UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS DIAICO DOS SANTOS ROSA A VALORIZAÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE NA REDE ESTADUAL PAULISTA DE EDUCAÇÃO BÁSICA: um estudo comparativo FRANCA 2017 DIAICO DOS SANTOS ROSA A VALORIZAÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE NA REDE ESTADUAL PAULISTA DE EDUCAÇÃO BÁSICA: um estudo comparativo Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” como pré-requisito para a obtenção do título de mestre em Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Análise de Políticas Públicas. Área de Concentração: Educação. Orientadora: Profa. Dra. Hilda Maria Gonçalves da Silva FRANCA 2017 Rosa, Diaico dos Santos. A valorização da profissão docente na rede estadual paulista de educação básica : um estudo comparativo / Diaico dos Santos Rosa. –Franca : [s.n.], 2017. 138 f. Dissertação (Mestrado Profissional – Políticas Públicas). Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Orientador: Hilda Maria Gonçalves da Silva 1. Educação - Financiamento. 2. Fundos de investimento. 3. Professores - valorização. I. Título. CDD – 371.12 DIAICO DOS SANTOS ROSA A VALORIZAÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE NA REDE ESTADUAL PAULISTA DE EDUCAÇÃO BÁSICA: um estudo comparativo Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” para a obtenção do título de mestre em Planejamento e Análise de Políticas Públicas. BANCA EXAMINADORA Presidente: ____________________________________________________________ Dra. Hilda Maria Gonçalves da Silva (UNESP-Franca) 1 o Examinador: ________________________________________________________ Dr. Ricardo Ribeiro (UNESP-Araraquara) 2o Examinador: _________________________________________________________ Dra. Célia Maria David (UNESP-Franca) Franca, 09 de março de 2017. Dedico aos meus pais, Sebastião e Marlene, e a minha irmã, Maria Gabriela. AGRADECIMENTOS Primeiramente, a todos os meus familiares, especialmente aos meus pais, Sebastião e Marlene, pelo constante interesse, esforço, dedicação e apoio incomensuráveis tanto nas horas de alegria, pelas conquistas, quanto nas horas de tensão com um apoio impagável. A minha irmã, Maria Gabriela, pela enorme paciência em ouvir todos os assuntos chatos do mestrado, pelo amor, pelo carinho que sempre teve por mim em todos os momentos até hoje. A minha orientadora, Profa. Dra. Hilda Maria Gonçalves da Silva, pela chance e a credibilidade desde o primeiro artigo científico até as últimas correções da dissertação. E também, pelas conversas e conselhos dados além do tema do trabalho e do mundo acadêmico. Aos professores Prof. Dr. Ricardo Ribeiro e Profa. Dra. Célia Maria David que compuseram a banca de meu Exame Geral de Qualificação/Defesa e realizaram, nesta ocasião, críticas, sugestões e apontaram diversos e caminhos e leituras para o bom desenvolvimento do trabalho. Prolongo estes agradecimentos ao professor Genaro Alvarenga Fonseca (Tio B), por ter me dado o incentivo de iniciar os primeiros passos nas pesquisas acadêmicas em relação à Educação. Também agradeço a Profa. Dra. Vânia de Fatima Martino, pelos conselhos sempre certeiros em relação ao andamento da pesquisa. Também gostaria de agradecer ao Prof. Dr. Marcelino Rezende Pinto, da USP-RP, que, assim como o seu orientando, Quibão Neto, ajudaram com dados e fontes nas horas mais sensíveis da recolha de dados. Aos integrantes do programa de Planejamento e Análise de políticas públicas, incluindo os grandes amigos de caminhada no mestrado feitos em meios aos prazos e cobranças da pesquisa, um grande abraço. Aos queridos amigos de longa data, àqueles que permanecem e permanecerão nela: Edson Silva, Nicolas Vilas Boas, Matheus Vilas Boas, Sabrina Miranda, Thiago Sandri e Claudio Pereira. Agradeço também, as amizades que tive o prazer imensurável de fazer na Unesp-Franca: Daniel Stulano, Bento Salgado, Alemão Stencil, Iara Maíra, Isabela Gisse Rainho, Eliza Tafner, Adriana Ressiore, Priscila Bermudes, Mayara Brandão, Manoel Ayusso, Pedro Zonta, Lívia Rodrigues, Thais Rocha, Bruna Santana, Tales Novaes, Neto Cavallini, Guilherme Campos, Bruno Alvarenga, Matheus Banjai, Ana Carla Pessin, Ananda Michelino, Laura França, Mariana Carvalho, Eduardo Coutinho, Marcela Marcucci, Lie Yoshii, Amanda Claudiano, as Repúblicas Sarjeta e Tuffy e o pessoal do PIBID-Franca como um todo. Apesar de esquecer momentaneamente de listar alguns no momento, não significa que não mantenho todos na lembrança Agradeço, em especial, a todos da República Masmorra, casa onde tive a honra de morar e crescer como pessoa. Apesar da lista ser imensa, guardo todos os momentos compartilhados com os moradores com muito carinho e será sempre honra reencontra-los no Entorta Liminha. Um abraço especial a: Henrique Bordignon Reis, Rafael Bozzutti, Felipe Dourado, Jorge Sá, Diogo Mazzucatto, Felipe Bernadino, Elvis Diana, Danilo Audi, Gean Rodrigues, Luís Manhani, Bruno Fonseca, Guilherme Neves e Fábio Augusto. A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto prática ética. Paulo Freire ROSA, Diaico dos Santos. A valorização da profissão docente na rede estadual paulista de educação básica: um estudo comparativo. 2017. 138f. Dissertação (Mestrado em Planejamento e Análise de Políticas Públicas) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquista Filho”, Franca, 2017. RESUMO O trabalho desenvolvido tem como objetivo compreender a valorização da profissão docente nas políticas de educação básica brasileira, focando no professor efetivo contratado pelo Estado de São Paulo. Parte-se da compreensão da política de financiamento da educação básica, essencialmente ao que se refere aos fundos contábeis FUNDEF e FUNDEB, no contexto da Reforma do Estado brasileiro na década de 1990. No tocante a valorização da profissão docente atual, compreendendo o professor como um dos principais agentes do processo educacional, que sofre com o baixo preparo profissional para a ordenação do conteúdo escolar e das ações didáticas, o baixo prestigio profissional, a complexidade para enfrentar eficientemente as características demonstradas pelos alunos e principalmente a baixa remuneração do serviço prestado. O trabalho estabelece uma análise comparativa entre os professores e enfermeiros efetivos estaduais, sobretudo por meio das suas progressões e promoções contidas nos planos de carreira. A pesquisa é de caráter bibliográfico-documental com base nos estudos que se dedicam à análise da carreira docente como José Marcelino Rezende Pinto, Bernardete Angelina Gatti, Dalila Andrade Oliveira, Eloiza Oliveira, Romualdo Portela, entre outros. Conta ainda com o tratamento dos dados pelo método comparativo relativos ao magistério e enfermagem do IBGE/PNAD, INEP, Perfil da Enfermagem no Brasil, APEOESP, SEESP, UNESCO, Portal da Transparência Estadual, legislações estaduais e federais, e as Deliberações e Resoluções da SEE-SP e do CEE. Palavras-chave: Valorização. Professor. São Paulo. ROSA, Diaico dos Santos Rosa. The valorization of the teaching profession in the state of São Paulo basic education network: a comparative study. 2017. 138f. Master’s Dissertation (Planning and Analysis of Public Policies) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquista Filho”, Franca, 2017. ABSTRACT The developed work aims to understand the appreciation of the teacher in the Brazilian basic educational politics, focusing on the effective teacher hired by the São Paulo State. It starts from the comprehension of the politic of financing the basic education, essentially as regards the accounting funds of FUNDEF and FUNDEB, in the context of the Brazilian Reform in the decade of 1990. Concerning the valorization of the teacher nowadays, comprehending the teacher as one of the main roles in the educational process, who suffers from poor professional preparation, the complexity to efficiently face the students’ characteristics and, above all, suffering from low salaries. This academic work stablishes a comparative analysis between teachers and nurses, all State employees, according to the progression and promotions on their career plans. This bibliographical-documental research is based on the studies devoted to analyze the teacher career, from José Marcelino Rezende Pinto, Bernardete Angelina Gatti, Dalila Andrade Oliveira, Eloiza Oliveira, Romualdo Portela, and others. This work also has the data treatment from the comparative method related to the magisterium and nursing from IBGE/PNAD, INEP, Perfil de Enfermagem no Brasil, APEOESP, SEESP, UNESCO, Portal da Transparência Estadual, state and federal legislations, and the Deliberations and Resolutions from SEE-SP and CEE. Key-words: Appreciation. Teacher. São Paulo. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Índice dos professores estaduais paulistas com pós- graduação..............................................................................................................p.100 Figura 2: Escala de pontos para evolução anual dos professores............................................................................................................p.107 Figura 3: Pontos e pesos para as evoluções pela via não acadêmica dos professores paulistas................................................................................................................p.111 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1: Investimento direto em educação nas três esferas do governo.............pg.41 Gráfico 2: As remunerações iniciais e evoluções por provas institucionais e aperfeiçoamentos................................................................................................pg.108 LISTA DE QUADROS Quadro 1: Estrutura do financiamento da educação no Brasil.................................p.25 Quadro 2: Impostos segundo a natureza de arrecadação e transferência...............p.28 Quadro 3: Características da composição dos recursos do Fundef e do Fundeb ...p.32 Quadro 4: Valor aluno-ano e complementação da União ao Fundef 1997 a 2006...p.38 Quadro 5: Brasil: Investimento direto em educação em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) 1997 a 2002...........................................................................................p.40 Quadro 6: Valor da complementação da União ao Fundeb 2007 a 2009.................p.44 Quadro 7: Comparação entre os valores estimados pelo CAQi para a educação básica e os valores aplicados pelo Fundeb (2015)...................................................p.49 Quadro 8: Perfil demográfico e de atuação.............................................................p.98 Quadro 9: Característica étnica dos profissionais e população paulista..................p.99 Quadro 10: Jornada semanal de trabalho (%).......................................................p.103 Quadro 11: Jornadas dos professores da rede estadual de São Paulo.................p.104 Quadro 12: Nível de rendimento mensal domiciliar per capita dos profissionais a nível nacional.................................................................................................................p.106 Quadro 13: As remunerações iniciais e evoluções por provas institucionais e aperfeiçoamentos..................................................................................................p.108 Quadro 14: Tempo para evoluções por provas ou aperfeiçoamentos...................p.115 Quadro 15: Rendimentos iniciais mensais de alguns servidores paulistas................................................................................................................p.116 Sumário INTRODUÇÃO.......................................................................................................................10 CAPÍTULO 1 A REFORMA DO ESTADO E A POLÍTICA DE FUNDOS PARA A EDUCAÇÃO...........................................................................................................................14 1.1 Financiamento da educação: vinculações constitucionais e recursos públicos............22 1.2 Fundos de financiamento da educação: FUNDEF e FUNDEB.....................................30 1.2.1 Custo aluno qualidade inicial (CAQi) e o Custo aluno qualidade (CAQ)...................46 CAPÍTULO 2 O TRABALHO DOCENTE NA ATUALIDADE................................................51 2.1 Os salários e as carreiras dos professores...................................................................59 2.2 Os salários dos professores brasileiros.........................................................................65 CAPÍTULO 3 OS PROFESSORES DO ESTADO DE SÃO PAULO.....................................83 3.1 Comparativo entre os professores e enfermeiros do Estado de São Paulo..................95 3.1.1 Aspectos demográficos..............................................................................................96 3.1.2 A formação dos profissionais......................................................................................99 3.1.3 Aspectos das atuações profissionais........................................................................101 3.1.4 Perfil socioeconômico dos profissionais...................................................................104 3.1.5 As remunerações dos Professores e Enfermeiros Paulistas....................................106 3.1.6 Os interstícios para as evoluções acadêmicas ou não.............................................110 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................118 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................124 10 INTRODUÇÃO As mudanças ocorridas nos últimos dois séculos marcaram fortemente as conjunturas sociais, econômicas, políticas e culturais. As transformações advêm em grande parte da globalização econômica, reestruturação da divisão internacional do trabalho e a difusão das políticas neoliberais, sobretudo nas décadas de 1980 e 1990 pelos Estados Unidos e Inglaterra. Nesse quadro, difunde-se a necessidade da Reforma do Estado e, concomitante a esse processo, a reforma dos sistemas educacionais na América Latina dada a forte influência dos organismos internacionais. A redefinição em grande parte na Constituição Brasileira de 1988 sobre o papel do Estado e a sua reestruturação em relação as políticas públicas, a avaliação de políticas e programas governamentais, trouxeram mudanças essenciais para as funções de planejamento e gestão de governo, sobretudo, no aspecto central que se conecta ao financiamento da educação básica, e seus impactos nas políticas de valorização dos profissionais do magistério. A área de estudo, denominada como políticas públicas, aglomeram as normas políticas em seu campo que determinam as suas decisões, elaborações, implementações e avaliações. Se tratando do Brasil, alguns aspectos deram mais notoriedade a essa área. Assim, essas políticas quanto ao conhecimento sobre o desenho, a implementação e o processo de decisão das políticas públicas alcançaram visibilidade e importância no país. Também devemos levar em conta as novas visões sobre o papel do Estado e dos governos que transformaram as políticas do pós-guerra por políticas de restrição de gastos (SOUZA, 2007). Por meio das transformações introduzidas pelas políticas públicas, iniciada na reforma da década de 1990, houve um direcionamento na constituição de um novo modelo de gestão e uma nova forma de gerenciar o setor público e os seus fundos. Portanto, a reformulação do papel do Estado e a relação com a sociedade, sobretudo quanto a afiançar mais direitos sociais (SPOSATI, 2009, pg.13) através da nova Constituição, significou repensar a sua estrutura organizacional frente às crises e limites de intervenção, com o objetivo de lograr os desafios impostos pelo sistema econômico capitalista. 11 O primeiro capítulo visa compreender a política de financiamento da educação básica, no contexto da Reforma do Estado e da educação, nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), entre 1995 e 2002, e Luís Inácio Lula da Silva do Partido do Partido dos Trabalhadores (PT), entre 2003 e 2010, essencialmente ao que se refere aos fundos contábeis FUNDEF e FUNDEB. Levando em conta de maneira sucinta, as mudanças em andamento nos mandatos de Dilma Rousseff, também dos Partidos dos Trabalhadores, entre 2011 e 2018. Em relação ao segundo capítulo, abordar a questão docente significa, antes de tudo, levar em conta que é uma atividade profissional com especificações bem diferentes e, em sua maioria, muito distintas das demais profissões. Dessa forma, falar sobre a docência requer um esforço de reconhecimento dessas diferenciações do ser professor, isto é, sua heterogeneidade, características, especificidades e as problematizações como a precarização da profissão docente. O professor como um dos principais agentes do processo educacional, sofre com o baixo preparo profissional para a ordenação do conteúdo escolar e das ações didáticas, o baixo prestigio profissional, a complexidade para enfrentar eficientemente as características demonstradas pelos alunos significam obstáculos à realização dos princípios propostos para a escola e principalmente a baixa remuneração do serviço prestado. Todos esses elementos cooperam para a produção do fracasso escolar e a reduzida qualidade do ensino, acentuadas, no Brasil, pelos elevados índices de repetência e evasão (KLEIN, 2007). Assim, os baixos salários dos professores, parcela do quadro de precarização e intensificação do trabalho docente estão ligados ao trabalho de baixa qualidade desenvolvido pelo professor à medida que trazem transtornos para o trabalho desse profissional. Se a qualidade do trabalho do professor for comprometida surgem consequências para diversos setores da sociedade, dada a relevância que a educação escolar detém na contemporaneidade. Conforme Ribeiro e Silva (2010), o professor além de deter uma função de extrema importância, trabalha em um terreno inconstante. Posto isso, cabe ressaltar as diferenças entre as nomenclaturas vencimento, salário e a remuneração. Camargo (2010) discorre sobre essa distinção: 12 O “salário” é definido juridicamente como o montante ou retribuição paga diretamente pelo empregador ao empregado pelo tempo de trabalho realizado – em geral, em relação ao número de horas-aula – nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Já o termo “vencimento” é definido legalmente (Lei nº 8112, de 11/12/90, art. 40) como “retribuição pecuniária pelo exercício de cargo público, com valor fixado em lei”. Os “vencimentos” dos cargos efetivos são irredutíveis e, para cargos de mesma atribuição ou de atribuição semelhante na mesma esfera administrativa, é garantida sua isonomia. O conceito de “remuneração” por sua vez, pode ser definido como o montante de dinheiro e/ou bens pagos pelo serviço prestado (por exemplo, cestas básicas), incluindo valores pagos por terceiros. A “remuneração” é a soma dos benefícios financeiros, dentre eles o “salário” ou “vencimento”, acordada por um contrato assinado entre empregado e empregador, tendo como base uma jornada de trabalho definida em horas-aula. O “salário” ou “vencimento” são, assim, uma parte da “remuneração”. No caso do magistério público, a “remuneração” é composta pelos “vencimentos” do cargo, acrescida de vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, em outras palavras, o vencimento básico mais as vantagens temporais, as gratificações, o auxílio transporte, etc. Conforme citado, a nomenclatura mais acertada para ser utilizada neste trabalho seria remuneração. Contudo, apesar de ser importante mostrar a distinção entre as nomenclaturas e de reconhecer a complexidade entre elas, há de notar que, tanto na economia quando nas pesquisas em educação, as três nomenclaturas citadas são comumente usadas para indicar o valor da mensalidade recebida pelos professores, sobretudo o termo salário. Dessa forma, o segundo capítulo busca discutir os salários dos professores com vista a compreender melhor o cenário tão heterogêneo da remuneração docente no Brasil. Além disso, abordaremos a discussão sobre a carreira docente, refletiremos sobre os valores e as variações dos salários dos professores brasileiros. O terceiro e último capítulo discute os salários dos professores do Estado de São Paulo, mesmo sendo o estado mais rico do Brasil, remunera mal seus professores há tempos. Pesquisas como a de Lapo e Bueno (2003), realizada na década de 1990, já diagnosticavam os salários como uma das causas centrais da insatisfação com o trabalho e da exoneração do magistério. Essas autoras também verificaram os pedidos de abandono dos professores paulistas entre 1990 e 1995, que apresentavam um crescimento de 300% nas solicitações em relação a década anterior. O capítulo ainda estabelece um comparativo entre os professores e enfermeiros efetivos do Estado, estabelecendo comparações entre as profissões 13 desde aspectos socioeconômicos até progressões na carreira estadual por tempo de trabalho ou aperfeiçoamento. Além disso, faz-se uma breve análise do histórico de transformações na carreira dos professores estaduais de São Paulo e os compara a nível salarial e carga horária com outras profissões com a mesma qualificação profissional do Estado. O corpus de análise foi constituído por pesquisas ligadas à apreensão do plano de carreira estabelecido pelo governo do estado de São Paulo para os docentes da educação básica estadual, sobretudo, por pesquisadores das áreas da economia e educação e por documentos referentes à temática produzidos pelos organismos internacionais tais como o Banco Mundial e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) (OCDE), por documentos do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), por dados divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e, mais especificamente as Deliberações e Resoluções da SEE-SP e do CEE, além da legislação brasileira pertinente. Na análise documental, foram ainda considerados, materiais recentemente publicados pelos dois principais órgãos sindicais de professores que abordam a questão salarial. À vista disso, analisamos as documentações da CNTE e da APEOESP, por meio de jornais, cartilhas e informativos que, ao lado de algumas pesquisas produzidas por esses sindicatos, ajudaram a estruturar o corpus da pesquisa. Esses documentos, por sua vez, encontramos disponibilizados nos sites dessas organizações. CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO Este capítulo busca apresentar e compreender a política de financiamento da educação básica no contexto da Reforma do Estado e da educação, nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), entre 1995 e 2002, e Luís Inácio Lula da Silva do Partido do Partido dos Trabalhadores (PT), entre 2003 e 2010, essencialmente ao que se refere ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Fundamental e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEF) e Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Fundamental e de Valorização dos Profissionais da 14 Educação (FUNDEF) e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Levando em conta de maneira sucinta as mudanças em andamento nos mandatos de Dilma Rousseff, também dos Partidos dos Trabalhadores, entre 2011 e 2018. Dessa forma, o capítulo aborda as bases legais que regulamentam o financiamento da educação, as fontes de recursos públicos para o sistema educacional e a operacionalização destes no decorrer do primeiro capítulo, com o auxílio de tabelas, gráficos e quadros. Por fim, e de maneira resumida, abordamos o custo aluno qualidade (CAQI) e custo aluno qualidade (CAQ), pauta essencial dentro da atual discussão sobre financiamento educacional em busca de uma melhora qualitativa em relação ao dinheiro investido por aluno. 1. A REFORMA DO ESTADO E A POLÍTICA DE FUNDOS PARA A EDUCAÇÃO As políticas educacionais por fazerem parte de uma conjuntura de reestruturações macroeconômicas e políticas são influenciadas por modelos formulados pelo Banco Mundial, ONU, Fundo Monetário Internacional – FMI e outros organismos internacionais que produzem “manuais” prontos de como um país pobre ou emergente deve proceder no caminho de atingir o nível e metas pré- estabelecidas dos países desenvolvidos. É evidente a estratégia da desobrigação do Estado, em que nasce o discurso das “reformas educacionais”, vide o Brasil e os outros países da América Latina, visando o enquadramento à nova ordem da globalização (MARE, 1995, p.12). Nesse cenário, a educação se torna um instrumento para atender aos interesses do mercado, contida na proposição de reformas a partir da década de 1990 no Brasil, ganhando espaço no âmbito das políticas externas do capital. Conforme essa visão, Gamboa (2001, p.85) sublinha que: Essas reformas obedecem a uma política educacional, que expressa interesses dos grupos dominantes, os quais controlam a política nacional após a onda dos golpes militares e do crescente intervencionismo internacional, na América Latina, na década de 1960. [...] Semelhante às fábricas que produzem mercadorias, o 15 sistema educativo deve produzir outra mercadoria denominada capital humano. O que se ressalta nos organismos internacionais hasteados no capital, sobretudo, Banco Mundial – BM, Fundo Monetário Internacional – FMI e Organização Mundial do Comércio OMC é o consenso articulado sobre o mito da falência do Estado nacional autônomo. Assim, a interferência do BM é exercida tanto pelos empréstimos concedidos, como pela difusão ideológica do neoliberalismo nos países em desenvolvimento, através das suas políticas de ajuste, em especial a fiscal e financeira. Segundo Soares (1998, p.23): O objetivo dos programas de ajuste é assegurar o pagamento da dívida e transformar a estrutura econômica dos países de forma a fazer desaparecer características julgadas indesejáveis e inconvenientes ao novo padrão de desenvolvimento (neoliberal): protecionismo, excesso de regulação, intervencionismo, elevado grau de introversão, entre outras. Em meio às várias medidas adotadas pelo Banco Mundial, merece destaque a convicção que ele credita a descentralização, ao caracterizá-la como opção incontestavelmente possibilitadora de escolas eficazes e autônomas (TAVARES, 2003, p.26). Dessa forma, a educação se coloca como um instrumento importante para o desenvolvimento econômico dos países, segundo a definição do documento Prioridades y Estratégias para Educación do Banco Mundial (1996, p.21). É um componente fundamental e estratégico para o Banco Mundial ajudar os países em desenvolvimento a melhorar os níveis de vida face ao crescimento sustentável e investimento no capital humano. Conforme as pretensões do Banco Mundial, as políticas para a educação dos países em desenvolvimento, principalmente no Brasil, fogem a verdadeira formação intrínseca plena do cidadão, dada que são formuladas e ajustadas sobre as particularidades do sistema econômico. O documento do Banco Mundial posiciona a educação como ferramenta fundamental na redução da pobreza. [...] o investimento em educação somente contribui para reduzir a pobreza em um contexto de crescimento com políticas redistributivas da renda, ao passo que, mesmo com crescimento, no contexto de políticas e efeitos redistributivos negativos, a educação não reduz a pobreza, nem mesmo nos países industrializados (CORAGGIO, 1998, p.116) 16 Da mesma forma, Piketty (2014), credita a educação o papel de diminuir as desigualdades socioeconômicas, desde que essa seja acompanhada de outras políticas públicas para diminuir as disparidades sociais. A efetividade da política educacional está condicionada a mudanças na distribuição de renda, da riqueza e dos bens econômicos, políticos e culturais para uma maior parte dos cidadãos, sobretudo em países como o Brasil que é apontado em diversos rankings como um dos países mais socioeconomicamente desiguais do mundo. Torres (2003) destaca a influência do Banco Mundial sobre a função formadora e estratégica para a educação. Visto que nas últimas décadas confere-se a este um espaço classicamente destinado à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a agência das Nações Unidas dedicada a educação. Dessa maneira, através do controle financeiro, formam-se metas e padrões definidos pelos interesses do mercado que incidem diretamente na formação educacional de cada país, em especial nos países em débito. Gamboa (2001, p.100-101) caracteriza enquanto ideário para a educação. O ideário de “Mais e melhor educação para todos’ parece uma frase em extinção na maioria dos países da América Latina, inseridos num mundo onde os computadores, a internet e a informação são os eixos por onde passam as transformações e as possibilidades dos sujeitos terem acesso a eles. [...] na conjuntura atual, determinada pela globalização da economia dos países periféricos e, dentre eles, os da América Latina, entram em crise e com eles surgem perspectivas sombrias para a educação pública. Consonante as ideias preestabelecidas para as reformas, Cabral Neto (2004) caracteriza o percurso que elas fazem com eixo na Conferência realizada na Cidade do México, em 1979, pela Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), com o escopo de definir as bases do Projeto Principal de Educação para a América Latina e Caribe (PROMEDLAC). Essas reuniões objetivavam formular políticas educacionais que fossem resistentes ao tempo, trazendo modernização e desenvolvimento aos sistemas de ensino. Dessa maneira, as reuniões ocorreram hasteadas nas análises e avaliações periódicas pelos representantes a respeito das políticas educacionais a fim de criar novos Planos de Ação para a América Latina. Em 1990, ocorreu a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia, convocada em parceria pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o Banco Mundial (BM). Essa Conferência é considerada um 17 marco para a educação, nas últimas décadas, pois dela resultou a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, chancelada por 155 países, contando o Brasil. Documento este, que passou a balizar as políticas do Banco Mundial para a educação e expressou, desde então, um objetivo para educação básica, a focalização no ensino fundamental. Nessa mesma década e dentro da Reforma Gerencial do Estado brasileiro, temos a implementação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF). A Conferência de Jomtien, fomentada pela Unesco, o Unicef e o Banco Mundial, iniciou uma política educacional focalizada no ensino fundamental e na defesa da relativização dos deveres do Estado com a educação (PINTO, 2002). Incutindo que o dever de prover a educação é de todas as camadas da sociedade, retirando a exclusividade do Estado. Em vista disso, o Banco Mundial e o FMI passaram a condicionar os seus empréstimos à adesão de diretrizes, caracterizadas singularmente pela economia, visão unilateral do custo-benefício e aspectos utilitaristas (DOURADO, 2004). Dentre as metas estabelecidas pelo Banco Mundial, destaca-se a busca por resultados, o fortalecimento da autonomia escolar e a atualização na sua capacidade gerencial, assim como a capacitação de professores sob as diretrizes técnicas vindas daqueles que gerem a economia. De acordo com Azevedo (2006, p. 30-31), entre 1991 e 1995, três reuniões da PROMEDLAC (Reuniões dos Ministros de Educação da América Latina e Caribe) mereceram destaque. [...] em Quito/Equador (1991), estabeleceram-se compromissos no sentido de investir na formação de recursos humanos e fortalecer iniciativas sociais; promover o desenvolvimento educativo concernente aos desafios do mercado, da equidade social e da democratização política; executar mudanças nos processos de gestão da educação, com ênfase na administração e no planejamento; desenvolver mecanismos e estratégias que proporcionassem a integração de diversos setores, a fim de compartilhar as responsabilidades com a educação; e formular novos currículos, a fim de atender aos princípios básicos de aprendizagens, estabelecidos em Jomtien (1990), para tornar a prática pedagógica das escolas mais significativa. Em Santiago/Chile (1993), na reunião do PROMEDLAC V, os Ministros da Educação acordaram em destinar mais recursos e melhorar a sua aplicação à educação; promover a modernização da gestão educacional, a profissionalização e a melhoria do funcionamento das escolas; priorizar e dar qualidade à educação básica, inclusive, nos processos de ensino aprendizagem; investir na educação de jovens e adultos; e envolver os meios de comunicação no processo educacional, como 18 agentes educativos. Na reunião de Kingston/Jamaica (1995), o PROMEDLAC VI discutiu a agenda intitulada de transformação educativa. Desse modo, estabeleceram-se mecanismos de controle e de medição para acompanhar e comparar os níveis de competência e de indicadores da evolução do desempenho das escolas, bem como utilizar essas informações para melhorar a qualidade da educação. Discutiram, ainda, ações que propiciassem a valorização dos docentes e, assim, o seu desempenho funcional. Embora os acordos feitos entre os Ministros da Educação de países da América Latina e do Caribe ressaltaram a educação em uma conjuntura mais ampla, a reforma educacional se concentrou na Educação Básica e, no Brasil, principalmente no Ensino Fundamental conforme as orientações externas. Os diversos programas, projetos e estratégias que norteavam as reformas educativas, com início na década de 1990, focaram-se em quatro eixos: a) gestão; b) qualidade e equidade; c) profissionalização docente; d) financiamento. O Brasil, como um dos líderes dos países emergentes (BRICS), adentra no processo de mundialização do capital (CHESNAIS, 1996). Nesse contexto, as políticas educacionais estão relacionadas a configuração do modo de produção dominante. Desse modo, as particularidades das definições educacionais estão contidas no bojo da sociedade capitalista e sujeitas as contradições inerentes às classes sociais da sociedade contemporânea. Sendo assim, as reformas inerentes à educação no país, a partir de 1990, fortemente influenciadas pelo Banco Mundial, Cepal, FMI, Unesco e outros organismos internacionais, tentam difundir na América Latina e no Caribe um aglomerado de diretrizes articuladas através de um modelo de educação de caráter homogêneo para a região. Mantendo a atenção para os três objetivos principais da reforma: focalização, descentralização e privatização. Assim, foram estabelecidos componentes decisivos para a reforma da educação para os países emergentes, particularmente: 1)a prioridade depositada sobre a Educação Básica; 2) a melhoria da qualidade da educação; 3) a prioridade sobre os aspectos financeiros e administrativos da reforma educativa; 4) a descentralização e instituições escolares autônomas e responsáveis por seus resultados; 5) convocação para uma maior participação dos pais e da comunidade nos assuntos escolares; 6) o impulso do setor privado e os organismo não governamentais (ONGs), como agentes ativos no terreno educativo, sejam na tomada de decisões, seja na implementação das políticas; 7) a mobilização e a alocação eficaz de recursos adicionais para a educação fundamental, como temas 19 principais do diálogo e da negociação como os governos; 8) um enfoque setorial; 9) a definição de políticas e prioridades baseadas na análise e econômica (TORRES, 2003, p. 131-138). A reestruturação do sistema educacional, em razão das mudanças ocorridas na esfera do capitalismo, trouxe a questão do capital humano e fez aflorar o tema da gestão empresarial na educação como símbolo da qualidade total, partindo de um escopo econômico de matiz neoliberal (GENTILLI, 2002, p. 126). Enquanto os pensadores do capital humano lidavam com um mercado de trabalho em crescimento e a lógica do planejamento de Estados, os neoliberais teorizavam a educação para a competência em um mercado competitivo (idem, 1998). Em conformidade com Araújo (2006), o projeto formulado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso é conexo ao ajuste neoliberal. Mesmo que este projeto tenha sofrido um atraso no país, dado o impeachment de Fernando Collor de Melo, o projeto foi retomado pelo governo de Itamar Franco. Bem tardio ao neoliberalismo mexicano, que já passava pela sua primeira crise, algo que só aconteceu ao final da década no Brasil (SADER, 2013, p. 137-138). As relações de trabalho no governo FHC foram submetidas a processos de informalização, que na realidade significaram sua precarização, com a expropriação de direitos essenciais dos trabalhadores – a começar pelo contrato formal de trabalho (idem). Dentro dessa reforma, encontra-se, notadamente, o Programa nomeado “Acorda Brasil: está na hora da escola”, difundido entre 1995 e 1998, segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. Em sua gestão, também se implementou o Ministério da Administração Federal e a Reforma do Estado (MARE). Esse Ministério criou o Programa da Qualidade e Participação Pública, instituindo os modelos de envolvimento da sociedade civil para fundamentar o Estado em sua proposta neoliberal. O citado Programa tinha como função divulgar documentos e dados que amparassem as estratégias de Reforma do Estado, diminuir as responsabilidades que, antes, eram exclusivas do Estado e que poderiam ser divididas com outras instâncias do governo e sociais, buscando construir uma gestão descentralizada. Em meio ao duplo mandato de FHC (1995-2002), além da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9.394/96 (BRASIL, 2001), sancionada com grande impacto no financiamento educacional, a Emenda Constitucional nº 14 (BRASIL, 1996) deu formato a redistribuição de recursos e tornou possível a criação 20 do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) através da Lei nº 9.424/96 (BRASIL, 1996). Bem como, o Plano Nacional de Educação aprovado pela Lei nº 10.172/01 (BRASIL, 2001), sendo instaurado pelo governo, à época, com supressão de artigos importantes relacionados ao financiamento da educação. O Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2001, p.3) abarca “o programa de distribuição de recursos financeiros diretamente para as escolas, de forma a expandir sua autonomia”. O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) tem recursos administrados pelas próprias instituições públicas de ensino. Entretanto, a autonomia remete-se, em especial, ao “projeto pedagógico assim como em termos de recursos financeiros públicos suficientes para manutenção do cotidiano escolar” e aumento das ofertas para a educação (BRASIL, 2001, p. 34). Resultante desse processo de descentralização do Estado foi criado o Fórum Permanente de Valorização do Magistério e Qualidade na Educação, que reunia os docentes, Estado e a Academia. Um dos produtos desse Fórum foi a oficialização no ano de 1994, do Pacto pela Valorização do Magistério e Qualidade na Educação, reunindo a União, os estados, os municípios e uma parte das entidades dos trabalhadores em educação, visando firmar e complementar uma política de longa duração, com olhos à elevação dos índices qualitativos da educação básica. Mesmo com os avanços no contexto das reformas educativas em alguns países da América Latina, essas não refletiram, adequadamente, nem para o êxito econômico nem para enfrentar as desigualdades socioeconômicas, muito menos superar a pobreza a e aumentar a qualidade de vida de maior parte da população. Os mandatos de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010), foram marcados por uma conjuntura de tensão conflitante entre o antigo governo e a promessa de mudanças formuladas pela nova gestão. As forças políticas que formaram a resistência ativa às políticas do neoliberalismo de FHC esperavam do novo governo uma modificação da estrutura social, especialmente em relação ao antigo modelo econômico. Dessa forma, a nova gestão, então, estaria frente a um quadro complexo de: [...] desenhar um programa alternativo e contrário ao modelo atual, capaz de responder às reivindicações imediatas do mundo do trabalho, mas visualizando um horizonte societal distinto e 21 alternativo, que não tenha ilusões quanto ao caráter destrutivo da lógica hoje predominante (ANTUNES, 2001, p. 135). Conforme Antunes (2001), esperava-se uma forte alteração na política econômica com o Governo Lula, indo contra os interesses do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos Organismos Multilaterais. Assim como recuperar um salário mínimo digno, iniciar a reforma agrária de extrema importância para diminuir a miséria brasileira, além de conter o processo de privatização da União. Contudo, o antigo governo e suas políticas neoliberais deixam um campo político altamente sólido. Enquanto de um lado, os capitais transnacionais (com aquiescência dócil do que resta dos capitais nativos) puxarão o pêndulo para o centro e para a direita, visando a implementação de políticas de conformidade com seus interesses, sob a batuta do FMI e do BM, de outro lado o universo multifacetado do mundo do trabalho, através de suas ações concretas pela base, por seus sindicatos, movimentos sociais urbanos e rurais, partidos e movimentos de esquerda, deverão respaldar, amparar, impulsionar e mesmo exigir do Governo Lula a elaboração de programas e de políticas que garantam e ampliem os direitos e conquistas dos trabalhadores contra a lógica destrutiva dos capitais (ANTUNES, 2001, p. 142). De acordo com Sader (2013), em seu diagnóstico feito sobre o Governo Lula, avançou, primeiramente, pelos setores de menor resistência e maior fragilidade do neoliberalismo: deu atenção às políticas sociais, como o Bolsa Família1e aos projetos de articulação regional. Conforme o referido autor, “ele combinou estabilidade monetária e retomada do desenvolvimento econômico e políticas de distribuição de renda, que assumiu centralidade nas políticas de governo” (SADER, 2013, p. 139). Em relação ao primeiro mandato do Governo de Dilma Rousseff, apesar da continuidade da redução da miséria e do desemprego devido aos programas sociais e as medidas para reduzir impostos, os primeiros quatros anos (2011-2014) foram marcados por uma crise econômica, com o aumento da inflação e queda Produto Interno Bruto brasileiro. 1 O programa Bolsa Família instituído pela Lei Federal nº. 10.836, unificou os programas: Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Educação – Bolsa Escola (Lei nº 10.219, de 11 de abril de 2001 - Governo Fernando Henrique Cardoso), Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto nº 3.877, de 24 de julho de 2001 - Governo Fernando Henrique Cardoso), Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Saúde – Bolsa Alimentação (Medida Provisória nº 2.206-1, de 6 de setembro de 2001 - Governo Fernando Henrique Cardoso), Programa Auxílio-Gás (Decreto nº 4.102, de 24 de janeiro de 2002 - Governo Fernando Henrique Cardoso) e Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Fome Zero (Lei nº 10.689, de 13 de junho de 2003 - Governo Lula). 22 Em um momento em que a mídia e os dados macroeconômicos apontam um desiquilíbrio nas contas governamentais, o governo reeleito de Dilma Rousseff põe em prática a agenda das classes dominantes, isto é, sob um ambiente de retomada da inflação, PIB abaixo de zero e déficits orçamentários, a presidente adota um discurso de austeridade, cortando milhões da educação logo no primeiro ano de seu segundo mandato (2015-2018). Esse corte não coaduna com o slogan do governo “Brasil, Pátria Educadora” e com tantos outros cortes que desde a época de Pombal, acenam com arrochos em tempos de crise política e econômica, contudo, retirar investimentos do sistema educacional além de afetar diretamente e instantaneamente as classes mais pobres do país também gera consequências graves para o crescimento socioeconômico a médio e longo prazo. 1.1 Financiamento da educação: vinculações constitucionais e recursos públicos A Constituição Federal de 1988 estabelece as bases legais que regulamentam o financiamento da educação. O art. 212 prevê as fontes de recursos para o financiamento, no qual o Governo Federal deve aplicar 18% de sua receita líquida de impostos em educação, destinando aos Estados, Distrito Federal e Municípios a aplicação de 25% da mesma base. Assim, provendo dois tipos de tributos para o Desenvolvimento do Ensino Público e a Manutenção dos impostos da contribuição social. A Constituição Federal define, no § 5º do art. 212, que a educação básica pública “terá como fonte adicional de financiamento a contribuição social do salário-educação, recolhida pelas empresas” (BRASIL, 1988). Tal dispositivo deveria ser cumprido por Municípios e Estados, contudo a União não o pôs em prática até os meados dos anos de 1990. Esse vínculo constitucional da receita de impostos e recursos que havia sido normatizada pela Emenda Calmon, a qual segundo representava: [...] a tradição das Constituições democráticas de 1934 e 1946 de vinculação de recursos à educação, foi aprovada em 1983, mas somente seria aplicada em 1985, em virtude das ações protelatórias da então Secretaria do Planejamento (SEPLAN), ocupada pelo ministro Delfim Neto (que 48 horas após a aprovação da emenda), declarou, segundo depoimento do senador João Calmon, saber como “driblar a educação” (MARTIN, 2011, 87-88). [...] a EC do Senador João Calmon [...] fixou o porcentual mínimo de 13%, no 23 caso da União e 25% no caso de Estados, Distrito Federal e Municípios (DAVIES, 2006, p.45). Além disso, a emenda representou um avanço significativo ao dar notoriedade ao direito à educação e dos deveres do Estado, assim como finalizou um período obscuro em relação a transparência na gestão dos gastos com a Manutenção e Desenvolvimento do Ensino – MDE. Consoante a Davies (2006), os fundos destinados à educação vinculados legalmente, não garantiram o seu real repasse ao sistema educacional. Velloso (1988, p.360) constata a violação da Emenda Calmon, principalmente após a sua aprovação”. Tanto como o “descumprimento da exigência constitucional das verbas devidas tem contato direto com a omissão – conivência dos Tribunais de Contas, cuja eficácia e/ou confiabilidade são limitadíssimas, para não dizer nulas” (DAVIES, 2006, p. 47). [...] passados 27 anos da aprovação da Emenda João Calmon, que retomou a vinculação de receitas para a educação, continuamos a afirmar que tornar o sistema de financiamento um instrumento de construção de igualdade para a oferta educacional no país é uma questão política (GOUVEIA; SOUSA, 2010, p. 792). No tocante às contribuições sociais para o financiamento educacional, temos o Salário-Educação (SE), em funcionamento desde 1964, o qual determina que as empresas devam repassar um percentual de 2,5% incidente sobre o valor da folha de salários, mensalmente recolhido junto à contribuição ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Inicialmente, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), após arrecadar os recursos do SE, fracionava os recursos de cada Estado em duas partes, onde uma parte permanecia nesse órgão como cota Federal (1/3) e a outra metade (2/3) voltavam ao Estado responsável pela arrecadação. As duas partes eram investidas no ensino fundamental. Contudo, dentre as modificações ocorridas no Salário Educação no ano de 2000, a sistemática de distribuição merece destaque: Antes de separas as cotas, o FNDE passou a extrair 10% da arrecadação total, o que reforçou a sua capacidade de financiamento de vários programas educacional federais que gerencia, dividindo os 90% restantes também em duas cotas. A Cota Estadual (2/3) foi transformada em Cota Estadual e Municipal e passou a ser redistribuída conforme a responsabilidade pela oferta da matrícula da educação básica e não mais apenas para o ensino fundamental, beneficiando equitativamente os governos estaduais e municipais em 24 cada Estada. Sob essa sistemática de redistribuição em duas cotas, os governos estaduais e municipais contam, atualmente com recursos provenientes da repartição da Cota Estadual e Municipal e desenvolvem programas federais financiados com recursos da Cota Federal, como o Programa Nacional de Transporte Escolar, o Programa Nacional de Alimentação Escolar, o Programa Nacional do Livro Didático, entre outros (BASSI, 2011, p.6). Em relação ao financiamento da educação pública, a competência pelo funcionamento e expansão do sistema de ensino educacional deve ser efetivada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, conforme as determinações das normas legais vigentes (ABRAHÃO, 2005). A União deve utilizar recursos na implementação de alguns programas que definem ações próprias, além de distribuir fundos para os sistemas municipais e estaduais. Na constituição de suas receitas, os estados agregam os fundos recebidos da União aos vindos de suas fontes, os quais são aplicados na manutenção e expansão de seus sistemas educacionais. Na constituição dos recursos designados à manutenção e à expansão das redes de ensino, os municípios obtêm fundo do governo Federal e dos Estados, adicionados aos recursos próprios. Conforme Castro (2010, p.172), a vinculação de impostos para a educação “é uma das medidas políticas mais importantes para garantir a disponibilidade de recursos para o cumprimento do vasto rol de responsabilidades do poder público nessa área”. Entende-se, dessa forma, o quão essencial é a vinculação de impostos para a garantia e melhoria do setor educacional, sobretudo, ao que se determina na Constituição Federal de 1988. Nessa perspectiva, para defender o direito à educação, o Estado definiu as fontes de financiamento e a estrutura, ao estabelecer que a educação receberia os recursos financeiros por meio da vinculação de impostos da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios. De acordo com o quadro 1, o sistema de ensino educacional brasileiro é estruturado e organizado conforme o regime de colaboração, sistema esse anterior ao determinado pela Constituição de 1988. 25 Quadro 1 – Estrutura do financiamento da educação no Brasil. União Estados Municípios Orçamentários (Tesouro) Ordinários do Tesouro Vinculação da Receita de Impostos (18% para MDE) Vinculação da receita de impostos (25%) para MDE Subvinculação do Fundef (representa 15% das receitas de impostos do FPE e ICMS) Vinculação da receita de impostos (25%) para MDE Subvinculação do Fundef (representa 15% das receitas de impostos e do FPM) DRU (ex- FEF/FSE) --- --- Contribuições Sociais Salário educação/quota federal Contribuição sobre o lucro líquido Contribuição para a seguridade social Receitas brutas de prognósticos Salário Educação/quota estadual --- --- --- Transferências --- Salário educação/quota federal Salário educação/quota estadual Orçamentários da União (exemplo: complementação do Fundef) Aplicação do salário educação/quota federal e outras fontes do FNDE Salário educação/quota federal Salário educação/quota Orçamentários do Estado Orçamentários da União Aplicação do Salário educação/quota federal e outras fontes do FNDE Diretamente Diretamente 26 Outros --- arrecadados Operações de crédito Diversos arrecadados Operações de crédito Diversos Outras Fontes Operações de crédito Renda líquida da loteria federal Renda de órgãos autônomos Aplicação do salário educação/quota federal e outras fontes do FNDE Diretamente arrecados Diversos --- --- Fonte: CASTRO (2001). Os recursos advindos de transferências que tenham como origem os impostos devem ser contabilizados como se fossem impostos, isto é, para se adequar ao sistema de vinculação. Dessa forma, os estados e o Distrito Federal devem somar à sua receita de impostos transferências provindas da União que tenham como pilar os impostos. Da mesma forma, os municípios devem agir, somando à sua base de cálculo para MDE às transferências do estado e da União que tenham fontes os mesmos impostos. Além disso, os impostos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, isto é, recursos provindos diretamente por cada estado, existem outras fontes de arrecadação de recursos para o meio educacional advindos de receita de transferências constitucionais e outras transferências; como a receita do salário- educação e de contribuições sociais ou mesmo as receitas de incentivos fiscais e outros recursos com base na legislação sobre o financiamento. Nessa atual conjuntura, a política de financiamento educacional brasileira está imbricada nas relações federativas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Assim sendo, o financiamento caracteriza uma divisa que marca as possibilidades de intervenção dos entes federados e a amplitude de suas opções e estratégias no alcance de políticas próprias ou de políticas intergovernamentais. Rossinholi (2010), ao tratar do art. 211 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), diz que este é definido pela descentralização financeira, 27 representando uma expansão da participação de estados e, em especial, de municípios no recebimento tributário e na receita para uso, passando a ter a função redistributiva e supletiva, para assegurar a igualdade de oportunidades educacionais. Contudo, cada ente administrativo possui atuação prioritária com específicas modalidades e etapas do ensino. Os recursos vinculados pela constituição, à Manutenção e ao Desenvolvimento do Ensino (MDE) emanam de uma parte da receita pública, de créditos operacionais e contribuições sociais. Na maioria das vezes, os recursos públicos são originários da receita de impostos segundo seus aspectos próprios. Dentro dessa conjuntura de reorganização dos fundos e despesas públicas, as despesas correntes e as despesas de capital merecem destaque, dada a sua importância na Administração Pública do Estado. As despesas correntes são aquelas efetuadas pela Administração Pública visando promover a execução e a manutenção da ação governamental. Essas despesas desdobram-se em despesas de custeio e transferências correntes. Já as despesas de capital são aquelas efetivadas pela Administração Pública destinadas a formar um bem de capital ou adicionar valor a um já existente, assim como transferir, por compra ou outro meio de aquisição, a propriedade entre entidades do setor público ou do setor privado para o primeiro (FERREIRA, 2014, pg.98) O quadro 2 apresenta os impostos e sua natureza de arrecadação e transferência. 28 Quadro 2 – Impostos segundo a natureza de arrecadação e transferência. Imposto segundo a natureza de arrecadação e transferências Natureza Transferências para Estados Municípios Imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) Estadual 50% Imposto sobre a transmissão “causa mortis” e doação de bens e direito (ITCM) Estadual Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) Estadual 25% Imposto sobre importação (II) Federal Imposto sobre exportação (IE) Federal Imposto sobre propriedade territorial rural (ITR) Federal 100% Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza (IR) Federal 21,5% 22,5% Imposto sobre produtos industrializados (IPI) Federal 21,5% 22,5% Imposto sobre operação de crédito, câmbio e seguro ou relativas a títulos e valores mobiliários (IOF) Federal Imposto sobre a transmissão “inter vivos” dos bens imóveis e de direitos reais/imóveis (ITBI) Municipal Imposto sobre propriedade urbana (IPTU) Municipal Imposto sobre serviço de qualquer natureza (ISS) Municipal Fonte: DOURADO (2004). 29 A porcentagem referente à União, que é de 18%, e aos estados, Distrito Federal e municípios de 25% estão vinculados a receita líquida dos impostos, assim, obriga-se: No caso da União, deduzir previamente da receita bruta de impostos a parcela transferida aos estados, Distrito Federal e municípios; no caso dos estados, deduzir previamente da receita bruta de impostos e transferências a parcela transferida aos municípios; no caso do Distrito Federal e dos municípios, fazer incidir a alíquota de 25% sobre toda receita de impostos próprios e transferidos (DOURADO, 2004, p.8). Conforme Oliveira (2002, p.92), o objetivo de equalizar a capacidade arrecadadora e as responsabilidades na oferta de serviços das diferentes esferas administrativas públicas são feitas através das transferências de recursos. A exemplo disso, temos os Fundos de participação dos estados e dos municípios nas transferências de recursos. Duarte (2005) aponta que o sistema de educação básica no Brasil pode ser descrito, em vala rasa, como um sistema público federativo que tem por base o financiamento fiscal oriundo de recursos de receitas municipais e estaduais. A participação dos estados subnacionais, é de aproximadamente 50,1% da receita vinculada à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, e os municípios, com 32,1%. Aprovado após 1996, o processo normativo foi organizado hasteado em fontes e responsabilidades financeiras compartilhadas e diferenciadas. Pesquisas sobre o direito à educação (ADRIÃO 2007; CURY 2002; ARAÚJO, 2003), destacam a necessidade de aprofundamento nas análises sobre a sistematização das relações intergovernamentais. Como responder a dois pontos tão distintos, tendo que atender a uma organização político-administrativa baseada na autonomia e nas disparidades fiscais entre os estados, municípios e Distrito Federal, e ao mesmo tempo apelo constitucional pelo direito à educação? O art. 211 da Constituição Federal institui o princípio de regime de colaboração fiscal entre os entes da federação – a União em conjunto com os demais entes e estes, por outro lado, capacidade de autogoverno. Mesmo que o princípio constitucional de lei complementar tenha fixado normas para a colaboração não tenha sido respeitada (CURY, 2002, p.173), esta pesquisa entende que as reestruturações no sistema de financiamento da educação básica, instauradas pela Emenda Constitucional nº. 14/1996 encadearam competências e meios dispares. 30 Guiados pela lei, o sistema de financiamento entre os entes federados deve se guiar pela colaboração, pela ação supletiva e distributiva da União e dos Estados, dispondo, contudo, limitado à capacidade de resposta e esforço fiscal da união, estados, distrito federal e municípios. Com o FUNDEF, substituído pelo FUNDEB em funcionamento até 2020, o tema federalismo ganhou mais espaços, e através de pesquisas passaram a agregar com mais intensidade a discussão sobre o tema da Federação, principal responsável pelas desigualdades regionais na educação. 1.2 Fundos de financiamento da educação: FUNDEF e FUNDEB O FUNDEF foi implantado nos estados da federação, mais o Distrito Federal, em 1º de janeiro de 1998. Criado pela Emenda Constitucional nº 14/1996 e regulamentado pela Lei 9.424/1996, funcionou no período legal de duração dez anos, isto é, acabou em 31 de dezembro de 2006. Com base em suas determinações, era um fundo de natureza contábil que deveria articular a esfera federal, estadual e municipal; promover conselhos de participação da população; garantir o mínimo de recursos financeiros para uma melhora qualitativa do ensino fundamental em todo o país; investir na manutenção e desenvolvimento do ensino; valorizar o profissional do magistério e diminuir nos entes da federação as desigualdades estaduais assim como as regionais (BRASIL, 1996, arts. 1º, 2º, 4º, 6º e 7º). Sua implementação trouxe melhoras e pioras no sistema educacional que foram abordadas por diversos autores que pesquisavam a ferramenta de distribuição de recursos. O FUNDEF possibilitou a expansão do atendimento do ensino fundamental, no entanto, a centralização dos recursos financeiros em uma modalidade de ensino provocou uma marginalização de grande parte de jovens e crianças do ensino médio e infantil (GEMAQUE, 2004; ARELARO, 1999; DAVIES, 1999; PINTO, 1999, 2002). Segundo Francisco Fernandes (2005), os problemas em decorrência do FUNDEF na forma de atender as etapas de ensino provocaram a ausência de uma política que manejasse recursos para a universalização comum das etapas de ensino, baseadas em ferramentas que mantivessem a valorização dos profissionais do magistério e trouxesse uma melhora da qualidade do ensino. Deste modo, como um meio de solucionar o maior problema do FUNDEF, ou seja, a focalização dos 31 recursos em uma etapa de ensino, surge o FUNDEB, mecanismo que pretendia equalizar os recursos e garantir o acesso a todas as etapas de ensino. Embora as discussões quanto a nova ferramenta que fosse substituir o FUNDEF tenham início anterior à sua criação, o fundo surge oficialmente no país por meio da Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006, regulamentado pela Lei 11. 494, de 20 de junho de 2007, destinada a abranger a todas as etapas do ensino básico (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio), conforme traz a sua sigla, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Fundo também temporário, que pretende/pretendia suprimir ou diminuir os aspectos e resultados negativos do antigo fundo, especificamente, o menor repasse de verbas para a educação infantil e a educação de jovens e adultos, o deficiente sistema de gestão e avaliação da distribuição de recursos e fraca valorização do magistério em todos os âmbitos. Tal como apontando, o FUNDEB também é um fundo contábil provisório, com duração de 14 anos – até 31 de dezembro de 2020 – (Lei 11.494/2007, art. 48) e também com o mesmo mecanismo de distribuição dos recursos arrecadados com base na captação de impostos estaduais e municipais, bem como a complementação da União e redistribuição dos mesmos dentro de cada estado, municípios e Distrito Federal (art. 1º; art. 3º), conforme as matrículas da educação básica (art. 4º). No FUNDEB, calculadas somente as matrículas presenciais e que estiverem dentro das competências estipuladas na Constituição de cada esfera governativa, segundo o art. 211 da Constituição Federal de 1988. À vista disso, Araújo (2009, p.35) diz que, “as matrículas de educação infantil mantidas pelas redes estaduais e matrículas do ensino médio mantidas pelas redes municipais não serão consideradas para efeito de distribuição dos recursos”. No julgamento de Bernardi (2005), o FUNDEB executa uma função mais ampla que o FUNDEF, dado que a sua base jurídica visa promover a igualdade pela distribuição de recursos da educação entre a esfera estadual e os seus municípios, atender e universalizar a educação básica e não somente o ensino fundamental, valorizar os profissionais da educação e garantir as condições necessárias para um piso salarial do magistério público (BRASIL, 2007, art. º1º ao 4º; 8º; 21º; 40º; e 41º), Apesar de sua abrangência e objetivos ambiciosos quando se compara o FUNDEB ao FUNDEF. Este fundo mantém grande parte da lógica de funcionamento e forma de gestão dos recursos captados em relação ao FUNDEF. Portanto, uma 32 análise sucinta do período de existência do fundo e de suas características traz entendimentos usuais para o estudo do atual FUNDEB. O quadro 3 mostra os pontos principais de ambos os fundos, levando em conta apenas à constituição de seus recursos. Quadro 3 – Características da composição dos recursos do FUNDEF e do FUNDEB. CARACTERÍSTICAS FUNDEF FUNDEB 1 – Fonte de recursos 15% de contribuição de estados, DF e municípios: Fundo de Participação dos Estados (FPE) Fundo de Participação dos Municípios (FPM) Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações (IPIexp) Desoneração de exportações (Lei Complementar nº 87/96) Complementação da União Contribuição de estados, DF e municípios de: 16,66% no primeiro ano; 18,33% no segundo ano 20% a partir do terceiro ano, sobre: Fundo de Participação dos Estados (FPE); Fundo de Participação dos Municípios (FPM); Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações (IPIexp); Desoneração de Exportações (Lei Complementar nº 87/96) Contribuição de estados, DF e municípios de: 6,66% no primeiro ano; 13,33% no segundo ano; 20%, a partir do terceiro ano, sobre: Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCM); Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA); quota-parte de 50% do Imposto Territorial Rural (ITR) devida aos municípios Complementação da União 2 – Montante de recursos R$ 35,2 bilhões (previsão de 2006, sem complementação da União) Consideradas as estimativas (em valores de 2006) e a escala de implantação gradual do fundo, os montantes previstos de recursos (contribuição de Estados, DF e municípios, sem complementação da União), seriam R$ 41,1 bilhões no primeiro ano; R$ 45,9 no segundo ano; R$ 50,7 bilhões no terceiro ano. Em 2014 o valor foi de 115,3 bilhões, sem complementação da União. 33 3 – Complementação da União R$ 313,7 milhões (valor previsto para 2006). Não há definição, na Constituição, de parâmetro que assegure o montante de recursos da União para o fundo. Consideradas as estimativas, em valores de 2006: R$ 2 bilhões no primeiro ano; R$ bilhões no segundo ano; R$ 4,50 bilhões no terceiro ano Em 2014 o valor foi de 10,8 bilhões. 10% do montante resultante da contribuição dos estados e municípios a partir do quarto ano Valores reajustáveis com base no índice oficial da inflação. Esses valores oneram os 18% da receita de impostos da União vinculada à educação, por força do art. 212 da Constituição, em até 30% do valor da complementação Não poderão ser utilizados recursos do salário-educação (a contribuição do salário-educação será estendida a toda educação básica pública) Até 10% poderá ser distribuída aos fundos por meio de programas direcionados à melhoria da qualidade da educação 4 – Total geral de recursos do fundo R$ 35,5 bilhões previstos para 2006 Previsões (em valores de 2006) R$ 43,1 bilhões no primeiro ano; R$ 48,9 bilhões no segundo ano; R$ 55,2 bilhões no terceiro ano. Em 2014 o valor foi de 126,1 bilhões. 5 – Distribuição dos recursos Com base no número de alunos do ensino fundamental regular e especial, de acordo com dados do Censo Escolar do ano anterior Com base no número de alunos da educação básica (creche, pré-escolar, fundamental e médio), de acordo com dados do Censo Escolar do ano anterior, observada a escala de inclusão: Alunos do ensino fundamental regular e especial: 100%, a partir do primeiro Alunos da educação infantil, ensino médio e EJA: 33,33% no primeiro ano; 66,66% no segundo e 100% a partir do terceiro 6 – Utilização dos recursos Mínimo de 60% para remuneração dos profissionais do magistério do ensino fundamental. O restante dos recursos, em outras despesas de manutenção e desenvolvimento do Mínimo de 60% para remuneração dos profissionais do magistério da educação básica. O restante dos recursos em outras despesas de manutenção e desenvolvimento da educação básica pública. 34 ensino fundamental público 7 – Salário-educação Vinculado ao ensino fundamental. Parte da quota federal é utilizada no custeio da complementação da União ao Fundef, permitida até o limite de 20% do valor da complementação Vinculado à educação básica. Não pode ser utilizado para fins de custeio da complementação da União ao Fundeb. Fonte: FNDE (2015). Como ferramenta de efetivação da política educacional de universalização do ensino fundamental, o FUNDEF, ao meio de outros aspectos, reestruturou o pacto de colaboração entre os entes federados. Aos estados e municípios, incluindo o Distrito Federal, couberam a utilização de 60% do percentual constitucional mínimo de 25% de alguns impostos para a receita do ensino fundamental. Como mostra o quadro 1, seriam 15% dos seguintes impostos: FPE, ICMS, FPM, IPI exportação e a compensação financeira conforme a lei complementar 87/96 (Lei Kandir)2. Dessa forma, sobraria à União o papel de complementação, sempre que, em cada estado e no Distrito Federal, o valor mínimo por aluno não alcançasse o determinado pelo MEC (Ministério da educação) em nível nacional3 Portanto, com base nas delimitações impostas pela distribuição dos recursos do FUNDEF, é possível perceber a priorização do Governo Federal no ensino fundamental. No entanto, autores da área do financiamento da educação como: Monlevade (1998), Davies (1999), Arelaro (1999; 2004), Pinto (2002), Ramos (2003), Ximenes (2009), Ednir e Bassi (2009), discutem se realmente houve a priorização desta etapa de ensino, alegando que a centralização permaneceu concretamente mais no campo da teoria do que na prática. O FUNDEF não angariou novos recursos para o sistema educacional brasileiro a nível nacional, ele apenas possibilitou uma nova redistribuição a nível estadual entre União e os municípios uma fatia dos impostos que já eram vinculados anteriormente à Manutenção e 2A Lei Kandir regulamentou a aplicação do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Feita pelo então ministro do Planejamento Antonio Kandir, transformou-se na Lei Complementar 87/96, que já foi alterada por várias outras leis complementares. 3 Para maiores informações sobre o valor aluno/ano e metodologia de filtragem, acessar o site http://www.fnde.gov.br/financiamento/fundeb/fundeb-consultas 35 Desenvolvimento do Ensino (MDE), através da divisão no número de matriculados no ensino fundamental regular. Monlevade, ao discorrer sobre o FUNDEF e a sua sustentação legal, destaca o descompromisso e desresponsabillização da União quanto ao ensino fundamental. Conforme o autor, a política formulada e implementada por Fernando Henrique Cardoso (FHC) objetivava diminuir os gastos com a educação no país. Segundo a cartilha do Banco Mundial, os recursos despendidos em educação no Brasil eram suficientes, mas não estavam sendo bem direcionados, parte de uma análise estritamente economicista e com fortes controvérsias numéricas. Nessa conjuntura, a política de fundos foi um forte avanço no ordenamento dos gastos, com equidade e parcimônia (MONLEVADE, 1998, p. 24). Ao adentrar mais a fundo na discussão, o repasse de recursos feito pela União ao sistema escola da educação básica é o menor dos entes federados, caso agravado por ser o ente que mais arrecada dentre as esferas administrativas onde Estados e os municípios, e especialmente o último, repassa proporcionalmente muito mais que o Governo Federal (DAVIES, 1999). Tal colocação se baseia no fato de que apesar da União ser a formuladora do FUNDEF, o Governo Federal por meio da Emenda nº 1, alterou o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988, reduzindo de 50% para menos do que 30% do percentual da receita vinculada à educação, que deveria extinguir o analfabetismo e investir na manutenção de desenvolvimento do ensino fundamental (1999, p.45). Outro aspecto negativo em relação ao FUNDEF é do descompromisso do Governo Federal, apontado por Arelaro (1999) no artigo em que examina o primeiro ano de funcionamento do FUNDEF e atualizado por Pinto (2002) em uma pesquisa em que avalia os dois períodos de gestão de FHC, é o não cumprimento na forma de cálculo do valor mínimo a ser gasto por aluno, explicitado na lei 9.424/96. Dessa forma, estima-se que o ensino fundamental, foco do FUNDEF, deixou de receber aproximadamente dez bilhões de reais de recursos federais desde 1998 (2002, p.4). Ramos (2003), ao analisar o FUNDEF na década de 1990 evidencia que a suposta ênfase dada a educação pelos discursos oficiais da União na época não foi acompanhada por políticas de expansão dos investimentos públicos em educação, mesmo com o aumento da arrecadação dos impostos na metade da década adiante. Conforme o autor, a centralização real foi no pagamento dos encargos da dívida 36 pública com os organismos internacionais de financiamento e empréstimos. Para a autora, na educação “houve um declínio na ordem de 46% durante o período de 1995 a 1999 dos gastos com Manutenção e Desenvolvimento do Ensino e redução dos recursos provenientes do salário-educação” (p.302). Outrossim, segundo a autora, a formulação do FUNDEF permitiu apenas uma redistribuição dos montantes de recursos e não o aumento destes, onde estados e municípios continuaram a direcionar o mesmo montante, assim como a União, que também se manteve apenas realocando os recursos dos outros níveis de ensino para o ensino fundamental dentro da delimitação imposta pelo fundo, onde 60% era somente para o objetivo do fundo de financiamento, o ensino fundamental (2003, p. 302)4. O estudo feito a partir de pesquisa de Adrião; Oliveira (2007), Aleralo (2007), Davies (2008), mostra que o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), no decorrer dos seus dez anos de funcionamento, não propiciou o aumento da contribuição da União com o sistema educação. Arelaro (2007), intitula o funcionamento do FUNDEF em seus dez primeiros anos de vigência, como o “Fundo Robin Hood”, principal ferramenta de financiamento nos dois Governos de FHC (1995/2002), e continuada, apesar da forte oposição no primeiro mandato do Governo Lula (2003/2006), mostrou como essa ferramenta foi uma artimanha para o Governo Federal investir em menor proporção o que se deveria em educação e diminuir por meio da legislação os “novos investimentos”. Segundo a autora, os números dos dois mandatos são incisivos, pois se em 1995 gastava-se 16,7 bilhões, em 2002, esse valor diminuiu a 13 bilhões, isto é, uma redução de 3,7 bilhões em um período de 8 anos. Em concordância, Davies (2008), ao analisar o FUNDEF, conclui que, conforme as determinações dos organismos internacionais de focalização no ensino fundamental, este fundo de financiamento “praticamente não trouxe recursos novos para o sistema educacional brasileiro como um todo, pois apenas redistribuiu, em âmbito estadual, os recursos existentes” (DAVIES, 2008, p.25). 4 Segundo Davies (2008), o fundo DRU “desvinculação das receitas da união”, que já recebeu diversas denominações, subtraiu bilhões (10 bilhões por ano) da educação pela desvinculação de 20% da receita de alguns impostos e também do salário-educação. A consequência é que o Governo Federal só foi obrigado a aplicar 14,4% da receita de impostos em MDE (20% de 18%=3,6%). Contudo, através da aprovação da PEC 96A/03 em outubro de 2009, essa “manobra” foi paulatinamente diminuída até o fim da sua incidência sobre a educação em 2011. 37 No que se refere a “maquiagem” promovida pela União ao contrariar os discursos oficial de novos recursos para a educação, Adrião; Oliveira (2007, p.111- 112) afirma: [...] os recursos utilizados para “complementar” o per capita mínimo de cada estado têm-se originado de uma fonte que, obrigatoriamente já seria aplicada nessa etapa da educação básica. Ou seja, o governo federal não investe recursos orçamentários, “desembarcando” do financiamento do ensino fundamental. Assim, o prodígio das iniciativas políticas tomadas em 1996 consiste em o governo federal desobrigar-se de gastar com o ensino fundamental, aumentar a responsabilidade dos demais entes federados e, concomitantemente, conseguir passar-se por um governo que priorizava essa etapa de ensino. Em relação ao desrespeito, pelo Governo Federal, da EC nº14/1996 quanto ao estabelecimento do valor mínimo por aluno, isto é, um padrão mínimo de qualidade do ensino, já evidenciado por Arelaro (1999) e Pinto (2002) no governo FHC, continuou em pauta nos dois governos de Lula, e ainda tenta-se aprovar em 2016 o Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi) no segundo mandato de Dilma Rousseff. Assim afirma Ximenes (2009), “durante o primeiro mandato do governo Lula também ocorreu desrespeito da União em relação ao valor aluno ano e em relação à complementação do Fundef” (2009), como mostra os dados do quadro 4. 38 Quadro 4 – Valor aluno-ano e complementação da União ao Fundef – 1997 a 2006 Governo Ano Valor aluno-ano decretado Valor aluno- legal Complementação da União (valor R$ em milhões) Complementação legal (valor R$ em milhões) Nº de estados atendidos FHC 1997 300,00 300,00 59.218.680 (PA) 1 1998 315,00 418,56 486.656.300 1.971.322.800 (PA, BA, CE, PI, PE, MA) 6 1999 315,00 418,56 579.989.900 1.852.827.000 (PA, BA, CE, PI, PE, MA, AL, PB) 8 2000 333,00 455,23 485.455.000 1.988.498.000 (PA, BA, CE, MA, PI) 5 2001 363,00 522,13 391.558.200 2.310.316.600 (PA, BA, MA, PI) 4 2002 418,00 613,67 320.500.000 2.841.170.000 (PA, BA, MA, PI) 4 LULA 2003 434,71 710,75 362.100.000 4.362.730.000 (PA, BA, MA, BI) 4 2004* 537,71 864,00 485.000.000 5.043.887.900 (PA, BA, MA, PI, AL, CE) 6 2005* 627,26 954,42 395.300.000 5.017.037.700 (PA, MA, PI, AL) 4 2006* 682,00 1.200,00 369.100.000 5.141.800,380 (PA, MA) 2 Total -- -- 3.934.877.180 -- Fonte: Tabela originalmente publicada em Ednir e Bassi (2009). Adaptações feitas pelo autor da tese com informações complementares obtidas por meio do Estudo Técnico Nº 39 07/2007 (www.camara.gov.br), e pelo site do MEC (www.mec.gov.br), acessado em 14/09/2006. Nota: *valores estimados pelo MEC e SNT. Como demonstra os dados da Tabela 4, no decorrer dos governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e o primeiro mandato do governo Lula, o sistema educacional continuou a ser o foco dos investimentos somente nos discursos oficiais. A União, durante o período de operacionalização do FUNDEF, sustentou o valor-aluno-ano sempre abaixo do que previa o seu valor determinado em lei, conforme a sua função supletiva e redistributiva (Lei 211 da CF/1988), por meio da complementação financeira aos estados que não alcançassem o valor mínimo nacional. O governo federal cortou gradativamente o valor de sua complementação aos fundos dos estados, e dessa forma deixou de fornecer o complemento a alguns estados, dado quem 2006 somente o Maranhão e Pará ainda eram beneficiados. No entendimento de Daniel Vazquez (2007), essa artimanha dos governos federais prejudicou a devida alocação de recursos federais para o fundo de financiamento, visto que o valor aluno/ano maior causaria o aumento do valor destinado aos estados. Nesse ponto, conforme o autor, “o FUNDEF é um caso exemplar para compreender as restrições impostas pela política econômica vigente à eficácia dos programas sociais”, uma vez que o definidor dos limites impostos pelo financiamento é o próprio governo federal por meio do MEC (VAZQUEZ, 2007, p. 272). Independentemente das pautas sociais para que a legislação educacional (CF/1988, art. 211, § 1º-, na LDB – BRASIL, 1996a, art. 4º, inciso IX, art. 74 -, na Lei do FUNDEF – Brasil, 1996b; art.13-, PNE – BRASIL, 2001, PNE – BRASIL, 2014), obrigue os estados, municípios, união e o distrito federal a estabelecer um padrão mínimo de qualidade, essa discussão não obteve êxito em medidas institucionais e o custo aluno-ano utilizado foi resultante da partilha dos recursos já alocados anteriormente entre as matrículas computadas pelo censo escolar, além de sofrer perdas nos valores em vista de se cumprir as metas de superávit fiscal em grande parte pela recessão econômica (ARAÚJO, 2009). Em suma, Araújo (2007), ao pesquisar o período de financiamento do FUNDEF, ressalta os cinco pontos negativos quanto ao seu impacto na educação: A primeira é o seu caráter de focalização no ensino fundamental, afetando diretamente a capacidade dos entes federados em prover o direito à educação nos demais níveis e modalidades, com destaque 40 para os efeitos perversos no atendimento das crianças de zero a seis anos de idade, seja pela baixa cobertura escolar, seja pela precarização do modelo de atendimento, induzindo a proliferação de uma imensa rede de escolas infantis comunitárias e filantrópicas. A segunda diz respeito à manutenção das desigualdades regionais. Foram constituídos 27 fundos estaduais, cada um tendo por base para a repartição os recursos resultantes de impostos. Como o desenvolvimento econômico, fator determinante para o perfil das receitas, é desigual, os fundos reproduzem as desigualdades regionais pré-existentes. Em terceiro lugar, com a implantação do Fundef o país viveu uma enorme disputa entre os governos estaduais e municipais por alunos do ensino fundamental. Este modelo tornou-se um poderoso instrumento indutor do processo de descentralização via municipalização do ensino. Em muitos estados foram alcançados altos índices de repasse das matrículas do ensino fundamental para esfera municipal. Em quarto, houve um sucessivo descumprimento pela União das regras estabelecidas para a sua participação no fundo. Durante todos os anos da vigência do FUNDEF o valor decretado com o custo- aluno nacional sempre esteve em desacordo com o escrito na legislação, causando enormes prejuízos para estados e municípios e tornando a participação financeira da União irrelevante no montante de recursos aplicados no fundo, nunca tendo passado de 3%. Isso nos leva a afirmar a quinta deficiência do FUNDEF, que é justamente não agregar recursos novos para o setor educacional, constituindo-se numa ferramenta de alocação diferente dos recursos existentes (ARAÚJO, 2007, p. 78, 79). Partes dessas carências pontuadas pelo autor podem ser diagnosticadas como variáveis explicativas para o cotidiano da educação brasileira, quando examinamos os dados relativos ao investimento do PIB (produto interno bruto) em educação no Brasil, conforme o quadro 5. Quadro 5 – Brasil: investimento direto em educação em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) – 1997 a 2012. ANOS BRASIL 1 99 7 1 99 8 1 99 9 2 00 0 2 00 1 2 00 2 2 00 3 2 00 4 2 00 5 2 00 6 2 00 7 2 00 8 2 00 9 2 01 0 2 01 1 2 01 2 % 3,6 4,1 4,1 4,6 4,7 4,7 4,6 4,5 4,5 4,9 5,1 5,3 5,6 5,6 5,8 6,0 Governo 1º FHC 2º FHC 1º LULA 2º LULA 1ºDILMA Fundos FUNDEF FUNDEB Fonte: INEP/MEC (1997 a 2012). Notas: 1 - Utilizaram-se os seguintes grupos de Natureza de Despesa: Pessoal Ativo e Encargos Sociais (inclusive, a estimativa para complemento da aposentadoria futura do pessoal ativo), outras Despesas Correntes, Investimentos e Inversões Financeiras; 2 - Estão computados nos cálculos os recursos para bolsa de estudo, financiamento estudantil e a modalidade de aplicação: Transferências 41 Correntes e de Capital ao Setor Privado; 3 - Não se incluem nestas informações as seguintes despesas: aposentadorias e reformas, pensões, juros e encargos da dívida, e amortizações da dívida da área educacional; 4 - Os investimentos em Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos e Educação Indígena foram distribuídos na Educação Infantil, no Ensino Fundamental anos iniciais e anos finais e no Ensino Médio, dependendo do nível de ensino ao qual fazem referência. No Ensino Médio estão computados os valores da Educação Profissional (concomitante, subsequente e integrado); 5 - A Educação Superior corresponde aos cursos superiores em Tecnologia, demais cursos de Graduação (Presencial e a distância) (exceto cursos sequenciais) e cursos de pós- graduação Stricto Sensu - Mestrado, Mestrado Profissional e Doutorado (excetuando-se as especializações Lato Sensu); 6 - Estes dados referem-se aos investimentos em educação consolidados do Governo Federal, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios; 7 - Para os anos de 2000 a 2003, estão contabilizados na área educacional, os valores despendidos pelo Governo Federal para o Programa Bolsa-Escola; 8 - Nos dados enviados para a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) nos anos anteriores a 2004, não estão alocados os valores do complemento para a aposentadoria futura do pessoal ativo; 9 - Entre os anos de 2000 e 2005: para os dados estaduais, foi utilizada como fonte de informações, um trabalho técnico realizado pelo Inep diretamente dos balanços financeiros de cada estado; para os dados municipais do mesmo período, utilizou-se uma metodologia baseada no percentual mínimo de aplicação de cada município, definido pela legislação vigente; 10 - A partir de 2006, utilizaram-se como fontes de dados estaduais e municipais, o Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Educação - Siope -, administrado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE; 11 - Os dados da União foram coletados do Sistema Integrado de Administração Financeira - Siafi/STN - para todos os anos; 12 - Para o cálculo dos valores de Investimentos Públicos em Educação, utilizaram-se as seguintes fontes de dados primários: - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - Inep/MEC; - Secretaria do Tesouro Nacional (STN); - FNDE; - Balanço Geral dos Estados e do Distrito Federal; - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes); - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea); - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); - Caixa Econômica Federal (CEF); - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); 13 - Os indicadores constantes nessa tabela foram atualizados em 22 de junho de 2015, em virtude da atualização dos valores do Produto Interno Bruto de 2000 a 2013 feita pelo IBGE em março de 2015. Ao focar o período efetivo de 1998 do FUNDEF que encerrou em 2006, de fato em grande parte deste período que abarca os mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002), nota-se uma estagnação dos gastos e investimentos no setor educacional baseado no PIB da maior parte do período, como mostra o gráfico 1. Gráfico 1 – Investimento direto em educação nas três esferas de governo. 42 Fonte: Dados do INEP/MEC e gráfico do autor. Ao analisar os números elencados no gráfico, constata-se tanto na Tabela 5 quanto no Gráfico 1 o menor investimento/gasto em relação ao PIB (3,6), o maior (6,0) e a amplitude de variação (não significa um crescimento) de apenas 2,4%. Entretanto, olhando o período de tempo, o período de 15 anos pouco acrescentou em investimentos diretos em educação provindos do PIB. Olhando atentamente os dados, constata-se que durante 6 anos, o valor dos investimentos/gastos em educação em relação ao PIB diminuiu ou estagnou próximo ao valor de 4,6%. A análise estatística das medidas de tendência central, na qual média, moda e mediana, revelam o investimento no sistema educacional sobre o PIB ficaram focalizados em média e mediana de 4,5%. Estes números, em conformidade com os estudiosos da área, mostram que FUNDEF não trouxe novos recursos para a educação, o fundo apenas redistribuiu os já incorporados segundo estipula a lógica neoliberal de racionalidade dos gastos públicos na educação. No que se relaciona aos investimentos em educação em relação ao PIB, Ramos (2003) enfoca para o ponto em que levando em conta o quanto se pode estabelecer comparações internacionais e da arbitrariedade na delimitação de um percentual a ser investido, o investimento de uma receita de 7% do PIB (6% real, conforme os dados do governo elaborado pelo autor) na educação não atende a real necessidade de um país em desenvolvimento, que além de necessitar se equiparar 3.6 4.1 4.1 4.6 4.7 4.7 4.6 4.5 4.5 4.9 5.1 5.3 5.9 5.6 5.8[VALOR],0 0 1 2 3 4 5 6 7 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Investimento direito em educação em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) – 1997 a 2012. % 43 ao alto investimento feito pelos países ricos necessita também criar uma estrutura mais sólida no sistema educacional. Castro (2007), afirma que os gastos públicos em educação com base no PIB durante os anos 1995 a 2005 não priorizaram as políticas educacionais no período desses mandatos. Nota-se isso no Gráfico 1 apresentado, verifica-se a análise sobre os dados do período do FUNDEF. Portanto, não houve de fato uma prioridade macroeconômica concedida às políticas educacionais pelos governos no período; ocorreu apenas a manutenção do status quo de gasto da política educacional. Cabe salientar que se isso tivesse ocorrido com um PIB em forte crescimento, não seria de todo mal, pois os gastos educacionais poderiam ascender acima do aumento da matrícula, o que poderia representar uma possibilidade de ampliação de gastos relativos e de melhoria da qualidade da educação. Entretanto, não foi isso que ocorreu no Brasil, pois foi um momento de pífio crescimento do PIB, além de ser bastante errático (CASTRO, 2007, p. 868). O primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva (Lula), 2003 a 2006, manteve os investimentos e gastos na educação em relação ao PIB em 4,7%. Em relação ao governo FHC, houve um aumento de apenas no ano 2006 em 4,9% e outros menores fatias de aumentos consecutivos nos dois primeiros anos de seu segundo mandato, ou seja, 5,1% em 2007 e 5,3 em 2008, segundo o relatório feito pelo INEP (EDNIR; BASSI, 2009). Com a instituição do FUNDEB no ano de 2007, renovaram-se as esperanças de se expandir os investimentos em educação. Entretanto, conforme Davies (2008), o FUNDEB ainda que tenha modificações substancias em relação a função da União no financiamento da educação básica, mantém à razão da lógica financeira. É um mecanismo com traços neoliberais, pois propõe basicamente uma redistribuição entre o governo estadual e as prefeituras, de uma parte significativa (20%) dos recursos já vinculados constitucionalmente à educação, com base nos critérios de número e tipo de matrículas na educação básica, com pouco acréscimo de recursos novos (a complementação federal), equivalente a 5% do total da receita do FUNDEB em 2007. Em outras palavras, o FUNDEB é mais uma proposta de racionalização dos gastos públicos segundo uma lógica quantativista e se baseia no pressuposto de que os recursos são suficientes, porém mal distribuídos entre os governos (DAVIES, 2008, p.9). Os recursos do FUNDEB são originários dos mesmos impostos que formavam o FUNDEF mais o ITR, O ITCM e o IPVA (BRASIL, Lei 11.494/2007, art. 44 3º, incisos I a IX §§ 1º e 2º). Sua implantação foi em escala gradativa, chegando ao percentual final de 20% dos impostos5. Outrossim, os recursos deste fundo contam desde o início com a complementação da União e com os fundos do rendimento financeiro advindos com a receita do fundo, no caso onde os Estado não atinjam o mínimo percentual nacional (BRASIL, Lei 11.494/2007, art. 3º e 4º). A crítica central ao novo fundo foi a de trazer poucos recursos novos para o sistema educacional brasileiro, visto que apesar da expansão em número de alunos de outras etapas e modalidades de ensino da educação básica este não trouxe fundos significativos para atender a esta demanda com qualidade. Segundo Saviani (2008), mesmo que o fundo tenha arrecadado mais, com a elevação de R$ 35 bilhões inicialmente, para R$ 48 bilhões em 2008, mostrando um avanço de 36% na renda, os números dos alunos atendidos pelo FUNDEB aumentaram em 56,6%, isto é, ocorreu financeiramente uma diminuição dos investimentos no sistema educacional. Conforme Adrião e Oliveira (2007): Ainda que represente um ganho em relação à situação anterior, uma vez que prevê a distribuição de recursos para toda a educação básica, o Fundeb equaciona de maneira muito limitada dois outros problemas importantes. De um lado, o do aumento do gasto total em educação básica no país, e de outro a ação mais decidida da União na redução da desigualdade entre os estados. Assim sendo, ainda que distribua melhor os recursos para a educação básica, permanece em dívida com dois grandes problemas: o do montante a ser investido em educação pela União e sua ação mais decidida na redução da desigualdade entre os entes federados. No entendimento de Davies (2008), o FUNDEB não é capaz de solucionar todos os problemas contidos no FUNDEF pelos seguintes pontos: 1 – Angariou poucos recursos para o sistema educacional nacional; 2 – Delimita um padrão de qualidade vaga e contraditório; 3 – Estabelece uma complementação da União muito tímida; 4 – Beneficia creches, pré-escolas e instituições de educação especial privadas; 5 – Os 60% do FUNDEB não propiciam a real valorização dos profissionais do magistério6. Segundo este autor a complementação da União representa de fato um recurso novo para o fundo, mesmo que único e com capacidade financeira limitada, dado a fonte deste (2008, p.38). Entretanto, os números a respeito da 5 Ver quadro 1. 6 As discussões acerca da “valorização dos profissionais da educação” serão tratadas no capítulo II. 45 complementação financeira da União ao FUNDEB mostram um funcionamento diferenciado em relação ao FUNDEF. Quadro 6 – Valor da complementação da União ao FUNDEB – 2007 a 2009 Governo Ano Complementação da União (Valor R$ em milhões) Nº de estados atendidos Lula 2007 2.000.000.000 (AL, BA, CE, MA, PA, PB, PE e PI) 08 2008 3.174.300.000 (AL, AM, BA, CE, MA, PA, PB, PE e PI) 09 2009 5.070.150.000,00 (AL, AM, BA, CE, MA, PA, PB, PE e PI) 09 Dilma 2013 9.271.718.804,91 (AL, AM, BA, CE, MA, PA, PB, PE, PI, RN) 10 2014 10.859.445.899,83 (AL, AM, BA, CE, MA, PA, PB, PE, PI, RN) 10 Fonte: FNDE (2015). Contrariamente ao funcionamento do FUNDEF, onde a União diminuiu o valor de sua complementação e assim o número de entes federados contemplados, o primeiro triênio anual do FUNDEB mostrou-se uma lógica inversa. De 2007 a 2009 o governo federal expandiu em 153,5% os recursos destinados a complementação do fundo e elevou dessa forma os estados atendidos de 08 para 09. Mesmo levando em conta os avanços de um fundo em relação ao outro nos primeiros anos de funcionamento, Saviani (2008), aponta que a aglutinação de “novos” recursos por meio da complementação da União durante os três primeiros anos de funcionamento do FUNDEB tem acontecido por montantes proporcionalmente menores à quantidade de incorporação das matrículas da educação básica. Sua instituição gradativa seja para o aumento da subvinculação dos recursos, seja para a incorporação de novas matrículas das etapas e modalidades que antes não eram engendradas pelo FUNDEF, recaem sobre o papel de complementação da União. Além do mais, o salário educação, emenda constitucional nº53/2006 modificou o art. 212 da Constituição Federal, possibilitando que seus recursos de alíquota 2,5%, sejam utilizados em toda a educação básica, ao contrário do que 46 acontecia com o outro fundo. Contudo, segundo destaca Ximenes (2009), aumentou-se a rede da contribuição sem a expansão da alíquota de recursos da mesma e, “caso não entre dinheiro novo na conta da referida contribuição, se repetirá a conhecida política de ampliação de demanda sem acréscimos de recursos” (XIMENES, 2009, p.13). Davies (2008), em sua tese defendeu que este fundo traz poucos recursos para a educação, e essa afirmativa se sustenta pelo fato de o FUNDEB apenas redistribuir 20% de maior parte dos recursos já destinados à educação entre os entes estaduais e municipais, e estes sobre o número de matrículas dentro da atuação dos governos e sua obrigação constitucional com o sistema de educação básica (Lei 11.494, 2007, art. 8º). O FUNDEB também deixou a desejar em relação ao padrão mínimo de qualidade, dado o caráter vago e a contrariedade da lei, pois apenas fixou quantitativamente os valores por aluno, mas não esclareceu onde deveria se hastear a proposta de custo-aluno-qualidade de cada nível e modalidade da educação básica (BRASIL, Lei 11.494, 2007, art. 10 §§ 1º e 2º; art.46). Conforme Davies (2008), a formula utilizada para o cálculo do valor anual mínimo por aluno, apesar de sugerir a ideia de custos diferenciados para os diversos níveis e modalidades de ensino, não é um critério pedagógico, mas sim contábil. 1.2.1 Custo aluno qualidade inicial (CAQI) e custo aluno qualidade (CAQ). Dentro da compreensão estabelecida nesse texto, hasteados no arcabouço legal e na literatura sobre o financiamento da educação no Brasil, percebe-se a lógica racional financeira ditando a lógica educacional e social usada pelos governos, sobretudo, a partir do processo de reforma gerencial do Estado na década de 1990. Essa reforma é um pilar para o entendimento dos problemas educacionais e estabelecimento dos fundos FUNDEF e FUNDEB, o último ainda em funcionamento como a principal ferramenta de financiamento da educação do país. O Estado em relação ao financiamento e a destinação dos recursos necessários ao sistema educacional tem se amparado em balizas mínimas, ou seja, segue-se a implantação política e administrativa da “desresponsabilização” pela educação. Uma prova disso é a estrutura de financiamento que ordena os fundos segundo uma distribuição de recursos que não atende as reais necessidades dos 47 alunos, dado que nunca foi formulado a partir desse pressuposto. Embora, tanto o FUNDEF quanto o FUNDEB tenham avançados na política de financiamento, a União como a maior arrecadadora de recursos continua a se eximir de um investimento qualitativo em educação, mantendo a lógica iniciada pelo FUNDEF a qual mantém o sistema educacional distante do mínimo aceitável para alavancar mudanças substanciais (ARELARO, 2004). A racionalidade financeira sugerida por organismos internacionais de financiamento, com