UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro Uso do 210Pb na cronologia da contaminação de cromo em sedimentos do Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP) FANNY ROXANA MAMANI MATAMET Orientador: Prof. Dr. Daniel Marcos Bonotto Tese de Doutorado elaborada junto ao Programa de Pós-Graduação em Geociências e Meio Ambiente, para obtenção do título de Doutor em Geociências. Rio Claro (SP) 2013 DEDICATORIA ___________________________________________________________________ A DEUS, porque sempre cuida de min. E aos meus pais, Isidro J. e Elsa E. exemplos de amor e harmonia. AGRADECIME'TOS ___________________________________________________________________ A realização deste trabalho contou com a participação de varias pessoas e entidades, as quais registro aqui meus sinceros agradecimentos. � Em primeiro lugar agradeço ao meu orientador Prof. Dr. Daniel Marcos Bonotto por todo seu entusiasmo na orientação deste trabalho. Obrigado de coração pela paciência, pela confiança, pela amizade, pelos ensinamentos e pelos exemplos de profissionalismo e dedicação a profissão que levarei comigo pra sempre. � Meus sinceros agradecimentos ao CAPES pelo apoio financeiro durante o primeiro ano do meu doutorado e ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) pelo apoio financeiro garantido na bolsa de doutorado durante os três últimos anos de pesquisa. � Obrigada a Universidade Estadual Julho Mesquita Filho (UNESP) a qual tenho muito carinho. Obrigado a todos do Instituto de Geociências e Ciências Exatas que fizeram parte desta minha passagem pela UNESP. Agradeço também de coração de forma muito especial a Rosangela Vacello secretaria do Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE) da UNESP – Campus Rio Claro, obrigada pela paciência e apoio constante durante estes quatro anos. � Agradeço ao FUNDUNESP (Fundação para o Desenvolvimento da UNESP) pela ajuda econômica que auxilio na saída de campo e análises em laboratório. � Também, agradecer ao CEA (Centros de estudos ambientais) da UNESP pelas análises químicas das águas. � Esta tese de doutorado não seria exeqüível sem a cooperação de centros de pesquisa em outras universidades. Sinceros agradecimentos ao Prof. Dr. Renato Campello Cordeiro da UFF - Universidade Federal de Fluminense, Niterói (RJ), pelas análises granulométricas dos sedimentos. � Meu eterno obrigado a minha família, sempre presente, até os mais distantes. Pai, mãe e irmãos, sem vocês nada disso teria frutificado. � Aos meus colegas e amigos, grandes pensadores e o futuro da ciência brasileira: Juliana Galhardi, Fabiana Meira, Ricardo, Denise, Leiliane, Thiago, Lara, Carolina, Ricardo, Márcia Sayuri obrigado pelas longas conversas, pela companhia nos congressos e pela amizade sempre presente. � Agradeço muito a todos pelos momentos vividos, experiências trocadas, lições e conversas sempre muito bem vindas. Pode ser que alguns nomes não constem aqui, mas saibam que trago no coração cada um que fez parte da minha vida nestes 4 anos. Obrigada! Í'DICE ___________________________________________________________________ ÍNDICE RESUMO ABSTRACT LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS I. INTRODUÇÃO II. OBJETIVOS III. LOCALIZAÇÂO, ASPECTOS GERAIS DA ÁREA DE ESTUDO. IV. MATERIAL E METODOS V. RESULTADOS E DISCUSSÃO. VI. CONCLUSÕES. REFERÊNCIAS SUMARIO ___________________________________________________________________ DEDICATÓRIA AGRADECIME'TOS Í'DICE SUMARIO LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS RESUMO ABSTRACT CAPITULO 1 – I'TRODUÇÃO ............................................................................................1 1.1. Apresentação........................................................................................................................1 1.2. História do setor industrial de couro e calçado em Franca................................................3 1.3. Fontes, ciclos e usos do cromo ...........................................................................................7 1.4. Aspectos patológicos devido ao consumo de cromo ...........................................................8 1.5. Distribuição geoquímica de cromo em sedimentos de rio ................................................11 1.2. Métodos de datação...........................................................................................................12 1.2.1. Métodos dos radiométricos......................................................................................12 1.2.2. O 210 Pb como traçador geocronológico ...............................................................14 1.2.3. Deposição de 210 Pb em sedimentos ........................................................................15 1.6.4. Modelos para a determinação da taxa de sedimentação utilizando o 210 Pb...........16 1.6.4.1. Concentração Inicial Constante – CIC.........................................................17 1.6.4.2. Taxa de Suprimento Constante – CRS...........................................................18 CAPITULO 2 – OBJETIVOS ...............................................................................................21 2.1. Justificativas ......................................................................................................................21 CAPITULO 3 – LOCALIZAÇÃO E ASPECTOS GERAIS DA ÁREA DE ESTUDO...23 3.1. Localização e acesso..........................................................................................................23 3.2. Aspectos geológicos...........................................................................................................23 3.3. Clima e vegetação............................................................................................................. 26 3.4. Hidrografia........................................................................................................................27 CAPITULO 4 – MATERIAIS E MÉTODOS......................................................................30 4.1. Coleta das amostras de água, sedimento e tratamento em laboratório............................30 4.2. Caracterização das águas..................................................................................................37 4.2.1. Determinação dos parâmetros físicos e químicos das águas..................................37 4.3. Caracterização dos sedimentos.........................................................................................37 4.3.1. Determinação dos principais óxidos nos sedimentos .............................................37 4.3.2. Determinação do teor de matéria orgânica.............................................................37 4.3.3. Determinação da granulometria em sedimentos.....................................................38 4.3.4. Determinação do 210 Po nos sedimentos por espectrometria alfa...........................38 4.3.5. Determinação do 238 U nos sedimentos por espectrometria alfa..............................41 4.3.6. Espectrometria alfa .................................................................................................46 4.3.7. Determinação da concentração do cromo nos sedimento.......................................49 CAPITULO 5 – RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................50 5.1. Análises das águas ............................................................................................................50 5.1.1. Concentração de cromo e parâmetros físicos e químicos nas águas......................50 5.2. Análises dos sedimentos.....................................................................................................57 5.2.1. Principais óxidos ....................................................................................................57 5.2.2. Matéria orgânica e relação com o cromo...............................................................61 5.2.3. Granulometria e relação com o cromo....................................................................63 5.2.4. O 210 Pb presente nos sedimentos.............................................................................65 5.2.5. O 238 U presente nos sedimentos...............................................................................66 5.2.6. Taxa de Sedimentação mediante o método do 210 Pb...............................................71 5.2.7. Distribuição de cromo e o tempo de deposição nos sedimentos.............................80 CAPITULO 6 – CO'CLUSÕES...........................................................................................86 REFERÊ'CIAS......................................................................................................................88 APÊ'DICE ...........................................................................................................................101 LISTA DE FIGURAS ___________________________________________________________________ Figura 1 – Ciclo do cromo no solo e na água (adaptado de Nriagu & Nieboer, 1988)..............8 Figura 2 – Esquema de decaimento das séries naturais do Urânio e Tório (Ivanovich & Harmon, 1992)..........................................................................................................................15 Figura 3 – Dinâmica do 210Pb no meio ambiente (Lima, 1996)...............................................16 Figura 4 – Esquema do modelo CIC........................................................................................18 Figura 5 – Esquema do modelo CRS.......................................................................................19 Figura 6 – Mapa de localização da área de estudo. Ribeirão dos Bagres na região de Franca (SP)............................................................................................................................................24 Figura 7 – Mapa geológico da região de Franca (SP)..............................................................26 Figura 8 – Localização mais detalhada dos pontos de coleta. Pontos RX1, RX3, RX5 e RX6 no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)........................................................................31 Figura 9 – Ponto RX1, nascente do Ribeirão dos Bagres no Jardim Ribeira, região de Franca (SP)............................................................................................................................................32 Figura 10 – Ponto RX3, próximo ao distrito industrial de curtume e calçado, região de Franca (SP)............................................................................................................................................33 Figura 11 – Ponto RX5, a 600 metros da estação de tratamento de esgoto (ETE), região de Franca (SP)................................................................................................................................33 Figura 12 – Ponto RX6, próximo à descarga no rio Sapucaí, região de Franca (SP)..............34 Figura 13 – Aspectos da coleta de sedimentos no Ribeirão dos Bagres: (a) introdução do tubo de coleta; (b) Retirada do testemunho coletado para as análises..............................................34 Figura 14 – Coleta de amostra de água para analises química dos pontos RX1, RX3, RX5 e RX6 no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)................................................................35 Figura 15 – Medição ″in situ″ do pH e temperatura nas amostras de água utilizando DIGIMED DM-2.......................................................................................................................35 Figura 16 – Tratamento das amostras de sedimentos em laboratório: (a) amostragem em intervalos de 3x3 cm; (b) homogenização e quarteamento das amostras; (c) condicionamento das alíquotas em sacos plásticos; (d) secagem e moagem das amostras para análise........................................................................................................................................36 Figura 17 – Série do 238U: do 210Pb ao 210Po, com indicação das meias vidas dos radionuclídeos e as energias das partículas beta e alfa emitidas (Baskaran et al., 1995- 1996).........................................................................................................................................39 Figura 18 – Diagrama esquematizado em três fases para obter o 210Po nas amostras de sedimentos do Ribeirão dos Bagres, Franca (SP).....................................................................40 Figura 19 – Diagrama esquematizado das fases para obter o 238U nas amostras de sedimentos do Ribeirão dos Bagres, Franca (SP)........................................................................................42 Figura 20 – Béqueres com as amostras de sedimentos na chapa.............................................43 Figura 21 – Colunas de troca iônica onde foram realizadas as separações dos isótopos de U44 Figura 22 – Eletrodeposição de Urânio: (a) célula de eletrodeposição, (b) solução final dentro da célula de eletrodeposição (c) célula de eletrodeposição ligada à fonte estabilizada, Modelo TCA...........................................................................................................................................45 Figura 23 – Amostras de U eletrodepositados em disco de aço inoxidável.............................46 Figura 24 – Espectrômetro alfa utilizado para as medidas dos isótopos nas amostras de sedimento..................................................................................................................................49 Figura 25 – Diagrama de Piper das amostras de água nos pontos RX1, RX3, RX5 e RX6 do Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)............................................................................56 Figura 26 – Distribuição da fração argila (triângulos) e silte (losangos) ao longo dos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5 e (d) RX6, coletados no Ribeirão dos Bagres..............................................64 Figura 27 – Variação da atividade 210Pb excesso com a profundidade nas amostras de sedimentos dos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5 e (d) RX6, coletados no Ribeirão dos Bagres........................................................................................................................................71 Figura 28 – Relação da atividade Ln do 210Pb (não produzido) e a massa acumulada nos sedimentos dos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5 e (d) RX6, coletados no Ribeirão dos Bagres........................................................................................................................................74 Figura 29 – Idade das camadas sedimentares ao longo dos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5 e (d) RX6, coletados no Ribeirão dos Bagres...................................................................76 Figura 30 – Tempo de deposição em função da profundidade dos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5, (d) RX6, coletados no Ribeirão dos Bagres, e (e) Densidade demográfica da região de Franca (SP) entre os anos de 1833 e 2010 (FONTE: IBGE, 2008)....................................................................79 Figura 31 – Teores de Cr (ppm) em função ao ano de deposição nos testemunhos (a) RX1, (b) RX3, (c) RX5 e (d) RX6 coletados em 2010 no Ribeirão dos Bagres................................83 Figura A1 – Espectrograma alfa do 210Po extraído da amostra RX3-1 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)..........................................................................................101 Figura A2 – Espectrograma alfa do 210Po extraído da amostra RX3-5 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)..........................................................................................101 Figura A3 – Espectrograma alfa do 210Po extraído da amostra RX5-2 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)..........................................................................................102 Figura A4 – Espectrograma alfa do 210Po extraído da amostra RX6-1 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP)..........................................................................................102 Figura A5 – Espectrograma alfa do U extraído da amostra RX1-3 coletadas no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP).................................................................................................103 Figura A6 – Espectrograma alfa do U extraído da amostra RX3-5 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP).................................................................................................103 Figura A7 – Espectrograma alfa do U extraído da amostra RX5-5 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP).................................................................................................104 Figura A8 – Espectrograma alfa do U extraído da amostra RX6-5 coletada no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP).................................................................................................104 LISTA DE TABELAS ___________________________________________________________________ Tabela 1 – Pontos de coleta dos testemunhos geo-referenciados com GPS (Global Positioning System)...................................................................................................................32 Tabela 2 – Energia, meia-vida e intensidade dos radionuclídeos emissores alfa (Seelmann- Eggebert et al., 1981)................................................................................................................47 Tabela 3 – Parâmetros físicos e químicos das amostras de águas nos pontos RX1, RX3, RX5 e RX6, coletadas em junho de 2010 no Ribeirão dos Bagres...................................................51 Tabela 4 – Valores máximos, mínimos, média, mediana e desvio padrão dos principais óxidos (%) nas amostras de sedimentos dos testemunhos RX1, RX3, RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres..................................................................................................................57 Tabela 5 – Matriz de correlação de Pearson entre os principais óxidos, perda ao fogo (LOI) e matéria orgânica no testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres. Todas as correlações da matriz são significantes em p = 0,05....................................................................................58 Tabela 6 – Matriz de correlação de Pearson entre os principais óxidos, perda ao fogo (LOI) e matéria orgânica no testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres. Todas as correlações da matriz são significantes em p = 0,05....................................................................................58 Tabela 7 – Matriz de correlação de Pearson entre os principais óxidos, perda ao fogo (LOI) e matéria orgânica no testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres. Todas as correlações da matriz são significantes em p = 0,05....................................................................................59 Tabela 8 – Matriz de correlação de Pearson entre os principais óxidos, perda ao fogo (LOI) e matéria orgânica no testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres. Todas as correlações da matriz são significantes em p = 0,05....................................................................................59 Tabela 9 – Concentração da matéria orgânica (MO) nos sedimentos nos testemunhos RX1, RX3, RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres................................................................61 Tabela 10 – Porcentagem máxima e mínima para areia, silte e argila nas amostras de sedimentos nos testemunhos RX1, RX3, Rx5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres........63 Tabela 11 – 210Pb determinado a partir dos resultados das análises de 210Po nos sedimentos dos perfis RX1, RX3, RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres.....................................66 Tabela 12 – Valores de 210Pbtotal, 210Pbproduzido e 210Pbnão produzido a partir dos resultados das análises de 238U nos sedimentos do perfil RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres....................69 Tabela 13 – Valores de 210Pbtotal, 210Pbproduzido e 210Pbnão produzido a partir dos resultados das análises de 238U nos sedimentos do perfil RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres....................69 Tabela 14 – Valores de 210Pbtotal, 210Pbproduzido e 210Pbnão produzido a partir dos resultados das análises de 238U nos sedimentos do perfil RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres....................70 Tabela 15 – Valores de 210Pbtotal, 210Pbproduzido e 210Pbnão produzido a partir dos resultados das análises de 238U nos sedimentos do perfil RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres....................70 Tabela 16 – Parâmetros necessários para a determinação da taxa de sedimentação pelo método do 210Pb nos testemunhos RX1 e RX3 coletados no Ribeirão dos Bagres..................73 Tabela 17 – Parâmetros necessários para a determinação da taxa de sedimentação pelo método do 210Pb nos testemunhos RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres..................74 Tabela 18 – Tempo e ano de deposição de sedimentos nos testemunhos RX1 e RX3 coletados no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................................75 Tabela 19 – Tempo e ano de deposição de sedimentos nos testemunhos RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................................76 Tabela 20 – Teores de Cr total (mg/kg) nas amostras de sedimentos nos testemunhos RX1, RX3, RX5 e RX6 coletados no Ribeirão dos Bagres................................................................81 Tabela 21 – Valores máximos, mínimos, média, mediana e desvio padrão de Cr total (mg/kg) nas amostras de sedimentos de testemunhos coletados no Ribeirão dos Bagres......................82 Tabela A1 – Principais óxidos e LOI (%) presentes nas amostras de sedimentos do testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres.................................................................105 Tabela A2 – Principais óxidos e LOI (%) presentes nas amostras de sedimentos do testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres.................................................................105 Tabela A3 – Principais óxidos e LOI (%) presentes nas amostras de sedimentos do testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres.................................................................105 Tabela A4 – Principais óxidos e LOI (%) presentes nas amostras de sedimentos do testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres.................................................................106 Tabela A5 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o cromo, matéria orgânica, areia, silte, argila, 210Pbtotal e 210Pbexcesso em sedimentos do testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres...............................................................................................................................106 Tabela A6 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o cromo, matéria orgânica, areia, silte, argila, 210Pbtotal e 210Pbexcesso em sedimentos do testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres...............................................................................................................................106 Tabela A7 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o cromo, matéria orgânica, areia, silte, argila, 210Pbtotal e 210Pbexcesso em sedimentos do testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres...............................................................................................................................107 Tabela A8 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o cromo, matéria orgânica, areia, silte, argila, 210Pbtotal e 210Pbexcesso em sedimentos do testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres...............................................................................................................................107 Tabela A9 – Porcentagem de areia média; areia fina e muito fina; silte muito grosso, grosso, médio; silte fino e muito fino e argila nas amostras de sedimentos de testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................107 Tabela A10 – Porcentagem de areia média; areia fina e muito fina; silte muito grosso, grosso, médio; silte fino e muito fino e argila nas amostras de sedimentos de testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................108 Tabela A11 – Porcentagem de areia média; areia fina e muito fina; silte muito grosso, grosso, médio; silte fino e muito fino e argila nas amostras de sedimentos de testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................108 Tabela A12 – Porcentagem de areia média; areia fina e muito fina; silte muito grosso, grosso, médio; silte fino e muito fino e argila nas amostras de sedimentos de testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres.............................................................................................108 Tabela A13 – Resultados das análises de 210Po por espectrometria alfa dos sedimentos do testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................109 Tabela A14 – Resultados das análises de 210Po por espectrometria alfa dos sedimentos do testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................109 Tabela A15 – Resultados das análises de 210Po por espectrometria alfa dos sedimentos do testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................110 Tabela A16 – Resultados das análises de 210Po por espectrometria alfa dos sedimentos do testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................110 Tabela A17 – Concentração de urânio obtida por espectrometria alfa nos sedimentos do testemunho RX1 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................111 Tabela A18 – Concentração de urânio obtida por espectrometria alfa nos sedimentos do testemunho RX3 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................111 Tabela A19 – Concentração de urânio obtida por espectrometria alfa nos sedimentos do testemunho RX5 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................111 Tabela A20 – Concentração de urânio obtida por espectrometria alfa nos sedimentos do testemunho RX6 coletado no Ribeirão dos Bagres, Região de Franca (SP)...........................112 Tabela A21 – Resumo das concentrações de U para o testemunho RX1..............................112 Tabela A22 – Resumo das concentrações de U para o testemunho RX3..............................112 Tabela A23 – Resumo das concentrações de U para o testemunho RX5..............................113 Tabela A24 – Resumo das concentrações de U para o testemunho RX6..............................113 RESUMO ___________________________________________________________________ A produção de couro, principal matéria-prima para a confecção de calçados, traz grandes benefícios econômicos para a região de Franca (SP), que é um importante pólo industrial da cadeia produtiva de couro e considerada também como a “capital do calçado”, contribuindo em grande parte para a comercialização e exportações de couros. A ânsia pela conquista de mercados e pelo lucro rápido tem provocado interesse governamental, especialmente devido às indústrias coureiras que utilizam como base o cromo no processamento do couro, gerando grandes quantidades de resíduos que, muitas vezes, são dispostos de forma inadequada, contribuindo para a deterioração rápida dos recursos hídricos e bióticos do meio ambiente. Neste sentido, o Ribeirão dos Bagres, na região de Franca, Estado de São Paulo, apresenta problemas de contaminação das águas e sedimentos por cromo e, possivelmente, outros metais pesados gerados pelas indústrias de couro localizadas dentro da cidade. O presente estudo objetivou avaliar a cronologia a partir da taxa de sedimentação no Ribeirão dos Bagres, usando o método do 210Pb, de maneira a acompanhar mudanças históricas ocorridas nas concentrações de cromo. Para isso, vários aspectos específicos foram determinados nos sedimentos tais como, concentração de cromo, taxa de sedimentação, a cronologia dos sedimentos, óxidos, matéria orgânica, granulometria e parâmetros físico-químicos das águas. Os resultados mostraram concentração máxima de Cr de 26,25 mg/kg e mínima de 0,83 mg/kg nos sedimentos que estão abaixo da média dos folhelhos mundiais, indicando ausência de aportes antropogênicos na área de estudos. As taxas de sedimentação obtidas com as análises de 210Pb situam-se entre 0,07 e 0,77 g.cm-2.ano-1 e, foram verificados sedimentos mais antigos, com idade de 177 anos e sedimentos mais recentes com idade de 4 anos. Os níveis de matéria orgânica nos sedimentos se mostraram altos quase em todos os testemunhos. A análise dos óxidos mostrou a sílica como o maior constituinte dos sedimentos, sendo as frações finas (silte e argila) predominantes e, mostrou-se particularmente importante no controle de metais totais. Em adição, as análises dos parâmetros físicos e químicos das águas indicaram que a qualidade das águas é boa, estando apta para a agricultura e pecuária. Palavra chave: Ribeirão dos Bagres, sedimentos, cronologia por 210Pb, cromo. ABSTRACT ___________________________________________________________________ The production of leather, the main raw material for making shoes, bring major economic benefits to the region of Franca (SP), which is an important industrial hub in the chain production of leather and also considered as the "shoe capital", contributing largely to the marketing and exports of leather. The lust for conquest of markets and quick profit has caused government interest, especially due to leather industries that use chromium as a base in leather processing, generating large amounts of waste that are often disposed of inappropriately contributing to the rapid deterioration of water resources and biotic environment. In this sense, Ribeirão dos Bagres, in the region of Franca, São Paulo, presents problems of contamination of waters and sediments by Chrome and possibly other heavy metals that are generated by the leather industries located within the city. The objective of the present study was to evaluate the chronology from the sedimentation rate in Ribeirão dos Bagres, using the 210Pb method in order to track historical changes that occurred in the concentrations of chromium. To this end, various specific issues were determined in sediments such as chromium concentration, sedimentation rate chronology of sediments, oxides, organic matter, granulometry and physico-chemical parameters of water. The results showed maximum concentration of Cr in the sediments (26.25 mg / kg) and minimum (0.83 mg / kg) and are below the World’s average for shales, indicating the absence of anthropogenic contributions in the area of study. The sedimentation rates obtained from the analysis of 210Pb are between 0.07 and 0.77 g.cm-2.ano-1, sediments were observed in the oldest age of 177 years and younger sediments at the age of four years. The levels of organic matter in sediments have shown high almost all the witnesses. The analysis showed the oxides of silica as the major constituent of the sediments, the fine fractions (silt and clay) were predominant in sediments and were particularly important in controlling total metals. In addition, the analysis of the physical and chemical parameters of water indicated that water quality is good and is suitable for agriculture and livestock. Keyword: Ribeirão dos Bagres, sediment, 210Pb chronology for, chrome. 1 CAPITULO 1 – I'TRODUÇÃO ___________________________________________________________________ 1.1. APRESE'TAÇÃO As atividades antrópicas vêm causando problemas ambientais no uso do solo e do subsolo, e têm prejudicado também os recursos hídricos devido as atividades industriais, mineração, urbanização desordenada, agricultura, pecuária, construção de barragens visando à geração de hidroeletricidade, uso não controlado de água subterrânea, dentre outras (MACHADO, 1995). Alguns estudos têm demonstrado que ocorre grave contaminação dos sedimentos dos rios e águas próximos de zonas de industrialização e mineração, levando, também, à contaminação dos peixes, consumidos pela população ribeirinha (NRIAGU & PACYNA, 1988; ATSDR, 2000). Os sedimentos marinhos são considerados o último reservatório de grande quantidade de substâncias e elementos eliminados nos corpos de águas costeiras, sobretudo substâncias contaminantes, como compostos clorados e metais pesados. Porém, os sedimentos são ambientes não passivos, onde ocorrem mudanças físicas e químicas, nas quais muitos dos elementos são reciclados e transformados, podendo alguns deles retornar à coluna de água (SUESS, 1980; OLSEN et al., 1982). Dentre as substâncias que ingressam nos corpos de água, os metais pesados constituem um grupo de elementos cuja abundância nos ambientes marinhos tem sido muito estudada, devido à sua toxicidade e por ter origem natural e antropogênica (CHESTER & MURPHY, 1990; GIORDANO et al., 1992; FRENCH, 1993). Se as condições geoquímicas dos sedimentos favorecem a formação de compostos insolúveis, como metais introduzidos por diferentes fontes, antropogênicas ou natural. Isto permite que fique registrada nos sedimentos a história dos processos que aportam essas substâncias (GOLDBERG et al., 1977; BENNINGER et al., 1981). Para avaliar as mudanças de aportes dos metais que ocorrem durante determinado tempo numa zona de deposição, pode-se utilizar um traçador que se associe às partículas sedimentárias e, dependendo da escala de tempo em que isto acontece, podem-se utilizar traçadores radioativos naturais da série do urânio, que originam diferentes radioisótopos com distintas meias-vidas e comportamento geoquímico que permite determinar os fluxos para os 2 sedimentos. Numa escala de 100 ~ 150 anos, o radioisótopo mais utilizado é o 210Pb da série do 238U, que tem uma meia vida de 22,3 anos, sendo o aporte atmosférico a principal fonte. Trata-se de um produto do decaimento do seu precursor, o gás inerte 222Rn (TUREKIAN et al., 1977; BENNINGER, 1978; SALAMANCA, 1993). O 222Rn na atmosfera decai para o 210Pb, o qual é altamente reativo e associa-se rapidamente às partículas, precipitando-se, depois, na superfície. Isso o torna útil para estudos de fluxos de entrada e processos que determinam a distribuição dos elementos reativos nos sedimentos, como os metais pesados, permitindo, assim, estimar as taxas de sedimentação e calcular a idade dos estratos específicos na coluna de sedimentos num determinado tempo equivalentes a 5 - 7 vezes à sua meia vida, isto é, os últimos 120 anos, período no qual foram desenvolvidas as indústrias de muitas áreas urbanas. A região de Franca (SP), nesse panorama, configura-se como um ponto estratégico de contaminação ambiental, pois nela abriga-se um dos mais importantes polos industriais do Brasil, que contém dezenas de fábricas de grande porte responsáveis por emissões de sólidos, líquidos e de gases poluentes no ambiente. Dessas indústrias, a produção de couro e calçados é a principal fonte de contaminação por cromo do sistema local Cultri (2008). O Ribeirão dos Bagres representa um ambiente no qual se conjugaram inumeráveis mudanças ambientais, tais como: alterações na descarga fluvial por influência da variabilidade climática natural, rompimento de barragem e crescimento populacional. O recebimento de efluentes sem nenhum tratamento leva à poluição do Ribeirão dos Bagres que, por sua vez, deságua no Rio Sapucaí, prejudicando dessa forma toda a região norte-nordeste do Estado de São Paulo. Apesar da exposição ao cromo gerado por produtores de couro na cidade de Franca, foram desenvolvidos até o momento poucos estudos relacionados ao impacto ao meio ambiente por parte das indústrias. Dias & Garcia (2002) apresentaram um estudo sobre a caracterização da presença de metais (Cr, Cu, Ni, Pb e Zn) na concentração total em lodos de curtume. Foi verificado que o cromo apresentou fatores de concentração de 749 mg/kg (lodo seco) e isso foi atribuído à detecção de despejos clandestinos efetuados por curtumes localizados no município de Franca. Por outro lado, Pb, Ni, Cu e Zn apresentaram concentrações de 135 mg/kg, 59 mg/kg, 271 mg/kg e 850 mg/kg, respectivamente, não atribuídas a uma fonte específica de contaminação. Martín & Nunes (2007), por exemplo, mostraram resultados sobre efeito adverso de amostras de lodo, oriundo das estações de 3 tratamento de efluentes das cidades de Franca (SP) e Barueri (SP) sobre microcrustáceos de água doce. Dessa forma, até o momento, não foi realizado nenhum tipo de estudo relacionado ao comportamento geoquímico do Cr nos sedimentos, enfocando a evolução histórica de contaminação. Neste trabalho, utiliza-se o 210Pb como traçador dos processos de sedimentação do material particulado para estabelecer a cronologia, método utilizado por Bonotto et al. (2005) e Bonotto & Lima (2006). Paralelamente, estuda-se nos sedimentos a distribuição do cromo pela utilidade de combinarem-se técnicas radiométricas com estudos clássicos de abundância e distribuição de contaminantes (neste caso, metais pesados) para avaliar a contaminação ou não de um metal pesado feito o cromo e seu impacto na área de estudo. Os resultados também contribuem para a formação de uma base de dados para estudos futuros, relacionados a problemas antrópicos que ocorrem em diferentes bacias hidrográficas. 1.2. HISTÓRIA DO SETOR I'DUSTRIAL DE COURO E CALÇADO EM FRA'CA Franca situa-se na região entre os rios Pardo e Grande e foi fundada no início do século XVIII por bandeirantes paulistas. Faz parte da 14ª Região Administrativa do estado, possuindo 328.176 habitantes. Está na região Nordeste do estado, a aproximadamente 400 km da capital paulista. Sua área total é de 609 km², pertencendo à bacia hidrográfica do Sapucaí Mirim/Grande UGRHI 08, constituída por: Rio das canoas, Rio Pouso Alegre, Rio São João e Ribeirão Salgado (CULTRI, 2008). A cidade de Franca um Arranjo Produtivo Local (APL) especializado na produção de calçados masculinos de couro, o que estimulou o surgimento de empresas correlatas. De acordo com Suzigan et al. (2003) e Barbosa (2004), o município constitui um exemplo perfeito de cluster industrial, pois concentra praticamente todo o elo produtivo da manufatura do calçado, reunindo desde o curtimento de couro (principal matéria-prima na confecção de calçados), produção de insumos (adesivos e selantes), componentes (solados e outros) e acessórios para calçado em geral, inclusive para fabricação de tênis e calçado de outros materiais, além do couro. Encontram-se também instaladas importantes fábricas produtoras de máquinas e equipamentos para a fabricação de calçados que surgiram pela necessidade de atendimento dos produtores locais e hoje fornecem seus produtos para outras regiões do país e também para o exterior. Segundo Suzigan et al. (2003), a aglomeração de produtores de calçado, de insumos e de componentes espalhou-se por diversos pequenos municípios vizinhos à Franca, como 4 Restinga, Patrocínio Paulista, Pedregulho, dentre outros. No entanto, Franca possui uma estrutura mais completa. Para a compreensão da importância do cluster coureiro-calçadista na cidade de Franca, será traçado um breve histórico sobre a indústria, sob o prisma de Tosi (1998), que faz uma extensa pesquisa sobre a história econômica da cidade, que permitiu o surgimento e perpetuação do setor industrial do couro e calçado. A origem do setor coureiro, posteriormente calçadista na cidade, tem seu alicerce em princípios do século XX, quando a cultura cafeeira, principal riqueza da região até então, atravessou um período de imenso declínio em virtude de diversas crises de ordem nacional e internacional. O desenvolvimento da atividade pecuária na região de Franca deu-se também mediante o fluxo migratório de habitantes das Minas Gerais frente ao declínio aurífero em fins do século XVIII. Os mineiros passaram a buscar terras férteis para a criação de gado e plantação de lavouras. De acordo com Engler & Guiraldelli (2007), a criação do gado na região de Franca foi de fundamental importância para o surgimento da indústria calçadista na cidade, em função da grande disponibilidade do couro, matéria-prima essencial na produção de calçado. Iniciou-se a partir daí um processo de substituição do café pelo gado na região, especialmente no município de Franca, que apresenta características favoráveis de solo e relevo. Tal fato leva, inclusive, o município a transformar-se em um centro reprodutor de gado reconhecido nacionalmente no início do século passado. Com a introdução do gado, surgem os primeiros trabalhos em couro na cidade - celas de montarias, artefatos de couro e “sapatões”, desenvolvidos pelos tropeiros da região que lidavam com o gado - devido à grande quantidade de matéria-prima disponível. Barbosa (2006) salienta que o surgimento dos curtumes na cidade ocorreu por alguns fatores, tais como o intenso fluxo de couros que transitavam pela “Estrada dos Goiases”, o que proporcionava uma facilidade para obtê-los; a existência de água em abundância em virtude dos diversos rios e córregos que circundam a região; e a forte presença de madeiras ricas em tanino. Isto porque o curtimento de couro realizado inicialmente em Franca utilizava madeiras ricas em tanino, neste caso o barbatimão, que possui em sua casca significativa quantidade desta sustância química. Esta árvore era nativa da flora original do Planalto de Franca e passou a ser largamente explorada por conta da instalação de ferrovias na cidade. Para a construção dos tanques de curtimento, era utilizada a pedra tapiocanga, rica em óxidos de ferro e que 5 atuava como catalisador na solução de curtimento, lavagem dos couros e como fonte energética. A utilização de couro nesta época era ampla, sendo aplicada em estruturas compostas de couro, mobília, vestuário, dentre outras. Segundo Oliveira (2003), o primeiro registro de industrialização da atividade de curtume de couro em Franca foi a partir de 1886, quando o Pe. Alonso Ferreira de Carvalho montou um curtume às margens do córrego Cubatão, com o objetivo de aproveitar o couro vindo com tropeiros de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Em Franca, em 1970, há noticias de instalação de pelo menos três curtumes em processo de mecanização, o que, conforme Barbosa (2007) indica uma tradição do setor na cidade. Profissões relacionadas à atividade coureira em Franca são uma constante há muito tempo. No entanto, as atividades de seleiro, sapateiro e lojas especializadas em selaria e sapataria organizadas na forma de empresas só apareceram nos últimos anos do século XIX. Assim, passou-se do artesanato (apesar não ter ocorrido sua extinção por completo) à implantação de indústrias, importantes no processo de perpetuação da atividade. Atividades ligadas à cadeia produtiva do couro (como calçados, arreios, curtumes, sapateiros, sapatarias, seleiros, selarias) estavam presentes desde 1872 na cidade, quando a principal atividade era o comércio de sal. Em 1901, havia um mercado especializado na venda de produtos utilizados na confecção de calçados, arreios e selas. Nessa época, a atividade de couro e calçado em Franca comparava-se ao trabalho de alfaiates e costureiras modistas, cujas atividades indicavam serem trabalhadores independentes (TOSI, 1998). Em 1911. a produção de calçados de Franca era expressiva, estando assim disposta: 149 botas, 25.696 botinas, 44 sapatos, 11.331 chinelos. De acordo com Tosi (1998), a cidade experimentava um progresso na indústria de couro, com a instalação de fábricas de calçados e indústria deste gênero. Após o ano de 1910, a produção de selas e calçados ultrapassa as fronteiras da cidade, sendo embarcadas na forma de encomendas para outras cidades, constituindo assim um mercado próprio. O aumento dos embarques de couro foi impulsionado pelo processo de industrialização do setor. Até 1904, o curtimento era realizado utilizando-se lascas de barbatimão, cortadas manualmente; com o uso de máquinas de trituras, a produção aumentou. No entanto, com a escassez de matéria-prima para o curtimento (no caso o barbatimão, que estava se extinguindo juntamente com outras espécies de madeiras nobres da região), não houve crescimento da 6 quantidade de couros curtidos, fato que motivou Major Elias da Mota, em 1912, a viajar para o sul e investigar as condições de curtimento com cromo, bem como investigar os equipamentos mais adequados para a realização do processo. Segundo Tosi (1998), em 1913 foi instalada pelo major Elias Mota a primeira indústria de curtume dotada de maquinarias importadas da Alemanha com a aplicação industrial de Cromo no curtimento de couro. O composto utilizado para essa finalidade é o sulfato crômico, Cr2(SO4)3 . xH2O, também denominado sulfato trivalente e conhecido no jargão industrial como sal de cromo (MOTA, 2001). Em 1920, há registros de três curtumes em Franca: Macedo Marx e Cia. ou Curtume Progresso, Pedro Pucci & Sobrinho, com 18 operários, e Elias Motta, conhecido como Curtume Cubatão que nesse ano possuía 81 operários. Já em 1921, foi criada a primeira fábrica de calçado de Franca, a Jaguar. A indústria possuía maquinaria que permitia uma produção diária de 150 pares, empregando 90 operários, sendo 65 trabalhando na confecção de calçado, 25 na selaria, 5 no balcão e 3 no escritório. Na década de 1940, Franca tinha como principal indústria a de transformação de couros, e em segundo lugar a indústria de calçado e selas. As indústrias de curtumes no ano de 1939 tinham uma produção de 1.464 peles por semana, com forte tendência de aumento, principalmente destinada à exportação (TOSI, 1998). Após 1945, as fábricas relacionadas à confecção de calçado foram surgindo em Franca, como insumos – saltos, soldados vulcanizados em borracha, máquinas – solidificando assim o cluster coureiro-calçadista na cidade. A região de Franca converteu-se em uma referência na indústria de calçado desde a década de 1970, quando o município já abrigava cerca de 280 a 300 empresas do setor calçadista e derivados de couro. Esse número cresceu a cada decênio, até que nas décadas de 1980 e 1990 já haviam se instalado na cidade em torno de 450 a 500 empresas, gerando uma mão-de-obra de aproximadamente 20 mil trabalhadores, como afirma o SindiFranca (2008). Atualmente, de acordo com o mais recente cadastro geral de empregados e desempregados do Ministério de Trabalho (CAGED, 2008), Franca possui aproximadamente 28.000 empregos formais derivados de 760 indústrias de calçado, como aponta o último censo da indústria de calçado de Franca, de 2005, realizado pela UNICACEF/IPES. 7 Atualmente, a maioria dessas indústrias encontra-se no Distrito Industrial, localizado na zona oeste da cidade, mas também há indústrias situadas em todo o sítio urbano do município. 1.3. FO'TES, CICLOS E USOS DO CROMO O cromo é um metal de transição, que não ocorre livremente na natureza, mas na forma de seus compostos, podendo ser tóxico para o ser humano dependendo da sua forma de oxidação. Nestes processos ou fontes de contaminação, o cromo aparece nas formas trivalente, hexavalente e elementar. As fontes naturais de contaminação ambiental são por meio dos incêndios florestais e as erupções vulcânicas. O elevado conteúdo desse metal no ambiente tem origem nas atividades antropogênicas, como as indústrias de cromagem, a mineração, fabricação de cimento, fundições, indústria de galvanoplastia, fertilizantes, lixo urbano e industrial (curtimento de couro) para confecção de bens de consumo (WHO, 1988; ATSDR, 2000; HSDB, 2000). O cromo é usado principalmente na fabricação de aços inoxidáveis, estruturas de construção civil e ligas metálicas, que contêm normalmente um teor mínimo de 12 % do metal. O cromo concede a estes materiais uma resistência à corrosão, aumento significativo da dureza da camada e resistência ao atrito e ao desgaste (GIANNETTI et al., 2001). Ele é usado em grande escala para a transformação de peles de animais em um produto resistente à biodegradação: o couro. O composto usado nesse processo é o sulfato de cromo III – Cr2(SO4). x H2O – também denominado sulfato trivalente e conhecido no jargão industrial como sal de cromo (MOTA, 2001). O composto promove o enrijecimento da pele, garantindo a preservação do produto final. Cabe ressaltar que a legislação brasileira impõe uma série de regras rigorosas aos projetos industriais que utilizam esse elemento. O processo de contaminação pode ser descrito através de um ciclo, iniciado quando o cromo ou seus compostos são lançados por processos industriais para corpos de água ou para a atmosfera, podendo sofrer transformações que contaminam ou não os meios (ar, água e solo). A oxidação e a redução do cromo constituem um processo cíclico. O ciclo completo do cromo (Figura 1) é termodinamicamente estável em um sistema em equilíbrio com o ar e com a água é menos estável. Isso nos leva a fazer suposições a respeito do comportamento desse elemento no solo. O ânion HCrO4 - (Cr6+) é temporariamente retirado do ciclo, provavelmente em forma reduzida (NRIAGU & NIEBOER, 1988). Esse íon é reduzido num processo 8 conhecido como decromificação, análogo à denitrificação, que é a parte mais importante do ciclo do nitrogênio. Tal redução do Cr6+ é realizada pelo carbono, por meio da fotossíntese. Após a redução do cromo VI, o cromo III formado reage com diversos ligantes que podem torná-lo não reativo. Ligantes móveis, como o citrato, complexam o cromo III e o unem ao óxido de manganês da superfície do solo, local em que o cromo e citrato são oxidados. Também é possível a oxidação pelo oxigênio do ar sob a radiação UV. Quando os ligantes orgânicos estão presentes em excesso em relação ao cromo III, estes compostos orgânicos tendem a induzir a reação inversa de MnO2, ligando o íon Mn 3+. Esse íon pode prevenir a formação de cromo VI ou reduzi-lo assim que ele se forma, acelerando a rotação do ciclo (BARTLETT, 1986; NRIAGU & NIEBOER, 1988). FIGURA 1 – Ciclo do cromo no solo e na água (adaptação de NRIAGU & NIEBOER, 1988). 1.4. ASPECTOS PATOLÓGICOS DEVIDO AO CO'SUMO DE CROMO O cromo é um elemento químico identificado como essencial à nutrição humana; uma ingestão diária abaixo do nível determinado leva a sintomas de deficiência. Embora esteja presente nos organismos em pequenas quantidades, contribui para a realização de importantes funções, particularmente no metabolismo da glicose (MERTZ, 1969). No entanto, quando em concentrações elevadas e, sobretudo em estado de oxidação diferente de III, é potencialmente perigoso à saúde e ao equilíbrio ambiental (NRIAGU & NIEBOER, 1988). O estabelecimento de limites ambientais gerais está de acordo com as concentrações que se tem verificado nas várias partes do mundo, e com os quais não se tem detectado efeitos na 9 saúde da população exposta. Diferente dos limites ocupacionais, que tem sido objeto de frequentes estudos de diferente natureza e de constantes avaliações, os limites ambientais gerais necessitam de maiores avaliações. Com o tempo, estes limites poderão sofrer modificações importantes devido a novas descobertas ou a mudanças nas condições em que hoje se apresenta o cromo. Tem-se para ar urbano a concentração limite máxima de 50 ng/m3; para água de rios, 10 µ/m3; água de oceanos, 5 µg/m3; água potável, 0,05 mg/L; solo, 125 mg/kg em média, podendo aumentar a até 250 mg/kg (não existe um limite preciso), e, por alimentos, a ingestão diária não deve exceder de 0,03 – 0,1 mg/dia. Uma ideia da diferença de toxicidade existente entre o Cr (VI) e Cr (III) é dada pela comparação entre os vários valores de dose referencial de exposição oral crônica (RfD – Referência Dose for Chronic Oral Exposure), apresentados pela United States Environmental Protection Agency (USEPA) em seu Sistema Integrado de Informação de Risco (IRIS), onde se encontra cromo hexavalente, com 0,005 mg.kg-1.dia-1, e cromo trivalente, com 1,000 mg.kg-1.dia-1. O homem pode ser exposto ao cromo por via respiratória e por via digestiva, ou, ainda, por meio do contato com a pele. Os níveis de cromo no ar e na água são geralmente baixos. A concentração total de cromo no ar varia entre 0,01 a 0,03 µg/m3. Os fatores que contribuem para alterar a saúde por meio da exposição ao cromo são dose, isto é, a quanto uma pessoa será exposta; a duração, ou seja, durante quanto tempo estiver e de que maneira estiver exposta. Deve-se levar em consideração a idade da pessoa exposta, o sexo, sua dieta alimentar, o estilo de vida e seu histórico de saúde. Apesar dos efeitos negativos em altas doses, o cromo III é considerado essencial para alguns seres vivos. O cromo trivalente faz parte de pequenas biomoléculas que se encontram em pequenas quantidades no organismo do homem. Ele parece ser necessário para o metabolismo da glicose e lipídeos. Também parece ser importante para a utilização de aminoácidos em muitos sistemas, além de ser necessário na prevenção de diabetes e arteriosclerose em seres humanos. Tem-se observado que alguns complexos de cromo parecem atuar de modo a potencializar a ação da insulina, sendo por isso denominado de “fator de tolerância à glicose”. A ausência de cromo III gera uma intolerância à glicose, resultando no aparecimento de diversos distúrbios. Porém, ainda não se pode explicar com segurança como ele atua. A inalação de cromo (III) não causa irritação no nariz ou na boca na maioria das pessoas. Estima-se em 305.000 o número de pessoas expostas ocupacionalmente ao cromo e a 10 seus compostos nos EUA, em seus locais de trabalho. Ainda que a exposição tenha cessado há muito tempo, é possível a ocorrência de câncer no pulmão. A ingestão de cromo, acidental ou não, provoca fortes dores abdominais, vômito, necrose tubular aguda e danos aos rins e ao fígado, hemorragia e até a morte (ATSDR, 2000). A OSHA estima que há aproximadamente 558.000 expostos ao Cr (VI), dos quais 352.000 expostos acima do nível de ação, que é de 2,5 µg/m3 , e 68.000 acima do limite PEL – Permissible Exposure Limit. A concentração de cromo (III) em água potável é em torno de ppb (partes por bilhão). O cromo (III) está presente nos vegetais frescos, frutas, carnes, fermentos e grãos. Alimentos ácidos em contato com aço inox ou panelas de cozimento com altos níveis de cromo podem provocar o desgaste do aço inox. O nível de cromo no solo pode aumentar devido ao despejo das indústrias têxteis, de pigmentos, curtume de couro, de eletrodeposição e por meio de partículas liberadas da cinza do carvão (ATSDR, 2000). O cromo hexavalente está classificado pela Agency for Toxic Substance and Disease Registry (ATSDR, 2005) em 16° lugar na lista dos maiores contaminantes de interesse ambiental. Segundo o Boletim mensal da Comissão Interna de Segurança Química do IBILCE, o cromo VI penetra facilmente nas membranas biológicas, formando complexos com o ADN, tendo ainda potencial ação oxidante sobre o mesmo. Ele altera a função das enzimas e os parâmetros químicos do sangue, diminui a resistência a agentes patógenos, causa alterações de comportamento e perda de apetite. Inalado em altas concentrações, maiores que 2 µg/m3, o cromo hexavalente pode causar irritação no nariz, coriza, espirros, coceira, sangramento, ulcerações e ruptura do septo nasal. Esses sintomas podem ocorrer com trabalhadores expostos ao cromo (VI) durante meses ou anos. Exposição por um longo período tem sido associada ao câncer de pulmão em trabalhadores que estiveram sujeitos a níveis de concentração do ar de 100 a 1.000 vezes maior do que encontrado no ambiente natural (GALVÃO & COREY, 1987). A literatura mostra acidentes ocorridos com compostos de cromo; um dos primeiros relatos foi no Reino Unido em 1979, onde 1463 pessoas foram contaminadas pela liberação de trióxido de cromo sólido por parte do transporte de container. Além desse caso, ocorreram outros acidentes ambientais e industriais, havendo casos relatados de pessoas que ingeriram alimentos contaminados ou beberam água contaminada com compostos de cromo, ou mesmo de incidentes com ingestão de soluções de cromo. Conforme (ATSDR, 2000), é relatado um caso de óbito de um jovem de 14 anos de idade após a ingestão de 7,5 mg/kg de dicromato de potássio. Antes do óbito, a vítima apresentou fortes dores abdominais e vômito. Alto nível de 11 enzimas hepáticas foi encontrado no soro após 24 horas da ingestão, e um exame pós-morte mostrou necrose de fígado e rins, além de edema renal. Outro acidente com bastante repercussão foi o caso de duas pessoas que ingeriram aveia contaminada com dicromato de potássio e apresentaram sinais e sintomas agudos de intoxicação, como dores abdominais, vômitos e diarreia (ATSDR, 2000). No Brasil, atualmente as áreas mais atingidas são os locais onde se realiza o curtimento de couro (fábricas de curtume), prejudicando principalmente os rios e estuários. Estudos epidemiológicos demonstraram que trabalhadores de indústrias de produção de cromato têm uma maior predisposição ao desenvolvimento de câncer de pulmão. No Japão e nos Estados Unidos foi relatado um alto índice de câncer sinonasal em trabalhadores de indústrias de produtos primários de cromato (ROJAS et al., 1999). No Brasil, uma fatalidade, não muito divulgada por sua gravidade, confirma a utilização de insumos tóxicos que são prejudiciais à saúde humana na fabricação de couro. Em setembro de 2005, dois trabalhadores morreram asfixiados quando limpavam um tanque de um curtume desativado em Patrocínio Paulista (cidade próxima a Franca). Outros dois trabalhadores ficaram internados por vários dias na santa casa de Franca. Laudos da CETESB apontou que havia cromo e sulfeto nos tanques, material com alto poder de poluição. Isto comprova que os curtumes utilizam produtos perigosos e que podem causar a morte de pessoas dependendo de sua utilização. Além do homem, plantas e animais aquáticos e terrestres uma vez expostos ao cromo apresentam distúrbios nos processos metabólicos. Desta forma, a espécie do metal e sua concentração devem ser observadas para que não ocorra deficiência ou intoxicação. (CETESB, 1990). 1.5. DISTRIBUIÇÃO GEOQUÍMICA DE CROMO EM SEDIME'TOS DE RIO A contaminação de um ambiente aquático por emissões de elementos-traço pode ser monitorada por teores nas águas no material particulado (em suspensão) e nos sedimentos. Na prática, a determinação dos teores de metais contaminantes nas águas fornece resultados não tão precisos devido às mudanças nos fluxos de emissão, que provocam fortes oscilações nesses teores. A maioria do cromo em águas superficiais pode estar na forma de material particulado, ou depositado nos sedimentos. Algumas partículas podem permanecer como matéria suspensa e posteriormente serem depositadas nos sedimentos. A maioria dos compostos solúveis de cromo em água superficial pode estar presente na forma cromo hexavalente, e uma pequena parte na forma cromo (III) em complexos orgânicos. O cromo hexavalente pode, entretanto, ser 12 reduzidos a cromo (III) por matérias orgânicas presentes na água, podendo, eventualmente, depositar-se nos sedimentos (HSDB, 2000). O sedimento é um meio semissólido formado por minerais, água intersticial e uma mistura de compostos físico-químicos e biológicos, estruturados em macro e micro ambientes, muitas vezes interligados. Vivendo em diferentes profundidades, bilhões de bactérias são encontradas em cada grama de sedimento, metabolizando e reciclando ácidos orgânicos, nitrogênio, metano e compostos orgânicos. Sedimentos contendo determinadas concentrações de matéria orgânica concentram produtos altamente tóxicos, como amônia e sulfetos de hidrogênio (BURTON & MACPHERSON, 1995). O sedimento é um dos compartimentos mais importantes dos ecossistemas aquáticos utilizados na avaliação do nível de contaminação dos ecossistemas aquáticos continentais pois nele podem ser acumulados compostos orgânicos e/ou inorgânicos como metais-traço, algumas vezes em concentrações elevadas (ESTEVES, 1998). Conforme Esteves (1988), os sedimentos, principalmente suas frações granulométricas mais finas, constituem indicadores de contaminação dos ambientes aquáticos por metais-traço. Na contaminação de sistemas aquáticos, a quase totalidade de metais-traço, entre 90 – 99 %, é encontrada nos sedimentos de corrente, nos quais peixes, invertebrados e plantas acumulam menos de 1 % do total que contamina o sistema. Os sedimentos apresentam então um quadro real de contaminação em comparação às águas que, devido às variações de fluxo, apresentam concentrações variáveis. Os metais-traço estão ligados de forma predominante ao material particulado em suspensão, precipitando nos sedimentos (FÖRSTNER & MULLER, 1974; FÖRSTNER & PATCHINEELAM, 1976; HAKANSON, 1980; FÖRSTNER & WITTMAN, 1983). 1.6. MÉTODOS DE DATAÇÃO 1.6.1. Métodos radiométricos A aplicação de métodos radiométricos para geocronologia sedimentar tem mostrado considerável sucesso (RITCHIE et al., 1973; LIVINGSTONE & CAMBRAY, 1978; DURHAM & JOSHI, 1980). Destaca-se o uso dos radionuclídeos naturais 210Pb, 32Si e 55Fe, estes dois últimos cosmogênicos e do radionuclídeo antropogênico 137Cs. Para datar sedimentos recentes de lagos de água doce, foi verificado que o 210Pb é ideal para datar 13 sedimentos lacustres com idades de cerca de 100 anos, e que o 137Cs é útil para identificar sedimentos acumulados durante o período 1963-1964 (KRISHNASWAMI et al., 1971). Posteriormente, Koide et al. (1972, 1973) verificaram a validade do método do 210Pb para determinar taxas de sedimentação em lagos e baías para períodos, variando de alguns anos a um século. O uso combinado do 210Pb natural e 137Cs antropogênico foi feito por Robbins & Edgington (1975) no lago Michigan, tendo aqueles autores concluído que a mobilidade de ambos radionuclídeos nos sedimentos é pequena, e constatado que as medidas das taxas de sedimentação estavam concordantes com aquelas derivadas de métodos mais laboriosos e estabelecidos como os métodos palinológicos e estratigráficos. Em outro estudo, Robbins et al. (1978) usaram pólen (gramíneas marinhas) de Ambrosia para estimar taxas de sedimentação dos lagos Ontário e Erie, e observaram que, dentro dos erros experimentais, as taxas obtidas estavam concordantes com aquelas obtidas usando o método do 210Pb e 137Cs. Também, Edgington et al. (1991) usaram o 210Pb e o 137Cs para estimar taxas de sedimentação recente no lago Baikal; em adição, seus resultados proveram informação sobre a data de eventos paleolimnológicos, existência de diferentes zonas deposicionais no lago e desenvolvimento de modelos de balanço de massa para sedimentos e contaminantes. Hermanson (1990), Edgington et al. (1991), Baskaran et al. (1995, 1996) e Kumar et al. (1999) usaram esses dois métodos para estimar taxas de sedimentação recente em ambientes diversos como lagos, baías e plataformas continentais. Kirchner & Ehlers (1998) aplicaram os métodos combinados do 210Pb e 137Cs para obter informações sobre sedimentação num ambiente costeiro sujeito a processos de erosão, perda de sedimentos e deposição de material. Com tudo isso, os radionuclídeos naturais e antropogênicos têm sido largamente usados em estudos ambientais nas últimas duas décadas, como cronômetros em processos de sedimentação marinha e lacustre, também como traçador para suprir informações sobre os caminhos seguidos por metais em ambientes aquosos. Pode-se dizer que a grande maioria destes trabalhos foi realizada no hemisfério norte, devido ao ápice das explosões nucleares (1963) e ao acidente de Chernobyl (1986), para que estes radioisótopos fossem usados como traçadores geocronológicos. 1.6.2. O 210Pb como traçador geocronológico 14 Os radionuclídeos naturais e antropogênicos transportados pela atmosfera, como o 210Pb, 137Cs, 239Pu, 240Pu e 7Be, são usados como traçadores de processos ocorridos em ambientes marinhos e lacustres, numa escala de tempo de uns poucos anos a algumas décadas. Os diferentes comportamentos geoquímicos desses radionuclídeos em sistemas aquosos tornam essa série de traçadores uma ferramenta valiosa para investigar tanto movimentos de massas de água como também a intensidade de remoção dos metais reativos em corpos de água (BUESSELER & SHOLKOVITZ, 1978; SANTSCHI et al., 1980; LIVINGSTONE et al., 1984; CARPENTER et al., 1987). Dentre estes radionuclídeos, o 210Pb tem tido um uso crescente como traçador para determinar taxas de sedimentação de sistemas deposicionais marinhos, lacustres e fluviais, como também de taxas de deposição de neve em regiões polares, em períodos de tempo da ordem de um século (KOIDE et al., 1973; ROBBINS & EDGINGTON, 1975; CHANTON et al., 1983; CARVALHO & RAMOS, 1990; YU et al., 1995; BASKARAN et al., 1995 - 1996), e para estudar o destino de metais poluentes em áreas costeiras (BASKARAN et al., 1997). O 210Pb é um radionuclídeo natural que possui uma meia vida de 22,26 anos, e pertence à série de decaimento radioativo do 238U (Figura 2). O 210Pb é largamente utilizado para determinar a idade das camadas sedimentares e a taxa de sedimentação dos últimos 100-150 anos em rios, lagos, baías e estuários em testemunhos de sedimentos, períodos no qual ocorreram grandes mudanças ambientais por consequência da urbanização e industrialização (RUIZ-FERNANDES et al., 2007). FIGURA 2 – Esquema de decaimento das séries naturais do Urânio e do Tório (IVANOVICH & HARMON, 1992). 15 1.6.3. Deposição de 210Pb em sedimentos O 238U presente nas rochas, depois de uma série de decaimentos, forma o 226Ra, um radioisótopo cuja meia-vida é de 1622 anos, e que, ao emitir uma partícula alfa, decai para o 222Rn, também um radioisótopo cuja meia-vida é de 3,8 dias (APPLEBY & OLDFIELD, 1978). Como o 222Rn é um gás, parte dele consegue se difundir por entre os poros da rocha e escapar para atmosfera, onde, depois de uma série de decaimentos, forma o 210Pb de meia- vida relativamente longa (22,26 anos). Este 210Pb formado é então absorvido pelas partículas em suspensão no ar e removido da atmosfera através de deposição seca ou úmida. Uma vez alcançando a superfície da Terra, o 210Pb é transportado pelo escoamento superficial para os rios e lagos e é depositado nos sedimentos de fundo. O 210Pb presente nos sedimentos e proveniente da deposição atmosférica é chamado de 210Pb em excesso, não suportado ou não produzido (ALVAREZ-IGLESIAS et al., 2007). Porém, além do 210Pb não produzido, os sedimentos também possuem uma concentração de atividade proveniente do 210Pb formado 16 por conta do decaimento do 226Ra presente nos sedimentos, chamado de 210Pb suportado ou produzido. Como o 226Ra tem uma meia-vida muito maior que de seus filhos, o 226Ra encontra-se em equilíbrio secular com eles, o que permite a determinação da concentração de atividade do 210Pb produzido (REINIKAINEM et al., 1997). Como os modelos utilizados para determinar a taxa de sedimentação de ambientes aquáticos levam em conta apenas o 210Pb em excesso, ele pode ser determinado através da diferença entre a concentração de atividade total de 210Pb e a concentração de atividade do 210Pb suportado presente nos sedimentos (Figura 3). FIGURA 3 – Dinâmica do 210Pb no meio ambiente (LIMA, 1996). 17 1.6.4. Modelos para a determinação da taxa de sedimentação utilizando o 210Pb O 210Pb é o principal método de avaliação da dinâmica de sedimentação moderna (KOIDE et al., 1972, 1973; GOLDBERG & BRULAND, 1974; ROBBINS, 1978; GOLDBERG et al., 1978;). Porém, observações indicam que a grande maioria dos perfis de 210Pb não se enquadra às suposições requeridas pelo método de datação. Por exemplo, a migração de sedimentos pode afetar profundamente a distribuição de radioisótopos em ambientes onde a quantidade de testemunhos é relativamente baixa e os sedimentos presentes estão bastante misturados. Além disso, variações intrínsecas na determinação da atividade de 210Pb nos sedimentos ocorrem em resposta à natureza do próprio processo de sedimentação, que é afetada por mudanças na composição do sedimento e variações na taxa de sedimentação de acordo com o clima (KRISHASWANI et al., 1980; OLSEN et al., 1981; DeMASTER & COCHRAN, 1982; NITTROUER et al., 1983, 1984; GARDNER et al., 1987). Para corrigir as dificuldades que apresenta o método cronológico de 210Pb, vários modelos foram inicialmente utilizados na interpretação de dados de perfis. Estes modelos empíricos predizem os efeitos de sedimentação e a causa de distribuição de 210Pb, resolvendo explicitamente a taxa de sedimentação por uma equação que descreve a distribuição de 210Pb (GOLDBERG & KOIDE, 1962; GOLDBERG, 1963; APPLEBY & OLDFIELD, 1978; ROBBINS, 1978; OFFICER, 1982; CHRISTENSEN, 1982). 1.6.4.1. Concentração Inicial Constante - CIC Este modelo assume que, na escala de tempo estudada, a concentração inicial de 210Pb no sedimento é constante (FAURE, 1986; REINIKAINEN et al., 1997), ou seja, o modelo leva em consideração a concentração de 210Pb em excesso em cada fatia da coluna sedimentar por unidade de massa seca. Este modelo é mais adequado a regiões com uma deposição de sedimentos permanente, sem sofrer interferência de correntes ou movimentos bruscos da lâmina d’água (ROBBINS et al., 1978) Figura 4. A atividade de 210Pb, A(x), varia com o acúmulo de massa seca de sedimento, m, em determinada profundidade de acordo com a equação (1): A(x) = A(0) • e (-λ210 •m/r) (1) 18 FIGURA 4 – Esquema do modelo CIC Onde: A(x) = atividade do 210Pb em excesso na camada sedimentar a ser datada; A(0) = atividade inicial do 210Pb em excesso; m = massa seca acumulada por unidade de área (g/cm2); r = taxa de sedimentação (g/cm2. ano); λ = Constante de decaimento do 210Pb (0,03114 ano-1). 1.6.4.2. Taxa de Suprimento Constante – CRS Este modelo foi desenvolvido inicialmente por Goldberg (1963). Em seguida Robbins (1978) criou o termo Modelo de Fluxo Constante (CF), enquanto que Appleby & Oldfield (1978) o designaram como Modelo de Taxa Constante de fornecimento (CRS). O modelo assume que ocorre ausência de resuspensão do material depositado e um fluxo constante de 210Pb em excesso na interface água-sedimento, independentemente da variação da taxa de sedimentação, ou seja, é estabelecida uma taxa de sedimentação constante ao longo de uma coluna sedimentar de tamanho definido (APPLEBY & OLDFIELD, 1978; ABRIL, 2004; MIZUGAKI et al., 2006) (Figura 5). Este modelo é mais apropriado em regiões de grande interferência nas deposições de sedimentos, no qual há uma distribuição irregular da atividade. O excesso de 210Pb a uma profundidade z de um perfil igualar-se-á ao fluxo (constante) integrado durante o correspondente intervalo de tempo. Considerando a profundidade z, a equação é dada por: A(z) = A(0). e (-λt) (2) 19 FIGURA 5 – Esquema do modelo CRS Onde: A(z) = atividade residual acumulativa do 210Pb” não produzido” nos sedimentos a uma profundidade z; A(0) = atividade total do 210Pb “não produzido” na coluna de sedimentos. A idade dos sedimentos à profundidade z é, então; t = (1/λ) ln [A(0)/A(z)] (3) e a velocidade de sedimentação V é: V = λA(z)/P(z) (4) Onde: P(z) = atividade de 210Pb “não produzido” à profundidade z. 20 CAPÍTULO 2 – OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS ___________________________________________________________________ 2.1. OBJETIVOS GERAIS � Avaliar a cronologia a partir da taxa de sedimentação recente no Ribeirão dos Bagres, usando o método do 210Pb, de maneira a acompanhar mudanças históricas ocorridas nas concentrações de cromo ao longo dos testemunhos. 2.2. ETAPAS DO TRABALHO � Determinar a taxa de sedimentação na área estudada e a cronologia das camadas sedimentares, utilizando o 210Pb em testemunhos amostrados; � Quantificar a concentração do cromo nos testemunhos, visando datar os eventos relacionados com variações dessas concentrações nos últimos 100 anos; � Determinar os parâmetros físico-químicos das águas; 21 � Determinar os principais óxidos nos sedimentos para definir a relação com a geoquímica do cromo; � Quantificar a matéria orgânica, que é um parâmetro importante na mobilização do Cr no perfil dos sedimentos, e; � Determinar a granulometria dos sedimentos. 2.3. JUSTIFICATIVAS O elevado crescimento populacional, além do incremento da quantidade de estabelecimentos industriais e o aumento acentuado de produção, principalmente em relação às indústrias do setor coureiro-calçadista no município de Franca/SP, têm provocado gradativamente maior geração de resíduos sólidos, de esgotos domésticos e impermeabilização do solo, contribuindo para a deterioração da qualidade das águas de abastecimento público. Neste caso, buscou-se avaliar, no Ribeirão dos Bagres, os riscos potenciais causados pelos resíduos tóxicos de modo a fornecer subsídios a políticas públicas. A importância deste projeto está relacionada com a possibilidade de exposição humana a substâncias tóxicas, neste caso o cromo, em áreas contaminadas por processos antropogênicos (processamento de couro). Ademais, o Ribeirão dos Bagres, foco do projeto, recebe efluentes domésticos e de indústrias antes de desaguar no Rio Sapucaí, importante drenagem que se presta ao abastecimento público de diferentes setores de população daquela região. Nesse sentido, tornou-se relevante estudar com mais detalhes a cronologia dos sedimentos do rio e avaliar o comportamento geoquímico do cromo nos sedimentos, visando determinar a taxa de sedimentação, um importante parâmetro descritivo das bacias hidrográficas e que possibilita paralelamente acompanhar a evolução dos níveis de concentração do cromo no sistema aquático. Trata-se de um estudo que contribuirá para avaliar o cenário de manejo de bacias hidrográficas urbanas, incluindo registros desde a época pré-industrial no Brasil até os dias atuais, constituindo-se em uma contribuição pioneira para a área de estudo. A análise conjunta das variáveis propostas em área de conservação totalmente inserida em malha urbana pode ser considerada pioneira para o Brasil e pouco explorada em regiões tropicais. 22 CAPÍTULO 3 – LOCALIZAÇÃO E ASPECTOS GERAIS DA ÁREA DE ESTUDO ________________________________________________________________________ 3.1. LOCALIZAÇÃO E ACESSO A área de estudo compreende o município de Franca, localizado na porção nordeste do estado de São Paulo, mais especificamente o Ribeirão dos Bagres (Figura 6). Franca ocupa uma área de 609 km², sendo 84 km² de área urbana (2002), e está em uma altitude média de 1.040 m (em planalto variando de 760 m a 1.060 m) entre as latitudes 20º30’e 20º35’S e as longitudes 47º22’ e 47º27’W. Faz limite com cidades paulistas como Batatais, Cristais Paulista e Patrocínio Paulista, e divisa com as cidades mineiras de Ibiraci e Claraval. O acesso à área pode ser realizado partindo da cidade de São Paulo pela Rodovia Anhanguera (SP-330) até a cidade de Ribeirão Preto, de onde se segue pela Rodovia Candido Portinari (SP-334) até a cidade de Franca. 23 3.2. ASPECTOS GEOLÓGICOS As unidades geológicas que ocupam a maior parte da região de Franca são as rochas Mesozoicas pertencentes ao Grupo São Bento (rochas sedimentares das formações Pirambóia e Botucatu) e as rochas ígneas basálticas da Formação Serra Geral da Bacia do Paraná. Seguem-se, em termos de área de distribuição, os sedimentos correlacionados à Formação Itaqueri, de idade Cretácica a Terciária, e os sedimentos Quaternários. Duas reduzidas ocorrências de arenitos da Formação Aquidauana (Grupo Tubarão da Bacia do Paraná) são encontradas nos extremos nordeste e sudeste da área. Segundo Almeida et al. (1980), esta porção da Bacia do Paraná sofre forte influência tectônica dos terrenos geológicos localizados no sudeste do estado de Minas Gerais, que apresentam uma evolução tectônica Proterozoica bastante complexa comparada à evolução Fanerozoica da bacia, pois regionalmente ocorrem unidades geotectônicas Pré-Cambrianas em contato direto com uma bacia sedimentar Fanerozoica que, além de possuir um comportamento ascensional expressivo durante o Mesozoico, com atividades magmáticas gerais, apresentam forte controle estrutural balizado pela atividade Neotectônica durante o Cenozoico. Figura 6 – Mapa de localização da área de estudo. Ribeirão dos Bagres na região de Franca (SP). 24 25 As rochas quartzíticas do Grupo Canastra, consideradas de idade Mesoproterozoica, são as únicas representantes do embasamento cristalino expostas na região, tendo área de ocorrência de pequena expressão na sua porção nordeste (Figura 7). No aspecto geomorfológico, a região de Franca está inserida em sua maior parte na Província Geomorfológica das Cuestas Basálticas e parcialmente na Província do Planalto Ocidental Paulista, segundo a subdivisão geomorfológica do estado de São Paulo proposta por Ponçano et al. (1979) e Almeida (1964), adotada no Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo (IPT, 1981b). Segundo esses autores, a cidade de Franca apresenta um relevo escarpado nos limites com a Depressão Periférica, assim como de uma sucessão de grandes plataformas estruturais, de relevo suavizado, incluídas para o interior, em direção à calha do Rio Paraná. Por outro lado, esta província é classificada por Ross & Moroz (1997) como uma unidade morfoestrutural dos Planaltos Residuais de Franca e de Batatais. Nessa unidade, predominam formas de relevo denudacionais, cujo modelado é constituído por colinas de topos aplanados ou tabulares, com vales pouco entalhados. As altimetrias variam entre 800 m e 1.100 m. Por se tratar de terras altas, circundadas por terras baixas, é um centro disperso de drenagem. Figura 7 – Mapa geológico da região de Franca, São Paulo (IBGE, 2005) 26 3.3. CLIMA E VEGETAÇÃO A região apresenta condições de clima que, de acordo com a classificação de Köeppen (1948), está entre o grupo A (tropical quente) e o grupo C (mesotérmico), com inverno seco e verão chuvoso. O clima é influenciado por três grandes correntes devido ao predomínio de massas de ar marítimas sobre as continentais. Os índices pluviométricos variam entre 1100 mm e 1500 mm, com valores médios de 1370 mm/ano (DAEE, 1974). São observadas duas estações: a úmida, que abrange os meses de outubro a março, e a seca, de abril a outubro. A temperatura média anual é da ordem de 23º C, com intervalos compreendidos entre 13º C e 30º C. Nos meses de dezembro e janeiro, a insolação apresenta valores entre 40% e 56%, e nos meses de julho e agosto, os valores são de 50% a 80% (CETESB, 1980). A vegetação na região de Franca apresentava cobertura vegetal original pertencente aos domínios de Mata Atlântica e de Cerrado nas áreas de contato principalmente entre Savana e Floresta Estacional Semidecidual. A partir de meados do século XIX, houve uma redução significativa dessa vegetação natural devido à expansão da fronteira agrícola, com a introdução da cultura do café na região de mata (solo fértil), à exploração da madeira para uso como lenha ou dormentes ou, ainda, matéria-prima para casas e móveis e, em parte, à pastagem (ABAG-RP, 2006). Ab’Saber (1968) classifica a área de Franca dentro de uma faixa de transição entre o Domínio dos Chapadões Florestados (dominantes no Planalto Ocidental Paulista) e os Chapadões Revestidos de Cerrados (dominantes no Triângulo Mineiro e no sudeste de Goiás), mostrando-se como um “mosaico cerrado-mata”. Esta área é transicional tanto do ponto de vista das formas de relevo como das condições ecológicas do solo, da vegetação e da história do povoamento. O mesmo autor considera a área como um dos remanescentes mais bem preservados dos chapadões do setor norte-oriental da Bacia do Paraná. De acordo com levantamento da ABAG-RP (2006), os tipos de vegetais encontrados na região de Franca são: Cerrado (1267,2 ha), floresta estacional (2262,4 ha), floresta secundária (364,2 ha), vegetação riparia (7266,0 ha) e reflorestamento com eucalipto (33,1 ha), sendo este último praticamente insignificante. 27 3.4. HIDROGRAFIA As regiões/bacias hidrográficas do estado de São Paulo segundo o Sistema de Informação para o Gerenciamento de Recursos Hídricos do estado de São Paulo estão classificadas em: Bacia do Rio Tietê, Região Hidrográfica da Vertente Paulista do Rio Grande, Bacia do Rio Paraíba do Sul, Região Hidrográfica da Vertente Paulista do Rio Paranapanema, Região Hidrográfica Aguapeí/Peixe e Região Hidrográfica de São José dos Dourados; cada uma delas apresenta pequenos afluentes de água (pequenas bacias) (SIGRH, 2006). Tais rios pertencentes às UGRHIs (Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo) constituem unidades territoriais “com dimensões e características que permitem e justifiquem o gerenciamento descentralizado dos recursos hídricos” (art. 20 da Lei Estadual 7663 de 30/12/1991) e, em geral, são formadas por partes de bacias hidrográficas ou por um conjunto delas, que de forma alguma podem ser consideradas como bacias hidrográficas. A região de Franca é bem drenada, cortada a nordeste pelo Rio das Canoas; a norte, pelo Ribeirão do Macaco e do Pouso Alto; a noroeste, pelo Ribeirão do Salgado; a sul, pelo Rio Sapucaí; e ao sudeste, pelo Ribeirão das Macaúbas, sendo que o Rio Sapucaí é o de maior volume de água e, consequentemente, de maior importância da região. Esses rios pertencem à Região Hidrográfica da Vertente Paulista do Rio Paranapanema, a UGRHI-8 (Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos de Sapucaí Mirim/Grande – 8) que apresenta uma área de 9.166 km2 de extensão e localizada no nordeste do estado de São Paulo (Figura 6). O abastecimento de água na UGRHI-8 é de responsabilidade da SABESP, atendendo a uma população de 266.617 habitantes em Franca, além do que é exportado para o município de Restinga e do que é perdido, que correspondem, aproximadamente, a 29%. As grandes partes de água consumidas pela região de Franca provêm do Rio Canoas (porção paulista), maior manancial de abastecimento de água da cidade e das unidades aquíferas como: o Aquífero Superficial (Cobertura Cenozoica), Formação Serra Geral (é o mais importante da região) e o Aquífero Botucatu (porção livre e confinada) (SIGRH, 2006). O Ribeirão dos Bagres, foco de estudo, é considerado como sub-bacia; faz parte da UGRHI-8 e é o principal rio que corta a zona urbana de Franca. Nasce na região do Jardim Riviera (Zona leste), a 1050 m de altitude, e deságua no Rio Sapucaí, no município de 28 Restinga (SP). Em toda sua extensão urbana, o Ribeirão dos Bagres não possui mata nativa; em seu lugar, foi construída uma das avenidas de maior trânsito da cidade, a Marginal dos Bagres (Av. Hélio Palermo, no Alto Bagres; Av. Antonio Barbosa Filho, após o Vale dos Bagres até a região do Galo Branco; Av. das Seringueiras no complexo viário Cubatão/Bagres). O Ribeirão dos Bagres recebe efluentes domésticos e de indústrias antes de desaguar no Rio Sapucaí, importante drenagem que serve de abastecimento público a toda a região norte-nordeste do estado de São Paulo, como os municípios de Franca, São José da Bela Vista, Patrocínio Paulista, Cristais Paulista, Restinga e Batatais. Segundo relatório do IPT (1998), no município de Franca, a maioria das indústrias geradoras de efluentes enquadra-se como indústrias de curtume de couro e fabricação de sapatos. Como grande parte da água consumida em Franca também provém dos aquíferos da região, esta prática de disposição pode comprometer a sua qualidade, tornando-os vulneráveis à contaminação. 29 CAPÍTULO 4 – MATERIAIS E MÉTODOS ___________________________________________________________________ Nesta seção, serão descritos todos os aspectos relacionados aos locais escolhidos para este estudo. Contempla os pontos de coleta de amostras e as descrições dos materiais e métodos empregados na execução das diversas fases analíticas. Para o desenvolvimento desta pesquisa, foram utilizados o LABOGEO – Laboratório de Geoquímica; o LABIDRO – Laboratório de Isótopos e Hidroquímica do Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE) da UNESP – Campus de Rio Claro; o laboratório de Geoquímica da Universidade Federal Fluminense – UFF (Niterói – RJ); e o laboratório do Centro de Estudos Ambientais (CEA) da UNESP. 4.1. COLETA DAS AMOSTRAS DE ÁGUA, SEDIME'TO E TRATAME'TO EM LABORATÓRIO Para a realização deste trabalho, foram coletados quatro testemunhos de sedimentos no Ribeirão dos Bagres em Franca – SP (Figura 8). Os sítios de amostragem compreenderam coletas a montante e a jusante da saída da descarga dos curtumes, sendo: sítios RX1 e RX3 (antes), sítio RX5 (próximo aos curtumes) e sítio RX6 (depois). Estes setores foram escolhidos em função das esperadas anomalias geoquímicas antrópicas em sedimentos, indicadas em trabalhos com problemas ambientais similares por Bonotto et al. (2005) e Bonotto & Lima (2006). Estes pontos de amostragem foram georreferenciados com GPS (Global Positioning System) em coordenadas UTM e marcados com piquete de PVC (Tabela 1) (Figuras 9-12). Pelo menos quatro testemunhos de sedimentos recentes (30 cm de profundidade) foram coletados durante a época de menor índice pluviométrico. Os sedimentos foram coletados com tubos de acrílico (5 cm de diâmetro) previamente lavados e ambientados com água do local de amostragem (Figura 13). As amostras de água foram coletadas nos mesmos pontos de coleta dos sedimentos RX1, RX3, RX5, RX6. Um litro de água de cada local de amostragem foi coletado nas 30 margens do rio, diretamente em garrafas plásticas, previamente lavadas no laboratório e, no próprio local, lavadas com a água do próprio rio. As amostras foram coletadas diretamente na corrente do rio, com a boca da garrafa sempre voltada em direção ao fluxo da água (Figura 14). Para melhor preservação, parte das amostras foi acidificada no próprio local a pH 1 com solução de HNO3, conforme recomendado na literatura (AGUDO, 1987). Na Figura 15 pode-se observar que, para todas as amostras de água, foram determinados os parâmetros físico-químicos (pH e T) em temperatura ambiente, por meio de eletrodos específicos inseridos diretamente na amostra (equipamento DIGIMED DM-2) e adequadamente calibrados. FIGURA 8 – Localização mais detalhada dos pontos de coleta. Pontos RX1, RX3, RX5 e RX6 no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP). 31 TABELA 1 – Pontos de coleta dos testemunhos georreferenciados com GPS (Global Positioning System). Testemunho Coordenadas UTM Identificação RX1 0252559 / 7729096 Nascente RX3 0248270 / 7725150 Antes (Distrito Industrial) RX5 0245803 / 7721567 ETE + 600m RX6 0232180 / 7709239 Descarga (Sapucaí) FIGURA 9 – Ponto RX1, nascente do Ribeirão dos Bagres no Jardim Ribeira, região de Franca (SP). 32 FIGURA 10 – Ponto RX3, antes do distrito industrial de curtume e calçado, região de Franca (SP). 33 FIGURA 11 – Ponto RX5, a 600 metros da estação de tratamento de esgoto (ETE), região de Franca (SP). FIGURA 12 – Ponto RX6, próximo à descarga no rio Sapucaí, região de Franca (SP). 34 FIGURA 13 – Aspectos da coleta de sedimentos no Ribeirão dos Bagres: (a) introdução do tubo de coleta; (b) Retirada do testemunho coletado para as análises. (a) (b) 35 FIGURA 14 – Coleta de amostra de água para análises químicas dos pontos RX1, RX3, RX5 e RX6 no Ribeirão dos Bagres, região de Franca (SP). FIGURA 15 – Medição “in situ” do pH e da temperatura nas amostras de água utilizando DIGIMED DM-2. 36 No laboratório, os tubos com sedimentos amostrados (10-30 cm) foram inicialmente seccionados aproximadamente de 3 cm em 3 cm (totalizando 32 amostras) e acondicionados bem fechados e congelados em bolsas de plástico até futuras análises. Para a determinação da concentração de cromo total, matéria orgânica, 210Po, 238U e dos óxidos, uma porção de cada amostra foi separada e seca em estufa a cerca de 60° C por um período de 24 horas, para preservação da matéria orgânica e minimização da perda de elementos voláteis e, em seguida, pulverizada em moinho (Figura 16). A alíquota da amostra destinada à determinação da granulometria foi apenas congelada até o emprego dos procedimentos em laboratórios da UFF (Niterói-RJ). FIGURA 16 – Tratamento das amostras de sedimentos em laboratório: (a) amostragem em intervalos de 3x3 cm; (b) homogenização e quarteamento das amostras; (c) condicionamento das alíquotas em sacos plásticos; (d) secagem e moagem das amostras para análise. (a) (b) 37 (c) (d) 4.2. CARACTERIZAÇÃO DAS ÁGUAS 4.2.1. Determinação dos parâmetros físicos e químicos das águas Sua realização foi no laboratório do CEA (Centro de Estudos Ambientais) da UNESP. Para as análises químicas das águas, foi usado 1 litro de amostra, aproximadamente. Nessas amostras, foram determinados o pH, a condutividade, os cátions (cálcio Ca2+, magnésio Mg2+, potássio K2+, sódio Na+) e ânions (cloreto Cl-, nitrato NO3 -, sulfato SO4 2-, bicarbonato HCO3 - ). A condutividade foi determinada por potenciometria, o sódio, por espectrometria de absorção atômica, e as concentrações de Cl, K, Ca, Mg, SiO2, nitrato e sulfato, por colorimetria. 4.3. CARACTERIZAÇÃO DOS SEDIME'TOS 4.3.1. Determinação dos principais óxidos nos sedimentos A determinação dos teores dos principais óxidos presentes nos sedimentos foi efetuada no LABOGEO – Laboratório de Geoquímica do Departamento de Petrologia e Metalogenia do IGCE⁄UNESP campus de Rio Claro, mediante a Espectrometria de Fluorescência de Raios X, utilizando um equipamento tipo Philips®, modelo PW2400. Detalhes adicionais na metodologia de análises podem ser encontrados em (VERGOTTI, 2008; NERY, 2009 e SABARIS, 2010). 4.3.2. Determinação do teor de matéria orgânica Os teores de matéria orgânica foram determinados segundo o método titrimétrico de Walkley-Black, (1934). Sua realização foi no LABIDRO – Laboratório de Isótopos e Hidroquímica do Departamento de Petrologia e Metalogenia do IGCE⁄UNESP. Foram usadas, nesse procedimento, amostras secas na estufa (~ 1 g de sedimento total). As alíquotas de sedimentos foram colocadas num frasco de Erlenmeyer. Após a pesagem, às amostras foram adicionados 20 ml de HNO3; depois, foram adicionados 10 ml de dicromato de potássio 1M. Após agitação, foram adicionados 100 ml de água deionizada e, finalmente, 38 realizada a filtragem. Imediatamente depois do procedimento analítico, foram usados 25 ml da solução para quantificar a matéria orgânica mediante o espectrofotômetro tipo Hach®, modelo DR2000, seguindo a metodologia descrita no manual de instruções (HACH, 1992). Os resultados obtidos com essa técnica apresentam boa correlação com os dados obtidos por outras técnicas e.g. via seca – Perda ao fogo Dean (1974), Bengtsson & Enell (1986) e Heiri et al. (2001). É por esse motivo que pode ser empregado como uma estimativa do conteúdo de matéria orgânica. 4.3.3 Determinação da granulometria em sedimentos As análises granulométricas dos sedimentos foram realizadas no Laboratório de Geoquímica do Instituto de Química da UFF, utilizando-se o difrator granulométrico a laser (analisador de partículas granulométricas, modelo Cilas 1064). As amostras de sedimento foram descongeladas, e 5 g de amostras úmidas foram adicionados em uma proveta, sendo pesadas na sequência. Logo após, foi realizado um pré- tratamento das amostras, adicionando peróxido de hidrogênio para remover a matéria orgânica até chegar ao fim da reação. Em seguida, as amostras foram centrifugadas e eliminou-se o sobrenadante. Adicionaram-se 10 ml de um dispersante para desagregar as partículas (hexametafosfato de sódio) em cada proveta e, na sequência, introduzido em um agitador mecânico por 24 horas. Em seguida, adicionou-se água ao material que foi peneirado em malha de 500 µm (limite inferior). Nas amostras processadas neste estudo não foram encontradas partículas maiores que 500 µm, exceto ocasionais fragmentos vegetais. Colocou-se, por fim, a amostra no analisador, e a quantificação das frações granulométricas entre 0,04 e 500 µm foram realizadas pelo fenômeno de difração, que apresenta 100 peneiras virtuais entre as faixas citadas, utilizando-se 10 minutos de sonificação para dispersão da amostra. 4.3.4. Determinação do 210Po nos sedimentos por espectrometria alfa A determinação dos teores de 210Po e 210Pb foi conduzida no LABIDRO – Laboratório de Isótopos e Hidroquímica (IGCE/UNESP). A determinação do 210Pb foi feita através da 39 medida da atividade alfa de seu descendente, o 210Po (ROBBINS & EDGINGTON, 1975; CHANTON et al., 1989; BASKARAN et al., 1995-1996). O 210Pb decai para Bi210 (meia-vida de 5 dias), e este, para 210Po (meia-vida de 138,4 dias) (Figura 17). O equilíbrio radioativo entre esses radionuclídeos é estabelecido em torno de dois anos, de modo que depois desse tempo a atividade 210Po na amostra é equivalente à do 210Pb. FIGURA 17 – Série do 238U: do 210Pb ao 210Po, com indicação das meias- vidas dos radionuclídeos e as energias das partículas beta e alfa emitidas (BASKARAN et al., 1995- 1996). O procedimento de extração do 210Po das amostras de sedimento foi realizado em diferentes fases químicas (Figura 18). Primeira fase – Digestão dos sedimentos Para a digestão dos sedimentos, foi pesado aproximadamente 1 g de cada fração com uso do béquer de teflon. A seguir, foram adicionados 10 ml de água régia. Essas soluções foram mantidas em chapa aquecedora em torno de 100o C por 10 minutos. Após resfriar, a solução foi filtrada num funil de vidro munido de papel de filtro com ajuda de água deionizada até 30 ml aproximadamente. Depois, foi adicionado a cada amostra 0,2 ml do traçador Po-209 (atividade igual a 7,68 dpm, o qual possui uma energia de emissão alfa apropriada à mensuração de 210Po). Em seguida, foram levadas para a chapa aquecedora a uma temperatura de 200° C por 4 horas, aproximadamente, até secagem. Depois de resfriar à temperatura ambiente, foram adicionados 20 ml de HCl 8M. 40 FIGURA 18 – Diagrama esquematizado em três fases para obter o 210Po nas amostras de sedimentos do Ribeirão dos Bagres, Franca (SP). 41 Segunda fase – Extração do Ferro Para extração do Fe3+ existente na solução resultante da primeira fase, foi utilizado um solvente orgânico (30 ml de éter etílico), adicionado a um funil de separação, onde o solvente entrou em contato com a fase inorgânica (solução obtida a partir da digestão dos sedimentos). O ferro é transferido para a fase orgânica, após agitação contínua do funil de separação. Terceira fase – Deposição do polônio nas lâminas de cobre Nesta última fase do procedimento, foi realizada a deposição do polônio em lâminas de cobre onde inicialmente foram adicionados a cada alíquota 5 ml de hidroxilamina cloridrato 20%, e 2 ml de citrato de sódio 25% (JIA et al., 1999), com posterior ajuste do pH a 2 com o uso de peagâmetro (FLYNN, 1968), mediante solução concentrada de hidróxido de amônio (NH4OH). Depois, foi introduzido um disco de cobre na solução de maneira que a face do disco ficasse para cima durante a deposição do polônio. Com ajuda de uma chapa aquecedora sob agitação constante entre 85° C e 90° C, foi realizada a deposição num intervalo de 90 minutos (FLYNN, 1968). Depois desse tempo, o disco foi retirado da solução, lavado com água destilada e seco sob lâmpada de secagem. Uma vez obtido o disco de cobre contendo o polônio-210, foi realizada a quantificação deste elemento mediante o espectrômetro de partículas alfa. 4.3.5. Determinação do 238U nos sedimentos por espectrometria alfa Foi necessário quantificar o 238U e o 234U p