UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Campus de Botucatu Departamento de Física e Biofísica Marília Lisbôa de Oliveira ESTUDOS ESTRUTURAIS COM A IMPORTINA-α E SEQUÊNCIAS DE LOCALIZAÇÃO NUCLEAR (NLS) DE PROTEÍNAS ENVOLVIDAS NO METABOLISMO DE GLICOGÊNIO DO FUNGO Neurospora crassa Botucatu/ SP 2010 Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado como parte dos pré-requisitos para a obtenção do título de Física Médica, à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Campus de Botucatu Departamento de Física e Biofísica ESTUDOS ESTRUTURAIS COM A IMPORTINA-α E SEQUÊNCIAS DE LOCALIZAÇÃO NUCLEAR (NLS) DE PROTEÍNAS ENVOLVIDAS NO METABOLISMO DE GLICOGÊNIO DO FUNGO Neurospora crassa Orientador: Marcos Roberto de Mattos Fontes Co-orientadora: Agnes Alessandra Sekijima Takeda Botucatu/ SP 2010 Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado como parte dos pré-requisitos para a obtenção do título de Física Médica, à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉC. AQUIS. TRATAMENTO DA INFORM. DIVISÃO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: ROSEMEIRE APARECIDA VICENTE Oliveira, Marília Lisbôa. Estudos estruturais com a importina-α e Sequências de Localização Nuclear (NLS) de proteínas envolvidas no metabolismo de Neurospora crassa / Marília Lisbôa de Oliveira. - Botucatu, 2010 Trabalho de conclusão de curso (bacharelado - Física Médica) - Instituto de Biociências de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, 2010. Orientador: Marcos Roberto de Mattos Fontes Co-Orientador: Agnes Alessandra Sekijima Takeda Capes: 20901003 1. Biofísica molecular. 2. Cristalografia. 3. Neurospora crassa. 4. Glicogênio. Palavras-chave: Cristalização; Importina; Sequência de Localização Nuclear. Marília Lisbôa de Oliveira Estudos estruturais com a importina-α e sequências de localização nuclear (NLS) de proteínas envolvidas no metabolismo de glicogênio do fungo Neurospora crassa Botucatu, 19 de novembro de 2010. _____________________________ Orientador ___________________________ Banca examinadora Botucatu/ SP 2010 Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado como parte dos pré-requisitos para a obtenção do título de Física Médica, à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. RESUMO Proteínas que apresentam atividades no núcleo e possuem sequência de localização nuclear (NLS) tem seu deslocamento dependente do heterodímero importina-α/β. A importina- (ImpA) é responsável pelo reconhecimento inicial do substrato a ser importado através da interação com os NLS. Os sinais são caracterizados por apresentar um ou mais grupos de aminoácidos básicos, denominados como sequências monopartidas e bipartidas. O fungo Neurospora crassa vem sendo utilizado há mais de 70 anos como organismo modelo em estudos de expressão gênica, desenvolvimento e diferenciação celular, ritmo circadiano, defesa do genoma, bem como outros aspectos da biologia de eucariotos. A presença de um grande número de genes no genoma de N. crassa ainda com funções desconhecidas aponta este organismo como um promissor modelo para o estudo de novos mecanismos genéticos e bioquímicos ainda não identificados. Considerando a importância do metabolismo do glicogênio para os organismos, o presente trabalho teve como objetivo o estudo estrutural de complexos de ImpA com peptídeos NLSs (NCM e NCB) de proteínas envolvidas no metabolismo de glicogênio do fungo N. crassa, utilizando técnicas de cristalografia de proteínas. Monocristais dos complexos ImpA-NCM e ImpA-NCB foram obtidos para a coleta dos dados de difração de raios-X, resultando em dois conjuntos de dados à 2,1Å e 2,45Å de resolução, respectivamente. Após elucidação da estrutura da ImpA, mapas de densidade eletrônica gerados revelaram uma densidade eletrônica no sítio principal de reconhecimento de NLS da ImpA de ambas estruturas, possibilitando modelagem dos peptídeos. Em uma comparação do mapa de densidade eletrônica obtido de ambos complexos com um mapa de uma estrutura nativa de ImpA (70- 529) coletada à 2,0Å de resolução, a qual usualmente apresenta um peptídeo “contaminante” no sitio de ligação, foi constatada uma semelhança entres as densidades do sítio de ligação principal, com exceção da densidade ocupada pelo resíduos Lys232 E Lys546 dos peptídeos NCM e NCB respectivamente. Isso sugere uma ocupação parcial de ambos peptídeos a esse sítio em virtude de uma possível baixa interação dos mesmos com a ImpA de Mus musculus. Para ambos os peptídeos, ensaios de interação precisam ser feitos para avaliar a afinidade dos mesmos, porém para o peptídeo NCM, a adição de resíduos nas extremidades N e C-terminal podem aumentar as chances de interação com a ImpA, uma vez que diminui a flexibilidade dos resíduos que poderiam interagir com resíduos do sítio de reconhecimento de NLS da ImpA. 1 1. OBJETIVO Estudar a ligação de possíveis sequências de localização nuclear (NLS), de proteínas envolvidas no metabolismo do glicogênio em Neurospora crassa, no modelo experimental importina-α com o emprego da técnica de cristalografia de raios-X. 2. INTRODUÇÃO 2.1 Importação para o núcleo celular dependente da importina. O tráfego de macromoléculas entre o citoplasma e o núcleo é uma atividade fundamental das células eucariontes. O intercâmbio entre esses dois compartimentos celulares se dá através do complexo do poro nuclear (NPC), o qual é constituído por diversas moléculas incorporadas ao envelope nuclear. O direcionamento de proteínas para o núcleo é determinado pela presença de uma sequência de localização nuclear (NLS), normalmente composta por um ou mais grupos de resíduos básicos de aminoácidos (CINGOLANI et al., 1999). O transporte de moléculas maiores que 50 kDa através do envelope nuclear, normalmente acontece por meio de um processo ativo capaz de bombear macromoléculas contra um gradiente de concentração. Os processos de importação e exportação acontecem por meio dos poros da membrana nuclear. No entanto, um conjunto de diferentes receptores é necessário em cada caso. Nas células animais, há dois importantes receptores: a importina α e a importina β (FRADIN, 2005). Elas reconhecem as NLSs, formando um heterodímero capaz de encontrar o seu caminho no envelope nuclear e através do NPC. O processo de importação das proteínas com NLS pode ser dividido em várias etapas (Figura 1). Inicialmente, no citoplasma, a importina- (ImpB) liga a importina- (ImpA) deslocando o domínio auto-inibitório (Importin beta binding - IBB) (KOBE, 1999) da mesma. Após a formação do heterodímero (importina-/), é possível a ligação da proteína a ser importada, via reconhecimento do NLS. (IMAMOTO et al., 1995; GÖRLICH et al., 1995). A ImpB então, ancora o complexo aos filamentos citoplasmáticos do complexo do poro nuclear (NPC) e ocorre o transporte através do poro em virtude dessas interações (GÖRLICH et al., 1996; MOORE & BLOBEL, 1993). 2 No núcleo, o complexo proteína-substrato se desacopla com a ligação da proteína GTPase Ran (Ran-GTP) à subunidade  da importina, alterando sua conformação e liberando o IBB da ImpA. Esse domínio então passa a competir com a NLS da proteína importada, promovendo uma diminuição de afinidade da carga, facilitando a liberação da mesma em virtude do mecanismo auto-inibitório (KOBE, 1999). Uma otimização do processo de desacoplamento da carga e reciclagem da ImpA ocorre com auxílio da nucleoporina Nup50, que liga-se a uma das regiões de ligação do NLS e uma porção C-terminal da importina, em virtude de maior afinidade com a mesma (MATSUURA & STEWART, 2005). Interações entre cargas e carreadores são orquestradas pela molécula Ran, a qual cicla entre os estados ligados GTP- e GDP. O nucleotídeo Ran é controlado pela RanGEF (guanine nucleotide exchange factor), a qual catalisa a recarga de RanGDP com GTP, e RanGAP, o qual estimula a hidrólise de GTP (Figura 1). A Ran exerce papel importante, uma vez que o mecanismo de reciclagem das macromoléculas envolvidas é dependente de energia. Figura 1. Visão geral da importação nuclear de proteínas. a) No citoplasma, um complexo de importação entre NLS e o heterodímero importina α-β é formado. b) Ciclos da Ran entre núcleo e citoplasma (STEWART, 2007). 3 A reciclagem de ambas as subunidades α e β da importina ocorre de maneira independente através do NPC. (GÖRLICH et al., 1996; MOORE & BLOBEL, 1993). Enquanto a ImpB volta para o citoplasma na forma de complexo com a RanGTP, a ImpA é exportada ativamente ao formar um complexo com a exportina CAS (Cellular apoptosis susceptibility) complexada a RanGTP. A CAS, com uma afinidade maior que o Nup50, remove-o da ImpA (MATSUURA & STEWART, 2005) e, formando o complexo ImpA-CAS-RanGTP, segue rumo ao citoplasma. Uma vez de volta ao citoplasma, a RanGAP e RanBP1 (que removem RanGTP da ImpB), estimulam a hidrólise do GTP ligado a Ran da ImpB e CAS. Dessa maneira, ocorre liberação das importinas para um novo ciclo (STEWART, 2007). 2.2 Estrutura cristalográfica da Importina-. Análises estruturais da importina-α (ImpA) revelaram três domínios funcionais. Um deles é o domínio de ligação da importina-β, o qual é chamado de IBB, localizado na região compreendida dos resíduos 10-55 na posição N-terminal (GÖRLICH et al., 1996; WEIS et al., 1996). O segundo domínio é uma região central hidrofóbica conhecida como domínio armadillo repeat (arm). São ao todo dez motivos repetidos (Figura 2) e cada repetição de arm consiste de três α-hélices que são conectadas por loops. Além disso, foi demonstrado que um NLS clássico liga-se a dois sítios dentro de uma superfície helicoidal do domínio arm na importina α (CONTI et al., 1998; KOBE, 1999; FONTES et al.,2000). O terceiro domínio é uma curta região ácida na posição C-terminal. Esta região liga-se a proteína CAS que possui a função de exportar a ImpA do nucleoplasma. A ImpA é responsável pelo reconhecimento inicial do substrato a ser importado pela ligação do seu NLS e tem aproximadamente 60 kDa. 4 Figura 2. Representação em diagrama de fitas da ImpA (PDB-1IAL). Os motivos arm apresentam cerca de 40 resíduos constituídos por três hélices alfa, denominadas H1, H2 e H3 (KOBE, 1999). As repetições apresentam cerca de trinta graus de rotação entre si, resultando em uma molécula alongada e torcida. As hélices H3 da porção côncava da molécula apresentam resíduos de triptofano e asparagina conservados, cercados por resíduos ácidos. Esse arranjo confere um sítio de ligação com características hidrofóbicas e eletrostáticas, (CONTI & KURIYAN, 2000) em que a ocupação de determinadas posições, denominadas de P1 a P6 no sítio principal (S1) e P1’ a P5’ no sítio secundário (S2), são importantes para reconhecimento de NLS (FONTES et al., 2000) (Figura 3). Figura 3. Posições de ligação na importina-α nos sítios secundário (esquerda) e principal (direita). A letra D representa o ácido aspártico, N a asparagina, Y a tirosina, W o triptofano, E o ácido glutâmico e R a arginina. 5 A ligação de NLSs monopartidos se dá no sítio principal localizado entre o primeiro e o quarto arm. Os NLSs bipartidos ocupam os dois sítios de ligação, no qual cada sítio reconhece uma das sequências básicas. A sequência linker entre as sequências básicas faz pouco contato com o receptor, consistente com sua tolerância a mutações. A afinidade da interação importina-sequência alvo é um parâmetro crítico na determinação da eficiência do transporte (CATIMEL et al., 2001). 2.3 Neurospora crassa e a era pós genômica. Os organismos pertencentes ao reino dos fungos têm exercido um papel fundamental no avanço da compreensão dos mecanismos moleculares de organismos eucariotos devido as suas facilidades de manipulação e o conhecimento das características genéticas e bioquímicas envolvidas em seu ciclo de vida. O fungo Neurospora crassa é um dos fungos filamentosos melhores conhecidos, sendo utilizado, há mais de 70 anos, como organismo modelo em estudos de expressão gênica, desenvolvimento e diferenciação celular, ritmo circadiano, defesa do genoma, bem como outros aspectos da biologia de eucariotos. Pesquisas utilizando N. crassa como modelo, nas primeiras décadas do século XX determinaram o destino da genética moderna e da biologia molecular. Na década de 40, Beadle e Tatum utilizando N. crassa estabeleceram a relação entre genes e proteínas, formulando a hipótese de “um gene, uma enzima”. O seqüenciamento do genoma de N. crassa, aliado aos avanços das metodologias disponíveis envolvidas na inativação de genes específicos deu início às análises da genômica funcional do fungo. A inativação de genes de interesse, juntamente com a análise de sua regulação sob diferentes condições, bem como a análise fenotípica das linhagens mutantes, tem como objetivo expandir o conhecimento do genoma funcional em fungos, permitindo a realização de comparações entre importantes processos biológicos em organismos distintos, com o intuito de revelar os mecanismos bioquímicos envolvidos nos processos de regulação das vias metabólicas dos organismos. 6 3. METODOLOGIA. O fluxograma da Figura 4 mostra, de maneira simplificada, as etapas para resolução de uma estrutura protéica por difração de raios-X. Figura 4. Etapas para resolução de uma estrutura protéica por difração de raios-X de maneira simplificada. 3.1. Obtenção da amostra de importina-α truncada (70-529). A amostra de ImpA empregada nos experimentos de cristalização foi obtida a partir da expressão em larga escala da importina-α truncada N-terminal (70-529) em bactérias Escherichia coli, linhagens BL21(DE3) pLysS, contendo o vetor pET- 30a (Novagem) com a sequência que codifica importina de Mus musculus, isoforma 2, provenientes de uma cultura permanente. A forma truncada foi escolhida a fim de se evitar competições entre os peptídeos NLS e o domínio auto-inibitório da proteína e sua expressão foi realizada de acordo com Teh e colaboradores (TEH, 1999). Clonagem, expressão e purificação da proteína alvo recombinante Obtenção de cristais convenientes para difração de raios-X Coleta de dados de difração de raios-X Processamento dos dados de difração de raios-X e caracterização inicial dos cristais Resolução do problema de fases pelo método MR Refinamento/Modelagem Análise da qualidade do modelo Modelo final 7 Posteriormente, o extrato de E.coli contendo a proteína de interesse foi submetido à purificação pelo método de cromatografia de afinidade em coluna cromatográfica HiTrap (GE Healthcare) e cromatógrafo (Akta Purifier – GE Healthcare) seguida de uma purificação por cromatografia de troca iônica. A amostra de ImpA pura foi concentrada em Amicon-30 (Millipore ) até uma concentração de 18mg/mL, sendo armazenada à -20°C. 3.3 Peptídeos NLS. Proteínas relacionadas ao metabolismo do glicogênio em N. crassa foram indicadas pelo grupo da Prof. Maria Célia Bertolini, da Unesp de Araraquara, como proteínas as quais precisam apresentam atividades no núcleo. Seqüências das proteínas NCU03482 (NCM) e NCU06679 (NCB) foram selecionadas como potenciais NLSs. Uma foi indicada como potencial sequência monopartida (NCM) e outra como bipartida (NCB) (Tabela 1). Ambas sequências dos peptídeos NLS foram fornecidas pela Prof. Maria Célia Bertolini. Tabela 1. Potenciais NLS de proteínas relacionadas a regulação do metabolismo do glicogênio. Código de acesso Sequência NLS NCM (NCU03482) 228EVHKKKEI235 NCB (NCU06679) 533EARRAAQMTGAERRHRKTRTS550 3.4. Cristalização da importina-α truncada (70-529). Os experimentos preliminares de cristalização foram feitos na busca de melhores condições de cristalização, empregando-se a difusão de vapor por gota suspensa (hanging drop) (MCPHERSON, 1982). Para o NCM, a gota foi constituída de 1µL da solução de proteína (18 mg/mL), 0,5 µL da solução do peptídeo (12mg/mL) e 0,5 µL da solução do reservatório. Para o NCB, a gota foi constituída de 2µL da solução de proteína (18 mg/mL), 1 µL da solução do peptídeo (25mg/mL) e 1 µL da solução do reservatório. Em ambos os casos, buscou-se a relação proteína : ligante de 1:8 na gota. A solução do reservatório, 8 que continha 0,5 mL de solução de citrato de sódio, atuando como agente precipitante, com concentrações molares variáveis (de 0,5 à 0,75 M, variando de 0,05 em 0,05 M); 0,1mM de citrato de sódio pH 6,0 como tampão e 10mM de DTT como aditivo foi a estratégia empregada para experimentos com ambos peptídeos. Esses sistemas fechados foram mantidos sob temperatura constante de 18 C e cristais cresceram após 15-20 dias. 3.5 Coleta e processamento de dados de difração de raios-X. Após a obtenção dos cristais com peptídeos mono e bipartidos, os mesmos foram colocados em loops, com diâmetros adequados ao tamanho dos cristais, na com adição de 25% de glicerol atuando como crioprotetor. Tais cristais foram levados ao LNLS (Laboratório Nacional de Luz Síncrotron), em Campinas-SP, a fim de se coletar dados de difração de raios-X. Os dados obtidos dos dois conjuntos foram processados utilizando-se o programa HKL 2000 (OTWINOWSKI & MINOR, 1997). 3.6 Elucidação, refinamento e modelagem da estruturas. Essa etapa consistiu em se fazer a substituição molecular utilizando-se o programa AMoRe – Automated Package for Molecular Replacement e os arquivos de coordenadas 1EJL para o conjunto de dados da NCM e 1EJY para NCB (FONTES, et al. 2000). Os modelos gerados pela substituição molecular foram então refinados até a máxima concordância entre os dados experimentais e a estereoquímica da molécula com o uso do programa Refmac. A modelagem manual foi feita no programa Coot, lançando mão dos mapas de densidade eletrônica gerados na etapa anterior, da sequência da proteína e da estrutura da proteína modelo. Durante esta etapa de refinamento, foram feitos ajustes manuais do modelo à densidade eletrônica. O modelo de ImpA contendo peptídeo NCM teve seu refinamento iniciado com fatores R iniciais de 29,13% e Rfree 29,32%. Após a adição e modelagem dos peptídeos nas densidades eletrônicas presentes nos sítios de ligação da ImpA, ciclos de refinamento de posição e fator temperatura B foram efetuados. Deleções de cadeias laterais de alguns resíduos, cujas densidades eletrônicas não foram 9 informativas para posicionamento das mesmas, foram efetuadas no modelo bem como mutações para os resíduos quando regiões apresentaram-se imprecisas. O mesmo procedimento foi realizado para o modelo de ImpA com o peptídeo NCB tendo como início do refinamento valores de fatores R inicial de 28,60% e Rfree 29,28%. Posteriormente, um refinamento da ocupação dos resíduos dos modelos e a adição de moléculas de água foram executados, seguidos de refinamentos de posição e fator temperatura. A qualidade estereoquímica dos modelos obtidos foram checadas no PROCHECK (LASKOWSKI et al, 1993), através dos parâmetros como Rwork e Rfree e pela geração do Gráfico de Ramachandran. 4. RESULTADOS 4.1. Cristalização, coleta e processamento de dados de difração de raios- X. Após empregarmos as condições de cristalização necessárias, utilizando co- cristalização, obtivemos monocristais (Figura 5) adequados para a coleta dos dados de difração. A condição de cristalização do cristal com NCM foi de 0,65M de citrato de sódio pH 6,0 e 10mM de DTT. O cristal com NCB foi obtido com 0,75M de citrato de sódio pH 6,0 e 10mM de DTT. (a) (b) Figura 5. Monocristais de ImpA com NLS NCB (a) e NCM (b). Foram coletados conjuntos de dados de 2,1 e 2,45 Å, correspondentes aos complexos de ImpA com NCM e NCB, respectivamente. As imagens de todos os conjuntos foram coletadas com oscilação de diferença de 1° entre cada imagem. 10 Todos os cristais eram isomorfos (grupo espacial P212121) em relação ao cristal da ImpA nativa e com outros complexos cristalizados. Dados experimentais encontram-se na tabela 2. Tabela 2 – Estatísticas da coleta de dados de difração de raios-X. ImpA- NCM ImpA- NCB Cela unitária (Å) a=78,52 b=89,94 c=99,62 α==γ=90 a=78,11 b=89,92 c=98,69 α==γ=90 Grupo espacial P212121 Resolução (Å) 40,0-2,1 (2,18- 2,10)a 40-2,45 (2,54-2,45)a Reflexões únicas 41687 24887 Dados completos (%) 99,1 (94,0)a 94,7 (93,1)a Rmerge b (%) 6,6(47,0)a 11,6(53,0)a I/σ (I) 20,79 (2,38)a 10,41(2,06)a Redundância 4,9 (4,1)a 4,8 (3,3)a a Números em parênteses correspondem aos dados de mais alta resolução, b Rmerge = hkl(i(|I hkl,i-|))/hkl,i , onde I hkl,i é a intensidadede cada medida individual da reflexão com índices de Miller h, k and l,e é a intensidade média daquela reflexão. Calculado para I > -3σ (I). 4.2. Elucidação, refinamento e modelagem da estruturas. Com a finalidade de se estudar a possibilidade de interação entre proteínas relacionadas ao metabolismo do glicogênio e a Importina  (ImpA), possíveis sequências de localização nuclear (NLS) foram selecionadas para experimentos de co-cristalização. Os experimentos realizados resultaram na obtenção de dois modelos da ImpA. Esses modelos da ImpA (Figuras 6 e 8) foram submetidos a modelagem manual e refinados até a máxima concordância entre os dados 11 experimentais e calculados. Ao término do processo, diagramas Ramachandran foram gerados, confirmando a qualidade estereoquímica dos modelos (Tabela 3). Tabela 3- Estatísticas de refinamento. ImpA-NCM ImpA -NMB Resolução (Å) 40,0-2,1 (2,18-2,10)a 40,0-2,45(2,54-2,45)a Número de reflexões. F>0 39402 23431 Completeza (%) 99,1 (94,0)a 94,7 (93,1)a Rcryst b (%) 19,05 19,06 Rfree c (%) 22,41 23,90 Número de átomos (não hidrogênios): Proteína H2O 3287 132 3252 - Fator de temperatura médio (Å2)e 46,96 57,48 Gráfico de Ramachandrand Resíduos nas regiões mais favoráveis (não permitidas) (%) 95 (0,3) 95(0,3) a Números em parênteses correspondem aos dados de mais alta resolução. b Rcryst = hkl(||Fobshkl|-|Fcalchkl||)/|Fobshkl|, onde |Fobshkl| e |Fcalchkl| são as amplitudes dos fatores de estrutura observados e calculados. c Rfree é equivalente ao Rcryst ,mas calculado com base em 5% do total de reflexões obtidas. d Calculado com o programa PROCHECK (Laskowski et al., 1993). Ao verificar os sítios de ligação de NLS dos modelos de ImpA, foi constatada a presença de densidade eletrônica significativa somente no sítio de ligação principal. O peptídeo NCM possui sequência 228EVHKKKEI235 e foi possível modelá-lo completamente dentro da densidade (Figura 7). Dentre os resíduos, não foi encontrada densidade eletrônica para as cadeias laterais da His230, e Lys233. Na posição onde o Glu234 foi inserido, a densidade eletrônica encontrou-se maior do que a do resíduo. Em relação ao peptídeo NCB, cuja sequência é 533EARRAAQMTGAERH 12 RKTRSR550, havia densidade somente para os resíduos 542ERHRKTRS549 (Figura 8). Dentre os resíduos modelados, não foi encontrada densidade eletrônica para a cadeias laterais dos resíduos Glu542, Arg543 e His544. Não foi encontrada densidade eletrônica no sítio de ligação secundário da ImpA. 5. DISCUSSÃO 5.1. Análise da interação do complexo ImpA-NCM. Ao verificar os sítios de ligação de NLS dos modelos de ImpA, foi confirmada a presença de densidade eletrônica significativa no sítio de ligação principal - S1 (Figura 6), ao contrário dos outros complexos de ImpA e peptídeos NLS monopartidos elucidados. Figura 6. Representação em diagrama de fitas da importina-α truncada N-terminal (70-529) com o peptídeo NCM (em verde), no sítio de ligação principal. Após modelagem do peptídeo NCM (228EVHKKKEI235), a estrutura da ImpA com o ligante NCM foi sobreposta à uma estrutura nativa da ImpA à 2,0Å de resolução, a qual apresenta um contaminante no sitio de ligação. A presença dessa densidade eletrônica na ImpA nativa ocorreu devido as fortes cargas negativas na região de ligação do NLS. Dessa maneira, há uma grande probabilidade da ligação de peptídeos e outras proteínas. Essas moléculas “contaminantes” são provenientes 13 do processo de preparação da amostra (expressão e purificação) e a densidade eletrônica encontrada no sítio de ligação de NLS da ImpA nativa corresponde a elas, uma vez que a proteína truncada em sua porção N-terminal empregada nos experimentos não apresenta o domínio auto inibitório. De maneira a comparar a proteína nativa com o complexo NCM, mapas de densidade eletrônica de ambas as moléculas foram gerados e sobrepostos a fim de compará-los. (Figura 7). Com a sobreposição dos mapas de densidade eletrônica, foram constatadas semelhanças entres as densidades, com exceção da densidade ocupada pelo resíduo Lys232. Na posição ocupada pelo resíduo Glu234 a densidade eletrônica encontrou-se maior do que a do resíduo, ao contrario da ausência de densidade eletrônica para a cadeia lateral do resíduo Lys233. Um mapa de omissão (omit map) utilizando o pacote de programas CCP4 foi gerado para auxiliar nas análises, o que confirmou a ausência de densidade eletrônica para a cadeia lateral do resíduo Lys233, bem como para o resíduo de Glu234, sendo ausente também nesse último interações do tipo ponte de hidrogênio entre a ImpA e os átomos de oxigênio da cadeia lateral do resíduo. Essas interações são importantes na posição em que o Glu234 encontra-se, pois são essenciais para o reconhecimento de NLS (FONTES, 2003). Os resultados obtidos até o momento podem sugerir uma ocupação parcial do peptídeo em virtude de uma baixa interação dos mesmos com a ImpA de Mus musculus. 14 Figura 7. Sítio principal (S1) da ImpA na presença do ligante NCM. Mapa de densidade eletrônica 2|Fobs|-|Fcalc|, contornado com desvio padrão de 1,2, correspondendo ao peptídeo NCM. Mapa em azul corresponde aos dados experimentais na presença do peptídeo. Mapa em rosa indica dados da ImpA nativa. Entre parênteses estão indicadas as posições do sítio de ligação principal. 5.2. Análise da interação do complexo ImpA-NCB. Ao verificar os sítios de ligação de NLS dos modelos de ImpA, constatou-se a presença de densidade eletrônica significativa somente no sítio de ligação principal S1 (Figura 8). Figura 8. Representação em diagrama de fitas da importina-α truncada N-terminal (70-529) com o peptídeo NCB (em amarelo), no sítio S1. 15 No sítio de ligação secundário, uma densidade apareceu muito fraca, o que não indicou a presença de algum ligante nessa região, assim como na região entre o sítios principal e secundário sítio principal, sugerindo que o peptídeo empregado no experimento não seja bipartido. Além disso, o número de resíduos entre Arg534 e His 544 é menor do que o numero de resíduos indicado em estudos anteriores, que indicam 10-12 resíduos de distancia (FONTES, 2000). Em relação à densidade eletrônica presente no sítio de ligação principal, somente uma porção do peptídeo NCB foi modelada, resultando no modelo ImpA contendo o peptídeo 542ERHRKTRS549 (Figura 9). O mesmo procedimento de análise do peptídeo NCM foi aplicado para o ligante NCB. Embora esse peptídeo tenha ocupado a densidade eletrônica de maneira satisfatória quando comparado ao NCM, a posição ocupada pela Arg545 é ocupada prioritariamente por resíduo de lisina nas estruturas de complexos já elucidados (FONTES, 2000). Novamente uma densidade eletrônica para a cadeia lateral de uma lisina (Lys546) indica a possível ocupação do ligante em S1. Figura 9. Sítio principal (S1) da ImpA na presença do ligante NCB. Mapa de densidade eletrônica 2|Fobs|-|Fcalc|, contornado com desvio padrão de 1,2, correspondendo aos peptídeos NCB. Mapa em azul corresponde aos dados experimentais na presença dos peptídeos. Mapa em rosa indica dados da ImpA nativa. Entre parênteses estão indicadas as posições do sítio de ligação principal. 16 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao compararmos o mapa de densidade eletrônica obtido de ambos complexos com um mapa de uma estrutura nativa de ImpA (70-529) coletada à 2,0Å de resolução, a qual apresenta um “contaminante” no sitio de ligação, constatamos a semelhança entres as densidades, com exceção da densidade ocupada pelo resíduos Lys232 e Lys546 dos peptídeos NCM e NCB respectivamente. Isso pode sugerir uma ocupação parcial de ambos peptídeos em virtude de uma baixa interação dos mesmos com a ImpA de Mus musculus. Para ambos os peptídeos, ensaios de interação precisam ser feitos para avaliar a afinidade dos mesmos, porém para o peptídeo NCM, a adição de resíduos nas extremidades N e C-terminal podem aumentar as chances de interação com a ImpA, uma vez que diminui a flexibilidade dos resíduos que poderiam interagir com resíduos do sítio de reconhecimento de NLS da ImpA. 7. BIBLIOGRAFIA CATIMEL, B., TEH, T., FONTES, M. R. M., JENNINGS, I. G., JANS, D. A., HOWLETT, G. J., NICE, E. C., KOBE, B. 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