UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO OBRIGATÓRIO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA, REALIZADO JUNTO AO SETOR DE CLÍNICA CIRÚRGICA DE PEQUENOS ANIMAIS DO HOSPITAL VETERINÁRIO DE UBERABA, EM UBERABA-MG E DO HOSPITAL VETERINÁRIO DE UBERLÂNDIA, EM UBERLÂNDIA-MG. Relato de Caso: Manejo de Feridas Cutâneas em Pequenos Animais Giovana Carvalho Vieira UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO OBRIGATÓRIO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA, REALIZADO JUNTO AO SETOR DE CLÍNICA CIRÚRGICA DE PEQUENOS ANIMAIS DO HOSPITAL VETERINÁRIO DE UBERABA, EM UBERABA-MG E DO HOSPITAL VETERINÁRIO DE UBERLÂNDIA, EM UBERLÂNDIA-MG. Relato de Caso: Manejo de Feridas Cutâneas em Pequenos Animais Giovana Carvalho Vieira Orientadora: Prof.ª Dr.ª Paola Castro Moraes Relatório do Estágio Curricular em Prática Veterinária apresentado à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Campus de Jaboticabal, Unesp, para graduação em Medicina Veterinária JABOTICABAL, S.P. Junho de 2022. Agradecimentos Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus, por estar sempre ao meu lado, acalentando meu coração nas horas difíceis e me guiando e dando forças para continuar nesse caminho. Sou grata também à minha família, que é meu alicerce e que sempre me apoiou nas minhas escolhas. Principalmente à minha mãe, Sandra, que criou a mim e minha irmã com muito esforço e sabedoria, sempre nos ensinando a diferença do certo e do errado e nos incentivando a correr atrás de nossos sonhos; e à minha irmã, Isadora, que sempre foi minha melhor amiga e que mesmo longe, me dava conselhos e me fazia encontrar o lado bom das coisas. Agradeço ainda, ao meu pai, Célio e ao meu padrasto, Dimas, os quais sempre estiveram presentes me dando muito carinho e amor. Vocês são meus exemplos de pessoa. Aos meus amigos unespianos, Isabela, Maria Beatriz, Letícia, Vinícius e Nicolas sou eternamente grata, por todos os momentos felizes que vivemos ao longo da graduação e por nos apoiarmos nas dificuldades. Em especial, agradeço a Isabela que foi como uma irmã durante todos esses anos e que pôde compartilhar uma parte do estágio curricular comigo. Amo todos vocês! Ao meu namorado, Bruno, agradeço o companheirismo e paciência, por me tolerar nas horas mais complicadas. Nos momentos de ansiedade, em que eu só queria reclamar, você estava ao meu lado me ouvindo e me ajudando, não me deixando desistir. Agradeço aos meus professores, principalmente, ao Prof. Dr. Fabrício Singaretti de Oliveira e a Prof.ª Dr.ª Paola Castro de Moraes, os quais tiveram participação especial na minha formação, me dando oportunidades acadêmicas que sou muito grata! Sinto que levo comigo um pouco de cada um, sobretudo o amor que têm pela profissão e o carinho que têm com seus alunos. Obrigada ao Hospital Veterinário de Uberaba, onde fui muito bem recebida para estágio curricular e onde conheci muitos profissionais que me ensinaram muito, especialmente às preceptoras Larissa Godoi Máximo, Fernanda Oliveira Soares e Aline Matos. Agradeço também ao Hospital Veterinário de Uberlândia, o qual me deu várias oportunidades e contribuiu vigorosamente para o meu aprendizado, especialmente para as médicas veterinárias Lara Grama Lima, Camila Muchinski e Kimberly Félix. Não posso deixar de desejar meus agradecimentos à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias onde vivi maravilhosos 5 anos e tive experiências incríveis. Lá pude me desenvolver não só como profissional, mas também como pessoa, aprendendo a lidar com as adversidades da vida. Por fim, sou grata aos animais, pois eles são seres puros que merecem todo amor e cuidado do mundo. É por eles que me formo como médica veterinária e que procuro exercer a profissão da maneira mais ética e calorosa possível. Em especial, agradeço aos meus gatos de estimação Milk, Fiona, Cheetara, Carina e Bergamota, os quais me fizeram escolher trilhar esse caminho. “Se escutar uma voz dentro de você dizendo 'Você não é um pintor', então pinte sem parar, de todos os modos possíveis, e aquela voz será silenciada.” - Vincent van Gogh. i SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS .......................................................................................... iii LISTA DE TABELAS E QUADROS .................................................................... vi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................ vii I. RELATÓRIO DE ESTÁGIO ...................................................................................... 1 1. Introdução ............................................................................................. 1 2. Descrição do local de estágio ............................................................... 1 3. Descrição das atividades desenvolvidas ............................................... 6 4. Discussão das atividades desenvolvidas ............................................ 16 5. Considerações finais ........................................................................... 17 II. MONOGRAFIA .......................................................................................................... 17 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 17 2. REVISÃO DE LITERATURA ......................................................................... 18 2.1. Anatomia da pele ...................................................................................... 18 2.2. Caracterização das feridas .................................................................... 19 2.3 Fases da cicatrização ................................................................ 21 2.3.1. Fase Inflamatória ................................................................................. 21 2.3.2. Fase de desbridamento ..................................................................... 21 2.3.3. Fase de reparo ..................................................................................... 22 2.3.4. Fase de maturação ............................................................................. 24 2.4. Fatores que interferem na cicatrização .............................................. 24 2.4.1. Do hospedeiro ...................................................................................... 25 2.4.2. Do ferimento .......................................................................................... 25 2.4.3. Externos.................................................................................................. 26 2.5. Tipos de cicatrização ............................................................................... 26 2.5.1. Cicatrização por primeira intenção ................................................. 26 2.5.2. Cicatrização por segunda intenção ................................................ 27 2.5.3. Cicatrização por terceira intenção .................................................. 27 2.6. Tratamento de feridas abertas .................................................. 27 2.6.1. Medicamentos tópicos ....................................................................... 29 2.6.2. Bandagens e curativos ...................................................................... 31 2.6.2.1 Camada de contato ........................................................... 32 2.6.2.2 Camada secundária............................................................33 ii 2.6.2.3 Camada terciária................................................................34 2.6.3. Cirurgias reconstrutivas ..................................................................... 34 3. RELATO DE CASO .............................................................................................. 37 4. DISCUSSÃO ........................................................................................................... 49 5. CONCLUSÃO ......................................................................................................... 52 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................53 iii LISTA DE FIGURAS Figura 1. Consultórios de atendimento do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.......................................................................................................2 Figura 2. Sala de atendimento emergencial do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.......................................................................................................3 Figura 3. Unidade de internação de cães do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.......................................................................................................3 Figura 4. Unidade de internação de gatos do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.......................................................................................................3 Figura 5. Unidade de Terapia Intensiva (U.T.I.) do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.......................................................................................................4 Figura 6 A. Sala de preparo pré-cirúrgico e B e C. Centro cirúrgico principal do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022.................................................4 Figura 7 A. Centro cirúrgico utilizado em aulas e para cirurgias contaminadas e B. Sala de paramentação do Hospital Veterinário de Uberaba – Uberaba/MG, 2022........4 Figura 8. Centro cirúrgico do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia – Uberlândia/MG, 2022...............................................................................5 Figura 9 A. Sala de paramentação e B. Sala dos residentes do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia – Uberlândia/MG, 2022..................................6 Figura 10. Sala de preparo pré-operatório do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia – Uberlândia/MG, 2022.............................................................6 Figura 11 A. Consultório de atendimento cirúrgico e B. Unidade de Terapia Intensiva (U.T.I.) do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia – Uberlândia/MG, 2022....................................................................................................6 Figura 12. Gráfico em pizza evidenciando a distribuição da porcentagem relacionada aos principais casos cirúrgicos acompanhados durante o estágio no Hospital Veterinário de Uberaba (HVU), no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG.........................................................................................................10 iv Figura 13. Gráfico em pizza evidenciando a distribuição da porcentagem relacionada aos principais casos cirúrgicos acompanhados durante o estágio no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU), no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG.........................................................14 Figura 14 A. Representação da vascularização cutânea no cão e no gato e em B. no homem. A seta verde indica o nível em que a pele deve ser divulsionada para preservação do plexo em cirurgias reconstrutivas (Adaptado de Morales, 2009) .......19 Figura 15. Representação gráfica das fases da cicatrização e deposição de colágeno na matriz extracelular. Fonte: ISAAC et al., 2010........................................................24 Figura 16. Ferida lacerante em região perineal bilateral antes desbridamento cirúrgico inicial e remoção das miíases (21/03/2022) ...............................................................38 Figura 17. Bandagem do tipo "Tie over" com curativo úmido-seco (23/03/2022) ....................................................................................................................................41 Figura 18. Ferimento em região perineal bilateral, queda dos pontos do "Tie-over" (28/03/2022) ..............................................................................................................42 Figura 19. Ferimento com contração das bordas e tecido de granulação saudável recobrindo tuberosidade isquiática (01/04/2022) .......................................................43 Figura 20. Ferimento com ampla contração das bordas e tecido de granulação saudável, medindo 13,5cm por 8,5cm. Foto tirada antes do início do procedimento cirúrgico, após antissepsia prévia e realização da bolsa de fumo (06/04/2022) ....................................................................................................................................45 Figura 21 A. Enxerto retangular medindo 13,5cm por 8,5cm retirado da área doadora, região torácica lateral direita; B. Enxerto fixado sobre defeito em região perineal por meio de sutura com pontos simples separados (fio de sutura Nylon 3-0) ..................46 Figura 22. Ferimento após deslocamento do enxerto (11/04/2022) ...........................47 Figura 23 A. Ferida em início de epitelização (14/04/2022); B. Ferida com grande contração das bordas e epitelização (18/04/2022) .....................................................48 Figura 24 A. Evolução do ferimento em 02/05/2022, retirada dos pontos do Tie-over; B. Oclusão quase completa da ferida em 26/05/2022.................................................48 v Figura 25 Aspecto macroscópico do ferimento em 03 de junho de 2022, com cicatrização completa em ambos os lados, restando apenas cicatriz em lado direito. Fonte: imagens cedidas pelo HVET-UFU...................................................................49 vi LISTA DE TABELAS Tabela 1. Número e porcentagem de animais atendidos de acordo com a espécie e sexo no Hospital Veterinário de Uberaba, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG.............................................................................................8 Tabela 2. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos dos casos clínicos no Hospital Veterinário de Uberaba, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG.............................................................................8 Tabela 3. Número e porcentagem de animais atendidos de acordo com a espécie e sexo no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG...............................................12 Tabela 4. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos dos casos clínicos no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG...............................................12 Tabela 5. Valores do hemograma e bioquímico séricos realizado no dia 21 de março de 2022. .....................................................................................................................39 Tabela 6. Valores do hemograma pós transfusão sanguínea, realizado no dia 23 de março de 2022. ..........................................................................................................40 Tabela 7. Valores do hemograma e bioquímicos séricos pré-operatórios, realizado no dia 05 de abril de 2022................................................................................................43 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Classificação das feridas abertas, segundo etiologia, grau de contaminação e tempo de duração. Fonte: WALDRON, D.R. e ZIMMERMAN-POPE, 2003; PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014..........................................................................20 vii LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ALT: alanina amino transferase BID: 2 vezes ao dia bpm: batimentos por minuto. cm: centímetros dL: decilitro Dr.(a): Doutor(a) ECC: escore de condição corporal. FA: fosfatase alcalina FC: frequência cardíaca FR: frequência respiratória g: grama h: hora HVET-UFU: Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia HVU: Hospital Veterinário de Uberaba IM: via intramuscular IV: via intravenosa. Kg: quilograma L: litros mg: miligramas mL: mililitros mm3: milímetros cúbicos mmHg: milímetros de mercúrio. mrpm: movimentos respiratórios por minuto viii OH: ovário histerectomia PAS: pressão arterial sistólica Prof.(a): professor(a) s: segundos. SC: via subcutânea SID: 1 vez ao dia TID: 3 vezes ao dia TPC: tempo de preenchimento capilar TR: temperatura retal U.T.I.: unidade de terapia intensiva VO: via oral 1 I. RELATÓRIO 1. INTRODUÇÃO O presente documento é referente ao Estágio Curricular Obrigatório desenvolvido pela discente Giovana Carvalho Vieira, matriculada no décimo período de Medicina Veterinária pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – FCAV/UNESP, Campus Jaboticabal, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Paola Castro Moraes, do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da mesma Instituição. O estágio foi realizado em duas etapas, totalizando 630 horas. Inicialmente, foi realizado no setor de clínica-cirúrgica de pequenos animais do Hospital Veterinário de Uberaba, situado na cidade Uberaba-MG, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, sob a supervisão do Prof. Dr. Endrigo Gabellini Leonel Alves, totalizando 310 horas oficiais e extras. Em seguida, o estágio foi efetuado, também na área de clínica-cirúrgica do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, localizado no município de Uberlândia-MG, no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, sob a supervisão Prof. Dr. Francisco Claudio Dantas Mota, perfazendo um total de 320 horas oficiais. Objetivou-se com o estágio colocar em prática os conhecimentos teóricos adquiridos ao longo da graduação e aprender com diferentes perspectivas por meio do acompanhamento da rotina de hospitais que possuem públicos alvos e condutas clínico-cirúrgicas distintas. 2. DESCRIÇÃO DOS LOCAIS DE ESTÁGIO 2.1 Hospital Veterinário de Uberaba (HVU) – Uberaba, MG. O Hospital Veterinário de Uberaba está localizado na Av. do Tutuna, 720 - Núcleo Res. Tutunas, na cidade de Uberaba, MG. Seu horário de funcionamento é das 7h às 22h de segunda a sexta-feira e, aos fins de semana, o atendimento ocorre das 9h às 20h. No entanto, há médicos veterinários que ficam de plantão 24 horas por dia, incluindo fins de semana e feriados, para monitoramento dos pacientes internados e atendimentos emergenciais. O horário estipulado para os estagiários era das 8h às 18h. Os serviços fornecidos pelo hospital são nas áreas de clínica médica e clínica cirúrgica de pequenos animais, anestesiologia, diagnóstico por imagem, clínica 2 médica e cirúrgica de grandes animais, patologia clínica, bem como internação e atendimento de animais silvestres encaminhados pela polícia ambiental. O atendimento ao paciente é feito pelos residentes e preceptores, sendo os últimos, veterinários com experiência contratados para orientar e auxiliar os residentes nas suas condutas terapêuticas. Na área de cirurgia, havia 8 residentes e 3 preceptoras, eles se subdividiam nas áreas de atendimento cirúrgico, internação e bloco cirúrgico. Ainda, o hospital conta com a ajuda de auxiliares clínicos, que executavam toda a parte de enfermagem nos animais internados, como trocar acessos periféricos, coletar exames hematológicos (hemograma, bioquímicos séricos e hemogasometria) e realizar as medicações diárias. No que tange a infraestrutura, a parte de pequenos animais do hospital é composta por uma recepção; 8 consultórios, sendo um deles específico para atendimento de felinos e um feito em homenagem aos cachorros doadores de sangue (consultório dos cães heróis); unidade de internação; sala de pós operatório; internação de pacientes gastrointestinais; 2 canis; 1 gatil; unidade de terapia intensiva (U.T.I.); sala de atendimento emergencial; enfermaria; sala de residentes; 2 salas de pré-operatório; 2 centros cirúrgicos; sala de esterilização; farmácia; sala de ultrassonografia; sala de radiografia e laboratório de patologia clínica. Figura 1 Consultórios de atendimento do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU) A. Consultório padrão, B. Consultório de felinos, C. Consultório dos cães heróis. Fonte: Arquivo pessoal, 2022. 3 Figura 2 Sala de atendimento emergencial do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. Figura 3 Unidade de internação de cães do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. Figura 4 Unidade de internação de gatos do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. 4 Figura 5 Unidade de terapia intensivo (U.T.I.) do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: arquivo pessoal, 2022. Figura 6 A. Sala de preparo pré-cirúrgico, B e C. Centro cirúrgico principal do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. Figura 7 A. Centro cirúrgico utilizado para aulas práticas e cirurgias de caráter contaminado, B. Sala de paramentação do Hospital Veterinário de Uberaba (HVU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. 2.2 Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU) – Uberlândia, MG. O Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU) está situado na Av. Mato Grosso, 3289 – Bloco 2S – Umuarama, Uberlândia, MG. O horário de funcionamento é de segunda a sexta-feira, das 7h às 18h, exceto feriados. 5 Entretanto, o horário estabelecido para os estagiários é das 7h às 17h, sendo permitidas duas horas de almoço, totalizando 8 horas diárias. O HVET-UFU dispõe de atendimento para animais de companhia (cães e gatos), bem como animais silvestres e animais de produção. Para essas espécies, além do atendimento clínico, há serviços especializados de imagem (radiografia, ultrassonografia e exames cardiológicos); oncologia; endocrinologia; oftalmologia e exames laboratoriais de patologia clínica. No que se refere ao quadro de funcionários, o hospital conta com 36 médicos veterinários residentes e 17 docentes. No setor de clínica cirúrgica, há um total de 9 residentes, os quais realizam escala entre atendimento, centro cirúrgico (cirurgia e anestesiologia) e U.T.I. (unidade de terapia intensiva). Ademais, há 3 professores, dois de cirurgia e um de anestesiologia, os quais amparam os residentes nos diagnósticos e condutas terapêuticas a serem tomadas. Estruturalmente, o HVET-UFU conta com recepção; 6 consultórios, os quais são divididos entre clínica médica e cirúrgica; laboratório clínico; farmácia; sala de preparo pré-cirúrgico; 3 centros cirúrgicos; U.T.I.; enfermaria; sala de técnica operatória e 2 salas para os residentes. Figura 8 Centro cirúrgico do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU). Fonte: imagens cedidas pelo HVET-UFU. 6 Figura 2 A. Sala de paramentação, B. Sala dos residentes do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU). Fonte: imagens cedidas pelo HVET-UFU Figura 3 Sala de preparo pré-operatório do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU). Fonte: Imagens cedidas pelo HVET-UFU. Figura 41 A. Consultório de atendimento cirúrgico, B. Unidade de Terapia Intensiva (U.T.I.) do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU). Fonte: Arquivo pessoal, 2022. 3. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS 3.1 Hospital Veterinário de Uberaba (HVU) – Uberaba, MG. No decorrer do período de estágio realizado no Hospital Veterinário de Uberaba, a estagiária teve a oportunidade de acompanhar a rotina do setor de clínica 7 cirúrgica. Os residentes e preceptores se dividiam entre atendimento cirúrgico, internação e bloco cirúrgico. Aqueles que ficavam responsáveis pelos animais internados, se subdividiam em período matutino, vespertino e noturno, de modo que, os pacientes ficavam sob supervisão 24 horas diárias. Ademais, também ficavam responsáveis por assistir aos animais que chegavam para atendimento emergencial. Os estagiários, por sua vez, não possuíam uma escala específica, ajudavam nas atividades solicitadas. Logo pela manhã, eram aferidos os parâmetros clínicos dos pacientes internados (temperatura, pressão, glicemia), dando mais atenção para aqueles em estado mais crítico, os quais eram mantidos na U.T.I. (unidade de terapia intensiva). Ainda eram realizados a troca e limpeza de todos os curativos, daqueles animais que possuíam algum tipo de ferida, cirúrgica ou traumática. A função de cateterização venosa, ministrar medicações, limpeza da baia dos animais, coleta de exames hematológicos e hemogasometria, era exclusiva dos auxiliares clínicos contratados, podendo os estagiários ajudar quando necessário. Quando requisitado, os estagiários acompanhavam os atendimentos, auxiliando na realização da anamnese e exame físico geral, na contenção do paciente e por vezes, na coleta de exames hematológicos. Em caso de retornos pós cirúrgicos, era possível fazer também a retirada de pontos e avaliação do animal. Em dias que havia procedimentos cirúrgicos agendados, o estagiário tinha a possibilidade de adentrar no bloco cirúrgico para acompanhar as cirurgias. Era sua função auxiliar no preparo do paciente, realizando a tricotomia, posicionamento do paciente na mesa, antissepsia prévia e abertura dos materiais. Quando possível, os residentes e preceptores permitiam que o estagiário paramentasse para auxiliar na cirurgia propriamente dita. Finalizado o procedimento, era efetuado a limpeza da ferida e curativo, sendo também responsabilidade do estagiário. Abaixo, pode-se observar a casuística acompanhada pela estagiária, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022. 8 Tabela 1. Número e porcentagem de animais atendidos de acordo com a espécie e sexo no Hospital Veterinário de Uberaba, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG. ESPÉCIE SEXO TOTAL FÊMEA MACHO Canina 136 67 203 (87,9%) Felina 23 5 28 (12,1%) TOTAL GERAL 159 (68,8%) 72 (31,2%) 231 (100%) Tabela 2. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos dos casos clínicos no Hospital Veterinário de Uberaba, no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos ESPÉCIE TOTAL CAN FEL Ablação de conduto auditivo 1 1 Abscesso em membro pélvico 1 1 Amputação membro torácico 1 1 Avulsão de rádio 1 1 Caudectomia 1 1 Cistotomia 1 1 Conchectomia 2 2 Contusão pulmonar 3 3 Corpo estranho esofágico, gástrico ou intestinal 6 1 7 Dilatação gástrica 1 1 Displasia coxofemoral e de cotovelo 5 5 Doença do disco intervertebral 3 3 Eventração ou evisceração 1 2 3 Fecaloma 1 1 Feridas 24 3 27 Fístula dentária 1 1 Flegmão 1 1 Fraturas ósseas 28 9 37 Hérnia inguinal, perineal ou umbilical 7 7 Insulinoma 1 1 Intussuscepção 1 1 Lesão medular 1 1 Linfoma 1 1 Lobectomia pulmonar 1 1 9 Luxação articulares 9 9 Luxação de patela 4 4 Maceração fetal 1 1 Miíase 3 3 Neoplasias cutâneas 23 23 Neoplasias em baço 2 2 Neoplasias hepática 1 1 Neoplasias retais 1 1 Nodulectomia 12 12 Orquiectomia 7 7 Otohematoma 4 1 5 Ovário histerectomia 7 3 10 Perfuração de córnea 2 1 3 Piometra 14 1 15 Pneumotórax 1 1 Prolapso anorretal ou vaginal 2 2 Prolapso de globo ocular 1 1 Protusão de terceira pálpebra 1 1 Rânula 1 1 Ruptura de bexiga 1 1 Ruptura de ligamento cruzado cranial 3 3 Ruptura diafragmática 1 1 2 Sarcoma de aplicação 1 1 Sutura ílio-trocantérica 1 1 Toracotomia 1 1 Trabalho de parto/ distocia/ abortamento 1 3 4 Trauma 2 1 3 Trauma crânio encefálico 3 3 Trauma torácico 3 3 Tumor em mama/ mastectomia 25 3 28 Tumor em prepúcio 1 1 Tumor perineal 1 1 TOTAL 232 31 263 10 Figura 12. Gráfico em pizza evidenciando a distribuição da porcentagem relacionada aos principais casos cirúrgicos acompanhados durante o estágio no Hospital Veterinário de Uberaba (HVU), no período de 03 de janeiro a 25 de fevereiro de 2022, em Uberaba/MG. 3.2 Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU) – Uberlândia, MG. Durante os dois meses de estágio no setor de clínica-cirúrgica do HVET-UFU, foi possível acompanhar as atividades tanto do setor de atendimento, voltado exclusivamente para casos cirúrgicos, como também do centro cirúrgico e do setor de U.T.I. Os demais estagiários realizavam rodízios, de modo que, sempre houvesse dois estudantes acompanhando as consultas, um auxiliando na unidade de terapia intensiva e o restante dentro do bloco cirúrgico. No atendimento, os estagiários eram responsáveis por realizar toda a anamnese, a qual era orientada por meio de um roteiro existente no sistema de gestão utilizado pelo hospital (Simples Vet) e exame físico geral dos pacientes (aferição de FC e FR, TR, avaliação de mucosas, TPC, hidratação, linfonodos periféricos, pulso etc.) Feita a abordagem inicial, o residente responsável dava continuidade ao atendimento, realizando o exame específico do sistema acometido e coleta de exames necessários. Ainda era função do estagiário, auxiliar na contenção dos animais, bem como acompanhar os pacientes e tutores até os locais de realização de exames especiais (radiografia e ultrassonografia). 6% 4% 14% 7% 16%29% 9% 15% Principais casos observados Jan-Fev 2022 HVU OH eletiva Orquiectomia Neoplasia Nodulectomia Mastectomia/ tumor mama Casos ortopédicos Piometra Feridas 11 Na U.T.I. sempre havia dois residentes da clínica médica e um residente da clínica cirúrgica. Nesse local, eram recebidos pacientes em estado de urgência e emergência, os quais necessitavam de monitoramento e cuidados intensivos. O setor funcionava em horário comercial, assim como o hospital, sendo que os animais que necessitavam de internação noturna e em fim de semana, eram encaminhados para clínicas locais. Pela manhã eram recepcionados os pacientes que já haviam sido internados anteriormente na U.T.I., os estagiários os acomodavam e realizavam os parâmetros clínicos iniciais (FC, FR, coloração de mucosas, TPC, hidratação, TR, pulso, PAS e glicemia). Ao longo do dia, os parâmetros eram repetidos com determinada frequência, dependendo do estado do animal e eram também realizadas medicações e ocasionalmente procedimentos, tais como sondagem, aferição de débito urinário; toracocentese etc. Ainda, chegavam animais para atendimento emergencial, sendo que os primeiros socorros eram prestados pela equipe da U.T.I. Em contrapartida, no centro cirúrgico, era função dos estagiários recepcionar os animais que iriam efetuar procedimento cirúrgico e anestésico naquele dia, fazer a aferição de parâmetros iniciais (FC, FR, coloração de mucosas, TPC, TR e PAS) e realizar a canulação venosa periférica. Em seguida, os residentes entregavam aos estagiários a ficha de medicações anestésicas, a qual continha as doses, concentrações e volumes exatos para cada paciente. Feito isso, os estagiários se dividiam em três funções: auxiliar de cirurgião, auxiliar de anestesista e volante, o qual era responsável por buscar medicações e instrumentais durante a cirurgia, fazer a tricotomia e antissepsia prévia dos animais. O estudante que ajudava o anestesista, além de anotar todos os parâmetros durante a anestesia (FC, FR, PAS, saturação de oxigênio e TR), podia ocasionalmente fazer a epidural, acesso para pressão invasiva e entubar o paciente. Já o estagiário que estava paramentado, além de auxiliar na cirurgia, realizava a instrumentação. As tabelas e gráficos abaixo demonstram a casuística acompanhada pela acadêmica durante os meses de março e abril de 2022. 12 Tabela 3. Número e porcentagem de animais atendidos de acordo com a espécie e sexo no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG. ESPÉCIE SEXO TOTAL FÊMEA MACHO Canina 79 47 126 (84,6%) Felina 11 12 23 (15,4%) TOTAL GERAL 90 (60,4%) 59 (39,6%) 149 (100%) Tabela 4. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos dos casos clínicos no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG. Diagnósticos, suspeitas clínicas, sinais clínicos ou procedimentos ESPÉCIE TOTAL CAN FEL Ablação de escroto 1 1 Acidente vascular cerebral 1 1 Amputação de membros 6 1 7 Cardiopatia descompensada 3 3 Caudectomia 1 1 2 Cesariana/ OH terapêutica 6 1 7 Cetoacidose diabética 2 2 Cisto epidermóide 1 1 Cistotomia 3 1 4 Colite 1 1 Contusão pulmonar 1 1 Denervação da cabeça do fêmur 2 2 Desbridamento de ferida 2 2 4 Displasia coxofemoral 1 1 Distocia 5 5 Doença articular degenerativa 1 1 Efusões pleural e abdominal 3 3 Enterectomia 1 1 Enxerto de pele 1 1 Esplenectomia 1 1 Estabilização de coluna 3 2 5 Estafiloma 1 1 Eventração e evisceração 1 1 2 Ferida lacerativa 6 6 Flape conjuntival e de terceira pálpebra 3 3 13 Flegmão em membro 1 1 Fraturas ósseas 4 1 Gastrite 1 1 Hemilaminectomia 2 2 Hemometra 1 1 Hérnia perineal bilateral 1 1 Insuficiência renal aguda 1 1 Intoxicação 1 1 Laparotomia exploratória 2 2 Lesões ulcerativas hemorrágicas cutâneas 1 1 Luxação de patela 1 1 Mastectomia 10 2 12 Melanoma 1 1 Melena 1 1 Neoplasia em vulva 2 2 Neoplasia ulcerada 1 1 Nodulectomia simples e com reconstrutiva 12 12 Obstrução do trato urinário 3 3 Orquiectomia eletiva 4 2 6 Osteossínteses 14 4 18 Ovário histerectomia eletiva 15 2 17 Parada cardiorrespiratória 2 2 Politraumatismo 6 6 Profilaxia dentária 2 2 Prolapso retal e vaginal 2 2 Protusão de terceira pálpebra 3 3 Pseudociese 1 1 Remoção de implante ósseo 2 1 3 Ressecção de cabeça e colo femoral 5 5 Ruptura diafragmática 2 2 4 Torção uterina 1 1 Torção vólvulo gástrica 1 1 Trauma cranioencefálico 2 2 Tumor venéreo transmissível em região metatársica 1 1 Úlcera de córnea 1 1 Vulvoplastia 1 1 TOTAL 162 29 191 14 Figura 13. Gráfico em pizza evidenciando a distribuição da porcentagem relacionada aos principais casos cirúrgicos acompanhados durante o estágio no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU), no período de 02 de março a 29 de abril de 2022, em Uberlândia/MG. 4. DISCUSSÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS Dos 231 casos acompanhados no Hospital Veterinário de Uberaba (HVU), 203 (87,9%) eram caninos e 28 (12,2%) felinos, sendo que desses, 159 eram fêmeas (68,8%) e 72 eram machos (31,2%). No geral, os casos mais frequentemente observados eram os relacionados a problemas de caráter ortopédico (29%), os quais eram ocasionados, normalmente, por atropelamentos e ataques de outros animais. Dentro dessa categoria, enquadram-se fraturas de ossos longos (fêmur, tíbia, úmero, rádio), fraturas em pelve, escápula e mandíbula, bem como luxações e displasias articulares. Em seguida, destacam-se como casos recorrentes neoplasias mamárias e sua exérese, mastectomia (16%); feridas lacerantes e perfurantes (15%); neoplasias diversas (14%); piometra (9%); nodulectomia (7%); ovário histerectomia (6%) e orquiectomia (4%), sendo os dois últimos procedimentos eletivos e de grau simples. Cirurgias mais complexas, envolvendo tecidos moles, como correção de hérnia perineal (1,3%), correção de ruptura diafragmática (0,8%), cistotomia (0,4%), enterectomia e gastrotomia (3,4%) eram menos comuns na casuística. O HVU possuía parceria com a polícia militar, bombeiros e prefeitura municipal, logo, muitos dos animais que eram atendidos eram provenientes desses locais, muitas vezes resgatados e sem histórico. Os procedimentos realizados eram custeados por 38% 11%16% 6% 6% 5% 7% 7% 4% Principais casos observados Mar/Abr 2022 HVET-UFU Procedimentos ortopédicos Mastectomia OH Orquiectomia Nodulectomia Nodulec com reconstrutiva Coluna Procedimentos oftalmicos Ruptura diafragmática 15 esses órgãos. Por conta disso, a casuística desse local de estágio era mais variada, em virtude de não haver empecilhos financeiros para realização de procedimentos cirúrgicos. Além disso, o fato desse local possuir internação própria, possibilitou melhor acompanhamento dos casos observados, uma vez que, os pacientes ficavam mais tempo sob supervisão veterinária e o estagiário podia acompanhar a evolução do quadro clínico. Em contrapartida, no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU), no total, foram acompanhados 149 animais, tanto em atendimento e centro cirúrgico como na U.T.I, sendo 126 cães (84,6%) e 23 gatos (15,4%). Desses, 90 eram fêmeas (60,4%) e 59 machos (39,6%). Nesse local de estágio, o predomínio também foi de casos ortopédicos (38%) seguido de ovário histerectomia (16%); mastectomia (11%); procedimentos oftálmicos (7%); cirurgias de coluna (7%); orquiectomia (6%); nodulectomia simples (6%); nodulectomia com reconstrutiva (5%) e correção de ruptura diafragmática (4%). No HVET-UFU, havia professores especializados nas áreas de ortopedia/oftalmologia e cirurgia reconstrutiva, logo, era mais acessível acompanhar esses tipos de procedimentos. Ainda, o perfil de pessoas atendidas no hospital era de tutores com baixo poder aquisitivo, os quais eram assistidos, em sua maioria, por ONG’s (organização não governamental). Dessa forma, procedimentos cirúrgicos mais complexos e onerosos, acabavam não ocorrendo com muita frequência. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a graduação, embora a porcentagem de aulas práticas na grade curricular seja superior à de aulas teóricas, a pandemia acabou prejudicando os alunos, visto que, foi impossível ministrar todo o conteúdo prático. Desse modo, é de extrema importância que esse procure se aperfeiçoar por meio de estágios e atividades extracurriculares. Assim, o período de estágio curricular foi fundamental para o meu crescimento profissional e pessoal, visto que, possibilitou-me vivenciar a rotina clínico-cirúrgica de um hospital veterinário universitário, o qual atende diferentes tipos de públicos e animais. Ainda, foi possível aprimorar meus conhecimentos sobre técnicas cirúrgicas e condutas terapêuticas, bem como a maneira correta de abordar os tipos tutores e a respeitar as diversidades, entendendo que cada um possui um contexto social e uma realidade de vida. 16 Por meio desse treinamento pude perceber que nem sempre a teoria se concretiza na prática e saber lidar com as adversidades com resiliência é de grande relevância para que nos tornemos profissionais mais responsáveis e respeitosos com nossos pacientes. Por conseguinte, infere-se que o estágio curricular só agregou pontos positivos a minha carreira, me possibilitou amadurecimento e me sinto hoje mais preparada para atuar na profissão. 17 II. MONOGRAFIA MANEJO DE FERIDAS CUTÂNEAS EM PEQUENOS ANIMAIS 1. INTRODUÇÃO Na rotina clínico-cirúrgica veterinária, o conhecimento sobre o processo de regeneração da pele, bem como as possibilidades de tratamento para acelerar essa cicatrização, são de extrema importância, uma vez que, torna-se cada vez mais frequente casos de lesões cutâneas das mais diversas origens (TILLMAN et al., 2015). Mordeduras, atropelamentos, queimaduras, feridas cirúrgicas, neoplasias e até mesmo maus tratos, estão entre as causas comuns desse tipo de injúria. A pele é o maior órgão do corpo animal. Além de atuar como barreira mecânica contra a ação de agentes externos (biológicos, químicos ou físicos), também participa da termorregulação, manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico e recepção sensorial (ISAAC et al., 2010). A perda de integridade cutânea mobiliza uma série de componentes sanguíneos e permite a entrada de agentes invasores e toxinas. Tal evento pode desencadear alterações sistêmicas graves, culminando até mesmo no óbito do animal. Uma ferida pode classificar-se de diferentes maneiras, seja quanto ao seu agente causador e grau de lesão tecidual ou pelo seu tempo de exposição e grau de contaminação. Todavia, independentemente do modo como ela se origine, os mecanismos desencadeados pelo organismo serão o de resolução dessa falha. Dessa forma, o ferimento pode fechar-se por primeira intenção, quando é suturado cirurgicamente ou por segunda intenção, quando o aposicionamento das bordas da lesão ocorre pela formação de um novo tecido (MACPHAIL, 2014). De acordo com Pavletic (2010), o processo cicatricial é dividido em quatro fases: inflamatória, desbridamento, reparo e maturação. Tais etapas podem sofrer com a ação de fatores externos como o uso de determinados fármacos, bem como com as particularidades de cada indivíduo, seja pela presença de comorbidades e estado nutricional (MACPHAIL, 2014) ou pela diferença entre as espécies (BOHLING e HANDERSON, 2006). Dessa forma, existem uma variedade de tratamentos os quais podem ser utilizados para o manejo de ferimentos, porém, cabe ao veterinário avaliar a fase de cicatrização em que a lesão se encontra e qual o produto e recurso ideal para cada 18 situação. Dependendo do aspecto da ferida, pode-se optar pelo fechamento do ferimento por primeira intenção, ou seja, por aposição das bordas por meio de sutura cirúrgica; ou mesmo por segunda intenção, onde a oclusão do defeito ocorrerá pela formação de um novo tecido. Ademais, em casos de ferimentos muito extensos e que apresentem leito viável, pode recorrer a cirurgias reconstrutivas, como aplicação retalhos e enxertos cutâneos (PAVLETIC, 2003; SWIN, 2003; PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). Logo, objetiva-se com o presente trabalho, compilar conhecimentos científicos acerca das categorias de feridas visibilizadas na clínica de pequenos animais e dos cuidados necessários para tratamento dessas, orientando o veterinário na escolha da opção mais apropriada para cada situação. Além disso, visa discutir um relato de caso, acompanhado durante o período de estágio curricular, que aborda essa temática e pontuar possíveis alternativas à conduta terapêutica tomada. 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Anatomia da pele A pele é composta pela epiderme, derme e os anexos associados, tais como pelos, unhas e glândulas sudoríparas e sebáceas. A primeira é a porção mais superficial, a qual é protetora; esta não possui vascularização própria, recebendo seus nutrientes dos capilares dérmicos. A derme, por sua vez, é mais espessa e nela encontram-se as fibras colágenas, reticulares e elásticas, assim como macrófagos, fibroblastos, mastócitos e células plasmáticas, os quais são recrutados no processo cicatricial. Diferentemente dos humanos, em cães e gatos, não há vasos musculocutâneos e sim cutâneos diretos, que correm próximos e paralelos à pele (Figura 14A), irrigando uma área específica. Por esse fato, técnicas de enxerto humano não são facilmente aplicáveis a medicina veterinária (PAVLETIC, 2003; MACPHAIL, 2014). Dos vasos cutâneos diretos emergem artérias e veias, as quais formam o plexo subdérmico (mais profundo), cutâneo (intermediário) e subpapilar (superficial). O primeiro é essencial para a viabilidade da pele, devendo ser preservados por cirurgiões para sucesso do procedimento cirúrgico. Assim, em áreas com musculo panicular, como tronco cutâneo, esfíncter superficial e profundo do pescoço, prepúcio e supramamário, o plexo é mais superficial e profundo em relação ao musculo 19 panicular, devendo a pele ser separada abaixo do músculo cutâneo a fim de preservar o plexo (seta verde Figura 14A). Já em áreas sem o musculo panicular, como extremidades, o plexo percorre a superfície profunda da derme, sendo necessária a separação da pele logo abaixo dessa porção, representada pela seta vermelha na figura abaixo (MORALES, 2009; MACPHAIL, 2014). Figura 14 A. Representação da vascularização cutânea no cão e no gato e em B. no homem. A seta verde indica o nível em que a pele deve ser divulsionada para preservação do plexo em cirurgias reconstrutivas (Adaptado de Morales, 2009). 2.2 Caracterização das feridas As feridas podem ser classificadas segundo vários critérios, no entanto, de acordo com Waldron e Zimmerman-pope (2003), se dividem em duas categorias básicas: abertas e fechadas. As abertas ocorrem por meio da perda de continuidade da pele, enquanto as fechadas são aquelas ocasionadas por contusões e esmagamentos, não apresentando perda de tecido, mas podendo evoluir para um ferimento aberto, caso haja comprometimento da viabilidade dos tecidos adjacentes. As primeiras são ainda subdivididas quanto a etiologia, ao grau de contaminação e tempo de duração, como podemos observar no quadro 1. 20 Quadro 1. Classificação das feridas abertas, segundo etiologia, grau de contaminação e tempo de duração (WALDRON, D.R. e ZIMMERMAN-POPE, 2003; PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). CLASSIFICAÇÃO FERIDAS ABERTAS Etiologia Abrasão Perdas da epiderme e partes da derme. Ex.: queimaduras Avulsão Laceração do tecido e suas inserções; separação dos tecidos Incisão Criada por objeto cortante e com bordas regulares Laceração Cortes de conformação e bordas irregulares Punção Ocorre por perfuração do tecido por projétil ou objeto pontiagudo. Grau de contaminação Limpa Ferida operatória efetuada sem falhas assépticas, sem abertura de trato respiratório, alimentar ou geniturinário Limpa-contaminada Ferida cirúrgica com moderada contaminação, onde houve abertura de trato respiratório, alimentar e geniturinário Contaminada Feridas abertas traumáticas e recentes, com considerável contaminação; podem ser cirúrgicas onde houve quebra na assepsia Suja infectada Feridas abertas traumáticas antigas, com mais de 105 UFC* por grama, contaminação por pus Tempo de duração Classe I Ferimentos limpos com pouca contaminação bacteriana – 0 a 6 horas Classe II Feridas com significativa contaminação – 6 a 12 horas Classe III Apresentam intensa contaminação bacteriana – acima de 12 horas *UFC – Unidade formadora de colônias Embora nem sempre seja simples a classificação precisa do ferimento, baseando-se na análise macroscópica, essa ferramenta torna-se útil para guiar o pensamento clínico do veterinário e orientá-lo sobre qual conduta seguir. 21 2.3 Fases da cicatrização O processo cicatricial de um ferimento resume-se a restauração da continuidade do tecido cutâneo, por meio da união de eventos físicos, químicos e celulares que ocorrem no organismo. Esse reparo pode formar um novo tecido ou substituí-lo por colágeno. Desse modo, é possível subdividir esse processo em quatro fases, as quais ocorrem de maneira dinâmica, concomitantemente (MACPHAIL, 2014). Tais estágios apresentam diferenças microscópicas, que refletem em características macroscópicas da ferida, orientando seu manejo adequado (HOSGOOD, 2006). 2.3.1 Fase inflamatória Assim que ocorre a injúria, a cicatrização já se inicia. Primeiramente, haverá um processo inflamatório como mecanismo protetor. Devido a hemorragia causada pelo ferimento, de imediato, observa-se vasoconstrição mediada por catecolaminas, a fim de limitar a perda sanguínea. Em seguida, os vasos se dilatam e há aumento da permeabilidade dos capilares, permitindo com que o fibrinogênio e outros elementos de coagulação cheguem ao local. Por meio da quimiotaxia, as plaquetas são atraídas para o local, aderindo-se ao ferimento e formando um tampão inicial que realiza hemostasia. Essas também liberam quimio atratores e fatores de crescimento que serão essenciais para as fases finais. Os vasos linfáticos são ocluídos por fibrina e plasma, com o intuito de localizar a inflamação e aproximar as bordas da ferida. Ainda, por meio de ligações covalentes entre a fibrina e na presença do fator XIII ativado, fortalece-se o coágulo provisoriamente, funcionando como barreira à infecção e perda de fluidos. As conhecidas “crostas” se formam quando essa estrutura seca e permitem com que a cicatrização evolua. Nessa fase, as plaquetas, mastócitos e macrófagos são responsáveis pela liberação de fatores de crescimento e citocinas, os quais atuam na fase proliferativa da cicatrização. Células brancas também atingem o local nessa etapa, para poderem atuar na fase de limpeza (MACPHAIL, 2014). Macroscopicamente, observa-se rubor, edema, aumento de temperatura e dor no local (HOSGOOD, 2006). 2.3.2 Fase de desbridamento Durante essa fase, neutrófilos e monócitos são atraídos para o ferimento, onde iniciam o ato de desbridamento. Os neutrófilos são células brancas que realizam a 22 remoção das bactérias e debris, por meio de fagocitose. Quando degenerados, liberam enzimas e radicais livres que agem potencializando essa limpeza inicial, removendo resíduos celulares e materiais necróticos, bem como atraindo os monócitos. Esses, por sua vez, são fundamentais para a cicatrização em si, pois secretam citocinas e fatores de crescimento que auxiliam na formação e remodelamento do tecido (MACPHAIL, 2014). Quando chegam ao ferimento começam a denominar-se macrófagos, os quais liberam colagenase, que age removendo necrose, bactérias e materiais estranhos. Ainda, secretam fatores de crescimento relacionados a síntese de tecido de granulação. Quimioatratores conduzem os macrófagos à tecidos lesados e esses, recrutam células mesenquimais, as quais realizam angiogênese e modulam a matriz cicatricial, permitindo transição para a fase de reparo (HAN e CEILLEY, 2017). Nessa etapa, MacPhail (2014) relata que se pode observar a formação de exsudato, o qual é composto pela morte dessas células no leito da ferida. Vale destacar que, segundo Hosgood (2006), o processo inflamatório pode tornar-se crônico quando não há remoção do agente causal, nesse caso a extensão da lesão aumenta e haverá fibrose excessiva, o que prejudica o processo cicatricial. 2.3.3 Fase de reparo Ao final da fase de inflamatória, após a ação dos macrófagos, instaura-se a etapa proliferativa. Nesse estágio, dá-se o início da formação do tecido de granulação, o qual é formado pela proliferação dos fibroblastos, pela síntese e deposição de colágeno, elastina e proteoglicanos, que amadurecem o tecido fibroso, e pela angiogênese. Esse processo ocorre por meio da substituição da fibrina do ferimento pelo colágeno, o qual só atingirá seu ápice 2 a 3 semanas após a lesão (MACPHAIL, 2014). Primeiramente, há predomínio de colágeno tipo III, o qual é imaturo e forma uma camada mais delgada e progressivamente, esse é substituído pelo colágeno tipo I, mais denso, o que confere maior tensão a ferida (PAVLETIC, 2010). No que diz respeito a angiogênese, essa ocorre por meio da migração de células endoteliais para o espaço perivascular da derme, onde há a formação de brotamentos que emergem para a superfície do tecido de granulação, proliferando e formando o plexo capilar superficial (DYSON,1997). Esse mecanismo decorre da atividade dos macrófagos nas fases anteriores, onde foi sintetizado fatores 23 mitogênicos e quimiotáticos. Ademais, de acordo com Hosgood (2006), outros estímulos para esse processo são a baixa tensão de oxigênio e alta concentração de ácido lático no ambiente da ferida, os quais interferem na produção de citocinas. Os novos capilares, aumentam a tensão de oxigênio e, consequentemente, a fibroplasia (MACPHAIL, 2014). A associação de todas essas reações da origem a um tecido de granulação, de aparência granular, polposo e de coloração vermelha brilhante, o qual preenche a ferida abaixo da crosta e age como barreira protetora contra a entrada de agentes microbianos. Ainda nesse tecido, há miofibroblastos que auxiliam no mecanismo de contratura da ferida (HOSGOOD, 2006; MACPHAIL, 2014). Por fim, para completar a fase proliferativa, inicia-se a epitelização. Em feridas abertas, não suturadas, para que esse processo ocorra, de maneira adequada, é preciso que o tecido de granulação que fornecerá o suporte seja saudável (MACPHAIL, 2014). Esse, começa por meio do recrutamento de células epidérmicas para as margens da ferida, as quais irão se proliferar de maneira centrípeta até o recobrimento total da ferida (PAVLETIC, 2010). Os macrófagos, células epiteliais e fibroblastos presentes no ferimento são os responsáveis pela liberação de fatores de crescimento que desencadeiam essa mobilização (HOSGOOD, 2006; LOPES, 2016). O mecanismo de contração é igualmente importante para o fechamento da ferida, uma vez que, reduz consideravelmente a sua extensão. Ele ocorre simultaneamente aos outros processos descritos por meio da reorganização do colágeno do tecido de granulação e pela contração dos miofibroblastos presentes na borda da lesão (MACPHAIL, 2014). Como descrito por Pavletic (2010), as margens são direcionadas para o centro mediante a contração. Assim, o tecido cutâneo ao redor começa a estirar e apresentar aspecto estrelado e o processo se encerra quando as bordas se tocam ou quando a tensão da pele circundante iguala ou supera as forças de contração (HOSGOOD, 2006; MACPHAIL, 2014). Destaca-se que, mesmo que a contração pare, o processo de epitelização é suficiente para recobrir o ferimento. Um ponto importante a se ressaltar é que, nessa etapa, a utilização de curativos que promovam um ambiente úmido é interessante, uma vez que esse, acelera o mecanismo de desbridamento autolítico, por atração de mais glóbulos brancos para o leito da ferida e, também, facilita a formação do tecido de granulação e epitelização. Ademais, reduzir a exposição do tecido ao oxigênio, por meio de curativos oclusivos, 24 melhora a angiogênese e fibroplasia, por interferir na produção de citocinas (MACPHAIL, 2014). 2.3.4 Fase de maturação Por fim, a fase de maturação é a última do processo cicatricial, por mais que se inicie juntamente com a fase de reparo, pode se estender por cerca de 1 ano após o começo da lesão. Tal etapa é caracterizada pela substituição do colágeno imaturo (tipo III), pelo colágeno tipo I, o qual é mais organizado e resistente e se dispõe ao longo das linhas de tensão, remodelando-se e elevando a força tênsil do ferimento. As fibras colágenas desorganizadas acabam sendo deterioradas pela ação enzimática de metaloproteinases, que são secretadas pela própria matriz extracelular; ainda a celularidade do tecido de granulação diminui por meio da morte das células (MACPHAIL, 2014). Segundo Hosgood (2006) e Pavletic (2010), o ganho de força inicial pelo ferimento é mais acelerado, no entanto, esse aumento torna-se mais vagaroso e a capacidade normal do tecido nunca se recupera nos ferimentos, sendo reconstituídos apenas 80% da força original. Conforme reduz a quantidade de capilares e a celularidade, a cicatriz torna-se mais clara e mais rasas e macias. Figura 15 Representação gráfica das fases da cicatrização e deposição de colágeno na matriz extracelular (ISAAC et al., 2010). 2.4 Fatores que interferem na cicatrização O processo de cicatrização descrito anteriormente, ocorre em indivíduos saudáveis e em condições ideais para cada etapa. Existem diversos fatores que 25 podem interferir nessas fases, bem como variações individuais, seja por alterações sistêmicas ou por particularidades de cada espécie (MACPHAIL, 2014; BOHLING e HANDERSON, 2006). A seguir, ficarão descritas algumas dessas adversidades. 2.4.1 Do hospedeiro É conhecido, que em sua maioria, indivíduos mais velhos estão mais debilitados e suscetíveis a doenças do que os mais jovens. Devido a isso, o fator idade acaba refletindo na cicatrização, sendo que nos animais de idade mais avançada, torna-se mais lenta que em animais jovens sem comorbidades. A nutrição é também um ponto importante, pois pacientes com déficit proteico acabam tendo retardo cicatricial e ferimentos mais débeis, devido à falta de substrato para síntese de componentes essenciais e de energia para essas células (AMALSADVALA e SWAIN, 2006; MACPHAIL, 2014). Ademais, enfermidades como hepatopatias, hiperadrenocorticismo e diabetes melitus apresentam atraso cicatricial por deficiência na síntese de fatores de coagulação, excesso de glicocorticoides circulantes e propensão a infecções, respectivamente. Fatores que interferem na atividade enzimática, como a uremia, ainda podem afetar tal processo (MACPHAIL, 2014). Em conformidade com Bohling e Handerson (2006), há também diferença entre as espécies, visto que estas possuem particularidades anatômicas na histologia cutânea, principalmente felinos. Nos gatos, a perfusão da pele íntegra é inferior e sua facilidade de rompimento, quando comparado à cães, é maior; assim, infere-se que tais animais possuem menor síntese de colágeno. Por esse motivo, observa-se tempo maior de cicatrização de feridas que cicatrizam por segunda intenção nessas espécies, bem como menor força em ferimentos suturados. Ainda, o tecido de granulação em felino apresenta coloração mais esbranquiçada, sendo seu aparecimento mais vagaroso e menos abundante do que em cães (BOHLING e HANDERSON, 2006; PAVLETIC, 2010). Já nos caninos, observamos que as lesões se mostram mais exsudativas, avermelhadas e edematosas, na fase inflamatória. 2.4.2 Do ferimento As características intrínsecas ao ferimento em si também são fatores que alteram o tempo e o modo de cicatrização. Dependendo do local, pode-se verificar 26 ausência de tecido de granulação, como é o caso do periósteo, fáscias musculares, tendões e bainhas nervosas; isso torna a cicatrização mais lenta. Ainda, a presença de corpos estranhos, tais como sujidades, poeira, fios de sutura e implantes, acabam prolongando a fase inflamatória, devido a liberação de enzimas para eliminar o corpo estranho, que acabam agindo não seletivamente e destruindo a matriz extracelular. Tais corpos estranhos podem acabar favorecendo a adesão de microrganismos, ocasionando em infecções e a existência de um processo infeccioso no leito da ferida acaba provocando a eliminação de toxinas bacterianas e mobilizando infiltrado inflamatório que causam necrose e trombose vascular, comprometendo ainda mais a cicatrização (MACPHAIL, 2014). Além disso, conforme MACPHAIL (2014), a temperatura e umidade no local da ferida influenciam no processo cicatricial. Ferimentos mantidos a temperatura de 30ºC e úmidos possuem cicatrização mais rápida e com maior força tensiva. Por esse motivo o tratamento com bandagens é interessante. 2.4.3 Externos Ainda fatores extrínsecos podem agir nesse mecanismo, como o uso de determinados fármacos. Pacientes tratados com corticosteroides possuem depressão do sistema imune, predispondo a infecções e apresentam atraso na cicatrização, podendo esse efeito ser revertidos por vitamina A e esteroides anabolizantes. Segundo, Romana-Souza et al. (2010), por esse motivo, o estresse pode produzir o mesmo efeito, através da ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. A radioterapia, por sua vez, pode inibir a cicatrização, pois reduz a angiogênese, deposição e substituição do colágeno e aumenta a taxa de fibrose cutânea (MACPHAIL, 2014). 2.5 Tipos de cicatrização Feita a avaliação da ferida, é necessário definir qual será o método de eleição para sua oclusão, por meio de fechamento cirúrgico ou não. Um ferimento pode cicatrizar por diferentes técnicas (PAVLETIC, 2010). Para isso, deve-se considerar a classificação e o estágio cicatricial em que a ferida se encontra. 2.5.1 Cicatrização por primeira intenção Nesse caso, a oclusão ocorrerá por suturas cirúrgicas, sendo possível somente se as bordas estiverem próximas o suficiente e se o ferimento for recente, cerca de 6 27 a 8 horas da lesão. Ainda, o fechamento primário é recomendado em feridas livres de contaminação e infecção (MACPHAIL, 2014). 2.5.2 Cicatrização por segunda intenção Em contrapartida, feridas que possuem perda tecidual, que já ocorreram há mais de 8 horas e estão com certa contaminação, não devem ter as margens aproximadas por meio de suturas, uma vez que, as chances de deiscência dos pontos e necrose são frequentes. Dessa forma, devem ser tratadas como feridas abertas, onde o fechamento ocorrerá com a formação de um novo tecido, por meio da deposição de colágeno, formação de tecido de granulação e epitelização, sendo que esse processo é mais lento, podendo levar meses (MACPHAIL, 2014). 2.5.3 Cicatrização por terceira intenção A cicatrização por terceira intenção refere-se a junção das duas anteriores, isto é, quando inicialmente opta-se por deixar o ferimento cicatrizar por segunda intenção e depois que a ferida já apresentou certa melhora, reduziu seu tamanho e já apresenta tecido de granulação saudável, realiza-se a oclusão por meio de suturas (WATANABE, 2010). 2.6 Tratamento de feridas abertas Em medicina veterinária, a casuística de feridas de diferentes etiologias é bem comum, no entanto, muitas vezes, a lesão não é a comorbidade mais grave do animal. Atropelamentos e ataques estão entre as causas mais recorrentes e nesses casos, os locais de traumatismo são incertos, podendo haver afecções que coloquem em risco a vida do paciente. Para tanto, o veterinário deve estar preparado para realizar essa triagem, utilizando-se do protocolo ABCDE do trauma, o qual ranqueia as prioridades de atendimento emergencial - avaliação das vias aéreas (Airway), respiração espontânea (Breathing), circulação sanguínea (Circulation), capacidade neurológica (Desability) e, por último, avalia-se a exposição das lesões (Exposition) (AGUIAR, 2006). Inicialmente, o ferimento deve ser isolado com bandagens provisórias, contendo possíveis hemorragias e evitando danos adicionais; em seguida, deve-se estabilizar a condição do animal antes que o controle da lesão seja efetuado (MACPHAIL, 2014). Feito isso, partindo para o manejo da ferida propriamente dita, 28 deve-se lembrar de classificá-la, vide Quadro 1. Segundo MacPhail (2014), as primeiras 6 a 8 horas desde a lesão são consideradas “horas de ouro”, sendo que atendimentos iniciados dentro desse prazo possuem maiores chances de sucesso. Quando se efetua a limpeza inicial da ferida, o objetivo é remover o máximo de contaminantes e tecidos inviáveis, a fim de torná-la mais adequada para fechamento por primeira ou segunda intenção. No geral, a indução anestésica e analgesia do paciente são necessárias para exame e cuidados iniciais, visto que, é um procedimento doloroso que pode ocasionar estresse para o animal. Partindo disso, é preciso realizar tricotomia ampla da região adjacente ao ferimento, a fim de evitar contaminação iatrogênica e possibilitar melhor viabilização da região acometida. Dernell (2006) recomenda proteger a ferida da entrada de pelos com auxílio de gazes estéreis umidificadas em solução fisiológica ou gel. Posteriormente, realiza-se a antissepsia das imediações com solução antisséptica, como clorexidina ou iodopovidona. Feito isso, inicia-se a lavagem da ferida, a qual deve ser copiosa e com alta pressão, a fim de reduzir sua contaminação e retirar possíveis corpos estranhos e sujidades. Preconiza-se a utilização de solução de ringer com lactato ou solução fisiológica 0,9% aquecidas, pois são isotônicas e causam menores danos ao tecido. Na ausência dessas diluições, a lavagem com água corrente pode ser feita, no entanto, por ser hipotônica, causa certos danos celulares (MACPHAIL, 2014). Ainda, é possível preparar uma soluções com antissépticos, como solução de iodopovidona a 0,1% (diluição de 1 parte de iodo para 9 partes de solução salina) ou solução de clorexidina a 0,05% (diluição de 1 parte em 40 partes de solução salina estéril), tais preparos possuem propriedades antimicrobianas e não geram dano ao tecido (PAVLETIC, 2010). O desbridamento, por sua vez, é uma etapa importante para otimização da cicatrização, visto que, remove tecidos inviáveis (necrosados) e possíveis secreções, corpos estranhos e agentes infectantes. Esse procedimento pode ser feito de maneira cirúrgica, autolítica, mecânica, enzimática ou biocirúrgica (MACPHAIL, 2014). Segundo Pavletic (2010), o desbridamento pode ser seletivo, quando remove apenas o tecido necrótico; ou não seletivo, quando acaba lesando também porções viáveis do tecido cicatricial. 29 O desbridamento autolítico utiliza-se de géis tópicos ou bandagens hidrofílicas que fornecessem ambiente úmido na ferida, o qual permite a ação de enzimas endógenas sobre tecidos necrosados; já o enzimático, trabalha por meio da atividade de enzimas proteolíticas exógenas, as quais são aplicadas topicamente e decompõe necroses, coágulos e a biopelícula bacteriana, ambos os métodos são seletivos. Em contrapartida, o desbridamento cirúrgico se dá pela excisão do tecido desvitalizado através de bisturi e tesouras cirúrgicas. Deve-se desbridar a musculatura até que essa apresente sangramento e o subcutâneo deve ser evitado, principalmente em gatos, pois pode atrasar a cicatrização e predispor a infecções (BOHLING e HANDERSON, 2006; MACPHAIL, 2014). Já o desbridamento mecânico ocorre por meio do arrancamento do tecido necrótico através de curativos que secam sobre o ferimento e se aderem à superfície, como úmido-seco ou seco-seco. Os dois últimos, são métodos mais rápidos, mas que acabam removendo partes viáveis da lesão - não seletivos (PAVLETIC, 2010). Por fim, o desbridamento biocirúrgico é feito com o auxílio de larvas de mosca estéreis que irão secretar enzimas e degradar tecidos necróticos, desinfetar e promover a formação do tecido de granulação. Essa terapia é mais usada em ferimentos crônicos, que não cicatrizam e que possuem alto grau de necrose e infecção (MACPHAIL, 2014). 2.6.1 Tratamentos tópicos De acordo com MacPhail (2014), em complemento a essa terapia, o veterinário pode recorrer ao uso de antibióticos e antimicrobianos tópicos, os quais irão auxiliar na prevenção e controle de infecções. A utilização de antibióticos tópicos no leito da ferida em 1 a 3 horas após a contaminação, impede a sua dispersão. Por conta disso, é importante que se realize a cultura e antibiograma prévios do material da ferida, com o intuito de se determinar que tipos de agentes estão se proliferando e quais medicamentos serão eficazes contra ele. Em casos que ocorra risco de bacteremia e disseminação da infecção o uso de antibióticos sistêmicos é importante. Esses compostos, podem ser empregados por meio de pomadas ou adicionados nas soluções de lavagem (penicilinas, cefalosporinas, tetraciclinas e ampicilina). Vale destacar que, um princípio relevante da terapia é o de que os benefícios desses fármacos se sobreponham aos seus efeitos citotóxicos, de modo que, não interfiram no processo de cicatrização (PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). 30 Dentre os principais antibióticos tópicos usados na clínica de pequenos animais pode-se citar: pomada de bacitracina-neomicina-polimixina, pomada de gentamicina, sulfadiazina de prata e nitrofurazona (PAVLETIC, 2003; KRAHWINKEL e BOOTHE, 2006; MACPHAIL, 2014). A primeira, também conhecida como pomada antibiótica tripla, possui amplo espectro de ação contra bactérias patogênicas, mas ação limitada contra Pseudomonas spp. É normalmente usada em ferimentos superficiais, no início, para prevenção de infecções. A bacitracina de zinco auxilia no processo de epitelização, mas retarda a contração cicatricial, possui baixa toxicidade sistêmica (KRAHWINKEL e BOOTHE, 2006; MACPHAIL, 2014). A sulfadiazina de prata 1%, encontrada na forma de creme e pomadas, atua contra bactérias gram-positivas e gram-negativas, também sendo eficaz contra fungos. Ademais, é capaz de adentrar nos tecidos necróticos e auxiliar no mecanismo de desbridamento e reepitelização. É o fármaco de eleição para tratamento de feridas ocasionadas por calor (queimaduras), podendo agir por até 3 dias e com associação de curativos por até 7 dias. Estudos demonstraram ausência de toxicidade para as células cicatriciais humanas, tais como macrófagos, queratinócitos e fibroblastos (PAVLETIC, 2003; KRAHWINKEL e BOOTHE, 2006; MACPHAIL, 2014). Produtos à base de sulfato de gentamicina, estão disponíveis como pomada 1%, pó e soluções, sendo eficazes contra agentes gram-negativos. Em soluções isotônicas promove contração da ferida e epitelização (PAVLETIC, 2003; MACPHAIL, 2014). No entanto, de acordo com MacPhail (2014), cremes de gentamicina à base de óleo em contato com água atrasam esses processos. Por fim, a nitrofurazona caracteriza-se pelo amplo espectro gram-positivo e propriedade hidrofílica, sendo que age pouco sobre Pseudomonas spp. Atrai fluidos para o leito da ferida, permitindo a dissolução de secreções para que essas sejam absorvidas (MACPHAIL, 2014). Segundo descrito por Pavletic (2003), tem sido sugerido que retarda a reepitelização da ferida, embora tal comprovação necessite de mais pesquisas. É comum o emprego de estimuladores tópicos de cicatrização, os quais ajudam no controle desses ferimentos. A aloe vera é um gel extraído da babosa, planta bastante conhecida, possui em sua composição acemannan e alantoína, os quais 31 promovem cicatrização tecidual e crescimento epitelial, respectivamente. Ainda, possui propriedades antibacterianas e fúngicas e efeito estimulante de replicação fibroblástica. Quando usada em conjunto a sulfadiazina de prata, ameniza seus efeitos colaterais. Outros compostos recorrentes são o mel e o açúcar. O mel quando utilizado em ferimentos promove desbridamento autolítico, reduz edema e inflamação, auxilia na formação do tecido de granulação e na reepitelização. Seus atributos antimicrobianos, provém de enzimas do peróxido de hidrogênio, que surge pela oxidação da glicose, do seu baixo pH e hipertonicidade e presença de inibina (PAVLETIC, 2010). Deve ser usado no início do processo cicatricial até a formação de tecido de granulação saudável. (MACPHAIL, 2014). Salienta-se que, o mel para consumo não deve ser usado em feridas e sim aquele esterilizado por meio de irradiações gama (DUNFORD et al., 2000). No que diz respeito ao açúcar, possui efeitos hipertônicos similares. Deve ser usado no início da fase inflamatória até a fase de reparo. Ele atrai macrófagos, acelera a descamação tecidual, é fonte de energia e favorece a formação de tecido de granulação saudável. Devido a sua osmolaridade, reduz a umidade da ferida e a proliferação bacteriana (PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). Sua limitação sucede-se da necessidade de um leito vasto e úmido para aderência de seus grânulos. Estudo realizado por Serafini et al. (2012) mostra o uso bem sucedido do açúcar em forma de gel, como alternativa nesses casos, devido a sua melhor aplicabilidade. 2.6.2 Bandagens e curativos Outro ponto integrante na terapia de feridas são as bandagens e curativos, visto que, operam como uma espécie de revestimento, o qual protegerá o ferimento e fornecerá um ambiente adequado para a cicatrização. Destaca-se que o curativo fica em contato íntimo com a ferida, podendo ou não necessitar de um suporte adicional para mantê-lo no local correto. As bandagens são esses envoltórios de sustentação (PAVLETIC, 2010). Além de manter o local limpo, Pavletic (2010) e MacPhail (2014) descrevem que tais artifícios mantêm os medicamentos tópicos aplicados por mais tempo, reduzem edemas e hemorragias, eliminam espaço morto, imobilizam a lesão evitando danos adicionais e amenizam o tecido cicatricial formado. Ademais, propiciam maior conforto ao animal, absorvem exsudatos e tornam o ferimento esteticamente melhor. Para isso, as bandagens devem ser efetuadas de maneira correta ou podem acabar 32 prejudicando o processo cicatricial. Segundo os mesmos autores, as bandagens são compostas por três camadas: a primária (curativo de contato), secundária (intermediária) e terciária (externa). 2.6.2.1 Camada de contato De acordo com MacPhail (2014), para a escolha de um curativo de contato apropriado é preciso determinar em qual etapa de cicatrização está o ferimento, se há presença de exsudato, local e profundidade da lesão, se há ou não escaras e quantidade de infecção e necrose. Vale ressaltar que não existe um curativo adequado para todos os tipos de ferida e um mesmo ferimento pode necessitar de diferentes tipos dependendo da fase cicatricial em que se encontra (PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). A função desta camada é manter fármacos tópicos em contato com a ferida, manter o ambiente úmido facilitando o desbridamento autolítico, absorção de exsudatos e vedação, além de trazer certo alívio doloroso e evitar a perda demasiada de fluidos. Dentre as propriedades da camada de contato, destacam-se: ser aderentes ou não aderentes, absorventes, semioclusivas ou oclusivas e retentoras de umidade. Segundo Pavletic (2010), um determinado curativo pode ter mais de uma dessas características. No primeiro caso, enquadram-se as bandagens úmidas-secas e secas-secas; quando utilizadas auxiliam no desbridamento mecânico da ferida, pois se aderem ao leito do ferimento e ao serem removidas, retiram porções de necrose e detritos. Destaca-se que esse tipo de curativo deve ser usado somente na fase inicial, pois promove desbridamento não seletivo, podendo lesar tecidos viáveis, e causa bastante dor ao animal. A vantagem das bandagens úmidas em relação as secas é que além de trazer mais conforto ao paciente, permite maior absorção de exsudatos viscosos, por esse motivo são mais utilizadas (FOSSUM, 2014). Pavletic (2010) recomenda o uso desse tipo de curativo apenas nas primeiras 72 horas, as quais correspondem a fase inflamatória, evitando dano ao tecido de granulação emergente. Já os curativos não aderentes, não se prendem na superfície da pele. Normalmente, são usados em feridas com tecido viável, em fase proliferativa ou naquelas que receberam enxerto de pele (Pavletic, 2010). Normalmente, são semioclusivos e são compostos por uma camada de gaze embebida em substância viscosa, como petrolato (vaselina) ou parafina. Possuem a função de fornecer 33 ambiente úmido para a cicatrização e epitelização, impedindo a dessecação e permitindo a drenagem de líquidos em excesso para a camada secundária, sendo sua necessidade de troca menor, cerca de 1 vez a cada 3 a 7 dias (MACPHAIL, 2014). Pavletic (2010) ainda descreve o uso destes curativos associados a pomadas, cremes e géis cicatrizantes, potencializando seu efeito. Pode-se utilizar também as camadas de contato não aderentes e oclusivas, as quais são impermeáveis ao ar e utilizadas em feridas em fase de reparo saudáveis e com pouco exsudato. Formam um ambiente úmido e com baixa tensão de oxigênio, favorável a migração de macrófagos, proliferação de fibroblastos, neovascularização e epitelização. Devem ser revestidas externamente por camada de fitas adesivas, de borracha ou plástico. Podem apresentar camada hidrocoloide adesiva associada ou películas de poliuretano, hidrogel e outras pastas hidrófilas, são menos utilizadas na medicina veterinária (MACPHAIL, 2014). Os curativos de caráter absortivos podem ser usados tanto na camada de contato, como na secundária. Eles geralmente são preferíveis na fase inicial, pois é o momento em que a ferida apresenta mais secreções, devido ao processo inflamatório e muitas vezes infeccioso, que gera congestão de vasos. Como já mencionado, os curativos do tipo úmido-seco e seco-seco, apresentam essa propriedade, no entanto, existem outros curativos hidrofílicos absortivos que podem ser usados, como a espuma de poliuretano (PAVLETIC, 2010). 2.6.2.2 Camada secundária A camada intermediária é responsável não só por manter o curativo de contato junto à ferida, mas também é usada para absorver exsudatos, detritos, bactérias e enzimas e mantê-los afastados do ferimento; para fornecer proteção mecânica à lesão, impedindo seu movimento e traumatismos. Para isso, ela deve possuir capilaridade e ser espessa, podendo-se utilizar algodão hidrofílico. Ressalta-se que a aplicação de pressão no processo de confecção dessa camada, auxilia na redução de espaço morto da ferida, o qual pode propiciar o aparecimento de seroma (MACPHAIL, 2014). 34 2.6.2.3 Camada terciária A camada mais externa é aquela utilizada para proteger a bandagem de contaminação e oferecer sustentação para as demais camadas. Pode ser confeccionada com ataduras de algodão, fita adesiva cirúrgica (esparadrapo e micropore) ou faixas autocolantes e elásticas (CAMPBELL, 2006; MACPHAIL, 2014). Frequentemente, as feridas estão em locais de difícil acesso para execução de uma bandagem convencional (quadril, ombro, axila, períneo); desse modo, uma técnica bastante utilizada na veterinária é a de bandagem do tipo “Tie-over”. Para sua execução é preciso realizar suturas na pele ao redor do ferimento, as quais devem ficar com um laço frouxo, que possibilite a passagem dos fios para fixação. Feito isso, realiza-se o curativo primário e secundário sobre a ferida e por fim, coloca-se gazes/compressas estéreis que serão a camada terciária, qual será fixada por meio de suturas realizadas com fios de algodão. É possível ainda, adicionar camada impermeabilizante por fora, a fim de evitar a contaminação da bandagem (MACPHAIL, 2014). 2.6.2 Cirurgias reconstrutivas Quando o ferimento é muito extenso, impossibilitando a síntese por primeira intenção e quando a oclusão secundária se torna uma alternativa vagarosa, torna-se viável a realização de cirurgia reconstrutiva. Para tal propósito, há diversos procedimentos de reconstrução disponíveis, no entanto, é preciso avaliar cada situação como única, a fim de selecionar a melhor técnica (SCHEFFER et al., 2013; MACPHAIL, 2014). O ponto de partida para escolha de qual estratégia será utilizada é examinar a viabilidade do tecido da ferida, o local onde situa-se a lesão e seu suprimento sanguíneo, bem como a disponibilidade e tensão do tecido adjacente. As linhas de tensão são geradas pela força do tecido fibroso presente na derme; ela não é constante, podendo variar de acordo com a região do corpo, espécie, raça, idade, conformação e até gênero do animal (PAVLETIC 2010). Tal tensão retrai as bordas de uma incisão de maneira centrífuga, dessa forma, feridas que são paralelas a linha de tensão possuem melhor cicatrização, devendo essas, quando suturadas, serem fechadas no mesmo sentido (MACPHAIL, 2014). Outra problemática que pode afetar o sucesso cirúrgico é o local da lesão, há partes no corpo onde o grau de 35 movimentação e estiramento do tecido é grande, podendo tensionar excessivamente a sutura. Atentar-se a esses tópicos é essencial para evitar deiscência de pontos, necrose, atraso na cicatrização e desconforto para o paciente (PAVLETIC, 2003). Há defeitos que podem ser fechados apenas por meio de incisões de relaxamento e técnicas de plastia. Entretanto, ferimentos amplos ou em regiões de tecido circundante limitado necessitam de deslocamento de pele de outros locais; nessa categoria enquadram-se os retalhos e enxertos. Os retalhos pediculados são segmentos de pele, envolvendo epiderme e derme, os quais são deslocados de um leito doador para um local de lesão. Eles possuem irrigação própria, possibilitando maior sobrevida do tecido após a cirurgia. Retalhos de padrão axial, incluem uma veia e uma artéria cutâneas diretas e por isso, possuem 50% maiores chances de se tornarem viáveis do que retalhos subdérmicos, os quais contam somente com a perfusão do plexo subdérmico (PAVLETIC, 2003; MACPHAIL, 2014). Retalhos locais são aqueles produzidos próximos ao defeito de pele. Dentro dessa categoria, temos os retalhos de avanço, que possuem padrão subdérmico e são retirados da pele adjacente à ferida, a qual é solta e elástica, permitindo o deslizamento e recobrimento da área de falha. É o tipo mais recorrente na veterinária. Podem possuir um único pedículo ou serem bipediculados e para facilitar o seu deslocamento, pode-se utilizar de técnicas de relaxamento como plastia em “VY” ou H-plastia, as quais permitem maior elasticidade do tecido e fechamento completo do defeito (PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). Pavletic (2010) e MacPhail (2014) também descrevem nessa categoria os retalhos rotacionais, os quais possuem formato semicircular e compartilham a mesma borda que o ferimento, recobrindo-o por meio de rotação de 90º ou 45º; os retalhos de transposição, que são retangulares e dividem uma margem com a ferida, a qual é o ponto de articulação que se rotaciona em até 90º; e por fim, os retalhos de interpolação, que são uma modificação do método de transposição, entretanto, nesse caso não há contato com uma das borda da ferida, havendo segmento de pele entre o flape e o defeito; assim, quando o retalho for criado, o comprimento do flape deve levar em conta o tamanho da porção de pele intermediária. 36 Dispõe-se ainda dos retalhos distantes, criados longe do ferimento e que exigem reconstrução em múltiplos estágios (PAVLETIC, 2010). Enquadram-se nessa classe os retalhos em bolsa e em dobradiça, usados para reconstruir pele, principalmente, em porção distal de membros. Outro tipo são os retalhos compostos, os quais são assim denominados por apresentarem outras estruturas em sua composição, como músculo, ossos e cartilagem (MACPHAIL, 2014). Outro recurso bastante utilizado na cirurgia reconstrutiva são os enxertos cutâneos. Esses são porções livres de pele, as quais são removidas de um leito doador e transferidas a locais de lesão mais distante, onde irão adquirir novo suprimento sanguíneo. Classificam-se em enxertos totais, quando junto com a epiderme é levada toda a derme ou enxertos parciais, quando parte da derme é seccionada do segmento. São recomendados para ferimentos livres de contaminação ou tecidos necróticos, que possuem tecido de granulação saudável, possibilitando realizar a justaposição das bordas cutâneas. Normalmente, são usados em defeitos em membros ou lesões extensas em tronco (SWAIM, 2003; MACPHAIL, 2014). Com relação a sua origem, os enxertos podem ser retirados do mesmo animal que irá recebê-lo (autoenxerto); de um animal da mesma espécie do receptor (aloenxerto/homoenxerto) ou de uma espécie diferente da do receptor (xenoenxerto/heteroenxerto). No último caso, segundo MacPhail (2014), as chances de rejeição são maiores. No que concerne ao leito da ferida, esse deve estar limpo e conter tecido de granulação saudável, a fim de fornecer vascularização adequada para as cirurgias reconstrutivas. Presença de contaminantes, bactérias, tecido de granulação exuberante, tecido adiposo avascular, úlceras crônicas, lesões por esmagamento afetam negativamente a qualidade dos enxertos no pós operatório. Regiões com ausência de tecido conjuntivo, como ossos, tendões, cartilagens e nervos, não suportam aplicação de tal técnica (SWAIM, 2003; MACPHAIL, 2014). A utilização de suturas de ancoragem para fixar o enxerto no tecido de granulação é importante, assim como o uso de bandagens compressivas, bem acolchoadas e não aderentes, as quais irão aumentar a adesão e manter o local o mais imóvel possível, absorvendo líquidos e evitando traumatismos (PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). Os enxertos de espessura total, no geral, apresentam-se mais viáveis do que o de espessura parcial. São preferíveis em lesões em porção distal de membro e partes 37 flexoras e quando cicatrizados, adquirem aspectos físicos semelhantes ao da pele normal (MACPHAIL, 2014). Nessa classificação estão as técnicas de enxertos em malha, tampões, faixas e camadas de pele. Por sua vez, enxertos parciais, que possuem espessura variável de derme, são mais frágeis e podem não crescer pelos, devido a remoção dos folículos pilosos. Enxertos em tampão e faixa são recomendados para regiões com lesões menores, as quais não se movimentam em excesso e nem estão sujeitas a traumatismo exógeno (MACPHAIL, 2014). Seu formato é variado, sendo aplicado, normalmente, em feridas com tecido de granulação e contorno irregular com baixa contaminação (SWAIN, 2003). Já os enxertos em malha são definidos pela presença de pequenas incisões (5 a 15 mm) ao longo de sua extensão, igualmente espaçadas (2 a 6 mm), as quais, segundo MacPhail (2014), promovem drenagem de exsudato, flexibilidade, conformação e expansão. São utilizados em defeitos extensos, em áreas difíceis de imobilizar. Para sua confecção pode-se usar um dispositivo especial expansor de enxerto ou realizar a mão livre, sendo que esse processo permite com que o enxerto se molde e prenda a superfícies irregulares com presença de exsudato e sangue (SWAIN, 2003; MACPHAIL, 2014). Visualmente, o resultado fica melhor quando tais fendas são feitas ao longo das linhas de tensão (MACPHAIL, 2014). O insucesso da técnica, geralmente, ocorre por separação entre o leito receptor e o enxerto, infecção, movimentação do enxerto, formação de seroma e hematomas (SWAIN, 2003; PAVLETIC, 2010; MACPHAIL, 2014). Isso pode ocorrer tanto por erros na execução do procedimento propriamente dito, como erros no manejo do animal no pós operatório. O paciente deve ficar em espaço restrito, utilizar colar elisabetano em tempo integral e fazer a troca das bandagens em intervalos adequados. 3. RELATO DE CASO Canino, sem raça definida (SRD), macho, não castrado, aproximadamente 3 anos de idade, pesando 18,300 kg. Deu entrada no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (HVET-UFU) no dia 21 de março de 2022 (dia zero) com histórico de ter sido resgatado no dia anterior. Tutora relatou que animal foi encontrado no meio do mato, local onde ela observou que apresentava ferida exposta na região anal com presença considerável de larvas de mosca no local (miíase). Ao ser levado para a casa, a tutora realizou por conta própria a limpeza do ferimento com 38 soro e água oxigenada e aplicou spray de prata. Ainda, relatou ter notado presença de miíase na boca. Ao exame físico constatou-se que animal estava prostrado, com desidratação severa (superior a 10%), enoftalmia, ECC (2/9), mucosas hipocoradas e secas, TPC de 2 segundos, linfonodos submandibulares megálicos, ausência de abdominalgia e organomegalia. Na ectoscopia verificou-se presença de ferida lacerante em região perineal bilateral, a qual apresentava tecido necrótico e contaminado, com odor fétido e presença de miíases; grande parte dos tecidos moles adjacentes havia sido comprometida, havendo exposição de parte das tuberosidades isquiáticas, no entanto, o ânus estava preservado (Figura 16). Apresentava também escara em face medial do membro pélvico direito. Suspeitou-se que animal poderia estar em quadro de sepse e possivelmente com hemoparasitose ou doença infecciosa concomitante. Prognóstico desfavorável. Foram coletados exames hematológicos para avaliação do estado geral do paciente e para realização de sedação (Tabela 5). Figura 16 Ferida lacerante em região perineal bilateral antes desbridamento cirúrgico inicial e remoção das miíases (21/03/2022). Fonte: Imagem cedida pelo HVET-UFU. O paciente foi anestesiado para limpeza e curativo da ferida. Como medicação pré-anestésica foi aplicado quetamina (1 mg/kg – SC) e metadona (0,2 mg/kg – IM) e para indução administrou-se propofol (dose efeito – IV). Foi efetuado o desbridamento cirúrgico da ferida perineal retirando bordas necrosadas e grande quantidade de larvas, desbridamento da ferida em membro pélvico e remoção das larvas da cavidade oral. Como a região perineal é de difícil acesso para colocação de bandagem, optou- se pela técnica de “Tie-over” associada a curativo úmido-seco para desbridamento mecânico. Foram suturados laços frouxos com fio de sutura nylon 0 ao redor da lesão, 39 aplicou-se gazes estéreis umedecidas com solução de ringer com lactato sobre o leito da ferida, seguida de camada de gazes estéreis secas, as quais foram sustentadas por compressa estéril seca fixada por meio de sutura com fio de algodão ancoradas nos laços de nylon (Figura 15). Tabela 5. Valores do hemograma e bioquímico séricos realizado no dia 21 de março de 2022. HEMOGRAMA 21/03/2022 ERITROGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Hemácias (mm3) 2,3 x 106 5,5 – 8,5 x 106 Hemoglobina (g/dL) 5,2 12 - 18 Hematócrito (%) 15,8 37 - 55 LEUCOGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Leucócitos (mm3) 24,8 x 103 6 – 17 x 103 Segmentados 66 60 - 77% / 3.000 - 11.500/mm3 Linfócitos 8 12 - 30% / 1.000 - 4.800/mm3 Plaquetas (mm3) 174.000 166.000 - 575.000 BIOQUÍMICA SÉRICA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Creatinina (mg/dL) 0,70 0,5 – 1,5 FA (U/L) 139 20 - 156 ALT (U/L) 33 21 -102 * valores de referência do HVET-UFU O paciente foi internado na unidade de terapia intensiva (U.T.I.) do HVET-UFU e mantido sob monitoramento. Foi instituída fluidoterapia com ringer com lactato, taxa de 5mL/kg/h, reavaliando conforme o grau de desidratação. Ainda foi prescrito ceftriaxona (30 mg/kg/BID/IV), metronidazol (15 mg/kg/BID/IV), enrofloxacino 10% (10 mg/kg/SID/IV), imizol (5 mg/kg/SC aplicação única), omeprazol (1 mg/kg/BID/IV), metadona (0,2 mg/kg/IM a cada 4 horas), quetamina (1 mg/kg/BID/SC), dipirona (25 mg/kg/TID/IV), complexo B (1 mL/animal/SID/IV) e Capstar® (1 comprimido/animal/ 40 SID/VO). Devido a anemia intensa, foi realizado prova de compatibilidade sanguínea para realização de transfusão de sangue total, a qual apresentou aglutinação negativa a prova de reação cruzada. Assim, como o setor de U.T.I. não possui funcionamento 24 horas, o paciente foi encaminhado para internação noturna em clínica particular com retorno no dia seguinte (22/03/2022) para continuação do tratamento. No dia seguinte, o paciente foi readmitido na internação da U.T.I. e ao exame físico apresentava FC 160 bpm, FR 20 mrpm, mucosas hipocoradas, TPC 2s, desidratação de 6-8%, PAS 110 mmHg e nível de consciência deprimido. Para correção da anemia, foi efetuada a transfusão sanguínea, 500 mL da bolsa em um período de 4 horas. Sua prescrição foi alterada: ceftriaxona (30 mg/kg/BID/IV), metronidazol (15 mg/kg/BID/IV), enrofloxacino 10% (10 mg/kg/SID/IV), omeprazol (1 mg/kg/SID/IV), tramadol (4 mg/kg/TID/SC), dipirona (25 mg/kg/TID/IV) e complexo B (1 mL/animal/SID/IV). Foi encaminhado para internação noturna novamente. No dia 2 (23/03/2022), retornou para internação na U.T.I. Apresentava parâmetros clínicos dentro da normalidade. Foi realizado hemograma para verificação da condição clínica pós transfusão (Tabela 6). Realizada limpeza do ferimento e curativo refeito (Figura 17). Passado o dia, como o paciente se manteve estável, se alimentando espontaneamente, foi concedida a alta da internação, sendo encaminhado para casa com receitas e retorno diário para troca da bandagem e avaliação do ferimento. Prescrito, via oral, enrofloxacino 150mg (8 mg/kg/SID por 2 dias), metronidazol 400mg (21 mg/kg/BID por 3 dias), Doxitrat® 80mg (6,5 mg/kg/BID por 28 dias), omeprazol 20mg (1 mg/kg/SID por 14 dias), cloridrato de tramadol 50mg (5mg/kg) e dipirona 500mg (25 mg/kg) TID por 7 dias e meloxicam 2mg (0,1 mg/kg SID por 4 dias). Tabela 6. Valores do hemograma pós transfusão sanguínea, realizado no dia 23 de março de 2022. HEMOGRAMA 23/03/2022 ERITROGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Hemácias (mm3) 4,33 x 10⁶ 5,5 – 8,5 x 106 Hemoglobina (g/dL) 8,5 12 - 18 Hematócrito (%) 28,2 37 - 55 41 LEUCOGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Leucócitos (mm3) 18,1 x 10³ 6 – 17 x 103 Segmentados 82 60 - 77% / 3.000 - 11.500/mm3 Linfócitos 8 12 - 30% / 1.000 - 4.800/mm3 Plaquetas (mm3) 296.000 166.000 - 575.000 * valores de referência do HVET-UFU Figura 17 Bandagem do tipo "Tie over" com curativo úmido-seco (23/03/2022). Fonte: Imagem cedida pelo HVET-UFU. Três dias depois (24/03/2022), já havia sido removida grande parte do tecido necrótico da ferida, logo, suspendeu-se o uso do curativo úmido-seco e iniciou terapia tópica com sulfadiazina de prata, mantendo o curativo do tipo “Tie-over”. Aos fins de semana, era realizado encaminhamento para realização dos procedimentos de limpeza e curativo do ferimento. Decorridos sete dias (28/03/2022), o animal retornou para realização de curativo, no entanto, ao exame físico, verificou-se que os pontos do “Tie-over” haviam caído. Dessa forma, foi necessário refazê-los. Foi aplicado 3mg/kg de lidocaína ao redor da ferida, nos pontos de inserção dos fios, a sutura foi refeita com fio nylon 2-0. A ferida apresentava-se úmida com tecido de granulação rosado com algumas áreas mais claras, ainda havia exposição de tuberosidade isquiática direita (Figura 18). 42 Figura 18 Ferimento em região perineal bilateral, queda dos pontos do "Tie-over" (28/03/2022). Fonte: Imagens cedidas pelo HVET-UFU. No dia 8 (29/03/2022), o animal pesou 23 kg e apresentava-se ativo. Verificou- se que a ferida já estava em fase de granulação e optou-se pela troca da pomada de sulfadiazina de prata por Vetaglós®. O manejo do curativo continuou o mesmo: limpeza da ferida com solução de ringer lactato, aplicação de camada de contato com gazes estéreis com Vetaglós®, camada de gazes estéreis secas e compressa estéril ancoradas por fios de algodão no “Tie-over”. Assim, paciente continuou comparecendo ao HVET-UFU diariamente para manutenção do curativo. Onze dias passados (01/04/2022), o ferimento já apresentava retração das bordas e recobrimento da tuberosidade isquiática com tecido de granulação, o qual apresentava coloração avermelhada e saudável (Figura 19). 43 Figura 19 Ferimento com contração das bordas e tecido de granulação saudável recobrindo tuberosidade isquiática (01/04/2022). Fonte: Imagem cedida pelo HVET-UFU. No dia 15 (05/04/2022), animal compareceu ao hospital para limpeza diária da ferida, estava pesando 31 kg. Avaliou-se que o leito da ferida era viável para tentativa de fechamento por cirurgia reconstrutiva. Optou-se pela técnica de enxerto cutâneo total em malha. Para isso, foram colhidos exames hematológicos pré-operatórios (Tabela 7). Foi receitado Metacell® Pet para suplementação vitamínica, BID por 30 dias. Tabela 7. Valores do hemograma e bioquímicos séricos pré-operatórios, realizado no dia 05 de abril de 2022. HEMOGRAMA 05/04/2022 ERITROGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Hemácias (mm3) 5,0 x 106 5,5 – 8,5 x 106 Hemoglobina (g/dL) 9,5 12 - 18 Hematócrito (%) 33,3 37 - 55 LEUCOGRAMA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Leucócitos (mm3) 14,2 x 103 6 – 17 x 103 Segmentados 35 60 - 77% / 3.000 - 11.500/mm3 Linfócitos 17 12 - 30% / 1.000 - 4.800/mm3 Plaquetas (mm3) 413.000 166.000 - 575.000 44 BIOQUÍMICA SÉRICA RESULTADO VALOR DE REFERÊNCIA Creatinina (mg/dL) 0,70 0,5 – 1,5 ALT (U/L) 33 21 -102 Albumina (g/dL) 2,3 2,6 - 3,3 * valores de referência do HVET-UFU No dia 16 (06/04/2022) foi efetuada a cirurgia. Quando chegou, o paciente apresentava FC 80 bpm, FR 124 mrpm, PAS 110 mmHg, mucosas normocorada, TPC 1s e TR de 38,2ºC. Como medicação pré anestésica foi utilizada metadona (0,2 mg/kg IM). Ainda foi ministrada antibioticoterapia profilática com ampicilina (20 mg/kg IV). Como método de anestesia local foi realizado epidural com lidocaína 2% (3 mg/kg) e morfina (0,1 mg/kg). Para indução anestésica utilizou-se midazolam (0,3 mg/kg) e propofol (5 mg/kg), ambos por via intravenosa. Para proporcionar melhor analgesia somática, visto que seria removido segmento de pele em tórax, foi administrado quetamina (1 mg/kg SC). O tubo endotraqueal utilizado no animal foi tamanho 9,5 e ele foi mantido sobre ventilação espontânea e manutenção anestésica com isofluorano por via inalatória. Quanto ao procedimento cirúrgico propriamente dito, foi feita tricotomia ampla e antissepsia prévia da região doadora com clorexidina degermante e alcoólica. Além disso, uma bolsa de fumo foi confeccionada no ânus. A ferida foi lavada com solução de ringer lactato 250 mL com 0,1 mL de clorexidine aquoso (solução de clorexidina a 0,04%) e a pele íntegra ao redor foi tricotomizada e limpa com clorexidina degermante e alcoólica, sem entrar em contato com o ferimento. Após antissepsia, a área receptora foi medida, sendo que apresentava cerca de 13,5 cm por 8,5 cm (Figura 20). 45 Figura 20 Ferimento com ampla contração das bordas e tecido de granulação saudável, medindo 13,5cm por 8,5cm. Foto tirada antes do início do procedimento cirúrgico, após antissepsia prévia e realização da bolsa de fumo (06/04/2022). Fonte: imagem cedida pelo HVET-UFU. O paciente foi colocado em decúbito lateral esquerdo e realizado incisão retangular, com as mesmas medidas da área doadora, na região torácica lateral direita (Figura 21A). A pele foi divulsionada e feita a hemostasia dos vasos. O subcutâneo do defeito foi aproximado com fio de sutura de ácido poliglicólico (PGA 2-0) e as bordas da pele foram aproximadas em padrão de sutura Wolff, com fio de sutura Nylon 2-0, com fechamento em formato de figura geométrica X, os vértices da ferida foram fechados inicialmente e a sutura foi avançada para o centro. O enxerto de pele foi retirado e o subcutâneo foi removido até que os folículos pilosos ficassem visíveis. Foram feitas diversas incisões de relaxamento, e foi irrigado com solução fisiológica 0,9%. As bordas da ferida perineal