VVINICIUS MOURA MENDONÇA Impactos pluviais na cidade de Presidente Prudente–SP Presidente Prudente São Paulo 2011 VINICIUS MOURA MENDONÇA IIMMPPAACCTTOOSS PPLLUUVVIIAAIISS NNAA CCIIDDAADDEE DDEE PPRREESSIIDDEENNTTEE PPRRUUDDEENNTTEE--SSPP PRESIDENTE PRUDENTE - SP 2011 VINICIUS MOURA MENDONÇA IIMMPPAACCTTOOSS PPLLUUVVIIAAIISS NNAA CCIIDDAADDEE DDEE PPRREESSIIDDEENNTTEE PPRRUUDDEENNTTEE--SSPP Monografia apresentada ao Conselho do Curso de Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente – Universidade Estadual Paulista, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientadora: Profª. Drª. Margarete Cristiane de Costa Trindade Amorim PRESIDENTE PRUDENTE - SP 2011 FICHA CATALOGRÁFICA Mendonça, Vinicius Moura. M497i Impactos pluviais na cidade de Presidente Prudente-SP / Vinicius Moura Mendonça. - Presidente Prudente : [s.n], 2011 128 f. : il. Orientador: Margarete Cristiane de Costa Trindade Amorim Trabalho de conclusão (bacharelado - Geografia) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Inclui bibliografia 1. Clima Urbano. 2. Chuva. 3. Impacto pluvial. I. Amorim, Margarete Cristiane de Costa Trindade. II. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. III. Impactos pluviais na cidade de Presidente Prudente-SP. III A meu pai e minha mãe, pelo amor, apoio e exemplo de vida. IV AGRADECIMENTOS A Deus, por sua inspiração, pelo pão de cada dia, pela saúde, amor, e por fornecer uma nova oportunidade de viver a cada manhã. Agradeço. Aos meus pais, “Side” e “Zezé”, pelo carinho, paciência, exemplo de vida, e amor, presente em cada ato. Enfim, obrigado por sonhar comigo o meu sonho, e assim tornando-o concreto. Igualmente, agradeço a Vanessa (irmã) e ao Nicolas (“lindão” do tio). Agradeço também a todos meus avós (in memoriam), tios e primos. Valeu! À Talita, pela paciência, carinho e incentivo, e por todos os bons momentos que passamos juntos. Obrigado! Aos bons e verdadeiros amigos, os quais com toda certeza trouxeram bons momentos, e fizeram parte de minha vida. Enfim, pelo incentivo, apoio, momentos de debate (polêmicos), ou mesmo aqueles de relax (embalados pelo tereré), risadas, e diversos outros motivos. Um abraço especial para aqueles mais próximos, “Shinoby”, “Nino”, Matheus, Murilo, Calebe, “Well”, “Tuka”, Hadassa, Quezia, Tainá, pessoal da “Luz Vermelha” (“um salve aí pra rapa dos sujeitos suspeitos do Paranapanema”). E outro abraço para aqueles que contribuíram para que se chegasse até aqui, para os amigos de Penápolis que vou guardar pra sempre comigo, professores (em especial ao Professor Luiz, que veio a me apresentar a verdadeira Geografia), ao pessoal da Geografia de Presidente Prudente, principalmente a Turma 51, enfim, a todos aqueles que de certa forma tiveram uma convivência, seja no dia a dia, ou mesmo nos “corredores da vida”. Lembranças a todos! À Margarete, em especial, pois, desde o começo tem dado seu voto de confiança à minha formação científica, dando seu apoio, ao que inicialmente era vazio e cheio de dúvidas, e hoje, apesar de todas as dificuldades, se torna concreto. Obrigado também pelas sugestões, incentivos, e pelas conversas. Meus sinceros agradecimentos! Ao pessoal do GAIA e dos outros grupos de pesquisa, pelas contribuições, apoio, e pelas boas conversas acompanhadas quase sempre de um cafezinho. Ao pessoal da Estação Meteorológica da FCT-UNESP, pelo fornecimento dos dados V para este estudo. E ainda, aos funcionários da Biblioteca e do Jornal “Oeste Notícias” pelo auxilio nas análises dos jornais na hemeroteca. À Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente, da Universidade Estadual Paulista, pela formação acadêmica como geógrafo, pelos professores, os quais contribuíram para além de uma simples formação acadêmica, e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, pelo incentivo financeiro ao estudo, essencial durante todas suas fases. E por fim, à cidade de Presidente Prudente, palco deste ensaio, e ensaio de minha vida. VI “Se não puder se destacar pelo talento, vença pelo esforço.” Dave Weinbaum VII RESUMO Os eventos extremos pluviométricos quando ocorrem em cidades sem um prévio planejamento capaz de suportar tais episódios, trazem certo desconforto para a população e seu habitual modo de vida. Os impactos registrados nos ambientes urbanos estão associados, na maioria das vezes, à inadequação do uso e ocupação do solo urbano. Assim, através deste estudo buscou-se analisar os impactos deflagrados por eventos de precipitação na cidade de Presidente Prudente, baseando-se principalmente no referencial teórico-metodológico Sistema Clima Urbano, em especial, no Subsistema Hidrodinâmico, proposto por Monteiro (1976). Assim, procurou-se analisar os transtornos que ocorreram na dinâmica socioambiental da cidade durante os eventos de precipitação mais expressivos. Para isto foram analisados os dados quantitativos da Estação Meteorológica da FCT/UNESP de Presidente Prudente e também dados qualitativos por meio dos registros dos jornais da cidade. Para as análises quantitativas foram utilizados os dados da estação meteorológica do período de 1969 a 2009, e para as análises qualitativas foi considerado este mesmo período. Através desse estudo, foi possível conhecer e estudar a distribuição espacial dos problemas sociais e ambientais deflagrados pela precipitação no ambiente urbano de Presidente Prudente e também entender a dinâmica desses impactos. Portanto, com este estudo pretende-se contribuir com os órgãos públicos de gestão urbana para que eles possam tomar medidas preventivas para diminuir os impactos em época de chuvas intensas, visando assim, à melhoria da qualidade de vida. PALAVRAS-CHAVES: Clima urbano. Chuva. Impacto pluvial. Problemas socioambientais. Presidente Prudente. VIII LISTA DE FIGURAS Figura 01 – Fatores que intervêm na formação do clima urbano 27 Figura 02 - Esboço do perfil de uma ilha de calor e o aumento pluviométrico em uma grande área urbana 29 Figura 03 - Diagrama do S.C.U. e sua articulação, segundo os canais de percepção . 33 Figura 04 - Canal III – Impacto Meteórico (Subsistema Hidrodinâmico) 36 Figura 05 - Localização da área de estudo 39 Figura 06 - A expansão da estrada de ferro Sorocabana 40 Figura 07 - Evolução e crescimento de Presidente Prudente - 1923/2004. 44 Figura 08 - Atuação dos principais sistemas atmosféricos sobre Presidente Prudente. 52 Figura 09 - Características dos sistemas atmosféricos na América do Sul 57 Figura 10 - Tipos climáticos da região Sudeste. 58 Figura 11 - Prédio da estação Meteorológica da FCT-UNESP de Presidente Prudente. 61 Figura 12 - Fórmulas usadas para os cálculos estatísticos. 52 Figura 13 – Médias trimestrais dos totais de precipitação no Brasil. 64 Figura 14 – Tipologia pluviométrica anual de Pres. Prudente (1969-2009). 67 Figura 15 – “Cratera na Avenida Tancredo Neves” - Presidente Prudente. 90 Figura 16 – “Inundação no estacionamento do Prudenshopping”. 91 Figura 17 – “Inundação no Parque do Povo”. 91 Figura 18 – “Cratera engolindo carro na Rua João Gonçalves Foz em Presidente Prudente”. 94 Figura 19 – “Impactos no ambiente urbano de Pres. Prudente, no período de 2 a 7 de Janeiro de 2007". 96 Figura 20 – Desabamentos e queda de árvores em Pres. Prudente, 27/01/09. 97 Figura 21 – Diferentes visões da Avenida Washignton Luiz sobre o Córrego do Bacarin. 100 IX Figura 22 – Diferentes visões do fundo de vale do Córrego do Bacarin. 100 Figura 23 – Localização dos pontos principais abordados na primeira década (1969- 1978). 101 Figura 24 – Na foto da esqueda, a Rua Bahia, na Vila Marcondes, e na da direita, a Rua Xingú, na Vila Furquim. 102 Figura 25 – Localização dos pontos principais abordados na segunda década (1979- 1988). 103 Figura 26 – Diferentes visões do fundo de vale na Avenida Ana Jacinta (entre a COHAB e Jd. Santa Paula). 104 Figura 27 – Fundo de vale entre os bairros Jardim Monte Alto, Jardim Sabará e Parque Cedral. 105 Figura 28 – Trechos da Avenida Tancredo Neves, na Zona Leste de Presidente Prudente. 106 Figura 29 – Rua João Carneiro Mendonça, na Vila Brasil. 106 Figura 30 – Rua Alexandre Bacarin, no Parque Alvorada. 107 Figura 31 – Trechos do Parque do Povo. 107 Figura 32 – Localização dos pontos principais abordados na terceira década (1989- 1998). 109 Figura 33 – Exemplo de inundação no Parque do povo (30/11/2009). 111 Figura 34 – Trecho do Jardim Vale do Sol. 111 Figura 35 – Jardim Humberto Salvador. 112 Figura 36 – Conjunto Brasil Novo. 114 Figura 37 – Localização dos pontos principais abordados na quarta década (1999- 2009). 115 Figura 38 – Centro e Camelódromo. 116 X LISTA DE MAPAS Mapa 01 - Localização de Presidente Prudente no Estado de São Paulo 38 Mapa 02 - Localização das áreas de exclusão social de Presidente Prudente 47 Mapa 03 - Presidente Prudente: Ocupação do solo. 48 Mapa 04 - Localização de Presidente Prudente no mapa geomorfológico do Estado de São Paulo. 49 Mapa 05 –Classes de declividade do perímetro urbano de Presidente Prudente. 50 Mapa 06 – Mapa Geomorfológico do perímetro urbano de Pres. Prudente 51 Mapa 07– Localização dos impactos associados à precipitação em Presidente Prudente-SP no período de 1969 a 1978. 103 Mapa 08 – Localização dos impactos associados à precipitação em Presidente Prudente-SP no período de 1979 a 1988. 108 Mapa 09 – Localização dos impactos associados à precipitação em Presidente Prudente-SP no período de 1989 a 1998. 110 Mapa 10 – Localização dos impactos associados à precipitação em Presidente Prudente-SP no período de 1999 a 2009. 113 Mapa 11 – Localização dos impactos associados à precipitação em Presidente Prudente-SP no período de 1969 a 2009. 117 XI LISTA DE QUADROS Quadro 01 - Mudanças climáticas produzidas pela cidade. 28 Quadro 02 - Total e média, mensal e anual da precipitaço em Presidente Prudente- SP (1969-2009). 62 Quadro 03 – Critério para a classificação de anos extremos. 67 Quadro 04 – Frequência porcentual da tipologia pluviométrica. 70 Quadro 05 - Construção do jornalismo e da notícia. 73 Quadro 06 – Frequência dos impactos socioeconômicos urbanos do município de Presidente Prudente. 76 Quadro 07 – Quadro síntese da tipologia dos impactos socioeconômicos urbanos do município de Presidente Prudente-SP. 86 XII LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01 – Total pluviométrico anual em Presidente Prudente (1969-2009). 63 Gráfico 02 – Precipitação média mensal em Presidente Prudente (1969-2009). 64 Gráfico 03 – Distribuição sazonal da precipitação em Presidente Prudente (1969- 2009). 65 Gráfico 04 – Distribuição mensal de precipitação em Presidente Prudente (1969- 2009). 65 Gráfico 05 – Precipitação média mensal em Presidente Prudente e suas amplitudes, desvios padrão e coeficientes de variação (1969-2009). 66 Gráfico 06 - Números de dias com chuva no ano em Presidente Prudente-SP (1969- 2009). 66 Gráfico 07 – Número de notícias anuais relacionadas aos impactos da chuva em Presidente Prudente-SP. 76 Gráfico 08 – Número de impactos no ambiente urbanos correspondente às notícias. . 76 Gráfico 09 – Relação do número de notícias com número de impactos. 77 Gráfico 10 – Relação entre o total anual de precipitação e o número de impactos identificados nos jornais. 78 Gráfico 11 – Relação da precipitação máxima em 24 horas e o número de impactos correspondente ao mesmo mês. 78 Gráfico 12 – Total de impactos urbanos específicos registrados nos jornais. 79 Gráfico 13 – Divisão dos impactos definidos como “outros”. 80 Gráfico 14 – Análise Rítmica de Janeiro de 1996 em Presidente Prudente. 89 Gráfico 15 – Análise Rítmica de Fevereiro de 1996 em Presidente Prudente. 92 Gráfico 16 – Análise Rítmica de Janeiro de 2007 em Presidente Prudente. 95 Gráfico 17 – Análise Rítmica de Janeiro de 2009 em Presidente Prudente. 98 XIII SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 14 2. OBJETIVO ....................................................................................................... 17 2.1 Objetivo Geral ...................................................................................... 17 2.2 Objetivos Específicos .......................................................................... 17 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ......................................................... 18 4. CLIMA URBANO .............................................................................................. 24 5. PRESIDENTE PRUDENTE: CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO ..... 38 6. CARACTERISTÍCAS DA PRECIPITAÇÃO EM PRESIDENTE PRUDENTE .... 60 6.1. Dados quantitativos da precipitação ................................................... 60 6.2. Dados qualitativos da precipitação...................................................... 69 6.2.1 Importância da análise qualitativa e do uso da mídia impressa ......... 69 6.2.2. Análise dos dados qualitativos da precipitação ................................ 74 6.3. Agrupamento entre os dados quantitativos e qualitativos da precipitação ............................................................................................... 77 6.3.1 Tipologia mensal dos impactos urbanos ........................................... 81 6.4. Análise de alguns episódios de eventos extremos de precipitação que deflagraram problemas socioambientais na cidade. .................................. 87 6.5. Espacialização dos impactos ocorridos em Presidente Prudente e suas características ........................................................................................... 99 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 118 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 120 14 No momento em que o homem avança na conquista e ocupação do território, primordialmente como um substrato para a produção agrícola e criação de rebanhos e, posteriormente, erguendo cidades, expandindo o comércio, extraindo recursos naturais e instalando indústrias, ou seja, ao transformar a superfície terrestre, este se constitui no principal agente modificador do ambiente. (SANT’ANNA NETO, 1995, p.30) 1. INTRODUÇÃO As transformações no espaço natural ocorrem desde que o mesmo surgiu, porém o homem tem acelerado ainda mais esse processo, com o objetivo de adaptá-lo às suas necessidades. Essas transformações se intensificaram a partir do momento em que o homem aprimorou seus conhecimentos, tornando possível, através de novas técnicas, transformar de maneira mais ágil a paisagem. Um exemplo claro sobre essas mudanças são as cidades, modelo mais evidente da complexa transformação do espaço pelo homem. Prontamente, a cidade tornou-se a expressão máxima da ação antrópica no espaço, como afirma Monteiro (1976, p.54): Seja pela implosão demográfica, seja pela explosão de atividades, os espaços urbanos passaram a assumir a responsabilidade do impacto máximo da atuação humana sobre a organização da superfície terrestre e na deterioração do ambiente (MONTEIRO, 1976, p.54). Dando continuidade, FONZAR (1981, p.1) descreve que a urbanização dos últimos anos é resultante do próprio aumento da população mundial e de uma tendência Pós-Revolução Industrial que passou a concentrar nas cidades as pessoas. De tal modo essa população passou a desfrutar da facilidade de ter suas principais necessidades atendidas (abrigo, alimentação, serviços, entre outras). A paisagem urbana se adapta de forma significativa para servir de espaço essencial para o homem da cidade, principalmente nos dias atuais, onde, quase sempre, predomina-se o modo de vida capitalista, o qual, por ser movido pelo consumo, tende cada vez ser mais transformador, criando assim um ambiente próprio de vida. Observa-se então que juntamente à essa adaptação surgem alguns 15 problemas relativos à qualidade ambiental dentro da cidade, o que leva a questionar se essas adequações, que na maioria das vezes possuem suas irregularidades, são realmente necessárias, e se sim, por que não se pensar em outras medidas, que sejam compatíveis com um modelo de cidade mais seguro e justo. Tratando de qualidade ambiental no espaço urbano, Sant’Anna Neto (1995, p.31) alega que a construção de uma paisagem largamente alterada nas cidades tem provocado significativas derivações na baixa atmosfera, ou seja, na camada limite urbana, que vem comprometendo a sua integridade. Mesmo com toda sua complexa estrutura, consequente do desenvolvimento da tecnologia e das técnicas de engenharia, as cidades permanecem ainda bastante vulneráveis e parecem tornar-se cada vez mais indefesas diante de eventos naturais extremos, acarretando grandes perdas e prejuízos às populações afetadas. De acordo com Gonçalves (2003, p.69), no Brasil os principais motivadores dos desastres que tem repercussão nas atividades humanas são os de natureza climática, sendo as variações bruscas de temperatura (geadas), e as oscilações hídricas (episódios pluviais extremos negativos e positivos), os mais significativos, que causam um verdadeiro impacto no meio ambiente, bem como na vida social e econômica do país. Assim, devido à relevância do presente estudo, se faz necessária a análise desses episódios pluviais extremos, com o objetivo de focar os episódios positivos de precipitação, que é quando ocorre o ataque à integridade urbana. De tal modo, o presente estudo se faz presente sobre o núcleo urbano de Presidente Prudente, uma cidade de porte médio com fundamental importância econômica para o interior de São Paulo. Sendo conhecida como a capital do extremo oeste paulista, tal cidade, por não ter passado por um processo de planejamento adequado, sofreu, e ainda sofre com os intensos episódios de precipitação que afetam a dinâmica da cidade. Portanto, tendo a necessidade de se entender como ocorrem essas desorganizações no espaço urbano diante de tais episódios pluviais, esta pesquisa baseou-se no referencial teórico-metodológico Sistema Clima Urbano, em especial, no Subsistema Hidrodinâmico, proposto por Monteiro (1976). Assim, através dessa contribuição, vê-se que analisar esses transtornos no ambiente urbano (na perspectiva das intensas precipitações) pode servir como auxílio para as intervenções pelos órgãos públicos de planejamento urbano, por 16 meio das elaborações e execuções de planos de regulamentação, isto é, medidas preventivas que possam diminuir os transtornos em períodos de precipitação excepcional. Consequentemente poderá servir de base para as adaptações e o aprimoramento do planejamento urbano, objetivando uma interdisciplinaridade necessária e visando um ambiente equilibrado entre a atmosfera e a sociedade. 17 2. OBJETIVO 2.1 Objetivo Geral Este estudo visa analisar os impactos pluviais na cidade de Presidente Prudente, tendo como finalidade, demonstrar os transtornos ocorridos durante o período de 1969 a 2009, que levou assim, a influenciar na sua dinâmica socioambiental urbana. 2.2 Objetivos Específicos Caracterizar a área de estudo, definindo seus aspectos físicos e históricos, buscando entender como se deu a ocupação seu espaço urbano. Identificar e analisar as características dos sistemas atmosféricos atuantes em Presidente Prudente, definindo a frequência (ritmo) das massas de ar e frentes que atuam nesse município, e que ocorrem durante os impactos; Analisar a série histórica dos dados da Estação Meteorológica de Presidente Prudente, dando maior ênfase para os dados de precipitação do período de 1969 a 2009. Conhecer e analisar os impactos no ambiente urbano através das notícias publicadas nos jornais prudentinos (O Imparcial e Oeste Notícias), e ressaltar a sua importância para o presente estudo. Comparar os eventos extremos pluviais com a quantidade de dados qualitativos correspondentes ao dia. Delimitar e caracterizar os problemas socioeconômicos ocasionados por estes eventos. Localizar e observar em campo os locais onde mais ocorreram tais problemas socioeconômicos. Espacializar os problemas socioeconômicos encontrados, através da elaboração de mapas, de modo a representar as áreas mais vulneráveis. 18 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Este estudo teve como principal pressuposto, o fato de que para que haja um desequilíbrio na integridade das cidades, ou seja, quando é alterado o status quo desse meio, através dos extremos episódios de precipitação, é necessário previamente uma ocupação urbana irregular. Logo, a natureza é apenas a deflagradora desses impasses, pois a própria urbanização promove alterações na paisagem, potencializando a vulnerabilidade desse ambiente aos eventos extremos climáticos. Mantendo-se o mesmo foco, foi feito um levantamento bibliográfico abrangendo diversas áreas do conhecimento, principalmente aquelas relacionadas ao tema, afim de que através de diferentes panoramas pudesse-se chegar a uma análise mais concreta e se propusesse medidas de planejamento que melhor solucionem os problemas descritos no presente trabalho. O trabalho se fundamentou nos estudos de clima urbano, fazendo parte do Sistema Clima Urbano (S.C.U.), em especial, o Canal de Percepção Humana III, Subsistema Hidrodinâmico, proposto por Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro (1976). Assim como Monteiro, a perspectiva adotada levou em consideração o processo caótico de urbanização (sem um prévio planejamento adequado no uso e ocupação do solo) aliado ao estabelecimento desordenado das atividades econômicas e sociais, criando características favoráveis para que as desorganizações no ambiente urbano sejam deflagrados por anomalias pluviais positivas. Para a caracterização da área de estudo, a cidade de Presidente Prudente, foi feito primeiramente a análise dos aspectos históricos de sua formação, do uso e ocupação do solo, e o levantamento sobre os aspectos físicos (relevo, solo, hidrografia e clima) do local e sua relação com o Estado de São Paulo, ou mais especificamente o oeste paulista. Após a caracterização da área de estudo, realizou-se uma revisão bibliográfica sobre quais são os sistemas atmosféricos que frequentemente atuam na região de Presidente Prudente, e como normalmente se caracteriza o tempo de acordo com cada época do ano. 19 Foi executada a coleta, a tabulação e a análise dos dados diários, mensais e anuais pluviométricos, obtidos junto a Estação Meteorológica da Faculdade de Ciências e Tecnologia - UNESP - de Presidente Prudente compreendendo o período de 1969 a 2009. Com estes dados, foi possível além de analisar estatisticamente, gerar e organizar tabelas e gráficos. Os dados de precipitação foram estatisticamente tratados no programa Microsoft Office Excel 20071, com o objetivo de fornecer informações quanto a sua quantidade, periodicidade e intensidade, a partir de diferentes técnicas, como o cálculo dos totais, das médias, das amplitudes, dos desvios padrões e dos coeficientes de variação. Além disso, foi observada a precipitação máxima acumulada em 24 horas (mm) (pm24h) e os números de dias com chuva (ndc) mensais. Por meio da técnica de identificação de anos extremos, proposto por Sant‘Anna Neto (1995, p. 30) criou-se a tipologia pluviométrica da cidade de Presidente Prudente pelas oscilações rítmicas que desviaram do habitual para padrões extremos. Essa caracterização baseou-se no desvio padrão da precipitação total da série histórica e possibilitou a delimitação das frequências dos anos Normais (N), Normais Tendentes à Seco (Ns) e à Chuvoso (Nc), Secos (S) e Chuvosos (C). Em seguida julgou-se que seria melhor dar uma maior atenção aos dados de precipitação máxima em 24 horas, pois foi através destes que se tornou possível identificar os aguaceiros, ou seja, os episódios mais representativos. E é durante esses aguaceiros que ocorre a maioria dos impactos no ambiente urbano. Lembrando também que o risco dos impactos ocorrerem é proporcionalmente maior quando a precipitação intensa ocorre em pouco tempo, do que a mesma quantidade em um tempo maior (duração/ intensidade/ frequência) Através dos dados quantitativos diários de precipitação, foi feita a seleção de episódios que mais se destacaram em relação aos outros, ou seja, aqueles eventos pluviais extremos mais representativos das condições onde ocorreram os impactos no ambiente urbano, levando-nos a comparar com os dados qualitativos e identificar tais problemas. Para buscar nos jornais os episódios pluviais que trouxeram problemas para a cidade, optamos pela escolha dos episódios superiores a 15 mm, pois não foram encontrados impactos com precipitações inferiores a essa margem. 1 Microsoft Office Excel 2007 faz parte do pacote Office 2007, e pertence à Microsoft Corporation. 20 Com o objetivo de obter os dados qualitativos, foram analisados os jornais Prudentinos “Oeste Notícias” e “O Imparcial”, ambos de grande veiculação e importância regional. Tal análise compreendeu o período de 1969 a 2009, sendo que os dados foram tabulados de acordo com o tipo de evento climático, data da ocorrência, local do evento e os problemas causados para a população. Após tal diagnóstico foi feita a correlação dos dados quantitativos com os dados qualitativos, buscando-se analisar como os impactos no ambiente urbano são influenciados pelos episódios extremos de precipitação, e como tais impactos influenciam na desorganização da dinâmica habitual dos citadinos. Para auxiliar, foram usadas tabelas, gráficos e figuras a fim de ilustrar a relação entre os impactos no ambiente urbano e a dinâmica da atmosfera. Foram realizados alguns diagnósticos quanto aos principais impactos ocorridos no ambiente urbano de Presidente Prudente, como alagamentos, inundações, problemas na pavimentação, quedas de árvores e diversos problemas de ordem social e ambiental, de maneira a se pensar algumas medidas adaptativas aos impactos no ambiente urbano em discussão, para a melhoria da qualidade de vida do cidadão prudentino. Com a necessidade de se aprofundar nos problemas associados à chuva no ambiente urbano, foram analisados os impactos de forma temporal, ou seja, delimitaram-se através de uma tipologia, quais foram os meses em que os principais impactos foram identificados. Tal análise foi realizada através dos registros dos ímpetos identificados nos jornais prudentino. Tal tipologia faz parte dos resultados obtidos, e traz como principal função, prever quais e quando os diferentes impactos na cidade ocorrem. Buscando compreender como se deu o processo de formação dos eventos extremos pluviais, elaboraram-se alguns gráficos de Análise Rítmica de alguns dos episódios mais representativos. Para isto, utilizou-se da análise conjunta dos diferentes dados meteorológicos coletados e da identificação dos diferentes sistemas atmosféricos atuantes durante o mês referente ao episódio analisado. Para o uso de tal metodologia, o trabalho foi fundamentado na Climatologia Geográfica, ou seja, aquela área da Geografia que não está preocupada apenas com valores médios dos registros meteorológicos, mas sim com a aplicabilidade desses e outros conhecimentos para a realidade vivida, buscando entender como tais condições atmosféricas influenciam a sociedade, e vice e versa. 21 [...] Assim, deve-se definir, na climatologia atual, duas linhas de abordagem que se complementam: a econômica, onde cumpre avaliar o papel insumidor do clima na organização do espaço, e a ambiente, onde os produtos da ação humana sobre a atmosfera são referenciados em termos de qualidade. (MONTEIRO, 1976, p.10) Um dos pioneiros nesse estudo foi Max Sorre (1984), que tentando superar a ideia dos parâmetros estatísticos médios, apresenta a seguinte definição: As definições clássicas dão importância exagerada à noção de valores médios. Propusemos substituí-lo por uma fórmula mais diretamente utilizável pelos biólogos: o clima, num determinado local, é a série de estados da atmosfera, em sua sucessão habitual. E o tempo que faz nada mais é do que cada um desses estados considerado isoladamente. Essa definição conserva o caráter sintético da noção de clima, enfatiza seu aspecto local e, ao mesmo tempo, evidencia o caráter dinâmico do clima, introduzindo as ideias de variação e de diferenças incluídas nas de sucessão (SORRE, 19842 apud TEODORO, 2008, p. 150). Dando sequência ao assunto, Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro, em 1969, define o clima por meio do ritmo de sucessão habitual dos estados atmosféricos sobre os lugares. A aceitação do conceito de Max Sorre (1951) deu margem a adoção de um novo paradigma que não encontraria apoio em uma estratégia metodológica, de vez que Sorre não produziu análises climatológicas. A estratégia proposta por Pédélaborde (1957) foi descartada, de vez que ele se preocupava antes com o levantamento da “totalidade dos tipos de tempo”, enquanto a mim interessava mais o mecanismo ‘sequencial’ desses tipos, dando atenção às suas peculiares irregularidades, posto que estas se constituem (longe de ser “exceções”) em eventos de imensa importância aos processos de interação geográfica (MONTEIRO, 1991, p. 38-39). Assim, ao surgir à necessidade de analisar esses mecanismos sequenciais, o autor usou da análise rítmica para tal solução, que nada mais é que comparar sequencialmente a sucessão dos elementos climáticos e dos estados atmosféricos, observando assim o ritmo (certo padrão habitual) e os estados peculiares (eventos extremos). O ritmo climático só poderá ser compreendido por meio da representação, concomitante, dos elementos fundamentais do clima 2 SORRE, M. A adaptação ao meio climático e biossocial – geografia psicológica. In: MEGALE, J. F. (Org.). Max. Sorre: Geografia. São Paulo: Ática, 1984, p. 30-86. 22 em unidades de tempo cronológico pelo menos diárias, compatíveis com a representação da circulação atmosférica regional, geradora dos estados atmosféricos que se sucedem e constituem o fundamento do ritmo. [...] Só a análise rítmica detalhada ao nível de ‘tempo’, revelando a gênese dos fenômenos climáticos pela interação dos elementos e fatores, dentro de uma realidade regional, é capaz de oferecer parâmetros válidos à consideração dos diferentes e variados problemas geográficos dessa região. [...] Na análise rítmica, as expressões quantitativas dos elementos climáticos estão indissoluvelmente ligadas à gênese ou sua qualidade, e os parâmetros resultantes dessa análise devem ser considerados, levando em conta a posição no espaço geográfico em que se define (MONTEIRO, 1971, p. 9- 13). Utilizando então desta metodologia, foi feita a análise rítmica de alguns episódios representativos, que trouxeram grandes transtornos para a cidade durante os eventos de precipitação, buscando assim, entender a formação desses episódios, e como se apresentaram as condições atmosféricas antes e depois desses eventos. A escolha dos meses se deu pela influência na geração dos problemas já identificados no ambiente urbano, especialmente dos últimos anos. Os gráficos foram elaborados através da proposta de Monteiro (1971), utilizando-se de dados meteorológicos diários, registrados na Estação Meteorológica da FCT – UNESP, como precipitação, temperatura, umidade relativa do ar, pressão atmosférica, nebulosidade, direção e velocidade do vento. Juntamente com tais dados foram utilizadas imagens de satélite Goes do site do CPTEC/INPE3 e das cartas sinóticas da Marinha do Brasil4 para a identificação dos sistemas atmosféricos atuantes no período escolhido para estudo. Portanto, foram elaborados gráficos de análise rítmica dos meses de Janeiro de 1996, Fevereiro de 1996, Janeiro de 2007, e Janeiro de 2009, através da organização dos dados no software Microsoft Excel 2007® e posteriormente editados no software CorelDraw X3®5. Posterior à elaboração dos gráficos, foram realizados alguns trabalhos de campo na cidade, buscando contemplar as áreas mais afetadas, principalmente pelos eventos de inundação, alagamento e desmoronamento de edificações, e processos erosivos. Durante os trabalhos de campo utilizou-se como metodologia a observação, e em alguns casos fotografando os locais onde foram detectados os impactos. Entre os locais visitados, os principais foram: a Avenida Tancredo Neves e 3 Dísponivel em - http://www.cptec.inpe.br/ 4 Dísponivel em - http://mar.mil.br/ 5 CorelDraw X3 é um software registrado da Corel Corporation. 23 os bairros adjacentes na Zona Leste; o Parque do Povo e o Prudenshopping, situados sobre o Córrego do Veado, o Tênis Clube e as vias mais próximas; o fundo de vale, sob forma de praça, do Córrego do Bacarin; a Avenida Ana Jacinta, próxima a COHAB e CECAP, e outros bairros mais distantes da área central, como o Brasil Novo, o Vale do Sol, os Conjuntos Habitacionais Ana Jacinta e Mario Amato. Por fim, com base nos dados qualitativos, provenientes da pesquisa nos jornais locais, foi elaborado o mapeamento dos impactos associados à chuva em Presidente Prudente, buscando espacializar tais impactos segundo sua localização e classe. Para esse mapeamento, primeiramente foram tabuladas todas as notícias, separadas por data, endereço/localização e tipo de impacto (inundação de fundos de vale e cursos d’água, alagamento de edificações, problemas na pavimentação, erosão, dificuldades na circulação das vias, queda de árvore, desabamento/desmoronamento de edificações, veículos atingidos, comércio afetado e destelhamento). Para a localização, algumas vezes identificou-se que não havia o endereço completo, como por exemplo, quando aparecia o nome da rua sem numeração, ou mesmo só o nome do bairro. Nesses casos, de acordo com cada tipo de impacto foi deduzido seu local de ocorência, como por exemplo, os cursos d’água, para inundação, residências próximas ao fundo de vale para alagamento, etc. Durante o mapeamento foram desconsiderados os locais que tiveram problemas econômicos para o município e os locais com falta do fornecimento de energia. No primeiro caso devido à maioria dos problemas gerarem prejuízos econômicos para a cidade, e no segundo pelo entendimento que a interrupção no fornecimento acontece por “zonas” da cidade e não pontualmente, como acontece nos outros casos. Após a tabulação, foram pontuados com símbolos os impactos, segundo sua localidade e tipo, no software MapInfo 10.0®6, que através de Layers, gerou-se 5 mapas, divididos em quatro décadas, e um geral, sendo o primeiro dos impactos dos anos de 1969 a 1978, o segundo dos impactos dos anos de 1979 a 1988, o terceiro de 1989 a 1998, o quarto de 1999 a 2009, e o último contemplando todos esses anos (1969-2009). Após a geração dos mapas, esses foram exportados e tratados esteticamente no CorelDraw X3® 6 MapInfo 10.0 é um software registrado da Pitney Bowes Software Insight. 24 4. CLIMA URBANO A sociedade convive diariamente com problemas que afetam diretamente seu cotidiano, sejam estes sociais ou/e ambientais, trazem dificuldades para que a população desempenhe suas atividades, desde as mais complexas, até aquelas mais corriqueiras. Deste modo, tentando evitar essas dificuldades, o homem passa a almejar um modo de vida que venha a diminuir esses embaraços, gerando assim uma melhor qualidade de vida. Porém, sabe-se que só o desejo por melhorias não é o suficiente, logo é preciso se pensar novas formas de intervenções, que possam tornar possível tal ambição. Então surgem dentro da ciência, áreas de estudo que se preocupam com a melhoria na qualidade de vida, tanto na perspectiva social, como na ambiental. Estas áreas de estudo estão diretamente relacionadas com o planejamento, ou seja, tratam de estudar situações problemáticas, para que dentro destes esboços se possam achar soluções que venham a diminuir seus reflexos. Dentro desta perspectiva, surgem então os estudos da atmosfera, pois, por estar presente no dia a dia da sociedade, faz-se necessário entendê-la, para que, além de prever sua dinâmica natural, se possa planejar o meio conforme a sua própria naturalidade, além de considerá-lo nos processos de planejamento. Assim, vê-se que, As preocupações do homem com os fenômenos originados na atmosfera e que repercutem na superfície terrestre é tão antiga quanto a sua própria percepção do ambiente habitado. Desde o início da epopeia humana na terra, o interesse pelo tempo e pelo clima se justifica pela indubitável influência que os fenômenos atmosféricos, e seus aspectos inerentes, exercem no cotidiano das populações e em suas atividades econômicas. (Sant’Anna Neto, 1995, p.11) Logo, La ciudad constituye la forma más radical de transformación del paisaje natural, pues su impacto no se limita a cambiar la morfología del terreno, sino que además modifica las condiciones climáticas y ambientales. Surge, así, un espacio eminentemente antropizado en el que la actuación del hombre se manifiesta en una doble vertiente: por un lado, las modificaciones que introduce directa y conscientemente, que tienen su mejor manifestación en el plano y la 25 morfología urbanos; de otro, las que se derivan de este mismo espacio construido y las actividades que en él se desarrollan, cuyas manifestaciones más signicativas son la contaminación y la aparición de un clima especifico de la ciudad (GARCÍA, 1995, p. 252). (Grifo nosso) Sobre o clima urbano, Pitton (1997), nos dá a seguinte definição de clima urbano: É nas áreas urbanas que ocorre a ação antrópica sobre o clima. As alterações que se processam nos espaços urbanos, através da materialidade física da cidade e das atividades decorrentes, associadas ao sítio e às relações que se estabelecem entre espaços e a atmosfera contígua, propiciam condições climáticas distintas de áreas circunvizinhas e criam um clima próprio, denominado Clima Urbano. (PITTON, 1997, p.8) Nos estudos de Amorim (2000), em sua revisão da literatura sobre a climatologia urbana, expõe-se que na época da Revolução Industrial (século XIX), surgem os primeiros estudos sobre clima urbano, baseados na diferença de temperatura entre a cidade e o ambiente rural. O primeiro foi do químico Luke Howard (1772-1864), em 1833, o qual comprovou a contaminação do ar e a ocorrência de temperaturas mais elevadas em ambientes urbanos, quando comparados com os arredores, isto é, as áreas rurais. Santos (1996) descreve que Emilien Renou (1815-1902) também realizou um estudo em Paris para detectar, as diferenças de temperaturas entre a cidade e o rural. Segundo Pitton (1997, p.10) até a década de 1960, os trabalhos de clima urbano se baseavam fundamentalmente no campo térmico, ou seja, as ilhas de calor urbana. Posteriormente a essa década, devem ser destacados, conforme Lima (2009) nos aponta, os trabalhos de Landsberg (1981) que buscou analisar as alterações que se processavam com a temperatura, umidade relativa, precipitação, nuvens e o vento quando entravam em contato com áreas urbanas; outro que contribuiu também foi Chandler (1965), o qual concluiu que a cidade modifica o clima através de alterações na superfície, produzindo aumento de calor e da precipitação, assim como modificações na ventilação e umidade do ar. A partir do final da década de 1960 houve um impulso nas investigações sobre clima urbano, com publicações de Landsberg, Oke, entre outros, mas estes estudos foram realizados apenas em cidades de zonas climáticas temperadas, assim era necessária uma metodologia que se aplicasse em áreas tropicais. 26 Surgem então os estudos de clima urbano nas cidades de clima tropical, conforme o interesse da comunidade científica. Exemplo disso no Brasil foram os trabalhos de Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro, o qual realizou diversos estudos do clima das cidades no país, e propondo uma nova abordagem metodológica do clima urbano, através da teoria sistêmica, que veio a se chamar Sistema Clima Urbano (1976). Com o nascimento de tal metodologia, começam a aparecer então estudos da temática no país, aplicando-a a diversas escalas urbanas, desde as cidades pequenas, até as metrópoles, o que vem a contribuir com a produção científica brasileira e com a melhoria da qualidade de vida nas cidades. Assim observa-se que a preocupação com as transformações da paisagem através da urbanização e suas decorrentes variações climáticas já vem de certo tempo, porém nos últimas décadas tem se intensificado devido ao intenso processo de urbanização, que vem aumentado a proporção dos problemas ambientais. O clima nas cidades, estudado em uma escala local, possui algumas particularidades suas peculiaridades em relação ao clima regional, levando a verificar diferenças climáticas entre o ambiente urbano (densamente alterado) e o ambiente rural (menos alterado), como pode ser visto em Lombardo (1985), Amorim (2000), entre outros. Essas diferenças são atreladas a diversos motivos, tais como as diferenças de albedo entre os materiais construtivos das edificações; pelas diferentes densidades de arborização; pela impermeabilidade do solo; pela emissão de poluentes na atmosfera; entre outras causas. O que leva a constatar que os centros urbanos possuam inúmeras características que vem a formar o seu “clima urbano”. (Figura 01) Quando se trata de clima urbano, não se pode deixar de falar de alguns fenômenos climáticos específicos que tem gênese nas áreas urbanas, os quais por afetarem as cidades, são considerados impactos para a população, pois atinge sua integridade. (Quadro 01) Tais impactos são, sobretudo, provocados pela inadequação do uso e da ocupação dos solos nas cidades, as quais produzem, por meio do processo desordenado e acelerado da urbanização, características favoráveis para suas ocorrências. Para definir impacto de acordo com tal proposta de estudo aqui apresentada, pode-se observar o artigo 1º da CONAMA 001/86, o qual, “Considera impacto ambiental, qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do 27 meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I) a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II) as atividades sociais e econômicas; III) a biota; IV) as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V) a qualidade dos recursos ambientais”. (Grifo nosso) Tratando destes impactos dentro da perspectiva urbana, observa-se em Mota (2003), a afirmação de que os principais dentro da cidade são as “ilhas de calor”, os problemas de ventilação, o aumento de precipitação, a poluição do ar e os ataques à integridade urbana (objeto de estudo deste trabalho). Figura 01 – Fatores que intervêm na formação do clima urbano. Fonte: García, 1995. Nesse contexto, Corbella & Yanna (2003) apontam que dentro do ambiente urbano, o adensamento dos edifícios cria alguns problemas socioambientais, como a conservação de calor pela grande massa térmica, efeitos da poluição do ar e do ruído urbano, impermeabilização do solo, reflexões de energia solar para os pedestres, produção de calor antropogênico, aumento dos cânions, modificação da umidade e da direção dos ventos, redução ou paralisação dos ventos pelas 28 edificações, diferentes temperaturas e sensações segundo o microclima, gerando assim um ambiente propicio a ter seu clima natural alterado. (Grifo nosso) Quadro 01 - Mudanças climáticas produzidas pela cidade. Fonte: LANDSBERG, 19707 apud AYOADE, 2004, p.301. Segundo Landsberg (1981), as grandes cidades (metrópoles) intervêm, significamente, nos totais pluviométricos. As ilhas de calor, a desigualdade da estrutura urbana e os produtos da poluição são os principais causadores do aumento da pluviosidade em áreas urbanas. (Figura 02) O autor afirma que o aumento das chuvas em áreas urbanas é explicado por três motivos: a ilha de calor, que ocasiona as precipitações quando está, diretamente, associada às outras condições de tempo; o “efeito obstáculo”, que impede o progresso da circulação atmosférica pela desigualdade aerodinâmica da estrutura urbana; os produtos da poluição, que favorecem as formações de nuvens e 7 LANDSBERG, H. E.: 1970, 'Micrometeorological Temperature Differentiation through Urbanization' in Urban climates, Techn. Note No. 108; World Meteorological Organization, pp. 129-136. 29 as mudanças nos espectros do tamanho original do pingo de chuva. Porém, como já dito anteriormente, isto só se aplica às metrópoles, pois cidades menores, como Presidente Prudente, não possui uma malha urbana extensa o suficiente para gerar tais mudanças, porém é necessário deixar claro tal processo. Figura 02 - Esboço do perfil de uma ilha de calor e o aumento pluviométrico em uma grande área urbana. Fonte: OKE, 1987. Mesmo com toda sua complexibilidade, as cidades permanecem ainda bastante vulneráveis e parecem tornar-se cada vez mais indefesas diante de eventos naturais extremos, acarretando grandes perdas e prejuízos à população afetada. Sobre vulnerabilidade, o glossário da Defesa Civil8 diz que é uma condição intrínseca ao sistema receptor que, em interação com a magnitude do evento ou acidente, caracteriza os efeitos adversos, medidos em termos de intensidade dos danos prováveis, ou seja, uma relação existente entre a magnitude da ameaça, caso ela se concretize, e a intensidade do dano consequente. Sendo as cidades então mais vulneráveis em relação a condição natural do meio, Gonçalves (2003, p.69), aponta que no Brasil os principais agentes desses desastres de repercussão nas cidades, e nas atividades humanas são de natureza climática, sendo as variações bruscas de temperatura (geadas) e as oscilações hídricas, ou seja, episódios pluviais extremos negativos e positivos (secas e 8 http://www.defesacivil.gov.br/publicacoes/publicacoes/glossario.asp 30 enchentes) os mais significativos, causadores de um verdadeiro impacto no ambiente bem como na vida social e econômica do país. Abordando a temática, adversidades climáticas, Monteiro (1989), defende que estas se configurem, como eventos extremos, e que estas têm como principal característica resultante, os prejuízos causados para uma determinada população, que vão desde prejuízos materiais até óbitos. O autor ainda ressalta que se um determinado evento extremo ocorre em uma área despovoada, esse não será mais considerado como adversidade, pois não causará impacto algum na vida social. [...] as áreas urbanas são, particularmente, mais afetadas porque correspondem aos segmentos da superfície terrestre mais intensamente transformados. A atividade humana nestas áreas, principalmente através da alta exploração dos recursos naturais, produz quase sempre inadequada artificialização, altera o ambiente local e cria uma vulnerabilidade maior em relação aos eventos do sistema natural que, na maioria das vezes, não são de grande magnitude. Como um circuito alimentado positivamente, a vulnerabilidade aumenta e, consequentemente, aumenta a capacidade de a população absorver seus efeitos. (GONÇALVES, 2003, p. 70) Segundo Dias (2011)9, do ponto de vista social, eventos extremos são aqueles que provocam impactos extremos, envolvem riscos e expõe as vulnerabilidades dos sistemas humanos e naturais. A autora diz que evento extremo tem a ver com vulnerabilidade e resiliência, e traz a seguinte definição de ambos: Vulnerabilidade é a susceptibilidade que tem as pessoas, suas atividades, posses e infraestrutura às perdas e danos quando sujeitas a eventos físicos de diferentes ordens de magnitude. Já a resiliência tem a ver com o tempo de recuperação após um evento extremo – baseado num processo prévio de adaptação e num aprendizado de como lidar com desastres. (DIAS, 2011) Catelan (2006), diz que na produção do ambiente urbano, pode-se observar uma dinamização de formas e funções que pouco considera o ritmo da natureza em sua composição material. Os impactos hidrometeóricos são decorrentes desse fato, pois ao se produzir o espaço urbano, ou seja, a cidade estipula-se uma nova condição para o ambiente, uma composição infraestrutural que altera a dinâmica de escoamento das águas pluviais, provocando tais impactos. 9 Dísponivel em 31 A execução de edificações, a pavimentação de vias, e outros processos de ocupação, nas cidades, resultam na impermeabilização do solo, com sérios impactos ambientais, tais como o aumento do escoamento superficial da água e a redução da recarga dos aquíferos (rebaixamento do lençol freático). O aumento do volume de água escoado para os recursos hídricos, associado ao assoreamento dos mesmos, resulta na ocorrência de inundações, com prejuízos de ordem econômica e social. (MOTA, 2003, p.53) Em meio a todo esse inventário de problemas urbanos, queremos focar no impacto hidrometeórico, pois como já dito, o estudo deste é de fundamental importância, pois na ocorrência das intensas chuvas, é atingida diretamente a população (principalmente a de baixa renda), por meio da desordem na circulação e na execução das atividades cotidianas. Os eventos climáticos extremos, que são anomalias negativas ou positivas em relação aos valores médios, influenciam, tanto direta, quanto indiretamente, a organização de uma sociedade. No que diz respeito às chuvas, o fenômeno merece destaque para os estudos de clima urbano, pois os aguaceiros - fortes precipitações concentradas - são de especial interesse no Brasil, já que, dificilmente, uma ou algumas cidades, de diferentes regiões, não sejam atingidas [...] a complexidade da questão e sua importância nacional exigem maiores considerações, no que concerne tanto à gênese do fenômeno como a seu impacto urbano, nos mecanismos de defesa. (MONTEIRO, 2003, p.54-55) O estudo do impacto da chuva faz parte do Sistema Clima Urbano (S.C.U.), como já descrito anteriormente, foi proposto por Monteiro em sua obra Teoria e Clima Urbano (1976). O autor nesta sua produção define que o impacto meteórico é episódico (eventual) e tem como fonte de origem a atmosfera (natureza), porém sabe-se que a responsabilidade dos transtornos não é exclusivamente da mesma. Quando ocorre na forma de precipitação - na projeção do ambiente ao núcleo - podem ocorrer ataques à integridade urbana, acarretando em transtornos na cidade, atingindo diretamente seus habitantes. Assim, chega-se à conclusão de que quanto mais caótico é o processo de urbanização (sem planejamento adequado no uso e na ocupação do solo), maiores serão os impactos negativos da precipitação no ambiente urbano. O Sistema Clima Urbano é baseado na Teoria Geral dos Sistemas (T.G.S.) que surgiu no campo da biologia através dos estudos do organismo por Ludwig Von 32 Bertalanffy entre os anos de 1950-1968. Segundo Bertalanffy (1973), “A T.G.S. é moldada em uma filosofia que adota a premissa de que a única maneira inteligível de estudar uma organização é estudá-la como sistema”. (BERTALANFFY, 1973, p.25). Fonzar (1981, p.17) diz que a T.G.S tem como principal finalidade não isolar os fenômenos em diferentes contextos, mas estudá-los como entidades ou sistemas, pois o tratamento em partes isoladas se mostrava insuficiente para atender os problemas teóricos e práticos propostos pela moderna tecnologia. É apoiado nessa teoria e em decorrência de suas análises que Monteiro propôs o Sistema Clima Urbano (S.C.U.) e seus canais de percepção humana, que avalia os fenômenos através da análise conjunta dos mesmos, correlacionando e comparando-os. Esse sistema está representado respectivamente, pelo diagrama e quadro na Figura 03. Monteiro (1976) avaliou o S.C.U. como um sistema complexo, aberto e adaptativo, que abrange o clima de um dado espaço terrestre e sua urbanização. Em sua obra, o autor propôs dez enunciados básicos, que formulam uma idéia reguladora para seu entendimento. Esses enunciados explicam o que é o tal sistema, nos aspectos da estrutura interna; da importação, transformação e exportação da energia e dos produtos; e das intervenções antrópicas, no sentido da auto-regulação, dentre outros aspectos. De acordo com todas as abordagens realizadas sobre os estudos de clima urbano, a abordagem geográfica, empregada e iniciada pelo professor Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro é a mais completa, pois associa a natureza e o homem, fato que torna, [...] muito difícil defender a natureza em seu estado natural na cidade, assim como também acreditar que um determinado contexto urbano apresentaria boas condições de vida destituída de elementos naturais na sua formação (MONTEIRO, 2003, p. 189). No decorrer da tese de Zavattini (2004) observa-se que a partir do S.C.U. passou-se a reafirmar as “escalas“ do clima e os “fluxos” de energia que os mecanismos de circulação atmosférica vinham conferir à definição espacial dos climas. 33 Figura 03 - Diagrama do S.C.U. e sua articulação, segundo os canais de percepção. Fonte: MONTEIRO, 2003, p.45-46. Monteiro (1976) trata das escalas do clima, através de categorias taxonômicas da organização geográfica do clima e suas articulações com o clima 34 urbano. O autor diz que o espaço urbanizado (local) se relaciona fortemente com o ambiente regional, sendo este influenciado pelos ambientes sazonais. Assim o espaço urbanizado é muito mais influenciado mais pelo ambiente regional, do que vice-versa, e o mesmo acontece entre o ambiente regional e o sazonal. Segundo Monteiro (2003, p.20), [...] o clima local se insere em climas sub-regionais e sazonais, assim como pode ser dividido até os microclimas. A cidade tanto se integra em níveis superiores como se dividem em setores, bairros, ruas, casas, ambientes internos etc. As divisões do ponto de vista sistêmico são inconsequentes, importando predominantemente as relações entre as diferentes partes em que se compõe ou decompõe o sistema para o desenvolvimento das funções organizadoras. O enunciado III ainda diz que, “O S.C.U. importa energia através do seu ambiente, e é sede de uma sucessão de eventos que articulam diferenças de estados, mudanças e transformações internas, a ponto de gerar produtos que se incorporam ao núcleo e/ou são exportados para o ambiente, configurando-se como um todo de organização complexa que se pode enquadrar na categoria dos sistemas abertos” (MONTEIRO, 2003, p. 20). Por ser um sistema aberto, então está passível de ficar em desequilíbrio, pois, precisa da energia do ambiente para suas atividades, porém não devolve esta da mesma forma, gerando assim, transformações nas condições naturais. Assim, buscando entender estas transformações nas condições naturais do clima, o Sistema Clima Urbano propõe estudos sobre o clima urbano por meio de três canais de percepção humana. O conjunto-produto do S.C.U. pressupõe vários elementos que caracterizam a participação urbana no desempenho do sistema. Sendo variada e heterogênea essa produção, faz-se mister uma simplificação, classificatória, que deve ser constituída através de canais de percepção humana. (MONTEIRO, 2003, p. 24) Em seu estudo, Monteiro (2003, p.24) sintetiza os canais de percepção da seguinte forma: I. Conforto Térmico - englobando as componentes termodinâmicas que, em suas relações, se expressam através do calor, ventilação e umidade nos referenciais básicos a esta noção. É um filtro perceptivo bastante significativo, pois afeta a todos permanentemente. Constitui, 35 seja na climatologia médica, seja na tecnologia habitacional, assunto de investigação de importância crescente; II. Qualidade do Ar - a poluição é um dos males do século, e talvez aquele que, por seus efeitos mais dramáticos, atraia mais a atenção. Associada às outras formas de poluição (água, solo, etc.), a do ar é uma das mais decisivas na qualidade ambiental urbana; III. Meteoros do Impacto - aqui estão agrupadas todas aquelas formas meteóricas, hídricas (chuva, neve, nevoeiro), mecânicas (tornados) e elétricas (tempestade), que assumindo, eventualmente, manifestações de intensidade, são capazes de causar impacto na vida da cidade, perturbando-a ou desorganizando-lhe a circulação e os serviços. (Monteiro, 2003, p.24) (Grifo nosso) (Figura 04) Grilo (1992, p.13) aborda que as intensas chuvas originadas pela circulação atmosférica regional e seus tipos de tempos especiais (disritmias extremas), atingem o ambiente transformado pelo homem, que, dependendo da maneira do uso e da ocupação do solo, facilitarão a ocorrência de impactos na área urbana. Tais chuvas atingem o espaço urbano, e podem resultar em movimentos do solo, obstruções das infraestruturas, alagamentos, acúmulo de entulhos, dificuldades de circulação, dentre outros, que culminam em desestabilizar a integridade urbana. Esses transtornos são claramente visíveis nos dias de intensa precipitação, quando é visto, principalmente na mídia, problemas na circulação de transportes, nas atividades, nos serviços, na comunicação, pelos problemas sanitários e de abastecimento, pelas perdas e danos socioeconômicos, dentre muitos outros. Nos estudos de Teodoro (2008, p. 35), o autor cita que para que haja uma auto-regulação do canal III (impacto meteórico), a ação do homem é oriunda em dois campos: a racionalização do uso e da ocupação do solo e o aperfeiçoamento da infra-estrutura urbana (por exemplo, as adequações das galerias de águas pluviais, no sentido do escoamento areolar); e a regulamentação das drenagens dos cursos d’águas convergentes ao sítio urbano e seu entorno imediato. Além dessas medidas, a previsão do tempo também é válida, objetivando a prevenção (estados de alertas). 36 Figura 04 - Canal III – Impacto Meteórico (Subsistema Hidrodinâmico). Fonte: MONTEIRO, 2003, p.54. Ainda que segundo o Sistema (S.C.U.) proposto por Monteiro (1976) a responsabilidade seja dada à natureza - trânsito no subsistema do operador ao operando -, o estabelecimento desordenado das atividades econômicas e sociais numa área urbana cria condições favoráveis e fundamentais para que os impactos urbanos ocorram, sendo indispensável um prévio planejamento das cidades, que deve, obrigatoriamente, associar o natural com o social. Para esta pesquisa, especialmente o clima com o ambiente urbano. 37 Fundamental ainda para esse estudo é diferenciar alguns conceitos que serão abordados, como alagamento, enchente, inundação e desmoronamento. De acordo com o glossário do site da Defesa Civil10, Alagamento: é a água acumulada no leito das ruas e no perímetro urbano por fortes precipitações pluviométricas, em cidades com sistemas de drenagem deficientes. Enchente: é a elevação do nível de água de um rio, acima de sua vazão normal. Inundação: é o transbordamento de água da calha normal de rios, mares, lagos e açudes, ou acumulação de água por drenagem deficiente, em áreas não habitualmente submersas. Pode ser usado como sinônimo de enchente. Desmoronamento: Queda ou derrubamento de uma edificação. É também utilizado como sinônimo de escorregamento, para descrever movimentos de encostas - desmoronamento de rocha. Assim, após toda esta caracterização sobre os estudos de clima urbano, e todas suas complexibilidades, faz-se presente neste estudo tal abordagem sobre a cidade de Presidente Prudente, a qual, através de diversos ensaios já realizados na temática, sabe-se que esta é alvo de peculiaridades em seu clima urbano. Nesta óptica de estudo, é de senso comum que esta passou por diversos momentos de dificuldades com os problemas das chuvas, os quais trouxeram grandes prejuízos econômicos para os cofres públicos da cidade, e principalmente dificuldades nas atividades cotidianas da população. 10 http://www.defesacivil.gov.br/glossario/index1.asp - Acesso em 19 de Junho de 2011. 38 5. PRESIDENTE PRUDENTE: CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO A cidade de Presidente Prudente está situada no oeste do Estado de São Paulo, a em média, a 435 metros acima do nível do mar, compreendida em coordenadas geográficas entre a latitude 22º07’S e a longitude 51º23’W, e dista aproximadamente 600 quilômetros do oceano. (Mapa 01 e Figura 05). Mapa 01 - Localização de Presidente Prudente no Estado de São Paulo. Fonte: IBGE, 2010 Segundo o IBGE e SEADE (2010), a cidade possui 207.610 habitantes, sendo que deste total, 97,96% é urbana (203.217 habitantes), e apenas 2,04 % rural (4.232 habitantes). No SEADE (2008) observou-se também que o município possui uma área de 562,11 km², com uma densidade de 369,05 de habitantes/km². Possui um PIB de cerca de R% 3.182.330 (participação de 0,317 % no estado). E na participação total 39 do PIB, é separado da seguinte forma: 80,94% para o setor de serviços, 18,40% para o setor de indústrias e 0,65% para o setor agropecuário. Figura 05 – Localização da área estudo. Fonte: Nunes, 2006. 40 Segundo Vicente (2001, p.31), a área urbana da cidade é de aproximadamente 124 km² e encontra-se assentada nas vertentes do espigão formado pelo conjunto das microbacias dos Córregos do Veado, do Bacarin e do Colônia Mineira a leste, apresentando uma expansão da malha urbana, a qual abrange o córrego do Botafogo e do Cedro, fazendo parte da bacia do Rio Santo Anastácio, e a oeste, os Córregos do Gramado, da Cascata e das Três Pontes, os quais deságuam na bacia do Rio Mandaguari, integrante da grande bacia do Rio do Peixe. Em relação a sua formação histórica, Abreu (1972) explica que a cidade de Presidente Prudente foi fundada em 14 de setembro de 1917. Tendo como primeiros núcleos urbanos as Vilas Goulart e Marcondes, respectivos nomes de dois coronéis que eram os principais negociantes de terras da região na época, os quais disputavam a hegemonia comercial e futuramente, política da cidade. A Vila Goulart situava-se na porção oeste do espigão central, na região da futura estação ferroviária, e a Vila Marcondes, que surgiria em meados de 1919, situava-se em sua porção leste. A ocupação do oeste Paulista se iniciou a partir de meados do século XIX, e teve como principal objetivo a expansão da fronteira agrícola do café, sendo que nesta região tal posse ocorreu por meio da Estrada de Ferro Sorocabana, meio de deslocamento de mercadorias e pessoas, como pode ser vista na Figura 06. Figura 06 - A expansão da estrada de ferro Sorocabana. Fonte: Camargo, 2007, p.52. 41 A cidade de Presidente Prudente teve um histórico de ocupação que não se difere, em determinados aspectos, do que ocorreu na maioria das cidades médias brasileiras, principalmente o das cidades paulistas. A partir de um ponto de circulação, no caso a estação ferroviária, a cidade se expandiu com loteamentos e arruamentos periféricos para abrigar a população, que saiu do campo em busca de melhores condições de vida. Deste ponto em diante, os interesses econômicos, o tempo e as condições do relevo se encarregaram de fazer o restante, direcionando o seu maior crescimento para a porção oeste. (CAMARGO, 2007, p.14) Segundo Camargo (op. cit., p.56), com a criação do município, Presidente Prudente passou a ter importância para o interior do estado de São Paulo, tornando- se o polo político e administrativo da região. Cada vez mais, a cidade foi tomando para si a posição de capital da Alta Sorocabana. Segundo Abreu (op. cit.), o desenvolvimento econômico da cidade se deu através da agricultura (principalmente a cultura do café e depois passa para o cultivo do algodão e outros), da pecuária, das indústrias (relacionadas com a agropecuária), e pelo comércio, pois a cidade se encontra em um local estratégico para quem fazia o trajeto para o estado do Mato Grosso do Sul ou mesmo para São Paulo. O crescimento urbano e populacional de Presidente Prudente se deu, essencialmente, a partir da crise cafeeira na década de 1930. Alguns produtores ainda conseguiram se adaptar e passaram a produzir algodão e outros tipos de culturas menores; mas, com a chegada da pecuária extensiva, grandes propriedades foram formadas, praticamente eliminando as pequenas propriedades. Este quadro fez com que o pequeno produtor saísse do campo em busca de oportunidades melhores no núcleo urbano de Presidente Prudente, ou ainda, em outras cidades. (CAMARGO, 2007, p.60) Assim, verifica-se que a formação de Presidente Prudente expressa a chamada a atual urbanização brasileira caracterizada pelo surgimento de novas cidades no interior do país, como nos aponta Santos (1994), e que no caso do interior paulista esteve orientada pela “economia cafeeira” ao promover a sua ocupação no início do século XX, tanto pelo estímulo ao cultivo do café quanto pela instalação de linhas férreas para o escoamento da produção do interior para o litoral que propiciou a apropriação, valorização e fragmentação das novas terras. Deste modo, entendendo a urbanização enquanto resultado da articulação de diferentes escalas geográficas, buscou-se compreender os principais aspectos da formação e produção do espaço urbano de Presidente Prudente, caracterizando a origem da 42 cidade no contexto regional, a ampliação de seus papéis urbanos, sua consolidação como centro polarizador da economia regional e a diferenciação do espaço que instigou as desigualdades sociais. A própria dinâmica da frente pioneira fez de Presidente Prudente mais que uma cidade ponta de trilhos, pois logo se destacou como centro regional prestador de serviços e comércio. Ao mesmo tempo, é preciso considerar outros elementos mais amplos, ligados ao cenário nacional e internacional. De acordo com Sposito (2004): [...] a expansão cafeeira pelo chamado “Oeste Paulista” dá-se no bojo do processo de constituição da instituição jurídica da propriedade privada da terra, no Brasil, processo fundamental para a consolidação do modo capitalista de produção no país. (ibid., p. 429) [...] os grandes empreendimentos que operaram os interesses privados e a acumulação capitalista no processo de ocupação do “Oeste Paulista” e o que de fato isto representou em termos políticos e econômicos, foram a apropriação das terras e a sua viabilização econômica para revenda e, simultaneamente, a implantação de um sistema urbano de serviços. Era também o desmatamento, a construção do sistema de transportes, a comercialização da produção no litoral, a construção das cidades com todos os seus equipamentos urbanos e o financiamento da produção. (ibid., p.432) Complementando seu pensamento, a autora coloca que: [...] o interesse pela incorporação de terras à economia capitalista ocorria por meio de movimentos diferentes que se articulavam e se complementavam. De um lado, a ocupação de terras gerava a possibilidade de seu parcelamento e venda de lotes rurais para a expansão cafeeira ou outras culturas. De outro lado, a constituição de cidades ao longo de ferrovias já implantadas ou acompanhando o traçado daquelas em implantação, gerava, simultaneamente, o apoio necessário à vida rural que se estabeleceria, estimulando e criando condições favoráveis à aquisição dos lotes rurais, bem como havia o interesse nos negócios com as próprias terras urbanas, já que a ocupação do campo possibilitava e necessitava da instalação de comércio e serviços urbanos. (ibid., p.433) Assim, a cidade de Presidente Prudente cresceu e desenvolveu-se principalmente por conta dos intensos fluxos migratórios em sua direção estimulados pelo desenvolvimento econômico urbano-regional, expressando também a diferenciação socioespacial e o acirramento das desigualdades sociais determinadas pelo processo de produção do espaço urbano e por sua expansão territorial. Sintetizando o trabalho de Sposito (1983), observou-se que o histórico de apropriação e ocupação da cidade de Presidente Prudente e a expansão territorial 43 da malha urbana foram marcados por alguns acontecimentos e fatos. Primeiramente na década de 1910, ocorreu à implantação dos dois primeiros núcleos urbanos da cidade, um na zona leste e o outro na zona oeste, ambos ocupando as áreas de topos do espigão divisor de águas. Na década de 1920 e 1930, a economia rural, baseada no café, provocou transformações e a cidade se expandiu mais ao oeste, onde foram ocupadas também as altas e médias vertentes e algumas cabeceiras de drenagens. Na década de 1940, a economia rural, baseada no setor algodoeiro seguido pela pecuária, impulsionou a expansão do tecido urbano para todas as direções, mas com destaque para os eixos oeste, norte e sul da cidade. Nesta década, foram incorporados na malha urbana os primeiros fundos de vale. Na década de 1950, ocorreu a expansão das áreas de pastagens e as indústrias frigoríficas se instalaram na cidade. O crescimento territorial da cidade seguiu a ferrovia no sentido norte-sul. Mas apesar deste crescimento, ela também sofreu expansão em todas as direções, recebendo destaque para os eixos oeste, norte e sul. Os topos do espigão divisor de águas, as altas e médias vertentes, algumas cabeceiras de drenagem e alguns fundos de vale foram incorporados ao tecido urbano. Nas décadas de 1960 a 1980, ocorreu a implantação de alguns programas habitacionais e introdução do projeto de urbanização de fundos de vale. Os eixos de expansão que se destacaram foram o norte, leste e oeste. O eixo sul sofreu pequena expansão e isso ocorreu devido ao rompimento das barreiras psicológicas geradas pelo preconceito popular com as áreas além dos fundos de vale e da rodovia. Já atualmente, na década de 1990 e após 2000, outros núcleos urbanos foram implantados, por meio de programas habitacionais, e junto a estes mais compartimentos geomorfológicos foram incorporados. Sposito (1983) mostrou que esse processo de crescimento, foi uma configuração urbana característica das principais cidades médias brasileiras e foi baseada na especulação imobiliária que ocorreu em áreas consideradas como eixo de expansão do município. No caso de Presidente Prudente, este eixo levou a cidade, a sua população e seus problemas para as regiões oeste, sul e sudoeste do município, devido, dentre outros fatores, à topografia favorável do terreno e à presença de colinas amplas e levemente convexas, o que facilitou a implantação de loteamentos. (Figura 07) Assim, analisando a Figura 07, verificou-se que a especulação imobiliária foi o grande motor de crescimento de Presidente Prudente, a partir da década de 1970 44 até início da década de 1980. Foi através da comercialização de terras pelo setor privado que surgiram os loteamentos responsáveis pelo rápido crescimento. Figura 07 – Evolução e crescimento de Presidente Prudente - 1923/2004. Fonte: Camargo, 2007, adaptado de Leal, 2002. Conforme Sposito (2004), O par urbanização-cidade mantém-se como expressão de uma relação intrínseca e indissociável, mas agora caracterizado pelo rompimento da identidade entre processo e forma, no que se refere à tendência de concentração. Desta maneira, a produção do espaço 45 urbano de Presidente Prudente atuou como um processo social excludente, apresentando-se como expressão da acumulação capitalista e da forma como esta acumulação promoveu as mudanças que possibilitaram o desenvolvimento econômico e o acirramento das contradições socioespaciais urbana. (SPOSITO, op.cit., p. 10) Segundo Nunes (2007b), a formação urbana de Marília, cidade que passou por um processo parecido com o de Presidente Prudente, se deu, [...] no âmbito do processo de urbanização, que consistiu de início na apropriação, fragmentação e comercialização da terra sobrepondo o valor de troca ao valor de uso aliada à acumulação capitalista, que serviram como base para a produção desigual e contraditória do espaço urbano. (NUNES, 2007b, p.21) Carlos (1994) ressalta que a produção espacial urbana é desigual, na medida em que o espaço é fruto da produção social capitalista que se realiza e se reproduz desigualmente e que se materializa através da divisão do trabalho. Deste modo, o espaço urbano é resultado do processo de produção num determinado momento histórico, que revela as relações contraditórias do processo de reprodução do capital, através da materialização da divisão espacial do trabalho. É na produção do espaço urbano que os processos sociais excludentes apresentam maior visibilidade, devido ao caráter concentrador e pelo fato dos arranjos espaciais que definem a cidade estarem ligados a processos de acumulação capitalista que, por sua vez, são seletivos e acentuam as desigualdades, criando diferenciações socioespaciais intraurbanas e representando em termos práticos a formação de territórios precários. (NUNES, 2007b) Carlos (op.cit.) diz que essas contradições criam-se e estruturam-se a partir da relação de dominação-subordinação centrada no processo de acumulação e centralização da propriedade e do poder. Desta maneira, é na expansão da cidade e do urbano que se fortalece a acumulação capitalista, sendo que a cidade e o urbano, neste caso, passam a representar a expressão espacial desse sistema de produção, na qual a contradição é condição e produto de seu desenvolvimento. Assim, no sistema de produção capitalista, o poder privado, aliado com a estruturação urbana promovida pelo poder público, produz um espaço urbano calcado na propriedade privada e na acumulação capitalista, produzindo assim, como afirma Sposito (2004, p.5) [...] “espacialidades e temporalidades urbanas que diferem entre si e se expressam na cidade como espaço das diferenças”. 46 E é nessa diferenciação do espaço urbano em classes sociais, é que se observa que em Presidente Prudente, a população de mais baixa renda é segregada, socialmente e espacialmente, como se pode verificar no Mapa de Inclusão/ Exclusão Social de Presidente Prudente11 (Mapa 02), organizado pelo Centro de Estudos de Mapeamento da Exclusão Social para Políticas Públicas na UNESP de Presidente Prudente. Tal estudo se utiliza de indicadores sociais, para identificar as áreas com maior concentração de exclusão social. Mapa 02 - Localização das áreas de exclusão social de Presidente Prudente. Fonte: CEMESPP, 2000. Segundo Camargo (op. cit.), 11 Disponível em www4.fct.unesp.br/grupos/cemesp 47 [...] a classificação de exclusão social aplicada a determinadas áreas é resultado de uma associação de diversos fenômenos, que permitiram, também, a diferenciação social, econômica e ambiental entre estas áreas; tal fato mostra que algumas áreas da cidade apresentam, além dos problemas ambientais, aspectos negativos de diversas ordens. (CAMARGO, op. cit., p.46) Assim, nota-se que a cidade passou por diferentes transformações impulsionando as pessoas, de menor poder aquisitivo a residir em locais de certa forma inadequados, como por exemplo, a ocupação de áreas de risco próximo aos fundos de vales ou áreas de encosta, áreas com alta densidade de edificações, sem cobertura vegetal arbórea, áreas completamente impermeabilizadas, e locais de antigos aterros, fazendo com que essas pessoas, além de estarem de certa forma excluída socialmente, a residirem em zonas de riscos. No presente estudo pode-se verificar o quanto essa população residente em áreas mais vulneráveis, tem seu cotidiano afetado durante as intensas chuvas. Amorim (199, p.80) evidenciou que neste contexto, a cidade, cujo planejamento não acompanhou o seu crescimento viu-se defronte a uma concentração de pessoas, que saíram do campo em busca de uma vida melhor. Estas pessoas foram obrigadas, por questões financeiras, a se instalar em ambientes deteriorados, com baixa qualidade ambiental, locais pobres, de baixo custo de vida, sem toda infraestrutura necessária, Assim, a ocupação do solo se configura de forma a integrar diferentes processos de ocupação, formada por diferentes tipos de construções de tal como se observa atualmente. (Mapa 03) Seguindo pela caracterização, mas sob o viés físico, verifica-se que, de acordo com o Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo na escala 1:500.000 elaborado por Ross e Moroz (1996), o município de Presidente Prudente encontra- se localizado na Bacia Sedimentar do Paraná (morfoestrutura) e no Planalto Ocidental Paulista (morfoescultura), mais precisamente no Planalto Central Ocidental. É essencialmente constituído por rochas do grupo Bauru, e seu relevo é formado basicamente por colinas médias, amplas, morrotes alongados e espigões. (Mapa 04) 48 Mapa 03 - Presidente Prudente: Ocupação do solo. Fonte: Amorim, 2000, p.63. Nunes (2002) apresentou uma breve caracterização da morfologia do relevo da área urbana de Presidente Prudente, apresentando uma subdivisão entre a zona leste e a zona oeste. Segundo o autor, ambos os setores apresentam amplas diferenciações morfológicas, predominando na zona leste as colinas pequenas de topos convexos, vertentes convexas, fundos de vales em V, declividades médias a altas e Argissolos e Neossolos. Já na zona oeste predominam as colinas amplas de topos suavemente ondulados, vertentes côncavas e retilíneas, planícies aluviais e 49 alvéolos em berço, declividades médias a baixas e Latossolos. Para essa caracterização foi feito pelo autor o mapa de classes de declividade (Mapa 05) e o mapa geomorfológico (Mapa 06), ambos do perímetro urbano de Presidente Prudente. Mapa 04 – Localização de Presidente Prudente no mapa geomorfológico do Estado de São Paulo. Fonte: Ross e Moroz, 1997. Vicente (2001, p.31) ainda mostrou que orientação ao nível de base no sentido oeste dá-se de maneira menos abrupta do que a Leste, com declividade predominante de 2 a 5 %. Sendo que a Leste a declividade pode chegar acima de 45 %. 50 M ap a 05 – C la ss es d e de cl iv id ad e do p er ím et ro u rb an o de P re si de nt e P ru de nt e. F o n te : N un es , 2 00 6. 51 Mapa 06 – Mapa Geomorfológico do perímetro urbano de Presidente Prudente. Fonte: Nunes, 2006. Já, quanto ao clima, Sant’Anna Neto e Tommaselli (2009, p.11), esclareceram que a cidade se encontra em uma área de transição entre os climas zonais controlados pelos sistemas tropicais (atlântico e continental), que lhe confere elevadas temperaturas de primavera e verão, e pelos sistemas extratropicais (massas polares) que ocasionam episódios de invasão das frentes frias e do ar polar no outono e inverno, provocando baixas temperaturas. Boin 52 (2000, p. 23) mostrou ainda que em episódios esporádicos (principalmente no verão), há a atuação da Massa Equatorial Atlântica, que traz consigo grande umidade, aumentando assim a intensidade das chuvas. (Figura 08) Figura 08 – Atuação dos principais sistemas atmosféricos sobre Presidente Prudente. Fonte: Boin, 2000, p.199. Devido à grande importância da atuação dos sistemas atmosféricos na gênese climática regional, Berezuck (2007, p. 63-66), fez o seguinte detalhamento de cada sistema atmosférico atuante na região: Sistema Tropical Atlântico (STa) – Esse sistema regional, de natureza estável na região do oeste paulista, é proveniente da atuação do Anticiclone do Atlântico Sul. A princípio, devido à subsidência dos altos ventos provenientes da circulação da célula de Hadley nas latitudes de 25 a 35º, os ventos são de 53 característica fria e seca, e durante o seu deslocamento pelo Oceano Atlântico vão ganhando umidade e calor. Quando esses ventos atingem o litoral oriental brasileiro, provocam chuvas em toda a região litorânea. Em seu trajeto continental, essa massa sofre ressecamento adiabático quando se desloca sobre as serras do Mar e da Mantiqueira, e continua perdendo sua umidade, chegando à região de estudo com características quentes e secas. Os ventos de leste e nordeste, portanto, são predominantes na região, atuando em quase 50% dos dias. Sistema Polar Atlântico (SPa) e Frentes Polar Atlântica (FPa) – O Sistema Polar Atlântico, ao contrário do STa é de característica fria, originado na região denominada de Anticiclone Móvel Polar. Essas áreas formadoras de massas de ar frio seguem por dois trajetos: o trajeto do Pacífico a oeste da Cordilheira dos Andes e o trajeto Atlântico a leste da cordilheira. Frequentemente, o Sistema Tropical Atlântico e o Sistema Polar Atlântico, massas com características distintas se encontram originando os sistemas frontais ou frontogênese, ou popularmente denominadas frentes frias. As frentes frias percorrem a área de estudo com uma ciclicidade média de uma semana, trazendo consigo as chuvas. Dependendo da época do ano e da intensidade desses sistemas frontais, o período entre uma frente fria e outra pode variar de quatro dias para até mais de 30 dias, originando os períodos de estiagem conhecidos nos meses de junho- julho-agosto, períodos que podem se converter em eventos de seca. Portanto, a maioria dos casos de precipitação do Oeste Paulista, deve-se às incursões das Frentes Frias ou Polares, originadas pelo contato da massa fria (SPa) com a massa quente (STa), sendo essas frentes responsáveis por aproximadamente 70% das chuvas anuais. Sistema Equatorial Continental (SEc), e Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) - O Sistema Equatorial Continental atua com mais frequência no período de verão, quando suas massas quentes e úmidas provenientes da região amazônica percorrem o território nacional e chegam até o Oeste Paulista. Em geral, essas massas são atraídas pela atuação de uma frente fria e deixam o tempo instável em todo o Brasil Central. Nos primeiros dois dias, existe a formação de desenvolvidas cúmulus nimbus, o que os meteorologistas 54 denominam de Complexo Convectivo de Mesoescala, que frequentemente resulta em tempestades locais ou até regionais. Após o terceiro dia de atuação do Sistema Equatorial Continental é que se denomina que o território nacional está sobre a influência de uma ZCAS. A ZCAS constitui-se como uma área de constante instabilidade atmosférica que pode, além do período de verão, estender sua atuação de setembro a março, possuindo geralmente uma média de 2000 a 2500 km de extensão, praticamente cruzando o Brasil de noroeste a sudeste, mas podendo ainda atuar em outros tipos de configuração. As chuvas são volumosas, podendo em um único dia chover até mais de 100 mm, potencializando adversidades climáticas. No entanto, a importância da atuação do Sistema Equatorial Continental e da Zona de Convergência do Atlântico Sul para as culturas agrícolas de verão e recursos hídricos regionais é muito grande, sendo esses sistemas responsáveis por significativas parcelas de precipitação regional principalmente de dezembro a fevereiro. Complexo Convectivo de Mesoescala (CCM) – Os Complexos Convectivos de Mesoescala possuem sua área gênese na região do Chaco (norte da Argentina e Paraguai), que climatologicamente recebe a denominação de Depressão Barométrica do Chaco. Devido às altas temperaturas que a região apresenta nos meses de primavera e verão, aliadas à presença de altas porcentagens de umidade relativa, favorece-se a ocorrência de fortes processos convectivos que originam aglomerados de nuvens com alto desenvolvimento vertical. Esses aglomerados, associados à presença de frentes frias, se movimentam de oeste para leste em 70% dos casos, atingindo os estados do sul do Brasil e de sudoeste para nordeste e norte em 30% dos casos atingindo a Região Sudeste. Os CCM´s são responsáveis, assim como as ZCAS, por eventos de chuvas abundantes, podendo promover precipitações de mais de 100 mm em 24 horas, possuindo, porém, uma atuação mais regional, ao contrário das ZCAS que possuem uma maior área de atuação. Como dito anteriormente, a ação dos CCM´s podem ser um pré-estágio para a configuração de uma ZCAS. Sistema Tropical Continental (STc) – O sistema tropical continental atua principalmente no período de primavera-verão, quando a região do Chaco (área entre o Paraguai, norte da Argentina e Pantanal Mato-Grossense) sofre com uma 55 diminuição barométrica relacionada ao alto grau de insolação que a área recebe, culminando com as altas temperaturas. Desse modo, essa massa, de ação mais periódica é responsável pela gênese climática dos dias mais quentes e de umidade relativa mais baixa da área de estudo. Caso esse sistema atmosférico persista durante vários dias consecutivos, além de sua influência no rendimento agrícola, pode afetar a saúde de crianças e idosos, aumentando os casos de problemas de pressão arterial, crises alérgicas e respiratórias. O STc pode também agir significativamente em dias de pré frontal. Instabilidade Tropical (IT) – As precipitações regionais ocorrem primordialmente com a ação direta dos sistemas frontais. Dependendo do período do ano, há a atuação de ZCAS e Complexos Convectivos de Mesoescala com relação à formação de chuvas. No entanto, principalmente no período do verão, ocorrem precipitações decorrentes do grande calor e umidade da região, onde a convecção origina, principalmente no fim da tarde, a formação de nuvens de chuvas e possíveis eventos de tempestades regionais ou até locais. Essas chuvas, popularmente chamadas de “chuvas de verão”, são as Instabilidades Tropicais ou Its. Em sua descrição, BEREZUK (2007) ainda diz que esses oito sistemas são os mais atuantes com relação aos aspectos climáticos da região, sendo esses, três com características mais estáveis (SPa, STa e STc) e os outros cinco sistemas de característica instável (FPa, SEc, CCM, ZCAS, IT), possuindo cada um desses uma intensidade e aspectos específicos em cada estação do ano, evidenciando a dinamicidade desses sistemas no território nacional. Se por um lado, no verão, as massas polares não são tão intensas e sistemas como o Equatorial Continental, auxiliando na formação de CCM e ZCAS, são mais atuantes, no inverno as massas polares podem chegar até as regiões equatoriais promovendo o fenômeno da friagem amazônica, anulando a ação do SEc em latitudes mais elevadas. Variações sazonais do Sistema Tropical Continental são relevantes com maior atuação nos períodos de primavera e verão e nulos no inverno. A ação do Sistema Tropical Atlântico também varia sazonalmente, ficando mais forte no inverno, assim como o Sistema Polar Atlântico, aumentando a porcentagem de dias estáveis e concretizando o período seco de junho até 56 início de setembro com a volta do período de chuvas e reinício da ação das Instabilidades Tropicais e chuvas decorrentes do sistema tropical, diminuindo o predomínio quase absoluto dos sistemas frontais, que agem durante todo o ano. Essa variação sazonal, com a participação dos sistemas acima citados é apresentada pelas figuras de Monteiro (Figura 09). Além dos sistemas atmosféricos já descritos, BEREZUCK (op. cit.), evidencia que podem também ser considerados como sistemas participantes nos aspectos climáticos regionais outros quatro tipos de grande importância nas análises regionais: Sistema Polar Tropicalizado (SPT) – Constitui como a área atuante de um Sistema Polar cujas características atmosféricas encontram-se em estado avançado de tropicalização. Dissipação de Frente ou Frontólise (D) – Área na qual uma frente fria se dissipa. Na região da área de estudo não é muito comum a ocorrência de dissipação dos sistemas frontais, sendo a frontólise mais comum, por exemplo, no sul da Bahia ou estados do nordeste em casos de frentes frias com maior intensidade. De acordo com a classificação oficial do IBGE, Presidente Prudente localiza-se na área de influência do clima Tropical Sub-quente e úmido, com 1 ou 2 meses secos. (Figura 10) A sazonalidade climática da cidade se resume a dois tipos básicos: um período quente e chuvoso entre outubro e março e, outro mais ameno e seco, entre abril e setembro, quando as temperaturas podem cair bastante em episódios de entrada das massas polares. Porém, na maior parte do ano está sob a ação do sistema tropical atlântico, que é uma massa de ar quente, estável e pouco úmida, daí a característica de temperaturas elevadas na maioria dos dias do ano. As chuvas regionais são bem mais irregulares do que a temperatura, pois ao contrário destas, que são mais controladas por fatores astronômicos, como a radiação solar, a precipitação é determinada por fatores relacionados à circulação atmosférica (massas de ar e frentes) que atuam em recortes temporais bem menores de previsão mais difícil. (SANT’ANNA NETO & TOMMASELLI, 2009, p.12). 57 Figura 09 - Características dos sistemas atmosféricos na América do Sul. Fonte: Monteiro, 1973. Segundo Sant’Anna Neto & Tommaselli (2009), através da série histórica da Estação Meteorológica da FCT/UNESP, a temperatura média anual de Presidente Prudente é de 23,4ºC, atingindo os 26ºC nos meses de verão e 20ºC no inverno. Entretanto quando se verificou os valores máximos e mínimos, observou-se que as temperaturas mais elevadas, em média, oscilam entre 27ºC e 28ºC, com extremos acima dos 38ºC (a máxima registrada foi de 39,3ºC, em 17 de novembro de 1985) e as mínimas, situam-se entre 16ºC e 18ºC, com extremos próximos a 0ºC (a menor temperatura registrada atingiu -1,8ºC, no dia 18 de julho de 1975). Entretanto o que prevalece são os dias quentes, com máximas diárias acima dos 30ºC. 58 Figura 10 – Tipos climáticos da região Sudeste. Fonte: IBGE, 2006. Já a média anual de chuvas em Presidente Prudente é de 1300 mm, o que significa cerca de 1300 litros de água por metro quadrado, por ano. Entretanto verifica-se grande variabilidade sazonal (alternância de períodos chuvosos e secos) e, ainda, uma grade variabilidade interanual. Nos 40 anos de dados registrados pela Estação Meteorológica observou-se que pode chover 50% a mais ou a menos de um ano para o outro. O ano mais chuvoso registrado na cidade foi o de 1989, quando ultrapassou 1800 mm. O ano mais seco, que ainda está na memória de muitos prudentinos, foi 1985, cujo total anual foi de apenas 840 mm, com registros de graves conseqüências no abastecimento de água na cidade (SANT’ANNA NETO & TOMMASELLI, 2009, p. 13). Todavia, dados mais atuais da Estação Meteorológica da UNESP de Presidente Prudente, confirmaram que o ano de 2009 foi o ano mais chuvoso, com um total de 2049,6 mm, sendo que só no mês de janeiro somou 557,7 mm. Porém, sabe-se que se tratando apenas das médias, ou dos totais anuais e mensais não abordou-se o que realmente se quer neste trabalho, ou seja, os eventos extremos pluviométricos, aqueles considerados aguaceiros por Monteiro (1976). Assim, dentro de todos os anos analisados, por várias vezes a cidade de 59 Presidente Prudente sofreu a influencia das intensas chuvas, chegando a um total de mais de 130 mm precipitado num mesmo dia. De tal modo, sabendo que ocorreram várias vezes esses episódios intensos, faz-se necessário analisá-los, e identificar quais foram as consequências destes dentro da cidade de Presidente Prudente. 60 6. CARACTERISTÍCAS DA PRECIPITAÇÃO EM PRESIDENTE PRUDENTE Diante de todos os levantamentos bibliográficos feitos, buscando caracterizar a área de estudo, e do levantamento dos dados, quantitativos e qualitativos, correspondentes à precipitação em Presidente Prudente, surge à necessidade de avaliar tais segmentos e juntá-los em forma de resultado, como decorrência da análise da presente pesquisa. 6.1. Dados quantitativos da precipitação Partindo da análise dos dados quantitativos, verificou-se que estes se tornam importantes para o estudo a partir da compreensão da quantidade, da periodicidade e da intensidade da ocorrência de fenômenos. Assim, foi essencial adquirir dados numéricos de precipitação, pois eles são fundamentais para se praticar um diagnóstico temporal, dando base para a construção de uma tipologia pluviométrica da cidade e, consequentemente, as explicações dessas oscilações. Além deste fato, o clima de um determinado lugar é classificado por meio de uma série temporal dos elementos climáticos de 30- 35 anos, entretanto, quanto maior o período de dados, diretamente proporcional será a confiabilidade do estudo (AYOADE, 2004, p.2). Deste modo, foi realizada a coleta, tabulação e análise dos dados diários, mensais e anuais de precipitação junto a Estação Meteorológica d