UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS Trabalho de Formatura Curso de Graduação em Engenharia Ambiental ANÁLISE DE VIABILIDADE SOCIOAMBIENTAL E ECONÔMICA DE SISTEMAS DE REAPROVEITAMENTO DE ÁGUA EM RESIDÊNCIAS UNIFAMILIARES Rodrigo Prieto Rocha Prof(a). Dr(a). Clauciana Schmidt Bueno de Moraes Rio Claro (SP) 2016 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro RODRIGO PRIETO ROCHA ANÁLISE DE VIABILIDADE SOCIOAMBIENTAL E ECONÔMICA DE SISTEMAS DE REAPROVEITAMENTO DE ÁGUA EM RESIDÊNCIAS UNIFAMILIARES. Trabalho de Formatura apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, para obtenção do grau de Engenheiro Ambiental. Rio Claro - SP 2016 RODRIGO PRIETO ROCHA ANÁLISE DE VIABILIDADE SOCIOAMBIENTAL E ECONÔMICA DE SISTEMAS DE REAPROVEITAMENTO DE ÁGUA EM RESIDÊNCIAS UNIFAMILIARES. Trabalho de Formatura apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, para obtenção do grau de Engenheiro Ambiental. Comissão Examinadora Clauciana Schmidt Bueno de Moraes (orientadora) Marcelo Loureiro Garcia Caroline Antonelli Santesso Rio Claro, 24 de Novembro de 2016. Rodrigo Prieto Rocha Clauciana Schmidt Bueno de Moraes AGRADECIMENTOS Agradeço à minha família por todo o apoio em todos os objetivos que tracei para mim, principalmente na escolha pelo curso de Engenharia Ambiental, que me cativou desde o primeiro momento. Agradeço aos meus pais, Luiz e Martha, por sempre estarem lá para mim quando precisei, mesmo quando eu cometia grandes erros. Ao meu pai, por sempre me ajudar a encontrar oportunidades quando eu não as via e à minha mãe, que me deu a ideia que tornou este trabalho possível. Ao meu irmão, Gustavo, que sempre esteve do meu lado quando as situações não estavam boas e me ajudava a colocar tudo em perspectiva. Se ele não estivesse lá para me ouvir, não sei onde eu estaria. À minha avó, Gladys, por ser uma ótima ouvinte e conselheira, sempre orando e se preocupando comigo e com meu irmão. À minha melhor amiga, Ana, por todas as conversas, risadas e “planos de dominação mundial”. Sem dúvida nenhuma, esses anos todos não seriam tão bons sem a sua amizade. Agradeço também à minha orientadora, Clau, que aceitou me ajudar com este trabalho desde o começo. Mais do que uma excelente professora, uma grande amiga e que sempre nos inspirou a fazer o nosso melhor. Agradeço também a todas as pessoas que estiveram presentes ao longo da minha vida, e que de alguma forma me ajudaram a me tornar uma pessoa sempre melhor. Por fim, agradeço também a você, que lê estas páginas. Pois, mais do que uma pesquisa para a graduação, este trabalho foi feito para ser de auxílio aos futuros alunos e profissionais. “Se você não está preparado para errar, você nunca conseguirá fazer nada original.” Sir Ken Robinson LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas NBR – Norma Brasileira OMS – Organização Mundial de Saúde SABESP – Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo CBCS – Conselho Brasileiro de Construções Sustentáveis ONU – Organização das Nações Unidas LEED – Leadership in Energy and Environmental Design AQUA – Alta Qualidade Ambiental HQE – Haute Qualité Environnementale LISTA DE FIGURAS Figura 1: Fluxograma do Desenvolvimento do Trabalho..............................................38 Figura 2: Modelo de Válvula de Duplo Acionamento..................................................43 Figura 3: Modelo de bacia sanitária com segregação de urina......................................44 Figura 4: Modelo de bacia sanitária acoplada ao lavatório por gravidade....................45 Figura 5: Modelo de Torneira Temporizada..................................................................46 Figura 6: Modelo de torneira com sensor de proximidade............................................47 Figura 7: Modelo de restritor de vazão..........................................................................49 Figura 8: Modelo de arejador para torneiras..................................................................50 Figura 9: Esquema de sistema de reaproveitamento de água pluvial.............................55 Figura 10: Cisterna instalada pelo programa “Água Para Todos”.................................56 Figura 11: Modelo de minicisterna integrada a jardim vertical.....................................56 Figura 12: Esquema de filtro auto-limpante para água de chuva..................................57 Figura 13: Esquema de separador de águas de chuva...................................................58 Figura 14: Esquema de funcionamento de um sistema de minicisterna........................59 Figura 15: Placa de identificação de ponto de água pluvial..........................................60 Figura 16: Planta Humanizada para Casa Fictícia 1......................................................67 Figura 17: Planta Humanizada para Casa Fictícia 2......................................................68 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Comparação dos resultados LEED e AQUA..................................................35 Tabela 2: Características, vantagens e desvantagens de tecnologias/alternativas de gestão de água..................................................................................................................61 Tabela 3: Características das Famílias Hipotéticas 1 e 2...............................................62 Tabela 4: Características das Residências Fictícias 1 e 2...............................................63 Tabela 5: Comparação de Tecnologias e Equipamentos Disponíveis no Mercado para as Casas Fictícias.............................................................................................................66 Tabela 6: Modelos de Cisternas para as Casas 1 e 2......................................................69 Tabela 7: Tempo de retorno para cisternas nas casas 1 e 2............................................71 Tabela 8: Lista de Indicadores utilizados.......................................................................72 Tabela 9: Caracterização de tecnologias e equipamentos/alternativas por indicadores qualitativos.......................................................................................................................73 Tabela 10: Tecnologias/Equipamentos melhor avaliados...........................................74 RESUMO Nos últimos anos, um dos assuntos mais comentados e debatidos, tanto no Brasil como em outros países, tem sido a questão da crise hídrica. Por consequência, várias alternativas e tecnologias para reaproveitar ou reduzir o consumo de água têm sido desenvolvidas. Este trabalho possuiu enfoque na aplicação de diferentes equipamentos e alternativas de reaproveitamento de recursos hídricos em residências unifamiliares, enaltecendo as principais vantagens. Para tanto, foi realizada uma revisão bibliográfica sobre a problemática da crise hídrica e respectiva gestão dos recursos, tecnologias e equipamentos existentes e processos de certificação ambiental, que consideram o uso eficiente da água. Foram então analisadas tecnologias e fontes alternativas de água que poderiam ser implantadas em dois tipos de residências, com famílias de classe média com poderes aquisitivos diferentes. Por meio de análises de custo e indicadores ambientais, sociais e econômicos, as melhores opções foram a bacia sanitária de duplo acionamento, equipamentos com restritores de vazão, arejadores (convencional e com vazão constante) e sistema de minicisterna. Tais alternativas apresentaram baixo custo e ótimo desempenho na redução do consumo de água, sendo os mais viáveis para permitir um uso mais responsável deste recurso. Palavras-chaves: Água. Tecnologias de Reaproveitamento. Questão Socioambiental e Econômica. Custo-Benefício. Residências. Indicadores. ABSTRACT In last few years, a subject much discussed and debated, as in Brazil as in other countries, it has been the issue of water crisis. For consequence, a lot of alternatives and technologies to repurpose or reduce the water consumption have been developed. This work has focused on the application of different equipment and alternatives of reutilization of water resources in single family homes, highlighting the main advantages. Therefore, a bibliographic review was carried out on the problems of the water crisis and its management of existing resources, technologies and equipment and environmental certification processes, which consider the efficient use of water. Alternative water technologies and sources were then analyzed that could be implemented in two types of residences with middle-class families with different purchasing power. By means of cost analyzes and environmental, social and economic indicators, the best options were the sanitary basin of double drive, equipment with flow restrictors, aerators (conventional and with constant flow) and minicistern system. Such alternatives presented low cost and excellent performance in reducing water consumption, being the most feasible use of this resource. Keywords: Water. Reuse Technologies. Repurpose. Socio-environmental and Economic Issues. Cost-Benefit. Residences. Indicators. 12 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ..................................................................... 13 2. OBJETIVOS ............................................................................................................. 15 3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ................................................................................ 16 3.1. Recursos Hídricos: Importância e Gestão ........................................................... 16 3.2. Tecnologias e Alternativas para Reaproveitamento e Redução de Consumo de Água ............................................................................................................................... 21 3.3. Construções Sustentáveis: Conceito e Certificação ............................................ 30 4. METODOLOGIA ..................................................................................................... 37 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 42 5.1. Tecnologias e Alternativas de Gestão de Água: .................................................. 42 5.1.1. Equipamentos Hidrossanitários: ....................................................................... 42 5.1.2. Sistemas de Aproveitamento de Águas Cinzas: ............................................... 50 5.1.3. Sistemas de Aproveitamento de Águas Pluviais: ............................................. 54 5.2. Tecnologias de Conservação de Água Aplicáveis: .............................................. 62 5.3. Análises Econômicas, Sociais e Ambientais: ....................................................... 72 6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .............................................................. 74 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 76 13 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA Um dos assuntos mais recorrentes atualmente está relacionado com o melhor aproveitamento de água, e maneiras de fazer um uso o mais sustentável possível deste recurso. Devido ao desenvolvimento urbano acelerado na segunda metade do século XX, a concentração da população em espaço reduzido produziu grande competição pelos mesmos recursos naturais (solo e água), destruindo parte da biodiversidade natural (TUCCI, 2008). As águas ocupam 71% da superfície do planeta, desse total apenas 0,63% é água doce, e grande parte dela está imprópria para o consumo. É amplamente divulgado na mídia e em trabalhos técnico-científicos o aumento da escassez da água em todo o mundo. Já não são mais aceitas as afirmativas de que a água é um recurso infinito (LIMA, 2010). Pois, embora tenha uma ciclagem rápida, um processo mal planejado, gera um grande impacto ambiental que pode inviabilizar outros usos para a água. De fato, caso se mantenha a taxa de crescimento da população mundial, em 1,6% ao ano, e o consumo per capita se mantiver, o planeta terá cinquenta anos garantidos e a partir daí a demanda será maior que a oferta (LIMA, 2010). Um desenvolvimento sustentável urbano tem o objetivo de melhorar a qualidade da vida da população e a conservação ambiental. É também essencialmente integrador na medida em que a qualidade de vida somente é possível com um ambiente conservado que atenda às necessidades da população, garantindo harmonia do homem e da natureza (TUCCI, 2008). A crise hídrica se tornou um dos principais assuntos em conversas e debates em praticamente todas as esferas da sociedade nos últimos anos, bem como formas de reduzir o consumo de água ou reaproveitá-la de diferentes maneiras. Segundo Lima (2010), o crescimento das atividades econômicas e a manutenção das condições de qualidade de vida da população dependem da conscientização da importância desse insumo estratégico e respectivamente de seu uso de forma racional por todos os setores. Para isso, são necessárias análises para desenvolvimento de sistemas que buscam soluções alternativas para o aumento da oferta da água, como a utilização da água de reuso, coleta, tratamento e utilização da água pluvial, como também a diminuição do desperdício e perdas. Uma alternativa para o aumento da oferta de água é a água pluvial que quando tratada pode ser utilizada para fins não potáveis. E em se tratando da diminuição do desperdício, existem tecnologias e componentes economizadores acessíveis em âmbito nacional e de fácil instalação, cujo objetivo é a redução eficaz no consumo de água (LIMA, 2010). 14 Ainda de acordo com Lima (2010), muitos estudos vêm sendo desenvolvidos em vários países a fim de identificar os usos finais da água, principalmente no setor residencial. E, no Brasil, percebe-se que os principais “vilões” do consumo de água em uma residência são os chuveiros e bacias sanitárias, os quais juntos representam 59% do consumo total da residência. Em seguida, temos as pias de cozinha (18%), lavadoras de roupa (9%), lavatórios (7%), tanques (4%) e consumo no jardim e lavagem de carros (3%). Diante do cenário de secas, faltas de água e racionamento cada vez mais frequente e intenso, torna-se necessário desenvolver opções, alternativas e tecnologias para um melhor uso e gestão dos recursos hídricos. As ações que objetivam a conservação de água abrangem duas áreas distintas: a humana e a técnica. Na área humana se insere o comportamento sobre o uso da água e os procedimentos para a realização de atividades consumidoras. As medidas referentes ao uso racional da água são evoluções obtidas a partir da implantação de novas teorias e tecnologias que resultem em uma mudança de comportamento da sociedade, promovendo um uso sustentável da água. Já na área técnica estão inseridas, dentre elas, as ações de medições e aplicações de tecnologias e procedimentos para enquadramento do uso. Os incentivos são feitos por meio de campanhas, informações, educação pública, tarifas e regras que motivem os usuários a adotar medidas conscientes. (Montibeller & Schmidt, 2004 apud Marinoski, 2007, ou LIMA, 2010). Contudo, com tantas alternativas, acaba por se tornar mais complicado compreender o funcionamento e a relação custo benefício de cada uma. Assim, este trabalho tem por objetivo geral analisar alternativas e tecnologias para gestão de recursos hídricos que possam ser aplicados em residências unifamiliares, no conceito da construção civil. 15 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivo Geral  Análise de alternativas e tecnologias que promovam uma melhor gestão dos recursos hídricos que são e possam ser aplicadas em residências unifamiliares no conceito da construção civil. 2.2. Objetivos Específicos  Discutir sobre a crise hídrica em relação à gestão ambiental e à sustentabilidade, no contexto de construção sustentável em habitações.  Apresentar uma análise dentre as alternativas e tecnologias de recursos hídricos existentes, que possam ser usadas em residências unifamiliares (discorrendo sobre custos de implantação/manutenção e indicadores de benefícios econômicos, ambientais e sociais no contexto de construção sustentável). 16 3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1. Recursos Hídricos: Importância e Gestão. Com o aumento da população urbana (muito mais expressiva do que a rural, houve um grande aumento na expansão dos centros urbano. Isso tornou muito difícil controlar o crescimento ou planejar o modo como as cidades se desenvolveriam, fosse por ineficiência da gestão pública, fosse por ocupação irregular da própria população. Uma população maior significa uma demanda igualmente maior por produtos e serviços. E com um crescimento desordenado, a implantação de infraestrutura necessária para atender a essa demanda torna-se igualmente mal planejada, o que trás diversas consequências negativas, tanto à população quanto ao ambiente em que ela está inserida. Nesse cenário, a água tornou-se coadjuvante de uma urbanização caótica: embora seja essencial à vida, ao desenvolvimento econômico e ao bem-estar social, a água no meio urbano passou a contribuir com a poluição, a contaminação e a transmissão de doenças, assim como os desastres ambientais (RODRIGUES, 2016). É um fato inegável de que a água é um recurso natural de extrema importância, cujo consumo deve ser feito de forma consciente. Contudo, cerca de 97% do total dos recursos hídricos estão presentes nos oceanos, e os outros 3% são constituídos por água doce. Esta última porcentagem distribui-se em 75% nas calotas polares e em 25% em água dos rios, lagos e água subterrânea. Desses 25%, por sua vez, sabe-se que 98,8% correspondem a águas subterrâneas e o restante 1,2% a águas superficiais (SOUZA, 1998). Neste sentido, Brasil é um dos países com maior disponibilidade de água doce do mundo, detendo cerca de 14% do recurso hídrico global, e estando assim em uma situação privilegiada e estratégica para seu desenvolvimento (RIBEIRO FILHO et al., 2006), o que exige uma cuidadosa gestão desse recurso. De acordo com Netto (1992 apud Oliveira, 2005), o consumo de água sofre influência não só de aspectos como o clima, sistema de distribuição e tributação, custo da água e quantidades de habitantes da região, mas também pelos hábitos culturais e o padrão econômico da população. Por estes hábitos e padrões, podemos considerar, segundo Tucci (2008), as chamadas “águas urbanas” como sendo as que englobam o sistema de abastecimento de água e esgotos sanitários, a drenagem urbana e as inundações ribeirinhas, a gestão dos sólidos totais, tendo como metas a saúde e conservação ambiental. Ainda assim, as águas disponíveis não são livres de sofrer com impactos causados pela ocupação 17 urbana, seja ela planejada ou não. Ainda segundo Tucci (2008), os principais problemas relacionados com a infraestrutura de água no ambiente urbano são: • Falta de tratamento de esgoto: grande parte das cidades da região não possui tratamento de esgoto e lança os efluentes na rede de esgotamento pluvial, que escoa pelos rios urbanos (maioria das cidades brasileiras); • Outras cidades optaram por implantar as redes de esgotamento sanitário (muitas vezes sem tratamento), mas não implementam a rede de drenagem urbana, sofrendo frequentes inundações com o aumento da impermeabilização; • Ocupação do leito de inundação ribeirinha, sofrendo frequentes inundações; • Impermeabilização e canalização dos rios urbanos com aumento da vazão de cheia (sete vezes) e sua frequência; aumento da carga de resíduos sólidos e da qualidade da água pluvial sobre os rios próximos das áreas urbanas; • Deterioração da qualidade da água por falta de tratamento dos efluentes tem criado potenciais riscos ao abastecimento da população em vários cenários, e o mais crítico tem sido a ocupação das áreas de contribuição de reservatórios de abastecimento urbano que, eutrofizados, podem produzir riscos à saúde da população. Dependendo também do porte da cidade, há diversos “estágios” para o trato dos recursos hídricos, sendo que nos países em desenvolvimento, a quantidade de estágios pode ser variada. Inicialmente, quando a população é pequena, o abastecimento é realizado a partir de poços ou de um corpo d’água próximo, e o esgoto é despejado na drenagem (quando existe) ou evolui para poços negros ou fossas sépticas. Existe o risco da água de abastecimento ser contaminada pelo próprio esgoto. Esse cenário é dramático quando o solo tem baixa capacidade de infiltração, as fossas não funcionam e o esgoto escoa pelas ruas ou por drenagem (TUCCI, 2008). Este é um estágio chamado de “pré-higienista”, onde se proliferam muitas doenças transmitidas pela água, como a diarreia. O abastecimento de água de fontes seguras e a coleta de esgoto, com despejo a jusante (sem tratamento) do manancial da cidade, tiveram como finalidade evitar doenças e seus efeitos, mas acabaram transferindo os impactos para jusante. Essa fase é chamada de higienista. O crescimento urbano no referido século se acelerou depois da Segunda Guerra Mundial, ocorreu um boom de crescimento populacional, chamado de baby boomer. Esse processo foi seguido da urbanização acelerada, levando uma alta parcela da população para as cidades nesses países, resultando novamente em colapso do ambiente urbano em razão dos efluentes sem tratamento e da poluição aérea. A fase higienista é caracterizada por transporte de esgoto distante das pessoas e canalização do 18 escoamento. As consequências se dão como redução das doenças, mas rios contaminados, impactos nas fontes de água e inundações. O Brasil infelizmente está ainda na fase higienista em razão de falta de tratamento de esgoto na maioria das cidades, transferência de inundação na drenagem e falta de controle dos resíduos sólidos. A cobertura de água (ou seja, a abrangência do abastecimento) é alta no Brasil, mas é baixa a cobertura de coleta e tratamento de esgoto. (TUCCI, 2008). Segundo Tucci (2008) os serviços de água possuem problemas crônicos: preservação dos mananciais urbanos, perda de água na distribuição e falta de racionalização de uso da água em nível doméstico e industrial. O desenvolvimento urbano tem produzido um ciclo de contaminação, gerado pelos efluentes da população urbana, que são o esgoto doméstico/industrial e o esgoto pluvial. Segundo Tucci, esse processo ocorre em razão de: • Despejo sem tratamento dos esgotos sanitários nos rios, contaminando este sistema hídrico. • O esgoto pluvial transporta grande quantidade de poluição orgânica e de metais que atingem os rios nos períodos chuvosos. • Contaminação das águas subterrâneas por despejos industriais e domésticos, por meio das fossas sépticas, vazamento dos sistemas de esgoto sanitário e pluvial, entre outros. • Depósitos de resíduos sólidos urbanos, que contaminam as águas superficiais e subterrâneas, funcionando como fonte permanente de contaminação. • Ocupação do solo urbano sem controle do seu impacto sobre o sistema hídrico. Com o tempo, locais que possuem abastecimento tendem a reduzir a qualidade da sua água ou exigir maior tratamento químico da água fornecida à população. Portanto, mesmo existindo hoje uma boa cobertura do abastecimento de água no Brasil, essa pode ficar comprometida se medidas de controle do ciclo de contaminação não ocorrerem. As empresas de saneamento nos últimos anos têm investido em redes de coleta de esgoto e estações de tratamento, mas a parcela do volume gerado pelas cidades que efetivamente é tratado antes de chegar ao rio é ainda muito pequena (TUCCI, 2008). A Política Nacional dos Recursos Hídricos estabelecida em 1997, seguindo o modelo francês de gestão, adaptado à cultura brasileira, define a gestão por bacias hidrográficas, nas quais seriam enquadrados os recursos hídricos segundo sua qualidade e quantidade e os possíveis usos (PARENTE, 2007), de modo que toda a população e 19 diferentes setores econômicos tenham acesso à água com qualidade necessária, tanto para consumo quanto para processos produtivos. No meio industrial, por exemplo, sistemas de reaproveitamento de água têm sido incorporados para se atingir melhorias significativas. O Brasil conta também com o Plano Nacional de Recursos Hídricos (MMA, 2006) e a Legislação de Saneamento Ambiental (2007) que integra os mecanismos econômicos. Instituições como a Agência Nacional de Águas, agências estaduais e os Conselhos e Comitês de bacia também contribuem para que todo o processo de gestão de água se encaminhe de forma adequada (TUCCI, 2008). Porém, mesmo com práticas e conhecimentos para um consumo mais racional de água, ainda há diversos entraves para tal, pois a rede de distribuição atual não consegue fornecer água a toda população de forma eficiente. Somando-se a isso, existe um desconhecimento de parte da população sobre a água ser um recurso finito (ainda que de ciclagem rápida) e a um consumo desmedido, e o resultado é a crise hídrica que vem se agravando nos últimos anos. Por outro lado, ao mesmo tempo em que esse cenário se mostra preocupante, ele também aumenta o incentivo e desenvolvimento de propostas para alternativas de reaproveitamento de água, seja para fins menos nobres, seja para criar formas de consumo mais consciente e sustentável, o que permite uma melhor conservação deste recurso natural, além de reduzir gastos. A gestão de água ou gerenciamento dos recursos hídricos é o nome dado à atividade de planejar, desenvolver e administrar a utilização mais otimizada dos recursos hídricos, levando em conta todas as necessidades simultâneas de água e procurando distribuí-la de maneira equânime e satisfatória (RODRIGUES, 2016). O acesso à água começa a ser tratado como questão de segurança nacional por muitos países que temem sua escassez. A ONU prevê que até 2050 faltará água potável para 40% da humanidade, enquanto alguns pesquisadores relatam que a falta será em 2025. Tal constatação exige uma tomada de consciência mundial sobre a amplitude do problema e torna premente a necessidade de decisões e comprometimento da população visando a manutenção da qualidade de vida e cuidado com o planeta (SANTOS, 2007). De fato, em 1958, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (UNITED NATIONS, 1958) estabeleceu uma política de gestão para áreas carentes de recursos hídricos que comporta o seguinte conceito: “a não ser que exista grande disponibilidade, nenhuma água de boa qualidade deve ser utilizada para usos que toleram águas de qualidade inferior”. Em outras palavras, é preferível que não se utilize água potável para fins menos nobres do que o consumo humano ou dessedentação de animais, como 20 prioriza a legislação, que também fundamenta a água como um recurso finito, vulnerável e de valor econômico. Portanto, deve ser promovido o uso racional e a conservação da água. O uso racional é entendido como o conjunto de ações que otimizam a operação do sistema predial de forma a reduzir a quantidade de água necessária para a realização das atividades consumidoras, mantendo-se os níveis de desempenho dos serviços – enfoque na demanda de água. A conservação de água, por outro lado, é definida como o conjunto de ações que, além de otimizar a operação do sistema predial de modo a reduzir a quantidade de água consumida, promove a oferta de água produzida no próprio edifício, proveniente de fontes alternativas à água potável fornecida pelo sistema público – enfoque na demanda e na oferta interna de água. Dessa forma, águas de qualidade inferior, como as residuárias de origem doméstica, águas de drenagem agrícola e águas salobras, devem ser vistas como fontes alternativas para usos menos restritivos quando possível (HESPANHOL, 2002). Nunes (2006) também aponta a captação e o aproveitamento de águas pluviais como “uma outra medida não-convencional para conservação da água”, sendo uma prática bastante comum em muitos lugares do Brasil e do mundo. E o Brasil é um país bastante privilegiado no que diz respeito à disponibilidade de água, sendo o 23o entre os países com maior volume de água disponível/pessoa. Tendo a grande maioria de seus rios com origem em centros dispersões de água como o Planalto das Guianas, a Cordilheira dos Andes e o Planalto Brasileiro, o país apresenta uma importante rede fluvial que distribui o volume de águas por uma significativa malha de drenagem, a qual responde pela maior parte do potencial hídrico (UNESCO, 2001). Uma vez que o país tem um grande volume natural de águas, uma gestão adequada deste recurso se faz necessária. A gestão dos recursos hídricos faz parte do sistema de gestão ambiental, se focando no monitoramento e controle das fontes de poluição e de qualidade da água, propondo soluções preventivas e corretivas para a conservação das propriedades físicas, químicas e biológicas do ambiente para proteger a saúde humana e dos ecossistemas. A gestão também propicia o desenvolvimento de atividades sociais e econômicas que estejam em equilíbrio com a natureza, assumindo atitudes proativas e criativas em relação ao meio ambiente e não se restringindo somente ao atendimento à legislação (SANTOS, 2007). 21 Em uma visão nacional, a gestão dos recursos hídricos também Relatórios da ONU alertam para o fato de que, nos países em desenvolvimento, como o Brasil, 90% da água utilizada é devolvida à natureza sem tratamento, contribuindo assim para a deterioração de rios, lagos e lençóis subterrâneos (DEVES, 2008). No Brasil, como em vários outros países, a unidade de planejamento para elaboração e gestão de qualquer projeto é sempre a bacia hidrográfica. E essa gestão deverá sofrer uma transição para um gestão integrada (múltiplos usos), em ecossistema (bacia hidrográfica) e preditiva (antecipar problemas, desastres e impactos). Isto implica em avanços tecnológicos essenciais: monitoramento avançado em tempo real, treinamento de gerentes de recursos hídricos com visão integrada e integradora, capacidade de análise ecológica e modelagem matemática e construção de cenários adequados com avaliação de tendências, impactos e análises de risco (TUNDISI, 2003). E para elaborar e colocar em prática tais medidas é preciso que haja um planejamento multidisciplinar, que fica a cargo de instituições como o Comitê de Bacia e Secretarias Municipais e Estaduais de diversas áreas. Contudo, mesmo contando com diversos instrumentos de apoio para a gestão dos recursos hídricos, como Plano Diretor Municipal, políticas e legislações ambientais, ainda há graves problemas nos recursos hídricos (como falta de práticas efetivas de gestão de usos múltiplos e integrados, escassez de água natural ou causada por uso intensivo de água, etc.). 3.2. Tecnologias e Alternativas para Reaproveitamento e Redução de Consumo de Água. Frente aos crescentes problemas relacionados à gestão dos recursos hídricos, diversas estratégias funcionais têm surgido para reaproveitamento de água pela sociedade, ainda que de forma aparentemente pontual. Desde métodos simples, como banhos mais curtos ou água de reuso, até projetos mais sofisticados, como a construção de cisternas para captação de água de chuva, podemos notar uma mobilização por parte da população em reduzir o consumo de água. Essa conscientização toma parte no conceito de desenvolvimento sustentável, que se baseia em “integrar conservação da natureza e desenvolvimento, de modo a satisfazer as necessidades humanas fundamentais mantendo a integridade ecológica e respeitando a diversidade cultural e a autodeterminação social” (MONTIBELLER FILHO, 2004). 22 A busca por novas técnicas de gestão se espalha por todo o globo, devido aos vários países que temem a escassez de seus recursos hídricos e trabalham constantemente para desenvolver tecnologias inovadoras e sustentáveis para garantir a disponibilidade de água de diferentes qualidades para usos específicos, como a Queensland University of Technology, na Austrália. Essa instituição, por exemplo, é responsável por elaborar diversas novas tecnologias de funcionamento prático e de fácil compreensão, para reduzir o consumo de água potável e disponibilizar águas com qualidade menos nobre para diferentes atividades, incluindo água da chuva, ou stormwater. Pesquisas notaram frequentemente que cargas e concentrações de poluentes originadas em áreas urbanas são significativamente maiores quando comparadas ao meio rural. Ainda mais significativo, a diversidade físico-química de poluentes na água de chuva urbana é comparativamente maior, levando a impactos mais irreversíveis no recebimento de água pelo ambiente (Egodawatta et al. 2005). Deve-se, portanto, lembrar que o volume de água no planeta é constante e vem sendo ciclado infinitamente desde os tempos mais remotos. Desse modo, uma gestão ineficiente ou um consumo inadequado pode comprometer os recursos hídricos em uma escala global. Outra ferramenta para uma melhor gestão da água é a busca por fontes alternativas para o abastecimento, que reduzam o consumo da rede distribuidora, mas que tenham qualidade o bastante para atender a necessidades menos nobres ou não potáveis. Essa escolha envolve, não só os custos para adquirir um sistema ou equipamento específico, como também o custo para garantir a qualidade necessária para o uso pretendido para a água vinda de fonte alternativa, além de garantir a saúde de todos os usuários. De fato, a qualidade da água fornecida é uma das maiores responsabilidades das empresas de abastecimento, sendo necessária a aplicação de tecnologias de tratamento para eliminar poluentes ou qualquer agente que traga risco à saúde, buscando atender os parâmetros de potabilidade do Ministério da Saúde. Negligência para com fontes alternativas de água ou gestão ineficiente dos sistemas podem colocar em risco o consumidor e as atividades pretendidas para águas alternativas, por estar fora dos padrões de qualidade. Portanto, ao mesmo tempo em que utilizar água vinda de fora da rede distribuidora confere o ônus de se tornar “produtor de água”, traz também a responsabilidade pela gestão qualitativa e quantitativa do recurso. Os principais cuidados para fontes alternativas podem ser resumidos em: 23  Sistema hidráulico independente e identificado;  Torneiras de água não potável devem ter acesso restrito;  Devem ser previstos reservatórios específicos;  Usuários devem ser capacitados para o uso. Com diversos projetos sendo elaborados e testados, apresentando resultados cada vez melhores, o próximo passo é levar tais tecnologias diretamente à população, para que sejam aplicadas em todas as áreas possíveis. 3.2.1. Água de Reuso: Classificação e Aplicação. Uma das práticas mais comumente difundidas é água de reuso, definida pelo CBCS como a água não potável obtida por tratamento de água residuárias, sendo esta, por sua vez, definida como “efluente gerado após o uso da água em edificações residenciais, comerciais e industriais” (MARQUES; OLIVEIRA, 2013). O reuso pode ser direto, caracterizado quando as águas residuárias são descartadas nos corpos d’água (águas superficiais ou subterrâneas) e utilizadas novamente à jusante, ou indireto, quando ocorre a utilização planejada e imediata, após o efluente receber tratamento adequado ao tipo de utilização que será feita. No meio urbano, o potencial de reuso de águas é muito abrangente e variado. A reutilização de água doméstica surge como uma opção que cada vez mais vem sendo praticada, além de constantemente vir apresentando tecnologias complexas e adequadas para sua adoção, com o objetivo de amortizar os problemas referentes à demanda e à oferta de água (SILVA et al., 2012). No entanto, os usos que exigem água com qualidade elevada podem configurar custos incompatíveis com os benefícios correspondentes, pelo fato de exigirem sistemas de tratamento e de controle mais complexos (HESPANHOL, 2002). De acordo com a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental de São Paulo, há duas classificações para a água de reuso: potável e o não potável. O reuso potável seria uma alternativa associada a riscos elevados, segundo Pombo (2011), pela presença considerável de contaminantes orgânicos ou patógenos presentes nos efluentes. Devido aos processos caros e complexos para o tratamento de tais efluentes, reusos potáveis para água são economicamente inviáveis, além de não haver qualquer garantia de proteção à saúde, a menos que seja feito em estações de tratamento especializadas para o processo. Em outras palavras, o reuso potável só é viável quando os efluentes 24 passam por ETAs e ETEs. Assim sendo, águas de reuso não podem ser utilizadas para consumo, irrigação de hortas, banhos ou qualquer uso que envolva contato entre efluente e população. Portanto, deve-se priorizar o reuso para fins não potáveis. De acordo com Rodrigues (2016), os principais reusos não potáveis são:  Irrigação de parques e jardins públicos, centros esportivos, campos de futebol, quadras de golfe, gramados e áreas ajardinadas de escolas e universidades;  Irrigação de áreas ajardinadas ao redor de avenidas, rodovias, edifícios públicos, residenciais e industriais;  Sistemas decorativos aquáticos, tais como fontes e chafarizes, espelhos e quedas d’água;  Descargas sanitárias em banheiros públicos e em residências, edifícios comerciais e industriais;  Limpeza de pisos e pátios;  Lavagem de automóveis, motocicletas, trens e ônibus públicos;  Limpeza e desobstrução galerias de águas pluviais e redes de esgoto;  Reserva de proteção contra incêndios;  Assentamento de poeira em obras;  Preparação e cura de concreto não-estrutural em canteiros de obra;  Estabelecimento de umidade ótima em compactação e solos;  Geração de energia; Refrigeração de equipamentos. Deve-se lembrar também que, de acordo com a Agência Nacional de Águas (2005), ANA, embora reusos não potáveis possuam menores riscos, deve haver um sistema de gestão e monitoramento constante para garantir eficiência e proteção à saúde pública. Dependendo também da qualidade da água necessária para o reuso, Pombo (2011) considera duas maneiras de fazê-lo:  Efluente pode ser reusado diretamente em outra operação, quando o nível de contaminação não interfere no processo seguinte, conhecido como reuso em cascata;  Reuso feito indiretamente, que é a aplicação do efluente tratado, sendo realizado em processos diferentes daquele que originou o primeiro efluente. 25 Há diversas tecnologias para tratar efluentes, podendo-se escolher a mais apropriada com base na necessidade, custo e objetivo a ser atingido. Assim, não há exigência de submeter o efluente a determinados tratamentos quando o seu uso pretendido não o requer (CAL, 2011). De acordo com a origem do efluente, Otterpohl (2001) classifica as águas residuárias da seguinte maneira:  Águas cinzas: efluentes provenientes dos chuveiros, banheiras, lavatórios de banheiro e máquinas de lavar roupas. Essas águas são ricas em sabão, sólidos suspensos, matéria orgânica (cabelo, sangue, etc.) e podem possuir pequenas quantidades de bactérias;  Águas negras: efluentes provenientes dos vasos sanitários, bidês, mictórios e pias de cozinha, Essas águas são ricas em matéria orgânica e bactérias com potencial patogênico;  Águas amarelas: efluente representado somente pela urina;  Águas marrons: efluente representado somente pelas fezes. 3.2.2. Aproveitamento de Águas Cinzas. Efluentes produzidos em residências, edifícios comerciais, escolas, entre outros, oriundos dos lavatórios, chuveiros, banheiras, tanques e máquinas de lavar roupa. Portanto são águas geradas em pontos diversos, o que as confere características distintas, provocando diferenças em sua constituição (NUNES, 2006). Bazzarella (2005) apud Lima (2010) citam autores como Nolde (1999) e Christova-Boal et al (1996) que não consideram como água cinza os efluentes vindos de cozinhas, por considera-los altamente poluídos, putrescíveis e com inúmeros compostos indesejáveis como óleos e gorduras. Santos, Zabrock e Kakitani (2002), citados por Boni (2009) apud Lima (2010), também ressaltam que a água de pia de cozinha deveria ser desconsiderada nessa categoria, uma vez que os óleos, gorduras e graxas presentes no efluente são difíceis de retirar em filtrações, além de conterem microrganismos. De acordo com NSW HEALTH (2000), dependendo da origem do efluente gerado, dos fatores dinâmicos locais (tais como número de usuários, hábitos alimentares, idade, consumo, etc.), a água cinza pode conter contaminações das mais diversas. A qualidade da água distribuída também tem influência na qualidade do efluente produzido (CAL, 2011). 26 Desse modo, para que as águas cinzas possam ser reutilizados é necessário ou desejado lançar mão de tratamentos adequados, incluindo desinfecção, a qual surtirá o feito pretendido desde que o efluente seja anteriormente tratado, possibilitando a redução da concentração de sólidos suspensos e a redução a demanda bioquímica de oxigênio (DBO) (NSW HEALTH, 2000). Uma vez que são menos contaminadas que as águas negras, no que tange a inexistência de fezes, urina, papel higiênico, etc., as águas cinzas têm recebido especial enfoque como possibilidade para reuso (RAPOPORT, 2004), de forma que um tratamento não muito complexo poderia ser eficaz no atendimento a demandas pretendidas, como por exemplo o reuso em bacias sanitárias (CAL, 2011). Já é prática comum que águas de menor importância (residuárias, drenagem agrícola, de alta salinidade, etc.), sejam usadas para cultivo e aquicultura, em regiões do planeta onde águas de boa qualidade não estão disponíveis ou com fácil acesso. Contudo, essa forma de utilização, sem qualquer planejamento, pode trazer sérios riscos à saúde, ao ambiente e à produção agrícola. De forma geral, a água de reuso é uma opção adequada do ponto de vista ambiental, uma vez que contribui para redução da captação e consequentemente, das vazões de lançamento de efluentes. No entanto, deve-se considerar o fator de saúde pública e, embora alguns países do mundo possuam padrões para reuso que fazem dessa uma prática comum, no território brasileiro, estas práticas são observadas em um estágio preliminar (RAPOPORT, 2004). Mas, embora ainda nos falte normas e diretrizes para estabelecer solidamente conceitos, padrões e limites para águas cinzas em residências, setor comercial e industrial, alguns parâmetros podem ser extraídos da norma NBR 13.969:1997, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). De acordo com May (2009), além do estabelecimento do sistema de reúso e os usos preconizados para as águas tratadas, a norma também aborda a vazão de águas a serem reutilizadas, o grau de tratamento exigido, o sistema de armazenamento e distribuição e, também, um manual de operação e treinamento dos responsáveis pelo sistema de reuso. As águas cinzas devidamente tratadas podem ser utilizadas no consumo não potável, como descarga de vasos sanitários, lavagem de calçadas e ruas, irrigação de jardins e faixas verdes, construção civil (compactação do solo, controle de poeira, lavagem de agregados), limpeza de tubulações, sistemas decorativos (espelhos d’água, chafarizes, etc). Segundo Eriksson et al. (2002), as águas cinzas podem ser usadas para 27 diversos fins. Contudo, o tipo de tratamento aplicado e o uso final são fatores determinantes para o sucesso do empreendimento (May, 2009 apud Lima, 2010). No Brasil, o uso de água cinza ainda é pouco aplicado, embora seja prática comum e em grande escala em outras regiões de mundo. Nosé (2008) apud Lima (2010), citando Soares et al. (2001) e Oliveira (2005), constatam que, no Japão, condomínios, hotéis e hospitais já tem sistema de aproveitamento de águas cinzas em seu planejamento. Vários municípios japoneses têm edifícios projetados para coletar água de esgoto secundário, que é tratada para alimentar caixas de descarga, gerando uma economia de até 30% no consumo de água potável. Segundo Lazarova et al. (2003), apud Peters (2006) e Lima (2010), o estádio Mileniun Dome, no Reino Unido, utiliza como fontes alternativas a água cinza, água de chuva e água subterrânea para a descarga nos vasos sanitários e mictórios do edifício (646 vasos sanitários e 191 mictórios). Os visitantes e empregados utilizam os lavatórios e contribuem com 120 m³/dia de água cinza que é tratada e reutilizada. Na república de Singapura as indústrias estão tomando várias medidas para conservação da água potável, procurando substituí-la por água não potável. As indústrias retiram 11,1 milhões de metros cúbicos de água do mar por dia, somente para reusá-la como água de resfriamento (Peters, 2006, apud Lima, 2010). No Brasil, apesar de pouco praticado, algumas regiões já utilizam do sistema de reuso de águas cinzas. No estado de São Paulo, o reuso é praticado pela Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (SABESP), a qual possui cinco estações de tratamento e vende a água para reutilização em indústrias e na rega de jardins públicos e lavagem de ruas de vários municípios (LIMA, 2010). A NBR 13.969 (ABNT, 1997) apresenta padrões de qualidade para esgotos tratados, de acordo com seus usos previstos. A norma contém, também, parâmetros para o reuso de efluentes, considerando todas as possíveis necessidades do usuário, recomendando que os usos para todas as áreas devem ser estimados, estando de acordo com o volume total de reuso. A NBR 13.969 prevê ainda, graus progressivos de tratamento dos esgotos para o reúso, dependendo do nível de exigência de qualidade para a qual este efluente tratado será reusado. Com isso, a norma divide esses efluentes em classes para o reuso (ABNT, 1997):  Classe 1: lavagem de veículos e outros usos que requerem o contato direto do usuário com a água, com possível aspiração de aerossóis pelo operador incluído chafarizes; 28  Classe 2: lavagens de pisos, calçadas e irrigação de jardins, manutenção de lagos e canais para fins paisagísticos, exceto chafarizes;  Classe 3: reuso nas descargas de vasos sanitários;  Classe 4: reuso nos pomares, cereais, forragens, pastagens para gados e outros cultivos através de escoamento superficial ou por sistema de irrigação pontual. Santos (2002) apud Peters (2006) explicam que a configuração básica de um sistema de água cinza consta basicamente do subsistema de coleta de água servida, do subsistema de condução de água (ramais, tubos de queda e coletores), da unidade de tratamento (gradeamento, decantação, filtração e desinfecção), do reservatório de acumulação, e, se necessário, de um sistema de recalque, reservatório superior e distribuição. Mendonça (2004) apud May (2009) descreve que, para que os sistemas de reuso de águas cinzas possam ser projetados e construídos de forma sustentável e eco eficiente, um conjunto de fatores precisa ser atendido, dentre eles: a aplicação; requisitos de qualidade; tipo de tratamento; legislação e normas técnicas; instalações hidráulicas; e características do efluente. Na maioria das vezes, esses fatores são verificados em análises socioeconômicas e ambientais para implantação do sistema de reuso, de modo a levar o projeto a atender a esses requisitos com segurança. (LIMA, 2010). 3.2.3. Aproveitamento de Águas Pluviais. Outra forma muito difundida para reduzir o consumo de água é o uso de água pluvial. Segundo Nunes (2006), captação e aproveitamento de águas pluviais é algo relativamente simples e econômico, que consiste em captar, armazenar e tratar água provinda de chuvas, para ser fornecida com qualidade para usos menos nobres (não potáveis). Nos tempos atuais, o aproveitamento de águas pluviais é praticado em muitas regiões áridas e semiáridas do mundo, inclusive no Brasil (ANA, 2005). O aproveitamento dessa água pode colaborar para a conservação dos recursos hídricos de qualidade superior e para a prevenção da escassez da água potável nos sistemas de distribuição (BEZERRA et al., 2010). Existem vários aspectos positivos no uso de sistemas de aproveitamento de água pluvial, pois estes possibilitam reduzir o consumo de água potável diminuindo os custos de água fornecida pelas companhias de 29 abastecimento; minimizar riscos de enchentes e preservar o meio ambiente reduzindo a escassez de recursos hídricos (May, 2004 apud Marinoski, 2007) (LIMA, 2010). Além dos aspectos positivos citados acima, podem-se citar outras vantagens do aproveitamento de água de chuva (Simoni et al., 2004 apud Marinoski, 2007) (LIMA, 2010):  Utiliza estruturas existentes na edificação (telhados, lajes e rampas);  Baixo impacto ambiental;  Água com qualidade aceitável para vários fins com pouco ou nenhum tratamento;  Complementa o sistema convencional;  Reserva de água para situações de emergência ou interrupção do abastecimento público;  Redução do consumo de água potável e do custo de fornecimento da mesma;  Melhor distribuição da carga de água da chuva no sistema de drenagem urbana, o que ajuda a controlar as enchentes. Quanto ao uso, as águas de chuvas podem ser aplicadas de forma semelhante às águas servidas. Lavagem de veículos, rega de jardins, lavagem de roupas, limpeza de pisos e paredes, bacias sanitárias e mictórios são exemplos de possibilidades para se usar águas pluviais. No que cabe à qualidade, estudos feitos pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) constataram que, dadas às características presentes nas amostras de água de chuva, o abastecimento por fontes pluviais exige os mesmos tratamentos para reuso de águas cinzas, e a responsabilidade pela gestão da qualidade da água pluvial recai sobre o responsável por implementar o sistema. A utilização de águas pluviais pode ser realizada desde que haja controle de qualidade e inspeções da exigência de tratamento adequado, visando o não comprometimento da saúde de seus usuários, nem tampouco do funcionamento dos sistemas envolvidos (ANA, 2005). De acordo com Marinoski (2007) apud Lima (2010), a viabilidade da implantação do sistema de aproveitamento de água pluvial depende essencialmente dos seguintes fatores: precipitação, área de captação e demanda de água. Além disso, para projetar tal sistema as condições ambientais locais, clima, fatores econômicos, finalidade e usos da água devem ser levados em conta, buscando não uniformizar as 30 soluções técnicas. Em outras palavras, não há um sistema único para todas as situações. Condições diferentes remetem a sistemas de aproveitamento diferentes. Santos (2002) apud Peters (2006) apontam que a configuração básica de um sistema de aproveitamento de água de chuva consta da área de captação (telhado, laje e piso), dos sistemas de condução de água (calhas, condutores verticais e horizontais), da unidade de tratamento de água (reservatório de autolimpeza, filtros, desinfecção) e do reservatório de acumulação. Segundo Leal (2000) apud May (2004), o sistema de aproveitamento de água de chuva funciona da seguinte maneira: a água é coletada de áreas impermeáveis, normalmente telhados. Em seguida é filtrada e armazenada em reservatórios de acumulação, que pode ser apoiado, enterrado ou elevado e ser construído de diferentes materiais, como: concreto armado, blocos de concreto, alvenaria de tijolos, aço, plástico, poliéster, polietileno e outros (LIMA, 2010). As desvantagens do sistema são a diminuição do volume de água coletada nos períodos de seca, além da necessidade de se fazer uma manutenção regular no sistema, caso contrário podem surgir riscos sanitários (LIMA, 2010). 3.3. Construções Sustentáveis: Conceito e Certificação. A construção civil é o setor econômico que mais impacta o meio ambiente, especialmente no consumo de recursos naturais, e geração de resíduos, com significativa geração de poeira e poluição sonora em canteiros localizados dentro das cidades (JOHN & AGOPYAN, 2011). Buscar uma indústria de construção mais sustentável consiste em fornecer edificações que garantam melhor qualidade de vida presente, sem comprometer o atendimento das necessidades futuras, conferindo então um uso sustentável dos recursos naturais, entre outros fatores. Baseando-nos na Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA), no Conselho Brasileiro de Construções Sustentáveis (CBCS), e em outras instituições, podemos destacar as seguintes características das construções sustentáveis (CORREA, 2009):  Aproveitamento de condições naturais do local e implantação de análise do entorno;  Qualidade ambiental externa e interna;  Gestão sustentável da implantação da obra; 31  Adaptar-se às necessidades atuais e futuras dos usuários;  Uso de matérias-primas que contribuem com a eficiência do processo;  Redução de consumo energético e de água;  Educação ambiental e conscientização dos envolvidos no processo;  Introdução de novas tecnologias sempre que possível e viável;  Reduzir, reutilizar, reciclar e dispor corretamente os resíduos sólidos. Para designar empreendimentos de construção civil construídos dentro dos parâmetros da construção sustentável, há o termo green building (do inglês, edifício verde). Tais projetos utilizam técnicas e tecnologias que permitem atingir a sustentabilidade nas diversas fases do empreendimento. Contudo, ainda que a obra toda seja sustentável em sua construção, não se pode garantir seu desempenho após esse período, principalmente em edifícios habitacionais. Essa limitação se deve ao fato de o empreendedor não ter qualquer controle sobre o usuário final, que pode tomar atitudes de uso que diminuam os ganhos obtidos (COSTA & MORAES, 2012). Quando surgiram os conceitos da construção sustentável, programas para pô-los em prática começaram a ser desenvolvidos, criando as primeiras certificações ambientais para construção civil. Já havia um consenso de que passar voluntariamente pelos processos de certificação criava uma busca eficiente pela melhoria contínua, para garantir sempre uma boa classificação para os empreendimentos. Dependendo do processo e do órgão certificador, diferentes aspectos são analisados com base em critérios e indicadores específicos, mas sempre considerando os três pilares da sustentabilidade (Social, Econômico e Ambiental), muito embora algumas certificações possam, por vezes, dar mais peso ou importância a um dos três. Também é possível que um mesmo aspecto seja analisado por mais de um indicador, como é o caso da água. Isso, pois ela pode ser vista como recurso natural, fonte de custo, alvo de novas tecnologias, etc. Dentre os processos de certificação mais conhecidos, temos, no Brasil, as certificações LEED, AQUA e o Selo Casa Azul. Cada processo tem seu próprio sistema de avaliação e conjunto de categorias analisadas na edificação ou empreendimento. Algumas categorias e critérios são comuns a todos os três, como gestão de recursos hídricos e eficiência energética, enquanto outros podem ser mais evidentes em um processo do que nos demais. O tipo de construção a ser certificada também influencia 32 na avaliação, pois um determinado critério ou categoria pode ser muito mais influenciado por uma edificação do que por outra. A. Certificação LEED Segundo a GBC Brasil, LEED (Leadership in Energy and Environmental Design, o que pode ser traduzido como Liderança em Energia e Design Ambiental) é um sistema internacional voluntário de certificação e orientação ambiental para edificações, utilizado em 143 países, com o intuito de incentivar a transformação dos projetos, obra e operação das edificações, sempre com foco na sustentabilidade de suas atuações. É o selo de maior reconhecimento internacional e o mais utilizado em todo o mundo, com mais de 15 mil empreendimentos certificados (COSTA E MORAES, 2013). O processo pode ser aplicado em diversos tipos de edificações, independente de serem novas ou não, ou da função exercida pela construção (como hospitais, residências, escolas, etc.). A certificação trás diversos benefícios à edificação, nos setores econômico, social e ambiental. De forma mais ampla, podemos listar os seguintes benefícios, dentre vários:  Uso racional e redução da extração de recursos naturais;  Redução do consumo de água e energia;  Uso de materiais e tecnologias de baixo impacto ambiental;  Estímulo a políticas públicas de fomento a Construção Civil;  Aumento da satisfação e bem-estar dos usuários;  Melhora na segurança e priorização da saúde dos trabalhadores e ocupantes;  Diminuição de custos operacionais e de riscos regulatórios;  Valorização do imóvel para revenda;  Modernização e menor obsolescência da edificação. A certificação LEED possui um total de 7 dimensões a serem avaliadas. Todas possuem pré-requisitos obrigatórios e recomendações que, se atendidas, conferem mais pontos à edificação. Dependendo do número de pontos adquiridos, define-se o nível da certificação, de 40 pontos (certificação mínima) até 110 pontos (certificação platina). As dimensões avaliadas pelo processo de certificação LEED são:  Sustainable sites (Espaço Sustentável) – Encoraja estratégias que minimizam o impacto no ecossistema durante a implantação da edificação e aborda questões 33 fundamentais de grandes centros urbanos, como redução do uso do carro e das ilhas de calor.  Water efficiency (Eficiência do uso da água) – Promove inovações para o uso racional da água, com foco na redução do consumo de água potável e alternativas de tratamento e reuso dos recursos.  Energy & atmosphere (Energia e Atmosfera) – Promove eficiência energética nas edificações por meio de estratégias simples e inovadoras, como por exemplo simulações energéticas, medições, comissionamento de sistemas e utilização de equipamentos e sistemas eficientes.  Materials & resources (Materiais e Recursos) - Encoraja o uso de materiais de baixo impacto ambiental (reciclados, regionais, recicláveis, de reuso, etc.) e reduz a geração de resíduos, além de promover o descarte consciente, desviando o volume de resíduos gerados dos aterros sanitários.  Indoor environmental quality (Qualidade ambiental interna) – Promove a qualidade ambiental interna do ar, essencial para ambientes com alta permanência de pessoas, com foco na escolha de materiais com baixa emissão de compostos orgânicos voláteis, controlabilidade de sistemas, conforto térmico e priorização de espaços com vista externa e luz natural.  Innovation in design or innovation in operations (Inovação e Processos) – Incentiva a busca de conhecimento sobre Green Buildings, assim como, a criação de medidas projetuais não descritas nas categorias do LEED. Pontos de desempenho exemplar estão habilitados para esta categoria.  Regional priority credits (Créditos de Prioridade Regional) – Incentiva os créditos definidos como prioridade regional para cada país, de acordo com as diferenças ambientais, sociais e econômicas existentes em cada local.. Quatro pontos estão disponíveis para esta categoria. Para realizar o processo de certificação LEED, primeiramente deve-se escolher a tipologia da certificação para depois registrá-la e enviar o material necessário para avaliação. Esse material é auditado e, de acordo com a pontuação atribuída, se confere a certificação de nível equivalente. 34 B. Certificação AQUA Originado na França, em 1974m o sistema de certificação AQUA foi uma adaptação exclusiva para a realidade brasileira, realizada pela Fundação Vanzolini, a partir do modelo francês HQE (Haute Qualité Environnementale). Assim como quaisquer outros processos de certificação, a adesão ao sistema AQUA é voluntária. A avaliação da Qualidade Ambiental do Edifício é feita para cada uma as 14 categorias de preocupação ambiental e as classifica nos níveis Base (prática corrente ou regulamentar), Boas Práticas e Melhores Práticas (desempenho calibrado conforme o máximo constatado recentemente nas operações de Alta Qualidade Ambiental). Para que o empreendimento seja certificado AQUA, deve ter, no mínimo, um perfil no qual, das 14 categorias, sete sejam classificadas como Base, 4 como Boas Práticas e 3 como Melhores Práticas. As catorze categorias de qualidade ambiental são distribuídas da seguinte maneira:  Relação com o Entorno;  Escolha Integrada de Produtos, Sistemas e Processos Produtivos;  Canteiro de Obras de Baixo Impacto Ambiental;  Gestão de Energia;  Gestão de Água;  Gestão de Resíduos de Uso e Operação do Edifício;  Manutenção – Permanência do Desempenho Ambiental;  Conforto Higrotérmico;  Conforto Acústico;  Conforto Visual;  Conforto Olfativo;  Qualidade Sanitária dos Ambientes;  Qualidade Sanitária do Ar;  Qualidade Sanitária da Água. Para garantir o atendimento dos critérios de sustentabilidade, são feitas três auditorias ao longo do empreendimento, nas fases de Pré-Projeto, Projeto e Execução. Dentre os benefícios do processo de certificação AQUA, podemos citar:  Economia direta do consumo de água e energia elétrica; 35  Menores despesas condominiais gerais (água, energia, limpeza, manutenção, conservação);  Melhores condições de conforto e saúde;  Menor demanda de recursos hídricos;  Redução da poluição em geral;  Melhor qualidade de vida;  Menor geração de riscos;  Melhor gestão de resíduos sólidos. De acordo com Dalla Costa e Moraes (2013), o sistema LEED não é uniforme, dando pesos diferentes aos seus critérios de avaliação (quase um quarto do peso da certificação está na eficiência energética), e não tem interesse em checar a eficiência ambiental das áreas de gestão do empreendimento. Por outro lado, o AQUA pesa os fatores com igual valor, pois a certificação apoia-se no desempenho global, e não em uma área específica, mesmo com o maior número de categorias referenciando a qualidade final do edifício, como qualidade sanitária do ar e conforto olfativo. Contudo, não possui um ponto específico para tratar de inovações. Ainda segundo Dalla Costa e Moraes (2013), para poder comparar as categorias os critérios foram separados em classes partindo dos referenciais LEED NC (Novas Construções) e AQUA Edifícios do Setor de Serviços. As classes foram escolhidas baseadas na definição de construção sustentável. Fonte: Dalla Costa e Moraes (2013). LEED AQUA Etapas de Certificação Concepção Programa, concepção, realização e operação. Abrangência Ambiental Ambiental Validade Dois anos Um ano para operação. Sem vaidade para demais certificados Resultado Quatro níveis de certificação de acordo com a pontuação obtida Certificação obtida a partir do atendimento a o perfil de desempenho Tabela 1: Comparação dos resultados LEED e AQUA 36 C. Selo Casa Azul O Selo Casa Azul é uma classificação socioambiental dos projetos habitacionais financiados pela Caixa Econômica Federal. É o primeiro sistema de certificação criado para a realidade da construção habitacional brasileira. Foi desenvolvido por uma equipe multidisciplinar em parceria com a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade Estadual de Campinas. O intuito é incentivar o uso racional de recursos naturais, reduzir o custo de manutenção dos edifícios e as despesas mensais dos usuários, além da conscientização das vantagens das construções sustentáveis. O selo aplica-se a empreendimentos habitacionais financiados pela Caixa Econômica Federal e sua adesão é voluntária (GRÜNBERG ET AL, 2014). O processo de avaliação considera 53 critérios em 6 categorias diferentes:  Qualidade Urbana;  Projeto e Conforto;  Eficiência Energética;  Conservação de Recursos Materiais;  Gestão da Água;  Práticas Sociais. O Selo Casa Azul é concedido ao empreendimento que obedeça a, no mínimo, 19 critérios obrigatórios e, quanto mais critérios opcionais forem atendidos, melhor será o nível da classificação. Os níveis são:  Bronze: 19 critérios obrigatórios;  Prata: 19 critérios obrigatórios e 6 critérios opcionais;  Ouro: 19 critérios obrigatórios e 12 critérios opcionais. Diferente das demais certificações (LEED e AQUA), o Selo Casa Azul tem sua aplicação restrita às residências populares do projeto Minha Casa, Minha Vida. Contudo, segundo Grünberg et al (2014) em seu artigo, o Selo Casa Azul é o que apresenta o melhor desempenho geral entre os três, por ter sido desenvolvido exclusivamente para a realidade brasileira, confirmando a hipótese de que um sistema criado para uma realidade e localidade específicas apresenta melhor resultado. 37 4. METODOLOGIA O presente trabalho consiste de pesquisa de natureza aplicada, de procedimento bibliográfico e objetivo descritivo. Tais considerações implicam, portanto, em:  Pesquisa Bibliográfica: feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que já se estudou sobre o assunto. Existem porém pesquisas científicas que se baseiam unicamente na pesquisa bibliográfica, procurando referências teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a resposta (FONSECA, 2002, p. 32);  Pesquisa Descritiva: exige do investigador uma série de informações sobre o que deseja pesquisar. Esse tipo de estudo pretende descrever os fatos e fenômenos de determinada realidade (TRIVIÑOS, 1987). A primeira etapa desenvolvida foi realizar uma pesquisa bibliográfica, em livros, trabalhos acadêmicos, artigos e sites específicos, a respeito da crise de água, sua gestão no Brasil e em outros países, e certificações para construções sustentáveis. Isso permitiu uma melhor compreensão da problemática em questão, sendo o embasamento teórico do trabalho. Em seguida, foram consultados trabalhos acadêmicos, artigos científicos e outras fontes de pesquisa, sobre tecnologias, técnicas de reaproveitamento, conservação e gestão dos recursos hídricos, que poderiam tornar mais viável a sustentabilidade de residências unifamiliares de classe média alta. Feita a parte da pesquisa bibliográfica, passou-se para a parte descritiva, em que foram analisadas as tecnologias e alternativas de gestão de recursos hídricos, buscando as que melhor se aplicariam aos tipos de residência de que se trata o trabalho. Para uma visão mais efetiva, foram considerados dois modelos de residências (uma de 70m² e outra de 134m²), para duas famílias hipotéticas com rendas diferentes (a primeira com ganho de 4 salários mínimos e a segunda, com 10 salários mínimos, com base em cotações feitas em sites governamentais – variação de dois salários mínimos acima ou abaixo). Aplicadas algumas considerações para as aquisições dos equipamentos selecionados, foram feitos cálculos para analisar o tempo de retorno do investimento. 38 Como parte qualitativa do trabalho, foram feitas análises com base em indicadores de benefícios econômicos, sociais e ambientais, para determinar quais tecnologias apresentariam a melhor relação custo-benefício entre custos de implantação, manutenção, tempo de retorno do investimento (redução na conta de consumo de água) e benefício de reaproveitamento de água. A comparação dos valores de investimento, tempo de retorno e indicadores permitiu conferir quais tecnologias e equipamentos são mais viáveis, tanto em termos econômicos como socioambientais. Podemos traduzir o processo de elaboração do presente trabalho no fluxograma abaixo: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA  Crise Hídrica;  Gestão de Água;  Selos Verdes. PESQUISA DE TECNOLOGIAS/ ALTERNATIVAS PARA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS CÁLCULOS PARA VIABILIDADE ECONÔMICA  Custo de Aquisição;  Tempo de Retorno. ANÁLISE POR INDICADORES  Social;  Econômico;  Ambiental. CONCLUSÕES  Tecnologias/Alternativas de melhor viabilidade. Figura 1: Fluxograma do Desenvolvimento do Trabalho. Fonte: Elaborado pelo autor. 39 Os cálculos de viabilidade econômica foram feitos apenas para os equipamentos ou alternativas cujos valores de mercado pudessem ser determinados ou que não exigissem conhecimento técnico específico para sua implantação, e consideram o custo de aquisição do equipamento/alternativa e o tempo de retorno do investimento. Para uma estimativa, foi utilizada a equação a seguir, proposta por Hafner (2007): Em que temos: TR - tempo de retorno (anos); G - custos (R$); G = Ge + MO, na qual: Ge - custo de aquisição de equipamento novo; MO - custo da mão-de-obra para efetuar a substituição. C - consumo (Litros/mês); C = 30 x uso x Cc, na qual: uso - número de acionamentos por dia; Cc - consumo do equipamento convencional (antigo) (litros/acionamento). E - taxa de economia de água gerada pela substituição; E = 1 - (Ce / Cc), na qual: Ce - consumo do equipamento economizador (novo) (litros/acionamento); Cc - consumo do equipamento convencional (antigo) (litros/acionamento). p - custo do consumo de um litro de água; p = (tarifa de água + tarifa de esgoto) x fator de multiplicação / 1000 r - taxa de juros simples Para realizar os cálculos, algumas considerações foram feitas, as quais serão melhor explicadas no item 4.2 deste trabalho, e seguiu-se a ordem: 1. Pesquisar o custo de aquisição do equipamento/alternativa (G); 2. Calcular o consumo total do produto em L/mês (C); 𝑇𝑅 = 𝐺 (𝐶 × 𝐸 × 𝑝 − 𝐺 × 𝑟) 40 3. Calcular a taxa de economia do equipamento econômico em relação ao convencional (E); 4. Calcular o tempo de retorno em meses (TR); Calculados todos os tempos de retorno dos equipamentos, montou-se uma tabela para cada uma das casas hipotéticas, com o custo de aquisição de cada equipamento, tanto individual quanto para todos que seriam utilizados, consumo de aparelho convencional, consumo do aparelho econômico, valor da economia em porcentagem e o tempo de retorno em meses. Segundo Rodrigues (2015), para os sistemas de aproveitamento de águas cinzas e pluviais, seria utilizada uma série de outras equação para determinar o tempo de retorno do investimento: 𝐶𝑀𝐸𝐸 = (𝑃𝐸 × 𝑇 × 𝐷 × 𝑉) Em que: CMEE - custo da energia elétrica para o funcionamento da bomba da cisterna (R$/mês); PE – potência do equipamento (kW); T – tempo de funcionamento do equipamento (h/dia); D – número de dias de funcionamento do equipamento no mês; V – valor da tarifa de energia elétrica consumida (R$/kWh) Com o custo de energia elétrica para o equipamento, se determinaria o custo de operação e manutenção do sistema pela somatória: 𝐶𝑀𝑂𝑀 = ∑ 𝐶𝑀𝐸𝐸 𝑛 𝑖=0 Os custos de manutenção dos equipamentos para tratamento variam de acordo com o sistema selecionado. Dependendo do tratamento, não se fará necessário muitas intervenções, como reposições e substituições de peças, limpezas periódicas, etc. Nesse sentido, a complexidade é um fator limitante para a seleção da tecnologia, visto que os 41 sistemas mais complexos tornam-se economicamente e operacionalmente inviáveis (MORELLI, 2005). Para chegar a um resultado final para o tempo de retorno, foram feitos orçamentos hipotéticos em conjunto com a empresa Eco Casa, que forneceu modelos de cisternas prontas para ambas as casas fictícias. Foi possível determinar o tempo de retorno deste investimento. Com o valor de CMOM calculado, pôde-se calcular a economia mensal efetiva (EE), subtraindo os custos de manutenção das taxas de água e esgoto da rede distribuidora (ER). 𝐸𝐸 = 𝐸𝑅 − 𝐶𝑀𝑂𝑀 Com a economia mensal efetiva multiplicada por 12 meses, se obteve a economia anual efetiva (U), utilizada para o cálculo do tempo de retorno. Então foi utilizada a equação proposta por Sella (2011) para determinar esse tempo: 𝑛 = 𝑃 𝑈⁄ Onde: n – tempo de retorno (anos); P – o valor do investimento inicial (R$); U – o valor da parcela de economia anual (R$). Para os modelos de cisternas de ambas as casas foram feitas tabelas para indicar o volume, custo dos sistemas e tempos de retorno de investimento. Em seguida, foram elaborados indicadores (meios social, econômico e ambiental) e se verificou quais equipamentos/alternativas apresentavam a característica do indicador (análise qualitativa). Por fim, fez-se a conclusão, considerando os indicadores e valores de tempo de retorno, para determinar quais equipamentos/alternativas trariam melhor retorno nas residências fictícias. 42 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1. Tecnologias e Alternativas de Gestão de Água. 5.1.1. Equipamentos Hidrossanitários. Um dos principais fatores a determinar o consumo de água ao longo da vida útil das edificações é a especificação das louças, metais sanitários e equipamentos hidráulicos nelas utilizados (ANA, 2005). Em outras palavras, aparelhos como mictórios, torneiras, chuveiros, vasos sanitários, etc., são um dos primeiros itens avaliados quando se trata de economia de água em qualquer tipo de edificação. Portanto, é muito importante que se busque aparelhos sanitários que apresentem uma boa relação custo-benefício quanto à economia de água. Uma vez que o mercado atual apresenta uma grande variedade desses equipamentos, basta escolher aqueles que melhor se adequam às necessidades dos usuários. A seguir, temos descrições de alguns desses equipamentos, com especificações, vantagens e desvantagens. 5.1.1.1 Bacias Sanitárias. De acordo com Albuquerque Neto e Julio (2014), uma bacia sanitária convencional consome cerca de 12 L de água por acionamento, independente da quantidade de dejetos líquidos e sólidos. Se somarmos isso ao fato de que as descargas para dejetos líquidos correspondem a 80% dos acionamentos (ALBUQUERQUE NETO; JULIO, 2014), a necessidade de bacias sanitárias mais econômicas se torna uma necessidade clara. A. Bacias sanitárias com válvulas de duplo acionamento. Sistema que oferece a possibilidade de escolha entre dois volumes para a descarga: um de 6 L e outro de 3 L (ALBUQUERQUE NETO; JULIO, 2014). Este equipamento possibilita um uso mais racional da água, de acordo com a necessidade. Ou seja, a escolha da descarga depende da quantidade de dejetos sólidos e líquidos. A economia por essa tecnologia é de aproximadamente 37,5% em relação ao convencional. Se compararmos os preços de equipamentos convencionais e de duplo acionamento, verificamos o custo entre ambos é bem próximo, de modo que a escolha por uma tecnologia de menor consumo de água se torna economicamente. 43 B. Bacias sanitárias com segregação de urina Conduz urina (águas amarelas) para um fim diferente daquele destinado às fezes (águas negras). A segregação ocorre por meio de dois compartimentos separados, sendo um para urina e outro para dejetos sólidos, possuindo uma descarga dupla (descarga longa, de 4 L a 6 L, e descarga curta, de 0,15 L a 0,2 L) (ALBUQUERQUE NETO; JULIO, 2014). Essa tecnologia já prevê o tratamento e posterior uso das águas amarelas, podendo atingir uma economia de 95% em comparação ao aparelho convencional (RODRIGUES, 2016). Figura 2: Modelo de Válvula de Duplo Acionamento Fonte: Docol (2016) 44 C. Bacias sanitárias de descarga a vácuo Operando do mesmo modo que os vasos sanitários em aviões, esse aparelho coleta dejetos por uma central de vácuo automatizada (HAFNER, 2007). Essa bacia tem consumo de apenas 1,2 L de água por descarga, usada apenas para lavagem da superfície interna e do poço da bacia. Isso, pois o acionamento causa uma diferença de pressão, que suga o efluente para a rede coletora. De acordo com Alves et al. (2006), o sistema a vácuo exige quantias elevadas de energia elétrica para que as bombas de vácuo e os outros componentes funcionem, em torno de 3 W/h por descarga. Portanto, apesar do reduzido consumo de água, a utilização desse sistema em situações banais pode não ser interessante, devido ao elevado consumo de energia elétrica e aos custos de implantação e manutenção da central de vácuo do sistema (HAFNER, 2007). De acordo com Resende (2009), em reportagem publicada em 2010, embora o sistema a vácuo apresente uma ótima economia de água, ele possui a desvantagem de ser um grande gerador de ruídos, afetando questões de privacidade e podendo até causar distúrbios auditivos, pois os sistemas existentes no mercado ultrapassam, em muito, o nível de decibéis recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Outra desvantagem é o alto custo dessa tecnologia, não sendo aplicável em residências, o que torna o sistema a vácuo viável apenas em edifícios ou áreas com grande afluxo de pessoas. Figura 3: Modelo de bacia sanitária com segregação de urina Fonte: Rich Earth Institute apud. Rodrigues (2015) 45 D. Bacia sanitária acoplada ao lavatório por bombeamento Nesse sistema, a água utilizada no lavatório passa por um filtro e é armazenada em baixo da cuba. Quando a descarga da bacia é acionada, a água armazenada é bombeada em direção ao reservatório da bacia, que a utilizará na descarga seguinte. Tomando a hipótese de que esse volume será suficiente para a limpeza da bacia, dispensando a água da rede de distribuição, essa tecnologia possibilita uma economia de até 100% em comparação ao aparelho convencional (RODRIGUES, 2016). E. Bacia sanitária acoplada ao lavatório por gravidade Já no sistema de acoplamento por gravidade a água utilizada no lavatório é conduzida pela gravidade e armazenada diretamente no tanque da bacia sanitária, para ser usada na descarga. Contudo, algumas desvantagens levantadas por Hafner (2007) na operação e manutenção podem ser citadas, como o risco de proliferação de microrganismos no efluente armazenado, principalmente em períodos longos de não utilização da descarga, uma vez que esse conjunto não contempla qualquer sistema de tratamento. Como explicado no item 3.3.1, esse sistema configura um reuso em cascata. Semelhante à tecnologia anterior, essa pode chegar à economia de 100% quando comparada ao aparelho convencional (RODRIGUES, 2016). Figura 4: Modelo de bacia sanitária acoplada ao lavatório por gravidade. Fonte: Roca apud. Palocci (2015) 46 5.1.1.2 Torneiras Equipamento ainda mais utilizado do que vasos sanitários, as torneiras costumam ser um dos principais alvos em qualquer campanha de conscientização pelo uso racional de água. Isso, pois é um equipamento que pode apresentar vazamentos com facilidade, sendo apontados como um grande colaborador pelo desperdício de água. A. Torneira com funcionamento hidromecânico Também chamada de “torneira temporizada”, o fluxo de água se dá ao pressionar a válvula mecânica, que se fecha depois de algum tempo. Esse período controlado de acionamento leva a uma redução do consumo de água. Contudo, a ANA (2005) alerta que o mecanismo não deve ter um tempo de funcionamento curto, para evitar que o usuário acione a válvula repetidamente. Além disso, a alta frequência de uso e ações de vandalismo podem provocar problemas de desregulagem do tempo de vazão programado (NUNES, 2006). Essa tecnologia possibilita uma economia de cerca de 48%, segundo ANA (2005), em comparação ao aparelho convencional. Quanto a comparação econômica, tudo depende do custo do aparelho convencional, sendo que alguns modelos podem ser mais baratos que os hidromecânicos, enquanto outros podem ter um preço mais ou menos equivalente. Figura 5: Modelo de Torneira Temporizada Fonte: Docol (2016) 47 B. Torneira eletrônica com sensor de proximidade Aparelho com sistema elétrico que detecta a presença do usuário para liberar o fluxo de água. Da mesma forma, o fluxo se encerra quando o usuário se afasta da torneira. A alimentação elétrica do sistema se dá pelo uso de baterias ou pela rede de distribuição elétrica do local (127/220V), podendo esse sistema, de acordo com Schmidt (2004), estar localizado no corpo da torneira ou na parede (RODRIGUES, 2016). Essa tecnologia possibilita uma economia de até 80% (DECA, 2015) em comparação ao aparelho convencional. Entretanto, como o funcionamento dessas torneiras depende de energia elétrica, o uso com frequência naturalmente provoca um aumento significativo no consumo de energia elétrica (NUNES, 2006), sem contar que o custo do equipamento, se comprado com aparelhos convencionais, o torna praticamente inviável em termos econômicos. 5.1.1.3 Chuveiros e duchas Outro jogo de aparelhos comumente visados em campanhas de conscientização sobre uso racional de recursos hídricos, chuveiros e duchas são alvos constantes de críticas, pois liberam grandes volumes de água de forma relativamente desnecessária. Figura 6: Modelo de torneira com sensor de proximidade. Fonte: Docol (2016) 48 Assim sendo, qualquer campanha de conscientização sempre apresenta “não tomar banhos demorados” entre seus tópicos. Segue agora alguns aparelhos que apresentam tecnologias para um melhor uso da água, evitando gastos desnecessários. A. Chuveiros e duchas com restritor de vazão Uma intervenção possível em chuveiros e duchas de ambientes sanitários públicos ou residenciais é a utilização de um restritor de vazões excessivas (Figura 16), normalmente empregado em condições de alta pressão, possibilitando a regulagem da vazão a níveis de conforto e economia (RODRIGUES, 2016) Os restritores são disponíveis em versões de 8, 14 e 16 L/min devendo ser aplicados em locais com pressão acima de 10 mca. Há restritores de vazão que reduzem a vazão em duchas de 20 a 25 L/min para 14 L/min (DECA, 2015). Entretanto, os restritores de vazão tem como desvantagens a impossibilidade de regulagem da vazão quando há diferença de pressão entre água quente e fria, além de sofrerem entupimentos com certa facilidade, necessitando de desmontagem e limpeza periódica (ANA, 2005). Essa tecnologia possibilita uma economia de até 80% (DECA, 2015) em comparação ao aparelho convencional. 5.1.1.4 Reguladores de vazão Os reguladores de vazão são dispositivos internos que muitas vezes passam desapercebidos pelos usuários, contudo possibilitam uma significativa redução de consumo (HAFNER, 2007). A. Restritor de vazão constante Além dos restritores de vazão para chuveiros, conforme descrito acima, estão também disponíveis no mercado os restritores de vazão tanto para torneiras como também para misturadores, que devem ser utilizados apenas para pressões superiores a 10 MCA (Metro de Coluna de Água) (ALBUQUERQUE NETO; JULIO, 2014). Quando regulados adequadamente, possibilitam reduções bastante significativas de consumo, principalmente quando instalados junto as torneiras de funcionamento hidromecânico (ANA, 2005). 49 Essa tecnologia possibilita uma economia de 60% (DECA, 2015) em comparação ao aparelho convencional, sem restritor. O equipamento também apresenta um baixo custo no mercado, portanto pode ser obtido sem grandes despesas, se pagando em pouco tempo com a redução das contas de água. B. Arejador Um arejador é um dispositivo que pode ser utilizado tanto em torneiras como em chuveiros (Figura 8), com o objetivo de introduzir ar à água, permitindo a sensação de maior volume (OLIVEIRA; HENKES, 2015) de forma que o usuário não sinta tanta diferença de vazão durante o uso. O equipamento direciona o fluxo de água, de forma a evitar a dispersão do jato, além de reduzir os espirros e respingos de água (HAFNER, 2007). Sua aplicação é indicada principalmente para torneiras de cozinhas e lavatórios onde não sejam necessários grandes volumes de água (MATEUS, 2004). Ainda de acordo com Hafner (2007), o arejador é um equipamento simples e bastante eficiente, de custo muito reduzido, e aplicação simples sem exigência de manutenção (RODRIGUES, 2016). De acordo com a NBR 10.281 (ABNT, 2003), essa tecnologia possibilita uma economia de 50% em comparação ao aparelho convencional, sem o acessório. Figura 7: Modelo de restritor de vazão Fonte: Manutenção & Suprimentos (2011) 50 C. Arejador de vazão constante O arejador de vazão constante possui, além das características de um arejador convencional, um fluxo contínuo e limitado à vazão de 6 litros por minuto, mesmo com o registro aberto ao máximo, reduzindo o consumo em aproximadamente 30% (ANA, 2005) quando comparado com arejadores convencionais, ou seja, uma economia de cerca de 65% em relação ao aparelho convencional sem arejador (RODRIGUES, 2016). 5.1.2. Sistemas de Aproveitamento de Águas Cinzas. Como elucidado anteriormente, águas cinzas são efluentes domésticos provenientes de banheiras, chuveiros, lavatórios, máquinas de lavar roupa, etc. A reutilização de águas cinzas tratadas em residências contribui para a redução do consumo residencial de água potável, reduzindo também o volume de contaminantes do solo e dos corpos d’água. Em alguns casos, principalmente em edificações de grande porte, a prática do reúso apresenta-se como uma alternativa mais atrativa, em termos econômicos, do que a utilização de águas pluviais (ALVES et al., 2009, p. 274). Em seu trabalho de diplomação pela UFRS, Sella (2011) aponta que, segundo Brasil et al. (2005, p. 50), os seguintes cuidados devem ter destaque na instalação de um sistema de reuso de água cinza:  O sistema hidráulico deve ser identificado e independente do sistema de abastecimento de água potável;  Todos os pontos de acesso à água de reuso devem ter acesso restrito, sendo indicados adequadamente; Figura 8: Modelo de arejador para torneiras. Fonte: SustentArqui (2014). 51  As pessoas que trabalharem em atividades inerentes ao sistema de reuso devem receber instruções;  Os reservatórios de armazenamento devem ser específicos. Ainda segundo Sella (2011), o sistema necessário para o aproveitamento desses efluentes constitui-se de:  Coletores: um sistema de condutores, tanto verticais quanto horizontais, que possibilite o transporte do efluente do chuveiro, do lavatório, e da máquina de lavar, até o sistema de armazenamento;  Armazenamento: composto por um ou mais reservatórios que irão armazenar o conteúdo proveniente dos coletores;  Tratamento: esse dependerá da qualidade que a água coletada deverá receber, para atender às necessidades do seu destino. Segundo Sella (2011), o sistema de coleta das águas cinzas deve seguir às recomendações de uma norma, por exemplo a NBR 8.160:1999, que estabelece exigências e recomendações referentes ao projeto, execução e manutenção dos sistemas de esgoto, assegurando a saúde pública dos usuários (ABNT, 1999, p. 1). A ANA (2005) determina que “os pontos de coleta de águas cinzas devem ser determinados em função do tipo de água cinza a ser coletada, e em função da configuração hidráulica do edifício”. Se considerarmos uma residência unifamiliar, as fontes costumeiras serão pias, chuveiros, lavatórios, máquinas de lavar e banheiras. Como relatado anteriormente, as águas oriundas dessas fontes têm como contaminantes mais comuns os sabões, xampus, pastas de dente e alguns outros produtos químico. É afirmado por alguns autores que as águas cinzas provenientes de chuveiros e lavatórios de banheiros são consideradas aparentemente como as menos contaminadas, enquanto que as águas cinzas provenientes da cozinha apresentam partículas de comidas, óleos, gorduras e detergentes, tornando-as mais poluídas que as demais (RODRIGUES, 2016). Com isso, podemos considerar a instalação de tubulações independentes para as cozinhas, para que recebam tratamentos específicos, diferentes das demais águas cinzas coletadas. A partir dessas tubulações, a água coletada pode ser reutilizada diretamente (em cascata), ou tratada ou mandada para reservatórios de acumulação. Neste último caso, segundo May (2009) as águas cinzas são armazenadas, para que se atinja um melhor balanço entre o volume gerado e a demanda a ser atendida nas etapas seguintes. Isso 52 garante que o sistema de reuso possa aproveitar águas cinzas durante todo o dia, acumulando efluentes ao longo de vários dias. Contudo, embora proporcionem maior estabilidade, tais reservatórios exigem espaço físico à disposição. Em áreas residenciais já construídas, esse espaço pode não estar disponível. Segundo análises do armazenamento de águas cinzas feitas Dixon e Butler (1999 apud RAPOPORT, 2004), foram confirmados processos físicos e biológicos, como sedimentação de sólidos, crescimento de bactérias aeróbicas, liberação de gases pela matéria orgânica, etc. Concluiu-se que, se armazenada por 24h, a água cinza teria uma melhora na qualidade pelo decaimento de parâmetros orgânicos. Mas caso a armazenagem chegue às 48h, o oxigênio dissolvido seria reduzido, o que levaria a inconvenientes estéticos na água. Conforme dito anteriormente, a prática de reuso de água pode ser implantada de duas maneiras distintas (MIERZWA, 2002): através de reuso direto (em cascata) ou indireto (após tratamento do efluente). No caso do reuso direto, o efluente gerado por uma operação será imediatamente usado em outra operação, uma vez que possui características dentro dos parâmetros de qualidade de água exigidos. É sempre de suma importância identificar a atividade para se aplicar o reuso em cascata, pois, segundo Mierzwa e Hespanhol (2005), deve haver uma relação direta entre a qualidade e a quantidade do efluente disponível, com demanda e os padrões de qualidade exigidos. Por causa dessas exigências, poucas operações produzem efluentes que podem ser diretamente aproveitados, o que torna o reuso em cascata em uma prática mais limitada. Um exemplo de reuso direto já apresentado são os vasos sanitários, cuja água para descarga provém dos lavatórios. Outra forma de reuso em cascata é o bombeamento para irrigação de áreas verdes, feita preferencialmente pelo subterrâneo, para evitar contato humano com a água, ficando dentro dos parâmetros exigidos pela Norma (como explicado em 3.3.2). Por fim, de acordo com Mierzwa e Hespanhol (2005), uma vez que tenham sido avaliadas e implantadas todas as alternativas compatíveis com reuso em cascata, deve-se optar pelo reuso de efluentes tratados. Contudo, a modalidade de reuso mais discutida atualmente corresponde ao reuso indireto de águas, que consiste na utilização dos efluentes após submetidos a uma etapa de tratamento (POMBO, 2011). 53 De acordo com Eriksson et al. (2002 apud MAY, 2009), pode-se dar diversas finalidades às águas cinzas. Mas o tratamento utilizado e o destino final são aspectos que determinam se o sistema de reuso será, ou não, bem sucedido. Existe atualmente uma extensa base de dados relacionada às principais tecnologias de tratamento disponíveis, bem como uma grande variedade de equipamentos e sistemas de tratamento de águas, que são capazes de produzir efluentes com os diversos parâmetros de qualidade necessários. Assim, a etapa de tratamento não é um aspecto limitante para o desenvolvimento de iniciativas orientadas para um uso racional da água. A principal cautela consiste na estratégia a ser desenvolvida para atingir resultados mais apropriados para cumprimento das demandas nos vários níveis de qualidade exigidos conforme a finalidade pretendida (SAUTCHÜK ET AL., 2005). Segundo Morelli (2005), o sistema de tratamento é uma sequência de operações e processos unitários definidos em razão de três requisitos: Das características do líquido a ser tratado, que variam conforme a procedência do efluente; Dos objetivos pretendidos com o tratamento, que exigem diferentes parâmetros de qualidade, conforme a classe na qual estiverem enquadrados;  E da capacidade de remoção de cada processo unitário, que varia conforme o nível de tratamento, podendo ser necessário mais de um processo. Os processos e operações unitárias de tratamento devem ser capazes de regular a concentração dos contaminantes presentes nos efluentes para os parâmetros exigidos em normas, adequando-os ao reuso subsequente (SAUTCHÜK ET AL., 2005). Esses processos de tratamento acabam por ser mais complexos que os preconizados para as águas pluviais, devido à maior concentração de contaminantes característicos das águas cinzas. Portanto, devem ser efetuados estudos de tratabilidade que lancem mão tanto de tratamentos físico-químicos como também biológicos (ANA, 2005). De acordo com Sautchük et al. (2005), para se ter uma água de qualidade apropriada, é preciso combinar duas ou mais técnicas de tratamento, e com tecnologias específicas para eliminar os contaminantes presentes nas águas cinzas. Segundo Gonçalves, R. (2006) e considerando as recomendações de Hafner (2007), todo o tratamento destas águas compõe-se de três a quatro etapas. 54  Tratamento preliminar: remoção de sólidos grosseiros por processos e operações de gradeamento;  Tratamento secundário: processos biológicos em reatores aeróbicos ou anaeróbicos, com sedimentação e filtração (se necessárias);  Tratamento terciário / Desinfecção: inativação de patógenos por cloração, radiação UV ou aplicação de ozônio. A última etapa, quando necessária, é para correção de pH pela adição de ácidos ou bases, para garantir a integridade das tubulações, equipamentos hidráulicos e peças sanitárias. Porém, todas essas formas de tratamento requerem um espaço físico e, por vezes, um custo de implantação e conhecimento técnico que podem não estar disponíveis nas residências para as quais este trabalho se aplica. Devido a essa complicação, consideraremos apenas o reuso direto das águas cinzas, que se mostra mais prático, embora menos abrangente. 5.1.3. Sistemas de Aproveitamento de Águas Pluviais. A configuração básica de um sistema de reaproveitamento de águas pluviais apresenta a área de captação por telhados, lajes ou pátios; a condução de água por calhas, condutores verticais e horizontais; a unidade de tratamento; e o reservatório de acumulação dessas águas (SANTOS, D., 2002). Um sistema como esse consiste em reter a água das chuvas (usando calhas e cisternas), filtrá-la, tratá-la e armazená-la para posteriores usos não potáveis (lavar pisos, carros, irrigar plantas, descargas em vasos sanitários, etc.). Deve-se lembrar de descartar o volume inicial dessa água, pois é a parte usada para lavar o telhado e as calhas. De maneira semelhante ao reaproveitamento de águas cinzas, podemos considerar as etapas de coleta, armazenamento e tratamento. E, nessas três etapas, há diferentes técnicas de acordo com as necessidades do projeto. Na parte da coleta, ou captação, as águas pluviais podem ser coletada à partir de áreas impermeáveis, como lajes, telhados, estacionamentos, etc., de modo que é preferível que sejam superfícies lisas. Para efeito deste trabalho, focou-se captação por sistemas de calhas em telhados e lajes, como apresentado na Figura 9 a seguir: 55 Águas de chuva são armazenadas em cisternas, e os modelos convencionais tem capacidade de armazenar grandes volumes de água para serem usados tanto em períodos de estiagem prolongada quanto em períodos de chuvas regulares, para reduzir o consumo de água pelo sistema de abastecimento local. A título de curiosidade, as cisternas construídas pelo programa “Água Para Todos”, do governo federal, tem capacidade para armazenar até 16 mil litros de água, o suficiente para abastecer uma família de até cinco pessoas durante secas de até seis meses. Contudo, uma vez que cisternas como essas necessitam de grande espaço físico sua implantação, como mostra a Figura 10, o que as tornaria também economicamente inviáveis, projetos foram elaborados para montar cisternas menores, mas com a mesma eficiência de um projeto convencional. São as chamadas “minicisternas”, que podem atender ao público que possui espaço mais limitado, como em centros urbanos, a exemplo da Figura 11. Figura 9: Esquema de sistema de reaproveitamento de água pluvial. Fonte: Sempre Sustentável (2016) 56 Assim como ocorre com as águas cinzas, é necessário que se realizem tratamentos para o uso de águas pluviais. Contudo, para águas provenientes das chuvas, os tratamentos necessários são mais simples, de modo que esse sistema se torna mais aplicável em residências, que já possuem um espaço físico mais limitado, do que o sistema de águas pluviais. Figura 10: Cisterna instalada pelo programa “Água Para Todos”. Fonte: Cultura Mix Figura 11: Modelo de minicisterna integrada a jardim vertical. Fonte: Planeta Sustentável (2016) 57 A primeira etapa no tratamento de á