Universidade Estadual Paulista Júlio Instituto de Artes GESIEL VILARUBIA PEREIRA ESTRUTURAÇÕES MELÓDICO-HARMÔNICAS NOS 50 PONTEIOS DE CAMARGO GUARNIERI São Paulo 2017 GESIEL VILARUBIA PEREIRA ESTRUTURAÇÕES MELÓDICO-HARMÔNICAS NOS 50 PONTEIOS DE CAMARGO GUARNIERI Dissertação apresentada à Universidade como exigência parcial para a obtenção do grau de mestre em Música. Área de concentração: Musicologia / Etnomusicologia / Educação Musical. Linha de pesquisa: Abordagens históricas, estéticas e educacionais do processo de criação, transmissão e recepção da linguagem musical. Orientador: Prof. Dr. Yara Borges Caznók São Paulo 2017 Ficha catalográfica preparada pelo Serviço de Biblioteca e Documentação do Instituto de Artes da UNESP P436e Pereira, Gesiel Vilarubia, 1986-. Estruturações melódico-harmônicas nos 50 Ponteios de Camargo Guarnieri / Gesiel Vilarubia Pereira. - São Paulo, 2017. 194 f. : il. Orientador: Profª. Drª. Yara Borges Caznók. Dissertação (Mestrado em Música) – Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Instituto de Artes. 1. Guarnieri, Camargo - 1907-1993. 2. Musica para piano - Analise, apreciação. 3. Composição (Musica). I Caznók, Yara Borges. II. Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes. III. Título. CDD 780.981 GESIEL VILARUBIA PEREIRA ESTRUTURAÇÕES MELÓDICO-HARMÔNICAS NOS 50 PONTEIOS DE CAMARGO GUARNIERI Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Música no Curso de Pós-Graduação em Artes, do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – Unesp, com a Área de concentração em Musicologia/Etnomusicologia/Educação Musica, pela seguinte banca examinadora: _________________________________________________________________ Prof.ª. Dr.ª Yara Borges Caznók IA – UNESP – Orientadora _________________________________________________________________ Prof. Dr. Lutero Rodrigues da Silva IA - UNESP _________________________________________________________________ Prof. Dr. César Henrique Rocha Franco UniFIAM-FAAM São Paulo, de de 2017 Agradecimentos A Deus, fonte de todo o saber. À minha querida esposa, por seu amor e incondicional apoio em tudo. Sobretudo, sou grato por nosso filho Heitor, um grande presente que deu um novo sentido às nossas vidas. Aos meus pais e minha irmã, que estiveram sempre ao meu lado. Aos meus sogros que contribuíram grandemente para que este trabalho pudesse se realizar. À minha querida professora e orientadora Yara Caznók, sempre tão amiga, paciente, positiva e disposta a falar e fazer música, com quem muito aprendi durante este período. Aos meus sempre professores e amigos Lutero Rodrigues e César Franco. Aos meus amigos Demétrio Montealegre, Siderlei Gomes, Eric Corso, Mauro Ricci Jr., pois, sem a compreensão e o apoio destes, este trabalho não seria viável. Aos meus amigos professores e alunos com os quais aprendo a cada dia e enriquecem-me como músico e como pessoa. RESUMO Tendo como objeto de estudo os 50 Ponteios para piano de Camargo Guarnieri, este trabalho se concentra na análise de suas estruturações melódicas e harmônicas, almejando compreender aspectos estruturais da poética do compositor neste ciclo de peças. Apresenta-se, inicialmente, um diálogo entre as transformações sofridas pela escritura melódico-harmônica de Guarnieri durante o período de composição desta coleção e uma contextualização histórico-estilística, na qual são focalizadas, principalmente, suas buscas por um nacionalismo influenciado por Mário de Andrade e suas experiências com diferentes idiomas harmônicos. Propõe-se, ainda como texto preparatório para as análises, uma classificação textural dos 50 Ponteios e, ainda, a verificação de algumas constâncias formais dentro desta coleção. Nos capítulos seguintes, esta dissertação se direciona para a verificação das escolhas dos materiais presentes na construção das melodias e harmonias e se estende sobre observação dos procedimentos composicionais característicos de Guarnieri – sua poética. A partir desta investigação analítica, constatamos, nos Ponteios e em outras obras do compositor, a recorrência de um motivo melódico o qual denominamos Motivo Guarnieri. Na dimensão harmônica, chamou-nos a atenção a reincidência de uma determinada estrutura harmônica simétrica, utilizada com função Dominante nos momentos cadenciais, além do cuidado, por parte do compositor, em usar estruturas simétricas nos contextos escalares, harmônicos e formais. Sempre que possível, as análises foram permeadas por diálogos estabelecidos com pesquisadores da obra de Guarnieri e pela observação das relações entre suas decisões composicionais e seu posicionamento estético, diretamente influenciado pelo livro Ensaio sobre a música brasileira, de Mário de Andrade. Palavras-chave: Camargo Guarnieri. Ponteios. Análises Melódico-harmônicas. ABSTRACT The aim of this work is to study the 50 Piano Ponteios of Camargo Guarnieri, focusing on the analysis of their melodic and harmonic structures, seeking to understand the structural aspects of the composer's poetics in this cycle of pieces. We initially examine the transformations incurred by Guarnieri's melodic-harmonic writing in the period that this collection was composed, and a produce a historical-stylistic contextualization. This contextualization focuses on the Brazilan nationalism which was influenced by Brazilian philosopher and critic Mário de Andrade, and Guarnieri’s experiences with different harmonic languages. In preparation for the analysis, a textural classification of the 50 Ponteios is performed, as well as a verification of some formal consistencies within this collection. The dissertation is also directed to the examination of the choices of the materials present in the construction of the melodies and harmonies, and extends to the observation of the compositional procedures characteristic of Guarnieri – in other words, his poetics. From this analytical investigation we can observe, in the Ponteios and in other works by this composer, the recurrence of a melodic motif which we call The Guarnieri Motive. In terms of harmony, we are struck by the recurrence of a specific symmetrical harmonic structure, used as dominant function in cadential moments. We may also verify the care the composer took to use symmetrical structures in scalar, harmonic and formal contexts. Whenever possible, the analysis was permeated by dialogues established with researchers on Guarnieri’s work, and by the observation of the relationship between Guarnieri’s compositional decisions and his aesthetic opinion, as influenced directly by the book Ensaio sobre a música brasileira by Mário de Andrade. Keywords: Camargo Guarnieri. Ponteios. Melodic-harmonic analysis. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – PRIMEIROS 4 COMPASSOS DO PONTEIO Nº 2. .......................................... 34 FIGURA 2 – PRIMEIROS 4 COMPASSOS DO PONTEIO Nº 38. ........................................ 35 FIGURA 3 – PONTEIO Nº 11, INÍCIO DAS SEÇÕES A, A’ E A’’. ...................................... 36 FIGURA 4 – PONTEIO Nº 21, INÍCIO DAS SEÇÕES A E B. ............................................... 37 FIGURA 5 – PONTEIO Nº 20, INÍCIO DAS SEÇÕES A, B E C. .......................................... 38 FIGURA 6 – ESCALA MAIOR DESCENDENTE COM ELISÃO DO 7º GRAU (CHAMADA DE HEXACORDAL POR MÁRIO DE ANDRADE, NO ENSAIO). .............. 41 FIGURA 7 – ESCALA MAIOR DESCENDENTE COM O 7º GRAU ABAIXADO (MIXOLÍDIO). ......................................................................................................................... 41 FIGURA 8 – ESCALA MAIOR DESCENDENTE COM O 4º GRAU ALTERADO ASCENDENTEMENTE (LÍDIO). ........................................................................................... 41 FIGURA 9 – ESCALA MENOR DESCENDENTE EM GRAUS NATURAIS. .................... 41 FIGURA 10 – ESCALA MENOR DESCENDENTE COM O 6º GRAU ALTERADO ASCENDENTEMENTE (DÓRICO). ...................................................................................... 41 FIGURA 11 – MODOS MISTOS: A. LÍDIO-MIXOLÍDIO; B. FRÍGIO-DÓRICO. .............. 43 FIGURA 12 – ESCALA DE TONS INTEIROS. ..................................................................... 43 FIGURA 13 – ESCALA OCTATÔNICA EM SUAS DUAS TRANSPOSIÇÕES. ................ 43 FIGURA 14 – ESCALA CROMÁTICA .................................................................................. 43 FIGURA 15 – ESCALA ALTERADA .................................................................................... 43 FIGURA 16 – PONTEIO Nº 16, MELODIA E HARMONIA CONFIRMAM O MODO LÍDIO-MIXOLÍDIO, C. 1-8. ................................................................................................... 45 FIGURA 17 – PONTEIO Nº 34, PARALELISMOS MELÓDICOS PÕEM EM DÚVIDA O CENTRO PRINCIPAL DA PEÇA (DÓ MAIOR), C. 1-12. .................................................... 45 FIGURA 18 – PONTEIO Nº 9, TOTAL CROMÁTICO MELÓDICO NO EM UM FRAGMENTO DO DESENVOLVIMENTO, C. 19- 25. ........................................................ 46 FIGURA 19 – PONTEIO Nº 33, AUSÊNCIA DO QUARTO GRAU DA ESCALA DE FÁ M NA MELODIA, C. 1-8. ................................................................................................. 47 FIGURA 20 – CÂMBIO ENTRE SÉTIMAS MAIOR E MENOR NO PONTEIO Nº 37, C. 1-4. ....................................................................................................................................... 48 FIGURA 21 – ESCALA COM OS INTERVALOS DE 3ª M, 6ª M E 7ª M. ........................... 49 FIGURA 22 – PONTEIO Nº 29, ABAIXAMENTO DO SÉTIMO GRAU EM UMA MELODIA NO MODO LÍDIO, ............................................................................................... 51 FIGURA 23 – PONTEIO Nº 8, MELODIA CROMÁTICA COM ALGUMAS NOTAS DE DÓ MAIOR, C. 4-15. ......................................................................................................... 54 FIGURA 24 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 4, C. 3-4. ...................... 64 FIGURA 25 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 9, C. 15-18. .................. 64 FIGURA 26 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 5, C. 7-11. .................... 65 FIGURA 27 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 29, C. 1-4 E 39-44. ...... 65 FIGURA 28 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 17, C. 1-4. .................... 66 FIGURA 29 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 22, C. 13-14. ................ 66 FIGURA 30 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 38, C. 7-12. .................. 66 FIGURA 31 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 2, C. 5-6. ...................... 67 FIGURA 32 – APROXIMAÇÃO CROMÁTICA NO PONTEIO Nº 21, C. 1-4. .................... 67 FIGURA 33 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 3, C. 8-12. .......... 69 FIGURA 34 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 11, C. 1-4. .......... 69 FIGURA 35 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 13, C. 1- 6. ......... 69 FIGURA 36 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 20, C. 18-38. ...... 70 FIGURA 37 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 24, C. 3-7. .......... 71 FIGURA 38 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 27, C. 1-9. .......... 71 FIGURA 39 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 29, C. 11-23. ...... 71 FIGURA 40 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 30, C. 1-10. ........ 72 FIGURA 41 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 31, C. 16-23. ...... 72 FIGURA 42 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 34, C. 1-23. ........ 73 FIGURA 43 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 39, C. 1-6. .......... 73 FIGURA 44 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 42, C. 1-5. .......... 73 FIGURA 45 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 44, C. 19-23. ...... 74 FIGURA 46 – PERFIL MELÓDICO DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 50, C. 4-9. .......... 74 FIGURA 47 – SÉTIMO GRAU MENOR DO MODO DE FÁ MIXOLÍDIO ASCENDENTEMENTE E OMISSÃO DO SÉTIMO GRAU NA FINALIZAÇÃO DA FRASE NO PONTEIO Nº 16, C. 1-5. ...................................................................................... 75 FIGURA 48 – SÉTIMO GRAU MAIOR DA ESCALA DE SOL MAIOR USADO DESCENDENTEMENTE NA MELODIA NO PONTEIO Nº 18, C. 1-9. .............................. 76 FIGURA 49 – SÉTIMO GRAU MAIOR DA ESCALA DE FÁ MAIOR USADO DESCENDENTEMENTE NA MELODIA NO PONTEIO Nº 33, C. 1-2. .............................. 76 FIGURA 50 – QUARTO GRAU AUMENTADO DO MODO DE MI LÍDIO USADO DESCENDENTEMENTE NO PONTEIO Nº 17, C. 1-4 ......................................................... 76 FIGURA 51 – SEXTO GRAU MENOR PARA O QUINTO GRAU DA ESCALA DE FÁ MAIOR NO PONTEIO Nº 7, C. 3-5. ................................................................................. 77 FIGURA 52 – SEGUNDO GRAU MENOR PARA O PRIMEIRO GRAU DA ESCALA DE MI♭ FRÍGIO NO PONTEIO .............................................................................................. 77 FIGURA 53 – EXEMPLO DE REPETIÇÃO SEGUIDA (“REBATIMENTO”) DE NOTAS NA MELODIA. .......................................................................................................... 77 FIGURA 54 – NOTAS REPETIDAS NA MELODIA NO PONTEIO Nº 20, C. 28-32. ......... 78 FIGURA 55 – NOTAS REPETIDAS NA MELODIA NO PONTEIO Nº 39, C. 7-9 (A) E 14-17(B). ............................................................................................................................... 78 FIGURA 56 – NOTAS REPETIDAS NA MELODIA NO PONTEIO Nº 45, C. 1-7 .............. 79 FIGURA 57 – NOTAS REPETIDAS COM TERÇAS PARALELAS NA MELODIA NO PONTEIO Nº 3, C. 3-5. ............................................................................................................ 79 FIGURA 58 – NOTAS REPETIDAS COM PARALELISMO NA MELODIA NO PONTEIO Nº 17, C. 1-4 (A) E ................................................................................................. 80 FIGURA 59 – DÉCIMAS PARALELAS NA MELODIA NO PONTEIO Nº 34, C. 1-12. .... 81 FIGURA 60 – ALGUNS RITMOS DE ACOMPANHAMENTO DE TANGO DE TANGOS BRASILEIROS (DE DIVERSOS AUTORES). ..................................................... 82 FIGURA 61 – INFLUÊNCIA DO CHORO NO PONTEIO Nº 19, C. 1-2. ............................. 82 FIGURA 62 – INFLUÊNCIA DO CHORO NO PONTEIO Nº 27, C. 1-4. ............................. 83 FIGURA 63 – PROGRESSÃO RÍTMICO-MELÓDICA NO PONTEIO Nº 23, C. 28-39. .... 85 FIGURA 64 – PROGRESSÃO RÍTMICO-MELÓDICA NO PONTEIO Nº 25, C. 20-27. .... 85 FIGURA 65 – ESCALA EM DUAS DIREÇÕES EM UMA MESMA VOZ NO PONTEIO Nº 12, C. 5-6. .......................................................................................................... 86 FIGURA 66 – ESCALA EM DUAS DIREÇÕES EM UMA MESMA VOZ NO PONTEIO Nº 23, C. 5-6. .......................................................................................................... 86 FIGURA 67 – PSEUDOPOLIFONIA NO PONTEIO Nº 25, C. 15-21. .................................. 87 FIGURA 68 – INÍCIO DAS SEÇÕES A E A’ DO PONTEIO Nº 43. ..................................... 88 FIGURA 69 – LINHA MELÓDICA SECUNDÁRIA RESULTANTE DO USO DE APOJATURAS DE EFEITO NO PONTEIO Nº 8, C. 9-15. .................................................... 89 FIGURA 70 – LINHA MELÓDICA SECUNDÁRIA RESULTANTE DO USO DE APOJATURAS DE EFEITO NO PONTEIO Nº 39, C. 14-21. ................................................ 89 FIGURA 71 – REDUÇÃO RÍTMICA E HARMÔNICA DO PONTEIO Nº 15, C. 1-11. ...... 90 FIGURA 72 – REDUÇÃO RÍTMICA E HARMÔNICA DO PONTEIO Nº 32, C. 1-4. ........ 90 FIGURA 73 – REDUÇÃO HARMÔNICA DO PONTEIO Nº 40, C. 1-16. ............................ 91 FIGURA 74 – ALTERNÂNCIA DE ESCALA/MODO NA MELODIA DO PONTEIO Nº 31, C.1-4. ............................................................................................................................. 92 FIGURA 75 – ALTERNÂNCIA DE ESCALA/MODO NA MELODIA DO PONTEIO Nº 33, C. 1-4. ............................................................................................................................ 92 FIGURA 76 – ALTERNÂNCIA DE ESCALA/MODO NA MELODIA DO PONTEIO Nº 37, C.1-4. ............................................................................................................................. 93 FIGURA 77 – ALTERNÂNCIA DE ESCALA/MODO NA MELODIA DO PONTEIO Nº 3, C. 3-5, 12-14. ................................................................................................................... 93 FIGURA 78 – ALTERNÂNCIA DE ESCALA/MODO NA MELODIA DO PONTEIO Nº 17, C. 1-4, 23-26. ................................................................................................................. 93 FIGURA 79 – INVERSÃO DAS NOTAS CARACTERÍSTICAS DOS MODOS NO PONTEIO Nº 29, C. 5-14 (DENTRO DA SEÇÃO A), 30-39 (DENTRO DA SEÇÃO A’). ... 94 FIGURA 80 – ADIÇÃO MELÓDICA NO PONTEIO Nº 11, C. 1-4, 6-9, 14-15. .................. 96 FIGURA 81 – ADIÇÃO MELÓDICA NO PONTEIO Nº 26, C. 1-4, 5-7, 26-29 ................... 96 FIGURA 82 – ADIÇÃO MELÓDICA NO PONTEIO Nº 31, C. 4-6, 6-7. .............................. 96 FIGURA 83 – ADIÇÃO E SUBTRAÇÃO MELÓDICA NO PONTEIO Nº 39, C. 14-15, 16-17, 18-19, 20-21, ................................................................................................................. 97 FIGURA 84 – ALTERAÇÃO RÍTMICA COM DESLOCAMENTO MÉTRICO NO PONTEIO Nº 20, C. 1-4, 5-8, 13-16. ........................................................................................ 97 FIGURA 85 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 12, C. 3-4. ............................... 99 FIGURA 86 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 17, C. 1-4. ............................... 99 FIGURA 87 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 18, C. 10-13. ........................... 99 FIGURA 88 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 23, C. 1-3. ............................... 99 FIGURA 89 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 29, C. 1-8. ............................... 99 FIGURA 90 – MOTIVO GUARNIERI (A) NO PONTEIO Nº 31, C. 1-4. ............................. 100 FIGURA 91 – ACORDES POR QUARTAS NO PONTEIO Nº 23, C. 1-2. ......................... 104 FIGURA 92 – ESCALA DE TONS INTEIROS NO PONTEIO Nº 9, C. 1-4. ...................... 104 FIGURA 93 – BIMODALIDADE: MI FRÍGIO NA LINHA SUPERIOR E FÁ LÍDIO NA LINHA INFERIOR, PONTEIO Nº 2, C. 1-6. ................................................................. 104 FIGURA 94 – INÍCIO DO PONTEIO Nº 11, C. 1-4. ............................................................ 105 FIGURA 95 – INÍCIO DO PONTEIO Nº 18. SOBREPOSIÇÃO DE SOL LÍDIO (MÃO DIREITA) E SOL MAIOR (MÃO ESQUERDA). ................................................................ 107 FIGURA 96 – PONTEIO Nº 12, CADÊNCIA NOS TRÊS ÚLTIMOS COMPASSOS. ...... 110 FIGURA 97 – PONTEIO Nº 23, DIATONICISMO PREDOMINANTE NOS ACORDES DA MÃO DIREITA, C. 11-16. .............................................................................................. 110 FIGURA 98 – PONTEIO Nº 25, C. 27-28. ............................................................................ 111 FIGURA 99 – TRÍADES MAIORES E MENORES SOBRE UM BAIXO PEDAL NO PONTEIO Nº 24, C. 1-3, 17-21. ............................................................................................. 117 FIGURA 100 – ACORDES EM PRIMEIRA INVERSÃO (6) NO PONTEIO Nº 20, C. 11-12. ................................................................................................................................. 117 FIGURA 101 –SUBDOMINANTE NAPOLITANA NO PONTEIO Nº 49, C. 75-77. ......... 118 FIGURA 102 – SEGUNDO GRAU FRÍGIO NO PONTEIO Nº 41, C. 21-24. ..................... 118 FIGURA 103 – SEGUNDO GRAU FRÍGIO DENTRO DE UM MOVIMENTO DE CADÊNCIA DE ENGANO NO PONTEIO Nº 44, C. 6-7. .................................................... 119 FIGURA 104 – ACORDE MAIOR COM SEXTA MAIOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (DÓ MAIOR) NO PONTEIO Nº 3, C. 1-3. ............................................................ 120 FIGURA 105 – ACORDE MAIOR COM SEXTA MAIOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (SI♭ MAIOR) NO PONTEIO Nº 24, C. 3-4. ........................................................... 120 FIGURA 106 – ACORDE MENOR COM SEXTA MAIOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (LÁ♭ MENOR) NO PONTEIO Nº 30, C. 1. .............................................................. 120 FIGURA 107 – ACORDE MAIOR COM SEXTA MAIOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (DÓ MAIOR) NA SEÇÃO CENTRAL DO PONTEIO Nº 32, C. 20-23. ................. 121 FIGURA 108 – ACORDE MENOR COM SEXTA MAIOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (LÁ MENOR) NO PONTEIO Nº 38, C. 1-2. ....................................................................... 121 FIGURA 109 – ACORDE MAIOR COM SEXTA MAIOR RELACIONADOS POR TERÇAS MAIORES (RELAÇÃO DE MEDIANTE) NO PONTEIO Nº 43, C. 68-70. ....... 121 FIGURA 110 – ACORDE MENOR COM SEXTA MENOR SOBRE O PRIMEIRO GRAU (LÁ♭ MENOR) NO PONTEIO Nº 30, C. 39-40. ...................................................... 122 FIGURA 111 – TRÍADE MAIOR COM SEXTA E SÉTIMA MAIORES NO PONTEIO Nº 7, C. 1, 19 E 43-44. .......................................................................................... 123 FIGURA 112 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR NO PONTEIO Nº 16, C. 1-4. ..................................................................................................................................... 124 FIGURA 113 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR NO PONTEIO Nº 20, C. 1-4. ..................................................................................................................................... 124 FIGURA 114 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR NO PONTEIO Nº 31, C. 1-4. ..................................................................................................................................... 124 FIGURA 115 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR NO PONTEIO Nº 39, C. 1-4. ..................................................................................................................................... 125 FIGURA 116 – TRÍADES MAIORES COM SÉTIMA MENOR EM MOVIMENTO DE QUARTA JUSTA ASCENDENTE NO PONTEIO Nº 27, C. 8-9. ................................. 126 FIGURA 117 – TRÍADES MAIORES COM SÉTIMA MENOR EM MOVIMENTO DE QUARTA JUSTA ASCENDENTE NO PONTEIO Nº 42, C. 1-4. ................................. 126 FIGURA 118 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR EM MOVIMENTO DE SEGUNDA MAIOR ASCENDENTE NO PONTEIO Nº 6, C. 7-8. ...................................... 126 FIGURA 119 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR EM MOVIMENTO DE SEGUNDA MAIOR ASCENDENTE NO PONTEIO Nº 33, C. 6-7. .................................... 127 FIGURA 120 – TRÍADES MAIORES COM SÉTIMA MENOR EM MOVIMENTO DE SEGUNDA MENOR DESCENDENTE NO PONTEIO Nº 9, C. 38-39. ........................ 127 FIGURA 121 – TRÍADE MENOR COM SÉTIMA MAIOR NO PONTEIO Nº 44, C. 22-23. ................................................................................................................................. 128 FIGURA 122 – TRÍADE MENOR COM SÉTIMA MENOR NO PONTEIO Nº 31, C. 26-29. ................................................................................................................................. 129 FIGURA 123 – UTILIZAÇÃO DO ACORDE DE SEXTA AUMENTADA NO PONTEIO Nº 6, C. 27-28. ...................................................................................................... 129 FIGURA 124 – UTILIZAÇÃO DO ACORDE DE SEXTA AUMENTADA NO PONTEIO Nº 7, C. 25-27. ...................................................................................................... 130 FIGURA 125 – UTILIZAÇÃO DO ACORDE DE SEXTA AUMENTADA NO PONTEIO Nº 13, C. 25-26. .................................................................................................... 130 FIGURA 126 – ESCALA OCTATÔNICA, ACORDE MAIOR COM SÉTIMA E TENSÕES DA ESCALA. ...................................................................................................... 131 FIGURA 127 – ESCALA DE TONS INTEIROS, ACORDE MAIOR COM SÉTIMA E TENSÕES DA ESCALA. ................................................................................................... 131 FIGURA 128 – ESCALA ALTERADA, ACORDE MAIOR COM SÉTIMA E TENSÕES DA ESCALA. ...................................................................................................... 131 FIGURA 129 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MENOR E NONA AUMENTADA NOS PONTEIOS Nº 37, C. 12 (A) E Nº 38, C. 50 (B). .......................................................... 132 FIGURA 130 – RESOLUÇÃO EM ACORDE MAIOR APÓS ACORDE DE DOMINANTE COM DISSONÂNCIAS QUE APONTAM PARA A ESCALA MENOR (♭9 E ♭13) NO PONTEIO Nº 42, C. 21-22. ............................................................................ 132 FIGURA 131 – TRÍADE MENOR COM SÉTIMA MENOR E NONA MAIOR NO PONTEIO Nº 1, C. 29-32. ...................................................................................................... 133 FIGURA 132 – TRÍADE MAIOR COM SÉTIMA MAIOR E QUARTA AUMENTADA NOS PONTEIOS Nº 5, C. 40 (A), Nº 9, C. 49 (B) E Nº 15, C. 1 (C). .................................... 134 FIGURA 133– TRÍADES COM NOTAS ADICIONADAS NOS PONTEIOS Nº 8, C. 55 (A – SI♭ MENOR, COM AS NOTAS DO BAIXO DO C. 51), Nº 10, C. 56-57 (B – DÓ MAIOR) E Nº 23, C. 39 (C – MI MENOR). ........................................................... 134 FIGURA 134 – TRÍADE MENOR COM SÉTIMA MAIOR COM SEXTA MENOR ADICIONADA NO PONTEIO Nº 49, C. 87-89. ................................................................... 135 FIGURA 135 – POLIACORDE NO PONTEIO Nº10, C. 51-54. .......................................... 135 FIGURA 136 – POLIACORDE NO PONTEIO Nº 42, C. 19-20. ......................................... 136 FIGURA 137 – TÉTRADE COM SÉTIMA DIMINUTA E SEU ENCAIXE EM DUAS POSSIBILIDADES (A) E (B) DE ESCALAS OCTATÔNICAS. ........................................ 137 FIGURA 138 – TRÊS TRANSPOSIÇÕES DA TÉTRADE DIMINUTA SOBRE AS TRÊS TRANSPOSIÇÕES DA ESCALA OCTATÔNICA. .................................................. 137 FIGURA 139 – TRÍADE DIMINUTA COM SÉTIMA DIMINUTA NO PONTEIO Nº 14, C. 7-8. .......................................................................................................................... 137 FIGURA 140 – TRÍADES DIMINUTAS COM SÉTIMA DIMINUTA NO PONTEIO Nº 22, C. 1-4. .......................................................................................................................... 138 FIGURA 141 – TRÍADE DIMINUTA COM SÉTIMA DIMINUTA NO PONTEIO Nº 27, C. 7-9. .......................................................................................................................... 138 FIGURA 142 – TRÍADE DIMINUTA COM SÉTIMA DIMINUTA NO PONTEIO Nº 36, C. 20-22. ...................................................................................................................... 139 FIGURA 143 – TRÍADES DIMINUTAS COM SÉTIMA DIMINUTA NO PONTEIO Nº 44, C. 13-14. ...................................................................................................................... 139 FIGURA 144 – ACORDES POR TONS INTEIROS. ........................................................... 140 FIGURA 145 – ACORDE SOBRE ESCALA DE TONS INTEIROS NO PONTEIO Nº 7, C. 25-29. ........................................................................................................................ 140 FIGURA 146 – ACORDE SOBRE ESCALA DE TONS INTEIROS NO PONTEIO Nº 9, C. 1-6. ............................................................................................................................ 141 FIGURA 147 – ACORDE SOBRE ESCALA DE TONS INTEIROS NO PONTEIO Nº 19, C. 1-2. .......................................................................................................................... 141 FIGURA 148 – ACORDE AUMENTADO COM SÉTIMA MAIOR NO PONTEIO Nº 31, C. 1-4. .......................................................................................................................... 141 FIGURA 149 – NOTAS EM COMUM ENTRE AS ESCALAS OCTATÔNICA (A), DE TONS INTEIROS (B), ALTERADA (C) E O MODO LÍDIO-MIXOLÍDIO (D). ......... 142 FIGURA 150 – SIMETRIA INTERVALAR DO ACORDE E RESOLUÇÃO TONAL. ..... 143 FIGURA 151 – MELODIA EM SOL MAIOR SOBRE ACORDES POR QUARTAS NO PONTEIO Nº 11, C. 1-4. .................................................................................................. 146 FIGURA 152 – ACORDE POR QUARTAS EM UM CONTEXTO HARMÔNICO POR TERÇAS NO PONTEIO Nº 15, ............................................................................................. 146 FIGURA 153 – ACORDE POR QUARTAS EM UM CONTEXTO HARMÔNICO POR TERÇAS NO PONTEIO Nº 20, ............................................................................................. 146 FIGURA 154 – ACORDE POR QUARTAS SE MOVIMENTANDO EM DUAS CAMADAS NO PONTEIO Nº 21, ......................................................................................... 147 FIGURA 155 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO PONTEIO Nº 13, C. 31-32. ................................................................................................................................. 148 FIGURA 156 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO PONTEIO Nº 14, C. 42-52. ................................................................................................................................. 148 FIGURA 157 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO PONTEIO Nº 21, C. 59. .... 149 FIGURA 158 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO PONTEIO Nº 23, C. 1-5. ... 149 FIGURA 159 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO PONTEIO Nº 27, C. 27-28. ................................................................................................................................. 150 FIGURA 160 – ACORDES QUARTAIS SUBSTITUTOS NO NO PONTEIO Nº 39, C. 23-24. ................................................................................................................................. 150 FIGURA 161 – ACODES MISTOS PONTEIO Nº 28, C. 25-27. ......................................... 151 FIGURA 162 – ACODES MISTOS NO PONTEIO Nº 23, C. 33-39. ................................... 151 FIGURA 163 – (A) ACORDE MAIOR COM SÉTIMA PRIVILEGIANDO OS INTERVALOS DE QUARTA; (B) ACORDE POR QUARTAS EMPREGANDO INTERVALOS DE SEGUNDA. ............................................................................................ 152 FIGURA 164 – SIMETRIA NA DISPOSIÇÃO DAS NOTAS DO ACOMPANHAMENTO NO PONTEIO Nº 9, C. 4-6. ........................................................... 153 FIGURA 165 – SIMETRIA NA DISPOSIÇÃO DAS NOTAS DA MÃO ESQUERDA (ACORDES) NO PONTEIO Nº 30, ....................................................................................... 153 FIGURA 166 – SIMETRIA NA DISPOSIÇÃO DAS NOTAS DO ÚLTIMO ACORDE NO PONTEIO Nº 49, C. 89. ................................................................................................... 153 FIGURA 167 – SIMETRIA NO PONTEIO Nº 10, C. 51-57. ................................................ 154 FIGURA 168 – SIMETRIA NA DISPOSIÇÃO DE ACORDES DA MÃO DIREITA NO PONTEIO Nº 23, C. 1-5. .................................................................................................. 154 FIGURA 169 – DISPOSIÇÃO ACÚSTICA COMO BASE PARA A CONSTRUÇÃO HARMÔNICA NO PONTEIO Nº 6, ...................................................................................... 155 FIGURA 170 – DISPOSIÇÃO ACÚSTICA COMO BASE PARA A CONSTRUÇÃO HARMÔNICA NO PONTEIO Nº 7, ...................................................................................... 156 FIGURA 171 – DISPOSIÇÃO HARMÔNICA COMO BASE DE UM ACORDE MAIS AMPLO PONTEIO Nº 14, C. 1-4. ......................................................................................... 156 FIGURA 172 – DISPOSIÇÃO ACÚSTICA NO PONTEIO Nº 19, C. 1-2. .......................... 156 FIGURA 173 – ACORDES EM DISPOSIÇÃO FECHADA NO REGISTRO MÉDIO- AGUDO NO PONTEIO Nº 7, C. 1. ....................................................................................... 157 FIGURA 174 – DISPOSIÇÕES FECHADAS NO REGISTRO MÉDIO-AGUDO NO PONTEIO Nº 12, C. 1-2. ........................................................................................................ 157 FIGURA 175 – DISPOSIÇÕES FECHADAS NO REGISTRO MÉDIO-AGUDO NO PONTEIO Nº 24, C. 1-4. ........................................................................................................ 157 FIGURA 176 – HARMONIA ESTÁTICA NO PONTEIO Nº 4, C. 1. .................................. 159 FIGURA 177 – HARMONIA CIRCULAR NO PONTEIO Nº 5, C. 1-7. ............................. 159 FIGURA 178 – HARMONIA CONTÍNUA NO PONTEIO Nº 44, C. 6-12. ......................... 161 FIGURA 179 – REARMONIZAÇÃO DA REEXPOSIÇÃO DO TEMA NO PONTEIO Nº 33, C. 5-8 E 14-17. ............................................................................................................ 162 FIGURA 180 – MOVIMENTAÇÃO DA LINHA DO BAIXO EM NOTAS LONGAS NO PONTEIO Nº 14, C. 1-4. .................................................................................................. 163 FIGURA 181 – MOVIMENTAÇÃO DA LINHA DO BAIXO EM NOTAS LONGAS NO PONTEIO Nº 38, C. 1-4. .................................................................................................. 163 FIGURA 182 – MOVIMENTAÇÃO DA LINHA DO BAIXO COM FUNÇÃO RÍTMICA NO PONTEIO Nº 20, C. 51-59. ............................................................................ 164 FIGURA 183 – MOVIMENTAÇÃO DA LINHA DO BAIXO COM FUNÇÃO RÍTMICA NO PONTEIO Nº 27, C. 1-4. ................................................................................ 164 FIGURA 184 – BAIXO PEDAL EM UMA TEXTURA DE MELODIA COM ACOMPANHAMENTO CORDAL NO PONTEIO Nº 24, C. 1-3. ....................................... 164 FIGURA 185 – BAIXO PEDAL EM UMA TEXTURA DE MELODIA COM ACOMPANHAMENTO FIGURADO NO PONTEIO Nº 41, C. 1-4. ................................... 165 FIGURA 186 – BAIXO PEDAL EM UMA TEXTURA DE MELODIA COM ACOMPANHAMENTO EM OSTINATO NO PONTEIO Nº 25, C. 23-27. ......................... 165 FIGURA 187 – BAIXO PEDAL EM UMA LINHA MELÓDICA NA VOZ MAIS GRAVE NO PONTEIO Nº 23, C. 14-17. ............................................................................... 165 FIGURA 188 – LINHA DO BAIXO EM MOVIMENTO PARALELO COM A LINHA MELÓDICA PRINCIPAL NO PONTEIO Nº 20, C. 28-32. .................................................. 166 FIGURA 189 – LINHA DO BAIXO EM MOVIMENTO PARALELO COM A LINHA MELÓDICA PRINCIPAL NO PONTEIO Nº 34, C. 1-10. .................................................... 166 FIGURA 190 – LINHA DO BAIXO EM MOVIMENTO PARALELO COM A LINHA MELÓDICA PRINCIPAL NO PONTEIO Nº 45, C. 13-17. .................................................. 166 FIGURA 191 – LINHA DO BAIXO COMO VOZ CONTRAPONTÍSTICA NO PONTEIO Nº 41, C. 12-17. .................................................................................................... 167 FIGURA 192 – RESOLUÇÃO DO ACORDE DE DOMINANTE CARACTERÍSTICO DE GUARNIERI SOBRE ACORDES MAIORES OU MENORES. ................................... 168 FIGURA 193 – SEMICADÊNCIA NO PONTEIO Nº 11, C. 13-14. .................................... 170 FIGURA 194 – SEMICADÊNCIA NO PONTEIO Nº 27, C. 16-17. .................................... 170 FIGURA 195 – SEMICADÊNCIA NO PONTEIO Nº 32, C. 41-43. .................................... 171 FIGURA 196 – CADÊNCIA AUTÊNTICA NO PONTEIO Nº 6, C. 36-39. ........................ 172 FIGURA 197 – CADÊNCIA AUTÊNTICA NO PONTEIO Nº 32, C. 62-63. ...................... 173 FIGURA 198 – CADÊNCIA AUTÊNTICA NO PONTEIO Nº 38, C. 49-51. ...................... 173 FIGURA 199 – CADÊNCIA MODAL (AUTÊNTICA) NO PONTEIO Nº 31, C. 26-29. .... 174 FIGURA 200 – CADÊNCIA MODAL (AUTÊNTICA) NO PONTEIO Nº 17, C. 29-32. .... 174 FIGURA 201 – FALSA RELAÇÃO ENTRE ACORDES COM CONDUÇÃO PARALELA DAS VOZES INTERNAS RELACIONADOS POR TERÇA NO PONTEIO Nº 5, C. 1-5. .......................................................................................................... 176 FIGURA 202 – ACORDES COM CONDUÇÃO PARALELA DAS VOZES COM MOVIMENTO DIRETO NO PONTEIO Nº 31, C. 1-4. ..................................................... 176 FIGURA 203 – ACORDES COM CONDUÇÃO PARALELA DAS VOZES EM TEXTURA CORDAL NO PONTEIO Nº 24, C. 17-21. ...................................................... 177 FIGURA 204 – ACORDES COM CONDUÇÃO LIVRE DAS VOZES NO PONTEIO Nº 27, C. 1-4 (MOVIMENTO CONTRÁRIO DAS VOZES.). ............................................. 177 FIGURA 205 –ACORDES PARALELOS EM TEXTURA CORDAL NO PONTEIO Nº 35, C. 1-11. ........................................................................................................................ 177 FIGURA 206 – ACORDES COM CONDUÇÃO LIVRE DAS VOZES NO PONTEIO Nº 3, C. 16-26 (ESTRUTURAÇÃO HARMÔNICA DAS VOZES EM DUAS CAMADAS). .............................................................................................................. 178 FIGURA 207– ACORDES COM CONDUÇÃO LIVRE DAS VOZES NO PONTEIO Nº 12 (ESTRUTURA HARMÔNICA DAS VOZES EM DUAS CAMADAS TRATADAS COM (A) EXPANSÃO E (B) CONTRAÇÃO). .............................................. 178 FIGURA 208 – ORNAMENTAÇÃO POLIFÔNICA DAS VOZES INTERNAS NO PONTEIO Nº 33, C. 5-8. ........................................................................................................ 180 FIGURA 209 – ORNAMENTAÇÃO POLIFÔNICA DAS VOZES INTERNAS NO PONTEIO Nº 48, C. 1-4 ......................................................................................................... 180 FIGURA 210 – COLORAÇÃO INTERVALAR DA MELODIA NO PONTEIO Nº 10, C. 24-26. ...................................................................................................................... 181 FIGURA 211 – DIFERENTES COLORAÇÕES INTERVALARES DE UMA MESMA MELODIA NO PONTEIO Nº 17, C. 11-22. ..................................................................... 182 FIGURA 212 – COLORAÇÃO INTERVALAR DA MELODIA DO ACOMPANHAMENTO NO PONTEIO Nº 23, C. 1-5 (DUAS QUARTAS SOB UMA POSSÍVEL MELODIA DE ACOMPANHAMENTO). .............................................. 182 FIGURA 213 – ACRÉSCIMO DE UMA LINHA POR GRAU CONJUNTO DIATÔNICO E/OU CROMÁTICO A UMA MELODIA NO PONTEIO Nº 5, C. 13-28 .... 183 LISTA DE TABELAS TABELA 1. DIVISÃO DOS PONTEIOS EM CINCO VOLUMES, DATA DE COMPOSIÇÃO E PUBLICAÇÃO. ......................................................................................... 25 TABELA 2. FASES COMPOSICIONAIS DE CAMARGO GUARNIERI ............................ 25 TABELA 3. CLASSIFICAÇÃO DOS PONTEIOS SEGUNDO BELKISS CARNEIRO DE MENDONÇA. .................................................................................................................... 30 TABELA 4. CLASSIFICAÇÃO DOS PONTEIOS A PARTIR DO CRITÉRIO TEXTURAL. ............................................................................................................................ 31 TABELA 5. ESTRUTURA FORMAL DO PONTEIO Nº 2. ................................................... 34 TABELA 6. ESTRUTURA FORMAL DO PONTEIO Nº 38. ................................................. 35 TABELA 7. ESTRUTURA FORMAL DO PONTEIO Nº 11. ................................................. 36 TABELA 8. ESCALAS E MODOS NA MELODIA, TEXTURA, INDICAÇÕES DE CARÁTER/ANDAMENTO E INDICAÇÕES METRONÔMICAS NOS 50 PONTEIOS. .... 55 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 18 1 OS PONTEIOS ..................................................................................................... 24 1.1 Contextualização histórico-estilística .................................................................... 24 1.2 Aspectos texturais .................................................................................................. 29 1.3 Aspectos formais ................................................................................................... 32 2 MELODIA ............................................................................................................ 40 2.1 Escalas e modos ..................................................................................................... 40 2.2 Escalas e modos usados como estrutura dos materiais melódicos ........................ 44 2.2.1 Estruturação melódica tonal .................................................................................. 47 2.2.1.1 Ponteios estruturados sobre escala Maior.............................................................. 47 2.2.1.2 Ponteios estruturados sobre escalas Menores ........................................................ 49 2.2.2 Estruturação melódica modal ................................................................................ 50 2.2.2.1 Ponteios estruturados sobre modos com terça maior ............................................ 50 2.2.2.2 Ponteios estruturados sobre modos com terça menor............................................ 52 2.2.3 Ponteios estruturados sobre a escala Cromática .................................................... 53 2.2.4 Relação entre escalas, modos, texturas, indicações de caráter/andamento e indicações metronômicas ....................................................................................... 55 2.3 Procedimentos rítmico-melódicos ......................................................................... 60 2.3.1 Origens estético-estilísticas ................................................................................... 60 2.3.2 Notas ornamentais e notas estruturais da melodia ................................................. 61 2.3.3 Procedimentos melódicos ...................................................................................... 63 2.3.3.1 Aproximação cromática ......................................................................................... 64 2.3.3.2 Perfil melódico descendente .................................................................................. 68 2.3.3.3 Tratamento melódico da nota sensível .................................................................. 74 2.3.3.4 Notas repetidas na melodia e as “terças caipiras” ................................................. 77 2.3.3.5 “Notas rebatidas” com ritmos pontuados (influência do Choro) ........................... 81 2.3.3.6 Linha melódica em moto perpetuo e pseudopolifonia ........................................... 83 2.3.3.7 Linha melódica secundária resultante do uso de apojaturas de efeito. .................. 88 2.3.3.8 Textura gestual: distribuição rítmica da melodia/harmonia ao piano .................... 89 2.3.3.9 Variações melódicas .............................................................................................. 91 2.3.3.9.1 Repetição de fragmento melódico com mudança de escala/modo. ....................... 91 2.3.3.9.2 Transformações melódicas: adição, subtração, substituição, deslocamento de altura e alteração rítmica de notas na melodia. ...................................................... 94 2.3.4 Motivo Guarnieri ................................................................................................... 98 3 HARMONIA ...................................................................................................... 101 3.1 Tonalidade/modalidade, bitonalidade/bimodalidade e atonalidade. .................... 102 3.2 Estruturas acórdicas ............................................................................................. 112 3.2.1 Formações acórdicas sobre escalas tonais e modais ............................................ 115 3.2.1.1 Tríades Maior e Menor ........................................................................................ 116 3.2.1.2 Tríade Maior/Menor acrescida do intervalo de sexta maior ................................ 119 3.2.1.3 Tríades Maiores e Menores acrescidas do intervalo de sétima............................ 122 3.2.1.4 Acorde de Sexta Aumentada com função de Dominante da Dominante ............. 129 3.2.1.5 Dissonâncias sobre tríades com sétima menor (nonas, décimas primeiras e décimas terceiras) ................................................................................................ 130 3.2.1.6 Tríades e tétrades com notas adicionadas ............................................................ 133 3.2.1.7 Poliacordes ........................................................................................................... 135 3.2.2 Formações acórdicas sobre escalas simétricas .................................................... 136 3.2.2.1 Tríade Diminuta com sétima diminuta e escala Octatônica ................................ 136 3.2.2.2 Tríade Aumentada e a escala de Tons Inteiros .................................................... 140 3.2.3 Acorde de Dominante característico de Guarnieri............................................... 142 3.2.4 Formações acórdicas pós-tonais (não terciais) .................................................... 143 3.2.4.1 Acordes por quartas (acordes quartais) ................................................................ 144 3.2.4.2 Estruturas acórdicas formadas por intervalos de quartas substituindo ou complementando acordes Maiores e Menores ..................................................... 147 3.2.5 Disposição intervalar das estruturas acórdicas .................................................... 152 3.2.5.1 Disposição simétrica ............................................................................................ 152 3.2.5.2 Disposição com base na série harmônica ou disposição acústica ....................... 154 3.3 Progressões/encadeamentos harmônicos ............................................................. 157 3.3.1 Progressões harmônicas sobre escalas diatônicas ou cromáticas ........................ 158 3.3.2 Harmonias estática, circular e contínua e suas relações com a estrutura formal . 158 3.3.3 Movimentação da linha do baixo ......................................................................... 162 3.3.4 Cadências ............................................................................................................. 167 3.3.5 Condução melódica das vozes da harmonia ........................................................ 175 3.3.5.1 Condução paralela das vozes ............................................................................... 175 3.3.5.2 Condução livre das vozes .................................................................................... 177 3.3.5.3 Ornamentação polifônica das vozes internas ....................................................... 178 3.4 “Coloração” intervalar das melodias ................................................................... 180 CONCLUSÕES ..................................................................................................................... 184 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 189 ANEXO: PARTITURA DOS 50 PONTEIOS DE CAMARGO GUARNIERI ............... 194 18 INTRODUÇÃO Reconhecido internacionalmente como um dos principais nomes da composição no Brasil, Mozart Camargo Guarnieri (1907-1993) passou, paulatinamente, a ser foco de pesquisas no meio acadêmico a partir da década de 1990. Após sua morte, sua biografia, sua obra e sua influência sobre uma geração de compositores brasileiros do século XX, começaram a ser alvo de estudos. Talvez pelo pequeno distanciamento histórico que temos, a literatura sobre Camargo Guarnieri é ainda reduzida, mas vem em um movimento crescente, principalmente a partir de 2001. Deste ano, datam dois trabalhos: Guarnieri: expressões de uma vida, de Marion Verhaalen, e O tempo e a música, organizado por Flávio Silva, os quais, hoje, são percurso obrigatório para qualquer estudo sobre o autor. Traduzido para o português por Vera Silvia Camargo Guarnieri (esposa do compositor), o livro Guarnieri: expressões de uma vida originou-se da tese de doutorado The solo piano music of Francisco Mignone and Camargo Guarnieri defendida em 1971 na Columbia University pela pianista e musicóloga Marion Verhaalen. A autora faz um trabalho bem fundamentado e o dispõe em seu livro na seguinte ordem: Introdução e Prefácio (contextualização do livro e do compositor), Vida e obra de Camargo Guarnieri (dados biográficos); Desenvolvimento da música brasileira de caráter nacional (posicionamento estético). Os capítulos seguintes agrupam obras de acordo com sua instrumentação e formação, com comentários e análises de cada obra: Piano Solo; Piano e Orquestra; Música Vocal: Canto e Piano, Canto e Orquestra, Coro a Capela; Óperas, Cantatas e Grandes Obras Vocais; Música de Câmara: Instrumentos de Corda e Piano; Instrumentos de Cordas e Orquestra; Instrumentos de Sopro; Obras Orquestras. Concluem o trabalho um Índice das principais obras e um Índice Onomástico. Inicialmente proposto à FUNARTE por Vasco Mariz para a comemoração dos 80 anos de vida de Guarnieri (1987), mas publicado apenas em 2001, o livro O tempo e a música, organizado pelo musicólogo Flávio Silva, é um compêndio de textos de diferentes autores abordando de vários momentos e aspectos da vida e obra deste compositor. Além disso, este livro é composto por uma vasta documentação (cartas, entrevistas, publicações jornalísticas e programas de concerto) que valida e enriquece sobremaneira esta publicação. Dentre os autores, estão pesquisadores tais como Lutero Rodrigues, Flávia Camargo Toni, Osvaldo Lacerda, Jorge Coli, Vasco Mariz, Mário Ficarelli, Paulo Castagna, Laís de Souza Brasil e 19 Belkiss Carneiro de Mendonça. Some-se a isto ainda, a meticulosa catalogação da obra de Camargo Guarnieri, feito de inestimável valor para o pesquisador de sua obra. Pela qualidade e seriedade das pesquisas contidas nos livros supracitados, é obvio que boa parte dos trabalhos acadêmicos sobre o compositor tenha estes dois livros como principais fontes bibliográficas, e isto também será válido para o presente trabalho. As dissertações e teses que encontramos tratando especificamente de Camargo Guarnieri podem ser divididas em algumas áreas específicas de pesquisa: catalogação de sua obra, biografia, posicionamento estético, análises estrutural e interpretativa de obras. Sobre a catalogação das obras de Guarnieri, encontramos uma dissertação de mestrado que propõe uma organização e uma análise do repertório coral do compositor (SIQUEIRA, 2000), isto, com data anterior à catalogação feita em O tempo e a música. Há também um trabalho mais recente, que apresenta a catalogação das obras de difusão interdita de Guarnieri1 (ABRAHIM, 2010). Os dados biográficos de Guarnieri estão frequentemente presentes nos trabalhos acadêmicos, cumprindo o papel de contextualização histórica do tema a ser desenvolvido. Além disso, encontramos algumas pesquisas que têm como objetivo principal o estudo biográfico do compositor, dentre eles: Camargo Guarnieri: memórias e reflexões sobre a música no Brasil (WERNET, 2009) e Fazer-se compositor: Camargo Guarnieri 1923 - 1945 (EGG, 2010). Há também um trabalho que trata da atividade de Guarnieri como professor de composição: A escola de composição de Camargo Guarnieri (KOBAYASHI, 2009). Devido à presença constante da biografia de Guarnieri em outros trabalhos, e por não ser o objetivo principal de nossa análise, faremos menção a dados biográficos que forem diretamente relevantes para nossa investigação e que nos ajude a esclarecer ou a argumentar sobre pontos importantes das obras estudadas. Camargo Guarnieri foi figura fundamental na consolidação do nacionalismo musical e do modernismo brasileiro e, por isso, a discussão de seu posicionamento estético em trabalhos é constantemente presente. Normalmente, este tema é trabalhado tanto sobre uma peça específica, quanto sobre aspectos gerais de sua obra ou, ainda, sob o ponto de vista histórico. Nesta temática, podemos citar alguns trabalhos: Neoclassicismo e Nacionalismo no segundo Concerto para piano de Camargo Guarnieri (GONÇALVES, 2009); El Nacionalismo em la obra para piano solo del compositor brasileño Camargo Guarnieri (PLATA, 2009); Música 1 Guarnieri considerava que suas obras escritas entre 1920 e 1928 não possuíam um “valor rigorosamente artístico”. “Tudo quanto escrevi de 1920 a 1928 não deve, em hipótese alguma e sob nenhum pretexto, ser impresso e publicado, devendo apenas servir para estudo científico e comparativo” (Catálogo de Composições de Camargo Guarnieri, IEB/USP). 20 e expressão nacional nas Sonatinas para piano de Camargo Guarnieri (BENCKE, 2010); Nacionalismo e música erudita de vanguarda no Brasil e na Argentina: Camargo Guarnieri e Alberto Ginastera (1930 – 1960) (ORNAGHI, 2013). Sobre a sua obra propriamente dita, há um número maior de trabalhos do que em relação aos temas anteriores, principalmente, trabalhos relacionados à sua composição para piano, a maioria com ênfase na performance. Além do estudo do repertório pianístico, há também um importante trabalho do maestro Lutero Rodrigues (2001), As características da linguagem musical de Camargo Guarnieri em suas sinfonias, que privilegia as obras sinfônicas do compositor2 . Há também alguns poucos trabalhos sobre obras para outros instrumentos e/ou canto, que não o piano, e sobre obras para formações camerísticas. O olhar sobre o repertório pianístico, camerístico e sinfônico acontece sob diferentes ângulos: analítico-estrutural (harmonia, contraponto, forma e orquestração), interpretativo, histórico e semântico (relação texto e música). Abaixo, listamos os principais trabalhos encontrados.  The Ponteios of Camargo Guarnieri (Tese, 1995) – Ney Fialkow;  Chôro para piano e orquestra de Camargo Guarnieri: formalismo estrutural e presença de aspectos da música brasileira (Dissertação, 1999) – Maurício Zamith Almeida;  Camargo Guarnieri: uma análise das fugas das Sonatinas nº 3 e nº 6 para piano (Dissertação, 2002) – Geraldo Majela Brandão Ribas;  Análise musical de “Estudo para instrumentos de percussão”, 1953, M. Camargo Guarnieri; primeira peça escrita somente para instrumentos de percussão no Brasil (Dissertação, 2003) – Fernando Augusto de Almeida Hashimoto;  A Toccata e a Sonata de Camargo Guarnieri: uma abordagem técnica para a performance (Dissertação, 2004) – Sérgio Luiz de Souza;  Afastamentos composicionais no Choro Torturado de Camargo Guarnieri (Dissertação, 2004) – Elaine Milazzo;  Dança brasileira e Dança negra para piano solo de Camargo Guarnieri: uma abordagem interpretativa (Dissertação, 2007) – Priscila Gambary Freire;  Coesão e proporções nos Improvisos para piano de Camargo Guarnieri (Dissertação, 2007) – Carlos Alberto Assis; 2 A pesquisa relacionada ao repertório orquestral é ainda bastante escassa. Talvez isto se deva à grande dificuldade de encontrar partituras editadas destas obras. 21  A Fuga da Sonata para piano de Camargo Guarnieri: uma análise retórico-estrutural (Dissertação, 2008) – Daniel Vieira;  Improviso nº 3 para flauta solo de Camargo Guarnieri: desconstrução da obra a partir dos elementos rítmicos e melódicos como processo auxiliar na performance musical (Dissertação, 2008) – Giampiero Pilatti;  As canções de amor de Mozart Camargo Guarnieri e de Cláudio Santoro: uma interpretação informada pelos contextos estéticos originais (Dissertação, 2010) – Florence Rosa Lobo;  Gestos musicais no Ponteio nº 49 de Camargo Guarnieri: análise e comparação de gravações (Dissertação, 2011) – Josias Matschulat;  A contribuição de Camargo Guarnieri para o repertório violonístico brasileiro (Tese, 2011) – Marcelo Fernandes Pereira;  Camargo Guarnieri’s ten Momentos for piano: a recording and discussion of stylistic and expressive elements (Tese, 2014) – Suham G. Bello Brenes;  Considerações sobre o Ponteio e Dansa para piano e violoncelo de Camargo Guarnieri, contribuições para a didática do violoncelo a partir de uma peça brasileira (Dissertação, 2014) – Carlos Márcio Norberto Bicalho;  As canções de Camargo Guarnieri e Suzanna de Campos: um estudo para a interpretação (Tese, 2015) – Josani Keunecke Pimenta;  Comunicação de emoções básicas em Ponteios de Camargo Guarnieri (Dissertação, 2015) – Heidi Kalschne Monteiro. Dentro da produção de teses e dissertações, poderíamos citar trabalhos que comentam indiretamente a vida ou a obra de Guarnieri. Como exemplo disto, encontramos o trabalho Orquestração e instrumentação no nacionalismo: um estudo de quatro obras representativas do repertório sinfônico brasileiro (LUCAS, 2011). Tão importante quanto teses e dissertações sobre Guarnieri, são os artigos publicados em periódicos e revistas acadêmicas nacionais. Normalmente decorrentes de pesquisas mais amplas, são fontes sucintas de conhecimento, nas quais um determinado tema da pesquisa é desenvolvido separadamente. Na bibliografia deste trabalho, consta a referência a alguns artigos que julgamos importantes para nosso estudo, lembrando que, de todo o material pesquisado para o levantamento bibliográfico (incluindo dissertações e teses), nem todos se mostraram diretamente relacionados à temática por nós escolhida. 22 A partir deste levantamento, é possível percebermos que, mesmo não sendo uma produção volumosa, os trabalhos acadêmicos sobre Mozart Camargo Guarnieri têm mantido certa constância e regularidade, principalmente após 2001. Chama-nos a atenção a quantidade de trabalhos sobre a obra para piano de Guarnieri realizada por alunos de pós-graduação da Universidade Federal de Rio Grande Sul, trabalhos que, em sua maioria, se dão na área da performance, já que o curso de Pós-graduação em Música com ênfase em Práticas Interpretativas frequentemente recebe alunos de piano (Daniel Vieira, Eliane Milazzo, Geraldo Majela Brandão Ribas, Heidi Kalschine Monteiro, Josias Matschulat, Fernando Rauber Gonçalves, Luciana Noda). Após este levantamento bibliográfico, percebemos que trabalhos que discutem os procedimentos técnico-composicionais do compositor aparecem em menor número. Nosso trabalho buscou investigar sistematicamente os procedimentos melódico-harmônicos adotados por Camargo Guarnieri em seus 50 Ponteios, assim como abrindo um caminho de aproximação com algumas outras obras compostas no mesmo período, a saber, entre, aproximadamente, 1928 – data de sua primeira obra e ano em que começa a estudar com Mário de Andrade – e 1959, ano de composição do último Ponteio para piano. Nesta dissertação, pretendemos investigar os materiais escalares que fundamentam as estruturas melódicas, realçar o diálogo entre os anseios nacionalistas de Mário de Andrade e sua realização nos Ponteio e, por fim, levantar as características melódicas da poética composicional de Camargo Guarnieri. No que concerne à harmonia, verificamos a utilização de estruturas acórdicas recorrentes (modelos tonais e pós-tonais), suas relações entre si, seu relacionamento com a melodia, suas possíveis funções na articulação formal, assim como, a aproximação ou distanciamento de um centro harmônico estável. Estrutura da dissertação Como estrutura da dissertação, propomos uma divisão em três principais Capítulos. No primeiro Capítulo, intitulado OS PONTEIOS, apresentamos uma contextualização histórica-estilística dos 50 Ponteios para piano de Guarnieri. São observados o período de composição deste ciclo, as influências diretas e indiretas que possam ter recebido, além dos aspectos texturais e formais presentes em cada Ponteio. O segundo capítulo, com o título MELODIA, analisa, primeiramente, os materiais utilizados como fundamentos para a construção melódica: suas estruturas escalares. Posteriormente, são observados os procedimentos melódicos recorrentes na composição dos 23 Ponteios, assim como, as motivações estéticas que possam ter influenciado o compositor a fazer algumas escolhas musicais concernentes à elaboração melódica. O terceiro Capítulo, nomeado HARMONIA, parte da relação entre a escrita harmônica do compositor e as práticas Tonal, Modal, Bitonal e Atonal observando as estruturas de base da construção harmônica – tríades e tétrades – e algumas de suas possibilidades de aparecimento e de transformação nos Ponteios. Em seguida, investigam-se prováveis relacionamentos harmônicos, tais como progressões e cadências, e, por fim, o comportamento melódico das linhas que compõem a harmonia considerando suas implicações polifônicas. 24 1 OS PONTEIOS 1.1 Contextualização histórico-estilística Camargo Guarnieri dedicou grande atenção ao piano em suas composições, o que resultou em um vasto repertório para este instrumento. Esta produção é composta por ciclos de obras: cinquenta Ponteios, vinte Estudos, dez Valsas, dez Improvisos, dez Momentos; uma Sonata, oito Sonatinas, peças individuais e peças infantis. Além das peças solo, o piano desempenha um importante papel em suas canções e na música de câmara. Guarnieri também compôs seis Concertos, um Concertino, um Choro, uma Seresta, Variações sobre um tema nordestino, peças nas quais o piano atua como instrumento solista à frente da orquestra. Ainda podemos ressaltar a presença do piano dentro da orquestra compondo o colorido orquestral de algumas de suas obras sinfônicas. Segundo Verhaalen (2001, p. 87), provavelmente, o fato do piano ser o instrumento de ofício de Guarnieri proporcionou-lhe uma fluência natural, observada em suas obras para teclado. Os cinquenta Ponteios foram compostos entre 1931 e 1959, um período de quase trinta anos que compreende as primeiras composições de Guarnieri e se estende até sua consolidação como importante criador brasileiro, após vencer alguns prêmios nacionais e internacionais de composição3 . Também são deste período suas três primeiras Sinfonias, algumas Suítes para orquestra, Aberturas, muitas obras camerísticas e solistas, além da ópera Pedro Malazarte e outras peças vocais. A coleção completa é dividida em cinco volumes, cada volume com dez Ponteios. 3 Prêmio The Edwin A. Fleischer Music Collection, da The Free Library of Philadelphia, 1º lugar com a obra Concerto nº 1 para violin e orquestra (1942); Prêmio Luiz Alberto Penteado Rezende, São Paulo, 1º lugar com a Sinfonia nº 1 (1944); Prêmio Chamber Music Guild (Washington) e Radio Corporation America/RCA Victor para quarteto de cordas, 1º lugar entre os concorrentes da América Latina com o Quarteto de Cordas nº 2 (1944); Prêmio Alexandre Levy, Prefeitura de São Paulo, 1º lugar com o Concerto nº 2 para piano e orquestra (1946); Concurso Sinfonia das Américas, Detroit, EUA, 2º lugar com a Sinfonia nº 2 (1946); Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo “Prêmio Carlos Gomes”, 1º lugar com a Sinfonia nº 3 (1954); 2º Concurso de Música Latino-Americana do Festival Latino-Americano, Caracas, Venezuela, “Prêmio José Angel Lamas, 1º lugar com o Choro para piano e orquestra” (1956). 25 Tabela 1. Divisão dos Ponteios em cinco volumes, data de composição e publicação. Volume Nº dos Ponteios Período da composição Ano da publicação e editora I 1 a 10 1931 a 1935 1955 – Ricordi, Buenos Aires 1969 – Ricordi Brasileira II 11 a 20 1947 a 1949 1955 – Ricordi, Buenos Aires 1969 – Ricordi Brasileira III 21 a 30 1954 a 1955 1957 – Ricordi, Buenos Aires 1970 – Ricordi Brasileira IV 31 a 40 1956 a 1957 1959 – Ricordi, Buenos Aires 1970 – Ricordi Brasileira V 41 a 50 1958 a 1959 1961 – Ricordi, Buenos Aires 1970 – Ricordi Brasileira Fontes: VERHAALEN, 2001; SILVA, 2001. Para melhor contextualizarmos os 50 Ponteios dentro da trajetória estética e composicional de Guarnieri, utilizaremos uma divisão de sua produção musical em diferentes fases composicionais feita por Rodrigues, em seu artigo As características da linguagem musical de Camargo Guarnieri (2015). Tabela 2. Fases composicionais de Camargo Guarnieri Período cronológico Fase composicional Principais características e acontecimentos 1928 a 1940 Fase de formação  Aluno de Lamberto Baldi e Mário de Andrade;  Viagem à Europa de 1938 a 1939, tendo aulas com Charles Koechlin;  Ruptura estética entre os anos de 1934 e 1936. 1940 a 1950 Fase de afirmação  Obras premiadas internacionalmente;  Viagens aos Estados Unidos;  Tournée sul-americana (1945);  Importantes composições sinfônicas e preferência pelas grandes formas. 26 1950 a 1965 Fase do nacionalismo de combate  Carta aberta aos músicos e críticos do Brasil;  Obras premiadas;  Busca por tornar mais evidente o caráter da música brasileira em suas peças. 1965 a 1982 Fase do nacionalismo essencial  Prestígio internacional consolidado;  Regente da Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo (1975);  As constâncias de origem popular tornam-se mais sutis, reduzidas à sua essência;  Transformações em sua música em direção à modernidade (harmonia). 1982 a 1993 Fase final  Menor número de composições;  Retorno à música tonal e utilização de formas mais concretas. Fonte: RODRIGUES, 2015, p. 135-138. Ao fazermos uma análise comparativa das duas tabelas, é possível notarmos que o período de composição dos 50 Ponteios compreende as três primeiras fases composicionais do compositor. A partir da análise de outras obras compostas por Guarnieri neste mesmo período, é possível notarmos uma certa homogeneidade na escrita harmônica do compositor, exceto pela ruptura estética dentro da primeira fase composicional, entre 1934 e 1936. Tal ruptura é apontada por Rodrigues como, possivelmente resultante, dentre outros fatores, das duras críticas de Mário de Andrade a algumas obras mais cromáticas (“dissonantes”) do compositor4. Na comparação entre a produção anterior e posterior a esta interrupção, Rodrigues afirma que, em relação à harmonia, a partir de 1936 o tonalismo deixou de ser perturbado pelo cromatismo excessivo e tornou-se mais evidente, melhor definido, enquanto as dissonâncias passaram a ser empregadas com moderação; o uso do modalismo passou a ser mais frequente (RODRIGUES, 2015, p. 131). 4 Rodrigues cita algumas críticas de Mário em relação à Sonata nº1 para violoncelo e piano (1931), ao Quarteto de cordas nº 1 (1932) e, principalmente, à Sonata nº 2 para violino e piano (1933) (RODRIGUES, 2015, p. 130). 27 Podemos acrescentar que, segundo Verhaalen, aproximadamente a partir deste mesmo período é que Guarnieri passa a utilizar com maior frequência harmonias por intervalos de quarta (VERHAALEN, 2001, 83). Voltando à Tabela 1, notamos um maior espaçamento de tempo entre a composição dos Ponteios que formam o primeiro volume para os do segundo volume, distância que é cada vez menor à medida que os próximos volumes são compostos. Os doze anos que separam os dois primeiros volumes resultam em uma diferença nos procedimentos composicionais entre as peças destes volumes, sentida em menor grau nos volumes posteriores. Nos dez primeiros Ponteios, há maior ousadia em relação à harmonia – por exemplo, com a utilização de dois centros harmônicos simultâneos – e os ostinati são empregados com maior frequência, se comparado aos outros volumes (Tabela 4). A partir do segundo volume, os intervalos melódicos e harmônicos de quarta e a utilização dos modos Mixolídio, Lídio e Mixolídio com quarta aumentada são cada vez mais frequentes. É importante ressaltar que foi entre a composição do primeiro e do segundo volume dos Ponteios (1935 – 1947) que Guarnieri compôs importantes e premiadas obras, peças que contribuíram para a consolidação de sua escrita. Destas obras, podemos citar: Sinfonia nº 1, Sinfonia nº 2, Concerto nº 1 para violino, Concerto nº 2 para piano, Abertura Concertante, Flor de Tremembé, além de canções e peças de câmara. Outro ponto a ser considerado quando comparamos as Tabelas 1 e 2, é que a maior parte dos Ponteios (os três últimos volumes) foi composta dentro da denominada “Fase do nacionalismo de combate”. Provavelmente, devido à publicação da Carta aberta aos músicos e críticos do Brasil e sua grande repercussão no meio musical, Guarnieri passou a “tornar mais evidente o pretendido caráter de música brasileira” (RODRIGUES, 2015, p. 137) em suas composições. Talvez, por isso, algumas características melódicas e harmônicas – como a utilização frequente dos modos das tonalidades Maior e Menor – se mantenham, ainda, firmemente neste período. Deste modo, podemos perceber que nos 50 Ponteios – apesar da ruptura estética observadas no meio da década de 19305 – há a conservação de algumas características que podem demonstrar uma unidade composicional na totalidade deste ciclo. Por ser um conjunto composto por cinquenta miniaturas concisas e autossuficientes, “os Ponteios refletem [...] várias técnicas da escrita do compositor durante estes anos” (VERHAALEN, 2001, p. 128) e por isso representam uma parcela importante de sua obra. É por este motivo que utilizaremos este ciclo como uma amostragem de sua composição a fim 5 Apesar dista ruptura, nos Ponteios do primeiro volume podem ser constatados de maneira germinal elementos melódicos e harmônicos que serão mantidos e desenvolvidos nos demais volumes. 28 de analisar seus procedimentos melódicos e harmônicos. Pela quantidade de peças que compõem este ciclo e o período cronológico que o compreende, é possível encontrarmos uma diversidade de procedimentos, mas também reincidências de alguns padrões, os quais serão alvos de nossa investigação. Sobre o título Ponteio, Guarnieri explicava: “Na verdade, são prelúdios que têm caráter clara e definitivamente brasileiro. Achei melhor usar uma palavra diferente de ‘prelúdio’ para expressar esse caráter brasileiro” (VERHAALEN, 2001, p. 128). Em entrevista concedida ao Diário da Noite, em 1935, Guarnieri comenta a respeito do termo Ponteio dizendo que É um prelúdio. Em vez de “prelúdio” uso “ponteio” porque diz mais com o caráter de minhas despretensiosas composições. A palavra “Ponteio” é mais uma prova de minha tendência nacionalista. Presumo ter sido o primeiro a usar tal palavra sistematicamente nesta acepção (Guarnieri in WERNET, 2009, p. 167). Encontramos, no documentário Mozart Camargo Guarnieri (2007), um testemunho do compositor Almeida Prado, aluno de Guarnieri, dizendo que o título Ponteio teria sido uma sugestão de Mário de Andrade a Camargo Guarnieri, o que é possível, já que ao se referir ao que seria uma suíte genuinamente brasileira, em seu Ensaio sobre a música brasileira (1972), Mário de Andrade comenta que o primeiro movimento poderia ser chamado de “Ponteio (prelúdio em qualquer métrica e movimento)” (p. 68). Tomando a definição de Belkiss Carneiro de Mendonça (2001, p. 402), “Ponteio deriva do verbo pontear, que significa preludiar. O hábito de preludiar era muito usado até o séc. XVIII e, como improvisação, servia para testar a afinação do instrumento, indicar a tonalidade aos cantores ou mesmo fazer calar os ouvintes”, e comparando-a com a citação de Verhaalen, podemos inferir que o nome Ponteio reflete a influência da música caipira, cujas características principais veremos demonstradas por meio de alguns elementos texturais e harmônicos presentes. Segundo Fialkow (1995), em sua tese de doutorado, Camargo Guarnieri deixa transparecer diversas influências em seus Ponteios: os Prelúdios para piano de Chopin, as figurações pianísticas de Schumann e de Scriabin; influência da música popular brasileira: a Modinha, o Choro, o Tango brasileiro, a Choro e a música rural de São Paulo e do Nordeste; e, ainda, elementos da música afro-brasileira e afro-americana (Blues e Jazz). No início de cada Ponteio, Guarnieri coloca indicações de tempo que também sugerem, além do andamento, o caráter de cada peça. Nos dez primeiros Ponteios, temos as 29 seguintes indicações: Calmo, com profunda saudade, Raivoso e ritmado, Dolente, Gingando, Fatigado, Apaixonado, Contemplativo, Angustioso, Fervoroso, Animado. Cada uma delas é construída na escrita de cada Ponteio por meio da utilização de ritmos mais simples ou complexos, harmonias/melodias que se encaminham cromática ou diatonicamente e, sobretudo, nas melodias, formadas tanto por intervalos mais angulosos, quanto, quase inteiramente, por graus conjuntos. “Guarnieri não usou títulos para seus Ponteios, entretanto, ele deixa pistas para o performer em suas elaboradas e poéticas marcações de tempo” (FIALKOW, 1995, p. 22). Segundo a intérprete Belkiss Carneiro de Mendonça, as indicações de caráter são utilizadas como título para os Ponteios (2001, p. 402). Sobre esta questão, Heidi Kaschne Monteiro concorda e também aponta alguns caminhos que Guarnieri utiliza para exprimir as indicações, em sua dissertação Comunicação de emoções básicas em Ponteios de Camargo Guarnieri. 1.2 Aspectos texturais Cada um dos Ponteios possui sua particularidade em relação à textura e à estrutura. Sobre isto, Verhaalen (2001, p. 129) afirma que “é impossível encontrar um Ponteio típico devido à grande variedade de estruturas”. Apesar desta afirmação, Belkiss Mendonça (2001, p. 402) propõe a seguinte classificação dos Ponteios de acordo com algumas características levantadas por ela. 30 Tabela 3. Classificação dos Ponteios segundo Belkiss Carneiro de Mendonça. Ponteios Características gerais e/ou presença de elementos texturais 1-5, 7, 8, 24, 31 Acompanhamento em moto-contínuo e linha melódica livre 12, 21, 25, 40, 47 Movimentos rápidos de valores iguais e intervalos pouco distanciados 19, 23 Elementos da música popular carioca6 17, 29, 34, 45 Intervalos de terças (terças caipiras), descrito como modal rural 15, 32, 35, 37, 39 Presença de elementos africanos (batuque e lundu) 13, 22, 28, 33, 36, 38, 41, 46 Caráter geral descrito como “tristeza e melancolia” 9, 10, 11, 26, 44, 48 Polifonia 20 [Referência ao] Aboio 18 [Citação de] Cantiga de cego7 30, 43, 49, 50 Características individuais8 Fonte: MENDONÇA, 2001, p. 404. Para esta classificação, Belkiss Mendonça parece levar em consideração elementos texturais (polifonia), elementos técnicos e pianísticos (movimentos rápidos de valores iguais e intervalos pouco distanciados, moto-contínuo e linha melódica livre), relações com outras poéticas musicais ou referências à música folclórica (manifestação popular da música carioca, modal rural, elementos africanos, aboio, cantiga de cego) e caráter (tristeza e melancolia, tristemente). Percebe-se que os Ponteios podem ser classificados sob diferentes critérios: texturais, rítmicos, melódicos, harmônicos, formal, da técnica pianística ou sob o ponto de vista do caráter, entre outros. Para nossa análise, classificamos os cinquenta Ponteios utilizando um 6 Na nossa análise, qualificamos com “elementos da música popular carioca” as figurações rítmico-melódicas próximas ao Choro. 7 Esta cantiga, denominada “O cego”, encontra-se no Ensaio sobre a música brasileira, de Mário de Andrade (1972, p. 149). 8 A autora não explicita o que se entende por “características individuais”. Suspeitamos que procedimentos composicionais muito particulares, a autora não quis agrupá-los em outras classificações. 31 único critério: a textura. Veremos a importância das relações estabelecidas entre as escolhas harmônicas e as escolhas texturais adotadas pelo compositor e sua intrínseca coexistência. Tabela 4. Classificação dos Ponteios a partir do critério textural9. Características Ponteios Melodia com acompanhamento Ostinato rítmico 1, 2, 3, 4, 8, 12, 16, 18, 25, 34 Cordal 5, 7, 22, 23, 24, 30, 31, 35, 36, 37, 38, 43 Figurado 6, 8, 11, 13, 14, 19, 27, 28, 41, 42, 44 Pedal 17, 20, 29, 34, 45 Polifonia Livre 9, 10, 14, 19, 26, 27, 33, 39, 42, 44, 46, 48, 50 Movimento contrário 21, 47 Textura gestual 15, 32, 40, 49 A polifonia está sempre presente em todos os Ponteios, tanto na relação de autonomia dos elementos entre um ostinato e uma melodia que sobre ele se coloca, quanto na condução melódica de progressões harmônicas; porém, classificamos como polifônicos apenas àqueles em que a movimentação das vozes ou camadas mostra-se determinante para compreensão da obra. Segundo o musicólogo Paulo Castagna (2003), “a polifonia era um procedimento utilizado em várias correntes composicionais das décadas de 1920 e 1930, mas especialmente empregadas pelos neoclássicos, a partir dos modelos barrocos” (p. 13). Para Kostka (2006), uma grande parte da música do Século XX pode ser analisada utilizando as texturas tradicionais: monofonia, homofonia (melodia acompanhada e textura cordal) e polifonia (imitativa e livre). Além destas, ele ainda cita a textura composta, que seria uma textura mais complexa que é formada por camadas. Classificamos os Ponteios em três grandes grupos:  Melodia com acompanhamento: um material melódico (temático) é acompanhado por um plano secundário (ostinato, acordes em blocos ou arpejados) ou nota pedal;  Polifonia: linhas autônomas, complementares que contêm informações intervalares, direcionais e rítmicas diferentes, porém entrelaçando-se contrapontisticamente 9 Realçamos que, em nossa análise, os Ponteios nº14, 19 e 35 enquadram-se em mais de uma classificação por apresentarem duas características texturais que consideramos estruturais. 32 (BERRY: 1987, p. 192). No caso dos Ponteios, dividimos em contraponto livre e contraponto por movimento contrário (ou espelhado);  Textura gestual: é o desdobramento de um gesto pianístico, ou seja, a escrita idiomática do instrumento passa a ser o elemento gerador da textura. Também ressaltamos que, esta classificação que está sendo empregada nos 50 Ponteios, pode ser aplicada a outras obras deste compositor, mas não compreende toda a variedade textural das demais obras. Além da textura de cada Ponteio, chama-nos a atenção a utilização de algumas escalas modais características da música tradicional do interior paulista. “Os modos mais usados são o Dórico, o Lídio, o Mixolídio e o Modo do Nordeste [Mixolídio com a quarta aumentada]” (VERHAALEN, 2001, p. 135). Estes modos podem ser encontrados nos Ponteios nº 16, nº 17, nº 18, nº 20, nº 29, nº 34, nº 39, nº 43, nº 45 e nº 46. Nestes, a melodia frequentemente evoca toques e cantos da música caipira, abrindo mão das interferências cromáticas, comuns aos outros Ponteios. No caso dos Ponteios nº 17, nº 20, nº 29, nº 34 e nº 45, os dobramentos de décima (às vezes, oitava e décima) da melodia sugerem uma releitura das terças paralelas da música caipira, principalmente na executada pela viola caipira. Tal sensação é reforçada pela utilização da nota pedal, neste caso, representando a(s) corda(s) solta(s) da viola caipira que soa(m) continuamente enquanto a melodia é entoada. Sobre esta tradução da música de viola para o piano, Fialkow diz que “Em alguns Ponteios, está bem claro que o piano é usado também para imitar ou se referir a instrumentos em particular. Frequentemente, o piano se refere ao violão, outras vezes à viola, e aos instrumentos mais representativos da tradição Ibérica” (FIALKOW, 1995, p. 89). 1.3 Aspectos formais Devido à brevidade de cada um dos Ponteios, a forma é concisa, possuindo quase sempre uma unidade temática durante toda a peça. “Com relação à forma, Guarnieri dizia que considerava quase todos os Ponteios monotemáticos, com exposição seguida de reexposição” (VERHAALEN, 2001, p. 128). É importante trazer para as considerações formais, um termo que Mário de Andrade apresentou no Ensaio sobre a música brasileira (1972, p. 42) para descrever um processo de transformação do texto (poema) em música. Trata-se do termo “ambientação” e aplica-se, 33 geralmente, nas Introduções e nas Exposições temáticas. Segundo Mário, “ao invés de ser expressiva momento por momento, a música popular cria ambientes gerais, [...] resultantes fisiológicas da graça ou da comodidade, da alegria ou da tristeza” (Idem). Mário ainda diz que o compositor, seguindo o exemplo da música popular, deve “ambientar musicalmente o ouvinte de forma a permitir pela sugestão da dinamogenia uma perceptibilidade mais vívida, mais geral, mais fisiopsíquica do poema” (Idem). No caso da música instrumental, esta ambientação se relaciona com o material temático, precedendo-o ou suportando-o, conduzindo o ouvinte ao caráter desejado. Se a ambiência antecedia a exposição do tema, já trazia consigo a missão de anunciar seu caráter, preparando sua aparição em um contexto mais familiar, com o qual pudesse manter uma íntima relação de cumplicidade. A ambiência também poderia surgir com o tema, simultaneamente, assim contribuindo para melhor definir ou reforçar seu caráter, e poderia prolongar-se mais além do final de sua exposição, prorrogando sua memória ainda viva até a completa extinção. Antecedendo e sucedendo temas, a ambiência passava a exercer também um papel formal, delimitando os espaços reservados para seus respectivos temas no contexto estrutural da obra (RODRIGUES, 2015, p. 110). Na afirmação anterior, é possível notarmos a relação formal entre ambiência e forma musical. Rodrigues aponta que aparece, especificamente em três momentos, que, para a nossa análise dos Ponteios, podem ser vistos da seguinte maneira: antes do tema (Introdução), no tema (Exposição/Rexposição) e após o tema, como seu fechamento (Coda). Quando ocorre, em andamentos lentos ou temas contrastantes, na maioria das vezes, o compositor não a via [melodia acompanhada] somente como melodia acompanhada, porém como tema e sua “ambiência”, termo com o qual Guarnieri costumava denominar certo tipo de acompanhamento que exercia papel decisivo no estabelecimento do caráter psicológico de um determinado tema (Idem). No texto anterior, Rodrigues faz um paralelo entre a textura de melodia acompanhada e a ambientação temática. Logo, a ambientação pode ser vista como a maneira com que o acompanhamento é estruturado a fim da construção do caráter do tema. Deste modo, a escolha dos elementos que compõem o acompanhamento – ritmo harmônico, direção da harmonia, estrutura rítmica, dinâmica, articulação, registro e timbre – é decisiva para direcionar o ouvinte ao caráter desejado. Segundo nossa análise, predominam três modos de construção dos Ponteios, divididos em dois modelos de estrutura binária A A’ e A (com Desenvolvimento) A’, e um modelo ternário A A’ A’’. Frequentemente, encontraremos uma pequena Coda ao final dos Ponteios. 34 Guarnieri desenvolveu e utilizou com regularidade um tipo de forma ABA na qual a seção B não contém material novo, mas sim um desenvolvimento do material A [seção A’]. [...] A parte central da seção B em geral se inicia imperceptivelmente, como uma continuação do material inicial, chega a um clímax, e então há um bem- vindo retorno, frequentemente harmonizado de maneira nova [...] (VERHAALEN, 2001, p.82). O Ponteio nº 2 é um exemplo do nosso primeiro modelo formal binário A A’. Nos dois primeiros compassos da peça, temos a apresentação do ostinato rítmico melódico que estará presente até o final, seguido, já no compasso 3, pela melodia de A, que continua até o compasso 12. Os compassos 13 e 14 conduzem o ostinato ao registro grave (oitava abaixo) e a partir do compasso 15, temos uma repetição variada do trecho inicial, a seção A’. Neste caso, os três últimos compassos concluem a peça como uma pequena Coda. Figura 1 – Primeiros 4 compassos do Ponteio nº 2. Tabela 5. Estrutura formal do Ponteio nº 2. Ponteio nº 2 Seção A Ponte A’ Coda Compasso (1 - 2) + (3 - 12) (13 - 14) (15 - 16) + (17 - 28) (29 - 31) mudança de registro do ostinato = O segundo modelo de estruturação formal binária, A (com Desenvolvimento) A’, pode ser encontrado no Ponteio nº 38. A seção A deste Ponteio demonstra a expansão harmônica e melódica conjugada ao aumento da dinâmica que conduz a um ponto culminante antes da retomada do tema na seção A’. Esta expansão da primeira seção pode ser observada, por exemplo, na diferença de quantidade de compassos entre A (32 compassos) e A’ (19 compassos). Comparando a melodia, é possível notarmos que, até o compasso 19, esta permanece quase inalterada em relação ao A’, mas a expansão se dá principalmente pelo 35 postergar de uma resolução harmônica que é intensificado por meio de progressões a partir do compasso 21. Figura 2 – Primeiros 4 compassos do Ponteio nº 38. Tabela 6. Estrutura formal do Ponteio nº 38. Ponteio nº 38 Seção A A’ Compasso (1 – 32) [(1 – 19) + (19 - 32)] (33 - 51) Desenvolvimento O Ponteio nº 11 é um bom exemplo da estrutura ternária A A ’A’’. Neste Ponteio, uma breve melodia é exposta do primeiro ao quinto compasso (A) e, a partir do compasso seis, a mesma melodia é reapresentada no registro agudo com o acréscimo de algumas notas. Além disso, do compasso seis ao compasso treze (A’) há maior movimentação rítmica da voz interna e o acréscimo de algumas notas na harmonia. No compasso quatorze, a mesma melodia é mais uma vez exposta, porém com mudança de dinâmica (agora ppp, no início pp) e algumas alterações no acompanhamento. 36 Figura 3 – Ponteio nº 11, início das seções A, A’ e A’’. Tabela 7. Estrutura formal do Ponteio nº 11. Ponteio nº 11 Seção A A’ A’’ Compasso (1 - 5) (6 - 13) (14 - 20) dinâmica pp mudança de registro da melodia dinâmica ppp Além destes modelos citados, encontramos alguns Ponteios que adotam outras articulações formais. O Ponteio nº 16 é unário: seção única A, seguida de uma pequena Coda em seus últimos compassos, assim como o nº 22. É possível, também, encontrarmos uma estruturação formal ternária A B A’, com a seção central contrastante no Ponteio nº 21. Da anacruse do compasso 23 até o compasso 37, 37 há contrastes rítmicos, intervalares e de dinâmica se comparado com as partes A (compassos 1 a 22) e A’ (compassos 38 a 59). Figura 4 – Ponteio nº 21, início das seções A e B. Já os Ponteios nº 20 e nº 45, apresentam uma estrutura próxima à do Rondó, ou seja, um constante aparecimento de A (literal ou variado), entremeado por estrofes ou episódios (B, C). Em ambos os Ponteios tal divisão é demonstrada, inclusive, por meio das indicações metronômicas dos andamentos. 38 Figura 5 – Ponteio nº 20, início das seções A, B e C. Ultrapassando a fronteira dos Ponteios e alcançando outras obras de Guarnieri, perceberemos seu empenho em tornar claras as formas musicais consolidadas nos períodos históricos anteriores (Sonata, Forma Lied, Tema com variações, entre outras). Na literatura referente a Camargo Guarnieri, a preocupação com a organização formal está constantemente pontuada entre as principais características de sua obra, traço que pode ser observado desde as primeiras composições até as derradeiras. Dentre outras coisas, isto lhe conferiu o status de compositor Neoclássico. Sobre seu cuidado com a estruturação formal de suas composições, Guarnieri diz ao compositor Ricardo Tacuchian: Sou um brahmsiano: a forma é minha alucinação. Isto não quer dizer que ela me prende, ao contrário, uso-a a serviço de minha imaginação e de minha expressão. O que vale na forma é o seu aspecto geral, mas dentro dela recrio sempre novas propostas (TACUCHIAN, 2001, p. 447). Finalizando este capítulo, gostaríamos de realçar que as observações levantadas sobre aspectos texturais e formais nos Ponteios incidem e reaparecem nos capítulos seguintes 39 que tratarão, especificamente, dos procedimentos composicionais referentes à melodia e à harmonia. Em nossa análise, ainda que descritos separadamente, todos os elementos estruturais concorrem para uma compreensão unificada da obra. Como disse Verhaalen em ao tratar especificamente dos Ponteios: Todos os aspectos discutidos – forma, harmonia, melodia, estrutura, ritmos harmônicos – devem ser considerados em cada um dos Ponteios porque, individualmente, nenhum deles pode retratar o estilo de escrever do compositor. (2001, p.135) 40 2 MELODIA 2.1 Escalas e modos Camargo Guarnieri teve seu primeiro contato com Mário de Andrade no ano de 1928, mesmo ano em que o livro Ensaio sobre a música brasileira foi publicado, a fim de ser um norteador estético para os jovens compositores brasileiros. O Ensaio Sobre a Música Brasileira é um livro escrito com a intenção de sedimentar uma ideia de nacional na música: a ideia de música brasileira de Mário de Andrade. Entretanto, este não o fez apenas com o intuito de defender o nacionalismo musical brasileiro, mas sim de fundar definitivamente a nacionalidade da música brasileira, conjugando recursos variados que destacam a busca da brasilidade nos elementos constitutivos da composição nacional a ser feita no Brasil pelos compositores – eruditos, naturalmente – que, daí por diante, quisessem se integrar à legitimação da música nacional (PICCHI, 2009, p. 106). Ao abordar o tema melodia, o autor recomenda aos compositores que se utilizem dos materiais estruturais da música folclórica, citando, então, alguns dos modos eclesiásticos, em especial: o modo Mixolídio, ao comentar sobre “a sétima abaixada” (ANDRADE, 1972, p. 44); e o modo Lídio, dizendo que “este se acomoda perfeitamente com a psicologia musical do brasileiro” (Idem, p. 149). Aponta ainda, a escala hexacordal (escala Maior desprovida do sétimo grau, a sensível), dizendo que seu uso geraria um “efeito interessantíssimo” (Idem, p. 45). Os mesmos modos citados no Ensaio, também são ressaltados por Mário em sua Pequena História da Música (2015) como sendo frequentes e comuns no “populário brasileiro” (p. 172-173). Tais dizeres de Mário de Andrade podem ter influenciado Camargo Guarnieri na escolha dos materiais escalares que fundamentariam suas composições. Tal influência pode ter se dado não apenas no uso das escalas e modos citados no Ensaio, mas, também, direcionado o olhar do compositor para os múltiplos padrões escalares da música folclórica brasileira. O compositor e musicólogo João Baptista Siqueira (1906-1992), que também se enveredou pelos caminhos do nacionalismo em meados do século XX, publicou, em 1956, o livro Pentamodalismo Nordestino, no qual defende que a música desta região é formada por cinco principais escalas: 41 Figura 6 – Escala Maior descendente com elisão do 7º grau (chamada de Hexacordal por Mário de Andrade, no Ensaio). Fonte: SIQUEIRA, 1956, p. 14. Figura 7 – Escala Maior descendente com o 7º grau abaixado (Mixolídio). Fonte: SIQUEIRA, 1956, p. 15. Figura 8 – Escala Maior descendente com o 4º grau alterado ascendentemente (Lídio). Fonte: SIQUEIRA, 1956, p. 16. Figura 9 – Escala Menor descendente em graus naturais. Fonte: SIQUEIRA, 1956, p. 17. Figura 10 – Escala Menor descendente com o 6º grau alterado ascendentemente (Dórico). Fonte: SIQUEIRA, 1956, p. 18. Chama-nos a atenção o fato de Siqueira ter demonstrado todas as escalas descendentemente, característica cujas razões serão comentadas mais à frente. 42 A professora e pesquisadora Ermelinda Paz, em seu livro Estruturas modais na música folclórica brasileira, ressalta que Siqueira, em um livro posterior, Canto metafísico (1981, p. 3-4) estabelece que os modos mais utilizados no Nordeste são: I Modo Real (mixolídio), II Modo Real (lídio) e o III Modo Real – misto Maior (mescla de lídio e mixolídio) além de I Modo derivado (frígio), II Modo derivado (dórico) e III Modo derivado – misto menor (mescla de frígio e dórico) (SIQUEIRA, 1981 apud PAZ, 1994, p.23). Mais recentemente, o compositor e arranjador Paulo Tiné, em seu doutorado (2008), tratando dos procedimentos modais na música brasileira, a partir da análise de várias melodias regionais brasileiras, chega à conclusão que os modos mais utilizados são: Mixolídio, modo Menor (Eólio), Lídio e Dórico, dispostos aqui em ordem decrescente de aparecimento. Ressalta, também, o grande número de melodias baseadas na escala Pentatônica, principalmente, no contexto do repertório afro-brasileiro (p. 82-85). A influência de Mário de Andrade e de seus escritos contribuiu grandemente para o desenvolvimento do pensamento etnomusicológico brasileiro, resultando na criação de um acervo de materiais melódicos, harmônicos, formais e, por fim, estilísticos da música regional brasileira. [...] Mário iniciou uma ampla divulgação da coleta de cantos folclóricos entre os artistas brasileiros, visando despertar nos intelectuais dos centros urbanos (São Paulo, em especial) o interesse pedagógico em torno da cultura rural como matéria- prima ou fonte de inspiração para elaborar suas composições eruditas. Por essa razão, em seus artigos escritos nos anos 1920, enaltecia os poucos trabalhos existentes sobre a coleta das canções folclóricas realizados por Luciano Gallet ou por Renato Almeida (CONTIER, 2013, p. 114). Em nossa análise dos 50 Ponteios, as escalas e os modos recorrentes obedecem à seguinte classificação: escala Maior, escala Menor, modos Mixolídio, Lídio, Lídio-mixolídio (Mixolídio com quarta aumentada), Dórico, Frígio, Lócrio e Frígio-dórico (Frígio com sexta maior). Verificaremos, ainda, a utilização de escalas simétricas (Tons Inteiros, Octatônica e Cromática) e da escala Alterada, esta última, diretamente ligada à música popular afeita à improvisação jazzística.10 10 Estão exemplificados apenas os modos e escalas menos usuais. 43 Figura 11 – Modos mistos: a. Lídio-mixolídio; b. Frígio-dórico. Figura 12 – Escala de Tons Inteiros. Figura 13 – Escala Octatônica em suas duas transposições. Figura 14 – Escala Cromática Figura 15 – Escala Alterada11 As formações escalares utilizadas nos Ponteios podem ser observadas sob diferentes pontos de vista: 11 Segundo o pianista Brian Waite, “a escala Alterada é uma combinação de segmentos [tetracordes] da escala Octatônica e da escala de Tons Inteiros”. Ainda segundo Waite, é usada principalmente sobre o acorde de Dominante com sétima para acrescentar-lhe possíveis alterações (WAITE, 1987, p. 65). Trocando a ordem dos tetracordes, eliminando a repetição das notas final e inicial e finalizando no quinto grau (trítono), obtém-se a escala Lídio-mixolídio (Sol♭, Sol♯/Lá♭, Si♭, Dó, Ré♭, Ré♯/Mi♭, Mi/Fá♭, Sol♭). 44 1. Como estrutura dos materiais melódicos; 2. Como estrutura dos materiais harmônicos; 3. Na relação entre harmonia e melodia (na totalidade de cada Ponteio ou em momentos específicos de cada peça). Neste capítulo, serão desenvolvidas as implicações melódicas, prioritariamente. As decorrências das escalas e modos no âmbito da harmonia e da relação harmonia/melodia serão tratadas no próximo capítulo. 2.2 Escalas e modos usados como estrutura dos materiais melódicos Por mais que se faça uma análise centrada no aspecto melódico, é inevitável não considerar influências que harmonia, forma ou textura possam exercer sobre a construção do discurso melódico. Tal influência se dá em maior grau quando comparamos os momentos de Exposição temática (seções A, A’, A’’, B e C) com os trechos reservados para a elaboração/expansão harmônica e motívica (Desenvolvimentos). É na Exposição temática que, normalmente, encontramos certa estabilidade escalar, ainda que, em alguns casos, possa estar comprometida por interferências cromáticas na linha melódica. Tais alterações podem se dar com o intuito de variar e adequar a melodia à uma nova harmonização, ornamentar ou, ainda, gerar, propositalmente, ambiguidade quanto ao centro tonal/modal12. Mesmo com estas modificações, em muitos casos, a escala ou o modo mantêm suas características principais. Parte dos Ponteios possui uma única escala ou modo predominante na melodia, mas esta nitidez poderá ser confirmada ou posta em dúvida pelo acompanhamento ou por paralelismos harmônicos da própria linha melódica. 12 Como veremos no capítulo que tratará das características harmônicas dos Ponteios, algumas destas peças possuem certa ambiguidade harmônica, possibilitando a interpretação de mais de um centro polarizador, o que normalmente será observado relacionando melodia e harmonia. 45 Figura 16 – Ponteio nº 16, melodia e harmonia confirmam o modo Lídio-mixolídio13, c. 1-8. Figura 17 – Ponteio nº 34, paralelismos melódicos põem em dúvida o centro principal da peça (Dó Maior), c. 1-12. 13 Apesar do quarto grau alterado não constar na melodia (podendo, por isso, ser classificada apenas no modo Mixolídio), sua ausência não contradiz o modo Lídio-mixolídio presente no ostinato (mão direita), já que é possível que interpretemos a quarta aumentada do acompanhamento como a nota faltante da melodia. 46 Já nos Desenvolvimentos, geralmente as melodias se moldam às progressões e aos afastamentos harmônicos, podendo, por vezes, transformar ou estender a escala principal da peça. Por ter como característica a instabilidade e o contínuo deslocamento e expansão harmônicos, a observação unilateral da melodia nos desenvolvimentos, pode resultar, em casos mais extremos, na identificação de uma escala Cromática. Figura 18 – Ponteio nº 9, total cromático melódico no em um frag