UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS - RIO CLARO LETÍCIA APARECIDA FRASSON OFÍCIO DE ALUNO: O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PRIMÁRIA E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE Rio Claro 2015 EDUCAÇÃO FÍSICA LETÍCIA APARECIDA FRASSON OFÍCIO DE ALUNO: O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PRIMÁRIA E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE Orientador: Prof ° Dr. Samuel de Souza Neto Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - Câmpus de Rio Claro, para obtenção do grau de licenciada em Educação Física. Rio Claro 2015 Frasson, Leticia Aparecida Ofício de aluno : o processo de socialização primária e a construção de uma identidade / Leticia Aparecida Frasson. - Rio Claro, 2015 39 f. : il., gráfs. Trabalho de conclusão de curso (licenciatura - Educação Física) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro Orientador: Samuel de Souza Neto 1. Educação física - Estudo e ensino. 2. Identidade social. 3. Ensino fundamental. 4. Infância. I. Título. 796.07 F843o Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP AGRADECIMENTOS Inicio agradecendo primeiro a Deus por sempre me amparar e me dar força nessa caminhada. Também agradeço a minha família – mãe, pai, Luan, Denis, Mariana, Lívia e Totoven (in memorian) – por toda confiança depositada em mim, por toda educação, por todas as conversas, por toda ajuda e amor durante todos esses anos. Saibam que vocês fazem parte essencial na pessoa que me tornei e estar com vocês é dádiva. Amo incondicionalmente cada um! Agradeço agora a todas as meninas com quem morei na República Devassas, durante esses 7 anos, e afirmo que a convivência com cada uma me fez uma pessoa melhor e me ensinou a ser mais tolerante. Meu muito obrigada especial a mais recente formação da Rep. que conta com: Poá, Jú, Carol e Marcelinha que de longe foi a mais harmoniosa de todas. Também agradeço especialmente a Goiás pelo ano de convivência e amizade/parceria, a qual tenho o prazer de ainda desfrutar e a Tahísa pelos muitos anos de amizade, de morada, de troca de ideias, de brigas, de puxões de orelha, de baladas, de intercâmbio – o qual ter ido com você me deixou muito mais segura e confortou muito mais meu coração – e de viagens juntas. Você foi muito importante para mim todos esses anos e apesar de estarmos afastadas atualmente, saiba que o você tem um lugar bem especial no meu coração. Com isso, aproveito para agradecer todos os amigos e pessoas que conheci durante esse tempo, pessoas essas que fizeram enxergar um mundo bem mais amplo que o que eu vivia. E não poderia deixar de dizer meu muito obrigada aos “monstrinhos” criados por mim, Mobral e Isabollas. Amo muito vocês dois e só tenho agradecer por tudo que compartilhamos. Cada troca de ideia até amanhecer do dia, cada série compartilhada, cada fitinha, ao carnaIlha, com muita tinta e muito gliter, cada balada, cada cerveja, cada ideia de merda (sempre topada por vocês) e principalmente por cada momento de brotheragem (que sim foram MUITOS...haha). Devo muito a vocês, meus lindos! E lógico não poderia deixar de expressar minha eterna gratidão a amizade e morada de 7 anos com a minha melhor amiga da Unesp, a Carol ou Bebê – como eu costumo chamar (haha) – você sabe o quanto foi e é importante para mim durante todos esses anos. Cada troca de ideia, cada experiência que compartilhamos, cada sonho que sonhamos, até mesmo no desenvolver do TCC, cada balada, cada cerveja, cada falatório depois do treino, cada comida que me fez (haha), cada favor que nunca deixou de realizar para mim e cada muitas outras coisas que vivemos juntas, coisas essas que culminaram na pessoa muito melhor (em todos os sentidos) que me tornei hoje, saiba que isso tudo tem sim um dedo seu, minha ríspida favorita. Te amo tanto que nunca conseguirei expressar! Aproveitando, agradeço também ao Tcherba, meu lindo mais lindo, por todas as trocas de ideia, pelo companheirismo de sempre e por toda paixão que você tem ao falar de qualquer coisa, espero que eu possa pegar pelo menos um pouquinho dessa paixão. E lógico, ao meu cachorro mais gato do mundo inteiro o Zé, eu te amo muito cachorrão safado e sinto muito sua falta. Agradeço também a todos os alunos da Turma de EF 2009, os quais foram de extrema grandeza para minha formação profissional e lógico os quais me acompanharam nas baladas nesses anos. Agradecendo em especial a amizade de todas as Bagasseiras (Thaysinha, Ronca, Japa, Samira, Carol, Natty, Tahísa, Becca, Koty e Vivi) foi (é) um prazer estar com vocês e acompanhar vocês nas loucuras dessa época incrível. Agradeço especialmente também as outras turmas com as quais convivi na complementação, em especial, o LEF 2010 (Risos, Cau, Rá, Tinha, Mayra, Taynara, Neymar, Cholas, Paiasso, Chico, Leandro, Jaque, Mobs e Raquel) onde fui muito bem acolhida e pude participar de inúmeros debates de grande valia para ampliar minha visão de mundo. Obrigada por tudo pessoal e muita sucesso para vocês! Agora aproveito para agradecer as Repúblicas que me acolheram e nas quais tive o prazer de viver momentos inesquecíveis são elas: a Rep. do Dani e do Emil, a Rep Bis, a Rep Misseduz, a Rep Atoas, a Rep Manicômio, Rep Cabeças e lógico a minha segunda república mais amada de Rio Claro a Rep. Pocas e Boas, na qual agradeço em especial as risadas, as insanidades, as baladas sem fim, os churras de fim de ano, enfim a amizade de cada integrante que passou por esse lugar especial, obrigada: Ayrinha (minha veterana tão querida e amada), Ju Lodder, Sarete, Ama, Irmã, Meia, Drika, Lagis e Pasculli. Agradeço imensamente todos os professores que compartilharam comigo seus conhecimentos e os quais me inspiram nessa profissão que a cada dia eu amo mais. Obrigada principalmente ao Prof. Samuel, meu querido orientador, com qual fiquei horas trocando ideias e nem vi o tempo passar, com quem dividi minhas angústias, meus conhecimentos e aprendi muito, cada ideia que compartilhamos me fez crescer imensamente tanto pessoal quanto profissionalmente. Obrigada por tudo Prof. e espero que você continue inspirando seus alunos assim como fez e faz comigo. Por fim, minha gratidão mais que especial, a minha eqüipe de 7 anos que alegrava todos os meus dias e que me fazia manter esse corpo escultural (haha). É imensurável ver o quanto fomos nos aproximando a cada dia e como nos tornamos essa família. Obrigada Futsal Feminino da Unesp Rio Claro...vocês são fodas e foi um prazer conviver/viajar com vocês todos esses anos. Agradeço também a cada apelido que me deram, a cada campeonato com ou sem título, aos dois títulos do InterUnesp, a cada zuera que fizemos juntas, a cada troca de ideia no Sujo’s ou no DJ, a cada tradiça, a cada role de boa, a cada praia, ou seja, a cada momento que vivemos juntas, cada um de vocês é muito importante para mim e me fez tornar uma pessoa cada vez melhor. Agradeço especialmente as minhas veteranas: Karina (por cada brincadeira saudável dentro e fora de quadra), Irmã, Carrets, Má Japa e Thaysa; a minha companheira de início ao fim Raquelzinha; as minhas bixetinhas mais que especiais e que nunca me respeitaram Ama (minha amora), Lagis (minha gordinha) e Lívia (minha risada mais gostosa); e também a Mayarinha, Maíra, Isabollas, Lodder, Gi, Dê, Loren, Fofa (minha véia mais querida), Lari e Ana Japa. Letúcia ama vocês meninas! E lógico, meu obrigada também, aos meus treinadores de todos esses anos: Dú, Gui, Testô, Dé, Cholas, Renan, Neymar (meu neguinho obrigada por tudo que compartilhamos dentro e fora de quadra, por me apoiar e estar comigo sempre. Você tem um lugar muito especial no meu coração!) e Rob, o qual me fez me tornar um ótima jogadora (haha) e principalmente uma pessoa muito melhor. Você é foda demais, Lob e terá uma vida de sucesso com certeza! Nada que eu diga aqui conseguirá demonstrar o carinho e o quanto vocês todos (as) são especiais para mim. Obrigada Unesp Rio Claro por cada momento compartilhado e vivido! Obrigada por cada serenata, cada brincadeira saudável e sei que palavra é pouco para expressar o quanto fui feliz esses anos. RESUMO Na última década dos anos 90, alguns estudos acadêmicos voltaram-se para a questão de se valorizar as investigações sobre o saber docente, o saber pedagógico e a prática pedagógica. Dentre os inúmeros temas abordados, o papel do aluno frente à escola, foi o que chamou nossa atenção. Com base nisso, estuda-se sobre o habitus do aluno, sobre seu papel enquanto ator social, sobre sua identidade de aluno, sobre seu ofício de aluno, entre outros. No âmbito desse processo e com base nas vivências da pesquisadora este estudo buscou como objetivo geral compreender o papel da socialização primária na constituição do ofício de aluno e na construção de sua identidade. Especificamente: (1) Levantar dados sobre o papel da socialização primária na construção da identidade de aluno e; (2) Identificar em estudantes do ensino fundamental como eles constituíram o seu ofício do aluno. Nosso trabalho se baseou em uma pesquisa de natureza qualitativa. Contou com 7 participantes, todos eles alunos de uma escola pública do munícipio de Rio Claro. Para coleta de dados foi utilizada a entrevista semi-estruturada. Na disposição dos resultados optou-se pela divisão em três eixos: (1) Infância, (2) Escola e (3) Ofício de aluno. Já para análise do conteúdo, a discussão, separou-se em dois eixos temáticos: o primeiro sobre a socialização primária na construção da identidade de aluno e o segundo sobre a construção do ofício de aluno. Com isso, pudemos concluir que o ofício de aluno é de ordem: temporal, social, plural, heterogêneo, personalizado, situado, biográfico e estrutural. E que papel que o aluno desenvolve na escola é influenciado pela socialização primária (família e escola) à qual o mesmo foi submetido. Porém, deixamos aqui uma contribuição singular, visando que futuros projetos possam ser desenvolvidos de forma a ampliar o entendimento desse tema. Palavras-chave: identidade, ofício de aluno, socialização primária SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 4 1.1. O cenário da pesquisa 4 1.2. O problema de estudo 5 1.3. O problema de estudo e a sua importância 6 2. OBJETIVOS 8 3. REVISÃO DE LITERATURA 8 3.1. Aprendizagem discente 8 3.1.1. A construção do Habitus 9 3.1.2. Ofício de aluno 11 3.1.3. A identidade na socialização primária 13 4. METODOLOGIA 15 4.1. Pesquisa qualitativa 15 4.2. Técnica utilizada para a coleta de dados 16 4.3. Participantes do estudo 18 4.4. Forma de análise dos resultados 18 5 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 19 5.1. Infância 19 5.2. Escola 21 5.3. Ofício de aluno 22 6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 26 6.1. A socialização primária na construção da identidade de aluno 26 6.2. A construção do ofício de aluno 29 6.2.1. A aprendizagem do ofício de aluno é social e temporal 29 6.2.2. A aprendizagem do ofício de aluno é plural e heterogênea 30 6.2.3. A aprendizagem do ofício de aluno é personalizada e situada 31 6.2.4. A aprendizagem do ofício de aluno é biográfica e estrutural 31 7. CONCLUSÃO 32 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA 34 ANEXO I – ENTREVISTA 37 ANEXO II – TCLE 38 4 1. INTRODUÇÃO 1.1 O Cenário da Pesquisa A escola, o professor, o aluno, a relação professor-aluno, a relação ensino e aprendizagem são alguns dos temas estudados pela área da educação. Entre esses diferentes eixos temáticos de estudo, fizemos um recorte visando conhecer o aluno, pois, embora seja um ator social visto por todos pouco se sabe sobre ele fora do âmbito do ensino e da aprendizagem. A ideia de estudar o aluno nasceu da minha inserção no PIBID, projeto de iniciação à docência desenvolvido numa escola de ensino fundamental pública e da própria experiência como aluna. Entretanto, como nesse grupo nós fizemos leituras de textos vinculados aos temas “Os Professores e a sua Formação”, “Vida de Professor”, “Didactica Magna: A Arte de Ensinar Tudo a Todos” e “Ofício de Aluno”, na tentativa de se compreender melhor: quem são os professores? O que fazem...? Como surge a didática moderna? Quem são os alunos? Emergiram questões relevantes, pois para propormos metodologias inovadoras, um dos objetivos do nosso PIBID era necessário conhecer primeiro os seus atores. Porém, tentando entender melhor esta temática fizemos outro levantamento sobre o assunto, tendo emergido algumas possibilidades, tais como: as lógicas da formação que valorizassem os “estudantes como atores responsáveis pela sua formação” (TARDIF, 2008); a “experiência como aluno” (NOVOA, 1999); os saberes provenientes da história de vida individual e os lugares de formação (TARDIF, 2002) etc. Mas quase nada de estudos relacionados ao “ofício de aluno”, de se ver na atividade de ensino um exercício semelhante à atividade de trabalho. Algo até então não pensado por mim em minha trajetória de vida. Optamos por aprofundar este tema que consideramos de suma importância para a escola, os professores e, em particular, os próprios alunos. Entretanto, analisando melhor essa temática surgiram também outros questionamentos no sentido de que não se questiona o ofício de professor, mas em relação ao ofício aluno, as tarefas realizadas pelo educando podem ser consideradas como ofício? Qual é a identidade que se constrói nesse “ofício”? A sociedade enxerga o aluno também como um trabalhador? Qual é o papel/função de aluno perante a organização escolar, familiar, social? O aluno se reconhece na atividade de estudo 5 como no exercício de um ofício? Dar ao aluno este status significa melhorar as relações e atividades do processo de escolarização? 1.2. O Problema de Estudo Desde os primórdios da história da educação, a escola sofreu forte influência da religião e depois dos modelos de educação. No presente apesar das mudanças havidas permanecem, ainda, em sua maioria, os vestígios do modelo tradicional de ensino, conhecido também como modelo de transmissão de conhecimento, mudando-se apenas os conteúdos ensinados. No entanto com o passar do tempo e com o aumento dos estudos sobre desenvolvimento humano, ocorreu uma certa reforma educacional, onde “inseriram formas de organização e de ação pedagógica que dessem ao aluno um ofício em que a sua atividade fosse mais efetiva, tirando-o da condição apenas de paciente para a de agente” (INFORSATO, 2011). Outros estudiosos, como Libâneo (1982), Saviani (1984), Bordanave (1984), Mizukami (1986) também apresentaram a sua visão sobre o assunto em termos de tendências e correntes da educação, abordagens de ensino, concepção de ensino, enfim, classificando e agrupando as correntes teóricas em diferentes tipologias, juízos ou princípios vinculados ao fenômeno educativo e seus efeitos sobre o indivíduo e a sociedade. Dos trabalhos encontrados, Mizukami (1986) nos coloca que a base das teorias do conhecimento envolve três características básicas: primado do sujeito, primado do objeto e interação do sujeito-objeto. Seguindo esse itinerário levantaremos alguns elementos sobre o aluno, pois no recorte efetuado se tem o lugar de onde se olha o aluno. Assim, na Abordagem Tradicional, modelo que até o presente momento mantém as suas raízes na escola, a principal característica é a transmissão de conhecimento, pois o seu objeto é o conhecimento. O aluno é visto como o receptáculo desse conhecimento universal. Portanto, “passivo” em relação a todo processo. Na Abordagem Comportamentalista o objeto também é o conhecimento, mas acredita-se que o homem (o aluno) é o produto do meio, podendo ser inteiramente modelado pela transmissão do conhecimento decidido pela sociedade. Entretanto, com a Abordagem Humanista temos uma mudança de foco, o aluno passa a ser sujeito desse processo de escolarização, sendo considerado ativo e 6 participativo. Esta mudança de foco muda também com a Abordagem Cognitivista, colocando-o na relação interacionista entre sujeito e objeto, pois acredita-se na capacidade do indivíduo/aluno explorar o ambiente, tomar parte dele, transformá-lo e incorporá-lo em si. Mas, o foco muda mais uma vez com a Abordagem Sócio cultural, nos trazendo uma visão de que processo ensino e aprendizagem não se limita a escola. Ele é mais amplo e se insere na sociedade, na perspectiva de que o aluno desenvolva uma atitude crítica, comprometida com a sociedade e com a cultura, pois são os homens que inscrevem a sua história e determinam quem é determinado pelo social, político, econômico, histórico. Desse modo não compete a nós discutirmos as abordagens de ensino, pois este não é o nosso foco, mas se apropriar dessa concepção de aluno que perpassa determinadas visões, como na confluência das abordagens humanista, cognitista e sociocultural que conferem um lugar ativo ao aluno no seu ofício. 1.3. O Problema de Estudo e a sua Importância A ideia de ofício nos remete a uma perspectiva de escola de ofício. Essa ideia perpassa também um tempo passado em que o 'saber fazer' era passado de pai para filho, do artesão para o aprendiz, do mestre para o discípulo. Neste contexto, e não importa a época, sabemos que os alunos cumprem com algumas atividades que exigem, quase sempre... (...) ler, transcrever, copiar, resumir, transpor, redigir textos; responder a questões ou inventá-las; definir, associar, classificar, transformar as palavras, procurá-las no dicionário; analisar, completar, transformar frases; enunciar, identificar, completar, transformar formas verbais; contar, explicar, comentar acontecimentos reais ou fictícios; enunciar ou aplicar definições, regras, procedimentos; resolver problemas, fazer operações com números ou conjuntos; classificar, seriar, relacionar, agrupar objetos, símbolos, números; construir, medir, comparar, transformar figuras geométricas; fazer desenhos, diagramas, gráficos; calcular ou transformar medidas... (PERRENOUD, 1995, p. 11) Continua o autor, estas, entre tantas outras atividades rotineiras, constituem o que se denomina de o “pão-nosso de cada dia”. No entanto, percebemos que a escola é completada por muito mais atividades do que essas realizadas dentro da sala de aula. Isso fica bem explícito quando ouvimos nossos pais, avós ou até nós mesmos, contarmos como é ou era a nossa vida na escola, pois passamos por ela um longo período de nossas vidas. De modo que esses diversos anos de prática escolar acabam por gerar ou constituir um habitus social, o habitus de aluno, 7 descrito por Perrenoud (1995), como a formação de um conjunto de esquemas de ações, de pensamentos, de avaliação, de antecipação. Estes esquemas, uma vez adquiridos, não se transformam facilmente de hoje para amanhã. Mas podem comandar uma parte das novas experiências individuais, tanto na construção de uma imagem da realidade como nas condutas concretas que adota em relação aos estudos, colegas, formação, enfim, carreira. Se admitirmos esta análise, poderemos entender que a organização escolar condiciona profundamente as competências e as estratégicas que os alunos ali desenvolvem, incorporando-as. Para Perrenoud (1995), a escola além de criar um habitus, também é responsável pela produção de um ator social, pois cada organização social fabrica um tipo diferente de ator, dotado de diferentes estratégias e aprendizagens para se viver em determinado ambiente. Neste contexto podemos perceber a moldagem que a criança, enquanto aluno, é submetida ao participar da escola, local que o aluno habita dos seis aos 17/18 anos, de quatro a seis ou oito horas por dia, de 20 a 30 ou 40 horas por semana. Dessa forma, ao analisarmos estes números eles são semelhantes aos dos trabalhadores. Portanto, ao fazer essa comparação podemos também compreender que não há diferenças tão grandes, quanto à relação de tempo trabalhado por dia e por semana, de um aluno e de um trabalhador real (PERRENOUD, 1995), podendo se constituir num ofício a aquisição desse processo. Um ofício que perpassa a aquisição de uma cultura, a cultura escolar formadora também de um hábito. Assim, ambos, cada um em seu campo, tem em comum um habitus, uma identidade específica do meio aos quais pertencem nos levando a indagar como esta identidade se constrói. Que a escola é um sistema de interação social, não nos resta mais dúvidas. Com isso, temos que cada aluno, nesse ambiente, vive processos específicos de socialização, onde eles constroem a imagem de si próprios, ou seja, aonde eles vão formando sua identidade a cada nova experiência. Como foi dito por Vasconcelos (2008) onde “a constituição da identidade do aluno é um processo heterogêneo e em constante movimento.” Ainda nessa linha vemos que essa identidade também é construída a partir da disposição dos sujeitos em ocupar lugares pré-estabelecidos – como escola, fábricas, entre outros – pela sociedade. 8 2. OBJETIVOS No âmbito desse processo este estudo buscou como objetivo geral compreender o papel da socialização primária na constituição do oficio de aluno e na construção de sua identidade. Especificante se buscou: (1) Levantar dados sobre o papel da socialização primária na construção da identidade de aluno e; (2) Identificar em estudantes do ensino fundamental como eles constituíram o seu ofício do aluno. 3. REVISÃO DE LITERATURA 3.1. Aprendizagem discente 3.1.1. A Construção de um Habitus Bourdieu (2006, p. 8610) define habitus como sendo o “que se vive como mais natural, aquilo sobre o que a ação consciente não tem controle”, ou seja, é um... (...) sistema de disposições duráveis e transferíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações, e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas que permitem resolver os problemas da mesma forma e graças às correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidas por estes resultados (p. 41). Deste modo, podemos dizer que o habitus, segundo Bourdieu (1989) é um conjunto de ações que tendem a estruturar inconscientemente o agente social de tal forma que o mesmo não consiga agir de outra maneira se não daquela em que ele já está estruturado. Perrenoud (1995) afirma, ainda, que habitus é “um conjunto de esquemas de acções, de pensamentos, de avaliação e de antecipação”. O autor chama à atenção para o fato de que anos de prática numa mesma organização promovem a formação desses esquemas. Assim, tendo em vista que passamos no mínimo 12 anos da nossa vida junto a uma organização escolar nos parece óbvio afirmar que a mesma cria nos alunos, o que a sociologia chama de um habitus. 9 Habitus esse criado a partir de todas as atividades rotineiras que os alunos desempenham na escola, intituladas por Perrenoud (1995) como “pão-nosso de cada dia”. Atividades estas como: Escutar uma lição é apenas uma atividades entre outras. O resto do dia passa-o o aluno a exprimir-se, a discutir e sobretudo a ler, escrever, transcrever, copiar, recopiar textos, a fazer exercícios de gramática, de vocabulário, a resolver problemas e matemática, a construir figuras geométricas, a fazer cálculos, a classificar, a fazer diagramas, a medir, a cantar, a desenhar, a pintar, a fazer trabalhos manuais, a coser ou ainda a realizar trabalhos de campo, a preparar conferencias, a procurar informações na biblioteca, a jogar, a imitar, a fazer desporto ou teatro (PERRENOUD, 1995, p. 50). Essas atividades descritas acima são as que compõem o currículo formal – aquele que a escola nos mostra e nos cobra, o qual tem bases pedagógicas e feitas pela direção da escola, em parceria com os professores – mas e o que aprendemos e não faz parte desse currículo? Ai temos o que conhecemos como currículo escondido ou oculto – atividades que não compõem formalmente o currículo mas que são aprendidas pelos alunos, durante o período escolar. Entre elas temos: Aprender-se a viver na multidão ou isolar-se dela; Aprender-se a matar o tempo, a esperar, a acostumar-se ao aborrecimento ou à passividade da vida escolar; Aprende-se a ser-se submetido à avaliação do outro, não só a do professor mas também dos colegas; Aprende-se também a satisfazer as expectativas do professor e dos colegas; Aprende-se a viver numa sociedade hierarquizada e estratificada; Aprende-se em combinação com os outros alunos, a controlar ou, pelo menos, a influenciar, o ritmo de trabalho escolar e de progressão no programa, através de diversas estratégicas de diversão: fazer novas perguntas, mostrar que não se compreendeu, que não se encontrou material; Aprende-se a funcionar em grupo restrito, a partilhar e a utilizar, nesse grupo, os valores e os códigos de comunicação; (EGGLESTON, 1997, p.110-113 apud PERRENOUD, 1995, p. 57-58) Além disso, tudo ainda podemos incluir que aprende-se também de uma relação com o tempo através de horários e das pausas do tempo escolar; de uma relação entre o espaço privado e público e de uma relação com as regras e os saberes. (PERRENOUD, 1995, p.58). Isso nos mostra, que a escola é responsável por desenvolver um habitus social no aluno e que a criação do mesmo se dá por duas maneiras: a primeira onde a escola é dita como responsável (currículo real) e a segunda que não é papel direto da escola (currículo escondido ou oculto). Seguindo a afirmativa de que a escola além de produzir esse habitus, também é responsável pela produção de um ator social. Tendo em vista que cada organização social fabrica um tipo diferente de ator, dotado de diferentes estratégias 10 e aprendizagens para se viver em determinado ambiente. Mas sabendo que “as aprendizagens da escola preparam sem dúvida para se viver em noutras organizações construídas segundo o mesmo modelo” (PERRENOUD, 1995, p.36). Neste contexto podemos perceber a moldagem que o aluno é submetido ao tornar- se parte da escola, local que o mesmo habita dos seis aos 17/18 anos. Dessa forma, quando comparamos a vida de adultos/trabalhadores – (rotinas de trabalho) com a dos alunos percebemos que a escola como um lugar de vida e de trabalho ‘e semelhante a muitos outros. No entanto, o que diferencia um trabalhador de um aluno? ‘E o fato de que uma vida ativa está intimamente ligada ao trabalho remunerado, ao conseguir se sustentar, por esse motivo o aluno assim como o “desempregado, doente, deficiente, reformado, prisioneiro, dona (ou dono) de casa” (PERRENOUD, 1995, p.27) está fora da população ativa do país. Assim, cada um em seu campo, tem em comum um habitus, uma identidade específica do meio aos quais pertencem e que nos permite identificar a aprendizagem desse ofício, assim como aprende-se também o ofício de cidadão, de ator social e de trabalhador. 3.1.2. Ofício de aluno Exercer um oficio, ter um trabalho é uma forma de ser reconhecido pela sociedade, uma forma de existir em uma organização encarregada de perseguir finalidades e de procurar uma eficácia otimizada (PERRENOUD, 1995, p.15). Portanto, o professor exerce um ofício, o ofício de ensinar. E o aluno, ele também exerce um ofício? No Dicionário Aurélio (2010, p.1498) retiramos quatro afirmações da palavra ofício, que acreditamos ser as mais pertinentes para nosso propósito: 1. Ocupação manual ou mecânica a qual supõe certo grau e habilidade e que é útil ou necessária à sociedade. 2. Ocupação ou trabalho especializado do qual se podem tirar os meios de subsistência; profissão. 3. Ocupação permanente de ordem intelectual, ou não, a qual envolve certos deveres e encargos ou um pendor natural. 4. Atividade exercida em determinados setores profissionais ou não; cargo; função; ocupação. Partindo da primeira afirmação, percebemos que de certa forma ela se encaixa na definição que buscamos, pois os alunos de um modo ou de outro 11 acabam por desenvolver tarefas manuais e até mesmo mecânicas, em determinadas situações escolares. Estas exigem deles certo grau e habilidade para sua realização. E sabemos também a importância desse aluno para a sociedade, explicita na afirmação repetida vezes por diferentes adultos/idosos: “Criança boa é aquela que frequenta uma escola”. A segunda afirmação é talvez a que mais foge da definição que buscamos se comparada as outras, afinal ser aluno não nos remete a nenhum meio de subsistência. Mas Perrenoud (1995, p.15) afirma que: (…) os meios de subsistência não se limitam à questão material. Para existir, dependemos dos outros de uma forma ainda mais fundamental: temos necessidade que nos reconheçam uma identidade, uma utilidade, o direito de ser o que somos, de fazer o que fazemos. Com base nisso, podemos afirmar que é no ofício de aluno que as crianças e os adolescentes encontram seus meios de subsistência. Para a terceira não é uma ocupação de ordem intelectual, ser aluno, é o que? E a quarta e última definição, segue também essa linha ao abranger, o ofício de aluno como uma atividade não profissional. Assim podemos concluir que o ofício de aluno, na compreensão de Perrenoud (1995, p.15) “é, pois, aceitável de um ponto de vista semântico”. Para Almeida (2010) ser aluno comporta como atribuição um dever, ou seja, um dever ser de certa forma. Porém o que podemos perceber é que apesar de ser um dever, o mesmo não é escolhido pelo aluno, mas levado pela sociedade e pela família, a agir como um. Está embutido nele, a necessidade de ser aluno. Por isso, temos que o ofício de aluno é considerado um ofício sui generis. Primeiro porque não é pago, depois porque: a) é menos livremente escolhido que qualquer outro; b) depende fortemente de um terceiro, não somente nas suas finalidades e condições principais, mas nos seus pormenores [...]; c) exerce-se permanentemente sob o olhar e o controlo de terceiros, não só quanto aos resultados, mas também quanto às mais pequenas modalidades; d) está constantemente sujeito ao princípio de uma avaliação das qualidades e dos defeitos da pessoa, da sua inteligência, da sua cultura, do seu caráter. (PERRENOUD, 1995, p.16). Portanto, apesar de haver uma ligação entre a criança e a condição de ser aluno, muitas vezes o trabalho na escola não faz sentido para esse, devido as 12 “condições de aprendizagem contrárias às regras elementares de um funcionamento intelectual fecundo” (PERRENOUD, 1995). Apesar de existir escolas que trabalham das mais diversas maneiras, ainda, não existe um modelo ideal para suprir essa necessidade do aluno, a qual faca com que o aluno se sinta parte integrante desse sistema tido como escolar. No geral, o que vemos cada vez mais é a escassez de sentido das formas de escolarização. A escolarização se impõe, assim, como um elemento edificante de um projeto civilizatório em que o sujeito deverá aprender, no caso a criança e, depois, o adolescente, seu ofício: escrever, ler, contar, memorizar, fazer exercícios, resolver problemas, aceitar, obedecer etc. A condição do aluno e dos adjetivos que lhe são cabíveis estarão vinculados ao “sucesso” ou “fracasso” de sua vida escolar (ALMEIDA, 2010, p. 38). Porém também sabemos que a culpa não é única e exclusivamente da escola, mas sim do sistema, que engloba além da escola, a sociedade e a família, que muitas vezes não sabem explicar a importância de frequentar à escola para o filho. E então, ha sistemas de trocas para manter essa criança na escola, como por exemplo: “é para o seu bem” ou ainda “se você não passar de ano, não vai ganhar uma bicicleta nova”. Daí me surge a seguinte indagação: quando vamos começar a olhar o aluno como peça principal da escola? Quando pensaremos num sistema de ensino voltado para essa outra parte, a qual ao meu ver é mais beneficiada por frequentar esse sistema? Ou mesmo como afirma Perrenoud (1995), “Qual aluno poderá interessar-se profundamente pelo seu trabalho quando este é tão fragmentado, desconexo, caótico?” 3.1.3. A identidade na socialização primária Junto ao nosso nascimento inicia-se o que Gomes (1992) chama de “processo de transformação do ser biológico em um ser social, em um ator social típico - de sua classe, de sua sociedade, de seu tempo. Nesse processo, as bases da individualidade, da personalidade, da identidade e da cidadania são progressivamente construídas”. Mas, então, como ocorre esse processo de construção social de cada indivíduo? Isso dar-se-á por meio da socialização – subdividida, pelas ciências sociais, como primária e secundária? 13 Dubar (1997, p.73) apresenta a definição Berger & Luckmann (1966) sobre a socialização primária, considerando-a como "a primeira socialização que o indivíduo experimenta na infância, e em virtude da qual torna-se membro da sociedade" com “a incorporação deste "saber de base" na e com a aprendizagem "primária" da linguagem (falar, depois ler e escrever)” explicitando que a criança sofre influência da família e da escola. Porém, o autor ainda afirma que essa socialização também será certificada pelos adultos que estarão nesse ambiente e em outros que a criança estiver em interação. Como podemos ver pela citação descrita abaixo: “Nesta problemática, não restam dúvidas de que os saberes de base incorporados pelas crianças dependerão não só das relações entre a família e o universo escolar, mas também da sua própria relação com os adultos, que asseguram a sua socialização. A chave essencial de compreensão dos mecanismos e dos resultados da socialização primária é, assim, a valorização que é feita dos diferentes saberes possuídos pelos diferentes adultos "socializadores" e das relações que estabelecem com os diversos "socializados" (DUBAR, 1997, p.74) Desta forma, adotaremos nesse trabalho, que a socialização primária refere- se ao que a criança estabelece de relações com a família, a escola e os adultos que se relaciona, constituindo no itinerário dessa transformação para se tornar um ser social. Já para a socialização secundária Dubar (1997, p.75), com base em Berger & Luckmann (1966) afirma que esta “trata-se da incorporação de saberes especializados - que chamaremos *saberes profissionais* - que constituem saberes de um novo género”. Saberes esses adquiridos em campos específicos como a universidade, por exemplo. No entanto, o autor nos chama à atenção para que... A aquisição destes saberes pressupõe a socialização primária anterior e coloca, à partida, "um problema de consistência entre as interiorizações originais e novas". Aqui, vários casos são possíveis desde o simples prolongamento da socialização primária por uma socialização secundária cujos conteúdos concordam, simultaneamente, com o "mundo vivido" pelos membros de família de origem e, portanto, com os saberes construídos anteriormente, até à transformação radical da realidade subjectiva construída aquando da socialização primária. (DUBAR, 1997, p. 75). Dessa forma, podemos pensar que talvez haja uma dependência da socialização secundária em virtude da socialização primária, porém o autor nos deixa bem claro que esta afirmação não condiz. Tendo em virtude que “é possível propor a dupla hipótese: por um lado, a socialização nunca é completamente conseguida e, por outro, a socialização nunca é total nem acabada” (Grifo nosso) 14 (DUBAR, 1997, p.76). Portanto, tanto a socialiação primária quanto a secundária são de extrema importância na aquisição da identidade de uma pessoa no mundo. A Identidade ‘e apresentada por Dubar (1998) através de dois processos identitários distintos, porém conectados. O primeiro diz respeito “às diversas maneiras pelas quais indivíduos tentam dar conta de suas trajetórias (familiares, escolares, profissionais...)” intitulada pelo autor como a identidade biográfica ou a identidade para si. Ou seja, a mesma está ligada à como o indivíduo se autodefine. Já a segundo refere-se ao que o autor, com base em Kaufman, “chama de quadros sociais da identificação, ou, ainda, quadros de socialização e envolve as categorias utilizadas para identificar um indivíduo num dado espaço social” intitulada como identidade estrutural ou identidade para outrem. Nesse processo o indivíduo define- se pelo ângulo do outro (pessoas ou instituições). Com base nesses conceitos, podemos perceber que talvez o aluno se autodefina como portador de um ofício mas a sociedade/outros não o qualificam da mesma maneira. Stuart Hall (1992) nos apresenta ainda a identidade cultural. A qual o mesmo classifica “como aspectos de nossas identidades que surgem de nosso "pertencimento" a culturas étnicas, raciais, linguísticas, religiosas e, acima de tudo, nacionais”. Com isso temos que o indivíduo está sendo influenciado o tempo inteiro e de inúmeras maneiras. Portanto, como um órgão institucional, a escola – por meio de interações com colegas-alunos, professores e funcionários – exerce uma grande influência sobre a formação da identidade desse aluno, influindo tanto na construção do processo identitário biográfico quanto estrutural. E sabendo que a escola é um sistema de interação social podemos afirmar que cada aluno, nesse ambiente, vive processos específicos de socialização, aonde eles vão formando sua identidade a cada nova interação tanto com os próprios alunos, quanto com os mais diversos adultos que compõem esse espaço. Dubar (1995) nos afirma então que a identidade não é classificada como inata, mas sim que ela é construída na infância, e que a mesma remete-se como um processo desenvolvido ao longo de toda vida. O autor conclui que apesar de sermos moldados para sermos seres sociais, estamos em constante interações com os mais diversos ambientes e dependemos disso para construirmos nossa identidade. Em face dessa compreensão buscou-se saber como um grupo de alunos constituíram a sua identidade e o seu ofício de aluno, tendo como caminho metodológico a pesquisa qualitativa. 15 4. METODOLOGIA 4.1. Pesquisa Qualitativa Para a realização desse estudo, optou-se pela pesquisa qualitativa, na qual o pesquisador desenvolve conceitos e entendimentos com base em padrões encontrados nos dados, pelo mesmo, coletados. André (1995, p.16 e p.17) nos apresenta que esse tipo de pesquisa inicia-se por volta do final do século XIX quando os cientistas sociais começaram a indagar se o modelo de investigação das ciências físicas e naturais dava conta do estudo dos fenômenos humanos e sociais ou se deveria ser outro. A autora relata, ainda, que Weber e Dilthey foram alguns dos primeiros estudiosos que contribuíram de forma importante para a configuração dessa perspectiva qualitativa de pesquisa. Ambos argumentavam que para compreender esses significados era necessário colocá-los dentro de um contexto. Porém “outros estudiosos das questões humanas e sociais aliam-se às ideias deles. E defendem a ideia de conhecimento que se tornou conhecida como idealista-subjetivista. Essa corrente nos afirma “que a realidade seja algo externo ao sujeito” e “valoriza a maneira própria de entendimento da realidade pelo indivíduo.” A mesma busca incessantemente “a interpretação em lugar da mensuração, a descoberta em lugar da constatação, valoriza a indução e assume que fatos e valores estão intimamente relacionados, tornando-se inaceitável uma postura neutra do pesquisador. “ Triviños (2012) complementa colocando que esse tipo de pesquisa iniciou-se com as práticas desenvolvidas pelos antropólogos e depois pelos sociólogos, sendo posteriormente adotada na investigação educacional. O autor afirma que… O aparecimento da pesquisa qualitativa na Antropologia surgiu de maneira mais ou menos natural. Os pesquisadores perceberam rapidamente que muitas informações sobre a vida dos povos não podem ser quantificadas e precisavam ser interpretadas de forma muito mais ampla que circunscrita ao simples dado objetivo. Isto não significou, de começo, a abandono de posicionamento teóricos funcionalistas e positivistas. (TRIVIÑOS, 2012, p.120) A abordagem qualitativa, de acordo com André (1995), defende uma visão holística dos fenômenos que leva em conta todos os componentes de uma situação em suas interações e influências recíprocas, tendo suas raízes teóricas na fenomenologia. Assim, a concepção idealista-subjetivista ou fenomenológica de conhecimento que dão origem à abordagem qualitativa de pesquisa, podendo ser 16 encontrada também nas ideias do interacionismo simbólico, da etnometodologia e da etnografia, entre outras. A pesquisa qualitativa, de forma muito geral, segue o mesmo roteiro ao realizar uma investigação. Isto é, “existe uma escolha de um assunto ou problema, uma coleta e análise das informações. É indispensável, não obstante isso, fazer alguns esclarecimentos importantes.” (TRIVIÑOS, 2012, p.131) No entanto, André (1995, p.22) nos alerta para o fato de que… (…) o próprio conceito de pesquisa qualitativa não tem sido suficientemente discutido, o que tem resultado em críticas ou defesas, às vezes pouco fundamentadas, de posições, sem que se explicite de que tipo de pesquisa qualitativa cada um está falando. Dentre os três tipos de pesquisa utilizados nessa abordagem – descritiva, exploratória e explicativa – este estudo utilizará a exploratória. Neste tipo de estudo é comum, inicialmente, que o assunto pouco conhecido seja explorado ao longo da investigação. De modo que o pesquisador vai habituando-se ao tema, podendo criar com o passar tempo hipóteses e desenvolver novos estudos. Esse tipo de pesquisa permite ao pesquisador aumentar sua experiência em torno do problema. O pesquisador parte de uma hipótese e aprofunda seu estudo nos limites de uma realidade específica, buscando antecedentes, maior conhecimento para, em seguida, planejar sua pesquisa (Triviños, 2012). Porém, o real objetivo de uma pesquisa do tipo exploratória é familiarizar-se com um assunto ainda pouco conhecido. Assim, ao final de uma pesquisa exploratória, você conhecerá mais sobre aquele assunto, e estará apto a construir hipóteses. Como qualquer exploração, a pesquisa exploratória depende da intuição do explorador (neste caso, da intuição do pesquisador) (GIL, 2008). Por fim, como técnica escolheu-se a entrevista semi-estruturada e para o tratamento dos dados a análise de conteúdo. 4.2. Técnica utilizada para a Coleta de Dados O presente estudo optou pela entrevista como técnica de coleta de dados. Minayo (2010) afirma que as entrevistas podem ser consideradas conversas com certa finalidade e de certa forma dispõe de uma organização. Dentre os diferentes tipos de entrevista esse estudo escolheu-se à entrevista semi-estruturada (ANEXO 1) para embasá-la. 17 Segundo Triviños (2012, p.146) esse tipo de entrevista é definido como: Aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante. Desta maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa. Com isso, temos que a mesma se desenvolve a partir de um esquema básico, com o pesquisador podendo acrescentar uma ou outra questão, que acredite ser pertinente para aquele determinado caso ou para aquele determinado pesquisado. Tendo sempre em vista que o pesquisador obedece a um roteiro previamente definido e que de acordo com Lüdke e André (1986, p.34) “permite que o entrevistador faça as necessárias adaptações, abordando os sujeitos da pesquisa com um instrumento mais flexível”. Desse modo, o seu registro dar-se-á por meio de gravações diretas e anotações ao longo da entrevista feitas pelo próprio entrevistador. Ambas as autoras ainda nos apresentam a principal vantagem dessa técnica em relação às outras, pois ela “permite a captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos” (LUDKE; ANDRE, 1986, p.33 e p.34). Nesta pesquisa, a entrevista foi realizada com sete alunos de uma escola pública de ensino fundamental II e ensino médio de uma cidade de porte médio (Rio Claro - 200 mil habitantes) do interior paulista na sala da coordenação pedagógica. Inicialmente foi consultada a escola e os pais dos alunos e depois foi entregue o termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pelo Comitê de Ética (anexo 2). Dos oito alunos consultados, sete retornaram com a autorização assinada, pois um aluno contou que os pais não concordaram com o estudo. Neste contexto, a entrevista foi feita dividida em três eixos (Identificação, Família e Escola) e organizada em 17 questões. 4.3. Participantes do Estudo Como já foi colocado, o estudo foi realizado em uma Escola Estadual localizada no munícipio de Rio Claro que trabalha com alunos do Ensino Fundamental II (6°ano a 9°ano) e do Ensino Médio (1°ano a 3°ano). Esta localiza-se 18 na zona urbana, recebendo adolescentes de escolas públicas dos bairros vizinhos, oriundos de uma formação heterogênea e de classes sociais diversas. Nesta direção, o presente estudo foi feito com sete alunos do 6° ao 9° ano, sendo eles: um do 6°, dois do 7°, 3 do 8° e 1 do 9°, sendo quatro meninas e três meninos, de 12 a 13 anos, escolhidos aleatoriamente pela coordenadora pedagógica da escola. A grande maioria mora com pais e irmãos, sendo que apenas um mora com avó, avô e mãe. Os pais e mães deles possuem diversos empregos. Entre eles, os pais: um ‘e encarregado de um supermercado, enquanto que os outros trabalham como soldador, entregador de balas, dono de lanchonete, um está desempregado e dois são mestre de obras. Já as mães são: ajudante de padeiro, dona de lanchonete, secretária, monitora numa escola, uma trabalha em um restaurante e duas são balconistas numa loja de roupas. Eles possuem escolaridade bem variada também, sendo que 6 terminaram o Ensino Médio, 3 o Ensino Fundamental e 1 a Faculdade, sendo que de 4 deles os filhos não souberam falar. 4.4. Forma de Análise dos Resultados Para consideração dos dados coletados foi empregado a análise de conteúdo. Esta forma de análise é de acordo com Lüdke e André (1986) um processo criativo que exige grande rigor intelectual e muita dedicação, não existindo, nesse processo, uma forma pré-estabelecida de sistematização. Tem sempre como foco uma sistematização e uma coerência na seleção de frases e palavras-chave conforme o foco principal pretendido no estudo. Minayo (2010) nos explica que a análise de conteúdo é uma expressão genérica para designar o tratamento de dados numa pesquisa qualitativa. É um conceito historicamente construído para dar respostas teórico-metodológicas. Por fim, temos que a grande vantagem desse tipo de análise é a formalização do procedimento que origina categorias que facilitam a comparação entre os diferentes casos. Uma dica importante é que o pesquisador deve possuir um grande conhecimento sobre o tema para não adentrar na pesquisa desprovido de bagagem teórica. (MOZZATO, 2011) Bardin, citado por Godoy (1995), apresenta à utilização da análise de conteúdo em três fases fundamentais: a pré-análise, a exploração do material e o 19 tratamento dos resultados. Na primeira fase é estabelecido um esquema de trabalho que deve ser preciso, com procedimentos bem definidos, embora flexíveis. A segunda fase consiste no cumprimento das decisões tomadas anteriormente, e finalmente na terceira etapa, o pesquisador apoiado nos resultados brutos procura torná-los significativos e válidos. Neste trabalho adotamos a proposta de Lüdke e André (1986) por ser considerada por nos mais simplificada, dividindo a organização dos dados em três eixos temáticos que nortearão a apresentação e análise dos resultados, sendo eles: Infância, Escola e Ofício de Aluno. 5. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS Como foi colocado, os dados foram organizados em três eixos temáticos – Infância, Escola e Ofício de aluno. No entanto alertamos que o roteiro de questões empregadas na entrevista estava dividido em duas partes, a primeira que dizia respeito a infância, sendo composta por seis questões (de 1 a 6). E a segunda que nos remetia à escola e era composta por mais doze questões (de 7 a 18), totalizando então 18 perguntas. 5.1. Infância A primeira pergunta da entrevista pede aos alunos que os mesmos falem um pouco sobre a sua infância. E1, E3, E4, E5 e E7 responderam que brincavam na rua com amigos. Entre as brincadeiras citadas por eles temos: queimada, amarelinha, boneca, esconde-esconde, pega-pega, pipa, futebol e E5 citou também que brincava com a família de bets. Já E2 disse que brincava com o avô, pois ficava com ele o dia todo enquanto seus pais trabalhavam e E6 falou que brincava um pouco só porque focava bastante nos estudos. Dessa forma, temos que eles significaram que a infância foi uma fase de brincadeiras e convivência com os amigos. Quando perguntados diretamente sobre pessoas que brincavam na infância, os entrevistados afirmaram que faziam esta atividade principalmente com os amigos e alguns familiares (irmão, prima, avô, avó, mãe e pai) – ver gráfico 1. No entanto, E2 afirmou ser somente com o avô e E6 somente com familiares. 20 Gráfico 1 – Pessoas com quem brincava na infância Amigos Familiares Fonte: própria autora Na questão dois eles responderam sobre a relação com os pais. Todos os entrevistados disseram ter uma boa relação com os pais. Para E2, E3, E5 e E7 apesar de ter uma boa relação com os pais às vezes ocorriam algumas brigas. E1 afirmou ter uma relação bem aberta, pois seus pais não são tão rígidos. E E6 disse que seus pais estão separados, então ele mora com a mãe e convive de vez em quando com o pai. Ainda nessa linha de relação entre entrevistado e família temos as questões 4 e 5. Na quatro eles deveriam explicitar sobre quem foram seus primeiros educadores, todos citaram a família, só E7 disse não se lembrar pois começou a ir para a escola com apenas dois anos. E1 foi o único a citar exclusivamente a figura paterna, enquanto todos os outros citaram a figura materna como principal. Para E3 e E4 tivemos ambos (pai e mãe) e também a avó. Na quinta questão eles esclareceram um pouco sobre se foram ou não preparados para ir à escola. Dois disseram não lembrar (E2 e E6). Três disseram que não foram preparados (E1, E4 e E7), E1 ainda afirma “Foi um choque porque é bem diferente a escola de brincar”. E dois afirmam terem sido preparados sim (E3 e E5). Com isso percebemos que o fato de terem uma boa relação com os pais, faz com que os entrevistados tenham citado um deles como principal educador. Porém, podemos perceber que apesar dessa boa relação três famílias não cumpriram com o papel de preparar seus filhos para a entrada na escola, um momento totalmente novo para a criança. 5.2. Escola 21 Na questão seis, eles tinham que lembrar o que significou ir para a escola na fase em que estava na infância. As respostas seguiram a linha de: brincar, aprender coisas novas e ficar com amigos. E1: Brincar e aprender coisas novas; E2: Ficar com meus colegas; E3: Brincar e ficar com amigos; E4: Aprender coisas novas e mostrar para a família; E5: Brincar; E6: Aprender coisa nova e; E7: Brincar e ficar com amigos. (Ver gráfico 2) Gráfico 2 – Significado de ir para à escolar na infância Brincar Aprender coisas novas Ficar com amigos Fonte: própria autora Na questão sete, eles deveriam explicar como foi para eles a entrada na escola. Nela eles falaram sobre dois momentos – a entrada na pré-escola e também na escola que estão atualmente. No entanto, E4 explicou somente sobre a entrada no 6° ano e E7 sobre sua entrada esse ano na escola atual. Ao falarem sobre a pré-escola, E1 e E5 afirmaram ser legal porque tinha bastante amigos para conversar e brincar; E2 e E3 disseram que tinham medo no início porque ficavam sem os familiares, avô e mãe respectivamente e E6 falou que foi esquisito, porque não sabia o que era uma sala de aula e não estava acostumado com um monte de gente perto dele. Já sobre a entrada no 6° ano, E1, E2, E3 e E4 falaram que vieram com amigos da outra escola, por isso se sentiram mais à vontade na nova escola; E6 disse que ficou tímido e quieto pois não conhecia nem a escola e nem as pessoas. 22 Alguns alunos falaram sobre as novidades da nova escola, entre elas: o grande número de matérias (E1), o sinal que avisa troca de aulas, saída e entrada, e intervalo (E4) e o tamanho da escola (E5) “Eu fiquei meio assustada no primeiro dia de aula pelo tamanho da escola e confusa”. E7 falou sobre a escola ser legal e também que fez muitos amigos, o mesmo veio de outro estado e entrou na escola esse ano. Portanto, temos que esta parte dos resultados condiz diretamente com a entrada delas na escola. Fala sobre o que significou ir na escola – na infância – questão 6 e também sobre a entrada deles na escola, questão 7. E vemos que há um período definido como transição de uma pré-escola de brincadeiras para uma escola “de verdade” como introdução de novos hábitos – como número de matérias e sinal. 5.3. Ofício de aluno Nessa parte temos a pergunta 8 e 9 falando sobre a relação dos alunos com seus amigos e também com os seus professores. Na questão oito, os alunos falaram sobre como seus amigos da escola foram tornando-se próximos a eles. Todos afirmaram ser por meio de conversas. E2 e E3 disseram que eles se aproximaram por terem gostos parecidos. Todos os outros só falaram sobre isso quando perguntados diretamente e afirmaram que isso conta muito para tornarem-se próximos. Na nona questão, eles contaram um pouco sobre sua relação com os professores da escola atual. Todos os alunos afirmaram ter boa relação com os professores e citaram diferentes motivos. E1, E5 e E7 afirmaram que gostam dos professores porque eles explicam bem. E2 falou que quando gosta da matéria ele tem uma relação melhor com o professor. E3 disse que o professor de Geografia é seu favorito porque ele é mais atencioso que os outros e também porque eles conversam sobre outros assuntos além da disciplina. E4 disse que não gosta de alguns porque são bravos e E6 não especificou o porquê gosta deles. Consequentemente temos que os alunos tem ótima relação com os amigos e também com os professores. Nesse trecho da entrevista temos a relação dos alunos diretamente com a escola (significado, amigos, liderança e vivência). Na questão 10 eles deveriam 23 contar como são seus diferentes momentos na escola. Eles foram estimulados a falar sobre entrada na escola, sala de aula e intervalo. Com exceção de E7 que disse preferir ficar sozinho nesses momentos, os outros entrevistados disseram que estão sempre com os amigos. E4 e E5 falaram que aproveitam esses momentos para ficar com amigos de outras séries. Na questão 11 eles relataram como faziam ou tratavam o que os professores lhes pediam como lição. Todos os alunos afirmaram fazer as tarefas tanto de casa quanto de aula. E1 e E2 falaram que só não fazem a lição senão entenderem. E4 afirmou que organiza tudo em um quadro na sua casa para não esquecer nada. E5 disse que quando não sabe pede ajuda aos pais. Essa questão teve uma resposta curiosa de E7 que afirmou fazer tudo, mas disse “Faço porque tem que fazer, né!?”. Na questão 13 foi perguntado aos entrevistados o que ele e seus amigos conversavam sobre a escola, os professores e as aulas. Ficou claro que os alunos conversam mais sobre professores e aulas. E1 citou coisas como provas e também sobre se professor faltou; E2 sobre dúvidas em matérias; E3 sobre o que vai ter na aula, sobre matérias e sobre lição; E4 sobre trabalhos e se os professores são legais ou bravos; e E5 sobre lições, trabalhos e se os professores são chatos ou não. E7 foi o único a citar algo sobre a escola e afirmou que falam sobre que aula vai ter amanhã, o que vai ter nas aulas e se a escola é legal ou não. Já E6 disse não falar com amigos sobre essas coisas. (Vide gráfico 3). Gráfico 3 – Conversas sobre escolar, professores e aulas. Escola Professores Aulas Fonte: própria autora Na número 14 indagou-se, ainda, se no grupo de amigos dele havia ou não um líder, ou alguém escolhido para representa-los. Os entrevistados ficaram bem 24 divididos, três afirmaram que sim (E1, E2 e E7), três afirmaram que não (E4, E5 e E6) e um (E3) afirma que para determinadas tarefas eles escolhem um líder/comandante. Porém, quando perguntado sobre os motivos de o porquê essa pessoa ser o líder eles elencaram diferentes motivos, dentre eles: “Ela era a mais entusiasmada. Ela chegava e fazia. Ela ajudava todo mundo” diz E1. Já E2 diz que era porque é o que mais ajuda o grupo. E E7 não soube falar o porquê. Para os que afirmaram não haver lideres, eles dizem que: decidem as coisas juntos (E4), cada um faz a sua parte (E5) e que há uma mesma relação entre todos (E6). E para E3 quando eles vão realizar algum trabalho eles escolhe alguém, por votação, para a pessoa liderar o grupo. Como última parte desse trecho, a questão 17 fala: qual o sentido que o entrevistado dá para sua vivência na escola. Eles falaram sobre a importância que escola tem para eles, pois prepara cada um para um futuro melhor, além de ser a grande responsável por ensinar coisas novas e possibilitar ainda uma convivência com os amigos. Para E1 ela é responsável por preparar para o futuro e o local onde se aprende coisas novas; para E2 ela prepara para o futuro; E3 fala que é onde aprende coisas novas e pode estar com amigos; E4 diz que possibilita um futuro melhor e também pode estar com amigos; E5 fala sobre ter um futuro melhor e aprender coisas novas; já para E6 e E7 compete a aprender coisas novas. Na décima segunda questão da entrevista, foi perguntado a eles como cada um junto a seu grupo de amigos organizam-se para enfrentar as atividades escolares. Para E1, E2, E3, E4, E5 e E7 a melhor forma de organização é trabalhar em grupo e com um sistema mútuo de ajuda entre seus componentes tanto no que diz respeito a trabalhos quanto a tarefas de sala ou de casa. Somente E6 afirmou que não gosta de fazer trabalho em grupo, pois prefere fazer tudo sozinho e que só trabalha em grupo quando exigido pelo professor. Com isso, temos que a escola é sim um ambiente de (con)vivência e um local de interação social, e os alunos como seres sociais não deixam essa ideia falsa. Temos ainda duas questões que remetem diretamente a ideia de identidade, a 15 – identidade biográfica e a 16 – identidade relacional. Na quinze, o entrevistado falou sobre quem ele é, ou seja, como ele faria uma autodescrição. Nos relatos abaixo temos as respostas de cada um. Analisando as respostas temos dados que dizem sobre as características da personalidade de cada indivíduo e também sobre seus gostos. 25 E1: Uma pessoa tímida, não sou muito sociável e com meus amigos acho que sou “legalzinha”; E2: Uma pessoa tímida, gosto bastante de estudar, de ficar com meus amigos e de jogar jogo eletrônico; E3: Eu sou chata, mas as vezes sou legal, depende. Sou mandona às vezes; E4: Eu sou engraçada, um pouco inteligente e gosto de passear; E5: Eu me descreveria como uma pessoa legal, engraçada, bacana, amiga, conselheira, nervosa, neurótica e que ama animais; E6: Eu sou uma pessoa meio séria. De vez em quando gosto de brincar bastante. Não gosto de coisa errada; E7: Eu sou legal, sou tímido. Já a questão 16 foi dividida em duas partes. A primeira pedia que o entrevistado falasse como seus amigos o descreveriam e a segunda se ele achava que a descrição feita pela visão dos amigos era diferente de sua autodescrição. Na parte um da questão, os relatos dos dados dos alunos trouxeram, principalmente, descrições sobre características de sua personalidade. Na parte dois da questão, exclusivamente E1 disse que sim Eu acho que ela muda. Porque tipo “to” com eles a dois anos, três anos acho, são dois anos que estou com eles. E tipo eu mudei bastante desde lá, não sou aquela pessoa quietinha no canto com vergonha, acho que muda. No entanto, todos os outros entrevistados (E2, E3, E4, E5, E6 e E7) afirmam que uma opinião não muda em relação a outra. E1: Acho que eles falariam que sou engraçada e meio bagunceira; E2: Ouço o pessoal me chamando de “nerd”; E3: Eles falariam que sou chata, brincalhona, faço todos darem risadas e que sempre atrapalho o grupo; E4: Acho que eles falariam que sou engraçada; E5: Que sei guardar segredo, que sou engraçada e legal; E6: Uma pessoa meio chata, por causa da seriedade que eu levo as coisas; E7: Acho que eles falariam que sou legal. Para finalizar a entrevista foi perguntado ao aluno se ele pretendia continuar estudando após concluir o terceiro ano do Ensino Médio. Todos afirmaram que sim e listaram cursos como: Advocacia (E1), Engenharia (E2 e E7), Farmácia (E4), 26 Veterinária (E5) e Engenharia de mecatrônica (E6). Somente E3 disse não saber qual curso pretende fazer. 6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 6.1. A socialização primária na construção da identidade de aluno O mundo nos oferece um processo constante de socialização, essa definida por Gomes (1992) como um processo de transformação do ser biológico em um ser social. Como descrito melhor na Revisão Literária desse trabalho, Dubar (1997), com base em Berger & Luckmann (1966), nos apresentou a divisão dessa socialização em duas: a socialização primária e a socialização secundária. Nesse trecho da pesquisa faremos uso exclusivo e direcionado da socialização primária. Adotaremos que a socialização primária segundo Berger & Luckmann (1966 apud DUBAR, 1997) corresponde a primeira socialização que o indivíduo experimenta na infância e em virtude da qual se torna membro da sociedade. Neste contexto pudemos perceber que os entrevistados durante sua infância costumavam brincar na rua com amigos e alguns familiares. Desse modo, temos que a criança começa então a se socializar e incorporar regras, introduzidas por meio de brincadeiras, as quais levarão para sua via toda, como: trabalhar em grupo, ajudar o próximo, viver em sociedade, entre outras. Portanto, temos aqui o que Berger & Luckmann (1998) chamam de “o primeiro mundo do indivíduo”. Mundo esse que será transferido para outros ambientes que a criança venha a viver, entre eles a escola. Esta questão fica claro quando os indivíduos citaram como significado da escola na infância o fato de brincar, explícito na frase de E1:” Para mim era brincar mesmo”, de E3: “E eu aprendi a brincar com todo mundo mesmo” e de E5: “(...) no sentido de brincadeira mesmo”. Além disso, Gomes (1992) nos afirma que é também a socialização primária que faz a inserção da criança no mundo social objetivo, à medida que promove a aprendizagem de elementos culturais mínimos: linguagem, hábitos, usos, costumes, papéis, valores, normas, padrões de comportamentos e de atitudes, etc. (GOMES, 1992, p. 96) 27 Entre esses elementos culturais mínimos aprendidos pelas crianças, temos a escola e a família como principais disseminadoras. Gomes (1992, p.96) ainda nos chama à atenção para que essas duas classes – escola e família – “além de tudo, também promove a formação de estruturas básicas da personalidade e da identidade”, ou seja, compete a ambos formar um ser apto a viver em sociedade. Para isso, é intimamente importante que haja uma boa relação entre família e criança, como descritos por todos os nossos entrevistados. É importante que se tenha “uma relação bem aberta” (E1), que se “converse bastante” (E2), que “os pais ajudem os filhos” (E4) e vice-versa, entre outras coisas. Contudo, compreendemos que a primeiro contato que a criança possui com o mundo externo dar-se-á pela família e cabe a ela então preparar a mesma para viver em outros ambientes/organizações – escola – mas será que os pais costumam fazer isso? Ou será que é mais fácil soltar a criança ao léu? Foi o que gostaríamos de saber ao questionarmos os alunos sobre dois pontos – primeiros educadores e preparação para ir à escola. A respeito de primeiros educadores tivemos a citação de membros da família, como: pai, mãe e avó, o que não nos causou nenhuma surpresa. Já na parte de preparação para ir à escola, nos surpreendemos bastante, afinal apenas dois entrevistados afirmaram ter sido preparados pelos pais/familiares, enquanto três afirmaram não terem sido preparados. Há uma diferença enorme de brincar na rua, na família, de viver em um ambiente fechado com outras crianças, outros adultos, em um lugar cheio de regras. Por outro lado percebemos que apesar da boa relação com os pais, os mesmos não se preocuparam em amenizar esse choque para a criança, simplesmente preparando-os para essa nova fase. Isso fica bem claro na fala de E1 “Eles não prepararam. Foi meio que um choque porque a escola é bem diferente de brincar!”. Esse novo ambiente de (con)vivência diária da criança chamada de escola é a principal responsável pela criação do que a sociologia chama de habitus definido por Bourdieu (1989, 1994, 1996 apud Silva, 2009, p.64) como um conjunto de ações que tendem a estruturar inconscientemente o agente social de tal forma que o mesmo não consiga agir de outra maneira se não daquela em que ele já está estruturado. Perrenoud (1995) complementa essa definição e nos chama à atenção para dois pontos essenciais: que anos de prática numa mesma organização promovem a formação desses esquemas e que todas as atividades rotineiras que os 28 alunos desempenham na escola, “pão-nosso de cada dia” também promovem a criação desse habitus. Quando observamos as respostas dos entrevistados sobre seus diferentes momentos na escola, onde os alunos citam sempre estar com amigos no diferentes períodos e nos contam de imediato como são esses momentos, percebemos então essas atividades rotineiras e também a criação desse habitus, tendo em vista que os alunos frequentam esse ambiente escolar por cerca de cinco horas diárias e durante cinco dias da semana. Ainda nessa linha Almeida (2010, p.16) nos fala que esse habitus é responsável por “incorporar também um ofício, ser aluno, em determinado contexto e tempo que lhe imprimem um dever, uma exigência norteadora de suas ações e atividades escolares”. Podemos perceber que grande parte dos alunos entrevistados, tirando um deles, em quase todas as questões citaram seus amigos da escola, falaram sobre ficar com eles nos diferentes momentos escolares e também estarem com eles na entrada na nova escola, sobre como é importante ter eles ao lado, como companhia. Com isso, temos que esse habitus não é unicamente formado no desenvolver do currículo formal – aquele que a escola nos mostra e nos cobra, o qual tem bases pedagógicas e é feito pela direção da escola, em parceria com os professores – mas também no currículo oculto – atividades que não compõem formalmente o currículo mas que são aprendidas pelos alunos, durante o período escolar, entre elas: a convivência em sociedade, trabalho em grupo. Partindo disso, temos que é intolerável não aceitar a afirmação de que a escola é um sistema de interação social, onde os alunos vão formando sua identidade. E que ela é considerada a principal responsável por introduzir o aluno nas mais diferentes organizações que compõem a sociedade. Porém, este processo de socialização nunca está acabado, ou seja, não se encerra nesse momento da vida, mas se transforma ao longo do tempo, por meio da socialização secundária que é entendida como “a interiorização de submundos institucionais” (BERGER & LUCKMANN, 1998, p.174). Em outra direção, mas referendando tambem este caminho, como uma das responsáveis pela socialização secundária, encontramos a Universidade. Instituição essa cada vez mais acessível aos alunos, pois ficou claro quando perguntamos aos entrevistados se os mesmos pretendiam continuar seus estudos após o término do Ensino Médio e todos unanimemente responderam que “Sim!”. 29 Almeida (2010) nos mostra que a identidade do sujeito aluno não é uma só. Ela possui uma mobilidade plástica porque diz respeito ao sujeito em suas múltiplas relações nos vários espaços e tempos presenciais ou virtuais em que transita, ou seja, espaços e tempos escolares e não escolares. (ALMEIDA, 2010, p.14) Por fim, vemos que essa identidade é formada inicialmente com base no processo de socialização primária – família e escola – e de socialização secundária – demais organizações da sociedade. Que ela é um processo constante, ou seja, nunca tem um fim, está sempre sendo construída e que é moldada pelo habitus adquiridos nos mais diferentes ambientes da sociedade nos levando a ideia de um ofício. 6.2. A construção do ofício de aluno Essa parte da discussão foi dividida em quatro tópicos: o primeiro que fala sobre a aprendizagem do ofício de aluno como um aprendizado social e temporal; a segunda em que a aprendizagem do ofício de aluno aparece como sendo plural e heterogênea; a terceira em que a aprendizagem do ofício de aluno se torna tambem personalizada e situada e a quarta e última que fala que aprendizagem do ofício de aluno é biográfica e estrutural. Os três primeiros tópicos foram inspirados no que Maurice Tardif atribui como algumas características dos saberes profissionais, publicadas no artigo “Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários” do ano de 2000 na Revista Brasileira de Educação, mas que nos ajudou a pensar emu ma carcterizacao do oficio de aluno. 6.2.1. A aprendizagem do ofício de aluno é social e temporal A aprendizagem do ofício de aluno é social, porque ocorre num espaço, este composto pela família e pela escola. Ela também é temporal, pois é adquirida ao longo do tempo. Esses dois processo compõem o que chamaremos construção de uma identidade, a identidade de aluno. Essa construção advém de anos vivendo nas mesmas organizações – a escola e a família – e também da própria história de vida e de vida escolar. Os 30 alunos aprendem a viver nesse espaços e principalmente de como agir para que haja “sucesso” nessa caminhada. No nosso estudo focamos principalmente na questão da escola. Perguntamos como era a relação com os professores, como os alunos tratavam as tarefas dadas pelos professores e como o aluno e seus amigos se organizavam para realizar essas atividades. Para essa última, a grande maioria disse trabalhar em grupo, característica aprendida ainda na infância e também que um ajuda o outro, de modo que vemos como eles se agrupam com seus semelhantes para enfrentar o que lhes é “estranho”. Para as outras duas questões, todos os entrevistados disseram ter uma boa relação com os professores e também afirmaram fazer todas as tarefas que os professores lhes pedem, apesar de alguns não quererem muito, como afirmou E7: “Tem que fazer as atividades, né!?”. Com isso, percebemos que os alunos acreditam que a escola é sim um lugar para aprender e não para fazer algazarras. Essa afirmação vai de acordo com o que Perrenoud (1995) nos apresenta no trecho abaixo: a escola é, por definição, um lugar onde se vem para aprender. Nenhum aluno pode ignorar que “está lá para isso”. Desde os primeiros anos que sabe perfeitamente que se lhe pede para se apropriar dos saberes constituídos que estão no “programa”. (PERRENOUD, 1995, p. 83). Isso mostra que anos de prática escolar levam o aluno a uma condição de saber o que fazer nessa organização para que os mesmos tenham o que Perrenoud (1995) chama de “aprender para vir a ter sucesso”. Ou seja, o aluno aprende a viver nesse local e como agir no mesmo, de modo que o mesmo obtenha sucesso com o mínimo de esforço possível. Desse modo observamos a criação então de uma identidade e de uma socialização desse aluno. 6.2.2. A aprendizagem do ofício de aluno é plural e heterogênea A aprendizagem do ofício de aluno é plural e heterogênea porque possui natureza diferente para cada um e também porque tem a ver com as condições familiares e escolares, as quais os indivíduos foram submetidos ao longo dos anos. Nesse trecho temos principalmente o sentido que cada aluno atribui a sua vivência na escola. Quando somadas as respostas temos que: cinco vão à escola para aprender mais; quatro para ter um futuro melhor e apenas dois deram 31 respostas correspondentes a estar/ver amigos. Essa classificação vai totalmente de acordo com o estudo de Almeida (2010) onde os alunos indicaram como o mais importante “aprender conhecimentos”, “preparação para a vida adulta” e “conviver com as pessoas”. Com base nesses dados, podemos perceber que os alunos buscam diferentes objetivos na escola e que a grande maioria ainda se importa com aprender coisas novas e ter um futuro melhor, como é o caso de E2 que disse que gostaria de ter um futuro melhor para ajudar os pais. E que a convivência com os amigos apesar de importante ainda está em segundo plano para a grande parte dos entrevistados. Fato esse que nos surpreendeu porque em perguntas anteriores eles sempre citavam seus amigos. 6.2.3. A aprendizagem do ofício de aluno é personalizada e situada Tardif (2000) nos afirma que os saberes profissionais são personalizados porque são “saberes apropriados, incorporados e subjetivados, difíceis de dissociar das pessoas”, ou seja, cada um passou por uma cultura pessoal, uma história de vida e agora transfere esse sentimento para a atividade profissional que está inserido, no caso, ser aluno. E ela também é situada porque promove a contextualidade desse aluno. Nessa parte percebemos que o fato de a família preparar o aluno para a escola é de extrema importância para que o mesmo não tenha nenhuma surpresa desagradável como citado por E1: “Foi meio que um choque porque a escola é bem diferente de brincar” ou E2: “(...) eu não gostava porque tinha medo, preferia ficar com o meu pai, com meu avô” ou E6: “Nunca tinha entrado numa sala de aula e não estava acostumado com um monte de gente junta e perto de mim”. No entanto, sabemos que esse fato é bem pessoal então dependendo da criança é algo irrelevante, mas também pode nao ser. Outro fato que condiz com essa parte foi como os alunos descreveram seus diferentes momentos na escola. A grande maioria afirmou passar os mais diferentes momentos na companhia dos amigos. O que Almeida (2010, p. 100) nos aponta que “a vida na escola ultrapassa o terreno da cognição do saber e do saber-fazer. A escola também é o lugar de encontro, é o lugar de estar com outros sujeitos na mesma condição, é o lugar em que as “sociações”. ‘E nesse espaço que o aluno aprende a se socializar tanto com amigos quanto com outros adultos que o compõe. 32 6.2.4. A aprendizagem do ofício de aluno é biográfica e estrutural A aprendizagem do ofício de aluno é biográfica, ou seja, diz respeito a como o aluno se auto define. E também é estrutural onde o indivíduo define-se pelo ângulo do outro (pessoas ou instituições). Nessa seção, era perguntado aos alunos tanto sobre a sua autodescrição quanto sobre o que ele achava que os seus amigos diriam a seu respeito. Posteriormente, se perguntava tambem se haveria mudança de uma descricao para outra. Apenas E1 disse que sim, que haveria mudança de sua autodescrição para descrição de seus amigos. E1 afirmou assim: “Porque tipo eu “tô” com eles a dois anos (...). E tipo mudei bastante desde lá, não sou aquela pessoa quietinha no canto com vergonha.” Esse fato, nos faz pensar se realmente os alunos conseguem separar uma descrição da outra e se realmente essas descrições não mudariam. Porque sabemos o quanto somos sociáveis e como somos o tempo todo influenciados pelo meio que vivemos – pessoa, instituições, mídia – o que torna quase impossível nos auto definirmos sem influências, somente pela nossa própria concepção. 7. CONCLUSÃO De maneira inicial, esse trabalho teve como inquietação a análise sobre o ofício de aluno. Sim, esse outro elemento que compõe a atmosfera de ensino. Aluno esse preterido pelas pesquisas, as quais em sua maioria focam o professor, considerado peça fundamental da aprendizagem. No decorrer do texto, em especial, na revisão de literatura, trouxemos autores sobre esse tema central (ofício de aluno) e alguns que permeiam a questão, como socialização e identidade. Partindo sempre do dois objetivos da pesquisa: (1) Levantar dados sobre o papel da socialização primária na construção da identidade de aluno e (2) Identificar em estudantes do ensino fundamental como eles constituíram o seu ofício do aluno. Com base nos resultados e na discussão, podemos concluir que o ofício de aluno é temporal, social, plural, heterogêneo, personalizado, situado, biográfico e 33 estrutural. Ou seja, se ela ocorre em um dado espaço (família e escola), ela também se dá através do tempo (história da vida e da vida escolar). E vai de acordo com cada aluno, o qual tem uma visão única sobre seu ofício apesar de sofrer influência da organização em que vive e também das pessoas que convivem com ele nessas instituições. Esse papel que o aluno desenvolve na escola é influenciado pela socialização primária à qual o mesmo foi submetido. Podemos perceber no estudo, que os alunos tiveram uma infância signficativa, onde puderam brincar com amigos/familiares e que os mesmos possuiam uma ótima relação com a família. Não sabemos até que ponto isso pode ter influenciado nas respostas de como eles se enxergam como aluno. No entanto, esse pode ser considerado um tema para projetos futuros. De certa forma, temos que o ofício de aluno ainda é muitas vezes ignorado e menosprezado pela sociedade que o aluno vive. Dessa forma, o mesmo não se reconhece como um “trabalhador” e considera-se simplesmente um aluno. Porém, essa pesquisa visou contribuir para essa mudança de visão. No entanto tivemos algumas dificuldades para desenvolver esse projeto pela escassa literatura na área. Com isso deixamos aqui uma contribuição singular, visando que futuros projetos possam ampliar o entendimento desse tema tão precioso para o âmbito escolar. 34 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ALVES-MAZZOTTI, A. J.; GEWANDSZNAJDER, F. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 2001. 2. ANDRÉ, M. E. D. A. Texto, Contexto e Significados: algumas questões na análise de dados qualitativos. Cadernos de Pesquisa: São Paulo, mai. 1983. 3. ANDRÉ, M. E. D. A. Etnografia da prática escolar. 16 ed. Campinas: Papirus, 1995. 4. FERREIRA, A. B. H. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 5 ed. Curitiba: Positivo. 2010. 5. ALMEIDA, E. N. Da construção do “ofício de aluno”: observando, ouvindo e interpretando visões e versões de jovens alunos: uma pesquisa em duas séries da educação básica de uma escola particular de Belo Horizonte/MG. 2010. 123f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. 6. BERGER P.L., LUCKMANN T. A construção social da realidade. São Paulo: Editora Vozes, 1998. 7. BORDANAVE, J. E. D. A opção pedagógica pode ter consequências sociais e individuais importantes, Revista de Educação AEC: Brasília, n. 54, p. 41-45. 1984. 8. BOURDIEU, P. O camponês e seu corpo. Revista de Sociologia e Política: Curitiba, n. 26, p. 83 – 92, jun. 2006. 9. BOURDIEU, P. Capítulo III: A gênese do conceito de habitus e de campo. In: O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. 10. CAMACHO, L. M. Y. A invisibilidade da juventude na vida escolar. Perspectiva: Florianópolis, v. 22, n. 02, p. 325-343, jul./dez. 2004. 11. DIEHL, A. A.; TATIM, D. C. Pesquisa em ciências sociais aplicadas: métodos e técnicas. São Paulo: Prentice Hall, 2004. 12. DUBAR, C. A Socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Porto: Porto Editora, 1997. 13. DUBAR, C. Trajetórias sociais e formas identitárias: alguns esclarecimentos conceituais e metodológicos. Educação e Sociedade: Campinas, v. 19, n. 62, abr. 1998. 35 14. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008. 15. GIMENO SACRISTÁN, J. O aluno como invenção. Tradução de Daysi Vaz de Moraes. Porto Alegre: Artmed, 2005. 16. GODOY, A. S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de Administração de Empresas: São Paulo, v. 35, n. 2, p. 57-63, mar./abr. 1995. Disponível em . 17. GOMES, J. V. Família e Socialização. Psicologia-USP: São Paulo, v.3, n.1/2, p.93-105. 1992. 18. HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 1992. 19. INFORSATO, E. C. O ofício de aluno. 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Nesta fase de sua infância, quando você começou ir para à escola, o que significou ir para escola? BLOCO SOBRE A ESCOLA 7. Como foi sua entrada na escola? 8. Como os seus amigos da escola foram se tornando próximos a você? 9. Como é a sua relação com os professores da escola? 10. Como são os seus diferentes momentos na escola? 11. Como você trata ou faz aquilo que os professores lhe pedem como lição ou atividade? 12. Como que vocês se organizam para enfrentar as atividades escolares? 13. O que vocês conversam sobre a escola, os professores e as aulas? 14. Entre vocês se escolhe alguém para representá-los ou isso não é necessário? (Há um líder?) 15. Você poderia falar sobre quem você é? (Opinião própria) 16. Para os seus amigos quem você é? (Opinião dos amigos) 17. No mundo que você vive consigo mesmo, qual é o sentido que você dá ou atribui para a sua vivência na escola? 18. Você pretende continuar seus estudos? 38 ANEXO II – TCLE (Termo de Consentimento Livre Esclarecido) TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO - (TCLE) (Conselho Nacional de Saúde, Resolução 466/12) Eu Letícia Aparecida Frasson, RG 44.787.200-X, estudante do curso de Licenciatura em Educação Física, estou desenvolvendo o projeto de pesquisa de trabalho de conclusão de curso “OFÍCIO DO ALUNO: O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PRIMÁRIA E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE”, para a obtenção do título de licenciada em Educação Física. No desenvolvimento desse projeto o pesquisador responsável e orientador é o Prof. Dr. Samuel de Souza Neto, docente do departamento de Educação. O menor _______________________________________________________, sob responsabilidade, está sendo convidado (a) como voluntario(a) participar da pesquisa “OFÍCIO DO ALUNO: O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PRIMÁRIA E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE”. Essa pesquisa que tem como objetivo levantar dados sobre o papel da socialização primária na construção da identidade de aluno e identificar em estudantes do Ensino Fundamental, com faixa etária entre 11 e 15 anos, como eles constituíram o seu ofício de aluno. A participação de seu(sua) filho(a) será no sentido de dar uma entrevista individual. Os eventuais riscos relativos a esta pesquisa podem ocorrer no momento da realização da entrevista individual e do grupo focal (entrevista coletiva) em termos de constrangimento e na análise dos dados se esta não for fiel ao que foi falado. Para minimizar esses riscos, o roteiro de entrevistas, será elaborado de modo a evitar constrangimentos e questões que envolvam aspectos de foro íntimo. As entrevistas serão gravadas em áudio. Ambos serão realizados em clima amistoso e de respeito aos participantes. No que tange à análise dos dados, esta será efetuada de modo a respeitar a opinião do participante, sendo fiel às suas manifestações, não emitindo juízos de valor sobre as respostas dadas. Da mesma forma também se torna fundamental registrar que está assegurada a liberdade de desistência ou continuidade na pesquisa, bem como o direito de solicitar a qualquer momento esclarecimentos sobre a mesma ou encerrar a participação, sem nenhuma penalidade. Além disso, se o(a) seu(sua) filho(a) se sentir constrangido(a) ou incomodado(a) com alguma questão terá total liberdade de não respondê-la, sem que isso signifique qualquer penalidade. Caso ele(a) se sinta inibido(a) com a gravação do áudio, esta poderá ser interrompida a qualquer momento. Em relação aos benefícios dessa pesquisa, eles dizem respeito a possibilidade de contribuição para a pesquisa e produção de conhecimento na área da Educação e Educação Física. Espera-se a partir desse estudo contribuir com o processo de escolarização ao se ter uma caracterização da socialização primária na caracterização do oficio de aluno. Os dados obtidos por meio dessa pesquisa serão utilizados somente para fins científicos e o nome do participante será mantido em sigilo, sendo utilizado como identificação um pseudônimo ou número/letra. Os dados serão divulgados, inicialmente por meio do trabalho de conclusão de curso e posteriormente em periódicos e eventos científicos. Dessa forma, o participante terá a garantia de esclarecimento em qualquer momento da pesquisa, por meio do contato com o pesquisador (telefones para contato estão transcritos abaixo) ou ainda, junto ao Comitê de Ética do IB/RC por meio do telefone (19) 3526-9605 ou (19) 3526-4105. Cumpre informar, ainda, que ele(a) não terá nenhum gasto para participar dessa pesquisa, da mesma forma que não receberá nenhuma remuneração. Se você, pais e/ou responsáveis pelo menor estiver suficientemente esclarecido(a) convido-o(a) a assinar esse Termo elaborado em duas vias, sendo que uma ficará com o pesquisador e outra com você. Rio Claro, ............ de ..........................................de 2014. _________________________________ _____________________________________ Pesquisador responsável/Orientador Assinatura do representante legal do Prof. Dr. Samuel de Souza Neto participante da pesquisa Dados sobre a Pesquisa: Título do Projeto: Ofício do aluno: o processo de socialização primária e a construção de uma identidade 39 Pesquisador Responsável: Samuel de Souza Neto Cargo/função: Professor Adjunto do Depto de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Instituição: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus de Rio Claro Endereço: Instituto de Biociências – UNESP - Rio Claro – Departamento de Educação. Endereço: Avenida 24-A, nº1515, Bairro Bela Vista, CEP: 13506-900 Dados para Contato: fone (19) 3526-4276 e-mail: samuelsn@rc.unesp.br Aluno/Pesquisador: Letícia Aparecida Frasson Instituição: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus de Rio Claro Endereço: Instituto de Biociências – UNESP - Rio Claro – Departamento de Educação Endereço: Avenida 24-A, nº1515, Bairro Bela Vista, CEP: 13506-900 Dados para Contato: fone (19) 3597-7702 ou (19) 9245-7917 e-mail: leticia_frasson@hotmail.com Dados dos pais e ou responsável do menor participante da pesquisa Nome:_____________________________________________________________ Documento de Identidade:_____________________________________________ Sexo:__________________________ Data de Nascimento:____/____/__________ Endereço:__________________________________________________________ Telefone para contato:_______________________________________________ ____________________________________________________________________ Aluna: LETICIA APARECIDA FRASSON _____________________________________________________________________ Orientador: Prof. SAMUEL DE SOUZA NETO