UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação Programa de Pós Graduação em Design METODOLOGIA DE CURVATURA DE BAMBU LAMINADO COLADO (BLAC) PARA FABRICAÇÃO DE MOBILIÁRIO – DIRETRIZES PARA O DESIGN Bruno Perazzelli Farias Ramos Bauru - 2014 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação Programa de Pós Graduação em Design METODOLOGIA DE CURVATURA DE BAMBU LAMINADO COLADO (BLAC) PARA FABRICAÇÃO DE MOBILIÁRIO – DIRETRIZES PARA O DESIGN Bruno Perazzelli Farias Ramos Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Design, no Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, linha de pesquisa de Planejamento de Produto, sob a orientação do Prof. Dr. Marco Antonio dos Reis Pereira. Bauru - 2014 Ramos, Bruno Perazzelli Farias. Metodologia de curvatura de bambu laminado colado (BLaC) para fabricação de mobiliário – diretrizes para o design / Bruno Perazzelli Farias Ramos, 2014 114 f. : il. Orientador: Marco Antonio dos Reis Pereira Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, Bauru, 2014 1. Design. 2. Bambu laminado colado curvo. 3. Moldes. 4. Diretrizes metodológicas. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação. II. Título. Banca Examinadora Prof. Dr. Marco Antonio dos Reis Pereira Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Orientador Prof. Dr. Antonio Ludovico Beraldo Universidade Estadual de Campinas Prof. Dr. José Carlos Plácido da Silva Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Prof. Dr. Ivaldo De Domenico Valarelli Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Prof. Dr. Tomas Queiroz Ferreira Barata Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Dedico esta dissertação à minha mãe, Odete. Agradecimentos À minha família, pelo apoio e incentivo constantes. Aos professores membros da banca examinadora. Ao Prof. Dr. Milton Nakata, pela experiência compartilhada durante o estágio docente. Aos professores do Programa de Pós Gradução em Design – FAAC - UNESP. À CAPES e ao PPGDesign, pela bolsa de pesquisa. À J.R.Pengo, pela doação do adesivo de Poliuretano de Óleo de Mamona. Aos colegas do mestrado, em especial ao Flávio, pelos trabalhos e amizade desenvolvida. Agradeço principalmente ao meu orientador o Prof. Dr. Marco Pereira, pela confiança em mim depositada, desde a graduação, e por me guiar durante todos estes anos. A todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para o desenvolvimento desta dissertação e a realização da minha pós-graduação. Resumo Com a crescente escassez da oferta de madeira e a busca constante pela criação de produtos ecologicamente corretos, o bambu vem atraindo cada vez mais atenção como matéria-prima renovável para o desenvolvimento de mobiliário. Sendo um material amplamente explorado em países orientais, onde apresenta uma ampla gama de usos, é ainda pouco conhecido e utilizado em nosso meio, necessitando de mais estudos para seu desenvolvimento adequado. Para a confecção de mobiliário em Bambu Laminado Colado (BLaC) observa-se a necessidade da produção de peças curvas que possam contribuir com novas possibilidades de criação na área, porém, a literatura pouco informa sobre métodos utilizados para sua confecção e utilização de moldes para este fim. Esta pesquisa tem por objetivo desenvolver uma metodologia adequada para o processo de curvatura de peças de BLaC através da utilização de moldes aquecidos. Para tal, primeiramente foi realizada uma revisão bibliográfica a cerca dos temas design, sustentabilidade, bambu e técnicas de curvatura de bambu laminado e também de madeira laminada, já que as informações sobre o curvatura de BLaC são muito escassas e a madeira laminada é o material mais próximo que pode ser usado como referência. Após a revisão bibliográfica, foi realizada a colheita do bambu, processamento dos colmos e laminação, também foram confeccionados moldes do tipo macho-fêmea, e um sistema de aquecimento elétrico para os moldes. Experimentos de colagem e prensagem de peças de BLaC curvo foram realizados e as peças geradas foram analisadas através de gabaritos comparativos com o intuito de verificar a consistência dos resultados obtidos, a variação do retorno elástico (springback) ocorrido nas peças e a eficiência do método utilizado. Ao final do processo, definiu-se diretrizes metodológicas que permitem o desenvolvimento tecnológico da geração de peças curvas em BLaC e ampliam as possibilidades da utilização do bambu como material para a confecção de mobiliário. Palavras-chave: design, bambu laminado colado curvo, moldes, diretrizes metodológicas Abstract With the growing shortage of wood supply and the constant research to create environmentally friendly products, bamboo has been attracting increasing attention as a renewable raw material for the development of furniture. Being a material widely exploited in Eastern countries, where it presents a wide range of uses, it is still unfamiliar and rarely used in our country, requiring further studies for their proper development. For the manufacture of furniture with Glued Laminated Bamboo (GLB) it is noticed the necessity of producing curved pieces that can contribute with new possibilities in the area, however, there is few literature about methods of making and using molds for this end. This research aims to develop a suitable methodology for the process of bending GLB pieces using heated molds. To this end, first of all, a literature review was conducted about design issues, sustainability, bamboo, bamboo bending techniques and also laminate wood bending, since the information about the GLB bending are very scarce and laminated wood is the most similar material that can be used as reference. After the literature review, the harvesting of bamboo, the processing of the bamboo culms and the lamination, molds of the male-female type were made and an electric heating system for the molds was also developed. Experiments of gluing and pressing of the pieces of bended GLB were made and the pieces produced were analyzed by comparative templates with the objective of verifying the consistency of the results obtained, the variation of springback that occurred in the GLB pieces and the efficiency of the method used. At the end of the process, methodological guidelines were defined, that allows the technological development of the generation of curved pieces of GLB and extends the possibilities of the use of bamboo as a material for furniture making. Keywords: design, glued laminated bamboo bending, molds, methodological guidelines Lista de Figuras Figura 1. Ciclo de vida do produto.........................................................................................................................22 Figura 2. Estratégias de Life Cycle Design e fases do ciclo de vida........................................................................23 Figura 3. Distribuição natural de bambu pelos continentes..................................................................................27 Figura 4. Múltiplos usos das diferentes partes do bambu.....................................................................................28 Figura 5. Uso dos colmos do bambu segundo sua idade.......................................................................................29 Figura 6. Mapa com o potencial de riqueza de espécies de bambu da tribo Bambuseae nas Américas...............32 Figura 7. Estrutura básica do bambu.....................................................................................................................33 Figura 8. Estrutura dos bambus do tipo paquimorfo e leptomorfo.......................................................................34 Figura 9. Morfologia do nó e diferentes espessuras de paredes...........................................................................34 Figura 10. Distribuição anatômica das fibras do bambu........................................................................................35 Figuras 11 a 13. Guadua angustifolia.....................................................................................................................38 Figuras 14 a 16. Phyllostachys pubescens..............................................................................................................39 Figuras 17 a 19. Dendrocalamus giganteus...........................................................................................................40 Figuras 20 a 22. Dendrocalamus latiflorus.............................................................................................................41 Figuras 23 a 25. Dendrocalamus asper..................................................................................................................42 Figura 26. Obtenção do folheado de bambu por rotação e por corte...................................................................46 Figura 27. Etapas do processamento do bambu....................................................................................................46 Figura 28. Tipos de colagem plana de BLaC...........................................................................................................47 Figura 29. Amostra de um assento de BLaC curvo feito com folheado de bambu................................................49 Figura 30. Protótipo de cadeira de Tejo Remy e René Veenhuizen.......................................................................49 Figura 31. Lâminas sendo prensadas, após colagem.............................................................................................50 Figura 32. Móveis em BLaC desenvolvidos por Paulo Foggiato para a empresa Oré Brasil...................................50 Figura 33. Curvatura das ripas de bambu e o banco finalizado.............................................................................51 Figura 34. Confecção do protótipo e o modelo finalizado.....................................................................................52 Figura 35. Moldes aquecidos e mobiliário finalizado.............................................................................................52 Figura 36. Conjunto de móveis feitos por Thonet entre 1830 e 1840...................................................................55 Figura 37. Poltronas CIMO, 1940...........................................................................................................................56 Figura 38. Sofá CIMO, década de 1940..................................................................................................................56 Figura 39. Cadeira Paimio, Modelo Nº41 (1930–1931), e Cadeira de braços, Modelo Nº31 (1932).....................57 Figura 40. Chaise-longue Nº 43 (1936)................................................................................................................57 Figura 41. Cadeira de braços para a Isokon Furniture Company, 1936..................................................................58 Figura 42. Cadeira LCW, 1946................................................................................................................................59 Figura 43. Cadeira Nº 670 e otomana Nº 671, 1956.............................................................................................59 Figura 44. Cadeira Grasshopper e otomana, 1946................................................................................................60 Figura 45. Cadeira Eva e chaise-longue Pernilla, 1934........................................................................................60 Figura 46. Ilustração das linhas de compressão, estiramento e o eixo neutro de peças de madeira curvadas....62 Figura 47. Testes de espessura da lâmina para uma determinada circunferência................................................63 Figura 48. Moldes do tipo macho, fêmea e macho-fêmea....................................................................................66 Figura 49. Processo de prensagem com molde macho-fêmea..............................................................................66 Figura 50. Ilustração do molde macho-fêmea com a direção da pressão aplicada no laminado..........................67 Figura 51. Figura do molde macho-fêmea segmentado........................................................................................67 Figura 52. Moto-serra............................................................................................................................................72 Figura 53. Serra circular destopadeira...................................................................................................................72 Figura 54. Serra circular refiladeira dupla..............................................................................................................73 Figura 55. Serra circular de bancada......................................................................................................................73 Figura 56. Plaina duas faces (própria para bambu)...............................................................................................73 Figura 57. Tanque..................................................................................................................................................74 Figura 58. Esquadrejadeira de Bancada.................................................................................................................74 Figura 59. Serra de Fita..........................................................................................................................................74 Figura 60. Furadeira e parafusadeira.....................................................................................................................75 Figura 61. Grampos e sargentos barra T................................................................................................................75 Figura 62. Paquímetro...........................................................................................................................................75 Figura 63. Termômetro Digital...............................................................................................................................76 Figura 64. Balança de precisão..............................................................................................................................76 Figura 65. Medidor de umidade de madeira.........................................................................................................76 Figura 66. Dimmer.................................................................................................................................................77 Figura 67. Torquímetro..........................................................................................................................................77 Figura 68. Equipamentos diversos.........................................................................................................................77 Figura 69. Moita de bambu gigante e detalhe da marcação das idades dos colmos.............................................78 Figura 70. Colheita do colmo e retirada dos ramos laterais..................................................................................78 Figura 71. Corte da seção do colmo em serra circular destopadeira.....................................................................79 Figura 72. Colmos cortados nas medidas necessárias...........................................................................................80 Figura 73. Colmos sendo refilados.........................................................................................................................80 Figura 74. Colmo após o refilamento...................................................................................................................80 Figura 75. Produto octaborato de sódio e tanque de tratamento por imersão....................................................81 Figura 76. Ripas separadas manualmente.............................................................................................................82 Figura 77. Detalhes de duas ripas antes e depois da retirada dos nós e diafragmas............................................82 Figura 78. Desenho técnico com as medidas dos moldes de 180° de abertura.....................................................83 Figura 79. Desenho técnico com as medidas dos moldes de 90° de abertura.......................................................84 Figura 80. Chapas de compensado e OSB............................................................................................................84 Figura 81. Confecção dos moldes..........................................................................................................................85 Figura 82. Prensagem dos moldes.........................................................................................................................85 Figura 83. Confecção dos moldes macho-fêmea ..................................................................................................86 Figura 84. Peças para fixar as duas partes do molde e o molde sendo testado....................................................86 Figura 85. Detalhe da separação entre as duas partes do molde..........................................................................87 Figura 86. Moldes com abertura de 90° finalizados..............................................................................................87 Figura 87. Moldes com abertura de 180° finalizados............................................................................................88 Figura 88. Resistência elétrica e fita adesiva de teflon..........................................................................................88 Figura 89. Plaina duas faces própria para bambu..................................................................................................89 Figura 90. Lâminas finalizadas...............................................................................................................................90 Figura 91. Teste manual da espessura das ripas....................................................................................................90 Figura 92. Itens para preparação do adesivo de óleo de mamona........................................................................91 Figura 93. Itens para preparação do adesivo de UF...............................................................................................91 Figura 94. Medição da umidade das lâminas.........................................................................................................92 Figura 95. Materiais para aplicação dos adesivos..................................................................................................92 Figura 96. Aplicação do adesivo nas lâminas.........................................................................................................93 Figura 97. Modo que deve ser evitado ao se dispor as lâminas para colagem......................................................93 Figura 98. Modo recomendado de se dispor os nós das lâminas..........................................................................94 Figura 99. Lâminas dispostas no molde.................................................................................................................94 Figura 100. Torquímetro sendo utilizado e detalhe do ajuste para o torque de 30 Nm.......................................95 Figura 101. Medição da temperatura do molde....................................................................................................95 Figura 102. Delineamento da peça de BLaC em papel...........................................................................................96 Figura 103. Gabarito feito a partir da peça de BLaC..............................................................................................96 Figura 104. Gabarito comparativo para análise de springback............................................................................97 Figura 105. Gabarito comparativo de springback................................................................................................98 Figura 106. Detalhe com a medição da variação de springback de 1 mm.........................................................98 Figura 107. Tiras de alumínio cortadas nas medidas necessárias..........................................................................99 Figura 108. Confecção dos dentes e dobras das tiras de alumínio........................................................................99 Figura 109. Furação das tiras de alumínio para fixação nos moldes e parafuso de fixação................................100 Figura 110. Moldes de 180° de abertura finalizados...........................................................................................100 Figura 111. Moldes de 90° de abertura finalizados.............................................................................................101 Figura 112. Etapas da confecção do sistema de aquecimento............................................................................102 Figura 113. Terminais instalados.........................................................................................................................102 Figura 114. Molde finalizado com as fitas de aquecimento................................................................................103 Figura 115. Espessura final das lâminas utilizadas...............................................................................................103 Figura 116. Teste com lâmina contendo nó no centro da peça...........................................................................104 Figura 117. Peças obtidas com as prensagens em cada um dos moldes, para os dois tipos de adesivos...........105 Lista de Tabelas Tabela 1. Cronologia dos principais acontecimentos relacionados à questão ambiental.....................................18 Tabela 2. Espécies prioritárias e para uso local e comercial..................................................................................30 Tabela 3. Distribuição dos elementos anatômicos do bambu Dendrocalamus giganteus....................................35 Tabela 4. Principais características da espécie Guadua angustifolia.....................................................................38 Tabela 5. Principais características da espécie Phyllostachys pubescens..............................................................39 Tabela 6. Principais características da espécie Dendrocalamus giganteus............................................................40 Tabela 7. Principais características da espécie Dendrocalamus latiflorus.............................................................41 Tabela 8. Principais características da espécie Dendrocalamus asper...................................................................42 Tabela 9. Principais propriedades dos adesivos e seus usos típicos......................................................................68 Tabela 10. Comparativo de área, produtividade e produção de mamona no Brasil.............................................69 Tabela 11. Equipamentos utilizados na pesquisa..................................................................................................72 Tabela 12. Espessuras das ripas para cada medida de raio.................................................................................103 Tabela 13. Fatores constantes.............................................................................................................................104 Tabela 14. Fatores variáveis.................................................................................................................................104 Tabela 15. Variação dos gabaritos comparativos para análise de springback com o adesivo PU.....................105 Tabela 16. Variação dos gabaritos comparativos para análise de springback com o adesivo UF......................106 Lista de Abreviaturas BLaC - Bambu Laminado Colado CCB - Borato de Cobre Cromatado CMMAD - Comissão Mundial sobre Meio Ambiente. CNUDS - Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável DfA - Design for Assembly DfD - Design for Disassembly DfE - Design for Environment INBAR - International Network for Bamboo and Rattan IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change. LCD - Life Cycle Design MDF - Medium Density Fiber MDI - Difenilmetano Diisocianato MLC - Madeira Laminada Colada NWFP - Non-Wood Forest Products ONU - Organização das Nações Unidas ORPAL - Oficina Regional para América Latina OSB - Oriented Strand Board PNF - Programa Nacional de Florestas PNMCB - Política Nacional de Incentivo ao Manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente PU - Poliuretano PVA - Acetato de Polivinila SBS - Sociedade Brasileira de Silvicultura SWB - Strand Woven Bamboo UF – Ureia-Formaldeído UNCED - United Nations Conference on Environment and Development UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE ABREVIATURAS 1. INTRODUÇÃO..........................................................................................................................14 1.1. OBJETIVOS................................................................................................................15 1.1.1. GERAIS.........................................................................................................15 1.1.2. ESPECÍFICOS................................................................................................15 1.2. JUSTIFICATIVAS........................................................................................................15 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA........................................................................................................17 2.1. SUSTENTABILIDADE.................................................................................................17 2.2. DESIGN E SUSTENTABILIDADE.................................................................................19 2.3. BAMBU....................................................................................................................24 2.3.1. Características Gerais...............................................................................32 2.3.2. Tratamentos Preservativos......................................................................36 2.3.3. Espécies Utilizadas no BLaC.....................................................................37 2.3.4. Bambu Industrializado.............................................................................43 2.3.5. Bambu Laminado Colado.........................................................................45 2.3.6. Incentivo ao uso do bambu no Brasil......................................................53 2.4. MADEIRA LAMINADA COLADA...............................................................................53 2.4.1. Curvatura de MLC....................................................................................61 2.4.2. Moldes.....................................................................................................65 2.4.3. Adesivos...................................................................................................68 3. MATERIAIS E MÉTODOS.........................................................................................................72 3.1. MATERIAIS...............................................................................................................72 3.1.1. Bambu Laminado Colado.........................................................................72 3.1.2. Moldes.....................................................................................................72 3.1.3. Equipamentos..........................................................................................72 3.2. PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS.........................................................................77 3.2.1. Colheita....................................................................................................78 3.2.2. Processamento........................................................................................79 3.2.3. Moldes.....................................................................................................83 3.2.4. Sistema de aquecimento.........................................................................88 3.2.5. Laminação...............................................................................................89 3.2.6. Espessuras das lâminas de bambu..........................................................90 3.2.7. Colagem e Prensagem.............................................................................90 4. RESULTADOS...........................................................................................................................99 4.1. MOLDES...................................................................................................................99 4.2. SISTEMA DE AQUECIMENTO..................................................................................101 4.3. ESPESSURAS DAS LÂMINAS DE BAMBU.................................................................103 4.4. COLAGEM E PRENSAGEM......................................................................................104 5. CONCLUSÕES E DISCUSSÕES..............................................................................................107 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................................109 GLOSSÁRIO..........................................................................................................................................114 ANEXOS 14 1. INTRODUÇÃO Desde o início do ofício de designer, décadas já se passaram, assim como muito da profissão mudou, evoluiu e teve sua importância ampliada. Hoje, além do designer ser responsável por desenhar belos artefatos, inovadores e funcionais, teve acrescido à sua função grandes responsabilidades para com o mundo e as pessoas que aqui vivem, graças, principalmente, a um conceito muito discutido e difundido hoje em dia: a sustentabilidade. A sustentabilidade é um conjunto de atitudes que busca transformar o modo de vida das pessoas, e consequentemente a sociedade, para que se possa viver de forma mais harmoniosa com o nosso planeta, preservando e respeitando tudo que nele reside, almejando um equilíbrio que se sustente pelas gerações futuras. O design tornou-se um campo extremamente fértil para a difusão desse conceito, pois os profissionais desta área projetam todos os artefatos que se utiliza e se descarta diariamente, afetando diretamente o estilo de vida da população e o meio ambiente. Esta união do design com a sustentabilidade se apresenta por diversos nomes: Ecodesign, Design para a Sustentabilidade, Design Ecológico, Design Sustentável, etc., mas independentemente do nome, o conceito permanece, e o designer tem a responsabilidade de trabalhar com ele, pensando em todo o ciclo de vida dos produtos, as ideias que estão associadas a estes produtos e as mensagens que eles transmitem. Uma matéria-prima considerada sustentável e que pode acrescentar muito ao design sustentável é o bambu. Pertencente a família das gramíneas, esta planta sempre acompanhou o ser humano durante sua evolução, servindo para inúmeros fins, desde alimentação e habitação até geração de energia e recuperação de áreas degradadas. Encontrado principalmente nas regiões tropicais e subtropicais do planeta o bambu é largamente usado em países orientais, com destaque para a China, e além da sua utilização em plantações, na área ambiental, e na confecção de produtos com sua forma in natura, o uso do bambu industrializado, ou processado, também é possível. Teoricamente, qualquer produto que possa ser feito de madeira pode também ser confeccionado com o bambu processado, utilizando-se materiais como as chapas de aglomerado, compensado, Medium Density Fiber (MDF), Oriented Strand Board (OSB), compósitos de bambu e outros materiais, Strand Woven Bamboo (SWB) e o Bambu Laminado Colado (BLaC). O BLaC é um material de beleza ímpar e com características físico-mecânicas excelentes, mas somente nos últimos anos tem sido encontrado no Brasil devido à importação de produtos chineses, principalmente pisos e utensílios domésticos, e pela iniciativa de algumas poucas empresas brasileiras. Assim como o fato do BLaC ser pouco explorado comercialmente em nosso país, pesquisas e estudos relacionados ao mesmo também são pouco encontradas, o que demonstra a necessidade de se estudar esse material, analisar suas características e explorar suas potencialidades. Um derivado do bambu que tem grande potencial, porém ainda é pouquíssimo explorado em nosso país é o BLaC curvo. Composto por lâminas de bambu coladas paralelamente e deformadas pela ação de moldes, o BLaC curvo pode ser um substituto da madeira, ou até de outros materiais, na confecção de mobiliário, além de agregar valor e alterar a imagem comum que se tem dos móveis de bambu, geralmente feitos a partir de bambu in natura. Porém, devido à escassez de informações 15 sobre os métodos utilizados para curvar o BLaC, se faz necessário o desenvolvimento de uma metodologia para sua fabricação. Pesquisando as técnicas usadas para curvar a madeira laminada, material similar ao bambu laminado, e sua evolução através dos tempos, pode-se captar os principais pontos desta tecnologia e adaptá-la ao bambu laminado, criando assim, um ponto de partida para os estudos na área. Com o intuito de contribuir com os estudos acerca bambu e suas aplicações como material para uso em mobiliário, esta pesquisa apresenta uma coletânea de informações sobre os temas sustentabilidade, bambu, bambu processado e curvatura de laminados, para com essas informações, desenvolver uma metodologia a cerca do processo de curvatura do bambu laminado colado. Para a etapa dos procedimentos experimentais, foram utilizados bambus da espécie Dendrocalamus giganteus, moldes do tipo macho-fêmea, com sistema de aquecimento elétrico e em dez configurações distintas de raios e ângulos de abertura, além de dois adesivos, sendo um o ureia- formaldeído e o outro o poliuretano à base de óleo de mamona. A colagem e prensagem das peças de BLaC foi dirigida com base em fatores constantes, como a temperatura, umidade das ripas, tempo e torque, e fatores variáveis, como os raios e ângulos de abertura dos moldes, a espessura e o número de ripas por colagem. Os dados coletados com as colagens do BLaC curvo foram reunidos e analisados para verificar a consistência dos resultados obtidos e a eficiência do método utilizado, definindo assim, diretrizes básicas que permitem o desenvolvimento tecnológico da geração de peças curvas em BLaC e ampliam as possibilidades da utilização do bambu como material para a confecção de mobiliário. 1.1. OBJETIVOS 1.1.1 Gerais Esta pesquisa tem por objetivo geral desenvolver uma metodologia para o processo de curvatura de peças de Bambu Laminado Colado, através da utilização de moldes aquecidos eletricamente, com foco na confecção de mobiliário em escala industrial. 1.1.2. Específicos 1. Realizar uma revisão bibliográfica sobre sustentabilidade, design sustentável, curvatura de bambu laminado e de madeira laminada; 2. Processar bambu para laminação; 3. Confeccionar moldes aquecidos para curvatura do BLaC; 4. Definir a espessura ideal das lâminas para curvatura; 5. Confeccionar peças curvas de BLaC a partir dos moldes; 6. Analisar a consistência os resultados obtidos com as prensagens. 1.2. JUSTIFICATIVAS Nas últimas décadas, e cada vez mais, a busca pela sustentabilidade tem instigado a pesquisa nas mais diversas áreas do conhecimento em prol do desenvolvimento de soluções mais sustentáveis para os atuais processos produtivos e ciclo de vida dos produtos, e o Designer, elemento 16 determinante no desenvolvimento destes produtos e processos, tem função vital como agente consciente e transformador tanto do meio em que se vive quanto da cultura que é perpetuada. Dentre os diversos pontos de atuação do Designer no processo produtivo, têm-se a busca por materiais alternativos como um fator primordial a ser pensado, e a pesquisa por novos processos produtivos como o catalizador da ação que culmina no desenvolvimento de produtos. São nestes dois pontos que esta pesquisa foca, pesquisando a matéria-prima bambu como material alternativo e o desenvolvimento de uma metodologia de curvatura do laminado de bambu colado como possível processo produtivo a ser utilizado para fabricação de móveis com BLaC curvo. A escolha do bambu se deu pelo fato desta planta apresentar grande potencial como matéria-prima para produtos industriais, e por ser uma excelente aliada rumo à sustentabilidade, principalmente à medida que o plantio do bambu e a sua utilização em substituição à madeira, mesmo que seja de reflorestamento, pode evitar o corte de novas árvores e assim diminuir a pressão exercida sobre as florestas principalmente nativas. Além dos fatores citados, tem-se na escassez de trabalhos científicos e de literatura específica sobre curvatura de BLaC, a principal justificativa para a realização desta pesquisa, cujos resultados visam contribuir com o desenvolvimento científico e tecnológico da aplicação bambu no Brasil. 17 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Este capítulo contém uma revisão bibliográfica sobre os temas que envolvem esta pesquisa. Primeiramente é abordado o termo sustentabilidade, seu surgimento e evolução, sua relação com o design e diversas manifestações, assim como as ferramentas que são utilizadas para seu desenvolvimento. Em seguida é apresentada a planta bambu, suas principais características, aplicações industriais, com ênfase ao Bambu Laminado Colado e sua curvatura, assim como alguns incentivos governamentais para seu estudo, cultivo e exploração. A última parte trata da madeira laminada, seus métodos de curvatura, os tipos de moldes e adesivos utilizados e sua aplicação na confecção de mobiliário. 2.1. SUSTENTABILIDADE Apesar de as preocupações com o impacto ecológico negativo causado pelo industrialismo haverem sido noticiadas já no século 19, foi somente ao final da década de 1960 que o movimento ambientalista começou a tomar as feições que hoje apresenta (CARDOSO, 2008). A palavra impacto, em português, tem o significado de choque ou colisão (BRANCO, 1988); portanto, o impacto ambiental é uma espécie de “trauma ecológico” que se segue ao choque causado por uma ação ou obra humana em desarmonia com as características e o equilíbrio do meio ambiente. Segundo Van der Lugt (2008), devido ao crescimento da população humana em todo o planeta, combinado com um aumento do consumo per capita, mais e mais pressão é colocada sobre os recursos globais, causando os três problemas ambientais inter-relacionados: esgotamento dos recursos naturais, deterioração dos ecossistemas e a deterioração da saúde humana, e todos os seus efeitos. Considerando-se tais fatos, torna-se necessário rever os conceitos de crescimento e desenvolvimento, a partir dos problemas ambientais que deles resultam. Tal revisão teve início na década de 1960, e assumiu uma escala global principalmente com a publicação de The Limits to Growth, de D.H. Meadows, D. L. Meadows, J. Randers e W. W. Behrens, em 1972. Porém, foi somente na década de 1990 que realmente se estabeleceu uma ligação estreita entre a temática ambiental e a produção industrial, dando seguimento às discussões de caráter político e normativo ocorridas nos anos oitenta (BARBERO; COZZO, 2009). Reubens (2010) informa que o conceito de desenvolvimento sustentável, como é conhecido, foi apresentado para o público mundial em 1987 pela United Nations World Commission on Environment and Development, em seu relatório denominado Our Common Future, onde se encontra a definição sintetizada mais conhecida do que seria o desenvolvimento sustentável: “O desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de atenderem às suas necessidades”. A palavra sustentabilidade foi usada primeiramente pelos silvicultores europeus no final do século XVIII, e isso provavelmente explica suas fortes raízes de conotação ambiental (REUBENS, 2010). Na época, as florestas estavam sendo devastadas para prover toda a madeira necessária como combustível para o desenvolvimento econômico europeu. Os silvicultores logo perceberam que as árvores não cresciam rápido o suficiente para igualar a velocidade com a qual eram cortadas, e para lidar com esse desmatamento foram desenvolvidas florestas científicas, ou sustentáveis. Simplificando, árvores suficientes seriam plantadas para repor as que eram cortadas, e a taxa de crescimento da floresta seria monitorada cientificamente para garantir tal reposição. 18 Segundo Vilela Junior e Demajorovic (2006), a era industrial exigiu uma forma de produção em massa que desestabilizou a estrutura tradicional de produção, passando a necessitar de quantidades cada vez maiores de recursos naturais, ocasionando o aumento de emissões e resíduos tóxicos, além de causar uma concentração populacional nos centros produtivos devido a migração da população rural. Os autores também informam que anteriormente aos anos 1970 não havia qualquer tipo de controle ambiental, e os poluentes gerados pelas indústrias eram eliminados diretamente no meio ambiente sem maiores restrições. Os primeiros órgãos a controlar o descarte de poluentes industriais foram estruturados no início da década de 70, assim como legislações ambientais foram organizadas e se iniciaram as atividades de monitoramento, licenciamento e fiscalização das indústrias. Com a crise ambiental provocada pela sociedade pós-moderna, a partir de meados do século XX se iniciam movimentos, como conferências internacionais e estudos, dedicados a buscar de forma efetiva, métodos para promover o desenvolvimento e, ao mesmo tempo, preservar o meio ambiente (ARRUDA, 2009). A Tabela 1 apresenta os principais acontecimentos internacionais, dos anos 60 até atualmente, que discutem a questão ambiental. Tabela 1. Cronologia dos principais acontecimentos relacionados à questão ambiental. Acontecimento Anos 60 1962 - Publicação de Primavera Silenciosa, por Rachel Carlson 1965 - Utilizada a expressão Educação Ambiental (Environmental Education) na Conferência de Educação da Universidade de Keele, Grã-Bretanha. 1968 - Fundação do Clube de Roma. Anos 70 1972 - Publicação do Relatório Os Limites do Crescimento – Clube de Roma. 1972 - Conferência de Estocolmo – Discussão sobre o desenvolvimento e o meio ambiente, conceito de ecodesenvolvimento. 1972 - Recomendação 96 – Educação e Meio Ambiente. 1973 - Registro Mundial de Programas em Educação Ambiental, EUA. 1974 - Seminário de Educação Ambiental em Jammi, Finlândia – Educação ambiental é reconhecida como educação integral e permanente. 1977 - Congresso de Educação Ambiental – Brazzaville, África – Reconhece a pobreza como maior problema ambiental. 1978 - Surge a certificação ambiental por iniciativa da Alemanha. Anos 80 1983 - Criada a CMMAD – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente. 1987 - Divulgação do relatório da CMMAD – Nosso Futuro Comum (Relatório Brundtland) e divulgação do conceito desenvolvimento sustentável. 1987 - Congresso Internacional da UNESCO/PNUMA sobre Educação e Formação Ambiental – Moscou – Reafirma os princípios de Educação Ambiental e assinala a importância e necessidade de pesquisa e da formação em Educação Ambiental. 1988 - Declaração de Caracas – ORPAL/PNUMA – sobre Gestão Ambiental na América – denuncia a necessidade de mudar o modelo de desenvolvimento. 1989 - Declaração de Haia, preparatório da Rio-92 – aponta a importância da cooperação internacional nas questões ambientais. Anos 90 1990 - Conferência Mundial sobre Ensino para Todos – Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem, Jomtien, Tailândia – destaca o conceito de analfabetismo ambiental. 1990 - ONU declara o ano 1990 como o Ano Internacional do Meio Ambiente. 1990 - Reuniões preparatórias para a Rio 92. 1992 - Conferência sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, UNCED, Rio 92/ ECO92 – criação da Agenda 21 – Tratado Ambiental para Sociedades Sustentáveis. 1992 - Carta Brasileira de Educação Ambiental. 1992 - Congresso Sul-Americano, Argentina – continuidade Rio 92. 1992 - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Bali. 1993 - Conferência dos Direitos Humanos, Viena. Conferência Mundial de População, Cairo. 1994 – 1º Congresso Brasileiro de Educação Ambiental. 19 1994 - Conferência para o Desenvolvimento Social, Copenhague – criação de um ambiente econômico, político, social, cultural e jurídico que permita o desenvolvimento social. 1996 - Editada a norma ISO 14000, que trata do sistema de gestão ambiental para as empresas. Editada a norma ISO 14040 que trata da Avaliação do Ciclo de Vida do produto. 1997 - Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade: Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade, Thessaloniki, Grécia. 1997 - Protocolo de Kyoto. Este documento define metas para a redução da emissão de gases de efeito estufa, estabelece um sistema de comércio das emissões para os países desenvolvidos e mecanismos de desenvolvimento “limpo” para os países em desenvolvimento. Anos 2000 2002 - Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável Johanesburgo, 2002 onde foi elaborado um Plano de Implementação. Também chamada de Rio+10 teve como objetivo central analisar e avaliar os possíveis avanços ocorridos nos compromissos firmados durante a Rio 92. 2005 - O Tratado de Kyoto entra em vigor oficialmente - institui compromissos mais rígidos para a redução da emissão dos gases de efeito estufa para os países industrializados. 2007 - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Bali. 2007 - Al Gore (ex-vice-presidente dos EUA) escreveu “An Inconvenient Truth”. O livro foi baseado em relatórios científicos incluindo os apresentados pelo IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change. 2012 - A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), a Rio+20, realizada na cidade do Rio de Janeiro, veio com o propósito de reafirmar as políticas de compromisso com o Desenvolvimento Sustentável, com o documento: “O futuro que queremos”. Fonte: Adaptado de Arruda (2009) O século XX foi marcado por uma demanda crescente de produtos e serviços, o que exigiu a extração rápida e desordenada dos recursos naturais mundiais aumentando, assim, a formação e liberação de resíduos nocivos na água, no solo e no ar. Porém, com o passar dos anos, a sociedade tornou-se cada vez mais consciente dos problemas ambientais, o que se manifestou através de grupos de interesse público, como organizações não governamentais, e a implementação de leis e diretivas comunitárias (PLATCHECK, 2012). Peltier e Saporta (2009) afirmam que a opinião pública já está habituada à ideia de que as atividades humanas entram em conflito direto com a preservação do meio ambiente, e um grande número de pessoas acredita que se tornou necessário modificar o nível de atividade e os hábitos a fim de conter a deterioração do meio ambiente. Os indivíduos pessimistas vão mais longe, prevendo perigo para todas as formas de vida na Terra, caso se continue a agir da maneira que se tem agido, enquanto os moderados estão de acordo com uma filosofia de desenvolvimento sustentável, que asseguraria ao mesmo tempo, prosperidade econômica, proteção sem risco ambiental e respeito pelo ser humano. Apesar das opiniões divergentes por parte das pessoas, fica claro que a tomada de consciência dos problemas ambientais é cada vez maior, e a vontade de encontrar soluções imediatas, tanto num caso como no outro, é absolutamente real. Se para inúmeras pessoas, preservar o meio ambiente tornou-se uma necessidade, agir para preservá-lo deve ser uma atitude sincera e eficaz. A finalidade de uma abordagem sustentável não é apresentar-se da noite para o dia como o ente mais respeitoso do planeta, mas agir concretamente, minimizando sensivelmente o impacto negativo que se possa causar ao meio ambiente (PELTIER; SAPORTA, 2009). 2.2. DESIGN E SUSTENTABILIDADE O conceito de desenvolvimento sustentável remete a um legado permanente de uma geração para a outra, para que todas sejam capazes de prover suas necessidades. Neste contexto, a sustentabilidade passa então a incorporar o significado de manutenção e conservação ad aeternum dos recursos naturais, o que demanda desenvolvimento tecnológico e científico, para que seja 20 possível utilizar, recuperar e conservar esses recursos, e consequentemente, aliviar as pressões que são exercidas sobre os mesmos (BARBIERI, 1997). A ecologia e o equilíbrio ambiental são os esteios básicos de toda a vida humana na Terra, e não pode haver vida nem cultura humanas sem eles. Segundo Papanek (1995), o design ocupa-se com o desenvolvimento de produtos, utensílios, máquinas, artefatos e outros dispositivos, e esta atividade exerce influência profunda e direta sobre a ecologia. Portanto, a ação do design deve ser positiva e unificadora, no sentido de tornar-se uma ponte entre as necessidades humanas, a cultura e a ecologia. Em se tratando da função do designer e sua importância, Bonsiepe (2011) escreve que cabe ao designer intervir na realidade com projetos que busquem superar as dificuldades e não se contentar apenas com uma postura crítica frente à realidade, mas persistir nessa posição. Já Papanek (1992) afirma que o design constitui a ferramenta mais poderosa dada ao homem com a qual se torna capaz de moldar os seus produtos, ambientes e, por extensão, a si mesmo. O designer deve analisar o passado, assim como as consequências de seus atos para o futuro, e isto é uma tarefa difícil, pois muitas vezes a carreira dos designers foi condicionada por uma orientação focada ao mercado e ao sistema de lucros. O autor ainda acrescenta que tanto a época como o lugar dão aos designers a certeza de que as técnicas e os talentos que colocam no trabalho permanecerão válidos no futuro. No entanto, é necessário ser extremamente cuidadoso com aquilo que é criado e por que é criado, pois as opções e as decisões no trabalho dos designers podem ter consequências ecológicas de longo alcance e a longo prazo. Cardoso (2008) escreve que a propagação mundial do modelo consumista americano depende do aumento contínuo da produção e do consumo. Porém, o mesmo excessivo consumo que mantem o sistema em funcionamento é responsável pelo agravamento constante dos problemas ambientais. O autor também afirma que o maior dilema para o designer na pós-modernidade talvez se encontre no fato de ele se encontrar justamente no ponto de encontro entre o mercado e o meio ambiente. Diversas profissões podem direcionar sua atenção para uma ou outra direção, sendo fácil para um economista aconselhar medidas para estimular o consumo, e ambientalista pregar a sua minimização, porém, a partir do momento em que se percebe que nem uma coisa nem a outra são tão simples assim, as pessoas acabam recorrendo ao designer para projetar soluções capazes de aproximar esses dois polos aparentemente incompatíveis. O tema do impacto ambiental entrou cedo para a pauta de discussões das organizações profissionais de designers. Devido seu relacionamento estreito com o processo produtivo industrial, os designers têm apresentado um elevado nível de consciência em relação a questões ecológicas, e as soluções desenvolvidas por esses profissionais demonstra disposição para acompanhar as rápidas mudanças da área, além de abertura constante para o novo e flexibilidade em termos de metodologia de projeto (CARDOSO, 2008). As reflexões sobre a ecologia, na área do design, remontam ao início da década de 1970, mas durante muitos anos foram alvo de intensas críticas. Somente a partir da década de 1980, diante da rápida propagação da poluição ambiental global, as reivindicações do design ecológico começaram a ter maior aceitação. O design ecológico concentra-se, sobretudo, na sustentabilidade ambiental de seus produtos, tendo suas intenções voltadas para um processo produtivo que poupe energia, apresente as menores emissões tóxicas possíveis e utilize materiais que não agridam o meio ambiente (SCHNEIDER, 2010). 21 Um dos primeiros termos que vieram a denominar a fusão entre design e a busca pela sustentabilidade ambiental, foi o Ecodesign. Segundo Manzini e Vezzoli (2011), a palavra Ecodesign é dotada de uma boa capacidade autoexplicativa, pois seu significado geral sobressai de maneira imediata dos dois termos que a compõe: Ecodesign é um modelo projetual, ou de design, orientado por critérios ecológicos. Portanto, o termo apresenta-se como uma síntese de um vasto conjunto de atividades projetuais que tendem a considerar a questão ambiental a partir do redesenho dos próprios produtos. A partir da década de 1990 surgiram novas concepções de projetos, denominadas DfX (Design for X), onde o “X” representa o objetivo desse projeto, como, por exemplo, Design for Assembly (DfA), Design for Disassembly (DfD), Design for Environment (DfE), etc. O conceito de DfE é utilizado em vários setores e por diferentes nomes, como Ecodesign, Green Design, ou “design de fabricação ambientalmente consciente”, entre outros. Porém, esses diversos nomes podem ser considerados sinônimos, já que todos partem de um mesmo princípio, que é a inclusão das questões ambientais no projeto de novos produtos, processos ou serviços (VILELA JUNIOR; DEMAJOROVIC, 2006). Atualmente, existem inúmeros termos e definições para caracterizar a relação entre sustentabilidade e design, alguns tem uma abordagem mais específica, como no caso dos DfX, enquanto outros tentam abarcar de forma mais geral possível a rede de conexões que existe entre a busca pela sustentabilidade e o trabalho do designer. Entre as definições descritas por Kazazian (2005), Ferrão (2009), Peltier e Saporta (2009), Barbero e Cozzo (2009), Manzini e Vezzoli (2011) e Platcheck (2012), pode-se notar certa evolução em relação ao foco dado pelo Ecodesign, que iniciou olhando exclusivamente para o desenvolvimento ambientalmente consciente, partindo da responsabilidade ambiental, e que aos poucos foi abarcando novos fatores, em busca de um melhor equilíbrio entre os requisitos funcionais, econômicos e ambientais, sendo que o termo mais atual, Design para a Sustentabilidade, se apoia em um tripé entre o que é economicamente viável, a manutenção do meio ambiente e a responsabilidade social. Bonsiepe (2011) ressalta que a contradição mais forte à qual a atividade projetual está exposta encontra-se na distância entre o que é socialmente desejável, tecnicamente factível, ambientalmente recomendável, economicamente viável e culturalmente defensável. Porém, além de combinar todos estes fatores, para ser verdadeiramente reconhecido como tal, o design para sustentabilidade deve também considerar, durante a concepção de produtos e serviços, todas as condicionantes que os determinem por todo o seu ciclo de vida, isto é, através da metodologia definida pelo Life Cycle Design (LCD). Com o LCD entende-se, de fato, uma maneira de conceber o desenvolvimento de novos produtos tendo como objetivo que, durante todas as suas fases de projeto, sejam consideradas as possíveis implicações ambientais ligadas às fases do próprio ciclo de vida do produto buscando, assim, minimizar todos os efeitos negativos possíveis. Em se tratando das fases do ciclo de vida, Papanek (1995), Kazazian (2005) e Manzini e Vezzoli (2011) fornecem uma lista de etapas com pequenas variações entre os termos usados por cada um deles, assim como o acréscimo ou decréscimo de fases. Porém, as etapas descritas por Manzini e Vezzoli (2011) parecem ser as que melhor resumem o ciclo de vida, seguindo o seguinte esquema: pré-produção, produção, distribuição, uso e eliminação, conforme mostra a Figura 1. 22 Figura 1. Ciclo de vida do produto. Fonte: Manzini e Vezzoli (2011) A cada etapa do ciclo de vida de um produto, fluxos de entrada (matérias e energias) e de saída (resíduos, emissões líquidas e gasosas) produzem impactos negativos sobre o meio ambiente (poluições, resíduos, nocividades, etc.). Identificar esses impactos constitui o início a qualquer tipo prevenção e melhoria dos modos de concepção e de consumo dos bens (KAZAZIAN,2005). Porém, varia de forma muito ampla os fluxos de entrada e saída de todos os processos que acompanham os produtos durante seu ciclo de vida, ao ponto que não se pode efetivamente determiná-los na fase de projeto, assim como, nem tudo é conhecido já na fase de projeto, tornando- se difícil prever todas as condições do sistema em que está inserido, já que este está em constante evolução. Portanto, uma abordagem mais realista e eficaz baseada no Life Cycle Design deve considerar todas as fases com o objetivo de minimizar o impacto ambiental negativo, mas não é taxativamente necessário operar em todas as fases, seja no caso de um sistema-produto inteiramente controlado por quem projeta, seja no caso em que o controle é apenas parcial (MANZINI; VEZZOLI, 2011). Considerando-se o Life Cycle Design, as estratégias necessárias para se integrar os requisitos ambientais no desenvolvimento de produtos, conforme Manzini e Vezzoli (2011), são as seguintes: - Minimização dos recursos: reduzir o uso de materiais e de energia; - Escolha de recursos e processos de baixo impacto ambiental: selecionar os materiais, processos e as fontes energéticas de maior ecocompatibilidade; - Otimização da vida dos produtos: projetar artefatos que perdurem; - Extensão da vida dos materiais: projetar em função da reaplicação dos materiais descartados; - Facilidade de desmontagem: projetar em função da fácil separação das partes e dos materiais. 23 A Figura 2 apresenta um esquema com as estratégias de Life Cycle Design e as fases do ciclo de vida. Figura 2. Estratégias de Life Cycle Design e fases do ciclo de vida. Fonte: Manzini e Vezzoli (2011) A fase de pré-produção abarca um dos tópicos mais importantes relacionados ao conceito do Ecodesign, que é a escolha correta dos materiais que serão utilizados na fabricação do produto e também dos recursos naturais que serão consumidos ao longo da vida útil desse produto. Portanto, o projetista deve levar em consideração os seguintes pontos: evitar o uso de materiais escassos ou em risco de esgotamento, utilizar materiais biodegradáveis, mais leves, de fontes locais e renováveis (VILELA JUNIOR; DEMAJOROVIC, 2006). A escolha adequada dos materiais, tanto pelo designer como pelo fabricante, é crucial. A poluição atmosférica e a destruição da camada de ozônio processam-se desde a extração mineral, consumindo combustíveis e gastando recursos naturais que não podem ser renovados, até ao designer que opta por utilizar plásticos esponjosos para fabricar embalagens descartáveis para alimentos (PAPANEK, 1995). O designer tem papel relevante na escolha e aplicações dos materiais utilizados em produtos de fabricação em série, mesmo estando ciente de que não estará diretamente envolvido com a origem ou o fim destes materiais. Lawson (2011) ainda afirma que o projetista necessita conhecer a tecnologia que usa para atingir os seus fins, ou seja, eles não decidem apenas o que querem obter, mas também têm de saber como obtê-lo. Papanek (1995) ressalta que deveria haver uma ênfase maior na qualidade e durabilidade dos produtos, à medida que as pessoas como os designers compreendam que a obsolescência ou o 24 mau acabamento desperdiçam recursos naturais, e contribuem para a escassez em escala global. O autor também afirma que o estilo do futuro será baseado em produtos que serão mais atemporais do que as novidades, tendências e modas, que mudam rapidamente. É função do designer, mas não somente dele, pensar cada vez mais em termos de ciclo de vida dos artefatos projetados, gerando soluções que estimulem e aprimorem o uso de materiais não poluentes e de baixo consumo de energia, a eficiência de operação e facilidade de manutenção do produto, e o potencial de reutilização e reciclagem após o descarte (CARDOSO, 2008). A transição em direção à sustentabilidade será um grande e articulado processo de inovação social, cultural e tecnológica, no âmbito do qual haverá lugar para uma multiplicidade de opções (MANZINI; VEZZOLI, 2011). Dar sua contribuição à construção da relação que existe entre o homem e a natureza, é elementar dos projetos de design voltados para a sustentabilidade. Para Kazazian (2005), produzir sem destruir e projetar um objeto do cotidiano prolongando sua vida útil e tornando seu fim assimilável por outros processos de vida, deve ser a finalidade de uma reflexão global que considera a complexidade da relação entre homem e natureza. Design e criação consciente são essenciais para garantir que a sustentabilidade não acabe sendo somente uma moda passageira usada pelo marketing para vender mais produtos. É imperativo que designers e fabricantes de produtos sejam verdadeiros para com os objetivos pautados pela sustentabilidade, e levem em consideração toda a cadeia produtiva, desde a matéria-prima até os impactos do produto final, ou sistema, em nosso planeta. Já os consumidores precisam ter acesso a produtos melhores projetados e mais sustentáveis, para que assim, tenham a possibilidade de fazer uma escolha consciente no momento da compra (REUBENS, 2010). 2.3. BAMBU A crescente escassez dos recursos naturais, associada ao desenvolvimento de novas tecnologias, vem incentivando as pesquisas com materiais alternativos, visando à preservação da natureza e à melhoria da qualidade de vida do homem (RIVERO, 2003). Segundo Lima (2006), muitos materiais naturais tiveram sua importância elevada em função das reais possibilidades de renovação de suas reservas e sua biocompatibilidade, como a facilidade de sua absorção pela natureza quando descartados. Material natural é todo aquele que é extraído pelo homem da natureza, mas que para sua utilização não tenha sofrido modificações profundas em sua constituição básica. Um material natural é considerado orgânico se obtido de um animal ou vegetal, e inorgânico se obtido de um mineral. Dentre os materiais orgânicos de fonte vegetal têm-se a madeira proveniente dos vegetais superiores (árvores frondosas e coníferas), o bambu (pertencente à família das Gramíneas) utilizado na sua forma in natura ou processado, além de polímeros como o látex e o âmbar (LIMA, 2006). Matérias-primas renováveis são produzidas pela natureza e transformadas pelo homem, e seu tempo de renovação pode ser de poucos anos até várias décadas, por isso, uma boa gestão de sua exploração assegura sua regeneração. Eles podem ser materiais de origem vegetal ou animal, como a madeira, a lã ou o algodão. Estes biomateriais fazem sucesso por apresentarem dupla vantagem: são oriundos de recursos agrícolas renováveis e são degradáveis (PELTIER; SAPORTA, 2009). Como fonte de matéria-prima, a madeira sempre foi conhecida como sendo um material renovável, entretanto, devido à alta taxa de desmatamento das florestas mundiais, esta fonte 25 renovável está sob muita pressão e se sua extração de forma insustentável continuar, ela poderá tornar-se extremamente limitada. De acordo com o Programa Nacional de Florestas (PNF) e com estudos realizados pela Sociedade Brasileira de Silvicultura (SBS), existe um desequilíbrio entre a oferta e a procura de madeira plantada para suprir as necessidades de crescimento projetadas para a indústria de base florestal. O setor vem chamando a atenção para a possibilidade de um “apagão florestal”, que poderá ocorrer em, no máximo, dez anos, considerando-se o estoque de florestas, o prazo de maturação dos novos investimentos e o déficit produtivo de 300 mil ha/ano (ROSA et al., 2007). Van der Lugt (2008) informa que além da madeira existem diversas fontes de materiais renováveis que podem ser usadas para produzir materiais semiacabados. Tais fontes renováveis, como o bambu, o vime, o sisal, a cortiça e a cana, entram na categoria de “Non-Wood Forest Products” (NWFP), que são bens de origem biológica e florestal, que não sejam madeira, e nem sejam provenientes de florestas ou de outros terrenos arborizados. O bambu tem recebido considerável atenção como um dos materiais disponíveis mais sustentáveis. Inegavelmente o bambu é uma das maiores fontes renováveis de biomassa no planeta, sendo um substituto para madeira, e mostrando desmembramentos positivos em relação ao meio ambiente. O bambu tem potencial para ser uma verdadeira fonte sustentável, e integrar todos os pilares da sustentabilidade: ambiental, social, econômico e cultural (REUBENS, 2010). O bambu está profundamente arraigado no cotidiano de comunidades tradicionais desde tempos imemoriais. Antropólogos sugerem que a dependência humana em ferramentas e tecnologias de bambu pode ter precedido o uso das ferramentas da Idade da Pedra, porém, existem registros limitados dessa época, pois o bambu é um material perecível. Segundo Reubens (2010), esta teoria parece bastante plausível, já que a maioria das civilizações antigas originarias da Ásia, África e América Latina, eram indígenas, e o bambu é um material facilmente trabalhado. O bambu é parte integral da vida na Ásia, o que pode ser claramente percebido por um ditado indiano que diz que “após o nascimento não se consegue viver sem bambu”. Devido à alta produtividade anual e à capacidade das plantações de bambu serem estabelecidas em áreas onde as árvores talvez não sobrevivam, o bambu pode ser uma alternativa promissora para se atingir a demanda crescente por matérias-primas, em particular a madeira. Portanto, o bambu pode ter um papel importante como fonte de matéria-prima para suprir a necessidade humana por fibras e madeiras para habitação, revestimento e acabamento interior, móveis, utensílios domésticos e outros produtos duráveis (VAN DER LUGT; VOGTLÄNDER; BREZET, 2009). A importância ambiental dos bambus é imensa, principalmente quando estão se desenvolvendo em seu ambiente natural. Porém, até mesmo em plantações e grandes cultivos, os bambus são capazes de oferecer muitos benefícios ao ambiente (GRECO; CROMBERG, 2011). Os bambuzais desempenham inúmeras funções em um ecossistema; o International Network for Bamboo and Rattan (INBAR) ressalta que os benefícios do bambu na restauração de solos degradados, reflorestamento, geração de biomassa, sequestro de carbono, prevenção de erosões e lixiviação, já foram todos documentados, mas melhores formas de gestão e sistemas de produção são necessários. Bambus também são habitats para diversas espécies em risco de extinção, como o urso Panda, o Gorila-da-montanha, lêmures e morcegos. Trinta e quatro espécies de pássaros são conhecidos por depender dos bambus na Amazônia. Outro fator interessante, citado pelo INBAR, é 26 que as pessoas se conectam com as casas de bambu em um nível muito básico, e resorts de bambu estão se tornando cada vez mais populares em diversos países, incluindo Austrália, Índia e China, principalmente porque as florestas de bambu, assim como coleções de bambu bem cuidadas, são ambientes únicos e dificilmente encontrados pela grande maioria das pessoas (INTERNATIONAL NETWORK FOR BAMBOO AND RATTAN, 2013). Kuehl, Henley e Yiping (2011) informam que os bambus estão entre as plantas de crescimento mais rápido do planeta, crescendo até um metro por dia, e diferentemente das árvores, os bambus do tipo alastrante formam extensos sistemas de rizomas que podem se estender por áreas de até diversos quilômetros. Um colmo, de qualquer espécie de bambu, completa seu crescimento poucos meses após o surgimento do broto, alcançando sua altura máxima em um mínimo de 30 dias para as espécies de pequeno porte, e em um máximo de 180 dias para as espécies gigantes (PEREIRA; BERALDO, 2008). Os colmos, que emergem dos rizomas, morrem naturalmente após 10 anos caso não sejam colhidos, porém, o sistema de rizomas sobrevive à colheita de colmos individuais, e por isso o ecossistema do bambu pode ser produtivo e ainda assim continuar a armazenar carbono com o nascimento de novos colmos. Já a biomassa perdida nesse processo, é substituída dentro de um ano. Casagrande e Umezawa (2004) informam que devido à sua alta capacidade de fixação de carbono, o bambu é classificado como uma planta C4; já Lanna et al. (2012) desenvolveram um trabalho onde foram realizadas análises em bambus para determinação dos teores de carbono em sua estrutura. Os resultados mostraram que o bambu possui em média os mesmos teores vistos em outras espécies vegetais, porém ao se analisar estes dados juntamente com as taxas de crescimento e de produtividade anual do bambu, nota-se a enorme vantagem que ele apresenta em relação ao armazenamento de carbono. Ao se substituir a madeira ou outros materiais pelo bambu, além de poupar a extração dos mesmos, contribui-se efetivamente com o armazenamento do carbono, pois o carbono sequestrado e armazenado na biomassa do bambu só é perdido quando se queima a planta, ou quando ela se decompõe. Portanto, quando se transforma o bambu em produtos duráveis, se está armazenando o carbono e, consequentemente, minimizando os problemas ambientais. A principal vantagem do bambu para atenuar as mudanças climáticas se encontra em sua rápida geração de biomassa e em sua capacidade de renovação. A biomassa de jovens florestas de bambu aumenta rapidamente durante 10 ou mais anos, até atingir um platô, onde o surgimento e a morte dos colmos, anualmente, são aproximadamente iguais. Já em plantações geridas, adotando-se práticas adequadas de cultivo e de colheita permitem uma produção muito maior de biomassa por área plantada. Kuehl, Henley e Yiping (2011) informam que, no ano de 2011, estimou-se que as florestas de bambu cubram 22 milhões de hectares, porém, estudos mostram que o bambu poderia ser desenvolvido em mais milhares de hectares de solos degradados nas regiões tropicais e subtropicais, onde poderia fornecer renda extra para agricultores, sem comprometer as culturas já existentes. Outro fato importante é que a produção de produtos de bambu geralmente requer menos energia se comparada a de produtos à base de combustíveis fósseis. Segundo Hidalgo-López (2003), a distribuição de bambu pelos continentes, é aproximadamente a seguinte: 67% na Ásia e Oceania; 3% na África; e 30% nas Américas. Na Figura 3, pode ser vista a distribuição natural de bambu por todo o planeta. 27 Figura 3. Distribuição natural de bambu pelos continentes. Fonte: Kuehl, Henley e Yiping (2011) O bambu não é uma arvore como considera a maioria das pessoas, mas uma gramínea arborescente gigante, e como tal, ele pertence à família Gramineae (Poaceae), subfamília Bambusoideae, que é dividida em dois grandes grupos: os herbaceous bambusoid grasses, ou bambus herbáceos, e os woody bambusoid grasses ou bambus lenhosos, conhecidos simplesmente como “bambus”. Este segundo grupo forma a tribo Bambuseae, que apresenta colmos lenhosos, geralmente ocos e divididos em septos ou diafragmas. Ramificam-se pelos nós e geralmente se multiplicam pelos rizomas que por sua vez geram novos colmos. O florescimento ocorre somente depois de muitos anos, quando a maioria produz sementes e depois morre (HIDALGO-LÓPEZ, 2003). A quantidade de espécies e gêneros de bambu catalogados por todo o planeta ainda não é exata, mas entre os valores fornecidos por Hidalgo-López (2003), Ohrnberger (in GRECO; CROMBERG, 2011), Pereira e Beraldo (2008) e Van der Lugt, Vogtländer e Brezet (2009), estima-se até 1.600 espécies e 121 diferentes gêneros. O termo bambu foi primeiramente introduzido pelo naturalista sueco Carlos Linneo (1707- 1778), que a partir do idioma híndi, adotou o termo mambu ou bambu para classificar essa categoria de plantas. Acredita-se que a origem da palavra bambu seja uma alusão ao forte barulho provocado pelo estouro dos colmos, quando submetidos ao fogo: bam-boo. Já no Brasil, os indígenas referiam- se ao bambu como taboca e taquara, entre outros nomes (GRECO; CROMBERG, 2011). O bambu pode ser considerado um recurso renovável e sustentável, graças à alta capacidade de geração anual de brotos e à realização da ciclagem de nutrientes. Segundo Greco e Cromberg (2011), essa ciclagem acontece à medida que a planta repõe folhas, ramos e folhas caulinares, que caem quando perdem a função fisiológica e se incorporam ao solo. A característica mais importante de uma plantação de bambu está no fato de ser uma cultura permanente de produção anual, produzindo grande quantidade de biomassa, sem que para isso, seja necessário um novo plantio após a colheita, ao contrário de outros tipos de culturas florestais comerciais. O bambu, além de suas qualidades ambientais, pode ser considerado uma ferramenta para o desenvolvimento econômico e social, considerando-se que sua tecnologia, quando apropriada por pequenos agricultores pode contribuir para a geração de renda e trabalho. (BARELLI, 2009). No meio rural, o bambu pode ajudar a diversificar os produtos oferecidos por uma unidade de produção familiar, além de ser passível de ser cultivado em pequenas áreas ou naquelas que não se destinem à 28 agricultura convencional, ainda apresentando um retorno de capital mais rápido do que o da madeira. Ademais, o bambu pode ser aproveitado nas construções rurais, confecções de móveis e artesanatos e ainda constituir importante incremento nutricional na dieta familiar, através do consumo de brotos (SILVA et al., 2009, in GRECO; CROMBERG, 2011). A Figura 4 mostra os múltiplos usos das diferentes partes do bambu. Figura 4. Múltiplos usos das diferentes partes do bambu. Fonte: Greco e Cromberg (2011) Moizés (2007) relata que o uso do bambu no Ocidente é restrito se comparado com a China, Índia e Japão, principalmente por questões culturais, já que no Oriente seu uso no cotidiano é milenar. Em tais países, o uso do bambu não se restringe somente à sua forma in natura, sendo utilizado também para a fabricação de pisos laminados, painéis laminados e derivados. No Brasil, o bambu é utilizado na forma natural (colmos) em estruturas de casas e objetos em geral, vinculados principalmente às tradições indígenas e aos imigrantes orientais. As propriedades do colmo de bambu mudam conforme seu desenvolvimento, por isso suas aplicações variam de acordo com sua idade. Antes de se projetar qualquer produto de bambu, é importante estimar a quantidade de bambu disponível na idade necessária para as aplicações que se deseja, para se ter certeza que haverá material suficiente para ser trabalhado. Sabendo-se que diferentes idades de bambu apresentam características distintas, torna-se de grande valia o conhecimento a cerca da quantidade do material disponível e sua idade, pois isso permite explorar todo o potencial do bambu em termos de produção e design (REUBENS, 2010). Janssen (1999) ressalta que somente colmos adultos devem ser colhidos, pois os colmos jovens devem ser preservados para amadurecerem e, principalmente, para prover a planta com 29 alimento, sendo importante não cortar muitos colmos, caso contrário, a planta será danificada e pode eventualmente morrer. A influência da idade do colmo no seu valor econômico é, talvez, maior no bambu do que em qualquer outro tipo de madeira, afirma Hidalgo-López (2003). Bambus de dois anos são bons para taliscas e pranchas. Aos três anos os colmos estão prontos para produção industrial, pois nesta idade, geralmente atingem a resistência plena. Por essa razão bambus a partir de três anos são recomendados para produção de móveis, laminado e uma grande gama de aplicações. Após os quatro anos o bambu torna-se extremamente rígido, sendo ideal para aplicações estruturais. Com mais de seis anos ele começa a perder a resistência mecânica gradativamente, e este processo continuará até o bambu atingir cerca de 12 anos e consequentemente secar (REUBENS, 2010). A Figura 5 apresenta as diferentes etapas da vida do colmo de bambu e suas aplicações em cada idade. Figura 5. Uso dos colmos do bambu segundo sua idade. Fonte: Adaptado de Hidalgo-López (2003) O INBAR recomenda a introdução e a experimentação de espécies consideradas prioritárias, com base em critérios relativos quanto à sua utilização, cultivo, processamento e produtos, recursos genéticos e condições edafoclimáticas. Diversas destas espécies prioritárias foram introduzidas no 30 Brasil e já se encontram adaptadas às condições locais de clima e solo (PEREIRA; BERALDO, 2008). A Tabela 2 mostra as espécies prioritárias para uso local e comercial, segundo suas características. Tabela 2. Espécies prioritárias e para uso local e comercial. Espécie Valor Manejo Clima e Ecologia Recursos Genéticos C RI E Cl SI D S IV T F Bambusa bambos ++ ++ ++ D h,d,s r,m,p H L M M H B. blumeana ++ ++ ++ D h,d,s r,m,p H L H H H B. polymorpha + + - D h,d r,m H H M H H B. textilis + ++ + D st r,m M L H H L B. tulda + ++ + D h,d r,m H M H H H B. vulgaris - - ++ D h,d,s r,m,p L L L L L Cephalostachyum pergracile + ++ + W h,d m M L M H M Dendrocalamus asper ++ + ++ D h,d r H H M H H D. giganteus + + + D h r H H M H H D. latiflorus ++ + + D h r M L M H L D. strictus ++ + ++ D d,s m,p M L L H M Gigantochloa apus + ++ + D h r H H M H H G. levis + ++ ++ D h r H L H H H G. pseudoarundinaria ++ + + D h,d r M L H H L Guadua angustifolia ++ ++ ++ W h r,m H H H H H Melocanna baccifera + ++ + W h r H M H H M Ochilandra + + + W h r H H M H H Phyllostachys pubescens ++ ++ ++ D t r,m M M L L L Thyrsostachis siamensis ++ ++ ++ D d,(h) w.(r) M M L H L Valor C = Potencial para comercialização RI = Indústria rural E = Regenerador ambiental ++ (alto); + (médio); - (baixo) ++ (alto); + (médio); - (baixo) ++ (alto); + (médio); - (baixo) Manejo D = Domesticado W = Selvagem h (trópicos úmidos); d (trópicos secos); st (subtropical); s (semiárido); t (temperado) Clima e Ecologia Cl = Clima Sl = Solos r (rico); m (médio); p (pobre) Recursos genéticos D = Desgaste genético S = Necessita pesquisa armazenamento de sementes IV = Necessidade de pesquisa sobre reprodução in vitro T = Necessidade de maiores transferências F = Necessidade de levantamentos futuros H (alto) M (médio) L (baixo) Fonte: Adaptado de Rao, Rao e Williams (1998) Rao, Rao e Williams (1998) salientam que a priorização das espécies de bambu é de grande valor não só para o INBAR, mas também para as instituições de pesquisa, universidades e outros, pois, apesar de uma lista como esta não ser definitiva para todo o sempre, ela representa um ponto de partida, que pode ser modificado conforme novas informações se tornem disponíveis. Segundo Cardoso Junior (2008), nos países asiáticos China, Japão, Tailândia e Vietnã, nos andinos Colômbia e Equador, e em outros como Costa Rica, o bambu vem sendo utilizado como 31 material sustentável na construção civil e na indústria alimentícia, moveleira, de papel e têxtil. As Américas nunca tiveram uma “cultura do bambu” como a China ou Japão tiveram, e na América Latina a exploração do bambu é limitada ao uso local de espécies encontradas nas proximidades (BYSTRIAKOVA; KAPOS; LYSENKO, 2004). No Brasil, a maioria das espécies utilizadas é exótica, originárias em sua maior parte de países orientais, com exceção ao gênero Guadua, endêmico da América, sendo muito utilizado na Colômbia e Equador, e possuindo várias espécies nativas no Brasil. Greco e Cromberg (2011) relatam que as espécies exóticas mais cultivadas no Brasil e normalmente encontradas em diversas regiões do país são: Bambusa vulgaris var. vulgaris (uso rural e produção de papel), Bambusa vulgaris var. vittata (ornamental e uso rural), Bambusa tuldoides (uso rural), Bambusa textilis (ornamental e uso rural), Dendrocalamus giganteus (uso rural, construções e laminado), Dendrocalamus asper (uso rural, construções e laminados), Phyllostachys pubescens (ornamental, alimentação e laminados) e Phyllostachys aurea (varas de pesca, cortinas e movelaria). Na América Latina, a Colômbia é o país que mais utiliza o bambu em construções rurais e urbanas. Já no Brasil, a maior produção está destinada à fabricação de vara-de-pescar, mobiliários tradicionais, artesanato, brotos comestíveis, instrumentos e papéis de fibras longas. Observando-se as proporções territoriais e o clima da China, que é o maior produtor de bambu do mundo, no Brasil também é possível de se visualizar o favorecimento de uma produção em larga escala, principalmente pelo clima tropical e subtropical das extensas áreas existentes no país (MOIZÉS, 2007). Apesar de o Brasil possuir aproximadamente 20% do total de espécies de bambu encontradas em todo o mundo, ele não apresenta grandes recursos de bambu, e esta é uma das explicações para o fato de a exploração desta planta no país estar restrita, em sua grande maioria, aos usos tradicionais como balaios, tutores na agricultura e construções provisórias (CARDOSO JUNIOR, 2008). Assim como as quantidades de espécies e gêneros de bambu pelo mundo não são precisos, as quantidades encontradas nas Américas e no Brasil também não o são, mas entre os valores fornecidos por Londoño (2001), Bystriakova, Kapos e Lysenko (2004), Filgueiras e Gonçalves (2004, in PEREIRA; BERALDO, 2008), são encontradas até 174 espécies diferentes no Brasil, que desponta nas Américas como o país com maior número de espécies, seguido pela Venezuela com 68 espécies, e a Colômbia com 56. A Figura 6 mostra um mapa com a riqueza potencial de espécies de bambu lenhosos nas Américas, derivado da combinação de mapas com a distribuição de 341 espécies nativas da região. 32 Figura 6. Mapa com o potencial de riqueza de espécies de bambu da tribo Bambuseae nas Américas. Fonte: Adaptado de Bystriakova, Kapos e Lysenko (2004) 2.3.1. Características Gerais Pelas características de seu colmo, o bambu é considerado como sendo uma planta lenhosa, monocotiledônea, e pertencente às angiospermas. Os bambus lenhosos geralmente possuem porte arbóreo, sendo constituídos por uma parte aérea, que abarca colmo, folhas, folhas caulinares e ramos, e uma parte subterrânea, composta por rizoma e raízes (GRECO; CROMBERG, 2011). Apesar de raramente ocorrerem bambus maciços (gênero Chusquea, por exemplo), os colmos de bambu, em sua grande maioria, apresentam uma forma ligeiramente cilíndrica e dispõe de uma sequência de entrenós (internós) ocos (cavidades), separados transversalmente uns dos outros por diafragmas (septos), que aparecem externamente como nós, dos quais emergem ramos e folhas. Os diafragmas fornecem maior rigidez e resistência aos colmos, o que lhes permite suportar a ação do vento e do próprio peso (PEREIRA; BERALDO, 2008). A Figura 7 apresenta a estrutura básica do colmo de bambu. 33 Figura 7. Estrutura básica do colmo de bambu. Fonte: Adaptado de Janssen (1999) Os colmos diferenciam-se em altura, diâmetro, espessura de parede e forma de crescimento, conforme a espécie a que pertençam. Segundo Pereira e Beraldo (2008), o colmo de bambu nasce com o diâmetro que terá por toda a sua vida, e este diâmetro é maior perto da base e diminui em direção à ponta, ou seja, o bambu é geometricamente um tronco de cone, mas este diâmetro nunca aumenta com o passar dos anos, como ocorre normalmente com as árvores. O rizoma exerce um papel fundamental no desenvolvimento do bambu, agindo não só como armazenador de nutrientes, para posterior distribuição, mas também como órgão responsável pela propagação do bambu. Ano após ano, o nascimento de novos colmos se efetua assexuadamente através da ramificação dos rizomas, e dependendo da maneira como essa ramificação ocorre, os bambus são classificados em dois grupos distintos: o grupo alastrante, no qual os colmos nascem e se desenvolvem separados uns dos outros, e o grupo entouceirante, no qual os colmos nascem e se desenvolvem agrupados uns aos outros (PEREIRA; BERALDO, 2008). O tipo alastrante, também é chamado leptomorfo ou monopodial, cresce em zonas temperadas; já o entouceirante, também conhecido como paquimorfo ou simpodial, cresce em zonas tropicais. Bambus de rizoma leptomorfo são geralmente distribuídos em regiões temperadas, como Japão, Coréia e China, onde os invernos são mais severos. São caracterizados pela resistência ao frio intenso, e consequentemente podem ser cultivados em elevadas altitudes dos trópicos. O tipo de rizoma paquimorfo é típico de zonas tropicais das Américas, Ásia, África e Oceania, e engloba espécies que não resistem a temperaturas muito baixas. Bambus com este tipo de rizoma são representados nas Américas pelo gênero Guadua, e na Ásia tropical pelo gênero Dendrocalamus e Bambusa (HIDALGO-LÓPEZ, 2003). A Figura 8 apresenta a estrutura dos bambus do tipo paquimorfo e leptomorfo. 34 Figura 8. Estrutura dos bambus do tipo paquimorfo e leptomorfo. Fonte: Adaptado de Hidalgo-López (2003) Hidalgo-López (2003) informa que os nós são importantes centros de atividade morfogenética e de crescimento intercalado, e raízes e galhos emergem somente dos nós, que consistem em cicatriz da bainha, crista do nó, diafragma e internó. Já os internós são delimitados pela cicatriz da bainha, que marca na face exterior do colmo a intersecção entre a bainha ou a folha caulinar e o próprio colmo. Os internós são menores na base e no topo do colmo, e geralmente são mais longos na parte do meio do colmo. A Figura 9 mostra a morfologia do nó e diferentes espessuras de parede de colmo. Figura 9. Morfologia do nó e diferentes espessuras de paredes. Fonte: Adaptado de Hidalgo-López (2003) 35 A maioria das espécies de bambu tem colmos de seção circular, mas existem também espécies que apresentam naturalmente colmos quadrados, sendo que na China antiga existiam também espécies com colmos triangulares (HIDALGO-LÓPEZ, 2003). Apesar de existirem algumas espécies com formatos diferentes do normalmente cilíndrico, é válido ressaltar que o colmo pode ser deformado artificialmente. Padovan (2010) relata que externamente o bambu possui uma camada de cera e internamente possui uma camada espessa lignificada, com numerosas células esclerenquimáticas (feixes de fibras), sendo assim constituída: - Parênquima: é o tecido básico do colmo e representa de 40% a 60% de sua composição; sua distribuição, no eixo do colmo, tem concentrações diferentes, com 60% na base e 40% na parte apical; tem função de estocar nutrientes e água, podendo armazenar quantidades significativas de amido; - Fibras: são as principais responsáveis pela resistência mecânica dos colmos; nos internós, estão orientadas paralelas ao eixo de crescimento, e representam de 40% a 50% do tecido total do colmo e de 60% a 70% de sua massa; a quantidade de fibras aumenta da base em direção ao topo. A Tabela 03 contém a distribuição dos elementos anatômicos nas camadas internas, intermediárias e externas do colmo de bambu da espécie Dendrocalamus giganteus. Tabela 3. Distribuição dos elementos anatômicos do bambu Dendrocalamus giganteus. Vasos Fibras Parênquima Camadas do colmo % % % Interna 11 16 73 Intermediária 9 32 59 Externa 8 55 37 Fonte: Adaptado de Rivero (2003) Na Figura 10, pode-se observar a distribuição dos elementos anatômicos da espécie de bambu Dendrocalamus giganteus, onde as regiões mais escuras representam os feixes de fibra e as mais claras representam as células parenquimáticas (RIVERO, 2003). Pode-se notar nitidamente que a densidade de fibras não é uniforme através da seção transversal do bambu, sendo mais elevada na periferia da parede, ou seja, nas regiões mais próximas à casca. Essa distribuição entre os elementos anatômicos do bambu também é variável ao longo da altura do colmo. Figura 10. Distribuição anatômica das fibras do bambu. Fonte: Elaborado pelo autor Pelo fato de nas regiões mais próximas à casca ocorrer maior densidade de fibras, elas abrigam as partes da parede do bambu com maior resistência mecânica. Essa é uma informação 36 muito importante a se levar em consideração antes do processamento dos colmos para a retirada de ripas laminadas (GRECO; CROMBERG, 2011). Além deste fator, é valido salientar que as propriedades mecânicas dos bambus dependem de diversos fatores, como: espécie; idade em que foi colhido; teor de umidade; posição ao longo do colmo (topo ou base); posição dos nós e internós, pois resulta em diferentes características, já que os nós são menos resistentes em compressão e dificultam a curvatura (JANSSEN, 1999). De acordo com Liese (1998) e Lopez (2003) (in MARINHO et al., 2012), as propriedades físicas e mecânicas dos bambus estão correlacionadas com as suas propriedades químicas e anatômicas, destacando-se o teor de lignina e a espessura das paredes celulares. A composição química do bambu varia conforme a espécie, as condições de crescimento, a idade e a região do colmo (base, meio ou topo). Já Higuchi (1990, in MARINHO et al., 2012), informa que a composição do bambu é semelhante à da madeira, com exceção dos extratos alcalinos, cinzas e sílica, que são mais elevadas no bambu. Segundo Liese (1998, in PEREIRA; BERALDO, 2008), os principais constituintes químicos do colmo de bambu são carboidratos, determinados como: celulose, hemicelulose, lignina e, em menores quantidades, resinas, taninos, ceras e sais inorgânicos. Após a celulose (55%), a lignina (25%) é o constituinte mais abundante do bambu. A lignina apresenta extrema importância na composição das plantas, pois além de desempenhar diversas funções como depósito de substâncias, proteção contra microoganismos e impactos, de acordo com Manríquez e Moraes (2009), Hariki, Vieira e Santos (2012) e Marinho et al. (2012), ela também proporciona às plantas propriedades de rigidez e resistência às paredes celulares. Segundo Klock et al. (2005, in PELOZZI, 2012), a lignina é um polímero amorfo responsável por aumentar a rigidez da parede celular, unir as células umas as outras e reduzir a permeabilidade da parede celular em relação à água, e a partir do momento em que a lignina é “plasticizada” (transição vítrea), com umidade e/ou calor, ocorre a liberação das tensões internas da madeira. A transição vítrea é a passagem de um estado desordenado rígido (vítreo) de um polímero, para um estado desordenado ainda maior, no qual as cadeias poliméricas possuem maior mobilidade. Tal mobilidade, no caso de alguns polímeros naturais como a hemicelulose, a celulose e a lignina, origina um comportamento menos rígido. Ou seja, como a lignina e a hemicelulose são polímeros amorfos e essencialmente termoplásticos, seu ponto de amolecimento é aquele da transição vítrea (MANRÍQUEZ; MORAES, 2009). Sabe-se que a transição vítrea da madeira está vinculada à sua temperatura e ao seu teor de umidade. Chan et al. (1989, in PELOZZI, 2012) mostram que a temperatura de transição vítrea da lignina para a madeira seca e quando a 14,5% de umidade, para a espécie seringueira, é de 128 °C e 77 °C, respectivamente. Para várias espécies, a transição vítrea da lignina in situ, no ponto de saturação das fibras, ocorre em zona compreendida entre 60 °C e 90 °C (IRVINE, 1984, in MANRÍQUEZ; MORAES, 2009). O ponto de saturação de fibras em madeira varia conforme a espécie, entre 28% e 30%, sendo comumente aceito como 30%, enquanto que nos bambus este valor é influenciado pela composição dos tecidos e varia, entre as espécies, numa faixa de 13% a 20% (HIDALGO-LÓPEZ, 2003). 2.3.2. Tratamentos Preservativos O bambu é um material biológico com grande presença de amido, e por isso está sujeito ao ataque de insetos e fungos, e deve, portanto, passar por um tratamento preservativo a fim de garantir a sua durabilidade. O colmo do bambu contem uma grande quantidade de células 37 parenquimáticas (cerca de 52%) que são preenchidas de amido nutritivo, o que determina, em grande parte, sua susceptibilidade ao ataque de brocas e fungos (LIESE, 2004). Azzini e Beraldo (2001, in PEREIRA; BERALDO, 2008) informam que os tratamentos preservativos do bambu são separados em dois métodos: tradicionais e químicos. Os tradicionais subdividem-se em: maturação ou cura no local da colheita, cura por imersão, por fogo e por fumaça; já os métodos químicos podem ser subdivididos em: oleosos, oleossolúveis, hidrossolúveis, imersão em solução de sais hidrossolúveis e substituição de seiva por sais hidrossolúveis. Os métodos químicos são mais eficientes do que os métodos tradicionais, e quando bem conduzido, protegem os colmos contra o ataque de carunchos, além de aumentar a durabilidade dos colmos quando em contato com o solo (PEREIRA; BERALDO, 2008). Dentre os métodos químicos, um dos mais comuns é o tratamento por imersão, que pode ser aplicado tanto aos colmos recém-cortados ou então àqueles que tenham sido secos ao ar. A duração do tratamento depende da espécie de bambu, das dimensões do colmo, da concentração da solução, dentre outros fatores. Atualmente, para o tratamento químico de colmos de bambu, existe a tendência de utilização de duas substâncias preservativas distintas. Uma delas é o borato de cobre cromatado (CCB), que pode tanto ser produzido artesanalmente como adquirido em estabelecimentos comerciais, e a outra substância, consiste em uma solução que visa minimizar a degradação ambiental decorrente do uso de metais pesados, pois se baseia na combinação do ácido bórico com o bórax (um sal à base de boro) (ESPELHO, 2007). A solução de ácido bórico e bórax é mais ecológica do que a maioria dos preservativos de madeira correntemente usados. É uma substância em pó branca, sem odor, de baixa toxidade ao contato, e que não é inflamável, combustível ou explosiva. Este produto não apresenta perigo ao decompor-se, e penetra e se propaga pelo bambu, ou madeira, de maneira mais rápida e eficiente do que somente o ácido bórico. A solução é atóxica ao meio-ambiente, porém é altamente salina. Quando uma quantidade moderada do produto é absorvida pelo solo, ela é filtrada ao ponto que não polui os lençóis freáticos, e quando diluído em maior quantidade de água, a solução pode ser usada como herbicida em terraços e calçadas (ENVIRONMENTAL BAMBOO FOUNDATION, 2005). 2.3.3. Espécies Utilizadas no BLaC Apesar das inúmeras espécies e usos possíveis do bambu, é necessário ressaltar o fato de que não existe uma só espécie capaz de abranger todas as aplicações possíveis. O que existe são espécies mais indicadas para um determinado tipo de exploração ou aplicação, pois enquanto algumas são ideais para a produção de brotos comestíveis, outras o são para a fabricação de celulose e papel, e enquanto algumas são insubstituíveis na confecção de artesanatos e móveis, outras são resistentes o suficiente para serem empregadas em qualquer tipo de construção (GRECO; CROMBERG, 2011). Do ponto de vista do aproveitamento do bambu, o colmo é a parte mais importante da planta, já que é a matéria-prima utilizada para a maioria das atividades onde o bambu é empregado. Sendo assim, as características do colmo representam o principal critério para a escolha da espécie a ser cultivada para fins comerciais. A seguir são listadas algumas das propriedades do bambu que, de acordo com Janssen (1999), determinam seu melhor uso, e com um entendimento razoável destas informações o usuário pode escolher os bambus mais apropriados para o que deseja: a altura do colmo, que é a altura total do colmo durante sua vida; a altura útil do colmo, que é a distância da base até uma certa altura onde o diâmetro se torna muito pequeno; o diâmetro externo na base e no 38 topo; a espessura da parede, nestes mesmos dois locais; a distância dos internós; a retidão dos colmos; as propriedades mecânicas; e sua durabilidade natural. Para a fabricação de BLaC são necessários bambus de grande porte, com parede espessa, por isso, as espécies mais utilizadas são: Dendrocalamus giganteus, Dendrocalamus latiflorus, Dendrocalamus asper, Guadua angustifolia e Phyllostachys pubescens (MOIZÉS, 2007). As Tabelas 4 a 8 contém uma descrição das principais características das espécies acima citadas, a partir de um cruzamento das informações fornecidas por Pereira e Beraldo (2008), Greco e Cromberg (2011) e Rao, Rao e Williams (1998). Tabela 4. Principais características da espécie Guadua angustifolia. Guadua angustifolia NOME BOTÂNICO Guadua angustifolia Kunth SINONÍMIA Bambusa guadua Humb. & Bonpl.; Guadua aculeata Rupr. Ex E. Fourn. NOMES COMUNS Guadua DESCRIÇÃO Bambu gigante entouceirante, de elevado porte, cor verde escuro com faixas brancas nos nós, apresenta folhas de tamanho médio e espinhos nas gema