UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ENGENHARIA CÂMPUS DE ILHA SOLTEIRA GIOVANNI TOBIAS SANTOS ECOTOXICIDADE DO INSETICIDA BIFENTRINA PARA BIOINDICADORES AQUÁTICOS Ilha Solteira 2024 Campus de Ilha Solteira PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL GIOVANNI TOBIAS SANTOS ECOTOXICIDADE DO INSETICIDA BIFENTRINA PARA BIOINDICADORES AQUÁTICOS Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira – Unesp como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil. Profª Dra. Juliana Heloisa Pinê Américo Pinheiro Orientadora Prof. Dr. Claudinei da Cruz Co-orientador Ilha Solteira 2024 Tobias SantosECOTOXICIDADE DO INSETICIDA BIFENTRINA PARA BIOINDICADORES AQUÁTICOSIlha Solteira2023 83 Sim Dissertação (mestrado)Engenharia CivilRecursos Hídricos e Tecnologias AmbientaisNão . FICHA CATALOGRÁFICA Desenvolvido pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação Santos, Giovanni Tobias. Ecotoxicidade do inseticida bifentrina para bioindicadores aquáticos / Giovanni Tobias Santos. -- Ilha Solteira: [s.n.], 2023 83 f. : il. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira. Área de conhecimento: Recursos Hídricos e Tecnologias Ambientais, 2023 Orientador: Juliana Heloisa Pinê Américo Pinheiro Co-orientador: Claudinei da Cruz Inclui bibliografia 1. Agrotóxico. 2. Ecotoxicologia. 3. Histopatologia. 4. Piretróides. S237e Impacto potencial desta pesquisa ODSs 6 – Água potável e saneamento: A pesquisa destaca as preocupações relacionadas aos efeitos prejudiciais da bifentrina em organismos aquáticos, como camarões e peixes. Essa toxicidade pode perturbar os ecossistemas aquáticos, afetando a biodiversidade. Portanto, ressalta-se a importância da implementação de medidas de controle ambiental. Potential impact of this research SDGs 6 – Clean water and sanitation: The study raises concerns about the harmful effects of bifenthrin on aquatic organisms, such as shrimp and fish. The toxic impact on these species can disturb aquatic ecosystems, affecting biodiversity. Therefore, it highlights the importance of implementing environmental control measures. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Câmpus de Ilha Solteira             Atestamos que GIOVANNI TOBIAS SANTOS, RA nº: CIV200026, RG nº 45.914.255-0, expedido pela SSP/SP, defendeu, no dia 29/08/2023, a dissertação intitulada ECOTOXICIDADE DO INSETICIDA BIFENTRINA PARA BIOINDICADORES AQUÁTICOS , junto ao Programa de Pós Graduação em Engenharia Civil, Curso de Mestrado Acadêmico, tendo sido 'APROVADO'.             Atestamos ainda que a obtenção do título dependerá de homologação pelo Órgão Colegiado competente. Ilha Solteira, 29 de agosto de 2023 _______________________________________________________ - ATESTADO DE APROVAÇÃO - DEFESA Faculdade de Engenharia - Câmpus de Ilha Solteira - Alameda Bahia , 550, 15385000, Ilha Solteira - São Paulo http://www.ppgec.feis.unesp.brCNPJ: 48.031.918/0015-20. MARCIA REGINA NAGAMACHI CHAVES:14202568826 Assinado de forma digital por MARCIA REGINA NAGAMACHI CHAVES:14202568826 Dados: 2023.09.12 09:02:16 -03'00' DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a Deus, meus pais (Rosângela e Giovanni), irmão (Ramon), amigos e todos os pesquisadores e professores que se dedicam ao desenvolvimento da ciência. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus por toda graça recebida diante de várias dificuldades e apuros durante o desenvolvimento da pesquisa. À minha família, pelo apoio, conselhos e por toda ajuda durante esta etapa da minha vida. Ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC) da Unesp de Ilha Solteira. Ao apoio do CNPq, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Brasil, pela concessão da bolsa de estudos. Número do processo: 132418/2020-7 À professora Dra. Juliana Heloisa Pinê Américo Pinheiro por ter me recebido e me orientado em toda a trajetória do mestrado. Ao professor Dr. Claudinei da Cruz que me acolheu como seu coorientado e me recebeu de braços abertos em seu laboratório. À toda equipe do Laboratório de Ecotoxicologia e Eficácia de Agrotóxicos (LEEA), pelos momentos de alegria, ensinamentos, puxões de orelha e todo cuidado e atenção durante a minha pesquisa. Em especial a Cecília, Isabella, Wilson, Pâmela, Henrique, que me acompanharam de perto. RESUMO Os Agrotóxicos são substâncias utilizadas no controle de insetos-praga e plantas daninhas. No entanto, quando entram em contato com organismos não-alvo, essas substâncias podem provocar uma série de problemas em diferentes níveis da cadeia alimentar. Por isso, o propósito deste estudo foi avaliar a toxicidade aguda do bifentrina em organismos aquáticos (como as macrófitas Lemna minor e Azolla caroliniana, o caramujo Pomacea canaliculata, o camarão Macrobrachium acanthurus, os peixes Xiphophorus maculatus e Hyphessobrycon eques), além de investigar sua toxicidade crônica em Hyphessobrycon eques. Além disso, calculamos o risco ambiental associado e analisamos as alterações histopatológicas nas brânquias, fígado e rins dos peixes H. eques. Os ensaios de toxicidade com as macrófitas tiveram a duração de 7 dias, enquanto com os demais organismos foram realizados em 48 horas. O teste de toxicidade crônica foi conduzido com H. eques, submetido a concentrações subletais por um período de 15 dias. Na análise histopatológica, os órgãos foram retirados, seccionados e imersos em uma solução fixadora de formol (10%), posteriormente incluídos em bloco, cortados e corados com Hematoxilina-Eosina e ácido periódico de Schiff. O inseticida bifentrina foi classificado como extremamente tóxico para o camarão M. acanthurus (CL50;48h: 0,00027 mg L- 1), peixes H. eques (CL50;48h: 0,031 mg L-1) e X. maculatus (CL50;48h: 0,0065 mg L- 1), com baixa toxicidade para o caramujo P. canaliculata (CE50;48h: 47,62 mg L-1) e quase inexistente toxicidade para as macrófitas L. minor (CI50;7d: 877,26 mg L-1) e A. caroliniana (CL50;7d: 679,84 mg L-1). No que diz respeito à análise de risco ambiental, os resultados refletiram as conclusões dos testes ecotoxicológicos realizados. As descobertas histológicas revelaram efeitos prejudiciais significativos em H. eques, afetando negativamente as brânquias e o fígado desses peixes. Em resumo, conclui- se que a exposição aguda e crônica ao bifentrina compromete a funcionalidade desses órgãos vitais, os quais são responsáveis pela respiração, troca de gases e desintoxicação, afetando funções essenciais para a sobrevivência dos peixes em ambientes aquáticos. Palavras-chave: agrotóxico; ecotoxicologia; histopatologia; piretróides. ABSTRACT Pesticides are substances used to control pest insects and weeds. However, when in contact with non-target organisms, these substances can cause a series of problems at various trophic levels. Thus, the aim of this study was to assess the acute ecotoxicity of bifenthrin to aquatic organisms (macrophytes Lemna minor and Azolla caroliniana, snail Pomacea canaliculata, shrimp Macrobrachium acanthurus, fish Xiphophorus maculatus and Hyphessobrycon eques), chronic ecotoxicity for Hyphessobrycon eques, calculate environmental risk, and analyze histopathological changes in the gills, liver, and kidney of H. eques. The ecotoxicity assays with macrophytes lasted for 7 days, while for the other organisms, it was 48 hours. The chronic ecotoxicity assay was conducted with H. eques, exposing the fish to sublethal concentrations for 15 days. In the histopathological analysis, the organs were removed, sectioned, and immersed in a 10% formalin fixative solution. They were then embedded, cut, and stained with Hematoxylin-Eosin and Periodic Acid-Schiff. The insecticide bifenthrin was classified as extremely toxic to the shrimp M. acanthurus (LC50;48h: 0.00027 mg L-1), fish H. eques (LC50;48h: 0.031 mg L-1) and X. maculatus (LC50;48h: 0.0065 mg L-1), slightly toxic to the snail P. canaliculata (EC50;48h: 47.62 mg L-1), and practically non-toxic to the macrophytes L. minor (IC50;7d: 877.26 mg L-1) and A. caroliniana (LC50;7d: 679.84 mg L-1). Regarding the environmental risk analysis, the results reflected those found in the ecotoxicological assays. The histological results presented significant adverse effects in H. eques, negatively affecting the gills and liver of these fish. In conclusion, both acute and chronic exposure to bifenthrin compromise the functionality of these vital organs, responsible for respiration, gas exchange, and detoxification, affecting vital functions for the survival of fish in aquatic environments. Keywords: pesticide; ecotoxicology; histopathology; pyrethroids. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Ilustração metodológica do ensaio de macrófitas.......................... 28 Figura 2 - Ilustração metodológica do ensaio de caramujo ........................... 31 Figura 3 - Monitoramento das variáveis de qualidade de água com sonda multiparâmetro YSI®.............................................................................. 32 Figura 4 - Ilustração metodológica do ensaio de camarão ............................ 33 Figura 5 - Ilustração metodológica do ensaio de peixes ............................... 35 Figura 6 - Ensaio crônico com H. eques........................................................ 38 Figura 7 - Gráfico de letalidade de A. caroliniana.......................................... 40 Figura 8 - Gráfico de letalidade de L. minor................................................... 41 Figura 9 - Gráfico de letalidade de P. canaliculata........................................ 43 Figura 10 - Gráfico de letalidade de M. acanthurus........................................ 44 Figura 11 - Gráfico de letalidade de X. maculatus / H. eques......................... 45 Figura 12 - Sinais de intoxicação observados em peixes da espécie H. eques após 15 dias de exposição ao inseticida. A Natação errática, sinais de hemorragia (S.E). B - Inchaço nas brânquias (I.B)................................................................................................ 49 Figura 13 - Fotomicrografias de brânquias de H. eques após exposição aguda............................................................................................. 52 Figura 14 - Fotomicrografias de brânquias de H. eques após exposição crônica............................................................................................ 54 Figura 15 - Fotomicrografias de fígado de H. eques após exposição aguda.... 57 Figura 16 - Fotomicrografias de fígado de H. eques após exposição crônica... 59 Figura 17 - Fotomicrografias de rim de H. eques após exposição aguda 62 Figura 18 - Fotomicrografias de rim de H. eques após exposição crônica 63 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Características gerais e físico-químicas de bifentrina................... 19 Tabela 2 - Classificação ecotoxicológica para organismos terrestres e aquáticos não-alvo ........................................................................ 36 Tabela 3 - Risco Ambiental de acordo com a concentração ambiental estimada........................................................................................ 37 Tabela 4 - Valores de CL, CE, CI 50 e classificação ecotoxicológica para os organismos de diversos níveis tróficos.......................................... 42 Tabela 5 - Calculo de Risco ambiental considerando um reservatório de 0,3m de profundidade.............................................................. 46 Tabela 6 - Calculo de Risco ambiental considerando um reservatório de 2m de profundidade.................................................................. 47 Tabela 7 - Sinais de intoxicação histopatológicos de brânquias de H. eques, após 48h de exposição à bifentrina ............................................. 51 Tabela 8 - Sinais de intoxicação histopatológicos de brânquias de H. eques, após 15 dias de exposição à bifentrina.......................................... 53 Tabela 9 - Resultados histopatológicos de fígado em H. eques, após 48h de exposição à bifentrina.................................................................... 56 Tabela 10 - Resultados histopatológicos de fígado de H. eques, após 15 dias de exposição à bifentrina.............................................................. 58 Tabela 11 - Resultados histopatológicos de rim de H. eques, após 48h de exposição à bifentrina................................................................... 61 Tabela 12 - Sinais de intoxicação histopatológicos de rim de H. eques, após 15 dias de exposição à bifentrina........................................ 63 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Resultados ecotoxicológicos obtidos por meio da utilização de organismos bioindicadores............................................................. 20 Quadro 2 - Ensaio de ecotoxicologia aquática................................................. 27 Quadro 3 - Sinais de intoxicação de H. eques durante a exposição a bifentrina em concentrações subletais............................................................... 48 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 13 2 JUSTIFICATIVA E HIPÓTESE .................................................................... 15 3 OBJETIVOS ................................................................................................. 16 3.1 OBJETIVO GERAL ....................................................................................... 16 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ......................................................................... 16 4 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................ 17 4.1 AGROTÓXICOS ........................................................................................... 17 4.2 INSETICIDAS DE USO DOMISSANITÁRIO ................................................. 18 4.3 INSETICIDAS PIRETRÓIDES ..................................................................... 19 4.3.1 Bifentrina ...................................................................................................... 20 4.4 ECOTOXICIDADE ........................................................................................ 21 4.5 ORGANISMOS BIOINDICADORES ............................................................. 21 4.5.1 Lemna minor ................................................................................................. 23 4.5.2 Azolla caroliniana.......................................................................................... 23 4.5.3 Pomacea canaliculata ................................................................................... 24 4.5.4 Macrobrachium acanthurus .......................................................................... 24 4.5.5 Xiphophorus maculatus ................................................................................ 25 4.5.6 Hyphessobrycon eques ................................................................................ 26 4.6 HISTOPATOLOGIA ...................................................................................... 26 5 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................. 28 5.1 ENSAIOS DE ECOTOXICIDADE AGUDA .................................................... 29 5.1.1 Ensaio de macrófitas: Azolla caroliniana e Lemna minor ............................. 29 5.1.2 Ensaio de caramujo: Pomacea canaliculata ................................................. 31 5.1.3 Ensaio de camarão: Macrobrachium acanthurus ......................................... 33 5.1.4 Ensaio de peixes: X. maculatus e H. eques ................................................. 34 5.2 ANÁLISE DOS DADOS E CLASSIFICAÇÃO DOS INSETICIDAS ................ 36 5.3 RISCO DE INTOXICAÇÃO AMBIENTAL ...................................................... 37 5.4 ENSAIO DE ECOTOXICIDADE CRÔNICA COM H. EQUES........................... 38 5.6 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA.................................................................... 40 6 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................. 41 6.1 ECOTOXICIDADE AGUDA PARA OS ORGANISMOS AQUÁTICOS ........... 41 6.2 ANÁLISE DE RISCO AMBIENTAL PARA ORGANISMOS AQUÁTICOS ...... 47 6.3 ECOTOXICIDADE CRÔNICA DE H. EQUES SINAIS DE INTOXICAÇÃO ............... 49 6.4 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA DE H. EQUES ............................................... 51 6.4.1 Ensaio agudo de brânquias de H. eques ...................................................... 51 6.4.2 Ensaio crônico de brânquias de H. eques .................................................... 54 6.4.2 Ensaio agudo e crônico do fígado de H. eques. ........................................... 56 6.4.3 Ensaio agudo e crônico do rim de H. eques. ................................................ 61 7 CONCLUSÃO............................................................................................... 66 REFERÊNCIAS ............................................................................................ 67 13 1 INTRODUÇÃO Os piretróides são inseticidas sintéticos derivados das piretrinas, uma substância extraída das flores do crisântemo (Chrysanthemum cinerariaefolium). Eles possuem uma alta taxa de degradação quando expostos à luz solar e ao ar, o que reduz o tempo em que permanecem no ambiente após a aplicação (Santos et al., 2007). Dentro do grupo dos piretróides, a bifentrina se destaca por seu amplo uso tanto em áreas urbanas quanto agrícolas para o controle de insetos-praga (Weston et al., 2019). No ano de 2021, foram registradas vendas de 4.337,94 toneladas de bifentrina no Brasil para fins agrícolas (Brasil, 2022). O uso da bifentrina em aplicações urbanas muitas vezes resulta na sua entrada nas bacias hidrográficas, seja devido à deriva durante a aplicação ou ao escoamento superficial em ambientes urbanos (Weston et al., 2019; Dar et al., 2016). Isso se torna um problema ambiental, uma vez que esses compostos são altamente tóxicos para animais aquáticos, incluindo peixes e invertebrados (Yang et al., 2018). A presença dessas substâncias em corpos d'água pode causar sérios efeitos adversos em várias espécies de peixes, como letalidade (Marques et al., 2021), natação errática (Ullah et al., 2022) e alterações histológicas nas brânquias, fígado e rins (Gonçalves et al., 2017; Gonçalves et al., 2018; Gonçalves et al., 2020) em espécies não-alvo (Dar et al., 2016). A condução de estudos ecotoxicológicos em diferentes níveis tróficos permite mapear os efeitos tóxicos dessas substâncias nos organismos (Wang et al., 2021). Portanto, a avaliação dos impactos dos contaminantes aquáticos considerando os níveis tróficos é fundamental em programas de monitoramento ambiental, uma vez que a toxicidade dessas substâncias varia de acordo com o nível trófico analisado (Marques et al., 2021). Os bioindicadores aquáticos são organismos que demonstram alterações comportamentais, histológicas e fisiológicas devido à sua sensibilidade. Eles indicam desequilíbrios no ambiente que não seriam detectados em organismos não expostos (Arias et al., 2007). Os estudos ecotoxicológicos desempenham um papel crucial na avaliação do risco ambiental e no biomonitoramento dos ambientes aquáticos. Eles permitem compreender as consequências da exposição a várias substâncias em organismos- 14 teste, por meio de exposições de curto prazo (ecotoxicidade aguda) ou de longo prazo (ecotoxicidade crônica), bem como as alterações histopatológicas após a exposição. Isso possibilita o estudo das implicações da poluição ambiental em diferentes níveis tróficos (Brooks et al., 2019). Neste estudo, foram selecionados organismos bioindicadores em diversos níveis tróficos. As macrófitas aquáticas flutuantes A. caroliniana e L. minor foram escolhidas como produtores autotróficos. Quanto aos consumidores primários, incluem o caramujo P. canaliculata, que pertence ao reino dos moluscos, o segundo maior grupo do reino animal (Tallarico, 2015), e o camarão M. acanthurus, considerado uma espécie de cultivo aquícola de importância econômica (Oosterveer 2006). Os consumidores secundários foram os peixes H. eques e X. maculatus, escolhidos devido à facilidade de manutenção em condições de laboratório, bem como à sua sensibilidade e às alterações histopatológicas com relevância ecológica (Cruz et. al., 2016). 15 2 JUSTIFICATIVA E HIPÓTESE O aumento no uso de agrotóxicos, especialmente os piretróides, para o controle de vetores de doenças domésticas, combinado com a falta de regulamentações que estabeleçam os níveis seguros dessas substâncias em ambientes aquáticos, despertou o interesse da comunidade científica em realizar estudos sobre os efeitos tóxicos dos piretróides nos organismos que habitam esses ambientes. Esses inseticidas atuam como moduladores dos canais de sódio nos axônios e, em concentrações subletais, podem causar alterações comportamentais e histológicas nos organismos expostos. Nesse contexto, espera-se que os estudos ecotoxicológicos realizados com bioindicadores aquáticos revelem a toxicidade em diferentes níveis tróficos após a exposição desses organismos aos piretróides. Com isso, é possível avaliar a toxicidade do inseticida bifentrina em diversos níveis tróficos, fornecendo uma base científica sólida e, possivelmente, estimulando a revisão das regulamentações relacionadas à qualidade da água no Brasil (Brasil, 2007). 16 3 OBJETIVOS 3.1 OBJETIVO GERAL Avaliar as ecotoxicidades aguda e crônica, e o risco de ambiental do inseticida bifentrina em bioindicadores aquáticos de diferentes níveis tróficos. 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Avaliar a ecotoxicidade aguda em macrófitas (A. caroliniana e L. minor), caramujo (P. canaliculata), camarão-pitu-de-água-doce (M. acanthurus) e peixes, platy (X. maculatus) e mato grosso (H. eques). Avaliar ecotoxicidade crônica e os sinais de intoxicação de H. eques, após exposição ao inseticida. Avaliar alterações histológicas de brânquia, fígado e rim de H. eques após a exposição aguda e crônica. Calcular o risco ambiental para macrófitas (A. caroliniana e L. minor), caramujo (P. canaliculata), camarão-pitu-de-água-doce (M. acanthurus) e peixes, platy (X. maculatus) e mato grosso (H. eques). 17 4 REVISÃO DE LITERATURA 4.1 AGROTÓXICOS O termo "agrotóxicos" abrange uma variedade de compostos, incluindo aqueles com ação inseticida, fungicida, herbicida, fumigante, bem como substâncias reguladoras de crescimento, desfolhantes ou dessecantes (Silva; Fay, 2004). Esses agrotóxicos desempenham um papel indispensável em todos os setores da agroindústria. No entanto, quando usados em excesso, os resíduos podem ser prejudiciais para a produção agrícola, o meio ambiente, a segurança alimentar e a saúde humana (Zhang; Yang, 2021). A Lei nº 7.802/1989, em seu Artigo 2º, que trata dos usos, fiscalização e classificação dos agrotóxicos, define esses produtos da seguinte maneira: Os produtos e os agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamentos de produtos agrícola, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição de flora ou fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivo. Substâncias e produtos, empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento (Brasil, 1989, p.1). A ausência de uso de agrotóxicos em cultivos agrícolas pode acarretar em consequências relacionadas a pragas e doenças nas plantações (Zheng, 2015), resultando em prejuízos econômicos (Sun et al., 2017). Os agrotóxicos são amplamente reconhecidos por seu papel positivo no controle de doenças e no aumento da produção agrícola. Entretanto, há indícios de que o uso inadequado dessas substâncias pode levar a sérios problemas ambientais. O escoamento em larga escala de agrotóxicos provenientes de águas residuais tratadas ou das lavouras para corpos d'água superficiais pode resultar em concentrações elevadas dessas substâncias nos recursos hídricos. Isso pode levar à ultrapassagem dos limites de toxicidade para os organismos aquáticos locais, gerando efeitos prejudiciais no ecossistema aquático (Constantinou et al., 2021). Estudos recentes têm demonstrado que inseticidas como o fipronil, imidacloprid e sete piretróides (bifentrina, permetrina, cipermetrina, deltametrina, ciflutrina, lambda-cialotrina e esfenvalerato) são relativamente tóxicos para 18 organismos aquáticos (Xie, et al., 2021). Uma das formas de contaminação causada por agrotóxicos ocorre por meio da lixiviação para as águas subterrâneas, escoamento superficial, absorção pelas plantas, volatilização e deriva no ar (Mojiri et al., 2020). Dado que esses produtos podem ser encontrados em corpos d'água rurais e urbanos, é de extrema importância compreender os efeitos sobre organismos aquáticos (Van de Merwe et al., 2018). Resíduos de agrotóxicos foram detectados em cursos d'água urbanos, tanto na coluna de água quanto nos sedimentos do leito (Ensminger et al., 2013). Devido ao elevado risco de contaminação ambiental, bem como aos impactos persistentes associados ao uso de agrotóxicos e seus subprodutos, esses problemas não podem ser negligenciados (Braun et al., 2019). A Organização Mundial da Saúde relatou que há aproximadamente 3 milhões de casos de intoxicação por agrotóxicos a cada ano, com até 220.000 mortes, predominantemente em países em desenvolvimento (OMS, 2019). Após a aplicação, os agrotóxicos podem passar por diversos processos no ambiente, como hidrólise, fotólise, adsorção, oxidação, volatilização, fotodegradação e degradação microbiana (Ghattas et al., 2017). Em um estudo recente, observou-se que a principal via de entrada de agrotóxicos em ambientes aquáticos é o escoamento da terra até rios e riachos (Girones et al., 2020). 4.2 INSETICIDAS DE USO DOMISSANITÁRIO O termo "Domissanitário" é empregado para se referir a substâncias utilizadas com o propósito de limpar, desinfetar ou eliminar pragas em ambientes urbanos. Esses produtos são empregados tanto em contextos domésticos quanto por entidades especializadas em aplicações profissionais (ANVISA, 1999). Nas últimas décadas, temos observado um aumento no uso de produtos domissanitários em ambientes urbanos. Entre os produtos mais utilizados, destacam- se os piretróides sintéticos e os organofosforados. Nesse contexto, os piretróides são mais amplamente empregados devido à sua baixa toxicidade para mamíferos (Amweg; Weston; Ureda, 2005). O uso irregular desses produtos resulta na presença de piretróides em ambientes aquáticos, por meio do esgoto e do escoamento superficial provenientes de ambientes domésticos (Weston; Holmes; Lydy, 2008). Em estudos de monitoramento ambiental realizados em rios e riachos urbanos, foram registradas 19 concentrações de 9,9 ng/L de bifentrina (Weston; Chen; Lydy 2015) na água e 1211 ng/g nos sedimentos suspensos (Weston; Holmes; Lydy, 2008). Os piretróides estavam presentes em todas as amostras coletadas, sendo o bifentrina o mais preocupante em termos de toxicidade. Acredita-se que esse pesticida possa ter origem tanto no uso por consumidores quanto no uso por controladores profissionais de pragas, mas o padrão sazonal de descarga de esgoto sugere que o uso profissional pode ser a fonte dominante (Weston; Holmes; Lydy, 2008). 4.3 INSETICIDAS PIRETRÓIDES Os piretróides são inseticidas amplamente utilizados na agricultura e em áreas urbanas devido à sua eficácia no controle de insetos e à baixa toxicidade para mamíferos (Yoo et al., 2016). O uso desses inseticidas teve início no século XIX, quando uma tribo persa começou a utilizar o ácido crisântemo ou o ácido pirético extraído da planta Chrysanthemum para controlar piolhos (Gokhale, 2008). No entanto, as piretrinas naturais eram sensíveis à luz solar e ao ar, o que reduzia sua eficácia como agrotóxicos (Santos et al., 2007). Após décadas de pesquisa realizadas pela indústria de produtos químicos agrícolas, em colaboração com governos e laboratórios acadêmicos, esses compostos foram sintetizados, resultando na criação de uma variedade de estruturas de piretróides para uso em medicina veterinária e no controle de pragas agrícolas (Soderlund et al., 2002). Os piretróides podem ser classificados em dois tipos: o tipo I, que não possui grupos ciano, e inclui derivados como aletrina, bifentrina, d-fenotrina, permetrina, resetrina, teflutrina e tetrametrina. Os piretróides do tipo II, por sua vez, contêm o grupo α-ciano, o que aumenta seu nível de ecotoxicidade. Entre os piretróides do tipo II, encontram-se derivados como ciflutrina, cialotrina, cipermetrina, deltametrina, fenvalerato, fenpropatrina, flucitrinato, flumetrina, fluvalinato e tralometrina (Fai, et al., 2017). O mecanismo de ação desses inseticidas envolve a modulação dos canais de sódio dependentes de voltagem, bem como dos canais de cálcio e cloreto (Yang et al., 2018). No entanto, o uso desses produtos representa um risco para organismos não-alvo, como aves, moluscos, abelhas e peixes. Além disso, há preocupações em relação à saúde humana, uma vez que os efeitos adversos desses compostos podem 20 causar danos por meio da exposição. Eles foram associados a perturbações no sistema endócrino, o que pode afetar negativamente os sistemas reprodutivos, imunológicos e aumentar a incidência de câncer (Gil-Garcia, et al., 2006). 4.3.1 Bifentrina A bifentrina é um inseticida que pertence ao grupo dos piretróides e é amplamente utilizado no controle de insetos pragas, incluindo pulgões, mosca branca, besouro do Colorado e pragas domésticas (Yang et al., 2018). Além disso, é empregado no combate às larvas do mosquito Aedes aegypti (Lee et al., 2004). Esse inseticida encontra aplicação em uma variedade de culturas perenes e anuais (ANVISA, 2023). A tabela 1 apresenta as características físico-quimicas de bifentrina. Tabela 1 – Características gerais e físico-químicas de bifentrina Características gerais Nome químico (IUPAC) (1RS) -cis-3- (2-cloro-3,3,3-trifluoroprop- 1-enil) -2,2- dimetilciclopropanocarboxilato de 2- metil-3-fenilbenzil CAS 82657-04-3 Propriedades físico-químicas Fórmula empírica C23 H22 ClF3 O2 Massa molecular 422,88 g mol-1 Solubilidade em água a 20°C 0,001 mg L-1 Ponto de fusão 79,6°C Pressão de vapor a 25°C 0,0178 mPa Fonte: Pesticide Properties Database (2022). Este inseticida é frequentemente detectado em ambientes aquáticos em concentrações de 106 ng L-1 (Weston et al., 2019), a 3,790 μg L-1 (Pennington et al., 21 2014). Todavia a presença deste inseticida representa um risco para a saúde, uma vez que a bifentrina pode induzir neurotoxicidade com alto estresse oxidativo em todas as regiões do cérebro de mamíferos (Syed et al., 2018). 4.4 ECOTOXICIDADE A ecotoxicidade é determinada através da avaliação dos efeitos de estressores ambientais em diferentes níveis, incluindo moléculas, células, órgãos, sistemas, comportamento, organismos e populações (Zhou et al., 2019). Organismos são submetidos à exposição a produtos químicos para avaliar o impacto no ambiente (Danner et al., 2019). Por definição, a ecotoxicidade aguda é o "efeito prejudicial, seja ele letal ou não letal, causado pela amostra no organismo-teste durante o período de exposição do ensaio" (ABNT, 2016, p.3). Estudos realizados com o inseticida Lambda-cialotrina, que é um piretróide, demonstraram alterações comportamentais e fisiológicas em Daphnia magna (Bownik, et al., 2019). Em outro estudo, o piretróide bifentrina foi detectado nos tecidos do intestino, estômago e cérebro do peixe Xenopus laevis (Zhang, 2019). Os ensaios são desenvolvidos para estabelecer a relação entre a resposta da espécie avaliada e as substâncias testadas. Isso possibilita a obtenção de dados sobre a exposição do organismo à substância poluente (Brady et al., 2017). Estudos relacionados à ecotoxicidade aguda são de extrema importância para avaliar e investigar eventos de poluição ambiental em organismos e ecossistemas (Hellou, 2011). 4.5 ORGANISMOS BIOINDICADORES A definição de "organismos bioindicadores" refere-se a organismos que demonstram respostas a contaminantes ambientais após a exposição por um período determinado. Eles revelam alterações comportamentais, bioquímicas, celulares ou fisiológicas que não podem ser detectadas em um organismo que não foi exposto (Arias, 2002). Para a seleção de espécies bioindicadoras, são considerados critérios como a abundância, a relevância ecológica, a tolerância a distúrbios e estressores, 22 bem como uma ampla distribuição que seja comparável a uma variedade de exposições (Siddig et al., 2016). O Quadro 1 mostra a utilização de bioindicadores em pesquisas. Quadro 1 – Resultados ecotoxicológicos obtidos por meio da utilização de organismos bioindicadores Organismos bioindicador Inseticidas Classificação ecotoxicológica quanto ao contaminante / Efeito ecotoxicológico Referência Macrobrachium pantanalense Macrobrachium amazonicum Daphnia similis (camarão) Danio rerio (peixe) Inseticida – Cipermetrina Barrage® Redução do comprimento dos camarões e do peixe- zebra, bem como a eclosão precoce e o aumento da incidência de deformidades de desenvolvimento em embriões de peixe-zebra. (Soares et al., 2017) A. caroliniana W. brasiliensis L. minor (macrófitas) M. acanthurus (camarão) X. maculatus H. eques (Peixes) P. canaliculata (caramujo) Inseticida - Clorpirifós O inseticida Clorpirifós foi classificado como extremamente tóxico para Macrobrachium acanthurus (0,002 mg L-1) e Xiphophorus maculatus (0,07 mg L-1). Moderadamente tóxico para Hyphessobrycon eques (1,65 mg L-1). Pouco tóxico para Pomacea canaliculata (30,66 mg L-1) e Praticamente não tóxico para Azolla caroliniana (849,72 mg L-1),  Wolffia brasiliensis (1271,63 mg L-1) e  Lemna minor (1299,60 mg L-1). (Marques et al., 2021) P. canaliculata Inseticidas - Cipermetrina O cipermetrina provocou alterações histopatológicas em P. canaliculata. (Arrighetti et al., 2018) Fonte: Elaboração do próprio autor. 23 4.5.1 Lemna minor A L. minor é uma macrófita aquática que pertence à família Lemnaceae, e é conhecida por sua ampla distribuição geográfica, facilidade de cultivo e alta taxa de crescimento (Zhao, 2014). Ela é considerada a menor angiosperma do mundo, com frondes (folhas e caules) que têm aproximadamente 5mm de diâmetro e raízes com cerca de 1cm de comprimento. Além disso, em condições de baixa disponibilidade de nutrientes no ambiente, essa macrófita desenvolve estruturas semelhantes a raízes, que auxiliam na estabilização em substratos e na melhora da absorção de nutrientes (Chaudhary; Sharma, 2014). Devido à sua sensibilidade a poluentes aquáticos, a L. minor tem sido extensivamente estudada (Putra; Ritonga, 2018, Landolt; Kandeler, 1987, Della et al., 2016). Além disso, ela demonstra a capacidade de absorver metais pesados, como chumbo e cádmio, durante seu período de crescimento (Sasmaz, 2015). Essa macrófita é também um excelente bioindicador, pois tem facilidade de colonizar corpos d'água de água doce. Ela é amplamente usada em análises de riscos ambientais e toxicológicos (OECD, 2006). 4.5.2 Azolla caroliniana A. caroliniana é uma pteridófita aquática de pequeno porte que possui ampla distribuição geográfica. Desenvolve-se bem em ambientes poluídos, quando comparado com outras espécies vegetais (Kondo, et al., 1989). Possui aplicação em lavouras de arroz, como uma fonte eficiente de nitrogênio (Cheng, et al., 2010). Em estudo realizado por Kimani et al. (2018). Relata-se que a incorporação de A. caroliniana, ajuda a mitigar a emissão de metano nos campos de arroz (Ali, et al., 2015). Estas macrófitas são capazes de crescer em águas desprovidas de nitrogênio combinado, pois possuem uma relação simbiótica com cianobactérias fixadoras de Nitrogênio, como a Anabaena azollae (Wagner, 1997). Além disso, o estudo relaciona A. caroliniana ao uso na produção de hidrogênio combustível e a redução da volatilização da amônia, que estimula a aplicação de fertilizante químico de nitrogênio (Pandey, 2012). 24 Esta macrófita apresenta vantagens no processo de fitorremediação de metais pesados, pois possui grande fator de bioacumulação e fácil colheita (Pandey, 2012). Além de ser utilizada como bioindicador aquático de fungicida a base de piraclostrobina (Vechita et al., 2016). 4.5.3 Pomacea canaliculata O P. canaliculata é um caramujo límnico pertencente à família Ampullariidae, popularmente conhecido como “Aruá do banhado” na região amazônica, distribui-se entre os trópicos e subtrópicos, abrangendo áreas da Região Sul da América do Sul (Cowie, et al., 2005), encontrado em vários ecossistemas, desde pântanos e lagoas até lagos e rios (Martin, 2003). Esta espécie neotropical (Kruatrachue, et al., 2011) possui características de modelo ambiental em pesquisas em ecotoxicológicas, devido à facilidade de cultivo e reprodução (as fêmeas da espécie chegam a depositar de 200 a 600 ovos em poucas semanas). O período de incubação dos ovos é de 14 a 17 dias e os caramujos tornam- se jovens entre 15-25 dias pós eclosão (Ferguson, 2005). Os gastrópodes, que abrangem uma diversidade abundante de espécies amplamente disseminadas em ambientes aquáticos, devem ser considerados nas avaliações de risco ambiental e toxicidade de xenobióticos (Tallarico, 2015). Além disso, em estudos realizados por Brunetti et al., (2016) o P.canaliculata apresentou bons resultados no biomonitoramento de piretroides e espalhante adesivo à base de óleo vegetal. 4.5.4 Macrobrachium acanthurus Os camarões do gênero Macrobrachium pertencem à família Palaemonidae, esse gênero é representado por um grupo muito diversificado de espécies de camarões que colonizam uma ampla variedade de ambientes estuarinos e de água doce em todo o mundo. Algumas das espécies desse gênero necessitam de ambos os ambientes, estuarino e de água doce, para completar seu ciclo de vida (Valência, 2017). As principais características distintivas desse gênero incluem a presença dos primeiros dois pares de pereiópodos quelados, sendo o segundo maior que o primeiro, o carpo não subdividido e a presença de dentes no rosto (Williams, 1984). 25 Conforme destacado por Granados (2021), o camarão M. acanthurus tem sido de grande importância econômica na região sudeste do México e é considerado um recurso pesqueiro de grande relevância. Além disso, essa espécie de camarão possui características como facilidade de reprodução, resistência a doenças e crescimento rápido, atingindo o tamanho comercial em apenas 6 meses. O gênero Macrobrachium é particularmente diverso em águas doces costeiras, com espécies que possuem diferentes demandas de salinidade em seu ciclo de vida. Por exemplo, espécies como M. acanthurus, M. olfersi e M. amazonicum, na América do Sul, possuem larvas que necessitam de água salobra para completar seu desenvolvimento (Boudour-Boucheker, et al., 2016). Esses camarões demonstram capacidade de tolerar aumentos na salinidade, exibindo sinais de hiporregulação, ou seja, a capacidade de manter a homeostase em ambientes com variações salinas (Wilder et al., 1998). No entanto, quando expostos a níveis muito elevados de salinidade, esses camarões enfrentam perda significativa de água em seus tecidos musculares (Freire et al., 2017). Em um estudo recente, M. acanthurus se destacou como um excelente bioindicador de contaminação em ambientes aquáticos com o pesticida clorpirifós. A concentração letal média (CL50;48h) para esse organismo foi de 0,002 mg L-1. Além disso, o camarão M. acanthurus mostrou-se de fácil manejo em condições de laboratório (Marques et al., 2021). 4.5.5 Xiphophorus maculatus Conhecido popularmente como platy ou platyfish, o X. maculatus é naturalmente encontrado ao norte da América Central, onde habita riachos e pântanos (Kallman, 1975). Pertencente à família Poeciliidae, é um peixe ornamental vivíparo não agressivo e de fácil reprodução, apresentando uma variada coloração laranja (Prodocimo; Freire, 2001). Foi introduzido em pelo menos 18 países, incluindo o Brasil, Estados Unidos da América, Canadá e Japão (Fuller et al., 1999). Além de habitats naturais, ele pode ser encontrado em ambientes lênticos, bem como em reservatórios artificiais ou áreas urbanas (Page; Burr 1991). O X. maculatus possui uma notável capacidade predatória sobre as larvas do mosquito Aedes aegypti, e suas características comportamentais e biológicas o tornam mais eficaz no controle de larvas em comparação com o peixe P. reticulata 26 (Junior, 2018). Além disso, o X. maculatus tem se mostrado um excelente bioindicador aquático para o organofosforado clorpirifós. Em um estudo conduzido por Marques et al., (2021), esse produto foi classificado como extremamente tóxico para a espécie, com uma CL50 de 0,07 mg L-1 em 48 horas. 4.5.6 Hyphessobrycon eques O H. eques é um pequeno peixe neotropical pertencente à família Characidae, com ocorrência que se estende desde a região da Amazônia até as bacias dos rios Guaporé e Paraguai. Geralmente, atinge cerca de 4 cm de comprimento e é encontrado habitando a parte inferior da coluna d'água, em grandes cardumes e prefere águas com características neutras a ligeiramente ácidas, com um pH entre 6,5 e 7,0, e uma temperatura variando de 26°C a 28°C (Aguinaga et al., 2014). Além de seu papel na ecologia aquática, o H. eques também tem importância econômica como peixe ornamental, devido à sua coloração corporal distintiva. Em alguns casos, a comercialização desses peixes se torna a principal fonte de renda para famílias que dependem desse comércio (Aguinaga et al., 2014). Essa espécie habita principalmente em bancos de macrófitas, que não apenas fornecem abrigo contra predadores, mas também servem como substrato para o desenvolvimento de outros organismos que servem de alimento (Takeda et al., 2004). Devido à sua sensibilidade às mudanças causadas por contaminantes aquáticos, o H. eques é considerado um excelente bioindicador aquático (Cruz et al., 2015). Além disso, em um estudo conduzido por Cruz et al., (2008), esse organismo atendeu de maneira exemplar aos critérios de seleção como um potencial bioindicador aquático. 4.6 HISTOPATOLOGIA A histopatologia é uma disciplina científica usada para avaliar a saúde de organismos expostos a poluentes, tanto em ambientes de laboratório como em estudos de campo. Por meio da análise histológica, é possível identificar indicadores de alterações ambientais, tornando-se uma ferramenta valiosa para monitorar diversos contaminantes em organismos sujeitos a doses letais e subletais. Essa abordagem contribui significativamente para a compreensão do estado geral do ecossistema local (Olaniyi, 2020). 27 Em um estudo recente realizado por Ghayyur et al., (2021), foram observadas alterações histopatológicas significativas nas brânquias do peixe Cirrhinus mrigala após exposição a inseticidas, incluindo Clorfenapir (um organofluorado), Dimetoato (um organofosfato) e Acetamiprid (um neonicotinoide). Tais alterações histológicas fornecem insights importantes sobre os efeitos negativos desses inseticidas nas brânquias desses peixes. Outro estudo conduzido por Hook et al., (2018) identificou alterações histológicas nas brânquias, no fígado e na composição lipídica do músculo do peixe Lates calcarifer coletado na bacia hidrográfica de Mackay Whitsundays. Nesse estudo, foram quantificados 55 agrotóxicos e metabólitos de agrotóxicos, que, de acordo com o autor, estão associados a essas alterações histológicas. Outros estudos também destacaram danos em organismos, como fusão lamelar, elevação do epitélio, hiperplasia e necrose (Ferreira; Assis, 2018), bem como mudanças na atividade enzimática e estresse oxidativo, sugerindo comprometimento da função respiratória e desequilíbrio nas defesas antioxidantes (Souza, Martins e Fernandes, 2020). Danos notáveis nos tecidos renais foram observados em diferentes estudos, incluindo o desenvolvimento de cistos, inflamação, necrose tubular (Silva, Oliveira e Martinez, 2019), degeneração tubular, aumento das lacunas intercelulares e infiltração inflamatória (Araújo, Pinto e Fernandes, 2021). Além disso, foram relatadas alterações hepáticas, como vacuolização de hepatócitos, degeneração citoplasmática, congestão sinusoidal e infiltração de células inflamatórias (Araújo, Pinto e Fernandes, 2018). Essas observações ressaltam os impactos adversos dos poluentes nos órgãos e tecidos dos organismos aquáticos, fornecendo dados importantes para avaliar a qualidade ambiental e a saúde dos ecossistemas aquáticos. 28 5 MATERIAL E MÉTODOS Os ensaios ecotoxicológicos ocorreram no Laboratório de Ecotoxicologia e Eficácia de Agrotóxicos (LEEA) do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos (UNIFEB) em Barretos, São Paulo. Para conduzir esses ensaios, foi submetida uma prévia da pesquisa à Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da mesma universidade (Protocolo n° 01_2021). O inseticida utilizado foi o Bifentek ® Rogama (nome comercial) que possui como princípio ativo a Bifentrina (Nº CAS: 82657-04-3) na concentração comercial de 215 g L-1 em suspensão concentrada. Este inseticida possui ação residual de baixo odor e indicado para campanhas de saúde pública, no controle de baratas, mosquitos, moscas, escorpiões, pulgas e cupins subterrâneos. O produto foi diluído em água desclorada e a aplicação foi feita com o auxílio de pipetas semiautomática, o monitoramento das variáveis de qualidade de água foram realizados com o auxílio de Medidor de Oxigênio Dissolvido de bolso - ASKO - mod. DO ECO, Medidor de Condutividade - ASKO -mod. AK51, Medidor de pH - ASKO - AK90 e sonda multiparâmetro YSI®. Os ensaios ecotoxicológicos são realizados na seguinte ordem (Quadro 2): Quadro 2 – Ensaio de ecotoxicologia aquática Ordem Tipo de ensaio Descrição 1° Sensibilidade Verificar a saúde dos organismos por meio de uma substância de referência (OECD 2002). Neste experimento foram utilizados Cloreto de Sódio (NaCl) para os ensaios de macrófitas e Cloreto de Potássio (KCl) para os demais organismos (ABNT NBR 15088, 2016). 2° Preliminar Estabelecer um intervalo de concentrações para a realização do ensaio definitivo. Ao final, é determinado a maior concentração que causa 0% de letalidade e a menor que causa 100%. 3° Definitivo Realizado amostra ou intervalo de concentrações estabelecido no ensaio preliminar, com o mínimo de cinco soluções testes. Fonte: (ABNT, 2016). 29 Esta formulação comercial foi diluída usando água desclorada, a mesma água usada no cultivo de cada organismo de teste. As diluições foram preparadas com base na concentração do ingrediente ativo. As avaliações de ecotoxicidade foram realizadas usando duas espécies de macrófitas (L. minor e A. caroliniana), uma espécie de caramujo (P. canaliculata), uma espécie de crustáceo (M. acanthurus) e duas espécies de peixes (X. maculatus e H. eques). 5.1 ENSAIOS DE ECOTOXICIDADE AGUDA 5.1.1 Ensaio de macrófitas: Azolla caroliniana e Lemna minor As macrófitas aquáticas (L. minor, A. caroliniana e W. brasiliensis) foram cultivadas em recipientes de 60 L com água desclorada contendo um substrato (terra, areia e matéria orgânica, em medidas iguais), e adubo químico. Após o estágio de crescimento vegetativo, as macrófitas foram aclimatadas em solução de Hoagland (água destilada reconstituída com nutrientes e pH 5,8 ± 0,2) durante sete dias em uma sala de bioensaio a 25,0 ± 2,0 °C, com fluxo contínuo de ar, intensidade de luz de 6.500 Lux e fotoperíodo de 12 horas de luz para 12 horas de escuridão. Os ensaios de ecotoxicidade para macrófitas foram realizados de acordo com os procedimentos da Diretriz para testes de produtos químicos - Inibição de crescimento de L. minor da OECD (2002), com algumas adaptações para A. caroliniana. Nos ensaios, foram selecionadas macrófitas com bom aspecto sanitário e tamanho homogêneo. Os testes foram conduzidos em uma sala aclimatada (nas mesmas condições de aclimatização) com duração de sete dias, conforme apresentado na figura 1. 30 Figura 1 – Ilustração metodológica do ensaio de macrófitas. Fonte: Elaboração do próprio autor. O ensaio para L. minor foi conduzido com três réplicas para cada concentração testada. Para cada réplica, foram escolhidas quatro colônias, cada uma com 3 frondes ("folhas"), totalizando 12 frondes por réplica. Para A. caroliniana, foram utilizadas cinco réplicas para cada concentração testada, com cinco plantas saudáveis em cada réplica. A toxicidade para L. minor foi avaliada pela inibição do crescimento das plantas, ocorrência de necrose e clorose. A toxicidade para A. caroliniana foi avaliada pela porcentagem de necrose e clorose. Antes de realizar os ensaios de toxicidade com o inseticida, a saúde e a sensibilidade das macrófitas foram avaliadas por meio de testes com a substância de referência cloreto de sódio (NaCl). Os testes de sensibilidade foram realizados nas mesmas condições de aclimatização (OECD, 2002). O ensaio de sensibilidade, concentração de inibição do crescimento (IC50;7d) de NaCl para L. minor foi realizada nas seguintes concentrações:0,0 (controle) 0,09; 0,80; 1,40; 2,45; 4,20 e 7,50 g L-1 (fator de diluição 1,75). Obtendo CI50;7d de 0,23 g L-1, com 0,16 mg L−1 como limite inferior (LI) e 0,29 mg L−1 como limite superior (LS). O ensaio de concentração letal (CL50;7d) de NaCl para A. caroliniana foi realizada nas seguintes concentrações:0,0 (controle) 0,50; 1,12; 2,53; 5,69; 12,81; 28,83 g L-1 (fator de diluição 2,25). Obtendo CL50;7d de 3,64 g L-1 (LI 3,21 e LS 4,14 g L-1). Esses 31 valores confirmam que as macrófitas estavam em condições normais de saúde e sensibilidade, de acordo com o a carta controle do laboratório. Os ensaios de ecotoxicidade de bifentrina em L. minor e A. caroliniana foram realizados expondo as macrófitas a diferentes concentrações do inseticida diluído na água de cultivo (solução de Hoagland). As concentrações foram determinadas em testes preliminares de ecotoxicidade em uma sala nas mesmas condições de aclimatização. No ensaio definitivo macrófitas foram expostas às seguintes concentrações: 0,0 (controle),107,50; 537,50; 1075,00; 1612,50; 2150,00 e 2687,50 mg L-1 por sete dias. A avaliação foi feita nos períodos de 3, 5, e 7 dias. Foi quantificado o número de frondes e se havia necrose ou clorose. Por fim, foi feito o cálculo da CI50;7d com base no percentual de letalidade no software Trimmed Spearman Karber (1976). 5.1.2 Ensaio de caramujo: Pomacea canaliculata Os caramujos (P. canaliculata) foram cultivados em recipientes de 300,0 litros com água declorada e substrato (terra, areia e matéria orgânica, em medidas iguais) até a reprodução. Foram alimentados com a macrófita aquática Pistia stratiotes e ração extrusada para peixes, contendo 28% de proteína. Após a reprodução, as jovens crias com peso de 0,90 a 1,20g foram encaminhados para sala de bioensaios, em caixas de 60 L, com água desclorada, condutividade elétrica da água de 0,09 ± 0,02 mS.cm-1, pH de 8,80, temperatura de 25,00 ± 2,00 °C e 4,11 ± 1,00 mg L-1, fotoperíodo de 12 horas, durante 7 dias, com aeração constante e alimentação diária com a macrófita Vallisneria americana. Em seguida, o período de aclimatação dos organismos foi realizado ensaio de sensibilidade com cloreto de potássio (KCl), nas concentrações de: 0,0(controle); 0,10; 0,25; 0,50; 0,90; 1,20; 2 g L-1. Os ensaios foram conduzidos em sistema estático (sem alimentação e renovação de água) por um período de 48 horas em aquários de três litros e com cinco caramujos por réplica. Obtendo a concentração efetiva de 50% (CE50;48h) de 1,11 g L-1 com intervalo de confiança (95%) entre 0,86 e 1,43 g L-1, de acordo com a carta controle do laboratório. Os ensaios de ecotoxicidade de bifentrina em P. canaliculata foram realizados expondo os organismos a diferentes concentrações do inseticida diluído em água desclorada, como mostra na Figura 2. 32 Figura 2 – Ilustração metodológica do ensaio de caramujo. Fonte: Elaboração do próprio autor. O ensaio de toxicidade com os caramujos foi conduzido de acordo com a norma NBR 15088 (ABNT, 2016) para peixes, adaptado para caramujos, o que garantiu a padronização dos ensaios. Os caramujos não foram alimentados e não houve aeração nos aquários durante os ensaios de toxicidade (48 horas). O ensaio com os caramujos foi realizado com três repetições para cada concentração testada, e em cada repetição, foram utilizados cinco caramujos. O ensaio definitivo foi realizado em triplicata nas concentrações de: 0,0 (controle) 1,15; 3,70; 12,00; 39,24 e 126,85 mg L-1. A imobilidade dos caramujos foi avaliada em 24 e 48 h de exposição, por meio de um toque mecânico com o auxílio de uma pinça no opérculo. As variáveis de oxigênio dissolvido, temperatura, condutividade elétrica e pH da água foram avaliados com sonda multiparâmetro YSI® durante os períodos de 0, 24 e 48 h de exposição ao inseticida (Figura 3). 33 Figura 3 – Monitoramento das variáveis de qualidade de água com sonda multiparâmetro YSI® nos ensaios com bifentrina. Fonte: Elaboração do próprio autor. 5.1.3 Ensaio de camarão: Macrobrachium acanthurus Os ensaios com M. acanthurus foram realizados de acordo com a ABNT NBR 15088: 2016 adaptada para camarão. Foi feita a aclimatação dos organismos em sala para bioensaios com tanques de 300L aerados sob fluxo contínuo de água, à temperatura de 25,0 ± 1,0 °C, fotoperíodo de 12 horas, no período de 7 dias em tanque de aclimatação aerado e alimentados diariamente com ração extrusada úmida. A água utilizada nos ensaios foi coletada em sistema próprio do laboratório após a descloração, com as seguintes características: condutividade elétrica da água de 0,19 ± 0,10 mS.cm-1, pH 8,5 ± 0,5, oxigênio dissolvido 4,11 ± 1,00 mg L-1 e temperatura de 25,56 ± 1,00. Foram utilizados organismos em fase juvenil pesando entre 1 e 2 g, estes foram submetidos a avaliação de sanidade e sensibilidade, com KCl nas concentrações de 0,01; 0,1; 0,25; 0,5; 0,9; 1,5 g L-1 mais o controle. Foram utilizados três camarão por concentração sendo 1 por aquário em sistema estático (sem renovação de água) no período de 48 horas, os organismos não foram alimentados 34 durante o ensaio. A CL50;48h de KCl foi de 0,09 g L-1, com intervalo de confiança (95%) entre 0,04 e 0,22 g L-1. Os ensaios preliminares foram realizados nas mesmas condições de aclimatação apresentadas. Figura 4 – Ilustração metodológica do ensaio de camarão Fonte: Elaboração do próprio autor. O ensaio definitivo foi realizado nas concentrações de 0,000011; 0,00011; 0,00032; 0,00054; 0,0011 mg L-1 de bifentrina mais o controle, com 6 indivíduos por concentração (1 indivíduo por aquário). A letalidade foi avaliada nos períodos de 24 e 48h após aplicação do produto e os organismos mortos foram retirados dos respectivos aquários. Em seguida foi calculado a concentração letal de 50% após 48h de exposição. A CL50; 48h e as variáveis físico-químicos de água foram monitorados nos períodos de 0, 24 e 48h de acordo com as normas estabelecidas pela ABNT NBR 15088: 2016 (ABNT, 2016). 5.1.4 Ensaio de peixes: X. maculatus e H. eques Os ensaios ecotoxicológicos para peixes foram realizados de acordo com os procedimentos da ABNT NBR 15088 (2016). Os peixes X. maculatus utilizados nos ensaios, provém do cultivo próprio do laboratório enquanto o H. eques foi adquirido por meio de criação especializadas de boa procedência. A aclimatação ocorreu no 35 período de sete a dez dias em sala de bioensaios, com caixas de 60 L, à temperatura de 25,0 ± 2,0 °C, fotoperíodo de 12h, com aeração constante promovida por bomba aeradora e alimentação diária com ração floculada. A água utilizada para a aclimatação foi desclorada em sistema próprio laboratório. O ensaio de sensibilidade ao KCl em X. maculatus foi realizado com alevinos de até 1 cm de comprimento nas concentrações de: 0,01; 0,1; 0,56; 1; 1,56; 2,44 g L- 1 mais o controle. Foi obtida a CL50;48h de 0,59 g L-1 com intervalo de confiança (95%) entre 0,39 (LI) e 0,9 (LS) g L-1. Os ensaios preliminares foram realizados com 5 indivíduos de (tamanho entre 1 e 2 cm) por aquário inicialmente com o volume de 1 L de água por um período de 24h. Em seguida foram aplicadas às concentrações testes e completadas com água até que se obtenha o volume total de 2 L por aquário. Neste experimento os organismos permanecem expostos a bifentrina durante o período de 48h, sem alimentação em sistema estático. A avaliação da letalidade e sinais de intoxicação são realizadas após 24 e 48h de exposição, foi observado natação errática, espasmos e dificuldade de arfagem. A Figura 5 mostra a metodologia utilizada. Figura 5 – Ilustração metodológica do ensaio de peixes Fonte: Elaboração do próprio autor. Em seguida foram feitos os ensaios definitivos nas concentrações de 0,0011; 0,0054; 0,011; 0,054; 0,11; 0,32 mg L-1 mais o controle em triplicata e 5 peixes por 36 réplica. Além disso, foram monitoradas as variáveis condutividade elétrica da água de 0,19 ± 0,02 mS.cm-1, pH 7,0 a 7,6, oxigênio dissolvido (OD) 4,31 ± 1 mg L-1 e temperatura 25,0 ± 1,0 °C, nos períodos de 0, 24 e 48h de aplicação do produto de acordo com as normas estabelecidas pela ABNT NBR 15088: 2016 (ABNT, 2016). Os ensaios realizados com H. eques seguiram os mesmos procedimentos de X. maculatus. Foram selecionados 3 indivíduos jovens com peso de 0,8 a 1 grama e acondicionados em aquários contendo o volume de 2L de água, pelo período de 24h. Após esse período foi aplicado KCl (para o ensaio de sensibilidade) nas concentrações de 0,01; 0,10; 0,56; 1,00; 1,56; 2,44 g L-1 mais o controle, por fim, foi colocado água desclorada até completar o volume de 3 L. As variáveis de qualidade de água foram monitoradas de acordo com as normas estabelecidas pela ABNT NBR 15088:2016 (ABNT, 2016): condutividade elétrica da água de 0,19 ± 0,02 mS.cm-1, pH variando de 7,0 a 7,6, oxigênio dissolvido (OD) de 4,31 ± 1 mg L-1 e temperatura mantida a 25,0 ± 1,0 °C nos períodos de 0, 24 e 48 horas após a aplicação do produto. A CL50; 48h obtida foi de 1,68 g L-1, com intervalo de confiança de 95% entre 1,32 e 2,41 g L-1. Em seguida, foram realizados os experimentos preliminares e por fim o definitivo nas mesmas concentrações do ensaio de X. maculatus. A avaliação das variáveis de qualidade de água foi realizada no período de 0, 24 e 48h e a ecotoxicidade de bifentrina foi avaliada nos períodos de 24 e 48h conforme o experimento de X. maculatus. 5.2 ANÁLISE DOS DADOS E CLASSIFICAÇÃO DOS INSETICIDAS Os valores de mortalidade foram submetidos a regressão linear e a concentrações efetiva, de inibição e letal estimados (CE50, CI50 e CL50) pelo software Trimmed Spearman Karber (Hamilton; Russo; Thurston, 1977) e o inseticida foi classificado (Tabela 1) quanto ao seu risco de intoxicação ambiental para cada espécie avaliada conforme categoriais da Environmental Protection Agency (EPA), 2022 (Tabela 2). 37 Tabela 2 – Classificação ecotoxicológica para organismos terrestres e aquáticos não-alvo CE/CI/CL 50% (mg L-1) CATEGORIAS (CL50) ≤0,1 Extremamente tóxico >0,1 (CL50) ≤1,0 Muito tóxico >1,0 (CL50) ≤10,0 Moderadamente tóxico >10,0 (CL50) ≤100,0 Pouco tóxico (CL50) >100,0 Praticamente não-tóxico Fonte: EPA (2022). 5.3 RISCO DE INTOXICAÇÃO AMBIENTAL O risco de intoxicação ambiental causado pelo inseticida bifentrina foi determinado a partir do método do quociente (Q), onde o risco é calculado por meio da equação 1 e 2. Assim, o risco é classificado em categorias (Tabela 3), de acordo com os valores de RQ propostos por Goktepe, Portier, Ahmedna (2004). CAE 100% = ( ) EQ. 1 QR = ( ) EQ. 2 Sendo: CAE = concentração ambiental estimada V = volume dos supostos reservatórios MDR = maior dose recomendada. Para calcular a concentração ambiental estimada (CAE) foram considerados cenários de contaminação adaptados de procedimento propostos por Kokta et al., (1992). Nesses cenários considerou-se que: A) Inseticida bifentrina esteja uniformemente distribuído no espelho d 'água de um reservatório com área de um hectare (10.000 m²) nas profundidades de 0,30 e 2,0 m. B) Densidade média da água de 1,0 g cm-3. 38 C) Quantidade do inseticida estudado aplicado na superfície do espelho d’água do reservatório seja equivalente às diluições de 100,00; 50,00; 25,00; 12,50; 6,25 e 3,125% da maior dose recomendada para uso domissanitário (MDR). D) Cálculo do volume dos supostos reservatórios (V) com 0,30 e 2,0 m de profundidade. Tabela 3 – Risco Ambiental de acordo com a concentração ambiental estimada. Quociente de risco Classes de risco RQ ≥ 0,5 Alto risco 0,05 < RQ < 0,5 Médio risco RQ ≤ 0,05 Baixo risco Fonte: Goktepe, Portier, Ahmednal., (2004) Para a avaliação do risco de bifentrina foi utilizada a maior dose de aplicação recomendada pela bula. O produto Bifentek® é indicado para aplicação domosanitária, com isso foi feito uma adaptação do método proposto por Kokta et al, 1992) e foi considerado a maior concentração de aplicação indicada na bula. Portanto, para fins de cálculo a concentração utilizada foi de 537,50 g i.a ha-1, recomendado para o controle de pulgas. Deste modo as concentrações utilizadas são: 537,500; 268,750; 134,375; 67,186; 33,594; 17,922 g i.a ha-1. 5.4 ENSAIO DE ECOTOXICIDADE CRÔNICA COM H. eques. Os exemplares de H. eques com peso entre 0,80 e 1,00 g, foram aclimatados em sala de bioensaio dentro de aquários de 60 L, aerados, com temperatura de 25,00 ± 2,00 oC, fotoperíodo de 12 h e alimentados uma vez ao dia com ração floculada (28 a 32% de proteína) por dez dias. Em seguida foi realizado o ensaio crônico com três réplicas por concentração, contendo 5 indivíduos por aquário. Os aquários foram aerados com bomba aeradora e continham o volume final de 5 L (considerando água + concentração do inseticida). Os organismos foram expostos ao inseticida bifentrina por 15 dias (Figura 6) de acordo com a ABNT NBR 15499:2016. 39 Figura 6 – Ensaio crônico com H. eques Fonte: Elaboração do próprio autor. As concentrações subletais foram definidas com base nas concentrações calculadas nos ensaios de ecotoxicidade aguda. A CL50;48h encontrada (0,031 mg L- 1) foi submetida a quocientes de 100, 50, 10 e 5 determinando as concentrações de: 0,0003; 0,0006, 0,003, 0,006 mg L-1 mais o controle. As variáveis de qualidade de água, foram aferidas com medidor de oxigênio dissolvido de bolso - ASKO - mod. DO ECO, Medidor de Condutividade - ASKO -mod. AK51, Medidor de pH - ASKO - AK90 nos períodos de: 0, 1, 3, 5, 7, 9, 11, 13, e 15 dias após exposição. A avaliação dos sinais de intoxicação ocorreu no mesmo período, foram observados natação errática, dificuldade de arfagem, espasmos e hemorragia. O experimento foi realizado em sistema semi-estático e a alimentação dos organismos teve início a partir do 3° dia e seguiu conforme os dias das avaliações. Foi utilizado 0,03 g de rações floculadas por aquário, sendo que cada aquário tinha cinco peixe com peso de 1g. Neste sentido foi calculado 0,6% do peso vivo para calcular o peso de ração por indivíduo. Todavia este percentual representa 0,03 g. No 7° dia de ensaio foi feita a limpeza dos aquários, retirando os resíduos de fezes depositados ao fundo. O volume de água retirado dos aquários foi de 1 L de 40 água, sendo reposto em seguida com a reaplicação de bifentrina correspondente à concentração de cada aquário. 5.6 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA Ao término do ensaio de toxicidade aguda e crônica com bifentrina em H. eques foram coletadas 5 amostras de brânquias, fígado e rim dos animais sobreviventes. Os órgãos foram retirados, seccionados longitudinalmente e imersos em solução fixadora de formol (10%) por 24 horas, em seguida foi feita a troca da solução fixadora e colocado álcool 70%, após 24 e 48h. Após a fixação, é feita a desidratação, diafanização e inclusão em Histosec® (Merck). Em seguida, a realização a microtomia em Micrótomo Lupetec Semi Automático Motorizado – MRP2016SA, obtendo cortes de 3 a 5 µm de espessura, por fim, corados com Hematoxilina-Eosina, PAS (ácido periódico de Schiff), Alcian Blue pH 2,5 e Alcian Blue + ácido periódico de Schiff (BEHMER et al., 1976). Para a análise das lâminas histológicas foi utilizado o microscópico de Luz de LED Panthera L- Motic®. 41 6 RESULTADOS E DISCUSSÕES 6.1 ECOTOXICIDADE AGUDA PARA OS ORGANISMOS AQUÁTICOS Após a realização dos testes com bioindicadores aquáticos expostos ao bifentrina, foram observados efeitos ecotoxicológicos, classificados da seguinte forma, do menos tóxico para o mais tóxico: L. minor, A. caroliniana (macrófitas), P. canaliculata (caramujo), X. maculatus, H. eques (peixes) e M. acanthurus (camarão). Os resultados de ecotoxicidade para A. caroliniana e L. minor revelaram CL50 (mediana de concentração letal) de 679,84 e 877,26 mg L-1, respectivamente. De acordo com a tabela 2 apresentada na metodologia, o inseticida foi classificado como praticamente não tóxico para ambas as macrófitas. Os resultados de LS (limite superior) e LI (limite inferior) podem ser encontrados na tabela 4. No caso de A. caroliniana, o maior percentual de necrose foi observado na concentração de 2687,50 mg L-1, com necrose em 99% das frondes, enquanto o menor percentual foi de 4% nas frondes expostas a 107,50 mg L-1 (Figura 7). Esses resultados indicam uma relação entre a concentração de bifentrina e o dano causado às macrófitas, com concentrações mais elevadas resultando em maior necrose das frondes. Figura 7 – Gráfico de letalidade de A. caroliniana Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: Dados expressos em porcentagem 4 38 57 75 95 99 y = 18,971x - 5,0667 R² = 0,9559 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 107,5 537,5 1075 1612,5 2150 2687,5 mg L-1 Po rc en ta ge m (% ) Concentração mg L-1 Letalidade Linear (Letalidade) 42 Em L. minor, observou-se um efeito inverso, onde o maior percentual de necrose foi registrado na concentração de 107,50 mg L-1, afetando 67% das frondes. Por outro lado, o menor percentual de necrose foi observado em 2150,00 mg L-1, com 29% dos indivíduos afetados, conforme ilustrado na figura 8. Esses resultados sugerem uma resposta diferenciada das macrófitas, com concentrações intermediárias de bifentrina causando mais danos nas frondes de L. minor. Os valores dos limites de confiança e a classificação ecotoxicológica estão disponíveis na Tabela 4. Figura 8 – Gráfico de inibição de crescimento de L. minor. Fonte: Elaboração do próprio autor. Os resultados do ensaio com macrófitas demonstraram uma maior resistência ao bifentrina. Esses organismos parecem ser menos suscetíveis aos piretroides em comparação a outros organismos aquáticos, como peixes, moluscos e crustáceos (Campbell et al., 2012). Isso ocorre devido ao mecanismo de ação dos piretroides, que envolve alterações na cinética dos canais de sódio de insetos (Yang et al., 2018), e as macrófitas não possuem esses mecanismos (Brenner et al., 2006). Além disso, observou-se um aumento no número de frondes em concentrações mais elevadas do inseticida. Esses resultados indicam que as macrófitas podem ser mais eficazes como agentes de biorremediação do bifentrina. Em um estudo com P. stratiotes e E. crassipes expostas aos piretroides permetrina, cipermetrina, deltametrina e bifentrina, observou-se uma eficiência de remoção de 60 67 43 33 36 29 y = -7,3469x + 70,159 R² = 0,8037 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 107,5 537,5 1075 1612,5 2150 2687,5 Po rc en ta ge m (% ) Concentração (mg L-1) Letalidade Linear (Letalidade) 43 contaminantes de 70% (Riaz et al., 2017). Além disso, é comum observar um aumento na biomassa vegetal após a exposição a inseticidas piretroides (Friberg-Jensen et al., 2003), o que reduz a concentração do poluente no ambiente aquático (Mugni et al., 2011). Os resultados de CL50;7d, CL50;7d, CE50;48h e CL50;48h dos organismos utilizados serão apresentados na Tabela 4. Tabela 4 – Valores de CL, CE, CI 50 e classificação ecotoxicológica para os organismos de diversos níveis tróficos. Organismos Nível trófico CL50;7d, CL50;7d, CE50;48h, CL50;48h (mg L-1) Equação Linear R2 Classificação de Ecotoxicidade (EPA, 2022) A. caroliniana Produtor/ Autótrofo 679,84 (588,99 – 784,7)* y = 18,971x - 5,0667 R² = 0,96 Praticamente não- tóxico L. minor Produtor/ Autótrofo 877,26 (704,38 – 1092,55)* y = - 7,3469x + 70,159 R² = 0,80 Praticamente não- tóxico P. canaliculata Consumidor primário 47,62 (35,733 – 63,46)* y = 0,3333x-0,5 R² = 0,83 Pouco tóxico M. acanthurus Consumidor primário 0,00027 (0,00018 - 0,00038)* y = 1,6x - 1,8 R² = 0,80 Extremamente tóxico X. maculatus Consumidor secundário 0,0065 (0,0043 - 0,0098)* y = 3,8x – 2 R² = 0,92 Extremamente tóxico H. eques Consumidor secundário 0,031 (0,020 - 0,048)* y = 2,4x - 4 R² = 0,86 Extremamente tóxico Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: * Intervalo de confiança Os resultados do ensaio com o caramujo P. canaliculata classificou o inseticida bifentrina como pouco tóxico para essa espécie (Tabela 2). A CE50;48h obtida foi de 47,62 mg L-1, e foram observadas reduções nos reflexos e tentativas de fuga a partir da concentração de 12,00 mg L-1. Indivíduos expostos à concentração de 126,85 mg L-1 apresentaram imobilidade/letalidade de 26,70% após 24 horas de exposição. No período de 48 horas, ocorreu letalidade de 33,33% dos organismos expostos à concentração de 39,24 mg L-1e 73,3% na concentração de 126,85 mg L-1 (Figura 9). 44 Figura 9 – Gráfico de letalidade de P. canaliculata. Fonte: Elaboração do próprio autor. Além disso, houve uma redução significativa nos níveis de oxigênio dissolvido na água, de 4,2 mg L-1 para 0,81 mg L-1 após 48 horas de ensaio, em todos os aquários, incluindo o controle (sem mortalidade ou sinais de estresse). Esse fenômeno não interferiu nos resultados do ensaio, uma vez que organismos desse tipo tendem a aumentar sua taxa de respiração quando expostos a baixos níveis de oxigênio, o que leva à diminuição do oxigênio disponível na água (Lukowiak, 1996). Em um estudo com o caramujo Chilina parchappi exposto ao piretroide cipermetrina, obteve-se uma CE;50 de 44,59 mg L-1, um resultado semelhante ao observado em P. canaliculata. Além disso, foram registrados efeitos neurotóxicos, como a perda da capacidade de aderir ao substrato (Fernández, et al., 2020). Já no caso do camarão-pitu-de-água-doce (M. acanthurus), observaram-se respostas mais sensíveis ao bifentrina. A CL50;48h obtida para esse organismo foi de 0,00027 mg L-1, classificando o inseticida bifentrina como extremamente tóxico para a espécie (EPA, 2022). Essa mesma classificação foi obtida em um estudo com o inseticida clorpirifós, onde a CL50;48h foi de 0,002 mg L-1, confirmando o M. acanthurus como um excelente bioindicador aquático para essas substâncias (Marques, et al., 2021). 0 0 33,33 100 y = 33,333x - 50 R² = 0,8333 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 3,7 12 39,24 126 Po rc en ta ge m (% ) Concentração (mg L-1) Letalidade Linear (Letalidade) 45 A concentração de 0,00032 mg L-1 resultou em uma taxa de mortalidade de 50% dos organismos em um período de 24 horas, enquanto todos os organismos expostos à concentração de 0,0011 mg L-1 de bifentrina apresentaram mortalidade até o final do ensaio, como ilustrado na Figura 10. Em estudos de monitoramento ambiental realizados em rios e riachos urbanos, foram encontradas concentrações de bifentrina com valores de 0,0000099 mg L-1 na água (Weston, Chen e Lydy, 2015) e 0,001211 mg g-1 nos sedimentos suspensos (Weston, Holmes e Lydy, 2008). Esses resultados destacam a necessidade de um controle ambiental rigoroso dessas substâncias, uma vez que esses organismos têm a tendência de habitar o fundo de corpos d'água líticos (Carvalho et al., 1979), o que aumenta o risco de exposição aos sedimentos contaminados (Weston, Holmes e Lydy, 2008). Além disso, a exposição subletal pode resultar em uma redução na capacidade de natação e na captura de presas, afetando o desenvolvimento e a sobrevivência da espécie, conforme descrito por Bechmann et al., em 2018. Figura 10 – Gráfico de letalidade de M. acanthurus. Fonte: Elaboração do próprio autor. No ensaio com os peixes X. maculatus e H. eques, foram obtidas as CL50;48h de 0,0065 e 0,031 mg/L, respectivamente. Resultados semelhantes foram observados no peixe O. niloticus exposto ao bifentrina, com uma CL50;96h de 0,00681 mg L-1. 0 0 83,33 66,67 100 y = 26,667x - 30,001 R² = 0,8 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0,000011 0,00011 0,00032 0,00054 0,0011 Po rc en ta ge m (% ) Concentração (mg L-1) Letalidade Linear (Letalidade) 46 Isso indica que este inseticida afeta peixes de forma semelhante, conforme relatado por Farag et al., em 2021. Os organismos expostos à concentração de 0,0011 mg L-1 não apresentaram letalidade ou sinais de intoxicação. No entanto, na concentração de 0,0054 mg L-1, foi observada uma taxa de letalidade de 46,67% em X. maculatus após 48 h de exposição ao bifentrina, como mostrado na Figura 11. Figura 11 – Gráfico de letalidade de X. maculatus / H. eques. Fonte: Elaboração do próprio autor. Os sinais de intoxicação, como permanência na superfície da coluna d'água e natação errática, ocorreram em 11,11% dos organismos de H. eques e 13,33% de X. maculatus na concentração de 0,01 mg L-1 após 48 horas de exposição. Esses sinais de intoxicação revelaram alto grau de desconforto e implicam na redução da taxa de sobrevivência e ganho de peso corporal dos indivíduos, conforme relatado por Farag et al., em 2021. Na concentração de 0,05 mg L-1, 11,11% dos exemplares de H. eques apresentaram incapacidade de arfagem e natação errática após 24 horas de ensaio, sendo constatada a morte dos mesmos após 48 horas de exposição. A resposta desses organismos após a exposição a contaminantes aquáticos pode ser usada para avaliar o impacto ambiental, destacando a importância desses estudos para informar estratégias de gestão e conservação desses ambientes, como mencionado por Mundy et al., em 2020. 0 0 47 67 100 100 100 0 0 0 16,67 40 100 100 y = 19,762x - 19,999 R² = 0,8951 y = 19,286x - 40,476 R² = 0,8354 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 0,0011 0,0054 0,011 0,054 0,11 0,32 Po rc en ta ge m (% ) Concentração (mg L-1) X. maculatus H. eques Linear (X. maculatus ) Linear (H. eques) 47 Vale ressaltar que as variáveis de qualidade da água permaneceram dentro das especificações da norma ABNT NBR 15088:2016 durante todos os experimentos. 6.2 ANÁLISE DE RISCO AMBIENTAL PARA ORGANISMOS AQUÁTICOS Os resultados obtidos nesta simulação demonstraram um baixo risco para macrófitas e caramujos em todas as concentrações. No entanto, foi observado um risco ambiental acima de 0,5 (classificado como alto risco) para o camarão M. acanthurus em todas as concentrações simuladas. As análises com os peixes (X. maculatus e H. eques) estão apresentadas nas Tabelas 5 e 6, simulando um reservatório com profundidades de 0,3 metros e 2 metros, respectivamente. Tabela 5 – Calculo de Risco ambiental considerando um reservatório de 0,3m de profundidade. Fonte: Elaboração do próprio autor. Os resultados da simulação em peixes mostram um maior risco ambiental para os alevinos de X. maculatus. O risco ambiental obtido para a concentração letal (CAE100%) foi 476% maior do que o valor observado para H. eques. Além disso, foi 13,2 vezes maior do que o limite considerado como de alto risco, de acordo com Goktepe, Portier e Ahmedna (2004). Diluições da CAE Espécies / CE, CI e CL50 A. caroliniana L. minor P. canaliculata M. acanthurus X. maculatus H. eques 679,84mg L-1 877,26 mg L-1 47,62 mg L-1 0,00027 mg L-1 0,0065 mg L-1 0,031 mg L-1 100% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Alto 0,179 0,000264 0,000204 0,00376 663,580 27,564 5,780 50% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Alto 0,090 0,000132 0,000102 0,00188 331,79 13,782 2,89 25% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Alto 0,0448 0,000066 0,000051 0,000094 165,895 26,891 1,445 12,5% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Alto 0,0224 0,000033 0,0000255 0,00047 82,948 3,446 0,723 6,25% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Médio 0,0112 0,000017 0,0000158 0,00024 41,474 1,723 0,361 3,12% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Médio 0,00560 0,00000825 0,00000638 0,000118 20,737 0,861 0,181 48 Tabela 6 – Calculo de Risco ambiental considerando um reservatório de 2m de profundidade. Fonte: Elaboração do próprio autor. Na simulação com os peixes X. maculatus e H. eques, considerando um reservatório de 2 metros de profundidade, observou-se um menor risco ambiental em comparação com o reservatório anterior. A maioria dos valores obtidos classifica-se como de médio e baixo risco ambiental. Resultados semelhantes foram observados por Marques et al. (2021) após simular a aplicação de clorpirifós em reservatórios com as mesmas medidas e comparar com os resultados ecotoxicológicos de X. maculatus e H. eques obtidos em seu ensaio. O camarão M. acanthurus é o bioindicador mais suscetível aos efeitos ambientais do inseticida bifentrina, seguido pelos peixes X. maculatus e H. eques. Esses organismos desempenham um papel crucial na ecotoxicologia e no monitoramento de inseticidas devido à sua alta sensibilidade (Marques et al., 2021). A presença dessas substâncias no ambiente é uma grande preocupação devido ao risco de poluição ambiental, especialmente em ecossistemas mais vulneráveis (Castillo et al., 1997). Além disso, alguns desses organismos têm importância econômica, e a contaminação pode resultar em prejuízos significativos na região. Além do risco ambiental, a contaminação por piretróides pode ser particularmente perigosa quando afeta a aquicultura, uma vez que essa atividade está diretamente relacionada ao consumo humano. Isso cria um risco para a saúde pública Diluições da CAE Espécies / CE, CI e CL50 A. caroliniana L. minor P. canaliculata M. acanthurus X. maculatus H. eques 679,84mg L-1 877,26 mg L-1 47,62 mg L-1 0,00027 mg L-1 0,0065 mg L-1 0,031 mg L-1 100% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Alto 0,0279 0,0000410 0,0000306 0,00586 103,33 4,292 0,9 50% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Médio 0,0134 0,0000205 0,0000153 0,00293 51,67 2,146 0,45 25% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Médio 0,00672 0,0000103 0,00000765 0,00146 25,83 1,073 0,225 12,5% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Alto Médio 0,00336 0,00000513 0,00000383 0,00073 12,917 0,537 0,113 6,25% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Médio Médio 0,00168 0,00000256 0,00000191 0,00037 6,458 0,268 0,056 3,12% CAE Baixo Baixo Baixo Alto Médio Baixo 0,000840 0,00000128 0,00000096 0,00018 3,229 0,134 0,028 49 (Wongmaneepratip; Leong; Yang, 2022). Em casos de contaminação humana, podem ocorrer sintomas agudos de envenenamento, como náuseas, vômitos, depressão respiratória, alterações mentais e lesões renais agudas (Deng et al., 2020). 6.3 ECOTOXICIDADE CRÔNICA DE H. eques sinais de intoxicação O ensaio de ecotoxicidade crônica permitiu observar vários sinais de intoxicação nos indivíduos, como dificuldade de movimentação, agitação e espasmos musculares em todas as concentrações testadas. Os organismos nos aquários controle não apresentaram sinais de intoxicação. Além disso, ao longo do experimento, ocorreu a morte de 3 indivíduos. Os resultados observados durante o ensaio estão apresentados no Quadro 3 e na Figura 12. As variáveis de qualidade da água não sofreram alterações durante o ensaio. Quadro 3 – Sinais de intoxicação de H. eques durante a exposição a bifentrina em concentrações subletais Dia de exposição Arfagem Natação errática Morte Outros efeitos 1° Sem efeito Sem efeito Sem efeito Sem efeito 3° 66,7% dos indivíduos expostos a concentração de 0,006 mg L-1. 66,7% dos indivíduos expostos a concentração de 0,006 mg L-1. 13,3% dos indivíduos expostos a concentração de 0,006 mg L-1 26,6% dos indivíduos expostos 0,006 mg L-1 apresentaram corrosão na nadadeira dorsal e hemorragia nos olhos. 5° 66,7% dos indivíduos expostos a concentração de 0,0056 mg L-1. 66,7% dos indivíduos expostos a concentração de 0,0056 mg L-1. Sem efeito 20% dos indivíduos expostos 0,006 mg L-1 apresentaram espasmos agitação. Perda de apetite e permanência no fundo do aquário (0,0003 a 0,006 mg L- 1). 7° Sem efeito Sem efeito 6,66% dos indivíduos expostos a concentração de 0,006 mg L-1 (apresentava sinais de hemorragia e inchaço nas brânquias) 33,3 % dos indivíduos da concentração 0,0006 mg L-1, apresentaram agitação. 33,3 % dos indivíduos da concentração 0,0003 e 0,006 mg L-1, apresentaram perda de apetite e permanência no fundo do aquário. 9° Sem efeito Sem efeito Sem efeito 33,3 % dos indivíduos da concentração 0,0003 mg L-1, 50 33,3 % em 0,0006 mg L-1 e 66,7 % em 0,006 mg L-1 apresentaram agitação 11° Sem efeito Sem efeito Sem efeito 13,3% dos indivíduos da concentração 0,0003 mg L-1 e 20% de 0,003 mg L-1, apresentaram espasmos e 26,7 % na concentração de 0,006 mg L-1 apresentaram agitação. 13° 6,66% dos indivíduos expostos a concentração de 0,0006 mg L-1, 6,66% em 0,003 mg L-1 e 13,3% em 0,006 mg L-1 Sem efeito Sem efeito 20% dos indivíduos expostos a concentração de 0,006 mg L-1, 60% em 0,0006 mg, apresentaram agitação. 20% em 0,0006 mg e 13,3% em 0,0028 mg apresentaram espasmos. 15° Em 60% dos indivíduos expostos na concentração de 0,0006 mg L-1, e todos 73,3% em 0,006 mg L-1 Sem efeito Sem efeito Todos os indivíduos na concentração de 0,0006 mg apresentaram agitação. 13,3% em 0,0003, 0,003, 0,006 mg L-1 apresentaram espasmos. Fonte: Elaboração do próprio autor. Figura 12 – Sinais de intoxicação observados em peixes da espécie H. eques após 15 dias de exposição ao inseticida. A Natação errática, sinais de hemorragia (S.E). B - Inchaço nas brânquias (I.B) Fonte: Elaborado pelo autor. O inseticida bifentrina atua como um desregulador endócrino com atividade antiestrogênica, levando a deficiências neurocomportamentais. Isso ocorre devido às alterações na regulação dos neurotransmissores, estresse oxidativo e inflamação A B 51 (Ullah et al., 2019; Farag et al., 2021). A exposição dos peixes a esse inseticida pode ocorrer por sorção branquial ou por meio da cadeia alimentar (Alonso et al., 2012), e a exposição a longo prazo pode causar efeitos tóxicos nos sistemas nervoso, imunológico, cardiovascular e genético (Ma, 2009). Além disso, podem ser observadas alterações histológicas nas brânquias, fígado e músculos dos peixes (Yang et al., 2020). 6.4 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA DE H. eques Após a exposição crônica ao inseticida bifentrina, alguns órgãos não estavam em condições de serem coletados e analisados para a confecção das lâminas. No entanto, entre as lâminas obtidas, foi possível observar e analisar os sinais de intoxicação resultantes da exposição. 6.4.1 Ensaio agudo de brânquias de H. eques A estrutura branquial de H. eques é composta por tecido cartilaginoso, vasos sanguíneos e revestida por células mucosas, células de sustentação, células de cloreto e células caliciformes. Ao longo das lamelas primárias, as lamelas secundárias são emitidas em intervalos regulares. As lamelas secundárias têm uma composição celular semelhante à das primárias. No grupo controle, a estrutura lamelar apresenta positividade para o PAS (Periodic Acid-Schiff), indicando a presença de secreção de muco com substâncias neutras produzidas pelas células caliciformes Após a exposição ao inseticida bifentrina por 48 horas, as brânquias de H. eques foram coradas com Hematoxilina-Eosina e PAS (ácido periódico de Schiff). Nas concentrações de 0,0011 e 0,0054 mg L-1, não foram observadas alterações significativas nos resultados histopatológicos. No entanto, nas concentrações de 0,011 e 0,054 mg L-1, foram identificados sinais de intoxicação. Para obter mais detalhes, os resultados estão apresentados na tabela 7 e na figura 13. 52 Tabela 7 – Sinais de intoxicação histopatológicos de brânquias de H. eques, após exposição aguda. Alterações Concentração (mg L-1) Controle 0,0011 0,0054 0,011 0,054 Congestão sanguínea - - - - X Aumento de secreção celular caliciforme - - - - X Desarranjo da estrutura lamelar - - - X X Fusão das lamelas secundárias - - - X X Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: (Controle) Peixes não expostos ao inseticida. (X) Presença da alteração. (-) Ausência de alteração. 53 Figura 13: Fotomicrografias de brânquias de H. eques após exposição aguda. Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: A Controle, com coloração PAS, sem sinais de intoxicação (25 µm = 200x), (LS) lamelas secundárias, (LP) Lamelas primarias. B Concentração de 0,0054 mg L-1, com coloração PAS, sem sinais de intoxicação (25 µm = 200x). C Concentração de 0,011 mg L-1, com coloração HE (50 µm = 100x) D Concentração de 0,054 mg L-1, com coloração HE (50 µm = 100x), apresentam (FLS) Fusão das lamelas secundárias. (-) Aumento de secreção celular caliciforme, (x) Desarranjo da estrutura laminar, (CS) Congestão sanguínea. Quanto ao ensaio de ecotoxicidade crônica, foram observados sinais de intoxicação em todas as concentrações, conforme apresentado na tabela 8 e na figura 14. LS LP 54 6.4.2 Ensaio crônico de brânquias de H. eques Tabela 8: Sinais de intoxicação histopatológicos de brânquias de H. eques, após 15 dias de exposição à bifentrina. Alterações Concentração (mg L-1) Controle 0,0003 0,0006 0,003 0,006 Congestão sanguínea - X X X - Desarranjo da estrutura lamelar - - X - - Fusão das lamelas secundárias - - - - - Aumento das células laminares - - - X - Hemorragia - - - - X Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: (Controle) Peixes não expostos ao inseticida. (X) Presença da alteração. (-) Ausência de alteração. 55 Figura 14: Fotomicrografias de brânquias de H. eques após exposição crônica. Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: A Controle, com coloração PAS, sem sinais de intoxicação, (LS) lamelas secundárias, (LP) Lamelas primarias (25 µm = 200x). B Concentração de 0,0003 mg L-1, com coloração PAS, apresenta (DL) Desarranjo da estrutura laminar (25 µm = 200x). C Concentração de 0,0006 mg L-1, com coloração HE, apresenta (CS) Congestão sanguínea (50 µm = 100x) e (x) Aumento das células laminares. D Concentração de 0,003 mg L-1, com coloração HE, apresenta (-) Hemorragia (25 µm = 200x). Como evidenciado, no ensaio agudo de 48h de exposição ao bifentrina, os organismos expostos apresentaram alterações na estrutura lamelar, incluindo congestão sanguínea, aumento na secreção de células caliciformes, desarranjo da estrutura lamelar e fusão das lamelas secundárias, nas concentrações mais elevadas deste ensaio (0,011 e 0,052 mg L-1). No entanto, no ensaio crônico de 15 dias, observaram-se modificações que incluíram congestão sanguínea, desarranjo da estrutura lamelar, fusão das lamelas secundárias, aumento das células lamelares e hemorragia, em todas as concentrações testadas. LS LP 56 No estudo realizado por Cengiz (2006) com carpa comum, (Cyprinus carpio) exposta ao piretóide deltametrina (50% da CL50;96h), observou alterações como edema, hiperplasia epitelial e fusão de lamelas secundárias em todas as concentrações do ensaio. Em outro estudo, as brânquias de H. eques revelaram alterações consideráveis no tecido branquial após exposição ao bifentrina, como necrose, fusão de lamelas secundárias e hiperplasia. Esses efeitos sugerem que a bifentrina afeta a estrutura e funcionamento das brânquias em H. eques (Gonçalves, Rojas e Gonçalves-de-Freitas (2017). As mudanças observadas, como fusão lamelar, elevação do epitélio, hiperplasia e necrose em H. eques, indicam danos significativos no tecido branquial (Ferreira, Segatto e Silva De Assis 2018). Além disso, a atividade enzimática alterada e o estresse oxidativo sugerem um comprometimento da função respiratória e um desequilíbrio nas defesas antioxidantes desses peixes devido à exposição à bifentrina (Souza, Martins e Fernandes 2020). Esses resultados ressaltam a importância de considerar os efeitos adversos da bifentrina nas brânquias de H. eques e sua possível influência na saúde e no bem-estar desses organismos aquáticos (Araújo, Fernandes 2022). Esses resultados enfatizam a importância da proteção das brânquias contra a exposição à bifentrina e a necessidade de medidas adequadas de controle e regulamentação do uso desse pesticida, a fim de evitar efeitos adversos na saúde dos peixes e na função respiratória em ambientes aquáticos. Além disso, destaca-se a necessidade de realizar estudos adicionais sobre os efeitos da bifentrina em outras espécies de peixes e em diferentes contextos ambientais, a fim de aprimorar a compreensão dos efeitos e desenvolver técnicas de manejo mais eficazes (Silva, Oliveira e Martinez 2021). 6.4.2 Ensaio agudo e crônico do fígado de H. eques. O fígado de H. eques apresenta estrutura de organização cordonal, com os hepatócitos arranjados em cordão a partir das vias centrais que podem ou não conter áreas exócrinas ao seu redor. Os hepatócitos são organizados à margem dos capilares sinusóides, possuem núcleos centrais levemente destacados para a periferia celular e citoplasma altamente basófilo. 57 Na reação de PAS, foi detectado alta intensidade de reação de grânulos de constituição neutra no interior dos linfócitos. Durante o ensaio os organismos-controle mantiveram-se saudáveis, com citoplasma claro, núcleo e nucléolo evidente, grânulos de glicogênio no citoplasma dos hepatócitos. Presença de arranjo cordonal dos capilares organizados, com formato levemente arredondado. Porém os resultados histológicos de fígado de H. eques, observados nas demais concentrações apresentaram sinais de intoxicação (Tabela 9) e na figura 17. Tabela 9 – Resultados histopatológicos de fígado em H. eques, após 48h de exposição à bifentrina. Alterações Concentração (mg L-1) Controle 0,0011 0,0054 0,011 0,054 Congestão sanguínea - - - - X Aumento dos capilares sinusóides - X X X X Desarranjo cordonal dos capilares sinusóides - - X X X Hipertrofia - - X - - Picnose no núcleo - - X X - Aumento do citoplasma - - - X - Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: (Controle) Peixes não expostos ao inseticida. (X) Presença da alteração. (-) Ausência de alteração. 58 Figura 15 – Fotomicrografias de fígado de H. eques após exposição aguda. Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: A Controle, com coloração HE, sem sinais de intoxicação, (CS) Capilares sinusóides (25 µm = 200x). B Concentração de 0,0011 mg L-1, com coloração HE, apresenta (*) Aumento dos capilares sinusoidal (25 µm = 200x). C Concentração de 0,0054 mg L-1, com coloração HE, apresentam (PN) Picnose no núcleo, (+) Hipertrofia, (-) Desarranjo cordonal dos capilares sinusoidais (25 µm = 200x). D Concentração de 0,054 mg L-1, com coloração PAS, apresentam (CS) Congestão sanguínea (25 µm = 200x). Além disso, nos organismos expostos a concentração de 0,005 mg L-1, foi observado hipertrofia nas células distantes das veias, enquanto as células próximas às veias mantiveram-se saudáveis. CS 59 Tabela 10 – Resultados histopatológicos de fígado de H. eques, após 15 dias de exposição à bifentrina. Alterações Concentração (mg L-1) Controle 0,0003 0,0006 0,003 0,006 Congestão sanguínea - - - - X Aumento dos capilares sinusóides - X X - X Desarranjo cordonal dos capilares sinusóides - - - X X Arranjo cordonal desorganizado com atrofia - - - - X Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: (Controle) Peixes não expostos ao inseticida. (X) Presença da alteração. (-) Ausência de alteração. 60 Figura 16 – Fotomicrografias de fígado de H. eques após exposição crônica. Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: A Controle, com coloração HE, sem sinais de intoxicação (CS) Capilares sinusóides, (25 µm = 200x). B Concentração de 0,0003 mg L-1, com coloração HE, apresenta (+) Aumento dos capilares sinusóides (25 µm = 200x). C Concentração de 0,003 mg L-1, com coloração HE, apresentam (CS) Congestão sanguínea, (50 µm = 100x), (X) Arranjo cordonal desorganizado com atrofia (25 µm = 200x). D Concentração de 0,006 mg L-1, com coloração HE, apresentam (*) Desarranjo cordonal dos capilares sinusóides (25 µm = 200x) Os resultados histopatológicos obtidos no ensaio agudo 48h e crônico 15d, mostraram alterações em todas as concentrações de ambos os ensaios. As alterações hepáticas são após a exposição ao bifentrina, são mais evidentes em H. eques, com relação aos outros órgãos avaliados neste estudo. O fígado é o principal órgão responsável pela desintoxicação do organismo, portanto é notável as alterações morfológicas após exposições a inseticidas (Dutta et al. 1993). Essas perturbações evidenciam que o fígado tenta realizar a desintoxicação da cipermetrina, resultando em danos celulares. No entanto, esses danos podem ser recuperados se a exposição à cipermetrina foi de baixa magnitude e por um curto período (Majumder e Kaviraj, 2022). CS 61 Em estudo realizado com inseticida piretróide deltametrina, com o peixe tambaqui (Colossoma macropomum), foi observado efeitos histopatológicos após 6h de exposição em concentração de 0,193 mg L-1, além disso, em maior período de exposição (96h) geraram danos irreversíveis aos órgãos, como necrose (Cunha et al. 2018). Em estudo realizado por Araújo, Pinto e Fernandes (2018) e Ferreira, Segatto e Silva de Assis (2019) com H. eques, constataram alterações como vacuolação de hepatócitos, degeneração citoplasmática, congestão sinusoidal e infiltração de células inflamatórias, evidenciando lesões hepáticas causadas pela bifentrina. Além disso, o estudo de Gonçalves, Rojas e Gonçalves-de-Freitas (2019) observou congestão sinusoidal, infiltração de células inflamatórias e necrose de hepatócitos no fígado dos peixes expostos. 6.4.3 Ensaio agudo e crônico do rim de H. eques. O tecido renal de H. eques é formado por túbulos contorcidos (distais e proximais) e por glomérulos filtrantes, localizados na cápsula glomerular. O interstício renal é composto por tecido conjuntivo e em algumas regiões ocorre a presença de tecido hematopoiético. A luz dos túbulos proximais e distais são PAS positivo. As estruturas renais dos organismos-controle mantiveram-se saudáveis durante todo o ensaio. Não houve sinais de intoxicação na concentração de 0,0011 mg L-1. Nas demais concentrações foram observados desprendimento da cápsula, aumento dos glomérulos filtrantes e aumento da hipertrofia (Tabela 11) e figura 22. Além disso, na concentração de 0,011 mg L-1 foi observado a presença da porção espessa da alça de Henle e capilares renais com hemácias dentro. 62 Tabela 11 – Resultados histopatológicos de rim de H. eques, após 48h de exposição à bifentrina. Alterações Concentração (mg L-1) Controle 0,0011 0,0054 0,011 0,054 Aumento dos glomérulos filtrantes - - X - - Desprendimento da cápsula - - - X X Hipertrofia - - - X X Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: (Controle) Peixes não expostos ao inseticida. (X) Presença da alteração. (-) Ausência de alteração. 63 Figura 17 – Fotomicrografias de rim de H. eques após exposição aguda. Fonte: Elaboração do próprio autor. Legenda: A Controle, com coloração PAS, sem sinais de intoxicação, (GF) Glomérulos filtrantes (25 µm = 200x). B Concentração de 0,0011 mg L-1, com coloração HE, sem sinais de intoxicação (12,5 µm = 400x). C Concentração de 0,011 mg L-1, com coloração HE, apresentam (DC) Desprendimento da cápsula. (+) Hipertrofia. D Concentração de 0,054 mg L-1