UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "JÚLIO DE MESQUITA FILHO" CAMPUS DE GUARATINGUETÁ BRANDON OLIVEIRA BEZERRA Sistemas exoplanetários Guaratinguetá 2021 Brandon Oliveira Bezerra Sistemas exoplanetários Trabalho de Graduação apresentado ao Conselho de Curso de Graduação em Bacharelado em Física da Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratin- guetá, Universidade Estatual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do diploma de Gradu- ação em Bacharelado em Física. Orientador: Profª Dra. Silvia Maria Giuliatti Winter Guaratinguetá 2021 B574s Bezerra, Brandon Oliveira Sistemas exoplanetários / Brandon Oliveira Bezerra – Guaratinguetá, 2021. 74 f : il. Bibliografia: f. 66-74 Trabalho de Graduação em Física (Bacharelado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, 2021. Orientadora: Profª. Drª. Silvia Maria Giuliatti Winter 1. Exoplanetas. 2. Sistema solar. 3. Astrometria. I. Título. CDU 521.9 Luciana Máximo Bibliotecária CRB-8/3595 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "JÚLIO DE MESQUITA FILHO" CAMPUS DE GUARATINGUETÁ BRANDON OLIVEIRA BEZERRA ESTE TRABALHO DE GRADUAÇÃO FOI JULGADO ADEQUADO COMO PARTE DO REQUISITO PARA A OBTENÇÃO DO DIPLOMA DE "GRADUANDO EM BACHARELADO EM FÍSICA" APROVADO EM SUA FORMA FINAL PELO CONSELHO DE CURSO DE GRADUAÇÃO EM BACHARELADO EM FÍSICA Prof. Dr. JULIO MARNY HOFF DA SILVA Coordenador BANCA EXAMINADORA: Profª Dra. Silvia Maria Giuliatti Winter Orientador/UNESP-FEG Me. Gustavo Oliveira Madeira UNESP-FEG Me. Gerson de Oliveira Barbosa Membro Externo Março, 2021 AGRADECIMENTOS Agradeço principalmente aos meus pais, pelo contínuo apoio e por sempre estarem presentes em todos os momentos. À minha família, por me incentivarem a alcançar meus sonhos. Aos meus amigos, por fazerem parte da minha jornada e por todas as memórias que vamos guardar juntos. À professora Silvia, pelo auxílio e orientação na elaboração deste trabalho. Aos meus professores, da FEG e os anteriores, por todo o esforço empregado na minha formação e dos meus colegas. A todos que participaram tanto direta quanto indiretamente da confecção deste trabalho e da minha jornada até aqui. E a Deus, por tornar tudo isso possível. O presente trabalho foi realizado com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) - Processo número 2016/24561-0. “Inteligências exteriores, ao explorar o Sistema So- lar com verdadeira imparcialidade, muito provavel- mente introduziriam o Sol nos seus ficheiros assim: Estrela X, classe espectral G0, 4 planetas e detritos.” (Isaac Asimov) RESUMO Além do Sistema Solar existem mais de 3000 sistemas estelares compostos por estrelas desde anãs até supergigantes, orbitadas por mais de 4000 exoplanetas de variados tipos, pequenos e rochosos, gigantes e gasosos, alguns desses tipos não vistos no Sistema Solar. Para detectar e confirmar esses mundos são empregadas uma série de métodos, cada um com suas vantagens. Alguns deles utilizados por bem-sucedidas missões espaciais, cujo objetivo é principalmente detectar efeitos causados por exoplanetas orbitando as estrelas de seus sistemas. Há planetas solitários em sistemas pequenos, em sistemas compostos por mais de uma estrela, por vários planetas, ou mesmo orbitando objetos diferentes. Como a Terra, existem aqueles na zona habitável de suas estrelas, região onde a água pode existir em seu estado líquido, condição associada à possíveis formas de vida. E da mesma forma que no Sistema Solar, existem corpos além das estrelas e planetas, são as exoluas, os exocometas, asteroides e exoanéis, alguns deles já confirmados e outros ainda candidatos. A primeira detecção e confirmação de objetos nunca vistos antes é difícil e delicada, mas com o futuro avanço tecnológico e o surgimento de equipamentos mais precisos, poderá ser feita a caracterização de sistemas e corpos que não são capazes de ser observados hoje. O presente trabalho visa elucidar termos e conceitos frequentes no tema de sistemas exoplanetários, apresentar dados importantes e alguns exemplos de exoplanetas e objetos extrassolares. PALAVRAS-CHAVE: Exoplanetas. Exoluas. Sistemas extrassolares. ABSTRACT Beyond the Solar System there are more than 3000 stellar systems composed of since dwarfs to supergiant stars, orbited by more than 4000 exoplanets divided in several types, small and rocky, giant and gaseous, some of which are not seen in the Solar System. Several methods are used in order to detect and confirm these worlds, each one with its own advantages. Successful space missions use some of them, aiming mainly to detect certain effects caused by exoplanets orbiting their systems’ stars. There are lone planets in small systems, in systems with more than one star, with several planets, or even orbiting different bodies. Like Earth, there are those within their stars’ habitable zone, region where water exists in its liquid form, what is usually related to possible life forms. In the same way as in the Solar System, there may be other objects than stars and planets, they are the exomoons, exocomets, asteroids and exorings, some of which are already confirmed, while others are still candidates. Detecting and confirming objects that were never seen before is a difficult and delicate task, but with advanced technology in the near future there will be more precise equipments able to characterize systems and bodies which are unable to be observed nowadays. This work aims to clarify frequent terms and concepts regarding exoplanetary systems, present important data and a few examples of exoplanets and extrasolar objects. KEYWORDS: Exoplanets. Exomoons. Extrasolar systems. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 Distribuição de exoplanetas em função da massa (massa da Terra) e raio (raio da Terra) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 Figura 2 Distribuição de exoplanetas em função da massa (massas de Júpiter) e período . 17 Figura 3 Distribuição de exoplanetas em função da excentricidade e período . . . . . . . 17 Figura 4 Movimento astrométrico de DENIS-P J082303.1-491201 e sua órbita baricêntrica 19 Figura 5 Gráfico de velocidade radial de OGLE-TR-56 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 Figura 6 Função de correlação cruzada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Figura 7 Dados de velocidade radial de HD 114762 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Figura 8 Velocidades Doppler de HD 30339 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Figura 9 Dados fotométricos de HD 209458 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Figura 10 Dados de trânsito de HD 209458 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 Figura 11 Dados de trânsito de OGLE-TR-56 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 Figura 12 Ilustração do método de microlentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 Figura 13 Curva de luz com modelos de OGLE 2003-BLG-235/MOA 2003-BLG-53 . . . 26 Figura 14 Aproximação e modelos de OGLE 2003-BLG-235/MOA 2003-BLG-53 . . . . 27 Figura 15 Zona habitável de Gliese 581 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Figura 16 Órbita e zona habitável do sistema HD 80606 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Figura 17 Representação artística do satélite CoRoT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Figura 18 Representação artística da nave Kepler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 Figura 19 Representação artística da nave PLATO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Figura 20 Nave e módulos da missão PLATO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 Figura 21 Satélite TESS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 Figura 22 Diagrama de Hertzsprung-Russell . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 Figura 23 Evolução estelar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Figura 24 Distribuição de exoplanetas por tipo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 Figura 25 Classificação de exoplanetas em categorias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 Figura 26 Órbita do sistema Kepler-90 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 Figura 27 Órbitas possíveis de exoplanetas em sistemas binários . . . . . . . . . . . . . . 43 Figura 28 Exemplo de colisão de um planeta com uma estrela secundária em um sistema binário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 Figura 29 Dados de trânsito do sistema TRAPPIST-1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 Figura 30 Órbitas planetárias de TRAPPIST-1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 31 Curva de luz de K2-141 b . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Figura 32 Trânsito dos planetas de Kepler-186 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Figura 33 Comparação de sistemas planetários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 34 Região de estabilidade de exosatélites prógrados . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Figura 35 Diagrama de um sistema estrela-exoplaneta-exolua-sub-lua . . . . . . . . . . . 58 Figura 36 Curva de luz do sistema de anéis de J1407 b . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 Figura 37 Modelo de anéis de J1407 b . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 Figura 38 Trânsito de um exocometa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 Figura 39 Exocometa 2I/Borisov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Métodos de detecção e número de exoplanetas detectados . . . . . . . . . . . . . 18 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 2 EXOPLANETAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2.1 DEFINIÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2.2 DADOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 2.3 MÉTODOS DE DETECÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.3.1 Astrometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.3.2 Velocidade radial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.3.3 Trânsito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.3.4 Cronometria de Pulsares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2.3.5 Microlente gravitacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.4 ZONA HABITÁVEL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 2.5 MISSÕES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 2.5.1 CoRoT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 2.5.2 Kepler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 2.5.3 PLATO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 2.5.4 TESS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 2.6 EVOLUÇÃO ESTELAR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 2.7 TIPOS DE EXOPLANETAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 2.7.1 Tipo Terra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 2.7.2 Super-Terra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 2.7.3 Tipo Netuno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 2.7.4 Gigante gasoso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.8 SISTEMAS EXOPLANETÁRIOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.8.1 Kepler-90 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.8.2 Estrelas binárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 2.8.3 TRAPPIST-1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 2.9 EXEMPLOS DE EXOPLANETAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 2.9.1 K2-141 b . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 2.9.2 Kepler-186 f . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3 OBJETOS EXTRASSOLARES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 3.1 EXOLUAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 3.1.1 Regiões possíveis e habitabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 3.1.2 Métodos de detecção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 3.1.3 Kepler-1625 b-I . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 3.2 SUB-LUAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 3.3 EXOANÉIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 3.4 EXOCOMETAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 4 CONCLUSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 13 1 INTRODUÇÃO A existência de vida em outros planetas sempre foi um dos grandes questionamentos do ser humano. A humanidade está sozinha no Universo? Há outras formas de vida em algum lugar? Se sim, elas seriam inteligentes como os humanos? Giordano Bruno, padre e filósofo do século XVII, foi um dos primeiros que fez perguntas seme- lhantes. Entre suas várias ideias, algumas das mais famosas - e que tiveram um grande peso na sua condenação pela Igreja -, são as de que o Sol é somente uma entre tantas estrelas, e que várias delas poderiam possuir planetas orbitando ao seu redor. Condenado à morte, Giordano não pôde viver para descobrir que estava certo. Hoje, há mais de 4000 exoplanetas descobertos, e mais de 5000 candidatos à espera de confirmação, de acordo com dados de NASA Exoplanet Archive (2021a). Desde a confirmação dos primeiros exoplanetas descobertos por Wolszczan e Frail (1992), e Mayor e Queloz (1995), cresceu o interesse geral nesse tipo de exploração espacial, a busca por mundos espalhados pelo Universo, pertencentes a outros sistemas, orbitando outras estrelas, possuindo caracte- rísticas e composições diferentes das que a humanidade conhecia. As décadas seguintes marcaram as primeiras descobertas e confirmações de tais mundos, utilizando telescópios avançados para observar seus trânsitos, medir suas velocidades, descobrir suas dimensões e inferir suas composições. Ao longo das últimas décadas houve um avanço enorme no número de detecções de exoplanetas, com equipamentos e técnicas cada vez mais precisas, e sistemas de detecção autônomos, que são responsáveis pela maior parte das detecções. Até 2013 eram detectados cerca de 140 exoplanetas por ano, mas com o anúncio da missão Kepler da Nasa em 26 de fevereiro de 2014, segundo Johnson e Harrington (2014), esse número subiu para mais de 850 planetas naquele ano. Utilizando uma técnica chamada de verificação por multiplicidade, o telescópio conseguiu analisar estrelas com mais de um planeta candidato, para direcionar sua busca priorizando tais sistemas ao invés de observações de sistemas simples, que possuem apenas um planeta. Desde o início da busca por planetas fora do Sistema Solar, já foram elaboradas novas técnicas de detecção, cada uma única em seus pontos fortes, sendo preferíveis em certos casos. O planeta Terra já passou por muitas fases, eras, desde a sua formação. Cada uma delas foi marcada por suas características e resultaram no que a Terra é hoje: um planeta rochoso, relativamente pequeno, e cuja pressão, temperatura, incidência de luz solar, e o fato de possuir água líquida em grande parte de sua superfície, entre outras características, tornaram possível a existência e evolução da vida como se conhece. O que se sabe hoje é resultado de estudos de como a vida foi no passado, desde os seus primórdios até atualmente. Com o estudo de exoplanetas é possível não só descobrir novos mundos dos mais variados tipos - planetas gigantes, frios, cobertos de lava e água -, como também estudar seu processo de evolução. Nessa busca, já foram encontrados planetas semelhantes à Terra em composição. Estudando tais planetas “terrestres”, pode-se ter uma noção de como a Terra evoluiu em suas eras passadas. A Terra está em uma região ao redor do Sol em que a água pode existir no estado líquido. Esse é o 14 fator principal que define o conceito de “zona habitável”, que é necessário para que a vida no geral, como se conhece hoje em dia, ocorra. Ao procurar e estudar planetas que se encontram na zona habitável de suas estrelas, pode-se talvez ter a chance de responder à tão antiga questão: a humanidade está sozinha no Universo? Para que a vida possa vir a ocorrer, é necessária uma série de fatores e condições específicas, que garantam um ambiente propício a isso. Essas condições de habitabilidade em exoplanetas não são vistas com frequência, ao se comparar com o número total de planetas (descobertos até agora), o que torna essa busca ainda mais trabalhosa. Hoje a busca por exoplanetas é robusta, contando com várias campanhas de observação de teles- cópios, e também com as missões espaciais elaboradas especificamente para isso. Para detectar os exoplanetas, entre outras técnicas, as missões observam a luz de milhares de estrelas ao mesmo tempo, à procura de quedas em sua intensidade, o que por vezes denuncia a existência de um planeta. Há vários catálogos com numerosas informações sobre os exoplanetas, tanto confirmados quanto candidatos de missões, planetas orbitando sistemas de múltiplas estrelas, mundos potencialmente habitáveis. Da mesma forma que há objetos entre o Sol e os planetas no Sistema Solar, eles também podem ser formados e estarem espalhados por outros sistemas na galáxia. Exoluas, satélites naturais de exoplanetas; exocometas, cometas de fora do Sistema Solar; sub-luas, objetos que orbitam as exoluas, satélites de satélites; exoanéis, anéis presentes em exoplanetas. Embora apenas alguns tenham sido confirmados, há interesse em saber como tais objetos podem ter se formado e como evoluem em seus sistemas, com a vantagem de servirem de comparação em relação aos próprios do Sistema Solar. Existem estudos interessados na possível habitabilidade, por exemplo, de exoluas, como os de Heller (2012) e Martínez-Rodríguez et al. (2019). Já foram descobertos oceanos subterrâneos de água em luas dos planetas gigantes gasosos no Sistema Solar, como em Encélado e Europa; se um processo semelhante se der em um exoplaneta e tanto ele quanto sua lua se encontrarem na zona habitável de sua estrela, ela pode ter chances de ser habitável, levando-se em conta parâmetros semelhantes aos analisados na habitabilidade de exoplanetas. O futuro da exploração exoplanetária e de objetos extrassolares tem em vista análises cada vez mais precisas, telescópios e missões espaciais cada vez mais avançados e tecnologias mais modernas aplicadas à sua busca. Com equipamentos mais avançados, será possível analisar com maior precisão a composição das atmosferas, superfícies e até interiores de exoplanetas. Dados esses que serão de grande importância na futura determinação da habitabilidade de tais sistemas. O objetivo do presente trabalho é: expor e explicar conceitos importantes no universo de sistemas exoplanetários, como a zona habitável e a evolução estelar. Discorrer sobre o funcionamento de algumas técnicas conhecidas para a detecção de exoplanetas, e algumas missões que as utilizam. E apresentar diferentes sistemas, dados e alguns dos exoplanetas confirmados, além de alguns objetos extrassolares confirmados e outros ainda sem confirmação. O texto está dividido em 4 capítulos. No capítulo 1, foi feita uma breve introdução do tema, o capítulo 2 tratará de expor conceitos e informações importantes sobre exoplanetas, no capítulo 3 será discutido sobre objetos extrassolares e suas características, e a conclusão será feita no capítulo 4. 15 2 EXOPLANETAS 2.1 DEFINIÇÃO A definição atual de um exoplaneta, feita pela Comissão F2 da IAU (International Astronomical Union - União Astronômica Internacional): Exoplanetas e o Sistema Solar, em agosto de 2018, é a seguinte: • Objetos com massas verdadeiras abaixo da massa limite para fusão termo- nuclear do deutério (atualmente calculada como 13 massas de Júpiter para objetos de metalicidade solar) que orbitam estrelas, anãs marrons ou re- manescentes estelares e que têm uma razão de massa com o objeto central abaixo da instabilidade L4/L5 (M/Mcentral < 2/(25 + √ 621) ≈ 1/25) são considerados “planetas” (independentemente de como se formaram). • A massa ou tamanho mínimo necessários para um objeto extrassolar ser considerado um planeta devem ser os mesmos usados no Sistema Solar. • Espera-se que esta definição evolua conforme o conhecimento acerca do tema cresça. (INTERNATIONAL ASTRONOMICAL UNION, 2020a, tradução nossa) Tem-se, então, que para um objeto ser considerado um exoplaneta, ele deve ter um limite máximo de massa, e orbitar certos objetos. O critério de massa leva em conta o fenômeno de reações nucleares que ocorrem dentro do planeta, quando sua massa ultrapassa a marca de 13 massas de Júpiter. Quando isso acontece, o corpo passa a ser considerada uma estrela. O limite de 13 massas de Júpiter foi definido pois em objetos com massas superiores, segundo Sutter (2019), a pressão em seus núcleos torna-se grande o suficiente para que eles iniciem um processo de fusão nuclear; ou seja, eles se tornam estrelas. A estrela deve ter uma massa pelo menos maior que 25 vezes a do objeto para que seus pontos L4 e L5 de Lagrange (pontos em uma órbita em que a resultante entre a força gravitacional dos objetos e a força centrípeta são aproximadamente zero) sejam estáveis. O segundo item dos critérios constata os limites mínimos como os vistos no próprio Sistema Solar, enquanto o terceiro espera que tais definições possam ser alteradas no futuro conforme se adquira mais conhecimento acerca de exoplanetas. Já a definição de um planeta no Sistema Solar, segundo a Resolução B5 da IAU de 2006, é a de um corpo celestial que: 16 • está em órbita ao redor do Sol; • tem massa suficiente para que a sua própria gravidade vença forças de corpo rígido, para que ele assuma um formato de equilíbrio hidrostático (quase redondo); • limpou toda a vizinhança de sua órbita. (INTERNATIONAL ASTRONOMICAL UNION, 2020b, tradução nossa) Em 2006, Plutão deixou de ser considerado um planeta e foi colocado como planeta anão por essa resolução - pois ele e sua lua Caronte possuem massas semelhantes e formam um sistema duplo, em movimento em relação ao mesmo ponto em comum (ou seja, ele não é o objeto gravitacionalmente dominante da região) -, então os parâmetros mínimos de massa e tamanho de um planeta no Sistema Solar que os exoplanetas têm são os de Mercúrio, o menor dos planetas rochosos. 2.2 DADOS Até 28 de novembro de 2021, eram conhecidos 4575 exoplanetas, em mais de 3300 sistemas diferentes, segundo dados de NASA Exoplanet Archive (2021a). Há mais de 7900 candidatos à espera de confirmação. Por meio de uma estimativa estatística de dados da missão Kepler da NASA, foi revelado, segundo Brennan (2020b), que há mais planetas do que estrelas na Via Láctea. Figura 1 – Distribuição de exoplanetas em função da massa (massa da Terra) e raio (raio da Terra) Fonte: Adaptado de NASA (2021) A Figura 1 exibe uma relação entre as massas e os raios de exoplanetas, e os métodos pelos quais eles foram detectados. Pode ser verificado que existe uma relação direta entre a massa e o tamanho de exoplanetas, que ao acumularem mais matéria, crescem. O método de trânsito tem a predominância no gráfico. Pode ser inferida uma relação entre detecções por esse método e o tamanho e massa dos planetas, o que será discutido mais abaixo. Na Figura 2 é apresentada uma distribuição dos exoplanetas confirmados em função de sua massa (em massas de Júpiter) e seu período orbital em dias, e o método usado para detectá-los. Há pontos 17 Figura 2 – Distribuição de exoplanetas em função da massa (massas de Júpiter) e período Fonte: NASA (2021) isolados no gráfico, correspondentes à planetas com períodos menores que um dia e massas tanto semelhantes à de Júpiter, quanto em torno de 0,2% dela; outros com períodos de 2 a 10 mil dias, com massas de 6 milésimos até 3% da massa do gigante gasoso; e outros com períodos maiores que 10 mil dias e massas entre 10 Júpiteres. Podem ser vistos 3 aglomerados na distribuição, um predominantemente composto por exoplanetas detectados por trânsito (ou curva de luz); outro composto principalmente de detectados por velocidade radial; e o mais diverso, composto pelos dois anteriores e também por detectados por variações temporais. O método de trânsito é o que mais detectou exoplanetas até o momento, com 3323 confirmados, o que pode ser verificado com a quantidade de pontos verdes no gráfico. O segundo método que mais detectou planetas é o de velocidade radial, seguido por microlentes. Figura 3 – Distribuição de exoplanetas em função da excentricidade e período Fonte: NASA (2021) Já na Figura 3, os planetas estão distribuídos de acordo com seu período e excentricidade, e também diferenciados pelos métodos que os detectaram. Há uma predominância de planetas detectados por trânsito em períodos mais curtos, o que está de acordo com a realidade, pois esse método é mais eficaz 18 para detectar planetas com períodos desse tipo. 2.3 MÉTODOS DE DETECÇÃO Tabela 1 – Métodos de detecção e número de exoplanetas detectados Método de Detecção Número de Exoplanetas Astrometria 1 Imageamento 54 Velocidade Radial 899 Trânsito 3444 Variações de tempo de Trânsito 22 Variações de tempo de Eclipse 16 Microlentes 120 Variações de tempo de Pulsares 7 Variações de tempo de Pulsações 2 Modulações de brilho Orbitais 9 Movimento do Disco 1 Fonte: NASA (2021) A tabela 1 mostra a contagem de exoplanetas detectados por vários métodos diferentes, até 28 novembro de 2021. Pode ser notado que a técnica de trânsito é a que mais detecta exoplanetas, apesar de possuir algumas limitações que serão discutidas mais abaixo. Em seguida vem a técnica de velocidade radial, que também é usada para a confirmação de exoplanetas, usada como segundo método de detecção, dada a sua grande precisão. 2.3.1 Astrometria De acordo com NASA Exoplanet Exploration (2020a), a astrometria leva em conta a mudança de posição da estrela, por conta da ação gravitacional do planeta que a orbita. Isso é verificado pela análise de várias imagens da estrela e de outras estrelas próximas à ela no céu. Em cada imagem, são comparadas as distâncias da estrela em relação às estrelas de referência, para saber se houve movimento. Em caso positivo, esse movimento pode ser analisado em busca de exoplanetas. Desse modo, quanto maior e mais massivo for o planeta, maior será a perturbação causada no movimento da estrela, e assim, mais evidente será na medição. Como a variação do movimento verificada é muito pequena, também consequência da distância entre o observador e o planeta ser muito grande, este método não é muito confiável para a detecção de exoplanetas. Na Figura 4 está representado um movimento astrométrico, de DENIS-P J082303.1-491201 (ou DE0823-49) em forma de gráfico, segundo os estudos de Sahlmann et al. (2013). O retângulo a ilustra o movimento relativo ao campo de estrelas de referência, a seta preta indica a direção e sentido do movimento próprio em um ano; e o retângulo b mostra um zoom da órbita baricêntrica causada pela atração gravitacional de uma anã marrom orbitando o sistema. Em ambos os casos, as observações são mostradas como círculos pretos e o modelo elaborado como as linhas cinzas. No painel b, o baricentro e o periastro da órbita, segundo os autores, estão marcados como um × e um pequeno quadrado vazio. A órbita é excêntrica e inclinada. 19 Figura 4 – Movimento astrométrico de DENIS-P J082303.1-491201 e sua órbita baricêntrica Fonte: Sahlmann et al. (2013) Quanto maior e mais massivo for um planeta, mais força gravitacional ele será capaz de exercer. Portanto, esse método tem a característica de ser capaz de identificar com maior facilidade um sistema com planetas gigantes, do que um com planetas menores, já que estes causariam uma menor perturbação na estrela. A astrometria é um método de detecção complicado de ser realizado, pois, como os outros métodos, depende de observações e imagens dos sistemas. Mas diferentemente deles, que se baseiam em medições de quanta luz ou a regularidade de sinais que chegam ao observador, a astrometria leva em conta principalmente a distância entre os corpos observados, como um método de imageamento aplicado várias vezes, para se determinar se houve alteração de posição entre os corpos do sistema. Ela é usada com frequência para corpos no Sistema Solar com sucesso. Como os sistemas exoplanetários estão a uma grande distância da Terra, é necessária uma grande precisão para sua observação. Há também um agravante de ser realizado da superfície da Terra, pois a atmosfera influencia na observação ao distorcer a luz vinda de fora do planeta. 2.3.2 Velocidade radial Este método também é conhecido como Método Doppler, pois mede variações da velocidade com que a estrela se move para mais longe e para mais perto de um observador, causadas pela ação gravitacional de seu planeta. O planeta age trazendo-a na sua direção conforme a orbita, o que para um observador seria como se ela se afastasse por um período, e se aproximasse em outro. Isso causa variações em seu comprimento de onda verificado, sendo a velocidade radial medida pelo deslocamento das linhas espectrais da estrela, por meio do efeito Doppler, de acordo com NASA Exoplanet Exploration (2020a). Isso funciona por meio da medição da luz que é emitida pela estrela, seu espectro de luz. Quando um corpo está se aproximando ou se afastando do observador a velocidades significativas (mas não 20 próximas à da luz), seu espectro é deslocado para a região do vermelho, quando se afasta; e para a região do azul, quando se aproxima. Esses efeitos são conhecidos como redshift e blueshift, respectivamente. O efeito Doppler é um efeito observado em situações de movimento relativo como esse, em que há corpos (emissores de ondas, sonoras, luminosas) se aproximando ou se afastando do observador. Para o observador, o objeto aparenta possuir características diferentes das próprias, como uma variação em seu comprimento de onda. Isso também acontece como por exemplo quando há uma ambulância se aproximando de uma pessoa numa rua; ao chegar mais perto, a pessoa percebe um som mais agudo do que ela emite; ao afastar-se, percebe-se um som mais grave. Figura 5 – Gráfico de velocidade radial de OGLE-TR-56 Fonte: Konacki et al.(2003) Na Figura 5 está representada uma versão simplificada das medidas de velocidade radial obtidas por Konacki et al. (2003) de OGLE-TR-56. A curva assume uma órbita circular, conforme era esperado do estudo do caso visto. Podem ser percebidos claramente os picos e vales da curva, correspondentes às mínimas e máximas velocidades com que a estrela se move ao redor do ponto fixo de observação; além de suas várias repetições, caracterizadas pela contínua ação gravitacional do planeta, movendo-se ao redor da estrela. Segundo Mayor e Queloz (1995), uma das formas de cálculo da velocidade radial é feita com uma técnica de “correlação cruzada”, que concentra a informação do efeito Doppler, no estudo, de aproximadamente 5000 linhas de absorção estelares. As medições realizadas pelos autores, no estudo de 1995, com avançados espectrógrafos, possuíam uma precisão a ponto de detectarem o movimento que Júpiter causa no Sol como sendo da ordem de 13 m/s. Atualmente a precisão do método já é bem maior: segundo os dados de Kemmer et al. (2020), conta-se com uma incerteza média de poucos metros por segundo. A função de correlação cruzada, de acordo com Simola, Dumusque e Cisewski-Kehe (2018), é o resultado da comparação de uma média das informações de todas as linhas espectrais observadas da estrela com um espectro sintético ou já conhecido. Para obter a velocidade radial da estrela como uma função do tempo, calculam-se as variações do baricentro (centro de massa de dois ou mais corpos, centro gravitacional) da função de correlação cruzada, sendo o baricentro estimado pela média de uma curva normal (gaussiana) que se encaixa com os dados obtidos. A Figura 6 ilustra a função de correlação cruzada usada nas medições de Mayor e Queloz (1995). A linha sólida é uma aproximação gaussiana que se encaixa com os dados obtidos. A posição da função de correlação cruzada é usada para calcular a velocidade radial, e sua largura está relacionada com a velocidade rotacional da estrela. 21 Figura 6 – Função de correlação cruzada Fonte: Mayor; Queloz (1995) Para o método de velocidade radial poder ser utilizado, o plano da estrela e do planeta deve ser aproximadamente paralelo em relação ao do observador, já que se for perpendicular, não será detectado um deslocamento horizontal da estrela em relação ao ponto de observação. Para esse caso, o método de astrometria seria mais indicado. Figura 7 – Dados de velocidade radial de HD 114762 Fonte: Kane et al. (2011) A Figura 7 mostra os dados de velocidade radial e o modelo Kepleriano que mais se encaixa com o planeta HD 114762, obtidos por Kane et al. (2011), representados pelos pontos e pela curva, respectivamente. Já a Figura 8 exibe o comportamento da velocidade radial de HD 30339, conforme os resultados de Nidever et al. (2002), fruto de um objeto acompanhante com um período curto em comparação com os planetas do Sistema Solar, de aproximadamente 15 dias ao redor de sua estrela, uma semiamplitude de 5.94 km s−1, e excentricidade de 0.25, resultando numa massa mínima de 77.8 massas de Júpiter para o objeto. O uso desta técnica pode revelar informações importantes sobre o planeta em estudo, conforme diz Charbonneau et al. (2000): período, semiaplitude (de velocidade radial) e excentricidade da órbita são 22 Figura 8 – Velocidades Doppler de HD 30339 Fonte: Nidever et al. (2002) algumas delas, além do semieixo maior e massa mínima, dependendo do valor assumido como massa da estrela que o planeta orbita. Em casos em que são verificados tanto a velocidade radial quanto o trânsito de um exoplaneta, sua massa e raio podem ser estimados com uma boa precisão. Em posse de todos esses dados também podem ser calculadas sua gravidade superficial e densidade média. A combinação de resultados entre essas duas técnicas de detecção é poderosa e traz várias informações úteis na investigação dos exoplanetas. Atualmente, por conta da sua precisão ser maior, a velocidade radial é o principal e mais bem- sucedido método para detectar exoplanetas. Ele é frequentemente usado com outros métodos para confirmar de fato que eles existem, segundo NASA Exoplanet Exploration (2020a). 2.3.3 Trânsito A técnica de trânsito, na definição de Petigura, Howard e Marcy (2013, tradução nossa), é “quando um planeta passa na frente da sua estrela, ele causa um escurecimento parcial que é proporcional à fração do disco estelar bloqueado.” Este método também é conhecido como Curva de Luz, por conta da sombra que o planeta causa quando este transita na frente da estrela, bloqueando seu “disco de luz”. Figura 9 – Dados fotométricos de HD 209458 Fonte: Charbonneau et al. (2000) 23 Na Figura 9, estão os dados fotométricos de HD 209458 obtidos por Charbonneau et al. (2000), ambos apresentando uma faixa que representa a luminosidade média percebida pelos instrumentos de observação sem perturbações, e ao redor do ponto 0.0 dia, uma queda na faixa. A queda corresponde à diminuição de luminosidade percebida causada pelo movimento do planeta na frente da estrela. Figura 10 – Dados de trânsito de HD 209458 Fonte: Charbonneau et al. (2000) E na Figura 10, está uma versão resumida e mais limpa dos dados, em conjunto com uma linha curva que segundo os autores representa um modelo elaborado do trânsito observado. Também foi dito que o maior desvio nos dados próximos do fim do gráfico se deu por conta de massas de ar. As linhas tracejadas superior e inferior representam curvas de trânsito para um planeta com raio 10% menor e maior, respectivamente. A região central representa o tempo de passagem, na qual o planeta se encontra completamente na frente da estrela. Figura 11 – Dados de trânsito de OGLE-TR-56 Fonte: Konacki et al. (2003) Na Figura 11, estão os dados do trânsito verificados por Konacki et al. (2003), de OGLE-TR-56. É comentado que o trânsito tem uma extensa base plana, e que os dados apontam para um corpo com o tamanho de Júpiter. A linha vermelha simboliza a curva que foi escolhida como o melhor modelo em comparação com os dados obtidos. O trânsito começa aproximadamente a partir da fase orbital de 0.97 até quase 1.03, verificado pela redução na intensidade da luz da estrela pelo equipamento, que retorna ao normal após a passagem do planeta ser concluída. Há também uma relação com a distância que o planeta se encontra da estrela. De acordo com NASA Exoplanet Exploration (2020a), quanto mais distante ele está, mais tempo leva para que sua passagem seja concluída, o que caracteriza uma curva de luz mais larga, dependendo dos limites adotados no eixo do tempo. 24 Uma série de características podem ser inferidas do planeta analisando sua curva de luz, como se nele há uma atmosfera, e pode-se inferir sua composição. O método funciona apenas com planetas com planos orbitais alinhados com a linha de visada do observador, pois com planos inclinados torna-se mais difícil de se ver a curva de luz. Em planos orbitais perpendiculares, não é possível usar esse método. Segundo Wunderlich et al. (2020), planetas orbitando estrelas mais frias são mais fáceis de se detectar e caracterizar pelo método de trânsito do que planetas orbitando estrelas mais quentes. Isso se dá por conta de seus curtos períodos orbitais e grandes razões entre os raios de estrelas e os de planetas. Este método funciona até em casos em que as estrelas estão distantes. Os planetas de mais fácil detecção por esse método são planetas gigantes com períodos orbitais curtos - como era o esperado para a missão CoRoT, conforme diz The European Space Agency (2020a) - já que quanto maior o planeta for, maior será a queda no brilho verificado na estrela; e quanto menor for seu período, mais chance há dele ser visto. De acordo com Murray e Dermott (2000), o período orbital de um planeta depende diretamente da distância que ele está da sua estrela, conforme a terceira lei de Kepler: T 2 = 4π2 µ a3 (1) em que T é o período orbital, µ = G(m1 +m2), G é a constante gravitacional Universal, igual a G = 6, 67260× 10−11Nm2kg−2, m1 é a massa da estrela e m2 do planeta, e a é seu semieixo maior. Desse modo, a evidência de que um planeta tem um período menor pode indicar que ele se encontra próximo de sua estrela. Com apenas aproximadamente 12 horas sem luz do Sol para fazer observações no céu noturno, com telescópios terrestres, quanto mais rápido o planeta orbitar sua estrela, isso será melhor verificado, já que períodos longos de meses ou até vários anos podem acarretar mudanças mínimas no brilho verificado de uma estrela, tornando a verificação mais complexa de ser realizada e aumentando as chances de serem consideradas apenas perturbações e não exoplanetas. Cerca de 76% dos exoplanetas descobertos até hoje foram através do método de trânsito. 2.3.4 Cronometria de Pulsares No estudo de Wolszczan e Frail (1992), usando um radiotelescópio para fazer medições precisas dos pulsos do pulsar (fase final da vida de uma estrela mais massiva que o Sol, que emite radiação enquanto gira regularmente) PSR 1257 + 12 (atualmente conhecido como PSR B1257 + 12), foi demonstrado que uma anomalia na regularidade dos pulsos do pulsar se dava devido à presença de três planetas no sistema. Esse método leva em conta a característica que pulsares são objetos rotacionais extremamente estáveis. Sendo assim, uma perturbação forte o suficiente para alterar seus períodos pode ser detectada, o que acontece quando há planetas orbitando próximos a eles. No estudo, a oscilação detectada pelo método de medição de pulsos, causada pelo movimento dos planetas, foi de cerca de 0,7 m/s, caracterizando a precisão dessa forma de detecção. Segundo os autores, planetas menos massivos do que a Lua seriam capazes de ser detectados com essa técnica. No entanto, apesar de tal precisão, esse método não é mais usado por não haver tantos pulsares 25 conhecidos para se observar, ou medir, contando com um número acima de apenas 2000 detectados, segundo Cofield (2016). Em comparação com o número de estrelas conhecidas, esse é um número ínfimo. E ainda, o número de pulsares com irregularidades em seus pulsos deve ser ainda menor, o que diminui ainda mais as chances de detecção de exoplanetas ao seu redor. 2.3.5 Microlente gravitacional A definição de microlentes é a seguinte: “microlentes gravitacionais ocorrem quando um objeto mais próximo passa pela ou muito próximo à linha de visada de uma estrela fonte mais distante, gerando um perfil de curva de luz simétrico bem conhecido.” (BOND et al., 2004, tradução nossa). A curva de luz verificada pelo método se dá por conta de uma estrela que passa em uma região do espaço que, por meio de sua distorção do espaço-tempo, parece intensificar a luz detectada oriunda de uma estrela mais distante para o observador, sendo que uma ligeira perturbação nessa curva de luz é geralmente efeito de um planeta. Isso também pode ocorrer com estrelas binárias, mas os dados e formato da curva são diferentes dos de um planeta. O intervalo de massas planetárias que o método é capaz de detectar varia desde planetas gigantes gasosos até planetas terrestres. O método tem esse nome porque para o observador, a luz da estrela distante parece ser desviada e aumentada, como se houvesse uma lente focando-a. Figura 12 – Ilustração do método de microlentes Fonte: NASA (2020) A Figura 12 de NASA Exoplanet Exploration (2020b) ilustra o momento em que uma estrela e seu planeta passam pelo ponto em que sua distorção do espaço causa a amplificação da luz vinda de uma estrela mais distante. Para Udalski et al. (2005), o método de microlentes tem boa confiança para detectar planetas distantes do observador e pequenos como Marte, pois diferentemente de outros métodos de detecção (trânsito, velocidade radial), ele é sensível à massa do planeta, visto que é sua massa que irá curvar a luz que será desviada da estrela fonte e amplificada para o observador; e a força do sinal de tal planeta pode ser grande (maior ou aproximadamente igual a 10%). 26 Uma quantidade importante que pode ser obtida no método é a razão q entre a massa do planeta e a da estrela que curvam a luz (q = mP/M ); se q tem um valor muito alto, significa que o objeto que acompanha essa estrela pode ser uma estrela secundária, de um sistema binário; se q for mediano, pode se tratar de um planeta gigante gasoso; e se for baixo, o sistema pode ser composto por uma estrela e um planeta pequeno, conforme diz Bond et al. (2004). Figura 13 – Curva de luz com modelos de OGLE 2003-BLG-235/MOA 2003-BLG-53 Fonte: Bond et al. (2004) Na Figura 13 está representada a curva de luz obtida por Bond et al. (2004) nas observações de 2003. As observações foram realizadas por duas equipes diferentes, a OGLE (Optical Gravitational Lensing Experiment, Experimento Ótico de Lentes Gravitacionais) tem os dados representados em vermelho, e a MOA (Microlensing Observations in Astrophysics, Observações de Microlentes em Astrofísica) em azul. Em ambos os painéis há os dados obtidos por ambas as equipes, com a diferença que no painel inferior, os dados da OGLE estão limitados a somente um ponto por dia, exceto nos picos do gráfico. Nos painéis pequenos à direita estão representados os dados obtidos por OGLE de 2001 a 2003, e por MOA de 2000 a 2003, representando que no período observado não houve nenhum aumento significativo na luz recebida pelos observatórios, ou seja, não houve nenhum outro evento de microlente para aquela estrela. Após as observações são elaborados modelos para encontrar o que melhor se encaixa com os dados obtidos, modelos simples com uma estrela, binários com duas, compostos por um planeta ou nenhum. A próxima figura ilustra a comparação entre os modelos de Bond et al. (2004) em relação aos dados obtidos. Na Figura 14 é feita uma aproximação no gráfico da imagem anterior, na região do efeito da microlente; estão representados os vários modelos elaborados por Bond et al. (2004) para a melhor identificação com os dados. O modelo simples é a curva tracejada em ciano; o binário, tracejado em roxo; o composto por um planeta, a linha pontilhada em verde; e o modelo geral de q = 0.0039 que melhor se encaixa com os dados é a linha sólida preta. Nos painéis superiores estão as aproximações do segundo pico e de um trecho à direita do gráfico. Os modelos simples e binário não foram capazes de se identificar satisfatoriamente com os dados 27 Figura 14 – Aproximação e modelos de OGLE 2003-BLG-235/MOA 2003-BLG-53 Fonte: Bond et al. (2004) obtidos, nos picos e também fora deles; enquanto que o de um planeta tem um aumento precoce na intensidade verificada, apesar de se encaixar bem no restante do tempo. O método inferiu que o objeto acompanhando a estrela trataria de um planeta com 1.5 massas de Júpiter, se a estrela pertencesse à sequência principal, de acordo com Bond et al. (2004). Existe essa dependência do tipo da estrela para descobrir a massa do planeta, já que isso somente se define por meio da razão q. Esse método tem poucos exoplanetas confirmados tanto por conta da difícil maneira de se precisar qual a massa do objeto que acompanha a estrela responsável pela lente - dependente da elaboração de modelos -, quanto pela observação em si, já que as estrelas devem ser monitoradas constantemente para que possa ser verificada uma alteração em seu brilho. Outro fator é que tal evento pode ocorrer somente uma vez, sem repetições para haver comparação de dados. 2.4 ZONA HABITÁVEL De acordo com Kasting, Whitmire e Reynolds (1993), a definição de zona habitável (ZH) é de uma região ao redor de uma estrela em que a temperatura de um planeta permite que a água exista no estado líquido em sua superfície, definição tal levando em conta que organismos conhecidos necessitam de água líquida pelo menos em algum momento em seu ciclo biológico. Segundo Vladilo et al. (2013), o critério mais adotado para definir tais ambientes “habitáveis” é a presença de água na fase líquida. A água sempre foi associada à vida, sendo fundamental para a maioria das espécies se desenvolverem. É, portanto, o primeiro e principal fator a ser considerado quando se trata de condições de habitabilidade de planetas. Mas também há outros fatores a se levar em conta para determinar se uma região está na ZH ou não, tanto intrínsecos quanto externos aos planetas: “As condições físicas necessárias são determinadas por uma série de fatores estelares, orbitais e planetários. A combinação de fluxo estelar e parâmetros 28 orbitais que levam à temperaturas superficiais compatíveis com o critério da água líquida definem a zona habitável.” (VLADILO et al., 2013, tradução nossa) Sendo assim, uma série de fatores atmosféricos também pode determinar a habitabilidade de uma dada região, como exemplo a pressão, visto que a uma dada temperatura, a água em estado líquido pode passar para outros estados, dependendo da pressão aplicada sobre ela. Para que uma região seja considerada habitável, então, também esses fatores devem estar entre certos valores limite. Uma ZH que se conhece é a da Terra ao redor do Sol, que por estar dentro de seus limites, possuir uma baixa excentricidade, e uma órbita sem perturbações drásticas, entre outros fatores, garante que haja água no estado líquido durante todo o período orbital. Figura 15 – Zona habitável de Gliese 581 Fonte: ESO (2009) A Figura 15 apresenta a zona habitável do sistema Gliese 581, em conjunto com alguns planetas do Sistema Solar para comparação. A faixa azul clara indica a ZH, e um trecho mais escuro indica uma possível extensão dela, por conta de possíveis variações nos parâmetros usados na estimativa nos dois sistemas. A imagem também traz a massa e a distância dos planetas em relação às estrelas. Segundo European Southern Observatory (2021), após refinar a órbita do planeta Gliese 581 d - descoberto em 2007, de acordo com Udry et al. (2007) -, uma equipe de astrônomos concluiu que ele se encontra dentro da ZH de sua pequena estrela vermelha. O planeta é, então, capaz de abrigar água líquida. Se Gliese 581 d possuir água, ela pode permanecer líquida durante todo seu período orbital ao redor da estrela. Porém, há planetas em que isso não ocorre. Ao invés de estarem na ZH por todo o seu período orbital, estão dentro dela somente uma época de seu ano, por exemplo, um planeta com uma grande excentricidade orbital. Isso tem efeitos drásticos em suas características físicas. Está representada na Figura 16 a órbita e a zona habitável ao redor da estrela HD 80606, cujo planeta tem um período de 111 dias e excentricidade de 0.93, segundo Kane e Gelino (2012). A ZH está em cinza na figura, na região do apoastro (ponto da órbita mais afastado da estrela) da órbita. O planeta passa cerca de 40% de sua órbita na ZH, na temperatura estimada de 286 K; porém, aproxima-se da 29 Figura 16 – Órbita e zona habitável do sistema HD 80606 Fonte: Kane; Gelino (2012) estrela no restante da órbita, aumentando gradualmente sua temperatura. No periastro (ponto da órbita mais próximo da estrela), a temperatura atinge 1546 K, aproximadamente. Esse processo causa um aquecimento na atmosfera superior do planeta tal que sua temperatura pode chegar a dobrar em apenas 6 horas de passagem pelo periastro. Esse sistema exemplifica uma ZH temporária em uma órbita. Kane e Gelino (2012) também citam um caso oposto, em que o planeta passa pela ZH no periastro (271 K), e no restante da órbita sofre com baixas temperaturas (127 K). 2.5 MISSÕES Desde algumas décadas até atualmente, houveram várias descobertas de sistemas planetários por telescópios. Porém, com o auxílio das missões espaciais, este número aumentou significativamente, resultado dos equipamentos sofisticados e precisos presentes nas naves. Em junho de 2017, o catálogo de exoplanetas da missão Kepler já contava com mais de 4000 planetas candidatos (detectados mas sem confirmação por um segundo método de detecção), com aproximadamente 2330 confirmações; e em junho de 2019, a contagem de exoplanetas confirmados já passava de 4000, segundo NASA Exoplanet Exploration (2018) e NASA Exoplanet Exploration (2019). As missões são a maneira mais efetiva de se detectar e confirmar exoplanetas, sendo suas medições analisadas nas bases terrestres para calcular e descobrir suas massas, raios, distâncias orbitais e várias outras características. 2.5.1 CoRoT A missão CoRoT (Convection, Rotation and Planetary Transits - Convecção, Rotação e Trânsitos Planetários), conforme diz ESA Science & Technology (2019c), foi liderada pela Agência Nacional Espacial Francesa, CNES, e a Agência Espacial Europeia - ESA - entrou na missão para fornecer equipamentos para o telescópio. De acordo com ESA Science & Technology (2021a), a missão teve início em dezembro de 2006, teve duração nominal de 2 anos e meio, e após duas extensões de missões, os intrumentos pararam de 30 funcionar em novembro de 2012; a missão foi concluída em junho de 2014. O foco científico da missão está no próprio nome, segundo The European Space Agency (2020a), em que “convecção e rotação” estão relacionados às análises do interior de estrelas, em específico, a asterossismologia, que estuda as oscilações de ondas acústicas dentro delas. Isso permite aos pesquisadores entender melhor como elas funcionam, o que é fundamental para entender de que maneira se dão as condições que tornam favoráveis a existência e evolução de planetas. E “trânsito” refere-se à técnica de detecção de exoplanetas, quando estes cruzam a frente de suas estrelas. A sonda SOHO (Solar and Heliospheric Observatory - Observatório Solar e Heliosférico), con- forme diz ESA Science & Technology (2020), está ativa desde 1995, e tem como principal objetivo o estudo do Sol, seu interior, superfície e atmosfera. Por ser uma parceria da ESA com a NASA, as análises e resultados da sonda SOHO podem ser comparadas com as do telescópio CoRoT, fazendo uma comparação a fundo do Sol com outras estrelas. O telescópio CoRoT foi incumbido de encontrar planetas rochosos como a Terra, próximos às suas estrelas, na esperança de haver planetas habitáveis entre eles. Há casos em que essa proximidade é maior do que a distância que Mercúrio está do Sol, ou seja, dependendo do tipo de estrela do sistema, o planeta rochoso pode ser incapaz de ser habitável, segundo The European Space Agency (2020a) por estar sujeito a ventos estelares e à grande força gravitacional da estrela, que pode incapacitá-lo de reter gases para formar uma atmosfera; além da elevada temperatura que a estrela proporcionaria a ele, entre outros fatores. Mas se o planeta for descoberto orbitando uma estrela anã vermelha, por exemplo, essa proximidade pode se dar na medida certa para que haja água líquida em sua superfície. Essas condições dependem da distância do planeta em relação à estrela, na órbita; do tipo de estrela; e também da fase atual de evolução dela. Figura 17 – Representação artística do satélite CoRoT Fonte: CNES; Ducros (2006) A Figura 17 apresenta uma visão artística da nave CoRoT ao redor da Terra, segundo The European Space Agency (2006), em sua órbita polar e circular. A nave possui um telescópio afocal com 27 cm de diâmetro e duas câmeras - uma para cada objetivo - e orbitava a Terra em órbita circular baixa (low-Earth orbit) e polar, de acordo com ESA Science & Technology (2019b). Dessa maneira, observava perpendicularmente à órbita, dentro de um limite de 10°, sem que a Terra interferisse. Seu campo de visão era um quadrado de 2,8° × 2,8°, metade para cada objetivo; e havia um prisma para que fosse possível fazer análises da atividade estelar durante um trânsito, conforme expõe The European Space Agency (2020b). 31 Segundo dados de The Extrasolar Planet Encyclopaedia (2021), há 36 exoplanetas confirmados sob o nome CoRoT, sendo que 31 deles foram descobertos dentro do período de 7 anos da missão original. Existem 33 sistemas planetários diferentes, com 3 sistemas possuindo mais de um planeta descobertos pelo telescópio. 2 dos 36 planetas foram descobertos pelo método de velocidade radial; e os restantes por trânsito, o foco da missão. 2.5.2 Kepler Conforme diz Robnik e Seljak (2020), o telescópio espacial Kepler operou em sua missão principal de 2009 a 2013, com o foco de detectar exoplanetas usando a técnica de trânsito. Ele mediu o brilho de 200.000 estrelas e detectou 18.000 planetas em potencial, dos quais mais de 2.000 estão atualmente confirmados, sendo vários deles corpos de tamanho terrestre. Segundo NASA Exoplanet Archive (2021a), o número atual de exoplanetas confirmados pela missão Kepler é de 2394, e planetas candidatos à espera de confirmação são 2366. Há também uma relação de candidatos e planetas confirmados na ZH de suas estrelas, seguindo os seguintes critérios: o planeta deve possuir uma temperatura superficial equilibrada entre 180 e 310K (180K < Teq < 310 K), ou uma insolação - radiação solar recebida por um planeta - em termos do fluxo recebido pela Terra entre 0.25 e 2.2 (0.25 < FluxoTerra < 2.2); seguindo esses critérios, há 361 planetas, tanto confirmados quanto candidatos, na ZH. A missão Kepler teve como objetivo específico descobrir planetas de tamanhos da Terra e menores, dentro ou próximos da ZH de suas estrelas, em uma região específica da Via Láctea, segundo Johnson (2018). Figura 18 – Representação artística da nave Kepler Fonte: NASA (2014) A nave Kepler está representada na Figura 18, em que os símbolos em cinza exibem as regiões no céu que a nave observou, cada região sendo a área de uma campanha de observação diferente da missão K2, conforme explica Johnson (2017b). Para concluir seu objetivo, a missão tinha como tarefas, de acordo com Johnson (2018): determinar a porcentagem de planetas terrestres e maiores que estão dentro ou próximos à ZH; determinar a distribuição de tamanhos e formatos das órbitas desses planetas; estimar quantos planetas existem em sistemas de múltiplas estrelas; identificar as propriedades das estrelas desses sistemas; entre outras. A missão estava em uma órbita heliocêntrica de período de 372 dias, que se distanciava da Terra com o tempo, conforme diz Johnson (2017c). Por não orbitar a Terra, não sofria perturbações causadas 32 por ações gravitacionais, magnéticas ou atmosféricas da Terra, o que foi uma grande vantagem em termos de estabilidade. No entanto, ela estava sujeita a efeitos da radiação solar, por não estar protegida por exemplo por uma atmosfera. Durante sua missão, o telescópio perdeu duas de suas 4 “rodas”, que funcionavam como giroscópios, usadas para posicioná-lo, segundo informações de Johnson (2018). Nos meses seguintes, foi organizada uma nova missão ainda usando o telescópio, intitulada K2. Para continuar a usar a nave, conforme diz Johnson (2017a), a equipe da missão desenvolveu uma técnica que usou justamente a pressão solar para estabilizar o telescópio, para que tivesse equilíbrio suficiente para continuar com as observações. Com sua mobilidade reduzida, a nova missão observava uma região no céu por até 83 dias antes de ter que manobrar para que a luz solar não entrasse no telescópio. A missão K2 foi desativada em 2018. De acordo com Johnson (2017c), o “único instrumento” da missão era um fotômetro com 42 CCDs (charged couple devices, dispositivos de carga acoplada), dispositivos usados para detecção de luz e formação de imagens de alta definição. Os dados acumulados da observação contínua do céu eram recebidos pela equipe da missão cerca de uma vez por mês. Por se tratar de uma missão exclusivamente para detectar exoplanetas pelo método de trânsito, a sonda Kepler fez um ótimo uso de seus CCDs, trazendo dados de milhares de observações durante todo seu tempo de missão original e estendido, o que pode ser verificado com o número de planetas descoberto pela missão, e também o número de candidatos: 2394 e 2366, respectivamente, para a missão Kepler; e 425 e 889, para a missão K2. Alguns dos resultados científicos da missão Kepler são muito interessantes, conforme diz Chen (2018): o telescópio provou que há mais planetas do que estrelas na galáxia, havendo estimativas de, aproximadamente, cada estrela possuir pelo menos um planeta. Foi revelado que há muitos planetas semelhantes à Terra em tamanho e distância às suas estrelas, o que chama a atenção para a investigação mais a fundo de tais mundos, levando em conta o foco principal da missão, de encontrar planetas em zonas habitáveis. Outras informações importantes são a existência de uma grande variedade em tipos e sistemas de planetas, desde pequenos e de dimensões terrestres até Júpiteres gigantes, e sistemas com desde um até oito planetas, orbitando próximos até bem distantes de suas estrelas. A sonda também observou mais de meio milhão de estrelas durante seus nove anos de missão, e assistiu a várias explosões de supernovas, trazendo mais informações acerca do estudo das estrelas. 2.5.3 PLATO A missão PLATO (PLAnetary Transits and Oscillations of stars, Trânsitos Planetários e Oscilações de estrelas) tem como objetivo a observação de estrelas e busca por planetas pelo método de trânsito, como seu próprio nome revela, segundo ESA Science & Technology (2021b). O foco da missão é encontrar e caracterizar planetas terrestres na zona habitável de suas estrelas, no intuito de analisar o que torna tais planetas habitáveis. É dito que a missão terá uma precisão sem igual. Seu lançamento está programado para 2026. Na Figura 19 está uma representação artística da missão PLATO, onde podem ser vistos seus 26 telescópios e painéis solares. Segundo ESA Science & Technology (2019a), a missão também foi 33 Figura 19 – Representação artística da nave PLATO Fonte: ESA; ATG medialab (2019) desenvolvida para investigar oscilações nas estrelas, o que a torna semelhante à missão CoRoT. No entanto, com o avanço da tecnologia, foi possível o refinamento da precisão de equipamentos, entre eles os usados em missões espaciais. Dessa forma, sua diferença da missão CoRoT se dará também na precisão de seus dados observados. Diferença essa também relacionada à missão Kepler, com seus dados de trânsito. De acordo com ESA Science & Technology (2021b), a missão pretende realizar esses objetivos por meio das técnicas de trânsito pela nave, velocidade radial por observatórios na Terra, e análises asterossismológicas da estrela; cada um dos métodos de detecção traz diferentes informações sobre o planeta (raio, massa), então além de poder detectar e confirmar os planetas, usando ambas as técnicas - um exoplaneta deve ser detectado por ao menos duas técnicas diferentes para ser confirmado -, a missão também poderá obter todos os dados necessários para conseguir caracterizar os que forem detectados com sucesso. Segundo ESA Science & Technology (2021f), a nave contará com um número de 26 telescópios pequenos, de rápido movimento e de campo de visão amplo; sua órbita será ao redor do ponto de Lagrange L2 do sistema Sol-Terra, ponto de equilíbrio instável. Por esse motivo, a nave precisará corrigir sua órbita periodicamente; ela levará combustível para 8 anos e meio de missão, sendo que ao menos 4 deles serão de operações científicas, em um primeiro momento. O ponto de Lagrange L2 é conhecido por ter sido região de operação de várias naves, como WMAP (Wilkinson Microwave Anisotropy Probe), Planck, e o futuro JWST (James Webb Space Telescope), segundo Barnett (2020b). Tal ponto é considerado ideal para se situar uma missão pela facilidade de comunicação com a Terra; pela simplicidade em ocultar o Sol, a Terra e a Lua de seus equipamentos, pois na posição basta manobrar para estar virada para o lado oposto que não haverá ocultações e nem danificação dos equipamentos por conta da direta radiação solar. Segundo ESA Science & Technology (2021c), a cada três meses, a nave deverá girar em 90° para evitar a luz solar. Ela estará a aproximadamente 1.5 milhões de quilômetros da Terra. Segundo ESA Science & Technology (2021e), após a proposta da missão ser apresentada pela primeira vez e então estudada por 2008 e 2009, ela não chegou a ser escolhida para as próximas duas oportunidades de lançamento M1 e M2, sendo escolhidas as missões Solar Orbiter e Euclid. Porém, a missão foi deixada como candidata à próxima oportunidade de lançamento M3, e em fevereiro de 2014 foi confirmada como a missão M3 do programa Cosmic Vision. A missão também terá capacidade de descobrir planetas orbitando estrelas binárias, exoluas, exoanéis, exocometas e planetas ao redor de sistemas jovens e também evoluídos, segundo ESA 34 Science & Technology (2019e). Isso se dará por conta do grande campo de visão que terá do céu, sua alta precisão e suas campanhas de longa observação contínua. De acordo com ESA Science & Technology (2021d), a nave contará com dois módulos: o módulo de carga e o de serviço. Ambos são separados, sendo que o módulo de carga terá a função de abrigar e proteger as câmeras da exposição à luz solar. Já o módulo de serviço conterá um escudo e painéis solares, um sistema de propulsão e controle de altitude, e sistemas de controle térmico, comunicação e controle. O escudo protegerá as câmeras do Sol; os painéis serão usados para fornecer energia à nave; o sistema de propulsão e controle de altitude será responsável por manter a órbita e estabilizar a nave para observações; o controle térmico terá como função a manutenção de temperaturas entre os componentes, cuidando para que não atinjam temperaturas capazes de danificá-los; o sistema de comunicação enviará os dados da missão para Terra, contando com 4 antenas, enquanto o de controle será o meio da equipe enviar comandos e gerenciar o satélite. Figura 20 – Nave e módulos da missão PLATO Fonte: ESA; ATG medialab (2020) A Figura 20 ilustra a nave completa e seus dois módulos separados. Cada uma de suas câmeras possuirá 6 lentes e 4 CCDs, com um campo de visão de 1100 graus quadrados, segundo ESA Science & Technology (2019d), e as câmeras “comuns” serão organizadas em quatro grupos de 6. Isso tornará a nave capaz de de observar um campo total de 2250 graus quadrados a cada observação. O plano atual da missão é de realizar duas observações de longa duração do céu, cada uma podendo durar até dois anos, conforme diz ESA Science & Technology (2021c). Há também um planejamento diferente, que consiste em uma observação contínua de três anos, e um ano com observação em vários pontos. Estima-se que a missão tenha feito a cobertura de 10 a 50% do céu, no tempo previsto de 4 anos para observações científicas. 35 2.5.4 TESS A missão TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite, Satélite de Pesquisa de Planetas em Trânsito) é, como as anteriores, uma missão de busca por exoplanetas, especialmente aqueles que passam na frente de suas estrelas em um trânsito, segundo Barclay (2021a). Seu foco é encontrar planetas menores que Netuno para que com seu trânsito, sejam identificadas características como sua massa e composições atmosféricas. Ela é liderada pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology, Instituto de Tecnologia de Massachusetts), com parcerias da NASA e outros institutos. Ela teve início em abril de 2018, sendo lançada em um foguete Falcon 9 pertencente à SpaceX, em Cabo Canaveral. Após uma série de manobras orbitais, o satélite chegou à sua órbita final depois de 60 dias do lançamento, conforme diz Barclay (2021a), uma órbita terrestre alta (high Earth orbit) e elíptica, de forma a ter um campo de visão limpo para fazer suas observações. Com um período de aproximadamente 13.7 dias, de acordo com Massachusetts Institute of Technology (), o satélite entrou em ressonância com a Lua, minimizando suas perturbações e adquirindo uma posição estável por muito tempo, sendo necessárias poucas manobras para mantê-la. Começou a operar em julho do mesmo ano. É esperado que a missão catalogue milhares de exoplanetas candidatos, para que em futuras análises eles possam ser confirmados e estudados mais a fundo, de acordo com Garner (2020). Cada uma de suas 4 câmeras CCD tem um campo de visão de 24 graus quadrados, segundo Massachusetts Institute of Technology (), totalizando um campo de 24° × 96° em cada setor de observação, com duração de aproximadamente 27 dias de observação para cada um dos 30 setores. Figura 21 – Satélite TESS Fonte: Orbital ATK (2018) O satélite é exibido na Figura 21, onde podem ser vistas suas câmeras envoltas pela proteção da luz solar, a nave, seus painéis solares e sua antena. O planejamento da missão previa que o hemisfério sul do céu seria observado no primeiro ano, e o hemisfério norte no segundo. O esperado é que a missão cubra cerca de 85% do céu, de acordo com Barclay (2021a). Por ser capaz de observar estrelas mais brilhantes do que a missão Kepler, exoplanetas ao redor de tais estrelas serão mais facilmente caracterizados com análises dos dados obtidos por bases terrestres, o que trará medidas mais precisas de suas composições e atmosferas. Pelo 36 menos dois trânsitos devem ser observados em seus períodos de observação para tornar um planeta um candidato. A missão oficial acabou e a estendida começou em julho de 2020, com o foco agora de atender pedidos de observações da comunidade científica pelos dois anos seguintes, segundo Barclay (2021b). 2.6 EVOLUÇÃO ESTELAR Um ponto importante a ser considerado na habitabilidade de planetas é a fase de evolução em que sua estrela se encontra, e como ela evoluirá com o tempo. As estrelas possuem várias fases durante sua vida, desde sua formação até sua morte, e dependendo do seu tipo, pode haver grandes mudanças em suas características de uma fase para outra. Conforme os cálculos de Schröder e Smith (2008), em 7.59 bilhões de anos, o Sol - hoje uma estrela da classe G2 V com aproximadamente 4.5 bilhões de anos de idade - se tornará uma gigante vermelha completa cujo raio poderá se estender até 1.2 AU, englobando os planetas interiores do Sistema Solar, e deslocando sua zona habitável para fora, para a faixa de 49 a 71 AU - na região do Cinturão de Kuiper. Se a Terra possuísse uma órbita de pelo menos 1.15 AU talvez sobreviveria à expansão do Sol, mas não seria de muita valia visto que o crescimento do Sol tornaria a Terra um planeta inabitável devido à sua alta temperatura e efeitos atmosféricos e físicos resultantes do processo. Sendo assim, dependendo do tipo de sua estrela, um planeta habitável hoje pode não ser em milhões de anos. Por isso, para a habitabilidade de sistemas, é importante essa determinação do tipo e de como a estrela irá evoluir com o tempo. Uma maneira de acompanhar e analisar a evolução de uma estrela é por meio do diagrama de Hertzsprung-Russell (HR), que traz informações sobre sua luminosidade e temperatura superficial. Também há variações que mostram sua magnitude aparente, massa e tipo espectral. A Figura 22 mostra um diagrama HR que exibe a luminosidade (em termos do Sol), temperatura superficial e tipo espectral de várias estrelas, traz seus tempos de vida e compara seus tamanhos com o do Sol. O Sol se encontra na faixa G, em aproximadamente 6000 K de temperatura, em um tempo de vida marcado de 1010 anos. Estrelas cujas reações termonucleares fundem hidrogênio em hélio - mais comuns - localizam-se na sequência principal, mas quando esgotam seu combustível, acabam se tornando anãs brancas, ou gigantes ou supergigantes vermelhas, dependendo de sua massa, segundo European Southern Observatory (2007). Há um limite - de massa - acima do qual a estrela irá crescer quando passar para a próxima fase de evolução, e abaixo do qual ela irá diminuir até se tornar uma estrela anã. As estrelas do diagrama geralmente são separadas por regiões, como pode ser visto na figura. São elas: as anãs brancas, na região inferior esquerda; a sequência principal, região diagonal acima do centro; as gigantes, um pouco acima e à direita da sequência principal; e as supergigantes, acima das gigantes. Cada uma delas, exceto a sequência principal, constitui diferentes tipos de estrelas, em diferentes fases de evolução. Segundo NASA e Team (2010), estrelas da sequência principal - como o Sol - são aquelas que fundem hidrogênio em hélio em seu interior. 37 Figura 22 – Diagrama de Hertzsprung-Russell Fonte: ESO (2007) A luminosidade de uma estrela depende das reações termonucleares que acontecem em seu interior, o que, por sua vez, é consequência direta de sua massa, pressão e temperatura; quanto maiores forem seus valores, Iliadis (2015) diz que mais rapidamente energia nuclear é gerada, o que contribui para a temperatura superficial. Seguindo o mesmo raciocínio, o autor cita que o tempo de vida de uma estrela na sequência principal depende diretamente desses valores, pois se uma estrela tem grande luminosidade, mais combustível ela queima para emitir radiação. Desse modo, estrelas maiores e mais quentes tem um tempo de vida menor. Na Figura 23, está representada uma visão artística de como se dá a evolução estelar para estrelas com diferentes massas. As estrelas menos massivas, anãs marrons e vermelhas, continuam em seu estado anão, por possuírem pouca massa para queimar. De acordo com The European Space Agency (2018), as marrons não conseguem temperaturas altas o suficiente para queimar seu combustível, e desaparecem; as vermelhas mantém o processo de fusão até acabar com todo seu hidrogênio, e transformam-se em anãs brancas. A partir das estrelas com massas solares o processo é diferente: estrelas aproximadamente iguais 38 Figura 23 – Evolução estelar Fonte: ESA (2018) ao Sol em termos de massa passam por alguns estágios em suas vidas, primeiramente ao consumir todo o hidrogênio disponível em seu núcleo, e crescendo até se tornarem gigantes vermelhas; que por sua vez, devido à pressão e contração, explodem numa nebulosa planetária, por fim tornando-se anãs brancas, segundo NASA e Team (2010). Estrelas mais massivas explodem em uma supernova - eventos capazes de serem vistos mesmo de estrelas muito distantes, mais brilhantes do que uma galáxia inteira, de acordo com NASA e Team (2010) -, que pode dar origem a uma estrela de nêutrons ou um buraco negro, dependendo da massa inicial da estrela. Pode ser verificado que o comportamento e a evolução de uma estrela estão intrinsecamente relacionados à sua massa. Para estrelas com até 8 massas solares, conforme explica Swinburne University of Technology (), a contração irá torná-las anãs brancas após a explosão da nebulosa. Para estrelas mais massivas, após uma série de contrações, aquelas cujos núcleos restantes possuírem até 3 massas solares colapsarão em uma supernova e se tornarão uma estrela de nêutrons. Se a massa de seus núcleos for maior que o triplo da do Sol, o colapso será tamanho que originará um buraco negro. 2.7 TIPOS DE EXOPLANETAS Para a divisão dos mais de 4000 exoplanetas confirmados até hoje, foram elaboradas quatro categorias: planetas terrestres, do tipo Terra; super-Terras; planetas do tipo Netuno; e gigantes gasosos. A Figura 24 mostra os planetas confirmados de acordo com seu tipo, até 28 de novembro de 2021, segundo dados de Brennan (2021c). Os planetas mais frequentemente encontrados são os do tipo Netuno, seguidos por um número muito próximo de gigantes gasosos e super-Terras. Assim pode-se ter 39 Figura 24 – Distribuição de exoplanetas por tipo Fonte: NASA (2021) uma ideia geral dos planetas mais facilmente encontrados pelos métodos de detecção atuais espalhados pela galáxia, planetas maiores e mais massivos do que a Terra. As classes de exoplanetas têm subtipos, que relacionam as temperaturas às quais os planetas estão submetidos. São, por exemplo, os “Júpiteres quentes”, “super-Terras frias”, entre outros. Figura 25 – Classificação de exoplanetas em categorias Fonte: Kopparapu; Wolf; Meadows (2020) A Figura 25 apresenta os diferentes tipos e subtipos de exoplanetas, separados por tamanho, fluxo de radiação recebido pela estrela, e composição química da atmosfera, segundo Kopparapu, Wolf e Meadows (2020). De acordo com o fluxo estelar, os planetas possuem diferentes tipos de atmosferas, determinadas por cálculos de equilíbrio químico. Podem ser vistos jovianos “quentes”, “mornos” e “frios” referentes a planetas gigantes e suas temperaturas, por conta da proximidade e fluxo de radiação recebido de suas estrelas; há também Netunos e sub-Netunos, super-Terras, Terras, Vênus/Mercúrio relacionando seus diferentes tamanhos e possíveis composições; e também “bolas de neve”, planetas frios e pequenos. 40 2.7.1 Tipo Terra Planetas do tipo Terra são, como o nome diz, os mais semelhantes à Terra em características físicas, como tamanho, massa, e composição rochosa. O requisito para um planeta ser considerado do tipo terrestre é ser rochoso e ter de metade ao dobro do tamanho (raio) da Terra, segundo Brennan (2020e). Podem ser formados de rocha, ferro, carbono, água. Alguns planetas do tipo Terra são Kepler-11 b, descoberto em 2010; TRAPPIST-1 d e TRAPPIST-1 e, ambos do sistema TRAPPIST-1, descobertos em 2016 e 2017, de acordo com Brennan (2021g) e Brennan (2021k). O sistema Kepler-11 é o mais compacto conhecido até hoje, com o planeta mais externo orbitando a uma distância entre as órbitas de Mercúrio e Vênus no Sistema Solar. Já o sistema TRAPPIST-1 possui 7 planetas dos tipos Terra e super-Terra orbitando uma estrela anã M a uma distância muito menor do que a de Mercúrio em relação ao Sol. 2.7.2 Super-Terra Super-Terras são, essencialmente, planetas do tipo terrestre mas maiores e mais massivos. São a classe de planetas que mais se encontram candidatos potencialmente habitáveis, segundo dados de Planetary Habitability Laboratory (2020). Por haver pouco conhecimento sobre eles - já que é um tipo de planeta que não existe no Sistema Solar -, podem ser compostos de rocha, gás, água ou gelo, de acordo com Brennan (2020d). Exoplanetas desse tipo possuem a partir de duas vezes o tamanho da Terra, e até 10 vezes a sua massa. Segundo Brennan (2021j), dados da missão Kepler mostram que são raros os planetas cujo tamanho está entre 1.5 e 2 Terras (na faixa das super-Terras). É citado que tal faixa pode representar uma divisão nos tamanhos e tipos planetários: planetas que atingem tais tamanhos podem começar a atrair gás e formar envelopes ao redor de si, característicos dos planetas gasosos - e no caso, de planetas tipo Netuno; por outro lado, planetas que não atingem essa faixa podem permanecer rochosos. Exemplos de super-Terras são Kepler-186 f, descoberto em 2014; GJ 273 b, descoberto em 2017; e HD 106315 b, também descoberto em 2017, segundo dados de Brennan (2020d). HD 106315 b orbita uma estrela do tipo F, maior e mais massiva do que o Sol. Uma super-Terra interessante é Kepler-22 b, um mundo possivelmente coberto de água com uma massa de 36 Terras e raio de 2.38 R⊕, cuja temperatura é aproximadamente 262 K, que encontra-se próximo da zona habitável de sua estrela, mas cuja inclinação pode auxiliar em sua habitabilidade segundo modelos calculados, de acordo com as informações de Brennan (2021i). 2.7.3 Tipo Netuno Exoplanetas do tipo Netuno são maiores que a Terra e podem ter diferentes composições, mas possuem núcleos rochosos ou compostos por elementos pesados e grandes camadas de gás ao seu redor, formadas principalmente por hidrogênio e hélio, conforme diz Brennan (2020c). Exoplanetas desse tipo têm tamanhos semelhantes a de Netuno e Urano no Sistema Solar, aproxi- madamente 4 Terras. Um subtipo de planetas encontrados tem sido os “mini-Netunos”, cujo tamanho ultrapassa o das super-Terras, mas é menor que o de Netuno. 41 Exemplos de exoplanetas do tipo Netuno são GJ 436 b, descoberto em 2004; Kepler-1655 b, descoberto em 2018; e HAT-P-26 b, segundo dados de Brennan (2021d), Brennan (2021h) e Brennan (2021e). Kepler-1655 b orbita uma estrela do tipo F, um pouco maior do que o Sol; GJ 436 b é curioso por não possuir metano, comum aos planetas do Sistema Solar, o que seria esperado dados seus gases e a alta temperatura que possui por conta de sua estrela; HAT-P-26 b tem uma massa de aproximadamente 22 Terras e leva pouco mais de 4 dias para completar uma órbita ao redor de sua estrela, pouco menor do que o Sol. 2.7.4 Gigante gasoso Gigantes gasosos são análogos aos planetas jovianos do Sistema Solar: Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. No caso, são planetas com grandes envelopes de gás ao redor de si, e têm dimensões maiores que pelo menos as de Netuno. Esses envelopes são compostos principalmente por hidrogênio e hélio, segundo Brennan (2020a). Possuem dimensões semelhantes aos dos planetas jovianos, chegando até a 4 Júpiteres, embora possa haver planetas confirmados maiores e aqueles cujo tamanho ainda não é conhecido. Alguns exoplanetas desse tipo são o Júpiter quente KELT-9 b, descoberto em 2017; 51 Pegasi b, descoberto em 1995; e 2MASS J01225093-2439505 b, descoberto em 2013, segundo Brennan (2021f), Brennan (2021b) e Brennan (2021a). KELT-9 b é tão quente em seu lado iluminado pela estrela que suas moléculas se quebram, podendo chegar até 4600 K - mais quente do que a superfície de algumas estrelas. 51 Pegasi b orbita uma estrela do tipo G - o mesmo do Sol - pouco maior que o Sol, em 4 dias. 2MASS J01225093-2439505 b tem o tamanho de Júpiter, mas sua massa é 24.5 vezes maior que a do planeta gigante, e orbita sua estrela do tipo M a 52 AU de distância, resultando em um período orbital de aproximadamente 593 anos. 2.8 SISTEMAS EXOPLANETÁRIOS A seguir serão tratados sistemas interessantes por serem compostos de vários exoplanetas, estrelas binárias - sistemas com duas estrelas ao invés de somente uma -, e por possuírem mais de um planeta na zona habitável. O estudo de sistemas de múltiplos planetas pode trazer informações importantes acerca de sua formação e evolução, o que pode ser comparado diretamente aos modelos conhecidos do próprio Sistema Solar. O estudo de sistemas binários pode trazer oportunidades únicas de testes de modelos orbitais com perturbações fortes ou fracas, entre outras características. E ter a possibilidade de caracterizar um sistema com planetas habitáveis é fundamental para determinar com mais precisão o que torna um planeta habitável e como os outros planetas influenciam nisso, além de ser importante para indicar candidatos para estudos profundos em futuras pesquisas cada mais precisas no ramo. 2.8.1 Kepler-90 O sistema Kepler-90 (também conhecido como KIC 11442793 e KOI 351) possui oito planetas, com períodos orbitais variando desde 7 até 330 dias, e semieixo maior de 0.074 até 1.01 AU, segundo os dados de Cabrera et al. (2014). Nele, há 2 planetas de tamanho terrestre, 3 super-Terras, 2 gigantes 42 gasosos, sendo que o último - Kepler-90 i - foi descoberto só recentemente, em 2017, enquanto o sistema foi descoberto em 2013. Diz-se que Kepler-90 é um sistema hierárquico, por conta da variedade de tipos de planetas, e por seus tamanhos aumentarem conforme a distância que se encontram da estrela. Isso é um reflexo do próprio Sistema Solar, que possui planetas pequenos e rochosos próximos do Sol, e planetas gigantes a maiores distâncias. Os planetas gigantes são gasosos, e são formados por meio do acúmulo de gás disponível longe da estrela, em seus períodos de formação. De acordo com Boss (2014), o processo de formação se dá da seguinte maneira: primeiramente ocorre a colisão e acúmulo de corpos sólidos cada vez maiores - desde partículas até planetesimais de vários quilômetros. Em seguida, contando com um núcleo planetário de algumas massas terrestres, o núcleo acreta envelopes massivos de gás disponível. Com o tempo, o protoplaneta atrai mais planetesimais e mais gás, crescendo rapidamente. Pelo fato de estarem mais distantes da estrela, e portanto, terem mais gás disponível durante sua formação, os planetas gasosos crescem com um núcleo sólido envolto por grande envelope de gás. Seus planetas gigantes gasosos Kepler-90 f, e g produzem 0.8% e 0.5% de trânsito, de acordo com os dados de Cabrera et al. (2014), o que significa que podem ser observados da superfície da Terra, facilitando observações de telescópios terrestres. Figura 26 – Órbita do sistema Kepler-90 Fonte: NASA (2017) A Figura 26 apresenta a órbita dos planetas do sistema Kepler-90 em comparação com os planetas interiores do Sistema Solar. A órbita mais externa, de Kepler-90 h, está em média mais próxima de sua estrela do que a órbita terrestre de 1 AU. Em zoom estão os planetas Kepler-90 b, c e i do sistema, sendo i o último deles confirmado. Os quatro primeiros planetas do sistema a partir da estrela - b, c, i e d - encontram-se em uma órbita mais interna do que a de Mercúrio em relação ao Sol, o que caracteriza períodos muito curtos em relação aos planetas restantes (de 7 a 60 dias), e também altas temperaturas (de 1056 a 518 K), de acordo com os dados de The Extrasolar Planet Encyclopaedia (2021). 43 Segundo Chen (2017), a configuração do sistema sugere que os planetas tenham se formado mais distantes da estrela e de alguma forma se aproximaram até as órbitas que possuem hoje. Isso também é verificado em outros sistemas de vários planetas, em que autores sugerem que inicialmente os planetas estavam em órbitas semelhantes às dos planetas do Sistema Solar e depois aproximaram-se da estrela. Há casos em que tal aproximação ocorre ainda na fase de formação planetária, quando há um disco de gás ao redor da estrela e os planetas estão imersos nele. Ao se mover em tal meio repleto de gás, o planeta sente o arrasto desse gás, o que ocasiona sua migração. assim trazendo-o a uma órbita mais interna, conforme discutido por Boss (2014). Os planetas do sistema Kepler-90 contam todos com uma inclinação de aproximadamente 89 graus, segundo dados de The Extrasolar Planet Encyclopaedia (2021), o que pode sugerir que todos foram formados pela mesma nuvem de gás e poeira, e não sofreram impactos fortes o suficiente para que sua inclinação se alterasse drasticamente; como é o caso de Urano no Sistema Solar, que tem uma inclinação axial de aproximadamente 98 graus, de acordo com Barnett (2019d). 2.8.2 Estrelas binárias Sistemas de estrelas binárias são compostos por duas estrelas, e têm uma série de particularidades, tais como: suas três possíveis órbitas em um mesmo sistema; e a possibilidade de interações entre as estrelas e o planeta ser tão intensa que causam a colisão do planeta com alguma das estrelas, ou sua expulsão do sistema. Há também a grande influência que a configuração do sistema tem na habitabilidade de planetas orbitando-as. Já foram descobertos mais de 150 planetas em mais de 103 sistemas desse tipo, segundo Schwarz (2021). Figura 27 – Órbitas possíveis de exoplanetas em sistemas binários Fonte: Kelly; Astronomy Magazine (2017) A Figura 27 ilustra as três possíveis órbitas de um exoplaneta ao redor de um sistema de estrelas binário. Existem órbitas do tipo S, P, e T. Em órbitas do tipo S, o exoplaneta orbita uma das estrelas, enquanto ela e a outra estrela, por sua vez, orbitam o centro de massa do sistema composto. Já em órbitas do tipo P, o planeta possui uma órbita externa às duas estrelas. Por fim, há a órbita de tipo T, que se dá pelo planeta orbitando o ponto de Lagrange L4 ou L5 da estrela menor, enquanto ela orbita a maior em uma órbita comum. O planeta assume uma posição na 44 órbita de forma que seja formado um triângulo equilátero entre a estrela central, o planeta, e a estrela menor. Esse tipo de órbita também existe no Sistema Solar, sendo verificada com os asteroides troianos de Júpiter: o Sol é o corpo central, há Júpiter, e asteroides que permanecem ao redor dos pontos de equilíbrio L4 e L5, sofrendo ação gravitacional de ambos, conforme diz Garner (2017). Em relação ao movimento orbital do planeta, pode ser esperado que uma órbita do tipo S pos- sua perturbações mais significativas, dependendo dos fatores de semieixo maior, excentricidade, e principalmente da distância entre as estrelas e suas massas; pois em determinados sistemas haverá momentos em que as estrelas estarão mais próximas entre si, e consequentemente haverá uma maior ação gravitacional sobre o planeta. Porém, haverá sistemas separados por uma grande distância, em que não haverá perturbações consideráveis na órbita do planeta. Um planeta em órbita do tipo P deve ser capaz de experimentar várias mudanças em suas estações por todo o seu ano, visto que há períodos em que se encontra mais próximo da estrela mais massiva, depois se afasta, e aproxima-se da outra estrela, o que pode causar grandes variações, por exemplo, em sua temperatura. De acordo com Klesman (2020) e Schwarz (2021), a maioria dos planetas conhecidos em sistemas binários têm órbita S, ao redor de somente uma das duas estrelas. Até então, não foi encontrado nenhum planeta com órbita T em um sistema. Planetas em órbitas T são chamados de planetas troianos, em semelhança com os troianos de Júpiter. Segundo as simulações de estabilidade planetária de Capuzzo-Dolcetta, Cesare e Marino (2020), em que foram usados diferentes parâmetros de massa e excentricidade para as estrelas, e variados valores de semieixo maior e massa do planeta, foi visto que havia 4 possíveis resultados: órbita estável, colisão com a estrela primária, colisão com a estrela secundária, e a expulsão do planeta do sistema. Nos casos de expulsão do planeta, verificou-se que sua órbita perturbada passava de uma do tipo S para uma do tipo P por um certo período, antes de ser ejetado. Essa observação levou os autores a inferirem a hipótese de que podem ocorrer transições de órbita de planetas em sistemas binários, se satisfeitas as condições certas. Figura 28 – Exemplo de colisão de um planeta com uma estrela secundária em um sistema binário Fonte: Capuzzo-Dolcetta; Cesare; Marino (2020) Na Figura 28, está representada uma colisão de um planeta com uma estrela secundária, exemplo 45 dos resultados das simulações de Capuzzo-Dolcetta, Cesare e Marino (2020). A órbita sem perturbações está em azul, a órbita perturbada do planeta em ciano, e a órbita da estrela secundária em vermelho. O ponto vermelho central é a estrela primária. Os autores também definiram um parâmetro importante no problema da estabilidade, o semieixo maior crítico, que separa a região estável da instável. Valores de semieixo maior menores que o crítico significam que o planeta estará na região segura, estável da órbita; valores maiores colocam-no na região instável. Por meio da variação da excentricidade orbital das estrelas, da razão de massa entre elas e da massa do planeta, eles chegaram a resultados que dizem que quanto maior a excentricidade do sistema, maior a razão de massa, e menor a massa do planeta, menor será o semieixo maior crítico. Isso significa que para sistemas com essas características, menor será a região de estabilidade de um planeta, pois tais fatores podem resultar em influência gravitacional significativa das estrelas sobre ele. Ou seja, sistemas sujeitos a esses parâmetros terão condições mais restritivas para que um planeta consiga se manter em órbita no sistema; visto que com alta excentricidade a órbita será alongada, podendo haver encontros próximos com a estrela secundária; e com grande razão entre as massas, uma das estrelas pode causar perturbações mais significativas na órbita do planeta. As definições de habitabilidade em tais sistemas são interessantes, pois não levam em conta apenas as características da estrela principal, mas também da estrela secundária. Dependendo do sistema, a secundária pode, desde fazer pouca diferença na ZH da estrela principal, até movê-la para longe da órbita do planeta. A análise de Thebault e Haghighipour (2015) revela que há complicações quando a estrela secun- dária, por exemplo, está muito próxima do planeta em uma órbita S. Assim, ela tem um grande papel na quantidade de radiação que chega até ele, o que pode alterar drasticamente os limites de ZH, além de poder causar instabilidade. Na análise de Kane e Hinkel (2013), foi usada a generalização do cálculo de ZH de uma estrela para duas, combinando os parâmetros de vários sistemas binários e seus respectivos planetas. Segundo os autores, para apenas uma estrela, a ZH depende da energia solar recebida (fluxo estelar) e do pico da distribuição de energia, em comprimento de onda. Em posse de tais dados, é possível calcular os limites da ZH para uma estrela. Para mais de uma estrela o processo se torna mais complicado, visto que ambas terão emissão de radiação e diferentes fluxos estelares, que assumem diferentes valores em regiões no espaço ao seu redor, diferentemente de somente uma estrela. Para Thebault e Haghighipour (2015), quando a radiação total recebida pelo planeta excede muito a recebida somente pela estrela principal, a ação da estrela secundária é não desprezível e, portanto, a ZH do planeta será afetada por ambas, não sendo possível considerar somente a influência da estrela principal. O estudo de Barbosa et al. (2020) levou em conta a estabilidade de partículas na região da zona habitável de sistemas binários com planetas em órbitas do tipo P, ao redor de ambas as estrelas. Foram usados dados de vários sistemas reais para fazer simulações de como tais sistemas evoluiriam com o tempo, de acordo com suas interações. O tempo total simulado foi de 1 milhão de anos. Os resultados foram que, em vários dos sistemas, o movimento das estrelas ou dos planetas causa perturbações fortes o suficiente que acabam por expulsar as partículas da região, ou colocá- 46 las em órbitas mais excêntricas, ou colidi-las com o planeta. Em algumas situações, as partículas permaneceram em órbitas estáveis. No entanto, em alguns dos sistemas em que as partículas foram expulsas, outras permaneceram co-orbitando o planeta, sendo essas as que assumiram uma posição de equilíbrio estável. Tal situação é semelhante à que ocorre com a lua Tétis de Saturno, com outras duas luas menores, o que será tratado mais adiante. A estabilidade orbital de sistemas binários leva em conta as massas, distâncias, e excentricidades das estrelas e dos planetas do sistema. Quanto menor a distância de um objeto ou planeta até o centro de massa das estrelas, mais forte será a perturbação que elas causam em sua órbita. A estabilidade em tais sistemas é delicada e depende de variados fatores, mas é possível. Alguns exoplanetas confirmados em sistemas binários são: PSR B1620-26 (AB) b, que está em órbita P ao redor de um pulsar e uma estrela anã branca; DMPP-3A b (HD 42936 b), uma super-Terra em órbita S ao redor de uma estrela tipo Sol do sistema DMPP-3, com semieixo maior orbital de apenas 1.22 AU e período de aproximadamente 7 dias; segundo Sigurdsson et al. (2003), Barnes et al. (2020) e The Extrasolar Planet Encyclopaedia (2021). 2.8.3 TRAPPIST-1 TRAPPIST é o nome do telescópio que observou este sistema exoplanetário (TRAnsiting Planets and PlanetesImals Small Telescope, Telescópio Pequeno de Planetas em Trânsito e Planetesimais), em funcionamento desde 2010, segundo European Southern Observatory (). TRAPPIST-1 ganhou certa notoriedade por se tratar tanto de um sistema com vários planetas (7) quanto por possuir 3 deles na zona habitável da estrela: os planetas TRAPPIST-1 e, f, e g. Os dados de Gillon et al. (2017) sugerem que os seis planetas interiores do sistema são rochosos. Todos têm dimensões terrestres, massas que variam desde 0.41 até 1.38 M⊕ e todos orbitam muito próximos de sua estrela, sendo o semieixo maior de TRAPPIST-1 h - o planeta mais externo - de apenas 0.06 AU. A densidade dos planetas variam desde 0.6 até 1.0 ρ⊕, conforme os dados de Grimm et al. (2018), caracterizando planetas rochosos. Os autores revelam que TRAPPIST-1 c e e têm possivelmente interi- ores rochosos, enquanto os cálculos indicam que os planetas restantes podem ter grandes atmosferas, oceanos ou gelo. A estrela do sistema é uma anã “ultrafria” - pouco maior do que Júpiter - do tipo M, cuja temperatura superficial está abaixo de 2700 K; estrelas desse tipo emitem radiação no infravermelho, conforme explica Gillon et al. (2016), razões pelas quais é possível caracterizar totalmente os planetas do sistema. A Figura 29 exibe as medições fotométricas realizadas pelo telescópio Spitzer do trânsito de todos os planetas de TRAPPIST-1, conforme os dados de Gillon et al. (2017). Os pontos coloridos representam os dados obtidos, e os pontos brancos representam uma média dos dados a cada dado intervalo de tempo. As linhas coloridas mostram o modelo que melhor se encaixa com os dados. Os planetas interiores têm períodos mais curtos e os exteriores mais longos. Os autores também explicam que o sistema apresenta uma “quase” ressonância, com razões entre o período de seus planetas aproximando-se de pequenos inteiros: 8/5, 5/3, 3/2 e 4/3. Tal ressonância é responsável por variações percebidas em seus tempos de trânsito. 47 Figura 29 – Dados de trânsito do sistema TRAPPIST-1 Fonte: Gillon et al. (2017) A configuração atual dos planetas sugere que eles possam ter se formado em regiões mais distantes da estrela e se aproximado até as órbitas que possuem hoje, segundo Gillon et al. (2017). Isso significa que alguns dos planetas poderiam ter atmosferas antigamente, mas perderam-na por conta da proximidade com a estrela. Grimm et al. (2018) afirmam que a análise das massas e densidades dos planetas também indica uma formação e crescimento dos protoplanetas distantes da estrela, além da região de congelamento de água, e que é consistente com sua consequente migração para a zona de planetas rochosos. Uma análise computacional preliminar da estabilidade de TRAPPIST-1 por Gillon et al. (2017) revelou que há uma chance de 25% do sistema sofrer uma instabilidade em 1 milhão (106) de anos, e de 8,1% dele conseguir chegar a até 1 bilhão (109) de anos. No entanto, não foram considerados a proximidade dos planetas com a estrela e o acoplamento e efeitos de maré resultantes. Esses fatores podem tanto estabilizar quanto desestabilizar o sistema, o que pode influenciar em sua estabilidade a longo prazo. Grimm et al. (2018) explicam que a indicação de que o sistema todo migrou para perto da estrela se dá por conta de possuir uma corrente de ressonâncias, fato também verificado por Gillon et al. (2017). Sistemas comuns que apresentam ressonâncias têm tendências de instabilidade, mas a migração de todos os planetas em conjunto de TRAPPIST-1 é a responsável por tornar o sistema estável por tanto tempo. Por possuírem baixos semieixos maiores, os planetas encontram-se muito próximos de sua estrela, o que causa um acoplamento de maré, segundo Gillon et al. (2016). Isso pode causar diferenças consideráveis em suas temperaturas entre seus hemisférios iluminados pela estrela e os sombreados. O planeta h conta com uma temperatura de equilíbrio de aproximadamente 168 K, enquanto a do planeta b é de aproximadamente 400 K, segundo os dados de The Extrasolar Planet Encyclopaedia (2021), 48 ambos em extremos opostos da temperatura necessária para a existência da água líquida. O planeta d é o que melhor se encaixa nesse quesito, com uma temperatura média de 288 K, sem contar possíveis efeitos atmosféricos para contribuição de sua temperatura. Figura 30 – Órbitas planetárias de TRAPPIST-1 Fonte: Gillon et al. (2017) A Figura 30 ilustra a órbita dos planetas do sistema, adotando o mesmo sistema de cores da Figura 29, também de Gillon et al. (2017). As faixas cinza e tracejada representam duas diferentes zonas habitáveis calculadas. A distância máxima do sistema até a estrela é de 0.063 AU, do planeta h; a zona habitável do sistema estende-se até pouco antes disso, consequência do tipo e pequeno tamanho de TRAPPIST-1, visto que irradia menos por ser menor, ter pouca massa e assim menos combustível para queimar, além de também emitir radiação no infravermelho. Podem ser vistos os exoplanetas TRAPPIST-1 e, f e g dentro dos limites de ambas as zonas habitáveis, um dos fatos pelos quais o sistema se tornou tão conhecido. As simulações de Grimm et al. (2018) mostram perturbações entre os planetas em suas excentrici- dades, e argumentos do periastro (ângulo da órbita em relação a uma direção de referência), frutos do fato de estarem em órbitas ressonantes, caracterizando interações gravitacionais mais intensas entre eles; evoluindo irregularmente com o tempo, e exibindo rápida precessão. Grimm et al. (2018) citam que o sistema apresenta semelhanças em relação à dinâmica do sistema Kepler-90, tratado anteriormente, visto que ambos possuem sete planetas e há ressonância entre os planetas dos sistemas. 2.9 EXEMPLOS DE EXOPLANETAS Os exoplanetas apresentados a seguir foram escolhidos por suas características únicas, como a proximidade da estrela e o curto período de K2-141 b e a presença em um sistema planetário múltiplo 49 e na zona habitável de Kepler-186 f. Exoplanetas podem possuir as mais variadas características, tanto orbitais quanto físicas, d