Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) Dagoberto Buim Arena 1 Adriana Pastorello Buim Arena 2 RESUMO: O artigo analisa três provas escolares do ensino primário, duas de uma mãe e uma de seu filho, guardadas e fornecidas ao pesquisador pela mãe. As duas primeiras são de 30 de março e de 13 de novembro de 1935, do 3º. ano do Grupo Escolar Fernando Lobo, em Juiz de Fora, MG. A terceira foi produzida no Grupo Escolar Coronel Amâncio Bueno, em Jaguariúna, SP, em 28 de maio de 1963, em classe de 4º. ano. O conjunto dos dados analisados destaca produtos escolares resultantes das relações entre professor, aluno e cultura escolar. As provas são documentos tão importantes quanto os cadernos para compreender os produtos da cultura escolar e, como este artigo quer indicar, são meios para a inserção no mundo da cultura escrita. A metodologia de microanálise dos documentos revela registros sobre a estrutura das provas e o currículo da escola brasileira no ensino do português como língua materna em 1935 e 1963. PALAVRAS-CHAVE: Provas escolares; Cultura escolar; Conteúdos escolares; Produtos escolares. EVALUACIÓN DE LA LENGUA PORTUGUESA EN PRUEBAS ESCOLARES DEL SIGLO XX (1935 e 1963) RESUMEN: Para realizar este trabajo se examinaron tres pruebas escolares de enseñanza primaria, dos de una madre y una de su hijo, proporcionadas al investigador por la primera. Las dos pruebas pertenecientes a la madre son del 30 de marzo y del 13 de noviembre de 1935, correspondientes al 3° año de la Escuela Fernando Lobo, en Juiz de Fora, MG. La tercera, fue realizada por su hijo en la Escuela Coronel Amancio Bueno en Jaguariúna, SP, el 28 de mayo de 1963, en una clase de 4° año. Del análisis de estos antecedentes escolares, surgen datos acerca de las relaciones entre el maestro, el estudiante y la cultura escolar. Las pruebas, como así también los cuadernos, permiten entender la cultura y los frutos de la escuela. Este trabajo pretende resaltar la importancia de la misma en la inserción en el mundo de la cultura escrita. La metodología para el microanálisis de los documentos revela los registros de la estructura de las pruebas y el currículo escolar en la enseñanza del portugués brasileño como lengua materna en 1935 y 1963. Palabras clave: Las pruebas escolares, la cultura escolar Contenidos de la escuela; resultados escolares. 1 Professor do Departamento de Didática e do Programa de Pós-graduação em Educação da UNESP – Câmpus de Marília. Doutor pela Universidade Estadual Paulista/Marília-SP. Estágio pós-doutoral pela Universidade de Évora – Portugal e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Pedagógicas de Lyon – França. Contato: dagobertobuim@hotmail.com. 2 Professora da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP – Câmpus de Marília. Contato: dricapastorello@gmail.com mailto:dagobertobuim@hotmail.com mailto:dricapastorello@gmail.com 136 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 EVALUATION OF THE PORTUGUESE LANGUAGE IN SCHOLARS EXAMS IN THE TWENTIETH CENTURY (1935 AND 1963) ABSTRACT: The article analyses three school exams of Elementary School, two belonging to a mother and one of her son, which were kept and provided to the researcher by the mother. The first two exams were dated March 30 and November 13, 1935 of the 3rd grade of Grupo Escolar Fernando Lobo in Juiz de Fora, Minas Gerais. The third one was produced at Grupo Escolar Coronel Amâncio Bueno in Jaguariúna, São Paulo in March 28, 1963 in a 4th grade class. The analysed data all together point out school products which are the result of the relationship between teacher, student and school culture. School exams are as important documents as the notebooks in order to understand the school culture, and as this paper tries to indicate, they are the means for the insertion into the world of written culture. The methodology based on the microanalysis of these documents reveals records about the structure of the exams and the Brazilian school curriculum in the teaching of Portuguese as a mother tongue in 1935 e 1963. KEYWORDS: school exams, school culture, school curriculum, school products. AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 137 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 Introdução Na área dos estudos sobre apropriação da linguagem escrita por crianças, dois conceitos ora se entrelaçam, ora se distanciam, ao serem considerados como suportes para pesquisadores interessados em compreender a apropriação escrita ou a inserção da criança no mundo letrado: o de cultura escrita e o de letramento. Os usos dos dois conceitos ampliam o leque de discussões sobre escola e cultura escrita, de um lado, e de escola e letramento de outro. Os estudos históricos têm legado, aos novos pesquisadores, a contribuição do conceito de cultura escrita, em perspectiva mais ampla que o de letramento, para explicar os modos de ler, de escrever e de usar a escrita em um universo cultural construído histórica e socialmente pela própria escrita. Esse mundo da cultura escrita, pelo qual os pequenos iniciam seu percurso em direção ao homem gráfico (FOUCAMBERT, 1996), se posiciona como o grande acervo, em transformação constante, com a função de ser a referência para o homem histórico e, ao mesmo tempo, constituí-lo como sujeito em uma sociedade intensamente gráfica. A criança, ao assumir o estatuto de aluno em uma escola, assume também o estatuto de um ser humano em busca de sua formação por meio da escrita e de suas múltiplas funções sociais. Essa criança-aluno, mais do que se letrar, é inserida no mundo dos homens que pensam com o escrito, que utilizam palavras em enunciados discursivos necessários para a formação de um pensamento verbalizado mais refinado e mais teórico. A mediação para a inserção da criança, com o estatuto de aluno, é feita pela cultura escolar inserida na, mas ao mesmo tempo constituinte da cultura escrita. O olhar sobre a cultura escolar guiado pelas políticas públicas, ou pelos fundamentos filosóficos, psicológicos ou pedagógicos começa a ser também orientado para a observação dos detalhes, das minúcias, dos registros antes desprezados, isto é, dos materiais produzidos no cotidiano da vida escolar pelos próprios alunos, orientados ou controlados pelos adultos: são eleitos como fontes de pesquisa os cadernos, os exames e as anotações de toda ordem. Essa cultura escolar construída pelas relações no interior das escolas, em momentos históricos diversos, pode, de acordo com o olhar, mostrar vestígios indicadores de organizações curriculares, de valoração de performances, de procedimentos didáticos, e, sobretudo, dos modos de inserção do aluno no mundo da escrita. Os tópicos a seguir anunciam os objetos analisados neste trabalho, como chegaram às mãos do pesquisador, e qual seria importância de seu estudo para o acervo da cultura escolar e 138 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 também para a construção da cultura escrita. A metodologia e as categorias de análise também serão anunciadas com o intuito de oferecer ao leitor a perspectiva global do artigo. 1. Os documentos Perto dos 83 anos, em 2009, uma aluna de terceiro ano em 1935, ao saber da importância que estes pesquisadores atribuem a documentos históricos, especialmente os de educação, gentilmente buscou em seus guardados os três documentos que aqui são apresentados e os ofereceu como material de pesquisa. Mineira de Juiz de Fora, radicada há anos em Marília, interior de S. Paulo, Mariana (nome fictício), guardou durante 74 anos duas provas por ela produzidas no Grupo Escolar Fernando Lobo, da cidade mineira, uma no mês de março e outra no mês de novembro de 1935. Junto com elas, guardou a de seu filho Roberto (nome fictício), então no quarto ano em 1963, no Grupo Escolar de Jaguariúna, na região de Campinas-SP. Vinte e oito anos separam os dois documentos produzidos em diferentes momentos históricos, tanto políticos, quanto educacionais. Antes de anunciar a metodologia de sua análise, será necessário entender a importância desses documentos entre as tendências das pesquisas na área, no universo da cultura escrita e da escolar, no universo dos materiais recuperados como indicadores do cotidiano pedagógico e dos reflexos de ideários educacionais e políticos do momento em que foram produzidos. 2. Os cadernos escolares como documentos históricos Ao defender a importância da análise dos cadernos escolares em educação, Viñao (2008) entende que se tornaram suportes específicos, com características próprias, produtos da cultura escolar, produzidos pela relação entre professor e alunos. Por essa razão, argumenta que os cadernos escolares como fonte histórico-educativa é algo relativamente simples: trata-se de uma fonte, não menos complexa que outras, que durante as duas últimas décadas vem figurando no cruzamento de três campos historiográficos relacionados, inclusive complementares: a história da infância, a da cultura escrita e a da educação. (VIÑAO, 2008, p. 15). Se, de seu lado, os cadernos escolares são destacados como objetos importantes para esse tipo de pesquisa, por outro, esses documentos não comparecem isoladamente aos acervos AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 139 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 das escolas ou das próprias pessoas que os guardam. Com eles, aparecem folhas soltas, exercícios, anotações e também as provas ou exames, guardados, ora como lembranças de uma boa nota, ora como registro de uma anotação qualquer de uma professora, cuja atuação tenha deixado sinais afetivos muito estreitos. Esses objetos, de produção cotidiana, por sinalizarem a inserção da criança-aluno no mundo da cultura escrita com a mediação da cultura escolar, tornam-se tão importantes quanto os cadernos, porque se, por um lado, ―os cadernos são um objeto de uso ‗cotidiano‘, por outro, durante um bom tempo foram, e em parte continuam sendo, o instrumento ou objeto escolar, junto com os exames, apontamentos ou notas de aula e exercícios escritos‖. (VIÑAO, 2008, p. 16). As provas anunciadas neste trabalho figuram deste modo, como documentos tão importantes quanto os cadernos para compreender os produtos da cultura escolar e, como este artigo quer indicar, como mediação para a inserção no mundo mais amplo da cultura escrita. Há, de certo modo, tanto nos cadernos quanto nas provas, a possibilidade de o pesquisador encontrar pistas que indiquem as ideologias, os valores do meio escolar, as políticas públicas, os conteúdos, a disposição gráfica, os costumes e o uso de tecnologias, sobretudo ―no tocante às produções manuscritas dos alunos, nas quais, como ocorre com os cadernos escolares, existe uma ampla diversidade de formas e modos de produção e uso.‖ (VIÑAO, 2008, p. 17). Dos comentários de Viñao (2008) sobre os cadernos escolares, é possível realizar aproximações com as provas que aqui serão analisadas. Neste momento, contudo, seria interessante, senão curioso, apontar a existência de tantos sinais além dos acima citados, que, além dos chamados ―códigos de apresentação (cabeçalho da tarefa diária, epígrafe ou título de cada atividade, margens, adornos e ornamentações, etc.)‖ (VIÑAO, 2008, p. 23), é também dado destaque à ―limpeza‖ e à ausência de ―manchas‖, folhas arrancadas ou anotações e desenhos intempestivos ou selvagens, não controlados. A razão é óbvia: o ―efeito estético‖ tem também um sentido ético, regularizador e disciplinar, e a ―limpeza absoluta‖ supõe a ―criação de hábitos‖, ou seja, a sujeição a uma ordem de não-transgressão com referências moralizadoras. (VIÑAO, 2008, p. 23). Pesquisas citadas por Gvirtz e Larrondo (2008) redimensionam a importância dos cadernos — e de outros materiais produzidos na relação entre professores e alunos — como fonte primária para a compreensão de fenômenos escolares como, por exemplo, da história do currículo, na Espanha, dos valores ideológicos, na Itália, ou das relações entre ensino e aprendizagem no Brasil. Entretanto, como bem destacam as autoras, ―levar em conta a especificidade do campo educativo, sustentamos, é fundamental na hora de produzir 140 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 conhecimentos históricos, porque a instituição escolar e seus dispositivos pedagógicos em si mesmos são produtores de efeitos.‖ (GVIRTZ E LARRONDO, 2008, p. 39). Deste modo, as provas escolares, tais como os cadernos, inserem-se como produtos específicos da cultura escolar que trazem incorporadas as referências de uma época, de ideologias e os sinais da cultura escolar. Essa articulação intencional promovida neste artigo, entre provas escolares e cadernos escolares tem o intuito de estabelecer correlações próximas entre essas produções, apesar de serem materialmente diferenciadas e funcionalmente também diversas. Essas correlações se aproximam, quando são tomadas como referência as categorizações entre práticas discursivas escolares e práticas discursivas pedagógicas (GIVRTZ e LARRONDO, 2008). Enquanto as primeiras são produzidas pelas relações dos homens no interior da escola, as pedagógicas caracterizam-se como metadiscursos, ―já que seriam práticas discursivas que se referem a outras práticas discursivas‖ (GIVRTZ e LARRONDO, 2008, p. 40). Deste modo, como os cadernos, as provas escolares seriam práticas escolares que, sob o olhar investigativo, poderiam fornecer respostas, por meio de detalhes, sobre múltiplos aspectos constitutivos de uma cultura escolar, cujas marcas podem ser encontradas na organização de um conjunto de características discursivas. Se os cadernos estão aos poucos saindo dos baús para ganhar destaque nas pesquisas de natureza histórica, as raríssimas provas, ainda na posse de seus produtores ou familiares, podem ser redescobertas, uma vez que ―a qualidade das descobertas das pesquisas que utilizam cadernos como fonte de pesquisa dependerá em grande medida desta consideração: a de suas especificidades.‖ (GVIRTZ e LARRONDO, 2008, p. 45). Os cadernos escolares reafirmaram o estatuto de grande fonte primária com os apontamentos de Manguel (1997), ao servirem como objeto de seus estudos para a verificação de pistas sobre as concepções do ensino de leitura e suas práticas na escola da cidade francesa de Seléstat, no século XV. Pelos cadernos de Gisenheim, um dos produtores dos dois cadernos preservados, Manguel (1997, p. 100) comenta que olhando as notas de Gisenheim acrescentadas ao texto em latim e alemão, podemos seguir a leitura analítica que acontecia nas aulas de Hofman. Muitas das palavras que Gisenheim escreveu nas margens de sua cópia em latim são sinônimas ou traduções: às vezes, a nota é uma explicação específica. [...] Outras notas oferecem a etimologia de uma palavra e suas relações com a equivalente alemã. [...] Parece que Hofman tinha uma preocupação especial em instruir os alunos a usar corretamente as palavras, respeitando seu significado e suas conotações, de tal forma que pudessem interpretar e traduzir com autoridade. AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 141 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 Nas observações de Manguel, além da importância dos cadernos, importa destacar a observação das minúcias, dos detalhes, das pistas, enfatizados pelo paradigma indiciário (GINSBURG, 1989), utilizado também como referência para a compreensão de situações especificas da cultura escolar e, neste caso, dos modos de ensinar e dos modos de estudar dos alunos de Seléstat, no final do século XV. Semelhantes observações podem ser feitas com base nas provas escolares de Mariana, de 1935, em Minas Gerais e do filho em 1963, em São Paulo. As provas poderão apresentar, como os cadernos, detalhes, minúcias, todos indicadores de um tempo, de um ideário, de uma cultura escolar. A metodologia de microanálise e os recortes dos documentos poderão desvelar esses registros aparentemente obscuros ou pouco importantes. 3. Os documentos de 1935 Concluídos os argumentos em defesa das provas escolares como documentos e como fontes primárias para compreender aspectos da cultura escolar, por meio de pistas, sinais e indícios, resta a apresentação desses documentos e a sua análise. Apesar de sua configuração gráfica ser, também, fonte de dados, a opção será a de descrever o contexto de sua produção, no limite dos dados que o próprio objeto pode fornecer e transcrever trechos de sua composição com o objetivo de consolidar comentários, ou apontamentos investigativos que serão orientados para as indicações sobre a língua portuguesa e o destaque dado a aspectos do conhecimento da área; os modos de formulação do discurso docente e discente; as pistas materiais que compõem o aspecto gráfico; os valores sociais e morais impregnados nos exercícios de avaliação e o controle, manifesto ou não, indicado por marcas ou pela ausência delas nos documentos. A primeira prova, produzida por Mariana em Juiz de Fora, quando cursava o terceiro ano do Grupo Escolar Fernando Lobo, em março de 1935, início no Brasil do movimento escolanovista, apresenta no alto um grande numero 9, em traço grosso, como os feitos com lápis vermelho do tipo utilizado por carpinteiros. Na margem esquerda, no alto, a professora colocou a data da correção: Juiz de Fora, 30-3-1935 e a sua assinatura: Amayr Baratta. No final da prova feita em uma folha dupla de papel almaço pautado, a aluna repetia o lugar e a data (29 de março de 1934), acompanhados de seu nome completo. As datas não são as mesmas: a da professora indica a da correção, um dia após a sua realização. A divergência às 142 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 datas (1934 e 1935) pode ser atribuída a um engano da aluna ainda presa aos tantos cabeçalhos escritos no ano que findara três meses antes. Escrita com pena de metal em caligrafia bem cuidada, a Prova Menzal, Terceiro Anno, Mez de Maço, conforme os registros feitos pela aluna, avaliava duas áreas apenas: a de língua materna e a de aritmética. Quatro situações de avaliação incidem sobre a aprendizagem da língua: cópia, ditado, formar sentenças com substantivos personativos e formar sentenças com substantivo comum. Tanto na cópia quanto no ditado as palavras apresentam o mesmo traçado gracioso. O primeiro, com o título Uma cidade, ensaiava ser uma carta, com descrição de cenário de uma cidade. O objetivo, obviamente, era verificar se os alunos conseguiriam transcrever da lousa para o papel todas as palavras com sua correta ortografia. Sem a data e sem autor, a carta inicia-se com o título Uma cidade, e o vocativo, Querida Elza. A primeira frase é exclamativa, característica presente nos modelos de textos oferecidos aos alunos nessa época, plena de adjetivos e descrições ideais: Quanto é graciosa e linda é a terra de Papae! Está situada numa eminência de sol, coberta de arvoredos, o que lhe dá aparência de grande e florido jardim donde surgem habitações. Três outros períodos concluem o texto, agora sem as marcas de uma carta: Saí hoje em companhia do primo Antonio e do capitão Nico um amigo dele. Já conheço muita gente e devo algumas visitas. Além do capitão Nico, citarei o padre Anselmo que vem sempre cá em casa e parece muito boa pessoa. Neste final, é possível notar ainda o uso das patentes, nem sempre atribuídas a militares, a relação estreita de parentesco quando em viagens para outra cidade e a presença do padre como uma visita constante nas casas dos fiéis. Se o texto para a cópia abordava alguns costumes da época e um gênero do discurso muito utilizado — a carta — o ditado privilegiava a fábula, o gênero específico destinado à difusão de valores morais. Na fábula O galo e a pérola, a moral da história não se situa no final, mas no primeiro parágrafo: A riqueza disse-nos a professora só tem valor para quem a sabe e pode apreciar e aproveitar devidamente. Prova é a seguinte fábula que lhes vou contar. A respeito dos valores morais impregnados nos textos, Andrés e Zamora, ao estudarem cadernos produzidos na Espanha entre 1922 e 1942 (no mesmo período em que as provas de Mariana foram produzidas), afirmam que ―podem, assim, ser objeto de ampla análise: por uma parte, os valores transmitidos pelos docentes através das cópias e dos ditados; e, por outra, a interiorização e expressão que os discentes faziam desses valores em suas relações e composições livres‖. (ANDRÉS e ZAMORA, 2008, p. 162). AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 143 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 Nessas duas situações de avaliação a aluna escreveu textos, sem que fossem de sua própria lavra. De qualquer modo, as avaliações indicam os procedimentos utilizados em sala de aula para ensinar a escrever: a cópia e o ditado, parceiros inseparáveis durante praticamente todas as décadas do século XX. A concepção de ensino da língua materna que poderia dar apoio a essas práticas era a de que aprender a escrever corresponderia ao ato de fazer movimentos graciosos com as mãos, pela cópia, e a registrar, por letras, os fonemas claramente distintos, pelo ditado. Convém, nesta altura desta exposição, agregar alguns dados a respeito do valor da boa caligrafia e sua importância para a educação até meados do século XX, com o aparecimento da caneta esferográfica e as mudanças de concepção sobre a essência do domínio da escrita como uma tecnologia cultural. Saber colocar palavras com a ortografia correta sobre o papel era a distinção claramente estabelecida entre alfabetizados e não alfabetizados, mas entre os escreventes era preciso fixar outros critérios para distinguir classes sociais, comportamentos e etiquetas. Fernandes (2008, p. 55) comenta um anúncio no século XIX em Portugal que ―propagandeava a chamada ‗letra da moda‘ ou da ‗elite‘, isto é, ‗a letra usada pela aristocracia inglesa e que distingue as senhoras da sociedade elegante‘ [...] uma caligrafia perfeita era um sinal de distinção.‖ A pena metálica usada por Mariana seria uma das cem variedades disponíveis na década de 30 do século XX (MIGNOT, 2008). Inventada na Inglaterra em 1803, permitia que o ensino da escrita tivesse ―um duplo fim: habituar os alunos a uma letra clara e legível e traçada com a necessária rapidez.‖ (BITTENCOURT, apud RAZZINI, 2008, p. 102). Na terceira situação de avaliação — Formar sentenças com substantivos personativos — Mariana elaborou dez frases padronizadas, com a utilização de nomes da época — Geny, Elvira, Dely, Mario, Marlene, Rosilda, Irene, Ilca e D. Amayr — acompanhados dos adjetivos doente, boa, bonita, trabalhadeira, melindrosa e pequena. Mário fora o único nome masculino, na única frase em que havia a indicação de uma profissão: Mário vai formar para professor. Às mulheres foram destinados apenas os adjetivos bonita, melindrosa, ou ainda, doente e trabalhadeira. Curiosamente, Mariana, a autora da prova, tornar-se-ia professora. Na quarta situação — Formar sentenças com substantivos comuns —, a padronização composta de sujeito, verbo de ligação e predicativo, cede lugar a outras formas, principalmente com o verbo ter: O meu rosto tem pele fina. Eu bebo água filtrada. Eu tenho uma mala azul. Eu tenho um livro de histórias do arco da velha. Boneca de louça custa caro. Duas frases fazem referência ao corpo, talvez influenciada pela ênfase dada à higiene escolar, tema recorrente desde o final do século XIX. As outras indicam, para Mariana, a posse de 144 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 objetos vinculados a ações de lazer — a mala para viajar, o livro para ler e a boneca para brincar. As frases criadas sobre saúde espelhavam as preocupações sanitárias desde o final do século XIX. Em livro publicado em Lisboa, em 1910, o estudioso alemão Burgerstein, na introdução de sua obra, afirmava a respeito da higiene escolar que este ramo de ciência não se tem desenvolvido senão desde uns cinquenta anos, visto que os médicos observando, no interesse científico, um grande número de crianças que freqüentam as escolas e constatando doenças e prejuízos de saúde, cujos motivos devem ser procurados no modo de ensinar ou na organização das escolas, observações que acompanhadas de experiências e investigações, originaram regras para o melhoramento da escola e sua organização material (BURGERNSTEIN, 1910, p. 2). Essa preocupação com a higiene incluía cuidados médicos de toda ordem, até mesmo a postura física, o modo de prender o suporte da pena entre os dedos e o modo de sentar-se para evitar problemas da coluna, especialmente entre as meninas, como aponta Burgerstein: Há diferentes espécies de desvios da espinha dorsal [...] O número proporcional de crianças com algumas destas deformidades é logo no primeiro ano escolar grande e cresce bastante nos anos seguintes. [...] Especialmente as meninas pela sua menor capacidade de resistência, motivada pela sua fraca construção dos ossos e músculos, oferecem neste caso uma grande percentagem. (BURGERSTEIN, 1910, p. 151/152). Por essas razões, Mariana, ao escrever com sua pena, deveria manter a postura física corporal recomendada pela professora como prevenção de doenças e cuidar da pele e da água que ingeria. Esses valores inculcados pela educação da época refletiam-se nas frases ou textos criados pelos alunos, como nesta prova escolar em Juiz de Fora. As duas últimas propostas para avaliar o domínio da língua materna destacam os conteúdos curriculares considerados importantes para o ensino do bem escrever: a categorização dos substantivos e sua aplicação em frases. Na prova não há marcas de correção. As marcas deixadas pela professora são apenas a data, a assinatura e a nota 9. Apesar de avaliada, a prova não era tocada pela ação docente para preservar os erros cometidos e, portanto, a legitimidade da nota atribuída. A segunda prova de Mariana, de 12 de novembro de 1935, considerada final, com registro de correção em 13 de novembro, e nota também 9, apresenta a mesma estrutura da de março, mas vem acrescida de duas outras áreas do conhecimento: História e Geografia. O cabeçalho, além do nome do Grupo Escolar, traz informações das quais podem ser interpretadas outras situações próprias da organização escolar. O primeiro registro refere-se à Prova Escripta Final e o segundo informa tratar-se do III anno mixto. AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 145 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 Por ser considerada como prova final, deduz-se que o calendário previa o encerramento do ano letivo durante o mês de novembro, e o fato de ser escrita sugere que haveria outra, possivelmente oral. De outra parte, a referência à natureza de composição de alunos — a classe mista — indica também o seu contraponto, ou seja, a organização de classes predominantemente com sexos distintos. Os pequenos registros apostos no topo da página revelam, 77 anos depois (em 2012), princípios de organização dos Grupos Escolares no país, sob o conceito de escolas reunidas em um mesmo prédio. Para avaliar o conhecimento em língua materna de Mariana, quatro solicitações foram feitas: Dictado, Fazer o perfil de um collega e Formar três sentenças com o Presente e Futuro e Condicional do verbo cantar; Passar um traço nos verbos encontrados. O texto apresentado para a transcrição gráfica da pronúncia feita pela professora — o ditado — baseava-se em pequena biografia do padre Bartolomeu de Gusmão. Figura muito citada nos livros didáticos até os anos 1950, acompanhado de outras tantas figuras históricas, o padre Bartolomeu servia, como os demais, como modelo de desprendimento, abnegação e heroísmo para a formação dos pequenos. O exercício destinado à avaliação de Mariana, entretanto, informava mais sobre sua família do que dele próprio, de sua nacionalidade ou de seus feitos como precursor do balonismo no Brasil. Em Santos, no anno de 1685, nasceu Bartholomeu Lourenço de Gusmão. Pertencia a uma família illustre. Seu irmão, Alexandre Gusmão, foi notável estadista. Sua irmã, D. Joanna de Gusmão, distinguiu-se tanto por suas virtudes, que chegou a ser julgada santa pelo povo de Desterro, hoje Florianópolis onde morreu em completa pobreza. Não há, incrivelmente, rasuras ou marcas de correção no ditado escrito por Mariana em caligrafia primorosa, a bico de pena metálica, tal como o perfil da colega Delly, que já fora, em março, sujeito de uma de suas frases, mas que em novembro, contribuía para compor a segunda tarefa: Delly é uma menina boa e delicada. Tem pelle clara, olhos castanhos boca pequena e nariz bem feito. Não vem sempre uniformisada. A mãe della, é uma senhora muito distincta, e auxiliar do Sr. Pelino, chama- se D. Elmaia da Cunha Vaz. Ella não tem capricho com os cadernos, rabisca e desenha os cadernos. Não é adiantada na arithmética. Deve ter 9 annos [de] edade. Seu pae trabalha num escriptorio. Não é muito applicada, no começo do anno era mais applicada. 146 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 Mariana descreve o perfil de sua amiga Delly apoiado sobre a descrição fisionômica e sobre sua falta de virtudes na escola. Como no primeiro texto, há preocupações, próprias da época, em enaltecer boas virtudes e apontar as reprováveis, especialmente na escola, entre elas o capricho com os cadernos. Tal como ocorrera em março, são apenas duas as situações discursivas, estruturadas em dois outros gêneros — a biografia e o perfil, enquanto em março foram carta e fábula. As outras duas tarefas cuidam de questões de natureza gramatical: identificação de formas verbais e domínio temporal das formas de verbo da primeira conjugação. As duas provas escolares produzidas em 1935 por Mariana espelham, de certo modo, as metodologias utilizadas para ensinar em língua portuguesa (cópia, ditado e memorização) e a concepção de que aprender a escrever limitava-se a traçar caprichosamente as letras e a escrever o discurso do outro. Além dessas conclusões, outras puderam ser anotadas: a gestão da organização dos alunos em classes masculinas, femininas e mistas; a gestão do tempo escolar; a distribuição de provas ao longo do ano, com finalização prevista para novembro; o sistema de atribuição de notas; a data e assinatura da professora para comprovar a correção feita, mas sem marcas visíveis; a natureza ideológica dos textos com o objetivo de dar destaque a valores tradicionais da cultura ocidental e a desejadas condutas escolares. 4. A prova escolar de 1963 Vinte e oito anos depois das provas de Mariana, em Juiz de Fora, Roberto, seu filho, produziria as suas no Grupo Escolar Coronel Amancio Bueno, em Jaguariúna, na região de Campinas, no 4º. Ano misto, no ano de 1963, um ano antes do golpe militar. A configuração do suporte físico da prova de Roberto distancia-se muito da de Mariana. A folha dupla fora impressa em gráfica com o cabeçalho pré-impresso: Delegacia Regional do Ensino. À esquerda e à direita, dois pequenos retângulos impressos traziam indicações para preenchimento. No primeiro Comportamento 6.0. Comparecimento (em branco). Faltas (em branco). No segundo, MEDIA 8.0. Matriculados 42. Classif. Geral 12º. lugar. Em seguida havia uma sequência de registros impressos para preenchimento pelo aluno: Estabelecimento Grupo Escolar Cel. Amancio Bueno; Aluno R.P.L.; espaço para nome da cidade, data Jaguariúna, 28 de maio de 1963 e classe: 4º. Ano misto. Provas. Linguagem Escrita (seguida de amplo espaço que ocupava toda a frente e parte do verso da página); Aritmética (com espaços pré-determinados para quatro problemas, separados por traço impresso de margem a margem, com a palavra Resposta também impressa; Questões Práticas AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 147 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 (sem nenhuma indicação); Conhecimentos Gerais. No final da última página havia um quadrado delimitado com a indicação CARTOGRAFIA e, logo ao lado, espaços para registros das notas: RESUMO: Nota de Linguagem. Nota de Aritmética. Nota de Conh. Gerais. Nota de leitura. Soma. Em seguida, espaço para o local, a data, acompanhado de VISTO e indicação para Assinatura do Pai ou responsável. Nesse momento histórico, a configuração da prova pré-impressa determinava, antecipadamente para o professor, quais deveriam ser os exercícios, a sua quantidade e quantas notas deveriam ser atribuídas, após contagem precisa dos acertos e dos erros. Em Linguagem escrita, foram solicitadas, na parte A, a realização de ditado e a descrição de um objeto — O meu livro, e na parte B, cinco exercícios de avaliação gramatical. No ditado, as rasuras cometidas por Roberto confundem-se com os traços feitos pelo corretor abaixo das palavras com ortografia inadequada. É interessante notar que o texto, apesar de ter apenas o seu início apresentado, revela características de fábula e, como na primeira prova de Mariana (O galo e a pérola), o tema são as pedras preciosas e a riqueza: Um aventureiro topou em uma de suas explorações com um rochedo de ouro. O precioso metal brilhava aos raios do sol com um fulgor incomparável. Admirado de tão grande riqueza, o aventureiro sentou-se e começou a refletir. Havia meia hora apenas, era um pobre homem sem destino, mal vestido e quase sempre com fome. Na parte B, de avaliação gramatical, Roberto preencheu lacunas, cujos dados indicam o conteúdo gramatical ensinado e avaliado: 1. Pãozinho – pãezinhos (plural dos substantivos na forma diminutiva); 2. A leoa avançou contra a ovelha (substantivos masculinos e femininos); Morreram vários porcos daquela vara (substantivos coletivos); Tenho um pensamento triste (substantivo abstrato); Comemos maçãs (substantivo comum); O menino e a menina vão passear. (concordância verbal). As marcas semelhantes à letra C, correspondendo a CERTO, feitas pela professora, inscrevem-se ao lado das respostas. Essa prática, observada em todos os exercícios subsequentes, não fora observada em 1935, nas provas de Mariana. Não há, do mesmo modo, identificação do corretor, como ocorrera em Juiz de Fora. Agora, a correção é impessoal, mas com marcas, e, no final, a assinatura é a do pai ou responsável, não a do corretor. A proposta de Descrição, um dos componentes da tríade Narração, Descrição e Dissertação considerados como gêneros para o ensino do bem escrever, largamente utilizados na cultura escolar brasileira, define o objeto que deveria ser descrito: Meu livro. O pronome possessivo, no singular, que traz implícito o artigo definido O Meu livro, impede que Roberto 148 Dagoberto B. Arena, Adriana P. B. Arena Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 escolha um livro, que poderia ser um de literatura, que porventura tivesse. O pronome explícito e o artigo implícito (mas presente na primeira frase abaixo) impedem a descrição de outro livro que não seja o didático, historicamente chamado de Meu livro: Vou descrever o meu livro. Ele é ilustrado. O meu livro tem: capa, dorso e folhas. A autoria é Daisy Brescia. Tem cento e cinqüenta folhas. A lição que eu mais gostei foi: O coelhinho violento. Meu livro chama-se Brasilia. O livro me distrai muito. Roberto reproduz, vinte e oito anos depois, neste caso, o mesmo modelo de descrição utilizado pela mãe, quando descreveu, em 1935, uma cidade qualquer. Em 1963, o objeto estava materializado diante do aluno em processo de avaliação. Na descrição transcrita há destaques para nome, autoria e constituição física do livro. O título do texto-lição selecionado como o mais interessante poderia revelar o mesmo tom moralista encontrado na fábula O galo e a pérola, reproduzido no ditado feito a Mariana. No final, o quadro RESUMO indicava as notas obtidas: 70 em Linguagem, 80 em Aritmética, 70 em Conhecimentos Gerais e 100 em Leitura. A soma alcançara 320, devidamente conferida pelo pai, comprovada pela assinatura no espaço a ela destinado, prática não registrada em 1935. Não há indicações de como teria sido a avaliação da competência leitora de Roberto. Conclusão Separadas por um intervalo de 28 anos, em estados brasileiros diferentes, embora no sudeste, as provas escolares de Mariana e Roberto revelam situações comuns, mas também divergem em outros aspectos. As primeiras situadas ainda na primeira metade do século XX representam e apresentam escolhas curriculares, condutas docentes e discentes, modos de registro e valores ideológicos próprios da época em que, na política, o país iniciava a arrancada de economia rural para uma economia de base industrial, que começaria a mostrar fôlego nos anos 1960; por outro lado, na educação, o movimento dos pioneiros da Escola Nova já havia lançado ideias pelos cursos de formação de professores e institutos de educação, em 1932, mas provas de Mariana trazem, ainda, as heranças do início do século, AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM PROVAS ESCOLARES DO SÉCULO XX (1935 e 1963) 149 Poíesis Pedagógica, Catalão-GO, v.11, n.1, p. 135-149, jan/jun. 2013 principalmente no ensino da língua materna apoiado sobre a metodologia de uso da cópia, do ditado e da memorização de dados e fatos sobre o país. A prova de Roberto conserva a mesma metodologia de avaliação em língua materna, reveladora dos procedimentos metodológicos utilizados — o ditado e a cópia —, mas com uma dosagem maior de noções gramaticais. De outra parte, se as evoluções pedagógicas não são tão perceptíveis, as medidas de controle do trabalho docente, tanto pelos superiores, quanto pelos pais, são evidenciadas pela pré-impressão da folha de prova de Roberto. As três provas escolares, produtos da cultura da escola, produtos das relações dos homens — gestores, professores e alunos — que compunham as escolas nos anos 30 e nos anos 60 do século XX, revelaram, por seus detalhes, dados com os quais é possível reconstruir conhecimentos de natureza histórica. REFERÊNCIAS ANDRÉS. M Del M. Del P. e ZAMORA, S.R. Representações da escola e da cultura escolar nos cadernos infantis (Espanha, 1922-1942). In: MIGNOT, A. C, V (Org.). Cadernos à vista. Escola Memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2008, p. 161-185. BURGERSTEIN, L. Construcções escolares e hygiene do ensino. Lisboa: Parceria Antonio Maria Pereira, Livraria Editora. 1910, 166 p. VIÑAO, A. Os cadernos escolares como fonte histórica: aspectos metodológicos e historiográficos. In: MIGNOT, A. C, V (Org.). Cadernos à vista. Escola Memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2008, p. 15-33. GVIRTZ, S. e LARRONDO, M. Os cadernos de classe como fonte primária de pesquisa: alcances e limites teóricos e metodológicos para sua abordagem. In: MIGNOT, A. C, V (Org.). Cadernos à vista. Escola Memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2008, p 35-48. FERNANDES, R. Um marco no território da criança: o caderno escolar. In: MIGNOT, A. C, V (Org.). Cadernos à vista. Escola Memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2008, p. 49-68. GINSBURG, C. A Micro-história e outros ensaios. Lisboa: Difel, 1989, 244 p. RAZZINI, M.P. G Instrumentos de escrita na escola elementar: tecnologias e práticas. In: MIGNOT, A. C, V (Org.). Cadernos à vista. Escola Memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2008, p 91-113. Recebido em 10-06-2013 Aprovado em 09-08-2013