ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DOS TUBARÕES DO ARQUIPÉLAGO DE FERNANDO DE NORONHA, COM ÊNFASE NO TUBARÃO-CABEÇA-DE-CESTO Carcharhinus perezi (Poey, 1876) (Carcharhiniformes, Carcharhinidae). RICARDO CLAPIS GARLA Tese apresentada ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Campus de Rio Claro, para a obtenção do título de Doutor em Ciências Biológicas (Área de Concentração:Zoologia) Rio Claro Estado de São Paulo – Brasil Dezembro de 2003 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DOS TUBARÕES DO ARQUIPÉLAGO DE FERNANDO DE NORONHA, COM ÊNFASE NO TUBARÃO-CABEÇA-DE-CESTO Carcharhinus perezi (Poey, 1876) (Carcharhiniformes, Carcharhinidae). RICARDO CLAPIS GARLA Orientador: Prof. Dr. ALBERTO FERREIRA AMORIM Tese apresentada ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Campus de Rio Claro, para a obtenção do título de Doutor em Ciências Biológicas (Área de Concentração:Zoologia) Rio Claro Estado de São Paulo – Brasil Dezembro de 2003 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com Este, que representa meu maior desafio até o momento, é dedicado aos meus pais, Luiz Carlos e Teresa, e minha irmã Carol. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com i Agradecimentos Aos meus pais, Luiz Carlos e Teresa, pelo amor e tudo que fazem pela minha formação. A meu pai, pela ajuda em todas as barras pesadas que rolaram; por cuidar da movimentação financeira dos auxílios financeiros; por ser meu meio de comunicação com o continente; e exemplo de integridade à carreira de professor universitário. À minha irmã Caroline pelo carinho e todas as nossas conversas, psicológicas ou não. Ao meu orientador, Prof. Dr. Alberto Ferreira Amorim, por ter acreditado no meu trabalho e me oferecido uma oportunidade quando os “tubarólogos” e ictiólogos renomados do país me negaram, e tudo que esta chance inicial possibilitou realizar. Ao Prof. Dr. Norberto Peporine Lopes da FCFRP-USP pela co-orientação na parte bioquímica do trabalho, pelo entusiasmo e presteza inesgotáveis e contagiantes no trabalho de campo; pela captura do maior tubarão do projeto (2,5 m) num dos pontos de pesca de costão tecnicamente mais difíceis do arquipélago, e pela aula de pilotagem de carretilha que presenciei na ocasião; por indicar o trabalho para a Revista Pesquisa FAPESP; por tudo que tem feito para minha formação; e acima de tudo, por ser o meu amigo Betão, com quem sempre posso contar. Ao meu orientador de mestrado, Prof. Dr. Nivar Gobbi, pelo aconselhamento freqüente e por ainda continuar contribuindo para minha formação profissional. Aos membros titulares da Banca Examinadora: Profs. Drs. Otto Bismarck F. Gadig, Roberto Goiten (UNESP), Emygdio L. Monteiro Filho (UFPR) e Marcelo Rodrigues de Carvalho (FFCLRP-USP) pelas valiosas sugestões e críticas que contribuíram para o enriquecimento desta tese; aos suplentes Profs. Drs. Ricardo M. C. Castro, Flávio Bockmann (FFCLRP-USP) e Maria José de Oliveira Campos (UNESP) pela disponibilidade em participarem. Ao Prof. Dr. Samuel H. Gruber, da Universidade de Miami, por ter sido um dos primeiros a incentivar meus estudos com ecologia de tubarões, quando todos os brasileiros desencorajavam; por ter proporcionado minha participação em dois cruzeiros a bordo do navio oceanográfico Seward Johnson, onde pude realizar as parcerias de pesquisa que permitiram deslanchar definitivamente o trabalho. Aos tripulantes do navio, pela simpatia e profissionalismo. Aos parceiros de pesquisa da Nova Southeastern University na Flórida, Prof. Dr. Mahmood Shivji e doutorando Demian Chapman, pela amizade, análises genéticas, financiamento em parceria obtido junto à Wildlife Conservation Society, e apoio na aquisição, transporte e implantação inicial da telemetria. Ao Dr. Bradley Wetherbee do PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com ii National Oceanographic and Atmospheric Administration dos EUA pela amizade e auxílio inicial no estudo de telemetria. Aos Drs. Ricardo Castro, Otto Gadig e Rodrigo Leão de Moura pela leitura, sugestão e apoio feitos aos meus projetos iniciais sobre tubarões. Não fosse a ajuda que vocês acham ter sido pequena, eu não estaria aqui. À Dra. Liana de Figueiredo Mendes, pela imensa amizade, por ter me levado a Noronha pela primeira vez; pelo apoio, incentivo e aconselhamento em todas as fases do projeto, e pela ainda nova, mas atuante ONG Oceânica. Ao Dr. Jorge Lins pela amizade, apoio e incentivo, pelo convite para apresentação de palestras, pelas sugestões feitas antes do início da redação da tese; e por segurar a barra frente a todos os transtornos e inconvenientes causados pela permanência de uma das embarcações do projeto no Iate Clube de Natal. A ONG IBIRÉ e seus membros, em especial Daniel Fonseca de Andrade, pela amizade, por ter acreditado em meu trabalho e firmado a parceria que permitiu o financiamento da Fundação O Boticário; pela filosofia da IBIRÉ e o maravilhoso trabalho de Educação Ambiental que ela possibilitou realizar em Noronha. Ao IBAMA pela concessão da licença de pesquisa, e a todos os seus membros em Fernando de Noronha. De forma especial a Marcos Aurélio Silva, o “Maguinho”, pela participação fundamental, sempre confiando e apoiando o trabalho; por ter intercedido junto à Diretoria do Parque para obter autorização para aquisição de uma embarcação; por ter permitido a utilização de outras embarcações para entrar na área do Parque nas ocasiões em que a do projeto estava em reparos; e por ter permitido guardar a jangada e os equipamentos na garagem do IBAMA. Á Administração Geral do Distrito Estadual de Fernando de Noronha, por autorizar a realização do trabalho, isenção da taxa de permanência e a possibilidade de adquirir passagens áreas com tarifas diferenciadas. Ao Brigadeiro da Aeronáutica Carlos Porto por possibilitar, em dois anos consecutivos, o embarque de equipamentos pesados essenciais ao projeto no avião Hércules C-130 (a “Patinha”) que vai para Noronha. Na FFCLRP-USP ao Prof. Drs. Fernando Matelatto pelas sugestões na parte de estrutura populacional e à doutoranda Andrea de Lucca Meireles pela ajuda nas análises. Aos Profs. Drs. John Mc Namara e Fernando Barbosa Noll por me receberem e discutirem meus dados finais, e Alexandre C. Ribeiro pela ajuda com o mapa da CPUE. A Vinícius Bonato da UNICAMP, pela extrema gentileza e presteza em ensinar-me a trabalhar com o programa CAPTURE. Ao Centro Universitário Barão de Mauá, especialmente o Prof. Marcelo Mestriner, pela amizade e interesse em sempre ajudar; pelo convite para apresentação de uma palestra na semana da Biologia; ao Prof. Dr. Orivaldo Pereira Ramos pela presteza na realização das análises clínicas do sangue dos tubarões. Às secretárias da PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com iii Pós-Gradução da UNESP Rio Claro, Heloísa, Sandra e Rute, pela resolução de todos os trâmites burocráticos via correio ou telefone durante o trabalho de campo. Ao tio Gustavo pelos inúmeros faxes enviados e recebidos em seu telefone. Ao primo advogado José Luiz Matthes pelo processo contra a empresa DHL pelo roubo de meu computador. Ao Homero da agência de viagens Hardy Tours de Ribeirão, pela gentileza, eficiência e profissionalismo ao longo destes seis anos de viagens aéreas. Ao Prof. Dr. Wagner Ferraresi de Giovani (FFCLRP-USP) por disponibilizar sua impressora laser para impressão da tese. A agência publicitária Z-dzain de Recife, seu proprietário Flávio Costa e o auxiliar Thiago pela arte final dos 14 painéis sobre tubarões atualmente expostos no “Museu dos Tubarões” em Fernando de Noronha e pelo cartaz de divulgação. Ao meu amigo Carlão da agência publicitária Foco Online de Ribeirão Preto e ao Fernando pela confecção de cinco painéis para o “Museu”; ao pessoal da agência, Paulinho, Renato, Wilson e Heloísa, pela amizade e profissionalismo. À agência DTP de Ribeirão, pela simpatia, profissionalismo e impressão dos cinco painéis na última hora. Ao Curso Latino Americano de Ecologia Quantitativa do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ). Em especial à organizadora Debby, aos brilhantes Profs. Drs. Paulo De Marco e Adriano Paglia, às meninas da limpeza e cozinha e a todos os amigos de curso que tornaram esta experiência inesquecível. Ao pessoal de Santos: Patrícia Mancini, Rafael Namora, Fábio Motta e Otto Gadig e Ronaldo “Magrão” Francini pela amizade, ajuda e alojamento. Ao pessoal de SP pela amizade e hospedagem: Sal, Ângela, Liana e Beto; e Carol de Ribeirão. Ao Kojima, Limão, Bebê e Fernando pela casa sempre disponível em Rio Claro. À querida Aninha, Ana Cláudia Motta, pelas inúmeras hospedagens em Recife e pelos papos de Rio Claro. À Liana Mendes e Rodrigo Coluchi pelas inúmeras hospedagens em Natal. Aos amigos de Ribeirão: Edu e Lu Nakano, Carlão, Deco, Alexandre, Gustavo, Sérgio, Pat, Ana Laura, Esqueleto, Bigas, Moacir, Ana Catarina, Guiga, Rogério, Fer, Carlo e Ana Cristina pelos churrascos, conversas e cerveja; ao pessoal da natação: Zé Renato, Bam-Bam, Paulinho, Maurão, Raquel, Paula e todos outros pela companhia no treino, churrascos e festas. Aos auxiliares de campo: os biólogos Carlo Leopoldo Bezerra Francini, Rodrigo Coluchi, Paula Regina Bonjorno, Renato Hajenius Aché de Freitas e a veterinária Cláudia Nascimento; à Paula Macedo, Manoel Carreira Neto e Thaís Guaratini. Ao pessoal de Noronha: José Carlos Marenga pela amizade, por oferecer o veleiro Oceanide como moradia quando fui despejado; e por cuidar da moto “Micróbio móvel”, à querida Tammy Casagrande pela ajuda no campo e pela presença sempre amiga, constante e prestativa; a José Martins do Projeto Golfinho Rotador por permitir guardar parte dos equipamentos em sua casa e pelo uso ocasional da internet; ao artista e amigo Élcio Santos PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com iv pela preparação do pôster; aos amigos Xará, Piu, Lisandro, Airton Cafuçú, Nei, Ivan, Dani e Leo, Paulinho, Batista, Tadeu e tantos outros pela amizade, festas, peixadas e pirões. Ao grande amigo Jairon (in memoriam) pela amizade, apoio e preocupação freqüentes com o bem-estar dos amigos, pelo quase naufrágio com os boiólogos, pelo resgate na Sapata, por me deixar tomar conta da casa durante sua ausência e pelas inúmeras festas e pirões. Tu faz muita falta, visse “coroa”? A ANPESCA e aos pescadores que devolveram ao mar os tubarões marcados ou entregaram as marcas: Paulo Dantas, Tola, Enoque, Mano, Paulo taxista, Maguinho e Policarpo. A Loirinho, Roberto e Danda pela ajuda nas capturas, principalmente a que virou Globo Repórter. Especialmente a Orlando José de Souza, o comandante “Truva”, pela honra de me emprestar o seu valente Feliz Navegante para inúmeras saídas; pela sempre pronta disposição em ajudar; e por guardar parte dos equipamentos. Aos mecânicos Maciel, Eliezer, Nando do IBAMA e Júnior do Boldró pela amizade e ajuda essenciais com o motor de popa e com a moto. Ao Edú da Atlantis Divers e João Flor pela ajuda na manutenção do motor de popa. Aos meus auxiliares de campo noronhenses: Batista, Paulinho, Ricardinho, Nando, Nininho, Bruno, Catita e Mané Miolo, pela companhia, amizade e muitos tubarões. Aos mergulhadores pescadores: Rica, Bodão, Tammy, Olga e Emi Obara. A Lula, Ivan e Sólon por emprestarem suas embarcações para checagem dos receptores quando a jangada do projeto afundou. A Marenga, Mauricio, Duda, Olga, Xará, Adriano, Ronaldo Magrão, Liana, Tammy e Ana por todas as vezes que me auxiliaram neste cansativo trabalho. Especialmente a Mauricio e Duda dos “Remos da Ilha” pelos empréstimos do inflável para realizar estas operações. Ao Engenheiro de Pesca Leonardo Veras, proprietário da Noronha Pesca Oceânica, pelo apoio inicial na tecnologia de pesca, o indispensável alojamento nos primeiros dois anos do trabalho; e pela chance de participar na montagem da exposição de tubarões. Ao Acioly, vizinho de alojamento na NPO, pelo empréstimo da cozinha centenas de vezes e por ser esta pessoa sempre tão de bem com a vida. Aos proprietários das operadoras de mergulho Águas Claras, Atlantis Divers e Noronha Divers pelo apoio e empréstimo de cilindros para checagem dos receptores e pelas centenas de mergulhos gratuitos. A Águas Claras, em especial a Fábio e Maurício pela amizade, alojamento inicial e por parte da minha formação em mergulho. Aos mergulhadores (impossível mencionar todos) pela amizade e por tornarem as operações sempre divertidas e agradáveis: Juarez, Nido, Lola, Duda, Régis, Rica, Bodão, Luciano, Carlinhos, Záira, Edu, Olga, Samuca e os demais. Ao mestre Jorjão pelo meu apelido “Onça”. Ao mestre Djalma, Luciano e Babu pela ajuda no resgate da jangada. Aos fotógrafos-sub Daisy Brisolla, Marta Granville, Caio Borghoff, Leo Francini, Záira Matheus e Samuca que sempre gentilmente cederam suas fotos para elaboração de painéis e para divulgação. Ao Bodão pela nossa primeira filmagem de shark-dive. Aos cinegrafistas Fábio e PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com v Lola da Hidrosfera Produções pelas imagens e edição do excelente curta de divulgação do projeto. A Ana Clara e Cristiano da TV Golfinho, pelo apoio e divulgação do trabalho à comunidade. A Verônica Falcão (Jornal do Commércio de Pernambuco) e Liana John (Estado de São Paulo) pelas ótimas matérias publicadas. A Caio Borghoff pela matéria e fotos na revista National Geographic brasileira. A “Feiticeira” Joana Prado pela entrevista no O positivo da Rede Bandeirantes. Ao programa Terra da Gente da TV Globo Regional de Campinas. Ao repórter Francisco José, o diretor geral Jotair e equipe pela matéria no Globo Repórter. A Lawrence Wahba, Rodrigo Astiz, Samuca e Alê por incluírem o projeto no documentário do National Geographic Channel. A Carlos Fioravante pela matéria na Revista Pesquisa FAPESP. Ao mestre Bira pela amizade e por estar presente na travessia Recife - Natal na qual quase naufragamos, e por toda a ajuda depois disso. A Zé Preto, Amaury e Gargamel de Brasília Teimosa pela ajuda e inesquecível amizade no reparo do barco após o quase naufrágio. A Joãozinho e Bira por cuidar do barco no Iate Clube de Natal. A Walter Magnani, de Ribeirão, pelas forquetas extras que fez para o caíco, indispensáveis enquanto morei no veleiro. De maneira mais que especial à Boca, Lígia Moreiras Sena, por ser um dos agentes de sustentabilidade mais completos que já conheci; por tudo que aprendi sobre Educação Ambiental e valores humanos; pela chance de ter presenciado a atuação de alguém com dom nato de educadora; por conduzir os dois módulos do curso de capacitação com maestria, e mostrar coragem e dedicação para enfrentar as dificuldades de Noronha; por ter sempre feito de tudo para me ajudar; por ensinar-me tanta coisa sobre o amor, inclusive que ele é possível mesmo à distância; por ter-me dado tanto desse amor e ter-me feito tão feliz. A FAPESP pela concessão da bolsa de doutorado (Processo 98/15080-8) e da reserva técnica, indispensável para resolver os inúmeros imprevistos de campo; pelo auxílio financeiro (Processo 00/02441-4) que possibilitou a aquisição das embarcações. A Wildlife Conservation Society e International Society for Reef Studies pelo equipamento de telemetria e computador. A Fundação O Boticário de Proteção à Natureza/ The J.D. & C.T. Mc Arthur Foundation pelas passagens e diárias que tornaram possível realizar a parte educacional. A Deus pela chance de viver experiências tão diferentes, por me proteger de todos os riscos que passei, por amparar minha mãe cada vez que ela sabia de uma enrascada minha, e por permitir meu crescimento, amadurecimento e reconhecimento profissionais. Impossível não me emocionar enquanto escrevo estes agradecimentos, pois graças a vocês meu sonho tornou-se realidade e chegou ao fim. Que será apenas o começo ... MUITO OBRIGADO!!! PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com vi ÍNDICE Página Resumo ................................ ................................ ................................ ................ 01 Abstract................................ ................................ ................................ ................. 02 1. INTRODUÇÃO GERAL ................................ ................................ ........................ 03 1.1. Introdução ................................ ................................ ................................ ...... 04 1.2. Objetivos ................................ ................................ ................................ ........ 11 1.2.1. Objetivo geral ................................ ................................ .......................... 11 1.2.2. Objetivos específicos................................ ................................ ............... 11 1.3. Descrição da área de estudo................................ ................................ .......... 13 1.3.1. Características naturais................................ ................................ ........... 13 1.3.2. Delimitação das Unidades de Conservação existentes............................ 15 1.3.3. Localidades de mergulho e pesca visitadas................................ ............. 16 2. REVISÃO DA LITERATURA ................................ ................................ ................ 26 2.1. Estrutura populacional................................ ................................ .................... 27 2.2. Marcação e liberação de tubarões ................................ ................................ . 29 2.3. Utilização de áreas de berçário por tubarões ................................ ................. 32 2.4. Uso de telemetria ultra-sônica em estudos de tubarões ................................ . 35 2.5. Manejo e conservação de elasmobrânquios................................ ................... 40 2.6. Caracterização geral das espécies de tubarão estudadas.............................. 46 3. ESTRUTURA POPULACIONAL, DISTRIBUIÇÃO E USO DO BERÇÁRIO ......... 49 3.1. Métodos ................................ ................................ ................................ ........ 50 3.1.1. Determinação das fases etárias ................................ ................................ 50 3.1.2. Operações de captura a bordo de embarcação................................ ......... 50 3.1.3. Operações de captura a partir do costão................................ ................... 51 3.1.4. Manuseio dos tubarões ................................ ................................ ............. 51 3.1.5. Marcação ................................ ................................ ................................ .. 52 3.2. Análise dos dados................................ ................................ .......................... 54 3.2.1. Estrutura populacional................................ ................................ ............... 54 3.2.2. Captura por unidade de esforço ................................ ................................ 54 3.2.3. Estimativa do tamanho populacional ................................ ......................... 55 3.4. Resultados................................ ................................ ................................ .... 56 3.4.1. Esforço de amostragem ................................ ................................ ............ 56 3.4.2. Espécies capturadas ................................ ................................ ................. 56 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com vii 3.4.2.1. Carcharhinus perezi ................................ ................................ ............... 56 a) Capturas ................................ ................................ ................................ ....... 56 b) Estrutura populacional ................................ ................................ .................. 56 c) Captura por unidade de esforço e distribuição ................................ .............. 57 d) Recapturas ................................ ................................ ................................ ... 58 e) Observação de tubarões marcados................................ ............................... 59 f) Estimativa do tamanho populacional................................ .............................. 59 g) Outras observações................................ ................................ ...................... 59 3.4.2.2. Ginglymostoma cirratum................................ ................................ ......... 60 a) Capturas ................................ ................................ ................................ ....... 60 b) Estrutura populacional ................................ ................................ .................. 60 c) Distribuição das capturas ................................ ................................ .............. 60 d) Recapturas ................................ ................................ ................................ ... 61 e) Observação de tubarões marcados................................ ............................... 61 f) Estimativa do tamanho populacional................................ .............................. 61 g) Outras observações................................ ................................ ...................... 61 3.4.2.3. Negaprion brevirostris ................................ ................................ ............ 62 a) Capturas ................................ ................................ ................................ ....... 62 b) Distribuição das capturas................................ ................................ .............. 62 c) Observação de tubarões marcados................................ ............................... 62 d) Outras observações................................ ................................ ...................... 62 3.5. Discussão ................................ ................................ ................................ ..... 73 3.5.1. Espécies de tubarões na região costeira do arquipélago........................... 73 3.5.2. Estrutura populacional................................ ................................ ............... 73 3.5.3. Recapturas e taxa de crescimento ................................ ............................ 75 3.5.4. Estimativas do tamanho populacional ................................ ....................... 76 3.5.5. Distribuição ................................ ................................ ............................... 76 3.5.6. Utilização do arquipélago como berçário................................ ................... 78 3.5.7. Utilização da laguna do arquipélago................................ .......................... 81 3.5.8. Parasitas e uso de estações de limpeza................................ .................... 82 3.6. Conclusões................................ ................................ ................................ ... 83 4. MOVIMENTAÇÃO, ATIVIDADE E USO DO HÁBITAT ................................ ......... 84 4.1. Métodos ................................ ................................ ................................ ........ 85 4.1.1. Funcionamento do equipamento de telemetria ulra-sônica........................ 85 4.1.2. Implante cirúrgico dos transmissores de telemeria ................................ .... 86 4.1.3. Instalação dos receptores de telemetria automatizados ............................ 86 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com viii 4.1.4. Distribuição do receptores de telemetria................................ .................... 87 4.1.5. Remanejamento dos receptores de telemetria ................................ .......... 88 4.1.6. Descarregamento dos dados armazenados pelos receptores ................... 89 4.2. Análise dos dados................................ ................................ ........................ 90 4.2.1. Movimentação, presença, atividade e tempo de permanência .................. 90 4.2.2. Cálculo dos espaços de atividade ................................ ............................. 90 4.2.3. Índice de sobreposição dos espaços de atividade................................ ..... 90 4.3. Resultados................................ ................................ ................................ .... 93 4.3.1. Monitoramento por telemetria................................ ................................ .... 93 4.3.1.2. Carcharhinus perezi ................................ ................................ ............. 93 4.3.1.3. Cálculo do espaço de atividade observado................................ ........... 96 4.3.1.4. Cálculo do índice de sobreposição dos espaços de atividade .............. 96 4.3.1.5. Ginglymostoma cirratum................................ ................................ ....... 97 4.3.1.6. Negaprion brevirostris................................ ................................ ........... 97 4.4. Discussão ................................ ................................ ................................ ... 109 4.4.1. Técnicas de monitoramento utilizadas................................ ..................... 109 4.4.2. Monitoramento, espaço de atividade e movimentação ............................ 110 4.4.3. Agrupamentos e sobreposição dos espaços de atividade ....................... 112 4.4.4. Período de atividade................................ ................................ ................ 112 4.4.5. Variação sazonal no uso do hábitat................................ ......................... 113 4.4.6. Movimentação dos tubarões de maior porte................................ ............ 113 4.4.7. Utilização da Laje Dois Irmãos ................................ ................................ 115 4.5. Conclusões................................ ................................ ................................ . 116 5. MANEJO E CONSERVAÇÃO DOS TUBARÕES ................................ ............... 117 5.1. Programa de educação e conscientização................................ ............... 118 5.1.1. Montagem de uma exposição permanente sobre tubarões ..................... 118 5.1.2. Campanha de educação e divulgação................................ ..................... 118 5.2. Implicações para a conservação dos tubarões do arquipélago ............. 121 5.2.1. Ausência de informações sobre os parâmetros populacionais ................ 121 5.2.2. Pesca direcionada aos tubarões no passado ................................ .......... 121 5.2.3. Estimativas do tamanho populacional ................................ ..................... 122 5.2.4. Genética................................ ................................ ................................ .. 122 5.2.5. Pressão de pesca sobre os tubarões no oceano Atlântico....................... 123 5.3. Problemática para o manejo dos tubarões do arquipélago .................... 124 5.3.1. Tubarões jovens residentes e com movimentação restrita ...................... 124 5.3.2. Atividade pesqueira no arquipélago................................ ......................... 125 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com ix 5.3.3. Pesca atual de tubarões no arquipélago................................ .................. 127 5.4. Recomendações para o manejo e conservação dos tubarões ............... 128 (1) Criação de uma época de defeso para a pesca de tubarões ....................... 128 (2) Criação de defeso para a Zona de Uso Intensivo do Parque ....................... 129 (3) Inclusão de defeso para os tubarões no plano de manejo da APA............... 129 (4) Manutenção da proibição do mergulho e pesca no Buraco da Raquel......... 130 (5) Manutenção das áreas de acesso restrito na Baía do Sueste...................... 130 (6) Cadastro dos pescadores amadores................................ ............................ 130 (7) Proibição da comercialização de carne de tubarão nos restaurantes........... 131 5.5. Conclusões................................ ................................ ................................ . 134 6. LITERATURA CITADA................................ ................................ ....................... 135 7. APÊNDICES ................................ ................................ ................................ ....... 149 Apêndice 1: Elasmobrânquios do arquipélago de Fernando de Noronha........... 150 Apêndice 2: Produção pesqueira da Noronha Pesca Oceânica ......................... 152 Apêndice 3: Exemplos de roteiros para preparação de vídeos informativos ...... 153 8. CARACTERIZAÇÃO SOROLÓGICA DOS TUBARÕES ................................ .... 155 Resumo ................................ ................................ ................................ .............. 156 Abstract................................ ................................ ................................ ............... 156 1. Introdução................................ ................................ ................................ ........... 157 2. Objetivo................................ ................................ ................................ ............... 157 3. Revisão dos efeitos fisiológicos do estresse em peixes ................................ ...... 158 4. Métodos................................ ................................ ................................ .............. 163 4. Resultados................................ ................................ ................................ .......... 164 5. Discussão ................................ ................................ ................................ ........... 167 6. Literatura citada ................................ ................................ ................................ .. 169 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com x ÍNDICE DE FIGURAS Página INTRODUÇÃO GERAL Figura 1. Carcharhinus perezi ................................ ................................ .................. 08 Figura 2. Localização do arquipélago de Fernando de Noronha .............................. 09 Figura 3. Ginglymostoma cirratum................................ ................................ ............ 10 Figura 4. Negaprion brevirostris ................................ ................................ ............... 10 ÁREA DE ESTUDO Figura 5. Localidades de pesca e mergulho visitadas ................................ .............. 25 ESTRUTURA POPULACIONAL, DISTRIBUIÇÃO E USO DO BERÇÁRIO Figura 6. Marcas utilizadas para marcação dos tubarões................................ ......... 53 Figura 7. Classes de tamanho de Carcharhinus perezi ................................ ............ 66 Figura 8. Localização das capturas de Carcharhinus perezi................................ ..... 68 Figura 9. Localização das recapturas dos tubarões................................ .................. 69 Figura 10. Classes de tamanho de Ginglymostoma cirratum................................ .... 70 Figura 11. Classes de tamanho de Negaprion brevirostris ................................ ....... 71 Figura 12. Capturas e observações de G. cirratum e N. brevirostris......................... 72 MOVIMENTAÇÃO, ATIVIDADE E USO DO HÁBITAT Figura 13. Ancoragem e do funcionamento dos receptores de telemetria ................ 91 Figura 14. Distribuição dos receptores em 2001 ................................ ...................... 91 Figura 15. Distribuição dos receptores em 2002 e 2003................................ ........... 92 Figura 16. Espaço de atividade do tubarão No 2................................ ..................... 100 Figura 17. Espaço de atividade do tubarão No 6................................ ..................... 101 Figura 18. Espaço de atividade do tubarão No 7................................ ..................... 102 Figura 19. Espaço de atividade do tubarão No 8................................ ..................... 103 Figura 20. Espaço de atividade do tubarão No 11................................ ................... 104 Figura 21. Espaço de atividade do tubarão No 12................................ ................... 105 Figura 22. Freqüência do tubarão No 16 na laguna do Buraco da Raquel .............. 106 Figura 23. Sobreposição dos espaços de atividade ocupados pelos tubarões ....... 108 MANEJO E CONSERVAÇÃO DOS TUBARÕES DE FERNANDO DE NORONHA Figura 24. Cartaz utilizado na campanha de divulgação ................................ ........ 120 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com xi ÍNDICE DE TABELAS ESTRUTURA POPULACIONAL, DISTRIBUIÇÃO E USO DO BERÇÁRIO Tabela 1. Esforço de amostragem................................ ................................ ............ 64 Tabela 2. Sumário do esforço de amostragem ................................ ......................... 65 Tabela 3. Recapturas de Carcharhinus perezi................................ .......................... 69 Tabela 4. Recapturas de Ginglymostoma cirratum ................................ ................... 69 MOVIMENTAÇÃO, ATIVIDADE E USO DO HÁBITAT Tabela 5. Carcharhinus perezi com transmissores ultra-sônicos .............................. 98 Tabela 6. Ginglymostoma cirratum e Negaprion brevirostris com transmissores ...... 99 Tabela 7. Espaços de atividade observados para Carcharhinus perezi .................. 107 Tabela 8. Sobreposição dos espaços de atividade de Carcharhinus perezi............ 107 CARACTERIZAÇÃO SOROLÓGICA Tabela 1. Valores sorológicos de Carcharhinus perezi ................................ ........... 165 Tabela 2. Valores sorológicos de Ginglymostoma cirratum................................ ..... 165 Tabela 3. Valores sorológicos de Negaprion brevirostris ................................ ........ 166 Tabela 4. Comparação entre espécies da Flórida e de Fernando de Noronha ....... 166 PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 1 Resumo O presente trabalho visa gerar informações básicas sobre a ecologia e a situação populacional do tubarão-cabeça-de-cesto Carcharhinus perezi, lambarú Ginglymostoma cirratum e tubarão-limão Negaprion brevirostris no Arquipélago de Fernando de Noronha, com ênfase na primeira, por ser numericamente dominante. Utilizou-se a combinação de técnicas de marcação e recaptura e de telemetria ultra-sônica para fornecer informações sobre: estrutura populacional, distribuição espacial dos tubarões e de suas áreas de berçário, época de parto, padrões de movimentação e de utilização do hábitat. Amostras de sangue foram analisadas para caracterização sorológica das espécies. Foi implantado um programa de conscientização e educação sobre a necessidade de conservação dos tubarões, e realizou-se um curso de capacitação em Educação Ambiental para os professores do ensino médio e fundamental. A plataforma insular do arquipélago é utilizada como área de parto e de crescimento de jovens pelas três espécies de tubarões. Carcharhinus perezi apresenta maior segregação espacial por tamanho. Não ocorre segregação espacial em Ginglymostoma cirratum e Negaprion brevirostris pois foram observados indivíduos neonatos, jovens e adultos freqüentando a região próxima à linha costeira do arquipélago. Os tubarões utilizam com menor freqüência o trecho da Área de Proteção Ambiental (APA) do arquipélago, o que possivelmente está relacionado à intensificação da utilização humana e a indícios de empobrecimento biológico da região nos últimos anos. O monitoramento por telemetria mostra que: os tubarões jovens são residentes em trechos específicos do arquipélago; eles podem ser ativos a qualquer horário do dia, mas os maiores espaços de atividade e deslocamentos ocorrem à noite; aparentemente não existem variações sazonais nos espaços de atividade; e os tubarões maiores apresentam espaços de atividade maiores. Os principais problemas para o manejo e a conservação dos tubarões são: os tubarões jovens são residentes e com movimentação restrita a trechos específicos do arquipélago; a pesca que ocorre dentro e fora das áreas protegidas, que atinge principalmente os neonatos na época dos nascimentos; e os indícios de empobrecimento genético desta população. As sugestões para a conservação são: a criação de uma época de defeso para a pesca de tubarões durante a época dos nascimentos e o cadastro dos pescadores profissionais e amadores. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 2 Abstract The aim of the present study is to provide basic data on the ecology and population status of the reef-shark Carcharhinus perezi, nurse-shark Ginglymostoma cirratum and lemon-shark Negaprion brevirostris at Fernando de Noronha archipelago, with special reference to Carcharhinus perezi, due to its numerical dominance. A combination of mark and recapture and ultrasonic telemetry methods were used to gather data on: the population structure, spatial distribution of the sharks, location of the nursery grounds, parturition time, patterns of movement and habitat use. Blood samples were analyzed for a serological characterization of the species. An educational program was established to increase the community awareness about shark conservation, and a capacitating course on Environmental Education was offered to teachers of the local school. The archipelago’s insular shelf is used as a parturition and growing ground for young sharks of the three species. Carcharhinus perezi shows size segregation. Size segregation was not observed in Ginglymostoma cirratum and Negaprion brevirostris, and neonate, young and adult sharks of these species were observed to frequent shallow waters of the archipelago. Sharks rarely frequent the archipelago’s Environmental Protection Area (EPA), which is probably related to an intensification of human use and evidences of biological impoverishment of this site in recent years. The telemetry monitoring shows that: the young sharks are resident and present site fidelity to specific portions of the archipelago; they may be active at any time of the day, but the larger activity spaces and excursions occur at night; apparently there is no seasonal variation in activity spaces and habitat use; and larger sharks have more extensive activity spaces. The main problems for the management and conservation of the sharks are: resident young sharks have restricted movements; fishing activity that occurs around the whole archipelago, inside and outside protected areas, and harvests the neonates during the birth season; and evidences of genetic impoverishment of the Carcharhinus perezi population. The conservation strategies proposed are: the establishment of a fishing closure for sharks during the birth season, and registration of the professional and amateur fishers. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 3 1. INTRODUÇÃO GERAL PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 4 1.1. Introdução A classe Chondrichthyes (tubarões, raias e quimeras) forma um grupo antigo e bem sucedido de vertebrados mandibulados, atualmente representados por aproximadamente 1.100 espécies. Possuem uma longa e complexa história evolutiva, que se estende por mais de 450 milhões de anos, desde o período Ordoviciano superior até os dias atuais (Compagno, 1990 a). Os Chondrichthyes são hoje separados em duas subclasses: Holocephali e Elasmobranchii. Os Holocephali são representados pelas quimeras, com cerca de 50 espécies conhecidas (Last & Stevens, 1994). Os Elasmobranchii abrangem as espécies de raias e tubarões. As raias estão incluídas na superordem Batoidea, sendo separadas em quatro ordens, 21 famílias, 63 gêneros e aproximadamente 550 espécies. Os tubarões estão distribuídos em duas superordens, Squaloidea e Galeoidea, abrangendo 12 ordens, 29 famílias, 103 gêneros e cerca de 480 espécies. O grupo Galeoidea inclui a ordem dominante, Carcharhiniformes, com 12 famílias, 63 gêneros e mais de 273 espécies (Mould, 1995). Os tubarões da ordem Carcharhiniformes são os que apresentam o maior número de gêneros, espécies, abundância e biomassa. São encontrados primariamente nas plataformas continentais tropicais até 200 m de profundidade, mas existem algumas espécies oceânicas e outras que ocorrem em águas temperadas. A maior parte das espécies atinge comprimento máximo de dois metros, apesar das espécies mais conhecidas e perigosas ao homem ultrapassarem este tamanho (Compagno, 1984). Entre todos os tubarões, os membros da família Carcharhinidae são os que mais influenciam as atividades humanas (Compagno, 1990 b). Como muitas das espécies atingem grande porte e são abundantes em águas tropicais e subtropicais, estes tubarões representam parte importante da produção pesqueira de várias artes de pesca. Possuem grande importância econômica, sendo utilizados como recursos pesqueiros (carne, óleo, couro e nadadeiras), recreativos (pesca esportiva) e turísticos (mergulhos e fotografia) (Nelson, 1990). Esta é a família de tubarões mais numerosa no Brasil. O gênero Carcharhinus é o que apresenta maior número de espécies, com cerca de 31 representantes em todo o mundo e 15 espécies já registradas em águas brasileiras (Gadig, 1999). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 5 Todos os tubarões Carcharhinidae são carnívoros oportunistas posicionados no topo das cadeias alimentares do ambiente marinho (Gruber, 1981), ou seja, ocupam o último elo da cadeia alimentar, possuindo poucos predadores naturais (Ab'Saber et al., 1997). São animais importantes como elementos tróficos dos ecossistemas marinhos tropicais e subtropicais onde são bastante abundantes. Predadores de topo mantêm espécies-presa abaixo da capacidade de suporte do ambiente e reduzem a competição interespecífica, influenciando a diversidade biológica dos ecossistemas onde vivem (Begon, Harper & Towsend, 1990). Sob o aspecto reprodutivo, todos os Carcharhinidae, exceto o tubarão-tigre Galeocerdo cuvier são vivíparos placentotróficos (Castro, Woodley & Brudek, 1999). Neste tipo de desenvolvimento embrionário, a bolsa vitelínica funde-se à parede do útero formando uma estrutura análoga à placenta, que é responsável pela transferência de nutrientes e oxigênio ao embrião (Springer & Gold, 1989). Várias espécies de Carcharhinidae utilizam berçários, que são áreas geograficamente discretas dentro da distribuição da espécie, para onde as fêmeas migram por ocasião do parto, e onde os filhotes permanecem durante os estágios iniciais do ciclo de vida (Castro, 1993; Simpfendorfer & Milward, 1993). Os berçários normalmente são localizados em regiões costeiras com águas relativamente rasas e oferecem as vantagens seletivas de uma baixa taxa de predação, abundância de presas e hábitat apropriado para os jovens (Morrissey & Gruber, 1993 b; Merson & Pratt, 2001). Apesar de sua diversidade e importância ecológica, os tubarões representam um dos maiores grupos de vertebrados cujo comportamento ainda permanece pouco conhecido, principalmente em vista das dificuldades logísticas relacionadas à sua manutenção em cativeiro e observação adequada dos animais no ambiente natural (Nelson 1977; Gruber & Myrberg 1977). Embora o conhecimento sobre a situação populacional das espécies de tubarões seja incipiente, algumas espécies já sofrem efeitos negativos da sobrepesca e exploração irracional do ambiente (Rosa & Menezes, 1996; Rosa, 1997; Camhi et al., 1998). Entretanto, não é apenas a falta de conhecimento biológico que impede o manejo e conservação dos tubarões. Historicamente estes animais possuem baixo valor econômico e contribuem apenas modestamente no volume total capturado pela pesca mundial. Conseqüentemente, existe uma baixa prioridade nos recursos financeiros destinados a pesquisa e manejo de tubarões, quando comparados com os PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 6 peixes ósseos, economicamente mais valiosos. Tal fato também é influenciado pela tradicional imagem negativa dos tubarões, como criaturas malévolas responsáveis por ataques a seres humanos e competidores pelos recursos pesqueiros (Camhi et al., 1998). O tubarão-cabeça-de-cesto, Carcharhinus perezi (Poey, 1876), é uma espécie usualmente associada a ecossistemas recifais e substratos consolidados da plataforma continental e plataformas insulares do oceano Atlântico Ocidental, sobretudo de águas tropicais entre 15 e 80 m de profundidade (Compagno, 1984) (Figura 1). É também uma das espécies de tubarão mais comuns no arquipélago de Fernando de Noronha (Soto, 1997) (Figura 2). A presença de Carcharhinus perezi medindo cerca de 70 cm portando cortes umbilicais abertos ou recentemente fechados (observação pessoal), demonstra que a espécie utiliza o arquipélago de Fernando de Noronha como uma área de berçário, segundo definição de Castro (1993) e Simpfendorfer & Milward (1993). Também foram observados tubarões neonatos pertencentes às duas outras espécies mais comuns do local, o lambarú Ginglymostoma cirratum (Bonaterre, 1788) (Figura 3) e o tubarão- limão Negaprion brevirostris (Poey, 1868) (Figura 4). O mapeamento e descrição de áreas de berçário e de hábitat das fases neonata, jovem e adulta são atualmente necessidades urgentes de pesquisa para fundamentar o manejo e conservação de tubarões (NMFS, 1998). A proteção dos berçários é de crucial importância para preservar as populações destes animais, pois a manutenção de um tamanho adequado da parcela reprodutiva destas depende diretamente de uma baixa mortalidade dos indivíduos jovens (Simpfendorfer & Milward 1993). Também existem evidências de que áreas protegidas por reservas marinhas podem ser importantes para a manutenção das populações de uma mesma espécie em localidades adjacentes (Mc Clanahan & Kaunda-Arara, 1996; Mc Clanahan, 1997). Deste modo, o berçário de Carcharhinus perezi situado dentro Parque Nacional Marinho do arquipélago de Fernando de Noronha pode ser importante para manutenção do estoque desta espécie em parte da região nordeste do Atlântico sul. Carcharhinus perezi foi uma das mais exploradas comercialmente entre 1992- 1997 pela empresa de pesca artesanal de tubarões Noronha Pesca Oceânica (NPO). A espécie representou 59% do total de 674 tubarões capturados durante os 23 meses nos quais os desembarques foram registrados (NPO, dados não publicados). Durante este período também foi verificado um declínio na freqüência de observações PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 7 subaquáticas de Carcharhinus perezi, especialmente dos indivíduos adultos (Leonora Fritzsche, Hidrosfera Produções Submarinas, comunicação pessoal). A pesca, mesmo que moderada, pode causar declínio na abundância e no número de espécies de tubarões costeiros (Walker, 1998). Isso ocorre porque vários aspectos populacionais dos tubarões, incluindo crescimento lento, maturidade sexual tardia, baixa fecundidade e alta longevidade, limitam a capacidade destes animais de se recuperar frente à exploração pesqueira excessiva ou outros impactos negativos (Branstetter, 1990; Hoenig & Gruber, 1990; Pratt & Casey, 1990). Os estudos sobre biologia da conservação geralmente associam conhecimentos sobre várias áreas da biologia e o uso conjunto de várias metodologias. Este tipo de abordagem tem sido bem sucedido na realização de estudos direcionados à preservação tanto de animais terrestres como felinos (Crawshaw, 1995; Rabinowitz, 1997) quanto animais marinhos como golfinhos (Pichler et al., 1998) e tubarões (Gruber, 1982; Nelson, 1990; Heist, 1996). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 8 Figura 1. Carcharhinus perezi jovem medindo aproximadamente 90 cm na Ressurreta, arquipélago de Fernando de Noronha (foto: Daisy Brisolla). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 9 Figura 2 A: Localização do arquipélago de Fernando de Noronha (FN) e demais localidades mencionadas no trabalho: (GR) Atol Glover’s Reef; (PML) Parcel Manoel Luis; (SPSP) Arquipélago de São Pedro e São Paulo; (AR) Atol das Rocas; (T/MV) Ilhas da Trindade e Martim Vaz (modificado a partir de Rocha & Rosa, 2001). B: Perfil batimétrico e delimitação das Unidades de Conservação existentes no arquipélago: APA – Área de Proteção Ambiental e PARNAMAR – Parque Nacional Marinho (com base na carta náutica No52 Do DHN da Marinha do Brasil). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 10 Figura 2. Ginglymostoma cirratum jovem medindo aproximadamente 170 cm nas Pedras Secas (foto: Daisy Brisolla). Figura 3. Negaprion brevirostris neonato medindo aproximadamente 65 cm nas piscinas-de-maré da Enseada das Caieiras (foto: Marta Granville). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 11 1.2. Objetivos 1.2.1. Objetivo geral O presente trabalho visa gerar informações sobre a ecologia e situação populacional de Carcharhinus perezi, Ginglymostoma cirratum e Negaprion brevirostris no arquipélago de Fernando de Noronha. 1.2.2. Objetivos específicos 1) Descrever a estrutura populacional e determinar quais as classes de tamanho que compõem a população destas espécies no arquipélago; 2) Determinar a distribuição espacial das diferentes classes de tamanho desta população ao redor do arquipélago; 3) Determinar a época de parto e localização das áreas de berçário no arquipélago; 4) Determinar os padrões de movimentação, atividade e uso do hábitat dos tubarões jovens no arquipélago; 5) Verificar se os tubarões jovens são residentes na região do arquipélago e se estes apresentam alta fidelidade local; 6) Verificar a ocorrência de eventuais mudanças sazonais na utilização do espaço pelos tubarões jovens; 7) Implementar programas educacionais para a população local, enfocando a importância ecológica dos tubarões e a necessidade de conservá-los; 8) Utilizar as informações produzidas para fundamentar estratégias para a conservação de Carcharhinus perezi e as outras espécies de tubarões do arquipélago. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 12 A seguir, a introdução geral aborda a descrição da área de estudo. Subseqüentemente, a revisão bibliográfica trata de temas pertinentes a execução do trabalho, como a estruturação das populações de tubarões, técnicas de marcação e liberação, utilização de áreas de berçário por tubarões, aplicação de telemetria ultra- sônica, manejo e conservação destes animais e caracterização geral das espécies estudadas. Do ponto de vista metodológico, o presente trabalho é subdividido em três partes complementares: • A primeira parte tem como objetivo descrever a estrutura populacional de Carcharhinus perezi no arquipélago de Fernando de Noronha através de um programa de marcação e liberação. Nesta parte são abordados aspectos sobre a estrutura populacional, estimativa do tamanho populacional, distribuição espacial e a utilização do arquipélago como berçário pela espécie. São também apresentados os resultados referentes às outras duas espécies de tubarões capturadas ao longo do estudo, Ginglymostoma cirratum e Negaprion brevirostris. • A segunda parte visa determinar os padrões de movimentação, de atividade e de utilização do hábitat pelos tubarões através do monitoramento automatizado com receptores de telemetria ultra-sônica; • A terceira parte descreve as atividades de conscientização e educação realizadas junto à comunidade do arquipélago, analisa as implicações e a problemática para o manejo de Carcharhinus perezi e das outras espécies de tubarões no local, apoiando-se nos resultados obtidos sobre a estrutura populacional, distribuição, movimentação e ecologia para fundamentar recomendações viáveis para a conservação das espécies; • Uma quarta parte, apresentada em um capítulo separado, trata da caracterização sorológica do plasma sanguíneo de Carcharhinus perezi, Ginglymostoma cirratum e Negaprion brevirostris. Adicionalmente, é feita uma revisão sobre o uso de análises sanguíneas na avaliação dos efeitos fisiológicos do estresse em peixes. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 13 1.3. Descrição da área de estudo 1.3.1. Características naturais O arquipélago de Fernando de Noronha consiste num grupo isolado de ilhas vulcânicas, localizado na região nordeste do Brasil nas coordenadas 3o 51’ S e 32o 25’ W, distante 545 km de Recife, capital do Estado de Pernambuco e 360 km de Natal, capital do Estado do Rio Grande do Norte (Figura 2A). Originadas por processos vulcânicos relativamente modernos, que ocorreram entre dois e 12 milhões de anos, as ilhas que formam o arquipélago representam o que resta do topo de um vasto cone vulcânico, cuja base está localizada a cerca de 4.000 metros de profundidade e possui um diâmetro de 60 km. Este cone vulcânico é parte da Dorsal Mediana do Atlântico, uma cadeia de montanhas submersas que divide ao meio o oceano Atlântico, desde a Antártida até o Ártico, numa extensão de mais de 15.000 km (Ferreira, Jesus & Silva, 1990). Constituído por 21 ilhas, rochedos e ilhotas, o arquipélago possui uma área total de 26 km2. A ilha principal está orientada na direção nordeste-sudoeste, medindo 9 x 6 km e ocupando uma área de 17 km2 (Ferreira et al., 1990; http://www.ibama.gov.br; http://www.noronha.pe.gov.br, abril de 2003). O arquipélago está sob influência de uma, possivelmente duas importantes correntes marinhas, a corrente Sul Equatorial, que é responsável pelas águas claras, quentes (26-27oC) e com salinidade em torno de 36, e provavelmente a corrente Equatorial Atlântica, que é originada longe da costa nordeste brasileira, fluindo por baixo e em sentido oposto à corrente Sul Equatorial (Eston et al., 1986). A água é clara praticamente o ano todo, o que torna o arquipélago um local muito procurado para a prática do mergulho recreativo (http://www.noronha.com.br, abril de 2003). O clima é tropical oceânico com duas estações bem definidas: uma estação chuvosa de janeiro a junho e uma seca no restante do ano. A pluviosidade média anual é de 1.300 mm, com os maiores índices entre março e junho e estiagem entre agosto e janeiro. Não existem cursos d’água perenes no arquipélago. As pequenas bacias, a reduzida capacidade de retenção de água do solo e o clima de acentuada estiagem propiciam riachos, lagoas e cachoeiras apenas temporários. A temperatura média anual é de 25oC, com amplitude em torno de quatro graus, sendo janeiro, fevereiro os meses mais quentes. A umidade relativa do ar é constante, com média PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 14 anual de 81% e insolação média máxima no mês de novembro (312,5 h) e mínima em abril (216,8 h) (Ferreira et al., 1990). Os ventos alísios predominam durante a maior parte do ano, com direção E, SE, ESE e velocidade média de 6,6 m/seg, com as maiores intensidades entre julho e agosto. Estes ventos atingem o lado sudeste do arquipélago (face barlavento), conhecido como Mar de Fora, gerando ondas com forte arrebentação e condições de mar agitadas durante a maior parte do ano. Entre novembro e março ocorre uma mudança no regime de ventos que passam a soprar na direção W, SW e WSW. Durante toda esta época são freqüentes os períodos de fortes ondulações na face sotavento do arquipélago (Mar de Dentro) e de calmaria no Mar de Fora (Eston et al., 1986; Maida & Ferreira, 1997). As marés são semi-diurnas com amplitude de 3,2 m durante as marés de sizígia (luas cheia e nova) e 2,0 m nas marés de quadratura (luas crescente e minguante) (Eston et al., 1986). Na região voltada para o Mar de Dentro a plataforma insular (com profundidades inferiores a 50 m) é estreita, enquanto que na face voltada para o Mar de Fora esta é bastante extensa. O traçado da costa apresenta paredões íngremes, pontas, reentrâncias, platôs, costões rochosos e praias de seixos rolados ou de areia. Na região voltada para o Mar de Dentro a plataforma insular (com profundidades inferiores a 50 m) é estreita, enquanto que na face voltada para o Mar de Fora esta é bastante extensa (Figura 2B) (Ferreira et al., 1990). Os costões rochosos situados no Mar de Fora sofrem a ação das ondas durante a maior parte do ano. A principal característica desta face do arquipélago é a presença de extensas barreiras de recifes formadas por concreções de algas calcáreas melobésias (Melobesioideae) e moluscos vermetídeos (Petaloconchus sp. e Dentropoma sp.) (Laborel & Kempf, 1965; Eston et al., 1986; Maida & Ferreira, 1997). Estes recifes podem ser considerados verdadeiras cristas algáceas. Desenvolvem-se contra a arrebentação das ondas podendo atingir até quatro metros de espessura, além de formar plataformas, franjas e terraços, que delimitam piscinas e lagunas (Laborel & Kempf, 1965). No Mar de Dentro os costões geralmente possuem inclinações suaves com presença de paredões rochosos e grandes blocos de pedra em fundo de areia. Nesta face do arquipélago grandes porções do substrato da zona entre-marés (0-2 m) são destituídas de macrorganismos, podendo formar-se ocasionalmente uma estreita crista recifal em alguns trechos (Eston et al., 1986). Entre dois e 15 m o substrato é PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 15 predominantemente coberto por vastos bancos de algas Dictyota sp. e Dictyopteris spp., várias espécies de esponjas, pequenas colônias dispersas de corais e populações de ouriços Diadema sp. e Tripneustes ventricosus. Entre 20 e 30 m ocorrem grandes cabeços isolados de corais Montastrea cavernosa. (Eston et al., 1986; Maida & Ferreira, 1997). A flora marinha de Fernando de Noronha (macrófitas e algas) não é abundante e diversificada quando comparada à costa brasileira, provavelmente devido à ausência de nutrientes básicos nas correntes que banham o arquipélago, quentes e empobrecidas de matéria orgânica (Ferreira et al., 1990). Algas pardas das famílias Dictyotaceae e Sargassaceae são dominantes em termos de biomassa e área ocupada (Eston et al., 1986). A ictiofauna local é composta por 99 espécies, sendo uma delas endêmicas do arquipélago e Atol das Rocas, a donzela Stegastes rocacensis (Moura & Rosa, 1997). Destaca-se a presença de grandes cardumes de sardinha Harengula clupeola, representantes das famílias Pomacentridae, Holocentridae, Haemulidae, Serranidae, Muraenidae, Sparidae, Acanthuridae, Carangidae, Labridae, Lutjanidae, Sphyraenidae, além dos elasmobrânquios (Moura & Rosa, 1997; Soto, 1997; Apêndice 1). O arquipélago é também área de desova e alimentação das tartarugas verde e de pente, Chelonia midas e Eretymocheles imbricatta respectivamente, e local de descanso e reprodução para o Golfinho-rotador, Stenella longirostris (Maida & Ferreira, 1997). 1.3.2. Delimitação das Unidades de Conservação existentes Em 14 de setembro de 1988 foi criado através do Decreto-Lei no 96.693, o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PARNAMAR) Os limites do PARNAMAR incluem cerca de 60% da ilha principal e toda a plataforma insular incluída dentro da isóbata dos 50 m de profundidade, com exceção de um trecho que vai desde o Porto até o Morro Dois Irmãos (Ferreira et al., 1990) (Figura 2B). O arquipélago de Fernando de Noronha conta, numa situação singular, com a coexistência de uma outra categoria de Unidade de Conservação do IBAMA, uma Área de Proteção Ambiental (APA). As APAs pertencem ao grupo de Unidades de Conservação de uso sustentável, o que as difere dos Parques Nacionais, rigidamente protegidos e onde fica proibido qualquer tipo de utilização de seus recursos. A APA de Fernando de Noronha inclui os 40% restantes da ilha principal e mais o trecho da PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 16 plataforma insular não incluído dentro da área do Parque Marinho (Ferreira et al., 1990) (Figura 2B). A APA de Fernando de Noronha enfrenta, atualmente, problemas decorrentes do uso conflitante que acabam por afetar a unidade em seu entorno. O principal problema enfrentado tem sido os depósitos de lixo, devido ao aumento dos resíduos urbanos produzidos pela população local, além de outros aspectos de poluição decorrente da ocupação humana (http://www.noronha.com.br, abril de 2003). Atualmente residem em Fernando de Noronha mais de 2.500 pessoas que dependem do turismo para a sua sobrevivência. Além do impacto socioeconômico gerado por esta dependência, o arquipélago possui limitada capacidade de suporte ambiental, não tolerando crescimento contínuo da ocupação humana. A ilha principal apresenta fortes alterações antrópicas. Houve ocupação desordenada, retirada de lenha, introdução de fauna e flora exóticas, construção de açudes, aeroporto e estradas, um grande aumento súbito da frota de veículos, acúmulo de lixo, exploração de dunas e de uma pedreira e destruição quase total do único manguezal do arquipélago. Atualmente existe também uma exploração comercial intensiva do mergulho recreativo e de passeios de barco para observação de golfinhos, além de uma crescente demanda interna de pescado (http://www.ibama.gov.br; http://www.noronha.com.br, abril de 2003). 1.3.3. Localidades de mergulho e pesca visitadas A seguir, são descritas as localidades visitadas na face sotavento do arquipélago (Mar de Dentro), com base na carta náutica No 52 do DHN da Marinha do Brasil e em observações subaquáticas (Figura 5, Página 25): 1. Cabeço da Sapata – grande aglomerado de pedras cuja base está a 42 m de profundidade e o topo a oito metros. Apresenta fundo arenoso e está situado no extremo sul do arquipélago, localização que faz com que haja uma considerável correnteza durante todo o ano. Baixa ocorrência de corais, sendo que o substrato apresenta principalmente outros organismos incrustantes, tais como algas e esponjas; 2. Ponta da Sapata – localizada no extremo sul do arquipélago, possui profundidade máxima de 28 m, fundo arenoso e presença de uma caverna com aproximadamente 20 m de desenvolvimento, cuja entrada está a 17 m de profundidade. À frente da caverna existem grandes blocos de rocha desmoronados PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 17 cobertos por algas e corais Montastrea cavernosa. Ao lado da caverna, há um paredão bastante inclinado, com poucas fendas e concavidades e grande ocorrência de ascídias coloniais e coral Pallythoa sp. Na base deste paredão existem grandes blocos de rocha sobrepostos, entre os quais ficam normalmente abrigados grandes cardumes de peixes. No fundo de areia (28 m) além dos blocos de rocha e cabeços de corais existe um grande “jardim” de enguias Heteroconger camelopardalis com centenas de indivíduos; 3. Naufrágio da Corveta – localidade onde naufragou a Corveta Ipiranga, cujo casco está em fundo arenoso, a 62 m. Este naufrágio ocorreu há aproximadamente 13 anos e, portanto, a quantidade de organismos incrustados, tais como ascídias e esponjas ainda é baixa em relação aos naufrágios mais antigos do arquipélago, como o do Porto e o da praia do Leão. Neste local são freqüentemente avistadas grandes raias prego e chita Dasyatis americana e Aetobatus narinari respectivamente, meros Epinephelus itajara, grandes cardumes de xáreus Caranx lattus, cavalas Scomberomorus spp. e arabaianas Seriola spp.; 4. Buracão – nesta localidade ocorrem grandes blocos de rocha desmoronados, que se encontram isolados e distribuídos de maneira esparsa sobre fundo arenoso ou de cascalho, em profundidades de cinco até 15 m. O topo das rochas geralmente é recoberto por coral Millepora alcicornis. Além dos 15 m predomina o fundo arenoso. Na faixa dos 20 m existe uma formação recifal isolada (~20 m2) coberta por corais M. cavernosa e outros organismos incrustantes, onde normalmente se concentram cardumes de peixes; 5. Zé Ramos – uma série de paredões rochosos íngremes, cujos topos são cobertos por coral Millepora alcicornis. Os cumes destes paredões ficam próximos a superfície, com as bases na areia (15 m), as quais apresentam convexidades em alguns trechos. Em outros trechos o declive dos paredões é mais suave, formando plataformas de fundo arenoso (entre cinco e 12 m) com presença de pequenas rochas e cabeços de coral M. cavernosa; 6. Laje Dois Irmãos – uma grande laje de rochas (~400 m2) sobre fundo arenoso, com profundidade máxima de 25 m e mínima de 14 m. Grande parte da laje é coberta por cabeços massivos de M. cavernosa. Também há grande ocorrência de algas Dictyota sp. e Dictyopteris spp., principalmente nas áreas mais abertas, com menos corais, ou seja, nas interfaces entre coral e areia. O local normalmente concentra grande quantidade de cardumes de peixes de médio a grande porte, PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 18 incluindo tubarões-cabeça-de-cesto Carcharhinus perezi. À frente da laje, a 25 m na areia, existe um “jardim” de enguias H. camelopardalis com centenas de indivíduos; 7. Boldró – praia arenosa com uma laje principal composta principalmente por algas calcárias, gastrópodes vermetídeos e outros organismos incrustantes. À esquerda da laje, existe um grande cabeço rochoso. Nos dois extremos da praia e em frente à laje e o cabeço existem vários blocos de rocha recobertos por algas e pequenas porções de recifes sobre o fundo de areia. Há cerca de dois anos atrás vários trechos da laje foram bastante danificados para instalação de um captador de água e pela construção de um duto de concreto na praia para abastecer o dessalinizador de água local; 8. Vinte Patacas – situada em frente à base do Morro do Pico, entre as praias do Boldró e da Conceição. Ocorrência de grandes blocos desmoronados e cabeços de rochas, recobertos por organismos incrustantes em profundidades de vão de cinco até 15 m. Existem dois cabeços maiores com base a cerca de 15 m, cujos cumes estão a cerca de cinco metros de profundidade e são recobertos por coral Millepora alcicornis; 9. Ilha do Morro de Fora – situa-se entre a praia do Meio e a praia da Conceição. Grande rochedo de origem vulcânica, com profundidades que variam de dois até 17 m. Grandes blocos de rochas sobrepostos, cobertos por algas e com baixa ocorrência de corais e porções recifais. Na região dos 17 m de profundidade, a cerca de 50 m de distância da base da ilha existem dois grandes cabeços cujos topos são cobertos por coral M. alcicornis e alguns blocos isolados de rochas sobre o fundo arenoso. Entre as rochas existem grandes espaços onde cardumes de peixes ficam abrigados; 10. Praia da Biboca – praia de seixos rolados. Numa grande extensão desta localidade o fundo é recoberto por algas pardas, onde se forma uma linha, paralela à costa, de blocos e platôs rochosos recobertos por algas. Nas bases das rochas e platôs existem fendas e túneis interconectados que formam vários abrigos e tocas. A profundidade varia de três a seis metros; 11. Bóia do Funchal – localidade anteriormente utilizada como base de ancoragem do navio Funchal durante cruzeiros de veraneio. Pequena laje de pedras com sulcos sinuosos e poucos trechos de recife, cobertos por algas e organismos incrustantes sobre fundo arenoso, entre 15 e 17 m de profundidade; PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 19 12. Naufrágio do Porto – embarcação grega desmantelada com profundidade média de seis metros sobre fundo rochoso, algas e areia situada à frente do Porto de Santo Antônio (3-9 m). A água nesta localidade geralmente não é tão clara como nos outros lugares, apesar de se tratar de um local sem muitas correntes. As partes da embarcação foram colonizadas por grande quantidade de organismos incrustantes e entre as ferragens normalmente concentra-se grande quantidade de cardumes de peixes; 13. Anpesca – praia de seixos rolados em frente ao galpão da Associação Noronhense dos Pescadores (Anpesca). Situada na região do Porto Santo Antônio, adjacente à porção externa do molhe de pedra que constituí o cais de atracação. Após a região dos seixos, o fundo é coberto por algas com ocorrência de pequenas pedras isoladas e pequenos trechos recifais (um a dois metros de profundidade). Entre dois e quatro metros existem vários trechos de fundo arenoso, coberto por algas e pequenas plataformas e depressões, cujas bases possuem grande quantidade de tocas e fendas interconectadas. Entre quatro e 12 m ocorrem pequenas depressões recobertas por algas e lajes de rocha esparsamente distribuídas sobre fundo de areia ou recoberto por algas. Atualmente existe uma grande população de ouriços-brancos Tripneustes ventricosus que praticamente removeu a extensa cobertura de algas que havia neste trecho e ocupou a grande maioria de abrigos que antes normalmente concentravam cardumes de peixes; 14. Ilha da Viuvinha – rochedo de origem vulcânica, com pequena quantidade de organismos incrustantes, cuja base está a 12 m em fundo arenoso. Possui uma caverna rasa na base, cujo desenvolvimento não ultrapassa cinco metros; 15. Porção da Ilha São José voltada para Ilha do Meio – rochedo de origem vulcânica com paredão íngreme cuja base está sobre fundo arenoso a 16 m. À frente desta porção existem pequenas lajes de rochas esparsas sobre o fundo de areia; 16. Ilha Sela Gineta – constituída por um imenso rochedo de origem vulcânica, cuja base está a 15 m em fundo arenoso. Grande quantidade de sargaços e poucos corais e a água é relativamente turva quando comparada a outras localidades do arquipélago; 17. Ilha do Meio – ilha com formação de túneis e cavernas. Sua base está a uma profundidade média de 15 m sobre o fundo arenoso. A grande ocorrência de concavidades na rocha propicia uma alta concentração de esponjas e ascídias, sendo PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 20 esta uma das localidades mais diversificadas quanto à ocorrência de pequenos organismos incrustantes e grande quantidade de pequenos peixes; A Ilha Rata, a segunda maior ilha do arquipélago, apresenta várias localidades, incluindo baías abrigadas e paredões com inclinações suaves e abruptas. Nesta ilha foram visitadas as seguintes localidades: 18. Buraco das Cabras – início na Ilha Rata (Mar de Fora) em direção ao Mar de Dentro pelo canal entre a Ilha Rata e a Ilha do Meio. Trecho relativamente homogêneo, com rochas pequenas, cobertas por algas filamentosas e poucas algas pardas (10 m), com poucas esponjas; a seguir, um trecho mais fundo (14 m) arenoso e com rochas maiores esparsas, formando pilares irregulares com muitas concavidades e organismos incrustantes; o último trecho (antes de chegar na Ressurreta) apresenta pedras pequenas, areia e algas filamentosas, algas pardas (Dyctiota sp., Stypopodium sp., Padina sp. e Sargassum sp.) (9 m); 19. Ressurreta – é uma baía de águas tranqüilas, com fundo arenoso e profundidade máxima de seis metros. As margens rochosas são suavemente inclinadas ou íngremes e com grande ocorrência de organismos incrustantes, tais como algas calcárias, esponjas, ascídias e algas pardas. Em alguns locais, são encontradas cavernas rasas cujo desenvolvimento não ultrapassa os cinco metros, onde normalmente são avistados cardumes de peixes. Afastando-se do a região das cavernas (costeira), o fundo da baía apresenta grandes concentrações de algas pardas Dictyopteris spp. sobre fundo arenoso ou de cascalho; 20. Canal da Ilha Rata – este canal apresenta fortes correntes, que geralmente se dirigem do Mar de Fora para o Mar de Dentro. A profundidade é de cerca de 15 m, com fundo arenoso. Sobre a areia existem formações recifais e rochosas lineares e contínuas, tornando o local mais abrigado das correntes do canal. Seguindo próximo às margens, é possível alcançar a Ilha do Meio. Estas formações possuem características diferentes, tendo a região mais próxima à Ilha Rata feições semelhantes à Ressurreta, com grande ocorrência de algas pardas. À medida que se distancia da Ilha Rata, as formações tornam-se mais altas e complexas, com maior ocorrência de algas calcárias, grande concentração de tocas e cavernas rasas interconectadas (desenvolvimento inferior a cinco metros), esponjas, ascídias e corais M. cavernosa; 21. Cagarras Rasas – situada ao lado da localidade Cagarras Fundas, esta região é mais abrigada e mais rasa, com profundidades entre 12 e 24 m. Apresenta PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 21 grandes rochas cobertas principalmente por algas pardas e algumas regiões com M. cavernosa e Millepora alcicornis; 22. Cagarras Fundas – paredão levemente inclinado e abrigado, com profundidade máxima de 32 m e fundo arenoso. Nesta localidade, há uma grande concentração de corais M. cavernosa, algas calcárias e algas pardas. No fundo arenoso, encontra-se uma grande concentração de esponjas leuconóides onde sempre são avistados neons limpadores Elacatinus sp; 23. Ponta do Cação – representa a porção direita da baía do Buraco do Inferno, em direção às Cagarras Fundas. Apresenta grandes rochas em fundo plano com areia e algas pardas, seguido por trecho com grandes formações rochosas que originam paredões e grandes cabeços com muitos organismos incrustantes. Estes cabeços têm início à aproximadamente oito m de profundidade com as bases na areia. A profundidade do local varia de 8 a 25 m (areia); 24. Buraco do Inferno – é uma baía com águas abrigadas e o fundo arenoso, com profundidade média de 15 m. As margens são inclinadas e, um pouco distante destas, observa-se a ocorrência de rochas desmoronadas com organismos incrustantes e grande quantidade de algas pardas Sargassum sp., Dyctiota sp. e Stypopodium sp. Afastando-se mais da costa em direção à porção central da baía, encontram-se entre 15 e 20 m grandes concreções rochosas em forma de cogumelos achatados sobre fundo arenoso, denominadas chapeirões. Estas formações são cobertas por grande quantidade de organismos incrustantes e abrigam vários cardumes de peixes sob sua base. A porção distal da baía, próxima ao local de acesso à mesma, é formada por grandes trechos de fundo arenoso e porções isoladas de pequenas rochas cobertas por organismos incrustantes e algas pardas, em profundidades que vão até 25 m; 25. Pontal do Norte – cabeço de rochas de origem vulcânica cujo topo está a 15 m e a base a 42 m de profundidade máxima, em fundo arenoso. Grande parte das rochas está coberta por algas e corais M. cavernosa e M. coralina; A seguir, são descritas as localidades amostradas na face barlavento do arquipélago (Mar de Fora) (Figura 5): 26. Buraco da Raquel – trata-se de uma laguna, ou seja, um lago de águas salgadas que se forma no interior de um recife. Na região costeira defronte à laguna existe um grande arco de pedra que deu a origem ao nome da localidade. Esta região PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 22 da laguna também é chamada de “Alagado” pelos ilhéus. Tal laguna é protegida durante a maré baixa, delimitada por uma grande barreira recifal interrompida em vários locais, limitando a área interna e o Mar de Fora, com duas barretas de acesso principais. O interior desta última apresenta fundo arenoso, porções de recife e rochas isoladas e trechos cobertos por algas. Alguns trechos do fundo próximos aos recifes que margeiam a praia da laguna são totalmente recobertos por Sargassum sp. A profundidade máxima é ao redor de quatro metros durante a maré cheia. Neste local geralmente são observados animais de grande porte, tais como dentões, cardumes de carangídeos e piragicas Kyphosus sp., tubarões-limão Negaprion brevirostris com mais de dois metros de comprimento e tartarugas verde e de pente. Em um dos trechos costeiros da laguna existe uma reentrância que forma uma pequena baía de fundo rochoso, com sulcos e depressões rasas, além de uma pequena praia de seixos rolados com pequenas porções de areia. Durante a maré baixa o local fica totalmente seco, com a formação de poucas piscinas-de-maré que não ultrapassam 60 cm de profundidade. Na maré cheia o trecho mais fundo, próximo ao canal de acesso à baía, tem cerca de 1,5 m profundidade e vai diminuindo suavemente até a praia. Tubarões- limão podem ser avistados nadando vagarosamente em toda a extensão desta baía, sendo possível observar suas nadadeiras dorsais e caudais totalmente expostas quando os indivíduos maiores (≥2 m) passam na beira da praia, a menos de 50 cm de profundidade; 27. Enseada das Caieiras – uma das maiores enseadas da ilha principal, com águas claras, fundo de areia relativamente plano e profundidade média de 10 m. Ocorrem lajes esparsas de pedra, rochas isoladas e trechos cobertos por algas. Na região mediana da enseada existem duas grandes lajes de pedra vizinhas uma da outra, indicadas por dois cabeços rochosos que ficam com os cumes parcialmente expostos durante a maré baixa. As rochas destas lajes são recobertas por algas e outros organismos incrustantes e normalmente concentram peixes de médio a grande porte, incluindo tubarões. A linha costeira desta enseada apresenta uma das maiores extensões contínuas de cristas recifais do arquipélago, que crescem paralelas à costa, podendo atingir até quatro metros de espessura e formam plataformas, franjas e terraços, que delimitam várias piscinas. A superfície da maioria dos recifes é recoberta por algas não calcificadas e outros organismos incrustantes. As piscinas podem ser isoladas durante a maré baixa, ou possuírem pequenas barretas de acesso ou túneis submersos, que estabelecem comunicação com as águas da enseada. Durante a maré baixa, as piscinas podem aprisionar grandes cardumes de sardinhas Harengula PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 23 clupeola, cardumes de peixes jovens pertencentes à várias famílias (hemulídeos, carangídeos, acanturídeos, pomacentrídeos) além de tubarões neonatos, estes últimos avistados principalmente durante a época de nascimentos, entre novembro e abril. A base da borda externa dos recifes, voltada para a enseada, possui águas turvas e é totalmente recoberta por algas pardas. Nesta localidade o mar é agitado durante a maior parte do ano; 28. Pontinha – península rochosa que corresponde a um dos limites extremos da Enseada das Caieiras. É um paredão rochoso, cuja ponta assemelha-se a um pequeno talude de declive suave, com topo a 12 m e base sobre fundo de areia a 20 m de profundidade. As condições de mar são normalmente bastante agitadas neste local. A face da península voltada para a Enseada das Caieiras forma um local mais abrigado do vento, com fundo rochoso e profundidade média de 12 m; 29. Pedras Secas – aglomerado de rochas vulcânicas, cuja base está a 15 m de profundidade. Os cumes destas rochas são emersos, podendo ficar totalmente expostos e secos durante a maré baixa nas épocas de mar calmo. O fundo é arenoso, coberto por partículas de origem calcária (algas calcárias, pequenos ossos e conchas) que torna sua coloração mais clara. Existem túneis, um vale estreito com paredes abruptas e um grande arco de pedras vulcânicas, onde é grande a quantidade de esponjas coloridas e outros organismos incrustantes (hidrozoários e algas calcárias). Esta formação normalmente concentra grande quantidade de cardumes de peixes. O mar é normalmente bastante agitado; 30. Pedra Alta – é um costão rochoso localizado entre a Pontinha e Praia da Atalaia. Ocorrência de um declive rochoso com topo a 12 m e base a 20 m, com fundo arenoso e presença de rochas isoladas. As condições de mar são normalmente agitadas; 31. Abreu – baía com margens rochosas, com fundo arenoso e profundidade média de oito a 10 m. Observa-se a ocorrência de blocos de rocha isolados que são cobertos por algas e baixa ocorrência de corais. Algumas rochas apresentam reentrâncias formando pequenas cavernas; 32. Baía do Sueste – baía com praia arenosa e águas relativamente turvas, cujas bordas laterais são delimitadas por paredões, plataformas e praias de seixos. A barreta principal de acesso da baía é formada pela porção direita da mesma e a Ilha do Chapéu, com profundidade média de seis metros e fundo de areia. Existe também uma segunda barreta formada pela Ilha do Chapéu e pela porção esquerda da baía, PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 24 com profundidade média ao redor de três metros e fundo com presença de cascalho, rochas e lajes que originam cavernas rasas cobertas por algas e organismos incrustantes. As lajes da barreta, as plataformas, paredões e a Ilha do Chapéu são de origem sedimentar arenítica. Durante a maré baixa e a enchente, na porção esquerda da baía antes da barreta rasa, é possível avistar o dorso de tubarões-limão de várias classes de tamanho (65 cm até 250 cm) nadando próximos à beira das praias de cascalho e das bordas das plataformas, em profundidades inferiores a 50 cm. Nesta baía encontra-se a única ocorrência de mangue em ilha oceânica do Atlântico Sul, ocupando uma área de 1500 m2 e formada por uma única espécie vegetal Laguncularia racemosa (Maida & Ferreira, 1997). 33. Iuias – cabeço rochoso formado por imensas rochas desmoronadas e espaços entre elas, que formam uma grande rede de túneis e cavernas interconectadas que geralmente concentram grande quantidade de cardumes. A profundidade varia de oito a 22 m. Logo à frente há um paredão rochoso vertical atingindo cerca de 40 m até o fundo arenoso; 34. Prego – O Prego é um pequeno penhasco rochoso com aproximadamente cinco metros de altura, situado na porção proximal do lado direito da península da Ponta das Caracas. A partir deste penhasco o costão desenvolve-se numa extensa plataforma de rochas vulcânicas com vários sulcos e piscinas. A partir das bordas da plataforma descem paredões quase verticais até o fundo de areia, entre três e nove metros de profundidade. Em trechos isolados formam-se cristas recifais nas bordas da plataforma e nas encostas e bases dos paredões. O fundo em frente a este costão é arenoso, com grande quantidade de algas pardas, além de rochas, pequenas lajes e recifes isolados; 35. Ponta do Capim-Açu – costão rochoso em declive com fundo de areia e rochas isoladas cobertas por algas, com baixa ocorrência de corais M. coralina e M. cavernosa. Próximo ao costão a profundidade é de cinco metros, atingindo 22 m no fundo de areia. Após esta parte rasa há um paredão rochoso íngreme que chega até 50 m e em seguida, outro desnível que atinge 90 m. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 25 Figura 5. Localidades amostradas no arquipélago de Fernando de Noronha. APA: Área de Proteção Ambiental; PARQUE: Parque Nacional Marinho. PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 26 2. REVISÃO DA LITERATURA PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 27 2.1. Estrutura populacional Toda a terminologia ecológica utilizada ao longo da revisão bibliográfica é mencionada conforme Ab’Saber et al. (1997). Uma população pode ser definida como qualquer grupo de organismos da mesma espécie que ocupa uma dada área e funciona como parte de uma comunidade biótica. Algumas características da população tais como a natalidade, a mortalidade, a distribuição etária, a razão sexual e a dispersão desempenham um importante papel na compreensão de como as populações mudam ao longo do tempo. As proporções entre os vários grupos etários determinam, por exemplo, o estado reprodutivo atual da população e indicam o que poderá ser esperado no futuro em termos de crescimento (Odum, 1983). No caso dos peixes, a estruturação por tamanho pode afetar a regulação de uma população, pois a presença de diferentes classes etárias num mesmo local proporciona a possibilidade de competição intra-específica e canibalismo, que por sua vez, levam a diferenças no uso do hábitat e de outros recursos devido a evitação de um grupo pelo outro (Helfman, Collette & Facey, 1997). Peixes de ampla distribuição geográfica, como os tubarões, podem apresentar variações em uma série de parâmetros quando populações de uma mesma espécie são analisadas em áreas distintas. Por exemplo, duas populações do tubarão-martelo Sphyrna tiburo apresentaram diferenças na estrutura etária, no tamanho e na idade de maturação, no tempo de gestação e no comprimento total dos neonatos (Parsons, 1993). Outros fatores, tais como a organização social, também influenciam a estrutura de uma população nas diferentes áreas de ocorrência de uma espécie. Nas espécies com organizações sociais mais desenvolvidas, como os tubarões Carcharhinidae e Sphyrnidae, os machos e as fêmeas sexualmente maduros e os jovens de ambos os sexos permanecem separados durante a maior parte dos seus ciclos de vida. Os jovens geralmente nascem e crescem em berçários localizados em pontos discretos da distribuição da espécie, ou em águas rasas pouco freqüentadas pelos adultos. Assim, cada segmento da população ocupa uma região geográfica ou um tipo de hábitat mais ou menos distinto. Esta tendência em segregar por tamanho é praticamente universal entre os tubarões, pois em circunstâncias normais, os PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 28 indivíduos de tamanho semelhante geralmente demonstram pouca agressividade uns com os outros (Springer, 1967). Em certas espécies a segregação sexual pode ser determinada pelo tipo de estratégia de desenvolvimento embrionário. As fêmeas de tubarões vivíparos placentotróficos como os tubarões-martelo Sphryna lewini, conforme crescem, vão para locais mais afastados da costa onde intensificam sua alimentação e atingem o tamanho de maturidade mais rápido que os machos. Ambos os sexos tornam-se sexualmente maduros com aproximadamente a mesma idade, mas as fêmeas são maiores. O maior tamanho das fêmeas aumenta a fecundidade e o sucesso reprodutivo das mesmas, que precisam de um tamanho maior para que o corpo possa acomodar os embriões e acumular reservas energéticas que serão usadas na gestação (Klimley, 1987). Dessa forma, a segregação sexual nos tubarões vivíparos placentotróficos pode refletir na estrutura etária e na razão sexual, entre outros parâmetros, que irão variar de acordo com a profundidade ou com a área geográfica ocupada por cada segmento da população. Por outro lado, tubarões ovíparos com hábitos mais lentos e bentônicos geralmente não apresentam separação e ambos os sexos maturam com tamanhos semelhantes. Isso porque a demanda energética da oviparidade é possivelmente menor que a da viviparidade (Klimley, 1987). Em alguns casos os machos apresentam maior dispersão que as fêmeas (Pardini et al., 2001; Feldheim, Gruber & Ashley, 2002), realizando extensas migrações a partir de uma certa idade. Um dos possíveis reflexos deste comportamento na estrutura populacional é uma menor quantidade de machos dentro das classes de tamanho maiores e desvios na razão sexual dentro destas classes. A atual exploração indiscriminada dos tubarões também pode resultar em alterações na estrutura populacional como conseqüência da pesca excessiva, tais como uma diminuição no tamanho populacional, e mudanças na estrutura etária e em parâmetros como fecundidade e taxas de crescimento e mortalidade (Stevens et al., 2000). Uma variedade de estudos populacionais de tubarões já foi feita, enfocando a estrutura das populações de uma ou várias espécies (Stevens, 1984; Casey & Kohler, 1992; Stevens, West & Mc Loughlin, 2000; Heithaus, 2001), a demográfia (Cailliet, 1992; Cailliet et al., 1992), idade e crescimento (Lessa et al., 1999 b), e estrutura genética (Heist, 1996; Heist, Musick & Graves, 1996; Heist, 1999; Feldheim, Ashley & Gruber, 2001). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 29 2.2. Marcação e liberação de tubarões Os primeiros estudos de marcação e liberação de peixes foram feitos com salmões Salmo salar por volta de 1600. Desde esta época até os dias atuais mais de 25 tipos de marcas externas para peixes já foram desenvolvidas, incluindo o uso de corantes, tatuagens, queimaduras feitas por calor ou por frio, mutilação de nadadeiras e uso de caracteres morfológicos e cromáticos (Gruber, 1982; Carrier, 1985; Wydoski & Emery, 1992). Atualmente o tipo de marca mais comum é o subcutâneo, com uma estrutura que penetra a pele ou tecidos musculares e permanece ancorada nestes, além de um componente externo para reconhecimento dos animais (Bergman, et al., 1992). Os estudos de marcação e liberação de peixes podem fornecer informações sobre comportamento, composição de espécies, classes de tamanho, razão sexual, distribuição espacial e temporal, delineamento de áreas de nascimento e de berçário, distribuição dos intervalos reprodutivos e abundância relativa (Anderson & Gutreuter, 1992; Wydoski & Emery, 1992). A identificação de tubarões através do uso de marcas externas é um valioso método para o estudo de vários aspectos da história de vida, da migração, da movimentação e da estrutura populacional. Marcas externas convencionais são aquelas que podem ser identificadas visualmente sem a utilização de equipamentos especiais de detecção. A possibilidade de detectar a presença de indivíduos ou de grupos destes em um determinado período ou local através da marcação constitui uma importante ferramenta para o manejo, sendo um dos métodos mais baratos, confiáveis e diretos na obtenção de dados para o estudo das populações de tubarões (Kohler & Turner, 2001). Marcas externas podem ser utilizadas para pronto reconhecimento de tubarões específicos em estudos comportamentais, para determinar a estabilidade de um grupo e para acompanhar mudanças em sua composição e tamanho ao longo do tempo (Klimley & Nelson, 1984; Strong et al., 1992; Bruce, 1992). Combinações de diferentes tipos de marcas, cores e padrões podem permitir a distinção de indivíduos ou de um determinado ano ou localidade de marcação (Pratt & Casey, 2001). As migrações sazonais realizadas por tubarões são primariamente influenciadas por flutuações de temperatura e mudanças ambientais e já foram demonstradas através de marcação para várias espécies de Carcharhinidae (Springer, 1967; Springer & Gold, 1989; Stevens, West & McLoughlin, 2000). A fidelidade a determinados locais, a habilidade PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 30 em retornar a pontos específicos e o tamanho da área de vida também já foram demonstrados para tubarões através de estudos de marcação combinados ou não a técnicas de telemetria ultra-sônica (Gruber, Nelson & Morrissey, 1988; Morrissey & Gruber, 1993 a, b; Stevens, 1984; McKibben & Nelson, 1986). Experimentos envolvendo marcação podem ser elaborados para validar parâmetros de idade e crescimento, padrões de residência e fidelidade espacial, tempo de residência, taxas de dispersão, identificação e composição da captura comercial, interações entre as espécies capturadas, alterações nos padrões de captura, seletividade dos equipamentos de captura, identificação de estoques pesqueiros, taxa de exploração sustentável destes últimos, estrutura e tamanho populacional, taxas de movimentação, de abundância, mortalidade, sobrevivência e recrutamento, além da taxa de perda das marcas e de sobrevivência de indivíduos transplantados ou criados em cativeiro (Carrier, 1985; Cailliet, 1990; Cailliet, 1992; Cailliet et al., 1992; Casey & Kohler, 1992; Heupel, Simpfendorfer & Bennet, 1998; Natason et al., 1999; Xiao, Stevens & West, 1999; Kohler & Turner, 2001). Até o momento já foram realizados cerca de 64 estudos de marcação e liberação direcionados aos tubarões. Os primeiros destes estudos tiveram início no final da década de 20 na Europa e envolviam somente pesquisadores. A partir da década de 50 surgiram os primeiros programas cooperativos de marcação de tubarões que envolvem a participação conjunta de pesquisadores e voluntários (Kohler & Turner, 2001). O principal programa de marcação e liberação do oceano Atlântico é o Programa Cooperativo de Marcação de Tubarões do Serviço Nacional Marinho e de Pesca dos EUA (http://na.nefsc.noaa.gov/sharks/index.html, abril de 2003). O Programa Cooperativo de Marcação de Tubarões surgiu em 1962, com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre a biologia dos tubarões do oceano Atlântico devido a uma série de ataques ocasionados por estes peixes na costa do Estado de Nova Jersey nos EUA. Atualmente conta com mais de 6.500 participantes distribuídos ao longo do oceano Atlântico, incluindo países das Américas e Europa e já realizou a marcação de mais de 113.000 tubarões pertencentes a 31 espécies. Também foram produzidas importantes informações sobre a composição e movimentação dos estoques, distâncias percorridas e número de dias em liberdade para várias espécies, incluindo aquelas mais exploradas pela pesca comercial e recreativa (Kohler, Casey & Turner, 1998; Kohler & Turner, 2001). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 31 Várias espécies de tubarões realizam deslocamentos extensos e migrações da ordem de centenas e até mesmo milhares de quilômetros. Baseado em dados de marcação e recaptura, os tubarões podem ser classificados em locais, costeiros e oceânicos. Espécies locais incluindo o tubarão-cabeça-chata Carcharhinus leucas, o lambarú ou tubarão-lixa Ginglymostoma cirratum, e o tubarão-martelo Sphyrna tiburo, passam a maior parte de seu ciclo de vida adulto em áreas de centenas de quilômetros quadrados em trechos relativamente confinados e próximos à costa. Espécies costeiras como o tubarão-galhudo Carcharhinus plumbeus, o tubarão-galha- preta Carcharhinus limbatus, e o tubarão-fidalgo Carcharhinus obscurus, permanecem próximos das plataformas continentais, mas podem percorrer distâncias de aproximadamente 1.600 km ou mais. O tubarão-galhudo, por exemplo, desloca-se desde a região norte da costa leste dos EUA até a península de Yucatan no México, localizada a 5.600 km de distância. Enquanto isso, as espécies oceânicas podem cruzar bacias oceânicas inteiras. As maiores distâncias percorridas em linha reta por espécies oceânicas no Atlântico norte foram 6.000 km para o tubarão-azul Prionace glauca, 4.000 km para o anequim Isurus oxyrinchus, e 2.500 km para o tubarão-galha- branca-oceânico Carcharhinus longimanus. Adicionalmente, o tubarão-azul e o anequim podem fazer circunavegações continentais, realizando viagens de ida e volta entre a América do Norte e Europa (Casey & Kohler, 1992; Kohler & Turner, 2001). O Programa Cooperativo de Marcação de Tubarões do Atlântico foi o único estudo até hoje a produzir informações sobre distâncias percorridas e número de dias em liberdade para Carcharhinus perezi. O programa já realizou a marcação de 630 tubarões desta espécie e a recaptura de 16 indivíduos. Os resultados sugerem que a espécie não se desloca por grandes distâncias, tendo percorrido uma distância máxima de 48 km a partir do local de marcação (Kohler, Casey & Turner, 1998). O maior período de tempo em liberdade registrado para a espécie foi de nove anos, observado em um indivíduo recapturado a uma distância de 3,7 km do local de marcação (http://na.nefsc.noaa.gov/sharks/newsletter/ 98/1998news.html, abril de 2003). Outros importantes benefícios adicionais proporcionados pelos programas de marcação e liberação são a educação e conscientização dos pescadores quanto à necessidade de conservação dos tubarões. A liberação dos animais é amplamente aceita hoje em dia, existindo vários pescadores recreativos que praticam unicamente a captura e liberação de tubarões e outros peixes (Hueter, 1996). PDF created with FinePrint pdfFactory trial version www.pdffactory.com http://www.pdffactory.com 32 2.3. Utilização de áreas de berçário por tubarões Uma das características básicas da organização social dos tubarões é a separação que existe entre os sexos e entre indivíduos jovens e adultos. Esta segregação por tamanho pode ser tanto geográfica como batimétrica e protege os indivíduos neonatos do canibalismo, um comportamento relativamente comum de