UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS MARIA EDUARDA CORREIA CLEMENTE A INFLUÊNCIA DA HISTÓRIA RUSSA NO CONFLITO RUSSO-UCRANIANO MARÍLIA 2023 MARIA EDUARDA CORREIA CLEMENTE A INFLUÊNCIA DA HISTÓRIA RUSSA NO CONFLITO RUSSO- UCRANIANO Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Campus de Marília. Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Duarte Fernandes dos Passos MARÍLIA 2023 C626i Clemente, Maria Eduarda Correia A influência da história russa no conflito russo-ucraniano / Maria Eduarda Correia Clemente. -- Marília, 2023 66 p. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Relações Internacionais) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília Orientador: Rodrigo Duarte Fernandes dos Passos 1. História. 2. Identidade étnica. 3. Conflito Ucrânia, 2014-. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. MARIA EDUARDA CORREIA CLEMENTE A INFLUÊNCIA DA HISTÓRIA RUSSA NO CONFLITO RUSSO-UCRANIANO Trabalho de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado ao Curso de Relações Internacionais como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais. Área de Concentração: História Russa, Conflito, Ucrânia. BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________ Orientador: Rodrigo Duarte Fernandes dos Passos Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Filosofia e Ciências, Campus de Marília ___________________________________________________________________ Paulo Victor Zaneratto Bittencourt Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências ___________________________________________________________________ Gabriel Sandino de Castro Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Filosofia e Ciências, Campus de Marília Marília, 1 de fevereiro de 2023 RESUMO A extensa e complexa história da Rússia é tamanha que provoca grandes impactos na região e no cenário internacional. O conflito entre Rússia e Ucrânia, iniciado oficialmente em 2014, pode ser compreendido através das profundas raízes históricas que marcaram suas relações. O presente trabalho resgata as origens de ambas as nações, desde o surgimento dos povos através da Rus de Kiev, uma confederação de Estados liderados por Kiev, no século VIII, até a unificação russa por Ivan III. Paralelamente, apresentam-se os fatores que se tornariam os principais motivos pelos quais o conflito russo-ucraniano teve seu despertar: influências e interferências ocidentais e o sentimento patriótico soviético. Por meio de método bibliográfico e explicativo, este trabalho visa estabelecer uma ligação entre a complexa história russa e o conflito russo-ucraniano, baseando-se na coleta de dados e informações de diversos autores e obras. Além da constatação de uma quantidade escassa de contribuições que englobem as implicações históricas do conflito na língua portuguesa, observa-se que as influências ocidentais e o desejo de reunificação soviética prevalecem ante as justificativas do conflito. Palavras-chave: Ucrânia; Conflito; Rússia; Identidade e Individualidade. ABSTRACT The extensive and complex history of Russia is so vast that it has great impacts on the region and international scenario. The conflict between Russia and Ukraine, officially started in 2014, can be understood through the deep historical roots that have marked their relations. This work retrieves the origins of both nations, from the emergence of the peoples through Rus of Kiev, a confederation of states led by Kiev, in the 8th century, to the Russian unification by Ivan III. Parallel to this, the factors that would become the main reasons why the Russian-Ukrainian conflict had its awakening are presented: western influences and interference and the Soviet patriotic feeling. Through bibliographic and explanatory methods, this work aims to establish a connection between the complex Russian history and the Russian-Ukrainian conflict, based on the collection of data and information from different authors and works. In addition to the observation of a scarce number of contributions that encompass the historical implications of the conflict in the Portuguese language, it is observed that Western influences and the desire for Soviet reunification prevail over the justifications of the conflict. Keywords: Ukraine; Conflict; Russia; Identity and Individuality. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 8 2. ASPECTOS GERAIS DA RÚSSIA ....................................................................... 10 2.1. Aspectos geográficos ...................................................................................... 10 2.2. Aspectos históricos ......................................................................................... 11 2.2.1. Povos originários: século X ao século XIII ................................................... 11 2.2.2. Ivan III aos Tempos de Dificuldades ............................................................ 14 2.2.3. A Dinastia Romanov .................................................................................... 16 2.2.4. A Primeira Guerra Mundial ........................................................................... 22 2.2.5. A Revolução Russa e o governo provisório ................................................. 23 2.2.6. O Governo Bolchevique e a Guerra Civil ..................................................... 23 2.2.7. O período soviético ...................................................................................... 24 2.2.8. A Rússia pós-União Soviética ...................................................................... 31 3. POLÍTICA EXTERNA............................................................................................ 36 3.1. A Política Externa e a tomada de decisão ...................................................... 36 3.2. A Rússia na Política Externa ........................................................................... 37 3.2.1. A Política Externa no período pós-soviético ................................................. 37 3.2.2. A Política Externa no governo de Putin ........................................................ 38 4. ASPECTOS GERAIS DA UCRÂNIA .................................................................... 41 5. O CONFLITO RUSSO-UCRANIANO ................................................................... 43 5.1. A formação do povo ucraniano e a relação com o conflito russo ............... 43 5.2. A Guerra da Crimeia ......................................................................................... 45 5.3. A invasão russa na Ucrânia: 24 de fevereiro de 2022 ................................... 48 6. IMPACTOS DA HISTÓRIA DA RÚSSIA NA GUERRA RUSSO-UCRANIANA ... 51 6.1. Origens da Ucrânia e o afastamento da Rússia ............................................ 51 6.2. As Relações do ocidente e a Rússia antes de 2013 ...................................... 52 6.3. O conceito de Rusky Mir .................................................................................. 53 6.4. Notas sobre o conflito russo-ucraniano desde 2013 .................................... 54 7. A CONCEITUAÇÃO DE CLAUSEWITZ E UMA BREVE ANÁLISE DO CONFLITO ................................................................................................................ 56 7.1. A Trindade Paradoxal de Clausewitz e a Guerra da Ucrânia ........................ 57 7.2. Da Guerra, Clausewitz...................................................................................... 57 7.2.1. O conceito de Clausewitz na Guerra da Ucrânia ......................................... 58 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 61 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 63 8 1. INTRODUÇÃO A extensa e complexa história da Rússia tem grande influência na região e no mundo. O conflito entre a Rússia e a Ucrânia, que começou em 2014, tem profundas raízes históricas compartilhadas entre esses dois povos. As origens de ambas as nações têm seu início com os Cimérios, sendo considerado o primeiro grupo a tomar conta do Estepe, provindo dos Balcãs em 1000 A.C. Através do surgimento da Rus de Kiev no século VIII, Kiev se tornou o principal centro de comando entre as confederações de cidades-Estados da região. Posteriormente, a central de Kiev foi substituída por Moscou através da independência da região que havia sido tomada pelos mongóis e também pela unificação russa proclamada por Ivan III em 1480. Desde então, os conflitos com a Polônia-Lituânia e o império Austro-Húngaro fizeram com que esses Estados tomassem controle temporariamente de certas regiões onde se localiza a Ucrânia, como consequência, fortes influências ocidentais permaneceram nessas regiões, passando a despertar na nação ucraniana um sentimento de nacionalismo e de não pertencimento a nação russa. Tais fatores, juntamente com a decaída da União Soviética, levaram a independência oficial do Estado Ucraniano em 1991. Desde a independência da Ucrânia e a dissolução da União Soviética, a Rússia, temendo que as nações ocidentais interfiram em sua esfera de influência, tem tentado manter o seu domínio presente nas nações que faziam parte desse bloco. Nesse viés, a expansão da OTAN, da União Europeia e a promoção da democracia vem causando temores na Ucrânia, haja vista o impacto da ocidentalização e a consequente alteração em sua esfera de influência. Esse receio é um dos motivos pelos quais o conflito russo-ucraniano teve seu despertar. Isto posto, no primeiro capítulo, será apresentado os aspectos geográficos da Rússia juntamente a uma breve leitura da História da Rússia, partindo dos povos originários ao atual governo de Vladimir Putin. Além disso, nesse capítulo aborda-se uma análise sucinta da definição de Política Externa e o seu percurso desde o período pós-soviético ao governo Putin. Em seguida, no segundo capítulo, apresenta-se uma curta leitura sobre a construção da Ucrânia com ênfase nos conflitos de 2014 e 2022. Para finalizar o texto, 9 propõe-se num terceiro capítulo, uma breve análise do conflito russo-ucraniano e por fim, são indicados os impactos da história russa e uma sucinta análise do conflito na visão de Clausewitz. Portanto, este trabalho tem como intuito expor principalmente uma breve leitura da longa História da Rússia e a sua relação com o conflito entre a Rússia e a Ucrânia: Quais são os principais catalizadores do Conflito? Como se caracteriza a Política Externa Russa? Como a cronologia dos eventos históricos se relacionam com as motivações do conflito? A fim de reforçar essas considerações, esse texto se baseia em métodos bibliográficos e explanatórios para a coleta de dados e informações de vários autores ao longo da história russa, bem como o desenvolvimento histórico da disputa entre a Rússia e a Ucrânia. Após a coleta de materiais bibliográficos sobre a história russa e o consequente conflito russo-ucraniano, encontramos um escasso número de obras na língua portuguesa e que englobem todos as implicações históricas do conflito. Sendo assim, este trabalho é significativo por proporcionar uma análise histórica da Rússia e do conflito russo-ucraniano na língua portuguesa. Além disso, devido ao atual e presente desenvolvimento do conflito russo-ucraniano, examinar a história da região e como ela moldou o atual conflito apresenta extrema relevância para a conscientização sobre os acontecimentos. 10 2. ASPECTOS GERAIS DA RÚSSIA 2.1. Aspectos geográficos A Rússia é um dos maiores países do mundo, compondo-se de aproximadamente de 6.5 milhões milhas quadradas. A Federação Russa faz parte da Eurásia, posto que está localizada tanto na Europa como na Ásia. A sua região é tão extensa que possui quatro diferentes tipos de vegetação: Tundra, Taiga, Estepe e Deserto (KORT, 2008). A parte europeia possui vastas redes de rios, o que proporcionou crescimento e conexão com as diversas divisões de sua grande extensão do seu território, como, por exemple, o rio Volga, o rio mais extenso da Europa considerado como o canal mais importante que conecta os mares Báltico, Negro e Cáspio, representando, portanto, um papel muito importante na história russa (KORT, 2008). Atualmente, as cidades mais importantes da Federação Russa são Moscou e São Petesburgo. Moscou se tornou uma cidade grande entre os séculos 13 e 15 e é onde se localiza os grandes símbolos da Rússia: Kremlin, a Catedral de São Basílio e a Praça Vermelha. Já São Petersburgo, conhecida como Leningrado durante o regime soviético, foi construída por Pedro I da Rússia e foi a capital da federação por mais de 200 anos (KORT, 2008). No que tange a sua população, aproximadamente 146 milhões de pessoas habitam na Rússia e cerca de 80% possuem etnia russa. Desde 1990 observa-se um declínio populacional devido à baixa taxa de natalidade e à alta taxa de mortalidade. Além disso, grande parte da população vive na área urbana atualmente, sendo Moscou a cidade mais populosa, nela habitam cerca de 12 milhões de habitantes, seguida por São Petersburgo com 5,5 milhões de habitantes (ONU, 2019). Além do exposto, a Rússia possui a terceira mais longa ferrovia do mundo, considerada uma das maiores infraestruturas criadas no século 19: a Rota Transiberiana, ela conecta a Rússia Ocidente ao Rússia do Extremo Oriente, com extensão de mais de 5,500 milhas, tem seu ponto de partida em Moscou terminando em Vladivostok (BRITANNICA, 2022). 11 2.2. Aspectos históricos 2.2.1. Povos originários: século X ao século XIII 2.2.1.1. Cimérios, Citas, Sármatas Como mencionado por Kort, o primeiro grupo que tomou controle do Estepe foram os Cimérios que se deslocaram dos Balcãs cerca de 1000 A.C e estenderam seu poderio até as Montanhas do Cáucaso. No entanto, seu legado não teve grande extensão e, por conseguinte, não deixaram muito impacto na área. Os Crimérios se locomoveram cerca de 700 D.C devido a invasão dos Citas provenientes da Ásia Central, o poderio dos Citas se estendeu até o leste da Sibéria. Os citas eram especialistas em joias e ornamentos para decoração. Se tornaram conhecidos por entrar em desentendimento com o rei persa Dario I; o conflito terminou em um recuo por ambas as partes (KORT, 2008). Segundo Kort, o controle dos Cintas durou até 200 D.C quando os Sármatas, os quais eram considerados conhecedores do metal e de novas armas, os derrubaram. Os Sármatas se deslocaram do Estepe por volta de 370 D.C, devido ao ataque dos Hunos. Por volta de 600 D.C, os ávaros tomaram posse da parte norte do Estepe. Kort também cita que nesse período já havia tribos eslavas orientais vivendo pela região que migraram da Europa Central. 2.2.1.2. Os Cazares Os Cazares surgiram durante o século sete, eram falantes da língua turca e proveniente da Ásia Central, se tornaram poderosos devido ao controle de importante rotas comerciais entre a Europa e o Oriente Médio. Os Cazares lutaram grandes guerras com exércitos árabes e trabalharam para o bloqueio da expansão do Islamismo no leste Europeu. Esse povo permaneceu no Estepe até serem derrotados pelo príncipe russo de Kiev em 966. Como consequência da caída dos Cazares, as invasões provindas da Ásia e de novos grupos nômades se iniciaram, causando grandes prejuízos aos Russos que tinham apenas se deslocado para a área. (KORT, 2008). 12 2.2.1.3. Rus de Kiev Kort alega que as origens do primeiro Estado Russo, a Rússia de Kiev (Kievan Rus), não são claras. De acordo com ele, O termo “Rus” seria uma referência aos varangianos. Os Eslavos orientais durante o século nove já estavam estabelecidos no leste europeu e fundaram em torno de 300 cidades, a população se concentrava na agricultura, no entanto, fazia-se falta uma organização política. As origens dos povos russos, ucranianos e bielorrussos remetem a constituição de Rus de Kiev, tendo em vista que essa região era composta por toda a Bielorrússia, metade da Ucrânia e partes da Rússia ocidental. De acordo com Kort, em torno de 862, varangianos liderados pelo príncipe Rurik tomaram posse da região de Novgorod. Após vinte anos, Oleg, sucessor de Rurik conquistou Kiev, lugar que se tornou a capital de Rússia de Kiev. Portanto, Kiev se tornou a principal fonte de controle de uma confederação de cidades-estados do Báltico ao Mar Negro. Ademais, o Império Bizantino tinha grande influência sob a Rússia de Kiev devido as negociações entre as duas partes. Uma das grandes influências a serem citadas foram a religião ortodoxa grega e a língua eslava eclesiástica, idioma muito próximo ao Russo da época, esses dois fatores culminaram na influência do folclore e da literatura secular e também na arte eclesiástica. A Rússia de Kiev chegou a um alto nível de poder sob o comando de Yarolav, o sábio e Vladimir Monomakh. Yarolav criou o primeiro código de lei da Rússia e tornou a cidade de Kiev um centro cultural e artístico, incluindo a Catedral de Santa Sofia. Já Vladimir Monomakh era um militar de alto nível e altamente educado, ele logrou vitórias contra nômades e campanhas contra os inimigos do ocidente. Através do governo de Vladimir no início do século 12, Kiev tornou-se um centro urbano de atividade comercial com 50 mil pessoas (KORT, 2008). Segundo Kort, na metade do século 12, observou-se o declínio da Rússia de Kiev; diversas guerras entre os príncipes estavam fazendo com que eles perdessem o foco na defesa contra os invasores. Além do mencionado, a prosperidade também passou a encontrar-se prejudicada quando as Cruzadas trouxeram uma rota direta entre o Leste Europeu e a Constantinopla através do mar Mediterrâneo. Após a morte de Vladmir Monomakh, Kiev foi saqueada em 1169 pelo príncipe russo Andrei 13 Bogolyubsky e, em 1203, foi saqueada por soldados russos. Consequentemente, a população passou a deslocar-se às regiões de oeste e nordeste. As desavenças entre os príncipes fizeram com que houvesse menos atenção as ameaças advindas do estrangeiro. Rússia de Kiev, portanto, divide-se em 12 principados. 2.2.1.4. Mongóis Os Mongóis era uma tribo nômade que se localizava no Estepe do norte da China. Como cita Kort sobre os Mongóis “[...] Sua mobilidade e habilidades de luta formidáveis os tornaram um perigo constante para assentamentos isolados ou pequenos[...]” (KORT, 2008, p.13, tradução nossa) O primeiro ataque Mongol aconteceu em 1123, na região Polovtsy a qual era controlada por nômades turcos. Os russos e os turcos se juntaram para tentar combater os mongóis. O conflito terminou diante de execuções de prisioneiros russos e turcos. No entanto, posteriormente, os mongóis se deslocaram para o interior da Ásia e retornam somente após 10 anos. (KORT, 2008) Por conseguinte, o próximo ataque ocorre em 1237 e termina em 1242 com a vitória e a conquista mongol, sendo Novgorod a única cidade que não foi conquistada. De acordo com Kort (2008, p. 15, tradução nossa): Em 1238, os mongóis tomaram a cidade de Vladimir, lar do grão-príncipe da Rússia. Os cidadãos que se refugiaram na principal igreja da cidade foram queimados vivos; os mongóis cortaram em pedaços aqueles que tentaram fugir dos incêndios. [...] Kiev caiu em dezembro de 1240 após uma longa e heroica defesa. Essa resistência teve seu preço. A destruição em Kiev foi tão total que seis anos depois um visitante da Europa encontrou apenas 200 casas naquela cidade outrora majestosa [...]. Os mongóis constituíram o Canado da Horda Dourada, o qual se estendeu desde o oeste do Mar Negro até a Sibéria; a tribo nômade governou o país indiretamente com o suporte de príncipes russos. Como alega Kort, a conquista mongol trouxe diversas mudanças e influências para o território: o enfraquecimento da economia; o isolamento do resto da Europa; e a opressão política e populacional, esses fatores foram as bases da Rússia autocrática com o tempo. 14 2.2.2. Ivan III aos Tempos de Dificuldades 2.2.2.1. Moscou e Ivan III Conforme aponta Kort, Moscou teve grande crescimento e estabilidade no período em que os Mongóis estiveram presentes. Ivan III se tornou príncipe de Moscou em 1462 e reinou até 1505, seu governo foi essencial para a unificação russa, ele chegou a quadruplicar o território de Moscou e anexou territorialidades incluindo Novgorod. Em 1480, Ivan III declarou a independência do Canado da Horda Dourada e se declarou Czar e autocrata. Em 1453, a independência religiosa e o estabelecimento da Igreja Ortodoxa Russa se tornaram evidentes ante a caída do império Bizantino. As ideias autocratas de Ivan III foram endossadas pela Igreja Russa Ortodoxa e a sua aliança com a Igreja Ortodoxa foi confirmada através de seu casamento com Sophia Paleologue da Constantinopla (KORT, 2008). Segundo Kort, o que impedia um Estado absoluto em Moscou era a classe aristocrática, os boiardos e os príncipes dos principados. Ivan III logrou afastar os boiardos do poder centralizado e os príncipes da soberania e, dessa forma, criou um Estado soberano que obedecia às regras de Moscou. Vasili III, filho de Ivan III, sucedeu o trono durante 1505 a 1533 e seguiu os passos de Ivan III. Desse modo, continuou com a expansão de Moscou e conseguiu anexar Pskov, Volokolamsk, Ryazan e Novgorod-Seversky. Além do mais, seu governo teve marca opressiva juntamente com a sua aliança com a Igreja ortodoxa (KORT,2008). 2.2.2.2. Ivan IV Ivan IV, filho de Ivan III, foi o sucessor do trono aos 3 anos de idade e seu período de reinado foi de 1533 a 1584. Ele é mais conhecido como Ivan, “o terrível” devido aos seus atos de violência e crueldade. Durante sua minoridade os boiardos tiraram vantagem e reasseguraram seus privilégios. Em 1547, aos dezesseis anos ele 15 foi intitulado Czar da Rússia e proclamou a Rússia autocrática, sendo o primeiro Czar oficial da Rússia (KORT, 2008). Como cita Kort, quatro eventos podem ter tido influência nas ações de Ivan IV: a morte de seu pai, o envenenamento de sua mãe, a morte de sua esposa e o incêndio em Moscou em 1547. As primeiras ações de seu reinado foram consideradas adequadas e possuíam como objetivo a eficiência do governo e do Estado, entre essas ações se pode citar: a conquista de Kazan, de Astrakan e da Sibéria. Através dessas conquistas, Ivan IV logrou criar um Estado centralizado com forte influência militar. Por conseguinte, em 1556, ele criou o Oprichnina, exército destinado a destruir aqueles que se opusessem ao Czar. O maior massacre contra a oposição aconteceu em 1570 em Novgorod causado pelo Oprichnina. Após esse evento, Ivan continuou com tortura e violência extrema a oposição, porém, em 1584 o Czar veio a falecer. 2.2.2.3.Tempos de dificuldades Após a morte de Ivan IV, o seu filho, Fyodor II, tornou-se o Czar da Rússia em 1584. Entretanto, como é mencionado por Kort, Fyodor não tinha interesse no governo, à vista disso, a função de governador recai para Boris Godunov, o qual durante seu governo logrou com que o país se recuperasse economicamente. Em 1598, Fyodor II faleceu e não tinha descendentes para continuar a sua linhagem e o único irmão de Fyodor II, Dmitry, supostamente havia falecido. Sendo assim, Boris Godunov tornou-se o novo Czar em 1598. Godunov era um bom governante, mas possuía vários inimigos. Em 1601, houve uma grande seca, o que levou o país a dois anos de fome. Em 1604, surgiu um homem que dizia ser Dmitry que havia falecido, irmão de Fyodor II; ele invadiu a Rússia com tropas polonesas. Nesse meio-tempo, Godunov acabou falecendo e seu filho, sucessor do trono, foi morto (KORT, 2008). Logo após a morte de Godunov, o primeiro 'falso’ Dmitry assumiu o poder através do suporte dos poloneses e a dissuasão dos russos, mas terminou morto em 1606. Isto posto, Vasily Shiusky foi colocado no poder pelos Boiardos até 1610 e logo foi substituído por um pequeno grupo de boiardos, esse grupo tinha como inimigos dois grupos armados que os cercava, sendo eles, os poloneses e um segundo ''falso” 16 Dmitry. No entanto, esse grupo de Boiardos tomou a decisão de colocar o filho do rei polonês, um católico, como czar. Essa situação não agradou parte dos russos e nem a igreja ortodoxa e por esse motivo surgiu uma rebelião (KORT, 2018). Em 1613, os poloneses foram forçados a deixar o poder e Zemsky Sobor (parlamento) elegeu Michael Romanov como o próximo Czar e com essa eleição iniciou-se o período da dinastia Romanov. 2.2.3. A Dinastia Romanov 2.2.3.1. Fyodorovich e Aleksey da Rússia A dinastia Romanov durou 300 anos, teve seu início no momento em que Mikhail Fyodorovich foi eleito ante ao parlamento Zemsky Sobor como novo Czar em 1613. Como menciona-se pela Boris Yeltsin Biblioteca Presidencial, o principal objetivo do governo de Fyodorovich foi estabilizar o país após os "Tempos de Dificuldades”1. Durante seu reinado a Rússia conquistou quase toda a Sibéria; por volta de 1645 a Rússia teria estendido seu território dos montes Urais até o Oceano Pacífico. Em 1645, após a morte de Mikhail, seu filho, Aleksey da Rússia assumiu o cargo de Czar até 1676. De acordo com a Boris Yeltsin Biblioteca Presidencial, o principal objetivo do governo de Aleksey foi a reposição do tesouro. Além do mais, como citado por Boris Yeltsin Biblioteca Presidencial: O maior sucesso da política externa de Aleksey foi a reunificação da Ucrânia e da Rússia (1654) e o retorno das antigas terras russas – Smolensk, terra de Seversky com Starodub e Chernigov (1667). Continuou o desenvolvimento da Sibéria, onde novas cidades foram fundadas: Nerchinsk (1658), Irkutsk (1659), Selenginsk (1666). (BORIS YELTSIN BIBLIOTECA PRESIDENCIAL, tradução nossa). 2.2.3.2. Pedro I da Rússia 1 O Tempo das Dificuldades foi um período conturbado da história russa, sendo marcado por fome, guerras, violência generalizada e disputas dinásticas. A Rússia foi invadida por tropas estrangeiras da Polônia e Suécia enquanto o trono era disputado. A disputa pelo trono aconteceu porque não havia herdeiros diretos ao trono da dinastia Rurik (BRASIL ESCOLA, [s.d.]). 17 Em 1676, Fyodor III, filho de Aleksey, ficou no poder por um curto período. Aleksey tinha dois filhos com duas esposas diferentes, os dois menores de idade eram os descendentes para substitui-lo no poder. Contudo, através de um golpe de Estado, Sofia I, filha de Aleksey, tomou o poder como regente, e seus dois irmãos, Ivan e Pedro, permaneceram como Czares. Em 1689, Sofia I tentou tomar o poder absoluto e terminou sendo exilada. Sendo assim, diante da minoridade dos Czares, a mãe de Pedro passou a governar em seu lugar. Após a morte da mãe de Pedro em 1694 e também de Ivan em 1696, Pedro passou a governar a Rússia (KORT, 2008). Segundo Kort, o principal propósito do governo de Pedro foi a modernização da Rússia. A primeira crítica ao seu governo foi relacionada ao atraso do exército russo, assim sendo, uma de suas primeiras ações consistiu no envio de militares para a parte ocidental da Europa para que pudessem aprender novas tácticas de cunho militar. Seu almejo de crescimento da Rússia não parou e ele resolveu visitar diversos países da Europa para aprender sobre assuntos navais, culturais e institucionais. Ao retornar à Rússia, Pedro estava convicto que a Rússia deveria se modernizar e seguir os passos da Europa. Por conseguinte, no final do século 17, Pedro pôs início as suas reformas mesmo com a forte oposição. Primeiramente, ele mudou as regras de aparências, os russos deveriam seguir os padrões do europeu moderno; ele também mudou o calendário para o modelo juliano. Simultaneamente, Pedro continuava a melhorar e investir no exército e subsídios da Rússia. Além do citado, Pedro começou a preparar- se para expandir os portos russos. Através do Tratado de Nystadt, o primeiro e sucedido alvo foi a costa báltica que era dominada pela Suécia, tal fato marcou o início da Rússia imperial juntamente com o título de imperador assumido por Pedro (KORT, 2008). Em 1712, Pedro intitulou São Petesburgo como capital da Rússia, assim sendo, diversas reformas foram realizadas com o objetivo de tornar a cidade mais moderna e de estilo Europeu. No que tange as reformas administrativas, como indica Kort, Pedro deu grande atenção à parte financeira, sendo a maior reforma relacionada a coleção de impostos da população e a imposição de indústrias (KORT, 2008). 18 Pedro I morre em 1725 e sua esposa Catarina I, reina por 2 anos até a sua morte em 1727. Após Catarina I, o neto de Aleksey, Pedro II reina até 1730, ano de sua morte. Por conseguinte, um golpe de Estado leva ao trono Elizabeth, filha de Pedro I, ela fica no poder entre 1741 e 1762, durante seu reinado foram construídos diversos palácios e a Universidade de Moscou foi fundada. Após o governo de Elizabeth, esteve no poder o sobrinho de Elizabeth, nascido na Alemanha, Peter of Holstein-Gottorp (Pedro III), o qual reinou por um curto período até sua morte. 2.2.3.3. Catarina II Catarina II (r.1762-1796) começa seu reinado em 1762, no lugar de seu esposo Pedro III. Um dos principais objetivos de seu governo era expandir o poder e o Estado russo para a Europa. Portanto, Catarina II logrou expandir o território russo de 11.000 milhas a 305.794 milhas, como menciona Hoogenbom (2012, p.85, tradução nossa), “[...] Catarina assumiu os objetivos militares de seus antecessores enquanto ela expandia a Rússia para o sul em direção aos portos do Mar Negro, a oeste em direção à Polônia, e noroeste ao longo dos portos do Mar Báltico [...]”. Ela também trouxe a ocidentalização através de arte e educação a nação russa. Criou reformas onde concedeu, mais poderio a nobreza, consequentemente, diminuindo os problemas financeiros russos (HOOGENBOM, 2012). 2.2.3.4. Paulo I Paulo I, filho de Catarina II, sucedeu o trono e teve um curto reinado de 1796 a 1801. Paulo I tinha muitos inimigos e não era popular diante da população. Após cinco anos de reinado, foi morto e tirado do poder através de um golpe de Estado (KORT, 2008). 2.2.3.5. Século 19: Alexandre I Isto posto, em 1801, Alexandre I assume a posição de Czar após a morte de seu pai, Paulo I. O governo do novo Czar foi acompanhado das melhoras e da 19 extensão do setor educacional russo e também da expansão da religião no espaço governamental (KORT,2008). Em 1812, novas tensões passaram a surgir entre a França e a Rússia, devido a sucessão de Napoleão Bonaparte após a revolução francesa. Napoleão invadiu a Rússia com um exército no total de 600,000 soldados e conseguiu chegar em Moscou, na esperança de que um tratado fosse firmado entre as duas nações; no entanto, o seu exército foi forçado a recuar devido à falta de suplementos e a chegada do brusco inverno russo. Napoleão, então, retornou com menos de 30,000 homens a França (KORT,2008). Após o ocorrido e a história francesa, em 1814, Napoleão foi obrigado a abdicar do poder e o Tratado de Paris e o Congresso de Vienna passaram a estabelecer a paz e reorganizar os territórios conquistados por Bonaparte. Diante do exposto, Alexandre I almejava permanecer com grande parte da Polônia, contudo, outras nações ocidentais temiam a expansão da hegemonia russa e assinaram o tratado onde somente pequena porção da Polônia permaneceu com a Rússia (KORT, 2008). 2.2.3.6. Nicolas I Alexandre I morre em 1825, sem filhos, o trono iria automaticamente para seu irmão Constantine, o mais velho entre os irmãos que ainda estavam vivos. No entanto, foi preparado um golpe de Estado para que o irmão mais novo, Nicolas I, se tornasse Czar da Rússia. Desse modo, o lema do governo de Nicolas I era Autocracia, Nacionalismo e Ortodoxia. Uma das principais reforma de seu governo envolveu a criação de um código de lei compreensível e a criação da primeira Escola de Jurisprudência. Em 1825, uma onda de revoluções começou a tomar conta, nomeado “Revoltas de Dezembro", essa revolução foi falha e não prosseguiu. Por conseguinte, pelo temor de Nicolas I a outras possíveis revoluções, a organização "Departamento Terceiro” é formada e regulava a censura dentro do país (KORT, 2008). Em 1848, uma onda de revoluções vinha a tomar conta da Europa e nelas objetivam-se a caída da monarquia. Diante desse acontecimento, Nicolas I enviou soldados para derrubar a rebelião Húngara contra a Áustria. 20 De acordo com Kort, em 1853, após a conquista dos territórios da Moldávia e Valáquia, iniciou-se a guerra da Crimeia que perdurou por 3 anos. As aparentes causas envolviam o enfraquecimento da Turquia, o que consequentemente influenciava no crescimento da Rússia e na extensão e controle de seus territórios do Balcãs ao Mediterrâneo. À vista disso, forças turcas, inglesas e francesas invadem a Criméia. Entretanto, em 1855, Nicolas I vem a falecer e a Rússia se viu derrotada devido ao seu atraso militar em comparação as duas potências europeias. Em 1856, Alexandre II, sucessor do trono, assinou o tratado de Paris e retirou as tropas russas do Mar Negro, cessando a Guerra da Crimeia. 2.2.3.7. Alexandre II O governo de Alexandre II é marcado pelo início do liberalismo e reformas na Rússia. Alexandre II iniciou debates sobre a abolição da servidão e apesar da oposição, entre 1861 e 1866, o Manifesto da Emancipação libertou os servos. No que tange ao sistema judicial, Alexandre II, convocou uma investigação do sistema, o novo sistema criado contribuiu para a melhora do sistema judicial, nesse viés, de acordo com Carl Watts (1998, p. 3, tradução nossa): O comitê identificou cerca de 25 defeitos no sistema existente e propôs um número de soluções radicais. Estas incluíam a separação dos poderes judicial e administrativo; julgamento por júri para processos criminais; julgamento de pequenas causas por Juízes de Paz em juízos sumários; a introdução de publicidade completa em tribunais; e a simplificação do processo judicial. No que diz respeito à educação, o governo de Alexander trouxe diversos benefícios, as escolas primárias que antes eram controladas pela igreja, passaram a ser controladas pelo zemstva2 e as universidades passaram a ter sua autonomia. Ademais do aludido, a censura também foi flexibilizada e era planejado a criação de uma constituição (WATTS, 1998). 2 Zemstvo, órgão de autogoverno rural no Império Russo e Ucrânia; estabelecido em 1864 para fornecer serviços sociais e econômicos, tornou-se uma influência liberal significativa dentro do Império Russo (BRITANNICA, [s.d.]). 21 2.2.3.8. Alexander III Em 1881, Alexander II é morto por uma organização revolucionária terrorista. Seu sucessor é seu filho, Alexander III, o qual suspendeu as reformas liberais realizadas por seu pai. Seu reinado afirmou-se na repressão, na censura, na russificação e na estabilidade e paz. Alexander III era contra o liberalismo, dessa forma, a Okhrana, polícia secreta política, foi estabelecida com o fim de controlar a autocracia, essa organização tinha agentes por todas as partes os quais reportavam atividades que vinham de confronto ao regime autocrata. Além disso, a repressão foi instituída juntamente a Igreja Ortodoxa, onde acreditava-se que a reeducação da população seria a melhor forma para que revoluções não se iniciassem (KORT, 2008). Isto posto, através da política de russificação, Alexander III acreditava que poderia reposicionar a Rússia como centro do poder no leste Europeu, a qual havia recaído com as ideias e reformas liberais apresentadas por seu pai. A russificação constituía-se em uma nação patriótica com somente uma língua, uma nacionalidade e uma religião, como descreve Etty: “a população teve seus nomes russificados e foram forçadas a aprender a ler, falar e escrever russo” (p. 3, 2008, tradução nossa). Etty também cita que durante o governo de Alexander III não houve guerras e conflitos revolucionários, portanto, seu governo é caracterizado como estável e pacífico. Em contradição, na visão de Etty (p.5, 2008, tradução nossa): [...] a paz era uma ilusão. As medidas de Alexandre aumentaram o fosso entre o regime e o povo. Elas alienaram quase todos os grupos sociais, étnicos e grupo econômico no império; eles fortaleceram o mir – a instituição que impedia o crescimento econômico modernização; e restringindo os direitos do zemstva, tribunais, universidades e da imprensa, eles decepcionaram as ambições daqueles moderados que aprovaram as reformas pós-186 [...]. Além do mencionado, durante o governo de Alexandre III, iniciou-se a construção da rota transiberiana e a promoção da Industrialização pelo Estado, financiada por ingleses e franceses. Apesar dos diversos atentados a sua morte, Alexander III, morreu em 1894 de causas naturais e no trono sucedeu seu filho Nicholas II (ETTY, 2008). 22 2.2.3.9. O fim da dinastia Romanov e Nicolau II Nicolau II (1894-1917), foi o último imperador da Rússia, seu governo culminou no fim da autocracia e no início da revolução. Seguindo os passos do pai, autocrata, não era a favor do liberalismo e se apoiava na soberania divina. Segundo Benedini, a guerra russo-japonesa que ocorreu durante o governo de Nicolau II entre 1904 e 1905, demonstrou mais uma vez, como na guerra da Crimeia, o retrocesso da Rússia no poderio militar; foi considerada uma desgraça internacional e resultou em uma grande perda da Frota Imperial. Por conseguinte, uma marcha pacífica ao redor do palácio de inverno foi coordenada pela população russa, insatisfeita com as vidas tomadas pela guerra e com a piora das condições de vida, esse evento marcou o início da revolução de 1905. Nesse episódio, a população foi violentamente repelida pela guarda imperial e o evento ficou conhecido como Domingo Sangrento. O Domingo Sangrento levou a uma onda de greves e rebeliões por parte da população, o que forçou Nicolau a conceder direitos civis básicos ao povo e a estabelecer o Parlamento Imperial (Duma). No entanto, como cita Benedini (p.7, 2015): Entre 1906 e 1914 a Rússia teve uma caricatura de governo representativo: a primeira Duma foi dissolvida pelo czar quando esta apresentou propostas consideradas como demasiado radicais; a segunda, convocada quase um ano depois, em 1907, e que viu a participação tática dos bolcheviques, durou apenas quatro meses; a terceira e a quarta Duma já representavam apenas os interesses da aristocracia mais fiel a Nicolau. Nem as outras promessas, ou seja, aquelas liberdades civis e políticas que outrora bastaram a satisfazer a oposição liberal foram mantidas. Não houve atenuação dos controles policiais e sim sua intensificação [...]. 2.2.4. A Primeira Guerra Mundial A Primeira Guerra (1914-1918) que teve seu início durante o governo de Nicolau II, teve grande relação com a Revolução de Fevereiro de 1917. A Rússia entrou na Primeira Guerra Mundial apoiando a Inglaterra e a França em 1914. A guerra trouxe diversas mortes e consequências para a população russa, tendo em vista a despreparação russa em frente a seus oponentes. 23 Em fevereiro de 1917, diante das claras consequências da guerra: fome, inflação e mortes, levou a revolta do povo Russo em Petrograd, o quais clamavam o fim da inflação e o fim da guerra. Durante o protesto, soldados também se juntaram aos protestos e a capital foi tomada pelos protestantes. Consequentemente, em março de 1917, Nicolau II abdicou do poder em meio a grande guerra, após um ultimato concedido pela Duma, marcando o fim do império Romanov (KORT, 2008). 2.2.5. A Revolução Russa e o governo provisório Entre as causas da Revolução Russa pode-se mencionar o descontentamento da população com o governo autocrático que esteve presente por quase 300 anos e a Primeira Guerra Mundial que trouxe consequências drásticas a nação russa (KORT, 2008). Após a abdicação de Nicholas II, o governo provisório liderado pela nobreza tomou as rédeas do poder, e decidiu manter a Rússia na guerra. Esse governo não logrou resolver as principais problemáticas da população, sendo considerado um governo instável. Assim sendo, em outubro de 1917, o governo provisório é derrubado pelo popular partido de esquerda comunista Bolchevique, liderado por Lenin, tal evento ficou conhecido como Revolução Bolchevique (KORT, 2008). 2.2.6. O Governo Bolchevique e a Guerra Civil No início do governo Bolchevique, foi assinado o tratado de paz Brest-Litovsk com a Alemanha, cessando a participação russa na primeira guerra mundial. Como resultado, a Ucrânia, a Finlândia, o Báltico e a Polônia foram cedidos. Após o tratado e a cessão das terras, a oposição cresceu, antibolcheviques começaram a reunir tropas nacionalistas. A oposição foi chamada de "movimento branco" enquanto os Bolcheviques eram reconhecidos como "vermelhos”. Segundo Kort (2008, p. 159, tradução nossa): Os “brancos" não eram um único movimento, mas uma variedade de grupos divididos por crenças políticas divergentes, variando de socialistas a arquiconservadores e monarquistas. Quando a luta começou, os bolcheviques controlavam o centro do país, incluindo as principais cidades e centros industriais, enquanto os “brancos” tinham que operar na periferia, 24 seus exércitos separados por grandes distâncias e incapazes de coordenar suas campanhas. O Exército Vermelho era comandado por Leon Trotsky, os demais generais incluiram, Mikhail Frunze, Mikhail Tukhachevsky, Semyon Budyonny e Anton Antonov Obsenko. Quando a Primeira Guerra Mundial terminou em 11 de novembro de 1918, os ex-aliados da Rússia, particularmente Grã-Bretanha, França e Japão, também uniram forças com os brancos para acabar com o poder bolchevique. Em outubro de 1919, o general Nikolai Yudenich tentou capturar Petrogrado, mas o ataque falhou. o Exército Vermelho estava no comando do centro industrial e o Exército Branco não pôde derrotá-lo e assim sendo, as tropas do Exército branco foram retiradas no fim de 1920 (KORT, 2008). 2.2.7. O período soviético 2.2.7.1. A Rússia na União Soviética3 Em 1921 a Rússia estava em guerra 7 longos anos. Os comunistas acabaram vencendo a guerra, mas o país estava em péssimo estado. Devido a guerra civil e o governo instável, a Grande Fome de 1921 e 1922 trouxe grande devastação e milhares de pessoas morreram de fome e doenças (KORT, 2008). Nesse período também, rebeliões armadas surgem nas áreas rurais e a ameaça mais perigosa ao domínio bolchevique foi a Rebelião de Kronstadt em 1921. A elite de marinheiros de Kronstadt se rebelou contra o governo Bolchevique com o intuito de manter o que se havia logrado durante a Revolução Russa. Os líderes soviéticos os identificaram como uma grave ameaça e os derrubaram (KORT, 2008). 3 Durante os seus sessenta e nove anos de existência, o império soviético foi constituído por quinze países, entre eles Rússia, Letônia, Lituânia, Estônia, Geórgia, Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Moldávia, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia e Usbequistão. Estes países, unidos, criaram a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, conhecida como União Soviética, que existiu de 1922 a 1991. Nesse período, a URSS foi considerada uma das maiores e mais poderosas potências mundiais, sendo a segunda maior força militar (POLITIZE, 2019). 25 Em 1921, a Nova Política Econômica (NEP) foi proclamada por Lenin como um meio de restabelecer a economia russa após os 7 anos de guerra civil. Esta medida abriu caminho para o capitalismo, permitindo o estabelecimento da iniciativa privada e a cobrança de impostos. Graças a essa nova política, a economia foi capaz de alcançar os níveis de antes da guerra em 1928 (KORT, 2008). Em 1929, após a morte de Lenin e do envio de Trotsky ao exilio, Stalin chegou a ser o governante da União Soviética e construiu um governo totalitário. Seu primeiro plano quinquenal (1928-1932) previu incentivar a industrialização e fazer da Rússia uma potência industrial em apenas quatro anos. Assim sendo, transformou fazendas individuais em fazendas coletivas, famílias trabalhavam juntas sob supervisão de oficiais do partido comunista. O caos do processo e o clima resultou na Grande Fome de 1932-33, onde especialmente na Ucrânia, morreram mais de 5 milhões de pessoas (KORT, 2008). O Grande Terror começou em 1934 depois que os oponentes políticos de Stalin foram assassinados. O novo sistema terrorista foi organizado e implementado pela polícia secreta. Os rivais políticos de Stalin, intelectuais, médicos, oficiais do exército e algumas minorias étnicas foram processadas durante o processo de expurgo de 1936 (KORT, 2008). Portanto, o governo de Stalin foi considerado de evolução e terror, houve grande evolução no processo industrial e simultaneamente somou-se aproximadamente 15 milhões de mortes, sendo considerado um governo composto de fome e genocídio. Stalin morreu, após sofrer um derrame, em 5 de março de 1953 (KORT, 2008). 2.2.7.2. A União Soviética na Segunda Guerra Mundial Na década de 1930, o sistema criado pelo Tratado de Versalhes na Primeira Guerra Mundial, começou a ruir, e o clima político na Europa começou a decair. Hitler, ditador da Alemanha, estava em busca de expansão de seus territórios e dessa forma, passou a tomá-los a força (KORT, 2008). Stalin tinha conhecimento que a União Soviética não estava preparada para entrar em guerra e tampouco queria perder seus territórios. Por conseguinte, em 1939, 26 o Pacto Nazi-soviético de não agressão mútua, entre a Rússia e a Alemanha, foi assinado, com objetivo mútuo de atacar suas esferas de interesse na Europa. O primeiro alvo foi a Polônia e Stalin invadiu a metade oriental do território polonês (KORT, 2008). Em 1941, Hitler decidiu quebrar o pacto nazi-soviético e atacou a Rússia, esse conflito ficou conhecido como Grande Guerra Patriótica. A União Soviética não estava preparada para a guerra, e a tática de Hitler foi um sucesso. Após cinco meses, todas as terras entre Leningrado e Rostov foram invadidas. Hitler também não conseguiu conquistar Moscou no inverno de 1941. O ponto de virada, na Segunda Guerra Mundial, foi a derrota da Alemanha na Batalha de Stalingrado e o exército de Hitler foi forçado a se retirar. Em fevereiro de 1945, os líderes aliados se encontraram na Conferência de Yalta na Crimeia, onde a ordem mundial do pós-guerra foi acordada (KORT, 2008). 2.2.7.3. A Guerra Fria A Segunda Guerra Mundial fez com que a União Soviética se destacasse como uma nação de grande poder para os Estados Unidos, como alude KORT (2008, p. 190, tradução nossa): O Exército Vermelho estava montado em todos os países da Europa Oriental e controlava quase metade da Alemanha pré-guerra, incluindo o território a mais de 160 quilômetros a oeste de Berlim. Os partidos comunistas leais a Moscou eram grandes forças políticas na França, Itália e Grécia. Nunca, mesmo depois das Guerras Napoleônicas, Moscou teve o destino de grande parte da Europa em suas mãos. Portanto, é notório que a Segunda Mundial alterou a ordem mundial de poder. No pós-guerra, a cortina de ferro dividiu o leste e o Oeste, Stalin estabeleceu governos comunistas na Europa Oriental e formou o Bloco Oriental dos estados satélites. A situação da Europa no cenário pós-guerra era de fome, imigração e desestabilização. Portanto, em 1947, os Estados Unidos lançaram o programa de ajuda financeira, denominado Plano Marshall, para recuperar a Europa e impedir a expansão soviética. Pela aproximação dos aliados causada pelo Plano Marshall, a 27 União Soviética criou a Comecon. De acordo com Picinin (apud Magnoli 2004) “A criação do Conselho Econômico de Assistência Mútua (Comecon) soldou as economias do Leste Europeu à União Soviética, separando-as das economias de mercado da Europa Ocidental”. Seguindo a Doutrina Truman, os Estados Unidos visaram conter a propagação do comunismo nos países do Terceiro Mundo que foram apoiados e financiados pela União Soviética. Segundo Picinin (2017, p. 1136): A Doutrina Truman de 1947 foi o primeiro plano de universalização norte americano. Os argumentos usados pelos chefes de estado concentravam-se seus argumentos na política industrial e financeiro à luta do anticomunismo no âmbito da hegemonia mundial. O governo de Truman marca o início da Guerra Fria e a política universal dos E.U.A. Em 1949, os Estados Unidos e seus aliados da Europa Ocidental formaram uma aliança militar comum, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). A União Soviética respondeu em 1955, formando o Pacto de Varsóvia. Berlim foi o símbolo da Guerra Fria quando, em 1961, o líder soviético Nikita Khrushchev, ordenou a construção do Muro de Berlim entre Berlim Ocidental e Oriental. A parede foi exposta por vinte e oito anos. 2.2.7.4. O governo de Khrushchev: descongelamento Após a morte de Stalin em 1953, houve um conflito entre seus ministros, Lavrenty Beria, Georgy Malenkov e Nikita Khrushchev sobre quem tomaria o poder. Nos anos procedentes, Khrushchev conseguiu ganhar vantagem. Em 1956, a União Soviética enfrentou uma revolta popular, contra a hegemonia soviética, na Hungria, conflito que causou de acordo com Taubman (2006, p.270) [...] cerca de 20.000 vítimas húngaras e 1.500 soviéticas [...]. No entanto, a popularidade de Khrushchev cresceu. O governo de Khrushchev ficou conhecido como o Thaw, traduzida por descongelamento. Essa definição de governo passa a ser observada no XX Congresso do Partido em 1956, no discurso secreto de Khrushchev, ele criticou Stalin 28 por sua tirania e assim sendo, tornou-se evidente que o governo teria mudanças e um processo de desestalinização (TAUBMAN, 2006). Krushchev tinha como prioridade as reformas na agricultura, logo de início, como cita Taubman (2006, p. 278, tradução nossa) “[...] ele rapidamente encontrou os limites ideológicos do sistema soviético, resistência e comportamento burocrático que ampliavam seus próprios erros [...]”. O plano de Khrushchev foi de revolucionar a agricultura russa através do cultivo extensivo de milho. Nos primeiros anos, suas reformas tiveram sucesso, de acordo com Taubman (2006, p. 279, tradução nossa) “[...] a produção agrícola de 1959 aumentou 8,5% ao ano e 51% no geral [...]”. Contudo a partir de 1960, a agricultura começou a demonstrar grandes desastres, no que tange a esse período, Taubman menciona: [...] 1960 provou ser o pior ano para a agricultura desde a morte de Stalin, e apesar das previsões otimistas no verão de 1961, a colheita daquele outono não foi melhor. [...] A colheita de 1963 foi desastrosa: apenas 107,5 milhões de toneladas contra 134,7 em 1958; as Terras Virgens produziram seus menores colheita em anos [...]. (2006, p. 279, tradução nossa). Enquanto os desenvolvimentos durante a guerra fria, em 1957, a URSS colocou em órbita o primeiro satélite do mundo, o Sputnik 1. Então, em 1961, o russo, Yuri Gagarin, tornou-se o primeiro homem a chegar ao espaço. No que tange às relações sino-soviéticas, os líderes tiveram seus desentendimentos e após a década de 1960, houve um distanciamento e havia mais competição do que cooperação entre a China e a União Soviética. Já nas relações dos Estados Unidos com a União Soviética, em 1962, a URSS resolve mandar misseis a Cuba para coagir o governo Estadunidense e prevenir uma possível invasão norte americana, tal ação resultou em um golpe decisivo no prestígio soviético (TAUBMAN, 2006). Em 1964, Khrushchev foi obrigado a renunciar e o poder foi entregue a Leonid Brezhnev. Apesar de ambíguo, o governo de Khrushchev foi positivo para a União Soviética e trouxe um sinal de evolução para aquela sociedade, tomando em conta os tempos de terror de Stalin. Na visão de Taubman (2006, p. 291, tradução nossa), “[...] as reformas do período de Khrushchev, desajeitadas e erráticas que fossem, 29 permitiram que uma nascente sociedade civil tomasse forma onde o stalinismo havia criado um deserto [...].” . 2.2.7.5. O governo de Brezhnev: era da estagnação O governo de Brezhnev ficou conhecido como “Era da Estagnação”, onde a União Soviética tornou-se política, economicamente, e socialmente atrasada, e a necessidade de reformas tornou-se cada vez mais evidente. O governo de Khrushchev foi substituído pela liderança conjunta de três parlamentares: Leonid Brezhnev, Alexey Kosygin e Nikolay Podgorny, eles acreditavam que as políticas e reformas de Khrushchev deveriam ser revertidas. As primeiras preocupações e ações giraram em torno da economia, principalmente, na melhoria do padrão de vida dos cidadãos. Por conseguinte, houve maior investimento na agricultura, aumento na produção de bens de consumo e a extensão de benefícios sociais (KORT, 2008). Houve reformas no início, mas, em poucos anos, Brezhnev inicia em seu pleno poder. A economia vinha decaindo pelos respectivos fatores: grande parte do produto nacional era redirecionado aos militares; o mercado não se baseava em oferta e procura e sim, em manter suas metas de produção, eliminado a possibilidade de lucro; a agricultura compartilhada não andava bem, sem investimentos e pelas más condições temporais, fez-se necessário a importação de grãos. Consequentemente, a economia passou a retardar-se a partir de 1970 e o padrão de vida do cidadão soviético decaiu. Esse período ficou conhecido como Era da Estagnação (KORT, 2008). O período entre 1969 e 1972 é conhecido como “Détente”. A União Soviética e os Estados Unidos fizeram vários esforços para conter mutuamente as armas e minimizar conflitos. Outro destaque desse período foram os Acordos de Helsinque de 1975, quando os países ocidentais concordaram em aceitar a União Soviética hegemonia sobre a Europa Oriental em troca de mais direitos civis para seus habitantes. Foi reforçada pela Guerra do Afeganistão (1979-89), onde a União 30 Soviética não conseguiu conquistar o Afeganistão devido à forte influência estadunidense no suprimento de munições (KORT, 2008). Brezhnev faleceu em 1982 e assumem sua posição respectivamente Yuri Andropov e Kostantin Chernenko que também vieram a falecer após pouco tempo de governo. Por conseguinte, Mikhail Gorbachev foi escolhido para ser o sucessor do governo (KORT. 2008). 2.2.7.6. O governo de Gorbachev e o fim da URSS Gorbachev fazia parte do Partido Comunista desde 1970. Em 1985, após a morte de Chernenko, ele foi eleito pelo partido para ser secretário geral. Durante o primeiro ano de governo, Gorbachev decidiu tomar como tempo de entendimento da estrutura do país e decidiu na substituição dos funcionários do partido. (KORT, 2008). Em abril de 1986, ocorre a explosão dos reatores de Chernobyl o que levou a contaminação do ar, prejudicando cidadãos da Ucrânia e Bielorrússia. Tal fato manchou a imagem do governo e levou a criação de políticas mais radicais (KORT, 2008). O termo Perestroika passou a ser utilizado no viés da reestruturação da economia e se expandiu quando as ações passaram a ir além do setor econômico e adicionou-se os termos: glasnost, democratizatsia e novoe myshlenie. Segundo Kort, glasnost sugeriu a redução da censura. Já democratizatsia indicou: “[...] abrindo o sistema político soviético, permitindo alguma escolha de candidatos nas eleições partidárias e estaduais. Não significava a democracia como entendida no Ocidente. Foi uma ferramenta para envolver o público como um todo no esforço de reforma [...]” (KORT, 2008, p. 224, tradução nossa). Além do mencionado, novoe myshlenie estaria relacionado a uma reforma nas relações exteriores (KORT, 2008). Em 1987, as críticas contra o governo emergiram e as políticas implementadas resultaram no declínio econômico. Isto posto, autonomias e independências passaram a emergir em regiões como Letônia, Lituânia, Estônia e Ucrânia. Desde então, Gorbachev passou a implementar reformas políticas drásticas: ele substituiu o parlamento soviético com diversos membros parlamentares, criando o Congress of People’s Deputies, a partir da visão de Kort (2008, p.226, tradução nossa): “O CPD 31 constituiu uma mudança política radical porque seus membros seriam eleitos sob um sistema que permitia a escolha de candidatos, algo inédito na história soviética.” Em 1989, houve a primeira eleição nacional do CPD e os políticos eleitos foram Andrei Skharov e Boris Yeltsin e os regimes comunistas passaram a ter suas decaídas. A decisão de retirada de tropas do Afeganistão marcou os últimos momentos da Guerra Fria. Em 1991, a primeira eleição pública para presidente da República Russa ocorreu e a população elegeu Boris Yeltsin, o qual havia renunciado sua posição no partido comunista. Apesar de diversas tentativas por parte de Gorbachev, através de um golpe de Estado, ele foi afastado de sua posição pelos membros do seu partido. O golpe caiu em questão de dias devido a resistência popular liderada por Yeltsin e também pelas declarações de independência. Em seguida, Yeltsin tomou a posição de chefe da República Russa. No início de dezembro de 1991, foi acordada a abolição da União Soviética entre Yeltsin e os presidentes da Ucrânia e Bielorrússia. Portanto, no fim de dezembro, 11 repúblicas da antiga URSS declararam independência. A União Soviética deixou de existir oficialmente em 31 de dezembro de 1991 (KORT,2008). 2.2.8. A Rússia pós-União Soviética 2.2.8.1. O governo Yeltsin Com o fim da União Soviética, a Rússia ainda possuía grande extensão territorial e populacional, fazendo-se necessário a implementação de reformas em todos os seus setores. A primeira reforma de Yeltsin foi relacionada a economia de mercado, acabando com o controle de preços do Estado sob os bens e serviços. A privatização de empresas foi o próximo passo. Todavia, a inflação explodiu; a comunidade russa advinda do período soviético não tinha suficiente conhecimento para prosseguir com negócios (KORT, 2008). A popularidade de Yeltsin também veio a decair com o conflito na Chechênia. O conflito teve seu início em 1994 devido a declaração de independência da 32 Chechênia; Yeltsin mandou tropas militares para tentar reconquistar a Chechênia. O conflito sangrento teve a duração de dois anos. Em 1996, um cessar-fogo foi declarado e Yeltsin assinou um tratado de paz com o presidente Aslan Maskhadov, concedendo à região um alto grau de autonomia. Em 1997, uma nova constituição foi adotada e eleições foram realizadas, dando início a um período de relativa estabilidade (KORT, 2008). Mesmo com a perda de sua popularidade Yeltsin conseguiu vencer um segundo turno como presidente, durante o respectivo período vivenciou-se diversas crises políticas e econômicas. Yeltsin continuou a enfrentar a oposição da Duma, dominada pelos comunistas, os quais atrapalhavam certas partes das reformas. Em 1998, a Rússia foi atingida por uma crise econômica e o rublo despencou. Em 1999, Yeltsin sofreu um impeachment, mas resistiu. Em dezembro de 1999, Yeltsin renunciou seu cargo e o poder ficou nas mãos de Vladmir Putin que era o primeiro- ministro na época (KORT, 2008). 2.2.8.2. Vladmir Putin Vladimir Vladimirovitch Putin é o atual presidente da Rússia, ex-agente da KGB do Ministério das Relações Exteriores e ex-chefe do Serviço Secreto Russo. Putin foi presidente de 2000 a 2008 e foi primeiro-ministro duas vezes. A ascensão de Putin ao poder em 2000, após a renúncia de Yeltsin, representou um divisor de águas na política russa. Putin se tornou presidente após a renúncia de Yelstin em 1999, mas também venceu seu primeiro turno eleitoral com pouco mais de 50% dos votos em 2000. Durante o seu primeiro turno, Putin tentou reestruturar o governo russo e suas regiões, dando mais poder a presidência: Por decreto presidencial Putin na primavera de 2000 estabeleceu sete distritos federais, cada um liderado por um nomeado presidencial, para supervisionar as 89 regiões da Rússia. Uma lei aprovada no verão de 2000 [...] privou os governadores regionais e presidentes de repúblicas de seus assentos no Conselho da Federação; doravante, eles tiveram que nomear um representante uma nomeação sujeita à aprovação das assembleias regionais ou da república. Enquanto isso, o governo usou ameaças e poder policial para tomar o controle de importantes meios de comunicação de oligarcas que se opõem às políticas de Putin. (Kort, 2008, p. 242). 33 No decorrer do governo Putin houve o primeiro crescimento econômico após a queda da URSS, como cita Milosevich (2018, p. 3, tradução nossa): Em 1999, o PIB cresceu 5,4%, e em 2000 subiu para 8,3%. Ironicamente, o aumento não foi devido às políticas econômicas de Putin, mas à desvalorização do rublo em 1998, que estimulou gastos com produtos domésticos e aumento dos preços do petróleo. A Rússia no comando de Putin ao abandonar as ideias neoliberais trazidas por Yeltsin tornou-se um Estado moderno, como menciona Milosevich (2017, p.3, tradução nossa) “um regime autoritário que impulsiona a modernização econômica, controlando recursos naturais e a distribuição da produção, e que graças a isso se mantém no poder.”. Nesse seguimento, no que diz respeito as estratégias de Putin no quesito econômico, pode-se mencionar a sua decisão de colocar em prática duas ações que objetivavam uma interação mais abrangente com o mundo: primeiramente, ele avistou os problemas que afetavam a economia sob Yeltsin; posteriormente, ele executou uma série de ataques aos oligarcas, sendo esses ataques uma tentativa de assegurar maior poder (WORTH, 2005). No que tange diretamente às políticas de Putin, segundo Worth, estas conseguiram grande apoio das coalizões de centro. Em 2001, Unity e Fatherland-All Russia foram criadas para prover uma força centrista na sociedade russa e para instalar uma cultura hegemônica diante da pós-União Soviética. Através da aliança em Fatherland- All Russia e Unity, a democracia foi atingida e possibilitou que o governo restringisse o poder para determinados grupos, ato que se justificaria pelo fato de que foram colocadas leis restringindo o número de partidos políticos no país. O ataque às oligarquias fortaleceu a construção de uma estratégia hegemônica juntamente à sociedade política russa. Putin ganhou apoiadores e investidores na Rússia com sua tentativa de acabar com a estrutura de monopólios para facilitar requerimentos institucionais, controlando a inflação e assegurando investimentos estrangeiros. Não obstante, os ataques de Putin às mídias, à imprensa livre e a grupos 34 de direitos humanos, podem ter acarretado uma maior concentração de poder presidencial (WORTH, 2005). Segundo Kort, em 2005, Putin é reeleito para seu segundo turno e passou a enfocar em reformas econômicas de livre mercado e inseriu incentivos para empresas internacionais se instalarem na Rússia. Além disso, a estatização de empresas cresceu, principalmente na indústria de petróleo, sendo a principal fonte de exportação. Isto posto, até 2008, a economia russa cresceu e se estabilizou devido a exportação de petróleo e gás natural. Conforme o autor, durante sua ascensão no poder, Putin organizou seu time econômico, o qual era encarregado de manter a macroeconomia estável, reduzindo a inflação através da continuação do processo de privatização e do fortalecimento do aparelho econômico do Estado. Ademais, quando Putin passou a introduzir um sistema de impostos baseado em uma baixa taxa fixa com baixos impostos corporativos, a Rússia começou a possuir um mercado econômico mais extenso. Ademais do mencionado, em 2005, o sistema político russo foi definido como democracia soberana, sendo um exemplo de Estado Híbrido, como aponta Milosevich (2018, p.4, tradução nossa): Esse modelo “democrático” é um exemplo de Estado híbrido, que atende aos requisitos da democracia formal – eleições (relativamente) livres, sistema multipartidário, livre mercado e liberdade de expressão teórica – mas impede a consolidação da democracia substancial por meio de instituições "invisíveis" como o serviço secreto, controle de mídia e permissividade com a corrupção, e assim perpetuar poder autoritário personalizado e oligarquias econômicas. Worth menciona que as estratégias implementadas por Putin teriam como fim a tentativa de construir uma sociedade civil hegemônica consolidada com a globalização. Durante sua ascensão, conforme o autor, Putin fez com que fatores regionais fossem unidos em direção a uma maior homogeneização ao realizar mudanças na esfera política; manter um crescimento na economia e reinserir ícones nacionais. Isto posto, o autor ressalta que o comprometimento de Putin com a cultura pode ser visto como um exemplo de transformismo. A imagem deixada por ele diante da 35 mídia nacional acompanhada do ‘Russian way’ e do patriotismo, lhe permitiu adquirir apoio dos nacionalistas e da oposição comunista. Putin se apoiava em táticas de Maquiavel a fim de aumentar seu potencial de líder, e um exemplo seria o uso tático da mídia, em que controlava a sua imagem (WORTH, 2005). Segundo Worth, a restauração do hino soviético e das cabeças das águias como emblema do Estado, parecia ter sido uma das mais simbólicas concessões nacionalistas, concedendo ainda, reconhecimento a outros símbolos da URSS e do czarismo. O governo de Putin ameaçava a oposição, pois aparentava apoiar a política do comunismo enquanto também apoiava economicistas reformistas liberais. Contudo, conforme o autor, essa restauração cultural da Rússia soviética obteve um efeito positivo na popularidade de Putin; nas eleições de 2004, ele recebeu mais votos de aposentados e de ex-veteranos soviéticos, os quais costumavam apoiar candidatos pró comunismo. De 2008 a 2012, Putin não podia se reeleger como presidente e seu designado foi Dmitry A. Medvedev que colocou Putin como primeiro-ministro. O governo de Medvedev teve enfoque na modernização da economia russa, introduzindo uma série de reformas econômicas. Ele também procurou melhorar as relações da Rússia com o Ocidente e assinou vários acordos importantes com os Estados Unidos e a União Europeia. Putin voltou ao seu cargo de presidente em 2012 e segue no cargo atualmente, estando em seu quarto mandato. 36 3. POLÍTICA EXTERNA 3.1. A Política Externa e a tomada de decisão De acordo com Bojang, a Política externa pode ser definida como uma estratégia por parte do governo formulada para alcançar os objetivos nacionais na esfera internacional. A Política Externa é influenciada por fatores externos e domésticos. No que tange aos fatores externos podem ser considerados: o sistema internacional, o direito internacional, as organizações internacionais, as alianças e estratégia militar. Já no escopo doméstico estão incluídos: cultura e história; geografia, cultura e população; desenvolvimento econômico e recursos naturais; capacidade militar; sistema político; personalidade do líder; partidos políticos; imprensa e opinião pública e ciência e tecnologia. Isto posto, o processo de tomada de decisão na Política Externa é essencial para compreender a maneira com a qual cada Estado age através de sua Política Externa e os seus resultados. De maneira geral, a tomada de decisão pode ser influenciada por atores governamentais e não governamentais. Nesse viés, Graham Allison apresenta em sua obra, Essência da Decisão, modelos de tomada decisão. O primeiro modelo apresentado é o modelo racional, onde o governo nacional escolhe ações que objetivem suas metas e objetivos estratégicos, dessa forma, o Estado é considerado um ator unitário o qual já possui suas metas estabelecidas e um conjunto de opções para poder tomar a melhor decisão através da análise do custo das possibilidades. O processo seria considerado direto e geralmente é usado em crises. No que diz respeito ao segundo modelo elucidado, o modelo organizacional, de acordo com o autor, nesse modelo não existiria o processo de identificar metas, as ações estariam baseadas em reações padrões de casos anteriores. Sendo assim, a decisão final dependeria do poder das partes burocráticas. Já o terceiro modelo citado seria o pluralista, as decisões desse modelo se baseariam na barganha através da mistura de interesses das partes governamentais e domésticas. 37 3.2. A Rússia na Política Externa 3.2.1. A Política Externa no período pós-soviético Como cita Tsygankov, devido à queda da União Soviética, fizeram-se necessárias reformas em relação à nova identidade nacional e política externa da Rússia, tendo em vista que a Rússia ficou no lugar de nação sucessora do bloco. A visão durante o governo de Gorbachev (1985-1991) era contra a perspectiva pró- ocidental, de acordo com CIDOB International Yearbook, a política externa era baseada na cooperação em vez de um ato de equilíbrio militar. No entanto, essa visão tornou-se de cunho pró-ocidental através das ideias liberalistas do respectivos presidente e primeiro-ministro, Boris Yeltsin e Andrei Kozyrev. A partir de 1992, as primeiras ações em prol das reformas foram relacionadas a uma reforma econômica radical, segundo Tsygankov (2013, p.56, tradução nossa) sobre a perspectiva russa, “A Rússia deveria parar de se preocupar com poder militar e geopolítica e, em vez disso, investir seus recursos na criação de uma economia e de um sistema político modernos.”. Posteriormente, assumiu-se que a Rússia deveria fazer parte das organizações internacionais ocidentais, sendo considerado um elemento crucial para a integração ocidental. Além do mencionado, a base da política externa se tornaria relacionada aos interesses nacionais e não mais a noções ideológicas. Contudo, em 1993, críticas surgiram contra a política externa vigente, sugerindo uma política externa mais independente, além disso, as políticas pró-ocidentais passaram a falhar devido a expansão da OTAN e a guerra na Iugoslávia. Por conseguinte, em 1996, Kozyrev renunciou ao seu cargo de primeiro-ministro e assumiu seu lugar Yevgeniy Primakov. O plano Primakov consistiria em adquirir uma visão de mundo multipolar e nacionalismo pragmático, além de estreitar laços com as nações ocidentais com o fim de melhorar a posição de poder da Rússia, como cita Tsygankov (2013, p.91, tradução nossa) sobre o entendimento de Primakov: [...] a Rússia tinha uma tendência a se tornar dependente dos mais fortes e, para preservar seu significativo papel geopolítico global, deveria perseguir o objetivo de se tornar um polo de poder independente. [...] O mundo unipolar 38 não seria liberal nem democrático, apesar das promessas americanas, e a Rússia não deveria sucumbir à retórica do mais forte. Em vez disso, deve usar uma combinação de políticas de cooperação e equilíbrio com o objetivo de minar a unipolaridade. Diante do exposto, a reposta de Primakov a expansão da OTAN foi a adaptação, como alude Tsygankov (2013, p.98, tradução nossa), “A Rússia teve pouca escolha a não ser trabalhar para estabelecer laços diplomáticos e políticos mais estreitos com a aliança [...]” e, dessa forma, em 1997, foi firmado entre a OTAN e a Rússia a Lei Fundadora sobre Relações Mútuas, Cooperação e Segurança entre a Rússia e a OTAN. Além do exposto, a Rússia também se juntou ao conselho conjunto permanente da OTAN. Entretanto, essa aproximação com a OTAN não proporcionou a Rússia o poder de veto que buscava e resultou numa perda do poder de barganha. 3.2.2. A Política Externa no governo de Putin Putin se encontra no poder há mais de 20 anos. Desde a queda da União Soviética, a Política Externa vem se transformando juntamente com a identidade nacional russa. Durante o governo Putin, houve diversas reformas as quais resultaram em uma estabilidade e uma crescente economia. Para atingir esses resultados, Putin utiliza o putinismo como sistema político, esse regime político tem sua base no conservadorismo e estatismo, onde também se faz presente grande nacionalismo, populismo e lealdade ao presidente. Além do mencionado, o sistema político putinismo é baseado no modelo racional e visa promover a estabilidade e a ordem na Rússia e no exterior. Esse sistema de governo é visto como uma forma autoritária de governo, enfatizando o controle sobre a mídia, a sociedade civil e a economia (MILOSEVICH, 2018). A definição conservadora do regime de Putin é descrita por Fish (2017, p.62, tradução nossa) “O regime de Putin é, antes de tudo, conservador no sentido exato: Prioriza a defesa do status quo e se opõe a todos os programas de transformação”. Além disso, o governo Putin também seria considerado conservador no sentido ideológico pelo seu estimo aos valores tradicionais com a adoção de posições contra a igualdade de gênero e contra a comunidade LGBT. 39 A base da Política Externa russa é o realismo geopolítico e o espaço pós- soviético seria um de seus vitais interesses. No que tange as ordens mundiais, de acordo com a política externa russa, o sistema multipolar seria o mais adequado, tendo em vista que a Rússia estaria entre os grandes poderes e almejaria ser tratada como tal. Além do exposto, o governo russo acredita que mesmo que a Rússia possua menos recursos econômicos, o país consegue alcançar seus objetivos e interesses através de sua política externa conservadora e nacionalista. Isto posto, no que diz respeito a sua esfera de influência, Van Herpen cita os componentes do soft-power russo: Mimesis, uma cópia das práticas do ocidente; reversão, tentativas de bloquear as influências do ocidente; Invenção, estratégia para a criação de novas táticas de soft-power, gerenciamento de meios mediáticos com o fim de controlar as suas “verdades”. De acordo com Roberts, a política externa de Putin gira em torno da identidade russa que é influenciada pelas relações com o ocidente, principalmente, no que diz respeito à negligência ocidentalista ao não considerar a Rússia como um Estado na esfera de poder. Além disso, o seu governo perpetuaria o patriotismo e segundo Roberts (2017, p. 6, tradução nossa) “Putin usa esse sistema a seu favor, para manter seus amigos leais ricos e a si mesmo no poder”, sendo assim, as ações na Crimeia poderiam ser consideradas como uma forma de fortalecimento ao governo nacionalista de Putin, posicionando-o como defensor de sua nação. O principal elemento impulsionador da política externa russa é tornar-se uma grande potência, ser reconhecida como tal e defender os interesses da Rússia a todo custo. Devido a rejeição de ideologia por parte de Putin, Roberts menciona sobre a dificuldade em lograr identificar outros elementos impulsionadores da Política Externa russa. Através de seu texto Roberts cita Alexander Dugin, o qual rotula Putin como um conservador que valoriza o estatismo, além de trazer à tona as ideologias de 1917 de ortodoxia, nacionalismo, autocracia e antiocidentalisimo. O antiocidentalismo, de acordo com Roberts (2017, p.9, tradução nossa) seria “[...] o veículo pelo qual Putin promove seus interesses pessoais de poder.”. No entanto, Roberts faz alusão a Laqueur, o qual menciona que as ações ocidentais pouco contribuíram para a construção de Putin na identidade russa, “Putin é motivado por mais do que suas 40 tendências estatistas ou seu interesse pessoal no poder.” (ROBERTS, 2017, p.9, tradução nossa). Segundo Roberts, a narrativa de Putin ofereceria uma alternativa ao domínio ocidental ante ao sistema internacional, como faz alusão Roberts (2017, p. 11. tradução nossa): Essa narrativa parece ser moldada em parte por uma compreensão do potencial global da Rússia como alternativa ao Ocidente, combinada com preocupações sobre um Ocidente hostil que falhou em reconhecer o lugar legítimo da Rússia como uma grande potência no sistema internacional, negando sua influência cultural e relacionamentos estratégicos em seu próprio quintal. Putin tentou construir uma imagem conservadora e moralista que entra em confronto com as ideias universalistas perpetuadas pelos Estados Unidos. No contexto da narração de Putin, logrou-se a aproximação das nações vizinhas, nações que antes faziam parte da União Soviética, essas regiões são cruciais para a Rússia por razões históricas, de segurança, de geopolítica e de demografia. Devido a semelhanças ideológicas e históricas nessa região, a Rússia considera-a a sua esfera de influência. "Há um conservadorismo presente nessas comunidades vizinhas, essas não se alinham facilmente com as definições liberais ocidentais de direitos humanos ou de relações entre religião e estado.” (ROBERTS, 2017, p.9, tradução nossa). Por conseguinte, essas nações acabam se ligando a Rússia pelas ideias conservadoras e pela grande dependência econômica. Diante do exposto, a expansão da OTAN foi essencial para a perpetuação do excepcionalismo russo. Há o temor que o ocidentalismo influencie a cultura russa e sua esfera de influência. Como alude Roberts, o excepcionalismo russo estaria mais relacionado a restauração da antiga união étnica russa: Os esforços de Putin para restaurar o excepcionalismo russo parecem menos sobre a expansão poder do Estado russo em terras estrangeiras (como na era soviética) e mais sobre restaurar a liderança russa entre os russos étnicos, muitos dos quais foram separados da pátria. (ROBERTS, 2017, p.13, tradução nossa). 41 4. ASPECTOS GERAIS DA UCRÂNIA A Ucrânia foi um dos países que compunha a antiga União Soviética, tendo a sua independência formal, em 24 de agosto de 1991, através da Declaração de Independência aprovada pelo parlamento ucraniano e também através da decaída do bloco soviético. A sua independência desde então proporcionou a nação fortes laços com o ocidente. Sendo o segundo maior país da Europa, com uma área que se somam aproximadamente 603.500 km² (ONU), é um grande centro de agricultura. Isto posto, no que tange a criação da nação ucraniana, Soavinksk menciona que o sentimento de nacionalismo desse povo surgiu quando quiseram se separar da Rússia e Polônia no século XX. Esse sentimento vem à tona com a separação dos grupos étnicos: os russos participavam da nobreza enquanto os ucranianos e outros grupos étnicos eram considerados periféricos. A Ucrânia iniciou seu sentimento nacionalista em busca de sua independência e identidade própria através da sua declaração de democracia da nobreza, de seus laços com a Polônia e da caracterização das terras ucranianas, sendo essas áreas onde fazia-se uso do dialeto ucraniano. Posteriormente, deu-se início ao nacionalismo baseado nas diferenças da cultura popular, antropologia e filologia, pautando-se em uma ideologia liberal. Devido a separação de terras da Polônia, os fragmentos nacionais ucranianos puderam se juntar em um mesmo Estado. De acordo com Soavinski, a língua ucraniana foi essencial para as bases da nação. No entanto, a Rússia ainda não reconhecia a Ucrânia como uma nova pátria, como cita Soavinski (2015, p.23) “[...] terras ucranianas sob controle polonês eram vistas simplesmente como Polônia; enquanto aquelas à margem esquerda do Dnieper eram parte do Império -visão com a qual a elite local, russificada, acabava por corroborar.”. Desde sua independência formal em 1991, a Ucrânia é considerada um sistema político híbrido por possuir elementos democráticos e não democráticos. Em 1994, Leonid Kuchma foi o presidente eleito através de eleições e governou com uma política pró-ocidental, mas que também atendia a Rússia (WELT, 2021). Como menciona Welt, as eleições de 2004 ficaram conhecidas como o período da Revolução Laranja, eleições que foram alegadas como fraudulentas através da 42 interferência russa ao eleger o primeiro-ministro Viktor Yanukovych (2006-2007), apoiador russo, e que terminaram anuladas. Nesse meio, a população ucraniana foi às ruas vestida de laranja manifestar o pedido de novas eleições. Em dezembro do mesmo ano, uma nova eleição foi realizada e, de forma democrática, Yushchenko foi eleito presidente da Ucrânia. Em seguida, em 2010, Yanukovych foi eleito como presidente da Ucrânia de 2010 a 2014. O período de seu governo marcou fortemente a separação da Ucrânia entre pró-ocidentais e pró-russos. Por seu cunho pró-russo, Yanukovych terminou temporariamente as oportunidades de uma possível integração na OTAN e na União Europeia, tal ação levou a diversos protestos. Devido aos protestos, Yanukovych foi afastado do poder em 2014 e foi exilado na Rússia. O seu sucessor foi Petro Poroshenko que governou durante 2014-2019, ele foi criticado pela falta de esforços contra a corrupção e pela economia do país. Foi durante a transição do governo Poroshenko e Yanukovych que ocorreu o conflito na Crimeia (WELT, 2021). Em 2019, Volodymyr Zelensky, ator e comediante ucraniano venceu nas urnas do segundo turno com 73% dos votos contra Poroshenko, sendo o sexto presidente da Ucrânia. A dissolução do parlamento ucraniano foi uma de suas primeiras estratégias e com isso logrou que o seu partido ocupasse grande parte do Parlamento. Durante o governo de Zelensky houve dificuldades econômicas e reformas de governo devido as dificuldades causadas pela separação da Crimeia. Ademais, o governo Zelensky também propôs uma série de mudanças, incluindo a desconcentração de poder, a reforma do sistema judicial, e medidas preventivas contra a corrupção. Seu governo também buscou aproximar a Ucrânia das potências Ocidentais (SILVA, 2022). 43 5. O CONFLITO RUSSO-UCRANIANO 5.1. A formação do povo ucraniano e a relação com o conflito russo Como alega Miller, no século 17, The synopsis foi escrito, uma obra na qual descrevia uma população eslava composta por “pequenos russos”, caracterizados por russos oficiais e “grandes russos”, compostos por outros povos. Essa obra teria sido escrita com objetivos de auxiliar o controle da Igreja e do Czarismo, tendo em vista que seria mais fácil controlar um único povo. No entanto, a ideia de um único povo não agradava todas as áreas da sociedade, principalmente a nobreza, como alude Miller (p.97, 2022, tradução nossa): Um nobre russo não precisava de mais homens como membros de sua corporação. Além disso, do ponto de vista do nobre russo (que foi "registrado nos livros"), os líderes Cossack não eram iguais, pois quase nenhum deles tinha documentos e não tinha sido dado o status da nobreza polonesa na Commonwealth Polonês-Lituano. Através da queda do Império Otomano, da divisão do Commonwealth Lituano- Polonês e da diferença entre os direitos entre Cossacos4 e a nobreza, os Cossacos passaram a perceber que não faziam parte desse “único povo”. Além disso, o projeto de constituição Russkaya Pravda do século 19 fez menção que todas as diferenças entre os povos russos deveriam ser eliminadas e imergidas em uma única nação. Como mencionam Breuilly e Halikiopoulou, a primeira visão de identidade nacional surgiu no século 19 através das revoluções americanas e francesas. Durante o século XX, era notória a diferença de direitos dos pequenos russos e a sua influência na parte ucraniana, como cita Miller que faz alusão à Chykalenko, uma das personalidades do movimento ucraniano, menciona que as cidades eram muito “Moscovizadas”. Por conseguinte, é durante o século XX que surge um grande movimento nacionalista que se propagou durante a Primeira Guerra Mundial mobilizando massas no cunho de identidade étnica. 4 Os cavaleiros cossacos estabeleceram-se em países como a Rússia e a Ucrânia, formando uma população que, no início do século XX, chegava a mais de dois milhões de indivíduos A palavra “cossaco” deriva do russo “kozac”, que, por sua vez, remete ao turco “kazac”, significando, aproximadamente, “homem livre”, “indivíduo livre (BRASIL ESCOLA, [s.d.] ). 44 A ocupação do império austro-húngaro e da Alemanha nas partes ocidentais da Rússia favoreceram os movimentos separatistas, esses movimentos permaneceram até a queda da União Soviética. Como cita Miller, durante a União Soviética passaram a ser instituídas repúblicas nacionais, onde a Ucrânia logrou um pouco mais de autonomia. Em 1991, através da dissolução da União Soviética, a Ucrânia se declara um Estado independente. Diante das anteriores menções é notório que a Ucrânia demonstrou progressos no que tange à sua identidade nacional e o seu afastamento da Rússia. Tal fato fez com que Moscou se alertasse para a perda de influência na região por uma possível aproximação do ocidente e uma maior distância do Estado russo. O processo do estabelecimento da identidade nacional acabou em partes com a antiga divisão entre oeste e leste da Ucrânia. Aproximadamente 31 milhões de cidadãos da Ucrânia participaram do voto de 1991, onde demonstraram suas opiniões para com a declaração de independência da Ucrânia, sendo aceita por 92% dos eleitores (O GLOBO, 2022). Nos anos anteriores da União Soviética, a maioria das províncias do leste da Ucrânia tinha mais falantes de russo do que de ucraniano. Contudo, em 2001, o número de falantes ucranianos era alto em todo o país, somente 14.8% considerava russo como língua nativa (MINORITY RIGHTS GROUP, 2008). Hodiernamente, 76% da população ucraniana relata o ucraniano como seu primeiro idioma. Mesmo nas áreas do leste, a maioria é multilíngue em ucraniano e russo (RATING GROUP, 2022). Os esforços russos para retardar a migração para o oeste da Ucrânia remontam ao início da era pós-soviética. Embora Yeltsin reconhecesse as fronteiras pós- soviéticas da Ucrânia, as preocupações sobre a possibilidade da reunificação russa levantaram preocupações de que Kyiv seria forçada a se juntar à Geórgia, Azerbaijão e Moldávia em 1996. Em 1997, a Ucrânia então foi incorporada ao GUAM5, 5 A GUAM foi estabelecida em maio de 2006 na Cúpula de Kiev, onde os Chefes de Estado assinaram a Carta da Organização. De acordo com a Carta, os principais objetivos são o fortalecimento dos valores democráticos, a garantia da supremacia da lei e o respeito dos direitos humanos; garantir o desenvolvimento sustentável; fortalecer a segurança internacional e regional e a estabilidade; aprofundar a integração europeia para a criação de um espaço de segurança comum e o alargamento da cooperação econômica e humanitária; desenvolvimento do potencial socioeconômico, de transporte, energia, científico, técnico e humanitário; estimular a interação política e a cooperação prática em áreas de interesse mútuo (GUAM ORGANIZATION, [s.d.]). 45 Organização para a Democracia e Desenvolvimento Econômico, se juntando a três estados pós-soviéticos: Geórgia, Azerbaijão e Moldávia. Além do exposto, em 2004, o governo Putin interferiu no governo democrático da Ucrânia ao apoiar Yanukovych, o sucessor do presidente Kuchma. Multidões de manifestantes vestidos de laranja foram às ruas pedir que novas eleições fossem realizadas novamente. Depois que Yushchenko tonou-se popular nas novas eleições, Moscou respondeu autoritariamente, cortes de gás foram impostos de 2006 a 2009. Yushchenko levantou a questão evitada por seu antecessor de obter um plano de ato de associação com a OTAN ( COUNCIL ON FOREING RELATIONS, 2010). O conflito da Crimeia deixou a Rússia enfrentando sanções econômicas dos Estados Unidos e da União Europeia. Em 2016, a OTAN fortaleceu suas competências armadas na Estônia, Letônia, Polônia e Romênia, mantendo sua iniciativa de “unir-se” à Ucrânia e à Geórgia, com o objetivo de fortalecer sua adesão ao longo das fronteiras da Rússia. Nesse viés, em Fevereiro de 2022, Putin decidiu optar pela invasão militar da Ucrânia ao declarar independentes as províncias de Donetsk e Luhansk. 5.2. A Guerra da Crimeia O primeiro conflito na região da Crimeia ocorreu em 1853 quando o Império russo lutou contra o império otomano, França e Inglaterra tendo em vista que a Rússia almejava o controle das províncias da Moldávia e Valáquia. O conflito terminou em 1856 com o tratado de Paris e a derrota russa. De acordo com Hannapi, desde seu início, as tensões estariam conectadas ao surgimento do capitalismo. O segundo conflito na região da Crimeia foi um conflito entre a Rússia e a Ucrânia que começou em fevereiro de 2014. Depois que o governo ucraniano pró-russo foi derrubado por uma manifestação e Poroshenko assumiu o poder, a Rússia logrou anexar a região da Crimeia na península do mar negro, esse movimento não foi reconhecido pela comunidade internacional e foi punido com sanções. A anexação da Crimeia pela Federação Russa foi um fator importante na política externa da Rússia desde então. 46 Desde a independência da Ucrânia, o conflito étnico se fez mais presente na região, tendo em vista que parte da população se consideraria de etnia russa. Segundo Welt (2021, p. 14, tradução nossa): “Na Ucrânia, o último censo nacional (2001), 17% da população identificada como russos étnicos, principalmente concentrada no Sul (Crimeia) e no Leste, onde os laços com a Rússia são mais fortes do que no resto do país.”. Através da eleição de Poroshenko, candidato pró-ocidente, deu-se início uma maior instabilidade nas relações entre Rússia e Ucrânia devido a possíveis suposições de negociações com a OTAN e a União Europeia. A invasão russa ocorre logo após a saída de Yanukovych do cargo de presidente, em seguida, um referendum ilegal com declaração de incorporação da Crimeia a Federação Russa foi realizado. Em 18 de março de 2014, o presidente russo Vladimir Putin assinou oficialmente um tratado anexando a Crimeia à Federação Russa. Além disso, quando a Crimeia foi anexada pela Federação Russa, instigou-se um novo movimento separatista nas regiões de Donetsk e Luhansk, regiões que continham aproximadamente 6.6 milhões de habitantes em 2014. Nessas regiões os militantes lograram tomar controle de partes de áreas mesmo com as ações de defesa ucranianas. (WELT, 2021). A resposta internacional à anexação da Crimeia foi negativa; os Estados Unidos e a União Europeia impuseram sanções à Rússia em resposta à anexação. A Assembleia Geral das Nações Unidas também aprovou uma resolução condenando a anexação e reafirmando a soberania da Ucrânia sobre a Crimeia. A anexação da Crimeia também aumentou a tensão entre a Rússia e o Ocidente, com muitos países acusando a Rússia de violar o direito internacional. Apesar da resposta negativa no meio internacional, Putin recebeu 96% de aprovação nacionalmente após a anexação da Crimeia. Portanto, a guerra elevou a posição de Putin nas eleições, mas também levou a uma migração maciça de russos e a uma repressão no país. A escolha de Putin de usar a força, especialmente para lançar um ataque em grande escala da Geórgia em 2008 e Donbass em 2014 remonta as suas táticas de cunho realistas. Isto posto, através da menção de Roberts, conclui-se que o conflito da Criméia objetivou que a Rússia lograsse se afirmar como uma potência regional para fortalecer 47 seus laços com países da antiga União Soviética e também expandir sua esfera de influência internacionalmente. De acordo com Roberts, as ações provenientes do ocidente tiveram grande impacto na política externa russa e, consequentemente, na narrativa de Putin. Putin observa a identidade russa conectada a Ucrânia, ele estaria protegendo a identidade russa das influências do ocidente ao anexar a Crimeia. Além disso, Putin rejeita o liberalismo ocidental com o objetivo de que sua liderança se beneficie das opiniões domésticas e também para poder justificar suas ações na Ucrânia. No que tange às justificativas russas sobre a anexação da Criméia, Roberts cita que o golpe de Estado contra Yanukovych foi ilegítimo. Segundo Putin, os direitos humanos da parte russófona da Crimeia estavam ameaçados pela agenda nacionalista ucraniana e os russos teriam a responsabilidade de proteger e prevenir uma crise humanitária. Além do mais, as forças militares russas estariam ameaçadas devido à instabilidade da região. As ações mencionadas demonstram o ponto de vista no qual Putin busca defender os interesses russos a todo custo. Nesse viés, Roberts faz alusão à Allison, o qual menciona que essas ações foram realizadas com o fim de criar incertezas ante a comunidade internacional e também para trazer uma releitura do direito internacional que pende para um cunho mais ocidentalista, segundo Roberts (2017, p.25, tradução nossa): Isso sugere que a crise na Ucrânia era mais do que simplesmente sobre a Ucrânia; é emblemático de Putin esforços para desafiar a ordem liberal, fornecendo uma leitura alternativa do direito internacional, dado que o existente é usado seletivamente pelo Ocidente. [...] Putin acusou os EUA de seguir "a lei da arma" ou de interpretar e aplicar seletivamente o direito internacional e de encontrar maneiras de fazer com que suas próprias agressões pareçam legítimas, ao mesmo tempo em que julga a Rússia. Putin acreditaria que o Ocidente encontrava uma maneira de fazer legitimas as suas justificativas de agressões e invasões a Estados soberanos, fazendo uso da aplicação seletiva do direito internacional. Essa ideia trouxe à tona o pensamento de que a Rússia deve buscar ser uma fonte de poder no meio internacional, por conseguinte, como indica Roberts (2017, p. 26, tradução nossa): 48 Putin usa o medo generalizado criado por esses conflitos congelados para constituir uma nova forma de liminaridade pós-soviética que desafia o direito internacional, intervenção e as regras do sistema internacional. [...] Isso se relaciona com as próprias visões de Putin sobre o excepcionalismo e a necessidade da Rússia de reivindicar seu lugar de direito como um líder internacional e uma potência regional cuja hegemonia foi ameaçada pela suposição do domínio liberal ocidental. A Rússia pode apresentar uma alternativa importante e pode fazê-lo usando as próprias regras do Ocidente - sua política liberal regimes e normas internacionalistas – contra ela. No que diz respeito a política externa, Lebow observa uma política externa de cunho agressiva advinda do governo Putin e compará-la as agressões de Luís XIV, Napoleão e Felipe II, afirmando que a política externa de Putin seria irreal: um líder comprometido com uma política externa completamente irreal que não apenas é profundamente resistente a informações que o alertam sobre os perigos envolvidos, mas que manipulou as redes de feedback para que nenhuma dessas informações seja trazida à sua atenção. (LEBOW, 2022, tradução nossa). 5.3. A invasão russa na Ucrânia: 24 de fevereiro de 2022 O ataque de 24 de Fevereiro por parte da Rússia à Ucrânia atualmente demonstra uma instabilidade para a região desde os últimos séculos. No início de 2022, quando a Ucrânia demonstrou interesse em se juntar a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), a insatisfação russa foi notória. No entanto, o estopim do conflito ocorreu no momento em que as províncias pró-russas Donetsk e Luhansk foram reconhecidas por Putin como independentes, em 21 de fevereiro de 2022. Posteriormente a esse ato, tropas russas foram enviadas para essas regiões, demonstrando indícios de uma possível invasão. Em 21 de fevereiro, o presidente russo Vladimir Putin fez um discurso, onde mencionou sobre a paralisação econômica da Ucrânia, juntamente a corrupção e as armas de destruição em massa que estariam presentes na Ucrânia. Essas reclamações incluíam também o desenvolvimento do Grupo do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) , além disso, o discurso se concentrou em assuntos relevantes a construção da etnia russa-ucraniana, mencionando a sua crença que russos, ucranianos e bielorrussos têm as suas raízes no mesmo sistema político primitivo da Rus de Kiev (BBC, 2022). 49 Isto posto, em fevereiro de 2022, Putin discursou que as circunstâncias da Rússia, Ucrânia e Belarus se vinculavam em seus destinos administrativos. As nações ocidentais acusaram a Rússia de tratar a Ucrânia e Belarus como Estados não soberanos, alegando que a Rússia estava seguindo os passos de seus antigos rivais. Durante o governo de Putin, Moscou adotou uma política em relação à Ucrânia e Belarus baseada na ideia de que esses países eram muito frágeis (COUNCIL ON FOREIGN RELATIONS, 2022). As alegações de Putin refletem a maneira como ele se recusa a aceitar representação pública das nações ucranianas e da Bielorrússia. De acordo com Synder, a invasão ucraniana só pode entendida através da compreensão histórica: “Você não pode entender a recente invasão da Ucrânia por Putin sem entender seu apego metafísico à era do império, sua narrativa mitológica da história russo- ucraniana e sua construção semimística do que constitui a nação russa.” (SYNDER, 2022). Além disso, Sydner apontaria que o Ocidente estaria vivendo em seu entendimento de tempo, o qual se mascararia como senso comum. A