c0 FÁBIO ROGÉRIO BATISTA LIMA IMAGEM & TECNOLOGIA: webmuseu de arte Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Mestrado Marília - SP 2012 1 FÁBIO ROGÉRIO BATISTA LIMA IMAGEM & TECNOLOGIA: webmuseu de arte Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, campus de Marília, como requisito para obtenção do título de Mestre em Ciência da Informação. Área de concentração: Informação, Tecnologia e Conhecimento Linha de Pesquisa: Informação e Tecnologia Orientadora: Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos (Universidade Estadual Paulista/Marília) Financiamento: FAPESP. Marília - SP 2012 2 Ficha Catalográfica Serviço de Biblioteca e Documentação – UNESP - Campus de Marília Lima, Fábio Rogério Batista. L732i Imagem & tecnologia : webmuseu de arte / Fábio Rogério Batista Lima. – Marília, 2012. 126 f. : il. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências, 2012. Bibliografia: f. 109-116 Orientador: Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos. Financiamento: FAPESP 1. Imagens, ilustrações, etc. 2. Museus digitais. 3. Arte - Catálogos. 4. Tecnologia da informação. 5. Semiótica e artes. I. Título. CDD 069.0285 3 FÁBIO ROGÉRIO BATISTA LIMA IMAGEM & TECNOLOGIA: webmuseu de arte Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, campus Marília, como requisito para obtenção do título de Mestre em Ciência da Informação. Área de concentração: Informação, Tecnologia e Conhecimento Linha de Pesquisa: Informação e Tecnologia Banca Examinadora ______________________________________________ Profa. Dra. Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP) Campus de Marília ______________________________________________ Dra. Maria Lucia de Niemeyer Matheus Loureiro Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação Museu de Astronomia e Ciências Afins – MAST ______________________________________________ Dra. Maria José Vicentini Jorente Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP) Campus de Marília Universidade Estadual Paulista - UNESP Marília, 30 de novembro de 2012. 4 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a minha família. Em especial, a minha mãe Geni Ramazotti Lima, por ter suportado e compreendido minha ausência por todo esse período de estudo longe de casa. Dedico também a todos os apaixonados por arte e conhecimento interdisciplinar. 5 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus pela saúde e pela força para eu seguir perseverante nessa caminhada acadêmica. A minha família e aos meus amigos. A Professora Orientadora Profa. Dr.ª. Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos pelos ensinamentos, confiança e oportunidade. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, pela credibilidade e pelo financiamento de minha pesquisa. Aos membros da banca de minha qualificação/defesa que acompanharam meu percurso acadêmico desde o início da graduação: Dr.ª. Maria José Vicentini Jorente (UNESP- Marília/SP) e Prof. Dr.ª Mariângela Spotti Lopes Fujita (UNESP- Marília/SP) e a museóloga do MAST Dra. Maria Lucia de Niemyer Loureiro. Aos funcionários do Escritório de Pesquisa, em especial a Sylvia, Renato e Cidinha. A todos os funcionários do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação e também aos alunos que conheci nas disciplinas cursadas no PPGCI. Aos funcionários da Biblioteca, da manutenção e da limpeza. Aos profissionais do Museu de Arte Moderna do Estado de São Paulo - MAM/SP, da Pinacoteca do Estado de São Paulo e do Museu de Arte de São Paulo – MASP, em especial a bibliotecária do MAM/SP Léia Carmen Cassoni, a pesquisadora e curadora do Núcleo de Pesquisa em Crítica e História da Arte da Pinacoteca/SP, Ana Paula Nascimento e também a Minha querida Amiga de longa data Elisabete Ribas, arquivista do Instituto de Estudo Brasileiro – IEB/USP por ter me colocado em contato direto com os profissionais da área da Museologia e também por ter me dado a oportunidade de estagiar no Instituto na época de graduação. Aos amigos que sempre estiveram presentes no período de elaboração da dissertação: André Jund (Japa-san... Artista Plástico e DJ), Clarice (companheira do Japa- san), Amanda Sertori, Mariana Inácio de Oliveira (Marie Jane), Ana Carolina Simionato (Karu), Camila Araújo, João Paulo Hernandes Teodoro. E a todos outros amigos e colegas que não constam nessa pequena lista e que também me apoiaram nesse percurso. MUITO OBRIGADO A TODOS!!! 6 Seres humanos, pessoas daqui e de toda parte, vocês que são arrastados no grande movimento da desterritorialização, vocês que são enxertados no hipercorpo da humanidade e cuja pulsação ecoa as gigantescas pulsações deste hipercorpo, vocês que pensam reunidos e dispersos entre o hipercórtex das nações, vocês que vivem capturados, esquartejados, nesse imenso acontecimento do mundo que não cessa de voltar a si e de recriar-se, vocês que são jogados vivos no virtual, vocês que são pegos nesse enorme salto que nossa espécie efetua em direção à nascente do fluxo do ser, sim, no núcleo mesmo desse estranho turbilhão, vocês estão em sua casa. Bem vindo à nova morada do gênero humano. Benvindos aos caminhos do virtual ( LÉVY, 1996, p. 150). 7 RESUMO Com o Ciberespaço surgiram os webmuseus, que se caracterizam como ambientes informacionais com exposições de obras de arte apresentadas virtualmente, afetando o uso da imagem. A partir de um dispositivo de acesso à rede Internet, qualquer pessoa pode visitar obras de artistas consagrados sem sair do lugar em que está, uma característica da ubiquidade (estar presente em vários lugares ao mesmo tempo) oferecida pelas tecnologias de informação e comunicação (TIC), o que era possível apenas com o deslocamento geográfico para visitas presenciais. A transformação formal e dos conteúdos das obras de arte na sua transposição para ambientes digitais é uma consequência da passagem de uma estrutura semiótica para outra, o que ocasiona mudanças na qualidade estética da obra produzida em suporte diferente daquele que está sendo apresentado no ambiente digital para a construção de informação imagética (tamanho, cor, forma, etc.) nos museus digitais. A digitalização e a transposição das obras de arte para catálogos digitais (versão digital dos catálogos tradicionais) e/ou nos webmuseus criam simulacros das obras originais e sua forma material e orgânica transforma-se em linguagem computacional de bits e bites. Nesse contexto, apresenta-se como proposta identificar as características que indicam as transformações da estrutura de apresentação da obra de arte na sua transposição para ambientes virtuais quando digitalizadas, uma vez que, a mudança de um sistema semiótico para outro ocasiona rupturas e mutações na qualidade estética da obra de arte produzida sobre um suporte e transferida para outro. Com uso do método bibliográfico descritivo, o objetivo foi verificar as características dos catálogos impressos de obras de arte, dos sites de museus e de webmuseus demonstrando suas semelhanças e diferenças na apresentação das informações das obras. Como resultado identificou-se que por um lado, a digitalização das obras de arte e sua transposição para ambientes digitais na construção de catálogos online e também impressos acarretam perdas informacionais referentes aos elementos essenciais da composição plástica da obra. A transformação mais evidente observada pela análise das obras nos catálogos foi: a diferença de cores tanto entre os catálogos impressos e a obra (levando em consideração aos tipos de materiais utilizados) quanto entre os catálogos impressos e os online, pois a cor luz difere-se da cor pigmento. E também, ao tratar de obras tridimensionais, como as obras escultóricas, há perdas em uma dimensão, ficando a imagem achatada e bidimensional. Com os catálogos digitais online, perde-se em intensidade, mas há ganhos em extensividade, pois ele aproxima as pessoas, recontextualizando as obras e servindo como guia e tradutor do acervo, levando o indivíduo a percorrer a exposição com um conjunto de informações que atuam como apoio didático pedagógico. Palavras-chave: Imagem. Informação e Tecnologia. Webmuseus. Intersemioses Digitais. 8 ABSTRACT With the presence of Cyberspace, web museums emerged, which are characterized as informational environments with exhibitions of artworks presented virtually, affecting the use of the image. Using an access device to the Internet, anyone can visit the works of established artists without leaving the place they are, which is a characteristic of ubiquity (being present in several places at the same time) offered by information and communication technologies (ICT), which was possible only with the geographic displacement to in-person visits. The formal and the artworks contents transformation in its transposition into digital environments is a consequence of the passage of a semiotic structure to another, which causes changes in the aesthetic quality of the work produced in different support from the one which is being presented in the digital environment for the construction of imagery information (size, color, shape, etc.) in digital museums. The digitalization and transposition of artworks to digital catalogs (digital version of the traditional catalogs) and /or web museums, create simulacra of the original works and its organic and material form transforms into computer language of bits and bites. In this context, were analyzed the impacts that information and communication technologies (ICT) cause the aesthetics of images available in these environments. Using the bibliographic descriptive method, the objective was to determine the characteristics of printed artworks catalogs, museums and web museums websites to demonstrate their similarities and differences in the presentation of works information. As a result, it was found that on the one hand, digitalization of artworks and its transposition into digital environments to build online and printed catalogs cause informational losses regarding the essential elements of the work’s artistic composition. The most obvious change observed by analysis of the works in the catalogs were the color difference between printed catalogs and work (taking into consideration the types of materials used) as well as the difference between the online and printed catalogs because the light color differs from pigment color. Also, when dealing with three-dimensional works as sculptural works, there are losses in a dimension, leaving the image flat and two-dimensional. With online digital catalogs, there is a loss in intensity, but there are gains in extensiveness, because it brings people closer re-contextualizing the works and serving as a guide and translator of the collection, leading the individual to go through the exhibition with a set of information that act as a didactic teaching support. Keywords: Image. Information and Technology. Web museums. Digital Intersemioses. 9 LISTA DE FIGURAS Figura 1- Homem com máscara de cabeça de ave atacado por um bisonte ferido. c.15.000-10.000 a.C. Pintura rupestre....................................................... 23 Figura 2 - Estratégias de comunicação ............................................................... 44 Figura 3 - One and Three Chairs ( Joseph Kosuth – 1945) ................................ 50 Figura 4 - Museu Virtual de Arte El Pais – Fachada ............................................ 60 Figura 5 - Saguão de entrada .............................................................................. 62 Figura 6 - Google Art Project ............................................................................... 64 Figura 7 - Quadro de “Osgêmeos” no Google Art Project em alta resolução ...... 65 Figura 8: Quadro “Saudades” no Google Art Project em alta resolução .............. 67 Figura 9 - Reprodução da Pinacoteca no Googleartproject.com ......................... 68 Figura 10 - Catálogos impressos de museus de arte .......................................... 76 Figura 11 - Catálogos de obras d’OsGêmeos ..................................................... 77 Figura 12 - Catálogo da exposição Arte no Brasil: uma história na Pinacoteca de São Paulo. Pinacotecado Estado de São Paulo .............................................. 78 Figura 13 - Catálogo impresso do Museu de Arte Moderna de São Paulo 2001 – 2007 .................................................................................................................. 79 Figura 14: Leitura visual de um catálogo de museu de arte (catálogo da Pinacoteca do Estado de São Paulo) ................................................................... 80 Figura 15 - Etiqueta da obra “Saudade” do pintor Almeida Júnior ...................... 80 Figura 16 - Modelo de etiqueta de obras de arte em catálogos impressos de museu .................................................................................................................. 81 Figura 17 - Análise comparativa entre dois catálogos impressos de museus representando a mesma obra .............................................................................. 82 Figura 18 - Análise comparativa entre dois catálogos impressos representando a mesma obra ...................................................................................................... 83 Figura 19 - Análise comparativa da obra Cabeça de índio do pintor Henrique Bernadelli ............................................................................................................. 84 Figura 20 - Acervo Online da Pinacoteca do Estado de São Paulo ..................... 85 Figura 21 - Inventário: catálogo geral do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Vols. 1 e 2 .......................................................................................... 86 Figura 22 - Revista informativa Moderno Man .................................................... 87 Figura 23 - Primeiro contato com a obra Saudade de Almeida Júnior ................ 89 10 Figura 24 - Leitura visual da obra Saudade ......................................................... 89 Figura 25 - Decompondo a obra Saudade .......................................................... 90 Figura 26 - Destrinchando a obra Saudade para à análise plástica .................... 92 Figura 27 - Análise da obra Saudade utilizando a semiótica aplicada ................. 93 Figura 28 - Análise comparativa da obra Saudade, entre: original, impressa, digital na Web ....................................................................................................... 94 Figura 29 - Catálogo online do Museu de Arte Moderna de São Paulo ............... 96 Figura 30 - Painel d’OsGêmeos no catálogo online do MAM/SP ........................ 97 Figura 31: Parte da obra que apresenta nitidez nas figuras .............................. 97 Figura 32 - Decompondo o painel em duas partes para melhor visualização ..... 98 Figura 33 - Composição do painel pelos OsGemeos .......................................... 100 Figura 34 - leitura visual do painel d’OsGemeos – visão panorâmica ................. 101 Figura 35 - Decompondo o painel para analise semiótica dos elementos construtivos da imagem ....................................................................................... 101 Figura 36 – Análise comparativa entre a obra original e a imagem no catálogo na Web ................................................................................................................ 103 Figura 37- Sistema de cores ............................................................................... 105 11 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Natureza da imagem, papel do receptor ........................................... 25 Quadro 2 - Tipos arquitetônicos de museus ........................................................ 55 Quadro 3 - As três categorias de websites de museus segundo Maria Piacente 69 Quadro 4 - Síntese conceitual de sites de museus ............................................. 71 Quadro 5 - Síntese das transformações qualitativas do painel d’OsGemeos na transposição para ambientes digitais, por meio do catálogo na Web ............... 95 Quadro 6 - Síntese conceitual de sites de museus ............................................. 104 12 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS IBRAM Instituto Brasileiro de Museus ICOM International Council of Museums (Conselho Internacional de Museus) MAM/SP Museu de Arte Moderna de São Paulo MINC Ministério da Cultura MTC Mathematical Theory of Communication MUVA Museo Virtual de Arte El Pais RGB Red, Green, Blue (reprodução de cores em dispositivos eletrônicos) TCP/IP Protocolo de Controle de Transmissão/Protocolo de interconexão TIC Tecnologias de Informação e Comunicação VRML Virtual Reality Modeling Language WebNG Web nova geração 13 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 1.1 Definição do problema ........................................................................................ 16 1.2 Proposição .......................................................................................................... 16 1.3 Objetivos Gerais .................................................................................................. 16 1.3.1 Objetivos específicos........................................................................................ 16 1.4 Metodologia ......................................................................................................... 17 1.4.1 Forma de análise dos resultados ..................................................................... 18 1.5 Justificativa .......................................................................................................... 19 2 A IMAGEM ............................................................................................................ 22 2. 1 Estética da imagem artística .............................................................................. 28 2. 2 Dimensão contemporânea da estética da arte: a questão da reprodutibilidade técnica. ...................................................................................................................... 30 3 SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO .......................................................................... 36 3.1 O que é informação? ........................................................................................... 37 3.2 Cibercultura ......................................................................................................... 45 3.3 Semiótica ............................................................................................................ 47 3.4 Intersemioses digitais .......................................................................................... 49 4 MUSEU E SUAS TIPOLOGIAS: O WEBMUSEU EM DESTAQUE ...................... 52 4.1 Webmuseu ou museu virtual: uma questão terminológica .................................. 56 4.2 MUVA (Museo Virtual de Artes El Pais) ............................................................. 59 4.3 Google Art Project ............................................................................................... 64 4.4 Categorias de websites de museu ...................................................................... 68 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .................................................... 74 5.1 Análise de catálogos de museu de arte .............................................................. 75 5.2 Análise semióticas de obras musealizadas ......................................................... 75 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 95 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 108 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ............................................................................ 116 APÊNDICES ........................................................................................................... 103 APÊNDICE A – Folders impresso de museu de arte ............................................. 104 APÊNDICE B - Análise in loco da obra “Saudade” do pintor Almeida Júnior exposta no acervo permanente da Pinacoteca do Estado de São Paulo ............................ 105 14 APÊNDICE C – Análise in loco do painel dos grafiteiros OsGêmeos no Museu de Arte Moderna de São Paulo .................................................................................... 106 ANEXO ................................................................................................................... 107 ANEXO A - PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO PAINEL d’OsGêmeos FEITO NO MAM/SP .................................................................................................................. 108 15 1 INTRODUÇÃO Essa pesquisa se insere na linha de pesquisa Informação e Tecnologia do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” – UNESP – Campus de Marília. Tem como tema “Imagem & Tecnologia: webmuseu de arte”. A pesquisa é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo – 2010/13268-3, sob a coordenação da Profa. Dra. Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos, e vinculada ao grupo de pesquisa – Novas Tecnologias em Informação da FFC/UNESP – Campus de Marília/SP. Refletir sobre a atualidade é enfatizar questões referentes à arte, à ciência e à tecnologia, o que nos remete as questões como a globalização, o crescimento informacional, a velocidade e a virtualidade, situações que estão relacionadas à evolução do homem e sua Teknè. O homem, enquanto agente dessa evolução, tem como uma de suas atividades a arte, uma manifestação de ordem estética resultante da percepção, das emoções e das ideias, a partir da utilização de uma grande variedade de meios e materiais, como a pintura, a escrita, a música, a dança, a fotografia, a escultura, entre outras. A arte influenciou a ciência e foi por ela também muito influenciada. Entretanto, na contemporaneidade, é a ciência juntamente com a tecnologia que vem imprimindo significativamente suas marcas sobre a arte. Contudo, os “[...] materiais e métodos podem ser diferentes, mas as estimulações cruzadas são frequentes e férteis para a arte, a ciência e a tecnologia.” (CZEGLEDY, 2003, p. 126). Desde o surgimento das principais sociedades primitivas, passando pelas complexas cidades pós-industriais até os dias atuais, o homem descobriu como fazer o fogo, cultivou a terra, domesticou os animais, construiu cidades, dominou os recursos energéticos naturais, implementou indústrias, conquistou o espaço cósmico, viajou pelos confins do espaço-tempo, entre muitas outras coisas. “[...] Durante esse trajeto a tecnologia ganhou significações e representações diversas em um movimento de vai e vem com a vida social.” (LEMOS, 2008, p. 25). 16 1.1 Definição do problema Paralelamente aos fatos citados, as bibliotecas, os arquivos e mais especificamente os museus, sofreram mudanças estruturais ao longo da história da humanidade. O uso das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) nos museus gerou mudanças na forma de tratamento do acervo em sua apresentação ao público e na organização de seus catálogos. Apontamos como problema de pesquisa a seguinte questão de investigação: Na transposição da obra de arte para os ambientes virtuais quando digitalizadas, ocorrem perdas informacionais, ocasionando o rompimento da qualidade estética da obra de arte produzida frente aos aparatos tecnológicos utilizados na construção de imagens para museus digitais? 1.2 Proposição A presente pesquisa tem como proposta identificar as características que indicam as transformações da estrutura de apresentação da obra de arte na sua transposição para ambientes virtuais quando digitalizadas, uma vez que, a mudança de um sistema semiótico para outro ocasiona rupturas e mutações na qualidade estética da obra de arte produzida sobre um suporte e transferida para outro. 1.3 Objetivos Gerais A partir do pressuposto de que houve transformações no modo de construção das informações de museus em ambientes virtuais, objetivamos no âmbito geral, identificar as transformações que a tecnologia provoca no processo de construção estética de obras de arte disponibilizadas em webmuseus e na geração de novas informações a partir de uma análise intersemiótica de algumas obras musealizadas levando em consideração quatro elementos: Estrutura x Forma x Função x Conteúdo, considerando a hipertextualidade decorrente desses novos ambientes. 1.3.1 Objetivos específicos . No contexto específico, objetivamos: � Verificar o papel da informação imagética nos ambientes de webmuseus de arte; 17 � Comparar as características dos catálogos impressos de obras de arte e dos catálogos digitais de museus e as características de webmuseus; � Construir um diretório de webmuseus brasileiros. 1.4 Metodologia Esta investigação é de caráter teórico, de nível descritivo e exploratório. Segundo Gil (1999, p. 44) as pesquisas descritivas e exploratórias são utilizadas quando a pesquisa está preocupada com a atuação prática. Dessa forma, fica evidente que o uso desse tipo de pesquisa é o que melhor condiz com a proposição desse estudo. Foram utilizadas fontes primárias (obras produzidas pelo próprio autor como: livros, teses, trabalhos de conclusão de curso, relatórios, entre outros), fontes secundárias (documentos produzidos a partir de documentos primários como, artigos de revistas, manuais, dicionários, enciclopédias e outros) e fontes terciárias (documentos que tem por função guiar o usuário para todas as fontes primárias e secundárias como: bibliografias, catálogos, índices e outros). O levantamento bibliográfico dos documentos primários, secundários e terciários para análise foi feito nas seguintes fontes bibliográficas: - Livros, periódicos, anais e relatórios; - Bases de dados nacionais e internacionais, textuais e referenciais e - Internet. A pesquisa realiza-se por meio de leitura e análise de documentos nos idiomas: inglês, espanhol e português, nas temáticas: intersemioses digitais, imagem, webmuseu de arte, cibercultura e ciência da informação, para tornar possível a identificação de elementos para responder os principais objetivos estabelecidos neste trabalho. Os procedimentos metodológicos foram delineados: 1. Levantamento exploratório de websites de museus de arte nacional e internacional. A partir dele foi selecionado aquele que, por suas características, se revelou um Webmuseu conforme as orientações descritas na literatura e tendo como base os resultados apontados na tese de doutorado da museóloga Maria Lúcia de Niemeyer Loureiro (2003), do artista e teórico britânico Roy Ascot (1996) e da pesquisadora norte americana Maria Piacente, o que será explicitado em um capítulo específico; Os websites 18 selecionados, e que serviram como parâmetro de controle e que se configuram como webmuseu foram o MUVA e o Google Art Project; 2. Para a análise dos catálogos de museus, impressos e digitais, foram selecionados os catálogos de dois museus, cujo critério para a escolha foi: identificar os mais representativos museus da capital Paulista: o MAM/SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo), caracterizado pela contemporaneidade das obras disponíveis e a Pinacoteca do Estado de São Paulo, pela representatividade da instituição no Brasil. A escolha se deu também pelo fato de ambos estarem disponíveis no Google Art Project com as obras escolhidas para análise; 3. Na análise das obras musealizadas, o critério foi: obras que revelassem a arte no século XlX e na contemporaneidade respectivamente. “Saudade” do pintor Almeida Júnior, por ser, de acordo com o curador-chefe da Pinacoteca Ivo Mesquita, a mais visitada no museu presencial e por ser um quadro emblemático do que foi a arte no Brasil do século XIX; e o painel sem título dos grafiteiros paulistanos “OsGemeos” situada na entrada principal do MAM/SP, em função do engajamento e expressão dos artistas no cenário artístico; 4. A análise in loco das obras foi realizada com visitas frequentes nas respectivas instituições onde elas se encontram, e teve acompanhamento direto de profissionais da área de curadoria e de bibliotecários dos respectivos museus. Teve-se como foco da análise, a sintaxe da imagem nos quesitos cor e forma, pois se evidenciaram as transformações sofridas quando transpostas de uma estrutura semiótica para outra, nas divulgações dos catálogos. 1.4.1 Forma de análise dos resultados Para que os objetivos propostos pela pesquisa fossem alcançados, os resultados obtidos assim foram sistematizados: � Identificação do papel da imagem nos catálogos de museus de obras de arte; 19 � Análise in loco das obras e verificação das transformações ocorridas pela mudança de linguagem na transposição das obras de arte para outros tipos de suporte: semioses; � Verificação se houve perda informacional entre as imagens da mesma obra ilustradas por catálogos diferentes: impressos x impressos ou impresso x catálogos digitais na Internet; � Análise do termo mais recorrente na literatura museológica que ilustra os museus no mundo virtual e suas características. 1.5 Justificativa Os meios de comunicação, bem como as tecnologias da informação, mudaram a maneira pela qual a informação é criada e disseminada. Em decorrência disso, os profissionais que trabalham com a informação, como os Cientistas da Informação, necessitam adquirir competências cognitivas e tecnológicas para lidar com essas mudanças. Segundo Robredo (2003, p. 24): A amplitude com que ocorre a codificação do conhecimento está intimamente ligada à tecnologia disponível. Das tabuletas de argila aos rolos de papiro, como suporte da escrita, ou do livro impresso à Internet como meio de publicação e difusão de materiais textuais e gráficos em geral, cada avanço tecnológico tem aumentado a facilidade com que o conhecimento pode ser codificado e difundido. Com base nos argumentos do autor, percebemos a importância do constante aprimoramento dos profissionais da informação frente à sociedade tecnológica e imagética que o cerca. O interesse para o desenvolvimento dessa pesquisa surgiu das leituras de livros e artigos sobre as temáticas: imagem, cibercultura, webmuseu, Ciência da Informação; sobre a atuação do profissional da informação nessas áreas ainda em consolidação, a aquisição de habilidades do autor na criação de imagens e também por acreditar que a Ciência da Informação é a área que oferece condições teórico- metodológicas para a compreensão do processo de produção, armazenamento e transmissão de qualquer tipo de informação, inclusive em obras de arte em 20 webmuseus, objeto de estudo dessa pesquisa de mestrado. De acordo com Zins (2007): Ciência da Informação é aquela área de estudo e prática que tenta determinar as leis e princípios pertencentes à análise, desenvolvimento e avaliação de dados, informação e sistema de conhecimento. Ela é baseada no seguinte raciocínio: todos os organismos são dados, informação e sistema de conhecimento, variando no grau em que podem processar essas funções cognitivas/afetivas. Cada uma dessas funções são apoiadas e intensificadas pela tecnologia que cada espécie gera, inventa e emprega. Os princípios cognitivos da semiótica Peirciana como, por exemplo, as espécies de raciocínio: dedução, indução e abdução serão utilizadas para fundamentar essa análise. O foco se dará no princípio de abdução, por que trabalhará com levantamento de hipóteses acerca das obras de arte e suas subjetividades. Sendo assim, uma forma de raciocínio propriamente sintético, ou seja, ela é simplesmente preparatória, é o primeiro passo da inferência científica que possibilita ao homem explorar e explicar o mundo. Segundo Santaella (1992, p. 74) [...] a inferência peirceana é uma função essencial da mente cognitiva e o pensamento em todos os níveis apresenta um padrão semelhante aos de três tipos de processos: hipótese, indução e dedução. Assim a vida do pensamento, em todos os estágios e situações, é uma questão de formação e/ou exercício de certos hábitos de inferência. Nesse sentido, é de extrema importância o conhecimento desse tipo de raciocínio para a pesquisa em questão, que analisará a forma com que as tecnologias da informação e comunicação mudaram a maneira pela qual a informação é criada, disseminada, utilizada e reutilizada. Sendo, portanto, de importância à investigação proposta para a área de Ciência da Informação, pois se dispõe a análise intersemiótica de algumas obras musealizadas e ainda, às informações contidas nos recursos de acesso/busca de sites de museus. Para tanto, será utilizado como base teórica à semiótica aplicada, de autores como Lúcia Santaella e Júlio Plaza. 21 Logo, na tentativa de promover uma compreensão do assunto estudado e posterior contribuição para a área, essa dissertação está organizada em seis seções, a saber: Capítulo 1 - Introdução: abarca uma reflexão da evolução das técnicas humanas e sua influência nas unidades de informação (bibliotecas, arquivos e museus), o problema, objeto de estudo, objetivos, metodologia e justificativa; Capítulo 2 – A imagem: uma síntese no contexto da arte e do processo evolutivo da estética da imagem em meio aos novos aparatos tecnológicos e o seu reflexo nos novos ambientes de disseminação da informação artística-cultural, os webmuseus; Capítulo 3 - Sociedade da Informação: aborda o aspecto terminológico da palavra informação e contextualiza sua importância e valor ao longo do tempo até os dias atuais. Aborda também a questão do avanço dos novos ambientes de comunicação, que surge da interconexão mundial entre computadores denominados Ciberespaço, bem como as transformações ocorridas com a imagem artística com o surgimento desse novo ambiente informacional. Capítulo 4 - Museu e suas tipologias: o webmuseu em destaque: aborda a questão terminológica e conceitual como o de: webmuseu, museu virtual, museu digital e seus derivados; demostra exemplos de webmuseu termo utilizado por Loureiro (2003), para designar webmuseus que reúnem reproduções digitais de acervos físicos e obras de arte criadas a partir de matrizes digitais. Capítulo 5 - Análise e discussão dos resultados: analisa e discute os resultados alcançados diante da proposta de estudo, dos objetivos e do objeto de estudo em questão. Capítulo 6 - Considerações finais 22 2 A IMAGEM Não é a tecnologia em si que determinará o resultado final de nossas ações, mas sim um conjunto complexo de atividades humanas que perpassa questões puramente técnicas. De acordo com Pinho (2008, p. 8), tudo o que é humano é ao mesmo tempo psíquico, técnico, histórico, etc. E se integra com que o autor chama de “equipamentos coletivos de subjetivação”. Como, por exemplo, as novas tecnologias informáticas e a Internet. É através desses equipamentos denominados “tecnologias”, que a história da comunicação entre os homens, bem como as construções de imagens e suas particularidades históricas e culturais mudaram e continuam em constante transformação. Desde o princípio, o ser humano tem a necessidade de se comunicar com os seus semelhantes, e os meios utilizados para esse processo têm variado ao longo dos séculos. A linguagem definida como a produção e entendimento da fala se desenvolveu com a evolução da espécie humana. A fala humana poderia ser comparada com a comunicação entre outros animais, porém a linguagem humana tem elementos que a distingue da linguagem dos animais, na medida em que possui a criatividade e interpretação. No início, quando os parentes Homo Herectus (que viveram entre 1,8 milhões de anos e 300.000 anos atrás) habitavam a Terra, o centro de sua fala não era muito desenvolvido, pois a comunicação se dava por meio de grunhidos, rosnadas e gestos. Na época dos Neandertais (há cerca de 300.000 anos até aproximadamente 29.000 anos atrás), acredita-se que o hemisfério esquerdo do cérebro desenvolveu- se um pouco mais. Com os Homo Sapiens (há 200.000 anos), o cérebro se desenvolveu propiciando a produção da fala, período assim caracterizado pela linguagem. Nesse caso, o papel da linguagem é primordial, pois “[...] ela garante o intercâmbio da significação, mediando as relações entre pessoas, flexibilizando o pensamento e ampliando a capacidade conceitual e proposicional de cada indivíduo” (BARRETO, 2008, p. 114). Acredita-se que esse desenvolvimento se deu pelo convívio simultâneo das duas culturas diferentes Neandertais e Homo Sapiens e a necessidade da comunicação entre eles. Com essa necessidade de comunicação, outras formas de linguagens surgiram como, por exemplo, as imagens. Tais imagens eram, 23 [...] sempre modeladas por estruturas profundas, ligadas ao exercício de uma linguagem, assim como a vinculação a uma organização simbólica (a uma cultura, a uma sociedade); mas a imagem também é um meio de comunicação e de representação do mundo, que tem seu lugar em todas as sociedades humanas. (AUMONT, 1993, p. 131). Essas imagens encontradas em sua maioria, em paredes de cavernas, como as de Altamira e Lascaux, conhecidas como pinturas rupestres, eram feitas com o uso de sangue de animais, argila e seiva de plantas. Acredita-se que era principalmente por meio dessas pinturas que as sociedades primitivas se expressavam. Sendo assim, todos os meios técnicos que suportam a informação têm uma relação com o espaço e com o tempo da vida social. Baseada em Geertz, Ângela Maria Barreto (2005, p. 112) afirma que: Os homens, ao produzirem as teias de significações para si mesmos, empregam meios técnicos/suportes materiais para transmitir as formas simbólicas, fundamentando, assim, sua vida social nos aspectos da produção, armazenamento e circulação da informação e do conteúdo simbólico. A grande variedade dessas pinturas, feitas por povos diferentes e em locais diferentes, mantêm algumas características em comum na representação do cotidiano, de ferramentas, de armas, ou figuras que representavam situações específicas, como a caça. Embora muitas vezes, as cenas de caça representadas em cavernas não descrevessem uma situação vivida pelo grupo, possuíam um caráter mágico, preparando o grupo para essa tarefa que lhes garantiria a sobrevivência, como ilustra a figura 1. Figura 1- Homem com máscara de cabeça de ave atacado por um bisonte ferido. c.15.000-10.000 a.C. Pintura rupestre Fonte: Lommel (1979, p. 27) 24 Com o passar do tempo, a produção de imagens começou a ser feita por meio da utilização de variados tipos de materiais e suportes, mas com o mesmo intuito: comunicar, representar e informar. Na modernidade, os modos de produção de imagem romperam definitivamente os modos anteriores. Os aparatos técnicos e químicos de produção de imagem possibilitaram a captura de imagens do mundo real de modo muito mais rápido. Exemplo disso é a fotografia, definida por Aumont (1993, p. 164) como “[...] ação da luz sobre certas substâncias que assim levadas a reagir quimicamente, são chamadas fotossensíveis. Uma superfície fotossensível exposta á luz será transformada provisória ou permanentemente [...]”. Com a fotografia houve um crescimento do uso da imagem para variados fins. Diferentemente da pintura, a fotografia passou a servir como documento comprobatório e indicial. A maneira de produzir imagens por máquinas fotográficas evoluiu com o passar do tempo e hoje temos à disposição, de modo muito acessível, máquinas fotográficas digitais. Tal perspectiva nos leva a concordar com as reflexões do cientista norte- americano Negroponte (1995), quando diz que vivemos num meio onde a tendência de nossas atividades de trabalho, nossos entretenimentos, nossas histórias e relações com outras pessoas tornam-se cada vez mais dependentes das tecnologias digitais. As imagens produzidas atualmente na maioria das vezes ilustram essa reflexão, pois percebemos que elas estão sendo produzidas cada vez mais com uso de equipamentos eletrônicos, seja por máquinas fotográficas digitais, por aparelhos celulares de última geração ou até mesmo por computadores portáteis com câmeras fotográficas embutidas. Sobre a fotografia e sua atual condição, Machado (2000) explica: [...] a fotografia hoje pressupõe uma gama praticamente infinita de possibilidades de intervenção, tanto no plano da produção (pode-se interferir no objeto a ser fotografado, nos meios técnicos para fotografar, como ainda na própria imagem fixada no negativo), quanto nos planos da circulação e consumo social de fotografias. Nesse cenário, está a produção de imagens de cunho artístico como as pinturas e ilustrações, feitas hoje não apenas por artistas, como em épocas anteriores, mas também por qualquer um que tenha certo conhecimento em softwares de produção e tratamento de imagens. Tal acontecimento é resultado da 25 disseminação do uso de computadores, softwares especializados, canetas eletrônicas que substituem o pincel e também da Internet. Contudo, as tecnologias, “[...] remetem a um agregado homem-máquina que variará conforme o caso [...]” (PARENTE, 1993, p. 16). O quadro 1 ilustra a evolução da imagem ao longo do tempo, e o efeito que ela exerce sobre a sociedade e a cultura a que pertence. QUADRO 1: Natureza da imagem, papel do receptor NATUREZA DA IMAGEM PRÉ FOTOGRÁFICA PÓS Figurar o visível e o invisível Registrar o visível Visualizar o modelável Figurar por imitação Capturar por conexão Simular por variações de parâmetros Imagem espelho Imagem documento Imagem matriz PAPEL DO RECEPTOR PRÉ FOTOGRÁFICA PÓS Contemplação Observação Interação Nostalgia Reconhecimento Imersão Aura Identificação Navegação Fonte: Adaptação de Santaella (2001, p. 172-178) As imagens, atualmente, são instrumentos cada vez mais utilizados para representar informação e gerir conhecimento nos mais variados tipos de ambientes, principalmente nos ambientes digitais, como na Internet, pois são encontradas em Web sites, Blogs, webmuseus, etc. Dessa forma, a imagem cumprindo sua função de registrar o imaginário, de significar e de dar sentido no mundo, “tem sido usada como meio e registro de conhecimento” (PLAZA, 1993, p.72). Para essas imagens serem utilizadas como instrumentos de informação e geradoras de conhecimento é necessário, portanto, que o sujeito que irá interagir no ambiente em que tais sinais imagéticos estão inseridos tenha uma cognição apropriada para interpretá-las. Essa interpretação “[...] é baseada na rede semântica total, horizontes, visões de mundo e experiência da pessoa incluindo os aspectos emocionais e sociais” (BRIER, 2004, p. 25, tradução nossa). E também ao uso das novas tecnologias de criação, de armazenamento, de disseminação e de apropriação da informação; e ainda o conhecimento sobre o funcionamento e a articulação estratégica entre a construção dessas imagens e suas amplas 26 possibilidades de sentido (polissemia) e de significação para sua possível gestão. Tal perspectiva vai ao encontro do exposto por Coelho Netto (2007, p. 152): Uma tela, uma escultura, um filme podem perfeitamente ser descritos como mensagens, como grupos de elementos de percepção extraídos de repertórios determinados e com uma estrutura certa. Esses mesmos grupos de elementos significantes, no entanto, talvez fique melhor sob o rótulo de forma, entende-se por forma não uma mais um conjunto de mensagens relacionadas entre si e formando um texto unitário. Uma forma pode ser constituída por uma única mensagem – os casos acima entram nesta categoria, em principio – mas na prática comunicativa é mais comum à ocorrência de formas compostas por mais de uma mensagem, intencionalmente ou não. O profissional da informação deve possuir um aprendizado da sintaxe da linguagem visual para trabalhar com imagens: O uso intenso das tecnologias de informação e comunicação (TICs) exige um direcionamento de inteligência no interior de sua organização. As estruturas de acesso automático, de armazenamento e de preservação da informação para sua localização e uso, requisitam uma fundamentação garantida pela racionalização, pela sistematização e pela compreensão: das estruturas de sinais e de símbolos contidos nos diferentes tipos de dados; da operacionalização no processo de comunicação e de transferência de informações; de linguagem natural e artificial; e de análises semânticas e semiótica (SANTOS, 2009, p. 10). É necessário que o profissional que tenha a informação como seu objeto de trabalho, esteja preparado não só para o uso desses novos aparatos advindos das tecnologias, mas que também esteja preparado para lidar com as mudanças decorrentes deste processo. Mudanças essas, de caráter tanto mental quanto social, pois estamos cada vez mais dependentes de informação para lidarmos com variados tipos de situações. Tais situações terão que ser resolvidas com maior agilidade e rapidez, e as imagens possibilitam essa agilidade desde que o sujeito esteja preparado para seu uso, pois “[...] para internalizar signos o ser humano tem que captar os significados já compartilhados socialmente” (MOREIRA, 1999, p. 113). Junto com o aumento exponencial da informação, as imagens hoje estão se tornando cada vez mais presentes em nossa vida diária: em placas de trânsito, outdoors, vitrines, bancas de jornal, logomarcas de empresas ou em livros, revistas e, massivamente, na rede Internet. De acordo com Aumont (1993, p. 314) “As imagens, isso é inegável, há mais de 100 anos multiplicam-se quantitativamente em 27 proporções impressionantes e sempre crescentes. Além disso, percebemos que essas imagens invadem nossa vida cotidiana, que seu fluxo não pode ser contido”. Dessa forma, a todo o momento é despejado sobre nós uma exponencial quantidade de imagens nos mais diversos tamanhos, cores, formatos e suportes. Quando nos conectamos à rede Internet, por exemplo, percebemos essa demanda que não para de crescer. Isso se dá devido às facilidades que temos da conexão entre computador e scanners, com os instrumentos de captura e restituição da imagem e o progresso das interfaces homem máquina. Os documentos cada vez mais estão tornando-se digitais, senão digitalizados, são criados diretamente digitais. A tendência é informação codificada, para leitura computacional. Explica-nos Lévy (1999, p. 50) que, Digitalizar uma informação consiste em traduzi-la em números. Quase todas as informações podem ser codificadas dessa forma. Por exemplo, se fizermos com que um número corresponda a cada letra do alfabeto, qualquer texto pode ser transformado em uma série de números. As informações digitais são mais fáceis de manipular em comparação com as analógicas, pois permitem a manipulação computacional, bem como facilitam as transmissões de dados via Internet. Um exemplo prático é a criação de imagens digitais. Com a ajuda de um software gráfico, pode-se melhorar e modificar o seu conteúdo. É possível ainda, enviá-la para outra pessoa com facilidade, com o uso de um computador ligado à rede mundial. Com essa rede, surgem os mundos virtuais. Outra esfera do saber, a infosfera caracterizada por Lévy como Ciberespaço. Segundo o autor, o desenvolvimento do ciberespaço “[...] nos fornece a ocasião para experimentar modos de organização e de regulação coletivos exaltando a multiplicidade e a variedade” (LÉVY, 1998, p. 66). É nesse espaço desterritorializado que surgem as imagens de síntese, fractais, as quais são criadas diretamente através de softwares especializados em criação de imagens, caracterizam-se por serem geométricas, abstratas e até figurativas, algumas feitas de um realismo e de cores vivas, muito próximas das imagens reais, semelhantes às imagens feitas de pigmento orgânico. Pois, [...] a dimensão fundamental da “reprodução” imagética da realidade propiciadas pelas tecnologias da imagem não se reduz nem a seu caráter instrumental [...]”, “[...] nem tampouco a sua capacidade manipulatória, como fator condicionador da consciência [...]” mas sim 28 ao seu valor ontológico, como principio gerador de um novo real (PARENTE, 1993, p. 14) Essa nova realidade proporcionada pelas novas tecnologias fascina a nova geração, os chamados nativos digitais, acostumados com ambientes virtuais repletos de imagens fractais. O fascínio pelos mundos virtuais e pelas imagens de síntese toca particularmente as jovens gerações. Este fascínio provém do fato de que não somente podemos criar pequenos “mundos” do nada, mas, sobretudo, pelo fato de que, num certo sentido, podemos habitar “realmente” esses mundos (QUÉAU, 1993, p. 99). Dessa forma, o virtual nos faz questionar e visualizar de uma nova forma o real, pois o suporte das imagens no mundo virtual é desprovido de matéria, bem como de processos físico-químico e maquínico, como na morfogênese ótica, mas sim, de processos matemáticos abstratos possibilitados pelo computador. O virtual não substitui o real, torna-se uma das formas de percepção atualizada e nos aguça a explorar novas maneiras de comtemplar o inteligível. As mudanças na forma de construção de imagens acompanharam a história da arte ao longo do tempo, e isso fez com que ocorressem mudanças na estética da arte e também em nossa forma de percepção e contemplação, como será analisada no próximo capítulo. 2.1 Estética da imagem artística Entende-se por arte, como um conceito recente que nasce ao abrigo dos primeiros estudos de história da arte no final do século XVIII. Nesse tempo, os descobrimentos de Pompéia e Herculano1 desencadeiam na Europa grande interesse pela arqueologia, que dará como fruto, muitas outras escavações, e, sobretudo, o conceito moderno de patrimônio de museu e legado cultural. No entanto, nossa cultura possui instrumentos específicos para decidir o que é ou não arte, pois “[...] a arte é considerada modalidade de interpretação da realidade produzida pela cultura, caracterizando elevado grau de experiência histórica” (LIMA, 2000, p. 21). 1 Subterradas em lama vulcânica, há quase 2000 anos, estas antigas cidades de veraneio romano, junto à baía de Nápoles, emergiam do seu longo sono, como uma das mais ricas descobertas arqueológicas de todos os tempos [...] – Fonte: http://pt.shvoong.com/humanities/archeology/499528- pompeia-herculano/#ixzz1nUmEk5fZ 29 No livro ‘O que é arte’, publicado em 1995, pelo historiador da arte Jorge Coli, discute-se a questão do objeto artístico e nosso modo de analisar e reconhecer uma obra de arte. Para Coli (2000, p. 8), a arte pode ser definida como “[...] certas manifestações da atividade humana diante das quais nosso sentimento é administrativo, isto é: nossa cultura possui uma noção que denomina solidamente algumas de suas atividades e as privilegia”. Para o autor a noção de arte se estabelece na noção de crença, pois se define arte na medida em que acreditamos que o objeto seja artístico, “[...] somos nós que enunciamos o ’em si’ da arte, aquilo que nos objetos é, para nós, arte” (COLI, 2000, p. 64). Nesse sentido, arte é crença, é hábito, ela é contextualizada pelo museu e de forma mais direta pelo catálogo. O catálogo contextualiza e valoriza a obra dizendo que o objeto nele contido é uma obra de arte, assim como o lugar que ela se hospeda (museus). Duchamp mostra muito bem uma das consequências importantes do “para nós” em arte: originários de outras épocas e de culturas distantes, mas agora disponíveis e ao alcance de nossa percepção, os objetos artísticos mudaram ou modificaram seus estatutos, funções, sentidos. A máscara africana deixou de ser, para nós, instrumento mágico, é arte; o cartaz publicitário já não é instrumento de venda, é arte; a imagem do santo perdeu sua função religiosa, é arte (COLI, 2000, p.69). A obra de arte, segundo Coli (2000), é um emissor de mensagens que nos envia sinais, mas o tempo e as distâncias culturais são grandes causadores de ruídos, pois interferem nos sinais enviados. A obra de arte ainda possui sua função religiosa (religare), de religação com os indivíduos, mas agora em espaços e sob entidades patrocinadoras diferentes, saindo dos espaços das igrejas e se inserindo cada vez mais em museus e galerias de arte. Na medida em que ignoramos ou esquecemos as significações originais, atribuímos significados culturais do momento. Assim, “[...] na ideia de arte ‘para nós’ é preciso contar com perturbações que podem ser diminuídas pelo esforço do conhecimento, mas nunca eliminadas” (COLI, 2000, p. 71). Contudo, mais do que comparações, ou exemplos de explicações de conceitos sobre o que é ou não arte, percebemos que a maior comunicação do objeto artístico para nós se dá através do deleite, do espanto, das seduções, das emoções e das evocações do belo e do sublime. Coli deixa claro em seu texto, que 30 há várias formas de análise e de descrição das obras de arte, pois elas carregam consigo um pedaço do tempo que foram construídas, o contexto histórico. Os modos de aproximação com o objeto artístico serão visto na análise a seguir. 2.2 Dimensões contemporâneas da estética da arte: a questão da reprodutibilidade técnica. A história da arte nos mostra a evolução das técnicas, dos estilos, das correntes de pensamentos de artistas os quais deixaram suas marcas por terem revolucionado a forma de fazer e de pensar a arte ao longo do tempo. É por meio desse processo, caracterizado pela constante busca de novos materiais, suportes e formas de representação imagética, que criadores fizeram da arte uma entidade em constante transformação em busca de novas estéticas. O filósofo Marc Jimenez (1999), refere-se à estética como sendo um ramo da filosofia que estuda a natureza do belo e dos fundamentos da arte, a ideia de obra de arte e de criação ou a relação entre as diferentes formas de arte e suas técnicas. Nesse caso, as técnicas de construção de imagens (pinturas). Segundo o referido autor, a cada época este conceito muda, pois “a arte é cheia de ambiguidades e paradoxos”, tornando difícil definir o que seria estética. Schlegel entende claramente como “filosofia da arte” a nova disciplina criada por Baumgarten, isto é, o estudo científico da arte e do belo. Porém, ao se estabelecer uma relação de exclusão entre o discurso e a arte, entre o pensador e o artista, ou o conceito ou a obra, mas não os dois simultaneamente, sua reflexão põe o dedo no equívoco fundamental que se encontra no centro do próprio pensamento estético (JIMENEZ, 1999, p. 18). Contudo, o século XX entrou na história da arte com o surgimento de novas correntes artísticas, as quais romperam definitivamente com os ideais e as técnicas dos “clássicos”, ou seja, ligados à arte do mundo antigo greco-romano, onde a relação do homem com a natureza era clara e positiva. Dessa forma, abriu caminho para novas ideias, para novas mentalidades e culturas. Baseadas nas formas das “vanguardas europeias”, conhecidas como movimentos de vanguarda. Iniciada pelo movimento Cubista, o qual desencadeou posteriormente o surgimento de vários outros movimentos em lugares e épocas diferentes, tais como: - Futurismo, 31 Expressionismo, Dadaísmo, Surrealismo, Construtivismo, Neoplasticismo, Suprematismo, Abstracionismo, dentre outros. O termo vanguarda deriva do francês avant-garde2, literalmente denota a “primeira linha de um exército, em ordem de batalha”, a “guarda avançada que abre a marcha”, o “corpo militar que vai a frente”. Mas na arte, refere-se a grupos de artistas que revolucionaram ao propor novas estruturas estéticas. Na vanguarda Russa, por exemplo, estiveram inseridos artistas engajados com ideologias políticas. Segundo Argan (1992, p. 324), De todas as correntes de vanguarda, animadas por propósitos revolucionários, a que se desenvolve na Rússia nos primeiros trinta anos do século com o Raísmo, o Suprematismo e o Construtivismo é a única a se inserir numa tensão e, a seguir, numa realidade revolucionária, concreta, e a colocar explicitamente a função social da arte como uma questão política. Para os artistas das correntes Russas citadas, a arte deveria estar a serviço da revolução, e fabricar coisas para a vida do povo como antes fabricavam para o luxo e bem estar dos mais afortunados. Argan (1992, p. 326) referindo-se a esse período nos diz, “[...] não mais existem artes maiores e menores: como forma visual, uma cadeira não difere em nada de uma escultura, e a escultura deve ser funcional como uma cadeira”. Com essa visão, a arte deveria estar sempre a serviço do desenvolvimento da revolução. Nesse período, destacaram-se dois movimentos que foram de extrema importância para arte do século XX: o “cubismo” e o “dadaísmo”. No primeiro, com Pablo Picasso (1910 - 1914) a frente do movimento cubista, as características eram basicamente de formas geométricas na maioria das vezes feitas por cubos e cilindros. A arte cubista rompeu com os padrões estéticos que valorizavam a perfeição das formas tiradas da natureza tão valorizada pelos europeus do período renascentista, e deu lugar a representação da forma, quando um único objeto pode ser visto por diferentes ângulos ao mesmo tempo. No segundo, o Dadaísmo iniciado em 1916 em Zurique (Suíça), teve como precursores Tristan Tzara (1896 – 1963), Hugo Ball (1886 – 1927) e Hans Arp (1886 – 1966), e o mais reconhecido desse movimento: Marcel Duchamp (1887-1968). No 2 Termo francês que significa “olhar a frente”. Na arte de vanguarda os artistas eram os que tinham essa visão, os quais pretendiam romper com os padrões artísticos vigentes. É nesse período que ocorre o rompimento entre arte e sociedade, até então a arte estava integrada na vivência social. 32 Dadaísmo negava-se qualquer valor estético da arte do passado, inclusive a própria arte moderna, e diferentemente dos outros movimentos de vanguarda nada propunha. Junto a isso, não podemos deixar de mencionar a importância de outros artistas que na mesma época também tiveram bastante repercussão. Tais como: Georges Braque, Henri Matisse, Francis Picabia, Raoul Hausmann, Hans Richter, Kurt Shwitters, dentre outros. E também, da Bauhaus, que foi a escola de artes plásticas, design e arquitetura mais importante do modernismo, e que teve grande importância na razão histórica das vanguardas, pois, segundo Argan (1992, p.340) ela “[...] transforma os impulsos revolucionários em processos metodológicos, a projeção para o futuro em programação e projetos”. Segundo Gant (2001, p. 13, tradução nossa), O século XX, dentro de uma constante busca de novos materiais e suportes que partem das Collages de Picasso e Braque ou as ready- made de Duchamp, se fortalece com as artes de acción e se materializa a partir da década de 1960, quando um grupo de criadores começa a utilizar novas técnicas para a gravação e reprodução de imagens e sons. Surge assim, de forma contemporânea, o vídeo-arte e a arte cibernética, e se constata o surgimento de criações coletivas [...]. O binômio “arte-tecnologia” não é recente, pois esteve presente em alguns movimentos de vanguarda. O mundo da imagem eletrônica abriu novas visões e impulsionou novas formas de ver e pensar a arte. Um dos acontecimentos que mais influenciou a nova conceituação de obra de arte, e que mais mudanças gerou, foi, segundo Gant (2001, p. 32, tradução nossa) “[...] o fenômeno da reprodução mecânica das imagens, primeiro através da fotografia e posteriormente com a digitalização”. A questão da reprodutibilidade técnica das imagens e das obras de arte foi alvo de discussão entre muitos pensadores da chamada Escola de Frankfurt. Tendo como principais integrantes Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Herbert Marcuse, Friedrich Pollock, Erich Fromm, Otto Kirchheimer e Leo Löwenthal, que analisavam as consequências dessa reprodutibilidade tanto para o campo da arte, quanto da política e da sociedade em geral. 33 Em meio a esse fato, surge a teoria crítica que fixa o ataque à denominada indústria cultural, que tratava a produção cultural como mercadoria, ou seja, a produção da cultura de massa (revistas, programas radiofônicos, cinema, televisão, etc.). Segundo os intelectuais da escola de Frankfurt, a indústria cultural estava transformando a produção artística em algo banal e mecânico, vista em seu modo de produção, igualada a fabricação de automóveis. O pensador que analisou com afinco essa questão e que por um tempo também fez parte da Escola de Frankfurt, foi Walter Benjamin (1892 - 1940)3. Embora algumas questões ideológicas o afastem das ideias depois defendidas pelos integrantes da primeira geração da referida escola, como Horkheimer (1895 - 1973) e Adorno (1903 - 1969), ambos aproximavam-se nas ideias em inferir que a instrumentalização das coisas torna-se também a dos indivíduos. Segundo Benjamim (1936), em seu ensaio “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, referindo-se às técnicas de reprodução de obras de arte (pintura), nos mostra dois lados: um positivo e outro negativo. Por um lado, a obra de arte reproduzida deixaria de ter seu caráter único (autêntico), a falta desse modo de ser aurático, segundo ele, provocaria um empobrecimento baseado na tradição (culto, magia, contemplação do belo), pois o simulacro esvazia a experiência. Mas por outro lado, suas imagens (reprodução das originais) passariam a fazer parte de uma camada massiva da sociedade, deixando-se desligar de uma elite cultural que outrora era exclusiva. Favoreceria dessa forma, a socialização da cultura, da arte, levando a crítica e a reflexão às camadas antes desprovidas. Segundo Jimenez (1999, p. 331), Em seu ensaio, Benjamin observa a crescente necessidade, no público, de “apropriar-se do objeto na imagem e na reprodução”. Podemos dizer que, desde então, a televisão e as novas tecnologias satisfazem largamente esta necessidade. Porém, não podemos notar a ambiguidade da proximidade midiática: frequentemente ela nos dá a ilusão de viver os acontecimentos ao vivo, no próprio local. Este é um fenômeno positivo, visto que aumenta nosso conhecimento. Em compensação, esta mesma proximidade é enganadora: ela leva a nos contentarmos com esta experiência mediatizada em detrimento da experiência vivida. 3 O texto de Benjamin é anterior aos textos de Adorno e Horkheimer. Benjamin (1936) em seu texto, via a tecnologia sob dois pontos de vistas: um positivo e outro negativo em relação a arte. Embora Benjamim tivesse conhecimento do uso que Hitler fez das tecnologias para acender ainda mais o fogo do Nazismo através do cinema e da propaganda Nazista, os textos e as reflexões de Adorno e Horkheimer foram mais incisivos nesse aspecto. 34 Dessa forma, Benjamin (1936) analisa a questão da autenticidade da obra em oposição ao seu simulacro em um mundo, onde não falta demanda para consumo desses produtos reproduzidos. O suprassumo de sua análise e fundamento de sua crítica é a questão da perda da “aura” nas obras de arte pela reprodutibilidade técnica. Ele conceitua (aura) como sendo “[...] uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja [...]” (BENJAMIN, 1994, p. 170). O autor, referindo-se a reprodução da obra de arte diz: A mais perfeita reprodução sempre falta alguma coisa: o hic et nunc da obra de arte, a unicidade de sua presença no próprio local onde ela se encontra. Não obstante, é a esta presença única, e somente a ela, que se encontra ligada toda sua história. (BENJAMIN, 2000, p. 224). Contudo, o conceito de aura, segundo Benjamin permite resumir essas características: [...] que se atrofia na era da reprodutibilidade da obra de arte é sua aura. Esse processo é sintomático, e sua significação vai muito além da esfera da arte. Generalizando, podemos dizer que a técnica da reprodução destaca do domínio da tradição o objeto reproduzido. Na medida em que ela multiplica a reprodução, substitui a existência única da obra por uma existência serial. E, na medida em que essa técnica permite a reprodução vir ao encontro do espectador, em todas as situações, ela atualiza o objeto reproduzido (BENJAMIN, 1994, p.168). Benjamin esclarece em seu ensaio, que a reprodutibilidade técnica já acontecia muito antes da fotografia e do cinema. No entanto, evidencia-se um aumento exponencial da reprodução de imagens devido ao surgimento desses equipamentos reprodutores – como as fotografias, o cinema e logo após, com o surgimento das fotocopiadoras a partir da década de sessenta. Segundo o autor: [...] a obra de arte foi sempre suscetível de reprodução. O que alguns homens haviam feito, outros podiam refazer. Em todas as épocas discípulos copiaram obras de arte a título de exercício; mestres as reproduziram para assegurar-lhes difusão; falsários as imitaram para assim obter um ganho material. As técnicas de reprodução, entretanto, são um fenômeno inteiramente novo, que nasceu e se desenvolveu no curso da história, por etapas sucessivas, separadas por longos intervalos, mas num ritmo cada vez mais rápido (BENJAMIN, 2000, p. 223). 35 Cada época possui seu método e instrumento de reprodução de imagem, e também, seu modo de cultuar suas obras imagéticas. Antes a arte estava a serviço de um ritual, inicialmente mágico, e depois religioso, reservada a poucos para contemplação. A fotografia tomou lugar, expandindo a possibilidade de muitos verem a mesma obra através de reproduções. Mas isto, de modo algum significa que com a fotografia acabou o valor de culto das imagens. Segundo Benjamin (1994, p. 174), Com a fotografia, o valor de culto começa a recuar, em todas as frentes, diante do valor de exposição. Mas o valor de culto não se entrega sem oferecer resistência. Sua última trincheira é o rosto humano. Não é por acaso que o retrato era o principal tema das primeiras fotografias. O refúgio derradeiro do valor de culto foi o culto da saudade, consagrada aos amores ausentes ou defuntos. A aura acena pela ultima vez na expressão fugaz de um rosto, nas antigas fotos. É o que lhes dá sua beleza melancólica e incomparável. Porém, quando o homem se retira da fotografia, o valor de exposição supera pela primeira vez o valor de culto. Contudo, as transformações referentes aos métodos e técnicas de reprodução de imagem é reflexo da evolução e do surgimento de uma nova sociedade – infosociedade. Atualmente denominada de sociedade da informação, e isso refletiu na visualidade da arte contemporânea. Com o advento da fotografia, com a vídeo-arte, com o cinema e, principalmente, com a inserção de equipamentos informáticos na construção de obras digitais e também nos ambiente virtuais como nos webmuseus, foi possível confeccionar uma nova proposta plástica recorrendo aos programas computacionais, o que será analisado nos próximo capítulos. 36 3 SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO Os seres humanos sempre sentiram a necessidade de gerar, compartilhar e adquirir informação, por meio dos mais variados tipos de assuntos e formas de expressão. O sonho de que esse arsenal informacional ultrapasse fronteiras, perpassa homens de diversas épocas, muito antes do aparecimento da Internet e está presente nos dias de hoje. Por meio das estruturas mentais é gerado o conhecimento de cada indivíduo, pois cada um possui formas e competências cognitivas de extrair informação e transformá-las em conhecimento. Na Idade Média o conhecimento era destinado ao clero por meio dos monges copistas, com o passar do tempo a ideia de ter um livre fluxo da informação gerada pela humanidade ganhou força no século XVII através de estudiosos eruditos, os quais montaram a rede de saber universal Academia de Lince, em 1603. Com a fundação das sociedades científicas na França e Inglaterra seis décadas depois, mais precisamente em 1660 aparece o primeiro periódico científico, embora não tratasse exclusivamente de assuntos científicos, mas também de resumos de livros publicados na Europa, algumas cartas e notas, etc. Estava evidente por esse fato, a preocupação da disseminação do conhecimento com o uso da tecnologia vigente na época. Como disse Barreto (2008) “O ideal compartilhado seria o de se construir uma sociedade do conhecimento não só uma sociedade da informação”. O mesmo autor diz ser um erro confundi-las, pois “a sociedade da informação é uma utopia de realização tecnológica e a do conhecimento uma esperança de realização do saber”. A relação de tempo/espaço e emissor/receptor é outra. A informação agora é obtida em tempo real (online), e isso faz com que o julgamento da informação também seja nesse mesmo tempo, e o receptor então, passa a ser o julgador da sua relevância no momento de sua interação. Atualmente, com a nova plataforma Web 2.0 – e caminhando para sua evolução “Web Semântica” ou Web 3.0 – a estrutura dos documentos depositados são híbridos, combinando diversas linguagens – audiovisuais (texto, som, imagem) –, o sistema de busca de informações (motores de buscas) são mais inteligentes, dinâmicos e precisos e a interatividade entre emissor e receptor é agora mais próxima, intensa e atemporal, a exemplo das chamadas redes sociais em especial o Facebook. 37 São de fato, nas redes sociais onde a estrutura sociotécnica “emerge como forma orgânica” em “novos padrões do uso da infotecnologia na Internet” como descreve Fumero (2007). A Web nova geração (WebNG) viu nascer em seu berço um novo sujeito. O sujeito atuante, impessoal, onde o talento é muito mais determinante, que outrora fosse uma determinada organização fechada, estática e atada a burocracias. Esse novo cidadão conhecido como nativo digital ou “Geração Y” exprime suas ideias e desejos em ambientes virtuais vivenciado em mundos paralelos por seus avatares. 3.1 O que é informação? Vivenciamos, segundo Gonzalez et al (2004, p. 195) “a era da informação”. Embora ainda não se saiba a natureza ontológica e epistemológica da informação, muitos estão sendo os esforços por pensadores e estudiosos de diversas áreas do saber, os quais pretendem chegar a um consenso terminológico a respeito do conceito de informação. Diferente do conceito de conhecimento, do qual já se possui um estudo teórico ao longo da história, o estudo do conceito de informação ainda possui uma história jovem. Não obstante, a informação começa a ser usada como objeto de estudo no Ocidente com as ideias de Hartley (1928) e Szilard (1929/1972), com suas reflexões sobre termodinâmica, sugerindo uma analogia entre informação, formas de organização e entropia. Gonzalez et al (2004, p. 198), ao discorrer sobre a segunda lei da termodinâmica, nos indica que “[...] há uma tendência nos sistemas físicos de se tornarem progressivamente desorganizados, sendo que a entropia é caracterizada pela quantidade de desordem de seus constituintes”. Tendo como base os autores mencionados (Hartley e Szilard), e levando o conceito de informação para uma abordagem voltada para a Teoria Matemática da Comunicação (MTC) Shannon e Weaver (1949) deixam de lado aspectos de ordem semântica, ou que envolvam o significado, e focalizam em aspectos objetivos concernentes à medida da quantidade de informação gerada em uma fonte e à transmissão de mensagens. O estudo da concepção filosófica do termo ‘informação’, por sua vez, apresenta significados complexos e abstratos. Embora nos diga Capurro apud Gonzalez et al (2004, p. 197), referindo-se às raízes etimológicas do termo latino informatio, “[...] estariam ligadas a conceitos gregos como typos, idea e morphé, 38 sendo que a sua acepção atualmente conhecida de “dar forma a algo” só foi consolidada entre os séculos XV-XVII”. Ainda considerando as raízes terminológicas do termo, verificamos que é composta pelo prefixo in e também pelo nome (substantivo) formae, o qual designa noção de forma. No entanto, [...] O prefixo in do termo informação pode ser entendido, enquanto modo acusativo, em três concepções: 1) como expressão da noção de movimento em direção ao lugar para onde se dirige algo; 2) como ordem temporal; de algo que se desenvolve através de processos, e, 3) em sentido figurado; como referência à noção de devir (GONZALEZ et al , 2004, p. 197). Dessa forma, compreendemos através das acepções do prefixo in, que o termo “informação” é algo que vem se desenvolvendo, e ainda está em transformação, sem uma definição precisa. Embora nossa referência seja a informação como algo capaz de direcionar uma ação, ela não é matéria, nem energia, mas seria um terceiro elemento constituinte do mundo e que não se reduz a outros dois. Nesse sentido, a informação não é uma entidade, coisa ou substância, mas “[...] um processo auto-organizado que permite o estabelecimento de padrões de ação para organismos situados em ambientes governados por relações compartilhadas de ordem” (GONZALEZ et al, 2004). No entanto, como a ciência [...] se manifesta em diversas modalidades – “calor, luz, som, elétrica, química, osmótica, atómica etc”. –, assim também as manifestações da informação se dão sob um espectro de modalidades: “estrutural, cinética, temporal, espacial, biológica, linguística humana, em código de máquina, etc.” (SCHAEFFER, 2001, p. 284). Segundo a visão ontológica da informação, refletimos sobre como algo não- material pode influenciar em algo material, ou seja, como nos propomos a analisar se a informação é ou não física? No viés epistemológico, a pergunta é: como é possível conhecer a informação? Dessa forma, o que se questiona é a diferença entre a informação e a pseudo-informação. As visões ontológica e epistemológica se distanciam da visão intuitiva do senso comum. Essas visões diferenciam-se também da visão dos pesquisadores da teoria matemática da comunicação (MTC) de autores como Claude Shannon e Warren Weaver (1949), que empregam o termo “informação” dissociado do uso cotidiano, e deixam de lado aspectos de ordem semântica, pois, se utilizam de 39 elementos da matemática na medida da informação, na transmissão de mensagens em sistemas físicos. Nessa vertente “[...] são preponderantes os problemas formais e técnicos da engenharia sobre a aplicação de teorias no âmbito tecnológico envolvidos na transmissão e recepção de mensagens [...]” (GONZALEZ; NASCIMENTO; HASELAGER, 2004, p. 198). Os teóricos dessa vertente preocupam-se com questões referentes à comunicação, à quantidade de informação gerada em uma fonte, à capacidade do canal que a transmite, bem como a efetividade e confiabilidade ao transmitir os dados, pois, seus focos são essencialmente técnicos, não adentrando em questões que envolvam reflexões de cunho epistemológico ou ontológico, mas sim, do controle eficiente da comunicação entre receptor e sua fonte, independentemente do conteúdo significativo da transmissão. Há pelo menos três outros tipos de reflexões a respeito da natureza ontológica e epistemológica da informação, sendo eles, respectivamente: o realismo informacional, a ecologia informacional e a semântica informacional. As quais serão feitas uma breve explanação. Segundo (GONZALEZ; NASCIMENTO; HASELAGER, 2004, p. 202). O realismo informacional é caracterizado por teorias que afirmam a realidade física e objetiva da informação [...].Um pressuposto fundamental do realismo informacional é que ambas, ordem e organização, constituem a matéria prima da informação que se propaga pelo universo em crescente complexidade. De acordo com o realismo informacional, quanto maior a desordem, menor a quantidade informacional. Contrário aos teóricos da (MTC), os quais afirmam que quanto maior a quantidade de desordem em um sistema (expresso em termos da independência relativa das mensagens), maior será a informação gerada. Dentro das reflexões da denominada ecologia informacional, que possui como seus principais expoentes Gibson (1979) e Bateson (1999), para os quais a informação é entendida como inerente à relação do ser com o mundo, Gibson (1979) adota um neologismo, affordance, tirado do termo to afford (fornecer, possibilitar), o qual designa a interação do ser no mundo. A existência das affordance, não se deve unicamente aos estímulos físicos do meio ambiente, mas está ligada à estrutura corpórea dos organismos e do meio em que eles se situam. 40 Para resumir, a informação, para os teóricos da ecologia informacional, é o conjunto das invariantes constitutivas das affordances que se estabelecem entre organismo e meio ambiente. Para Gonzalez et al (2004, p. 204), “a informação está intrinsecamente ligada à ação e à situação dos organismos no meio ambiente”, e o conteúdo significativo que a informação carrega é relativo ao tipo de organismo que a experiência. Contudo, a informação ecológica resulta da interação ativa entre os organismos e o meio ambiente do qual ele faz parte. Diferente da visão dos teóricos da (MTC) que entendem a informação em termos de comunicação de mensagens. Para finalizar, veremos a concepção de informação dada pelo olhar da semântica informacional, tendo como um dos seus expoentes Dretske (1981). Influenciado pelos teóricos da MTC, Dretske propõe a hipótese que a informação é um elemento objetivo, “[...] cuja existência (enquanto informação) é (amplamente) independente das atividades interpretativas de agentes conscientes” (DRETSKE, 1981, p.55). Contudo, diferente dos teóricos da (MTC), a preocupação de Dretske reside na tentativa de explicar o aspecto significativo da informação subjacente às crenças que fundamentam o conhecimento vinculado à percepção. Embora existam diversas vertentes e linhas de pensamento que tentam desvendar a natureza da informação, alguns autores dizem que a informação pode ser guardada, armazenada e expressa em objetos materiais, como por exemplo: livros, CDs, aparelhos eletrônicos, etc. O teórico da área da Ciência da Informação Michael K. Buckland (1991), identifica três grupos de definição de informação em seu artigo “Information as thing”: “Informação como processo”, “Informação como conhecimento” e “Informação como coisa”. Para o autor, Informação como processo, diz respeito a quando alguém é informado, o que conhece é modificado. Nesse sentido, “informação” é “o ato de informar...; comunicação do conhecimento ou “novidade” de algum fato ou ocorrência; a ação de falar ou o fato de ter falado sobre alguma coisa” ( p. 351). A Informação como conhecimento é quando a “informação” é também usada para denotar aquilo que é percebido na “informação como processo”: o “conhecimento comunicado referente a algum fato particular, assunto, ou evento; aquilo que é transmitido, inteligência, noticias” ( p. 351). 41 E por último, informação como coisa (p. 351) é aquela em que o termo “informação” é também atribuído para objetos (textos, documentos, eventos, etc.), assim como dados para documentos, que são considerados como “informação“, porque são relacionados como sendo informativos; tendo a qualidade de conhecimento, comunicado ou comunicação, informação, algo informativo. Nesse ponto de vista, “informação” inclui comunicação, mas vai mais além. Qualquer sistema de armazenamento e recuperação da informação se alimenta da “informação como coisa”. Independentemente das correntes teóricas expressas anteriormente, sabemos que a informação é expansiva e difusiva, considerada como a moeda de valor em nossa sociedade. Isso é devido ao fato que os bens de valor de hoje não se comportam como os de antigamente. Com a expansão informacional junto ao avanço das tecnologias, as relações interpessoais, a vida prática, o lazer entre outras coisas sofreram transformações. O conforto proporcionado pelas altas tecnologias pode ser interessantes para quem gosta e para quem pode, mas são indispensáveis para quem precisa. Na sociedade em que vivemos, denominada ”sociedade da informação”`, houve uma profunda mudança tanto na organização quanto na economia, [...] havendo quem a considere um novo paradigma tecno- econômico. É um fenômeno global, com elevado poder transformador das atividades sociais e econômicas, uma vez que a estrutura e a dinâmica dessas atividades inevitavelmente serão, em alguma medida, afetada pela infraestrutura de informações disponível. (BRASIL, 2000, p. 5, grifo do autor). As tecnologias de informação e comunicação TIC estão cada vez mais presentes em nosso dia-a-dia. E, tornam-nos, dessa forma, cada vez mais dependentes de equipamentos eletrônicos para lidarmos com diversas situações diárias. Segundo Capurro (2010, p. 11, tradução nossa), as tecnologias de informação e comunicação “são atualmente um fundamento da vida diária, os métodos científicos, os processos industriais, as estruturas políticas, econômicas e culturais”. Contudo, essa dependência transformou a forma de percepção do mundo, nossa cognição, todo um sistema social, político e cultural. Temos agora um espaço desterritorializado de troca de informação via meio eletrônicos, chamada de infosfera. 42 Esse novo ambiente informacional gerou distinção entre, os que têm acesso e fazem parte da infosfera, dos que não têm acesso e que não estão inseridos nela. Isso gerou um novo problema sociocultural chamado por Floridi (2001) de divisão digital; “[...] a fonte de muitos dos problemas éticos emergentes da evolução da sociedade da informação” (FLORIDI, 2001, p. 1, tradução nossa). Essa divisão é composta por dois cortes: o corte vertical e o corte horizontal. O corte vertical constitui-se pela mudança da modernidade para a pós- modernidade, representada também pela sociedade da informação. Na modernidade, o objetivo era a superação do ser pelo domínio da natureza, e pela criação de novas realidades, que nos beneficiaria. Em síntese, mais poder tecnológico, mais responsabilidade moral. No corte horizontal, Floridi refere-se às pessoas com pouco ou nenhum acesso à sociedade informacional e, de outro lado, as que possuem acesso pleno. Nesse viés, leva-se em conta a questão econômica, social e de educação. A pós-modernidade, a globalização, o avanço tecnológico determinaram a dinâmica de como as informações chegam até nós. No entanto, exige-nos também, cada vez mais rapidez em nossa decodificação e compreensão, pois são várias as formas de signos informacionais que nos é fornecido pelas mídias massivas. Além da questão ética da informação e suas particularidades, temos que nos pautar também na questão do entendimento dessas variedades de informações que nos chegam, nesse caso particular, dando ênfase nas informações imagéticas. Para Peirce (1990), tudo aquilo que existe no mundo físico, como, por exemplo, um objeto qualquer – uma cadeira, por exemplo – possui em sua existência informações implícitas e explicitas que as caracterizam e representam informacionalmente, seja por meio de sua forma, cor, tamanho ou qualquer outro elemento sígnico. No contexto desta pesquisa, julgamos de extrema importância não só o conhecimento da semiótica Peirceana, mas também de autores como Lúcia Sanataella (1983, 1992, 2001, 2010) e Júlio Plaza (2008), os quais trabalham dentre outros autores, com as teorias de Peirce. E em cima dessas teorias fazem seus estudos, como pode ser visto na obra “Tradução intersemiótica”, de Júlio Plaza. Plaza trabalha as teorias de Peirce direcionando-a para as artes plásticas, e aplica essas teorias ao movimento concretista dos anos 60/70, e têm como objeto de 43 estudo as obras de autores como Augusto de Campos e Haroldo de Campos, os quais seguem uma linha de pensamento do linguista Roman Jackobson. Através das leituras de Peirce, Plaza constrói uma metodologia própria instrumentalizando uma tipologia de traduções intersemióticas. São tipos de referência, algumas vezes simultâneos em uma mesma tradução, que, por si mesmos, não substituem, mas apenas instrumentalizam o exame das traduções reais. Aliás, não estamos aqui senão atuando em correspondência com o mesmo espírito que guia a organização das tipologias de signos formuladas por Peirce. (PLAZA, 2008, p. 89). Nesse sentido, e partindo do pressuposto científico de que toda linguagem possui uma gramática, foi feito no capitulo 5 uma análise da sintaxe visual de algumas obras de arte: “Saudade” do Pintor Almeida Junior e o painel (sem título) dos grafiteiros “OsGemeos” e teve como base teórica a semiótica aplicada de autores como Lúcia Santaella e Júlio Plaza os quais utilizam da semiótica Peirceana direcionada a questões da comunicação e arte. Segundo a professora de comunicação da Boston University School of Communication, Donis A. Dondis (2003, p. 31) “[...] o processo de composição é o passo mais crucial na solução dos problemas visuais [...]. Os resultados das decisões compositivas determinam o objetivo e o significado da manifestação visual e tem fortes implicações com relação ao que é recebido pelo espectador”. 44 Figura 2 - Estratégias de comunicação Fonte: Adaptação de Dondis (2003 p. 132) A linguagem pictórica, segundo Oliveira (2004, p. 116), “[...] se constrói a partir de uma peculiar semiose que se estabelece entre os dois planos constituintes de sua estruturação: o plano da expressão e o plano do conteúdo.” No entanto, esses planos não mantém uma relação arbitrária e nem é centrado em um conjunto de normas, mas ambos tem por finalidade “representar”. Dessa forma, “[...] a semiótica fornece métodos de descrição da pintura, na mesma medida em que ela nos fornece meios para melhor apreciá-la – o que já é aproximar-se esteticamente dela” (2004, p. 115). De acordo com Greimas (2004, p. 80), O crivo de leitura, de natureza semântica, solicita, por conseguinte, o significante planar e, assumindo feixes de traços visuais, de densidade variável, aos quais constitui em formantes figurativos, dota-os de significados, transformando assim as figuras visuais em signos objetos. Seguindo as estruturas sintáticas que configuram uma obra pictórica referida por Donis A. Dondis (2003): todos os objetos no mundo têm como base estrutural três formas elementares e básicas ou a fusão entre elas: - o quadrado, o circular e o triângulo, e são nesses elementos e é através deles, 45 [...] que a pintura sensibiliza o olho para perceber na dimensão de sua materialidade - seu suporte, suas pinceladas, as granulações das tintas, a inserção de outros componentes na composição dessas, o gesto de inscrição ou não do pintor, enfim nos constituintes de sua corporeidade física. (OLIVEIRA, 2004, p. 126). Nos próximos capítulos serão analisados os novos ambientes informacionais onde estão sendo usados para contemplação das artes, para podermos compreender melhor essa enxurrada de mensagens sígnicas que nos chegam diariamente por diversas formas, seja por meios de comunicação de massa (rádio, televisão) e principalmente na atualidade nos ambientes virtuais denominados ciberespaço. 3.2 Cibercultura Vivenciamos uma era em que o pensamento técnico e o pensamento simbólico se encontram, e o impacto das TIC, provoca uma mutação decisiva na esfera social e cultural. Tal momento é caracterizado pela explosão das redes extensas e sua abertura informacional ao grande público equipado com um dispositivo. Uma das redes mais conhecidas e utilizadas, chamada de rede das redes ou inter-redes, e, sobretudo a mais aberta, é a Internet (COUCHOT, 2003). Blattmann e Silva (2007) citado por Santos (2009) ressaltam, que o crescimento exponencial da informação advindo das TIC teve como consequência não só os novos tipos de recursos e ambientes informacionais, mas também novas denominações para esses ambientes. Pois, Com o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação, TICs, a Web evoluiu e nela se viu nascer novos tipos de ambientes informacionais, ambientes mais interativos e colaborativos para a troca, a criação, a geração e o armazenamento de informações. Essa nova concepção vem sendo denominada de Web 2.0 ou ainda Web Social (BLATTMANN; SILVA, 2007 apud SANTOS, 2009). A Internet trouxe consigo uma nova forma de pensar, fazer e comunicar para os seres humanos, pois sua estrutura atemporal e sem fronteiras geográficas bem como o serviço da plataforma Web, mais precisamente a Web 2.0, permite a livre circulação de informações, transferência de dados e troca de conhecimento entre as pessoas por meio de conglomerados de redes em escala mundial de milhares de 46 computadores interligados por TCP/IP, permitindo a troca de informações e transferência de dados. Dessa forma, “[...] podemos agora produzir sentido coletivamente, cooperativamente, no jogo das subjetividades abertas ao outro, para além das querelas identitárias, das fronteiras, das culturas, das religiões e dos territórios” (LEMOS, 2009). De acordo com Lévy (1999), no Ciberespaço o qual consiste em ambientes informacionais atuais em que se dá o trânsito de pessoas, ideias e comunicação, há um “dilúvio informacional”. Para o autor, O Ciberespaço é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo especifica não apenas a infraestrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo “cibercultura”, especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamentos e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço (LÉVY, 1999, p. 17). Foram nesses espaços comunicacionais e interativos que a tecnologia deu a luz a uma nova cultura, a qual segundo LÉVY (1999) a denominou: Cibercultura. “Em português, ‘dar à luz’ é fazer nascer. Isto é válido tanto no domínio da vida como no da imaginação. A luz parece unir o real e o virtual, o que já se manifestou e o que pode vir a ser manifestado” (OLIVEIRA, 2006). Novas pessoas acessam a Internet diariamente, novos computadores são interconectados, novas informações são injetadas num fluxo caótico, crescente e desordenado. No mundo digital, insere-se também o espaço das artes em geral: música, pintura, fotografia, cinema, etc. Foram criados ambientes virtuais, colaborativos, interativos entre as pessoas em proporções antes inimagináveis, como por exemplo, os Blogs, Flickr, redes sociais e afins e ainda os ambientes de contemplação das artes os webmuseus, o que vai ao encontro da afirmação de Lévy quando afirma que “[...] para cada uma das grandes modalidades do signo, texto alfabético, música ou imagem, a Cibercultura faz emergir uma nova forma e maneira de agir [...]” (LÉVY, 1999, p. 149). É no ambiente Web que está ocorrendo a fusão de linguagens e onde a arte agora está imersa. Segundo Eirin de Rapp (2000, p. 44) essa fusão “[...] se reflete nas páginas de arte, nas quais a informação estética é complementada por música, 47 animação, conexões para outras páginas [...]”, num fluxo intersemiótico que nos aguça a novas percepções cognitivas. As percepções cognitivas estimuladas pelas possibilidades oferecidas no ciberespaço nos encaminharam para uma reflexão sobre as intersemioses digitais. Entretanto, não há como falar de intersemioses digitais sem antes nos remetermos à semiótica, e a apresentação de seu conceito. 3.3 Semiótica A semiótica (do grego semeiotiké ou arte dos sinais) é a ciência que estuda o processo de articulação entre os diversos tipos de linguagens e os modos pelo qual o homem significa o que o rodeia. Ocupa-se do estudo do processo de significação ou representação, na natureza e na cultura dos conceitos e das ideias. As linguagens estão no mundo e nós fazemos parte delas. Nöth (2008, p. 21) explica que, A semiótica como teoria geral dos signos teve várias denominações no decorrer da história da filosofia. A etimologia do termo nos remete ao grego semeîon, que significa “signo”, e sema, que pode ser traduzido por “sinal” ou também “signo”. Semio-, uma transliteração latinizada da forma grega semeio-, e os radicais parentes, sema(t)- e seman-, têm sido a base morfológica para várias derivações de vocábulos que dão nome às ciências semióticas. De acordo com Nöth (2008, p. 18), “[...] a semiótica propriamente dita tem sua origem com filósofos como John Locke (1632-1704) que, no seu Essay on human understanding, de 1690, postulou uma “doutrina dos signos” com o nome de Semeiotiké [...]”; ou supostamente, com o trabalho do filósofo Johann Heinrich (1728-1777), o qual escreveu um tratado específico intitulado Semiotik. No entanto, Peirce (1990) atribui o nome semiótica ao filósofo inglês John Locke que afirmava que todas as nossas ideias tinham origem no que era percebido pelos sentidos. Segundo Locke “semiótica é a doutrina dos signos, que se ocupa da relação triádica entre sinais ou representação da coisa, a coisa propriamente dita e as ideias. Outro nome para semiótica seria lógica.” (LOCKE, 1988, p. 211). Afirma Nöth (2008, p.18) que, a doutrina dos signos, a qual segundo ele “compreende todas as investigações sobre a natureza dos signos, da significação e da comunicação na historia da ciência” coincide com a história da filosofia, uma vez 48 que Platão e Aristóteles eram teóricos do signo e, portanto semioticistas. Entretanto, somente no final do século XIX, início do século XX com os trabalhos paralelos de Ferdinand de Saussure (1857 - 1913) e Peirce (1839-. 1914) com a – fenomenologia –, a semiótica consolida-se e começa a adquirir autonomia e status de ciência. O saber é constituído por uma dupla face. A face semiológica ou semiótica – relativa ao significante – e a epistemológica – referente ao significado das palavras-. O estudo semiótico tem por objeto investigar todas as linguagens possíveis, como a linguagem oral (através da fala), a linguagem verbal (através de textos) a linguagem visual (através de imagens) e, atualmente a linguagem intersemiótica (fusão de todas as anteriores), “[...] pois examina os modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de produção de significação e sentido” (SANTAELLA, 1983, p. 13). Ainda segundo Santaella (2001, p. 141), a semiótica “[...] tem, como ciência geral dos signos, a tarefa de desenvolver instrumentos de análise desses produtos protótipos do comportamento sígnico humano”. Tudo o que vemos, sentimos e ouvimos, remete aos nossos sentidos, noções do que é real, e para que percebamos o quão vivo e interativo nós estamos com a realidade que nos cerca, e para interagirmos com essa realidade e com os seres que nela vivem, sentimos necessidades, como seres sociais que somos, de nos comunicarmos. Na comunicação, fazemos uso de diversos tipos de linguagens sígnicas algumas delas classificadas por Peirce, como por exemplo, os ícones, os índices e os símbolos, e são explicadas da seguinte forma: Um signo é um ícone, um índice ou um símbolo. Um ícone é um signo que possuiria o caráter que o torna significante, mesmo que seu objeto não existisse, tal como um risco feito a lápis representando uma linha geométrica . Um índice é um signo que de repente perderia seu caráter que o torna um signo se seu objeto fosse removido, mas que não perderia esse caráter se não houvesse interpretante. Tal é, por exemplo, o caso de um molde com um buraco de bala como signo de um tiro, pois sem o tiro não teria havido buraco ; porém, nele existe um buraco, quer tenha alguém ou não a capacidade de atribuí-lo a um tiro. Um símbolo é um signo que perderia o caráter que o torna um signo se não houvesse um interpretante. Tal é o caso de qualquer elocução de discurso que significa aquilo que significa apenas por força de compreender-se que possui essa significação (PEIRCE, 1990, p. 74). 49 Atualmente é comum a presença de variados tipos de linguagens numa só mídia. Como nos diz Santaella (2005, p. 250) “todas as artes se confraternizam: pintura, escultura, fotografia, vídeo, instalação e todos os seus híbridos, pois Estamos assistindo a uma ampliação dos “espetáculos” artísticos que não limitam sua materialização a uma determinada linguagem. Nesses casos, não só o processo como a própria obra abarca diferentes códigos (SALLES, 1998, p. 114).