UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA GABRIEL AUGUSTO DAVID DETECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA DE DESCARGAS CORONA EM SISTEMAS HVDC POR MEIO DE TÉCNICAS DE PROCESSAMENTO DIGITAL DE SINAIS Bauru - SP 2023 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA DETECÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA DE DESCARGAS CORONA EM SISTEMAS HVDC POR MEIO DE TÉCNICAS DE PROCESSAMENTO DIGITAL DE SINAIS GABRIEL AUGUSTO DAVID Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de Bauru/FEB da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” / UNESP, para obtenção do título de Mestre em Engenharia Elétrica. Orientador: Prof. Dr. Pedro de Oliveira Conceição Junior Coorientador: Prof. Dr. Fabio Romano Lofrano Dotto Bauru - SP 2023 DAVID, GABRIEL AUGUSTO. Detecção e caracterização da ocorrência de descargas corona em sistemas HVDC por meio de técnicas de processamento digital de sinais / GABRIEL AUGUSTO DAVID, 2023 93 f. : il. Orientador: Pedro de Oliveira Conceição Junior Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Engenharia, Bauru, 2023 1. HVDC. 2. Detecção de descarga corona. 3. Processamento digital de sinais. 4. Reconhecimento de padrões. 5. Diagnóstico de falhas. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia de Bauru II. Título. IMPACTO POTENCIAL DESTA PESQUISA Esta pesquisa apresenta uma nova metodologia para detecção e caracterização de descargas corona em sistemas de alta tensão em corrente contínua. O objetivo é reduzir as perdas de transmissão de energia elétrica e, por consequência, contribuir para uma maior eficiência energética e redução de custos para a sociedade. As descargas corona são um fenômeno elétrico que ocorre em linhas de transmissão de energia e podem causar interferências em equipamentos eletrônicos e perturbações na rede elétrica. Visando mitigar tais impactos negativos, a presente pesquisa possibilita que medidas preventivas sejam tomadas antes que o problema se torne mais grave. Importa destacar que este estudo recebeu o suporte da empresa Interligação Elétrica do Madeira S.A, que é responsável por uma das linhas de transmissão HVDC mais longas do mundo, com 2.385 quilômetros, conectando Porto Velho RO a Araraquara SP. O estudo forneceu uma base de conhecimento científico para um projeto desenvolvido no âmbito do Programa de Pesquisa & Desenvolvimento da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) que resultou na concepção de um dispositivo inovador para detecção HVDC, que atualmente é utilizado na linha de transmissão acima referida. POTENTIAL IMPACT OF THIS RESEARCH This research presents a novel methodology for detecting and characterizing corona discharges in high-voltage direct-current (HVDC) systems. The aim is to reduce electrical transmission losses and, consequently, contribute to greater energy efficiency and cost reduction for society. Corona discharges are an electrical phenomenon that occurs in power transmission lines and can cause interference with electronic equipment and disturbances in the power grid. To mitigate these negative impacts, the present study enables preventive measures to be taken before the problem becomes more severe. It is important to note that this research received support from the company Interligação Elétrica do Madeira S.A, which is responsible for one of the world's longest HVDC transmission lines, spanning 2,385 kilometers and connecting Porto Velho, RO to Araraquara, SP. The study provided a scientific knowledge base for a project developed under the Research & Development Program of the Brazilian National Electric Energy Agency (ANEEL), which resulted in the design of an innovative HVDC detection device that is currently used in the transmission line. Dedico aos meus familiares, amigos e professores que sempre me apoiaram e motivaram ao longo desta jornada. Em todos os instantes, a contribuição de todos foi essencial. AGRADECIMENTOS Primeiramente ao Todo, mente universal, infinita e vivente, que nos rege e torna tudo possível. Ao meu orientador, Professor Dr. Pedro de Oliveira Conceição Júnior minha profunda gratidão pela orientação, confiança, paciência e dedicação ao longo deste período, que, possibilitou que me tornasse um melhor profissional e acadêmico. Sobretudo agradeço a amizade e por compartilhar suas experiências e ensinamentos, que me serviram e seguirão servindo de exemplo para além deste período e trabalho. Ao meu coorientador Dr. Fabio Romano Lofrano Dotto fundador e CEO da empresa FAROL Pesquisa & Desenvolvimento pela oportunidade, aprendizado e pelas valiosas contribuições a este trabalho. Meu profundo agradecimento e apreço ao Dr. Paulo Roberto de Aguiar, professor titular do Departamento de Engenharia Elétrica (DEE), Universidade Estadual Paulista (UNESP) pela oportunidade, ensinamentos e amizade. Aos meus amigos do Laboratório de Aquisição de Dados e Processamento de Sinais (LADAPS) Dr. Leandro Melo Campeiro, Dr. Thiago Glissoi Lopes, Me. Paulo Monteiro de Carvalho Monson e, em especial, a Me. Cristiano Soares Júnior, por todos os ensinamentos, conselhos, confiança e amizade que foram imprescindíveis ao longo desta jornada. Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica da Faculdade de Engenharia de Bauru, em especial, aos professores Eduardo Paciência Godoy e Bruno Albuquerque de Castro pela inestimável formação acadêmica. Aos meus primeiros professores de Engenharia Elétrica que me motivaram a seguir neste caminho, Guilherme Augusto Marabezzi Clerice, José Ricardo Giordano Pinheiro e João Carlos Angelico. Agradeço à Interligação Elétrica do Madeira S.A (IE MADEIRA) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) sob a bolsa PD-06957-0005/2020 pelo apoio a este trabalho de pesquisa. À Faculdade de Engenharia de Bauru, ao Departamento de Engenharia Elétrica, ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia e todos os funcionários pelo suporte. Minha mais profunda gratidão aos meus pais, que são o meu alicerce, os meus maiores professores e exemplos, pelo apoio incondicional em prol de que pudesse ser, acima de tudo, uma boa pessoa. Ao meu pai, Carlos Augusto David símbolo de trabalho, foco, empenho, amor incondicional, alegria e perseverança sobre os tempos mais difíceis. À minha mãe, Célia Regina de Souza Nunes símbolo de fé, determinação, amor, paciência, superação, confiança e sabedoria inigualável neste mundo. Aos meus irmãos Neto e Lívia, que sempre estiveram à disposição para me ensinar, proteger e aconselhar, guiando me assim, ao longo desta jornada com muito amor, sabedoria e às vezes, paciência. Essa conquista também é de vocês! À minha companheira Victoria Scavassa Bailoni por todo amor, carinho, ensinamento, amizade e suporte constante nesta jornada. E a sua família, obrigado pela confiança e auxílio ao longo desta jornada. Aos meus antepassados, em especial, minha querida avó Deolinda Colpachi David, onde quer que esteja, espero que saiba que meu progresso também é fruto do seu incondicional amor e confiança. Aos meus familiares Edson Nunes, Maria Lúcia de Souza Dalben e Raquel Augusto David, e a próxima geração, Felipe, Enrico e Théo. Aos amigos e eternos professores Dr.Letícia Miquelin, Danilo Casarin, João Dalben e Derik Conte. Agradeço a todos que de forma direta ou indireta contribuíram para a consumação desta importante etapa em minha vida. “If I have seen further, it is by standing on the shoulders of giants.” Sir Isaac Newton RESUMO Embora linhas de transmissão de alta tensão sejam adequadas para transmissão de energia em longas distâncias, a busca contínua de redução de perdas na transmissão de energia elétrica de alta tensão em corrente contínua (HVDC – high voltage direct current) tem elevado a tensão de trabalho desses sistemas, atualmente, para valores médios de ±800 kV. Por consequência, a intensidade do campo elétrico no entorno do condutor também é aumentada, provocando a ionização do ar no entorno das linhas de transmissão que leva à descarga corona, responsável por diversos efeitos negativos e perturbações. Baseando-se em tal problemática, o presente trabalho apresenta uma nova metodologia para a detecção e a caracterização da ocorrência de descargas corona em sistemas HVDC através da combinação de parâmetros de processamento digital de sinais para seleção de características mais representativas de descargas corona. A análise experimental foi realizada a partir da aplicação de tensões entre ±30 kV a ±100 kV por meio de um gerador de alta tensão DC (direct-current) em um condutor eletrodo, e os sinais de corrente elétrica proporcionais ao efeito corona foram coletados por um dispositivo detector HVDC responsável pela aquisição de dados. Os sinais coletados foram submetidos a análises estatísticas no domínio do tempo, tempo-frequência e critério de Hinkley com a finalidade de extrair informações relevantes acerca do fenômeno de descargas corona. Os resultados obtidos indicam a viabilidade do método proposto na identificação e caracterização do fenômeno seguindo as mudanças no conteúdo do sinal, especialmente, para faixas de frequências estreitas, sendo possível quantificar de forma simples o percentual de crescimento das descargas corona de 40-80 kHz em função da tensão aplicada na faixa, além de apresentar alta confiabilidade (82% a 93%) por meio do cálculo do desvio do valor médio quadrático (RMSD) baseado na aproximação por modelo linear. A banda de frequênciass resultante do estudo demonstrou-se favorável para estabelecer um limiar para o percentual de crescimento da descarga corona de acordo com seu perfil ou condição de aplicação, podendo essa informação ser útil na construção de dispositivos móveis de baixo consumo e desempenho computacional, alinhado as demandas de novas tecnologias da indústria 4.0 e Internet das coisas. Palavras-chave: HVDC; detecção de descarga corona; processamento digital de sinais; reconhecimento de padrões; diagnóstico de falhas. ABSTRACT Although high-voltage transmission lines are suitable for power transmission over long distances, the continuous search for reducing losses in high-voltage direct current (HVDC) electric power transmission has increased the working voltage of these systems to average values of ±800 kV. In this context, the electric field intensity around the conductor is also increased, causing the ionization of the air around the transmission lines that leads to corona discharge, responsible for several negative effects and disturbances. Based on such problematic, the present work presents a new methodology for the detection and characterization of the occurrence of corona discharges in HVDC systems through the combination of digital signal processing parameters for the selection of optimal corona discharge characteristics. The experimental analysis was performed by applying voltages between ±30 kV and ±100 kV through a high voltage DC (direct-current) generator on an electrode conductor, and the electrical current signals proportional to the corona effect were collected by an HVDC detector device responsible for data acquisition. The collected signals were subjected to statistical analysis in the time domain, time-frequency and Hinkley criteria in order to extract relevant information about the corona discharge phenomenon. The results obtained indicate the viability of the proposed method in the identification and characterization of the phenomenon in a simple way following the changes in signal content, especially for narrow frequency bands, being possible to quantify in a simple way the percentage of growth of corona discharges as a function of the applied voltage in the 40-80 kHz range, besides presenting high reliability (82% to 93%) through the calculation of the root mean square deviation (RMSD) based on the approximation by linear model. The frequency band resulting from the study proved to be favorable for establishing a threshold for the percentage of corona discharge growth according to its profile or application condition, and this information can be useful in the construction of mobile devices with low consumption and computational performance, aligned with the demands of new technologies of Industry 4.0 and Internet of Things. Keywords: HVDC; corona discharge; digital signal processing; pattern recognition; fault diagnosis. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Curva típica comparação entre transmissões AC e DC. Fonte: Autor. .................. 14 Figura 2 – Mecanismo de formação do efeito corona. ............................................................. 29 Figura 3 – Efeito corona demonstrado em linhas HVAC e HVDC. ........................................ 30 Figura 4 - Representação esquemática da aplicação de algumas métricas de análise. ............. 36 Figura 5 - Exemplo de atenuação de filtro do tipo Butterworth para diferentes ordens N ....... 39 Figura 6: Diagrama esquemático da bancada de teste experimental. ....................................... 43 Figura 7: (a) Dispositivo detector HVDC; (b) Fonte DC de até 120 kV. ................................. 43 Figura 8: Banco de ensaios exemplificado duas das condições testadas: (a) Dispositivo posicionado à 0° em relação a fonte e, haste à 30 cm de distância; (b) Dispositivo posicionado à 90° em relação a fonte e, haste à 60 cm de distância. .................. 44 Figura 9: Dispositivo de Detecção HVDC. .............................................................................. 45 Figura 10 - Sistema de comunicação via infravermelho – interface USB-irDA2 .................... 46 Figura 11 - Exemplo de sinais de corrente no domínio do tempo obtidos a partir os ensaios laboratorias em duas medições: + 30 kV e + 100 kV. ........................................ 47 Figura 12 - Framework proposto para realização dos ensaios laboratórias. ............................. 48 Figura 13 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h30g90s polo positivo. ................. 51 Figura 14 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h30g90s polo negativo. ................ 51 Figura 15 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h30g0c polo positivo. ................... 52 Figura 16 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h30g0c polo negativo. .................. 52 Figura 17 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h60g90s polo positivo. ................. 53 Figura 18 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h60g90s polo negativo. ................ 53 Figura 19 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h60g90c polo positivo. ................. 54 Figura 20 - Sinais “puros” no domínio do tempo: ensaio #h60g90c polo negativo. ................ 54 Figura 21 - Caracterização do intervalo de tempo entre os pulsos e picos presentes nos sinais. ............................................................................................................................. 56 Figura 22 - Espectrograma completo da STFT do sinal de +100 kV correspondente ao ensaio #h30g90s. ............................................................................................................ 58 Figura 23 - Espectrograma da STFT do sinal de +100 kV correspondente ao ensaio #h30g90s: parte real em 2D. ................................................................................................. 59 Figura 24 - Espectrograma da STFT do sinal de +100 kV correspondente ao ensaio #h30g90s com foco: (a) espectro de frequências; (b) instantes de tempo. .......................... 59 Figura 25 - Espectrograma completo da STFT do sinal de +80 kV correspondente ao ensaio #h30g0c. .............................................................................................................. 60 Figura 26 - Espectrograma da STFT do sinal de +80 kV correspondente ao ensaio #h30g0c: parte real em 2D. ................................................................................................. 60 Figura 27 - Espectrograma da STFT do sinal de +80 kV correspondente ao ensaio #h30g0c com foco: (a) espectro de frequências; (b) instantes de tempo. .................................. 61 Figura 28 - Espectrograma completo da STFT do sinal de -100 kV correspondente ao ensaio #h60g90s. ............................................................................................................ 61 Figura 29 - Espectrograma da STFT do sinal de -100 kV correspondente ao ensaio #h60g90s: parte real em 2D. ................................................................................................. 62 Figura 30 - Espectrograma da STFT do sinal de -100 kV correspondente ao ensaio #h60g90s com foco: (a) espectro de frequências; (b) instantes de tempo. .......................... 62 Figura 31 - Espectrograma completo da STFT do sinal de -80 kV correspondente ao ensaio #h60g90c. ............................................................................................................ 64 Figura 32 - Espectrograma da STFT do sinal de -80 kV correspondente ao ensaio #h60g90c: parte real em 2D. ................................................................................................. 65 Figura 33 - Espectrograma da STFT do sinal de -80 kV correspondente ao ensaio #h60g90c com foco: (a) espectro de frequências; (b) instantes de tempo. .......................... 65 Figura 34 - Representação do critério de energia: sinal de +100 kV – ensaio #h30g90s. ........ 67 Figura 35 - Representação do critério de energia: sinal de -100 kV – ensaio #h60g90s. ......... 67 Figura 36 - Representação do critério de energia: sinal de +30 kV – ensaio #h30g0c. ........... 69 Figura 37 - Representação do critério de energia: sinal de -50 kV – ensaio #h30g0c. ............ 69 Figura 38 - Representação do critério de energia com foco na detecção e localização de ocorrências: sinal de +100 kV ensaio #h30g90s. ................................................ 70 Figura 39 - Representação do critério de energia com foco na detecção e localização de ocorrências: sinal de -100 kV ensaio #h60g90s. ................................................. 71 Figura 40 - Representação do critério de energia com foco na detecção e localização de ocorrências: sinal de -80 kV ensaio #h30g0c. ..................................................... 71 Figura 41 - Representação do critério de energia com foco na detecção e localização de ocorrências: sinal de -80 kV ensaio #h60g90c. ................................................... 72 Figura 42 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h30g90s – polo positivo. ............................................................................................................... 73 Figura 43 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h30g90s – polo negativo. .............................................................................................................. 74 Figura 44 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h30g0c – polo positivo. ............................................................................................................... 74 Figura 45 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h30g0c – polo negativo. .............................................................................................................. 75 Figura 46 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h60g0s – polo positivo. ............................................................................................................... 75 Figura 47 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h60g0s – polo negativo. .............................................................................................................. 76 Figura 48 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h60g90c – polo positivo. ............................................................................................................... 76 Figura 49 - Perfil de variabilidade espectral das descargas corona: ensaio #h60g90c – polo negativo. .............................................................................................................. 77 Figura 50 - Percentual de crescimento das descargas corona. ............................................ 78 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Configuração experimental. .................................................................................... 44 Tabela 2 – Características mais representativas. ...................................................................... 79 LISTA DE ABREVIATURAS AC – Alternating Current CV – Coeficiente de Variação DC – Direct Current DFT – Discrete Fourier Transform FEM – Finite Element Method FFT – Fast Fourier Transform HV – High Voltage HVAC – High Voltage Alternating Current HVDC – High Voltage Direct Current LT – Linha de Transmissão NR – Normas Regulamentadoras PD – Partial Discharge RMS – Root Mean Square RMSD – Root Mean Square Deviation SNR – Signal-to-Noise Ratio STATCOM – Static Compensators STFT – Short Time Fourier Transform SVC – Static Var Compensators SVM – Support Vector Machines TBD – Time Between Discharges TOA – Time of Arrival UHVDC – UltraHigh Voltage Direct Current WFP – Wavelet First Pulse SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13 1.1 Contexto e motivação ......................................................................................................... 13 1.2 Objetivos e contribuições do trabalho ................................................................................ 18 1.3 Organização do Trabalho.................................................................................................... 19 1.4 Publicações obtidas ............................................................................................................ 20 ALTA TENSÃO EM CORRENTE CONTÍNUA ................................................................ 21 2.1 Sistemas HVDC .................................................................................................................. 21 2.1.1 Sistemas AC versus DC ................................................................................................... 22 2.1.2 Manutenção em linhas e segurança do operador ............................................................. 23 2.1.3 Quantificação de tensão e corrente elétrica em sistemas HVDC .................................... 24 2.1.4 Importância da medição e detecção em sistemas HVDC ................................................ 25 2.1.5 Alternativas para detecção e quantificação de tensão e/ou corrente elétrica ................... 25 DESCARGAS CORONA E PROCESSAMENTO DE SINAIS ......................................... 28 3.1 Descargas Corona em sistemas HVDC .............................................................................. 28 3.1.1 Consequência das descargas corona em linhas de transmissão ....................................... 31 3.2 Técnicas para extração de características e reconhecimento de padrões de descarga corona em sistemas HVDC .................................................................................................................. 33 3.2.1 Análise estatística no domínio do tempo ......................................................................... 35 3.2.2 Análise no domínio da frequência a partir da Transformada de Fourier ......................... 37 3.2.3 Análise no domínio tempo-frequência a partir da STFT ................................................. 37 3.2.4 Filtragem digital .............................................................................................................. 38 3.2.5 Critério de energia de Hinkley ........................................................................................ 39 3.2.6 Coeficiente de variação ................................................................................................... 40 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................... 42 4.1 Banco de Ensaios ................................................................................................................ 42 4.2 Aquisição de Dados ............................................................................................................ 45 4.3 Processamento de Sinais e extração de características ....................................................... 47 RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................................... 50 5.1 Resultados e discussões da análise no domínio do tempo .................................................. 50 5.2 Resultados e discussões da análise no domínio do tempo-frequência................................ 57 5.3 Resultados e discussões do critério de energia de Hinkley ................................................ 65 5.4 Resultados e discussões da análise do Coeficiente de Variação ........................................ 73 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 80 6.1 Conclusão ........................................................................................................................... 80 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 82 Capítulo 1 INTRODUÇÃO Este capítulo fornece uma visão geral do presente trabalho, incluindo o contexto, motivação, objetivos e contribuições do estudo. Ao final, é fornecida a organização do documento e trabalhos relacionados publicados. 1.1 Contexto e motivação Os sistemas de energia elétrica de alta tensão em corrente contínua (HVDC – high voltage direct current) estão desempenhando um papel cada vez mais significativo na transmissão de energia elétrica devido a sua superioridade econômica e suas inúmeras vantagens sobre os sistemas de alta tensão em corrente alternada (HVAC – high voltage alternating current). Devido aos progressos realizados no campo da eletrônica de potência, os sistemas HVDC sofreram diversos aprimoramentos nas últimas décadas e se tornaram uma tecnologia consolidada para a transmissão de energia elétrica em longas distâncias, particularmente, acima de 500 km. Quando comparados aos sistemas HVAC, as principais vantagens dos sistemas HVDC são: perdas reduzidas na transmissão em alta tensão (HV – high voltage), controle total do fluxo de energia, número reduzido de componentes, possibilidade de interconexão de sistemas assíncronos em corrente alternada (AC – alternating current), e compensação de potência reativa não necessária (ALASSI et al., 2019; GHISLAIN OGOULOLA et al., 2020). As reivindicações a favor dos sistemas HVDC são suportadas pelas características particulares da transmissão de energia elétrica em corrente contínua (DC – direct current), tornando conveniente as aplicações destes sistemas. Por exemplo: (i) a transmissão DC resulta em menores perdas e custos em relação a uma linha de transmissão (LT) em corrente alternada Capítulo 1 - Introdução 14 equivalente; (ii) a transmissão AC via cabos é impraticável a longas distâncias, especialmente após a distância de equilíbrio, sendo que tal restrição não se aplica para as linhas DC; (iii) o fluxo de energia em um sistema DC pode ser facilmente controlado em alta velocidade, e, portanto, tendo como base uma sistema de controle apropriado, uma linha DC pode ser usada para aprimorar a estabilidade de um sistema AC; (iv) estações DC podem ser utilizadas para interligação de sistemas AC de diferentes frequências ou diferentes formas de controle, os custos e perdas do terminal, contudo, são maiores (ALASSI et al., 2019; ARRILLAGA, 2008). A curva típica de comparação de custos entre as transmissões AC e DC é ilustrada na Figura 1. A distância de equilíbrio é o ponto ao qual os custos de construção e operação de uma linha de transmissão DC e AC se equiparam. Para distâncias maiores que a distância de equilíbrio, os custos AC tornam-se gradativamente maiores que os custos DC para a mesma distância. A distância de equilíbrio encontra-se na faixa de 500 km a 800 km, podendo variar de acordo com alguns fatores (classes de custo específicas do país, avaliação de perdas, custo da passagem etc.). A curva correspondente a linha DC não é tão íngreme quanto a curva AC devido aos custos desta última serem consideravelmente mais baixos por quilômetro. No entanto, para linhas AC de longas distâncias, o custo de compensão de energia reativa intermediária deve ser levado em consideração (SIEMENS-AG, 2011). Figura 1 – Curva típica comparação entre transmissões AC e DC. Fonte: Autor. Por outro lado, é importante mencionar que nos sistemas HVDC, a medição deve ocorrer sob intenso campo eletromagnético que, por sua vez, possui elevados níveis de interferências e uma baixa relação sinal/ruído (SNR – signal-to-noise ratio). Cumpre frisar que, conforme relatado por XIN; YUAN (2016), o ambiente eletromagnético (ruído audível, Distância de Equilibro 500-800 km Custo Fixo HVDC Custo Fixo HVAC Capítulo 1 - Introdução 15 interferência de rádio e de campo elétrico etc.) causado pela descarga corona não apenas afeta a linha de transmissão ou equipamento HVDC (isto é, restringe a seleção do condutor e o projeto estrutural dos parâmetros da linha de transmissão etc.), como também traz consequências ambientais ao entorno das linhas de transmissão. No contexto ambiental, é importante mencionar que, com a implementação em larga escala das linhas de transmissão HVDC, os impactos ambientais causados por ondas eletromagnéticas se tornaram foco de atenção da comunidade de engenharia elétrica. Para tanto, métodos precisos e eficientes de monitoramento e medição, bem como procedimentos rigorosos de manutenção devem ser constantemente empregados a fim de se: (i) promover o monitoramento e a inspeção apropriada, detectando e caracterizando ocorrências de eventos inerentes (interferências, descarga corona, etc.); (ii) promover correções necessárias para o funcionamento adequado do sistema; (iii) garantir segurança; e (iv) garantir que o sistema siga o padrão ambiental eletromagnético (CUI et al., 2014a; WIJEWEERA et al., 2009; YUAN et al., 2016). Além do contexto ambiental, a segurança de pessoas é, também, um fator crítico na transmissão de energia elétrica. Por exemplo, durante a manutenção dos sistemas HVDC, é necessário garantir a proteção do operador evitando, assim, que o mesmo sofra choque elétrico durante o reparo dos equipamentos HV (SUO et al., 2020; WIJEWEERA et al., 2009). Para este propósito, atualmente existem dispositivos comerciais equipados com um sistema de segurança que emite avisos quando da presença de tensão ou corrente nos sistemas HVDC (LINESTART-INC, 2020). Diversos métodos de proteção e segurança de pessoas em HV são também encontrados na literatura científica, os quais se baseiam na detecção da presença de tensão ou corrente no equipamento HV, focando principalmente em duas abordagens: (i) métodos de medição por contato; e (ii) métodos de medição por aproximação baseados na medição do campo elétrico (WIJEWEERA et al., 2009; XIN; YUAN, 2016). Tais abordagens são de grande importância no estudo do ambiente eletromagnético no entorno das linhas de transmissão. As abordagens que focam na medição do campo elétrico têm sido particularmente mais difundidas em sistemas HV. Tais vantagens se devem ao fato de que as aplicações de medição de campos elétricos são robustas e consolidadas, uma vez que a medição do campo elétrico é utilizada para desenvolver sistemas de isolamento aprimorados e para garantir segurança de pessoas e equipamentos (WIJEWEERA et al., 2009). Diante disso, diversas pesquisas empenham-se para promover novas estratégias de monitoramento e inspeção de sistemas HVDC. SUO et al. (2020) aborda em seu trabalho uma forma de utilização da medição de campo elétrico no entorno das linhas de transmissão HVDC com vistas a garantir a segurança do operador contrachoques elétricos durante a manutenção da Capítulo 1 - Introdução 16 LT através da apresentação de um dispositivo inteligente equipado com um sistema de alerta preventivo, tendo como base a medição do campo elétrico na LT. Se o limiar de segurança for excedido, o dispositivo emitirá um sinal de alarme sonoro, solicitando que o operador se afaste da distância de risco. O trabalho de CUI et al. (2014b) propõe um sistema de medição distribuído baseado em uma rede de sensores sem fio coletando e monitorando o campo elétrico sob as linhas de transmissão HVDC. Para atingir este objetivo, o trabalho aborda o desenvolvimento de um sensor mecânico de campo elétrico baseado na Lei de Gauss empregando o microprocessador ARM e o módulo de radiofrequência Zigbee. O trabalho de XIN; YUAN (2016) apresenta um desenvolvimento de sensor de corrente aprimorado, baseado em resistência, para medição em banda larga da corrente de corona nas linhas HVDC. A partir de testes experimentais, o sistema proposto demonstrou adaptação ao ambiente eletromagnético complexo sob as linhas de transmissão, precisão, flexibilidade e estabilidade. Neste contexto, cabe ressaltar a importância da medição de corrente corona em sistemas HVDC, que desempenha um papel fundamental uma vez que fornece informações importantes, como ocorrência de descarga corona, interferências eletromagnéticas HV, intensidade de corrente elétrica, entre outras características relevantes aos projetos de linhas de transmissão e equipamentos (OTTO; READER, 2010; SUO et al., 2020; WIJEWEERA et al., 2009; XIN; YUAN, 2016; YUAN et al., 2012). As descargas corona são provocadas devido ao efeito causado pela ionização do ar ou outro fluído que envolve um condutor de alta tensão. Tratando- se de um efeito recorrente em linhas de transmissão HVDC, podendo provocar interferência de rádio e perda de energia elétrica. As perdas causadas por descargas corona podem afetar a operação segura e econômica das linhas de transmissão HVDC (XIN et al., 2016). Diante disso, ao projetar linhas de transmissão HVDC, é essencial prever o campo elétrico gerado pelas descargas corona a fim de mitigar os efeitos adversos causados pelo aumento da magnitude do campo elétrico no entorno das linhas. Dessa forma, as descargas corona tem sido alvo de diversas investigações teóricas e experimentais no campo vasto de descargas parciais (PD - partial discharge), com a finalidade de obter maior conhecimento e caracterização do fenômeno (ABOUELATTA et al., 2021; LIU et al., 2020). Assim, diversas abordagens foram propostas para estabelecer a detecção de HVDC com base no desenvolvimento de dispositivos de detecção de medição de corrente corona (LIU et al., 2011; XIN; YUAN, 2016; YUAN et al., 2012; ZHU et al., 2013) e dispositivos de detecção de medição de campo eletromagnético (CUI et al., 2018; SUO et al., 2020; WIJEWEERA et al., 2009; ZHU; LEE; PONG, 2019). Capítulo 1 - Introdução 17 Entretanto, devido à complexidade de calcular o campo elétrico das linhas HVDC que sofrem distorções provocadas pelos mecanismos das descargas corona (ZOU et al., 2017), tornou-se popular a utilização de técnicas de processamento digital de sinais elétricos ou acústicos que são medidos no sistema HV e carregam informações das descargas na forma de impulsos no domínio tempo. Métodos de reconhecimento de padrões ou algoritmos de aprendizagem de máquina também são empregados para extração de características. Recentes progressos no escopo de separação entre PD e fontes de ruídos são relatadas em (ARDILA- REY et al., 2020). Em relação aos sistemas HVDC, destacam-se estudos usando métodos de elementos finitos (FEM - Finite Element Method) (FARD; REID; HEPBURN, 2017), técnicas de classificação de máquina de vetor suporte (SVM - Support Vector Machines) (CAVALLINI et al., 2011), análise estatística baseada em tempo entre descargas (TBD - Time Between Discharges) (NIU; CAVALLINI; MONTANARI, 2008), monitoramento on-line de PD usando clusters baseados em mapas de classificação de tempo-frequência (JACOB; MCDERMID; KORDI, 2012) e reconhecimento de fonte on-line de PD usando redes neurais e análise de componentes independentes (CHANG et al., 2006). Diversos trabalhos têm sido conduzidos com foco principalmente na identificação corona de tensão e corrente de impulso (ÖNAL, 2018), identificação de sinais acústicos de descargas corona sob diferentes níveis de contaminação usando a transformada wavelet apresentando um modelo para extração de características relevantes do sinal (AL-GEELANI; PIAH; ABDUL-MALEK, 2018), desenvolvimento de algoritmo de filtragem wavelet first pulse (WFP), baseado em transformada wavelet, para medir os valores do tempo de chegada (TOA - Time of Arrival) de sinais eletromagnéticos para localização e estimação de fontes de descarga de corona em sistemas AC e DC (SZIRTES; CSELKO; BERTA, 2021), detecção acústica audiosônica de descarga corona aérea com base em transformada rápida de Fourier, técnicas de separação de descargas parciais e fontes de ruído elétrico (WAHYUDI et al., 2019) e a análise da correlação matemática das características espectrais do sinal corrente elétrica relacionado à corona na banda de frequências de 5-20 kHz para uma linha de transmissão UHVDC (ultrahigh voltage direct current) através da utilização do método de gaiola corona externa (LIU et al., 2018). Em complemento, o estudo das relações teóricas entre o espectro de energia de corrente corona e interferência de rádio em sistemas UHVDC (LIU et al., 2016). Apesar dos avanços e das contribuições existentes, ainda existem diversas lacunas de pesquisa para serem preenchidas no campo de extração de características de descarga corona, principalmente em sistemas HVDC e quanto aos métodos de determinação do perfil de descarga corona sob diferentes níveis de tensão e condições de operação. O principal motivo é a Capítulo 1 - Introdução 18 complexidade, precisão comprometida, custos e etapas adicionais envolvidas, além do conhecimento específico necessário ao operador indo acima do treinamento adequado normalmente realizado em conformidade com as legislações vigentes. Sendo assim, soluções mais claras de detecção, menos complexas e de baixo custo são particularmente mais interessantes e atrativas para as necessidades dos sistemas HVDC. 1.2 Objetivos e contribuições do trabalho Tendo como base a motivação discorrida, o presente trabalho aborda uma nova metodologia para extração e seleção de características relacionadas às descargas corona por meio do processamento digital de sinais de corrente elétrica em sistemas HVDC. A metodologia envolve uma nova combinação de parâmetros de processamento digital de sinais baseada em: (i) análise no domínio do tempo por meio da energia do sinal a partir do critério de Hinkley; (ii) análise no domínio do tempo-frequência com base na transformada de Fourier de tempo curto (STFT - short time Fourier transform); (iii) e Critério de Energia de Hinkley. A abordagem proposta permite a avaliação de informações importantes relativas às descargas corona, uma vez que a análise por meio das métricas de STFT fornece conhecimento sobre o mecanismo das descargas, bandas de frequência mais representativas e de maior intensidade dos sinais, duração dos impulsos das descargas e padrões de repetição. O critério de Hinkley, por outro lado, é uma métrica representativa que permite determinar, por meio dos tempos de chegada, os pontos de início e final das descargas baseado na energia dos sinais no tempo. Isto posto, a inovação do presente estudo é a implementação da métrica de coeficiente de variação (CV) a partir dos valores de magnitude da STFT nas frequências mais representativas e nos instantes de tempo em que ocorreram as descargas corona, os quais são determinados pelo critério de Hinkley. A nova métrica CVSTFT permite entregar a distribuição em frequência e intensidade (em porcentagem) somente no tempo de ocorrência das descargas corona a partir de um sinal de referência (baseline). Por fim, a nova combinação faz o uso da métrica do desvio da raiz média quadrática (RMSD – root mean square deviation) para determinar a melhor banda de frequências que demostra o percentual crescimento da descarga corona em função da tensão aplicada ao condutor HVDC. Uma das vantagens da presente proposta é sua simplicidade e rapidez no cálculo dos parâmetros uma vez que não faz uso de técnicas complexas de separação de ruído ou algoritmo de aprendizado de máquina, pois aborda o problema da quantificação do nível de tensão por Capítulo 1 - Introdução 19 meio de uma modelo de linearização do problema. Assim, a abordagem proposta visa estabelecer um limiar seguro para proteção no entorno das linhas de transmissão ou para fornecer informação útil sobre medição em campo de intensidade da corrente elétrica e da tensão, permitindo seu uso em sistemas microprocessados mais simples e em consonância as novas tecnologias de sistemas embarcados. Para validar a abordagem proposta para uma situação ampla de ensaios experimentais foram conduzidos para detecção de descarga corona em diferentes condições aplicando diversos valores de alta tensão em testes com e sem carga, e variação da posição da haste metálica condutiva e ângulo em relação a fonte de tensão. Sinais de corrente elétrica, foram medidos utilizando o sensor detector HVDC inovador, concebido por (DOTTO et al., 2022), o qual é equipado com um sistema de aquisição de dados e cujo princípio de medição é baseado no efeito corona. 1.3 Organização do Trabalho O presente trabalho segue estruturado em seis capítulos, da seguinte forma: ❖ Capítulo 1 – O primeiro capítulo trata da introdução do trabalho, apresentando a motivação da pesquisa, a importância das inspeções nas LT e da caracterização do efeito corona em sistemas HVDC, bem como a apresentação de trabalhos anteriores sobre o tema abordado e por fim, são apresentados os objetivos e organização do trabalho; ❖ Capítulo 2 – O segundo capítulo aborda o estado da arte de sobre o tema HVDC, investigando suas principais características e importância no setor de transmissão de energia elétrica; ❖ Capítulo 3 – O terceiro capítulo aborda o estado da arte sobre descargas corona e técnicas de processamento de sinais. Apresentando as principais técnicas de processamentos, bem como trabalhos anteriores relacionados a esta dissertação; ❖ Capítulo 4 – O quarto capítulo detalha equipamentos e procedimentos experimentais realizados para a implementação da abordagem proposta; ❖ Capítulo 5 – O quinto capítulo discute os resultados mais relevantes obtidos com a abordagem proposta; Capítulo 1 - Introdução 20 ❖ Capítulo 6 – O sexto capítulo conclui a dissertação, sintetizando as suas contribuições para a área do conhecimento, bem como aborda as perspectivas para trabalhos futuros. Ao final do trabalho encontra-se a bibliografia consultada e referenciada. 1.4 Publicações obtidas DAVID, G. A., OLIVEIRA JUNIOR, C. P., DOTTO, F. R. L., SANTOS, B. R. A. Feasibility Study of the Application of Signal Processing Techniques to Corona Discharge Characterization on HVDC Systems. In: Engineering Proceedings, v. 10, n. 1, p. 28, 2021. DAVID, G. A., OLIVEIRA JUNIOR, C. P., DOTTO, F. R. L., SANTOS, B. R. A. Corona discharge feature extraction in HVDC systems using the frequency spectrum of electrical current signals. In: Proceedings of the 14th Latin-American Congress on Electricity Generation and Transmission-CLAGTEE. 2022. G. A. David, P. O. Conceição, F. R. L. Dotto and B. R. Dos Santos, "New Signal Processing-Based Methodology for Optimal Feature Selection of Corona Discharges Measurement in HVDC Systems," in IEEE Transactions on Instrumentation and Measurement, DOI: 10.1109/TIM.2023.3260879. Capítulo 2 ALTA TENSÃO EM CORRENTE CONTÍNUA Este capítulo reporta a revisão da literatura sobre o tema HVDC, sendo apresentado os principais aspectos envolvidos na geração e transmissão, as características do sistema e a importância para o setor de energia elétrica. 2.1 Sistemas HVDC A capacidade total mundial de transmissão HVDC operacional, esperada até 2022, ultrapassa 400 GW. Sendo que mais da metade dessa capacidade (~52%) é concentrada somente na Ásia devido ao domínio do mercado por parte de países como China e Índia. Na China, por exemplo, projetos recentes demonstraram capacidade operacional de transmissão excedendo 6400 MW/± 800 kV, sendo que alguns já atingiram 10.000 MW (ALASSI et al., 2019). Devido a todos os recursos anteriormente mencionados, os sistemas HVDC são particularmente mais interessantes para a transmissão de energia elétrica em alto mar, florestas ou em grandes centros urbanos. O Brasil, por exemplo, comporta diversos elos de transmissão HVDC. Dentre eles, destacam-se: (i) a LT Itaipu que interliga a usina em Foz do Iguaçu, Paraná (PR), à estação de Ibiúna, São Paulo (SP), com uma extensão de 780 km (bipolo 2 × 3150 MW, ±600 kV); (ii) a LT Rio Madeira que interliga as usinas Santo Antônio e Jirau, em Porto Velho, Rondônia (RO), à estação de Araraquara, SP, com uma extensão de 2350 km, bipolar (bipolo 2 × 3150 MW, ±600 kV); e (iii) a LT Belo Monte (Xingu/Estreito) que interliga a usina Belo Monte, Pará (PA) à estação de Ibiraci, Minas Gerais (MG), com uma extensão de 2092 km (bipolo 2 × 2000 MW, ±800 kV) (ANEEL, 2019). Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 22 2.1.1 Sistemas AC versus DC A transferência de energia em uma linha AC depende da diferença angular entre os fasores de tensão entre os terminais da linha. Para um determinado nível de transferência de energia, esse ângulo aumenta com a distância. A transferência máxima de potência é limitada pelas considerações de estabilidade: estado estacionário e transitório. A capacidade de carga de uma linha AC é inversamente proporcional à distância de transmissão. Considerando que a capacidade de transmissão de energia das linhas DC não é afetada pela distância de transmissão, uma linha DC permite o controle total sobre a potência transmitida, bem como promove a capacidade de aprimoramento da estabilidade dinâmica nos sistemas AC, resultando em minimização de falhas e faltas (ARRILLAGA, 2008; SOOD, 2018). O controle de tensão é uma tarefa difícil e, por vezes, complexa, nas linhas AC, uma vez que o perfil de tensão varia com a carga da linha. Um sistema de controle de potência reativo apropriado se faz necessário a fim de se manter constante a tensão entre as extremidades da linha AC. O aumento da capacidade de transmissão de energia e o controle de tensão é possível por meio do uso de indutores shunt, capacitores em série, compensadores estáticos (SVC - static var compensators) e, recentemente, com o uso da nova geração de compensadores estáticos (STATCOM - static compensators). Os sistemas AC também requerem controladores de geração automática, os quais devem ser coordenados usando sinais de frequência. Ainda assim, esta operação é suscetível a presença de grandes oscilações de potência e transmissão de distúrbios (SOOD, 2018). A compensação de linha não necessária e a controlabilidade de fluxo de energia rápida e eficiente das linhas DC, faz com que os problemas e desafios anteriormente mencionados sejam minimizados. Além disso, uma capacidade de interconexão assíncrona entre dois sistemas de energia somente pode ser alcançada por meio de elos DC. Adicionalmente, em contraste com os sistemas AC, que operam como fases balanceadas e estão sujeitos a instabilidade quando um desequilíbrio ocorre, a impedância de aterramento é insignificante para correntes DC, sendo que um elo DC pode operar usando um condutor com retorno à terra (operação monopolar) (JOVCIC; AHMED, 2015). Apesar dos inúmeros benefícios anteriormente mencionados, os sistemas DC também possuem desvantagens (ARRILLAGA, 2008; SOOD, 2018): • Alto custo dos conversores de potência; • Incapacidade de usar transformadores para alterar os níveis de tensão; • Geração de componentes harmônicas; Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 23 • Exigência de potência reativa nos conversores; • Complexidade dos controles. 2.1.2 Manutenção em linhas e segurança do operador Dentre os diversos roteiros de manutenção adotados para os sistemas HVDC, destacam- se o processo de manutenção preditiva, cujo objetivo é prever e impedir condições de falha nos equipamentos e linhas de transmissão, e processo de manutenção preventiva, cujo obtivo é substituir componentes em períodos estipulados (antes da falha). A combinação de ambos os processos permite um planejamento correto da estratégia a ser adotada quando um processo de manutenção corretiva, por exemplo, for necessário. A escolha da técnica e equipamento apropriado para manutenção é uma etapa importante que influencia diretamente no tempo de operação de dispositivos, custos envolvidos, horas de trabalho, materiais de reposição etc. O principal objetivo é manter equipamentos e instalações em condição operacional satisfatória, fornecendo inspeção sistemática, detecção e correção de falhas incipientes, ensaios elétricos incluindo medições, ajustes e substituição de peças com vistas a impedir a ocorrência de falhas. Para tanto, sistemas de monitoramento equipados com tecnologia de ponta são empregados com o propósito de monitorar em tempo real e fornecer condições de controle para o sistema HVDC. Tecnologias avançadas baseadas em sensoriamento remoto, dispositivos wireless, drones, inteligência artificial e sistemas avançados de telecomunicação são empregados para atender este objetivo. Em síntese, os principais aspectos envolvidos são destacados a seguir (HAUSCHILD; LEMKE, 2014; MAWLE; PORATE; BURADE, 2015; WADHWA, 2017): • Inspeção - consiste em ações de inspeção visual padrão por meio de helicóptero, ou inspeção detalhada com auxílio de tecnologias de sensoriamento (infravermelho e ultravioleta, por exemplo) ou outros dispositivos anteriormente mencionados, com vistas a: verificar obstáculos sob as linhas, o estado das fundações, a condição das torres e dos condutores, a condição do sistema de aterramento e proteção, verificação do aspecto geral da linha de transmissão, verificação de vegetações e outras instalações (sistemas de telecomunicações, edifícios, rodovias etc.) nas proximidades da linha de transmissão. • Teste de isoladores - é realizado por meio de um dispositivo que obtém informações sobre distribuição de tensão ao longo dos elementos isolantes. O princípio de funcionamento deste dispositivo é baseado na medição automática e, dependendo da tecnologia do equipamento, a gravação do campo elétrico ao Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 24 longo do elemento isolante, o qual diminui consideravelmente frente a um isolador com revestimento interno que disposto sobre o elemento isolante. • Manutenção de linha viva - refere-se as atividades de manutenção preventiva e, quando necessário, corretiva. As atividades são realizadas em linhas energizadas, e incluem o reparo de condutores e torres, montagem de desvios de transmissão temporários, substituição de componentes de isoladores, e montagem de sinalizadores anticolisões de aves. É importante mencionar também que a segurança de pessoas, principalmente de operadores que atuam diretamente nas atividades de manutenção das linhas de transmissão, subestações e estações conversoras, é um dos aspectos cruciais nas atividades de manutenção. Neste contexto, o operador humano deve ser protegido contrachoques elétricos causados por diversas anomalias do sistema, como sobretensão, por exemplo, ou, até mesmo, por tensão residual em pontos desenergizados e/ou isolados. Falhas nos próprios equipamentos de manutenção e testes elétricos também são fatores de risco para o operador. A rigor, os equipamentos de manutenção devem prever todos estes aspectos, sendo que aparelhos de detecção HVDC, equipados com sistemas de aviso prévio ao operador quando da presença de tensão, devem ser empregados. Por outro lado, um sistema de proteção com tais características ainda é um desafio a ser superado em sistemas HVDC. Além da segurança do operador, as atividades de manutenção devem ser ambientalmente adequadas, de forma que os impactos ao meio ambiente sejam mínimos ou zero quando uma intervenção for necessária (CUI et al., 2014a; SUO et al., 2020; XIN; YUAN, 2016). 2.1.3 Quantificação de tensão e corrente elétrica em sistemas HVDC Atualmente, existem diversas normas técnicas direcionadas para os sistemas HVDC, as quais fornecem diretrizes para medição e testes, bem como a padronização das tecnologias envolvidas neste segmento. Os sistemas HVDC também devem operar em conformidade com normas regulamentadoras (NR) como, por exemplo, no caso do Brasil, a norma NR-10 (NR- 10, 2019), que estabelece diretrizes para segurança em instalações e serviços em eletricidade. No que diz respeito a medição e testes, as diretrizes são promovidas em sua maioria por normas técnicas internacionais. Como exemplo, é importante destacar a norma IEEE Std 1227-1990 IEEE Guide for the Measurement of DC Electric-Field Strength and Ion Related Quantities, (IEEE-STD-1227, 2010) que fornece orientações para medir a força do campo elétrico, a densidade de corrente de íons, condutividade, densidade de carga espacial monopolar e Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 25 densidade de carga espacial líquida nas proximidades dos equipamentos HVDC (linhas de transmissão, estações conversoras e aparelhos relacionados). Em síntese, a ênfase desta norma é direcionada para: (i) definição de terminologias aplicadas; (ii) descrição da inter-relação entre parâmetros elétricos envolvidos; (iii) descrição dos princípios operacionais dos instrumentos de medição; (iv) estabelecimento de métodos de calibração; (v) estabelecimento de procedimentos de medição; e (vi) identificação de fontes de erro de medição. 2.1.4 Importância da medição e detecção em sistemas HVDC A fim de se garantir a correta funcionalidade dos equipamentos, bem como a eficiência da transmissão HVDC, é essencial que ensaios elétricos e medições em HV sejam efetuadas. Para tanto, roteiros baseados em instruções normativas, bem como equipamentos devidamente calibrados são utilizados em diversos testes em HV focando principalmente em: (i) medições de tensão e corrente em sistemas HVDC; (ii) ensaios elétricos não destrutivos para verificação de compatibilidade eletromagnética; (iii) testes de isolamento elétrico e proteção; (iv) testes de sincronização entre tensões AC/DC. Adicionalmente, sistemas de monitoramento e inspeção em tempo real são empregados para fins de identificação e localização de falhas nos sistemas HVDC, as quais são reparadas por meio de roteiros de manutenção (BALIGA, 2011; GHISLAIN OGOULOLA et al., 2020; HAUSCHILD; LEMKE, 2014). 2.1.5 Alternativas para detecção e quantificação de tensão e/ou corrente elétrica O ambiente elétrico sob uma linha transmissão HVDC é influenciado por diversos fatores, tais como o campo elétrico, a densidade da corrente de íons, a densidade de carga espacial, a interferência de rádio, ruído audível e o campo magnético. O campo elétrico nas linhas de transmissão é um dos parâmetros mais importantes para avaliação dos impactos eletromagnéticos nos sistemas HVDC (CUI et al., 2014b, 2018). Neste contexto, muitas abordagens têm sido propostas para medição do campo elétrico em linhas de transmissão com vistas a controlar e minimizar os efeitos eletromagnéticos, reduzir impactos ambientais e garantir segurança de pessoas, principalmente, neste último caso, quando das atividades de manutenção (CUI et al., 2018; SUO et al., 2020; WIJEWEERA et al., 2009; XIN; YUAN, Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 26 2016; ZENG et al., 2008). As principais soluções atuais são classificadas em duas principais abordagens, descritas a seguir: • Medições diretas – são métodos de detecção por contato baseados na medição direta a partir de um dispositivo em contato com o equipamento HV; • Medições indiretas – são os métodos de detecção por aproximação, onde a grandeza que se deseja medir é inferida a partir de quantificação de uma outra como, por exemplo, a medição do campo elétrico nas proximidades do equipamento HV. Geralmente, em sistemas HV, a medição de quantidades transitórias não é registrada diretamente devido às suas grandes magnitudes. Medições de tensão e corrente em sistemas HVDC é um processo crítico influenciado por muitos fatores. Os equipamentos de HV possuem grandes capacitâncias dispersas em relação às estruturas aterradas e, portanto, grandes gradientes de tensão inerentes. Dessa forma, um operador humano, que manipula tais equipamentos, deve ser protegido contra estas sobretensões por meio de dispositivos de proteção. Além disso, são necessários sistemas robustos que devem ser capazes de controlar efeitos adversos como, por exemplo, a dissipação de calor dos circuitos e a interferência eletromagnética nas medições de tensão e corrente. As principais soluções empregadas na medição e testes em sistemas HVDC são descritas a seguir (HAUSCHILD; LEMKE, 2014; WADHWA, 2017) • Sphere gap - é considerado um dos métodos padrão para a medição do valor de pico de DC/AC e tensão de impulso. É também utilizado como verificador de voltímetros e outros dispositivos usados em circuitos medição e teste em HV. Seu princípio se baseia em duas esferas metálicas idênticas separadas por certa distância por um gás que forma uma lacuna entre elas. A diferença de potencial entre as esferas é obtida até que uma faísca passe entre elas. A resistência à ruptura do gás depende do tamanho das esferas, da distância entre elas, dentre outros fatores. • Folga da haste - pode ser usada para medir o valor de pico e tensão de impulso. Consiste em dois eletrodos de haste de 1,27 cm de seção quadrada em suas extremidades fixados em suportes isolantes. O comprimento da haste é igual ou superior a metade da folga entre a borda interna do suporte. O princípio de medição é baseado na detecção da tensão de ruptura, a qual é obtida a partir do aumento da folga da haste. Este aumento, por sua vez, é diretamente Capítulo 2 - Alta tensão em corrente contínua 27 proporcional ao aumento da densidade relativa do ar a partir de variações de pressão atmosférica. A tensão de ruptura também é sensível ao aumento da umidade relativa do ar, sendo que 15,5 mm Hg é a umidade padrão sob a qual o dispositivo é calibrado. • Voltímetro eletrostático – quando uma tensão é aplicada a um arranjo de eletrodo de placas paralelas, um campo elétrico é produzido entre as placas. Um voltímetro eletrostático mede a tensão a partir da força desenvolvida entre as placas tendo como base a disposição das mesmas, isto é, uma das placas é rigidamente fixa enquanto a outra sofre uma breve movimentação, por parte do eletrodo, da ordem de milissegundos. Neste caso, devido a movimentação relativamente rápido, a mudança no campo elétrico é desprezível. Uma vez que a força no campo elétrico é proporcional ao quadrado da tensão RMS (Vrms - root mean square), o dispositivo, portanto, infere a tensão, podendo ser utilizado em ambos os sistemas AC e DC. • Medição de alta corrente DC - correntes DC relativamente altas são utilizadas nos sistemas HVDC para testar disjuntores, para-raios de cabos etc. e ocorrem nas descargas atmosféricas, transientes de comutação e falhas de derivação. Diversos dispositivos especiais são utilizados para a medição de corrente corona. Dentre eles, destacam-se os dispositivos de medição baseada no efeito Hall. Assim, quando a corrente elétrica flui através de uma placa de metal disposta em um campo magnético perpendicular a ela, a força de Lorenz desviará os elétrons da estrutura do metal em uma direção perpendicular à direção do campo magnético e do fluxo da corrente. O deslocamento da carga resulta em uma força eletromotriz, na direção perpendicular, chamada de tensão de Hall. A tensão de Hall é proporcional à corrente, à densidade do fluxo magnético e inversamente proporcional à espessura da placa. Além do efeito Hall, a medição de correntes DC altas é também realizada por meio de: (i) dispositivos de correntes de frequência de alta potência, baseados em transformadores de corrente; (ii) dispositivos de medição de alta frequência e correntes de impulso, baseados no efeito de indução e efeito de Faraday. Capítulo 3 DESCARGAS CORONA E PROCESSAMENTO DE SINAIS Este capítulo apresenta a revisão da literatura sobre o tema descargas corona, assim como suas características e importância da detecção para os sistemas HVDC. Por fim, aborda-se as principais soluções para detecção de descargas corona, medições e caracterizações apresentando os principais trabalhos anteriores relacionados a área e as principais técnicas de processamento de sinais empregadas neste trabalho. 3.1 Descargas Corona em sistemas HVDC O efeito corona é o resultado da ionização do ar no entorno de elementos condutores, produzido pelos fortes campos elétricos presentes na superfície de pontos metálicos pontiagudos, condutores de pequeno diâmetro, dobras de ângulos agudos, entre outros, quando submetidos a altas tensões (ENA, 2009). O efeito corona permite com que todos os elétrons que se encontram em uma região de campo elétrico intenso sejam acelerados e ganhem energia suficiente para ionizar átomos de ar (com os quais colidem). Os pares íon/elétron produzidos são então acelerados e sofrem colisões. Neste caso, apenas as colisões de elétrons são ionizantes, ou seja, produzem o processo de decomposição em avalanche, restrita à região de ar adjacente ao "eletrodo corona". O mecanismo de formação do efeito corona é ilustrado na Figura 2. Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 29 Figura 2 – Mecanismo de formação do efeito corona. Fonte: Adaptado de (ZHANG et al., 2019). Posteriormente, o átomo atingido pode ser revertido ao seu estado inicial, liberando o excesso de energia em forma de calor, luz, energia acústica e radiações eletromagnéticas. Esse processo de ionização dá origem ao chamado efeito corona. A “coroa” aparece como uma fraca descarga (com aspecto semelhante à corona solar observada durante eclipses solares totais) irradiando para fora de seu ponto de ocorrência, produzindo ruído de crepitação que em alguns casos, nas proximidades das linhas de alta tensão, podendo ser audível. Toda a energia irradiada pelo efeito corona provém do campo elétrico do condutor carregado. Portanto, verifica-se uma dissipação de energia através da superfície desse condutor. No processo de descarga corona, devido à falta de homogeneidade do campo elétrico, a atividade de ionização primária é confinada a uma área próxima ao eletrodo onde o campo elétrico local é bastante forte. Em especial, esse fenômeno se desenvolve em uma fina camada de ar, pequena ou grande, próxima ao eletrodo cujo raio de curvatura é bastante pequeno. A fina camada de ar é onde a luminescência do gás ionizado ficará contida, sendo chamada de área de ionização, camada corona ou camada Halo (LIU et al., 2014). Fora desta área, onde o campo elétrico é fraco, dificilmente ocorre a ionização do ar ou o efeito de luminescência. O trabalho de HEDTKE; PFEIFFER; FRANCK (2019) apresenta o efeito corona ativo de forma visível em linhas HVAC (200kVrms) e HVDC (+240kV) conforme apresentado na figura 3. Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 30 Figura 3 – Efeito corona demonstrado em linhas HVAC e HVDC. Fonte: Adaptado de (HEDTKE; PFEIFFER; FRANCK, 2019). Os íons produzidos pelas descargas de corona nas linhas são transportados pelo vento e desaparecem conforme se distanciam da linha e à medida que as partículas carregadas se recombinam ou são depositadas nas superfícies ao entorno (ENA, 2009). A geração de íons por efeito corona depende da intensidade do campo elétrico nos conectores e condutores da linha de transmissão, denominado gradiente de tensão superficial. As linhas de transmissão e distribuição são projetadas com um gradiente de tensão superficial muito menor do que o gradiente de tensão inicial geralmente definido em 16 kV/cm, o que evita a produção de descargas corona. Em qualquer arranjo geométrico que se estabeleça um espaço não uniforme entre dois eletrodos submetidos a diferenças de potencial considerável, é possível a produção do fenômeno de descarga corona (MANTACH, 2018). A probabilidade de ocorrência de descargas corona nas linhas é reduzida usando acessórios com cantos arredondados e aplicando-se condutores de diâmetro maior. Para linhas de alta tensão e ultra alta tensão (acima de 275kV), o gradiente de tensão é reduzido (consequentemente reduzindo a probabilidade de descargas corona) se forem utilizados arranjos de condutores agrupados, ou seja, dois a quatro condutores por fase, separados por 40 cm ou mais por meio de espaçadores. Anéis de corona metálicos também podem ser instalados ao redor dos acessórios para distribuir o gradiente de tensão em uma área de superfície maior (ENA, 2009). O trabalho de PEEK (1920), foi o primeiro a citar ocorrência do efeito corona. Em sua publicação, o autor demonstra que, ao se elevar a tensão entre dois condutores lisos acima de Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 31 um determinado potencial crítico, ocorre um ruído sibilante, com emissão simultânea de fraca luz violeta que pode ser visualizada em ambientes escuros. Durante esse processo, observou-se ainda a formação de Ozônio e a presença de uma corrente de descarga que sustenta o processo de forma estável. Deste modo, o autor concluiu que, como resultado, a descarga corona é acompanhada por dissipação de energia manifestada de diversos modos: reações químicas, emissão de ruído, luz e calor. Em seu trabalho, o autor registrou a energia envolvida no processo através de um wattímetro que sofre aumento significativo com a elevação do nível de tensão aplicada, além de pontuar as diferenças entre descarga corona ocorrendo a partir de DC e AC. Fenômenos de descargas parciais são detectados com mais facilidade onde há uma distribuição de campo elétrico não uniforme, especialmente quando o isolamento dos equipamentos de isolação encontram-se deteriorados. Neste tipo de situação a distribuição de campo elétrico não uniforme evolui para campo elétrico local de maior intensidade (LIU et al., 2014). Durante a ocorrência de neblina e chuvas, as gotas de água podem elevar o gradiente de tensão da superfície dos condutores, aumentando a probabilidade de ocorrência de descargas corona. Esses eventos podem ocorrer durante condições atmosféricas de elevadas umidades, mas apresentam efeito temporário. 3.1.1 Consequência das descargas corona em linhas de transmissão As perdas causadas por descargas corona podem afetar a operação segura e econômica das linhas de transmissão HVDC, sendo não apenas um fator determinante para seleção para seção do condutor, mas também podendo afetar o investimento e o custo anual da operação (XIN et al., 2016). Além da dissipação de energia provocada pela ocorrência de descargas coronas em linhas de transmissão HVDC, Abouelatta et al. (2021) citam em seu trabalho que os sistemas de transmissão HVDC funcionam excedendo a tensão de início da corona, o que pode levar a diversos efeitos como por exemplo, ruído audível, interferência de rádio e TV, perdas de energia e deterioração dos sistemas de isolamento e problemas biológicos. Dessa forma, conforme ZOU et al. (2017), a distorção do campo eletromagnético causado pela descarga corona não apenas afeta a linha de transmissão ou equipamento HVDC (isto é, restringe a seleção do condutor e o projeto estrutural dos parâmetros da linha de transmissão etc.), como também traz consequências ambientais, assim como a formação de Ozônio e geração de campo de íon, podendo provocar perturbações no entorno. Em complemento, LIU et al. (2020), menciona que o ruído audível provocado pelas descargas corona tem um sério impacto negativo na vida e na saúde dos residentes das proximidades das linhas de transmissão. Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 32 Dessa forma, devido à grande atenção de órgãos de proteção ambiental e do público em geral, o ruído audível se tornou o fator dominante na seleção de condutores de linhas de transmissão HVDC e no projeto de estruturas de torres. Ademais, conforme mencionado anteriormente, outros fatores externos podem provocar o aumento significativo da amplitude das descargas coronas como precipitação, poluição, arranhões entre outros fatores que provocam distorções no gradiente de superfície dos condutores. Como efeito secundário, ocorre também o aumento do ruído audível. Para as variações de precipitação o fenômeno ocorre de forma mais intensa durante as transições entre o tempo seco e o úmido (HEDTKE; PFEIFFER; FRANCK, 2019). Problemas em equipamentos de medição também são registrados no entorno das linhas de transmissão. Segundo MA et al. (2017), a descarga corona nas proximidades das linhas HVDC criam fluxos de íons que induzem um efeito de carga ao equipamento de medição, causando erros de medição significativos. Ressalta-se ainda, que para linhas de transmissão HVAC, os íons gerados pelo efeito corona no primeiro semiciclo são atraídos novamente para linha devido à mudança na polaridade da tensão no segundo semiciclo. Entretanto, para transmissão HVDC, os íons do entorno da linha são atraídos para o solo devido ao campo elétrico. Como resultado, há íons carregados em quase todo o espaço entre os cabos do polo e o solo provocado distúrbios no entorno da linha de transmissão (ZHU; LEE; PONG, 2019). Embora linhas de transmissão de alta tensão sejam adequadas para transmissão de energia em longas distâncias, a alta tensão presente neste tipo de sistema favorece a ocorrência de descargas coronas uma vez que o efeito corona ocorre quando a tensão (ou seja, o campo elétrico) do condutor de transmissão é forte o suficiente (ZHU; LEE; PONG, 2019). Neste contexto, a busca contínua de baixas perdas nas linhas de transmissão HVDC tem elevado a tensão de trabalho nos sistemas de transmissão, atualmente para valores médios de 800kV, requerendo medições ou monitoramento dos campos elétricos próximos às linhas de transmissão HVDC para garantir a segurança, prever a estabilidade e falhas e diagnosticar a confiabilidade dos sistemas de transmissão de energia (MA et al., 2017). Além dos sistemas HVDC, HVAC os efeitos de descargas coronas também podem surgir em sistemas híbridos AC/DC (ZHOU et al., 2012). No entanto, é difícil calcular o campo elétrico das linhas HVDC devido aos complicados mecanismos de descarga corona (ZOU et al., 2017). O estudo profundo sobre as características da corrente corona pode melhorar ainda mais a compreensão teórica do desempenho do efeito corona e contribuir com a analise do mecanismo e as distorções eletromagnéticas das linhas de transmissão, que tem grande importância na otimização do projeto das linhas de transmissão Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 33 (LIU et al., 2018). Em vista disto, ao projetar linhas de transmissão HVDC, é fundamental prever o campo elétrico gerado por descargas corona, a fim de mitigar efeitos adversos causados pelo aumento da magnitude do campo elétrico no solo e no entorno. Dessa forma, torna-se de grande importância a detecção e a caracterização da ocorrência de descargas corona em sistemas HVDC, auxiliando na realização do projeto ideal e segurança da manutenção em linhas de transmissão, dessa forma atendendo aos requisitos de segurança e proteção ambiental. 3.2 Técnicas para extração de características e reconhecimento de padrões de descarga corona em sistemas HVDC A descrição matemática de uma descarga corona depende de inúmeras variáveis relacionadas à geometria dos eletrodos, às condições dos gases no entorno e à forma com que o campo elétrico é estabelecido no eletrodo ativo (RAIZER, 1991). Por essa razão, pesquisadores buscam por modelos que descrevam de forma adequada o fenômeno físico conforme as características particulares dos problemas estudados. Neste contexto, diversos métodos de detecção de descarga corona são relatados na literatura, conforme relatado por LIU et al. (2014), na teoria da detecção de corona apresentam-se vários métodos relativamente novos, como por exemplo, método de detecção por imagem infravermelha, método de detecção por imagem ultravioleta, método de detecção ultrassônica corona e método de detecção por pulso ultravioleta. Entre os efeitos provocados pelo fenômeno, a corrente corona é a característica mais típica para caracterizar a descarga corona. Mediante a isto, diversos trabalhos foram realizados no campo de pesquisa da corrente corona e alcançaram muitos resultados significativos. Dessa forma, pesquisas sobre as características do espectro da corrente corona e as relações entre os efeitos corona são de grande importância no projeto de otimização da linha de transmissão UHVDC (LIU et al., 2016). Existem várias técnicas e métodos de processamento de sinal para extração e seleção de características. Quando se trata da detecção de eventos e reconhecimento de padrões, como a detecção de transitórios, detecção (e/ou localização) de descargas parciais e descargas corona em sinais de corrente elétrica em alta tensão, a literatura científica reporta um vasto número de trabalhos de pesquisa que reportam estudos de casos com aplicação efetiva de diversas técnicas de processamento de sinais. Destacam-se neste sentido os seguintes Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 34 trabalhos: (CASTRO et al., 2017; LETERME; BARNES; VAN HERTEM, 2018; MARKALOUS et al., 2008; ZHU et al., 2013). De forma geral, os sinais podem ser analisados quanto ao domínio do tempo, domínio da frequência e domínio tempo-frequência. A análise no domínio do tempo é o tipo de estudo mais comum já que esta é a forma original em que o sinal é obtido, isto é, no caso de um sinal lido pelo dispositivo detector HVDC o valor do sinal (corrente elétrica) é estendido para todos os números reais em várias instâncias separadas em intervalos discretos de tempo (amostras). A partir deste sinal, análises estatísticas podem ser conduzidas tendo como base séries temporais, métricas representativas quando a tendência e desvio de padrões de comportamento. O uso de técnicas de processamento digital de sinais para reconhecimento de padrões de descarga corona tornou-se popular devido ao fato de fornecer informações para otimização do processo através das características atuais dos sinais. A partir disso, conforme relatado anteriormente, diversos trabalhos têm abordado o tema de medições e caracterização de descargas corona em sistemas HVDC, entre os quais diversos resultados significativos foram alcançados, como por exemplo, a identificação corona de tensão e corrente de impulso (ÖNAL, 2018), identificação de sinais acústicos de descargas corona sob diferentes níveis de contaminação usando a transformada wavelet (AL-GEELANI; PIAH; ABDUL-MALEK, 2018), detecção acústica audiosônica de descarga corona aérea com base em FFT, técnicas de separação de descargas parciais e fontes de ruído elétrico (WAHYUDI et al., 2019). O trabalho de XIN et al. (2016) desenvolve um sistema preciso medição de corrente corona com base no método dos elementos finitos, instrumentação virtual, tecnologias anti- interferência eletromagnéticas e comunicação de fibra óptica através de um sistema fixo com circuito equivalente RLC não linear. De maneira similar, o trabalho de YUAN et al. (2012) apresenta o desenvolvimento de um sensor de medição de corrente corona utilizando métodos de elementos finitos e métodos de simulação de carga em ambiente HVDC, cuja impedância se mantem invariável para variações de altas frequências com largura de banda até 14 MHz. Em ambos os trabalhos, os autores abordam as medições e análise no domínio do tempo. O trabalho de OTTO; READER (2010) aborda a utilização de técnica de gaiola corona em sistemas HVAC com o intuito de prever o ruído de rádio gerado pelo efeito corona aplicados em sistemas HVDC. Em seu trabalho o autor utilizou técnicas de processamentos de sinais no domínio do tempo e frequência para apresentar funções que descrevem as condições de excitação do fenômeno, bem como calcular características de propagação do ruído corona ao longo das linhas de energia. O trabalho de LIU et al. (2018) apresenta análise das características espectrais da corrente corona em linha de transmissão UHVDC através da utilização do método Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 35 de gaiola corona externa implantados a linhas de transmissão UHVDC em Pequim e Tibete. O autor analisou a relação entre os diferentes componentes do espectro da corrente corona que comina em uma expressão linear universal representando a correlação entre os componentes espectrais sob diferentes condições na faixa de 5-20 kHz. Em complemento, LIU et al. (2016) aborda o estudo de características espectrais e a regularidade de variação da corrente corona dentro da banda do espectro de 0,15 - 4 MHz, além da correlação entre o espectro de energia da corrente corona e a interferência de rádio para as mesmas condições. De acordo com a análise apresentada em seu trabalho, os espectros de energia de corrente corona e a interferência de rádio dentro da banda de 0,15 - 4 MHz são aproximadamente lineares. Embora haja diversos trabalhos que estudem a detecção do efeito corona, poucos trabalhos tem por objetivo de caracterização do efeito corona no condutor. Também conforme citado por XIN et al. (2016), estudos sobre perdas por efeito corona em linhas de transmissão são mais focados principalmente em linhas AC, sendo a pesquisas em linhas de transmissão DC apresentadas em menor quantidade. Este fato ocorre devido a maior uso de sistemas AC para transmissão de energia até o presente estudo (XIN et al., 2016). Porém, com a ampliação da tecnologia de transmissão DC, em especial HVDC, surge a necessidade de ampliação de pesquisas que abordem mais amplamente este tema. No entanto, existem poucas pesquisas que abordam descargas corona e processamentos de sinais voltadas para buscas de características espectrais de corrente corona, isto é, com foco em obter padrões de taxa de repetição, intensidade de pulso e outras características da descargas corona são refletidas no espectro da corrente corona (LIU et al., 2018). Logo, uma grande parte dos trabalhos de processamentos de sinais relacionados as descargas coronas em sistemas HVDC são realizados com analises no domínio do tempo. 3.2.1 Análise estatística no domínio do tempo Destaca-se como análise estatística no domínio do tempo empregada no presente trabalho o estudo do valor médio, valor de pico (máximo valor ± do sinal), e valor RMS (Figura 4. O valor RMS é definido como a raiz quadrada da média aritmética dos valores quadráticos de um sinal discreto conforme dado pela equação 1: 𝐸𝑟𝑚𝑠 = √ 1 𝑁 ∑ 𝑥𝑖²𝑁 𝑘=1 (1) Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 36 Onde N é o número discreto de amostras corresponde a constante de integração de tempo; xi é o sinal de corrente elétrica discreto composto por cada uma de suas amostras i (CASTRO et al., 2017). Figura 4 - Representação esquemática da aplicação de algumas métricas de análise. Fonte: Autor. Uma outra forma de análise estatística de sinais se dá por meio da análise da tendência e padrão de comportamento tendo como referência uma função crescente de coeficiente linear (linear fit – 450). Neste caso, o coeficiente de determinação R² (R-squared) pode ser empregado para o cálculo da variação percentual dos valores de um sinal em relação a uma função crescente de coeficiente linear. O coeficiente de determinação R² tem como base o coeficiente de correlação que expressa o quão forte é a relação entre as duas variáveis. Sendo assim, o coeficiente de determinação R² expresso em (2) é definido como o quadrado do coeficiente de correlação 𝐶𝑐, expresso por (3): 𝑅𝑠𝑞𝑢𝑎𝑟𝑒𝑑 = 𝐶𝑐 2 (2) 𝐶𝑐 = ∑ ∑ (𝑥𝑝(𝑘) − �̅�𝑝)𝑁 𝑘=1 − (𝑥𝐸(𝑘) − �̅�𝐸) √∑ (𝑥𝑝(𝑘) − �̅�𝑝) 2𝑁 𝑘=1 − √∑ (𝑥𝐸(𝑘) − �̅�𝐸)2𝑁 𝑘=1 𝑛 𝑘=0 (3) onde 𝑥𝐸 e 𝑥𝑝 são respectivamente o sinal de corrente elétrica investigado no presente estudo e o sinal de referência (linear fit). Pico M á x im o P o s it iv o Tempo RMS Máximo Negativo Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 37 3.2.2 Análise no domínio da frequência a partir da Transformada de Fourier Neste tipo de análise, o gráfico no domínio da frequência apresenta a quantidade da variável física (amplitude, energia e potência) dentro de cada faixa de frequência ao longo de um intervalo de várias frequências. Teoricamente, uma análise no domínio da frequência pode incluir informações sobre a mudança de fase que devem ser aplicadas a cada senoide para recuperação do sinal de tempo original. Mais importante do que isto é saber que um sinal no domínio do tempo pode ser convertido para o domínio da frequência por meio de ferramentas matemáticas permitindo a obtenção do chamado espectro de frequências. Por fim, uma análise no domínio tempo-frequência identifica o instante de tempo que estão presentes as várias frequências de um sinal. Sendo assim, é possível identificar os instantes de tempo em que ocorreram fenômenos de maior intensidade (por meio de um espectrograma), como uma descarga corona, e ao mesmo tempo em que é possível observar quais são as frequências deste fenômeno. Quando se deseja obter uma melhor compreensão das ocorrências nos dados, utiliza-se o espectro de frequência, que fornece em muitos casos, a informação detalhada sobre a condição de sinais que não pode ser obtida no domínio tempo. O conteúdo de frequências pode ser obtido pela aplicação de métodos e ferramentas como as transformadas de Fourier. Um dos métodos utilizados na análise em frequência do sinal é a Transformada Rápida de Fourier (FFT – Fast Fourier Transform). A FFT é um método de computar a Transformada Discreta de Fourier (DFT – Discrete Fourier Transform) de maneira eficiente, com menor custo computacional e o menor tempo de processamento (CONCEIÇÃO JUNIOR et al., 2016). 3.2.3 Análise no domínio tempo-frequência a partir da STFT A transformada de Fourier de curto prazo (STFT – short-time Fourier transform) pode ser empregada para avaliar a mudança do conteúdo em frequência ao longo do tempo nos sinais de corrente elétrica obtidos a partir os ensaios realizados com o dispositivo com vistas a detectar informações relevantes quanto aos instantes de tempo e frequências em que predominam a ocorrência de fenômenos. A STFT de um sinal é obtida deslizando uma janela de análise de comprimento 𝑀 sobre o sinal e calculando a DFT dos sinais em cada segmento conforme dado por (4): Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 38 𝑋(𝑘 + 1) = ∑ 𝑥(𝑛 + 1) 𝑁−1 𝑛=0 𝑓𝑁 𝐾𝑛 (4) onde 𝑋 é o valor calculado da DFT do sinal 𝑥 para 𝑁 amostras do sinal e frequência 𝑓𝑁 (MATHWORKS, 2023). A janela percorre todo o sinal em intervalos de 𝑅 amostras. Se um comprimento de sobreposição 𝐿 diferente de zero é especificado, a sobreposição dos segmentos com janelas compensa a atenuação do sinal nas bordas da janela. A DFT de cada segmento é adicionada à uma matriz que contém a magnitude e a fase para cada instante de tempo e frequência. O número de linhas na matriz STFT é igual ao número de pontos da DFT (MATHWORKS, 2020; SMITH, 2020). O número de colunas é dado por (5): 𝑘 = ⌊ 𝑁𝑥 − 𝐿 𝑀 − 𝐿 ⌋ (5) onde 𝑁𝑥 é o comprimento do sinal original 𝑥(𝑛) e os símbolos ⌊⌋ denotam a função piso. A matriz STFT é dada por 𝑋(𝑓) = [𝑋1(𝑓) 𝑋2(𝑓) 𝑋3(𝑓) … 𝑋𝑘(𝑓)] de tal forma que o 𝑚-ésimo elemento desta matriz é dado por (6): 𝑋𝑚(𝑓) = ∑ 𝑥(𝑛)𝑔(𝑛 − 𝑚𝑅) ∞ 𝑛=−∞ 𝑒−𝑗2𝜋𝑓𝑛 (6) onde 𝑔(𝑛) é função janela de comprimento 𝑀; 𝑋𝑚(𝑓) é a DFT dos segmentos janelados e centrados sobre o tempo 𝑚𝑅; 𝑅 é o tamanho dos saltos (intervalos) entre DFTs sucessivas. O quadrado da magnitude da STFT produz a representação por espectrograma a partir da função de densidade espectral de potência (MATHWORKS, 2020; SMITH, 2020). 3.2.4 Filtragem digital Os filtros digitais de resposta infinita ao impulso (IIR) são empregados para seleção de informações relevantes dos sinais coletados durante os ensaios experimentais em laboratório conduzidos com o dispositivo detector HVDC. Um filtro digital IIR 𝐻(𝑒𝑗𝜔) pode ser concebido a partir de sua transformação para um projeto de filtro analógico 𝐻𝑐(𝑗Ω) equivalente. Este filtro Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 39 analógico é então concebido por meio de um cálculo padrão. Uma vez que o filtro analógico equivalente foi efetivamente concebido, seu projeto é mapeado novamente para domínio discreto visando a obtenção de um filtro digital que atenda as especificações (OPPENHEIM, A. V.; SCHAFER, R. W.; BUCK, 2013). No presente projeto, foram empregados projetos de filtros digitais IIR Butterworth, que visa a obtenção de uma resposta em frequência o mais plana possível da banda de passagem. O quadrado da magnitude da resposta em frequência de um filtro Butterworth de ordem 𝑁, onde, quanto maior o valor de 𝑁 mais próximo de um filtro passa-baixas ideal (Figura 5). Figura 5 - Exemplo de atenuação de filtro do tipo Butterworth para diferentes ordens N Fonte: Adaptado de (OPPENHEIM, A. V.; SCHAFER, R. W.; BUCK, 2013) 3.2.5 Critério de energia de Hinkley O critério de energia de Hinkley trata-se de uma técnica avançada de processamento de sinais que caracteriza variações predominantes no conteúdo em frequência e na energia de um sinal aleatório, sendo capaz de detectar diversas informações relevantes como tempo de chegada e mudanças no padrão de comportamento do sinal ao longo do tempo (CASTRO et al., 2017; MARKALOUS et al., 2008). O critério de energia 𝑆 (𝑘) de um sinal discreto 𝑥 é definido como a somatória cumulativa dos valores de amplitude deste sinal, conforme expresso por (7): 𝑆(𝑘) = ∑ (𝑥𝑘 2 − 𝑆𝑁 𝑁 ) 𝑖 𝑘=1 (7) onde 𝑖 é o número de amostras de uma parte selecionada do sinal, 𝑆𝑁 representa a energia total e 𝑁 é o comprimento do sinal. É importante mencionar que, segundo Hinkley (1971), o ponto de mínimo global da curva do critério de energia corresponde ao tempo de início do evento ou mudança Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 40 predominante no sinal. De mesma forma, o ponto de mínimo global é efetivamente usado para detecção de transitórios e localização de início de descargas parciais, conforme relatado nos trabalhos de Castro et al. (2016, 2017), onde tal métrica foi emprega para detecção de descargas parciais em transformadores de potência utilizando sinais acústicos de transdutores piezelétricos. Essa métrica será utilizada no contexto do presente estudo com propósito de detecção dos pontos início e final das descargas corona em sistemas HVDC, uma tarefa difícil sem este cálculo em função das inúmeras fontes de ruídos presentes nos sinais. 3.2.6 Coeficiente de variação O coeficiente de variação (CV) é uma medida padronizada de dispersão de uma distribuição de probabilidade ou distribuição de frequência que mostra a razão entre o desvio padrão 𝜎 dos dados e seu valor médio 𝜇, isto é, mede a variabilidade dos dados. O CV é significativo como uma unidade de razão, que também pode ser expresso em porcentagem, conforme (8): 𝐶𝑉 = 𝜎 𝜇 (8) Assim, um valor pequeno de CV significa que os dados têm pequenas variações ou dispersão entre amostras nos dados. No caso de sinais de corrente elétrica que carregam informações de descarga corona ao redor de um condutor, podem ocorrer flutuações nos espectros dos sinais muito diferentes em duas ou mais condições de operação ou de tensão aplicadas. O presente estudo, portanto, introduz o CV para análises de vários segmentos espectrais nos instantes de tempo de ocorrência das descargas, medindo a variabilidade espectral para diferentes níveis de tensão e condições de operação, visando determinar diferentes perfis de descarga corona em sistemas HVDC. Para tanto, a metodologia proposta faz uso da matriz STFT 𝑋𝑚(𝑓), apenas para os elementos 𝑚 referentes a uma janela de tempo 𝑚𝑅 entre os instantes de tempo de início e fim da descarga corona, determinados pelo critério de Hinkley, para um dado sinal de corrente elétrica. Dessa forma, a taxa de desvio padrão para a média a partir da matriz SFTF é obtida através das equações (9) e (10): 𝜇𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓) = | 1 𝑁 ∑ 𝑋𝑚(𝑓) 𝑛𝑒 𝑚=𝑛𝑠 | (9) Capítulo 3 - Descargas corona e Processamento de sinais 41 𝜎𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓) = √ 1 𝑁 ∑ (𝑋𝑚(𝑓) − 𝜇𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓))2 𝑛𝑒 𝑚=𝑛𝑠 (10) Dessa forma, gerando a métrica 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇, conforme (11): 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓) = 𝜎𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓) 𝜇𝑆𝑇𝐹𝑇(𝑓) (11) Neste caso, 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇 será mais representativa quanto a variação do perfil da descarga corona para duas ou mais condições de operação ou tensões aplicadas a uma faixa estreita de frequência. Para aumentar a robustez da metodologia proposta, foi proposto o uso do desvio quadrático médio (RMSD – root mean square deviation), que é uma métrica representativa baseada na norma Euclidiana, para medir variações entre valores observados a partir de uma referência. O presente estudo introduz o cálculo do RMSD para a matriz 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇 visando determinar a melhor banda de frequências que expressa o percentual de crescimento das descargas corona em função da tensão aplicada (seguindo um ajuste linear) adotando um valor de referência. O RMSD calculado para a matriz 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇 é expresso em (12): 𝑅𝑀𝑆𝐷𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇 = ∑ √ [𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇,𝑂(𝑘) − 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇,𝑅(𝑘)] 2 [𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇,𝑅(𝑘)] 2 𝜔𝐹 𝑘=𝜔1 (12) onde, 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇,𝑅(𝑘) e 𝐶𝑉𝑆𝑇𝐹𝑇,𝑂(𝑘), representam os perfis de variabilidade e distribuição de um range de frequência a partir de 𝜔1 até 𝜔𝐹, nos instantes de tempo de ocorrência de uma descarga corona para um sinal de corrente elétrica tomado como referência 𝑅 e aquele em que observada maior intensidade 𝑂. No presente estudo, o sinal de referência adotado corresponde a condição mais branda, isto é, o valor mais baixo de tensão aplicada, que indica pouca transição entre ruído e descarga devido à baixa intensidade da amplitude da corrente. Assim, quando a condição transita para descarga corona correspondente ao valor mais alto de tensão aplicada, é esperado que o índice RMSD irá aumentar, permitindo a seleção de um percentual de aumento de acordo com as condições de operação e nível de tensão aplicada. Capítulo 4 MATERIAL E MÉTODOS Neste capítulo, a modelagem do problema, desenvolvimento do experimento, medições, instrumentação e análise dos dados são descritos. A eficácia da abordagem proposta foi avaliada através de testes experimentais e coleta de dados para extração de características. 4.1 Banco de Ensaios Uma análise experimental foi realizada em laboratório com ambiente e condições controladas visando a medição de sinais de corrente elétrica que carregam informações sobre descargas corona sob diferentes condições de operação em sistemas HVDC, a fim de se validar a metodologia proposta. A Figura 6 apresenta o diagrama esquemático da metodologia proposta para o experimento. O sinal de corrente elétrica é medido a partir de um sensor eletromecânico HVDC concebido por DOTTO et al. (2022), equipado com extremidade pontiaguda, que viabiliza o fenômeno corona pelo efeito das pontas, o qual é fixado a uma haste de contato que funciona como condutor de alta tensão (Figura 7.a). Os ensaios foram conduzidos aplicando tensões variando de ±10 kV a ±100 kV utilizando uma fonte DC de até 110 kV modelo Baur PGK 110/ HB (Figura 7.b) com saída retificada em meia onda (possibilidade de inversão da barra retificadora para escolha de semiciclos senoidais positivos ou negativos). O dispositivo detector HVDC foi devidamente fixado em uma haste de alumino (Figura 7.c) e o experimento foi reproduzido para diferentes condições de operação, permitindo a obtenção de diferentes perfis de descarga corona, isto é, com carga e sem carga com distanciamento fixo de 1,5 metro entre os eletrodos positivo e negativo em diferentes distancias e ângulos do sistema de medição em relação à fonte, conforme detalhamento apresentado na Tabela 1 e destacada na Figura 8. Capítulo 4 - Material e métodos 43 Figura 6: Diagrama esquemático da bancada de teste experimental. Fonte: Autor. Figura 7: (a) Dispositivo detector HVDC; (b) Fonte DC de até 120 kV. (a) (b) (c) Fonte: Autor. Fonte DC Interface USB-irDA2 Haste com divisor resistivo Dispositivo Detector HVDC Comunicação Infravermelho Capítulo 4 - Material e métodos 44 Figura 8: Banco de ensaios exemplificado duas das condições testadas: (a) Dispositivo posicionado à 0° em relação a fonte e, haste à 30 cm de distância; (b) Dispositivo posicionado à 90° em relação a fonte e, haste à 60 cm de distância. (a) (b) Fonte: Autor. Tabela 1 – Configuração experimental. Identificação do ensaio Detalhamento Medições #h30g0s Haste posicionada à 30 cm; dispositivo à 0 graus em relação a fonte; ensaio sem carga de ±10 kV à ±100 kV #h30g90s Haste posicionada à 30 cm; dispositivo à 90 graus em relação a fonte; ensaio sem carga #h30g0c Haste posicionada à 30 cm; dispositivo à 0 graus em relação a fonte; ensaio com carga de ±10 kV à ±80 kV #h30g90c Haste posicionada à 30 cm; dispositivo à 90 graus em relação a fonte; ensaio com carga #h60g0s Haste posicionada à 60 cm; dispositivo à 0 graus em relação a fonte; ensaio sem carga de ±10 kV à ±100 kV #h60g90s Haste posicionada à 60 cm; dispositivo à 90 graus em relação a fonte; ensaio sem carga #h60g0c Haste posicionada à 60 cm; dispositivo à 0 graus em relação a fonte; ensaio com carga de ±10 kV à ±80 kV #h60g90c Haste posicionada à 60 cm; dispositivo à 90 graus em relação a fonte; ensaio com carga Cabe ressaltar que as tensões aplicadas aos ensaios conduzidos com carga não ultrapassaram o valor de ±80 kV, devido a limitação construtiva do divisor resistivo (distância física segura de isolação), isto é, ±80 kV é o valor máximo suportado pelo dispositivo bem como as variáveis e influências do ambiente como temperatura, humidade e pressão atmosférica, foram mantidas constantes em 30° C, 78%, e 101,6 kPa, respectivamente. Capítulo 4 - Material e métodos 45 4.2 Aquisição de Dados Conforme mencionado anteriormente, os sinais elétricos foram coletados e armazenados durante os ensaios experimentais através do dispositivo HVDC desenvolvido por DOTTO et al. (2022), a versão final do dispositivo é apresentada na Figura 9. O dispositivo HVDC trata-se de uma alternativa tecnológica baseada no estudo e desenvolvimento de um dispositivo eletrônico portátil simples e eficiente que possibilita a detecção e quantificação de alta tensão e polaridade em sistemas HVDC. Figura 9: Dispositivo de Detecção HVDC. Fonte: Adaptado de (DOTTO et al., 2022). O princípio de medição do dispositivo baseia-se no efeito corona que é induzido pela presença de uma ponta proporcionando um caminho para a passagem de corrente elétrica. Este princípio pode ser ilustrado por um material condutor energizado cuja superfície tem uma forma não esférica com cargas elétricas distribuídas que permanecem em equilíbrio potencial. Quando tal potencial elétrico atinge uma certa intensidade, a deformação do campo elétrico causada pela maior densidade de carga nas regiões pontiagudas pode exceder o gradiente disruptivo do ar e ionizar as moléculas de gás no ar circundante. Conforme explicado anteriormente na Seção 3.1, o processo de ionização que dá origem ao efeito corona geralmente é iniciado pela aceleração de elétrons livres em um meio gasoso, que capta energia suficiente para produzir novos elétrons ao colidir com outros átomos. Subsequentemente, o átomo que foi atingido pode voltar ao seu estado inicial, liberando o excesso de energia na forma de calor, luz, energia acústica e radiação eletromagnética. Toda energia irradiada deve vir do campo elétrico da carga condutora, fazendo com que a ponta do dispositivo produza uma corrente proporcional a este campo. No dispositivo HVDC, a detecção ocorre quando o dispositivo entra em contato com o sistema HVDC com base no efeito corona. A corrente elétrica de alta tensão resultante é Capítulo 4 - Material e métodos 46 detectada através da ponta de alumínio mantida a uma distância de cerca de 5mm da superfície energizada. O sinal de corrente elétri