UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP Júlio de Mesquita Filho - Campus de Guaratinguetá ESTER MEIRA RAMOS AMORIM IMPLANTAÇÃO E GESTÃO DA FILOSOFIA LEAN EM EMPRESAS CONSTRUTORAS Guaratinguetá-SP 2024 ESTER MEIRA RAMOS AMORIM IMPLANTAÇÃO E GESTÃO DA FILOSOFIA LEAN EM EMPRESAS CONSTRUTORAS TCC apresentado à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Júlio de Mesquita Filho Campus de Guaratinguetá, para obtenção do título de Especialista em Gestão da Produção. Orientador(a): Prof. Dr. Otávio José de Oliveira Guaratinguetá-SP 2024 ESTER MEIRA RAMOS AMORIM IMPLANTAÇÃO E GESTÃO DA FILOSOFIA LEAN EM EMPRESAS CONSTRUTORAS TCC apresentado à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Júlio de Mesquita Filho Campus de Guaratinguetá, para obtenção do título de Especialista em Gestão da Produção. Data da defesa: 18/11/2024. Banca Examinadora: ______________________________________ Prof. Dr. Otávio José de Oliveira UNESP - Júlio de Mesquita Filho - Campus de Guaratinguetá ______________________________________ Prof. Maximilian Espuny UNESP - Júlio de Mesquita Filho - Campus de Guaratinguetá ______________________________________ Prof.ª. Ana Carolina Ferreira Costa UNESP - Júlio de Mesquita Filho - Campus de Guaratinguetá RESUMO A filosofia Lean, originalmente desenvolvida no setor automobilístico pela Toyota, tem sido amplamente adaptada para diversos setores, incluindo a construção civil. O Lean Construction é uma abordagem que busca otimizar processos, reduzir desperdícios e maximizar a eficiência nas obras, visando a criação de mais valor para o cliente. Esta pesquisa tem como objetivo propor recomendações em como se implantar e gerenciar a filosofia Lean em empresas construtoras utilizando-se de algumas ferramentas e conceitos Lean como: Kaizen, Just-in-Time (JIT), 5S, A3, Mapa de Fluxo de Valor (MFV), Last Planner System (LPS), Takt-time, Kanban, Heijunka, Células de Produção, Obeya e Gemba. O método de pesquisa adotado inclui revisão bibliográfica e estudo de caso sobre a implementação e gestão de filosofia Lean uma empresa construtora de grande porte. Este trabalho contribui para a consolidação e expansão do conhecimento sobre o tema e para as empresas construtoras que pretendem alcançar a excelência operacional, bons resultados organizacionais e financeiros. Palavras-chave: Manufatura enxuta; Construção enxuta; Construção civil; Canteiros de obra; Ferramentas enxutas; Conceitos enxutos. ABSTRACT The Lean philosophy, originally developed in the automotive sector by Toyota, has been widely adapted to several sectors, including the construction industry. Lean Construction is an approach that seeks to optimize processes, reduce waste and maximize efficiency in construction sites, aiming to create more value for the customer. This research aims to propose recommendations on how to implement and manage the Lean philosophy in construction companies using some Lean tools and concepts such as: Kaizen, Just-in-Time (JIT), 5S, A3, Value Stream Map (VSM), Last Planner System (LPS), Takt-time, Kanban, Heijunka, Production Cells, Obeya and Gemba. The research method adopted includes a literature review and a case study on the implementation and management of the Lean philosophy in a large construction company. This work contributes to the consolidation and expansion of knowledge on the subject and to construction companies that intend to achieve operational excellence and good organizational and financial results. Keywords: Lean manufacturing; Lean construction; Civil construction; Construction sites; Lean tools; Lean concepts. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Modelo A3 16 Figura 2 - Last Planner System 18 Figura 3 - Desbalanceamento da carga de trabalho por frentes 20 Figura 4 - Exemplo de cronograma takt 21 Figura 5 - Exemplo de Quadro Heijunka e cartão Kanban 22 Figura 6 - Sistemática de um Kanban 23 Figura 7 - Alguns exemplos típicos de formação de células de produção 25 Figura 8 - Metodologias para concepção de uma Obeya 26 Figura 9 - Classificação da pesquisa científica 28 Figura 10 - Fluxo metodológico da monografia 29 Figura 11 - Exposição de banners dos projetos em ferramenta A3 34 Figura 12 - Apresentação dos projetos desenvolvidos durante a primeira consultoria 35 Figura 13 - Situação atual e análise da causa (Projeto de Almoxarifado) 37 Figura 14 - Fluxo de recebimento de materiais 37 Figura 15 - Padrão de armazenamento de materiais 38 Figura 16 - Identificação de estoque mínimo e Kanban de estoque mínimo 39 Figura 17 - Quadro de acompanhamento de pedidos com Kanban de estoque 39 Figura 18 - Fluxo de expedição de materiais 40 Figura 19 - Aplicativo para controle de materiais 41 Figura 20 - Fluxo de solicitação de kits 41 Figura 21 - Modelo de lista de kits e controle de subida do kit para torre 42 Figura 22 - Quadro de programação dos kits solicitados e cartão Kanban 43 Figura 23 - Carrinhos de transporte de bancadas, pisos cerâmicos e forro de gesso 44 Figura 24 - Obra piloto de gestão de produção e logística Lean 45 Figura 25 - Etapas de implementação da filosofia Lean na obra protótipo 45 Figura 26 - Sequenciamento e balanceamento de tarefas no workshop da obra piloto 46 Figura 27 - Desenvolvimento do layout de canteiro e suas fases 47 Figura 28 - Setorização das atividades de infraestrutura enterradas 47 Figura 29 - Cronograma executivo em linha de balanço 48 Figura 30 - Histograma de mão de obra 49 Figura 31 - Modelo padrão de sala de guerra modelada 49 Figura 32 - Filtro do Dashboard de Suprimentos com as restrições 50 Figura 33 - Reunião de Check-in 51 Figura 34 - Painel Gemba de terminalidade das atividades 51 Figura 35 - Organograma da equipe de logística da obra 52 Figura 36 - Organização dos insumos dentro do almoxarifado interno 53 Figura 37 - Controle listas de kits hidráulicos 53 Figura 38 - Programação de subida de kits no elevador 54 Figura 39 - Dashboard desvios de cronograma 55 Figura 40 - Cockpit Lean 55 Figura 41 - Recomendações para a implementação e gestão da filosofia Lean em empresas construtoras 57 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................ 9 1.1 OBJETIVOS ........................................................................................... 10 1.2 DELIMITAÇÃO ...................................................................................... 10 1.3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................... 11 2 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................... 12 2.1 LEAN MANUFACTURING ..................................................................... 12 2.1.1 Kaizen ................................................................................................... 13 2.1.2 Just-In-Time (JIT) ................................................................................. 13 2.1.3 Cinco sensos (5S) ................................................................................ 14 2.1.4 A3 e Mapa de Fluxo de Valor (MFV) ................................................... 15 2.2 LEAN CONSTRUCTION........................................................................ 17 2.2.1 Last Planner System (LPS) e Pull-Planning ...................................... 17 2.2.2 Takt-time (JIT) ...................................................................................... 20 2.2.3 Kanban e Heijunka ............................................................................... 21 2.2.4 Células de Produção ........................................................................... 23 2.2.5 Obeya .................................................................................................... 26 2.2.6 Gemba .................................................................................................. 27 3 MÉTODO DE PESQUISA...................................................................... 28 3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA ......................................................... 28 3.2 FLUXO METODOLÓGICO .................................................................... 29 4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DO ESTUDO DE CASO................ 33 5 RECOMENDAÇÔES PARA IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE FILOSOFIA LEAN EM EMPRESAS CONSTRUTORAS .......................................... 57 5.1 COMPREENSÃO CAPACITAÇÃO E NIVELAMENTO DA EQUIPE ..... 57 5.2 ALINHAMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO COM A ESTRATÉGIA EMPRESARIAL ......................................................................................................... 58 5.3 MAPEAMENTO DE PROCESSOS E IDENTIFICAÇÃO DE DESPERDÍCIOS ....................................................................................................... 58 5.4 APLICAÇÃO DE CONCEITOS E FERRAMENTAS LEAN .................... 59 5.5 PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO INTEGRADOS ................................. 60 5.6 GESTÃO DE INDICADORES ................................................................ 61 5.7 PARCERIA COM FORNECEDORES EXTERNOS E PRESTADORES DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS .................................................................................. 62 5.8 ADAPTAÇÃO DA ABORDAGEM DA IMPLEMENTAÇÃO AO CONTEXTO DA OBRA ............................................................................................. 62 5.9 MELHORIA CONTÍNUA E SUSTENTABILIDADE ........................................ 62 5.10 CULTURA ORGANIZACIONAL E LIDERANÇA .................................... 63 6 CONCLUSÃO ........................................................................................ 64 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 66 9 1 - INTRODUÇÃO A indústria da construção civil pós-pandemia COVID-19 vem sendo uma das protagonistas na recuperação da economia global (AGRAWAL et al., 2024). No entanto, continua a sofrer de um baixo crescimento de produtividade, ciclos de projeto muito grandes, atrasos de cronograma, custos excessivos e é uma das indústrias com pior desempenho quando se avalia a utilização de recursos e gestão de impactos ambientais (SHEKADE; GAIKWAD, 2019). Nesse cenário, as construtoras têm buscado aumentar a produtividade, desempenho e eficiência dos empreendimentos através da aplicação de novas tecnologias e metodologias. A necessidade de garantir uma execução de alto desempenho levou ao desenvolvimento de metodologias como o Lean Construction com seus princípios focados na redução de desperdícios e melhorar os resultados gerais do projeto (SHEKADE; GAIKWAD, 2019). A aplicação da filosofia Lean na construção civil, no entanto, requer uma adaptação devido às particularidades do setor, como: a alta variabilidade dos projetos, fragmentação dos processos e o caráter único de cada obra (SALMAN et al., 2022). Liu et al. (2024), no estudo da filosofia Lean como catalizador na melhora em desempenho de projetos em pré-fabricados na China, a definem com uma metodologia de gestão da produção que visa minimizar o desperdício em termos de recursos humanos, materiais, custos, tempo e outros recursos durante o processo de produção do projeto de construção, enquanto maximização do valor derivado dos recursos investidos. Embora a literatura descreva os benefícios da aplicação do Lean Manufacturing em diferentes indústrias, a implementação eficaz de seus princípios no setor da construção civil ainda encontra diversas barreiras. Essas dificuldades estão relacionadas principalmente à cultura tradicional do setor, ao uso intensivo de mão de obra e à natureza fragmentada das cadeias de suprimentos na construção (XUE et al., 2023). Apesar da existência de estudos e implementações reais de conceitos e ferramentas enxutas (CRUZ; ALTAMIRANO; CARPIO, 2020; SÁNCHEZ et al., 2023), Liu et al. (2024) alertam que ainda faltam pesquisas sobre os reais impactos da filosofia Lean em nível organizacional e cultural de empresas construtoras, o que caracteriza o gap científico a ser preenchido por este trabalho. 10 Liu et al. (2024) comentam também que raramente foram identificados exemplos reais de sucesso na implementação do Lean na indústria da construção devido, grande parte, ao elevado grau de complexidade, volume de informações e falta de integração entre elas. Desafios comuns na implementação do Lean em projetos de construção incluem a necessidade de recursos extras no planejamento, falta de conhecimento e treinamento sobre a filosofia, análise de restrições deficiente, resistência à mudança e fluxo inadequado de informações entre diferentes partes interessadas (MCHUGH et al., 2022). Dessa forma, a questão de pesquisa que norteou o desenvolvimento desse trabalho foi: de que forma é possível introduzir o Lean Manufacturing em empresas construtoras? 1.1 OBJETIVOS O objetivo geral desta pesquisa é propor recomendações para implantar e gerenciar a filosofia Lean em empresas construtoras de forma a alcançar a excelência operacional. De maneira mais específica, esta pesquisa tem como objetivos: • Identificar boas práticas na implementação e gestão de filosofia Lean em uma empresa construtora de grande porte; • Identificar principais dificuldades, complexidades e barreiras encontradas para a implantação e gestão da filosofia em uma empresa construtora. 1.2 DELIMITAÇÃO Este estudo tem como foco em empresas construtoras. E como estudo de caso, restringiu-se a uma empresa construtora de grande porte, com obras de tipologia residencial e comercial de múltiplos pavimentos, localizada no estado do Paraná. 11 1.3 JUSTIFICATIVA O mercado global nas duas últimas décadas tem elevado o nível de exigência das empresas, forçando-as procurarem por meios de máxima redução de custos, entregas de maior valor aos clientes finais, responsabilidade e preocupação com os impactos ambientais de suas operações (ANDREADIS et al., 2017). Nesse cenário, este estudo recomendará formas de aplicação de filosofia Lean em empresas construtoras, de forma a atingir a excelência operacional a partir da eliminação de processos não agregadores de valor e consequentemente, obter-se bons resultados financeiros e alto desempenho competitivo. Estudos de Zhang et al. (2020) mostram que a filosofia Lean pode gerar economia significativa de tempo e de custos em construtoras, desde que aplicada com uma estrutura de gestão bem definida. Esse benefício resulta em um aumento de até 25% na produtividade, além de uma redução notável no desperdício de materiais e na ocorrência de retrabalhos. Ao contrário de outros setores que já adotaram amplamente o Lean, a construção civil ainda enfrenta dificuldades em aplicar efetivamente seus princípios devido à complexidade de suas operações, ao número elevado de partes envolvidas e à variabilidade dos projetos de construção (GÓMEZ-CABRERA et al., 2020). Diante desse cenário, esta pesquisa se justifica pela necessidade de expandir o conhecimento sobre como adaptar, estruturar e gerenciar a filosofia Lean no contexto específico da construção civil. Explorar esses aspectos contribui para o fortalecimento da competitividade das construtoras, reduzindo o desperdício, aumentando a eficiência operacional e garantindo a entrega de valor ao cliente. A partir dessa análise, pretende-se oferecer exemplos práticos e teóricos que possibilitem a empresas construtoras uma melhor compreensão das possibilidades de implementação e gestão dos princípios Lean, promovendo uma mudança cultural em direção a uma construção mais eficiente e colaborativa. 12 2 - REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 LEAN MANUFACTURING Focada em redução de tempo de produção, eliminação de desperdícios em sintonia com a demanda flutuante (MEESENA; THOMPSON, 2022), o Lean Manufacturing é uma filosofia de gestão, originalmente concebida no Sistema Toyota de Produção, a qual define a produção a partir de uma taxa de demanda promovendo uma expressiva redução de superproduções, tempos de espera, excessos de estoque e flutuações de demandas de mercado. De acordo com Mansoori et al. (2024), uma das principais formas de abordar sobre filosofia Lean é a partir dos cinco princípios que a embasam: • Definir valor (o que precisa ser entregue aos clientes); • Mapear o fluxo de valor (qual é o processo que entrega o valor definido); • Criação de fluxo (quais atividades que agregam valor no fluxo de entrega); • Utilizar um sistema puxado (puxando o valor, quando necessário); • Buscar a perfeição (a melhoria contínua de valor e fluxo). O conceito Lean associa práticas de melhoria constante dos processos com a eliminação de atividades que não agregam valor pelo ponto de vista do cliente. Essas atividades referem-se a desperdícios que o Lean e o Sistema Toyota de Produção (STP) categorizam em sete tipos diferentes: produção excedente, transporte, tempo de espera, estoque, transporte, processamento excessivo, desperdício e movimentação (PEREIRA et al., 2019). Segundo Batwara et al. (2024), para atingir a excelência operacional, as empresas devem primeiramente identificar e eliminar os desperdícios e obstáculos existentes em seus processos produtivos. Para isso, devem-se utilizar de alguns princípios do Lean Manufacturing como por exemplo a produção puxada (pull), baseada na demanda do cliente, em vez de ser empurrado (push) pela produção a partir de em previsões e/ou cronogramas. 13 A implementação desses princípios torna-se viável a partir da combinação de algumas ferramentas, conceitos e/ou programas enxutos, como por exemplo: Kaizen, Just-In-Time, 5S, A3 e mapeamento de fluxo de valor (MFV). Estes, potencializam a aplicabilidade do Lean Manufacturing, contribuindo para o posicionamento competitivo e agressivo das empresas em seus negócios (BATWARA et al., 2024). 2.1.1 Kaizen Para atingir alta performance financeira sob o uso de recursos escassos com baixo desperdício exigem uma abordagem sistemática do método enxuto. Um dos conceitos pilares do Lean Manufacturing, o Kaizen e/ou melhoria contínua, estimula os operadores do chão de fábrica a desenvolverem melhorias no processo de setup de máquinas, reduzindo tempo de processamento e desperdícios de matéria prima (CIVAN; CEVIKCAN, 2021). O princípio de melhoria contínua Kaizen tem como princípio envolver os funcionários do chão de fábrica no desenvolvimento de soluções. Esse conhecimento é estratégico ser compartilhado, por meio da socialização, e explicitado por meio da externalização (BOLDUAN; SILVA; BORBA, 2024). A grande maioria das inovações surgem através de propostas de melhoria contínua das competências dos participantes do processo, geralmente especialistas da linha de produção (TATAR; OBRECHT, 2024). 2.1.2 Just-In-Time (JIT) Um modelo Just-in-time (JIT) fornecerá uma solução com inventário de segurança zero (BRUNAUD et al., 2019). Modelos quantitativos validados para planejamento enxuto da cadeia de suprimentos ainda são escassos na literatura, principalmente porque os sistemas “empurrados” convencionais não foram amplamente integrados e testados com sistemas “puxados” em ambientes sustentáveis e resilientes no contexto da Indústria 4.0. Uma boa prática do mercado tem sido a integração do sistema “puxado”, Just-in-Time (JIT) com o planejamento de necessidade de materiais (REYES; MULA; MADROÑERO, 2023). 14 Meesena e Thompson (2022) indicam que algumas das vantagens em reduzir o tempo de ciclo está na simplificação de operações, de forma que a produção pode ser interrompida mais facilmente para se resolver defeitos ou flutuações de demanda. Além disso, quanto mais curta for a sequência de produção, mais fácil será interromper ou modificar a produção, resultando em uma produção mais enxuta. Apesar dos inúmeros benefícios da implementação da filosofia Lean Manufacturing, um ponto de atenção apontado em casos de cenários mais extremos, de grande flutuação de demanda, instabilidade e baixa previsibilidade de movimentos de mercado. Baldawi et al. (2024) indicam que empresas de pequeno e médio porte apresentam níveis mais limitados de implementação por motivos relacionados desde a sua estrutura organizacional, recursos financeiros e devido à falta de especialização. 2.1.3 Cinco sensos (5S) O programa 5S consiste em cinco pilares: senso de utilização (Seiri), senso de organização (Seiton), senso de limpeza (Seiso), senso de padronização (Seiketsu) e senso de disciplina (Shitsuke). Quando implementada de forma completa e adequada, essa abordagem é capaz de contribuir para melhorias no desempenho dos sistemas que estão sendo analisados (PEREIRA et al., 2019). O programa 5S é considerado como um dos primeiros passos para a implementação do conceito da filosofia Lean (BAJJOU et al., 2017). As soluções utilizadas no 5S incluem remoção de materiais e equipamentos desnecessários, separação e marcação de zonas para armazenamento de materiais, colocação de ferramentas e equipamentos em áreas designadas, conformidade com padrões estabelecidos, auditorias e treinamento (AISHEH et al., 2022). A implementação do 5S pode ser uma abordagem eficaz de apoio à gestão da segurança do trabalho do trabalho. Um local de trabalho organizado facilita a detecção de erros e a identificação de danos a materiais, ferramentas e equipamentos, que também representam um risco de acidente de trabalho (MORSHIDI et al., 2022). 15 2.1.4 A3 e Mapa de Fluxo de Valor (MFV) Maximizar o valor de um produto é possível de várias maneiras. Uma delas é a implementação de inovações em produtos. Alterar o design do produto traz a necessidade de introduzir diversas mudanças nos processos de produção e organização. Uma das ferramentas Lean, o mapa do fluxo de valor (MFV) é extremamente útil na identificação de perdas decorrentes do processo. Do ponto de vista do cliente, o produto produzido num processo sem ou com princípios Lean tem o mesmo valor. Porém, do ponto de vista da empresa, e principalmente ao nível dos custos, o produto ganha valor porque é necessário um insumo menor para a sua produção (TATAR; OBRECHT, 2024). Utilizada para identificar desperdícios no processo produtivo, a ferramenta A3 traz uma abordagem sistemática de resolução de problemas e melhoria contínua. Segundo Pascoal, Iamaguti e Bernardes (2021) o A3 permite mostrar as informações- chave e essenciais sobre um problema específico ou conjunto de problemas, e que devem ser perceptíveis e delineadas em uma folha A3, apresentando estrutura baseada no ciclo PDCA (Plan, Do, Check, Act) e/ou na metodologia DMAIC (Define, Measure, Analyze, Improve, Check). No ciclo A3 mais frequente as seções do relatório que são utilizadas são as seguintes: (1) histórico do processo, (2) estado atual, (3) estado futuro, (4) análise das causas raízes, (5) plano de implementação e (6) indicadores de monitoramento. Nas etapas (1), (2) e (3) são contextualizados os cenários reais, desenhada a importância do problema e descrito o que se sabe atualmente sobre a questão. No caso do estudo de Pereira et al. (2019), em uma das linhas de montagem de cabos de travão para a indústria automóvel, a identificação dos problemas foi realizada por meio de sessões de brainstorming com os líderes de equipe e o departamento de produção. Especificamente nos campos de estado atual e futuro são quantificadas todas as informações ou indicadores-chave relativos ao processo que está sendo estudado. Essas informações permitem que a equipe de melhoria se concentre em áreas específicas, para facilmente alcançar melhores resultados e grandes melhorias. Na etapa de análise das causas raízes (4) é importante fragmentar cada nível de informação para serem entendidas as possíveis causas dos problemas e/ou 16 baixa eficiência do processo em estudo (PEREIRA et al., 2019). Devem ser utilizadas algumas ferramentas de aprofundamento da análise como por exemplo Diagrama de Ishikawa e análise dos “5 Porquês”, ferramentas de resolução de problemas que identificam as causas raízes das ocorrências e as eliminam (MAŁYSA et al., 2024). Dessa forma, na etapa (5) é desenhado um plano de implementação mais assertivo e direcionado. No momento da checagem dos resultados, para validar as ações implementadas, é necessário mensurar o desempenho do novo processo formulado através de indicadores-chave (KPI’s) definidos na etapa (6) e assim, pode-se melhorar as ações e direcionamentos de forma contínua conforme evolução e maturidade do processo. Figura 1 - Modelo A3 Fonte: Shook (2018). Englobando ferramentas de MFV e PDCA, o gerenciamento por A3 é uma ferramenta que permite apresentar graficamente as etapas do processo para entender facilmente o fluxo de materiais e informações. Além de registrar e melhorar o processo avaliando seu estado atual e prestando atenção ao tempo das atividades que criam e não criam valor agregado em cada etapa e redesenhar o processo e os métodos de produção para alcançar melhorias (PEREIRA et al., 2019). 17 2.2 LEAN CONSTRUCTION Lean Construction é uma filosofia de gestão de produção da construção com raízes no Sistema Toyota de Produção o qual refere-se a um conjunto de princípios e práticas adotados pela Toyota com a finalidade de eliminar todos os tipos de desperdícios de seu sistema de produção de veículos e, consequentemente, desenvolver métodos de produção mais eficientes (AGRAWAL et al., 2024). Segundo Agrawal et al. (2024), para melhorar a produtividade da indústria da construção, pode-se começar pela aplicação da produção enxuta na construção com a identificação de algumas partes das atividades de transformação que podem ser desnecessárias, sem agregação de valor ou desperdício. Segundo Mansoori et al. (2024), empresas construtoras possuem grande dificuldade de implementação efetiva do Lean à medida que apresentam processos de ciclos longos e gerenciados por diferentes organizações e operações. Esse cenário torna o Kaizen e/ou melhoria contínua desafiadora e dificulta a repetição do processo. A falta de repetição resulta na dificuldade de medir o status do processo, definir o desenvolvimento metas e medir o impacto das ações de desenvolvimento. A resultante disto são processos de riscos elevados, baixa previsibilidade e confiança na cadeia de valor. Diante de tamanho desafio, a implementação da filosofia Lean em projetos de construção tem apresentado um grande potencial em otimizar os processos de produção melhorando notavelmente a qualidade do produto, reduzindo desperdícios, custos, melhorando a previsibilidade e mitigando riscos. Na indústria da construção civil têm sido aplicadas diversas ferramentas, conceitos e métodos vinculados à filosofia Lean, como por exemplo: Last Planner System, Pull-Planning, Takt-time, Kanban, Heijunka, Células de produção, Obeya e Gemba. 2.2.1 Last Planner System (LPS) e Pull-Planning Itodo et al. (2024) definem o Last Planner System (LPS) como um método de planejamento e controle da produção que envolve todos os membros da equipe do projeto no equilíbrio e nivelamento das cargas de trabalho, aumentando a confiabilidade do fluxo de atividades. A implementação eficaz do LPS na indústria da 18 construção impacta diretamente no sucesso ou não sucesso da implementação da filosofia Lean. O LPS é um sistema hierárquico que se concentra em aumentar o nível de detalhe dos planos conforme o tempo de execução se aproxima, aumentando-se a confiabilidade dos planos e reduzindo a variabilidade do fluxo de trabalho (AGRAWAL et al., 2024). O controle (Figura 2) se concentra em direcionar os planos selecionando tarefas para execução diária, transferência confiável de trabalho entre os especialistas e, se necessário, identificando formas alternativas de realizar os planos. Considera os itens cruciais no planejamento e controle, enfatiza aspectos envolvendo a equipe de execução de campo no processo de planejamento, colaboração entre várias partes interessadas, assumindo compromissos confiáveis em público, e mantendo os planos à vista de todos (BALLARD; TOMMELEIN, 2021). Figura 2 - Last Planner System Fonte: Agrawal et al. (2024). Com o envolvimento e colaboração direta da mão de obra nos planejamentos, a abordagem do Last Planner System (LPS) trouxe uma melhora efetiva na confiabilidade dos planejamentos, reduzindo a variabilidade no processo de construção. A prática tradicional de programação de construção muitas vezes define tarefas de uma forma que é desconectado da evolução do canteiro de obras. Esta 19 desconexão pode levar à negligência as realidades locais do projeto de construção (AGRAWAL et al., 2024). O LPS tem expandido da função de controle de produção para incluir a programação em fases/estágios de obra. Neste caso, nos cronogramas longo prazo são divididos em marcos executivos e com isso feitas transferências em nível de processo entre diferentes especialistas usando colaboração para “puxar” o planejamento (Pull-Planning). Os marcos definem as metas para cada fase do projeto (BALLARD; TOMMELEIN, 2021). A ferramenta Pull-Planning remete ao sistema puxado para atender às necessidades do que se precisa, na quantidade e momentos certos, otimizando assim, a entrega e o armazenamento de materiais no canteiro de obras e promovendo um fluxo de caixa mais saudável e equilibrado para a empresa (ITODO et al., 2024). Apesar dos benefícios comprovados, como a melhoria da confiabilidade do planejamento de projetos, a indústria da construção ainda não gera todos benefícios possíveis do LPS devido aos desafios técnicos e de gestão de pessoas enfrentados durante a sua implementação. Alguns desafios comuns na implementação do LPS na construção incluem a necessidade de recursos extras no planejamento, falta de conhecimento e treinamento sobre o LPS, análise de restrições deficiente, resistência à mudança e fluxo inadequado de informações entre diferentes partes interessadas (MCHUGH et al., 2022). Nos planejamentos colaborativos com implementação do Last Planner System tem sido utilizada a linha de balanço em que visualmente pode-se enxergar desperdícios de tempo, oportunidades de otimização de prazo e gargalos de forma didática, simples e visual. Algumas empresas têm implementado dashboards em Power BI (Business Intelligence) para consolidação e visualização dos controles e informações de forma visual e padronizada (POZZI et al., 2024). Com a evolução da tecnologia, esforços significativos foram feitos para automatizar diferentes componentes do LPS, como por exemplo, a automatização do fluxo de informações e verificação de restrições em tempo real (SOMAN, 2020). Diferentes ferramentas e tecnologias permitiram essa automação, como Modelagem de Simulação (ABDELMEGID et al., 2023), BIM (HEIGERMOSER et al., 2019), Linked Data (SOMAN, 2020) e Inteligência Artificial (AI) (SOMAN; SOLANA, 2022). A automação fornece benefícios profundos para a implementação de LPS com uma maior precisão dos planos, a possibilidade de seleção entre diferentes 20 alternativas de plano, simulações de tempo-espaço para reduzir conflitos e/ou imcompatibilidades em canteiros de obras e assim por diante. Como o LPS é uma ferramenta crucial de Lean Construction, a melhoria na implementação do LPS também apoia projetos de construção mais enxutos (AGRAWAL et al., 2024). 2.2.2 Takt-time Produção takt-time significa igualar as taxas de produção de diferentes frentes de forma a se evitar uma situação em que o progresso de tarefas mais rápidas é interrompido por tarefas mais lentas e vice-versa. Na produção takt-time, todas as tarefas inclusas nela são programadas para começar e terminar dentro de ciclos de igual duração. Assim, os negócios se movem de um local de trabalho para outro em intervalos consistentes. (KESKINIVA; SAARI; JUNNONEN, 2020). Na produção takt-time cada ofício deve terminar seu trabalho em um determinado local dentro de um período de tempo uniforme: o tempo takt (ALHAVA et al., 2019). Para garantir um processo contínuo da produção (Figura 3), todas interferências possíveis que podem causar variação na taxa de produção são eliminadas no planejamento takt-time. Figura 3 - Desbalanceamento da carga de trabalho por frentes Fonte: Frandson, Berghede e Tommelein (2013). No planejamento takt as frentes de trabalho são subcarregadas, ou seja, é atribuído menos trabalho do que a capacidade. O propósito da sub-carga é garantir que os trabalhos que levam mais tempo do que o esperado não atrasem a produção (FRANDSON; SEPPÄNEN; TOMMELEIN, 2015). 21 Quando várias frentes diferentes devem trabalhar juntas, a coordenação do trabalho entre elas é essencial (Figura 4). E apesar da produção ter planejamento takt, o trabalho nem sempre progride no mesmo ritmo dentro das estações de trabalho (HAGHSHENO et al., 2016). Figura 4 - Exemplo de cronograma takt Fonte: Dlouhy et al. (2016). Mais marcos são definidos para a produção quando o tempo takt é definido em um curto período (BINNINGER; DLOUHY; HAGHSHENO, 2017). Quanto menores forem os segmentos em que a produção é dividida, mais detalhado pode ser o plano de produção e menos ambiguidade haverá no monitoramento da produção (DLOUHY et al., 2018). Embora observar e corrigir erros diariamente exija muito monitoramento, isso evita que atrasos se acumulem e desenvolva o fluxo de produção (LEHTOVAARA et al., 2019). 2.2.3 Kanban e Heijunka Para a coordenação de muitas linhas de produção e redução de custos de logística e apoio, é aplicado o conceito de Heijunka, vinculado ao nivelamento de cargas. Na implementação de Heijunka é estabelecida uma previsão de carga de trabalho (planejamento takt) o que contribui para o processo eficiente de abastecimento e evita custos de mão de obra desnecessários e uma linha de montagem sem desperdícios. (CRUZ; ALTAMIRANO; CARPIO, 2020). O nivelamento de carga de abastecimento geralmente é controlado visualmente a partir de um quadro Heijunka (Figura 5) no qual será possível planejar e controlar o processo de abastecimento. O layout deste quadro deve ser adaptado às particularidades da indústria, sendo geralmente organizado de forma que no topo 22 ficam as semanas do mês e/ou dias da semana dependendo do tempo de ciclo das frentes de atividades envolvidas e ao lado esquerdo, verticalmente, as classificações por pedido. Podem ser ferramentas, materiais, insumos (CRUZ; ALTAMIRANO; CARPIO, 2020). Figura 5 - Exemplo de Quadro Heijunka e cartão Kanban Fonte: Cruz, Altamirano e Carpio (2020). Neste quadro Heijunka onde a produção é controlada pelo Kanban e nivelada com o Heijunka, é possível identificar as semanas com maior carga de trabalho e distribuí-las para evitar picos de pedidos, flutuações de demanda e garantir que as frentes de produção não fiquem desabastecidas. Além também de evitar tempos de espera, quebra de estoque e pedidos incorretos (CRUZ; ALTAMIRANO; CARPIO, 2020). Com o envolvimento do “último planejador” nos planejamentos de construções, tem sido muito comum a utilização de algumas ferramentas enxutas que funcionem de maneira visual e comunicação universal, como por exemplo, o sistema Kanban (Figura 6). Sendo um dispositivo sinalizador que autoriza e dá instruções para a produção ou retirada de itens em um sistema puxado, o Kanban, é muito aplicável na construção civil, principalmente em manutenções de equipamentos, inventários de almoxarifados e gestão de abastecimento em canteiros de obras (ITODO et al., 2024). 23 Figura 6 - Sistemática de um Kanban Fonte: Lean Enterprise Institute (2011). O sistema Kanban permite que gerentes de construção e fornecedores definam melhor as metas de forma integrada dentro e fora do local de obra, relatem demandas em tempo real e conduzam planejamento e monitoramento colaborativos e mais assertivos (ITODO et al., 2024). 2.2.4 Células de Produção A diversidade de alguns procedimentos produtivos, somada às condições de volume e demanda, levou gestores de vários setores a dividir o trabalho em tarefas que envolvem tarefas específicas. escopos. A divisão do trabalho fez com que algumas organizações dividissem as linhas de produção em grupos conhecidos como células, que foram adotadas para desenvolver um conjunto de tarefas específicas em um processo de produção (SÁNCHEZ et al., 2023). A organização de uma célula é baseada em um processo de fabricação focado na produção de peças em uma linha ou célula de máquinas operadas por trabalhadores vinculados à linha ou célula (TEZEL; KOSKELA; TZORTZOPOULOS, 2021). Portanto, a organização interna das células de produção é caracterizada agrupando um conjunto de recursos humanos, equipamentos e materiais para contribuir para a geração de valor na entrega através do desenvolvimento de um conjunto de tarefas. 24 Uma célula de produção refere-se a um pacote de trabalho realizado durante um tempo takt. Um pacote de trabalho define o trabalho que é realizado durante cada takt (DLOUHY et al., 2016). Segundo Tezel et al. (2016), nas organizações que adotam sistemas de produção celular, a disposição das células é realizada para manter alguns princípios elementares: • Cada célula é organizada para transportar realizar um processo específico; • Cada célula tem autonomia na sua organização interna e na tomada de decisão; • As células devem ser facilmente adaptáveis às condições de produção; • Os recursos e estoques nas células devem ser suficientes para manter a continuidade da produção, mas limitados evitar dificultar os processos de produção; • A comunicação deve ser dinâmica e eficiente entre as células de produção; • A afinidade de tempos de produção e entregas é necessária de acordo com os requisitos das células subsequentes que possuem interdependências; • Os recursos são organizados no local considerando a continuidade e eficiência do processo produtivo; • Equipes e pessoas são designadas de acordo com a especialidade da célula. Devido ao seu alto grau de especialização e flexibilidade, as células são ideais para implementação processos de melhoria contínua com foco na minimização de perdas e desperdícios para maximizar o valor gerado nos processos produtivos (TEZEL; KOSKELA; TZORTZOPOULOS, 2021). Nas células (Figura 7), os processos focados em ciclos de melhoria contínua levam à obtenção de benefícios mais significativos que podem ser usados para melhorar questões de eficiência e qualidade. 25 Figura 7 - Alguns exemplos típicos de formação de células de produção Fonte: Sánchez et al. (2023). Assim, as células têm um amplo potencial para promover melhorias nas entregas por meio de melhorias nos processos produtivos. Nas organizações celulares, foram observados diferentes benefícios que contribuíram para melhores processos de produção, como melhorias na produtividade, comunicação fluida, redução nos tempos de produção e estoques, redução na movimentação desnecessária de recursos e especialização de pessoas, entre outros (ALIMIAN; GHEZAVATI; MOGHADDAM, 2020). A organização dos processos produtivos em células envolve a realização de um conjunto de atividades, tais como (1) identificar os processos de produção e sua sequência de desenvolvimento, (2) seleção dos processos com potencial para organização por células, (3) definição de tarefas de cada pacote, (4) alocação de recursos para as células selecionadas de acordo com os requisitos das atividades relacionadas, (5) organizar pessoas, materiais e equipamentos de acordo com as sequências de atividades identificados em cada célula, (6) desenhar o plano de comunicação e inter-relação entre os células, (7) monitorar e melhorar a eficiência dos processos, e (8) promover uma cultura de melhoria contínua (SÁNCHEZ et al., 2023). Nessa sistemática, é importante que os lotes unitários sejam concluídos dentro do ciclo definido pelo tempo takt para que o trabalho possa continuar sem interrupção no próximo takt (HAGHSHENO et al., 2016). 26 2.2.5 Obeya Obeya é uma palavra de origem japonesa frequentemente traduzida como Sala de Guerra (Figura 8). A primeira utilização do termo relacionado à gestão foi feita por um executivo da Toyota – visando uma melhor coordenação de um complexo projeto de engenharia. Para facilitar a compreensão das opiniões dos outros trabalhadores e facilitar o seu acesso, foram penduradas folhas com os projetos em A3 na parede de uma das salas de reuniões onde cada um deveria escrever seu ponto de vista (NASCIMENTO et al., 2018). Figura 8 - Metodologias para concepção de uma Obeya Fonte: Obeya Association (2021). Tal como outras práticas e/ou ferramentas baseadas em filosofia Lean, a Sala de Guerra provou ser muito bem-sucedida na integração de informações e colaboração durante os processos de gestão. Facilita a tomada de decisões de uma forma mais eficiente e rápida, apoia uma redução significativa do desperdício e ajuda a reduzir as barreiras organizacionais (TERENGHI et al., 2014). Os participantes podem facilmente enxergar os pontos críticos a serem discutidos e alcançar uma consciência mais profunda sobre os problemas. A Sala de Guerra também oferece um espaço físico para monitorar o fluxo de informações e questões, exibindo visualmente o status e o progresso do projeto. 27 Pode ser também desenhado estratégias de projeto de forma a criar um plano logístico eficiente, eliminando assim movimentações desnecessárias (RASHIDIAN; DROGEMULLER; OMRANI, 2023). Temel et al. (2019) reforçam que na Sala de Guerra as partes não estão apenas reunidas, mas também, estão realizando seu trabalho diário juntos em grupos multifuncionais compostos por todas empresas participantes do projeto. Eles trocam vigorosamente ideias e perspectivas para desenvolver soluções para problemas do projeto. Algumas empresas adotam em sincronia com a Sala de Guerra algumas rotinas com reuniões presenciais, videoconferências, bem como plataformas avançadas, como BIM e meios complementares, como realidade virtual (VR) e realidade aumentada (AR) para tornar ainda mais claras, eficientes e profundas as discussões e estudos do projeto (DU et al., 2018). 2.2.6 Gemba Gemba (“vá, veja, pergunte por quê”) é uma caminhada no local de trabalho que visa observar os funcionários, perguntar sobre suas tarefas e identificar ganhos de produtividade e dificuldades e/ou problemas do dia a dia. Um componente chave de uma caminhada no Gemba é obter a opinião dos funcionários sobre o que está indo bem e o que está errado em uma operação específica (ROMERO et al., 2020). Demirkesen (2021) define o Gemba como uma ferramenta para identificar problemas existentes, coletar de dados diretamente no “local do ocorrido” e analisar as causas raízes dos problemas para assim, introduzir melhorias no chão de fábrica. É também uma prática essencial, que permite aos supervisores ver e avaliar o estado atual do chão de fábrica. Segundo Małysa et al. (2024), a implementação de algumas ferramentas Lean como reuniões diárias, Kaizens e Gemba diretamente na linha de frente com os operadores permitem chamar a atenção para situações perigosas durante a execução tarefas, resolver problemas relacionados à segurança do canteiro de obras e tornar um elemento de formação da cultura sobre a autonomia dos colaboradores na identificação e resolução de problemas recorrentes. 28 3 - MÉTODO DE PESQUISA 3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA Segundo Yin (2017), uma pesquisa científica pode ser caracterizada a partir de algumas variáveis, como: natureza, objetivos, abordagens, objetos e/ou meios e procedimentos conforme Figura 9. Figura 9 - Classificação da pesquisa científica Fonte: Elaborado com base em Yin (2017). Baseando-se nas caracterizações de Yin (2017), esta pesquisa pode ser classificada como aplicada, em relação à sua natureza, pois está voltada para o desenvolvimento de novos métodos orientados para as necessidades do mercado, utilizando a aplicação prática da ciência para gerar conhecimento e resolver problemas específicos. Quanto aos objetivos, é exploratória porque visa proporcionar maior identificação e compreensão dos problemas estudados, tornando-os mais claros e simples. Em alguns momentos também pode ser classificada com o objetivo explicativo por extrair uma compreensão detalhada de um fenômeno específico (YIN, 2017). Em relação à abordagem, é uma pesquisa qualitativa. Os dados serão analisados de forma a compreender as experiências e percepções dos profissionais envolvidos na implementação e gestão de práticas Lean em construtoras, sem 29 utilização de ferramentas ou técnicas estatísticas ou matemáticas. Com relação ao meio de realização da pesquisa, ela pode ser caracterizada como de campo, pois observa-se fatos e fenômenos onde eles ocorrem, coleta-se informações pertinentes sobre eles e os analisa (YIN, 2017). Com relação a procedimento, entende-se que essa pesquisa se utilizou de estudo de caso que, segundo Yin (2017), são os procedimentos mais adequados quando o objetivo é responder questões do tipo “como?” e “por que?”. Sendo assim, a estratégia escolhida para coleta de dados nesta pesquisa é o estudo de caso, permitindo uma análise detalhada das práticas de implementação Lean em contextos reais de construtoras brasileiras de grande porte. 3.2 FLUXO METODOLÓGICO Este tópico contém o fluxo metodológico da pesquisa (Figura 10). Ele descreve os passos a serem seguidos pela equipe para a realização do trabalho, garantindo assim maior confiabilidade das informações, recomendações e replicações. Figura 10 - Fluxo metodológico da monografia Fonte: A própria autora. Este projeto se iniciou com o estabelecimento do tema, gap de pesquisa, questão de pesquisa, objetivos, delimitação e justificativa (etapa 1). Essas atividades foram concluídas durante o período de elaboração do projeto de pesquisa. A etapa 2 foi o aprofundamento do referencial teórico por meio da revisão sistemática da literatura científica relacionada aos dois temas (Lean Manufactuing e 30 Lean Construction) com base na base de dados Scopus. Essa base foi escolhida por ser uma das mais abrangentes bases de resumos e citações de literatura, com ferramentas bibliométricas para acompanhar, analisar e visualizar a pesquisa. Além de ser uma das mais conceituadas e relevantes no cenário científico mundial, possuindo mais de vinte e dois mil títulos em diversas áreas, sendo “gestão” e “tecnologia” duas das principais delas (ELSEVIER, 2021). Na primeira busca foram utilizadas as palavras-chave “Lean Manufactuing” e “Lean Construction” com objetivo de identificar um conjunto de trabalhos que embasam a teoria sobre a filosofia Lean e contribuam com a identificação de seus conceitos, princípios e ferramentas. Na segunda busca foram utilizadas as palavras “Kaizen”, “Just-in-time”, “5S”, “A3” e “Mapa de fluxo de valor” no título dos artigos. Na terceira busca serão utilizadas as palavras “Last Planner System”, “Takt-time”, “Kanban”, “Heijunka”, “Células de Produção”, “Gemba” e “Obeya”. Foram selecionados trabalhos publicados nos últimos 5 anos. Esse período é considerado adequado para identificar principais características, tendências e padrões sobre o tema. Dos artigos identificados na literatura científica em cada busca, os trinta mais citados foram selecionados para elaboração do referencial teórico e para sistematização dos conceitos, princípios e ferramentas Lean. Na etapa 4 foi estruturado o protocolo de coleta de dados a partir dos elementos do referencial teórico, da sistematização e cruzamento entre os temas. Esse protocolo é fundamental para a garantia da confiabilidade e da validação das informações coletadas (YIN, 2017). Os elementos e os resultados obtidos nos estudos de caso, somados a teoria e à expertise da autora, subsidiaram as recomendações de implementação e gestão Lean em construtoras, apresentadas ao final neste trabalho. Para a escolha do estudo de caso (etapa 5) foram prospectadas grandes construtoras que operam no Brasil. Para a amostragem, foi selecionada uma construtora e incorporadora que esteja em processo de implementação e consolidação da filosofia Lean nas operações. A seleção foi realizada com base em critérios como: empresa construtora de grande porte da região sul do Brasil (1); construtora em processo de implementação e gestão de filosofia Lean (2); grande 31 volume de construções de edifícios verticais residenciais e comerciais (3); disposição em participar da pesquisa. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas e análise documental. As entrevistas permitirão explorar as experiências dos profissionais envolvidos na pesquisa, enquanto a análise de documentos (relatórios de projetos, manuais e treinamentos) fornecerá informações complementares sobre as práticas Lean adotadas. Em complemento foram realizadas visitas in loco para observação e validação das informações. A entrevista é um instrumento de coleta de dados que serve de apoio ao pesquisador na obtenção de informações e na identificação de comportamentos e de características dos entrevistados. Ela deve contemplar a estrutura organizacional, os níveis hierárquicos, a formação dos entrevistados, e outras características (YIN, 2017). As entrevistas se deram com profissionais de diferentes níveis hierárquicos, incluindo gerentes de projeto, engenheiros e trabalhadores de campo, permitindo uma visão abrangente sobre as práticas Lean em obras de construção civil. As entrevistas foram conduzidas a partir de um roteiro com a seguinte estrutura: como foi estruturada e implantada a filosofia Lean? (1), quais as ferramentas e conceitos Lean utilizados na implementação (2), quais os treinamento e capacitações realizados com as equipes (3), quais os KPI’s utilizados pela construtora no monitoramento de desempenho das implementações (4) e quais os resultados obtidos até então com a implementação da filosofia na empresa (5). A análise de documentos é um estudo aprofundado de informações do objeto de estudo a partir de um conjunto de registros físicos (YIN, 2017). Por meio dela foram estudados alguns documentos ligados às áreas de projetos, de qualidade ou excelência operacional, de produção e área de tecnologia. Para a análise documental, foram coletados documentos relacionados às práticas de implementação Lean como por exemplo: mapas de fluxo de valor desenhados do pré e pós implementação (1), sistemas e/ou softwares utilizados como apoio (2), relatórios e controles internos (3), materiais de treinamento acerca da filosofia Lean (4). Já a observação in loco ou observação direta ajuda os pesquisadores a presenciar a realidade dos fatos, obter novas informações e validar informações obtidas a partir dos outros dois instrumentos. Miguel e Souza (2012) enfatizam a 32 importância da visita ao local pesquisado para verificar e validar os fenômenos estudados. As visitas in loco foram realizadas nas obras piloto dos trabalhos de implementação Lean. Nessas visitas verificou-se a utilização das ferramentas implementadas, alinhamento dos colaboradores com a implementação e foram coletados feedbacks sobre o processo estabelecido. Com as informações obtidas dos três instrumentos de coletas de dados (entrevistas, análise de documentos e visitas in loco), foi realizada uma triangulação das informações levantadas (etapa 5) de forma a se obter um panorama mais representativo da realidade da empresa. Na etapa 6, a partir dos resultados obtidos no estudo de caso com suporte do referencial teórico, foram formuladas recomendações para a implantação e gestão de filosofia Lean em construtoras de grande porte. E por fim, foi redigida a conclusão da pesquisa (etapa 7). 33 4 - APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DO ESTUDO DE CASO O estudo é sobre uma construtora e incorporadora com origem na cidade de Londrina-PR com mais de 58 anos de atuação em imóveis residenciais e comerciais, volume de 4 a 5 mil funcionários e faturamento na faixa de 200 a 250 milhões ao ano. Todas as figuras, gráficos e informações deste capítulo são provenientes da empresa em estudo, que não foi mencionada neste trabalho por questões de sigilo. Nos últimos 20 anos a empresa em estudo expandiu seus negócios para outras localidades como: Maringá-PR, Curitiba-PR e Campinas-SP com empreendimentos verticais de altíssimo padrão. No rol de atuação do grupo também estão os empreendimentos econômicos (MCMV), localizados em regiões de potencial valorização além de atuar no ramo de obras corporativas, na construção de indústrias, universidades, teatros e centros esportivos pelo país. Nesse processo de expansão estrutural e física identificou-se uma crescente necessidade da melhoria na eficiência de processos internos para a potencialização da excelência em operações e sustentabilidade competitiva da empresa no mercado da construção. Com essa linha de raciocínio, em 2019 deu início a procura por empresas de consultorias voltadas para a melhor estruturação dos processos, consolidação e sugestão de processos construtivos mais enxutos, otimizados e com menos desperdícios. Para tanto contrataram-se, em momentos distintos, duas empresas de consultoria para implementação de filosofia Lean. Na consultoria prestada pela primeira empresa, em 2019, o objetivo principal era instigar a engenharia da construtora à análise crítica sobre a eficácia dos processos administrativos internos e dos processos construtivos de obra de forma a provocar o desenvolvimento de projetos que promovam melhorias operacionais e resultados financeiros concretos para a construtora. Foram contratados seis meses de consultoria divididos em dois módulos principais que envolveram cerca de trinta profissionais da engenharia da construtora: • 1º módulo: foco principal em treinamentos teóricos e dinâmicas sobre os conceitos, princípios da filosofia Lean e a aplicação na construção civil; 34 • 2º módulo: foco na aplicação dos conceitos aprendidos. Os trinta profissionais foram subdivididos em dez grupos de três integrantes cada com o objetivo de desenvolvimento de projetos de melhoria dos processos da construtora utilizando-se A3 para formatação do projeto de forma a se enxergar o estado atual do processo, objetivos do projeto, contramedidas e planos de ação para se atingir o estado futuro e resultados quantitativos e qualitativos obtidos ou que previam-se obter com o projeto. Os temas desenvolvidos envolviam assuntos como a redução de desperdícios vinculados às atividades de forro e drywall, ao piso e revestimento cerâmico, antecipação da execução de reboco externo e atividades de acabamento, otimização do tempo de ciclo da atividade de estrutura e otimização de prazos de execução de obra. Os projetos foram apresentados ao final da consultoria para diretoria e presidência em um auditório no qual ocorreu o fechamento da consultoria. Os feedbacks das equipes foram muito positivos destacando a importância do início do estímulo dos colaboradores a promoverem iniciativas de redução de custos, otimizações e kaizens na empresa. Nas Figuras 11 e 12, respectivamente, pode-se observar os banners expostos durante o evento e uma das apresentações dos projetos em A3 durante o evento de fechamento da consultoria. Figura 11 - Exposição de banners dos projetos em ferramenta A3 Fonte: Arquivos da empresa estudada. 35 Cada grupo teve até vinte minutos para apresentar o projeto desenvolvido perante os demais engenheiros, gerentes e diretoria. Ao final de cada apresentação a diretoria executiva da construtora fez as considerações e questionamentos pertinentes a cada tema. Como conclusão da consultoria prestada pela primeira empresa, 50% dos projetos apresentados obtiveram resultados mensurados, 30% dos projetos tiveram apenas resultados qualitativos e 20% foram projetos de longo prazo que não foram possíveis de serem finalizados no período da consultoria. Desses 50% que apresentaram ganhos concretos, percebeu-se uma grande dificuldade na padronização e disseminação da informação para a empresa como um todo. Alguns dos possíveis motivos levantados da descontinuidade desses projetos, pode-se citar: • Iniciativas pontuais e isoladas, sem uma centralização da informação; • Soluções e reestruturações aplicáveis em cenários específicos e inadequadas perante outros cenários. Figura 12 - Apresentação dos projetos desenvolvidos durante a primeira consultoria Fonte: Arquivos da empresa estudada. 36 Alguns anos depois, em 2022, a construtora buscou uma nova empresa de consultoria com o objetivo de redução de custos direcionada especificamente à engenharia de obras. A empresa estava passando por uma mudança na estruturação de orçamento de obras e por um momento de instabilidade na previsibilidade financeira em custos indiretos (tanto em equipamentos, quanto em recursos humanos de apoio/logística). Diferentemente da primeira empresa de consultoria, a segunda propôs a seleção de uma obra por filial (total de 4 obras), como pilotos dos projetos a serem desenvolvidos. Nessa linha de raciocínio, cada filial elegeu um tema com uma problematização, proposta de mudança e soluções do problema especificado. A consultoria ocorreu em um decorrer de doze meses com nivelamento conceitual a partir de vídeos tutoriais com alguns conceitos e ferramentas baseadas na filosofia Lean (Kanban, Kaizen, JIT, 5S, takt-time, MFV) e duas rodadas, com 5 meses cada, de desenvolvimento de projetos de melhoria operacional nas obras utilizando A3. Até então, nas obras da construtora, não existia um padrão de recebimento, estocagem e controle dos materiais. Consequentemente as obras apresentavam um grande volume de pedidos urgentes para o departamento de suprimentos, sobrecusto por compras em lojas locais e muita sobra de material ao final do empreendimento. Para a melhoria da gestão dos materiais em obra e redução dos desperdícios encontrados, desenvolveu-se o projeto de padronização dos almoxarifados de obra. Neste projeto, foram coletadas algumas informações como: paradas de produção por mês na obra por falta de material (1), número de pedidos urgentes (2) e acuracidade de estoque (3) para amostragem e formatação do estado atual dos almoxarifados da empresa (Figura 13). 37 Figura 13 - Situação atual e análise da causa (Projeto de Almoxarifado) Fonte: Arquivos da empresa estudada. Depois de identificado o estado atual dos almoxarifados da empresa, deu- se início ao desenho e padronização dos fluxos de entrada e saída de materiais e ferramentas. Na Figura 14 pode-se verificar o fluxo de materiais no momento de recebimento. Esse fluxo é utilizado nos manuais de padronização atualmente pela empresa. Figura 14 - Fluxo de recebimento de materiais Fonte: Arquivos da empresa estudada. 38 Também foi estabelecido o padrão de abastecimento dos materiais dentro das prateleiras do almoxarifado (Figura 15). Para os materiais de médio porte (conexões hidráulicas, conexões elétricas) padronizou-se a utilização de caixas de feira 50L e para materiais de pequeno porte e/ou rápido desgaste (parafusos, parabolts, pregos, entre outros) caixas bin nº 7. Figura 15 - Padrão de armazenamento de materiais Fonte: Arquivos da empresa estudada. Junto aos materiais armazenados inseriu-se o cartão de Kanban de estoque (Figura 16), o qual sinaliza a necessidade de requisição de material para o departamento de suprimentos que emitirá o pedido de compra (PC) conforme lead time do insumo. 39 Figura 16 - Identificação de estoque mínimo e Kanban de estoque mínimo Fonte: Arquivos da empresa estudada. O Kanban de pedido é levado ao quadro de pedidos (Figura 17) onde constam os dias do mês e a programação de entrega dos materiais conforme nº de requisição de material (RM) e pedido de compra (PC). Neste quadro os colaboradores conseguem observar a previsão de chegada do material solicitado no almoxarifado, e enquanto a reposição não chega, o estoque mínimo será consumido conforme calculo realizado baseando-se em consumo do insumo, lead time e coeficiente de segurança, com o intuito de não deixar a obra desabastecida. Figura 17 - Quadro de acompanhamento de pedidos com Kanban de estoque mínimo Fonte: Arquivos da empresa estudada. 40 No caso de o insumo estar em estoque disponível, ainda com volume excedente ao estoque mínimo, a movimentação de saída acontece de forma mais simples: se desloca o material da prateleira para a área de expedição conforme fluxograma (Figura 18) e é dada a baixa no aplicativo de controle de estoque pelo código de barras encontrado na identificação do insumo. Figura 18 - Fluxo de expedição de materiais Fonte: Arquivos da empresa estudada. No aplicativo de controle de estoque (Figura 19), o almoxarife consegue ter em tempo real algumas informações de grande relevância logística, como: • Inventário do almoxarifado com valor financeiro correspondente • Movimentações de saída de material com nome dos colaboradores e local de destino/apropriação do insumo • Fazer a impressão das etiquetas de identificação com endereçamento, código de insumo, código de barras para saída via celular • Filtrar insumos conforme estoque mínimo • Criar kits de materiais para simplificar a saída dos mesmos 41 Figura 19 - Aplicativo para controle de materiais Fonte: Arquivos da empresa estudada. Com este projeto, foi possível a padronização total sobre os fluxos logísticos de materiais, ferramentas em um almoxarifado de obra (1), identificações e endereçamentos dos materiais (2), controle de estoques físicos via Kanban e aplicativo (3), e definição de estoque mínimo de materiais de consumo variável (4). Outro projeto que vale destacar foi sobre a gestão do elevador provisório de obra (cremalheira). Foi verificado que não havia uma programação para os operadores das cremalheiras e desta forma eles trabalhavam sob demanda da produção a partir de solicitações imediatas pelo rádio de comunicação da obra. Desta forma os transportes eram sempre urgentes, sem programação antecipada. Além de que o grau de prioridade de subida ficava a cargo dos encarregados/líderes das atividades, o que gerava em certos momentos alguns atritos entre as equipes e desabastecimento de algumas atividades em prol de outras. A partir do projeto, foi desenhado o fluxo de solicitação de materiais e kits que seriam transportados pelo elevador cremalheira (Figura 20). Figura 20 - Fluxo de solicitação de kits Fonte: Arquivos da empresa estudada. 42 Os kits são montados dentro do aplicativo de controle de estoque e em listas físicas, próximas ao estoque, com a finalidade de orientar o almoxarife na montagem do kit. Na lista física (Figura 21) constam algumas informações como: código do insumo, descrição, foto, endereçamento, quantidades. No cabeçalho desta lista, informações como: a qual célula de produção pertence aquele kit, se a lista é do apartamento padrão e/ou modificado. E no verso o edifício, o controle dos kits já montados e entregues para as equipes de produção. Figura 21 - Modelo de lista de kits e controle de subida dos kits para a torre Fonte: Arquivos da empresa estudada. Os kits montados são transferidos para uma área de expedição externa ao almoxarifado, no caso, próxima ao elevador provisório de obra (cremalheira). Conforme o operador de cremalheira subia os kits programados nos horários do quadro de distribuição (Figura 22) os mesmos alteravam a posição para coluna de “abastecido” para sinalizar a finalização do fluxograma de abastecimento entre almoxarifado, montagem de kit e produção na torre. 43 Figura 22 - Quadro de programação dos kits solicitados e cartão Kanban Fonte: Arquivos da empresa estudada. Com a implantação deste projeto os fluxos logísticos da obra ficaram mais otimizados. As paradas de frente de produção por desabastecimento e/ou ineficiência na distribuição de materiais pelo transporte vertical reduziram drasticamente com os kanbans de distribuição. Tornou-se possível e simples identificar a programação de transporte de materiais diariamente, monitorar possíveis gargalos e readequar programações. Os demais projetos da consultoria buscaram encontrar oportunidades de melhoria na logística de distribuição dos materiais nos apartamentos dos pavimentos, com implantações de carrinhos de transporte (Figura 23) que facilitassem o deslocamento e organização de áreas de recebimento, descarte e expedição dos kits no pavimento. 44 Figura 23 - Carrinhos de transporte de bancadas, pisos cerâmicos e forro de gesso Fonte: Arquivos da empresa estudada. Depois da finalização da 2ª consultoria em Lean Construction, a construtora concluiu que existia uma grande necessidade em estruturar uma equipe interna que centralizasse essas informações e estudos, e as implementasse a filosofia de forma sistêmica e estruturada nas obras. Com essa linha de raciocínio, em 2023 iniciou-se a estruturação de uma equipe com formação em engenharia civil e produção que se responsabilizou por compatibilizar os trabalhos desenvolvidos até então com a filosofia Lean e concretizar a aplicação de processos padronizados na gestão de toda logística e na produção e prazo das obras do grupo baseando-se nessa filosofia. Definiu-se então uma obra piloto (Figura 24) a qual teria seu planejamento e execução em acompanhamento direto da equipe Lean com implementação em todo seu decorrer de ferramentas e rotinas vinculadas a filosofia Lean. A obra escolhida está localizada na cidade de Londrina-PR. São 2 torres residenciais de 14 pavimentos tipo, 4 apartamentos por andar, 1 pavimento térreo e 2 subsolos. Apartamentos com área privativa de 115 m². Prazo de 33 meses de execução, 26.590,00 m² de construção. 45 Figura 24 - Obra piloto de gestão de produção e logística Lean Fonte: Arquivos da empresa estudada. Com a seleção da obra piloto, estruturou-se as etapas de implementação dos novos processos conforme fluxo da Figura 25. Figura 25 - Etapas de implementação da filosofia Lean na obra protótipo Fonte: Arquivos da empresa estudada. A primeira etapa de implementação da filosofia Lean foi no Workshop de Gestão de Operações onde reuniu-se por cerca de 12 horas a equipe de liderança da obra (engenheiros, mestre, líderes de instalações, estagiários) para desenvolvimento do cronograma de obra a partir da metodologia de Last Planner em que se passa a adotar um sistema de produção puxado, no qual há uma preocupação não só com as 46 datas de entrega, mas também com a disponibilidade de recursos para a liberação de atividades. O Workshop foi estruturado de forma a abordar num primeiro momento o conceito do Lean. Basicamente explica-se a origem da palavra a partir da história do Sistema Toyota de Produção (STP), e insere-se alguns conceitos como just-in-time, kaizen, Heijunka, 5S, Kanban, 5 M’s de Ishikawa, 8 desperdícios do Lean, takt-time, célula de produção etc. Todos estes conceitos foram inseridos com exemplos práticos das rotinas em uma construção. Em seguida, segmentou-se as atividades da obra em três repartições: torre, fachada e periferia. As atividades de torre, que a princípio são repetitivas, foram dimensionadas pelo conceito de células de produção, equipes multifuncionais, nivelamento de cargas e lote de entrega como 1 pavimento. No caso de fachada e periferia, como não são repetitivas, definiu-se um plano de ataque, fases de obra e metas de médio prazo a partir de metodologia pull-planning. Na Figura 26 constam alguns dos momentos do Workshop de Gestão de Operações, o balanceamento de atividades, com ritmo de 7 dias por pavimento para cada uma das células de produção definidas, número de equipes, funções para cada atividade e cargas de trabalho. Figura 26 - Sequenciamento e balanceamento de tarefas no workshop da obra piloto Fonte: Arquivos da empresa estudada. 47 Com as células de produção definidas, seguiu-se para a 2ª etapa de implementação: Workshop de Gestão de Logística. Nesse treinamento (cerca de 8 horas), foram desenhados todos os fluxos de pessoas, veículos, materiais da obra, áreas de vivência, centrais de produção, berços e as fases de desenvolvimento do canteiro, conforme as imagens na Figura 27. Figura 27 - Desenvolvimento do layout de canteiro e suas fases Fonte: Arquivos da empresa estudada. Também é nesse momento que se definiu a setorização das áreas comuns de obra e plano de ataque (Figura 28). Desta forma, as equipes conseguiam visualizar gargalos, prioridades executivas, pontos de atenção, complexidades e oportunidades do projeto. Figura 28 - Setorização das atividades de infraestrutura enterradas Fonte: Arquivos da empresa estudada. 48 Após alguns dias imersos em informações de prazo, sequências executivas e planos de ataque da obra, a equipe Lean desenvolveu os documentos de cronograma executivo utilizando a ferramenta de linha de balanço (Figura 29) e o histograma com a distribuição e volume de mão de obra necessária para execução do empreendimento dentro do prazo e custo (Figura 30). Figura 29 - Cronograma executivo em linha de balanço Fonte: Arquivos da empresa estudada. Na linha de balanço contam-se algumas informações relevantes para o cronograma executivo da obra, como por exemplo: quantidade de células de produção, ritmo das células de produção, subseções, momentos de montagem e desmontagem de equipamentos de grande porte, marcos de atividades críticas, dentre outros. A linha de balanço é uma referência de início e término de atividades para a elaboração de histogramas. 49 Figura 30 - Histograma de mão de obra Fonte: Arquivos da empresa estudada. Com o início das atividades no pavimento tipo foi estruturada a obeya ou sala de guerra local onde é realizada a rotina de gestão diária (Check-in) e onde as lideranças se reúnem para avaliação dos indicadores, discussão de problemas e soluções, planos de ação e outras reuniões (Figura 31). Figura 31 - Modelo padrão de sala de guerra modelada Fonte: Arquivos da empresa estudada. Na sala de guerra deram início aos treinamentos sobre algumas das rotinas que passariam a existir para monitoramento e gestão a médio e curto prazo. 50 A primeira delas foi a rotina de eliminação de restrições (gestão médio prazo). Baseada na metodologia dos “5 Ms do diagrama de Ishikawa” em que as possíveis causas de um problema são categorizadas em material, mão de obra, máquina, método e meio. Nesta reunião utiliza-se da ferramenta de Power BI para fazerem filtros de cronograma médio prazo (visualização de 2 meses à frente), conforme a Figura 32. Nesse filtro são listadas algumas restrições padrões vinculadas à execução de algumas atividades. As restrições específicas e particulares de cada obra, seria identificada durante essa reunião que envolvia as lideranças de produção como mestre de obras, encarregados de empreiteiro, logística e engenharia. Essa reunião tinha uma frequência de 1x a cada 15 dias. Figura 32 - Filtro do Dashboard de Suprimentos com as restrições apontadas Fonte: Arquivos da empresa estudada. A segunda rotina implantada foi a de Check-in (gestão diária). A reunião de Check-in acontecia no início do expediente, onde reunia-se a engenharia num período de 15 min com a liderança de produção, coletavam-se informações de falta de mão de obra, possíveis problemas identificados logo no início do dia, recapituladas as metas do dia e liberavam-se as equipes para a produção do dia. No último horário do dia reúnem-se novamente para a realização do checkout, onde serão avaliadas as metas do dia se foram cumpridas ou não, e as que não tiverem sido cumpridas abrem- 51 se planos de ação com responsável e data limite de cumprimento para recuperação da meta (Figura 33). Figura 33 - Reunião de Check-in Fonte: Arquivos da empresa estudada. Na reunião de checkout os estagiários de engenharia levavam o controle de Gemba coletado durante o dia, em que eram identificadas faltas de terminalidade e problemas com qualidade executiva (Figura 34). Figura 34 - Painel Gemba de terminalidade das atividades Fonte: Arquivos da empresa estudada. 52 Algumas semanas depois de amadurecimento da implementação das rotinas de gestão de produção, deu-se início às rotinas de gestão de logística conforme a padronização inicializada pela segunda empresa de consultoria. Teve-se uma reorganização do organograma e das atribuições e responsabilidades do almoxarife e auxiliar de almoxarife, com os ajudantes de logística (Figura 35). Figura 35 - Organograma da equipe de logística da obra Fonte: Arquivos da empresa estudada. Neste organograma de logística, o almoxarife passou a adquirir uma função mais estratégica de gestão da organização do canteiro de obras conforme definido pela equipe no workshop de gestão logística. Com presença mais em campo, fazendo as validações de consumo de material em cada célula de produção, abastecimento eficiente e sendo responsável pela gestão da programação de abastecimento de material nas reuniões de Check-in. A função de auxiliar de almoxarifado é interpretada um cargo de controles de estoques mínimos, organização do almoxarifado interno e orientações nas montagens de kits internos. Também era o responsável pelo controle do aplicativo de gestão de estoque interno. Na Figura 36 constam-se alguns exemplos da organização do almoxarifado interno com insumos identificados e endereçados com controle em código de barras. 53 Figura 36 - Organização dos insumos dentro do almoxarifado interno Fonte: Arquivos da empresa estudada. Esses insumos são separados em formato de kits e levados até as centrais de pré-montagem de kits de hidráulica. As listas de kits ficam expostas na central (Figura 37) com os controles de montagem e entrega dos kits para a produção da torre. Figura 37 - Controle listas de kits hidráulicos Fonte: Arquivos da empresa estudada. Essa movimentação de almoxarifado para central e de central de kits para produção da torre, conforme solicitação e programação pela produção no quadro de 54 distribuição e abastecimento do elevador provisório (Figura 38) monitorado e abastecido pelo almoxarife. Figura 38 - Programação de subida de kits no elevador Fonte: Arquivos da empresa estudada. Com os treinamentos e implantação das rotinas de gestão de produção e logística a partir de conceitos e ferramentas vinculadas a filosofia Lean, foram elaborados alguns controles e relatórios gerenciais e estratégicos para reportar às gerências e diretoria sobre o desempenho em prazo e recursos da obra para gestão, melhorias e soluções de problemas. Esses relatórios são apresentados mensalmente à diretoria da empresa nas reuniões mensais de obra (RMO). Em síntese, são compostos por dois painéis principais: dashboard de prazos, e cockpit Lean. No dashboard de prazos (Figura 39) são controlados alguns indicadores como por exemplo: avanço físico-financeiro previsto versus realizado, atividades atrasadas ou adiantas em relação à linha de base, desvios de avanços por atividade, 55 data de tendência de término da obra e quantidade de dias de buffer dimensionado para a obra. Figura 39 - Dashboard desvios de cronograma Fonte: Arquivos da empresa estudada. No cockpit Lean (Figura 40) são monitorados outros índices, mais vinculados a alguns conceitos do Lean como: percentual de plano concluído (%PPC), cumprimento do Takt-time, paradas de produção, participação das reuniões de Check- in e Checkout. Figura 40 - Cockpit Lean Fonte: Arquivos da empresa estudada. 56 Com os treinamentos desenvolvidos, rotinas e monitoramentos/controles baseados numa reestruturação processual, a empresa conquistou mais transparência, visão e estratégia a logo prazo em todos os níveis: operacional, tático e estratégico. A empresa em estudo tem apresentado um desenvolvimento maduro em processos, com planejamentos de obras mais assertivos, execuções das construções com logística padronizada e otimizada, com menos desperdícios de movimentações, transportes e de fluxos contínuos de atividades. E consequentemente também os custos finais das obras têm se apresentado mais enxutos e previsíveis. 57 5 - RECOMENDAÇÔES PARA IMPLEMENTAÇÃO E GESTÃO DE FILOSOFIA LEAN EM EMPRESAS CONSTRUTORAS Implementar, estruturar e gerenciar a aplicação de filosofia Lean em construtoras exige uma adaptação dos princípios originalmente desenvolvidos na indústria manufatureira, para as particularidades da construção civil. Como sinaliza Mansoori et al. (2024), um dos desafios mais significativos para otimização de processos no setor é justamente a fragmentação dos processos de forma horizontal e vertical, com pontos de descontinuidade no fluxo de informações. Esse cenário dificulta medir o status do processo, desenhar metas e Kaizens. Apesar desta realidade do setor da construção, temos algumas recomendações para a implementação e gestão de filosofia Lean em construtoras. Estas recomendações estão esquematicamente representadas na Figura 41. Figura 41 - Recomendações para a implementação e gestão da filosofia Lean em empresas construtoras Fonte: A própria autora. 5.1 COMPREENSÃO CAPACITAÇÃO E NIVELAMENTO DA EQUIPE É muito importante que os princípios, conceitos e ferramentas Lean sejam conhecidos por todos da empresa, desde os operários e lideranças de obra até engenheiros, gerentes e diretores. Por isso, faça treinamentos, workshops e dinâmicas, sobre a filosofia Lean, constantemente com todos os envolvidos na implementação. Caso contrário, o desnivelamento conceitual e cultural pode impactar negativamente na implementação e gestão de uma produção Lean (LIU et al., 2024). 58 Outro ponto importante é a mudança de pensamento. O Lean incentiva a cultura de inovação e resolução de problemas em todos os níveis (operacional, tático e estratégico). Valorize e incentive a autonomia das equipes de operação em atuar e se posicionar sobre os processos da empresa (LIU et al., 2024). 5.2 ALINHAMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO COM A ESTRATÉGIA EMPRESARIAL É de extrema importância, utilizar uma metodologia de alinhamento estratégico de forma a garantir que as metas de longo prazo e os objetivos estratégicos sejam desdobrados até o nível operacional. Para isso, sugere-se a implementação do Hoshin Kanri, que quando feito em paralelo a mentalidade Lean, é possivel atingir melhores resultados corporativos garantindo que todos os funcionários estejam trabalhando em direção aos mesmos objetivos. É uma ferramenta central para empresas que desejam implementar práticas enxutas, garantindo alinhamento estratégico e sustentabilidade organizacional (ROCHE; BAUMGARTNER, 2024). 5.3 MAPEAMENTO DE PROCESSOS E IDENTIFICAÇÃO DE DESPERDÍCIOS Utilize o mapeamento de fluxo de valor (MFV). Ele é indispensável na identificação de processos e na análise do seu estado atual e contribui para a compreensão da natureza de todos os processos de negócios dentro da empresa. É importante que as metas sejam mensuráveis, específicas e apropriadamente adaptadas ao contexto para ajudar a organização a se concentrar em alcançar o sucesso no processo de melhoria (TATAR; OBRECHT, 2024). A partir da ferramenta de MFV, mapeie os fluxos de processos e identifique as atividades que agregam valor e as que não agregam (desperdícios). Na construção, isso pode ser feito desde o momento de concepção de produto e projeto até a execução em campo. Além da utilização do conceito de desperdícios e fluxo de valor, categorize os desperdícios identificados (transporte, estoques, esperas, super-processamento, retrabalhos, movimentação, superprodução e intelectual) e analise suas causas raízes a partir de metodologia dos 5 porquês. Esta forma de tratamento dos problemas cria um ambiente com mentalidade ativa em solução de problemas, equipes autônomas e grandes potenciais de melhoria contínua. 59 5.4. APLICAÇÃO DE CONCEITOS E FERRAMENTAS LEAN A implementação de algumas ferramentas que carregam em si vários conceitos da filosofia Lean simplifica e torna prática a abordagem da filosofia no ambiente corporativo. Para isso, sugere-se implementar conceitos e ferramentas os quais devem ser escolhidos de acordo com as especificidades da organização, do tipo de processo a melhorar e dos objetivos a serem alcançados (SÁNCHEZ et al., 2023). A seguir, estão listados alguns conceitos e ferramentas enxutas que podem colaborar durante o processo de implantação e gestão de filosofia Lean em empresas construtoras: • Kaizen: realizar ciclos de melhoria contínua e ciclos PDCA em projetos de curto prazo para solucionar problemas pontuais, como por exemplo: melhorar a eficiência de uma equipe específica ou resolver gargalos em logística de materiais (TATAR; OBRECHT, 2024). • Just-in-Time (JIT): planejar a entrega de materiais e o trabalho das equipes para que tudo chegue "no momento certo", evitando desperdícios de armazenamento e de tempo (BRUNAUD et al., 2019). • 5S (Seiri, Seiton, Seiso, Seiketsu, Shitsuke): implementar a organização no canteiro de obras, facilitando a localização de ferramentas, materiais, melhorando o ambiente de trabalho e segurança dos colaboradores (PEREIRA et al., 2019). • A3: estimule as equipes a utilizarem de ferramentas estruturadas para organização de propostas, monitoramento e comunicação de melhorias (PASCOAL; IAMAGUTI; BERNARDES, 2021). • Last Planner System: dê treinamentos constantes às equipes de produção sobre a filosofia Lean, e envolva diretamente colaboradores dos canteiros de obra nos planejamentos médio e curto prazo de forma a atingir maior confiabilidade e assertividade (ITODO et al., 2024). 60 • Takt-time: realize planejamentos com definição de ritmo comum às frentes de trabalho, de forma a se evitar uma situação em que o progresso de tarefas mais rápidas é interrompido por tarefas mais lentas e vice-versa (ALHAVA et al., 2019). • Kanban: utilizar ferramentas com sistemática Kanban para gerenciar a entrada e saída de materiais, evitando excesso de estoque e desabastecimento das frentes de produção. E nivelar as demandas a partir de Heijunka (CRUZ; ALTAMIRANO; CARPIO, 2020. • Células de Produção: organize e distribua as frentes de produção de maneira celular. Isto irá simplificar a comunicação entre as atividades, melhorar a produtividade, reduzir estoques e acelerar o ritmo da produção (TEZEL; KOSKELA; TZORTZOPOULOS, 2021). • Obeya: estruture ambientes e/ou salas onde contenham informações claras e transparentes sobre os projetos em andamento, indicadores-chave e etc. Essa medida irá melhorar consideravelmente a comunicação e aumentar a velocidade e transparência aos processos de decisão em projetos de desenvolvimento de produtos (TEMEL et al., 2019). • Gemba: tenha uma rotina estruturada de visitas e roteiros ao canteiro de obras com uma visão direcionada a identificação de desperdícios e oportunidades de melhoria (DEMIRKESEN, 2021). 5.5. PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO INTEGRADOS A filosofia Lean enfatiza a necessidade de planejar todas as etapas do processo para minimizar o tempo de inatividade. Isso inclui cronogramas detalhados, alinhamento com fornecedores e subcontratados. Portanto, recomenda-se a integração dos sistemas e softwares a serem utilizados nas rotinas do dia a dia para que tenha efetividade e assertividade o que é planejado e alinhado entre os stakeholders do projeto. A integração e interação dos operários e lideranças de produção nos planejamentos deve ser cultivada a partir de rotinas com implementação de Last Planner System (LPS), ferramenta que ajuda a alinhar o planejamento estratégico com 61 a execução em campo, permitindo maior controle sobre as atividades diárias e a identificação de gargalos e atrasos (AGRAWAL et al., 2024). Alinhado a uma comunicação LPS sugere-se também a utilização de quadros de gestão visual no canteiro de obras para acompanhamento do andamento das atividades e comunicação entre os envolvidos de maneira simples e universal. 5.6 GESTÃO DE INDICADORES Estabelecer métricas, parâmetros e realizar o monitoramento contínuo contribuirá para planejamentos e estratégias de sucesso. Para tanto, sugere-se estabelecer KPI’s (indicadores chave de performance) para acompanhar a produtividade, consumos de materiais, desperdícios e a qualidade dos serviços. Algumas sugestões de indicadores a serem coletados: • %PPC: porcentagem de pacotes concluídos. Indica a efetividade do que está sendo planejado e o alinhamento e cumprimento da execução com as metas desenhadas. • Desvios: aderência da execução real em relação ao planejado. Com adiantamentos e/ou atrasos das frentes de produção de forma a provocar replanejamentos. • Paradas de Produção: paradas de frente de produção por motivos que podem ser categorizados de acordo Diagrama de Ishikawa (material, mão de obra, máquina, método e meio). • Índice de Terminalidade das Atividades: porcentagem de terminalidade quantitativa e qualitativa das frentes de produção. Verificar se o valor está sendo agregado. Apenas monitorar sem uma retroalimentação e feedback contínuo resulta em diversos projetos e ideias sem resultados e melhorias efetivas. Portanto, realize reuniões frequentes de análise dos indicadores, com o envolvimento de todas as partes da equipe, para ajustar processos e identificar melhorias (MAŁYSA et al., 2024). 62 5.7 PARCERIA COM FORNECEDORES EXTERNOS E PRESTADORES DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS Para maximizar os benefícios da filosofia Lean, sugere-se que seus fornecedores e subcontratados também devam estar alinhados com a filosofia. Isso inclui alinhamento na entrega de materiais e sincronização com o cronograma da obra. Para tanto é de extrema importância o alinhamento contínuo e grande envolvimento da frente de suprimentos com a filosofia Lean. É estratégico e interessante também que as clausuras contratuais incentivem a colaboração, a entrega Just-in-Time e a eliminação de desperdícios por parte da construtora e dos terceiros e fornecedores que estarão em constante interação (REYES; MULA; MADROÑERO, 2023). 5.8 ADAPTAÇÃO DA ABORDAGEM DA IMPLEMENTAÇÃO AO CONTEXTO DA OBRA Recomenda-se que a implementação e gestão Lean seja flexível o suficiente para se ajustar rapidamente à demanda do cliente. Cada projeto de construção é único, e a aplicação do Lean deve ser adaptada a cada contexto. No caso de projetos de grande porte e complexidade diferenciados com muitas variáveis e interdependências, sugere-se a utilização de ferramentas Lean como LPS e MFV para simplificar e gerenciar essa complexidade de forma eficaz (SALMAN et al., 2022). 5.9 MELHORIA CONTÍNUA E SUSTENTABILIDADE Pequenas melhorias contínuas acumulam-se ao longo do tempo, trazendo grandes benefícios. Por isso, recomenda-se o incentivo das equipes envolvidas nos projetos de implementação Lean a constantemente procurarem formas de melhoria de processos, redução de desperdícios e aumento da eficiência. Alinhados a cultura da empresa, utilize de ferramentas tecnológicas e inovadoras como BIM (Building Information Modeling), Power B.I (Business Inteligence), IA (Inteligência Artificial) e dentre outras inovações para otimizar o planejamento e a execução, integrando a filosofia Lean com a digitalização da construção civil (AGRAWAL et al., 2023). 63 5.10 CULTURA ORGANIZACIONAL E LIDERANÇA A implementação do Lean requer um forte patrocínio da alta gestão, que deve liderar pelo exemplo e apoiar os times de obra nas práticas Lean. Sendo assim, fomente o desenvolvimento de sinergia entre as equipes de projeto. O sucesso na implementação e colheita de grandes resultados na implementação do Lean requer muito compromisso e engajamento da alta liderança com os projetos. Com essas práticas, uma construtora pode aproveitar os benefícios do Lean Manufacturing, como maior eficiência, redução de custos e melhoria na qualidade dos projetos. A chave para o sucesso é a adaptação cuidadosa e contínua dos princípios Lean ao ambiente dinâmico da construção civil (LIU et al., 2024). 64 6 CONCLUSÃO A implementação e gestão da filosofia Lean na construtora estudada se mostrou como uma abordagem eficaz para a otimização de prazo de obras e redução de custos. Através da pesquisa realizada, foi possível identificar que as práticas Lean, quando aplicadas de forma estruturada, sistemática e alinhada à estratégia da empresa, promovem ganhos significativos de produtividade, eficiência e qualidade nos processos construtivos. Entre os principais benefícios observados na empresa construtora estudada, destacam-se a diminuição do desperdício de materiais, tempo e esforço, o que se traduz em uma maior eficiência na gestão dos recursos e no controle das etapas de execução das obras. A aplicação de conceitos como just-in-time, Heijunka, 5S, Kanban, takt-time e Last Planner System mostraram-se especialmente vantajosa para a organização dos canteiros de obras e o alinhamento das equipes de trabalho, minimizando retrabalhos e promovendo uma cultura de melhoria contínua/kaizen. Observou-se ainda, na empresa construtora estudada, que a implementação consegue – não apenas reduzir custos operacionais – mas também, entregar projetos com maior qualidade e dentro dos prazos estabelecidos, o que aumenta a competitividade no mercado. Foi reportada também uma significativa redução de desperdícios, otimização de processos e melhoria na comunicação e no fluxo de informações entre os diferentes setores envolvidos na construção do empreendimento. Assim, conclui-se que a filosofia Lean oferece um caminho sólido e comprovado para construtoras que buscam maior eficiência e competitividade, além de promover uma mudança cultural orientada à eliminação de desperdícios e à maximização de valor para o cliente. Uma observação válida de ser ressaltada é que a empresa em estudo procurou por consultorias de implantação de filosofia Lean em períodos de instabilidade interna, de falta de previsibilidade financeira e aumento de custos indiretos das obras. Além de coincidir com anos de grande expansão da empresa: cerca de 15 obras simultâneas no ano de 2019 passaram para 40 obras simultâneas em 2023. Talvez buscando essa reestruturação com padronizações, estabilização de processo em um período de menor grandeza, a empresa crescesse de forma mais orgânica, sustentável e com riscos mitigados. 65 Outro ponto a ser colocado é que a empresa construtora estudada apresenta implementações limitadas aos canteiros de obra, com algumas ações pontuais vinculadas aos departamentos administrativos. E apesar de as construções civis serem o foco principal da empresa em estudo, para alcançar grandes resultados de forma sustentável, é essencial o comprometimento das lideranças e o engajamento de todas as partes envolvidas no processo construtivo, visando a implementação contínua de melhorias e a adoção plena das ferramentas Lean. As recomendações propostas neste trabalho possuem contribuições teóricas e aplicadas. A contribuição teórica se dá em função do aprofundamento e adaptação dos conceitos de Lean Manufacturing para a área de construção civil. Já a contribuição aplicada, ocorre pelo motivo de que, as empresas construtoras que adorem as recomendações propostas, passarão a ter melhores processos com maior qualidade, menor variação, maior produtividade nos canteiros de obras, organização e eficiência logística, bom desempenho em gestão de prazos e custos de obra. Neste sentido, em pesquisas futuras seria interessante buscar identificar outras formas de implementação e gestão de filosofia Lean em construtoras de grande porte no Brasil, de maneira a analisar as mudanças culturais necessárias para o sucesso do processo e quais os ganhos financeiros obtidos com a disseminação total da filosofia pelos departamentos e na empresa como um todo. Também seria de grande valor a identificação de boas práticas em empresas construtoras sobre a implementação e gestão de filosofia Lean em todos os níveis da empresa (estratégico, tático e operacional). De forma que os colaboradores, culturalmente, apresentem uma mentalidade voltada para a redução de custos e maximização de valor. 66 REFERÊNCIAS ABDELMEGID, M. A.; GONZÁLEZ, V. A.; O'SULLIVAN, M.; WALKER, C. G.; POSHDAR, M.; ALARCÓN, L. F. Exploring the links between simulation modelling and construction production planning and control: a case study on the last planner system. Production Planning & Control. London, v.34, p. 459-476, 2023. AGRAWAL, A.; ZOU, Y.; CHEN, L.; ABDELMEGID, M. A.; GONZÁLEZ, V. A. Moving toward lean construction through automation of planning and control in last planner system: a systematic literature review. Developments in the Built Environment, Amsterdam, v.18, p. 100419, 2024. ALHAVA, O.; LAINE, E.; KOSKELA, L. Can a takt plan ever survive beyond the first contact with the trades on-site? In: ANNUAL CONFERENCE OF THE INTERNATIONAL GROUP FOR LEAN CONSTRUCTION, 27. Proceedings [...]. Dublin, 2019, p. 453-464. ALIMIAN, M.; GHEZAVATI, V.; MOGHADDAM, R. 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