CAPELA SÃO JOÃO SALVAGUARDA E RESSIGNIFICAÇÃO DAS RUÍNAS EM UM PROJETO DE TURISMO RURAL. Àqueles que a memória é o bem que mais importa. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES, COMUNICAÇÃO E DESIGN DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA, URBANISMO E PAISAGISMO BAURU 2024 Trabalho Final de Graduação apresentado ao Departamento de Ar- quitetura, Urbanismo e Paisagismo da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, câmpus de Bauru, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. Discente: Ana Beatriz Nabas dos Santos. Orientador: Prof. Dr. Vladimir Benincasa. CAPELA SÃO JOÃO: SALVAGUARDA E RESSIGNIFICAÇÃO DAS RUÍNAS EM UM PROJETO DE TURISMO RURAL. AGRADECIMENTOS Primeiramente aos meus pais, Sônia e Donizete, e à minha irmã, Letícia, por me permitirem sonhar em estudar em uma faculdade pública, que se dobraram e desdobraram nos meus cinco anos de arquitetura e que aguentaram muitas vezes meus maus-humores com projetos. Especialmente este. Aos meus avós, Dona Ana Isméria, que me deu o nome, e Seu Antônio, que não me deu a paciência, por serem os quais eu tento sempre o meu melhor e que nunca sairão da minha memória. Às minhas companheiras de Unesp Bauru: Bianca Corvetto, Gabrielli Budart, Júlia Theodósio e Sabrina Meira, que passaram por muitos trabalhos, noites viradas e apenas dias comuns ao meu lado, me dando o prazer de poder chamá-las de amigas para o resto da vida. Ao meu orientador, Prof. Dr. Vladimir Benincasa por me guiar nessa jornada e em todo meu período como aluna. E aos ex-moradores da Companhia Inglesa, que inspiraram esse trabalho: as memórias de vocês permanecem vivas. Este trabalho tem como objeto de estudo e de intervenção a Capela São João, que, original- mente, fazia parte do conjunto de edificações de uma importante fazenda cafeeira, a Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, fundada na década de 1920. A propriedade ficou conhecida como Companhia Inglesa, pois foi gerida por uma grande empresa agrícola de capital inglês. Situa-se na cidade de Gália (SP), no noroeste paulista. Atualmente, a maior parte das edificações criadas pelos ingleses já não existem mais. Uma das remanescentes é a capela, que se encontra em situação de degradação e abandono, mas, mesmo assim, tornou-se ponto de interesse de turismo cultural rural na região. Através de levantamentos métrico, fotográfico, busca por referenciais e documentos sobre a edificação, propõe-se uma intervenção projetual, considerando seu aspecto histórico e seus usos e significados atuais para a região. Palavras-chave: Capela São João, Patrimônio rural, Preservação, Turismo rural, Gália (SP). RESUMO ABSTRACT This work has as its object of study and intervention the Capela São João, which was origi- nally part of the set of buildings of an important coffee farm, Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, founded in the 1920s. The property became known as Companhia Inglesa, as it was managed by a large agricultural company with English capital. It is located in the city of Gália (SP), in the northwest of São Paulo. Currently, most of the buildings created by the English no longer exist. One of the remains is the chapel, which is in a state of degradation and abandonment, but even so, it has become a point of interest for rural cultural tourism in the region. Through metric and photo- graphic surveys, a search for references and documents about the building, a design intervention is proposed, considering its historical aspect and its current uses and meanings for the region. Key-words: Chapel São João, Rural heritage, Preservation, Rural tourism, Gália (SP). 1 INTRODUÇÃO 12 16 32 42 64 88 90 96 108 2 3 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS BIBLIOGÁFICAS APÊNDICES ANEXOS 1.1 Patrimônio arquitetônico e conservação 1.2 Teorias do Restauro 1.3 O conceito de ruínas e a questão da restauração 1.4 Patrimônio e turismo rural 1.5 Intervenções em patrimônios 1.5.1 Palacete das Artes, Museu Rodin - Salvador, BA 1.5.2 La Capilla de Brihuega - Guadalajara, Espanha PATRIMÔNIO E RESTAURAÇÃO 2.1 O oeste Paulista e as fazendas de café 2.2 A Companhia Agrícola Inglesa Rio Tibiriçá 4.1 Contexto 4.2 Memorial da Companhia Inglesa 4.3 Ponto de Apoio aos Ciclistas e Cafeteria A COMPANHIA AGRÍCOLA INGLESA NO CONTEXTO DA EXPANSÃO CAFEEIRA NO NOROESTE PAULISTA PROPOSTA PROJETUAL 3.1 Inventário e tombamento do patrimônio 3.2 Prospecção arqueológica das ruínas 3.2.1 Materiais e estrutura 3.2.2 Tipologias de tijolos e técnicas de assentamento de paredes A CAPELA SÃO JOÃO SUMÁRIO “Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, biblio- gráfico ou artístico” (Brasil, 1937). A Capela São João, localizada em Gália-SP, foi tombada no ano de 2020 em âmbito municipal após despertar, por anos, o carinho e admiração da população local e de turistas por sua magnitude atemporal, além de ter sido local de grandes eventos que marcaram a história dos colonos que viveram no que um dia foi sede de um conjunto influente na região durante o ciclo do café: a Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, ou Companhia Inglesa, como ficou conhecida. Admirada pela sua arquitetura em estilo gótico inglês, atualmente, o edifício está abandonado e bastante degradado, mas se mantém como símbolo do que foi a Companhia Inglesa. Mesmo localizada no meio rural, distante das cidades vizinhas Garça e Gália, a capela atrai visitantes perio- dicamente. A região do município de Gália é local de circuitos de ciclismo e trilhas, além de também proporcionar alguns tipos de ecoturismo e turismo rural. A própria Capela São João é ponto de parada e de encontro de ciclistas da região, além de ponto turístico por si só, pela sua magnitude arquitetônica em meio a paisagem rural. O presente trabalho tem como objetivo a ressignificação e salvaguarda da Capela São João, em relação ao local em que está inserido, em estado de deterioração e abandono. Dessa forma, busca-se a com- preensão de seu caráter arquitetônico e im- portância cultural para conceituar o projeto de restauração, além do estudo de sua fun- cionalidade como patrimônio de turismo rural. Metodologicamente, foram usados os meios de pesquisa bibliográfico, documen- tal, pesquisa de levantamento e estudo do local. A pesquisa bibliográfica é desenvol- vida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e trabalhos científicos (Gil, 2002, pág. 44). Para o presente trabalho, foram consul- tados materiais que abrangiam o tema de patrimônio cultural e arquitetônico bem como trabalhos temáticos sobre as fazendas paulistas, como o livro Fazendas Paulistas (Benincasa, 2008) e Ruínas da fazenda São João do Tibiriçá: inventariação e ressigni- ficação de um patrimônio paulista (Silva Filho, 2020). Também, estudos de casos foram realizados para trazer maior referên- cia sobre restauração e o uso de ruínas em projetos Na pesquisa documental vale-se de materiais que não receberam ainda um tra- tamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa e que as fontes são muito mais diversificadas e dispersas em comparação com a pesquisa bibliográfica (Gil, 2002, pág. 45). Nesta categoria estão os docu- mentos conservados em arquivos de órgãos públicos e instituições privadas, tais como associações científicas, capelas, bibliotecas, entre outros (Gil, 2002, pág. 46). Também se utilizou de um formulário de perguntas. Basicamente, procede-se à so- licitação de informações às pessoas acerca do problema estudado para, em seguida, mediante análise, obterem-se as conclusões correspondentes aos dados coletados (Gil, 2002, pág. 50). Neste trabalho foram rea- lizadas perguntas aos grupos de ciclismo, que utilizam o local como ponto de parada, para a obtenção de informações relevantes para a requalificação da Capela São João e de seu entorno. Por fim, foi feito o estudo do local onde está implantada a Capela São João, levando em consideração a análise do entorno e do próprio edifício para a res- tauração do objeto de estudo e também a criação de novos meios de entretenimento e equipamentos para o amparo aos ciclistas que frequentam a região. Esse TFG, então, estrutura-se por: O Capítulo 1 “Patrimônio e Restau- ração” expõe a abordagem teórica onde se busca ter o embasamento sobre temas como patrimônio arquitetônico e conservação, as teorias do restauro, o conceito de ruínas e sua restauração, patrimônio rural e turismo rural, além de estudos de caso. O Capítulo 2 “A Companhia Agrícola Inglesa no contexto da expansão cafeeira no noroeste paulista” abrange brevemente 12 13 INTRODUÇÃO a situação do interior paulista, no desen- volvimento da agricultura do café e no pro- longamento das estradas ferroviárias e na criação da Companhia Agrícola no período abordado. O Capítulo 3 “A Capela São João” trata, então, do objeto de estudo. Apresen- ta-se a história e significado cultural da Capela São João, o seu inventário e tom- bamento. Ademais, a prospecção arqueoló- gica analisa seus materiais e estrutura, com enfoque nas tipologias de tijolos usados e os tipos de aparelho (assentamento) dos tijolos usados nas paredes durante a construção. O Capítulo 4 “Proposta Projetual” mostra a proposta de projeto criada para a área da Capela São João, a ser usada como memorial da antiga Companhia Inglesa, além do projeto arquitetônico adjacente de um Centro de Apoio aos ciclistas e Cafeteria, além de informações como layout e mate- rialidade. Por fim, as Considerações Finais ponderam as reflexões acerca do desen- volvimento do trabalho e a finalização do mesmo. C AP EL A SÃ O J O ÃO Sa lv ag ua rd a e re ss ig ni fic aç ão d as ru ín as e m u m p ro je to d e tu ris m o ru ra l. 14 PATROMÔNIO E RESTAURAÇÃO um 1.1 Patrimônio arquitetônico e conservação O presente capítulo tem como objetivo o embasamento da discussão sobre a sal- vaguarda do patrimônio histórico arquite- tônico, relacionando materiais de teóricos como Camilo Boito e Cesare Brandi, por exemplo, e as Cartas Patrimoniais, visando o domínio de conceitos e os processos rela- cionados ao tema. Segundo o Artigo 216, da Constitui- ção Federal de 1988, o patrimônio cultural brasileiro constitui “os bens de natureza material e imaterial, tomados individual- mente ou em conjunto, portadores de refe- rência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. O monumento é inseparável da história de que é testemunho e do meio em que se situa. Ele compreende toda criação isolada, em sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, acontecimento histórico ou evolução sig- nificativa. Entende-se como monumento não só às grandes criações, mas também as obras modestas que tenham adquirido, com o tempo, significação cultural e postam, ao futuro, mensagens do passado de um povo e permanecem como testemunho de sua exis- tência e tradições (Carta de Veneza, 1964). Entretanto, é constatado que há uma tendência geral de abandono dos edifícios, sem tomadas de ações para prevenção de riscos ou manutenções regulares apropria- das para assegurar a conservação dos bens. Assim, há casos onde é imprescindível o ato da restauração (Carta de Atenas, 1931). A conservação e a restauração dos monumentos visam a salvaguardar tanto a obra de arte quanto o testemunho histórico e por isso sua destinação é sempre para o fa- vorecimento à sociedade, porém, é sempre uma operação de caráter excepcional (Carta 17 de Veneza, 1964). É preciso compreender que a arqui- tetura, quando perde seu uso social, transforma-se em arqueologia. Por isso, a conservação do monumento depende, primordialmente, da função. Os monumentos da Antiguidade que chegaram até nós íntegros foram aqueles que mantiveram uma função social continuada [...]. Portanto, um dos atributos principais da restaura- ção arquitetônica, em qualquer época, é a reintegração do monumento na vida sociocultural. (AZEVEDO, 2008, p. 20). A conservação se baseia no respeito à substância e não deve deturpar o teste- munho nela presente e deve-se valer do conjunto de técnicas que, se não as tradi- cionais, que garantam eficácia e possuam bases científicas. Quaisquer intervenções na obra ou em seu entorno devem ser reali- zadas visando que, no futuro, não impeçam outra intervenção ou restauração (Carta de Burra, 1980; Carta do Restauro, 1972). A conservação deve ser, portanto, consi- derada não como um problema marginal, mas como objetivo maior do planejamento urbano e territorial das cidades (Declaração de Amsterdã, 1975). O patrimônio arquitetônico tem valor educativo determinante e importa, portanto, conservar os testemunhos de todas as épocas e experimentações. No entanto, o patrimônio é ameaçado pela ignorância, pela antiguidade, abandono e degradação sob diversas formas, e sua segurança e proteção só será assegurada quando houver tal compreensão pela população, especial- mente das novas gerações (Manifesto de Amsterdã, 1975). A educação patrimonial é ferramen- ta necessária para se tratar da conservação pois, só com o apreço, principalmente das novas gerações, é que o patrimônio ar- quitetônico poderá sobreviver. Programas de educação em todos os níveis devem ser aplicados e encorajados por todos os tipos de organizações, abrindo espaço para pesquisas e programas de educação e de- senvolvimento cultural (Declaração de Amsterdã, 1975). Acontecimentos do final do século XVIII, como a Revolução Francesa, o Ilumi- nismo e a Revolução Industrial, marcaram uma época de destruição com atos de van- dalismo e saques às obras de arte e arqui- tetura como simbologia da destruição da classe dominante. Essas ações alteraram a forma de relação de uma dada cultura com seu passado e acabou por despertar um sen- timento de proteção aos monumentos histó- ricos pela Europa. Com isso, vários estados, principalmente o francês, começaram a promover o interesse público pelos monu- mentos, visando sua preservação e salva- guarda (Salcedo, 2007; Kuhl, 2000). Anteriormente, no entanto, houve reformas voltadas apenas a adaptação dos edifícios em virtude das necessidades da época, mas apenas no contexto dos séculos XIX e XX é que começaram a surgir as primeiras abordagens teóricas sobre a con- servação e restauração de monumentos (Salcedo, 2013). Em Roma, surge, no começo do Figura 1: A Capela São João em dia de casamento, década de 1980. Fonte: Página “Juntos pela igreja da Companhia Inglesa Gália/SP” no Facebook. Fotos do Arquivo Pessoal de Suely Pinheiro e José Emídio. 18 19 1.2 Teorias do Restauro século XIX, o chamado “restauro arque- ológico”, que teve como base o texto do papa Leão XII sobre a reconstrução da Basílica de São Pedro, onde é descrito que “nenhuma inovação deve ser introduzida nem nas formas, nem nas proporções, nem nos ornamentos do edifício, a não ser para excluir aqueles elementos que foram acres- centados após sua construção, por capricho da época seguinte” (Blanco, 2008, p.130 apud Salcedo, 2013, p. 27). Assim, segundo Salcedo (2013), entende-se que os monu- mentos são obras já concebidas de formas completas e imutáveis e que a interven- ção se destina somente à conservação do edifício, sendo que, quaisquer elementos acrescentados em épocas posteriores, devem ser retirados. Um dos primeiros nomes a serem lembrados na história da teoria do restauro é de Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc (1814-1879). O francês é uma personali- dade no tema pois atuou numa época em que a restauração se estava firmando como ciência e foi autor de várias controvérsias (Kuhl, 2000). Segundo ele, “restaurar um edifício não é mantê-lo, repará-lo ou refazê-lo, é restabelecê-lo em um estado completo que pode não ter existido nunca em um dado momento” (Viollet-le-Duc, 2000, p. 29). Portanto, a restauração para Viollet-le-Duc era uma reprodução quase que fantasiosa de um edifício na época de sua constru- ção e o restaurador encarregado deveria se colocar como “arquiteto primitivo”, procu- rando sempre tentar entender ao máximo a obra a partir de pesquisas e documentações agindo como “o cirurgião habilidoso e ex- perimentado, que somente intervém em um órgão após ter adquirido o conhecimento completo de sua função e ter previsto as consequências imediatas ou futuras da sua operação” (Viollet-le-Duc, 2000, p. 68). Ao arquiteto também cabe complementar a obra, mas sempre levando em considera- ção a unidade estilística do período que o edifício foi construído. Antes de mais nada, antes de ser ar- queólogo, o arquiteto encarregado de uma restauração deve ser um cons- trutor hábil e experimentado, não somente do ponto de vista geral, mas do ponto de vista particular, isto é, deve conhecer os procedimentos de construção admitidos nas diferentes épocas de nossa arte e nas diversas escolas. (Viollet-le-Duc, 2000, p. 49). Seus princípios também iam em direção à manutenção constante dos monu- mentos, que o restauro não deve ser apenas da aparência, mas também da função do edifício, a importância dos levantamentos pormenorizados, do registro, da reutiliza- ção e que restauração é manter também o espírito da matéria. Princípios estes que são hoje levados em consideração durante a restauração (Kuhl, 2000). Entretanto, segundo Kuhl (2000), a forma incisiva como Viollet-le-Duc atuava sob um monumento acabou condenando sua teoria. Como não se contentava em apenas fazer uma reconstituição hipotética do estado de origem, mas, sim, do que se deveria ter feito, buscando uma pureza de estilo, acabou impondo um modelo ideali- zado que não respeitava as transformações do tempo e as modificações posteriores. E naquele momento, a ideia de uma cópia fielmente adquirida tinha o mesmo valor conceitual de um original (Salcedo, 2013). A teorias de Viollet-le-Duc seguiam o oposto das que o inglês John Ruskin (1819 - 1900) propôs em sua obra The Seven Lamps of Architecture, em 1849. Ruskin pregava o respeito pelo que é original e a manutenção constante para evitar futuros restauros; também era contra a substituição dos materiais antigos por novos e a adulte- ração dos desenhos originais. Camillo Boito (1836 - 1941) tem posição intermediária entre Viollet-le-Duc e Ruskin, pois sintetiza e elabora princípios que baseiam a teoria contemporânea de res- tauração. Era defensor da manutenção da memória histórica do edifício e sua restau- ração, mas sem o extremismo de Viollet-le- -Duc, além de acreditar que os acréscimos de épocas posteriores também faziam parte da história do edifício. Ademais, diferente de Ruskin, era contra a ideia de deixar o monumento chegar ao estado de ruína, mas pontuava que era necessária a manutenção regrada e progressiva para evitar maiores restaura- ções futuras (Kuhl, 2000; Salcedo, 2013). Em 1883, Boito apresentou, ao III Conselho dos Engenheiros e Arquite- tos Italianos, os critérios de intervenção que foram adotados pelo Ministério da Educação. Estes são: 20 21 [...] a diferença de estilo entre o novo e o velho; diferença dos materiais de construção; supressão de linhas ou ornatos; exposição das velhas partes removidas, nas vizinhanças do monumento; incisão, em cada uma das partes renovadas, da data da res- tauração ou de um sinal convenciona- do; epígrafe descritiva gravada sobre o monumento; descrição e fotogra- fia dos diversos períodos das obras, expostas no edifício ou em local próximo a ele, ou ainda descrições em publicações; notoriedade (Boito, 2000, p. 26). A teoria de Boito foi bastante difundida e foi modificada e reformula- da por alguns de seus alunos como Luca Beltrami e Gustavo Giovannoni. Beltrami (1854 - 1933) se distanciou de Boito ao admitir reconstruções e intervenções que seguissem o estilo original da obra, baseadas em estudos aprofundados de documentos e da própria obra (Salcedo, 2013). Segundo Blanco (2008, apud Salcedo, 2013) o método que Beltrami seguia tratava de realizar uma cópia exata sem se preocupar com os valores históricos e culturais que a obra contém, mas apenas que fosse o mais próximo possível do original. Giovannoni (1873-1947) foi um dos principais redatores da Carta de Atenas de 1931 e da Carta de Restauro Italiano de 1931. Seu método abarca o chamado “restauro científico”, que defende a con- servação do monumento como documento histórico e obra de arte. Giovannoni apresenta o princípio da mínima interven- ção e mínimo acréscimo e estabelece cinco modelos de ação: consolidar o edifício a partir de uma intervenção que seja técnica e não visível para garantir a permanência do mesmo; recomposição a partir de es- cavações de restos do edifício; a liberação de acréscimo somente se necessário, desde que não destoe do original; e o não uso de inovações, a não ser que seja inevitável e, posteriormente, sejam identificadas como tal. Giovannoni também acrescenta o valor do urbanismo sobre o edifício, pois a ar- quitetura se expressa não somente em seu terreno, mas, também, no contexto onde está inserido, e isto lhe confere caráter e identidade (Salcedo, 2013). Na década de 60, Cesare Brandi (1906 - 1988) formula seu conceito de restauro, onde expõe a ideia do edifício como obra de arte, com duas instâncias principais: a artisticidade e a histórica. Segundo Brandi, o “restauro constitui o momento metodo- lógico do reconhecimento da obra de arte, em sua consistência física e em sua dupla polaridade estética e histórica, com vistas a sua transmissão ao futuro” (Brandi, 1963: 34-36, apud Azevedo, 2008, p. 28). Brandi determina que apenas se restaura a matéria da obra de arte, pois seu valor cultural, sig- nificativo e histórico, está intrinsecamente presente e se for perdida sobrará apenas destroços. Também afirma que só se deve res- tabelecer a obra de arte de forma que não seja possível cometer qualquer tipo de fal- sificação artística ou histórica e sem apagar nenhum vestígio da passagem do tempo sobre ela (Azevedo, 2008). Tais propostas são diretamente contrárias às de Viollet- -le-Duc, que propunha a complementação por analogia de estilos e o apagamento de vestígios das épocas passadas. Brandi define também três princípios na restauração que foram levados em consi- deração para a escritura da Carta de Veneza de 1964. Primeiro, toda integração deve ser reconhecível, mas sem causar qualquer infração à unidade do edifício original, ou seja, invisível à distância, mas perceptível de perto; segundo, toda matéria é insubsti- tuível a não ser quando se trata do que é estrutural e pode ser modificado quando colaborar para a permanência da obra de arte; e, por fim, toda intervenção deve ser feita de modo que facilite novas interven- ções futuras (Salcedo, 2013). Com o avanço de diversos pensa- mentos teóricos sobre o restauro, começa a surgir, também, encontros e congressos para se discutir a salvaguarda do patrimô- nio. São então desenvolvidas as cartas pa- trimoniais, sob grande influência dos pen- sadores, para uma regularização das ideias. A Carta de Veneza é a primeira de muitas, surge no ano de 1964, elaborada pelo Conselho Internacional de Monumen- tos e Sítios Históricos, quando se realiza o II Congresso de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos - ICOMOS. A Carta propõe a conservação e restaura- ção dos monumentos a partir da pesquisa histórica do mesmo, devendo ter caráter excepcional, sem possibilitar a adição de elementos novos ou parecidos, sem serem absolutamente necessárias e que sejam cla- ramente diferenciáveis do original (Carta de Veneza, 1964), conceitos que vão de 22 23 encontro às ideias de Giovannoni. Já em 1972, o Ministério de Instrução Pública, do governo da Itália, publica a Carta do Restauro, que considera a diferença entre a salvaguarda e a restauração, sendo, a primeira, uma medida que não implique in- tervenção direta na obra e, a segunda, como medida que se destina a manter a obra em funcionamento e que facilite a transmis- são da mesma para o futuro. A Carta do Restauro, assim como a de Veneza, proíbe a adição ou remoção de elementos que possam resultar em qualquer tipo de apaga- mento da história do edifício, além de dar foco na importância da documentação de todo o processo de intervenção (Carta do Restauro, 1972). Por fim, no ano de 1980, o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios Históricos - ICOMOS, publica a Carta de Burra, que traz definições importantes de termos e, principalmente, diferencia a restauração da reconstrução. Segundo a Carta, a restauração se dá para o restabele- cimento da obra em um estado anterior da essência do bem e se limita à conservação do mesmo, enquanto reconstrução é o res- tabelecimento exato da condição anterior, quando o bem estiver comprometido com desgastes. A Carta permanece afirmando a necessidade de qualquer tipo de interven- ção ser realizada de modo que as técnicas e materiais assegurem futuras intervenções no bem, mas que sejam apenas de carácter necessário (Carta de Burra, 1980). As ruínas são vestígios materiais de culturas e civilizações. Elas evocam a passagem do tempo, permitem a conexão com o passado e simbolizam o testemunho das atividades do homem durante os anos. São registros da arquitetura de um local que já perderam suas características estéticas originais, mas que ainda carregam valor histórico, e é por meio de seus elementos tipológicos e estruturais que é possível o conhecimento de uma data ou período de sua construção (Diniz, 2014; Souza Júnior, 2017). As ruínas são objetos em movimento, que trazem ao homem moderno o confronto entre passado e presente. Ela desperta a reflexão da relação da matéria com a fragili- dade da vida humana. Elas são símbolos do recordar, mas também convidam a refletir sobre o futuro (Almeida, 2020). Durante o século XVIII, o roman- tismo tratou de ruínas como locais que compunham cenários de histórias pitores- cas que produziam imagens com intenções intimistas e melancólicas no meio do ambiente natural. A ruína transmitia o pen- samento de que tudo era perecível e teria fim trágico; até mesmo a arquitetura, feita para durar, poderia se findar com o tempo (Baeta; Nery, 2017). Segundo Souza Júnior (2017), o conceito de ruína é formulado a partir de dois conceitos que se relacionam e se con- trapõem ao mesmo tempo: O conceito do construído e destruído, o vertical e horizontal, constituindo assim momentos que pertencem às ruínas em seu ciclo de nascimento, esplendor, decadência, morte, esque- cimento e renascimento. Por outro lado, temos também as ideias de razão e sentimento que levam à contempla- ção do belo e do sublime evocando assim o juízo crítico pela valorização da experiência estética, uma ideia de um sistema direcionado ao processo de ordem e entropia e, por consequ- ência de quietude e exaltação até o ponto de chegar à melancolia (Souza Júnior, 2017, p. 137). Portanto, as ruínas têm dois momentos em sua história, seu início e seu fim, até o momento em que se trarão métodos para que ela renasça no mundo contemporâneo. De outro modo, teremos a ideia da contra- posição de razão e sentimento, que leva em consideração a contemplação da arquite- tura, mas também pode gerar sentimento profundo pelo estado em que se apresenta. Em consideração à questão do debate sobre ruínas, a Carta de Atenas (1931) foi um dos primeiros documentos que tratou sobre a restauração dos monumentos em ruínas, ao se basear no Parthenon ateniense, e comentar sobre métodos de restauro. Co- menta-se: Quando se trata de ruínas, uma con- servação escrupulosa se impõe, com a recolocação em seus lugares dos elementos originais encontrados (anastilose), cada vez que o caso o permita; os materiais novos necessá- rios a esse trabalho deverão sempre ser reconhecíveis. Quando for im- possível a conservação de ruínas descobertas durante uma escavação, é aconselhável sepultá-las de novo depois de haver sido feito um estudo minucioso. (Carta de Atenas, 1931). O cuidado minucioso que se deve ter com as ruínas tem de ser destacado e as decisões projetuais devem ser precisas, 1.3 O conceito de ruínas e a questão da restauração 24 25 pois o bem está em situação fragilizada com lacunas e partes inexistentes, assim, toda modificação proposta pode gerar uma perda de significações, que são importantes historicamente, mas, principalmente, para a relação afetiva da comunidade em que ela se insere (Almeida, 2020). Segundo Huyssen (2014 apud Baeta; Nery, 2017), em seu texto A nostalgia das ruínas, o interesse pelas ruínas no mundo contemporâneo está voltado para a criação de commodities pelo capitalismo e que as “ruínas autênticas”, como põe, não são mais valorizadas, pois não há o interesse pelo antigo, e a relação humana com o en- velhecimento é conturbada. Também, a res- tauração e intervenções interferem no que é o original da obra, anulando a autenticidade da mesma. [...] As “ruínas autênticas”, tais como ainda existiam nos Séculos XVIII e XIX, parecem não ter lugar na cultura de mercadoria e memória do capitalismo avançado. Na condição de commodities, as coisas em geral não lidam bem com o envelheci- mento. Tornam-se obsoletas e são descartadas ou recicladas. Constru- ções são demolidas ou restauradas (HUYSSEN, 2014, p.94 apud Baeta. R; Nery. J., 2017, p. 219). Entretanto, limitar ruínas apenas a objetos materiais de um passado histórico que não devem passar por restaurações tende a fadar o monumento ao esquecimento e, como já foi mostrado, segundo apontamen- tos da Carta de Veneza (1964) e Azevedo (2008), é necessário que o bem seja resta- belecido dentro do mundo moderno para que seja possível a sua permanência futura dentro da sociedade. Também, como diz Souza Júnior, a obra “só estará viva sempre e quando se mantenha acessível de alguma maneira, preservando sua potencialida- de para a experiência emocional” (Souza Júnior, 2017, p. 155). Segundo o professor Nivaldo Vieira Andrade Júnior (2008 apud Baeta; Nery, 2017), as ruínas são pontos de partida para novas construções arquitetônicas, que irão se complementar e dar-lhes um novo valor. Parece-nos importante alertar para a possibilidade de, em determina- das situações, preservar as ruínas enquanto tal e, ao mesmo tempo, in- corporá-las em novas construções que possam lhes agregar um valor instrumental (utilitário), desde que respeitando os valores históricos e de antiguidade inerentes ao seu estado de ruína. É necessário chamar a atenção para o fato de que, nestes casos, não estamos mais no campo do restauro dos monumentos, que prevê apenas a conservação das ruínas, mas sim no da composição arquitetônica. Estamos nos referindo àqueles casos de criação de híbridos arquitetôni- cos, nos quais a ruína — “resíduo de um monumento histórico ou artístico”, nas palavras de Brandi — aparece como peça construtiva, como elemento arquitetônico (Andrade Júnior, 2008, p.11 Baeta; Nery, 2017, p. 231). Portanto, a preservação das ruínas deve ser feita de forma dinâmica que possa ser integrada com as construções arquite- tônicas propostas. Essa abordagem busca a valorização do seu potencial instrumental ao respeitar seus valores históricos, além de seu objetivo principal de conservar res- quícios. Assim, as ruínas podem ser peças construtivas que enriquecem a composição arquitetônica entre o novo e velho e que trazem autenticidade ao local. Figuta 2: Capela São João em 2019. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2019. 26 27 Refere-se a patrimônio rural todo o conjunto de elementos culturais, históricos e arquitetônicos, naturais e imateriais em áreas rurais. A relação do patrimônio rural e a restauração está intrinsecamente ligada à preservação e à valorização destas áreas, promovendo a preservação da identidade cultural e histórica da região, além de pro- porcionar desenvolvimento ao local. Segundo Ferrão, podemos compreen- der patrimônio rural como: Os antigos casarões e senzalas, colônias e casario disperso, monu- mentos construídos com técnicas tradicionais da arquitetura rural ou com materiais e técnicas alternati- vas de construção; toda a arquitetura vernacular que possa estar presente no espaço rural, antigas capelas rurais, antigos engenhos e casas de máquinas, o próprio maquinário de- sativado, antigos equipamentos de produção de energia (monjolo, rodas d’água, etc.), estruturas desativadas (como pontes, diques e barragens), o espaço físico destinado às mani- festações culturais locais (praças, terreiros, largos, vilarejos, etc.), enfim, todo o ambiente construído que conforma o imenso patrimônio cultural rural (Ferrão, 2004, p.136 apud Silva Filho, 2020). Segundo Alves (2004), em meio a uma sociedade onde o modo de vida urbano comanda a realidade da maior parte da população, o patrimônio rural assume papel relevante ao ser objeto que carrega simbo- logia e cultura intrínsecos. O turismo rural, portanto, se utiliza destes bens como forma de ser mediador na aproximação do homem à natureza. O patrimônio como recurso do turismo rural contribui para o desenvolvi- mento econômico do local, entretanto, não se deve tratar a atividade como método de salvação do mundo rural, pois apenas com planejamento e estratégias corretas a valo- rização do patrimônio acontecerá. Ao tratar o turismo rural como atividade econômica é necessário a compreensão que este pode trazer o estímulo de novas atividades na região, como também contribuir para a re- vitalização econômica de cidades e vilas vizinhas (Alves, 2004). Assim, “a variedade e o carácter genuíno do património rural traduzem-se em riqueza económica e cultural, constituindo-se por isso num pólo de interesse turístico” (Alves, 2004, p. 49). O Ministério do Turismo, nos docu- mentos Diretrizes para o Desenvolvimen- to do Turismo Rural (2003), estabelece o turismo rural “como o conjunto de ativida- des turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometido com a produção agropecuá- ria, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade” (Brasil, 2003, p. 11). De acordo com Alves (2004), para que o turismo rural possa ser estratégia de desenvolvimento local é necessário consi- derar três pontos: o primeiro, que o turismo cultural deve ser adaptável ao lugar e a clientela de onde será implantado; segundo, que as atividades turísticas devem gerar riqueza e bem-estar para a comunidade, e por fim, deve garantir conforto aos habi- tantes do local. O turismo, portanto, pode e deve ser ato de transformações qualitati- vas no meio rural, e os bens culturais não devem ser restringidos apenas a um papel de atração turística (Lopes, 1999). O papel do turismo cultural deve ser o de encorajar o desenvolvimento local de modo que possibilite a revalorização e promoção do bem patrimonial, sempre com o intuito de fornecer maior bem-estar para as gerações atuais e futuras, buscando resta- belecer a conexão entre passado e presente e assim transmitir valores (Alves, 2004). 1.5.1 Palacete das Artes, Museu Rodin - Salvador, BA O Palacete das Artes foi inaugu- rado no ano de 2002, após uma restau- ração para que pudesse abrigar a filial do Museu Rodin, em Salvador. Chamado “Palacete Catharino”, pertenceu ao Co- mendador Bernardo Martins Catharino, sendo concluído em 1912. O tombamento do Palacete aconteceu em 09 de junho de 1986 e foi aprovado pelo Instituto do Patri- mônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), sendo o primeiro imóvel de estilo eclético a ser tombado pelo instituto. Após o tomba- mento, foi sede da Secretaria Estadual da Educação e Cultura até ser destinado a virar o Palacete das Artes. A escolha do Palacete para ser a sede da filial brasileira do Museu Rodin se deu pois atendia a várias exigências, como lugar que pudesse acolher peças originais de gesso e bronze e que tivesse significado 28 29 1.5 Intervenções em patrimônios: estudos de caso referenciais 1.4 Patrimônio e turismo rural cultural para a cidade. Entretanto, como a edificação não possuía espaço o suficiente, foi proposto um novo prédio para incluir maior acervo e lugares de lazer. As edificações trazem uma linguagem de coexistência complementar, uma vez que o Palacete é protagonista, reservado para a exibição das peças francesas, a administra- ção do Museu e áreas de atividades educa- tivas. O novo espaço é destinado a reserva técnica, exposições temporárias e um café- -restaurante. A conexão dos prédios é feita a partir de uma passarela de concreto proten- dido de 3 metros de altura, sem quaisquer pilares de apoio. O jardim centenário também é peça importante para que a conversa entre os dois edifícios seja harmoniosa. É um apelo à convivência pois é ponto central e atravessa todo o terreno com caminhos de pedra por- tuguesa e obras de Rodin posicionadas. Mesmo com a inserção de um novo volume a ideia de não interferir significa- tivamente no terreno, nas árvores centená- rias do jardim e ainda deixar que o Palacete fosse a peça dominante se fez presente e hoje o Palacete das Artes trás, não somente a ideia de um Museu, mas o restauro e in- tervenção arquitetônica como uma soma ao existente para a criação de um conjunto ar- ticulado estrategicamente. 1.5.2 La Capilla de Brihuega - Gua- dalajara, Espanha Desenvolvido em 2012 pelo arquiteto Adam Bresnick, o projeto de restauro da Capela de Brihuega, que estava em situação de abandono desde 1969, previu “resolver patologias complexas” (Architectures, 2014) sofridas pelos anos de descuido. Com objetivo de recuperar a estrutura e poder trazer usos variados para a cons- trução, foi estudada a fundo a arquitetura existente. Assim, foram refeitos detalhes das fachadas e beirais de telhas, mas ainda permitindo que falhas fossem apontadas, para que a noção de passagem do tempo fosse respeitada. Visando a experiência única de cada visitante, o projeto conta com espaços multiuso para diversos eventos, desde um casamento formal, até espaço para uma aula de ioga (Architectures, 2014). Para isso dispõe e distingue três áreas distintas, arti- culadas entre si: a cúpula, a entrada da nave e uma nova construção suspensa. As primeiras áreas transparecem a sobreposição entre antigo e novo, enquanto a última se destaca como ponto distinto, abrigando os novos usos, como banheiros e cozinha. Além disso, a materialidade também contribuiu de forma harmônica e de unificação do projeto atual com o antigo, usando mármore e ripas de pinho. 30 31 Figura 3: Museu Rodin. Fonte: Nelson Kon, 2020 Figura 4: Intervenção na La Capilla de Brihuega. Fonte: Eugeni Pons, 2012. A COMPANHIA AGRÍCOLA INGLESA NO CONTEXTO DA EXPANSÃO CAFEEIRA NO NOROESTE PAULISTA dois O capítulo aborda o ciclo cafeeiro na região nordeste do estado de São Paulo, dando ênfase na expansão ferroviária da companhia chamada Alta Paulista, que desbravou os sertões do estado e trouxe o reconhecimento da potencialidade agrícola da região. Também é apresentado a história da Companhia Agrícola Inglesa, complexo de produção cafeeira que ficou em atividade entre as décadas de 1920 a 1960. A tese de doutorado do Prof. Dr. Vladimir Benincasa foi obra essencial para a compreensão sobre o ciclo cafeeiro, junto do Trabalho Final de Graduação de Adenir Gomes da Silva Filho que explora vastamente a Companhia Inglesa. De acordo com Benincasa (2007, p. 247) “o café, na segunda metade do século XIX, tornava-se um produto cada vez mais importante no comércio mundial”. O ciclo cafeeiro passou por algumas fases, antes de se consolidar como um dos maiores cenários econômicos, não só brasileiro, como também mundial. A produção do café foi a que obteve maior atenção durante o final do século XVIII até meados do século XX no estado de São Paulo e que tornou a região uma das principais do país na época. O desenvolvimento da agricultura no estado de São Paulo foi pouco dinâmico até metade do século XVIII, quando a produção de cana-de-açúcar passou a ter destaque, principalmente nas regiões das cidades de Moji-Guaçu, Jundiaí, Sorocaba e Piracicaba e o desempenho econômico da região começa a atrair imigrantes (Benincasa, 2007). Inicialmente, o café não tinha destaque entre os cafeicultores, pois detém certas desvantagens, como o tempo entre plantio e colheita, que podia chegar a vários anos, além, do desconhecimen- to das tecnologias de beneficiamento dos grãos que, em comparação com países pro- dutores da época, era de baixa qualidade. A produção cafeeira brasileira alavancou com a devastação de cafezais cubanos na década de 1830 e com o aumento da demanda dos comércios da América e Europa (Lunna & Klein, 2005 apud Silva Filho, 2020). A chegada da cafeicultura para a 33 2.1 O Oeste Paulista e as fazendas de café região do Vale do Paraíba no fim do século XVIII, segundo Monbeig (1984 apud Silva Filho), não foi brusca, mas progressiva, pois a atividade cafeeira já acontecia nas terras fluminenses. A produção dos grãos ainda era papel secundário nas fazendas da região, porém a partir da década de 50, o mercado cafeeiro começa a se tornar promissor (Silva Filho, 2020). A cafeicul- tura avança para o Centro-Oeste Paulista e, em 1830, já se encontrava na região de Campinas, e continuou em direção de Limeira e Rio Claro até atingir Araraquara e Ribeirão Preto. A partir de então toma rumo ao oeste e sudoeste do estado (Benincasa, 2007). De acordo com Benincasa (2007) a atividade cafeeira tinha permanecido cen- tralizada no Vale do Paraíba em razão da facilidade de mobilidade das safras até os portos no litoral e, para além de Rio Claro, não era economicamente vantajoso para atividade devido o transporte ser encareci- do e da possibilidade de perda ou roubo da carga. Inicia-se, então, a partir da segunda metade do século XIX, a construção de linhas férreas pelo interior do estado para o escoamento da produção cafeeira. Segundo Matos (1974 apud Silva Filho, 2020), a rede ferroviária foi construída em função da cultura cafeeira onde, ao invés de guiar a expansão territorial, era guiada pela mesma. Inauguram-se então, a partir da década de 1870, grandes companhias férreas que foram importantes por possibilitar o avanço interiorano do café e da população, como: Mogiana, Sorocabana, Paulista, Ituana, entre outras. A partir das primeiras décadas do século XX, com abalos da crise econômica, o preço do café oscila e sua produção começa a ser deixada de lado para a abertura da diversificação da produção. A ferrovia, no entanto, continua a ser foco. Assim, a primeira parte do século XX marca a conquista e povoamento do sertão do estado de São Paulo e a criação de novas linhas ferroviárias (Benincasa, 2007). Enquanto a Sorocabana avançava pelo sul, a Paulista abria caminhos pelo norte e abria linhas que conectavam o interior paulista ao porto de Santos. Até 1920, a ocupação se dava em trechos do Planalto Ocidental paulista, entretanto, a produção se reduz pela curta duração do pé de café e a escassez que este gera no solo. Assim, surge o interesse pelas novas terras na nova zona que ia se abrindo no noroeste paulista (Benincasa, 2007). Abria-se assim, para o cafeicultor, uma vasta região já servida pela ferrovia, embora com solos não tão bons quanto à terra roxa, que dera fama mundial a São Paulo. Apesar de menos férteis, essas terras davam colheitas que, à época, se mostravam vantajosas (Benincasa, 2007, p. 467). Segundo Benincasa (2007), a nego- ciação das terras passou a ser extremamen- te rentável e o prolongamento das linhas férreas continuava. A divisão do terreno e loteamento das terras começam a ser racio- nalizadas, com glebas retangulares, com acesso à cursos d’água e em pontos altos de serras, evitando a excessiva valorização de lotes. A Companhia Paulista estende seus trilhos além de Piratininga e várias cidades como Gália, Garça e Marília, são fundadas no final da década de 20. A criação desses novos municípios desperta o interesse de capital estrangeiro e grandes Compa- nhias, como a Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, são construídas. [..] a Companhia Paulista e da So- rocabana iniciaram seu avanço para essas regiões, onde o início do cultivo do café se deu entre fins do século XIX e início do século XX, e, ao contrário das zonas Mojiana e Paulista, foi acompanhado pela estrada de ferro, quase nunca a precedendo. Nessas regiões, a cafeicultura atinge seu maior pico de produção entre 1934 e 1935, em plena crise dessa lavoura. Essa altíssima produção fora incen- tivada pelos altos preços de 1928, às vésperas da quebra da economia mundial (Benincasa, 2007, p. 465). Mesmo com a crise de 1929, o Noroeste Paulista continua a se desenvol- ver extraordinariamente, a população migra cada vez mais para a região e a urbanização se faz mais presente. A produção cafeeira continua mesmo com preços baixos, mas a rotatividade da plantação torna-se impres- cindível e, a partir da década de 1940, o café, produto que, até então, era símbolo do apogeu do estado de São Paulo, perde força. Já é quinta hora da manhã de um mês de Junho na Companhia Inglesa da década de 1930. Os galos ainda sono- lentos, são despertados pelo barulho agudo e choroso dos muitos tratores na garagem da fazenda. A beira do imenso terreiro de secagem do café os sinos tocam, contribuindo para o fim do tom solene do silêncio noturno. Toda fazenda desperta para mais um intenso dia de trabalho. É a colheita do café! (Uzai, 1996, p. 8). 2.2 A Companhia Agrícola Inglesa Rio Tibiriçá 34 35 A Companhia Agrícola Inglesa do Rio Tibiriçá, ou apenas Companhia Inglesa, foi construída na década de 1920 pela companhia londrina Basil Warrant (Carvalho, 2016, apud Benincasa, 2020) nas terras onde se tornaria o município de Gália. Seu modelo de gerenciamento combinado com as atividades culturais e artísticas oferecidas para os trabalhadores fizeram com que a fazenda se tornasse um dos maiores empreendimentos agrícolas ca- pitalistas do interior do Estado de São Paulo (Uzai, 1996). A vinda dos ingleses para a Alta Paulista se deu pelo avanço da produção do café e das ferrovias, como visto ante- riormente. Segundo Monbeig (1984 apud Uzai, 1996), a região de São José das Antas (Gália) começa a entrar em atividade e a quantidade de solos e a mobilidade para as cidades de Garça, Marília e Gália foram fatores que trouxeram o interesse de inves- tidores nas plantações de café. Segundo Gomes (1997, apud Silva Filho, 2020) os primeiros trabalhadores vieram sob a demanda de desmatamento das terras da fazenda e estes permaneceram no local para a produção cafeeira. Alguns dos motivos da permanência foram a própria oportunidade de trabalho, as preocupações com os direitos trabalhistas dos ingleses e a dificuldade de locomoção dos trabalhado- res para suas casas. Fatores que foram im- portantes para que a Companhia se tornasse uma pequena vila com comodidades. Assim, a Companhia Inglesa cresceu e, por causa de sua grande extensão terri- torial, foi necessária a divisão da área para controle e, com isso, aparece a figura dos administradores, pessoas de confiança dos ingleses e que eram trocados de quatro em quatro anos. Com essa divisão, também, a seção São João do Tibiriçá se torna sede da Companhia por motivos como topogra- fia mais alta e proximidade com o próprio Rio Tibiriçá, além de ser seu ponto central (Gomes, 1997 apud Silva Filho, 2020). A produção cafeeira foi sua principal fonte de renda durante a década de 1940 e contava com mais de dois milhões de pés de café e quase dois mil trabalhadores. En- tretanto, o mercado cafeeiro estava a oscilar depois da queda da Bolsa de Nova York, e a diversificação de plantações começou a ser necessária. A Companhia passa então a produzir diferentes tipos de cereais, legumes e hortaliças. Também é produzido cana de açúcar, algodão e seda, que são enviados aos grandes centros após tratamentos feitos no local. Assim, dentro da própria Companhia v começa girar grande capital que se torna atrativo para ainda mais trabalhadores e comerciantes, além de variados tipos de cargos como pedreiros, pintores, eletricis- tas, carpinteiros, entre outros (Silva Filho, 2020 apud Gomes, 1997). O atrativo financeiro era acom- panhado do atrativo do gerenciamento feito dentro da Companhia que, segundo Benincasa (2007) era fator que a diferen- ciava de outros empreendimentos cafeeiros. Primeiro, como já dito, a forma de geren- ciamento onde desaparece a figura do fa- zendeiro, como era o tradicional dentro das fazendas brasileiras, aparecendo as figuras dos profissionais contratados para diferen- tes funções como gerente, sub gerentes e contadores. E, segundo, as condições traba- lhistas que eram ofertadas, além de oportu- nidades de lazer e serviços. Segundo Uzai (1996) a organização do trabalho era um híbrido de tradicional sistema de colonato com o proletariado e 36 37 Figura 6: Implan- tação da fazenda São João do Tibiriçá, antiga Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, ou Companhia Inglesa, em Gália. Fonte: levantamen- to de V. Benincasa, 2006, pág. 527. havia preocupação dos ingleses com a le- gislação trabalhista vigente, pois foram en- contradas documentações dos anos de 1949 a 1951 sobre o pagamento de férias aos trabalhadores, benefício este que não era garantido no regime de colonato, sistema difundido nas fazendas paulistas. Ademais, o núcleo sociocultural que foi criado na Companhia se tornou ponto importante na memória dos antigos moradores. Filmes que chegavam no mesmo ano ao cinema local, peças teatrais, shows de músicas, circos e apresentações eram eventos recorrentes no complexo, mas que sempre vinham acompanhados da maximização do ritmo do trabalho (Uzai, 1997). Podemos ver como essa dualidade era presente no relato da ex-colona D. Maria dado à Uzai em 1996: Olha, sinceramente naquela época não se via tanta atração num só lugar. Bom, também não era só festa, nós trabalhávamos bastante. Trabalhar, todos tem que trabalhar... Divertir, nem sempre! Lá na Companhia, divertir era sempre. Só que era assim: trabalho é trabalho, diversão é diversão! Nunca ninguém ficava vadiando! O sol era o trabalho e a lua era a festa. Sem sol não há lua! Tinha gente que até reclamava que estava trabalhando demais, mas valia a pena, porque nas outras fazendas não tinha tanto divertimento como na Companhia. Nem em Gália era tão bom como lá! Todas as atividades de lazer não eram apenas para manter o glamour dos ingleses, mas também estratégias de estímulo para os empregados, que garantiam a satisfação do pertencer, de trabalhar em um local diferen- ciado e com tantos “privilégios”. A cons- trução da imagem de “bons patrões” dos ingleses serviu inclusive como maneira de maior passividade dos trabalhadores. Então né! Os ingleses eram bons mesmo! De vez em quando eles iam nas casas do povo para ver se estavam necessitando de alguma coisa, Eles foram duas ou três vezes em casa e nem se importam em sentar no chão duro da sala. Tinha vez que até comiam com a gente, Que gente boa! Os inglês mais velho é padrinho de batizado do meu irmão caçula. Só que era assim: eles eram bons, mas se não fizessem as coisas como eles mandavam ai era melhor arrumar as trouxas e ir embora, Eles eram amigos, mas eram patrões! (Relato de D. Ana apud Uzai, 1997, p. 40). Portanto, as relações pessoais eram amistosas, mas dependiam estritamente da eficiência de trabalho dos moradores e, como salienta Uzai (1996, p. 41), a relação de “hibridismo entre as relações pessoais diretas e de amizade entrelaçadas às relações de obediência e servidão” separam o patrão e o empregado. Figura 7: Time de futebol da fazenda. Fonte: Grupo Piramba MTB. Figura 8: Casamento na década 1980. Fon- te:Página “Juntos pela igreja da Companhia Inglesa Gália/SP” no Facebook. Fotos do Arquivo Pessoal de Suely Pinheiro e José Emídio. 38 39 Assim, outra segmentação social também caracterizava as relações dentro da Companhia e estavam implícitas nos costumes, como relata Hamilton Carvalho (2016), ex-colono. Elas aconteciam de formas variadas, como na separação das áreas residenciais e nos padrões das casas Os ingleses moravam em casas soberbas, em área relativamente afastada, com enormes jardins de desenho e padrão inglês. Todas as casas dos ingleses tinham lareiras, ainda que estivéssemos em um país de clima tropical e, ao invés de chuveiros, tinham banheiras. [...] A casa do gerente geral lembrava uma casa de campo como se vê nas foto- grafias inglesas com um jardim onde havia um lago para peixes, luxo im- pensável em qualquer residência nos anos de 1940. Havia uma piscina privativa e uma quadra de tênis onde só eles jogavam. As famílias inglesas se reuniam entre si nos fins de semana para nadar, jogar tênis e beber whiskey. Não havia interação com as demais famílias brasilei- ras. Além disso, eram os únicos que tinham carros particulares quando todo mundo andava a pé. A segunda classe social era o pessoal do escritório, administração, far- macêutico e professores da escola primária. Moravam em casas confor- táveis com jardim e grandes quintais. Dispunham de água encanada e energia elétrica grátis, mas ninguém tinha telefone ou carro. Seriam talvez umas dez ou quinze famílias que também só se reuniam entre si em ani- versários e reuniões. Não interagiam socialmente com os ingleses, nem com os demais residentes da fazenda. A terceira classe eram os trabalhado- res rurais, mecânicos, carpinteiros e operadores das fábricas. Moravam em conjunto de casas, algumas de alvenaria e outras de madeira, conhe- cidas como “colônias”, sem jardins, mas com água encanada e energia elétrica gratuita. A vida social desta classe girava em torno do bar, do cinema, do clube de futebol e da capela (Carvalho, 2016). A Companhia Agrícola do Rio Tibiriçá, durante seu período de atividade, chegou a ser conhecida como o “sonho dourado dos ingleses” até o ano de 1956 quando foi vendida à Companhia Agrícola, Imobiliária e Colonizadora (CAIC). O motivo pode ser a queda dos preços inter- nacionais do café ou descontentamento com o governo vigente na época, mas era fato que a permanência de suas atividades econômicas e recreativas não podiam mais ser sustentadas. Assim, surgiram novas pro- priedades a partir da criação de loteamentos das terras que compreendiam a Companhia (Benincasa, 2007; Uzai, 1997). Por anos as construções foram con- servadas pelas famílias que permaneciam no local, entretanto, atualmente, restam apenas ruínas, como a da Capela São João que será analisada a seguir. C AP EL A SÃ O J O ÃO Sa lv ag ua rd a e re ss ig ni fic aç ão d as ru ín as e m u m p ro je to d e tu ris m o ru ra l. 40 três A CAPELA SÃO JOÃO Os ingleses conversam sobre o inte- ressante filme visto ontem à noite em seu cinema. Estão ansiosos à espera da visita do senhor bispo. Neste momento, um luxuoso automóvel é estacionado em frente a imponente capela. É que trouxe o esperado bispo para a celebração da missa em louvor a São João. Todos entram naquele templo sagrado. Lá está o delicado sacristão lustrando os castiçais, turíbulos e candelabros em ouro e prata trazidos da Inglaterra. Percebem-se também, uma pequena multidão à espera da confissão de seus pecados. São as senhoras beatas, pecadoras convictas, que não perdem a oportunidade para admirar os maravilhosos afrescos pintados nas paredes laterais, Altar-mor e na nave da capela (Uzai,1996, p. 10). A Capela São João é uma das únicas edifIcações que restam do que um dia foi o complexo da Companhia Agrícola Inglesa. Segundo Benincasa (2007) o motivo da permanência do prédio é por pertencer à Paróquia de Gália. De acordo com Gomes (1997 apud Silva Filho, 2020), foi apenas com a chegada do engenheiro Humberto Celi que se começou a idealizar a construção de um edifício religioso. Foi escolhido o ponto mais alto da seção São João do Tibiriçá e, com a instrução do chefe geral de constru- ção José Zachello, em pouco mais de trinta dias, a capela já estava pronta. Segundo Pontes e Barnezi (2001 apud Silva Filho, 2020), a inauguração se deu no ano 1935, pelo Cardeal de São Paulo. A construção em estilo neogótico inglês em tijolos vermelhos aparentes não era uma simples capela, mas uma igreja destinada a atender moradores rurais de uma ampla área (Benincasa, 2007, p. 527) e possuía um programa completo. Possui nave ampla e livre, com o altar em mármore sob a abside e a sacristia e o santíssimo nas laterais. Também possui batistério e coro. A beleza da construção ainda permanece no seu exterior com a torre sineira em agulha ao centro e as aberturas em arcos com vitrais coloridos (Benincasa, 2007). Nossa! A Igreja da Companhia era tão bonita! Eu não perdia uma missa! Conta o povo que, quando inaugura- ram a Igreja, veio até Cardeal de São Paulo rezar missa! Cada pintura, de dar gosto a qualquer um, que tinha naquela igreja! Lá eu fiz a minha primeira comunhão e me crismei. Vi tanto casamento! Cada noiva linda! 43 44 45 Figura 9: Capela São João. Fonte: Biblioteca Municipal de Gália. Figura 10: Capela São João em 2023. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 11: Planta da Capela São João. Fonte: Levantamen- to métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. De vez em quando os ingleses davam até vestido de noiva! Que gostoso que era a Companhia! (Relato de D. Luzia apud Uzai, 1996, p. 40). Hamilton Carvalho, ex-morador, lembra que a Capela era ponto de grandes eventos da fazenda. Carvalho (2016), conta que a visita de padres acontecia quando havia datas comemorativas, e chegou-se a passar pela fazenda uma missão evangeli- zadora de frades capuchinhos, que contou com várias cerimônias como batizados, primeira comunhões, crismas e procissões. A verdadeira festa religiosa e popular era o dia de São João, padroeiro da Fazenda. Na noite de São João, os vizinhos se reuniam em torno de uma fogueira preparada de antemão e se comia pipoca, amendoim, cocada e era um tal de soltar rojões que ilu- minavam o céu da Fazenda continu- amente. Era uma festa caipira, dos caipiras mesmo – não se usava roupa de caipira, pois todos sendo caipiras usavam a própria roupa do dia a dia (Carvalho, 2016). A Capela, que um dia foi local de diversas celebrações e encontros, se encontra, atualmente, em condição lastimá- vel. O edifício permanece com suas ca- racterísticas quase inalteradas, mas a con- servação é precária. As paredes externas se encontram com pelo menos uma fissura vertical na alvenaria, os vitrais coloridos estão depredados, com poucas peças ainda inteiras. A cobertura da Capela está em péssimo estado, com grandes partes faltantes de telhas, ocasionando a infiltra- ção presente nas paredes e forro, além da decomposição da estrutura do telhado que também sofre com a ação de agentes pato- Figura 12: Cobertura da Capela São João. Fonte: Levantamen- to métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. PLANTA BAIXA CAPELA PLANTA DE COBERTURA CAPELA 46 47 ELEVAÇÃO FRONTAL ELEVAÇÃO LATERAL ELEVAÇÃO TRASEIRA Figura 13: Elevação da Capela São João. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 14: Elevação lateral da Capela São João. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 15: Elevação traseira da Capela São João. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. gênicos. O santíssimo e a sacristia são os locais mais degradados com a deteriora- ção da cobertura, os mobiliários internos foram depredados e a escadaria do coro apresenta muitas deformações. O altar-mor em mármore é um dos poucos elementos que se mantiveram em bom estado de con- servação.1 A Capela, hoje, é ponto de turismo pela sua grandiosidade e beleza, além de ser ponto de encontro de ciclistas que fazem trilha pela região. O inventário de um bem patrimo- nial é instrumento técnico que auxilia a manutenção das caraterísticas do edifício 1 Para maiores detalhes da condição de conservação da Capela consultar as tabelas M301, M302, M303 e M206 inseridas no Anexo A. e regulamenta as possíveis intervenções de salvaguarda a serem feitas nele, sendo considerado o primeiro ato no processo de tombamento. Esse documento surge como material para “ações de proteção, conser- vação, preservação, restauração, reabilita- ção, valorização e gestão do patrimônio” (Salcedo, 2020, p. 106). Os inventários são fichas que identi- ficam informações básicas dos bens como sua importância histórica e cultural, suas características físicas, estado de conserva- ção, preservação e se baseiam em pesquisas realizadas em diversos meios, com o intuito de abranger a maior quantidade de informa- ções, aprofundadas o suficiente, do edifício, para que não haja equívocos durante projetos de intervenções (Salcedo, 2020). Com a obtenção destes dados, é interessante que também haja a análise de forma analítica e crítica, preferencialmente com ilustrações e fotografias para maior veracidade, e caberia às instituições federal, estadual e municipal a elaboração e publicação deste material (Carta de Veneza, 1964; Carta de Atenas, 1931). A edificação da capela encontra-se suscetível às ações da natureza que podem causar danos às características físicas da mesma, e a elaboração de seu inventário é essencial para a garantia da manutenção das qualidades do edifício (Salcedo, 2020). Portanto, é relevante que haja o levanta- mento de dados minucioso e que a atualiza- ção do documento de inventário seja recor- rente (UNESCO, 1968). Ademais, a Carta do Restauro (1972) indica que os levantamentos de documen- tação de um edifício devem ser exaustivos e serem elaborados a partir de diversos meios como pesquisas bibliográficas, ico- nográficas e arquivísticas, pois irão ajudar na restauração da obra. A Declaração de Amsterdã (1975) ressalta que a organi- zação do inventário é indispensável, pois fornecerá a base para que a conservação não fuja do caráter legítimo da obra, e que é necessário a difusão destas fichas para que maior atenção seja dada à proteção das construções. O inventário da Capela São João foi proposto pelo arquiteto Adenir Gomes da Silva Filho a partir do Sistema Integrado de Conhecimento e Gestão (SICG), instru- mento desenvolvido pelo IPHAN. O foco dessa ferramenta é coletar dados sobre pa- trimônios culturais, a fim de produzir uma base de dados única sobre todos os tipos de bens materiais arquitetônicos e arqueoló- gicos da nação (IPHAN, 2009 apud Silva Filho, 2020). O SICG organiza a coleta de dados conforme três módulos: Conhecimento, Gestão e Cadastro. O utilizado por Silva Filho foi o modo de cadastro, que compõem fichas relativas a bens individuais que abrangem informações sobre o bem cultural que permitem sua identificação. Silva Filho produziu cinco fichas ao todo, sendo elas: a M304 que caracteriza construções típicas do patrimônio rural brasileiro a partir de aspectos morfológicos e atividades desen- volvidas, e as fichas M301, M302 e M303 direcionadas a Capela São João em dife- rentes aspectos como identificações gerais de localidade e caracterização externa e interna. Por fim, a M206 destina-se a acom- panhar e orientar vistorias nos imóveis com intuito de planejamento para revisões e intervenções futuras (Silva Filho, 2020). Todas as fichas produzidas pelo arquiteto se encontram no Anexo A deste trabalho. Junto do inventário, o tombamento de um patrimônio é um método de proteção a este bem. O Decreto-Lei Nº 25 de 1937 coloca o tombamento como instrumento jurídico e afirma que, se reconhecido como portador de valores ou memórias, o bem pode ser protegido pela União, os Estados ou pelos Municípios. O processo de tom- 48 49 3.1 Inventário e tombamento do patri- mônio bamento de um bem, sendo considerado uma ação de interesse público, não depende de interesse individual, assim, podendo ser manifestado pela comunidade. Os proprie- tários têm direito de se contrapor ao tom- bamento, porém o avanço do processo só irá rescindir com justificativas plausíveis. A inscrição do bem no Livro do Tombo acontece, então, depois da conclusão do levantamento de dados e da justificativa da necessidade de proteção do patrimônio (Brasil, 1937). Em outubro de 2020, com o Decreto Nº 1696/2020, a capela se tornou patrimô- nio municipal de Gália “pela sua história e beleza, despertou na população a vontade de preservar referida construção” (Tomba- mento Provisório Nº 1/2020)2. Entretanto, 2 Os levantamentos deste processo se encontram no Anexo A. seu estado de conservação permaneceu o mesmo desde então. Tendo em vista a Capela de São João como objeto de estudo deste TFG, surgiu a necessidade de uma maior investigação sobre sua materialidade e técnicas cons- trutivas. Segundo Villela (2015, pág. 12), a Arqueologia da Arquitetura surge para a aplicação de métodos não destrutivos que visam o “registro e interpretação objetivos de transformações físicas e materiais de su- perfícies arquitetônicas para auxiliar a rea- lização de diagnósticos de conservação” em construções arquitetônicas. Tendo como premissa que cada período histórico contribui de certa forma para a constituição da matéria e da forma configurada de uma ar- quitetura que chega até nós, na con- temporaneidade, a verificação das muitas transformações decorridas ao longo do tempo demanda o estabele- cimento de parâmetros de análise que implicam no reconhecimento objetivo dessas mudanças materiais (Villela, 2015). Portanto, para a análise de tal, foram feitas duas visitas in loco ao objeto de estudo: uma no dia 13 de agosto de 2023 e a segunda no dia 10 de março de 2024. A primeira visita se deu pelo interior da Capela com o auxílio de um funcioná- rio da prefeitura de Gália, que permitiu a entrada. Na segunda, realizou-se o registro e a análise da área externa da Capela, visto o impedimento da entrada no edifício por risco de desabamento (Figura 16). A análise e o levantamento foram feitos a partir de registros fotográficos e medições de elementos da edificação a fim de se ter maior abrangência da construção da Capela, que possui poucos registros. Os registros foram realizados, primeiramente, para contemplar a escala macro do edifício, e ser possível compreender sua grandeza em meio natural e abandonado. Em seguida, foram feitos registros tanto de detalhes da edificação, como de técnicas construtivas, adornos e reconhe- cimento de fissuras na estrutura, para uma melhor análise do estado atual da edificação em perigo de desabamento. Dentre os materiais usados, o que ganha destaque é o tijolo cerâmico, que é usado por toda a construção (paredes e pilares estruturais). São tijolos de coloração avermelhada de medidas variadas e que possibilitam grande variedade de texturas, ao edifício neogótico inglês, ao serem ass entados em diversas formas de aparelha- mento. Também é possível notar a presença de concreto nos alicerces e escadaria da capela, como um grande e único bloco de base para o prédio, e da argamassa armada, em de elementos decorativos na fachada da 50 51 Figura 16: Placas na frente da Capela. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. 3.2 Prospecção arqueológica das ruínas 3.2.1 Materiais e estrutura Por fim, outros materiais usados foram o ferro e vidro, presentes nos vitrais ogivais em todas as fachadas da capela. O ferro está, também, na cai- xilharia das aberturas, protegido por fina camada de tinta preta. Os vidros dos vitrais possuem quatro cores diferentes: verde, amarelo, roxo e branco e possuem textura similar ao que conhecemos como ártico. Atualmente, as peças estão depredadas, com vidros faltantes ou quebrados (Figuras 22, 23 e 24). 52 53 capela, como nas cruzes (Figura 16 e 17). Também é possível notar a presença de concreto nos alicerces e escadaria da capela, como um grande e único bloco de base para o prédio, e da argamassa armada, em de elementos decorativos na fachada da capela, como nas cruzes (Figura 16 e 17). O uso da madeira foi extenso, prin- cipalmente nas treliças, mas também está presente nas portas internas e externas, na escadaria que dá acesso ao coro, nos forros internos da sacristia, santíssimo, batistério e altar e no piso e estrutura do coro (Figuras 18, 19, 20 e 21). Figura 16: Argamassa armada presente em elementos da fachada. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 17: Cimento presente no alicerce da igreja. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 18: Forro do altar. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 19: Forro do batistério. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 21: Coro e treliças. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 20: Piso e estrutura do coro. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2023. Figura 22: Pedaço de vidro do vitral. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 23: Visão interna de um vitral. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. 54 55 Em relação ao estado de conservação da estrutura foi possível observar que há, pelo menos, uma trinca em cada fachada da Capela. A provável causa destas se deve ao movimento do solo, visto que a construção está perto de um pequeno declive, juntamente com o abandono de anos (Figuras 25, 26 e 27). Figura 24: Visão externa de um vitral. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 27: Trinca na fachada da Capela. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 26: Trinca na fachada da Capela. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 25 : Trincas na fachada da Capela. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Os tijolos maciços Tipo 1 foram en- contrados por todas as paredes da capela, sendo os mais usados, tanto nas paredes, quanto nos pilares de sustentação. Suas medidas se diferem do padrão que Costa (1955) apresenta, por variar em alguns cen tímetros em todas as suas dimensões, como 3 Não há fotos com fita métrica pela impossibilidade de chegar tão perto do material no local, portanto, as medidas são aproximadas. pode ser observado nas figuras 32, 33 e 34. O tijolo maciço Tipo 2 foi encontrado apenas nos pilares de sustentação da Capela. Essa tipologia apresenta mesma altura e comprimento que a tipologia 1, porém se difere na largura, como mostra a figura 35. Por último, a tipologia 3 foi usada apenas em detalhes ornamentais da Capela, como em cornijas e molduras das janelas. Suas dimensões são menores que as outras duas, acompanhando apenas a altura de 7 centímetros.³1 56 57 Ao se observar a construção como um todo foi possível verificar diferentes tipos de tipologias de tijolos cerâmicos empregados em sua construção. Segundo Costa (1955), os dois tipos principais de tijolos são os maciços, ou tijolos burros, e os furados que possuem, geralmente, dimensões de 23cm x 11cm x 7,5cm. Na Capela foram encontrados três tipos de tijolos de dimensões diferentes, como é mostrado no Quadro 1. Na Figura 28 é possível observar os vários tipos de tijolos e seus usos na construção. Tipo/nome do tijolo Dimensões classificadas por Costa (1955) Dimensões verificadas in loco Tijolo tipo 1 23cm x 11cm x 7,5cm 26cm x 13cm x 7 cm Tijolo tipo 2 26cm x 5cm x 7cm  Tijolo tipo 3 20cm x 10cm x 7cm  Figura 28: Parede da fachada frontal da Capela. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Quadro 1: Especificações dos tijolos encontrados in loco. Fonte: Elaborado pela autora, 2024. Figura 29: Tijolo maciço tipo 1. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 30: Tijolo maciço tipo 2. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 30: Tijolo maciço tipo 3. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. 3.2.2 Tipologias de tijolos e técnicas de assentamento de paredes 58 59 Assim, ao analisar a Enciclopédia Prática da Cons- trução Civil de Francisco Costa (1955), juntamente com o cruzamento de informações entre o arquivo digital CAD, fornecido por Adenir Gomes da Silva Filho, e as medições realizadas in loco dos tijolos, foi possível a criação de sistemas esquemáticos dentro do software SketchUp para a identificação das medidas das paredes da Capela, visto que a medição in loco foi impossibilitada pelo risco de entrada no edifício durante a segunda visita. Figura 32: Medidas do tijolo maciço tipo 1. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 33: Medidas do tijolo maciço tipo 1. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 34: Medidas do tijolo maciço tipo 1. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 35: Medidas do tijolo maciço tipo 2. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 36: Planta baixa da Capela São João. Detalhe do dimensionamento das paredes. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 37: Modelo esquemático de parede mestre de tijolos a 1 vez, a partir das tipologias encontradas na investigação in loco. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024.tijolo tipo 1 tijolo tipo 1 tijolo tipo 1 tijo lo tipo 1 tijo lo tipo 1 tijo lo tipo 1 Figura 38: Modelo esquemático de parede mestre de tijolos a 1 vez e 1/2, a partir das tipologias encontradas na investigação in loco. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. 60 61 Portanto, averiguou-se que, durante a construção da Capela, provavelmen- te foi usado o método de assentamento de paredes a 1 vez e a 1 vez e ½ aparelha- mento inglês, ou Opus Pseudisodomum (Costa, 1955). Segundo Costa (1955, pág. 13), os pilares de uma construção são “geralmen- te destacados da obra principal e quase sempre de seção quadrada e destinados a suportarem partes superiores e balancea- das”. Levando em consideração os pilares da Capela, foi possível observar que há uma maneira de assentamento de tijolos diferente em relação às paredes. Vista a utilização dos tijolos de Tipo 2 dá-se o nome, portanto, de paredes de tijolo misto. Foi analisado que, como as paredes, os pilares da Capela possuem duas dimensões diferentes, em relação ao local em que se posicionam. Deste modo, Costa (1955) demonstra que as dimensões das paredes estão diretamente ligadas ao posicionamento dos tijolos durante a construção da fiada. Afirma também que o assentamento de paredes de 1 vez de tijolo é consistente e mais econômico que no método de paredes de 1 e 1/2 vez. Figura 39: Modelo de parede de tijolos a 1 vez, por Costa (1955). Fonte: Costa, 1955, pág. 6. Figura 41: Parede da Capela em assentamento inglês em tijolo maciço. Fonte: Acervo pessoal da autora. Figura 42: Planta baixa da Capela São João. Detalhe do dimensionamento dos pilares. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 40: Modelo de parede de tijolos a 1 e 1/2, por Costa (1955) Fonte: Costa, 1955, pág. 8. Figura 43: Modelo esquemático de pilares de tijolos a partir das tipologias encontradas na investigação in loco. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. Figura 44: Modelo esquemático de pilares de tijolos a partir das tipologias encontradas na investigação in loco. Fonte: Acervo pessoal da autora, 2024. tijolo tipo 1 tijolo tipo 1 tijo lo tipo 1 tijo lo tipo 1 tijo lo tipo 2 tijo lo tipo 2 C AP EL A SÃ O J O ÃO Sa lv ag ua rd a e re ss ig ni fic aç ão d as ru ín as e m u m p ro je to d e tu ris m o ru ra l. 62 Ao analisar a Capela São João percebe-se que o uso da parede em 1 e 1/2 vez de tijolo se deu unicamente na fachada do edifício, bem como os pilares de espessura de 81 centímetros, devido ao aumento do peso naquele local pela presença da torre, que exige uma estrutura mais robusta. As paredes em apenas 1 vez de tijolo constituem o restante das paredes da Capela, juntamente com os pilares de 53 centímetros. Dessa forma, pode-se concluir que houve a ideia de uma economia durante a construção, mas sem perder a grandiosidade da fachada principal da Capela. Figura 45 e 46: Pilares da Capela em assentamento inglês em tijolo misto. Fonte: Acervo pessoal da autora. Figura 47: Planta de especi- ficação de paredes e pilares conforme dimensão. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Legenda: quatro PROPOSTA PROJETUAL 65 O município de Gália faz parte, junto de Marília, Garça e Ocauçu, da Região Turística do Alto Cafezal, pela sua história com o desenvolvimento econômico cafeeiro no estado de São Paulo durante o século XX (Gália, 2023). A cidade está locali- zada a 405 km da capital paulista e conta com cerca de 7 mil habitantes, sendo 4 mil apenas na área rural, segundo a estimativa de 2021 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia Estatística). 4.1 Contexto Figura 48: Localização de Gália e cidade da Região turística do Alto Cafezal. Fonte: Base cartográfico do IBGE. Elaborado pela autora. Figura 49: Cidade de Gália e localização da Fazenda São João. Fonte: Base cartográfico do IBGE. Elaborado pela autora. 66 67 A cidade continua com sua produção agrícola presente e durante os anos adquiriu outros meios de turismo. Segundo o Relatório de Atividades Turísticas (2021) realizado pelo Ministério do Turismo, o principal segmento turístico do município é “aventura, ecoturismo, rural e cultural”. Os atrativos registrados são: a Fazenda São Ramiro que incentiva a realização de eventos gastronômicos, pesca e visitas a cachoeiras; a Fazenda Dona Irani que favorece a visita à fazenda de café e comércio de mercadorias locais; a Estação Ecológica Caetetus que promove atividades de educação ambiental com trilhas de observação e a Igreja Matriz de São José que possui murais artísticos re- ligiosos do pintor plástico ítalo-brasileiro Bruno di Giusti, além de chamar atenção pela arquitetura neoclássica e neogótica. Ademais, a presença da atividade do ciclismo na zona rural de Gália vem se tornando cada vez mais expressiva. Grupos de ciclistas criam rotas próprias, que exploram as paisagens naturais da região da cidade, como cachoeiras, e que passam por localidades como a própria Capela São João. A Capela São João tornou-se ponto de parada e de encontro nas trilhas que passam pela fazenda São João do Tibiriçá pela sua arquitetura marcante em meio rural. Ciclistas saem tanto da cidade de Gália quanto de cidades próximas, produ- zindo trajetos que seguem as estradas rurais entre as propriedades privadas. Logo, o projeto de restauro da Capela São João deu-se pela criação de um novo uso para o edifício que chamasse a atenção dos visitantes que já passam pelo local periodicamente, além de trazer um maior conforto e propósito em ficar no local por mais tempo. Assim, foi criado o projeto de Memorial da Companhia Inglesa que será situado dentro da Capela e um novo edifício, onde era a antiga escola da Companhia, que possuirá uma cafeteria para atender os visitantes e um Ponto de Apoio aos ciclistas que passarem pelo local. Figura 50: Ciclismo rural e turismo na região de Gália-SP. Fontes: Base cartográfica: Google Earth, 2020; Trilhas via Wikiloc. Elaborado pela autora. A proposta de tornar o edifício em Memorial surgiu como principal ideia para uso da Capela visto a grande quantidade de relatos dos ex-moradores sobre a antiga Companhia Inglesa e a importância dela durante seus anos de atividade que deixou marcas pela cidade de Gália e região, como já foi mostrado em capítulos anteriores. Primeiramente, em função de rea- bilitar a Capela São João para uso, há ne- cessidade de regularizar sua estrutura de fundação, visto o risco de desabamento da construção. Dessa forma, sugere-se que o plano de restauro seria responsável pela estabilização do prédio junto com ativi- dades que tornassem a Capela utilizavam novamente, como o restauro das fachadas, esquadrias depredadas e das treliças e a colocação de novas telhas. Este projeto então levaria em consideração estudos mi- nuciosos e os valores e princípios de Boito (2000), que prezava pela diferenciação do velho e do novo e do que foi inserido com o restauro; de Giovanoni (2013) que propunha a inserção de apenas o necessário nas intervenções; e por fim de Brandi que propõe a intervenção com fácil distinção de materiais e com fácil remoção. Assim, para a estruturação do plano do Memorial, foram criados painéis de vidro e madeira com dimensões de 2,00m x 1,90m x 0,05m, que pudessem ser suspensos por roldanas nas treliças da Capela. A criação dos painéis se concei- 1,90m 2,00m 68 69 4.2 Memorial da Companhia Inglesa PLANTA MEMORIAL PLANTA MISSA Figura 51: Dimensões dos painéis. Fontes: Elaborado pela autora. Figura 52: Planta da Capela São João em layout de memorial. Fonte: Levanta- mento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 53: Planta da Capela São João em layout de missa. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. tuou pela ideia de que não houvesse muitos impedimentos visuais dentro da Capela, podendo assim ainda manter-se o vislumbre da grandiosidade interior do edifício. A disposição destes, além de ter se dado pela localização das treliças, levou em consideração as entradas e a concepção de um fluxo pelo local. O acesso principal do Memorial acontece, então, pela porta frontal da Capela e dirige os visitantes com os painéis até o altar. O Memorial, então, contaria com fotos antigas da Companhia Inglesa e relatos de ex-moradores, o que inspirou este TFG. A suspensão dos painéis por roldanas foi elaborada para que houvesse a possibilidade da Capela ainda ser usada para missas, portanto, era necessário que os painéis pudessem ser deslocados para desobstruir a visão e permitissem o layout dos bancos para a celebração religiosa. Também, pensando na permanência da instalação e do restauro da Capela, foi sugerido a inserção de um forro amadeirado entre as treliças e as telhas para que houvesse a proteção interna mas que permanecesse o visual da estrutura. As plantas e cortes da Capela com layout do Memorial e de missa com informações adicionais podem ser encontradas no apêndice. 70 71 Figura 54: Visão do memorial. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 55: Visão do memorial. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 56: Visão do memorial no coro. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 55: Visão do memorial pelo coro. Fonte: Elaborado pela autora. 72 73 CORTE AA CORTE BB Figura 57: Corte longitudinal da Capela. Fonte: Levantamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. Figura 58: Corte transversal da Capela. Fonte: Levan- tamento métrico por Adenir Gomes da Silva Filho. Adaptado pela autora. 74 75 Ao analisar a distância em que a Capela se encontra do meio urbano, foi perceptível que o uso dela enquanto templo religioso se daria de grande dificuldade, portanto, a ideia de trazer cultos religiosos partiu do princípio que ocorressem apenas em datas importantes durante o ano. Assim, não haveria conflito de interesses de visi- tantes ao local e ainda seria possível que a Capela tivesse seu uso original esporadica- mente. Tendo em vista, então, da possibili- dade desses dois usos para o edifício, foram criados bancos de madeira que pudessem ser flexíveis diante da atividade sendo realizada. Deste modo, os novos bancos usados tanto no layout do Memorial quanto no layout das missas, tem medidas de 2,50m x 0,50m x 0,45m. Os bancos foram elaborados visando uma estética mais limpa e regular para que pudessem complementar a estética dos painéis. Os mesmos, quando não estão sendo utilizados, serão guardados no Santíssimo e Sacristia da Capela. Figura 60: Visão da missa. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 59: Dimensão dos bancos. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 61: Visão da missa. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 62: Visão da missa pelo coro. Fonte: Elaborado pela autora. 2,50m 0,50m 0,45m 4 O questionário e respostas onde se encontram estas informações estão no Apêndice. O projeto de Ponto de Apoio aos ciclistas e cafetaria se deu primeiramente pela informação da passagem dos mesmos pela Capela e se estruturou depois de uma conversa com responsáveis por grupos de ciclismo da região. Dois grupos foram so- licitados: PirambaMTB e Quadra Bikers Cicloturismo que informaram que as neces- sidades de um ponto de apoio se daria pela disponibilização de materiais de conserto de bicicletas e local de abastecimento de alimentos.41 Juntamente dessa ideia, surgiu a necessidade de um espaço que pudesse também trazer maior conforto para quem apenas quer passar e visitar o Memorial. Assim, idealizou-se a criação de um local que pudesse abranger os dois públicos. Após análise maior do local, foi possível notar que, durante os anos de atividade da Companhia Inglesa, a escola que atendia aos moradores se localizava ao lado da Capela. Sendo assim, surgiu a ideia de posicionar o novo prédio onde era o antigo, que foi demolido entre os anos de 2002 e 2010, para aludir ao volume que acontecia no lugar. A circulação externa entre os edifícios conta com a pavimentação do terreno com piso intertravado seguindo sua declividade padrão, visto a pouca diferença de elevação que existe no local e aspirando a permeabilidade do solo. Foi criado um desenho orgânico que gerasse um grande canteiro entre a Capela e o Ponto de Apoio, além da disposição de bancos para incen- tivar a ocupação dos visitantes também na área externa do lugar. 76 77 4.3 Ponto de Apoio aos Ciclistas e cafeteria Figura 63: Capela e escola. Fonte: Biblioteca Municipal de Gália. Figura 64: Implantação dos edifícios e novos caminhos. Fonte: Elaborado pela autora. IMPLANTAÇÃO Partindo do conceito de ser um edifício que não competisse visualmente com a Capela e se diferen- cie completamente em estilo arquitetônico, o Ponto de Apoio e Cafeteria tem apenas um pavimento, que chega a uma altura de no máximo 4,25 metros. Grandes painéis de vidros nas portas e janelas foram criados para trazer leveza ao prédio, que contrasta com o peso visual que a Capela possui e também auxiliam na visualização de todos os ambientes à ela. Para permitir ainda mais a sensação de leveza do edifício, este foi posicionado sob uma pla- taforma de cimento, que eleva toda a construção em até 1,00 metro do ponto mais baixo do terreno. Portanto, foi Ambiente Função Área (UN) Àrea (Total) Ponto de Apoio Diversos 63,00 m² 63,00 m² Cafeteria Alimentação/ Convivência 114,00 m² 114,00 m² Cozinha Técnico 45,00 m² 45,00 m² Armazém de secos Armazenamento 5,00 m² 5,00 m² Câmara de Refrigeração Armazenamento 4,95 m² 4,95 m² Lockers Armazenamento 6,00 m² 6,00 m² D.M.L. Limpeza 1,75 m² 1,75 m² W.C. Funcionários Sanitários 3,95 m² 7,90 ,m² W.C. Sanitários 3,60 m² 7,20 m² W.C. PCD Sanitários 4,25 m² 8,50 m² P on to d e A po io a os C ic lis ta s e C af et er ia 78 79 PLANTA PONTO DE APOIO E CAFETERIA CORTE AA CORTE BB Figura 65: Planta do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 66: Corte AA do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 67: Corte BB do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Quadro 2: Quadro de áreas do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. necessário apenas pequenas modificações na topografia existente, proporcionando uma maior preservação do ambiente rural. O acesso para a construção se dá pela frente do Ponto de Apoio que está em nível com o terreno e pela escadaria lateral que chega até a frente da cafeteria. O Ponto de Apoio conta com uma área de 63,00 metros quadrados e dispõe de equipamentos de reparo de bicicletas e de auxílio na atividade física dos ciclistas. O intuito é abranger quaisquer neces- sidades de quem pratica a atividade física que passe pelo local ou esteja próximo. As plantas e cortes do Ponto de Apoio e cafeteria com informações adicionais podem ser encontradas no apêndice. 80 81 Figura 68: Vista do Ponto de apoio. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 69: Vista do Ponto de apoio para a cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 70: Vista do Ponto de apoio para a Capela. Fonte: Elaborado pela autora. ELEVAÇÃO 1 ELEVAÇÃO 2 Figura 71: Elevação 1 do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 72: Elevação 2 do Ponto de apoio e cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. O salão de atendimento é o local de encontro entre a cozinha e o Ponto de Apoio. Com acesso principal pela lateral esquerda, a Cafeteria possui uma extensão de 114,00 metros quadrados e pode atender até 45 pessoas acomoda- das em mesas de dois ou quatro lugares, que também são flexíveis à mudança de layout quando necessário. O mobi- liário em madeira e estofado branco foi escolhido buscando a otimização do espaço e a harmonia com a estética. O balcão para atendimento e pagamento se encontra posicionado estrategica- mente ao lado da cozinha para que o fluxo de pratos não interfira no acesso dos visitantes e também determina a entrada principal da Cafeteria. Para o auxílio completo da atividade em meio rural, a Cafeteria possui cozinha completa, com armazém de secos e câmara de refrigeração, visando o menor número possível de transportes para o local que é de longe acesso. A cozinha se localiza de forma centralizada no edifício e tem acesso pelo corredor lateral. O fluxo da cozinha tem foco em otimizar o trabalho e a cocção de comidas de preparo rápido. A saída e entrada de alimentos limpos e sujos se dão de maneira estratégica para que não haja contaminação cruzada. Assim, o ciclo limpo, que contém as partes de higieniza- ção, preparo e empratamento, acontecem de formas complementares e que evitem trocas existentes em cada etapa. O ciclo sujo, que se dá na volta dos pratos do salão, a higie- nização e descarte do lixo, ocorre de forma que seja possível a mínima intervenção nas outras etapas e com fácil acesso à parte externa para descarte. Complementando o ambiente, há armários e banheiro completo para funcionários com acesso pelo corredor lateral, tentando contemplar o máximo possível as necessidades dos mesmos. 82 83 Figura 73: Vista da cafeteria e cozinha. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 74: Vista da cafeteria para a Capela. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 75: Vista da cozinha para a cafeteria e Capela. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 76: Layout cozinha. Fonte: Elaborado pela autora. As cores e materiais selecionados para o novo edifício foram inspiradas pela própria Capela São João, com intenção de complemen- tar a construção já existente, ainda que em um estilo arquitetônico totalmente diferente. Desta maneira foram escolhidos tons terrosos para os revestimentos da parte social da Cafeteria que aludem aos tijolos tão característicos usados nas paredes da Capela. O branco das paredes, a madeira nos pilares e vigas e o concreto na plataforma, ainda que também referência à Capela, são usados à modo de transmitir a mo- dernidade do prédio, bem como as grandes es- quadrias de vidro com perfis preto. Ademais, as formas circulares que aparecem em detalhes como nas decorações das paredes e nos perfis do guarda-corpo são referências diretas à abisde da Capela. Por fim, uma vez que o novo edifício se conceitua levando em consideração a leveza e na não competição hierárqui- ca com a Capela, a inserção de uma caixa d’água no prédio se fez com dificuldade, pois resultaria em um volume muito forte na cobertura. Também, a necessidade de um ponto de vigia, visto a quantidade de bens materiais e a proteção do patrimônio contra depredações, surgiu a ideia de um um novo volume vertical, que se inserisse no local sem que tirasse a atenção do Ponto de Apoio e principalmente da Capela. Assim, o novo volume posicionou-se perto do es- tacionamento de funcionários e, visualmen- 84 85 Figura 77: Vista dos azulejos na cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 78: Vista do detalhe da parede na cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 79: Vista do detalhe da parede na cafeteria. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 80: Planta vigia/mirante. Fonte: Elaborado pela autora. PLANTA VIGIA/MIRANTE te, entre os dois edifícios já vistos, e, com sua altura total de 12 metros, tornou-se um ponto médio na perspectiva de quando se olha da Capela para o Ponto de Apoio. Uma vez criado o espaço, procurou- -se inseri-lo na dinâmica do local. Para isso, aproveitando-se da altura de 4 metros dos patamares e a inclinação da topografia, o segundo andar se tornou um mirante para os visitantes apreciarem a atividade no local e a paisagem rural. 86 87 CORTE AA CORTE BB Figura 81 e 82: Corte AA e BB, respectivamente, da vigia/mirante. Fonte: Elaborado pela autora. Figura 83: Vista geral do projeto. Fonte: Elaborado pela autora. C AP EL A SÃ O J O ÃO Sa lv ag ua rd a e re ss ig ni fic aç ão d as ru ín as e m u m p ro je to d e tu ris m o ru ra l. 88 CONSIDERAÇÕES FINAIS A motivação para este trabalho foram os vários relatos carinhosos de ex-morado- res sobre a antiga Companhia Inglesa e a beleza em destruição em meio rural que a Capela São João possui. O presente trabalho tenta inserir um patrimônio esquecido pelas autoridades na vida social que hoje ocorre no local onde está inserido, procurando não só a sua per- manência como memória do que um dia foi, mas tentando construir novas para quem tem interesse. Ademais, procurou promover a conscientização da salvaguarda de monu- mentos através de projetos de restauração e a importância da prospecção minuciosa para preservar o máximo possível da auten- ticidade do edifício. O patrimônio cultural é detentor de história principalmente quando em estado de deterioração e seu valor sentimental só cresce, a Capela São João é símbolo disso. ALMEIDA, M.; LOURENÇO, P; LUSO, E. Breve história da teoria da conservação e do restauro. Disponí- vel em: . Acesso em: ALMEIDA, T. C. L. de. Interven- ções em ruínas patrimoniais: o caso da cidade de Laranjeiras - Sergipe. In: Anais do 4º Simpósio Científico do ICOMOS Brasil. Anais...Belo Horizonte(MG) Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: . Acesso em: 08/06/2023 ALVES, J. E. Sobre o “património rural”: contributos para a clarificação de um conceito. Cidades - Comunidades e Territórios. 2004, N. 8, pp. 35-52. Dis- ponível em: < https://revistas.rcaap.pt/cct/ issue/view/586>. Acesso em: 08 Jun. 2023. ARCHITECTURES, L.T. Museu Rodin Bahia / Brasil Arquitetura”. 17 Ago 2020.ArchDaily Brasil. Acessado 26 Mai 2023. < https://www.archdaily.com.br/ br/910445/museu-rodin-bahia-brasil-arqui- tetura > ISSN 0719-8906 ARCHITECTURES, L.T. Restaura- ção e adaptação de uma capela do século XVI em Brihuega / Adam Bresnick” [Res- toration and adaptation of a 16th century Chapel in Brihuega / Adam Bresnick] 04 Mai 2014. ArchDaily Brasil. Acessado 10 Mai 2024. < https://www.archdaily.com. br/br/601390/restauracao-e-adaptacao-de- -uma-capela-do-seculo-xvi-em-brihuega-s- lash-adam-bresnick > ISSN 0719-8906 AZEVEDO, P. O. de. (2008). A Res- tauração Arquitetônica entre o passado e o presente. Rua: Revista De Urbanismo E Arquitetura, 6(1). Recuperado de https:// periodicos.ufba.br/index.php/rua/article/ view/3226. Acesso em: 24 Abr. 2023 BAETA, R. E., NERY, J. C. (2017). Reflexões sobre intervenções arquitetôni- cas contemporâneas em ruínas. Oculum Ensaios, 14(2), 217–240. Disponível em: https://doi.org/10.24220/2318-0919v- 14n2a3871. Acesso em: 22 Abr. 2023. BENINCASA, V. 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