidade da vida de um ser humano. Sabia que, naquele momento, meus sonhos acadêmicos seriam adiados e que meu objetivo era cuidar da minha filha, daquele ser pequeno, tão indefeso, com um cheirinho único, de olhos brilhantes e curiosos, repleta de amor e carinho para dar e receber. Finalizei o segundo ano do Ensino Médio já com a pequena no colo e decidi fazer Magistério a fim de encontrar melhores oportunidades de trabalho. Confesso que a princípio escolhi esse caminho para que pudesse ter a opção de trabalhar apenas meio período, enquanto minha filhinha estivesse na escola. Mas… na caminhada do Magistério surgiu uma fada. Sabe aquelas pessoas com asas coloridas, de brilho radiante e um poder avassalador em demonstrar o quão linda é a profissão de ser professora? Tive esse privilégio e a professora Rosinha fez meus olhos brilharem para 17 a profissão, me possibilitando acreditar que podemos fazer a diferença na vida de nossos alunos e que ser professor é uma profissão incrível. Após o término do curso Magistério, em 2000, decidi adiar o projeto de frequentar o Ensino Superior. Embora tenha recebido ajuda de meus pais e dos pais do meu esposo, não queria transferir a responsabilidade da educação da minha filha, pois sabia o quão importante era poder educá-la com os meus princípios e minhas convicções. Também sabia que a infância passaria e que eu teria muita vida pela frente para buscar conquistas acadêmicas. A pequena foi crescendo, construímos uma relação com muito amor, respeito, carinho e cumplicidade. Sabia que, em algum momento, retomaria meus estudos - algo que tanto almejava. No ano de 2001 trabalhei em uma escola particular no ímpeto de iniciar minha vida profissional. Porém, a escola não compartilhava dos mesmos princípios educacionais que os meus. Princípios esses que deveriam ser pautados no respeito à infância, às singularidades de cada criança, assim como no respeito e ética com cada educador e funcionário que ali trabalhava, aos quais eram totalmente desvalorizados financeiramente assim como violados em seus direitos trabalhistas. Então, no ano de 2002, iniciei minha trajetória na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro como professora eventual. Necessitando de uma renda fixa, no ano de 2004, iniciei um trabalho em um lar provisório para mulheres e filhos em vulnerabilidade, filiado a uma Organização Não Governamental (ONG), como monitora de ensino. Eu trabalhava nos períodos em que minha filha estudava e assim prosseguiu-se até o ano de 2006, no qual, em abril, fui oficialmente contratada como professora em uma escola de periferia da Rede Municipal de Ensino de Rio Claro, lecionando em uma sala de Pré I2. Enfim, um sonho realizado, e ali eu poderia realmente vivenciar o que era ser professora, ter a minha turma durante todo ano letivo, trabalhar seguindo meus princípios educacionais, valorizando a criança como centro do processo educacional, com práticas pautadas nas interações e brincadeiras. 2O Pré I correspondia à criança de 4 anos. Com a Deliberação do COMERC nº001 de 12 de maio de 2011, no qual Fixa Normas Regimentais Básicas para as Escolas do Sistema Municipal de Ensino de Rio Claro/SP, no Título IV, Capítulo II, Artigo 52, no qual organiza os níveis, etapas e modalidades de ensino, no inciso II, denomina Infantil I (Etapa II) as crianças que frequentam a Educação Infantil nas Unidades Educacionais de Educação Infantil do município de Rio Claro/SP. Desta forma, a organização dar-se da seguinte forma: Educação Infantil Etapa I corresponde à crianças de 0-3 anos de idade (Berçário I, Berçário II, Maternal I e Maternal II) e a Etapa II à crianças de 4-5 anos (Infantil I e Infantil II). 18 Também no ano de 2006, decidi retomar meus estudos e me matriculei na Universidade, cursando Pedagogia, em uma faculdade particular da cidade no período noturno, pois, pela manhã ficava com minha filha, à tarde trabalhava e à noite estudava. Penso que foi um momento muito importante para minha formação como educadora o fato de estar atuando como professora e ser ao mesmo tempo, estudante de Pedagogia, porque me recordo que vivenciava na prática muitas teorias estudadas, e as discussões que aconteciam na sala de aula relacionadas ao cotidiano escolar contribuíam muito com as reflexões acerca da educação, até porque, grande parte da minha turma compartilhava da mesma realidade que a minha (trabalhava no período diurno e estudava no período noturno). Ainda sobre minha carreira profissional, quando iniciei em 2006, não tinha experiência, mas uma vontade tão grande em trabalhar, em ser professora, em fazer o melhor para meus alunos, assim como a professora Rosinha, que me inspirou tanto em ser aquela que poderia fazer a diferença nos diferentes lugares que ocupava como educadora. A escola na qual iniciei minha trajetória na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro me proporcionou trabalhar no início da minha carreira com uma Diretora comprometida, dialógica, educada e ética que apoiava as minhas decisões pedagógicas e mostrava sempre a direção quando eu não sabia qual caminho percorrer com meus pequenos, corrigindo quando necessário e auxiliando o meu fazer pedagógico e minhas ideias inovadoras. Trabalhei nesta unidade escolar (U.E.) como professora contratada até o ano de 2009 e em 2010 me efetivei nesta mesma escola. Foi uma alegria tão grande que posso me reportar àquele momento e relembrar as batidas do meu coração. Ao início do ano de 2014, fui convidada a ser Vice-Diretora Substituta por alguns meses nessa mesma escola em que atuava como professora desde 2006. Foi uma experiência enriquecedora e, posteriormente a esse período, ainda no ano de 2014, prestei para o processo de Professora Coordenadora nesta mesma escola e fui eleita. Naquele momento me recordo que estar Vice-Diretora e posteriormente Professora Coordenadora me causou muito medo e diversas inseguranças. Não havia recebido em minhas formações iniciais (Magistério e Pedagogia Licenciatura Plena) formação específica para tais funções. Passei até por algumas teorias relacionadas à gestão democrática, mas, tudo muito teórico que não desvelavam o cotidiano de tais funções. Entendo, como Lima (2022), que existem algumas lacunas nos cursos de 19 formação de professores. A autora afirma que “a literatura sobre a carreira docente e sua formação, destaca que os cursos de formação inicial de modo geral não atendem às necessidades formativas [...] para o exercício da administração escolar” (Lima, 2022, p. 53). E, acrescenta que Por privilegiar o trabalho docente, os cursos de licenciatura destacam tempo insuficiente do currículo de formação inicial para a gestão escolar, sendo necessária a formação continuada para atender às necessidades do trabalho nas escolas (Lima, 2022, p. 53). Bertochi (2021) valida tais posicionamentos acima elencados advertindo que a trajetória formativa dos pedagogos em nosso país é marcada por divergências e indefinições, dificultando traçar um perfil profissional dos futuros Diretores. As argumentações de Mello e Miranda (2020) também afirmam que a bagagem do curso de Pedagogia junto à experiência em sala de aula oferece suporte necessário para poder atuar na direção escolar nos quesitos relacionados às questões pedagógicas. Porém, as autoras consideram que, em relação às questões burocráticas que permeiam a função do Diretor de Escola, o curso não tem oferecido os subsídios necessários para ocupar esse lugar na gestão escolar. Portanto, fui constituindo-me enquanto Gestora Iniciante espelhando-me em figuras positivas e me afastando de modelos negativos de gestores que passaram pela minha vida de estudante e de professora. Também, nesse início, busquei formações, cursos, como meio de sanar as lacunas existentes da formação inicial. Até porque é impossível que a formação inicial dê conta de todos os aspectos constitutivos do ofício de ser professor/gestor. A formação continuada é imprescindível para que tais profissionais se aperfeiçoem e dinamizem sua práxis. O início de carreira é permeado de dúvidas e incertezas. Por mais que Diretor/Vice-Diretor/Professor Coordenador possua experiência como professor, o início em uma nova função e/ou etapa o faz sentir-se, de certa forma, novamente iniciante, reconstruindo uma nova profissionalidade em um ciclo que se refaz constantemente, com características advindas das etapas que atuou (Derisso, 2020). Segundo Derisso (2020), O termo “professor(a) iniciante”, assim, não traria consigo a premissa de que a aprendizagem em um único momento da experiência profissional o torna apto e experiente de modo a transitar nas diversas etapas da educação básica, mas a de que, dependendo da etapa ou modalidade de ensino na qual o(a) professor(a) estiver se inserindo, estará se sentindo iniciante novamente em muitos aspectos (Derisso, 2020, p. 18). 20 Confirmando as ideias acima citadas, Brande (2021), em seus estudos, compartilha com a perspectiva de que em diversos momentos de nossas vidas passamos pelo lugar de iniciante. Lá no início, em 2001, fui professora iniciante, estreando como educadora, sendo tudo novo, arriscando-me em diversas turmas, substituindo muitos educadores, testando práticas-teorias, construindo o meu ofício e constituindo-me como docente. Posteriormente, em 2006, já com minha sala de aula, porém novamente iniciante. Professora iniciante contratada, pela primeira vez com uma mesma turma durante todo o ano letivo. Ali sim, acredito ter sido um grande ícone no meu início de carreira e na minha construção de ser professora da Educação Infantil. Recordo que os momentos formativos que aconteciam dentro da escola foram me constituindo educadora e trago marcas até hoje desse início de carreira. As formações que aconteciam durante as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo3 (HTPC), Hora de Trabalho Pedagógico Individual (HTPI), Reuniões Pedagógicas e, principalmente, nos diálogos estabelecidos em meu diário de bordo, os quais eram compartilhados com a Diretora da escola (na escola não havia ainda Professora Coordenadora), foram extremamente formativos e me constituíram em grande parte na educadora que sou hoje. Posteriormente, em 2014, quando fui eleita4 Professora Coordenadora, estava novamente no lugar de iniciante. Iniciava o percurso de formadora. Entre minhas colegas, eu era a educadora responsável em constituir os espaços formativos e fomentar discussões acerca do processo de ensino aprendizagem da U.E. onde atuava. A experiência em estar como Professora Coordenadora me proporcionou muitos aprendizados e inúmeros desafios. Ser Professora Coordenadora é abrir novos horizontes, contemplar a visão da escola e da educação por outros ângulos e, acima de tudo, aprender constantemente a ter resiliência, sabedoria e muito molejo para mediar as vontades, as necessidades e as urgências que diariamente emergem da escola, num movimento de ir e vir sem fim. 3A Resolução SME 004/2024 de 30 de janeiro de 2024 que “Dispõe sobre a Organização e funcionamento das Horas de Trabalho Pedagógico – HTP, Coletivo, Individual e Livre dos docentes estatutários e contratados na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro para o ano Letivo de 2024”. 4O processo de Eleição para a função de Professor Coordenador dá-se por meio do Decreto 11.578 de 09 de setembro de 2019 que “Regulamenta os procedimentos de designação para função da classe de Suporte Pedagógico de Professor Coordenador, de Profissionais do Magistério estáveis do Quadro 1 e Quadro 2, para exercício nas Unidades Educacionais, da Secretaria Municipal da Educação, nos termos do inciso II do artigo 51 da Lei Complementar 024/2007 e suas alterações e dá outras providências”. No ano de 2014 o Decreto vigente era o nº 9286 de 04 de abril de 2011. 21 Ocupando este lugar de Professora Coordenadora me sentia muito realizada nos momentos formativos e no espiral que os mesmos geram dentro da escola. Por intermédio das formações, as professoras aperfeiçoavam as práticas para com seus alunos e, através das modificações e ajustes em tais práticas, os alunos vivenciavam experiências prazerosas e enriquecedoras. Permaneci na função de Professora Coordenadora até fevereiro de 2017 e, em março, iniciei como Coordenadora da Educação Infantil da Etapa II no Centro de Aperfeiçoamento Pedagógico (CAP) da Secretaria Municipal da Educação (SME) de Rio Claro, onde permaneci até janeiro de 2019. Mais uma vez apresentava-me como iniciante. Estava frente a um novo desafio, uma nova experiência na qual era formadora de um grupo de Professoras Coordenadoras e corresponsável pelo processo de ensino aprendizagem de várias escolas de Educação Infantil. Sobre as diversas fases da vida na qual passamos, Garbosa (2019) reflete o quanto que [...] o desenvolvimento humano não é linear e tampouco passivo, pois os términos e recomeços decorrentes das experiências que desequilibram o estado de conforto propulsionam o indivíduo sempre a um novo estágio, um novo momento da vida [...]. Compreende-se, então, que, de tempos em tempos, o sujeito se depara com momentos determinantes que mudam em certa medida o curso de seu caminhar e o levam à mudança e ao amadurecimento (Garbosa, 2019, p. 40). A experiência em trabalhar na SME foi composta por inúmeras conquistas em questões formativas da Rede Municipal, assim como o contato amplo com todas as escolas de Educação Infantil do município. Os espaços formativos proporcionados às Professoras Coordenadoras e às professoras foram inúmeros e havia retornos muito positivos. A proximidade com as experiências enriquecedoras que as escolas realizavam diariamente foi algo extremamente gratificante, e que me possibilitou aprender muito com minhas colegas de profissão. Formei e fui formada. Em colaboração com minha parceira de profissão do CAP5, a Coordenadora Pedagógica da Educação Infantil Etapa I, realizamos formações com os Professores Coordenadores Iniciantes6, a fim de dar um apoio às colegas e aos colegas iniciantes. 5No CAP da SME a Coordenação da Educação Infantil era composta por duas Coordenadoras que trabalhavam em parceira. Uma da Educação Infantil Etapa I, responsável em coordenar as creches com crianças de 0-3 anos de idade e a outra coordenava a Educação Infantil Etapa II, cujas instituições atendiam crianças de 4-5 anos. 6Não entrarei nos detalhes abordados nesta formação, mas realizamos o curso, por dois anos consecutivos com as PC que estavam iniciando a carreira de PC na Rede Municipal de Ensino de Rio 22 Estudos realizados por Garbosa (2019) apontam que os novos profissionais necessitam de acompanhamento, precisam de apoio e amparo no início de suas carreiras, de forma que os impactos deste início são minimizados quando contam com profissionais que contribuem em sua nova jornada. E foi isso que eu e minha parceira tínhamos como objetivos quando realizamos tal formação. Foi um momento bem relevante e significativo dessa minha passagem pelo CAP. Porém, permaneci neste espaço por apenas dois anos. Trabalhar em um local no qual o diálogo não acontecia, onde as decisões eram impostas e as atitudes não compartilham das mesmas crenças que as minhas, estava me fazendo mal, então, decidi que seria mais prudente retornar à minha sala de aula. Sou extremamente grata ao aprendizado e experiências que obtive nesse período da minha trajetória profissional. Dessa forma, em fevereiro de 2019, voltei a dar aulas com minha jornada de trabalho completa7. No período da manhã trabalhei com uma turma, na época denominada de Projeto Recriando,8 em um bairro distrital da cidade. No período da tarde revezava-me em três escolas diferentes com Projetos Especiais de musicalização e artes na Educação Infantil9, Projeto de leitura no Ensino Fundamental, Projeto de Artesanato e Meio Ambiente no Programa Integra10, também com crianças do Ensino Fundamental. Voltar a dar aulas foi uma experiência enriquecedora e, ao mesmo tempo, um grande desafio, pois pude vivenciar e colocar em prática muitas teorias e muitos estudos que compartilhei com as professoras ao longo das formações. Realizar Claro/SP. A formação foi com o intuito de auxiliar o início de carreira conturbada do Professor Coordenador, de forma a dar suporte nas dificuldades, angústias e no fazer diário desse profissional. 7Na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro/SP o professor PEB I com cargo lotado na Educação Infantil tem jornada de trabalho semanal de 27h/a, distribuídas em 18h/a com aluno, 2 h/a de HTPC, 4 h/a de HTPI e 3 h/a de HTPL. Quando o professor opta em ampliar aulas a jornada máxima de trabalho semanal é de 44 h/a (A Resolução SME 002/2024 de 19 de janeiro de 2024 é a legislação que dispõe sobre o processo de atribuição de classes/aulas no decorrer do ano letivo de 2024). 8Hoje denominado, através da Resolução SME 006/2024 de 31 de janeiro de 2024, no capítulo X, Artigo 47, Programa Integra – Educação em Tempo Integral, que atende “crianças matriculadas na Educação Infantil na mesma Unidade Educacional, em turmas de Maternal II, Infantil I e Infantil II” (Rio Claro, 2023, p.02). Tais crianças permanecem na escola 7 a 10 horas diárias. 9Projeto Especial e Projeto de Leitura estabelecido e regularizado através da Resolução SME 006/2024 de 31 de janeiro de 2024. 10O Programa Integra – Educação em Tempo Integral - Ensino Fundamental nos anos iniciais (contraturno) foi organizado através da Resolução SME 006/2024 de 31 de janeiro de 2024, para crianças do 1º ao 5º ano por meio de oficinas pedagógicas organizadas em torno de 4 (quatro) eixos: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Raciocínio Lógico-Matemático, Esportes e Lazer e Meio Ambiente e Vida no Campo. 23 propostas diferenciadas, expressar minha criatividade de maneira ímpar, refletir sobre minha prática e minhas crenças foi transformador, assim como, também foi uma possibilidade de retornar aos doces momentos com os pequenos, curtir as falas, as experiências, os sorrisos, fracassos e sucessos do ofício de ser professora. Enfim, um ano de muita leveza e alinhamento da alma. Ao final do ano de 2019 recebi uma ligação surpreendente do Diretor de uma escola que me convidava para ser Vice-Diretora e, como o mesmo estava afastado exercendo a função de Supervisor de Ensino, eu seria sua Diretora Substituta em uma escola de Educação Infantil da Etapa I11, para o ano letivo de 2020. Foi um convite inesperado e que fez sentir-me muito honrada. Pensei bastante no convite e nas responsabilidades que tal função requeriam, porém, aceitei o desafio e então, em fevereiro de 2020, iniciei como Diretora Substituta em uma escola de Educação Infantil Etapa I da Rede Municipal da Educação de Rio Claro. Dessa forma, mais uma vez ocupava o lugar de iniciante, agora como Diretora Substituta de Escola. A escola era bem pequena, com 65 alunos de 0 a 3 anos, situada em um local de fácil acesso da cidade. A comunidade era bem participativa e fui muito bem recebida. Escolhi uma Vice-Diretora para compartilhar a direção; na escola já havia uma Professora Coordenadora. Iniciamos o ano com muitas propostas e muitos sonhos. A meta era articular a comunidade a fim de realizar algumas melhorias que o prédio necessitava, pois o espaço físico da escola era bem limitado e inadequado para o atendimento das crianças. A sala do Berçário I não tinha nenhuma janela, as salas de aula eram bem pequenas, o Berçário II compartilhava o mesmo banheiro que as outras turmas e, para as turmas utilizarem o banheiro, tinham que passar pelo pátio, o que, em dias frios e chuvosos era bem inadequado. A sala da direção ficava longe do restante da escola e a Professora Coordenadora não tinha sala própria, ficava alocada no pátio ou refeitório da escola. Enfim, os espaços eram pequenos e adaptados para ser escola. Após aproximadamente um mês do início das aulas, houve a pandemia de Covid-19 e a escola fechou as portas. A princípio, pensou-se que seria algo rápido e passageiro. Porém, não foi como imaginávamos e a pandemia se estendeu por muito tempo. 11A Rede Municipal de Ensino de Rio Claro/SP organiza a Educação Infantil em Etapa I, com turmas de Berçário I (crianças de 0-1 ano), Berçário II (1-2 anos), Maternal I (2-3 anos) e Maternal II (3-4) e Etapa II, com turmas de Infantil I (crianças de 4 anos) e Infantil II (5 anos). 24 Mês a mês, tínhamos a esperança de que tudo retornaria o mais breve possível, mas, não foi a realidade. E vendo o tempo que estava levando, eu e a Vice-Diretora iniciamos um trabalho de melhorias na escola, como pintura das paredes, pequenos reparos, organização dos espaços, construção de jardim sensorial, entre outras coisas, a fim de que o espaço se tornasse mais agradável para as crianças com o retorno presencial. Nesse momento, o trabalho presencial não havia sido retomado, porém, voluntariamente, iniciamos essas melhorias. Por esse motivo, não havia a possibilidade de mais pessoas auxiliando. Após alguns meses, em agosto de 2020, a escola retornou somente com a Equipe Gestora e alguns funcionários, a fim de iniciar propostas remotas para as crianças. Foi um período bem difícil, com inúmeros desafios para a equipe escolar e para as famílias, muitas incertezas e sobrecarga de responsabilidades. Ainda no ano de 2020, com o intuito de refletir sobre a escola, participar de momentos formativos e me auxiliar como Diretora de Escola Iniciante, comecei minha participação no GREEFA (Grupo de Estudos, Escola, Formação e Alteridade), o que me proporcionou, naquele momento e, ainda me proporciona, refletir sobre a escola em um ângulo mais amplo e humano. Cabe salientar que a busca por participar deste grupo não foi algo aleatório. Durante os anos de 2014, 2015, 2016 e 2017 participei de várias formações com a professora Laura (orientadora deste trabalho) e com outros participantes do grupo. Desta forma, a linha de estudos abordada no grupo era, e é, algo com a qual me identifiquei desde o início, e estar nesse espaço formativo enriqueceria minha atuação como Diretora de Escola Substituta Iniciante. Estar iniciante em uma função, em meio a uma pandemia, me causou muitas aflições e angústias. Embora experiente em outros cargos e funções, ali, naquela função específica de Diretora de Escola, estava sendo a primeira experiência profissional. García (1999), partindo das ideias de Burke, Fessler e Christensen (1984), coloca que “é possível que os professores também experienciem este começo [estado de iniciação] quando mudam para outro nível, outra escola, ou quando mudam de região” (Burke; Fessler; Christensen, 1984, p.14-15, apud García, 1999, p. 114). Aqui, estendo tal colocação do professor García trazendo minha mudança de função na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro, sendo agora, iniciante como Diretora de Escola. Entrelaçado a tudo isso, algumas questões de saúde começaram a afligir o meu cotidiano. Descobri inesperadamente, em fevereiro de 2020, um tumor cerebral 25 (benigno, mas um tumor). Meu chão caiu, minha alma saiu do corpo, receber uma notícia dessas não foi nada fácil, e pior do que receber a notícia, seria transmiti-la àqueles que amo. Porém, após diversas opiniões médicas, naquele momento, não havia preocupação, somente, manter uma rotina de acompanhamento constante. E, prosseguiu-se dessa maneira. Vida que segue. A vida é equilíbrio, um pêndulo, nunca totalmente lá, nem cá. Um ir e vir sem fim. Ao mesmo tempo, me efetivei novamente, em um segundo cargo na Educação Infantil. Fiquei muito feliz, algo que almejava a tempo, para tranquilizar minha rotina, caso futuramente retornasse à sala de aula. Na escola, iniciamos o ano letivo de 2021 remotamente e, o ano todo praticamente, seguiu-se nesse modelo de ensino, retomando o ensino híbrido em outubro de 2021 em formato de escalonamento, com a frequência opcional às famílias. Ao final do ano de 2021, no processo de remoção da rede, o Diretor da Escola removeu-se para uma escola de Educação Infantil de Etapa II12, localizada na região central da cidade, com 120 alunos de 2 a 6 anos. Iniciei como Diretora Substituta nessa nova escola em fevereiro de 2022 - dessa vez, totalmente presencial. A escola já possuía Professora Coordenadora, que por sinal, realizava um trabalho em que a formação continuada e a garantia de espaços formativos dentro da escola possuíam grande destaque, assim como o acompanhamento do trabalho de cada professora e de cada criança, respeitando as diferenças e estimulando as potencialidades dos educadores e educandos. Ter como parceira para desenvolver o trabalho pedagógico uma profissional cuja prática condizia com as mesmas convicções que as minhas deixou-me muito entusiasmada, pois já conhecia o trabalho realizado pela mesma. Me acompanhou a mesma Vice-Diretora que havia levado anteriormente. A escola era e continua sendo um local muito agradável, com organização impecável, estrutura física adequada para o atendimento das crianças, salas de aulas amplas e espaço externo extenso e arborizado. O fundo da escola é a Floresta Estadual Navarro de Andrade, repleta de árvores, com aparições constantes de animais silvestres, o que tornam os dias mais felizes e harmoniosos. Frescor florestal, sons da natureza, cheirinho de terra molhada, combinações perfeitas para trazer leveza à rotina. Nas questões pedagógicas, a escola realiza um trabalho com 12Como mencionado anteriormente, composta por crianças de 3-6 anos, com turmas de Maternal I, Maternal II, Infantil I e Infantil II. 26 propostas diferenciadas e voltadas a oferecer experiências significativas aos pequenos, tendo como eixos norteadores os jogos e as brincadeiras. Uma equipe de trabalho conectada e comprometida. A Direção da Escola gera muitas incertezas, dúvidas, medos e angústias, sentimentos que perpassam esse lugar de Diretora. Demorei muito tempo para sentir- me dona desse lugar, pois sendo iniciante e substituta não me sentia realmente “ocupante” dessa função. O que é ser Diretora de Escola? O que é ser Diretora Substituta de Escola? O que é sobretudo ser Diretora Substituta Iniciante? Que espaço é este que ocupo? Ocupar esse espaço me apavorava (e ainda me apavora), porque, tradicionalmente, “[...] é o diretor que, de acordo com a lei, responde, em última instância, pelo bom funcionamento da escola” (Paro, 2010, p. 266), mas também, de certa forma, me dava a esperança em fazer diferente e contribuir nesse lugar que estava. E as dúvidas? Quantas dúvidas! A cada dia uma nova demanda, hora documental, outras vezes relacional, burocrática, enfim, quantas descobertas. Ser Diretora é ter vários olhos, buscar vários olhares, colocar-se no lugar do outro e muitas vezes, abdicar do seu. Ser empática, solidária, firme, sensível, correta, justa, democrática. E, como ser tudo isso junto? Como saber em qual momento ser o que? Ótima pergunta, ainda não sei! Estou buscando com a prática aprender, me aprimorar. Confesso que o ano de 2022 foi repleto de aprendizado. Iniciar pós pandemia foi ainda mais desafiador, pois com tudo isso vieram os medos, as inseguranças da equipe e sobretudo, dos pais. Será que tais dúvidas, inseguranças e incertezas vem do fato de eu ser iniciante? Afinal, de fato, o ano de 2022 foi o primeiro ano que atuei com a escola funcionando normalmente. Nos anos anteriores, como já relatado, estávamos vivenciando a pandemia e o funcionamento da escola estava bem restrito, com, na maioria do tempo, demandas meramente burocráticas e documentais. Não existe receita pronta, é no fazer diário que nos tornamos profissionais melhores, que corrigimos nosso fazer, que transformamos nossa prática através da reflexão-ação-reflexão. Nunca estaremos prontos o suficiente, sempre haverá vírgulas, um novo parágrafo, um novo capítulo, uma nova história. E educação é isso, um inacabamento infinito, um transformar-se transformador. 27 E lembram do tumor que descobri no início de 2020? Após acompanhamentos constantes, ele cresceu e a pior notícia da minha vida veio em dezembro de 2021: o tumor deveria ser retirado, em uma cirurgia muito delicada de altíssimo risco. Havia acabado de receber a notícia que tinha sido aprovada na Pós- Graduação, estava em uma escola dos sonhos e parecia que, como em um filme, seria necessário que todos esses projetos dessem uma pausa, para que o foco naquele momento fosse minha saúde, quer eu quisesse ou não, pois, "Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma/ Até quando o corpo pede um pouco mais de alma/ A vida não para [...]13" (Falcão; Lenine, 1999). A espera para que a parte burocrática da cirurgia fosse liberada foi um período bem doloroso e reflexivo. Passei a olhar a vida e as pessoas de forma totalmente diferente. Até que o dia mais temido chegou, e realizei a cirurgia em quinze de abril de 2022. A cirurgia foi bem demorada, foram 11 horas na mesa cirúrgica e tudo foi um sucesso. O pós-cirúrgico foi bem doloroso e sofrido, repleto de sessões de fisioterapia, terapias e fonoaudiologia. E, como que em um passe de mágica, após um mês retornei à minha vida, e pude “dar play” novamente e retomar de onde havia parado. Sou a mesma? Não, com certeza não. Nem fisicamente e muito menos interiormente. A Karina do dia 14 de abril ficou naquela mesa de cirurgia e, se eu soubesse que algumas coisas mudariam, e que “nada do que foi será/ de novo do jeito que já foi um dia14” (Lulu Santos, 1983) teria feito mais coisas antes, coisas tão simples, mas que jamais serão iguais, como por exemplo, ouvir as músicas “Hallelujah15” (Pentatonix, 2016) e “Bohemian Rhapsody16” (Queen, 1975) incansavelmente, com os efeitos sonoros que as mesmas produzem, pular como louca balançando a cabeça, olhar-me no espelho, prender os cabelos para cima, agradecer por tomar uma simples dipirona, pentear os cabelos, brincar de “gato mia” para descobrir de onde vem o som, cochichar e deixar que sussurrem em meu ouvido. Enfim, valorizar as coisas mais bobinhas da vida, que não percebemos serem tão importantes, visto que "a vida vem em ondas/ como um mar/ num indo e vindo infinito porque tudo o que se vê não é/ 13“Paciência” - Música lançada em 1999; Compositores: Carlos Eduardo Carneiro De Albuquerque Falcão / Oswaldo Lenine Macedo Pimentel; letra completa disponível em: https://www.letras.mus.br/lenine/47001/. 14“Como uma onda” - Música lançada em 1983; Compositores: Lulu Santos / Nelson Motta; letra completa disponível em: https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/. 15Música completa disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LRP8d7hhpoQ. 16Música completa disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fJ9rUzIMcZQ. https://www.letras.mus.br/lenine/47001/ https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/ https://www.youtube.com/watch?v=LRP8d7hhpoQ 28 Igual ao que a gente viu há um segundo/ Tudo muda o tempo todo no mundo17" (Lulu Santos, 1983). Após a primeira cirurgia aqui relatada, ocorrida em abril 2022, até novembro de 2024, quando finalizo esse trabalho, foram mais seis cirurgias, inúmeros desafios pessoais, dentre eles uma paralisia facial... Momentos doloridos e sofridos para o meu corpo e minha alma. Estou em busca de superar e ressignificar as dores a cada novo dia, muitas aprendizagens envolvidas. Bom, por fim, acredito que essa é minha trajetória até o presente momento. É claro que a partir da minha lente, do meu filtro. Não teria como colocar somente minha vida profissional, pois sou humana e os acontecimentos da vida perpassam a vida profissional em um espiral na horizontal. Hoje, estando na função de Diretora Substituta de Escola, os desafios são inúmeros, porém, a experiência do tempo de profissão e dos acontecimentos da vida me fazem buscar várias lentes, diferentes pontos de vista. Na busca constante de diminuir a ânsia de que tudo tem que ser resolvido imediatamente e com grande perfeição, busco diariamente atuar profissionalmente com mais leveza e na certeza de que não teremos a solução para tudo e que, na escola, não conseguiremos resolver todos os problemas, até porque, muitos deles escapam às nossas mãos. É claro que os que estão ao nosso alcance são resolvidos e estes não são poucos, porém, o mantra “respira, inspira e não pira” é recitado mentalmente em uma constância triunfal a fim de desacelerar os pensamentos e ter atitudes mais assertivas. 17“Como uma onda” - Música lançada em 1983; Compositores: Lulu Santos / Nelson Motta; letra completa disponível em: https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/. https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/ 28 1. INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta como objetivo geral compreender os aspectos constitutivos do Gestor Educacional - Diretora Iniciante da Educação Infantil - no cotidiano escolar do município de Rio Claro, a fim de analisar as práticas que exigem a atuação desse profissional. Desta forma, almejando alcançar o objetivo geral acima elencado, foram definidos como objetivos específicos: ● Compreender minha trajetória como Diretora de Escola Substituta Iniciante, a fim de analisar as ações que tem como horizonte uma gestão democrática; ● Identificar as funções do Diretor de Escola em documentos oficiais; ● Mapear e analisar as produções científicas que abordam a temática da gestão escolar, problematizando as contribuições específicas em contextos escolares. Tenho uma experiência bem ampla na Educação Infantil. Iniciei minha carreira na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro como professora eventual por alguns anos e, posteriormente, fui contratada por 4 anos consecutivos, tornando-me professora efetiva em fevereiro de 2010. Sempre atuei na Educação Infantil. Me identifico com os pequenos e acredito que fazemos extrema diferença na vida de cada educando. A Educação Infantil é a fase dos encantamentos, das descobertas, da curiosidade, do questionamento, dos olhos brilhantes e fervorosos por novidades e isso me leva a querer ser cada dia melhor. Ao estar no lugar de Diretora compreendo que tenho responsabilidade com a formação das crianças e em pensar uma proposta pedagógica que atenda às necessidades dos pequenos. Corroboro com as ideias de Oliveira (2011), ao afirmar que pensar uma proposta pedagógica para a Educação Infantil requer promover condições para que no interior da instituição ocorram interações entre as crianças de diferentes idades, entre as crianças e adultos em diversas situações, “construindo significações acerca do mundo e de si mesmas, enquanto desenvolvem formas mais complexas de sentir, pensar e solucionar problemas, em clima de autonomia e cooperação” (Oliveira, 2011, p. 49). Pensar a Educação Infantil é instigante e desafiador, sendo a etapa da educação básica aquela que me conquistou desde o início da minha carreira, visto que, nada é previsível, tudo é construído em ricas situações de experiências proporcionadas aos pequenos. 29 Habitei vários lugares profissionais. Sou professora, estou como Diretora Substituta, fui Coordenadora da Educação Infantil da Etapa II, fui Professora Coordenadora, fui Vice-Diretora, sou mãe, sou mulher, fui criança. Experiências enriquecedoras que me constituem a cada dia uma humana e uma profissional melhor, mais reflexiva, mais sensível e inacabada. Como afirma Paulo Freire (2015), consciente do meu inacabamento, sei que posso ir além dele. Trago o conceito de experiência contemplado por Benjamin (1994) no qual o narrador conta o que retirou de sua própria experiência, transmitindo-a e construindo a narrativa como um ofício manual, artesanal, de forma que, ao narrar experiências advindas de minhas vivências e memórias, trago aspectos que me permitem construir a trama daquilo que pretendo construir. Como narradora, não posso ser indiferente aos acontecimentos e nem tampouco irresponsável com as palavras. Como humana, estou em constante formação, nunca estou e/ou estarei completa e, como profissional da educação, não é diferente. Dessa forma, sou “mais do que um ser no mundo” (Freire, 2022, p.20), sou [...] uma presença no mundo, com o mundo e com os outros. Presença que, reconhecendo a outra presença como um ‘não eu’ se reconhece como ‘si própria’. Presença que se pensa a si mesma, que se sabe presença, que intervém, que transforma, que fala do que faz mas também do que sonha, que constata, compara, avalia, valora, que decide, que rompe (Freire, 2022, p.20). Como gestora de uma instituição de Educação Infantil, tenho a tarefa diária de sonhar, constatar, comparar, avaliar, valorar, decidir e romper. Sonhar com uma educação melhor e de qualidade, constatar que a realidade nem sempre é favorável, comparar o ontem do hoje e ver que, em pequenos passos, os avanços acontecem, avaliar as possibilidades, as atitudes e as consequências, valorar as pequenas conquistas, decidir caminhos e romper com atitudes mesquinhas e preconceituosas. A Educação Infantil tem um histórico marcado por origens filantrópicas e assistencialistas, de tal forma que eram destituídas responsabilidades do Estado para essa etapa de educação, principalmente para crianças de 0 a 3 anos de idade. Foram necessárias muitas lutas sociais para que as crianças passassem a ter direitos garantidos para frequentar tal etapa da educação básica. Segundo Monção (2013). Esse é um aspecto importante para identificar as especificidades da educação infantil, que desde sua origem trilha caminhos muito diferentes dos da escola de ensino fundamental e médio, tendo sua natureza vinculada ao 30 papel que a família, a mulher e a criança ocupam historicamente na sociedade, além de sua expansão ser apoiada por movimentos sociais (feminista e de direitos humanos) cuja convergência de lutas promoveu o reconhecimento da criança como sujeito de direitos na legislação (Monção, 2013, p. 69). A Constituição Federal de 1988 colocou como direito social das crianças de zero a seis anos de idade o atendimento em creches e pré-escolas e, firmou como dever do Estado para com a Educação. Posteriormente, com a LDB em 1996, a Educação Infantil integrou-se à Educação Básica, igualando-se ao Ensino Fundamental e Médio. Com a mudança inserida na LDB no ano de 2006, no qual antecipou o acesso ao Ensino Fundamental para os 6 anos de idade, a Educação Infantil passou a atender a faixa etária de zero a cinco anos de idade (Brasil, 2017). Segundo a legislação, [...] embora reconhecida como direito de todas as crianças e dever do Estado, a Educação Infantil passa a ser obrigatória para as crianças de 4 e 5 anos apenas com a Emenda Constitucional nº 59/200926, que determina a obrigatoriedade da Educação Básica dos 4 aos 17 anos. Essa extensão da obrigatoriedade é incluída na LDB em 2013, consagrando plenamente a obrigatoriedade de matrícula de todas as crianças de 4 e 5 anos em instituições de Educação Infantil (Brasil, 2017, p. 36). Dessa forma, a Educação Infantil, através de legislações e lutas populares, adquiriu muitos direitos e o caráter assistencialista aos poucos está dando espaço para uma perspectiva educacional, com especificidades próprias, tendo como “finalidade o desenvolvimento integral da criança de zero a cinco anos de idade em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, linguístico e social, complementando a ação da família e da comunidade” (Brasil, 2023, p. 24). Partindo desse pressuposto, para que a criança tenha o direito em desenvolver- se integralmente, cabe às instituições de Educação Infantil “a necessária articulação entre cuidado e educação, a centralidade das brincadeiras e das relações sociais no currículo [...] e o compartilhamento da educação da criança entre educadores e famílias” (Monção, 2013, p. 77). Portanto, é importante que as experiências proporcionadas às crianças dentro das instituições incluam “o acolhimento, a segurança, o lugar para a emoção, para o gosto, para o desenvolvimento da sensibilidade” (Bujes, 2001, p.21), o desenvolvimento social, o domínio do corpo, do espaço e das expressões, tendo como lugar privilegiado a curiosidade, o desafio e oportunidades investigativas (Bujes, 31 2001). Enfim, como educadora, concebo a Educação Infantil como o território das potencialidades. Obstante os avanços que a Educação Infantil conquistou até o momento, deparo-me diariamente com inúmeros desafios frente à função e as especificidades de tal etapa da educação. Dessa forma, para que os papéis e funções de uma etapa tão específica e crucialmente importante na vida dos pequenos sejam de fato instituídos, enquanto gestora, vejo-me no dever de abrir caminhos para que a ação formativa aconteça diariamente dentro da instituição escolar de tal forma que a Educação Infantil seja concebida como territórios potentes “nos quais a criança possa ser criança, e que nós, adultas, possamos perceber que sua vida é algo que pode e deve ser vivido por inteiro” (Gobbi, 2009, p. 131) e, como aponta Galzerani (2005), que enquanto educadores [...] questionemos o nosso olhar em relação à criança, que passemos a encará-la na sua inteireza e nas suas singularidades [...], que nos aproximemos de fato deste universo infantil; que saibamos romper esses muros, esses hiatos, construídos culturalmente entre o adulto e a criança, entre o mundo do adulto e o mundo da criança, universos tão distintos, tão hierarquizados (Galzerani, 2005, p. 65). Como forma de garantir as singularidades infantis dentro da instituição na qual atuo, reitero a importância da formação continuada, proporcionada em serviço. Como gestora, tenho a responsabilidade de ser precursora de tais momentos, para que os mesmos aconteçam nas Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), durante as Horas de Trabalho Pedagógico Individual (HTPI), reuniões formativas com toda a equipe escolar, e afins. Não valorizar e não contribuir com os momentos formativos é condenar a escola e a educação à fadiga, à mesmice, a fazer por fazer. “Quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (Freire, 2022, p.25). A formação continuada proporciona refletir criticamente sobre a prática. Tal reflexão torna-se imprescindível ao educador. Conforme pontua o Parecer 02/2015, “a formação continuada deve se efetivar por meio de projeto formativo que tenha por eixo a reflexão crítica sobre as práticas e o exercício profissional e a construção identitária do profissional do magistério” (Brasil, 2015, p. 34). Libâneo (2018) pontua que a formação continuada é um modo diferente de ver a formação dos professores, visto que aspira envolver os educadores em práticas que vão além do desenvolvimento pessoal do profissional, envolvendo os professores em 32 formações que considerem a organização da U.E., do currículo e outras esferas da escola que o profissional atua. Reiterando tais ideias, eu, enquanto gestora, acredito que a formação continuada em serviço é a mais valiosa, legítima. As temáticas, os estudos, são direcionados à realidade do grupo de educadores, assim como às dificuldades apresentadas por eles. Quando a formação é geral e/ou vem de fora, muitas vezes, não contempla as reais dificuldades que cada escola está enfrentando, ficando dificultoso atingir problemas mais pontuais. Quando as formações são realizadas no contexto da escola e para o grupo da unidade, “o professor é instigado a ganhar autonomia profissional, a refletir sobre sua prática, a investigar e construir teorias sobre seu trabalho” (Libâneo, 2018, p. 71). Afinal de contas, nada satisfaz mais um formador como ver seus formados autônomos e reflexivos sobre seus fazeres didáticos. O professor transforma-se em um pesquisador quando percorre caminhos em busca da construção de sua autonomia profissional, enriquecendo-se de práticas e conhecimentos, quando aprende a resolver problemas, mesmo os imprevisíveis. Saber dar respostas criativas, construir estratégias, inventar, descobrir - eis as qualificações de um profissional autônomo. O professor engessado, aplicador de regras já estabelecidas, não cabe mais dentro das escolas (Libâneo, 2018), acrescento ainda, será que em algum momento da história, coube? Sem reflexão a teoria torna-se palavras ao vento e a prática transforma-se em ativismo (Freire, 2022), visto que, tais reflexões devem ser pautadas “na necessária articulação entre cuidado e educação, a centralidade das brincadeiras e das relações sociais no currículo da Educação Infantil e o compartilhamento da educação da criança entre educadores e famílias” (Monção, 2013, p. 79). Ser educadora, estar na educação e, em especial na Educação Infantil, implica refletir sobre ações, estar em constante formação, compartilhar ideias e compartir a educação das crianças pequenas com seus familiares, ser rede de apoio, de forma que “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança18". Corroborando com tais ideias, Monção (2013) aborda em seus estudos que, O compartilhamento da educação na ótica democrática requer formação e qualificação adequadas para os educadores e a possibilidade de analisar as práticas cotidianas com as famílias bem como sua articulação com o projeto 18Provérbio africano. 33 pedagógico; requer uma prática permanente de pesquisa e reflexão crítica sobre como se dá a educação coletiva das crianças em espaços públicos (Monção, 2013, p. 82). Ser gestora iniciante em uma instituição pública de Educação Infantil é desbravar o desconhecido, é andar por caminhos nunca habitados em minha existência profissional. Por mais que esteja atuando na educação há anos, e que já tenha tido a experiência em estar como gestora nas funções de Vice-Diretora e Professora Coordenadora, a função de Diretora é algo novo, que me coloca novamente como iniciante. Sendo assim, como referência para traçar o meu ser gestora, busquei modelos profissionais que passaram por mim em meus anos como profissional do magistério. Referências positivas e negativas. Acredito ter tido bons exemplos, em minha trajetória, sobre e como gerir uma escola. As referências positivas me inspiram até hoje e as que não foram boas me mostraram atitudes que eu não quero fazer enquanto gestora. Como profissional, independente do lugar que ocupo, busco meu aprimoramento formativo através de estudos, leituras, vídeos, entre outros materiais que possam me auxiliar na caminhada. Também, sempre participo de formações oferecidas por Universidades e pela Secretaria Municipal de Educação de Rio Claro na busca de constante movimento dialógico com profissionais de diferentes áreas. Dessa forma, no ano de 2021, participei do curso oferecido pela SME “Formação técnico-administrativa para Diretores e Vice-Diretores de escola”, com uma carga horária de 60 horas. Essa formação contribuiu significativamente no início de minha carreira como gestora visto que o curso abordou questões burocráticas do trabalho cotidiano do Diretor de Escola, como o preenchimento e realização de documentações diversas. Posteriormente, no ano de 2022, também promovida pela SME, realizei a formação “Refletindo acerca do Projeto Político Pedagógico” com carga horária de 30 horas. O curso era voltado para além de questões burocráticas e documentais. Proporcionou conteúdos humanísticos e de relações interpessoais que desencadearam reflexões acerca do meu fazer cotidiano dentro da escola. É perceptível que a administração da SME, que iniciou sua vigência em janeiro de 2021 e com término previsto para dezembro de 2024, tem uma preocupação constante com a formação dos Diretores de Escola, assim como com a formação dos Professores Coordenadores, proporcionando diversas formações em serviço para as 34 equipes gestoras das unidades educacionais. Vale ressaltar que no ano de 2023 algumas formações foram direcionadas para os Diretores ingressantes dos anos de 2021 e 2022 e que não pude participar, visto que iniciei na função em 2020. Porém, participei de outras formações oferecidas durante o ano que não eram direcionadas aos ingressantes. Segundo Garbosa (2019) o apoio efetivo das Secretarias de Educação com formações e assessoramento aos ingressantes em cargos da educação é extremamente importante como forma de minimizar impactos. Acredito que estar em constante movimento formativo contribui significativamente para que eu vislumbre caminhos amplificados e para que eu possa refletir sobre a escola e, principalmente, sobre minha função e os percursos escolhidos. Partindo desse pressuposto, (Lima, 2022, p. 53) reflete que “a formação permanente das diretoras deve fomentar o desenvolvimento pessoal, profissional e institucional, potencializando um trabalho colaborativo baseado numa reflexão para transformar a prática”. Acrescento que só é possível efetiva transformação da prática quando nos deparamos com conflitos e buscamos soluções em estudos, em discussão com parceiros mais experientes. Quando repassamos os acontecimentos, refletindo sobre, e buscamos novos caminhos possibilitamos confrontarmos com nós mesmos e com reflexões acerca de nossa práxis. Ninguém reflete no vazio, ninguém cresce e amadurece profissionalmente somente praticando, é preciso embasar-se teoricamente e manter-se aluno. Dessa forma, a fim de refletir minha prática e o caminho trilhado durante essa pesquisa, no capítulo intitulado como “Ser Diretora de Escola - O que é estar nesta função?”, inicio relatando sobre o desenho de uma carta de tarô construída por mim para expressar o que é ser Diretora de Escola e o cotidiano dessa profissional. Também relaciono o gestor com um polvo, por encontrar semelhanças entre o Diretor de Escola e o referido animal. Finalizo o capítulo trazendo algumas concepções enraizadas enquanto estudante e a superação de tais concepções. Posteriormente, no subcapítulo 3.1, trago a reflexão do que é estar nesta função, em especial no início de carreira e a constituição desse profissional. Também são abordadas as legislações vigentes do Município de Rio Claro – SP, que descrevem as atribuições gerais e específicas deste profissional, e são descritos os requisitos para o ingresso do Diretor de Escola. Através da análise de alguns documentos, busco refletir as atribuições e funções deste profissional descritas oficialmente e aquelas tarefas ocultas, mas que 35 são realizadas cotidianamente dentro da instituição de Educação Infantil onde atuo. O ponto central do subcapítulo afirma que o Diretor de Escola tem que considerar, na sua prática, tanto a esfera administrativa como a pedagógica, isto porque são indissociáveis. Também abordo a dinâmica do trabalho, como as demandas, a rotina e as tarefas semanais são organizadas e, por fim, os imprevistos que acontecem, as conquistas, as responsabilidades que requerem a função, os desafios e as parcerias firmadas. No capítulo 4, “Na Gestão não existe solidão – Parcerias de sucesso”, abordo parcerias que o Diretor necessita para realizar um trabalho de qualidade. Também contemplo a composição da gestão escolar e as respectivas funções da Vice-Diretora e da Professora Coordenadora, conforme legislações municipais, e friso a importância em realizar um trabalho que atenda aos mesmos objetivos, delegando tarefas e compartilhando decisões. No capítulo 5, “Gestão democrática - utopia ou construção?", aponto os desafios enfrentados para a participação ativa dos familiares e comunidade escolar. Abordo a política de prestação de contas dos gastos financeiros realizados pela escola que atuo e os possíveis caminhos para construir uma gestão democrática e participativa. A difícil tarefa de tomar decisões é contemplada no capítulo 6 “Angústias e incertezas”, no qual também trago a importância do diálogo, da escuta ativa e de assumir a autoridade que me cabe enquanto Diretora de Escola. No capítulo 7, “Situações inusitadas e desafios”, compartilho o relato de alguns acontecimentos incomuns, engraçados e desafiadores que eu, enquanto Diretora, vivenciei no ano de 2022. Finalizo a dissertação com o capítulo 8 intitulado “Como estou aprendendo a ser Diretora de Escola”, em que relato a experiência única em realizar uma pesquisa narrativa da minha própria prática como Diretora Substituta de Escola Iniciante na Educação Infantil, de forma que adentro em minha constituição na função. Trago uma analogia da Diretora de Escola com a Karina orquidófila, em que ambas precisam de um olhar apurado e cuidadoso com cada pessoa/orquídea e as transformações que vivi durante a pesquisa e no decorrer da minha escrita. E por fim, no subcapítulo 8.1, titulado como “As lições”, trago quinze lições extraídas durante o processo formativo, assim como as reflexões que a pesquisa narrativa suscitou em mim. Também, ouso abordar a pesquisa aqui descrita como 36 forma a vir a contribuir com o início de carreira dos futuros Diretores de Escola, que ocuparão o cargo e/ou função, na Rede Municipal de Ensino de Rio Claro – SP ou em outras redes/instituições de ensino. 37 2. METODOLOGIA Para atender aos objetivos explicitados anteriormente, neste capítulo, debruço em traçar o caminho metodológico traçado por mim durante a referida pesquisa. A perspectiva teórico-metodológica utilizada para minha investigação foi a pesquisa narrativa, isto porque pesquisar “sobre a própria experiência é sempre uma pesquisa sobre o singular” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 33). A beleza e a singularidade que a pesquisa narrativa proporciona, através do relato do que nos toca, do que nos modifica durante todo o processo, é extremamente desafiadora, sendo “[...] uma pretensão metodológica de aproximação entre o mundo vivido e o mundo da teoria” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 38), através de um processo humanizador e participativo, o qual proporciona reconstruir significados e novas compreensões da experiência vivenciada. Com veemência Lima; Geraldi e Geraldi (2015) apontam que: Tomar como objeto de estudo uma experiência da qual se é o protagonista resulta em uma pesquisa com um estatuto epistemológico diferente daquele que, tradicionalmente, rege certo tipo de pesquisa científica (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 31). Desta forma, quando se pesquisa a própria experiência, “não se tem de saída uma pergunta, mas uma história” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 32). Sendo a pesquisa uma história vivida e posteriormente narrada, o modo de investigação é único e imprevisível, cercado de singularidades jamais repetidas, em que os materiais produzidos se tornam dados, na qual procuramos por pistas que irão delinear a estrutura da obra e, a partir da qual, será possível analisar e compreender um determinado período recortado e contado pelo narrador. Desta forma, a Diretora desprende-se após um tempo do vivenciado e torna-se a narradora/pesquisadora, a fim de analisar o vivido, vasculhando as minúcias, de forma que a palavra narrada transmite a experiência19 em que eu vivi, sendo única e exclusiva, um tesouro a ser desvelado (Douek, 2003). Dessa forma, a narrativa é uma forma de transmitir minha experiência, e a experiência narrada é perpetuada pelos que a ouvem, e de certa forma, são transformadas ao serem recontadas. Toda palavra é “portadora de experiência” (Douek, 2003, p. 64). 19A experiência da narrativa é potente porque traz em seu germe outras muitas histórias. Benjamin (1994) assemelha a potencialidade da narrativa às sementes de trigo “que durante milhares de anos ficaram fechadas hermeticamente nas câmaras das pirâmides e que conservam até hoje suas forças germinativas” (Benjamin, 1994, p. 204). 38 Cada instante vivenciado é único, insubstituível (Douek, 2003). Assim, a partir de tais vivências únicas e exclusivas do narrador, emergem reflexões de um tempo vivido, com um movimento exotópico proposto por Bakhtin (2003, 2010), como salientam Zanfelice e Bonotto (2020) Estas experiências do vivido dão à luz lições que derivam dos significados produzidos a partir do movimento exotópico proposto por Bakhtin (2003, 2010), o que torna possível refletir sobre nossas falas e ações no contexto de trabalho/pesquisa antes, durante e um tempo depois de nossos encontros com estes outros que nos constituem no espaço da educação infantil. (Zanfelice; Bonotto, 2020, p. 159). Saliento que a perspectiva de pesquisa aqui abordada extraiu lições do tempo vivido, contrapondo-se desta forma, a “uma pesquisa nos moldes positivistas que deseja a universalidade, a generalização... com aquele que quer mais compreender do que verificar” (Rosalen, 2019, p. 100). Assim, “o conhecimento singular corresponde à verdade que não se generaliza (pravda), mas da qual se extraem conselhos ou lições” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 33). Reiterando, o termo “pravda”, este “diz respeito à verdade local, àquela do acontecimento particular, singular, submetido às constrições do momento e do espaço” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 21), opondo-se dessa forma à verdade “istina”, aquela “obtida por abstração e generalização com base no que se repete nos acontecimentos particulares” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 21). A pesquisa narrativa é o caminho metodológico escolhido por mim, visto que é um lugar potente de palavra, em que a minha prática pedagógica ganha voz em um processo de penetração profunda, vendo o mesmo “de fora”, com um outro olhar, distanciando-me da minha própria história em um movimento exotópico. Zanfelice (2021) aborda que a pesquisa narrativa ocorre em dois tempos, sendo o primeiro o tempo vivido, o qual refere-se ao tempo daquela Diretora Iniciante que se debruçava em todas as suas atribuições, e o segundo o tempo revivido, no qual se assume enquanto pesquisadora com olhar exotópico, distanciando-se dos acontecimentos para colocá-los em diálogo e reflexão. Diante do exposto, a análise sistemática, a interpretação racional dos documentos utilizados e dos dados produzidos durante a pesquisa “costuma ser a prova da autoridade, da validade e da seriedade de uma pesquisa” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 31). Desta forma, cada pesquisa é singular, única, construtora da própria estratégia metodológica e, neste sentido: 39 O investigador distancia-se, então, da própria história para cotejar o tema com outros textos, outras vozes. A profundidade da penetração neste novo objeto dependerá precisamente do diálogo que vier a ser estabelecido com os outros (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 33). Sendo assim, tal estudo narra o vivido, o acontecido. Eu sou a narradora e o ponto chave de toda a narrativa. Segundo Lima, Geraldi e Geraldi (2015, p.24) “o modo narrativo está intimamente dependente das experiências do narrador e do narratório”. Portanto, as experiências vivenciadas por mim, durante todo o ano de 2022, são extremamente relevantes e fomentadoras das reflexões de tal escrita. Detenho-me aqui ao conceito de experiência contemplado por Benjamin (1994), baseando-se na arte de narrar e intercambiar momentos experienciados, na qual “ela tem sempre em si, às vezes de forma latente, uma dimensão utilitária. Essa utilidade pode consistir seja num ensinamento moral, seja numa sugestão prática, seja num provérbio ou numa norma de vida” (Benjamin, 1994, p. 200), em que se extraem conselhos a partir da experiência vivida e contada. Benjamin compara a arte de narrar como um trabalho artesanal, manual que “se imprime na narrativa a marca do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso” (Benjamin, 1994, p. 205). Dessa forma, os vestígios do oleiro “estão presentes de muitas maneiras nas coisas narradas, seja na qualidade de quem as viveu, seja na qualidade de quem as relata” (Benjamin, 1994, p. 205). Neste processo, torna-se imprescindível a arte da escuta, no qual Douek (2003), a partir da perspectiva benjaminiana, afirma que sem a escuta as palavras narradas perdem-se ao vento de tal forma que as narrativas não são retidas e tornam- se impossibilitadas de serem recontadas, tendo nessa trama a memória como papel imprescindível. Trazendo a ideia de Benjamin, o pesquisador, nesse processo de escuta, narrativa, memória e experiência, precisa ter clareza sobre para onde quer olhar e vasculhar a fim de “postar-se como um garimpeiro em busca de preciosidades” (Cassão; Rosalen, 2020, p. 90) escondidas, camufladas nas documentações. Do trabalho cotidiano dentro da escola realizado pela Diretora Iniciante, foi reunido um inventário, a fim de vasculhar tais preciosidades. Segundo o dicionário da língua portuguesa, "inventário" significa “listagem detalhada das propriedades deixadas pela pessoa que morreu, para que a partilha 40 dos bens seja efetuada” (Dicio, 202420). Dessa forma, abordo aqui "inventário" como os documentos abaixo listados, a fim de garimpar21 os dados e produzir as lições que serão extraídas no decorrer da pesquisa. Tais documentos geraram, no decorrer do ano de 2022, escritas que foram subsídios na formação do inventário, o qual “consiste em organizar os documentos (os achados, os guardados) e as novas informações obtidas em função da retomada da história e do tema” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 34). Segundo Rosalen (2019, p. 189) “[...] as preciosidades de um garimpo não são encontradas por acaso ou por pura sorte, mas sim como consequência de um trabalho árduo, diuturnamente cheio de sacrifícios, suor, paciência, insistência, estudo e reflexão”. Desta forma, o meu inventário de documentos foi constituído por escritas produzidas durante o ano de 2022, tais como: ● minha agenda pessoal com os compromissos e tarefas a serem realizadas diariamente; ● meu diário reflexivo com registros de fatos e memórias dos acontecimentos da escola; ● atas das HTPC; ● atas das reuniões de Conselho de Escola (CE). Outros documentos faziam parte do meu acervo como Diretora e pesquisadora: atas das reuniões de APM, atas numeradas de reuniões diversas22 e registros de conversas. Diante da diversidade de documentos, foi necessário fazer escolhas para atender o objetivo da pesquisa. Dessa forma, após diversas leituras, grifos e marcações, junto com minha orientadora, optamos por analisar os quatro documentos acima citados. Revisitar os registros produzidos, os materiais guardados e os trechos sublinhados é tarefa crucial em uma pesquisa narrativa. Neste movimento de revisitação das ferramentas utilizadas durante a pesquisa, eu, a pesquisadora, garanto que não estou me fundamentando somente em minhas memórias, que muitas vezes, com o passar do tempo, podem não ser fidedignas. Porém, nesse movimento 20Pesquisa realizada em dicionário online na página: https://www.dicio.com.br/inventario. 21Me refiro ao termo garimpar neste trabalho no sentido de “procurar meticulosamente indícios que, como a própria palavra nos diz, nos indicam os caminhos percorridos” (Rosalen, 2019, p. 107). 22Percebe-se que este documento aparece na Figura 1 (Figura Error! Main Document Only.: Arquivo elaborado com os dados divididos em documentos e categorias), visto que foi o último material a ser descartado, de forma que já estava comtemplado na tabela. 41 de investigação muitas memórias foram revisitadas, legitimando as documentações e, segundo os autores supramencionados, tais “memórias se tornam visíveis como dados, porque reconhecidas como tais ganham contorno no conjunto da história” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 33). A fim de facilitar a análise do inventário produzido durante todo o ano de 2022, na busca por indícios e pistas (Ginzburg, 1989) que permitiram elaborar posteriormente a estrutura da obra, elaborei um arquivo, dividido por categorias em forma de tabela. As linhas da tabela se referem aos documentos analisados e as colunas aos eixos levantados durante o garimpo realizado nas documentações. Tudo foi minuciosamente selecionado e distribuído de forma que, visualmente, eu conseguisse acessar cada registro rapidamente, facilitando dessa forma, a vasculha de tais documentos. A figura abaixo ilustra uma das tabelas elaboradas com os inventários que foram investigados. Figura 1 - Arquivo elaborado com os dados divididos em documentos e categorias Fonte: Acervo pessoal da autora (2023) Explicando melhor a tabela, os eixos deste trabalho foram elaborados a partir do garimpo nas documentações, sendo dessa forma, sete eixos: “Diretora auxilia PC com situações difíceis” (cor amarela); “Envolvimento da Diretora no Pedagógico” (cor 42 laranja); “Parceria entre PC, Vice e Diretora” (cor rosa); “Situações inusitadas e reflexões” (cor azul); “Direção com diferentes funções” (cor verde); “Intervenções na HTPC” (cor cinza) e “Gestão Democrática” (cor roxa). Cada documento utilizado como inventário na minha pesquisa foi exposto na linha da tabela (Registros de fatos e memórias; Atas de HTPC; Atas numeradas reuniões diversas; Agenda; Atas de CE) Todos foram enumerados e grifados com cores diferentes a fim de criar eixos para agregar temáticas. Os registros de fatos e memórias produzidos durante o ano de 2022, por exemplo, foram enumerados, totalizando 39 registros. Foi durante a leitura e análise de cada documento que criei os eixos citados acima a fim de facilitar ainda mais minhas buscas durante a escrita dessa dissertação. Fui ainda selecionando os trechos de cada registro nos quais citavam os eixos categorizados e adicionando-os na tabela como comentário, de tal forma que, quando eu precisasse recorrer a cada um, era somente clicar em cima do número na coluna específica, que a citação do registro produzido apareceria. Confesso que foi um processo trabalhoso, porém, facilitou demais durante a escrita e, também ficou visual e acessível para acessar as informações que eu necessitava em diferentes momentos da produção do texto. Após finalizada a tabela e iniciada a escrita do trabalho, percebi a necessidade em juntar alguns eixos levantados inicialmente. Então, as colunas “Diretora auxilia PC com situações difíceis” (cor amarela), “Envolvimento da Diretora no Pedagógico” (cor laranja), “Parceria entre PC, Vice e Diretora” (cor rosa) e “Intervenções na HTPC” (cor cinza) tornaram-se um único eixo com algumas subdivisões. A coluna “Direção com diferentes funções” (cor verde) tornou o eixo “Ser Diretora de Escola – o que é estar nessa função?”, as outras duas colunas permaneceram iguais, compondo dois eixos. A partir do que foi emergindo durante as escritas, foi criado um novo eixo “Angústias e incertezas”, o que comtemplou um pouco de cada coluna da tabela. Adentrando a escrita do trabalho e os registros produzidos durante a pesquisa, também foi necessário inserir o eixo “Como estou aprendendo a ser diretora de Escola” e finalizo com o subeixo “As lições”. Desta forma, tal tabela veio como forma de minimizar minhas inquietações relacionadas à escrita desta dissertação. Muitas incertezas, inseguranças e angústias perpassam nessa caminhada de escritora/narradora e se, de alguma forma, mesmo que trabalhosa, eu pudesse encontrar meios para que os caminhos percorridos e os 43 diálogos estabelecidos ficassem evidentes, assim eu faria. E nessas andanças acadêmicas, compartilho das mesmas angústias citadas por Chaluh (2008) Uma delas tem a ver com o aparecimento das vozes dos sujeitos da escola, dos meus outros da escola. Como fazer para que, na escrita [...] tenham luz/vida/existência as vozes dos meus outros da escola? Como dar conta na escrita da dialogia? Quais as formas/caminhos que vou procurar para efetivamente mostrar que na escola existiam/existem sujeitos, e não objetos, sujeitos que falam e que produzem tanto quanto eu, pesquisadora? (Chaluh, 2008, p.5) As palavras do outro tem contexto, não são isoladas, recortadas. Nesse sentido, considero a [...] corrente clássica em Ciências Humanas onde a palavra do outro é desprovida de seu caráter enunciativo, enquadrada e depurada a tal ponto pelos questionários, as escalas de medida, etc. que a palavra se torna comportamento e deixa de ser enunciação dirigida a alguém (Amorim, 2004, p.17). Desta forma, eu, enquanto pesquisadora, preciso, mesmo que através de recortes, manter o contexto. Então, como afirmado por Amorim (2004), “não há trabalho de campo que não vise ao encontro com um outro que não busque um interlocutor. Também não há escrita de pesquisa que não se coloque o problema do lugar da palavra do outro no texto” (Amorim, 2004, p.16). Levando em consideração tais apontamentos, não posso ignorar e nem esquecer que, para além de mim, locutora que falo, produtora de escrita e pesquisadora, “também há os sujeitos da pesquisa que falam e produzem textos tanto quanto nós” (Chaluh, 2008, p.5). Assim, os indícios, as pistas lidas e interpretadas nas documentações vão tecendo a colcha de retalhos e “recorremos ao paradigma indiciário no momento da construção da trama da produção escrita porque esse nos permite encontrar pistas para construir/reinventar acontecimentos vividos que entrelacem aquilo que queremos contar” (Peres; Chaluh, 2020, p. 60) de tal forma que eu, enquanto pesquisadora, reconstruo a trama do vivido costurando, capturando os acontecimentos registrados e aqueles que permaneceram na memória “tentando achar um sentido diferente para aquilo que, aparentemente, se apresentava isolado” (Peres; Chaluh, 2020, p. 61). Portanto, na pesquisa narrativa, dois objetos de estudos iniciais podem ser levantados, sendo eles a história narrada e a “lição que se extrai da narrativa” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 33), tarefa nada fácil. Desta forma, a aproximação, o estabelecimento da afetividade com a comunidade escolar e a busca de relações com o que me afeta durante todo o percurso traçado são pontos chaves para se obter êxito 44 nessa pesquisa, proporcionando singularidade na maneira de ver e compreender a escola. “O passado não é estático, sempre redefine-se através das compreensões e redefinições que dele fazemos no momento presente” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 39). Compreensões e redefinições do passado proporcionam reflexões e novos caminhos a serem traçados através das experiências vividas que possibilitam lições. Segundo Douek (2003), “a reconstrução do passado só é possível a partir do presente de quem a escreve, [...]. É no e pelo presente que se reconstroem as imagens do passado” (Douek, 2003, p. 81). Desta forma, "as narrativas da experiência são o lugar de onde o pesquisador extrai uma moral, um conselho, lições” (Lima; Geraldi; Geraldi, 2015, p. 39). Tais lições viabilizam que não ocorram os mesmos erros do passado, modificando resultados no momento presente. Paralelamente às documentações analisadas, em 21 de maio de 2023, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, a fim de gerar uma discussão com pesquisadores sobre a temática. As discussões teóricas acerca da temática se deram por meio da busca no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) dos anos de 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022. Realizei a pesquisa no Catálogo de Teses e dissertações da CAPES com os seguintes descritores: “gestor de escola” and “início de carreira” and “diretor de escola”, sem nenhum refinamento, e obtive o resultado de 85.699 trabalhos, que contemplavam diversas áreas de conhecimento como saúde, ciências sociais, administração pública e arquitetura. Após essa busca inicial coloquei alguns refinamentos, a fim de filtrar os trabalhos conforme a área de atuação. O refinamento se deu da seguinte forma: no ícone “grande área conhecimento” assinalei somente o campo “ciências humanas”, na “área de concentração” e “nome programa” foi assinalado o campo “educação”, obtendo o total de 1664 trabalhos. Analisando os títulos dos 1664 achados, foram descartados trabalhos cujos títulos não condiziam com a temática estudada, abordando, por exemplo, temáticas sobre disciplinas específicas como matemática, educação física, entre outras. Dessa forma, como filtro final, foram selecionados, através dos títulos, 38 trabalhos, sendo 20 dissertações e 18 teses que poderiam possibilitar discussão com a temática estudada. Porém, após a leitura dos resumos dos 38 trabalhos, foram descartadas 21 produções pelo fato de não conversarem com a temática. Das 21 produções, 15 45 trabalhos descreviam sobre professores iniciantes, 2 produções abordavam a vertente sobre educação, cultura e sociedade, 1 escrita trazia a temática sobre educação física, 1 dissertação sobre o professor como gestor em sala de aula e 2 trabalhos se repetiam, sendo um destes sobre professores iniciantes e o outro trabalho repetido sobre educação, cultura e sociedade. Desta forma, foram selecionados, para discussão teórica, 17 trabalhos, sendo 8 dissertações e 9 teses, conforme descritos abaixo no quadro 1 e no quadro 2: Quadro 1 - Dissertações - Resultado obtidos através de pesquisa bibliográfica realizada no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES em julho/2023 TÍTULO AUTOR (ES) ORIENTADOR (A) ANO DE PUBLICAÇÃO UNIVERSIDADE CIDADE/ ESTADO A GESTÃO E A ORGANIZAÇÃO DAS ESCOLAS/TURMAS MULTISSERIADAS NOS MUNICÍPIOS DE BARRA DE SANTANA E BOQUEIRÃO – PARAÍBA. ROSA AMÉLIA DE QUEIROZ BARROS MARIA DO SOCORRO SILVA 2020 UFCG CAMPINA GRANDE, PB APRENDENDO A SER DIRETORA DE ESCOLA SENDO”: UM OLHAR PARA AS APRENDIZAGENS DE DIRETORAS INICIANTES. CARLA VALERIA FARIAS LIMA CELSO LUIZ APARECIDO CONTI 2022 UFSCAR SÃO CARLOS, SP A QUEIXA ESCOLAR E O OS GESTORES ESCOLARES MUNICIPAIS: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DA TEORIA HISTÓRICO- CULTURAL.