UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CAMPUS DE JABOTICABAL LAURA NERY LEITE JABOTICABAL – SP 2024 Relatório final do estágio curricular obrigatório do curso de medicina veterinária, realizado junto à Tatiane Antonioli, São José dos Campos – SP e ao Centro de Reabilitação de Animais Silvestres da UNIVAP, São José dos Campos – SP. Caso de interesse: Reabilitação de Didelphis aurita com múltiplas fraturas. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CAMPUS DE JABOTICABAL Laura Nery Leite Orientador: Prof. Dr. José Maurício Barbanti Duarte Supervisoras: M.V. Tatiane Antonioli, M.V. Hanna Sibuya Kokubun M.V. Rayres Soares Gracia JABOTICABAL – S.P. 01º SEMESTRE DE 2024 RELATÓRIO FINAL DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA, REALIZADO JUNTO À TATIANE ANTONIOLI, SÃO JOSÉ DOS CAMPOS – SP E AO CENTRO DE REABILITAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES DA UNIVAP, SÃO JOSÉ DOS CAMPOS – SP. Caso de interesse: Reabilitação de Didelphis aurita com múltiplas fraturas. L533r Leite, Laura Nery Relatório final do estágio curricular obrigatório do curso de medicina veterinária, realizado junto à Tatiane Antonioli, São José dos Campos – SP e ao Centro de Reabilitação de Animais Silvestres da UNIVAP, São José dos Campos – SP : Caso de interesse: reabilitação de Didelphis aurita com múltiplas fraturas. / Laura Nery Leite. -- Jaboticabal, 2024 23 p. : fotos Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Medicina Veterinária) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal Orientador: José Maurício Barbanti Duarte 1. Animais Silvestres. 2. Centro de reabilitação. 3. Gambá. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. iv ÍNDICE LISTA DE ABREVIATURAS .................................................................................................................. V LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................................. VI I. RELATÓRIO ................................................................................................................................... 1 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 1 2. DESCRIÇÃO DOS LOCAIS DE ESTÁGIO .............................................................................................. 1 2.1. M.V. Tatiane Antonioli ......................................................................................................... 1 2.2. Centro de Reabilitação de Animais Silvestres .................................................................... 1 3. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS ................................................................................. 4 3.1. M.V. Tatiane Antonioli ......................................................................................................... 4 3.2. Centro de Reabilitação de Animais Silvestres .................................................................... 5 4. DISCUSSÃO DAS ATIVIDADES .......................................................................................................... 6 5. CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 7 II. MONOGRAFIA: REABILITAÇÃO DE DIDELPHIS AURITA COM MÚLTIPLAS FRATURAS ..... 8 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 8 2. REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................................................ 8 2.1. Biologia de Didelphis aurita ................................................................................................. 8 2.2. Tecido ósseo ....................................................................................................................... 9 2.3. Exame radiográfico .............................................................................................................. 9 2.4. Métodos de imobilização ................................................................................................... 10 3. RELATO DE CASO ......................................................................................................................... 10 4. DISCUSSÃO ................................................................................................................................. 14 5. CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 15 6. REFERÊNCIAS .............................................................................................................................. 15 v LISTA DE ABREVIATURAS BID – a cada 12 horas CCR RioSP - Concessionária do Sistema Rodoviário Rio-São Paulo CETAS – Centro de Triagem de Animais Silvestres CRAS – Centro de Reabilitação de Animais Silvestres FCAV – Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias IM – intramuscular IV – intravenoso Kg - quilograma MG – miligrama M.V. – médica veterinária SID – a cada 24 horas SP – São Paulo UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNIVAP – Universidade do Vale do Paraíba VO – via oral vi LISTA DE FIGURAS Figura 1. Esquema dos setores presentes no CRAS..................................................2 Figura 2. Distribuição geográfica de Didelphis aurita na América do Sul....................9 Figura 3. Projeções radiográficas realizadas da paciente. Projeção craniocaudal (A) e projeção mediolateral direita (B), ambas evidenciando a fratura no úmero (seta contínua) e no rádio (seta tracejada) do membro torácico direito .............................11 Figura 4. Transcirúrgico (A). Pós-cirúrgico imediato (B)............................................12 Figura 5. Figura 5. Projeções radiográficas realizadas da paciente. Projeção craniocaudal (A) e projeção mediolateral direita (B) do membro torácico direito, ambas evidenciando o posicionamento do pino intramedular e fixador externo (seta contínua) e a fratura de rádio direito (seta tracejada). Projeção dorsoventral (C) e projeção laterolateral direita (D) do crânio, ambas evidenciando uma fratura no osso frontal (seta pontilhada)..............................................................................................13 Figura 6. Foto do membro torácico direito evidenciando as lesões causadas pela tala..............................................................................................................................14 1 I. RELATÓRIO 1. Introdução O estágio curricular obrigatório supervisionado objetiva o desenvolvimento do profissional estagiário, sendo realizado durante o 10º Semestre de acordo com o projeto pedagógico do curso de Medicina Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Jaboticabal – SP. O presente relatório se refere às atividades desenvolvidas pela acadêmica, Laura Nery Leite, graduanda do décimo período do curso de Medicina Veterinária, durante o estágio curricular obrigatório sob orientação do Prof. Dr. José Maurício Barbanti Duarte. Durante o período de 18 a 31 de setembro de 2023 e de 01 a 31 de dezembro de 2023 o estágio foi realizado com a médica veterinária (M.V.) Tatiane Antonioli, na cidade de São José dos Campos - SP. Durante o período de 02 de outubro a 30 de novembro de 2023 o estágio foi realizado no Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), localizado na cidade de São José dos Campos – SP, sob supervisão da M.V. Hanna Sibuya Kokubun e da M.V. Rayres Soares Gracia. Foram cumpridas 248 horas com a M.V. Tatiane Antonioli e 352 horas no CRAS, totalizando 600 horas. 2. Descrição dos locais de estágio 2.1. M.V. Tatiane Antonioli A M.V. Tatiane Antonioli realiza trabalho volante em clínicas veterinárias de pequenos animais, levando consigo seus materiais próprios, sendo esses: estetoscópio, termômetro, notebook, carimbo e materiais para contenção. 2.2. Centro de Reabilitação de Animais Silvestres O Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) foi inaugurado em 1999 como um criadouro conservacionista, sendo uma extensão do Centro de Estudos da Natureza da Faculdade de Educação e Artes da UNIVAP. Está localizado na Avenida Shishima Hifumi, 2911, Urbanova, São José Dos Campos – SP, recebe animais de segunda à sexta-feira das 9:00 às 12:00 e das 13:00 às 16:30 e conta com uma equipe de 2 médicas veterinárias, 1 bióloga, 1 supervisor administrativo e 1 coordenadora, além de 4 tratadores e 12 estagiários, sendo 6 na 2 área de veterinária, 5 na de biologia e 1 na administrativa. O local é separado em 3 setores diferentes: a quarentena, o serpentário e o criadouro (Figura 1). A quarentena é dividida em recepção, cozinha, barracão, sala de necropsia, salão e sala de filhotes. Na recepção a equipe administrativa registra e recebe os animais, coletando informações sobre quem, onde, quando, em que situação encontrou o animal, o que foi feito com o mesmo após a captura e sua espécie. Na cozinha são armazenados e preparados os alimentos dos animais não estritamente carnívoros da quarentena e do serpentário, dispondo de 1 geladeira, 1 pia, 1 balança, 1 armário, 2 facas e 1 tábua para carnes, 1 faca e 1 tábua para os demais alimentos, tabelas com as necessidades alimentares de todos os animais e suas dietas do dia, suplementos alimentares, papas para filhotes, rações e sementes. O barracão serve como estoque de produtos e recursos e a sala de necropsia é utilizada para necropsia dos animais e armazenamento dos mesmos antes e após a necropsia, dispondo de 4 freezers, 1 mesa de procedimento, 1 pia, 1 armário e materiais para necropsia. Já o salão é utilizado para a triagem e estabilização de novos animais, armazenamento e preparação das medicações de todos os setores, coleta de Rua Quarentena Serpentário Criadouro Figura 1. Esquema dos setores presentes no CRAS. Fonte: Acervo pessoal. 3 material para exames, procedimentos não invasivos, além de abrigar animais que necessitavam de atenção constante como filhotes, que possuíam uma sala separada com aquecimento, e animais machucados. Esta contendo 1 mesa de procedimento, 3 mesas menores, 2 armários com medicações e materiais, balança, equipamento para laser terapia, equipamento para ozonioterapia, puçás de vários tamanhos, ganchos, 2 aquecedores e caixa de emergência. O serpentário é dividido em escritório, cozinha, biotério, sala das corns, laboratório e recintos. O escritório é utilizado pelos responsáveis técnicos para processamento de dados, reuniões e armazenamento de livros e documentos, e a cozinha é o local no qual são realizadas as refeições dos funcionários. O biotério é formado por 2 salas que contém 3 estantes, 1 mesa e 2 pias, uma abriga ratos twister e camundongos e outra tenébrios e diferentes espécies de baratas. A sala das “corns” e o laboratório são duas salas uma ao lado da outra, sendo a primeira, onde se alojavam as cornsnakes (Pantherophis guttatus), uma sala com controle de temperatura e humidade, ganchos, 3 pias e 2 armários para estoque, e a segunda uma sala utilizada para realização e análise dos exames coletados, contando com 2 pias, 2 armários, 1 centrífuga, 1 estufa, 1 geladeira, 1 computador, 2 microscópios e materiais de laboratório diversos. Os recintos do serpentário servem como área de transição para animais que saíram da quarentena, mas ainda não estão aptos para soltura ou realocação no criadouro, sendo feito de alvenaria até 1,20 m, tela galvanizada com espaçamento de 2 cm até completar 2,10 m de altura e na parte superior, e o chão conta com grama, toca feita de alvenaria e telha de Eternit, e fossa rasa cimentada com ralo e torneira. O criadouro é dividido em cozinha, recintos, centro cirúrgico, sala de recuperação e esterilização. Na cozinha ficam armazenadas as carnes e rações que são utilizadas em todos os setores e as frutas, legumes, vegetais e suplementos alimentares do criadouro, também são preparados os alimentos dos animais do criadouro e dos estritamente carnívoros de todos os setores, dispondo de 2 geladeiras, 1 freezer, 1 pia, 1 balança, 2 armários, 2 facas e 1 tábua para carnes, 2 facas e 1 tábua para os demais alimentos, tabelas com as necessidades alimentares de todos os animais e suas dietas do dia. 4 O local conta com diversos recintos que são utilizados por animais saudáveis que não podem ser soltos (com “Imprinting” ou lesões que impeçam sua sobrevivência em vida livre) e animais aguardando liberação para soltura. Sendo formados por tanques para cágado-tigre-d„água (Trachemys dorbigni), recintos menores para espécies de saguis e recintos maiores para mamíferos maiores, como cateto (Pecari tajacu), cachorro-do-mato (Cerdocyon thous) e macaco-prego (Sapajus nigritus), e aves, como urubu (Coragyps atratus), quiri-quiri (Falco sparverius), carcará (Carcara plancus), mocho-diabo (Asio stygius), gavião-carijó (Rupornis magnirostris), tucano-do-bico-verde (Ramphastus dicolorus) e alguns pscitacídeos, todos feitos com alvenaria, tela galvanizada, chão de grama ou terra, e poleiros dependendo das necessidades do animal. O centro cirúrgico conta com mesa de procedimento, foco cirúrgico, monitor multiparamétrico, tanque de oxigênio e 2 armários com medicações e materiais, assim como uma sala destinada à paramentação pré-operatória. Também é conectado a duas outras salas, a de esterilização que possui 1 armário, 1 pia, 1 seladora e 1 autoclave, e a de recuperação que tem 2 baias, uma mesa de procedimento e 1 pia. A rapicena e pscitacena são quarentenas específicas para rapinantes e psitacídeos, respectivamente. Sendo a primeira composta por 1 sala com gaiola, pia, armário, balança, materiais para coleta de amostras para exames, materiais para contenção e potes de água e comida; e a segunda composta de 3 salas, 1 com pia e 2 sem, gaiolas, balança, materiais para coleta de amostras para exames, materiais para contenção e potes de água e comida. Todas as salas possuíam uma antessala para colocação do equipamento de segurança e aspersão de Virkon, e um banheiro próprio com chuveiro para limpeza dos funcionários após sairem da sala. 3. Descrição das atividades desenvolvidas 3.1. M.V. Tatiane Antonioli Durante a realização do estágio a discente acompanhava e auxiliava nas consultas clínicas, procedimentos e exames complementares. As consultas eram iniciadas com a veterinária questionando o histórico geral do animal, enquanto o mesmo se ambienta com a sala. Em seguida era feito o 5 exame físico do paciente e coleta de exames laboratoriais, finalizando com analise de exames já feitos, caso os tenham, possíveis diagnósticos, prognósticos e tratamentos. Os procedimentos cirúrgicos e exames complementares ocorriam sempre que necessários, não tendo uma rotina constante. 3.2. Centro de Reabilitação de Animais Silvestres Durante a realização do estágio a discente acompanhava as trocas de plantões entre os estagiários, o primeiro atendimento dos animais, a rotina diária de alimentação, manejo e medicação dos animais, a realização de necropsias, exames complementares, consulta com especialistas, procedimentos cirúrgicos e a soltura de animais aptos. As trocas de plantão aconteciam durante a semana às 13:00 horas, todos se reuniam para a passagem do estado geral dos pacientes e discussão da conduta, realizando alterações nas prescrições e solicitação de exames complementares. As discussões também ocorriam uma vez pela manhã e outra ao final do expediente. Os animais eram trazidos pela população geral, polícia militar ambiental, equipe da CCR RioSP, equipe da Rodovia Tamoios e diferentes órgãos municipais da região, e só eram aceitos frente à autorização de algum funcionário do CRAS. Com a chegada de novos animais iniciavam-se dois processos simultâneos, a equipe administrativa coletava informações pertinentes ao animal e a equipe veterinária fazia a triagem do mesmo, analisando seus parâmetros, estado geral, prognóstico, exames complementares necessários e abordagem inicial. A rotina consistia em preparar, aplicar e registrar as medicações alopáticas e homeopáticas feitas, limpar os fundos das gaiolas, dos potes de água e de comida, pesar os filhotes e alimentação dos mesmos a cada 2 ou 4 horas, dependendo da fase de vida, preparar e passar a alimentação de todos os animais de manhã e/ou de tarde de acordo com o cronograma já pré-estabelecido, limpar os terrários das cornsnakes em caso de defecação, urina e/ou ecdise com registo do que ocorreu e da temperatura e umidade da sala. Além disso, as segundas, quartas e sextas-feiras era feita a lavagem do salão e da sala de filhotes, limpeza do biotério, e quarta de manhã eram coletadas fezes e sangue para, no período da tarde, serem analisadas 6 pelo LabCRAS, o laboratório formado por alunos da biologia e biomedicina com supervisão de um professor. As terças e quintas-feiras os estagiários da biologia confeccionavam enriquecimento ambiental para os animais do criadouro e serpentário e faziam a biometria por meio de pesagem e medição dos novos animais e dos filhotes. As necropsias ocorriam, normalmente, as terças e quintas-feiras à tarde, exceto em casos de primatas que eram feitas imediatamente após a eutanásia ou assim que observado o óbito. Foi possível acompanhar 15 necropsias, sendo elas 1 de réptil, 5 de aves e 9 de mamíferos. Os procedimentos cirúrgicos, exames complementares e consultas com especialistas ocorriam sempre que necessários, não tendo uma rotina constante. Dentre os procedimentos realizados o de maior ocorrência era a esterilização dos híbridos de sagui-do-tufo-branco (Callithrix jacchus) e sagui-do-tufo-preto (Callithrix penicillata), seguido por procedimentos ortopédicos, como colocação de pinos e tala. As solturas aconteciam frente à liberação da equipe técnica, podendo ser imediata, em casos de animais trazidos porque estavam em algum lugar que representa risco para a população ou pareciam estar machucados, mas após triagem foram determinados como saudáveis e aptos; ou não imediata, em casos de filhotes ou animais que chegaram lesionados e após o tratamento encontram-se aptos para soltura. Durante o estágio foram soltos 4 répteis, 8 aves e 35 mamíferos, sendo a maioria gambás jovens. 4. Discussão das atividades O estágio desenvolvido com a M.V. Tatiane Antonioli e no Centro de Reabilitação de Animais Silvestres permitiram à discente vivenciar diferentes realidades da profissão. Com a veterinária, a maioria dos animais atendidos possuíam histórico detalhado e os tutores tinham condições de realizar os exames, procedimentos e tratamentos prescritos. Enquanto no CRAS, os animais não dispunham de histórico e não haviam condições de realizar todos os exames, procedimentos e tratamentos ideais, sendo feito o possível dentro das condições existentes. 7 A discussão dos casos clínicos, acompanhamento de exames, procedimentos e do primeiro atendimento dos animais, foi de extrema importância para o crescimento profissional da estudante, permitindo o desenvolvimento do raciocínio clínico e de competências veterinárias. Além das necropsias, que permitiam compreender a extensão das lesões, achados post mortem, e o estudo anatômico de diferentes espécies. 5. Conclusão O estágio curricular obrigatório se faz muito importante na formação do médico veterinário como uma forma de consolidar e aprofundar conhecimentos adquiridos durante os cinco anos de graduação, permitindo também a troca de experiência com profissionais da área e a vivencia prática da rotina do médico veterinário. A escolha dos locais de estágio foi uma boa decisão, visto que permitiu conhecer diferentes realidades e aprender a lidar com elas de maneira adequada, sempre priorizando o bem-estar dos pacientes e a evolução própria. 8 II. MONOGRAFIA: Reabilitação de Didelphis aurita com múltiplas fraturas 1. Introdução Os mamíferos podem ser divididos pelo modo de reprodução em três principais grupos: os monotremados, os placentários e os marsupiais. Sendo os marsupiais distinguidos por sua gestação curta e lactação prolongada (CÁCERES, 2012). No Brasil já foi relatada a ocorrência de 15 gêneros e 62 espécies, caracterizadas pelas dimensões externas, tipo de pelagem e coloração. Dentre eles uma espécie de ampla distribuição é o gambá-de-orelha-preta (Didelphis aurita), que se adaptou a ambientes modificados pelo ser humano, essa adaptação auxilia na conservação da espécie, porém a torna mais propícia a ataques de animais domésticos e de humanos, atropelamentos ou envenenamentos (FARIA; LANES; BONVICINO, 2019; MACEDO; ARAUJO; MUSIELLO, 2020). O recebimento desse marsupial no CRAS e no CETAS é frequente, com uma maior ocorrência de filhotes ou neonatos (MACEDO; ARAUJO; MUSIELLO, 2020). Os animais adultos entregues às entidades estão, muitas vezes, extremamente debilitados, com lesões extensas e múltiplas fraturas. Por isso é fundamental a realização de exames de imagem, principalmente a radiografia, após a estabilização do paciente para a avaliação da extensão das fraturas (THRALL, 2019). O trabalho em questão possui o objetivo de relatar o caso de uma gambá-da- orelha-preta, fêmea, adulta com histórico de possível ataque de cachorro, na qual foram identificadas múltiplas fraturas e o tratamento clínico e cirúrgico da mesma. 2. Revisão de literatura 2.1. Biologia de Didelphis aurita O gambá-de-orelha-preta (Didelphis aurita) é um membro da família Didelphidae, ordem Didelphimorphia, que apresenta cauda de comprimento maior ou igual ao resto do corpo, fêmeas com marsúpio bem desenvolvido com 11 a 13 mamas e machos com saco escrotal anterior ao pênis. Eles têm hábitos crepusculares e noturnos, alimentando-se de pequenos vertebrados, frutos e invertebrados. E distribuem-se no litoral do Brasil, da Bahia ao Rio Grande do Sul, a leste do Rio Paraguai e nordeste da Argentina (Figura 2) e se adaptaram a zonas rurais e urbanas (FARIA; LANES; BONVICINO, 2019). 9 Figura 2. Distribuição geográfica de Didelphis aurita na América do Sul. Fonte: COSTA; ASTÚA; DE, 2015. 2.2. Tecido ósseo O osso é constituído por matéria mineral, como cálcio e fósforo, e matéria orgânica, como fibras colágenas e células especializadas (osteoblastos, osteócitos e osteoclastos). Ao sofrer uma fratura, no local ocorre hemorragia, formação de coágulos e consequente angiogênese e fibrose, com liberação de citocinas inflamatórias e formação de calo fibroso, cartilagem, calcificação endocondral e eventual remodelamento. Enquanto, sistemicamente, a lesão causa mudanças nas concentrações de proteínas inflamatórias circulantes, vitaminas e minerais, na produção de insulina, glicocorticoides e catecolaminas e a ativação da cascata de enzimas proteolíticas ligadas à coagulação (CUBAS; SILVA; CATÃO-DIAS, 2014). 2.3. Exame radiográfico As fraturas são caracterizadas por interrupção da continuidade de um osso, devendo ser radiografada para planejamento cirúrgico. E podem ser classificadas por localização, direção, número de linhas de fraturas, se é completa ou incompleta, fechada ou aberta. De acordo com localização são diafisárias, quando ocorre no eixo longo do osso, metafisárias, quando na metáfise proximal ou distal, epifisárias, comumente quando na placa fisária, ou articulares, quando adentram uma articulação. Por direção são transversas, quando perpendiculares ao eixo longo do osso, oblíquas, quando formam um ângulo com o eixo longo do osso, e espirais, quando a linha de 10 fratura aparece rotacionando o eixo longo do osso. Por número de linhas de fraturas são simples as que possuem somente uma linha de fratura e cominutivas as com mais de uma linha. São consideradas fraturas completas as que se estendem através de todo o osso e incompletas as que envolvem um único córtex; abertas quando há exposição ao ambiente externo e fechada se não há (THRALL, 2019). 2.4. Métodos de imobilização Dependendo do estado do paciente e tipo de fratura pode-se adotar protocolo conservador, pela imobilização do membro com talas e bandagens, ou cirúrgico, com utilização de pinos, placas, parafusos, fios e/ou fixadores externos; também podem ser reduzidas pelo método fechado ou aberto. Existem diversos tipos de implantes cirúrgicos que podem ser utilizados, dentre eles: fios de Kirschner com ponta do tipo trocante ou baioneta, pinos de Steinmann, pinos de Rush, haste bloqueada, fios metálicos ortopédicos, fixadores externos lineares do tipo 1A, 1B, 2 ou 3 feitos de barras de metal ou acrílico, fixadores de Ilizarov, parafusos corticais ou esponjosos, placas ósseas curvas, em “T”, em “L”, neutras ou de compressão dinâmica (CUBAS; SILVA; CATÃO-DIAS, 2014). 3. Relato de caso Uma gambá-da-orelha-preta, fêmea, adulta de 1,15 Kg foi atendida no CRAS em São José dos Campos – SP. Os munícipes a encontraram na calçada próxima a uma faixa de vegetação numa sexta-feira à noite (03/11/2023), fora do horário de recebimento de animais no CRAS, os mesmos suspeitavam de ataque de cachorro e encaminharam para uma clínica de pequenos animais para internação até segunda- feira. Na clínica foram feitas medicações para dor e fluido terapia. Na segunda-feira (06/11/2023), quando chegou ao CRAS, foi identificada crepitação, edema e mobilidade óssea anormal em região de úmero direito, mas sem perda de movimentação e propriocepção do membro, lesões superficiais em tórax dorsal direito em processo de cicatrização e laceração da membrana entre o dígito I e II do membro pélvico esquerdo, porém as lesões não eram sugestivas de ataque de cachorro, mas sim de agressão. O animal apresentava lambedura do membro aparentemente fraturado e do membro com laceração, indicando dor e/ou desconforto, por isso o protocolo inicial feito foi limpeza da ferida com clorexidina 11 degermante 2% e óleo ozonizado, 0,5 mg/Kg de tramadol IM SID por 13 dias, 25 mg/Kg de dipirona IM BID por 20 dias, 0,1 mg/Kg de meloxicam SC SID por 5 dias, homeopatias spray trauma e spray infecções BID, e foi agendada a radiografia para o dia seguinte, 07/11/2023, com uma profissional externa para planejamento cirúrgico. Figura 3. Projeções radiográficas realizadas da paciente. Projeção craniocaudal (A) e projeção mediolateral direita (B), ambas evidenciando a fratura no úmero (seta contínua) e no rádio (seta tracejada) do membro torácico direito. Fonte: Banco de dados CRAS – UNIVAP São José dos Campos – SP. A radiografia foi realizada na região de membro torácico direito utilizando a incidência mediolateral em decúbito lateral direito e craniocaudal. Observa-se fratura cominutiva em espiral diafisária do úmero direito e fratura transversa diafisária de rádio direito alinhada (Figura 3). A cirurgia foi marcada com um cirurgião ortopédico de pequenos animais externo para o dia 10/11/2023. Na anestesia foi feita 20 mg/Kg de cetamina IM associada a 5 mg/kg de xilazina IM, 1 mg/Kg de lidocaína no plexo braquial e manutenção com isofluorano 2,5%. Para o procedimento cirúrgico foi utilizado um pino intramedular de Steinmann com pontas cortantes nos dois lados com fixador esquelético externo linear de barra de metal do tipo 1A e braçadeiras, utilizando técnica aberta e retrógrada (Figura 4). 12 Figura 4. Transcirúrgico (A). Pós-cirúrgico imediato (B). Fonte: Banco de dados CRAS – UNIVAP São José dos Campos – SP. Após a cirurgia foram adicionadas a lista de medicações 20 mg/Kg de amoxicilina tri-hidratada SC SID por 7 dias e spray homeopático com associação de Symphytum officinale, Arnica montana e Calcarea carbonica. Além de limpeza e troca semanal do curativo, agendamento de radiografia para análise do posicionamento do pino e alteração da dieta de frutas em pedaços para frutas amassadas, já que o animal apresentava dificuldade de morder o alimento. 13 Figura 5. Projeções radiográficas realizadas da paciente. Projeção craniocaudal (A) e projeção mediolateral direita (B) do membro torácico direito, ambas evidenciando o posicionamento do pino intramedular e fixador externo (seta contínua) e a fratura de rádio direito (seta tracejada). Projeção dorsoventral (C) e projeção laterolateral direita (D) do crânio, ambas evidenciando uma fratura no osso frontal (seta pontilhada). Fonte: Banco de dados CRAS – UNIVAP São José dos Campos – SP. Na radiografia pós-cirurgia, 13/11/2023, nota-se redução da fratura, contudo houve desalinhamento da fratura em rádio o que justifica o quadro de perda de propriocepção do membro apresentado após a manipulação cirúrgica (Figura 5A-B). Também foi visualizada uma fratura incompleta do osso frontal do crânio (Figura 5C- D), causa da não mastigação do alimento. Por causa do desalinhamento do radio, o animal foi sedado novamente para colocação de tala para redução pelo método fechado e imobilização do membro. A tala utilizada foi a tala anterior de 13 cm de comprimento, atadura e bandagem elástica da articulação radioulnar proximal até a extremidade do membro, cobrindo todos os dígitos por completo. Uma semana após a segunda radiografia, 20/11/2023, a gambá voltou a mastigar o alimento e depois de 10 dias foi retirada a tala do rádio, que já apresentava calo ósseo palpável. Foram observadas lesões de assadura causadas pela tala (Figura 6) e lambedura por dor, sendo feita aplicação de 0,2 mg/kg de metadona IM para controle da dor aguda por manipulação durante a retirada da tala, 0,5 mg/Kg de tramadol IM SID por 3 dias, 0,1 mg/Kg de meloxicam SC SID por 5 dias e aplicação de óleo ozonizado nas lesões. Imediatamente após a retirada da tala o animal estava andando normalmente, recobrando sua propriocepção e conseguindo apreender o alimento com as mãos. 14 Figura 6. Foto do membro torácico direito evidenciando as lesões causadas pela tala. Fonte: Banco de dados CRAS – UNIVAP São José dos Campos – SP. Desde a chegada da gambá no CRAS até a retirada da tala houve ganho de aproximadamente 0,5 Kg de peso, mas sem ganho considerável de massa muscular por causa da restrição de espaço a qual ela estava sendo submetida para consolidação das fraturas. Com 15 dias de pós-cirúrgico, 25/11/2023, ela foi realocada para uma baia maior e teve exame de fezes positivo para Trichuris spp., então foi iniciada homeopatia para verminose e alterada a medicação de dor para 5mg/kg de gabapentina VO SID. No dia 30/11/2023 foi percebida mímica de vômito e a formação de um abcesso em região condizente com a fratura do crânio, o mesmo foi drenado e lavado com solução fisiológica. Todavia, a persistência de produção de secreção purulenta e piora do estado geral, são indicativos para eutanásia. Logo, um mês após a chegada do animal no CRAS (06/12/2023), foi feita a eutanásia com 9 mg/Kg de ketamina IM associada a 1,2 mg/Kg de metadona IM, 1,8 mg/Kg de propofol IV e 1,5 g/Kg de cloreto de potássio IV. 4. Discussão O relato acima visa demonstrar que uma equipe médico veterinária deve estar preparada para realizar a abordagem clínica em conjunto com exames complementares para a avaliação completa do paciente e a importância dos exames de imagem para o planejamento cirúrgico ortopédico. 15 Segundo Cubas, Silva e Catão-Dias (2014), os sinais clínicos apresentados pela gambá ao chegar no CRAS eram compatíveis com fratura, porém devem sempre ser complementados com exames radiográficos para escolha do melhor tratamento. O tratamento cirúrgico deve ser priorizado em casos de fraturas, caso o animal esteja apto, visto que animais de vida livre não toleram bem serem imobilizados ou manejados diariamente, tentando retirar as talas e curativos, aumentando o estresse, a movimentação do animal e atrasando a osteossíntese. A decisão final pela eutanásia foi tomada por se perceber queda da qualidade de vida da gambá e impossibilidade de retorno à vida livre. O método e agentes selecionados para o procedimento seguiram os critérios citados por Cubas, Silva e Catão-Dias (2014), objetivando a minimização do sofrimento. 5. Conclusão O presente relato de caso buscou apresentar a realidade vivenciada em um Centro de Reabilitação de Animais Silvestres e as adversidades encontradas durante o tratamento dos pacientes, como a falta de investimento na área de conservação da fauna brasileira, de cirurgiões e de técnicas cirúrgicas para animais selvagens. Com tudo, é possível comprovar a importância da integração de diversas áreas a medicina veterinária visando qualidade de vida e bem-estar do paciente. O veterinário de animais selvagens deve manter-se atualizado e ter boa comunicação com os colegas, promovendo discussões sobre os casos vivenciados e novas soluções para as afecções encontradas. 6. Referências CÁCERES, Nilton C. Os Marsupiais do Brasil, Biologia, Ecologia e Conservação, 2ª Edição. Campo Grande/MS: Editora UFMS, 2012. COSTA, L.; ASTÚA, D.; DE, N. IUCN Red List of Threatened Species: Didelphis aurita. 2015 Disponível em: https://www.iucnredlist.org/species/40500/197310366#bibliography. Acesso em: 10 dez. 2023. CUBAS, Zalmir S.; SILVA, Jean Carlos R.; CATÃO-DIAS, José L. Tratado de Animais Selvagens-Medicina Veterinária - 2 Vol. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 16 2014. E-book. ISBN 978-85-277-2649-8. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2649-8/. Acesso em: 22 nov. 2023. FARIA, Michel B; LANES, Rayque O.; BONVICINO, Cibele R. Marsupiais do Brasil: Guia de identificação com base em caracteres morfológicos externos e cranianos, 1ª Edição. São Caetano do Sul:Amélie Editorial, 2019. E-book. Disponível em: https://sbmz.org/wp- content/uploads/2021/06/Faria_et_al_2019_Livro_Marsupiais_do_Brasil_resolucao_ Alta.pdf/. Acesso em: 22 nov. 2023. MACEDO, Iasmim; ARAUJO, Caroline R. de; MUSIELLO, Lorena L. Projeto marsupiais: cuidados, reabilitação e soltura de gambá- de-orelha-preta (Didelphis aurita). Boletim Técnico ABRAVAS. Ano V, nº. 49. Ago/2020. THRALL, Donald. Diagnóstico de Radiologia Veterinária. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2019. E-book. ISBN 9788595150515. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595150515/. Acesso em: 25 nov. 2023.