UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FAAC - FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO Taís Moura Machado MARKETING DE RELACIONAMENTO E RELAÇÕES PÚBLICAS: UMA APLICAÇÃO NO SERVIÇO DE PÓS-VENDA DA EMBRAER EXECUTIVE JETS Bauru 2012 Taís Moura Machado MARKETING DE RELACIONAMENTO E RELAÇÕES PÚBLICAS: UMA APLICAÇÃO NO SERVIÇO DE PÓS-VENDA DA EMBRAER EXECUTIVE JETS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Comunicação Social da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista / UNESP-Bauru, como parte dos requisitos para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social: Relações Públicas. Orientadora: Profª. Drª. Célia Maria Retz Godoy dos Santos Bauru 2012 ORIENTADORA: __________________________________ Célia Maria Retz Godoy dos Santos Graduada e mestre em Comunicação Social, doutora em Sociologia e docente do Departamento de Comunicação Social, e do Programa de Pós Graduação em Poéticas Visuais da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, da Universidade Estadual Paulista / UNESP- Bauru. Coordenadora do Curso de Relações Públicas e Núcleo de Opinião da UNESP. BANCA EXAMINADORA: _______________________________ Maria Eugênia Porém Graduada em História pela Universidade Sagrado Coração/USC, Mestre em Comunicação Midiática e doutora em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista/UNESP-Bauru. Especialista em Comunicação, Marketing e Negócios pela Universidade de Marília. Professora assistente do curso de Relações Públicas, da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC), UNESP-Bauru. _______________________________ Fernanda de Almeida Graduada e mestranda em Comunicação Social pela Universidade Estadual Paulista/UNESP-Bauru, especialista em administração de empresas com ênfase em marketing pela Fundação Armando Alvares Penteado/FAAP e especialista em comunicação e planejamento estratégico pela Universidad Pontificia de Salamanca. Professora Universitária de Graduação e Pós-Graduação, tutora de cursos livres e MBA da Fundação Getúlio Vargas FGV- Online, Consultora em Comunicação, Marketing e Gestão. Bauru, 30 de novembro de 2012 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho aos meus pais, Marco e Ana, que estão sempre ao meu lado apoiando minhas decisões e permitindo que eu possa trilhar meu próprio caminho. Obrigada por todo o amor e paciência, além da dedicação e ensinamentos. Vocês são minha base, meu exemplo e o motivo de eu estar aqui hoje. Amo vocês! AGRADECIMENTOS Agradeço à minha orientadora, Célia Retz, por ter me apoiado neste trabalho com dedicação, mesmo que à distância. Às professoras Maria Eugênia e Fernanda, por terem aceitado gentilmente participar de minha banca, fazendo parte do encerramento de um importante ciclo de minha vida. À Embraer por permitir a realização deste trabalho e à Elaine Moreira, pela compreensão e auxílio nos momentos de dedicação extra a este trabalho. Às minhas irmãs Mariana e Luiza e ao meu irmão Lucas, que me dão orgulho e me servem de exemplo, motivando-me a ser uma pessoa melhor. Às minhas companheiras de república, Gaby, Bota, Robin, Ema, Leka, Maria, Melody e Angie, que me proporcionaram os melhores momentos em Bauru e que me ensinaram a valorizar e aprender com as diferenças. Aos membros do Grupo AGR (Ação, Gestão e Responsabilidade) que me fizeram abrir os olhos e a cabeça para novas ideias e horizontes, além de serem companheiros imbatíveis para todas as horas. Por fim, a todos os amigos e amigas que me acompanharam nesta trajetória universitária, tornando essa fase extraordinária e inesquecível. RESUMO O presente estudo tem o intuito de investigar a inter-relação das áreas de Marketing de Relacionamento e Relações Públicas, destacando seu valor estratégico. O objetivo é refletir sobre a atuação do relações-públicas no processo de gestão de fidelização de clientes aprimorando os serviços prestados no pós-venda, com aplicação específica no mercado de aviação executiva. Para estabelecer as bases de apoio que visam responder as hipóteses tratadas revisou-se a literatura sobre o assunto, procurando quebrar as barreiras entre os campos de saber vizinhos: marketing, em especial o de relacionamento, e as Relações Públicas. A consulta à bibliografia pertinente foi uma atividade contínua em todo o trabalho. Dividido em três capítulos, sendo os dois primeiros de fundamentação, apresentam um retrato dos serviços de pós-venda, ressaltam a importância do relacionamento e da definição de públicos neste âmbito, além de detalhar o mercado, dito como de luxo. O terceiro capítulo finaliza a discussão, oferecendo uma proposta de relacionamento para a Embraer Executive Jets a partir de ações pautadas nos referenciais teóricos abordados. Aos poucos, ao refletir e juntar ideias sobre o assunto, de forma a aproveitá-las na elaboração da proposta, culminou-se na seguinte conclusão: o relações-públicas é capacitado e preponderante para a construção de relacionamentos eficazes no pós-venda, pois preza pela excelência da comunicação e conhece a importância dos públicos neste processo. Palavras-chave: Marketing de Relacionamento, Relações Públicas, Relacionamentos, Pós-venda, Mercado de Luxo, Aviação Executiva. ABSTRACT The present study aims to investigate the interrelationship between the Relationship Marketing and Public Relations areas, highlighting its strategic value. The main goal is to discuss how the public relations professional can manage the customer loyalty by improving the after-sales services provided, applying it to a specific market such as business aviation. To establish the foundation to support the hypotheses, a revision of the subject literature was made, seeking to break down the barriers between marketing - mainly of relationship - and public relations knowledge fields. A consult of the relevant literature was a continuous activity throughout the work. Divided into three chapters, the two first ones of fundamentals concepts, presents an after-sales services scenario, emphasizing the importance of the relationship and the definition of audiences in this area, in addition to a detailed description of the luxury market, a business aviation reality. The third chapter ends the discussion with a relationship proposal for Embraer Executive Jets, through actions based on the studied concepts. By gathering ideas and reflecting about the subject, using them to develop the proposal, a conclusion was resulted: the public relations professional is prepared and essential to build an effective after-sales relationship, since it's concerned about the communication excellence and knows the audiences significance in this process. Keywords: Relationship Marketing, Public Relations, Relationships, After Sales, Luxury Market, Executive Jets. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Estágios da Excelência nos Serviços................................................40 Figura 2 - Portfólio de Jatos Executivos por Categoria......................................54 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Comparação entre Marketing 1.0, 2.0 e 3.0.....................................19 Tabela 2 - Tipos de Relacionamentos e Resultados Esperados.......................31 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................. 12 1. MARKETING E RELACIONAMENTO: UM PANORAMA .................. 15 1.1 Breve Evolução do Marketing .......................................................... 17 1.2 Marketing de Relacionamento ......................................................... 22 1.3 Relações Públicas e Relacionamento .............................................. 28 2. O PÓS-VENDA: UM OLHAR DE RELAÇÕES PÚBLICAS ................ 34 2.1 O Retrato dos Serviços de Pós-Venda ............................................ 35 2.2 Definição e Identificação de Públicos .............................................. 44 2.3 Mercado de Luxo: um Segmento em Ascensão .............................. 47 3. UMA PROPOSTA DE RELACIONAMENTO NO PÓS-VENDA: EMBRAER EXECUTIVE JETS .................................................................... 51 3.1 Embraer e a Participação no Mercado de Aviação Executiva .......... 52 3.2 Entendendo o Mercado de Aviação Executiva ................................. 55 3.3 A proposta para a Embraer Executive Jets ...................................... 58 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................... ........................................... 70 REFERÊNCIAS ............................................................................................. 73 12 INTRODUÇÃO 13 A globalização econômica transformou, nos últimos anos, a maneira com que as organizações relacionam-se com seus públicos e o ambiente. A necessidade de adaptação e adoção de nova postura por parte das organizações representou uma modificação nas relações com os clientes. Neste contexto, o marketing tradicional – aplicado até a metade dos anos 90 pela maioria delas – começa a adaptar-se às novas regras e demandas de mercado. Se antes elas buscavam novos clientes sem necessariamente preservar os já conquistados, hoje esta postura não se aplica mais. A satisfação do cliente agora está na constante avaliação e no relacionamento pós-venda. Nesta dinâmica, surgem as oportunidades para o Marketing de Relacionamento, que preza a manutenção do relacionamento com o cliente já conquistado. Ele corresponde a um conjunto de ações que visa promover fidelização com os clientes, de forma a mantê-los a partir de ações de comunicação relevantes. Todavia, este relacionamento não está somente ligado a uma visão mercadológica, mas também à percepção dos clientes em relação à imagem da empresa em atender suas necessidades da melhor forma possível. Assim, pode-se dizer que a atividade de Relações Públicas vai ao encontro desta perspectiva, podendo desenvolver, prever e instigar como será estabelecido este relacionamento. A partir da união dos conceitos de Relações Públicas e de Marketing de Relacionamento, este processo pode ser visto não só como um complemento de uma venda, mas como o início da fidelização de clientes. Portanto, o objetivo deste estudo é refletir sobre a importância do Marketing de Relacionamento na consolidação da imagem organizacional e na fidelização de clientes, num mercado específico como o da Embraer Executive Jets e, de que forma este processo pode ser gerido pelo relações-públicas. A intenção é atentar para a transformação da percepção e da experiência do consumidor na aquisição de um bem de luxo para que isso extrapole o ato de compra, consolidando-se em uma imagem institucional positiva e forte sobre a organização. As hipóteses oferecidas incluem a verificação do papel das Relações Públicas no desenvolvimento de um programa de Marketing de Relacionamento no serviço de pós-venda, especialmente quando apresentada 14 uma proposta de ação para o mercado de aviação executiva do Brasil, utilizando como exemplo, a Embraer Executive Jets. Assim, ancorado nesta perspectiva, o trabalho é exposto em três capítulos. No primeiro são debatidos aspectos nos campos de marketing e de relacionamento, buscando suas conexões com a atividade de Relações Públicas, no sentido de demonstrar que são complementares. Agrega-se a isso, a exposição da evolução do marketing, que segundo Kotler (2010) inclui as fases do Marketing 1.0, 2.0 e 3.0. E, ainda se apoia na fundamentação dos teóricos McKenna (1999), Gordon (2000), entre outros, para a conceituação dos termos. “Pós-venda: um olhar de Relações Públicas” é o título do segundo capítulo, no qual são abordadas temáticas como: o retrato dos serviços de pós- venda, a definição e identificação de públicos e o mercado de luxo. A reflexão a cerca desses conceitos serve para apoiar a análise posterior do mercado de aviação executiva, bem como subsidiar o plano de ação. Entre os teóricos estudados neste capítulo estão: Inglis (2002), Abreu (1996), França (2004), Galhanone (2005), entre outros. Já o terceiro capítulo, o último, trata da proposta de relacionamento no pós-venda da Embraer Executive Jets. Engloba, basicamente, seu histórico e uma breve explanação sobre o mercado de aviação executiva, de forma a compreender melhor as necessidades deste segmento. O enfoque é nas Relações Públicas e se delimita os objetivos e públicos, assim como as ações, a implantação e o controle. Em síntese dedica-se a investigar a inter-relação do Marketing de Relacionamento com as Relações Públicas, destacando seu valor estratégico. Busca aprimorar os serviços prestados no pós-venda chamando para a reflexão acerca dos resultados alcançados, como a fidelização de clientes, o posicionamento de mercado, a expansão das vendas de serviços e, consequentemente, o aumento da lucratividade. 15 1. MARKETING E RELACIONAMENTO: UM PANORAMA 16 Nos últimos 50 anos, ocorreram diferentes etapas de evolução do marketing, sendo destacadas diversas definições para a área. A primeira definição criada pela American Association Marketing (AMA) em 1935 define o marketing como: “O desempenho das atividades empresariais que dirigem o fluxo de bens e serviços dos produtores até os consumidores” 1. No entanto, com as modificações ocorridas no marketing, este conceito foi considerado incompleto, uma vez que abrangia somente os objetivos individuais e organizacionais. Com o passar dos anos foram feitas algumas revisões nesta definição, sendo a última realizada pela AMA em 2008, trazendo uma visão mais ampla e universal: Marketing é a atividade, conjunto de instituições e processos para criar, comunicar, distribuir e efetuar a troca de ofertas que tenham valor para consumidores, clientes, parceiros e a sociedade como um todo (AMA, 2008, s/p). Diversos outros autores procuraram compreender melhor a definição de marketing aprimorando e discutindo seus conceitos, como Kotler ao afirmar que “é um processo social e gerencial pelo qual indivíduos e grupos obtêm o que necessitam e desejam através da criação, oferta e troca de produtos de valor com outros” (1998, p.27). Já Ian Gordon define marketing como o "processo de identificar a satisfação das necessidades dos clientes de um modo competitivamente superior de forma a atingir os objetivos da organização" (2000, p.32). Porém, a definição que vem ao encontro do presente estudo é de Regis McKenna: A palavra marketing tem muitas definições, mas sem dúvida a melhor forma de definir marketing é como o “desenvolvimento de relações”. Se o pessoal de marketing desenvolver relações sólidas, seu conhecimento sobre o cliente e a comunicação com o cliente é um valor constante. O mesmo se aplica a relações com o revendedor, distribuidor, mídia e engenheiros (MCKENNA, 1999, p.235). 1Disponível em: http://www.portaldomarketing.com.br/Artigos/O_que_e_Marketing_o_Marketing_e_suas_princip ais_definicoes.htm. Acesso em 20 de setembro de 2012. 17 Com base neste conceito, iniciaremos uma breve exposição sobre o marketing e o relacionamento, traçando um panorama de seu surgimento até atingir a temática atual. 1.1 Breve Evolução do Marketing A origem do marketing é contraditória segundo diversos autores, sendo praticado na realidade desde o início da humanidade. Kotler (1998) afirma que o marketing ou o processo de troca é uma das atividades mais antigas do mundo, tendo sua origem nos primeiros processos de troca e passando pelos modernos sistemas de marketing atual. Ainda conforme o autor, os estudos formais sobre o assunto surgiram no início do século XX, no campo da administração de empresas. Para Kotler (2010, p.3-7), o marketing sofreu grandes evoluções ao longo dos anos, passando por três fases chamadas Marketing 1.0, 2.0 e 3.0. Já para Etzel, Walker e Stanton (2001), a análise do marketing em seu processo de evolução se dá a partir da Revolução Industrial configurando-se em três estágios sucessivos de mudanças na comercialização, que são: a orientação para a produção, a orientação para vendas e, posteriormente a orientação para o marketing. Las Casas (1997) chama esses estágios de: Era da Produção, Era de Vendas e Era do Marketing. No estágio de orientação para produção, segundo Etzel, Walker e Stanton (2001), o foco dos fabricantes estava no aumento da produtividade, o que foi permitido a partir da Revolução Industrial. A demanda era maior que a oferta, considerando que os consumidores estavam ansiosos por produtos e serviços. Assim, as empresas conseguiam vender qualquer produto para os consumidores sem quase nenhum esforço de vendas. De acordo com Kotler (2000), essa orientação para produção é viável enquanto o consumidor está mais interessado no produto do que em suas funções específicas. O autor (2010) denomina esta fase de Marketing 1.0, quando está centrado no produto. 18 A Era de Vendas ou estágio de orientação para vendas inicia-se após a depressão de 30 nos EUA. Segundo Las Casas (1997) e Etzel, Walker e Stanton (2001), esse estágio é quando começam a surgir os primeiros sinais de excesso de oferta, havendo excedente de produção e acúmulo em estoque. Assim, as empresas passaram a ter estratégias e ferramentas de vendas bem mais agressivas. Os consumidores começam a ter direito de escolha entre os produtos e serviços existentes, ficando mais exigentes e deixando de comprar qualquer produto se não forem persuadidos a fazê-lo. Kotler (2000) explicita que essa orientação leva as organizações a fazer um esforço de vendas e promoção de forma a persuadir os indivíduos em relação a produtos que costumam ter retração em comprar. A partir dos anos 50 surgiu então a Era do Marketing, em que as empresas começam a perceber que as vendas não eram constantes e não funcionavam a qualquer custo. Por isso, nessa época passou a existir uma valorização maior do consumidor. Todos os produtos deveriam ser vendidos a partir da constatação dos seus desejos e necessidades. O cliente passou a dominar o cenário da comercialização como um dos caminhos para obtenção de melhores resultados. Estava determinado o conceito de marketing, em que o consumidor passava a ser considerado o "rei" (LAS CASAS, 1997, p. 21). Neste estágio chamado de orientação para o marketing, conforme Etzel, Walker e Stanton (2001), as empresas identificam o que os consumidores desejam e adéquam as suas atividades, de forma a eliminar sua capacidade ociosa. Para Las Casas (1997), o conceito mostra sua evolução histórica no sentido da comercialização, uma vez que uma empresa moderna tem a orientação para o mercado como ponto de partida. O autor explicita que o sentido da comercialização mudou de empresa para consumidor e de consumidor para empresa. O foco está nas necessidades e desejos dos clientes. Este conceito cresceu cada vez mais a partir deste período, sendo que a valorização do consumidor tomou grande importância nos anos 90, em que 19 se falava em satisfazer necessidades, superar expectativas e orientar a empresa ao cliente. Kotler (2010) denomina esta fase de Marketing 2.0, o qual surge na era da informação, cujo núcleo é a tecnologia e está orientado para o cliente de forma a atender suas necessidades e desejos. Todavia hoje, segundo Kotler (2010), já estamos testemunhando o Marketing 3.0, chamado de a era voltada para os valores, no qual os profissionais da área tentam chegar ao coração, à mente e ao espírito dos consumidores. E, mais que isso, este tipo de marketing adquire relevância na vida dos consumidores, pois além de tratá-los como seres humanos plenos, ele também oferece soluções para os problemas da sociedade. Nesta fase as organizações se diferenciam por seus valores, transformando os consumidores a partir da participação, do paradoxo da globalização e da sociedade criativa, de tal modo que o Marketing 3.0 passa a ser entendido como marketing colaborativo, cultural e espiritual, ou seja, situado na arena das aspirações, dos valores e do espírito humano: é o marketing dos sentidos. As empresas que praticam o Marketing 3.0 têm uma contribuição maior em termo de missões, visões e valores a apresentar ao mundo; seu objetivo é oferecer soluções para os problemas da sociedade. [...] O Marketing 3.0 acredita que os consumidores são seres humanos completos, cujas outras necessidades e esperanças jamais devem ser negligenciadas. (KOTLER, 2010, p.4). Podem-se observar na tabela 1 as diferenças entre os três tipos de marketing segundo o autor. Tabela 1- Comparação entre Marketing 1.0, 2.0 e 3.0. Marketing 1.0 - Marketing centrado no produto Marketing 2.0 - Marketing voltado para o consumidor Marketing 3.0 - Marketing voltado para os valores Objetivo Vender produtos Satisfazer e reter os consumidores Fazer do mundo um lugar melhor Forças propulsoras Revolução Industrial Tecnologia da informação Nova onda de tecnologia Como as empresas veem o mercado Compradores de massa, com necessidades físicas Consumidor inteligente, dotado de coração e mente Ser humano pleno, com coração, mente e espírito Conceito de marketing Desenvolvimento de produto Diferenciação Valores 20 Diretrizes de marketing da empresa Especificação do produto Posicionamento do produto e da empresa Missão, visão e valores da empresa Proposição de valor Funcional Funcional e emocional Funcional, emocional e espiritual. Interação com consumidores Transação do tipo um- pra-um Relacionamento um- para-um Colaboração um- para-muitos Fonte: KOTLER, 2010, p.6. Kotler (2010, p.29) destaca que desde a criação do “mix de marketing”, nos anos 50 por Neil Borden, e dos 4Ps (produto, preço, praça e promoção), por Jerome McCarthy nos anos 60, os conceitos de marketing passaram por transformações significativas, adaptando-se às mudanças no meio. O autor explica que enquanto o marketing cumpria orientações táticas voltadas à produção, no modelo do Marketing 1.0, os conceitos relacionados ao produto eram satisfatórios. Porém, esse direcionamento foi mudando ao longo do tempo, tendo novos Ps juntando-se aos quatro originais (pessoas, processos, provas físicas, opinião pública e poder político), uma vez que o consumidor passou a ser mais crítico. Já nos anos 80, um período de instabilidade econômica e com baixa demanda de produtos para consumo, o marketing teve que evoluir de um nível tático para um nível estratégico voltado para o cliente. Com isso os 4Ps foram precedidos pelo desenvolvimento de segmentação, definição de mercado-alvo e posicionamento. Assim surgiu o Marketing 2.0, marcando o nascimento do marketing moderno. Mas o ponto de virada do marketing veio com a globalização e com o avanço da tecnologia, a partir da década de 90. Após o lançamento do computador pessoal e o surgimento da internet, a computação em rede facilitou a interação entre as pessoas e o compartilhamento de informações. Kotler (2010, p.31) ainda destaca que "os consumidores tornaram-se bem conectados e, assim, bem informados". Com o objetivo de acompanhar essas mudanças, o marketing passou a focar-se nas emoções humanas, pois não bastava atingir a mente do cliente, mas sim o seu coração. 21 O Marketing 1.0 e o Marketing 2.0 ainda terão alguma relevância. O marketing ainda tem a ver com desenvolver segmentação, escolher o segmento-alvo, definir o posicionamento, oferecer os 4Ps e construir a marca em torno do produto. No entanto, as mudanças no ambiente de negócios - recessão, preocupações com o meio ambiente, novas mídias sociais, empowerment do consumidor, nova onda de tecnologia e globalização - continuarão provocando mudanças maciças nas práticas de marketing. (KOTLER, 2010, p. 34) O que Kotler (2010) destaca então é que o futuro do marketing é cada vez mais horizontal e não vertical como foi ao longo dos últimos 60 anos, pois os consumidores passam a acreditar mais uns nos outros do que nas empresas. Uma das evidências apontadas em pesquisas para esse fator é a ascensão das mídias sociais, em que a confiança dos consumidores migrou da organização para outros consumidores. De acordo com a Nielsen Global Survey (apud Kotler, 2010, p.34), cada vez menos consumidores confiam na propaganda gerada por empresas. Diversas outras pesquisas apontam também para o sentido de que os consumidores passaram a desacreditar nas organizações e em seus negócios. Portanto, para compreender o consumidor contemporâneo, é necessário analisar três novas características destacadas pelo pesquisador (2010) no sentido de horizontalizar o marketing: a cocriação, a "comunização" e o desenvolvimento da personalidade da marca. A cocriação é considerada uma rede de inovação que proporciona a criação de novos produtos e experiências a partir da colaboração de diferentes indivíduos. A comunização está relacionada ao fato de os consumidores desejarem estar conectados uns com os outros e não com as organizações. Já o desenvolvimento da personalidade da marca está ligado ao DNA da mesma, que deve ser autêntico para sua diferenciação e credibilidade. Com essas reflexões, pode-se afirmar que descobrir e satisfazer as necessidades dos clientes é uma atividade constante no trabalho de marketing. Cada vez mais, novos campos da área são desenvolvidos visando à observação dos fatores que influenciam o comportamento do consumidor e o seu processo decisório. Para atingir a satisfação dos clientes, foram criados diversos segmentos do marketing, como: marketing pessoal, político, interno, 22 de massa, social, de relacionamento, organizacional, cultural, entre outros. No presente estudo, se destaca o Marketing de Relacionamento. 1.2 Marketing de Relacionamento O marketing tradicional, em que as organizações permaneciam buscando novos clientes sem necessariamente preservar os já conquistados, passou a não se aplicar mais. A satisfação do cliente agora está na sua constante avaliação e relacionamento pós-venda. Desta forma, surgiram as oportunidades para o Marketing de Relacionamento, com o investimento na manutenção do relacionamento do cliente já conquistado. Este tipo de marketing - o de Relacionamento - representa uma modificação nas formas de interação entre uma organização e seus públicos, principalmente seus clientes. O marketing tradicional, aplicado até o início dos anos 90 pela maioria das organizações, tinha como objetivo colocar no mercado produtos e serviços de forma ampla e rápida, gerando com isso maiores lucros. Entretanto, as velhas regras de identificação e satisfação das exigências do cliente mudaram consideravelmente nos últimos anos. O precursor desta teoria é Regis McKenna (1999), que apresentou o surgimento de um cenário diferenciado a partir da ampliação da tecnologia e do surgimento de novos consumidores. Ele expõe um paradigma diferente de marketing não só baseado no “faça mais”, voltado para aumentar o volume dos discursos de vendas, mas sim um processo baseado na experiência e no conhecimento. Este novo ambiente deve transformar-se em um diálogo entre os produtores e seus consumidores, de forma a conseguir sua fidelidade. [...] precisamos treinar nosso processo de raciocínio criativo de modo a ficar atentos, explorar e nos adaptar às novas formas de abordar estratégias empresariais e de marketing. Significa que precisamos desenvolver relações duradouras com nossos clientes, para que eles parem de pular de produto para produto 23 e de fornecedor para fornecedor à medida que surgem novas opções e tecnologias (MCKENNA, 1999, p.02). Seguindo o mesmo raciocínio, Gordon (2000) afirma que o marketing tradicional está em fase de declínio, pois estamos em uma sociedade em constante transformação, sendo necessária a reformulação das atividades organizacionais. Desta forma, é feita uma orientação do marketing para o relacionamento, permitindo a individualização dos clientes e uma maior percepção de suas necessidades e preferências. McKenna (1999, p.10-15) também destaca que o mercado evolui junto com a tecnologia, ou seja, quando o foco das empresas estava na produção em massa, a contrapartida era o marketing de massa. Já com um universo em que a produção é flexível, a correspondência passa a ser o marketing flexível e a capacidade de adaptação, programação e customização. A customização começa a ser valorizada, trazendo a capacidade de se lidar com o cliente de forma singular. Com isso, o autor analisa que estamos testemunhando a obsolescência da propaganda, por ser uma comunicação unilateral. Na batalha pela fidelização do cliente, não se pode mais fabricar uma imagem a partir da publicidade. A estratégia mercadológica volta-se então para o posicionamento da marca, demandando uma relação especial com os clientes. A publicidade deixa escapar o ponto fundamental do marketing – adaptabilidade, flexibilidade e capacidade de resposta. O novo marketing exige um ciclo de feedback; esse é o elemento que faltava no monólogo da publicidade, mas que existe no diálogo do marketing. O ciclo de feedback, conectando a empresa e o cliente, é fundamental à definição da operação de uma empresa realmente orientada ao mercado: uma empresa que se adapta, de forma apropriada, às necessidades dos clientes, em constantes mudanças (MCKENNA, 1999, p.15). Esse posicionamento de mercado das organizações a partir do relacionamento e buscando a credibilidade dos clientes pode ser feito de várias formas. Para McKenna (1999) as mais importantes são: por inferência, por referência e por evidências. A inferência significa o poder das relações de força junto ao mercado, como parceiros e financiadores; a referência ocorre quando pessoas de credibilidade dão referência sobre um determinado produto ou 24 serviço; já a evidência, é quando o próprio sucesso de um produto ou serviço reforça seu posicionamento. A inferência e evidência são baseadas principalmente no posicionamento da organização no mercado e a referência é obtida por experiências vividas por outros consumidores. Muitas coisas podem ser feitas para que esse três fatores trabalhem a favor de sua empresa. Pode-se, por exemplo, desenvolver relações favoráveis com pessoas importantes na infraestrutura do setor. Comece selecionando cuidadosamente os primeiros usuários do produto, seguindo das principais firmas de suporte externas, revendedores e distribuidores. Todas essas entidades, bem como consultores, analistas e jornalistas têm um papel de destaque na infraestrutura de seu setor. Servem como referências importantes e espalham notícias sobre a empresa. Conquistando a infraestrutura, a empresa estará a um passo da vitória na batalha do posicionamento no mercado (MCKENNA, 1999, p.90). Todas essas relações são estabelecidas por meio de experiências, um dos pilares em que o Marketing de Relacionamento é baseado. McKenna (1999, p.236) aponta que a confiança e a credibilidade são os maiores valores que se pode passar para um cliente, principalmente em mercados altamente competitivos. Esses valores podem ser comunicados a partir de uma estratégia de referência baseada na experiência. Um recurso amplamente utilizado para isso é a propaganda de boca a boca, pois proporciona um nível de confiança por meio de um sistema de referência. A comunicação boca a boca vem sendo feita fortemente por meio das redes e das novas tecnologias, tornando-se também um desafio para as empresas. O conhecimento tecnológico do consumidor apresenta um desafio aos fabricantes. Os consumidores não são mais tão influenciáveis. Querem saber mais sobre os produtos que compram. São céticos e críticos e, na maioria das vezes, ficam insatisfeitos. Os fabricantes devem satisfazer um nível de expectativa mais elevado (MCKENNA, 1999, p.180). O aspecto pós-venda também é bastante relevante no estudo do Marketing de Relacionamento. Para Gordon (2000) a satisfação do cliente não se resume mais à aquisição de um produto ou serviço, mas na sua constante 25 avaliação e relacionamento pós-venda. O consumidor espera que a empresa continue prestando-lhe atendimento de qualidade mesmo após encerrar o processo de aquisição. As mudanças na prática do marketing devem considerar que a relação entre uma empresa e seu cliente é para sempre, pois se isso não ocorre, ele tende a procurar outros produtos, marcas e fornecedores. Segundo Ian Gordon: O Marketing de Relacionamento é o processo contínuo de identificação e criação de novos valores com clientes individuais e o compartilhamento de seus benefícios, durante uma vida toda de parceria. Isso envolve compreensão, concentração e administração de uma contínua colaboração entre fornecedores e clientes selecionados para a criação e o compartilhamento de valores mútuos por interdependência e alinhamento organizacional (GORDON, 2000, p.25). A partir destes princípios, Gordon (2000) perpetra o conceito de fidelização do cliente, com o investimento prioritário na manutenção do cliente já conquistado, embora não se descarte a conquista do cliente potencial. A prática do marketing obteve grandes mudanças nos últimos anos, sendo também impactada pela tecnologia. Desta forma, o Marketing de Relacionamento pode apoiar-se em bancos de dados inteligentes que permitem um conhecimento mais aprofundado dos consumidores, o que garante às organizações a adequação de seus produtos e serviços às demandas, expectativas e necessidades deste público. No entanto, uma abordagem qualitativa das tendências do mercado ainda é muito importante, uma vez que a experiência pode valer muito mais do que a lógica. McKenna destaca que “embora pareça ironia, nessa era de comunicações eletrônicas a interação pessoal tornou-se mais importante do que nunca” (1999, p.158). Gordon (2000) também destaca que o Marketing de Relacionamento permite que a empresa concentre-se em seis atividades: 1. Tecnologia e clientes individuais: com a tecnologia da informação aliada à tecnologia de produção, é possível realizar o tratamento do cliente de forma individual e não só por meio de um mercado segmentado por grupos de clientes. 26 2. Objetivos da empresa: a partir do foco no cliente e da preocupação em atendê-lo como ele deseja, a empresa acabará tendo que rever seus objetivos, de maneira que ofereça ao cliente mais do que aquilo que ela já produz ou comercializa, eventualmente formando novas alianças e parcerias. 3. Seleção e rejeição de clientes: as empresas devem se concentrar nos clientes mais apropriados à sua estratégia, focando naqueles que recebem e proporcionam o máximo de valor. Ao torná-los prioritários, o aumento da lucratividade por cliente se estabelece. 4. Cadeia de relacionamento: são os diversos públicos que devem estar alinhados para atender às demandas de mudança, mediante as diretrizes de tempo, qualidade e custo apropriados às necessidades dos clientes. Entre eles: revendedores e varejistas, funcionários, fornecedores, banqueiros e investidores. 5. Reavaliação dos 4Ps do marketing: uma análise da modificação do marketing tradicional a partir do Marketing de Relacionamento. - Produto: o Marketing de Relacionamento faz com que o cliente possa participar do processo e da criação de um projeto, mediante a colaboração entre empresa e cliente, a qual cria valores para este último. - Preço: o valor do produto não depende somente de uma decisão da empresa e do mercado, mas muda proporcionalmente ao refletir escolhas feitas pelo cliente, bem como os valores instituídos a partir de tais escolhas. - Promoção: a comunicação de massa torna-se uma ferramenta institucional e não mais um meio para influenciar diretamente a compra. O cliente pode escolher como, com quem e com que frequência se comunicar. - Praça/distribuição: o marketing tradicional considerava um produto como um pacote de benefícios, enquanto que o de relacionamento permite que o cliente defina o posicionamento do produto e do serviço. Este decide onde, quando e como comprar cada elemento. 6. Administração do relacionamento: esta deve contar com uma “gerência de relacionamento”, responsável por escutar o cliente e integrar comunicações, tecnologias, pessoas e processos em colaboração com o consumidor. 27 Gordon (2000) afirma por fim que o Marketing de Relacionamento é um conjunto de ações direcionadas e de longo prazo. Ele oferece aos profissionais da área a chance de ajudar a empresa a crescer em um ambiente competitivo. De tal modo, a organização que adota o Marketing de Relacionamento preocupa-se mais em analisar seu modelo de negócio do que simplesmente vender o que produz. Mas o aumento da lucratividade acaba tornando-se consequência dos novos objetivos e da concentração do foco no cliente. Assim, é possível concluir que o relacionamento com o cliente deve ser visto e planejado como uma ação duradoura, trazendo lucratividade, exclusividade e fidelização. O que a organização busca nessa estratégia de relacionamento é a obtenção da atenção máxima do cliente aos seus serviços e produtos. McKenna também aponta que “o marketing de relações é essencial ao desenvolvimento de liderança, fidelidade do consumidor e rápida aceitação de novos produtos e serviços no mercado” (1999, p.105), mas considera que a criação de relações sólidas e duradouras com clientes é uma tarefa árdua e de difícil manutenção. As atitudes do consumidor com relação a um produto não são desenvolvidas através de um único evento ou anúncio, mas gradativamente. Estão sempre mudando e evoluindo durante o processo decisório – e continuam evoluindo depois de tomada a decisão. A “imagem do produto” é simplesmente a soma de todas essas atitudes (MCKENNA, 1999, p.182). Essa imagem do produto deve ser trabalhada constantemente nos âmbitos de referência e reputação, debate o autor. Para McKenna (1999, p.235), a palavra marketing pode ter muitas definições, mas a que melhor representa a área é o “desenvolvimento de relações”. Por meio de relações sólidas, o conhecimento sobre o cliente e a comunicação com o mesmo passam a ter um valor constante. Com isso, a abordagem integrada do Marketing de Relacionamento com as Relações Públicas torna-se possível e desejável, uma vez que o trabalho deste profissional está diretamente ligado à reputação e imagem da organização a partir do relacionamento com seus públicos. 28 1.3 Relações Públicas e Relacionamento Para analisar os novos paradigmas de comunicação nas organizações e o relacionamento com seus púbicos, torna-se fundamental abordar os conceitos de gestão de relacionamentos sob as estratégias do profissional de Relações Públicas. Este adquire o papel de avaliar as atitudes dos diversos públicos e identificar as atividades e os produtos da organização para construir relacionamentos duráveis de longo prazo. Autores como Simões, Kunsch e Andrade (apud BONFADINI, 2006, p.02) destacam que a área de Relações Públicas é responsável pelo desenvolvimento de políticas e estratégias de comunicação, visando à construção de uma imagem positiva e a opinião favorável de uma organização perante seus públicos. Já a resolução normativa nº 43 do CONFERP2, ratifica a função da área de Relações Públicas no parágrafo 30, inciso IV, como: 1) Criar, apresentar, implantar, gerar, propor, coordenar, executar e desenvolver políticas e estratégias que atendam às necessidades de relacionamento da organização com seus públicos (Resolução Normativa Nº 43, 2002). No entanto, as transformações no mundo empresarial levaram a área a revisar seus conceitos. A nova perspectiva empresarial voltada para a alta competitividade, produtividade e redução de custos induziu as organizações a modernizaram-se, tornando-se mais flexíveis de forma a trazer respostas mais rápidas ao mercado. Essas e outras transformações acarretaram uma mudança no relacionamento das empresas com seus diversos públicos, entre eles: clientes, fornecedores, funcionários, governo e imprensa. Para Fábio França (apud BONFADINI, 2006, p.02), o sucesso do relações-públicas nesta nova realidade empresarial está atrelado ao seu 2 Conselho Federal de Profissionais de Relações Públicas 29 conhecimento sobre as mudanças organizacionais e a sua capacidade de utilizar a comunicação como ferramenta estratégica neste âmbito. Como tudo na empresa, a comunicação depende de planejamento e de regras específicas para ser eficaz. É bom lembrar que a comunicação é um processo técnico e culto. Para qualquer empresa, o estabelecimento de um processo global de relacionamento com seu público de interesse e o público em geral, segundo suas prioridades, constitui nova exigência a ser considerada (FRANÇA, 2004, p. 8, apud BONFADINI, 2006, p.2). O valor estratégico do relações-públicas também é reforçado por Ferrari (apud BONFADINI, 2006, p.3) por meio de táticas de comunicação que efetuam o relacionamento com os públicos de uma organização. O papel do profissional nesse processo de construção de relacionamento é identificado pela autora no seguinte texto: As Relações Públicas atuam para construir relacionamentos com seus públicos. Mas o que são exatamente os públicos e qual são a sua importância? São grupos de pessoas cujo comportamento, de certa maneira afetam as organizações ou por elas são afetados. Eles são também objetos das Relações Públicas e é para eles que construímos os relacionamentos, visando ao estabelecimento do equilíbrio de interesses. As organizações são parte da sociedade que, por sua vez, é moldada pela interação dos públicos. Se nós construímos nossos relacionamentos com os públicos estratégicos, pensando nas organizações para as quais prestamos serviços, mesmo que indiretamente, estamos também beneficiando a sociedade (FERRARI, 2003, p. 10, apud BONFADINI, 2006, p.3). Ferrari também destaca a função das Relações Públicas no gerenciamento de conflitos nas relações das organizações com seus diferentes públicos. A melhor forma de beneficiar a sociedade é administrar os conflitos que as organizações criam ou os conflitos criados pelos diferentes stakeholders, que interagem com a organização. Na nossa tarefa diária nas empresas, devemos tentar a construção de relacionamentos nas organizações para 30 as quais trabalhamos, com a atenção voltada para a responsabilidade social, atuando dentro das características locais, mas sem perder de vista as necessidades globais da sociedade (Ferrari, 2003, p.10, apud BONFADINI, 2006, p.3). É necessária a abordagem dos conceitos das Relações Públicas de forma a aproximá-los aos dias de hoje, mostrando seu papel estratégico nas organizações e demonstrando o processo da comunicação organizacional. O estudo dos autores Grunig (2009) e França (2009) demonstra a maneira com que podem ser aplicadas as teorias da área na interação entre as organizações e seus públicos estratégicos e nas atividades globais das organizações. Grunig (2009, p.21-24) aponta dois paradigmas no setor, realizando um levantamento dos conceitos da profissão e de seu desempenho no gerenciamento estratégico das organizações por meio da gestão da comunicação. O primeiro indica as Relações Públicas como uma função mais técnica, administrando a percepção dos públicos sob a organização a partir da divulgação e da relação com os meios, envolvendo conceitos como imagem, reputação e identidade. O segundo, da gestão estratégica comportamental, mostra o relações-públicas participando de decisões estratégicas, a partir da comunicação simétrica e do engajamento com os públicos. Neste último, a função gerencial do profissional ultrapassa a parte técnica, já que pressupõe uma visão estratégica de administração e não só o exercício pontual de funções e atribuições. Ao falar sobre excelência na comunicação das organizações, Grunig (2009, p. 38-42) também indica as Relações Públicas como função gerencial que auxilia a organização a interagir com os elementos sociais, políticos e institucionais de um ambiente – agregando valores intangíveis tão relevantes quanto os econômicos. Trata-se do conceito de que os relacionamentos podem minimizar riscos, reduzir custos e proteger contra crises, por estarem diretamente ligados à reputação de uma empresa. O modelo simétrico de comunicação de duas mãos de Grunig e Hunt (apud KUNSCH, 1997, p.110), é considerado neste contexto o mais adequado para a atuação das Relações Públicas, uma vez que busca o equilíbrio entre os interesses da organização e dos públicos estratégicos. 31 O quarto modelo é o simétrico de duas mãos, a visão mais moderna das Relações Públicas, em que há uma busca de equilíbrio entre os interesses da organização e dos públicos envolvidos. Baseia-se em pesquisas e utiliza a comunicação para administrar conflitos e melhorar o entendimento com os públicos estratégicos. Portanto, a ênfase está mais nos públicos prioritários do que na mídia (KUNSCH, 1997, p. 111). Partindo deste modelo França (2009) aborda a gestão dos relacionamentos corporativos, identificando e analisando os públicos prioritários das organizações. O autor destaca que a ação de Relações Públicas se estabelece a partir dos relacionamentos, levando ao conhecimento de preferências, demandas e essencialmente perfis dos indivíduos e grupos. Assim, ele enfoca os relacionamentos corporativos e a sua administração estratégica, de forma a obter resultados e respostas positivas para os envolvidos, de maneira constante. Segundo França “o que é relevante para os profissionais de Relações Públicas é que o relacionamento corporativo determina o grau de comprometimento da empresa com seus públicos e vice-versa (2009, p.224)”. Em seu estudo sobre as redes de relacionamento corporativo o autor indica a complexidade e os valores das mesmas, a maneira com que podem ser construídas e a consciência e expectativas dos empresários de comunicação em relação à gestão de relacionamentos. No âmbito dos relacionamentos mercadológicos e na visão do relacionamento com os clientes, França demonstra o seguinte resultado (2009, p.227): relacionamentos caracterizados como de negócios, com o objetivo de vender, prestar um excelente atendimento e assistência técnica. Os resultados esperados são a credibilidade, satisfação, confiança e fidelidade. A tabela 2 apresenta uma síntese parcial dos resultados: Tabela 2 – Tipos de Relacionamentos e Resultados Esperados PÚBLICOS TIPO DE RELACIONAMENTO OBJETIVOS DA EMPRESA RESULTADOS ESPERADOS PELA EMPRESA Clientes Negócios Aumentar as vendas. Dar excelente atendimento e Merecer credibilidade. Ter clientes satisfeitos. Ter confiança dos clientes. Conseguir fidelidade. 32 assistência técnica. Excelente atendimento oferecido. Fonte: Adaptado de França (2009, p.229) Neste âmbito, Kunsch (1997) complementa o estudo dos relacionamentos organizacionais ao referir-se ao espaço que o marketing vem ganhando em setores e atividades específicas de comunicação. A autora aponta que a atividade de Relações Públicas precisa resgatar seu papel nesse contexto, colaborando para que as empresas atinjam seus objetivos mercadológicos. É necessário o aumento da afinidade da área de Relações Públicas com o marketing, de forma a posicioná-la não somente como um valor social e político, mas também verificando sua importância econômica para as organizações. Nogueira (2004) defende que o ideal é a junção das duas atividades. Para o autor, a convergência das óticas de Relações Públicas e marketing (sendo a primeira institucional e a segunda comercial) traz um resultado superior ao das duas áreas trabalhando de forma não integrada. Seguindo o mesmo raciocínio de Nogueira, Fortes (1989) afirma que a convergência das atividades pode ser benéfica, acreditando ainda que é possível enfocar conceitos similares das teorias, mas com diferentes metodologias. Enquanto o marketing interessa-se mais pelo consumidor, as Relações Públicas dão enfoque a todos os outros públicos e instituições. Entretanto, ambas reconhecem a importância das atitudes, percepções e imagens que devem ser transformadas em conceitos. Desta forma, o caminho indicado pelo autor para o benefício da empresa e sucesso nos resultados é a união das duas funções. Partindo desse pressuposto, entende-se que há uma complementaridade entre as áreas de Relações Públicas e de marketing. O marketing busca a objetividade e tangibilidade de suas ações, de forma a conseguir retornos financeiros e a valorizar sua linguagem pela alta direção das organizações. Neste aspecto, as Relações Públicas podem aprender com o marketing. Em contrapartida, este também pode evoluir a partir dos conhecimentos e especialidades de Relações Públicas nos conceitos de públicos e relacionamento. 33 Assim, surge como uma necessidade o Marketing de Relacionamento, reformulando a relação empresa e consumidor, uma vez que os públicos têm se tornado mais exigentes a cada dia. Atualmente, para estabelecer-se um bom relacionamento com os clientes são necessárias diversas ações além das promoções. Os clientes querem ser tratados de forma diferenciada e individualizada, não se restringindo somente ao consumidor final, mas também considerando toda a rede de marketing. Para Kotler, a rede de marketing: Consiste na empresa e naqueles que a apoiam - clientes, funcionários, fornecedores, distribuidores, revendedores, agências de propaganda e acadêmicos - com quem ela construiu relacionamentos profissionais mutuamente compensadores (2000, p.35). No centro do relacionamento desta rede estão as pessoas, seus desejos, suas necessidades e expectativas em relação à empresa. Há uma série de maneiras de se estabelecer um relacionamento com esses públicos. No entanto elas devem estar em sintonia com a política da empresa, além de ter sua filosofia administrativa e seus valores culturais e sociais. É imprescindível reconhecer o valor do relacionamento da empresa com seus públicos para a eficácia dessa proposição. Isso nos leva a dizer que a atividade de Relações Públicas, pela sua natureza estratégica, vai ao encontro desta perspectiva desenvolvendo programas de ação. Podemos considerar, também, que as Relações Públicas poderão atuar em conjunto com a área de marketing estruturando esses programas. Como se pôde verificar, as atividades de Relações Públicas possuem característica de atuação em que busca estabelecer uma relação que esteja embasada nos valores e conceitos da empresa para o cliente, podendo ser ela institucional, mercadológica ou corporativa. Assim, para a construção da confiança do cliente/consumidor a partir das ações de Relações Públicas é imperativo que a organização exteriorize seus princípios e valores de forma a produzir como resultado uma imagem sólida e confiável. 34 2. O PÓS-VENDA: UM OLHAR DE RELAÇÕES PÚBLICAS 35 Os conceitos de Marketing 1.0 e 2.0, atualmente são considerados ultrapassados, pois o foco das ações na época estava nas atividades que antecediam a venda de um produto e na venda propriamente dita, negligenciando muitas vezes os serviços pós-venda. Hoje ganham destaque outras visões, como o Marketing de Relacionamento – centrado nos serviços oferecidos ao consumidor após a compra. Para Inglis (2002) o maior potencial de lucro de uma empresa muitas vezes não reside nas vendas, uma vez que algumas delas conseguiram fazer com que o serviço de pós-venda se tornasse uma vantagem competitiva, ao invés de um custo. Cada vez mais o serviço pós-venda é reconhecido como parte integrante da cadeia de valor. Ele cria valor econômico, uma vez que frequentemente representa a melhor oportunidade de maior margem de lucro. Também mostra ser um excepcional mecanismo para reunir informações sobre os clientes e acompanhar o desempenho dos produtos. E, quando ajustado apropriadamente serve de plataforma sobre a qual as empresas podem alimentar fortes e crescentes relacionamentos com seus mais desejados clientes – os lucrativos (INGLIS, 2002, p.1). A partir deste referencial é possível analisar o panorama atual dos serviços pós-venda e as oportunidades de ascensão neste segmento. Isso pode ser feito por meio da identificação dos públicos estratégicos da organização, de forma a torná-los parte integrante de um plano de ação que vise um relacionamento duradouro com os clientes. 2.1 O Retrato dos Serviços de Pós-Venda No cenário atual, manter um bom relacionamento com os clientes passa a ser um fundamento básico no mundo dos negócios. Uma carteira de clientes 36 fidelizados pode minimizar a constante necessidade de conquistar novos clientes em um embate com um número cada vez maior de concorrentes. As empresas que conseguem superar as expectativas em suas atividades de pós-venda aumentam também a retenção e lealdade de clientes em longo prazo. Este pode ser considerado um benefício significativo, destaca Inglis, “uma vez que o custo de conquistar um novo cliente é estimado em três a seis vezes o custo de manter um cliente” (2002, p.2). Ainda sim a importância dos serviços pós-venda não foi devidamente internalizada pelas organizações, sendo que muitas delas perdem mais da metade de seus clientes a cada cinco anos (INGLIS, 2002, p.2). Outro fator a ser ressaltado é que consumidor também mudou significativamente nos últimos anos, passando a ser mais consciente de seus direitos, exigindo uma adaptação das empresas a este novo público. A Fundação Procon (Proteção e Defesa do Consumidor), principal entidade de defesa do consumidor ligada à Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania de São Paulo, recebe em média sessenta mil reclamações por mês. No ano de 2011 foram recebidas em torno de 720 mil reclamações3 - um salto de 380% em relação aos dez últimos anos, uma vez que em 1992 este número se aproximava a 190 mil. Sem dúvida, o Código de Defesa do Consumidor4, que entrou em vigência no início dos anos 90, foi um importante fator para a conscientização do direito de resposta por parte dos consumidores. O Procon tornou a divulgação do Cadastro de Reclamações Fundamentadas em São Paulo essencial para o País por apresentar um panorama da atuação geral das empresas no Brasil, além de divulgar anualmente a relação das empresas com maior número de reclamações. Os motivos são diversos, como recursos contra fabricantes e fornecedores de produtos e serviços, sempre depois da compra. Esses dados demonstram que o consumidor brasileiro não é mais tão passivo na defesa de seus direitos, e também que as empresas nacionais não estão suficientemente preocupadas em atender às expectativas dos 3 Disponível em: http://www.procon.sp.gov.br/pdf/acs_ranking_2011.pdf. Acesso em 20 de setembro de 2012. 4 LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990. http://www.procon.sp.gov.br/pdf/2010-07-23-codigo%20defesa%20consumidor.pdf. Acesso em 20 de setembro de 2012. 37 consumidores, tratando o pós-venda sem a devida atenção. Muitas parecem não compreender que os serviços podem constituir o grande diferencial de um negócio. A percepção do consumidor e a sua preferência por uma empresa ainda é fortemente relacionada aos serviços recebidos, sejam eles positivos ou negativos. Um cliente satisfeito gera muitos outros. Da mesma forma, um cliente insatisfeito tira da empresa clientes potenciais e, em alguns casos, já efetivos. Portanto, devem-se aumentar os esforços de marketing para os clientes existentes. Eles demonstram alto grau de lealdade quando compram pela segunda vez, por nenhuma outra razão maior de familiaridade e prazer (COOPERS e LYBRAND, apud ABREU, 1996, p.27). Para Abreu (1996) o chamado marketing de conquista e promoção continua dominando o mercado, enquanto as atividades de serviços pós-venda acabam ficando subempregadas, sendo vistas como centro de custos e com um papel secundário. Vavra (1993) também defende esta ideia dizendo que: À medida que amadurecemos em uma sociedade mais móvel, industrializada e tecnocrática, surge uma distinção entre a venda e as atividades pós-venda [...]. Relegamos a segunda metade da venda a departamentos de reclamações, de serviços e de garantias (VAVRA, 1993 apud ABREU, 1996, p. 25). Levitt, já em 1983, defendia em um clássico artigo chamado “After the sale is over...” que o foco do vendedor teria que mudar de simplesmente efetuar vendas para garantir a satisfação dos consumidores depois da compra, o que inclui estar atento às suas reclamações e necessidades futuras. A relação deve se intensificar após a venda, ajudando a determinar a escolha do consumidor em sua próxima compra. O autor dizia que o relacionamento entre consumidor e fornecedor deveria ser caracterizado muito mais por ser duradouro e contínuo do que por ser restrito a somente o momento da venda. Ele aponta que “a administração de relacionamento transcende os limites do marketing, exigindo programas de manutenção, investimento, melhoria e também substituição” (LEVITT, apud ABREU, 1996). 38 O autor prossegue afirmando que as pessoas compram expectativas e não coisas, e que no futuro a entrega, o serviço, a confiabilidade e a qualidade das interações serão muito mais importantes do que o produto em si e a tecnologia empregada em sua fabricação. Nos tempos atuais podemos dizer que a teoria de Levitt tornou-se realidade, uma vez que com a acirrada concorrência de empresas no mercado, a diferenciação entre produtos teve grande redução. Com isso, a decisão de compra do consumidor passa a ser influenciada não só pelos aspectos do produto, como valor percebido e preço, mas também pela qualidade dos serviços oferecidos. As empresas levaram muito tempo para compreender que para obtenção e retenção de clientes não basta ter um bom produto. Para os consumidores, o serviço pós-venda tornou-se um atributo do produto, tanto quanto sua qualidade, design, rendimento ou preço. A satisfação de um cliente está relacionada não só aos atributos do produto em si, mas a todo o pacote de serviços que o acompanha. O papel do pós-venda atual relaciona-se então à garantia da satisfação e fidelização dos clientes. Para Inglis, algumas empresas já encaram o serviço de pós-venda de forma estratégica, com a devida atenção e investimentos necessários. Porém, o autor aponta que “o maior desafio são os chamados ‘últimos cem metros’ da corrida, ou seja, a capacidade de fornecer ao consumidor os resultados prometidos (2002, p.2)”. Ele destaca que as empresas necessitam de uma estratégia de serviços que esteja voltada para o cliente, gerando receita e lucro significativos de forma crescente. Com isso será possível ampliar a eficiência e aumentar a retenção de clientes em longo prazo. As empresas devem buscar a liderança em satisfação dos clientes a partir da criação de um ambiente voltado para sua retenção e lealdade. Inglis (2002) relata também que as empresas referência neste conceito desenvolvem parâmetros de negócios baseados em relacionamentos e lucratividade de longo prazo, deixando de focar apenas em transações isoladas. Ainda de acordo com Inglis (2002, p.2), desenvolver um caminho ideal que antecipe e atenda as necessidades pós-venda não é uma tarefa fácil, no entanto deve-se partir pela criação de uma estratégia de serviços bem alinhada com a estratégia corporativa da empresa. Neste aspecto, algumas ações são 39 levantadas pelo autor como cruciais para direcionar a estratégia de uma empresa para serviços: • Segmentar o mercado de acordo com as qualidades que são importantes para atuais e potenciais consumidores. • Comparar sua oferta e sua capacidade de serviços com as de seus concorrentes. • Entender o poder e as limitações dos vários canais disponíveis para o marketing. • Desenvolver um sistema de precificação de serviços que leve em conta tanto as estratégias baseadas em produtos como a economia do ciclo de vida. É importante ressaltar que o planejamento de cada organização irá depender de suas especificidades, no entanto as ações apontadas pelo autor trazem uma referência para o contexto pós-venda. Partindo desses princípios será possível iniciar a construção do conhecimento da empresa de forma a comparar suas necessidades com suas capacidades e possíveis restrições. No contexto da primeira ação levantada pelo autor, ele exemplifica que: As organizações de primeira linha entendem o valor que fornecem aos clientes com o serviço excelente e esforçam-se para empacotar as ofertas de serviço adequadamente. Tais empresas compreendem que a chave do serviço lucrativo está na capacidade de dividir as ofertas de serviços por grupos de clientes – e, mais importante, em obter um retorno razoável sobre os serviços fornecidos, um retorno que reflita o valor recebido pelo cliente (INGLIS, 2002, p.3). Porém, mais do que criar um plano de ação estratégico, as organizações devem ter capacidade para executá-lo de forma eficaz. É na execução que muitas vezes se encontra o diferencial competitivo de uma estratégia. Inglis (2002) também elenca ações-chave que as empresas líderes em excelência de serviços seguem: 1) gerenciar os contatos com os clientes para aumentar a eficácia e a eficiência; 40 2) estruturar a organização para esta ser mais voltada para o cliente; 3) gerir a força de trabalho para atender à demanda de modo confiável e eficaz; 4) construir competência de seu pessoal; e 5) gerenciar o desempenho para equilibrar custos, qualidade e atendimento. De acordo com essas diretrizes os departamentos de serviços de uma empresa podem satisfazer melhor as expectativas dos clientes. O segundo e o terceiro ponto têm participação fundamental neste processo, uma vez que manter a coerência no atendimento ao cliente é fundamental. O autor adiciona: Os clientes devem receber o mesmo nível de serviço de todos os funcionários da empresa, assim como respostas coerentes entre si para todas as perguntas que fizerem, mesmo que mudem de um canal de comunicação para outro (por exemplo, do telefone para o e-mail) (INGLIS, 2002, p. 4). Deste modo, a fim de categorizar as organizações conforme a excelência dos serviços pós-venda, Kearney (apud INGLIS, 2002) identificou quatro estágios representados na Figura 1. Figura 1 - Estágios da Excelência nos Serviços Fonte: INGLIS, 2002, p. 4 41 Esses estágios demonstram a evolução de uma empresa desde sua fase inicial, em que lida somente com serviços de rotina, até começar a incorporar o feedback dos clientes, colocar seu foco em melhorar os relacionamentos com eles e por fim alinhar seus processos em torno da satisfação do cliente. A partir de uma estratégia bem direcionada e feita com eficácia, é possível então fazer com que os serviços aos clientes no pós-venda tragam grandes resultados, com a retenção de clientes, melhoria no posicionamento competitivo e crescimento da receita e lucratividade proporcionada pelos clientes. Para Gobbi (2011, p. 41-42), não há dúvida que após a criação do Código de Defesa do Consumidor os consumidores tomaram consciência de seus direitos e passaram a ser ainda mais exigentes. Somado esse fator com a globalização e a competitividade de mercado, a necessidade da transparência organizacional e de relacionamento com os consumidores passou a ser ainda maior. O primeiro passo da maioria das organizações foi a criação dos SACs (Serviço de Atendimento ao Consumidor), partindo num segundo momento para os departamentos de ouvidoria e ombudsman – em alguns casos. Essas atitudes visavam não somente defender os interesses dos cidadãos, mas também proteger a imagem da organização e evitar penalidades judiciais. As organizações precisam estar atentas à qualidade dos produtos e serviços oferecidos aos clientes, de modo que evitem que estes busquem opções concorrentes. Esses canais de atendimento ao consumidor aparecem como fundamentais nesse contexto, já estando preparados para ouvir quaisquer reclamações. Assim, a comunicação torna-se recíproca, de mão dupla, permitindo a real incorporação do feedback dos clientes. De acordo com Freemantle (1994, p.65), “para realmente ter sucesso, a busca da excelência no atendimento ao cliente deve se tornar uma obsessão eterna”. Este pensamento vai ao encontro do apresentado anteriormente por outros autores, uma vez que destaca que o relacionamento excelente com o cliente deve estar inserido no planejamento de uma empresa de forma a torná- 42 lo de grande importância. Para isso o autor indica que é necessária a mobilização da gerência e de todos os setores, ainda que não estejam diretamente relacionados com os públicos. Ainda de acordo com Freemantle (1994, p. 69), “o comprometimento da empresa deve ser visível, tangível e expresso com estratégicas claramente articuladas”. Para isso, é necessária uma reestruturação na política de relacionamento com os clientes ou consumidores, iniciando nos processos internos de comunicação das empresas. Partindo de um ambiente com compreensão mútua e confiança é possível transpassar essa imagem para o público externo. Isso se dá com a comunicação integrada e simétrica dos públicos internos e externos, priorizando o feedback. Freemantle (1994) acredita que a satisfação do funcionário influencia fortemente no atendimento ao cliente, uma vez que sua insatisfação com algum aspecto da organização pode ser transposta de maneira direta para o cliente. Entretanto o contrário também é verdade - um funcionário satisfeito atende melhor aos clientes, sendo então fundamental mantê-lo motivado por meio do feedback de seu bom atendimento, entre outras estratégias. Outro fator importante a ser destacado no comportamento pós-compra do consumidor é que neste momento ele avalia seus níveis de satisfação ou insatisfação, relacionando suas expectativas com o desempenho percebido sobre o produto ou serviço. Os canais criados pelas empresas para relacionamento com o consumidor mostram-se fundamentais neste processo, já que a partir deles os clientes encontram uma opção para sanar dúvidas, resolver problemas e até mesmo deixar elogios. Ainda sobre os canais de relacionamento, Solomon entende que: Os consumidores que estão satisfeitos com uma loja, são mais inclinados a reclamar, se dão ao trabalho de reclamar porque se sentem conectados à loja. [...] Compradores que conseguem resolver seus problemas sentem-se ainda melhor em relação à loja do que se nada tivesse dado errado. Por outro lado, se o consumidor não acredita que a loja reagirá bem à reclamação, se sentirá mais inclinado a simplesmente mudar de loja do que brigar. Ironicamente, os profissionais deveriam na verdade encorajar os consumidores a fazerem reclamações: as pessoas têm mais tendência a espalhar para 43 os amigos experiências negativas, não resolvidas do que se gabar de ocorrências positivas (SOLOMON, 2002, p. 249). Isto também indica que é preciso que a organização conheça muito bem seu consumidor para estabelecer a excelência no seu atendimento, sendo a transparência no relacionamento um fator fundamental. A análise e compreensão do comportamento do consumidor antes, durante e depois da compra ajudará no desenvolvimento de ações mais eficazes e válidas ao público específico de cada organização, construindo um relacionamento duradouro. Atualmente, a empresa que constrói com excelência um relacionamento com seus consumidores tem destaque no mercado, se configurando como um dos principais fatores competitivos entre elas. A satisfação do cliente também é identificada como sendo a chave do sucesso de um negócio, fazendo com que as empresas migrem para uma direção em que o contentamento do cliente é incorporado como missão. Esta visão complementa o conceito de Marketing 3.0, mostrando o direcionamento das empresas para os valores e não só para o produto. Com o novo perfil de consumidor, denominado muitas vezes de “consumidor global”, os requisitos do relacionamento voltam-se para conhecer, ouvir e valorizar o cliente. O poder do consumidor atual é ainda mais significativo, já que suas críticas, reclamações e dúvidas têm papel determinante na opinião de futuros compradores e clientes, influenciando a escolha de uma organização, produto ou serviço. Considerando a realidade do marketing pós-venda e de relacionamento e das Relações Públicas, pode-se destacar a complementaridade das áreas. Para Aranha (2011) o marketing de pós-venda é responsável por iniciar o processo de conquista de clientes assim que esses começam a desfrutar de determinado produto ou serviço que tenham adquirido. Isso prevê também a geração de novas ofertas e serviços. Ela destaca que esse processo voltado para o cliente visa: [...] alcançar a sua fidelização e conhecer seu grau de satisfação, além de ser considerado um excepcional mecanismo para reunir informações sobre você, acompanhar o desempenho 44 dos produtos comprado por você. Trata-se de uma plataforma para alavancar um relacionamento mais próximo. Torna-se uma vantagem competitiva sustentável porque o custo das barreiras entre o consumidor e a marca foi rompido e cria valor econômico, pois se transforma numa oportunidade para uma nova transação com uma margem de lucro maior (ARANHA, 2011, s/p) 5. Já no campo das Relações Públicas o processo é semelhante. A autora destaca que a atuação do relações-públicas no pós-venda se torna efetiva quando é possível medir como determinada ação foi recebida pelos clientes e como ela se transformou em um benefício para a empresa e o público-alvo. Ainda segundo Aranha: Na construção de um relacionamento de dupla mão, o feedback das ações e resultados é muito importante para a consolidação da imagem da marca de uma organização. Esta percepção de valor resgata a questão da intangibilidade que o folclore definiu sobre a prática das Relações Públicas (ARANHA, 2011, s/p). Ou seja, a comunicação e o relacionamento efetivo com os clientes só é possível mediante a comunicação de mão-dupla, definida a partir de um canal que dê a oportunidade de feedback e resposta para o consumidor. Para isso, é preciso também conhecer os diferentes tipos de públicos da organização e direcionar as estratégias para cada situação. 2.2 Definição e Identificação de Públicos Para traçar as estratégias de relacionamento com os públicos de uma organização, é essencial o mapeamento dos mesmos de forma a hierarquizar a importância de cada um. 5 Disponível em: http://www.aberje.com.br/acervo_colunas. Acesso em 20 de setembro de 2012. 45 O conceito de públicos tem diversas variações, todavia França (2004) destaca que ele sempre estará ligado a razão de ser da relação que determina os diferentes modos de interação empresa e públicos. O autor aponta que no campo das Relações Públicas a maior dificuldade é encontrar um conceito de públicos que aplique de forma lógica e geral as normas do relacionamento. Muitos autores categorizam os públicos em internos, externos e mistos. Entretanto, França (2004) afirma que essa divisão demonstra a incongruência com os objetivos da comunicação, desrespeitando as especificidades dos segmentos e tornando inviável sua determinação, já que um mesmo público pode transitar em várias categorias desta classificação. Considerando que as Relações Públicas fazem a comunicação estratégica com públicos específicos, é necessária uma definição dos tipos de públicos que uma organização quer se relacionar para realização deste trabalho. E, ainda deve-se estar ciente das perspectivas e objetivos desta relação e das possíveis expectativas do público envolvido. Ainda segundo o autor: O ideal seria estabelecer uma conceituação de públicos de abrangência universal, aplicável a todos os tipos de relacionamentos empresariais, capaz de justificar a inter- relação organização-públicos e não apenas defini-los genericamente (FRANÇA, 2004, p.2). Para tanto, França (2004) defende um conceito que analise inicialmente os fatores e critérios do envolvimento dos públicos com a organização e aponta as perspectivas nessa área. A correta identificação dos públicos é fundamental para o sucesso da comunicação organizacional, pois desta forma as empresas podem conhecê-los melhor e saber lidar com os mesmos. A definição de públicos para França (2004) envolve a relação e o objetivo da organização, categorizando-os em três, que são: os públicos essenciais, dos quais a organização depende para sua constituição, sobrevivência, manutenção de sua estrutura e execução de suas atividades fim. Os denominados de não essenciais, que fazem parte das atividades-meio, ligados à prestação de serviços ou intermediação política ou social e os públicos de rede de interferência que inclui públicos especiais do cenário 46 externo que exercem fortes influências no desempenho da organização a partir de seu poder operacional ou representativo. Estes se situam em dois subsistemas chamados rede de concorrente e rede de comunicação de massa. Entretanto, outra acepção de públicos costuma aparecer no meio acadêmico, que são os chamados de stakeholders. Estes podem ser categorizados como ativos e passivos. Para Grunig o termo pode ser definido como: [...] as categorias gerais de pessoas que são afetadas por consequências reais ou potenciais das decisões organizacionais estratégicas. Os stakeholders são pessoas que incorrem em algum risco quando a organização toma decisões. Categorias de stakeholders geralmente são o foco de programas de Relações Públicas, tais como relações com funcionários, com a comunidade, com investidores, com consumidores ou com o governo (GRUNIG, 2009, p.84). Já a teoria de classificação dos públicos segundo França (2009) é elaborada a partir do mapeamento dos stakeholders. É pela via de relacionamentos que se determinam quais serão os públicos interlocutores da organização e que se estabelece a aproximação, a compreensão entre as partes, as estratégias que ordenam a tomada de decisões quanto às ações a serem praticadas para conseguir a parceria, a colaboração, o comprometimento desses públicos e o apoio da opinião pública para a legitimação de seus empreendimentos. (FRANÇA, 2009, p.225). França (2009) conclui que apesar de ser necessária a preocupação com os públicos gerais da empresa, é dispensável estabelecer um relacionamento direto com todos eles. O importante é que o relações-públicas saiba mapear esses públicos e identificar quais desses são fundamentais. Para ele, os diversos relacionamentos apresentados por uma empresa permitem a criação de redes de relacionamento, após devidamente identificado o público a ser atingido e as políticas e estratégias que deverão ser seguidas para que o diálogo com eles tenha sucesso. 47 É importante também a maneira de mensurar os resultados das estratégias de relacionamento voltadas aos diversos públicos, devendo ser feita por meio da análise do grau de credibilidade, ética, fidelidade, satisfação, confiança, visibilidade e imagem pública positiva atingida. Para Grunig (2009), o retorno sobre relacionamentos normalmente chega de uma só vez. Ele cita que bons relacionamentos com os consumidores podem produzir uma fonte contínua de renda, mas muitas vezes o retorno acontece de uma só vez – por exemplo, quando crises, greves, boicotes, regulamentações, litígios ou má publicidade são evitados ou suavizados. Considerando essas definições de públicos, é preciso traçar o perfil dos públicos essenciais e ativos do setor ou organização, objeto de estudo deste trabalho, ou seja, da aviação executiva. Neste sentido percebe-se que os clientes em questão fazem parte do mercado de luxo: uma realidade que é discutida no próximo item. 2.3 Mercado de Luxo: um Segmento em Ascensão Para iniciar o estudo desse mercado, é preciso conceituar o que é considerado luxo. No dicionário Aurélio, este termo está associado ao prazer pelo supérfluo, custoso e suntuoso. Braga (2004 apud GALHANONE, 2005) diz que etimologicamente as palavras “luxo” e “luz” têm a mesma origem, que vem do latim “lux”. Para o autor essa referência à luz associa-se a conceitos como brilho, esplendor, distinção perceptível ou resplandecente. Já para Galhanone (2005), o conceito de luxo relaciona-se com o que é raro, exclusivo, restrito e de custo mais elevado. A autora resume que: [...] o luxo é sempre caro e raro. Se for acessível à maioria das pessoas, deixa de ser luxo. Decorre daí outra dimensão importante do termo: a diferenciação, ou melhor, sua simbologia das distinções de classe social. Luxo é tudo o que 48 sinaliza privilégio, elite, nobreza, prestígio, aristocracia, riqueza, estilo (GALHANONE, 2005, p. 02). Ao fazer uma análise da evolução do luxo, a autora (2005, p.2-3) aponta diferentes momentos históricos que o conceito passou. Ele nasceu antes dos processos industriais, estando até mesmo ligado a um conceito religioso. A partir de então ele passou a ser um aspecto de diferenciação social, separando ricos e pobres. Após a Revolução Industrial surgiu o luxo moderno, devido ao desenvolvimento técnico trazido pelos processos industriais. Neste momento ele ganhou uma dimensão de satisfação pessoal do indivíduo. Já no século XX ele vem relacionado com as atividades profissionais do indivíduo, proporcionando uma nova classe de nível superior que ganha importância social e econômica pelo seu trabalho. Lipovetsky e Forbes (apud GALHANONE, 2005) enxergam nessa evolução do luxo a grande tendência do segmento, pois a acumulação de objetos caros de forma exibicionista dá lugar a “atração pelo luxo dos sentidos, do prazer e da sensibilidade sentida na intimidade por cada indivíduo e não o luxo exterior, da exibição e da opulência, que visa simplesmente demonstrar status" (LIPOVETSKY apud GALHANONE, 2005, p.3). Esse momento demonstra a transição do luxo ostentatório, que era voltado para a aparência e admiração de um terceiro, para o intimista e individual, ganhando uma face emocional e de experiência. O luxo passa a ser mais sensorial, de prazer e sensualidade – e no prazer em saber-se diferente (GALHANONE, 2005). Como foi observado, o desejo pelo luxo faz parte então da espécie humana. Nele enxergam-se inspirações de um tipo de ideal de beleza, sensualidade, qualidade, prazer e elegância. Por isso, o consumo de bens e serviços deste mercado premium acaba sendo feito por escolhas emocionais, movidas pelo desejo, sonho, necessidade de pertencimento social ou de melhoria de autoestima. Esses fatores podem ser relacionados aos níveis 49 superiores da conhecida pirâmide de Maslow, ou seja, as necessidades de status e autoestima6. Como já acontece no restante do mundo, no Brasil esse segmento tem movimentado grandes volumes de negócios. De acordo com a MCF Consultoria e Conhecimento (2010) 7, o Brasil tornou-se prioridade da análise para investimentos das principais marcas e operações de luxo mundiais, devendo ocorrer a médio e longo prazo no País. Ainda segundo o estudo da MCF, empresa que é referência nacional em consultoria e assessoria no desenvolvimento de negócios de luxo, o panorama deste mercado no Brasil no ano de 2010 foi o seguinte: O Brasil vinha mantendo um ritmo de crescimento com percentual de 17%. Com o impacto da crise, o percentual alcançou 12,5% em 2008. O setor faturou US$ 6,23 bilhões em 2009 – crescimento de 4% (dólar) e 12% (real) em relação ao ano anterior – e deve ampliar seu faturamento em 22% este ano, alcançando o montante de US$7,59 bilhões. Os próximos 10 anos ainda serão marcados por um período forte de crescimento e expansão do mercado brasileiro no consumo de Luxo (MCF Consultoria, 2010, p.1). A cidade de São Paulo também é apontada como a capital de luxo da América Latina e o consumidor brasileiro como o principal consumidor para posicionamento de marcas. Para Ferreirinha (2008, s/p), “o luxo é formado por um bloco indissociável de qualidades que envolvem perfeição, beleza, originalidade e acima de tudo, desejo”. Para o consultor, a evolução do luxo fez com que o mesmo deixasse de ser um benefício de poucos para ser democratizado a um número maior de pessoas, tendo como combustível a essência do capitalismo: o lucro. Essa mudança facilitou, aparentemente, o acesso aos bens de luxo. No entanto, Ferreirinha (2008) destaca que o mesmo sistema que permitiu essa 6 Disponível em: http://www.portaldomarketing.com.br/Artigos/maslow.htm. Acesso em 15 de outubro de 2012. 7 Disponível em: http://www.mcfconsultoria.com.br/material/201010181428_panorama%20do%20luxo%20no%2 0brasil.pdf. Acesso em 20 de outubro de 2012. 50 democratização intensificou ainda mais sua inacessibilidade quando os artigos independem de qualquer correção inflacionária ou econômica. “Ou seja, o acessível está cada vez mais acessível e o inacessível cada vez mais inacessível, alimentando ainda mais o ‘motor’ do luxo: o desejo” (FERREIRINHA, 2008). Por não ser mais limitado ao universo das elites, o luxo tornou-se um importante mercado em termos globais. Atualmente ele movimenta cifras consideráveis de recursos e se configura como uma fonte notável de atividade econômica, sendo um segmento da economia com enormes potenciais de crescimento, geração de renda e de trabalho. As marcas de luxo exigem então um forte trabalho de posicionamento e de uso do marketing para renovação contínua. É possível afirmar que os bens de luxo são produtos e serviços com comportamentos muito distintos e particulares no mercado, fazendo com que seu posicionamento mercadológico frequentemente fuja às regras do marketing de consumo de massa. Portanto, é preciso adaptar e até mesmo reinventar conceitos para evoluir nesse segmento. Para Bianchi (2008)8, as pessoas querem mais do que um mero produto, elas querem conhecimento. Ela aponta que para muitos especialistas o novo consumidor de artigos de luxo é aquele que foge da compra pela compra ou pela mera ostentação do ter, partindo para a valorização das experiências pessoais, do saber e do conhecer. “É o fim do exclusivo pelo exclusivo. É preciso ter uma história que o valorize e o diferencie da massa, ainda que da pequena massa de artigos de luxo” (BIANCHI, 2008, s/p). Após um apanhado das principais características do mercado de luxo e de seu público, investigaremos o comportamento típico do mercado de aviação executiva e seus consumidores, suas aspirações e motivações, procurando alinhar os conceitos do Marketing de Relacionamento no pós-venda com essas peculiaridades. 8 Disponível em: http://www.gestaodoluxo.com.br/segmentacao/materia_26.htm. Acesso em 20 de outubro de 2012. 51 3. UMA PROPOSTA DE RELACIONAMENTO NO PÓS-VENDA: EMBRAER EXECUTIVE JETS 52 O estudo exploratório realizado sobre o mercado de pós-venda sugeriu a elaboração de uma proposta de relacionamento para o mercado de aviação executiva, especificamente para a empresa Embraer Executive Jets. Foi levado em conta que os clientes deste mercado são de alto padrão, caracterizando-o então como um segmento de luxo, necessitando de um suporte bem definido, com produtos e serviços adequados e estruturados para melhor atender as necessidades de cada cliente. Partindo desse pressuposto, realizou-se uma análise do panorama atual da empresa Embraer e do mercado de aviação executiva, a fim de compreender suas peculiaridades para a criação de um plano de ação e de relacionamento adequados. 3.1 Embraer e a Participação no Mercado de Aviação Executiva A Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A.) é uma das maiores organizações aeroespaciais do mundo, tendo completado quarenta anos em 2009, período em que adquiriu experiência em projeto, fabricação, comercialização e pós-venda de aeronaves nos segmentos militar, comercial e, mais recentemente, executivo. Já produziu cerca de cinco mil aviões, que hoje operam em mais de oitenta países, nos cinco continentes. Foi a maior exportadora brasileira, em termos de valores, entre os anos de 1999 e 2001, passando para a segunda maior nos anos de 2002, 2003 e 2004. Atualmente, sua força de trabalho totaliza mais de 17 mil empregados, sendo que mais de 90% destes estão baseados no Brasil9. 9 Disponível em: http://www.embraer.com.br/pt-BR/ConhecaEmbraer/EmbraerNumeros/Paginas/Home.aspx. Acesso em 27 de outubro de 2012. 53 Fundada em 19 de agosto de 1969 pelo Decreto-Lei nº 77010, seus esforços iniciais eram para satisfazer a demanda local do governo no atendimento de combatentes militares e desenvolvimento de tecnologias (REGO, 2000 apud CANINEO, 2010). A Embraer ainda desempenha um papel estratégico no sistema de defesa brasileiro, tendo fornecido mais de 50% da frota da força aérea brasileira. Além disso, cerca de cinquenta forças aéreas no exterior também operam seus produtos. Com a privatização da empresa em 07 de dezembro de 1994, período de difícil saúde financeira da mesma, foram impulsionadas ainda mais as mudanças estratégicas e culturais subsequentes a este evento, conforme aponta Rego (apud CANINEO, 2010). A entrada da Embraer no mercado de aviação executiva foi marcada pelo lançamento do jato Legacy 600, no ano de 2000 e ao longo deste período foi se expandindo de modo que em 2005 foram lançadas as aeronaves Phenom 100 e Phenom 300, em 2006 o programa Lineage 1000 e em 2007 foi anunciado o desenvolvimento dos programas Legacy 450 e Legacy 500. Assim foi criada uma nova área de negócios da empresa, a Embraer Executive Jets, que é responsável pelo desenvolvimento e suporte dos produtos voltados para a aviação executiva. De acordo com site institucional da organização, após este evento a Embraer já produziu mais de quinhentas aeronaves executivas, presentes em quarenta países. A experiência da Embraer em projetar aviões para alta utilização, trazida de sua expertise na área da aviação comercial, acrescentou aos jatos executivos características diferenciadas no mercado. Para ela, seus jatos executivos “estão posicionados no topo de suas categorias, oferecendo espaço e conforto superiores, desempenho excelente e baixo custo operacional” 11. A Figura 02 deixa claro como a Embraer Executive Jets posiciona seu portfólio de produtos no mercado de acordo com a distribuição de categorias de jatos executivos. Estas são divididas em: Personal, Entry-level, Light, Super- Light, Mid-Size, Super Mid-Size, Large, Super-Large, Long-Range. Canineo 10 Disponível em: http://www1.embraer.com.br/timeline/portugues/. Acesso em 29 de outubro de 2012. 11 Disponível em: http://www.embraer.com/pt-BR/Aeronaves/Paginas/Home.aspx. Acesso em 29 de outubro de 2012. 54 (2010) destaca que cada categoria varia em função de alcance e capacidade de passageiros, sendo possível verificar que a Embraer está posicionada de forma a atender praticamente todas as categorias, o que a coloca na disputa entre os seis maiores fabricantes de aeronaves executivas do mundo – sendo eles: Bombardier, Gulfstream, Cessna, Dassault Falcon, Hawker Beechcraft e Embraer Executive Jets. Figura 2 – Portfólio de Jatos Executivos por Categoria Fonte: UBS Business Jet Monthly Report, 2010 Com o crescimento da frota de jatos executivos, a demanda para suporte a esses produtos em âmbito mundial aumentou consideravelmente, sendo necessário o desenvolvimento de apoio e serviços ao cliente, que vão desde suporte à manutenção da aeronave até o fornecimento de software para operação da mesma. Com isso, novas oportunidades de mercado surgiram para a Embraer Executive Jets, permitindo sua entrada em um mercado chamado Maintenance, Repair and Overhal (MRO). Neste aspecto pós-venda, a Embraer tem uma ampla rede de suporte e soluções de serviços que atua em todo o mundo, buscando garantir assistência 55 aos clientes com rapidez e qualidade. A estrutura que suporta esses resultados é formada por uma rede de Centros de Serviços próprios e autorizados com quase setenta unidades; centros de distribuição de peças localizados pelo mundo; um sistema de atendimento ao cliente - Contact Center - que oferece assistência em tempo integral e com média de dez mil interações por mês; representantes técnicos com experiência e treinamento para prover o suporte necessário em solo; e um amplo portfólio de serviços para operações. A partir do desenvolvimento desses serviços, a Embraer Executive Jets conseguiu ser classificada entre as três melhores empresas do setor em suporte a produtos em dois rankings reconhecidos internacionalmente. As revistas especializadas no mercado de aviação executiva Aviation International News (AIN) e Professional Pilot (ProPilot) destacaram a rápida ascensão da Embraer por meio de avaliações positivas de clientes que reconheceram o trabalho desta na prestação de suporte e serviços ao cliente, classificando-a em 2º e 3º lugar, respectivamente, no ano de 201212. 3.2 Entendendo o Mercado de Aviação Executiva Para iniciar os estudos de relacionamento neste mercado, é necessário compreender as peculiaridades deste segmento restrito a um público com grande poder aquisitivo. Atualmente, consideram-se como voos de aviação executiva todos aqueles que têm propósito de transporte e que não são realizados pelas linhas aéreas ou pelos militares. O mercado de aviação executiva cresceu consideravelmente ao longo dos anos, desde que o primeiro jato foi colocado no mercado na década de 60. Os aviões executivos podem ser ainda objetos de desejo para muitos e realidade para poucos, mas vêm se tornando cada dia mais uma necessidade para empresas e consumidores de elevado poder aquisitivo. Devido à situação 12 Press Release Embraer - Disponível em: http://www.embraer.com/pt- BR/ImprensaEventos/Press-releases/noticias/Paginas/Embraer-recebe-reconhecimento-por- suporte-a-produtos-da-aviacao-executiva.aspx. Acesso em 20 de outubro de 2012. 56 caótica dos aeroportos ao redor de todo o mundo, com constantes imprevisibilidades de capacidade de atendimento à demanda e com as linhas comerciais não abrangendo determinados destinos, o mercado de aviação executiva acabou ganhando grande força no panorama mundial da economia. Com a expansão do modelo capitalista de mercado e o crescimento econômico de diversos países, muitas empresas e indivíduos tiveram acesso e interesse nos jatos executivos, uma vez que proporciona diferenciais competitivos de mercado, bem como de comodidade do passageiro. A maioria dos clientes desse nicho de mercado busca valores agregados como: aumento de produtividade, privacidade, flexibilidade, velocidade e conforto. Além desses, outros diferenciais entre a aviação comercial e executiva levam os clientes a buscar a segunda opção como um meio de mobilidade diferenciado. Enquanto as companhias aéreas comerciais oferecem voos com horários e rotas pré-determinadas, com possibilidade de conexões em outros destinos, pouca privacidade, limitações no uso de telefone, internet ou fax e pequena quantidade de aeroportos, a aviação executiva contrapõem todas essas dificuldades. O mercado de aviação executiva é descrito por Menezes (apud CANINEO, 2010, p.11-12) como um segmento da aviação geral, constituído por indivíduos e empresas que utilizam as aeronaves como ferramentas na condução de seus negócios. Ele destaca ainda que tal segmento compreende os aviões cuja propulsão pode se dar por meio de motores convencionais ou à pistão, turboélices, jatos e ainda os aviões pessoais, que permitem apenas um ocupante. O autor aponta que, segundo dados da empresa americana Honeywell - listada entre as quinhentas maiores empresas pela revista Fortune, fabricante de vasta diversidade de bens de consumo e provedora de serviços aeroespaciais e de engenharia - há evidências empíricas de que a venda de aeronaves executivas sofre incremento quando a economia se mantém em crescimento de mais de 3%, por um período maior que nove meses. Assim, é possível afirmar que no Brasil, assim como no restante do planeta, a aviação executiva está ligada diretamente ao desenvolvimento econômico. 57 Segundo uma pesquisa da Associação Brasileira de Aviação Geral (ABAG)13, o Brasil possui atualmente a segunda maior frota de aviação geral do mundo depois dos EUA. O mercado de aviação executiva pertence à este segmento, tendo um crescimento cada vez mais expressivo no mercado nacional. Ainda segundo a ABAG, o Brasil é o país que possui o maior mercado no segmento de aviação executiva na América Latina, com uma frota aproximada de 1.650 aeronaves, sendo 650 helicópteros, 350 jatos e 650 turboélices. Alguns dos principais fatores que impulsionam a expansão do segmento no País é o crescimento da economia brasileira, a valorização da moeda nacional e a internacionalização de empresas brasileiras (MARINS, 2012). Outro fator que é apontado como indicador do potencial do mercado brasileiro é a realização anual da Latin American Business Aviation Conference & Exhibition (LABACE) em São Paulo, principal evento de aviação executiva da América Latina, considerado o segundo maior evento do mundo em termos de público participante14. Marins (2012) destaca também que apesar do alto investimento necessário para adquirir um jato executivo, optar pela compra de uma aeronave particular pode não ser apenas uma questão de luxo, conforto ou exclusividade, mas de economia. Dependendo da necessidade da empresa ou do consumidor, vale a pena a compra de uma aeronave ou então apenas o fretamento eventual. Neste segmento, os públicos da aviação executiva podem ser divididos nas seguintes categorias: empresas, departamentos de voo, táxi aéreo, governos, propriedade compartilhada e High Net-Worth Individuals (HNWI) – pessoas com poder financeiro acima de um milhão de dólares disponível para investimentos imediatos. No entanto, dentre essas categorias, as empresas são responsáveis por mais da metade das aquisições de aeronaves executivas. 13 Disponível em: http://www.gestaodoluxo.com.br/gestao_luxo_novo/segmentos/mobilidade/mobilidade18.asp. Acesso em 29 de outubro de 2012. 14 Disponível em: http://www.abag.org.br/labace2012/port/labace2012-port.htm. Acesso em 06 de novembro de 2012. 58 Outro fato relevante é que a maioria delas (59%) é pequena, com menos de quinhentos funcionários (NBAA, 2011). Para a National Business Aviation Association - NBAA (2011), a aviação executiva é essencial para dezenas de milhares de empresas de todos os tipos e tamanhos que estão tentando competir em um mercado que demanda velocidade, flexibilidade, eficiência e produtividade. Como já citado, há alguns aspectos principais característicos para utilização da aviação executiva. A NBAA aborda de forma detalhada cada um deles: economia de tempo de seus empregados; aumentar a produtividade dos funcionários enquanto voam, ampliando também sua segurança pessoal e em percurso; atingir múltiplos destinos de forma rápida e eficiente; acessar locais com pouco ou nenhum serviço de linha aérea; previsibilidade de agendamento de horário; apoiar as necessidades de viagem de muitos tipos de funcionários da empresa; locomover equipamentos importantes; gestão do tempo; diminuição de horas sem atividades de trabalho longe de casa; e proporcionar um maior retorno financeiro aos acionistas. Após entender as características deste novo mercado, é possível perceber que o apelo para os clientes da aviação executiva deve ser completamente distinto do voltado à aviação comercial, uma vez que possuem necessidades diferentes. Além disso, a expectativa do público que utiliza jatos executivos está diretamente relacionada ao mercado de luxo, estando presente nos detalhes de acabamento, na robustez dos produtos, no requinte dos materiais e na qualidade de mão de obra; como também no status de exclusividade e diferenciação social permitido por esses produtos. 3.3 A proposta para a Embraer Executive Jets A Embraer Executive Jets atua no âmbito de relacionamento com os clientes a partir de algumas atividades face a face nos chamados “momentos da verdade”. Eles estão relacionados principalmente a treinamentos, 59 manutenções, oferta de serviços, eventos, entre outros, voltados principalmente para pilotos e operadores de aeronave. De acordo com Siqueira (2008), quando uma empresa tem sua atuação ligada indiretamente à prestação de serviços, atividades como publicidade, logística e promoções podem dar suporte para a conquista e manutenção dos clientes, mas os encontros dos consumidores com os prestadores de serviços decidirão em maior parte o sucesso da organização. Desta forma, uma atenção especial deve ser dada a estes momentos cruciais em que ocorre a interação entre consumidores e funcionários de entrega de serviços, as 'horas da verdade' (CARLZON apud