UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS SAN TIAGO DANTAS – UNESP, UNICAMP E PUC-SP KARINA STANGE CALANDRIN Processo decisório de política externa e groupthink: a operação “Paz para a Galileia” na Guerra do Líbano de 1982 São Paulo 2021 KARINA STANGE CALANDRIN Processo decisório de política externa e groupthink: a operação “Paz para a Galileia” na Guerra do Líbano de 1982 Tese apresentada ao Programa de Pós- graduação em Relações Internacionais San Ti- ago Dantas, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), da Univer- sidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), como exigência para obtenção do título de Doutor em Relações Internacionais, na área de concentração “Paz, Defesa e Segu- rança Internacional”, na linha de pesquisa “Es- tratégia, Defesa e Política Externa”. Orientador: Prof. Dr. Tullo Vigevani. São Paulo 2021 KARINA STANGE CALANDRIN Processo decisório de política externa e groupthink: a operação “Paz para a Galileia” na Guerra do Líbano de 1982 Tese apresentada ao Programa de Pós- graduação em Relações Internacionais San Ti- ago Dantas, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), da Univer- sidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), como exigência para obtenção do título de Doutor em Relações Internacionais, na área de concentração “Paz, Defesa e Segu- rança Internacional”, na linha de pesquisa “Es- tratégia, Defesa e Política Externa”. Orientador: Prof. Dr. Tullo Vigevani BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Tullo Vigevani (Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)) Profa. Dra. Cristina Soreanu Pecequilo (Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)) Prof. Dr. Michel Gherman (Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)) Prof. Dr. Marcelo Passini Mariano (Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)) Prof. Dr. Fabrício Chagas-Bastos (University of Melbourne) São Paulo, 05 de março de 2021. AGRADECIMENTOS O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. As opiniões, hipóteses e conclusões ou recomendações aqui expressas são de responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem a visão das instituições que apoiaram esta pesquisa. Bolsa PDSE - Nº processo: 88881.188422/2018-01 – na Universidade de Haifa em Israel. Para continuar resiliente nesta jornada tenho que agradecer imensamente às pessoas que me apoiaram e me deram a estrutura que eu precisei para concluir mais um capítulo da minha vida. Agradeço minha mãe, Sandra Stange, que me deu toda a estrutura emocional e financeira para que eu sempre perseguisse meus sonhos. Agradeço o meu orientador, Prof. Dr. Tullo Vigevani, pela ajuda em todo o processo de redação da tese, sempre me apoiando e fornecendo a base acadêmica necessária para a rea- lização deste trabalho. Agradeço meu co-orientador durante o estágio de pesquisa na Universidade de Haifa, Prof. Dr. Edy Kaufman, que apesar do curto período em que estivemos juntos me incentivou e proporcionou debates e situações de grande aprendizado. Agradeço os professores Dr. Guilherme Casarões e Dr. Michel Gherman que desde o início da pesquisa me ajudaram com a pesquisa bibliográfica e com questionamentos que di- recionaram a pesquisa ao que ela é hoje. Agradeço também ao Prof. Dr. Fabrício Chagas Bas- tos pela ajuda e todas as sugestões e questionamentos que me ajudaram a refletir sobre o texto e sempre melhorá-lo. Agradeço a todos os professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP e PUC-SP) que sempre foram solícitos e acessíveis às mi- nhas dúvidas. Agradeço ao Unisagrado por todo apoio durante a jornada de escrita desta tese de dou- torado. Aos meus grandes amigos Sidney Ortiz, Raphael Azevedo, Peter Sturken, Alfredo Guevara, Carolina Pedroso, Larissa Zaqueo, Gabriel Monzani, Danieli Fortes, Richtier Gon- çalves, André Liberman, Rabino Uri Lam, Tamires Souza, Lívia Milani, entre muitos outros que tornaram a caminhada menos árdua, trocando experiências e risadas. Agradeço também aos amigos do GEDES, Instituto Brasil-Israel, Beiachad e do Unisagrado que também me ajudaram muito durante a pesquisa, desde auxílio acadêmico quanto emocional. Precisamos de um senso de justiça, mas precisamos também de senso comum, de imaginação, de uma capacidade profunda de imaginar o outro, às vezes de nos colocarmos na pele do outro. Precisamos da capacidade racional de nos comprometer e, às vezes, de fazer sacrifícios e concessões. Amós Oz RESUMO A pesquisa tem como objetivo a análise do processo decisório de pequenos grupos em política externa a partir do fenômeno groupthink. Essencialmente, groupthink é a tendência de grupos coesos em alcançar um consenso sobre questões sem oferecer, procurar ou considerar pontos de vista alternativos. Em consequência, o groupthink foi responsabilizado por resultados ad- versos em processos de tomada de decisão política. Nossa escolha teórica recai na discussão sobre a influência de aspectos psicológicos na tomada de decisão, uma vez que os decisores estão propensos a estes elementos, como as emoções. Nesta pesquisa, propomos uma análise do processo decisório israelense sobre a operação “Paz para a Galileia” sob a hipótese de que os resultados não foram atingidos com a operação militar graças ao groupthink. Para tanto, analisaremos o processo decisório que definiu a operação e as formas de execução. A metodo- logia adotada é histórica, do tipo de observação indireta, com utilização de fontes primárias e secundárias. Palavras-chave: Israel. Guerra do Líbano de 1982. Groupthink. Processo Decisório. ABSTRACT The research aims to analyze the small groups’ foreing policy decision-making process based on the groupthink phenomenon. Essentially, groupthink is the tendency of cohesive groups to reach consensus on issues without offering, seeking or considering alternative points of view. As a result, groupthink was held responsible for adverse results in political decision-making processes. Our theoretical choice lies in the discussion about the influence of psychological aspects in decision-making, since decision makers are prone to these elements, such as emotions. In this research, we propose an analysis of the Israeli decision-making process on the “Peace for Galilee” operation under the assumption that the results were not achieved with the military operation thanks to Groupthink. For this, we will analyze the decision-making process that defined the operation and the forms of execution. The methodology adopted is historical, of the type of indirect observation, using primary and secondary sources. Keywords: Israel. 1982 Lebanon War. Groupthink. Decision-making process. RESUMEN La investigación tiene como objetivo analizar el proceso de toma de decisiones de pequeños grupos en política exterior a partir del fenómeno groupthink. Esencialmente, groupthink es la tendencia de grupos cohesionados a llegar a un consenso sobre temas sin ofrecer, buscar o considerar puntos de vista alternativos. Como resultado, groupthink se hizo responsable de los resultados adversos en los procesos de toma de decisiones políticas. Nuestra elección teórica radica en la discusión sobre la influencia de los aspectos psicológicos en la toma de decisiones, ya que los tomadores de decisiones son propensos a estos elementos, como las emociones. En esta investigación, proponemos un análisis del proceso de toma de decisiones israelí sobre la operación “Paz para Galilea” bajo el supuesto de que los resultados no se lograron con la operación militar gracias al pensamiento grupal. Para ello, analizaremos el proceso de toma de decisiones que definió la operación y las formas de ejecución. La metodología adoptada es histórica, del tipo de observación indirecta, utilizando fuentes primarias y secundarias. Palabras clave: Israel. Guerra del Líbano 1982. Groupthink. Proceso de toma de decisiones. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Quadro 1 – Tipos de abordagens cognitivas sobre processo decisório................... 30 Quadro 2 – Tipos de processamento cognitivo humano……............................... 31 Quadro 3 – Exemplo de tomada de decisão sob incerteza…….............................. 33 Quadro 4 – Tipos de análise de decisões………………………............................. 36 Quadro 5 – Tipos de avaliação da qualidade de uma decisão............................... 37 Quadro 6 - Orientações de pesquisa sobre processo decisório em psicologia.. 41 Quadro 7 - Elementos do pensamento de grupo…………………………………. 47 Quadro 8 - Elementos que aumentam a probabilidade de acontecer o pensamen- to de grupo…………………………………………………................ 48 Quadro 9 - Visões de grupo da sociedade judaica israelense…………………..... 62 Quadro 10- Temas que favorecem o ethos do conflito e groupthink……………. 65 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BBC British Broadcasting Corporation CLA Conselho da Liga Árabe CSNU Conselho de Segurança das Nações Unidas DNA Ácido Desoxirribonucleico EUA Estados Unidos da América FAI Força Aérea Israelense FL Frente Libanesa IDF Israel Defense Forces - Forças de Defesa de Israel NASA National Aeronautics and Space Administration OLP Organização para a Libertação da Palestina ONU Organização das Nações Unidas PM Primeiro-ministro PNR Partido Nacional Religioso RAU República Árabe Unida RI Relações Internacionais SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................... 11 2 ELEMENTOS PSICOSSOCIAIS NA TOMADA DE DECISÃO....….........…………….......................................................... 23 2.1 Processo de Tomada de Decisão.……..................………..................... 28 2.2 Groupthink........................…………...................................................... 39 3 TOMADA DE DECISÃO E RESOLUÇÃO DE CONFLITOS INTRATÁVEIS.........………................................................................. 49 3.1 O Ethos do Conflito…………………………………………………... 53 3.2 A memória coletiva e a vitimização do coletivo judaico israelense... 63 4 ANTECEDENTES DE INVASÃO ISRAELENSE AO LÍBANO…. 80 4.1 As Causas da Guerra Civil Libanesa (1975-1994)………………….. 82 4.2 A formação da Organização para Libertação da Palestina (OLP)... 88 4.3 Tensões prévias entre Israel e Palestina……………………………... 95 4.3.1 A importância da confiança……………………………………………. 99 5 A OPERAÇÃO PAZ PARA A GALILEIA (1982)…………………... 113 5.1 A criação de uma aliança: Israel e Maronitas………………………. 116 5.2 O processo de tomada de decisão israelense sobre a operação “Paz para a Galileia”……………………………………………………….. 125 5.3 Consequências da operação “Paz para a Galileia”…………………. 132 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................ 140 REFERÊNCIAS..................................................................................... 147 11 1 INTRODUÇÃO O objetivo desta pesquisa é analisar o impacto da estrutura do processo decisório sobre o desempenho da invasão do Líbano por Israel, de forma a estabelecer qual foi a dinâmica da barganha entre estes atores no período precedente ao qual culminou na decisão da invasão e do plano de ação. A fim de entender como ocorreu o processo decisório no gabinete do Pri- meiro-ministro (PM) israelense na Guerra do Líbano de 1982, e considerando a revisão bibli- ográfica relativa ao tema, a hipótese central defende que os responsáveis pela tomada de deci- são teriam vivenciado o fenômeno groupthink (JANIS, 1982), causando falhas na execução da operação militar. A hipótese secundária propõe que o fenômeno teria ocorrido como conse- quência da construção da narrativa israelense derivada da perseguição dos judeus no século XX e da formação do Estado israelense. A causa da derrota militar na empreitada de 1982 não teria acontecido apenas por mo- tivos táticos no campo de batalha ou pela vontade de um único tomador de decisão, mas, pela conjuntura do processo decisório e as escolhas dos planos de ação. A teoria que sustenta a pesquisa feita sobre groupthink estabelece um modelo de perguntas sobre a estrutura do grupo tomador de decisão, de modo a responder se este grupo está mais sujeito ou não a sofrer os efeitos do fenômeno, e é o que analisamos durante a execução da tese. A pressão para o consenso e o medo de ser excluído acabaria por subverter o propósito fundamental das reuniões do grupo. Em vez de produzir um amplo fórum para explorar todas as vias possíveis, o grupo rapidamente se move para reforçar o plano que recebeu maior apoio. Ainda, a tendência que se desenvolveu desde cedo dentro dos grupos interferiu no pen- samento crítico. Objeções e desafios para o “grande plano” foram ignorados e os planos de contingência não foram seriamente considerados. Consequentemente, os decisores estavam mal preparados quando a operação começou a evidenciar erros a partir da primeira semana de ação. A tese está dividida em quatro capítulos: no primeiro, analisamos a literatura em Psi- cologia Social e Política a respeito da tomada de decisões políticas e a relação destas teorias com a proposta racionalista-realista de análise nas Relações Internacionais (RI), a racionalis- ta-realista, justificando o nosso marco teórico. No segundo capítulo, discutimos os conflitos intratáveis e os elementos psicossociais do conflito Israel-Palestina, sob uma perspectiva do ethos do conflito para os israelenses. No terceiro capítulo, realizamos uma contextualização histórica da situação interna no Líbano pré-invasão e do conflito entre Israel e a Organização para Libertação da Palestina (OLP), mais especificamente. Por fim, no quarto capítulo anali- 12 samos o processo decisório do gabinete do Primeiro-Ministro Menachem Begin para a opera- ção “Paz para a Galileia” de 1982. A escolha do tema, bem como nosso recorte temporal, se deu pela importância da Guerra do Líbano, em 1982, como uma das experiências mais traumáticas para o Estado de Israel. Muitos estudos foram conduzidos sobre os eventos imediatos em torno da guerra em uma tentativa de explicar os resultados obtidos por Israel com a operação militar. Embora muitas dessas explicações sejam válidas, aqui destacamos o aspecto da tomada de decisão no Gabinete do PM Menachem Begin. Como dito anteriormente, partimos da hipótese de que o fenômeno groupthink ocorreu e com o objetivo de estudar o processo decisório de pequenos grupos a partir desta teoria. A análise da tomada de decisão em política externa tem sido dominada nas RI por perspectivas racionalistas (HUDSON, 2014). Na visão racional, as decisões políticas podem ser entendidas empiricamente como a resolução de problemas por atores-chave que perse- guem interesses bem especificados como, por exemplo, maximização de poder. Nesta pesquisa analisaremos aspectos estruturais da tomada de decisão no alto escalão israelense, com destaque para o Gabinete do PM Menachem Begin. Tomamos por base os oi- to elementos essenciais identificados por Janis (1982) para a ocorrência do fenômeno group- think: a) Invulnerabilidade; b) Racionalização; c) Moralidade, d) Estereótipos; e) Pressão; f) Autocensura; g) Unanimidade e h) Mindguards e sua presença ou não no processo decisório israelense. A orientação ideológica da tomada de decisão estaria centrada nas crenças sociais so- bre a justiça, objetivos israelenses, segurança, vitimização e patriotismo. Essas crenças estari- am ligadas a premissas principalmente tomadas da ideologia sionista, que serviu como princi- pal base epistêmica para as decisões e ações da sociedade e as principais motivações para a elite e grandes porções da sociedade israelense durante o conflito intratável, como pode ser chamado o conflito entre Israel e a Palestina, na definição de Bar-Tal (2001). Muitos tomadores de decisão padeceriam de excesso de confiança (ROSS; STILIN- GER, 1991; KAHNEMAN; TVERSKY, 2000). Tomadores de decisão assumem que podem controlar e prever os resultados futuros de suas ações. Isto está frequentemente relacionado com a crença que sua visão e percepção irão prevalecer. Essa perspectiva baseada na confian- ça deve também ser considerada válida para o lado opositor. Todos assumem que estão corre- tos em suas visões de mundo, o que é inerente ao ser humano mediano. Esta crença diminui a probabilidade de concessões de ambos os lados, mesmo quando é desejada e vista como pro- 13 vável por todos os envolvidos. Cada lado acredita que pode obter o que quer, sem ter que de- sistir de muito para fazê-lo (MCDERMOTT, 2004). A resistência em oferecer concessões pode ser bastante contraproducente. Por exem- plo, quando Israel destruiu prédios palestinos na Faixa de Gaza no início de 2001 (ISRAEL destrói […], 2001), foi fornecido um incentivo para ataques terroristas palestinos em represá- lia. No entanto, o governo israelense da época continuou convencido que apenas uma política severa puniria os terroristas e os impediria de tomar novas medidas contra os israelenses. Houve mais ataques contra Israel, incluindo homens-bomba em locais altamente populosos (HAMAS promete […], 2001), assim como a violência e a repressão aos palestinos têm tam- bém escalado (KUBOVICH; KHOURY, 2018). É importante ressaltar que este comentário não é feito para criticar um ou outro lado, mas sim para argumentar que, de acordo com as abordagens teóricas utilizadas nesta pesquisa, a confiança na justiça de sua própria causa, combinada com a recusa em oferecer concessões, pode reduzir as perspectivas de paz e o fim dos conflitos para todos (BAR-TAL, 2001). Excesso de confiança significa que decisões que não são devidamente avaliadas, po- dem se tornar mais extremas e são consideradas mais positivas do que deveriam ser. Caso o pragmatismo estivesse tão presente quanto teorias racionalistas-realistas de Relações Interna- cionais sugerem, esse não seria o caso. Em outras palavras, pessoas são mais confiantes do que deveriam e acabam por priorizar informações que corroborem seu ponto de vista (MCDERMOTT, 2004). Ainda de acordo com a autora (2004), estudos a respeito de decisões de júri mostram que é mais provável que seja mais equilibrado, bem como menos confiante de sua decisão, um no qual haja indivíduos que se posicionam para ambos os lados. Isso significa que veredictos divididos são tipicamente mais precisos, enquanto os jurados permanecem me- nos confiantes do que o caso com veredictos unânimes. A razão do excesso de confiança repousa na tendência dos indivíduos em subestimar os aspectos de situações a respeito das quais eles não conhecem (HEATH; TVERSKY, 1991). Da mesma forma, os líderes de Estados tendem a ser ativos em áreas nas quais eles confiam em suas habilidades. Isso pode ser parte da razão pela qual alguns preferem a política interna, enquanto outros são mais propensos a afirmar-se na arena internacional. A tendência de subvalorizar aspectos de uma situação que um indivíduo desconhece leva a superestimar suas chances de sucesso na negociação. Além disso, esse tomador de de- cisão também pode superestimar sua capacidade de impor sua solução preferida ao oponente, resistindo às tentativas do adversário de impor sua escolha. Esta dinâmica resulta na falácia da iniciativa, segundo a qual cada tomador de decisão atribui menos iniciativa, vontade e criati- 14 vidade para o adversário do que para si mesmo. Tais tomadores de decisão tendem a ser me- nos dispostos a fazer concessões porque eles não acreditam que os oponentes têm o que é ne- cessário para ter sucesso. Indivíduos com excesso de confiança também podem aceitar riscos porque eles negam que haja algum risco envolvido (MCDERMOTT, 2004). A tendência em subestimar a força do oponente, muitas vezes, torna menos provável que um tomador de decisão faça concessões. Essa intransigência do tomador de decisão, espe- cialmente se presente em ambos os lados do processo decisório, reduz a probabilidade de qualquer acordo ser alcançado. Tomadores de decisão fazem suas previsões e estimativas so- bre qual lado será bem sucedido. Fazem isso com base em uma combinação de fatores. Le- vando em consideração as estatísticas de casos semelhantes quando se analisa o passado, fatos isolados a respeito de um caso particular podem ser especialmente vívidos, tornando-se emo- cionalmente envolventes. As estatísticas e informações a respeito de eventos passados raramente o são. Isso significa que muitas vezes as previsões tornam-se tendenciosas em favor da informação individual de um tomador de decisão, os dados e as estatísticas anteriores per- dem a sua importância. Enquanto tomadores de decisão devem basear suas previsões em re- sultados passados de um ponto de vista, eles frequentemente são vítimas de toda uma série de heurísticas de julgamento (BORGIDA; NISBETT, 1977; KAHNEMAN; SLOVIC; TVERSKY, 1982). As previsões chegam a ser baseadas em planos que residam na ancoragem do melhor cenário. Cada tomador de decisão acredita que sua escolha pode prevalecer com poucas con- cessões. Além do que, estimativas são facilmente influenciadas pelas avaliações dos tomado- res de decisão e as intenções de várias partes. Enquanto os tomadores de decisão podem estar seguros de suas avaliações sobre suas próprias intenções, é fácil ser mal orientado sobre as intenções dos outros, que podem esconder verdadeiras preferências a fim de alcançar um me- lhor resultado. Todavia, o excesso de confiança nem sempre é ruim, ele pode carregar algumas vanta- gens. De acordo com McDermott (2004), primeiro, o excesso de confiança pode aumentar a capacidade de um tomador de decisão de ser persistente e comprometido em relação a um te- ma. Se o tomador de decisão realmente acredita que sua decisão pode ser bem sucedida, é mais provável que continue tentando chegar a um acordo. Em segundo lugar, o excesso de confiança pode aumentar a capacidade do tomador de decisão de tolerar a adversidade. Mais uma vez, se um tomador de decisão está convencido de que a vitória é possível, em curto pra- zo contratempos não são vistos como prejudiciais para o processo em si como um todo. Desta forma, o excesso de confiança promove um sentimento de que sua opinião acabará por preva- 15 lecer e, assim, aumenta o compromisso e persistência no processo de negociação em face a contratempos. Os conflitos podem, por vezes, ser resolvidos por causa desse tipo de tenacida- de do tomador de decisão. Outro obstáculo à resolução de conflitos é a incerteza. Preferência pela certeza é refor- çada quando altos graus de imprecisão ou ambiguidade existem em uma dada situação. Essa dinâmica pode levar a tomadores de decisão subestimarem o valor ou a probabilidade de ca- racterísticas significativas da política, como boa-fé, que não pode ser mensurada tão precisa- mente quanto a quantidade de munição, por exemplo. Nas negociações, as pessoas geralmente têm dúvidas sobre o resultado e sobre os fatos da situação. Elas podem ter dúvidas não só so- bre os objetivos do outro, mas também sobre seus próprios objetivos e quais concessões po- dem estar dispostas a oferecer ou aceitar. Isso acontece quando o processo de negociação em si começa a mudar, tanto em relação às metas quanto às estratégias gerais e individuais (MCDERMOTT, 2004). Em particular, certos resultados são psicologicamente considerados de forma despro- porcional à sua probabilidade real de acontecer. Uma demonstração disso pode ser observada em um experimento conduzido por Richard Zeckhauser, sobre quanto indivíduos pagariam para eliminar balas de uma arma em um jogo hipotético de roleta russa de seis tiros. Objeti- vamente, as pessoas deveriam pagar a mesma quantia, pois cada bala reduz a probabilidade de morte em uma mesma proporção, um pouco mais de 16 por cento. No entanto, eles estariam dispostos a pagar muito mais para remover a primeira ou última bala do que qualquer uma entre elas (MCDERMOTT, 2004). A razão para este viés está relacionada ao efeito da certe- za: tornar a morte menos incerta, removendo a primeira bala, ou tornando impossível, remo- vendo a última, carrega muito mais o peso psicológico do que remover quaisquer balas no meio. Desta forma, os tomadores de decisão tendem a se concentrar no que podem ver e mensurar um processo que Jervis (1993) chamou de "o bêbado procura"1. Outros efeitos dos resultados podem se mostrar ainda mais valiosos em longo prazo, como geração de boa von- tade ou confiança, não permanecem como foco da negociação porque são mais difíceis de ve- rificar ou medir. De acordo com McDermott (2004), em negociações sobre controle de armas, mesmo quando não foram obtidas grandes reduções entre Estados Unidos e União Soviética, o processo em si ajudou a gerar algum elemento de confiança e boa vontade, o que não neces- sariamente levou à resolução do conflito, mas levantou a possibilidade de novas estratégias de 1 O bêbado procura suas chaves sob a lâmpada porque é onde a luz está, e não necessariamente onde ele perdeu as chaves (JERVIS, 1993). 16 gerenciamento dele. A crise dos mísseis de Cuba, por exemplo, levou ao estabelecimento de uma linha direta entre Washington e Moscou para que os líderes pudessem se comunicar dire- tamente durante a crise (ALLISON; ZELIKOW, 1999). Os Estados geralmente usam vários tipos de sinais para diminuir a incerteza, reconhe- cendo que ela pode levar a conflitos indesejados. As nações podem emitir garantias que seri- am baseadas em certeza contingente. Por exemplo, as sanções impostas pelos Estados Unidos sobre o Iraque após a Guerra do Golfo foram ligadas ao desarmamento verificável de armas de destruição em massa. Se o Iraque permitisse à Organização das Nações Unidas (ONU) ins- pecionar essas armas, as sanções poderiam ser suspensas. Desta forma, a certeza de que as sanções seriam suspensas era contingente ao permitir inspeções. Sem essa inspeção, a aplica- ção de sanções era certa (MCDERMOTT, 2004). Outra parte do dilema da incerteza surge porque os aspectos de uma determinada situação que são incertos tendem a ser subestimados pelos decisores. Como resultado, cada lado acredita que será capaz de obter o resultado dese- jado. Em tais casos de pseudo dominância, cada lado está confiante sobre o curso de ação que se comprometeu, mas pode não considerar outros fatores que impedem o resultado desejado. Podemos observar esta dinâmica no conhecido Dilema do Prisioneiro2. A aversão à perda, também decorrente da teoria prospectiva, postula que há uma avali- ação assimétrica da perda e ganho, de modo que as pessoas tendem a supervalorizar o que eles têm em relação ao que eles não têm (KAHNEMAN; TVERSKY, 1984). De acordo com os autores, a maioria das pessoas tende a colocar diferentes pesos nos resultados positivo ou ne- gativo, de tal forma que os negativos carregam muito mais peso psicológico, sendo supervalo- rizados. A aversão à concessão, por outro lado, em que diferentes avaliações são feitas depen- dendo se uma concessão é oferecida ou recebida, é também comum. Tomadores de decisão não tratam o que o outro lado oferece para desistir como sendo tão importante quanto o que eles ofereceram para desistir. Desta forma, cada lado valoriza mais o que teve de abrir mão do que o outro lado oferece para desistir de uma negociação. Em outras palavras, uma troca igual não é sentida igualmente a ambos os lados; cada lado só se sente confortável com uma troca desigual na qual tenha se beneficiado (MCDERMOTT, 2004). Tal troca é difícil de conseguir, pelas seguintes razões: cada lado pode facilmente aca- bar sentindo que o outro lado tem a melhor parte do acordo, simplesmente porque eles valori- zam o que tinham a mais do que o outro lado se ofereceu para desistir. Fazer concessões leva 2 O Dilema do Prisioneiro é um problema apresentado dentro da Teoria dos Jogos e supõe que cada jogador quer aumentar ao máximo a sua própria vantagem sem considerar o resultado do outro jogador. 17 os negociadores a se sentirem piores. Por estas razões estruturais, ambos os lados acabam avessos ao risco de concessões. Os tomadores de decisão devem perceber que os acordos são mais prováveis quando a aversão à concessão pode ser superada. O status quo pode facilmente ser visto como uma alternativa aceitável ao invés de ter que fazer concessões. Às vezes concessões são menos valorizadas simplesmente porque são oferecidas pelo oponente. A lógica por trás dessa suposição é que, se o adversário parece dis- posto a desistir de algo, não deve ser valioso, porque o adversário nunca desistiria de nada importante sem ser forçado a fazê-lo. Para superar a tendência de desvalorizar o que o outro lado desiste ("desvalorização reativa"), os tomadores de decisão oferecem uma lista de con- cessões e pedem ao adversário que escolha entre elas (ROSS; STILINGER, 1991). Desta for- ma, o adversário é forçado a escolher a concessão que mais valoriza e, em seguida, ter maior dificuldade em manter a consistência em um argumento que afirma que a concessão foi sem valor. Por outro lado, o tomador de decisão pode oferecer um conjunto de demandas e deixar que o opositor escolha a concessão. O objetivo, do ponto de vista da resolução de conflitos, é de cada lado encontrar formas de reduzir os custos das concessões do outro. Pontos de referência relativos frequentemente influenciam o senso de justiça, ou injus- tiça, em um determinado resultado. Por exemplo, jogos de barganha mostram que, especial- mente para grupos que enfrentam discriminação, a justiça do resultado em si se torna um fator importante na aprovação de um acordo, independentemente da quantidade real de dinheiro ganho ou perdido (EAVEY; MILLER, 1984). Embora alguns tomadores de decisão estejam preocupados apenas com ganhos absolutos para o seu próprio lado, outros se preocupam com ganhos relativos em termos de quanto eles se beneficiam em relação aos outros. Tais diferen- ças ocorrem nas relações internacionais, em que muitas vezes se argumenta que os Estados buscam ganhos absolutos em algumas agendas como comércio e finanças, enquanto buscam ganhos relativos em segurança, por exemplo. Assim, a área específica de negociação será im- portante ao determinar qual estilo de barganha um participante escolherá, bem como a proba- bilidade de oferecer concessões ou chegar a acordos. A sociedade judaica israelense desenvolveu um espírito de conflito como resultado da experiência de guerras constantes e aparentemente intermináveis (BAR-TAL, 2001). Conside- rando especificamente o conflito com a Palestina, caracterizado como prolongado, violento, aparentemente irreconciliável, de natureza de soma zero, total3, central e com as partes inte- 3 O conceito de guerra total utilizado nesta tese se refere ao conflito que inclui todos e quaisquer recursos e in- fraestruturas associados a civis como alvos militares legítimos, mobilizando também todos os recursos da sociedade para lutar na guerra e dá prioridade à guerra sobre as necessidades dos não combatentes. 18 ressadas na sua continuação (AZAR; JUREIDINI; MCLAURIN, 1978; BAR-TAL, 1998a; GOERTZ; DIEHL, 1993; KRIESBERG, 1993), desenvolvido em território contestado que dois movimentos nacionais reivindicam como pátria. Por muitas décadas, o movimento naci- onal judaico e o nacionalismo palestino colidiram repetidamente sobre os direitos à autode- terminação, ao Estado e justiça. O conflito, no entanto, não era apenas territorial e político, mas total, isto é, também se referia a choques profundos de interesses religiosos, culturais e sociais. O conflito árabe-israelense começou como um conflito comunal entre judeus e pales- tinos que viviam na Palestina, governada pelos britânicos, e evoluiu para um conflito interes- tatal entre Israel e os países árabes durante os anos 1948-1949 e manutenção de uma guerra assimétrica com os palestinos em paralelo. Desde 1967, com a ocupação israelense da Cisjor- dânia e da Faixa de Gaza durante a Guerra dos Seis Dias, o conflito envolveu tanto os níveis interestatais quanto comunais. De acordo com Sandler (1988), essa expansão explica o au- mento da intratabilidade no conflito. Cada nova fase envolveu violência intensiva e foi segui- da pela entrada de novas partes no conflito e no desenvolvimento de novos padrões de intera- ção hostil. No curso do mesmo, milhares de vidas foram perdidas, incluindo civis, muitos mi- lhares ficaram feridos e centenas de milhares de palestinos tornaram-se refugiados. De 1930 até o início dos anos 1970, o conflito teve todas as características de intratabilidade (BAR- TAL, 1998a). Em vista da natureza intratável do conflito árabe-israelense, os judeus israelenses se viram permeados por um ethos4 de conflito que foi funcional para a estressante situação dis- pendiosa e prolongada do conflito. Esse ethos possibilitou a adaptação e o sucesso em lidar com as dolorosas consequências do conflito. Tem sido sugerido que este ethos consiste em oito temas de crença social (BAR-TAL, 1998a) que vamos tratar a seguir. O primeiro tema diz respeito aos objetivos que levaram ao confronto, e particularmen- te a justificativa desses objetivos em termos de sua importância. A volta dos judeus ao territó- 4 Reconhecemos que o conceito de Ethos é amplamente discutido nas Ciências Sociais, principalmente nas obras de Pierre Bourdieu e Norbert Elias, com conceitos correlatos de Capital Cultural, ethos e habitus. Sen- do que Capital Cultural, para Bourdieu, pode ser entendido como uma relação social dentro de uma econo- mia de práticas (sistema de troca) e compreende todos os bens materiais e simbólicos, sem distinção, que a sociedade considera importante. Como uma relação social dentro de um sistema de troca, o capital cultural inclui o conhecimento cultural acumulado que confere status e poder sociais. Já habitus compreende hábitos, habilidades e disposições socialmente arraigados. É assim que os indivíduos percebem o mundo social ao seu redor e reagem a ele. Essas disposições são geralmente compartilhadas por pessoas com formação seme- lhante (como classe social, religião, nacionalidade, etnia, educação e profissão). O habitus é adquirido por imitação (mímese) e é a realidade na qual os indivíduos são socializados, o que inclui sua experiência e oportunidades individuais. Assim, o habitus representa o modo como a cultura de grupo e a história pessoal moldam o corpo e a mente; como resultado, molda as ações sociais atuais de um indivíduo. 19 rio conhecido nos últimos séculos como a Palestina, com o objetivo de estabelecer seu próprio Estado após dois mil anos de exílio, foi inspirado pela ideologia nacionalista do sionismo. Es- sa ideologia forneceu aos judeus seus objetivos e justificativas (AVINERI, 1981; VITAL, 1982). Os objetivos centraram-se, antes de tudo, no estabelecimento de um Estado judeu na antiga terra natal de Eretz Yisrael5. No entanto, desde o início do sionismo, a questão da di- mensão territorial tornou-se uma controvérsia (HOROWITZ; LISSAK, 1978). Histórica, teo- lógica, nacional, existencial, política, societal e cultural, foram algumas das justificativas uti- lizadas para essas metas de estabelecimento de um Estado judeu em Eretz Yisrael. Apesar das divergências dentro do próprio movimento sionista, alguns motivos comuns são que a nação judaica foi fundada na antiga terra de Israel; que durante muitos anos de história judaica a an- tiga Terra de Israel era a pátria dos judeus; que durante o seu exílio os judeus mantiveram la- ços espirituais e físicos com o território, aspirando continuamente retornar a ele; e que a per- sistente experiência do antissemitismo na diáspora destacou a necessidade do povo judeu de uma existência segura em sua antiga pátria. A conquista do Sinai, da Faixa de Gaza, da Cisjordânia e das Colinas de Golã na Guer- ra de 1967 aumentaram muito a dimensão territorial dos objetivos israelenses. No rescaldo da guerra, muitos judeus israelenses acreditavam que Israel tinha o direito de manter esses terri- tórios. Suas crenças compartilhadas pertenciam ao direito exclusivo do povo judeu para a Cis- jordânia e Gaza e para a segurança, justificando a importância das Colinas de Golã e do Sinai (HOROWITZ; LISSAK, 1978). No contexto de justificar os objetivos israelenses, tentativas de refutar as reivindicações palestinas foram feitas. O território contestado foi frequentemente descrito como sendo escassamente povoado por árabes, que ali haviam imigrado nos últimos séculos. A definição nacional desses árabes como palestinos também foi negada por Israel, sendo alegado que eles eram parte da nação árabe, que já possuía seu direito a autodetermina- ção em diversos países. Finalmente, o apego à terra foi questionado pela caracterização do país, até o retorno dos judeus, como “desolado”, “negligenciado”, “desértico” e “primitivo” (RAM, 2007). Essas crenças sociais motivaram os membros da sociedade judaica israelense a lutar por seus objetivos e suportar as tensões e custos do conflito intratável. As crenças sociais so- bre segurança enfatizam a importância tanto da sobrevivência nacional quanto da segurança pessoal. Eles destacam os perigos potenciais e postulam as condições que fomentem a segu- rança da sociedade. Durante o conflito intratável, os judeus israelenses acreditavam que a se- gurança do país e de seus cidadãos judeus estava sob séria ameaça (ARIAN, 1995; BRE- 5 Área que se extende a toda a Terra de Israel bíblica, incorporando os territórios hoje de Israel e Palestina. 20 CHER, 1972). Portanto, a conquista da segurança, que originalmente serviu de base às aspira- ções sionistas de retornar a Israel e estabelecer um Estado judeu, tornou-se a necessidade e o valor central, adquirindo o status de um símbolo cultural no ethos judaico israelense (HO- ROWITZ, 1984; LIEBMAN; DON YEHIYA, 1983). A sociedade israelense tornou-se uma "nação em armas", vivendo em uma situação que tem sido chamada de "guerra dormente" (HOROWITZ, 1984). As considerações de segurança tiveram um papel crucial em muitas das principais de- cisões, sendo constantemente preferida em relação a outros temas. A segurança tornou-se de- cisiva para muitos tipos de leis, políticas e ações, indo além das esferas militar e política, mas também para os âmbitos econômico, legal, social, educacional, e até mesmo os domínios cul- turais (BAR-TAL; JACOBSON, 1998; KIMMERLING, 1993; PERLMUTTER, 1969). Além disso, durante o conflito intratável a sociedade aceitou sem críticas todas as decisões que fo- ram justificadas por preocupações de segurança; consentiu na censura rigorosa da informação, evitou o debate público sobre certas questões; e evitou procurar ou mesmo apresentar infor- mações sendo alegado que seria uma ameaça à segurança (BARZILAI, 1996). Atribuindo a mais alta prioridade ao valor da segurança, a sociedade fez tudo o que poderia para induzir seus cidadãos a servir nas forças armadas e motivar os qualificados para serem voluntários nas instituições e unidades mais importantes (por exemplo, a força aérea, as unidades de comando, o Mossad, os Serviços Gerais de Segurança). O serviço nas Forças de Defesa de Israel (IDF) foi visto como um ingresso para a sociedade israelense, e qualquer tipo de recusa ou evasão foi severamente punida. Indivíduos que não serviram ou foram liberados do serviço antes de concluí-lo, mesmo sob justificativa de serem psicologicamente inadequa- dos, encontraram desaprovação e dificuldades em encontrar trabalho na vida civil (BARZI- LAI, 1996). Todos os canais de comunicação e agentes de socialização prestaram homenagem para as forças de segurança, que eram altamente confiáveis (LISSAK, 1984). Aqueles que se vo- luntariaram para servir em instituições ou unidades especiais receberam alto prestígio, para os altos funcionários foram atribuídos um estatuto especial que lhes permitiu não apenas atuar como autoridades epistêmicas em uma ampla gama de questões, mas também serem aceitos em qualquer campo após a aposentadoria, incluindo a política, indústria, negócios, serviço civil e até instituições culturais e educacionais (BAR-TAL, 1998a). Ao mesmo tempo, uma herança de guerras e batalhas ajudou a desenvolver o heroísmo que, por sua vez, foi glorificado. Heróis militares receberam honras especiais e a sociedade demonstrou apreço por aqueles que haviam morrido no serviço militar, apoio a suas famílias e 21 ajuda para aqueles que foram feridos no cumprimento do dever. As crenças sociais fundamen- tais do ethos também se referiam às condições para garantir a segurança. Primeiro, foi enfati- zado que Israel tinha o direito e dever de enfrentar as ameaças por meio de seu próprio poder armado, sem contar com a ajuda de forças militares estrangeiras e muitas vezes desconside- rando a opinião pública ou os pontos de vista de líderes estrangeiros e organizações internaci- onais (por exemplo, a Organização das Nações Unidas; ONU). Em segundo lugar, a terra era considerada o mais importante ativo do país na manutenção da segurança (BAR-TAL, 1998a). Em suma, as crenças sociais sobre segurança eram funcionais para os confrontos vio- lentos no conflito, uma vez que atribuíam alta prioridade ao tema na agenda estatal, desde uma justificativa para as decisões e ações da sociedade, e motivou os cidadãos à participação do conflito e a lidar com condições estressantes. Crenças desse tipo incluem a negação da humanidade do grupo adversário, por exemplo (BAR-TAL, 1989). De fato, a deslegitimação mútua tem sido uma das manifestações dos longos anos de conflito entre os judeus israelenses e os árabes em geral, palestinos em particular (BAR-TAL, 1989). Desde cedo, o encontro entre judeus, principalmente vindos da Europa, e árabes que viviam na Palestina promoveu resultados negativos relacionados a estereótipos (LUSTICK, 1982). Aos árabes foram atribuídos rótulos como “primitivos”, “incivilizados”, “selvagens” e “atrasados”. Com o tempo, como o conflito se aprofundou e tornou-se violento, os árabes pas- saram a ser vistos como “assassinos”, “traiçoeiros”, “covardes”, “cruéis” e “perversos”, após o estabelecimento do Estado de Israel, estas deslegitimações sobre os árabes ainda prevaleci- am e eram transmitidas através de canais institucionais (COHEN, 1984; DOMB, 1982), eles, como um grupo, não foram diferenciados e foram vistos de forma homogênea. Além do mais, foram culpados pela continuação do conflito, pela erupção de todas as guerras e confrontos militares, e por intransigentemente rejeitar uma resolução pacífica (HARKABI, 1977; LAN- DAU, 1971). Essas crenças, embora pretendam explicar as causas do conflito e a violência dos ára- bes, também fornecem uma justificativa para o próprio comportamento hostil e das ações vio- lentas por parte dos israelenses. As crenças sociais de auto-imagem positiva envolvem a atri- buição de traços, valores, intenções e comportamentos para a própria sociedade, essas crenças permaneceram em absoluto contraste com aquelas que buscavam deslegitimar os árabes. Os judeus israelenses se viam como "pessoas novas", renascendo na Terra de Israel (HOFMAN, 1970; RAM, 2007). Os estereótipos positivos os retrataram como “tenazes”, “trabalhadores”, 22 “corajosos”, “modernos” e “inteligentes”, até o apelido de sabra6 foi cunhado. Com relação ao primeiro conjunto de traços, várias histórias e mitos foram acumulados sobre o comporta- mento dos judeus em tempos de paz e guerra, enquanto os últimos traços se referiam aos comportamentos dos judeus israelenses em relação aos árabes (BAR-TAL, 1998a). A autorrepresentação positiva também invocou a herança judaica. A cultura judaica, a religião e a tradição eram consideradas raízes da civilização do Ocidente e moralmente supe- riores. Os judeus israelenses pensavam sobre si mesmos como o “povo escolhido” e como “luz para as nações”, essas crenças proporcionavam força moral e sentimentos de autoestima positiva durante o conflito (BAR-TAL, 1998a). As mudanças nas crenças sociais do ethos têm influenciado a orientação da sociedade judaica de Israel, alterando o significado de identidade. As implicações cognitivas, afetivas e comportamentais dos judeus israelenses são diferentes do passado, no clímax do conflito in- tratável. Ser um judeu israelense nas últimas décadas implica ter crenças e atitudes, assim como padrões de comportamento, que correspondem à transição do conflito de intratável ao conflito tratável. A nova orientação emergente, no entanto, não caracteriza toda a sociedade judaica de Israel, alguns grupos se opõem explicitamente às novas tendências ou aspectos de- las (OREN; BAR-TAL, 2007). O que pudemos observar, de forma introdutória, são as formas como a psicologia pode auxiliar na análise de processo decisório em política externa dentro das pesquisas em Rela- ções Internacionais, e mais especificamente, como essas análises auxiliam no estudo deste processo em Israel. Nos próximos capítulos analisamos a evolução dos elementos discutidos na sociedade israelense e como estes elementos se mostram no processo decisório. 6 Apelido dado aos primeiros judeus sionistas que imigraram para Israel. Sabra é uma fruta típica da região do Levante, por fora tem uma casca dura e composta por espinhos, mas por dentro o fruto é doce e de gosto agradável. O apelido representaria a força dos judeus que imigrariam para Israel, mas que seriam “doces” por dentro. 23 2 ELEMENTOS PSICOSSOCIAIS NA TOMADA DE DECISÃO O objetivo principal deste capítulo é apresentar nossa abordagem teórica baseada na li- teratura de decisões comportamentais e suas contribuições à compreensão do processo decisó- rio em política externa. Desde suas origens, os estudos sobre a tomada de decisões em política externa têm sido dominados por perspectivas racionalistas (HUDSON, 2014). Esta abordagem predominante assume que as decisões políticas são parte de um processo de resolução de pro- blemas por atores-chave que perseguem interesses bem delimitados, com informação suficien- temente completa, e maximizando racionalmente ganhos, ignorando o fato de que a tomada de decisão é realizada por seres humanos, que, por sua vez, são propensos à influência de aspec- tos emocionais inerentes aos processos sócio-cognitivos. Desenvolvemos neste capítulo, portanto, uma revisão bibliográfica sobre o processo decisório em Psicologia Política e Social, que desafia as premissas básicas das teorias tradici- onais das RI, como racionalidade e pragmatismo; interesse nacional; balança de poder; inter- dependência; entre outros. O capítulo está organizado da seguinte maneira: em primeiro lugar, descreveremos brevemente os nossos pressupostos teóricos e usamos estes para desenvolver análises sobre a natureza da escolha estratégica. Então, apresentaremos especificamente a teoria do fenômeno groupthink e discutiremos as descobertas em termos de suas implicações para a compreensão da tomada de decisão estratégica e a pesquisa de decisões comportamentais em geral e para o caso aqui escolhido. A análise da tomada de decisão em política externa tem sido dominada nas Relações Internacionais por perspectivas racionalistas. A perspectiva racional produziu elaborados mo- delos de formulação de políticas em vários estágios - estabelecendo tarefas específicas - inclu- indo diagnóstico de problemas, coleta de informações, concepção de alternativas, avaliação das consequências e implementação de alternativas escolhidas. Por outro lado, a perspectiva racional tem sido amplamente criticada. Estudos de tomada de decisão política, como os tra- balhos de Graham Allison e Philip Zelikow (1971, 1999) sobre a Crise dos Mísseis de Cuba, forneceram evidências que põem em dúvida a validade empírica de modelos racionalistas e começaram a formular e a testar alternativas dentro dessa vertente teórica. Além disso, tem-se argumentado que pressupostos racionalistas de informação, preferências bem ordenadas e dominância de um único ator estão longe da realidade da política. Isso também obstruíria a utilidade da perspectiva racional como diretriz normativa para a formulação de decisões de alta qualidade (HART, 1991). 24 Além dos modelos organizacionais desenvolvidos de forma a contrapor as abordagens racionalistas, os psicólogos que estudavam a tomada de decisões políticas forneceram uma crítica diferente da perspectiva da escolha racional e começaram a formular modelos analíti- cos diversos. Os estudos psicológicos colocaram o homem no centro da tomada de decisão, em contraste com os paradigmas organizacionais e políticos que enfatizam os processos de nível médio (Estado). Esta análise focaliza o nível micro, que diz respeito a tomadores de de- cisão individuais solitários e em interação. O trabalho de Janis (1982) sobre groupthink faz parte dessa contribuição psicológica emergente no campo da tomada de decisão política. A habilidade de tomada de decisão do homem, fruto do processo de evolução biológi- ca dos seres humanos, é capaz de transcender as limitações naturais e de transformar o mundo em sua própria imagem. Nas mãos humanas, nossa inteligência nos permitiu superar as restri- ções do patrimônio biológico e possibilitar a adaptação no processo. A história da inteligência humana e da capacidade de tomada de decisão começa com um universo que é capaz de codi- ficar a informação. Esse foi o fator habilitador que permitiu que a evolução ocorresse (DAR- WIN, 2003) a uma taxa cada vez mais rápida. Dessa forma, os organismos desenvolveram redes de comunicação e decisão chamadas sistemas nervosos, que poderiam coordenar as partes cada vez mais complexas de seus cor- pos, bem como os comportamentos que facilitaram sua sobrevivência. Assim, a biologia deu origem a neurologia, já que os cérebros se tornaram a vanguarda do armazenamento e mani- pulação de informações (KURZWEIL, 2013). O próximo passo foi exclusivamente humano. O cérebro de um mamífero tem uma aptidão distinta que não foi encontrada em ne- nhuma outra classe de animal. Somos capazes de pensar hierarquicamente, de compreender uma estrutura composta por diversos elementos dispostos em um padrão, representando esse arranjo com um símbolo e, em seguida, usando esse símbolo como um elemento em uma con- figuração ainda mais elaborada. Essa capacidade ocorre em uma estrutura cerebral chamada neocórtex, que nos seres humanos alcançou um limiar de sofisticação e capacidade, de modo que possamos chamar essas ideias de padrões. Através de um processo recursivo interminá- vel, somos capazes de construir ideias cada vez mais complexas, chamamos essa vasta gama de conhecimento de ideias recursivamente ligadas. Somente o Homo Sapiens possui uma base de conhecimentos que ele próprio evoluiu, cresce exponencialmente e é transmitida de uma geração para outra (HARDMAN; MACCHI, 2010). Nossos cérebros deram origem a outro nível de abstração, na medida em que usamos nossa inteligência em conjunto com outro fator habilitador, o polegar opositor, para manipular 25 o meio ambiente e construir ferramentas. Essas ferramentas representaram uma nova forma de evolução, já que a neurologia deu origem à tecnologia. A primeira invenção foi a história: linguagem falada que nos permitiu representar idei- as com enunciados distintos. Com a invenção subsequente da linguagem escrita, desenvolve- mos formas distintas para simbolizar nossas ideias. Bibliotecas de linguagem escrita amplia- ram a capacidade de nossos cérebros sem ajuda para reter e expandir nossa base de conheci- mento de ideias recursivamente estruturadas (KURZWEIL, 2013). Na teoria de reconhecimento de padrões, Kurzweil (2005) descreve um modelo de como o cérebro humano consegue essa capacidade crítica usando uma estrutura muito inteli- gente projetada pela evolução biológica. Há detalhes neste mecanismo cortical que ainda não entendemos completamente, mas sabemos o suficiente sobre as funções que ele precisa reali- zar, que, no entanto, podem projetar algoritmos que tenham o mesmo propósito. Ao começar a entender o neocórtex, estamos agora em posição de amplificar seus poderes e entender me- lhor como o processo decisório ocorre dentro do cérebro humano. O princípio de funciona- mento do neocórtex representa todos os conhecimentos e habilidades, bem como a criação de novos conhecimentos. É o neocórtex, afinal, responsável por cada decisão política, cada mú- sica, cada pintura, toda descoberta científica e os vários outros produtos do pensamento hu- mano. Para avaliar em que medida nosso cérebro é semelhante aos programas de computa- dor, podemos pensar sobre o que o cérebro deve fazer enquanto processa informações. Fun- damentalmente, o cérebro armazena e processa informações e, por causa da universalidade da computação, há mais um paralelo entre cérebros e computadores do que pode ser aparente (KURZWEIL, 2013). Cada vez que fazemos algo, ou pensamos em algo, seja escovar os dentes, caminhar pela cozinha, contemplar um problema político, ou criar uma ideia, refletimos sobre como conseguir realizá-lo. Pensamos ainda mais em todas as coisas que não conseguimos fazer, já que as limitações do pensamento humano fornecem um conjunto igualmente importante de pistas (KURZWEIL, 2005). Pensar tanto em pensar pode muito bem estar retardando o pro- cesso, mas achamos que tais exercícios de autorreflexão nos permitem refinar os métodos mentais. Também temos dificuldade em iniciar uma memória no meio de uma sequência. Se aprender a tocar um pedaço de música no piano, geralmente não se pode simplesmente come- çar com um ponto arbitrário em seu meio. Há alguns pontos em que se pode pular, porque a memória sequencial da peça é organizada em segmentos. Se tentar começar no meio de um 26 segmento, porém, é preciso reverter para a leitura até a memória sequencial entrar no próximo segmento (KURZWEIL, 2013). Somos capazes de reconhecer rostos de pessoas familiares, mesmo sendo parcialmente cobertas ou distorcidas. Isso representa a chave da percepção humana: podemos reconhecer um padrão, mesmo que apenas uma parte dele seja percebida (vista, ouvida, sentida) e mesmo que contenha alterações. Nossa capacidade de reconhecimento aparentemente é capaz de de- tectar características invariantes de um padrão de características que sobrevivem ao mundo real das variações. As aparentes distorções em uma caricatura ou em certas formas de arte como o impressionismo enfatizam os padrões de uma imagem (pessoa, objeto) que reconhe- cemos ao mudar outros detalhes. O mundo da arte está realmente à frente do mundo da ciên- cia ao apreciar o poder do sistema de percepção humana. Usamos a mesma abordagem quan- do reconhecemos uma melodia a partir de apenas algumas notas (KURZWEIL, 2013). Ainda de acordo com o autor (2013), considere uma experiência que todos nós temos em uma base regular: uma memória de anos atrás inexplicavelmente aparece em sua cabeça. Muitas vezes será uma lembrança de uma pessoa ou um evento que você não pensou há muito tempo. É evidente que algo desencadeou a memória. O trem de pensamentos que fez essa memória aparecer pode ser aparente e algo capaz de articular. Em outras ocasiões, você pode estar ciente da sequência de pensamentos que levaram à memória, mas teria dificuldade em expressá-la. Muitas vezes, o gatilho é rapidamente perdido, então a memória parece que veio sem conexões com fatos correntes, mas o cérebro possui uma teia de pensamentos pratica- mente automáticos que formam conexões que às vezes não conseguimos mapear, todavia es- tão lá e, tem uma força poderosa sobre como tomamos decisões. O que unifica a psicologia política e a torna distinta de outras formas de análise políti- ca é a busca de explicação, descrição e previsão no nível individual de análise (JERVIS, 1976). Este nível informa e afeta os tipos de perguntas que são feitas, os meios de prova que são procurados e as naturezas de inferências sobre a causalidade que são feitas por psicólogos políticos (CALANDRIN, 2017). Esse viés de atenção não é apenas limitado à pessoa, por ve- zes incorpora o indivíduo agindo em conjunto com outros indivíduos em configurações de grupo, no entanto, privilegia a pessoa sobre organizações ou outros níveis de análise que di- minuem a importância do indivíduo. A este respeito, a psicologia política fornece uma incli- nação particularmente humanista sobre política, afirmando a importância dos processos psico- lógicos individuais para os resultados políticos (MCDERMOTT, 2004; CALANDRIN, 2017). No que tange ao episódio escolhido, a invasão foi instigada para fins que se estendiam muito além das ameaças de segurança imediatas. As verdadeiras intenções dos tomadores de 27 decisão estavam na mudança dos regimes governantes do Líbano a fim de derrubar as escalas políticas regionais a seu favor. O objetivo final israelense era remover a ameaça de movimen- tos políticos não estatais de outros Estados-nação, mais especificamente a Organização de Li- bertação da Palestina (OLP), mas os tomadores de decisão no alto escalão do governo israe- lense não teriam discutido todas as possíveis formas de abordagem e resolução de problemas como uma consequência da existência do fenômeno Groupthink no processo decisório, que discutiremos mais profundamente adiante no texto. A utilização da psicologia para explicar a tomada de decisão em um Estado tem se tornado mais frequente, mesmo que ainda pouco utilizada na análise de política externa no Brasil. O que propomos nesta tese é a união de teorias mais tradicionais de análise de política externa em Relações Internacionais (ALLISON; ZELIKOW, 1999; HERMANN, 1980; JER- VIS, 1976) com outras abordagens, como a psicologia política (JANIS, 1982). A teoria sobre groupthink é relevante para a compreensão de como os atores interagem em determinados contextos, temática explorada também nas Relações Internacionais, sob uma perspectiva um pouco distinta, por Graham Allison e Philip Zelikow (1999). Podemos obser- var que uma negociação combina circuitos regulares entre os atores posicionados hierarqui- camente dentro do governo. O comportamento do governo israelense pode ser entendido de acordo com o modelo de política burocrática desenvolvido por Allison e Zelikow (1999), não como resultado das organizações, mas como resultado de um jogo de negociações. Os resulta- dos são formados pela interação dos grupos formadores do Estado. Em contraste à análise cognitiva, o modelo de política burocrática não vê o ator unitário sozinho, mas muitos atores unitários: atores que não se concentram em uma única questão estratégica, mas em muitos problemas intranacionais que podem se desdobrar em problemas internacionais. Assim, os atores que operam em termos de vetorizar as ações políticas baseadas numa estratégia consis- tente - de acordo com várias concepções de objetivos nacionais, organizacionais e pessoais - tomam decisões de governo não por uma única escolha, racional, mas pela política (ALLI- SON; ZELIKOW, 1999). A política externa tem sido definida como um sistema de ação. Suas decisões, que constituem o comportamento do Estado, são o produto da interação entre dois ambientes: ope- racional e psicológico (ou percebido). Uma tarefa importante na análise de política externa é dissecar ambas as configurações, para explorar as suas partes componentes, e descobrir seus pontos de convergência e divergência (BRECHER, 1972). Um postulado básico de nossa investigação é que as escolhas políticas e as consequên- cias das decisões serão bem-sucedidas na medida em que os dois ambientes são congruentes 28 (BRECHER, 1972). Assim, é necessário examinar com cuidado os ambientes operacional e psicológico. É também essencial designar o alto escalão da tomada de decisão ou decisores de nível estratégico, cujo prisma de atitude e imagens específicas fornece a chave para compre- ender a força motora do comportamento do Estado, traduzido pelo ambiente psicológico. Usando técnicas de mapeamento cognitivo, analisaremos a partir de estudos psicológi- cos problemas complexos de escolha estratégica para investigar vários fenômenos inter- relacionados: a inércia cognitiva, a tendência de mudanças nos modelos mentais dos atores de questões estratégicas e problemas de tomada de decisão (PORAC; THOMAS, 1990; REGER; PALMER, 1996), o viés de enquadramento documentado (KAHNEMAN; TVERSKY, 1984; HODGKINSON et. al., 1999) e escalada de compromisso para um curso de falha de ação (STAW, 1997). 2.1 Processo de Tomada de Decisão A análise da tomada de decisão política em Relações Internacionais tem sido domina- da por estudos que pressupõem, automaticamente, a racionalidade das unidades de decisão, como os Estados e governos. Na visão racional, muito presente nas teorias do campo, as deci- sões políticas podem ser entendidas empiricamente como a solução de problemas calculada por atores-chave que buscam interesses bem especificados (por exemplo, maximização de po- der, realização de objetivos políticos formalmente declarados). Normativamente, a perspecti- va racional produziu elaborados modelos multiestágio de formulação de políticas, analisando tarefas específicas, incluindo diagnóstico de problemas, coleta de informações, formulação de alternativas, avaliação das consequências de alternativas, escolha, implementação de alterna- tivas escolhidas, feedback e aprendizado (MAULE; HODGKINSON; BOWN, 2005). As decisões estratégicas são a base sobre a qual as organizações identificam, esclare- cem e atuam em relação aos seus objetivos de médio e longo prazo. Nas últimas décadas, houve um aumento de interesse na aplicação de conceitos, teorias e métodos das ciências cog- nitivas à análise de tais decisões, com o objetivo de obter uma melhor compreensão dos pro- cessos de formulação e implementação de estratégias, desenvolvendo intervenções para facili- tar esses processos (HARDMAN; MACCHI, 2005; HUFF, 2002; EDEN; SPENDER, 1998; HODGKINSON, 2001; HODGKINSON; SPARROW, 2002). Os pesquisadores que investigam a tomada de decisões estratégicas a partir de uma perspectiva cognitiva geralmente adotaram uma das duas abordagens complementares. A pri- meira implica na aplicação de conceitos de decisões comportamentais na tentativa de esclare- 29 cer as maneiras pelas quais os estrategistas individuais pensam e argumentam ao fazer esco- lhas estratégicas (BARNES, 1984; SCHWENK, 1984; 1985; 1988; DAS; TENG, 1999). Uma grande parte destes trabalhos tem traçado a noção de heurísticas e tendências (KAHNEMAN; SLOVIC; TVERSKY, 1982). Nesta abordagem, os estrategistas podem incorrer em uma série de erros ao simplificar seus raciocínios em um esforço para reduzir o ônus do processamento de informações, o que leva a uma tomada de decisão deficiente (SCHWENK, 1995; DAS; TENG, 1999; HODGKINSON, 2001; MAULE; HODGKINSON, 2002). Além de explicar os aspectos do pensamento estratégico, esse conjunto de pesquisas forneceu uma refutação par- cial da crítica de que as heurísticas7 e tendências não podem ser generalizadas e testadas fora do laboratório (MAULE; HODGKINSON, 2002). A segunda abordagem implica o uso de várias técnicas de mapeamento cognitivo (AXELROD, 1976; HUFF, 2002) para explorar a estrutura mental dos atores e representações de problemas estratégicos, de forma relativamente direta. Esta linha de trabalho baseia-se no pressuposto de que os atores constroem representações mentais simplificadas da realidade e que as escolhas estratégicas são, em última instância, influenciadas por essas representações. Com base no trabalho de Bartlett (1932), Tolman (1932) e Johnson-Laird (1983), os pesqui- sadores que adotam essa abordagem se referem várias vezes a essas representações mentais como esquemas, mapas cognitivos e modelos mentais (HUFF, 2002). Hodgkinson e Sparrow (2002) observam que, apesar de serem desenvolvidos para diferentes propósitos, esses termos foram usados indistintamente para transmitir a noção geral de que os atores desenvolvem re- presentações internas de seus mundos, o que, por sua vez, está vinculado à ação organizacio- nal8. 7 O termo se refere ao processo cognitivo empregado em decisões não pragmáticas, sendo definida como estratégias que ignoram parte da informação com o objetivo de tornar a escolha mais simples e ágil. 8 Não obstante suas diferentes origens, esses termos são suficientemente semelhantes para significar esse uso geral. Nesta tese, portanto, usaremos estes termos de forma intercambiável, para capturar a ideia global de que os indivíduos internalizam seu conhecimento e compreensão de questões es- tratégicas e problemas sob a forma de uma representação simplificada da realidade. 30 Quadro 1 – Tipos de abordagens cognitivas sobre processo decisório 1ª Abordagem A partir da decisão tomada tentar compreender como os de- cisores pensaram. 2ª Abordagem Procura compreender as representações cognitivas, visões de mundo, dos decisores que influenciaram no processo de- cisório. Fonte: Criação nossa, baseada em dados de Barnes (1984), Schewenk (1984, 1985, 1988), Das e Teng (1999), Axelrod (1976), Huff (2002). Reconhecemos que o ato de elaborar estratégias em organizações ocorre em uma arena sociopolítica e que as estratégias são o produto de uma ordem negociada, cuja consequência é que as cognições conflitantes de diferentes partes interessadas devem de alguma forma ser reconciliadas (ALLISON; ZELIKOW, 1999). Utilizamos o termo "processamento tipo heurís- tico" para denotar um processo amplamente automático/semiconsciente no qual a informação estratégica é avaliada com base nas suas características de nível superficial. Há um grande volume de evidências que mostram que os indivíduos se envolvem em estratégias de proces- samento heurístico durante o processo de tomada de decisão estratégica (SCHWENK, 1995). Embora o processamento heurístico torne o mundo gerenciável (reduzindo os requisitos de processamento de informações do tomador de decisão), isso pode, em algumas ocasiões, gerar erros, reduzindo a eficácia da tomada de decisão estratégica. O processamento de tipo II (ela- borativo), em contraste, implica um nível mais profundo de análise de estímulo que ocorre sob controle consciente. O processamento de tipo II envolve um pensamento analítico denso e é menos provável que leve a erros e viés, embora possa às vezes também se revelar disfuncio- nal devido a efeitos como "paralisia por análise", a tendência de ficar sobrecarregado por mui- ta informação. Assim, o modelo clássico segrega a crença (probabilidade) do valor (utilidade). A teo- ria de utilidade esperada subjetiva (SAVAGE, 1954) articula um conjunto de axiomas que são necessários e suficientes para a representação acima, permitindo que a probabilidade subjetiva e a utilidade sejam medidas simultaneamente pelas preferências observadas. Por exemplo, se Alan é indiferente entre receber 100 reais se chover amanhã (e nada de outra forma) ou 100 reais se uma moeda atingir sua cabeça (e nada de outra forma), então inferimos que ele consi- dera que esses eventos são igualmente prováveis (isto é, p (chuva) = p (moedas) = 1/2). É im- portante enfatizar que Savage (1954), seguindo a tradição de teóricos anteriores (BOREL, 31 1924; RAMSEY, 1931; DE FINETTI, 1937 apud SAVAGE, 1954), rejeitou julgamentos di- retos de probabilidade a favor de uma medida derivada das preferências observadas. Em contraste, os psicólogos (KAHNEMAN; SLOVIC; TVERSKY, 1982) dão credibi- lidade a expressões diretas de crença e assumem que estas podem ser usadas para prever a disposição de agir sob incerteza dos atores. Por exemplo, uma perspectiva que oferece uma chance de receber 100 reais e uma chance igual de receber nada é mais arriscada do que uma perspectiva que oferece 50 reais com certeza, mesmo que a perspectiva "arriscada" não impli- que na possibilidade de perder dinheiro. A aversão ao risco é definida pelos teóricos da deci- são como uma preferência por um resultado seguro sobre um prospecto casual com igual ou maior valor esperado (HODGKINSON; MAULE; BOWN, 2005). Assim, a preferência de 50 reais com certeza sobre uma chance de 50-50 de receber 100 reais ou nada representa aversão ao risco. A procura de riscos, em contraste, é definida como uma preferência por uma chance de perspectiva com um resultado seguro de igual ou maior valor esperado. Tal forma implica, por exemplo, que a utilidade obtida por receber 50 é mais de metade do utilitário obtido por receber 100; portanto, receber 50 com certeza é mais atraente do que uma chance de 50-50 de receber 100 ou nada. Quadro 2 – Tipos de processamento cognitivo humano Tipo I – Heurístico Análise superficial e “automática” das informações recebidas. Tipo II – Elaborativo Análise mais profunda, envolvendo um pensamento analítico denso. Fonte: Criação nossa, baseada em dados de Schwenk (1995). Na medida em que a nossa distinção entre sistema do tipo I e tipo II é significativa, es- peramos encontrar que essas diferentes estratégias de processamento estejam associadas a di- ferenças na estrutura e no conteúdo das representações mentais dos decisores de questões e problemas estratégicos. Especificamente, a complexidade da representação mental de um ator varia de acordo com as quantidades relativas de processamento tipo I e tipo II implantados. Schwenk (1988) argumenta que essas suposições informam os "quadros de referência" dos estrategistas ou "visões de mundo" que, por sua vez, são codificados como mapas cogni- tivos ou imagens, isto é, estruturas cognitivas que encapsulam o significado do ambiente de 32 decisão. Consequentemente, também esperamos observar que os atores que escolhem diferen- tes opções estratégicas mantêm diferentes representações mentais da situação. Neste capítulo, apresentamos uma revisão da experiência em testar essas previsões, usando a pressão e limitação do tempo como formas de manipular as quantidades relativas de cada tipo de estratégia de processamento. Vários pesquisadores sugeriram que a introdução de pressão de tempo aumenta a quantidade de tipo I à custa do processamento de tipo II (FISKE, 1993; KRUGLANSKI; WEBSTER, 1996). Evidências mostram que a pressão do tempo re- duz a complexidade das estratégias cognitivas subjacentes à tomada de decisão (MAULE; EDLAND, 1997). Maule e Hockey (1993) sugerem que as reduções induzidas pela pressão da limitação do tempo na complexidade das estratégias cognitivas podem ser relativamente menores (por exemplo, "filtração", envolvendo pequenas mudanças na quantidade de informações relacio- nadas ao problema que são processadas) ou relativamente maiores (por exemplo, uma altera- ção na regra de decisão subjacente que leva a mudanças relativamente grandes na quantidade de informações relacionadas ao problema que são processadas). Maule, Hodgkinson e Bown (2005) empregaram a pressão de tempo na tentativa de aumentar a quantidade de tipo I em relação ao processamento de tipo II, prevendo que isso, por sua vez, reduziria a complexidade das representações mentais dos tomadores de decisão. Além disso, investigaram a forma que essa redução de complexidade pode afetar o processo decisório. Há várias maneiras pelas quais a pressão do tempo pode reduzir a complexidade do raciocínio causal. Por exemplo, os participantes podem pensar em menos fatores (ou seja, menos nós conceituais em um mapa cognitivo), podem fazer menos conexões causais entre fatores (ou seja, menos ligações entre nós conceituais em um mapa) ou ambos. As atuais abordagens de processo duplo têm pouco a dizer sobre como os aumentos no processamento de tipo I afetam a representação de um ator sobre um problema. Por isso, investigamos esta questão no presente estudo. A pesquisa anterior dos autores investigou a distinção entre as regiões focal e periféri- ca dos mapas cognitivos (HODGKINSON; MAULE; BOWN, 2005). A região focal inclui os nós de escolha e aqueles nós conceituais e links que são adjacentes aos nós de escolha. A re- gião periférica, pelo contrário, envolve links e nós que não estão diretamente conectados aos nós de escolha. Maule et. al. (2000) mostraram que a estrutura do raciocínio causal é mais importante do que seu conteúdo distinguindo entre participantes que escolhem diferentes op- ções. Em particular, eles descobriram que todos os participantes incluíam nós de conceito se- melhantes em seus mapas, independentemente da opção que escolheram. No entanto, houve 33 diferenças importantes na estrutura da região focal de seus mapas, com mais raciocínio causal em torno da opção que escolheram do que a opção que rejeitaram. Esta descoberta também é consistente com sugestões de Svenson (1999), desenvolvidas no contexto da teoria da diferen- ciação e consolidação. O centro desta teoria é a sugestão de que os indivíduos identificam uma alternativa promissora no início de um processo de decisão e, em seguida, participam de uma série de atividades cognitivas destinadas a diferenciar esta alternativa das demais. Isso sugere uma maior prioridade dada ao processamento de informações relativas à alternativa escolhida, que em nossa situação experimental, com base no mapeamento cognitivo, deve levar a uma rede mais elaborada de raciocínio causal em torno desta alternativa. A priori, Hodgkinson, Maule e Bown (2005) identificaram três formas pelas quais o aumento do processamento de tipo I pode reduzir a complexidade dos mapas cognitivos dos participantes. Em primeiro lugar, é possível uma redução do raciocínio causal restrito à região focal do mapa. Sob este cenário, os efeitos seriam semelhantes em relação às alternativas es- colhidas e rejeitadas. Em segundo lugar, é possível uma redução do raciocínio causal dentro da região focal, de modo que seus efeitos sejam mais fortes em relação à alternativa rejeitada, dada a menor prioridade concedida a essa alternativa. Finalmente, os anteriores podem levar a uma redução no raciocínio causal na região periférica do mapa. Por exemplo, supondo que esteja pensando se deve ou não levar um guarda-chuva para o trabalho; dois atos possíveis estão disponíveis: carregar ou não um guarda-chuva. Por sua vez, dois estados são possíveis: chover ou não chover. A consequência da opção escolhida é uma função tanto do ato escolhido (estar em posse ou não de um guarda-chuva) e o estado das coisas (o que influencia se irá molhar-se ou não). No modelo normativo clássico de decisão sob incerteza, os tomadores de decisão pesam a atratividade percebida (utilidade) de cada consequência potencial por sua probabilidade percebida (probabilidade subjetiva) (HOD- GKINSON; MAULE; BOWN, 2005). Quadro 3 – Exemplo de tomada de decisão sob incerteza Ato Estado Consequência Levar Guarda-Chuva Chover Não se molhar Não levar Guarda-Chuva Chover Molhar-se Levar Guarda-Chuva Não Chover Não se molhar Não levar Guarda-Chuva Não Chover Não se molhar Fonte: Criação nossa, com base em dados de Hodgkinson, Maule e Bown (2005). 34 Conforme mencionado anteriormente, Savage (1954) identificou um conjunto de con- dições de preferência que são ambas necessárias e suficientes para representar as escolhas de um tomador de decisão pela maximização da utilidade esperada subjetiva. Central para a re- presentação, um axioma conhecido como "princípio seguro" (também às vezes referido como "independência fraca") coloca que: se duas ações produzem a mesma consequência, então a escolha sobre qual ação tomar não depende da consequência. Durante o curso de suas vidas, as pessoas tomam muitas decisões, abrangendo uma ampla variedade de contextos e importâncias. Os tópicos de tomada de decisão comuns inclu- em opções de carreira, seja para se casar (e, em caso afirmativo, com quem e quando), que casa alugar (ou comprar), onde fazer compras e o que cozinhar para o jantar. A necessidade de uma boa decisão cresce à medida que a importância do contexto aumenta. Infelizmente, muitas vezes não é claro o que constitui uma boa decisão (HODGKINSON; MAULE; BOWN, 2005). No entanto, com poucas exceções, esse tópico recebeu relativamente pouca atenção na literatura de Relações Internacionais (EDWARDS et. al., 1996; LIPSHITZ, 1989; 1995; HERSHEY; BARON, 1992; FRISCH; JONES, 1993; FRISCH; CLEMEN, 1994). Vários mo- tivos podem explicar a relutância em tratá-lo diretamente. Primeiro, o tópico pode ser visto como muito amplo e mal definido, tornando praticamente impossível ser tratado de forma sis- temática e concisa. Um segundo motivo, relacionado, pode ser que várias classes de decisões podem ser definidas, cada uma exigindo diferentes critérios de julgamento. Em terceiro lugar, a discussão de "decisões sobre decisões" introduz o conceito de tomada de decisão de segunda ordem. Finalmente, alguns podem afirmar que uma resposta satisfatória à questão ainda não existe (HODGKINSON; MAULE; BROWN, 2005). Apesar das dificuldades associadas à avaliação da qualidade da decisão, alguns pes- quisadores tentaram resolver o problema. Talvez a questão mais fundamental tenha sido o de- bate acerca das decisões que devem ser julgadas pelo processo (pelo qual elas foram deriva- das) ou pelo resultado (e as consequências associadas). A maioria tomou uma abordagem ori- entada para o processo, baseando-se geralmente em uma versão da teoria da utilidade (SA- VAGE, 1954; LUCE; RAIFFA, 1957) e discute como uma boa decisão deve ser estruturada e modelada (EDWARDS et. al., 1984; LIPSHITZ, 1989). O principal argumento para esta abordagem baseada em processo é que a maioria das decisões são tomadas sob incerteza. Dada a estrutura e os números que entram em uma tomada de decisão, a tarefa do pro- cesso decisório deve, em princípio, ser trivial. A dificuldade reside na obtenção da estrutura e 35 do espaço apropriados, refletindo todos os resultados possíveis, o grau em que cumprem os objetivos de cada um, as contingências entre a decisão e o resultado e a probabilidade de ocor- rência de diferentes resultados. A decisão "certa", então, é escolher a opção com a maior chance de atingir os objetivos do tomador de decisão (HODGKINSON; MAULE; BOWN, 2005). O pressuposto subjacente é que, em longo prazo, bons processos de decisão são mais propensos a gerar bons resultados. Assim, a abordagem orientada em processos avalia a qualidade de uma decisão por sua estrutura, incluindo quão bem ela representa os objetivos do tomador de decisão. Como resul- tado, é mais fácil avaliar a qualidade e definição da matéria sobre a qual uma decisão deve ser tomada (SIMON, 1973). Ao julgar problemas mal definidos, o foco geralmente permanece na formulação do problema inadequado e não na própria decisão. A maioria das decisões da vida real são vagas e mal definidas (FISCHHOFF, 1996). Tomadores de decisão podem, por exemplo, realizar múltiplos e ambíguos objetivos, tornando difícil julgar qual seria a melhor decisão. No entanto, pesquisadores orientados a processos de tomada de decisão argumentariam que a metade da solução envolve a estruturação apropriada do problema. Baron (1994) observa que as pessoas têm dificuldade em seguir essa abordagem orien- tada no processo. Normativamente, a estrutura de decisão deve incorporar resultados poten- ciais, porque somente isso afetaria o cumprimento dos objetivos do tomador de decisão, um requisito conhecido como "consequencialismo". Mesmo que não afete as consequências de uma decisão (em termos de seus objetivos), as pessoas são sensíveis à forma como um resul- tado foi obtido. Baron, Spranca e Minsk (1991) mostraram que decisões com resultados idên- ticos são determinadas como resultantes de atos de ação, ao invés de atos de omissão. Alguns argumentam que as respostas emocionais fortes devem ser consideradas como parte do resultado da decisão (MCDERMOTT, 2004). Após o conhecimento de resultado de uma decisão, as pessoas são ainda menos propensas a seguir as diretrizes fornecidas pela lite- ratura baseada em processos. Em vez disso, ao julgar a qualidade da decisão, elas tendem a se concentrar no resultado (BARON; HERSHEY, 1988; JONES; YURAK; FRISCH, 1997). A razão simples subjacente a essa ênfase é que, no final do dia, as consequências de uma deci- são são mais salientes do que o processo que as produziu. Dessa forma, alguns pesquisadores de tomada de decisão em Psicologia Social defen- dem que o foco recaia sobre os resultados. Hershey e Baron (1992) salientam que, se um pro- cesso de decisão bom for mais suscetível a levar a um bom resultado, segue-se logicamente que os bons resultados são mais prováveis vindo de bons processos de decisão. Por sua vez, 36 Frisch e Clemen (1994) também abordam este argumento tratando a questão da qualidade da decisão, a partir de características do processo decisório que aumentem a probabilidade de obter um bom resultado, mesmo que violem a abordagem orientada para o processo. No entanto, a maioria dos pesquisadores enfatiza que o processo, e não o resultado, deve ser objeto de avaliação. Suas teorias são consideradas "normativas", prescrevendo o que as pessoas devem fazer e como julgar decisões. A pesquisa "descritiva", que discorre como as decisões são realmente feitas, mostra que as pessoas se concentram nos resultados das deci- sões. As considerações normativas e descritivas estão profundamente inter-relacionadas, e existe uma interação contínua entre as duas perspectivas (COOMBS; DAWES; TVERSKY, 1970; KEREN, 1996). Para avaliar a qualidade da decisão, é importante examinar as facetas tanto normativas como descritivas das questões relevantes. Um procedimento comum é usar benchmarks normativos nos quais o processo real e o resultado são comparados. Uma opção alternativa é o que Keeney e Raiffa (1976) denominaram de abordagem "prescritiva". Ela oferece diretrizes para os tomadores de decisão que procuram otimização, mas leva em consideração sua capacidade limitada de processamento de memória e informa- ções que as torna vulneráveis a erros humanos, como tendências de raciocínio e emoções. Quadro 4 – Tipos de análise de decisões Focada no Processo Descritiva Descreve como as decisões são realmente feitas. Normativa Diz o que as pessoas devem fazer e como julgar decisões. Prescritiva Oferece diretrizes para os tomadores de de- cisão que procuram otimização. Focada no Resultado A estrutura de decisão deve incorporar resultados potenciais, porque somente isso afetaria o cumprimento dos objetivos do tomador de decisão, um requisito conhecido como "consequen- cialismo". Fonte: Criação nossa, com base em dados de Coombs, Dawes e Tversky (1970), Keren (1996), Keeney e Raiffa (1976). As considerações específicas que prevalecem no processo de avaliação da qualidade da tomada de decisão dependem, em grande medida, do modelo de tomada de decisão adota- do pelo ator. O problema da qualidade da decisão é examinado dentro de três abordagens dife- 37 rentes, amplamente definidas, para o estudo da tomada de decisões. O primeiro é o chamado paradigma do jogo, que tem sido a abordagem dominante no campo da tomada de decisão desde a sua criação. O principal pressuposto subjacente é que cada problema de decisão pode ser traduzido em uma escolha entre apostas, dependendo fortemente da teoria da utilidade (LUCE; RAIFFA, 1957; KEENEY; RAIFFA, 1976; SCHOEMAKER, 1982). A segunda abordagem é o modelo de conflito, que considera uma decisão ser a resolução de um conflito emocional, no qual escolher uma opção significa renunciar a outra (JANIS; MANN, 1977; COOMBS, 1987). A terceira, e última, abordagem é o modelo de responsabilidade (TET- LOCK, 1991; LERNER; TETLOCK, 1999), que afirma como principal objetivo do decisor defender as decisões de forma convincente, se for responsabilizado. As avaliações podem variar entre os atores que endossam diferentes perspectivas e modelos diferentes, por exemplo, pacientes e colegas podem ter uma abordagem diferente pa- ra julgar a qualidade da decisão de um médico. Enquanto os colegas podem enfatizar o pro- cesso de decisão, os pacientes provavelmente se concentrarão no resultado. Seja qual for a perspectiva tomada, um ator neutro raramente existe (HODGKINSON; MAULE; BOWN, 2005). Quadro 5 – Tipos de avaliação da qualidade de uma decisão Paradigma do Jogo Processo decisório pragmático, somando prós e contras, influenciado pela teoria da utilidade, é a abordagem dominante no campo. Modelo de Conflito Um processo de perdas e ganhos, toda escolha é feita a partir da renúncia de outras possibilidades. Modelo de Responsabilidade Caso seja responsabilizado, o decisor deverá se defender, por isso escolhe a opção em que ele melhor se justifique. Fonte: Criação nossa, com base em dados de Luce e Raiffa (1957), Keeney e Raiffa (1976), Schoemaker (1982), Janis e Mann (1977), Coombs (1987), Tetlock (1991) e Lerner e Tetlock (1999). Como uma decisão é avaliada também depende se o ator se concentra na decisão ou no tomador de decisão, o produto ou o produtor. Por exemplo, um júri pode julgar o crime ou o criminoso, considerando, entre outras coisas, o número de infrações. Embora os dois estejam intimamente ligados, eles não são, de modo algum, o mesmo. O foco no tomador de decisão 38 pode envolver uma revisão do histórico de tomada de decisão dessa pessoa, que incorpora múltiplas e repetidas decisões (COOMBS; DAWES; TVERSKY, 1970). Em ambos os casos, bons processos de decisão têm maior possibilidade de produzir bons resultados. No entanto, há evidências cada vez maiores que, na prática, os padrões de escolha do tomador de decisão (e, possivelmente, os julgamentos dessas decisões) sob condi- ções de escolha únicas e repetidas não são necessariamente os mesmos (KEREN, 1996). Se uma decisão é percebida como única ou repetida, esta é muitas vezes determinada pela forma como a decisão é enquadrada, e por quem é o decisor. Por exemplo, um paciente (ou um de seus parentes) que tem que julgar a qualidade de um tratamento médico, natural- mente, se concentrará exclusivamente nas particularidades de seu próprio caso, adotando as- sim uma perspectiva única. Em contrapartida, os médicos provavelmente tenderão a ter em conta a informação distributiva. A disputa sobre o julgamento estatístico em oposição ao clí- nico (DAWES; FAUST; MEEHL, 1989) sugere que, enquanto a abordagem anterior é norma- tivamente superior, a maioria das pessoas se apega a esta última. Um desacordo fundamental entre os tomadores de decisão pode surgir quando um adota o procedimento clínico, enquanto o outro adota a abordagem estatística (ou vice-versa). Em suma, o julgamento da qualidade da decisão depende da perspectiva tomada pelo ator, seja focando no resultado ou no processo, na decisão ou no tomador de decisão, um jul- gamento estatístico ou clínico. A teoria que utilizaremos como base para o estudo explica um fenômeno que pode ocorrer em processos decisórios de pequenos grupos, sendo assim aplicável em Israel, e ao processo decisório da Guerra do Líbano de 1982. Este fenômeno, conhecido como Group- think ou pensamento de grupo, foi cunhado por Irving L. Janis em seu artigo “Victims of groupthink: A psychological study of foreign policy decisions and fiascoes”, publicado pela primeira vez em 1972. De forma inédita, o autor aplicou uma análise da psicologia para deci- sões no nível de Estado, tentando explicar escolhas em processos decisórios. Fez plausível a hipótese de que cada um destes eventos pode, em grande parte, ser atribuído à ocorrência de um fenômeno muito específico e prejudicial dentro dos grupos de decisores envolvidos9. Assim sendo, groupthink refere-se à tendência de grupos a chegarem a decisões sem avaliar com precisão as suas consequências, porque os membros desses grupos tendem a con- 9 O nome groupthink se origina na palavra doublethink da obra literária 1984, de George Orwell (HART, 1991). 39 cordar com a maioria e com as ideias que possuem maior apoio10. Na próxima sessão apro- fundaremos a discussão sobre o fenômeno groupthink e seus elementos. 2.2 Groupthink Nosso trabalho centra-se no tomador de decisão individual e no conjunto de tomadores de decisão individuais, como a principal unidade de análise, porque uma melhor compreensão dos processos de julgamento e dos sistemas de crença dos indivíduos é um pré-requisito vital para uma melhor compreensão das dinâmicas cognitivas e comportamentais do processo de estratégia em níveis mais altos de análise. Nosso trabalho é sustentado por uma abordagem de processo duplo para descrever os processos cognitivos através dos quais os atores individuais representam internamente problemas estratégicos e avaliam cursos alternativos de ação duran- te a elaboração de estratégias (HODGKINSON et. al., 1999; HODGKINSON; MAULE, 2002). Esta abordagem é baseada em teoria e pesquisa dentro da psicologia cognitiva e social sugerindo que existem dois tipos diferentes de estratégias de processamento de informação tipo I (heurística) e tipo II (elaborativo). Atualmente, os pesquisadores estão divididos em termos de extensão em que essas estratégias de processamento são mais apropriadamente vis- tas como funções paralelas, servidas por sistemas cognitivos independentes ou, alternativa- mente, como os extremos bipolares de um continuum unidimensional. Apesar de perspectivas racionalistas serem dominantes no estudo da tomada de deci- são em política externa, críticas frontais têm sido dirigidas ao modelo ao longo das últimas décadas. Estudos empíricos de decisão política, seguindo a liderança do estudo de Graham Allison e Philip Zelikow (1971; 1999) sobre a crise dos mísseis de Cuba, forneceram provas que duvidam da validade empírica dos modelos de atores racionais e começaram a formular e testar alternativas. Além disso, argumentou-se que os pressupostos racionalistas de informa- ções perfeitas, preferências bem ordenadas e dominância de um único ator estão muito distan- tes da realidade política. Isso também obstrui a utilidade da perspectiva racional como uma diretriz normativa para a obtenção de decisões de alta qualidade (DROR, 1964; ETZIONI 1967; LINDBLOM, 1979). 10 Na obra de Goldstein e Pevehouse (2014), este fenômeno é ilustrado por um exemplo de psicologia: um grupo de seis pessoas é solicitado para comparar os comprimentos das duas linhas projetadas em uma superfície, cinco das seis pessoas estão secretamente instruídas a dizer que a linha A é a maior mesmo que seja evidente que a linha B seja a maior. O mais provável é que a sexta pessoa concorde com o resto do grupo ao invés de acreditar em suas próprias convicções. 40 Alternativas à perspectiva racional assumiram várias formas. Um importante conjunto de abordagens enfatizou as dimensões políticas do processo de tomada de decisão: muitos ato- res, interesses diversos, conflitos interagências e coalizões ad hoc. Nos modelos burocrático e organizacional de processo decisório, as decisões não são o produto de escolhas calculadas por um governo ou uma empresa como um ator unitário, mas sim o resultado de um processo de barganha entre os diferentes jogadores em uma arena política burocrática (ALLISON; ZELIKOW, 1971, 1999; HALPERIN, 1974; ROSENTHAL; HART; KOUZMIN, 1991). O modelo implica uma ruptura definitiva com as perspectivas tradicionais de tomada de decisão, e uma separação rigorosa entre política e administração (MAULE; HODGKIN- SON; BOWN, 2005). A análise deve então tentar explicar por que algumas questões sociais recebem atenção dos decisores políticos, enquanto outras não. (BACHRACH; BARATZ 1970; COBB; ELDER, 1975; KINGDON, 1985). Como os estudos de Allison e Zelikow (1971; 1999), Steinbruner (1974), Linstone (1984) mostraram, os diferentes paradigmas de tomada de decisão política não são mutuamen- te exclusivos. Em vez disso, eles são complementares: há diferentes tipos de atores e proces- sos envolvidos na tomada de decisões. Dessa forma, explicar a tomada de decisões políticas requer, em outras palavras, uma técnica multiteórica de abordagem. O problema analítico se- ria desenvolver regras que especifiquem o potencial explicativo relativo de vários elementos e paradigmas em diferentes tipos de configurações de problemas, sistemas administrativos e arenas políticas. Além dos paradigmas acima mencionados, os psicólogos que estudam processos polí- ticos a tomada de decisões fornecem uma linha de críticas diferente daquelas baseada em uma perspectiva racionalista, levando à produção de modelos analíticos diferentes. A pesquisa psicológica sobre a tomada de decisões políticas baseia-se no trabalho de pioneiros como Lasswell, Leites, George, Simon e March (apud HOLSTI, 1977). Enfatizam a importância que as diferenças individuais podem ter no curso e nos resultados da tomada de decisão política. Estudos psicológicos trouxeram "o homem de volta": em contraste com pa- radigmas organizacionais/institucionais que enfatizam diferentes níveis de análise, estudos psicológicos centram-se no nível micro (decisores individuais sozinhos e/ou em interação) (HOLSTI, 1977; HERMANN, 1980; KINDER; WEISS 1978; JERVIS, 1980; UNGSON; BRAUSTEIN, 1982). Estudos psicológicos de decisão política refletem orientações diferentes e tradições de pesquisa dentro da psicologia. Eles têm focado, entre outros: (a) nas crenças e cognições dos decisores, moldando seus pontos de vista sobre o mundo, atores-chave e sua importância, a 41 natureza e o alcance dos problemas políticos, e as possibilidades de resolução (COTTAM, 1986); (b) nas capacidades e dinâmicas de processamento de informações, especificando dife- rentes formas pelas quais os indivíduos lidam com limitações nas habilidades cognitivas (AXELROD, 1976; NUTT, 1988); (c) nas emoções e motivações conscientes e inconscientes que afetam as atitudes e predisposições comportamentais dos decisores, incluindo muitos tra- balhos sobre os efeitos do estresse psicológico e estratégias individuais de enfrentamento (COTTAM, 1986; ETHEREDGE, 1985; JANIS; MANN, 1977), (d) nos relatos psico- biográficos de socialização e desenvolvimento da pessoa, de políticos e burocratas chave (GEORGE; GEORGE, 1956); (e) na liderança e estilo interpessoal de proeminentes líderes políticos e burocráticos, especificando como os atores principais interagem com os outros em seus ambientes sociais e profissionais (DOIG; HARGROVE, 1987); e por fim (f) nos grupos e processos, concentrando-se na formação e na dinâmica de pequenos grupos (GOLEMBI- EWSKI, 2008). Quadro 6 – Orientações de pesquisa sobre processo decisório em psicologia (a) Crenças e cognições realizadas pelos decisores Como a visão de mundo dos decisores é formada e suas consequências nas deci- sões. (b) Capacidades e dinâmicas de proces- samento de informações Como os indivíduos lidam com limitações nas habilidades cognitivas. (c) Emoções e motivações Como emoções afetam as atitudes e pre- disposições comportamentais dos deciso- res. (d) Relatos psicobiográficos Como decisores se desenvolveram como sujeito e sua capacidade de socialização. (e) Liderança e estilo interpessoal Como os atores principais interagem uns com os outros em seus ambientes sociais e profissionais. (f) Grupo e processos Como se dá a formação e a dinâmica de pequenos grupos. Fonte: Criação nossa, com base em dados de Sears (1986), Cottam (1986), Axelrod (1976), Nutt (1988), Cottam (1986), Etheredge (1985), Janis e Mann (1977), George e George (1956), Doig e Hargrove (1987) e Golembiewski (2008). 42 O trabalho de Janis, não só sobre pensamento de grupo (1982), mas também no seu es- tudo com Mann (1977), é pioneiro nessa contribuição emergente da psicologia para o campo da tomada de decisões políticas. No momento da sua publicação, era raro em sua ampla abor- dagem interdisciplinar (psicologia social, ciência política e história) o seu uso extensivo em estudos de caso comparáveis descrevendo o argumento, desenvolvendo e ilustrando a teoria. Esta metodologia tornou o modelo atrativo para um público amplo, incluindo a Ciência Políti- ca e as Relações Internacionais —que não eram inclinados a consultar estudos psicológicos empregando métodos estritamente experimentais11. Coesão, vista por Janis e a maioria dos outros teóricos de pequenos grupos como a ex- tensão da "adesão" dos membros de um grupo, é um dos fatores cruciais no funcionamento deste. É também uma das mais intensamente pesquisadas variáveis na psicologia social de pequenos grupos, talvez em parte por causa de ser um dos aspectos mais esquivos e multiface- tados de grupos: existem várias noções concorrentes de coesão; há diferentes técnicas de me- dir a coesão que nem sempre produzem resultados consistentes. A coesão afeta o comporta- mento do grupo de várias formas: permeia a estrutura e processo de grupo e fatores de coesão podem atuar como variáveis independentes, intermediárias ou dependentes. Essencialmente, muitos dos problemas não resolvidos na análise da coesão do grupo, relatados por Cartwright (1968), ainda existem hoje: como várias fontes de atração se combinam em uma medida com- pósita de coesão, qual é a importância de diferentes fontes de atração e agrupamento de cole- tivos, seus efeitos subsequentes sobre o comportamento e qual a natureza dos vínculos causais envolve