UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS - RIO CLARO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS (ZOOLOGIA) DINÂMICA POPULACIONAL E COMPORTAMENTO PREDATÓRIO INDIVIDUAL DA ARANHA SOCIAL Parawixia bistriata (RENGGER) (ARANEAE: ARANEIDAE) EDUARDO FELTRAN BARBIERI Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título Mestre em Ciências Biológicas (Área de Zoologia) Fevereiro - 2005 ____________________________________________________________________2 DINÂMICA POPULACIONAL E COMPORTAMENTO PREDATÓRIO INDIVIDUAL DA ARANHA SOCIAL Parawixia bistriata (RENGGER) (ARANEAE: ARANEIDAE) EDUARDO FELTRAN BARBIERI Orientador: Prof. Dr. JOSÉ CHAUD-NETTO Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Campus de Rio Claro, para a obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas (Área de Zoologia) Rio Claro Estado de São Paulo – Brasil Fevereiro de 2005 ____________________________________________________________________3 Dedico este trabalho às pessoas responsáveis pela minha formação, educação, caráter e alegria: Geraldo, Maria da Penha, Rafael e Leandro. i ____________________________________________________________________4 “...O futuro é uma astronave que tentamos pilotar. Não tem tempo nem piedade, e nem tem hora de chegar. Sem pedir licença, muda nossa vida e depois convida a rir ou chorar. Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá. O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar. Vamos todos numa linda passarela de uma aquarela que um dia enfim descolorirá.” (Aquarela, Toquinho) ii ____________________________________________________________________5 AGRADECIMENTOS Aos meus pais Geraldo e Maria da Penha, meus maiores incentivadores e os meus parâmetros para definir as palavras: carinho, respeito, humildade e honestidade. Muito obrigado. Aos meus queridos irmãos Rafa e Lê. Obrigado por fazerem da minha vida um mundo de alegria. A Bibi. Carinho, respeito, companheirismo e amor. São as palavras que me fazem lembrar de você. Este trabalho também é dedicado a ti, pois, sem sua ajuda não teria chegado até aqui. Aos meus irmãos de coração Elisa, Limão e Dado. À tia Ênia e tio Crêmes, meus tios companheiros. Aos tios Toninho e Rege, pelo incentivo. Aos tios José Urbano e Luiza, pelo carinho. Ao tio Dito, exemplo de simplicidade. À minha família de Guaíra, Dr. Mauro, Dona Carolina, Gustavo e Paula, pelo apoio e carinho. Ao Prof. Dr. José Chaud Netto. Obrigado pela confiança nos trabalhos realizados. Não só um ótimo orientador como um grande amigo, conselheiro e companheiro. À Prof. Dra. Sulene Noriko Shima, pelas valiosas observações que tanto enriqueceram este trabalho. Ao Prof. Dr. Mario Sergio Palma, meu orientador durante a Graduação. Além de sua amizade, foi a pessoa que me ensinou o significado da palavra Ciência. Ao Prof. Dr. Edilberto Giannotti, pela confiança nos trabalhos e amizade. Aos meus verdadeiros amigos da graduação Passat, Vítor, Flávio, Ricardinho, Cova e Punk. Ao Minduim (Maurício), meu irmão rioclarense. Ao companheiro de trabalho Andrigo. Juntos fazemos o Turco sorrir. Ao meu grande amigo e companheiro de cantoria Kleber-Filho, que faz Rio Claro ser divertido. iii ____________________________________________________________________6 Aos companheiros de baralho Serjão e Ânderson, que nas horas vagas são excelentes técnicos da UNESP. Aos coreanos Alberto e Joana, pela amizade. Aos meus amigos de São Paulo Aloísio e Fábio Damiani, pela valiosa companhia. Aos bons e velhos amigos de Itobi representados pela Marta. Aos bons e novos amigos de Itobi representados por Aninha, João Marcelo, Gisele, Bianca e Érica, pelo apoio e companhia. A todos do Coral Uirapuru representados pelo grande amigo José Ricardo, por me proporcionarem momentos de descontração e emoção. Aos amigos Bruna, Fábio, Cauré, Thiago e Willian, pela valorosa amizade e companhia. Aos amigos do CEIS, Anita, Lucy, Keity e Susan, pelo apoio e amizade. Ao Osmar Rocha, pela ajuda na coleta das colônias de aranhas. Ao Sr. José Edson da Casa de Agricultura de Itobi, pelo apoio. À Cris, seu sorriso é o cartão postal do Departamento de Biologia. À CAPES pela concessão da bolsa. Aos companheiros Mandela e Gabi, melhor companhia não há. À Wania, pelo incentivo e por me dar a oportunidade de realização de um sonho, ser professor. Aos estagiários Lucas e Danilo, pela compreensão e amizade. Aos professores e funcionários da UNESP que fazem dessa Universidade minha segunda casa. E agradeço de coração aos amigos Sr. Benedito, Vovó Margarida, Itajupira, Juraci, Zé do Côco, Juvenal, Joãozinho, Rosinha e o Sete que de alguma forma tanto me apoiaram na realização deste trabalho. iv ____________________________________________________________________7 ÍNDICE Página RESUMO.................................................................................................................... 1 ABSTRACT................................................................................................................ 3 INTRODUÇÃO GERAL............................................................................................ 5 CAPÍTULO 1: DINÂMICA POPULACIONAL DA ARANHA SOCIAL Parawixia bistriata........ 10 1. Introdução............................................................................................................ 11 2. Objetivos.............................................................................................................. 15 Experimento I: Desenvolvimento de colônias de Parawixia bistriata............................................. 16 3. Material e Métodos.............................................................................................. 17 4. Resultados............................................................................................................ 24 5. Discussão............................................................................................................. 27 6. Conclusão............................................................................................................. 33 Experimento II: Aceitação mútua entre indivíduos de colônias diferentes em Parawixia bistriata.. 35 3. Material e Métodos.............................................................................................. 36 4. Resultados............................................................................................................ 39 5. Discussão............................................................................................................. 45 6. Conclusão............................................................................................................. 47 7. Referências Bibliográficas................................................................................... 49 CAPÍTULO 2: COMPORTAMENTO DE CAÇA INDIVIDUAL EM COLÔNIAS DE Parawixia bistriata....................................................................................................................... 52 1. Introdução............................................................................................................ 53 2. Objetivos.............................................................................................................. 59 3. Material e Métodos.............................................................................................. 60 4. Resultados............................................................................................................ 63 5. Discussão............................................................................................................. 70 6. Conclusão............................................................................................................. 77 7. Referências Bibliográficas................................................................................... 79 v ____________________________________________________________________8 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 84 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DA INTRODUÇÃO GERAL....................... 87 vi ____________________________________________________________________1 RESUMO Parawixia bistriata é a única espécie da família Araneidae que apresenta comportamento social. Refúgio comunal e cooperação de caça são duas características interessantes observadas nessa espécie. O presente trabalho teve como objetivos analisar a dinâmica populacional das colônias de Parawixia bistriata durante seu desenvolvimento e estudar o comportamento de caça individual das aranhas dessa espécie. Por meio de observações de campo de sete colônias de Parawixia bistriata foi possível verificar que estas passaram por um intenso processo de forrageio, bem como de procura por um hábitat ideal, na medida em que se observa uma constante mudança no local de construção do refúgio comunal. Durante esse processo de forrageio, devido à deficiência na quantidade de recursos, bem como de espaço físico, é comum observar fissões de colônias dessa espécie. Em experimentos realizados na presente pesquisa observou-se que, apesar de ocorrer decréscimo acentuado no número de indivíduos em algumas colônias, a razão sexual das mesmas não foi alterada (1:1) no período em que foi realizada a sexagem dos indivíduos. Também foi observada uma grande tolerância entre indivíduos coespecíficos não aparentados, ou seja, de colônias não irmãs. Essa aceitação confirma a significativa existência de fusões de colônias ____________________________________________________________________2 durante o desenvolvimento dos indivíduos dessa espécie, que reforçam a idéia da formação das super-colônias, mencionada anteriormente por outros autores. No que diz respeito ao comportamento de caça individual em colônias dessa mesma espécie de aranha orbitela, observou-se que estas aranhas conseguem, de certa forma, escolher um determinado tipo de presa. Isso ocorre na medida em que se observa o total desprezo pelas presas de pequeno porte, bem como a preferência pela captura de presas de tamanho grande. Um outro fator importante é o fato de que essas aranhas consomem suas presas grandes no local e no momento em que foram capturadas. Esse processo poderia ser explicado pela existência de competições intracoloniais e uma aranha, ao capturar uma presa grande, tentaria garantir esse recurso consumindo-o no próprio local de captura, diminuindo assim a probabilidade de ter essa valiosa fonte energética roubada por seus coespecíficos. Palavras-chave: Parawixia bistriata, aranha social, dinâmica populacional, razão sexual, caça comunal e comportamento predatório. ____________________________________________________________________3 ABSTRACT Parawixia bistriata is the unique species of Araneidae that shows social behaviour. Communal refuge and cooperative hunting are two interesting features observed in this species. The objectives of this research were to analyze the population dynamics in colonies of Parawixia bistriata and to study the individual predatory behaviour of this species. Field observations of seven colonies of Parawixia bistriata showed that these colonies developed an intense hunting activity and search for an ideal place to build the nest. During these two activities the colonies can separate its members on account of the lack of food or space to build their webs. Although the number of spiders is significantly reduced during the development in some colonies, this research showed that the sex ratio of the colonies is almost 1:1 when it is possible to do the sexual identification. It was also noted that there is a great tolerance between spiders from different colonies and because of this there are fusions of colonies that become super- colonies. In relation to the individual predatory behaviour in Parawixia bistriata it was possible to see that this spider can recognize and choose its prey. Another ____________________________________________________________________4 experiment of this research showed that the spiders refused a small prey or left it after a while, if a bigger prey was captured. It was also observed that the spider “prefers” a big prey than a small one, and the spider feeds on a big prey in the same place of the web where it was caught. This fact can be explained by the existence of intra colonial competition for food and this behaviour maybe is a strategy to avoid the robbery of food by a co-specific that lies beside it. Key words: Parawixia bistriata, social spider, population dynamic, sex ratio, cooperative hunting, predatory behaviour. ____________________________________________________________________5 INTRODUÇÃO GERAL ____________________________________________________________________6 � � � � � � � � � � � � � INTRODUÇÃO GERAL As aranhas estão distribuídas por todo o nosso planeta tendo conquistado todos os ambientes ecológicos, com exceção do ar e do mar aberto (FOELIX, 1996). A grande maioria das espécies de aranhas tem hábitos solitários e não apresenta tolerância entre indivíduos da mesma espécie, a não ser logo após o nascimento dos filhotes ou durante a cópula. Na maioria das espécies o canibalismo é comum. Porém, dentro das 15 famílias existentes, aproximadamente 60 espécies de aranhas apresentam algum tipo de organização social (BUSKIRK, 1981). As aranhas sociais podem ser coloniais ou cooperativas. As espécies coloniais podem cooperar na construção de uma estrutura comum, mas cada membro possui a sua própria teia que é defendida contra a invasão de indivíduos da mesma colônia, embora haja tolerância de sobrevivência. Já as aranhas cooperativas possuem teias comuns, construídas por vários indivíduos, havendo cooperação na captura de presas e divisão de alimento. Parawixia bistriata é uma aranha da família Araneidae, um grupo que constrói teias orbiculares para a captura de presas e um refúgio comunal que abriga todos os membros da colônia (FIG. 1). Algumas das características que a destacam das demais espécies de aranhas sociais são as enormes redes noturnas, compostas por várias ____________________________________________________________________7 teias individuais construídas diariamente para capturar insetos, e o fato de ser a única espécie colonial que coopera na captura de presas (FOWLER & DIEHL, 1978; GORGÔNIO, 1979; GORGÔNIO & AURNHEIMER, 1979; UETZ, 1986; SANDOVAL, 1987; FOWLER & GOBBI, 1988; CARVALHO JR., 1998). Em pesquisas preliminares observou-se a fissão de colônias de P. bistriata, formando-se, assim, colônias irmãs menores, bem próximas umas das outras. É provável que as colônias provenientes de uma fissão mantenham uma razão sexual próxima de 1:1 (BARBIERI, não publicado). Também ocorre a fusão de colônias não irmãs formando super-colônias. Existe tolerância entre indivíduos não irmãos, mesmo em estágios de desenvolvimento diferentes (SANDOVAL, 1987). Em pesquisas de campo observou-se também que duas colônias distantes 10 metros se uniram completamente em dois dias (BARBIERI, não publicado). As duas colônias armaram suas teias de tal modo que foi possível o cruzamento dos fios suportes. No começo da manhã seguinte parte dos indivíduos de uma das colônias não voltou para o seu refúgio e sim para o refúgio da colônia vizinha. Esses indivíduos ficaram agrupados, há apenas alguns centímetros de distância dos indivíduos residentes. Na noite seguinte, todos armaram suas teias conjuntamente, não sendo possível distinguir os indivíduos visitantes dos residentes. No começo da manhã do segundo dia todos os indivíduos retornaram para o refúgio, não sendo possível distinguir grupos irmãos e não irmãos. Esse foi um caso observado em Janeiro de 2001 na cidade de Itobi, Estado de São Paulo. Considerando-se a existência de fissões, ou mesmo de fusões de colônias de Parawixia bistriata, a primeira parte desta pesquisa teve como objetivo estabelecer um perfil da dinâmica populacional de algumas das colônias, avaliando até que ponto esses mecanismos podem alterar o comportamento, a dinâmica da população e a razão sexual. Também foi avaliada a tolerância entre indivíduos coespecíficos não aparentados durante o processo de fusão de duas colônias. As aranhas formam o maior grupo taxonômico de organismos com hábito alimentar exclusivamente carnívoro (CODDINGTON & LEVI, 1991). Entre as aranhas, a territorialidade e o canibalismo são comportamentos corriqueiros; portanto, é um grupo em que há predomínio do modo de vida solitário (BUSKIRK, 1981). ____________________________________________________________________8 Todas as espécies de aranhas sociais são construtoras de teia e usam essa teia para capturar presas. Grandes colônias podem conter centenas de indivíduos em uma pequena área. A superfície da teia ocupada por aranha (s) diminui das espécies solitárias para as sociais (JACKSON, 1978). Acredita-se que as aranhas sociais devem ter desenvolvido técnicas de suprir sua taxa de energia necessária, mesmo com a diminuição da superfície de caça de cada uma delas na teia de captura. Aranhas sociais estão associadas à cooperatividade de captura de presas e alimentação comunal. Grupos de aranhas podem capturar presas maiores em relação às aranhas coespecíficas solitárias. (BURGESS, 1976; WARD, 1986). Parawixia bistriata é a única espécie de araneídeo que apresenta tanto a caça cooperativa quanto a solitária, tanto inter-atração quanto defesa de território (CARVALHO JR., 1998). Carvalho Jr. (1998) desenvolveu uma pesquisa de campo com colônias de Parawixia bistriata, onde descreveu o comportamento de caça comunal e a divisão de alimento entre os coespecíficos. Porém, em trabalhos realizados no campo observou-se que, na sua grande maioria, as presas não são compartilhadas entre os indivíduos das colônias havendo, assim, disputa pelo território ocupado, roubo de presas e até o canibalismo. No segundo capítulo desta pesquisa objetivou-se determinar o comportamento de caça individual em colônias de P.bistriata, levando-se em consideração o tamanho da presa, bem como a ordem em que as presas eram oferecidas às aranhas. ____________________________________________________________________9 Figura. 1: (a e b) Refúgio comunal de uma colônia jovem de Parawixia bistriata. (c) Refúgio comunal de uma colônia semi-adulta da mesma espécie ____________________________________________________________________10 CAPÍTULO 1 Dinâmica populacional da aranha social Parawixia bistriata ____________________________________________________________________11 1. INTRODUÇÃO Graças ao forrageio, um animal obtém a energia que proporciona crescimento, manutenção somática e reprodução. Por outro lado, forragear implica também em custos, uma vez que o animal que procura alimento fica exposto a predadores e deixa de utilizar seu tempo disponível em outras atividades. O comportamento de forrageio pode variar devido a mudanças morfológicas associadas com o crescimento e a maturidade, diferenças na disponibilidade de alimento e mudanças sazonais nesta disponibilidade (FRITZ & MORSE, 1985). As aranhas construtoras de teias, ou orbitelas, têm sido bastante usadas em pesquisas de forrageamento, pois elas permitem uma análise do investimento e da dieta que são dois processos envolvidos na atividade de obtenção de recursos alimentares (D’AYALA-VALVA, 2000). O forrageamento das aranhas orbitelas abrange dois processos complementares: seleção de um microlocal para construção de teia (RIECHERT & GILLEPIE, 1986) e o próprio período de forrageamento, o qual envolve uma seqüência de construções e remoções (parciais ou totais) da teia, que podem continuar durante toda a vida da aranha em um mesmo microlocal (CARICO, 1986; CRAIG, 1989; HIGGINS & BUSKIRK, 1992). ____________________________________________________________________12 A seleção de um microlocal para construção de teia depende de muitas variáveis, tais como: temperatura, umidade, insolação, estruturas para suporte de teias, velocidade e direção do vento e exposição às chuvas. Sendo assim, a aranha precisa avaliar esses diversos fatores em relação à quantidade de recursos que ela pode obter, a fim de maximizar a probabilidade de que o micrilocal escolhido reúna as melhores condições possíveis (RIECHERT & TRACY, 1975 JANETOS, 1986; CRAIG, 1989). As aranhas orbitelas são consideradas predadores de espera, porém muitas delas podem ser consideradas forrageadoras ativas, pois mudam o local de construção de suas teias constantemente (JANETOS, 1982). Assim, o indivíduo teria que tomar algumas decisões importantes, principalmente no que diz respeito ao momento de abandonar um local não muito proveitoso, bem como escolher o próximo local com as condições ideais para se estabelecer, pois, nesse processo, estão envolvidos o tempo em que ele ficará exposto ao ataque de predadores, durante o forrageio, e o trabalho que será gasto na construção de novas teias de caça e um novo refúgio no local escolhido. Além das variações de disponibilidade de presas, existem outros fatores que podem ser importantes no abandono de microlocais de construção de teias, como: distúrbios no suporte, estragos na teia causados por fatores físicos, como vento ou chuva, mudanças de temperatura e umidade, ou mesmo nas condições micro-climáticas e, ainda, interações agonísticas, ou distúrbios causados por predadores ou parasitas (D’AYALA-VALVA, 2000). As aranhas em agregação de teias podem aumentar o sucesso de forrageio e reduzir a variância na captura de presas, quando o “efeito ricochete”, do grande emaranhado de teias construídas pelas diversas aranhas, faz com que a presa que se desvia de uma teia possa ser capturada em outra (UETZ, 1989). A presença de alimento e hábitat são dois fatores que favorecem a agregação de algumas espécies de aranha, mas esta estratégia é uma das possibilidades de associação que não representa nenhum tipo particular de interação e sim uma resposta comum à presença desses recursos (HODGE & UETZ, 1996). Tais associações, apesar de terem muitas características em comum no que diz respeito ao processo de forrageio e escolha de um microlocal, diferem de grupos sociais por não serem organizadas internamente e por serem efêmeras. ____________________________________________________________________13 Segundo Uetz (1992), as agregações só podem ocorrer em determinados hábitats onde a disponibilidade de recursos é suficiente para garantir a sobrevivência e reprodução de todos os indivíduos envolvidos. Este mesmo processo de forrageamento é observado nas poucas espécies sociais, pois todas as espécies de aranha que apresentam algum tipo de socialidade são orbitelas. Para essas espécies, a escolha de um microlocal é ainda um processo mais delicado, pois o grande número de indivíduos implica o aumento da demanda de recursos bem como a necessidade de um maior espaço físico para a construção das teias de caça. Sendo assim, as aranhas sociais podem passar todo o seu desenvolvimento mudando de microlocal a fim de encontrar um hábitat ideal. Esse é o grande fator responsável por fissões e fusões de colônias, que ocorrem freqüentemente em algumas das espécies de aranhas sociais. Sabe-se que durante a fase de desenvolvimento das colônias da aranha social Parawixia bistriata alguns indivíduos morrem devido às condições climáticas, enquanto outros são predados e/ou acabam se separando da colônia durante a fase de dispersão. Também se sabe que as colônias de Parawixia bistriata sofrem fusões e fissões durante o seu desenvolvimento na procura de um micro-hábitat ideal, podendo ocorrer a formação de super-colônias, portando mais de 600 indivíduos, ou colônias muito pequenas com poucas dezenas de aranhas (SANDOVAL, 1987). Uma outra característica desta espécie é a razão sexual de 1:1 nas colônias, mas que somente pode ser observada a partir da sexta muda (GOBBI et al., 1979; SANDOVAL, 1987). As aranhas dessa espécie assumem vida solitária entre janeiro e março, dependendo do seu desenvolvimento. Após o acasalamento, as fêmeas produzem suas ootecas entre os meses de março e abril. Os ovos só vão eclodir entre junho e julho, ficando as aranhas dentro da ooteca até os meses de agosto ou setembro, quando elas produzirão suas primeiras teias (SANDOVAL, 1987). Neste primeiro capítulo realizou-se o acompanhamento do desenvolvimento de algumas colônias da aranha social Parawixia bistriata com o objetivo de se obter um perfil da dinâmica populacional dessa espécie. Também foram feitos experimentos de campo para verificar o grau de aceitação de colônias não aparentadas, simulando-se assim uma fusão de colônias não ____________________________________________________________________14 irmãs freqüentemente observada na natureza, durante o processo de forrageio na busca por um micro-hábitat ideal, levando à formação das ditas super-colônias. ____________________________________________________________________15 2. OBJETIVOS Este primeiro capítulo envolve dois experimentos com os seguintes objetivos: - Experimento 1: estudar a dinâmica populacional de colônias de Parawixia bistriata durante seu ciclo de vida. - Experimento 2: Verificar se há aceitação ou tolerância entre as aranhas durante o processo de formação de super-colônias, considerando a ocorrência de freqüentes fusões de colônias não irmãs e a observação de Sandoval (1987) de que todos os indivíduos de uma colônia seriam irmãos entre si, pois cada ooteca seria produzida por uma única aranha. ____________________________________________________________________16 EXPERIMENTO I Desenvolvimento de colônias de Parawixia bistriata ____________________________________________________________________17 3. MATERIAL E MÉTODOS Em um primeiro experimento para acompanhar o desenvolvimento de colônias de Parawixia bistriata foram coletadas, na primeira quinzena de agosto de 2002, três colônias no segundo estágio de desenvolvimento nas proximidades de Itobi/SP (FIG. 2), na rodovia SP350, distantes mais ou menos 3Km uma da outra. Estas colônias foram introduzidas no câmpus da Unesp/Rio Claro e foram denominadas 1, 2 e 3. A Tabela 1 indica o local, no câmpus, onde cada colônia foi introduzida, bem como o número de indivíduos de cada uma delas. ____________________________________________________________________18 Figura 2: Área de estudo: Região de Rio Claro e município de Itobi. À esquerda está o mapa do Estado de São Paulo, evidenciando a Região de Rio Claro. À direita está representado o mapa Rodoviário da região de Itobi Tabela 1: Número de indivíduos e local de introdução das colônias 1, 2 e 3 dentro do campus da UNESP/Rio Claro em agosto de 2002 Colônia Nº de indivíduos Localização 1 352 30 metros do biotério 2 251 Estacionamento do CEIS 3 180 Proximidades do Depto. de Educação As colônias tiveram seus indivíduos contados de agosto a março, duas vezes por mês, obtendo-se assim um perfil da população de cada colônia durante o seu ciclo biológico. Em agosto de 2003 outras quatro colônias, também no segundo estágio de desenvolvimento, foram coletadas no Município de Itobi/SP e introduzidas no câmpus da UNESP/Rio Claro com a finalidade de repetir o experimento realizado anteriormente. Essas colônias foram identificadas como 4, 5, 6 e 7. A tabela 2 contém ____________________________________________________________________19 os dados referentes ao número de indivíduos de cada colônia e o local, no câmpus da UNESP/Rio Claro, onde cada uma delas foi introduzida. Tabela 2: Número de indivíduos e local de introdução das colônias 4, 5, 6 e 7 no campus da UNESP/Rio Claro em agosto de 2003 Colônia Nº de indivíduos Localização 4 320 30 metros do biotério 5 516 Estacionamento do CEIS 6 341 Proximidades do Depto. de Educação 7 404 50m do CEAPLA Assim como no experimento anterior, as colônias 4, 5, 6 e 7 tiveram seus indivíduos contados quinzenalmente, de agosto de 2003 à março de 2004, a fim de determinar a dinâmica de suas populações. As Figuras 3-6 representam, respectivamente, os microlocais onde as colônias 1 e 4, 2 e 5, 3 e 6 e a colônia 7 foram introduzidas no Câmpus das UNESP-Rio Claro. ____________________________________________________________________20 Figura 3: Local do Câmpus da Unesp onde foram introduzidas as colônias 1 e 4. A seta indica a árvore onde elas foram introduzidas. ____________________________________________________________________21 Figura 4: Local do Câmpus da Unesp onde foram introduzidas as colônias 2 e 5. A seta indica o arbusto onde elas foram introduzidas. ____________________________________________________________________22 Figura 5: Local do Câmpus da Unesp onde foram introduzidas as colônias 3 e 6. A seta indica a árvore onde elas foram introduzidas. ____________________________________________________________________23 Figura 6: Local do Câmpus da Unesp onde foi introduzida a colônia 7. A seta indica a árvore onde ela foi introduzida. ____________________________________________________________________24 4. RESULTADOS A Figura 7 representa o perfil do desenvolvimento das colônias 1, 2 e 3 introduzidas no câmpus da Unesp/Rio Claro e acompanhadas regularmente de agosto de 2002 a março de 2003. 0 50 100 150 200 250 300 350 400 ago set out nov dez jan fev mar nú m er o de in di ví du os colônia 1 colônia 2 colônia 3 Figura 7: Dinâmica populacional das colônias 1, 2 e 3 entre os meses de agosto de 2002 e março de 2003. ____________________________________________________________________25 A Tabela 3 contém os dados referentes ao número de machos e fêmeas da colônia 1, a partir do mês de dezembro de 2002. Tabela 3: Razão sexual da colônia 1, de dezembro de 2002 a março de 2003. Mês Nº de machos Nº de fêmeas Dezembro 146 143 Janeiro 85 88 Fevereiro 49 53 Março 28 29 A Figura 8 representa o perfil do desenvolvimento das colônias 4, 5, 6 e 7 introduzidas no câmpus da UNESP/Rio Claro e acompanhadas regularmente de agosto de 2003.a março de 2004. 0 100 200 300 400 500 600 ago set out nov dez jan fev mar meses nú m er o de in di ví du os colônia 4 colônia 5 colônia 6 colônia 7 Figura 8: Dinâmica populacional das colônias 4, 5, 6 e 7 entre os meses de agosto de 2003 e março de 2004. ____________________________________________________________________26 A tabela 4, representa os números de machos e fêmeas das colônias 4, 5 e 7 de dezembro de 2003 a março de 2004. Tabela 4: Razão sexual das colônias 4, 5 e 7 de dezembro de 2003 a março de 2004. Colônia 4 Colônia 5 Colônia 7 Mês Machos Fêmeas Machos Fêmeas Machos Fêmeas Dezembro 134 139 109 101 157 165 Janeiro 103 96 89 83 144 152 Fevereiro 29 27 25 20 38 44 Março - - 06 15 - - ____________________________________________________________________27 5. DISCUSSÃO O forrageamento das aranhas orbitelas abrange dois processos complementares: seleção de um nicho adequado para construção de teia (RIECHERT & GILLEPIE, 1986) e o próprio período de forrageamento, o qual envolve construções e remoções (parciais ou totais) da teia, que podem continuar durante toda a vida da aranha em um mesmo micro ambiente, ou ser seguida por abandono do local inicialmente escolhido e reinício dos mesmos processos em outro sítio de nidificação (CARICO, 1986; CRAIG, 1989; HIGGINS & BUSKIRK, 1992; D’AYALA-VALVA, 2000). Na escolha de um micro ambiente é necessário que a aranha decida como abandonar ou ficar em um determinado nicho, pois embora as orbitelas apresentem uma estratégia de forrageamento do tipo “senta e espera”, elas escolhem ativamente onde estabelecer-se e quando deixar um determinado local. Provavelmente, elas selecionam o ambiente que ofereça maior retorno energético. A densidade e a distribuição de uma população de aranhas, bem como a presença de aranhas sociais dependem de vários fatores: disponibilidade de presas, estrutura do hábitat, presença de predadores e competidores, condições físicas e das interações entre essas populações. No final, o ____________________________________________________________________28 comportamento específico de um indivíduo será determinado por esses fatores e pela capacidade de otimizar a obtenção de alimento (OLIVE, 1980). Como pode ser observado nos resultados apresentados, neste trabalho, somente a colônia 1 foi acompanhada durante todo o ciclo de vida, nas primeiras observações. Já no segundo ano as colônias 4, 5 e 7 puderam ser acompanhadas até o mês de março. As colônias 2, 3 e 6 foram perdidas durante o experimento. As colônias de P. bistriata mudam de localidade constantemente, à procura de um local ideal, livre de perturbações e ambientes e que tenham uma quantidade de alimento adequada para seu desenvolvimento. Provavelmente as colônias 2, 3 e 6 desapareceram porque suas exigências em termos de sobrevivência não tenham sido ideais. A colônia 1, quando foi introduzida, tinha 352 indivíduos. Esse número foi diminuindo lentamente até o mês de dezembro. No mês de janeiro observou-se uma queda brusca no número de indivíduos devido à dispersão. Quando as aranhas dessa espécie atingem a idade adulta ocorre a dispersão e cada membro da colônia assume vida solitária, partindo à procura de um(a) parceiro(a) para o acasalamento. Machos e fêmeas se dispersam ao mesmo tempo, não havendo uma ordem pré-estabelecida para esse comportamento. Ele ocorre conforme o grau de desenvolvimento do indivíduo (quando se torna adulto), independentemente do sexo considerado. Devido à dispersão, de janeiro em diante o número de animais foi diminuindo de maneira mais intensa e, no mês de abril, já não foi possível encontrar indivíduos agrupados. A razão sexual somente pôde ser observada a partir de dezembro, quando ocorreu a diferenciação sexual. Assim como foi citado na literatura e observado em condições de campo, a razão sexual de 1:1 (um macho para uma fêmea) foi mantida nesse período, até o momento em que ocorreu a dispersão dos indivíduos. As colônias 4 e 7 apresentaram dinâmicas muito parecidas com a da colônia 1. Porém, neste ano (2004) a maior dispersão dos indivíduos ocorreu no mês de janeiro reduzindo drasticamente o tamanho de colônia. No mês de fevereiro, devido a essa dispersão, a população da colônia foi reduzida a quase um quarto do número de indivíduos computados em janeiro. No mês de março todos os indivíduos já haviam se dispersado. ____________________________________________________________________29 A colônia 5 teve seu desenvolvimento normal nos meses de agosto e setembro. No mês de outubro ocorreu uma fissão da colônia reduzindo a população a 47,5 %, provavelmente devido à competição por recursos, pois era composta por um grande número de indivíduos (516). A partir daí o desenvolvimento da colônia foi normal até o mês de março. Assim como foi observado com as colônias 4 e 7 , no mês de fevereiro a população diminuiu a quase um quarto do número de indivíduos computados no mês anterior. A razão sexual dessas três colônias acompanhou as proporções esperadas de 1 macho:1 fêmea, como já havia sido observado na colônia 1 e em trabalhos citados na literatura. É importante notar que no mês de março a quantidade de fêmeas na colônia 5 era bem maior que a de machos. Foi observado, em condições de campo, que na falta de recursos ou mesmo quando ocorre uma invasão da teia, seguida de briga, pode ocorrer canibalismo. Nessa época do ciclo das colônias de P. bistriata as fêmeas são maiores e mais fortes que os machos. Talvez tenha ocorrido canibalismo dos machos pelas fêmeas, o que explicaria porque a razão sexual dessa colônia foi alterada para quase 4 fêmeas para cada macho (4 : 1). Em condições naturais foi observado, que indivíduos em dispersão ou colônias em atividade de forrageamento chegam a migrar mais de 100 metros em uma noite, e nem sempre as aranhas deixam teias que possam guiar o observador até local de dispersão. Quando a colônia 2 foi introduzida possuía 251 indivíduos e logo no segundo mês de observação (setembro) esse número caiu para 54. No terceiro mês já não foi possível encontrar nenhuma aranha no local onde elas foram introduzidas. Talvez a localização do ninho não tenha oferecido recursos suficientes para a colônia e essa sofreu uma primeira fissão, quando 78,5% da população se separou e, logo depois, as demais aranhas também desapareceram. A colônia 3 teve desenvolvimento inicial esperado, semelhante ao da colônia 1, com o número de indivíduos diminuindo bem lentamente, provavelmente devido à morte natural, predação, possível dispersão e outros fatores comuns. Porém, no mês de novembro a população da colônia diminuiu drasticamente, sobrando apenas 7 indivíduos e, no mês seguinte, já não havia mais nenhuma aranha no local. É provável ____________________________________________________________________30 que a disponibilidade de recursos tenha diminuído muito e/ou o microlocal não tenha sido adequado para a sobrevivência de uma colônia com indivíduos de porte maior. A colônia 6 apresentou desenvolvimento semelhante ao da colônia 3 ou seja, até o mês de outubro seu desenvolvimento foi normal, mas em novembro ocorreu uma fissão da colônia sobrando apenas 24,18% dos indivíduos e, no mês de dezembro todos já haviam desaparecido. Esta colônia foi introduzida no mesmo local da colônia 3. As razões sexuais dessas duas últimas colônias não foram computadas, pois a diferenciação sexual geralmente ocorre em meados de janeiro e, neste período, todos os indivíduos de ambas as colônias já haviam deixado o local. Como foi dito anteriormente, além das variações de disponibilidade de presas, há outros inúmeros estímulos que podem ser importantes no abandono de locais de nidificação, como: distúrbios no suporte das teias, estragos na teia por fatores físicos, como vento ou chuva, mudanças na temperatura e umidade, ou mesmo nas condições micro climáticas e, ainda, interações agonísticas, ou distúrbios causados por predadores ou parasitas. A fim de ampliar a discussão dos resultados visando encontrar explicações para as grandes diferenças encontradas nos tamanhos das colônias e na sua dinâmica populacional, foram analisados minuciosamente os locais de introdução de cada colônia no Câmpus da Unesp-Rio Claro, levando-se em conta os fatores ambientais, as estruturas físicas para suporte das teias aéreas, bem como a abundância de presas nesses locais. É possível estabelecer algumas relações entre os locais do Câmpus onde as colônias foram introduzidas e suas dinâmicas populacionais. Em alguns casos pode-se até mesmo fazer comparações entre os dois anos de observação. Considerando que todas as colônias foram introduzidas no mesmo local (Câmpus da UNESP-Rio Claro), a uma distância máxima de 1km uma da outra, os dados meterológicos coletados tais como temperatura, umidade relativa do ar e luminosidade praticamente se tornam inúteis, pois não constituem parâmetros de comparação para uma posterior discussão dos resultados. Porém, é possível fazer uma breve análise de cada um dos quatro micro ambientes utilizados e discutir as diferenças observadas nas dinâmicas das colônias estudadas. ____________________________________________________________________31 O local onde as colônias 1 e 4 foram introduzidas (30 metros do Biotério) mostrou-se um ambiente com vantagens para o desenvolvimento destas colônias. Elas foram introduzidas entre os galhos de uma árvore mostrada na Figura 3. Essa árvore possui folhas largas que podem abrigar o refúgio das colônias tanto na fase juvenil quanto adulta. Bem próximo desta árvore há um poste de iluminação no qual sua luz atrai um grande número de insetos voadores que servem de alimento para as aranhas. Uma outra característica favorável é o grande espaço disponível, que possibilita que todas as aranhas da colônia armem suas teias de caça sem que haja competição por espaço. E, por último, a cerca de 20 metros desse local, há uma cerca viva formada por inúmeras espécies de plantas que servem de abrigo para um grande número de espécies de insetos. O final da tarde, quando as aranhas começam a montar suas teias de caça, coincide com o horário de intenso trânsito de insetos que estariam voltando para o seu abrigo, assim como outros que estão começando suas atividades por apresentarem hábito noturno. As particularidades do ambiente descrito poderiam explicar o sucesso do desenvolvimento das colônias 1 e 4 nesse local ao longo do desenvolvimento ontogênico. Por outro lado, é possível verificar a existência de uma diferença muito significativa no que se refere à dinâmica populacional das colônias 2 e 5 nos dois anos de observação. O micro ambiente escolhido (estacionamento do CEIS) é uma área que possui espaço suficiente para a construção das teias de caça de todas as aranhas das colônias consideradas e também é composto por árvores e arbustos de folhas largas, que abrigam facilmente um refúgio comunal. Porém, nesse local faltam árvores e arbustos que poderiam servir de abrigo para alguns insetos ou mesmo atraí-los para a alimentação. Isso faz com que ocorra competição por alimento e a falta de recursos pode ter sido o motivo do abandono deste local pela colônia 2. Por outro lado, apesar de se tratar do mesmo micro ambiente, foi possível observar o desenvolvimento completo da colônia 5. A explicação mais plausível para tal acontecimento seria o fato de que, nesse período, foram instaladas lâmpadas no estacionamento do CEIS que poderiam ter atraído mais presas, não havendo assim competição interna por recursos entre os indivíduos desta colônia. ____________________________________________________________________32 As colônias 3 e 6 foram introduzidas nas proximidades do prédio do Departamento de Educação. Essas colônias apresentaram dinâmicas muito parecidas. Ambas se desenvolveram bem até meados do mês de outubro, em novembro ocorreu uma intensa fusão e em dezembro todos os indivíduos haviam deixado o local. Este microlocal apresenta espaço suficiente para a construção de teias de caça não havendo, portanto, competição interna por espaço. Além disso, é possível notar algumas árvores e arbustos ao redor do local de introdução da colônia que torna essa região rica em recursos já que isto poderia estar atraindo uma grande quantidade de insetos. Também há luz nas proximidades que poderia estar atraindo ainda mais as presas. Porém, existe uma provável explicação para o abandono deste local pelas duas colônias. A árvore onde as colônias 3 e 6 foram implantadas apresenta folhas muito pequenas que acabam não servindo de proteção para um refúgio comunal de aranhas em estágio semi-adulto e adulto. Sendo assim, ao se sentirem vulneráveis, as aranhas podem ter deixado este micro ambiente a procura de um outro local com folhas maiores que poderiam estar lhes oferecendo maior proteção. A colônia 7 foi introduzida nas proximidades do CEAPLA. Assim como no local de implantação das colônias 1 e 4 este ambiente apresenta características totalmente favoráveis para o desenvolvimento de colônias tais como: riqueza de recursos, espaço para construção de teias de caça, proteção para o refúgio graças à presença de folhas largas e localização estratégica em relação ao trânsito de insetos alados. Todas essas características fazem com que uma colônia de Parawixia bistriata se desenvolva com sucesso. ____________________________________________________________________33 6. CONCLUSÃO Na natureza a sobrevivência está diretamente relacionada com a obtenção de recursos e a defesa contra predadores e distúrbios do local que servem de abrigo. Com a intenção de obter as condições ideais para o desenvolvimento os organismos devem buscar a otimização dos fatores relacionados acima. Essa busca pelas condições ideais leva os organismos ao forrageio. Muitas espécies passam a ter um comportamento nômade, ou seja, mudando de microlocal constantemente por todo o seu desenvolvimento. Para alguns animais a mudança de microlocal pode ser uma tarefa fácil, mas para as aranhas construtoras de teia aérea esse comportamento se torna um tanto quanto complicado. Além de quantidade de recursos e condições construção de um abrigo essas aranhas também dependem de características físicas do ambiente, pois precisam de uma estrutura que seja capaz de sustentar os fios de uma teia de caça. Quando se fala de aranhas sociais, como Parawixia bistriata a busca por um microlocal torna-se ainda mais complicado. Além de todas as características citadas anteriormente as aranhas sociais devem buscar microlocais que suportem grande quantidade de indivíduos, que neste caso pode chegar bem próximo de 1000. Sendo assim, é comum o acontecimento de fissões das colônias de Parawixia bistriata. ____________________________________________________________________34 Dos pré-requisitos de sobrevivência e possível mudança de microlocal citados acima, os dois principais responsáveis pelas fissões das colônias de P. bistriata são: escasses de recursos e abrigo insuficiente para proteger a todos os indivíduos. As dinâmicas populacionais das colônias observadas nesse experimento confirmam as idéias propostas para o forrageio na medida em que é possível notar fissões de algumas delas bem como o abandono completo do local de introdução no Câmpus. As colônias que foram acompanhadas por todo o desenvolvimento apresentaram uma dinâmica populacional esperada, na medida em que o número de indivíduos foi diminuindo lentamente até o momento de dispersão que se dá entre os meses de fevereiro e março. Um outro fator que se confirma na dinâmica populacional dessas colônias é a razão sexual de 1:1 quando os indivíduos atingem a idade adulta, conforme foi observado por outros autores anteriormente. Assim sendo, pode-se concluir que algumas das colônias introduzidas no Câmpus da UNESP-Rio Claro tiveram um grande sucesso no seu desenvolvimento por conseguir aproveitar ao máximo os recursos que esse microlocal lhes oferecia. Por outro lado, outras colônias, que foram introduzidas em locais não muito adequados para o seu desenvolvimento, saíram em busca de um outro microlocal que atendesse às suas exigências para garantir a sobrevivência dos seus indivíduos. ____________________________________________________________________35 EXPERIMENTO II Aceitação mútua entre indivíduos de colônias diferentes em Parawixia bistriata ____________________________________________________________________36 3. MATERIAL E MÉTODOS Inicialmente foi montado um local de experimentação na Chácara Primavera, município de Itobi/SP (FIG.2), uma região que preserva a característica natural de cerrado da região, onde seria possível a observação da interação entre as colônias. Foi feito um losango com estacas de bambu de 2m de altura, distantes 2,5m umas das outras. Em uma das estacas foi fixada uma porção de sombrite que serviria de abrigo para a colônia que ali fosse introduzida. Próximo ao centro desse losango foi fixada uma estaca de bambu, à qual foi amarrada uma lâmpada para que se pudesse registrar o comportamento das aranhas no período da noite, além de atrair os insetos que serviriam de alimento para os membros da colônia. Ao lado da estaca com a lâmpada, também perto do centro do losango, havia um arbusto com cerca de 3,20m de altura e 2,40m de diâmetro. Todas as estacas e o arbusto foram interligados com linha branca para que as aranhas introduzidas tivessem onde apoiar suas futuras teias e começar o trabalho de construção das teias de caça e seu refúgio. A Figura 9 é um esquema do local de experimentação citado no texto. ____________________________________________________________________37 Figura 9: Esquema do local de experimentação. Vista de cima. 1- estacas de bambu de 2m de altura onde as colônias eram introduzidas. 2- estacas de bambu de 2m de altura interligadas por linha onde as aranhas apoiariam suas primeiras teias. 3- estaca de bambu de 2m de altura com uma lâmpada de 100 W na extremidade superior. 4 Arbusto. Em março de 2003 foram coletadas duas colônias de P. bistriata adultas, distantes 8km entre si, na Rodovia SP350, no município de Itobi/SP. Essas colônias foram devidamente marcadas para sua pronta identificação, conforme pode ser visto na tabela abaixo (Tabela 5). Tabela 5: Número de indivíduos introduzidos e marcação das colônias A e B. Colônia Nº de indivíduos Cor A 60 Amarelo e laranja B 210 Sem marcação No dia 8 de março a colônia A foi introduzida no local de experimentação, às 18h e 30min, que é o horário em que é iniciado o período de atividades desses animais. Inicialmente foi registrado o comportamento de reconhecimento do local e construção da teia. No dia seguinte, depois das 20h e 30min, foi introduzida a colônia B para verificar qual seria a interação entre as duas colônias e se haveria aceitação e tolerância entre elas. ____________________________________________________________________38 No dia 10 foi observada a localização das aranhas nos refúgios, durante o dia, e qual seria a disposição das teias durante a noite, para verificar se as aranhas permaneceriam em seus locais de construção das teias, como nas noites anteriores. Esse mesmo experimento foi repetido com outras duas colônias de P. bistriata, também coletadas no município de Itobi/SP em fevereiro de 2004. Uma delas foi coletada na Estrada do Cristo distante cerca de 2 Km, em linha reta, da outra colônia coletada na rodovia SP350. A Tabela 6 contém os dados referentes às colônias C e D. Tabela 6: número de indivíduos e marcação das colônias C e D. Colônia Nº de indivíduos Cor C 207 Sem marcação D 82 Branco No dia 26 de fevereiro de 2004 a colônia C foi introduzida no local de experimentação para verificar qual seria a disposição das aranhas quanto à construção da teia de caça. No dia seguinte pela manhã observou-se o local onde elas fizeram seu refúgio. Nesse mesmo dia, foi coletada a colônia D que teve seus indivíduos marcados com tinta branca na região do abdome e cefalotórax. Posteriormente essa colônia foi introduzida no local de experimentação, para que se pudesse estudar a interação entre as duas colônias. Nos dias que se seguiram as colônias eram observadas durante o dia para determinar a posição do(s) refúgio(s) e durante a noite para verificar o posicionamento das teias de caça. ____________________________________________________________________39 4. RESULTADOS A Figura 10 representa um esquema da disposição das aranhas da colônia A no local de experimentação, na noite do dia 8 de março de 2003. Figura 10: Local de experimentação com a disposição das teias construídas pelas aranhas da colônia A (amarelo e laranja) na noite do dia 08/03/03. ____________________________________________________________________40 Na manhã do dia 9 as aranhas da colônia A estavam agrupadas no refúgio artificial de sombrite como era esperado (elas se agruparam no mesmo local onde foram introduzidas). No dia 9 de março à noite a colônia B foi introduzida no local de experimentação. Porém, quando ocorreu a introdução, as aranhas da colônia A já haviam construído suas teias de caça, pois, o período de atividade dessas aranhas começou por volta das 18 horas e a colônia B foi introduzida depois das 20h e 30min. À medida que as aranhas da colônia B começaram a caminhar pelo local habitado pelas aranhas de A, estas começaram a eliciar comportamentos de reconhecimento, ou seja, caminhar lentamente esfregando seus dois primeiros pares de pernas nas teias ali existentes e levando-os à boca. Também promoviam pequenos puxões nessas teias, que até então eram teias de sustentação. Ao encontrar uma teia de caça (teias orbiculares individuais), as aranhas de B as tocavam, realizavam leves flexões, mas não as invadiam, assim como fazem dentro da sua própria colônia. Carvalho Jr. (1998) descreve 4 categorias de aranhas nas colônias de Parawixia bistriata. As primeiras seriam as aranhas residentes, aquelas que constróem suas teias de caça. As cooperantes seriam aranhas que auxiliam na caça de algumas presas grandes. As rapinantes são aquelas que invadem e roubam as presas capturadas por outras aranhas e as dominantes seriam as que invadem e expulsam as residentes para tomar suas presas e sua teia de caça. Mas, durante todo o seu período de vida, as aranhas não permanecem em uma mesma categoria. Essa distribuição vai depender do seu estágio de desenvolvimento, ou seja, do seu tamanho e instar. A maior parte das aranhas da colônia é composta por residentes e existe um certo “respeito” quanto ao território, ou seja, os limites das teias de caça são respeitados, na maioria das vezes, No encontro entre as aranhas de colônias distintas a interação foi bem pacífica. Elas apenas se tocavam, por poucos segundos, com os primeiros pares de pernas. Não houve brigas e nem expulsões das teias. Após o término do reconhecimento, as aranhas de B construíram suas teias nas regiões vazias do local de experimentação, ou seja, respeitaram o posicionamento da teia das aranhas da colônia A. O esquema apresentado na figura 11 indica o posicionamento das aranhas da colônia B no local de experimentação. ____________________________________________________________________41 Figura 11: Local de experimentação com a disposição das teias construídas pelas aranhas da colônia A (amarelo e laranja) e da colônia B (preto) na noite do dia 09/03/03. No dia 10, pela manhã, observou-se que a interação das duas colônias foi total. Elas formaram dois refúgios bem distintos, porém com representantes das duas colônias em cada um deles. Um refúgio maior, contendo 102 indivíduos, foi feito sobre o sombrite (local de introdução das duas colônias) (FIG. 12). Ali havia representantes machos e fêmeas das duas colônias. E, em um outro refúgio, construído sobre um galho do arbusto, próximo ao centro do local de experimentação, havia 62 aranhas. Os demais indivíduos se dispersaram (106 indivíduos ou 39,25%). Na noite desse mesmo dia as aranhas das duas colônias construíram suas teias de caça e mantiveram o posicionamento observado nas noites anteriores. Apesar de construírem refúgios comunais a disposição das teias de caça permaneceu a mesma. ____________________________________________________________________42 Figura 12: Refúgio comunal sobre o sombrite formado por indivíduos de duas colônias. A seta indica um indivíduo da colônia A pintado de amarelo. As colônias C e D, estudadas no ano seguinte, apresentaram interação muito semelhante. No dia 26 de fevereiro de 2004 a colônia C foi introduzida no local de observação. Às 18h e 43 min. as aranhas dessa colônia começaram suas atividades de construção de teia de caça. A disposição das aranhas no interior da área experimental às 22h e 20 min. está representada na Figura 13. ____________________________________________________________________43 Figura 13: Local de experimentação com a disposição das teias construídas pelas aranhas da colônia C (preto) na noite do dia 26/02/04. Na manhã do dia 27 as aranhas da colônia C construíram seu refúgio entre as folhagens do arbusto. As 19h e 30 min. do mesmo dia a colônia D foi introduzida no mesmo local onde a colônia C havia sido liberada (no sombrite). As 18h e22 min. as aranhas da colônia C começaram suas atividades. Como a colônia D foi introduzida à noite, suas aranhas começaram suas atividades por volta das 21h e 30 min. A interação entre as aranhas das duas colônias foi semelhante à observada no experimento realizado em 2003. O contato entre as aranhas não aparentadas e o comportamento de invasão e reconhecimento das teias das aranhas da colônia C pelos indivíduos da colônia D foram idênticos aos observados para as colônias A e B. No dia 28, ás 0h e 25 min. as teias das duas colônias estavam dispostas segundo o esquema apresentado na Figura. 14. ____________________________________________________________________44 Figura 14: Local de experimentação com a disposição das teias construídas pelas aranhas da colônia C (preto) e da colônia D (cinza) na madrugada do dia 28/02/04. Na manhã do dia 28 as duas colônias se agruparam inteiramente formando um único refúgio sob as folhagens do arbusto. Este local já havia sido usado pelas aranhas da colônia C para montar seu refúgio, na manhã anterior. Nas noites que se seguiram (29/02 e 01/03) observou-se que a interação foi maior ainda, pois gradativamente as aranhas acabaram por construir suas teias em diferentes pontos do local de experimentação. Ou seja, a territorialidade gradativamente foi desaparecendo. ____________________________________________________________________45 5. DISCUSSÃO Neste experimento observou-se que as colônias de Parawixia bistriata são muito tolerantes com aos membros coespecíficos de outras colônias. Notou-se que apesar de existir uma hierarquia inicial de algumas aranhas, durante a fase de reconhecimento, ao se depararem com aranhas ou teias de indivíduos de uma outra colônia, existe o respeito de não ultrapassar os limites dessas teias, não havendo tentativa de expulsão dos indivíduos residentes, mesmo que a aranha considerada seja dominante em sua teia original. Essa interação entre as colônias pode ou não ser vantajosa para indivíduos das duas populações. Por um lado, a formação de super-colônias poderia propiciar uma maior proteção contra os predadores, maior captação de alimento e, principalmente, a presença de futuros parceiros para o acasalamento, o que evitaria cruzamentos internos (endogâmicos) ou, então, pouparia os indivíduos de se acasalarem somente depois da dispersão, durante a fase de vida solitária. Porém, essa interação entre as colônias poderia ser prejudicial para alguns de seus membros. Indivíduos dominantes de uma colônia poderiam perder sua posição privilegiada para aranhas maiores da outra colônia. A captação de recursos e a dominância poderiam ser afetadas pela presença de novos membros. Além disso, essa ____________________________________________________________________46 união poderia estar adiantando a fase de dispersão de alguns indivíduos devido à intensa competição por alimento, bem como de espaço físico para a construção de suas teias de caça, fato observado no experimento envolvendo as colônias A e B. ____________________________________________________________________47 6. CONCLUSÃO Dentre as muitas espécies citadas na literatura somente uma pequena porção delas é formada por indivíduos que apresentam algum tipo de socialidade. A socialidade implica muitas vezes no altruismo visando o sucesso na sobrevivência e no desenvolvimento da colônia. Divisão de trabalho, divisão de castas e cuidado parental são outros aspectos importantes dentro de uma eussocialidade. Mas, como pode ser observado, essas características não são encontradas em todas as espécies com algum grau de socialidade. Das trinta mil espécies de aranhas descritas, aproximadamente sessenta delas apresentam algum tipo de comportamento social, porém nenhuma delas é eussocial, ou seja, alguns desses fatores não são característicos dessas espécies. Na sua grande maioria, elas são para-sociais ou sub-sociais. Isso significa que ou não apresentam castas bem definidas, ou não ocorre cuidado parental e nem divisão de trabalho segundo o sexo. Anelosimus eximus é uma espécie de aranha social que apresenta cuidado parental, porém, todos os indivíduos se acasalam e não há divisão de castas. Por outro lado, Parawixia bistriata é uma espécie para-social do cerrado cujas únicas características de socialidade são a divisão de alimento e a construção de um refúgio comunal. Ao final do desenvolvimento, todas as aranhas estão aptas para o ____________________________________________________________________48 acasalamento e após a postura dos ovos todos os indivíduos adultos morrem, não havendo cuidado parental. Quando a ooteca se rompe, forma-se uma colônia onde todos os indivíduos seriam irmãos, ou seja, consangüíneos. É possível observar que na maioria das espécies sociais de invertebrados há intolerância por coespecíficos de outra colônia. Em abelhas e formigas a presença de um coespecífico de outra colônia no ninho leva à morte do invasor Por outro lado, em colônias de Parawixia bistriata além das fissões das colônias ocorre fusão de colônias não aparentadas formando as chamadas super- colônias, havendo assim uma certa tolerância por coespecíficos não aparentados. Os resultados obtidos nesse experimento revelaram a existência de uma intensa interação e tolerância por parte das colônias que se unem. Assim, é possível concluir que a fusão de colônias de Parawixia bistriata pode ser uma estratégia evolutiva da espécie para garantir uma variabilidade genética maior. Considerando que cada colônia é formada por indivíduos irmãos, a fusão de colônias tornaria o cruzamento entre indivíduos não aparentados extremamente benéfico em termos de valor adaptativo. ____________________________________________________________________49 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARICO, J. E. Web removal patterns in orb-weaving spiders. In: Shear, W. A. Spider: Webs, Beahavior, and Evolution. Stanford, California: Stanford University Press, 1986, p. 306-318. CARVALHO JR., M. C. Biologia do Comportamento da aranha colonial Parawixia bistriata (RENGGER) (ARANEAE: Araneidae). Tese (Doutorado) – Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 1998. 69 p. CRAIG, C. L. Alternative foraging modes of orb web weaving spiders. Biotropica, v. 21, p. 257-264, 1989. D’AYALA VALVA, A.. Ecologia de Forrageamento da aranha Nephilengys cruenta Fabricius 1775 (Araneae: Tetragnathidae). 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The ricochet effect and prey capture in colonial spiders. Oecologia, v. 81, p.154-159, 1989. UETZ, G. W. Foraging strategies of spiders. TREE, v.7, n.5, p.155-159, 1992. ____________________________________________________________________52 CAPÍTULO 2 Comportamento de caça individual em colônias de Parawixia bistriata ____________________________________________________________________53 1. INTRODUÇÃO As aranhas formam o maior grupo taxonômico de organismos com hábito alimentar exclusivamente carnívoro (CODDINGTON & LEVI, 1991). Aranhas geralmente são forrageadoras generalistas, ou seja, predam principalmente insetos, mas podem incluir outros artrópodes ou mesmo outras aranhas em sua dieta. Elas possuem uma grande diversidade de toxinas neurotóxicas capazes de matar suas presas rapidamente. Na sua grande maioria, a presa é menor ou de tamanho similar ao da própria aranha, mas muitas podem subjugar presas muito maiores do que seus próprios tamanhos. Existem várias exceções, onde algumas espécies de aranhas podem predar pequenos vertebrados. Certas aranhas caçam pequenos peixes, enquanto outras coletam pólen retido em suas teias (WISE, 1993). Poucas espécies apresentam alimentação especialista. Segundo STOWE et al. (1987), um dos únicos exemplos de aranha orbitela especialista seriam as aranhas de boleadeira (Mastophora) que se alimentam de machos de algumas espécies de mariposas. A escolha das presas pelo predador está diretamente relacionada ao retorno energético, que vai depender do tempo de busca e manipulação, da disponibilidade de presas no ambiente e do valor energético das mesmas. Um forrageador ótimo tem que ____________________________________________________________________54 avaliar as vantagens de se caçar, ou não, um determinado tipo de presa (D’AYALA- VALVA, 2000). As aranhas construtoras de teias aéreas têm grande habilidade em capturar vários tipos de presas, inclusive aquelas consideradas difíceis por possuírem veneno, carapaças duras ou serem muito ágeis. Alguns insetos podem expelir uma grande quantidade de suas substâncias de defesa ao serem capturados por uma teia aérea e, sendo assim, só após um determinado tempo é que a aranha vai capturá-lo. Muitas espécies de aranhas orbitelas possuem um sistema de caça altamente eficiente diretamente relacionado à velocidade e habilidade das pernas e quelíceras, tornando-as capazes de subjugar uma presa potencialmente difícil. Para as aranhas orbitelas, a teia é um instrumento fundamental para a retenção e captura de presas (CRAIG, 1987; EBERHARD, 1989). Ela aumenta a eficiência na captura de presas (ENDERS, 1975; RYPSTRA, 1982). O local onde a teia é construída e o período do dia em que a aranha forrageia influenciam tanto na visibilidade da teia para a presa, como no tipo e na quantidade de presas capturadas (NENTWIG, 1980). A teia é um dispositivo generalista, considerando que ela está adaptada para capturar os mais diversos tipos e tamanhos de presas (NENTWIG, 1987). Marques (2002), estudando as gotículas encontradas nas teias amareladas da aranha orbitela Nephila clavipes, descobriu que nelas estão presentes compostos químicos que, além de aumentar a elasticidade da teia, também são potentes toxinas neurotóxicas. Essas neurotoxinas provocam grande atividade no sistema nervoso de insetos. Segundo o mesmo autor, a presença de toxinas na teia seria uma outra estratégia de caça usada pela aranha, já que a presa apresenta algum tipo de paralisia ao entrar em contato com ela. Quando as presas se fixam à teia, em uma manobra para tentar se livrar, elas acabam ingerindo parte dos fios, apresentando, conseqüentemente, um certo grau de paralisia e, dependendo do caso, culminando com sua morte. O mesmo autor, em trabalhos de campo, verificou que os compostos que formam essas gotículas de veneno variam sazonalmente, estando diretamente relacionados com a dieta da aranha, nas diferentes épocas do ano. Observou também que essas toxinas da teia eram mais ativas nos insetos que representavam a maior parte da dieta da aranha, nas diferentes estações do ano. ____________________________________________________________________55 SANDOVAL (1994) descreveu a plasticidade no comportamento de construção da teia de indivíduos jovens de P. bistriata. Durante o período de revoada de cupins, as aranhas constroem teias especiais, aumentando o espaçamento entre as espirais e, conseqüentemente, o diâmetro da teia. A evidência de que esse tipo de teia está associado à captura de cupins é confirmada pelo fato de que essas aranhas a constroem, coincidentemente, no período de revoada desses insetos. Da mesma forma, teias com diâmetros menores e espirais menos espaçadas coincidem com a época de ocorrência de um grande número de pequenos dípteros (Domiphora). Sendo assim, a referida autora concluiu que essa espécie de aranha tem a capacidade de ajustar sua estratégia de caça em função da demanda de presas disponíveis, maximizando a obtenção de recursos e aumentando o seu valor adaptativo. A maioria das espécies de aranhas captura presas bem menores do que elas, mas entre as orbitelas existem aquelas que apresentam um comportamento de caça mais eficiente, que propicia a captura de presas muito maiores que seu próprio tamanho, com um máximo de 300 a 550% de sua dimensão. Na natureza, geralmente o número de presas pequenas capturadas é bastante elevado, mas, em termos de comparação, as orbitelas podem capturar presas bem maiores que as aranhas não orbitelas. Quando comparadas com outros predadores, as aranhas são bem mais eficientes na capacidade de capturar presas grandes. Este potencial predatório deu origem a uma grande variedade de estratégias de caça, incluindo técnicas mais eficientes de captura de presas, comportamento social bastante desenvolvido em algumas espécies, além de uma grande variedade de tipos de teia (NENTWIG & WISSEL, 1986). Vários trabalhos sobre o comportamento de caça e a dieta de aranhas orbitelas indicam que presas grandes representam a parte mais importante de sua biomassa total (D’AYALA-VALVA, 2000). D’Ayala-Valva (2000) observou que a aranha orbitela Nephilengys cruentata possui uma dieta seletiva, na medida em que compara as presas disponíveis com as capturadas. As presas pequenas têm sua importância na dieta, pois, além de fazerem parte da biomassa da aranha também podem ser essenciais em períodos de pouca disponibilidade de presas. As presas pequenas ficam retidas na teia e a aranha poderá consumir este alimento no momento da reciclagem de sua armadilha, maximizando a obtenção de recursos com a perda de energia. No trabalho desta autora ____________________________________________________________________56 foi concluído que Nephilengys cruentata é capaz de se alimentar de um amplo espectro de presas de diferentes tipos e tamanhos, inclusive aquelas que são duas ou mais vezes maiores que seu próprio tamanho. Em muitas espécies observou-se a existência de um ajuste comportamental ao tipo de presa, permitindo um aumento da eficiência de captura. É bastante comum o fato de que as presas, especialmente as de maior tamanho, sejam envolvidas em fios de seda secretados pelas aranhas, para facilitar a imobilização e o transporte (ADES et al., 1990). A imobilização da presa se dá por meio de “mordidas” curtas ou longas ou pelo enrolamento por seda. Durante o enrolamento a aranha pode girar a presa e assim ir adicionando seda ou, caso seu tamanho seja inferior ou semelhante ao da presa, pode se locomover ao redor desta para envolvê-la com a seda. As aranhas orbitelas podem apresentar diferentes comportamentos na manipulação e local da teia onde, presas de diferentes espécies e tamanhos vão ser ingeridas. Em alguns casos, como em Nephilengys cruentata, a aranha consome suas presas no seu refúgio localizado na parte superior da sua teia. Em outra espécie de orbitela, Nephila clavipes, a grande maioria dos insetos é ingerida no centro da teia. Todas as espécies de aranhas sociais são construtoras de teia e a utilizam para capturar presas. Grandes colônias podem conter centenas de indivíduos em uma pequena área. A superfície da teia ocupada por uma aranha diminui de espécies solitárias para sociais (JACKSON, 1978). Acredita-se que as aranhas sociais devem ter desenvolvido técnicas de suprir sua taxa de energia necessária, mesmo com a diminuição da superfície de caça de cada uma delas na teia de captura. Em espécies de aranhas sociais, a cooperação entre indivíduos pode promover grandes vantagens para a colônia: construção de abrigo contra mau tempo, proteção contra predadores e parasitas e captura de presas que não seriam pegas por coespecíficos solitários. (KULLMANN, 1972; BURSKIRK, 1975; JACKSON, 1978; KRAFFT,1979; VOLLRATH, 1982; CHRISTENSON, 1984; KRAFFT, 1985; NENTWIG, 1985; RIECHERT, 1985; UETZ, 1988; BREITWISH, 1989; KRAFFT & PASQUET, 1991) Aranhas sociais estão associadas à cooperação de captura de presas e alimentação comunal (UETZ et al., 1982). Grupos de aranhas podem capturar presas ____________________________________________________________________57 maiores em relação às aranhas coespecíficas solitárias. (BURGESS, 1976; WARD, 1986). Willey & Jackson, (1993) formularam a hipótese de que dentro das colônias de aranhas sociais, as aranhas que primeiro atacam uma presa teriam vantagem ao ingeri-la, em relação às aranhas que somente cooperam na mumificação ou transporte desta presa. Esses autores observaram que, em Stegodyphus mimosarum, o tempo gasto pela aranha que ataca a presa e dela se alimenta é o mesmo em relação ao das outras aranhas da colônia que não participaram desse processo de captura. Porém, a aranha caçadora leva vantagem quanto ao tipo de alimentação. As aranhas que atacam as presas geralmente se alimentam do tórax que é a parte mais nutritiva da presa, enquanto que as outras aranhas se alimentam das outras partes do corpo da presa. Anelosimus eximius é uma espécie de aranha social encontrada na zona tropical da América do Sul. Centenas de indivíduos podem dividir a mesma teia e cooperar em diferentes atividades como a construção da teia, cuidado com a prole, alimentação dos indivíduos jovens e captura de presas. (BRACH, 1975; FOWLER & LEVI, 1979; CHRISTENSON, 1984). Após a presa cair na teia, um determinado número de aranhas se aproxima para capturá-la. Depois de mumificada, a presa é picada e paralisada sendo, posteriormente ingerida por um grande número de aranhas. Durante a fase de caça, as aranhas que estão na periferia da teia são atraídas para o centro das vibrações provocadas pela presa, aumentando assim o número de aranhas que dela se alimentarão (BRACH, 1975; VOLLRATH E RODHE-ARNDT, 1983; KRAFFT & PASQUET, 1991). Parawixia bistriata é a única espécie de araneídeo social que apresenta tanto a caça cooperativa quanto a solitária Os fios de suporte das teias dessas aranhas coloniais fornecem pontos de apoio para as teias de outros indivíduos da colônia, o que acaba sendo uma vantagem da socialidade, pois, as aranhas se tornam capazes de construir teias utilizando os espaços não disponíveis para um indivíduo solitário (LUBIN, 1974; LUBIN, 1980; BUSKIRK, 1981). Assim, as teias coloniais são formadas pela junção de várias teias individuais construídas em estruturas de suporte comuns. O conjunto formado pelas teias individuais sobre a estrutura comum é denominado "super-teia". (UETZ, 1986; SANDOVAL, 1987; CARVALHO JR., 1998). ____________________________________________________________________58 As aranhas das colônias de P. bistriata armam suas teias de caça durante o crepúsculo, quando cada aranha vai produzir a sua teia orbicular. Durante toda a noite as aranhas tentam capturar o maior número de presas possível sendo que essas presas podem ou não ser compartilhadas com outras aranhas. Tudo depende do tamanho da presa que foi capturada, do tamanho da aranha que capturou uma determinada presa e de quantas presas foram capturadas pela mesma aranha. Carvalho Jr. (1998) apresentou uma proposta de categorização das aranhas das colônias de P. bistriata, classificando-as como sendo residentes, rapinantes, cooperantes ou dominantes. Também descreveu o comportamento de caça grupal e a divisão das presas por essas aranhas. Porém, em condições naturais, foi observado que, na sua grande maioria, as presas não são compartilhadas pelas aranhas da colônia e que o comportamento realizado pela aranha durante a caça de presas de diferentes tamanhos pode ter uma relação com o seu modo de vida social. Além disso, ocorre uma competição interna por recursos, já que não existe divisão de castas e todas as aranhas se acasalam ao final do seu desenvolvimento. Diante das características citadas acima sobre a biologia e ecologia da aranha social Parawixia bistriata, o segundo capítulo dessa pesquisa refere-se ao estudo do comportamento de caça individual dessa espécie. ____________________________________________________________________59 2. OBJETIVOS Este capítulo teve como objetivo o estudo do comportamento de caça individual de aranhas de colônias de Parawixia bistriata, levando em consideração o tamanho da presa e o local onde ela é consumida (centro ou periferia da teia); estes dados possibilitarão uma avaliação dos valores adaptativos dentro de uma colônia. ____________________________________________________________________60 3. MATERIAL E MÉTODOS Para a realização do estudo do comportamento de caça individual das aranhas coloniais Parawixia bistriata, foram feitas diversas observações de campo bem como filmagens de eventos de caça realizados por esses indivíduos. Essas observações foram feitas utilizando-se as colônias citadas no Capítulo 1, bem como algumas colônias encontradas no campo, na cidade de Itobi, São Paulo, durante os meses de dezembro a março, período este em que os indivíduos das colônias atingem a fase adulta. Para que fosse possível observar o comportamento de caça realizado por tais aranhas, algumas presas foram oferecidas a indivíduos adultos durante o crepúsculo, pois é nesse momento em que foi caracterizado o início das atividades de caça dessa espécie. A determinação desse período tornou possível a utilização de indivíduos que ainda não haviam se alimentado, ou seja, as aranhas escolhidas já haviam construído suas teias de caça, mas ainda não haviam capturado nenhuma presa. Foram feitas observações aleatórias de aranhas dentro de colônias com mais de 200 indivíduos adultos. Como já foi mencionado anteriormente, este estudo teve como principal objetivo determinar algumas diferenças no comportamento de caça de presas de ____________________________________________________________________61 tamanhos variáveis, oferecidas em ordens diferentes a indivíduos da espécie estudada. Para facilitar a análise dessa diferença comportamental, o oferecimento das presas foi feito em dois eventos distintos. Primeiramente (Evento 1) foi oferecida a uma determinada aranha uma presa pequena (de tamanho menor do que o dela) e observou- se seu comportamento de captura, desde a localização da presa, seguida pela sua imobilização e, por último, a ingestão da mesma. Em seguida foi oferecida, à mesma aranha, uma presa grande (de tamanho maior do que o dela) e observou-se seu comportamento de captura seguindo os mesmos critérios adotados para a primeira presa. Esse procedimento foi repetido 70 vezes. Em um segundo momento do experimento (Evento 2), a ordem de apresentação das presas foi invertida, ou seja, a presa grande foi oferecida primeiro e a pequena depois. Neste experimento também foram realizadas 70 repetições. A Tabela 1 contém os dados referentes aos tipos de presa que foram oferecidas nesse experimento nos dois eventos citados. Tabela 1: Tamanho aproximado e ordem dos insetos que foram usados como presas no experimento. Presas Tamanho aproximado (cm) Ordem Pequena 0.5 a 1.5 Isoptera, Dermaptera, Diptera, Hymenoptera, Lepidoptera e Orthoptera Grande 2,5 a 6,0 Lepidoptera, Odonata e Orthoptera O comportamento de caça realizado pelas aranhas orbitelas envolve alguns eventos que são relevantes para discussão, tais como, local da teia onde a aranha se alimenta da sua presa (centro ou periferia), processo de mumificação da presa: se a presa é envolvida pela seda e local da teia onde isso acontece (centro ou periferia), bem como se a presa é desprezada pela aranha, ou seja, a presa pode ser descartada, ou simplesmente a aranha não se interessa em capturá-la. Durante o processo de caça as aranhas das colônias de P. bistriata permanecem na região central das suas teias orbiculares tal como foi observado em Argiope argentata e Nephila clavipes, duas aranhas solitárias também da família Araneidae. Robinson (1969) e Ades (1991) afirmaram que o centro da teia é o local ____________________________________________________________________62 onde ocorre a convergência das vibrações na teia e é nesta região que a aranha recebe a maior quantidades de estímulos oferecidos pela presa, o que possibilitaria uma maximização na orientação e posterior captura desta presa. Assim sendo, as presas oferecidas foram colocadas na região periférica das teias até que estas presas estivessem suficientemente fixas ao visgo para não escapar. As observações que se seguiram levaram em consideração os seguintes comportamentos realizados pelas aranhas na captura de ambas as presas (pequena e grande), das ordens utilizadas: 1- Desprezada 1: se a presa era desprezada no momento em que era oferecida à aranha. 2- Desprezada 2: se a presa era desprezada pela aranha devido à presença de uma segunda presa. 3- Mumificada na periferia: se a presa era mumificada na periferia da teia 4- Mumificada no centro: se a mumificação ocorria no centro da teia. 5- Ingerida na periferia: se a presa era ingerida na periferia da teia 6- Ingerida no centro: se a presa era ingerida no centro da teia ____________________________________________________________________63 4. RESULTADOS As Tabelas 2 e 3 contêm os dados referentes aos tipos de presas utilizados nos experimentos de comportamento de caça individual de aranhas das colônias de Parawixia bistriata. O tipo de presa é importante, pois a aranha pode ajustar o seu comportamento de caça conforme as estruturas, mecanismos de defesa e comportamento de agressividade que cada presa pode apresentar. Tabela 2: Tamanho e freqüência em que as presas grandes de cada ordem foram oferecidas (n=140) Ordem do inseto utilizado Nº de repetições Tamanho em cm Lepidoptera 74 3,2 – 6,0 Orthoptera 25 2,5 – 5,9 Odonata 41 5,8 – 6,0 ____________________________________________________________________64 Tabela 3: Tamanho e freqüência em que as presas pequenas de cada ordem foram oferecidas (n=140) Ordem de inseto Nº de repetições Tamanho em cm Dermaptera 32 1,2 – 1,4 Díptera 31 0,5 – 1,1 Hymenoptera 27 0,9 – 1,5 Isoptera 34 1,1 – 1,5 Lepidoptera 9 1,4 – 1,5 Orthoptera 7 1,4 – 1,5 Na Tabela 4 foram incluídos os resultados obtidos nos experimentos de comportamento de caça referentes as 70 repetições realizadas na primeira parte do experimento (Evento 1). Nesta série, cada aranha recebeu, uma presa de tamanho pequeno no primeiro momento e, posteriormente, uma presa grande. Tabela 4: Comportamento de caça realizado pelas aranhas durante as 70 repetições do Evento 1. Comportamento realizado Presa grande Presa pequena Desprezada 1 1 1 Desprezada 2 0 67 Mumificada na periferia 59 60 Mumificada no centro 1 66 Ingerida na periferia 68 2 Ingerida no centro 1 67 Afim de melhor visualizar os resultados inseridos na tabela 4 e facilitar a discussão desta primeira parte do experimento (Evento 1), foi confeccionado um etograma (FIG. 1) que mostra as diferentes etapas do comportamento de caça das aranhas das colônias de P. bistriata durante os ensaios realizados. ____________________________________________________________________65 Figura 1: Etograma do Evento 1 mostrando a seqüência de comportamentos que envolveram a captura de presas nas 70 repetições realizadas. As cores azul e verde indicam os comportamentos mais freqüentes na captura de presas pequenas e grandes respectivamente. ____________________________________________________________________66 A Tabela 5 contém os resultados referentes ao comportamento de caça registrado na segunda etapa do experimento (Evento 2), nas 70 repetições. Nesta série, primeiramente foram oferecidas presas grandes às aranhas. Em seguida, cada aranha, anteriormente alimentada com uma presa grande, recebeu uma presa pequena. Tabela 5: comportamento de caça realizado pelas aranhas durante as 70 repetições do Evento 2. Comportamento Presa grande Presa pequena Desprezada 1 0 65 Desprezada 2 0 0 Mumificada na periferia 57 4 Mumificada no centro 6 5 Ingerida na periferia 63 0 Ingerida no centro 7 5 Com os dados registrados no Evento 2 foi confeccionado um etograma mostrando as 70 repetições realizadas nessa segunda parte do experimento (FIG. 2). As Figuras 3 e 4 ilustram duas seqüências de caça de presas pequenas, que representam os resultados obtidos no presente capítulo do trabalho. ____________________________________________________________________67 Figura 2: Etograma do Evento 2 mostrando a seqüência de comportamentos que envolveram a captura de presas nas 70 repetições realizadas. As cores verde e azul indicam os comportamentos mais freqüentes na captura de presas grandes e presas pequenas respectivamente. ____________________________________________________________________68 Figura. 3: Seqüência comportamental de caça de uma presa pequena. (a) A aranha está em repouso no centro da teia. (b) A aranha toca a presa com os dois primeiros pares de pernas. (c) A aranha pica a presa. (d) A presa é retirada da teia e levada ao centro, carregada pelas quelíceras. (e e f) A aranha mumifica a presa. (g) A aranha se orienta no sentido anti-horário (h) A aranha ingere a presa capturada. ____________________________________________________________________69 Figura 4: Seqüência comportamental de caça de uma presa pequena. (a) A aranha toca a presa com os dois primeiros pares de pernas. (b) A aranha pica sua presa e a segura fortemente com as pernas. (c e d) A presa é mumificada no local de captura. (e) A presa é levada ao centro da teia, carregada pelas quelíceras. (f) A presa é mumificada no centro da teia. (g) A aranha fixa a presa ao centro da teia. (h) A aranha segura sua presa e começa a ingeri-la. ____________________________________________________________________70 5. DISCUSSÃO As aranhas construtoras de teia ou orbitelas apresentam uma dieta generalista, ou seja, alimentam-se de presas das mais variadas espécies e tamanhos. A teia é um instrumento que amplia a capacidade de capturar presas maiores que a própria aranha. Segundo D’Ayala-Valva (2000), no comportamento de caça das aranhas podem ser definidas três diferentes fases: localização, imobilização da presa e atividades no local da teia em que aranha passa a maior parte do seu tempo (refúgio, centro ou periferia da teia). A localização é a fase em que a aranha detecta a presença de uma determinada presa em sua teia e vai ao seu encontro. Quanto maior for a agitação da presa, maiores serão as vibrações e a aranha poderá detectá-la com bastante facilidade. Já as presas que permanecem imóveis ou produzindo poucas vibrações acabam enviando poucas informações à aranha quanto à sua localização. Portanto, para encontrá-la, a aranha pode sacudir ou puxar a teia repetidas vezes, percebendo os pontos de tensão e a posterior posição da presa. Nesse momento de localização da presa a aranha também tem condições de discriminar o tipo de presa (tamanho e grupo) e decidir se vai aceitá-la ou rejeitá-la. Em caso positivo, a aranha estabelece a melhor ____________________________________________________________________71 estratégia de capturá-la. Em caso negativo, a aranha pode simplesmente retirá-la da teia. Em alguns casos, a aranha toca a presa com o primeiro e, às vezes, o segundo par de pernas antes de atacá-la, o que sugere que essa inspeção permite o reconhecimento dessa presa pela aranha. Entretanto, em outros casos, a aranha dirige-se para a presa e “morde-a” diretamente, sugerindo que a discriminação já foi feita pelo tipo de vibração produzida pela presa ou pelas sacudidas que a própria aranha provoca na teia, que permitem o reconhecimento do tipo e tamanho de presa capturada. As teias não servem apenas para a captura das presas, mas também para enviar sinais à aranha pela transmissão das vibrações provocadas pelo inseto (KLANER & BARTH, 1982). A aranha começa a “morder” a presa assim que entra em contato com ela, podendo haver uma série de “mordidas” curtas em diferentes regiões do corpo do inseto ou uma “mordida” longa. Em certas espécies de aranhas orbitelas, a presa é previamente envolvida por seda antes de ser atacada. Esse processo de imobilização pode ser feito antes e/ou depois de “morder” a presa, além de ocorrer no local onde a presa vai ser ingerida (no centro da teia ou no refúgio) (ROBINSON & OLAZZARI, 1971). No caso de grandes insetos das ordens Lepidoptera e Diptera o ataque direto por “mordida” é mais freqüentemente observado. As presas pertencentes à primeira ordem soltam escamas das suas asas na tentativa de se livrarem da teia. Os dípteros promovem uma grande vibração, sendo capazes de se soltarem da teia de captura. O enrolamento prévio é utilizado em Orthoptera, Homoptera e Coleoptera relativamente grandes, porque esses insetos possuem pernas fortes e carapaças duras que os habilitam a escapar da teia, além de provocarem efeitos nocivos à aranha caçadora. Esse processo também se repete em insetos da Ordem Hymenoptera dotados de ferrões que, em alguns casos, podem causar até a morte da aranha (OLIVE, 1980). Analisando os resultados obtidos nos estudos do comportamento de caça individual da aranha social Parawixia bistriata, de maneira geral, é possível observar que existem algumas diferenças em relação aos dois experimentos realizados (Eventos 1 e 2). Interpretando os resultados obtidos no Evento 1 (Tabela 4) é possível observar que a aranha não despreza a primeira presa em um primeiro momento, ou seja, mesmo sendo uma presa de tamanho pequeno a aranha se preocupa em capturá-la. Foi observado apenas um caso em que houve rejeição da primeira presa. Porém, quando a ____________________________________________________________________72 segunda presa (inseto grande) foi oferecida, a aranha imediatamente desprezou a primeira presa em aproximadamente 97% dos casos. Supõe-se que essa espécie de aranha tem preferência por presas maiores, assim como é observado em outras espécies, para as quais as presas grandes representam a maior parte da biomassa que elas consomem ao longo de seu desenvolvimento. Essa suposição é reforçada pelo fato de que essa espécie apresenta comportamento social, havendo assim, uma competição interna na colônia que faz com que a aranha, ao escolher a presa grande, esteja garantindo o seu desenvolvimento em relação aos outros indivíduos da colônia. Esse comportamento também pode garantir um status de indivíduo dominante dentro da colônia, conforme foi proposto por Carvalho Jr. (1998). Além disso, a aranha está garantindo o acúmulo de reservas necessárias para o período reprodutivo, pois, devido à ausência de divisão de trabalho segundo o sexo, todos os indivíduos das colônias de Parawixia bistriata se reproduzem. Os comportamentos de orientação e abordagem dessa aranha perante a presa são muito semelhantes aos observados nas outras aranhas orbitelas, conforme já foi mencionado. As aranhas dessa espécie em questão conseguem ajustar seu comportamento de caça conforme o tipo (espécie de inseto) e tamanho da presa, seguindo os padrões de ajustes comportamentais descritos por outros autores. Com os resultados obtidos no Evento 1, foi importante notar que 86,95% das presas pequenas capturadas foram mumificadas na periferia da teia em um primeiro momento. Somente duas das 60 presas citadas acima não foram levadas ao centro da teia. Por outro lado algumas presas não foram mumificadas na periferia, porem, todas elas foram levadas ao centro da teia. De todas as presas que foram levadas ao centro da teia, 95,65% delas foram mumificadas neste local. Analisando esses resultados em relação às observações dos locais onde essas presas foram ingeridas (ou parcialmente ingeridas) conclui-se que quase todas as presas pequenas capturadas foram imobilizadas no centro da teia. Observa-se também que, no Evento 1, apenas uma presa grande foi desprezada no momento em que foi introduzida na teia. Talvez esse fato possa ser explicado pelas fortes vibrações que ela efetuou, já que a presa em questão era um Orthoptera com 6 centímetros de comprimento. Com suas fortes pernas este inseto ____________________________________________________________________73 poderia oferecer algum perigo à aranha, que devido às essas vibrações, possivelmente, identificou e avaliou os perigos envolvidos nessa captura e optou por não capturá-lo. As demais presas grandes (69 do total de 70), ao serem oferecidas como segunda presa às aranhas, foram prontamente imobilizadas e posteriormente consumidas. Observou-se que 85,5% dessas presas foram imobilizadas com seda (mumificadas) no local de captura, ou seja, na periferia da teia. Apenas uma presa foi mumificada no centro da teia. Contudo, ela já havia sido inicialmente mumificada na periferia. As outras 10 presas capturadas não foram imobilizadas com a seda. Elas foram atacadas por “mordidas”, talvez devido a algum ajuste comportamental realizado pela aranha, em função do tipo de presa considerado conforme foi mencionado anteriormente. Um dos resultados mais interessantes refere-se ao local da teia onde as presas grandes foram ingeridas após serem capturadas e imobilizadas. Pesquisas realizadas com aranhas orbitelas revelaram que o centro da teia orbicular é o ponto de convergência das vibrações captadas, sejam elas provocadas por presas, competidores ou predadores. Sendo assim, as aranhas de teias orbiculares, quando em repouso, permanecem no centro de suas teias a fim de otimizar a captação das vibrações e, conseqüentemente, o sucesso na captura de presas. Muitas dessas espécies consomem suas presas no centro da teia. Desse modo estão mais protegidas contra a invasão de competidores e evitam um possível saque de outra aranha, estando prontas, inclusive, para responder aos estímulos eliciados por uma segunda presa que venha a se fixar em sua(s) armadilha(s). Analisando a Figura 1 é possível estabelecer, os padrões comportamentais da captura individual de uma presa pequena e, posteriormente, de uma presa grande registrados no Evento 1. Observa-se que 69 presas pequenas foram capturadas após a orientação e o ataque ajustados conforme o tipo de presa. Destas, 60 foram prontamente mumificadas no próprio local de captura (periferia) e 58 delas foram levadas ao centro da teia. As duas presas que não foram transferidas para a região central foram ingeridas imediatamente. Apesar de serem presas pequenas, aparentemente oferecem certo valor nutritivo para a aranha e por isso acabaram s