A HISTÓRIA DA ATIVIDADE MUSICAL NA IGREJA PRESBITERIANA UNIDA DE SÃO PAULO UMA FISIONOMIA POSSÍVEL Dissertação de Mestrado Orientadora: Professora, Livre-Docente, Orientando: Samuel Moraes Kerr Dirce Tereza Ceribelli Instituto de Artes da UNESP São Paulo 2000 II “Para louvor do nome do Altíssimo e deleite dos apreciadores da boa música, o Côro desta Igreja tomou parte em todos os cultos dominicais e em outros como o do aniversário da Igreja e do Natal, sempre com muita unção e elevação espiritual, além da execução plenamente satisfatória e agradável para todos os ouvintes. Visitou várias vezes cidades visinhas, tomando parte em trabalhos de evangelização. Seu distinto regente é o Prof. Péricles Morato Barbosa e o seu muito competente organista o prof. William Sunderland Cook.” Anuário da Igreja Presbiteriana Unida de São Paulo, 1948. Assinado pelo secretário do Conselho Ataliba Lara e pelo pastor da Igreja Rev. José Borges dos Santos Jr. “Foi solenemente empossado o novo organista da Igreja, o jovem Samuel Kerr. Durante o culto recebeu a solene investidura de Organista Emérito o Prof. William Sunderland Cook, a quem foi entregue o respectivo diploma.” Boletim 1479 do dia 13 de novembro de 1955. III A HISTÓRIA DA ATIVIDADE MUSICAL NA IGREJA PRESBITERIANA UNIDA DE SÃO PAULO UMA FISIONOMIA POSSÍVEL “Saudamos êsse esfôrço de pequeninos e grandes, dêsse labor e dedicação, cuja história deve um dia vir a público.” Isaac Nicolau Salum no artigo “Orfeões Evangélicos” publicado no n.º 48 de Cristianismo em junho de 1953. IV Índice/Diagrama Os Primeiros Procedimentos. As Primeiras Emoções. VI O Relato de Isaura 1 A Torre do Farol, ou a Igreja do Farol, ou os Sinos Silenciosos 1 Para aqueles que não conhecem a Igreja Presbiteriana 3 Dois Hinos soam em endereços históricos e em um momento histórico 6 Um Re-forço para o Coro 7 A história do menino Péricles 8 Reverendo Mattathias, ou O Fundador do Coro da Igreja Unida 9 Alguns trechos de um discurso “direto” do Rev. Mattathias 12 A Família do Rev. Zacharias de Miranda em São Paulo 13 As lembranças de D. Alice Schlittler 16 Uma pausa para falar da Rua dos Bambus 21 Natais na Igreja Unida 22 A Crônica de Moelmann 24 Philopea e Ebenezer 27 O desenvolvimento de canto de hymnos é um dos mais importantes... 30 À maneira de um roteiro cinematográfico, ou de um Vídeo Clip? 32 A história do Dr. Ruben 33 O Harmônio Hinkel 34 Zoraide Mesquita 36 O Grande Coral da 2ª Convenção das Escolas Dominicais 38 O quadro com o número dos hinos 42 The Old Hundredth 44 A reforma da galeria do Coro 45 O Órgão Moeller Opus 5812, ou um órgão de tubos procura uma nova casa 46 A chegada do Órgão Hammond 49 A primeira apresentação do “Aleluia”, ou a história da Ruth 52 Os coros do Oratório “O Messias” 53 Pequenas festas e concertos 56 Mylnen e sua história 57 A previsão do Silas 59 “Uma história sem importância” 61 “Eu ouvia no rádio a mesma voz que ouvia na Igreja” 61 V Quartetos vocais 63 “O Ampliador de Voz” 64 Amplia-se o Serviço de Som 66 Um registro forte na memória do autor/pesquisador 67 Um trio iconoclasta..., ou A Cantoria Ars Sacra 67 Uma história contada pela Dorotéa dos tempos de menina... 69 “Era meu desejo comprar um piano” 70 “Eu venho aqui na Igreja por causa do Coral” 72 Um hinário centenário 74 A convergência do modo de ser dos solistas vocais (as vozes masculinas) 75 A convergência do modo de ser dos solistas vocais (as vozes femininas) 78 Alberto Corazza 86 Coros Infantis na década de cinqüenta, ou os antecedentes de “Cantores do Rei” 87 Um testemunho pessoal acerca do valor da Educação Musical para as crianças... 92 À respeito de Nilce Borges do Val Galante 94 “Parabéns a você” 96 Coro da UMP 97 Uma Galeria de Violinistas 100 Regente de Plantão 102 O Concurso Schwartzmann, ou as irmãs Selma e Sônia Asprino 105 A pesquisa não terminou ainda 108 Quem sabe, os textos, a seguir, poderão funcionar como novos fragmentos... 111 Uma carta 112 Circular 113 Poema 114 Directriz a seguir 115 Boletim da APO 116 Nota de serviço 118 Annual Report 119 Uma foto 123 Entrevista 124 Placa e foto 126 Propostas do autor já publicadas ou televisionadas, poderão ajudar... 127 Conteúdo do CD 137 Bibliografia 139 A quem dedicar, a quem agradecer, ao final destas narrativas? 147 VI Os Primeiros Procedimentos As Primeiras Emoções Quando pensei em descrever a fisionomia da história da atividade musical na Igreja Unida e, já tendo algum material em mãos, vieram-me lembranças dos tempos em que freqüentava a Cinemateca, da rua Sete de abril, na década de 1950. Eram muitos os filmes ainda mudos, sempre separados por verbetes que localizavam períodos, explicando a narrativa muda. Os verbetes me pareciam títulos da narrativa seguinte. E, de narrativas em narrativas, sempre intituladas, formava-se a história maior que era o filme. Poderia me valer deste recurso para contar esta história? Será que poderia pedir emprestado ao cinema mudo, ao Charles Chaplin e a outros cineastas o sistema de narrativas, entremeadas de verbetes, compondo uma história maior ? Será que as Teorias das Linguagens poderiam me fornecer um recurso paralelo em que me apoiar? Realmente, na época do “pensamento estruturalista” que, praticamente, terminou na década de 1970, alguns teóricos se dedicavam a estudar as estruturas das narrativas, em busca de suas unidades menores, as seqüências e, a partir daí, dos desenhos abstratos dos seus planos de significação. Entre eles, Tzvetan Todorov e Roland Barthes. O primeiro sempre transforma a narrativa maior em diversas narrativas com lógicas de montagem diferentes. Como vemos, o objetivo era o de criar modelos, para através deles “desmontar e remontar” narrativas já feitas e lhes desvendar o funcionamento. Pensei ao contrário: que tal construir pequenas narrativas com o pouco material que estava aparecendo e deixar que o conjunto delas apresentasse a fisionomia procurada, fosse por coordenação, fosse por subordinação? Foi, então, que comecei a escrevê-las, sem me preocupar com os pontos de vista dos narradores, com os recursos expressivos por eles usados: narrativos, descritivos e dissertativos, ou mesmo com os tipos de discursos que ia elaborando: discursos avaliativos, preditivos, etc. ... Tentei ocupar o tanto quanto possível a posição de um narrador/observador, mas quando o narrador em 1a pessoa aparece, quase virando um narrador/personagem, assim o assumi e o identifiquei através do “entre parêntesis I.” E este narrador, algumas vezes, beira o estilo do narrador onisciente, quando crio imaginações, pensamentos e ações das personagens, através de inferências. A seguir, procurei uma fundamentação antropológica, pois acho que essas teorias sempre podem explicar um pouco do comportamento dos homens. Para tanto acolhi a pesquisa de Lévi – Strauss, demonstrada em o O Pensamento Selvagem. Valeu-me, e bastante, o conhecimento do VII método “bricolagem”, que este autor acredita ser capaz de dar conta de compor fisionomias de sociedades ou grupos desconhecidos. Achei, também, que aqui estava um outro recurso, não mais para análises, mas para criações, como fazem hoje alguns artistas plásticos. E tomei a palavra bricolagem no seu sentido mais imediato, o da pesquisa e montagem de resíduos, indícios, restos e sucatas de códigos verbais, musicais e visuais, registros de memória, marcas de objetos de cultura, vestígios sonoros, pedaços de documentos, fotos não identificadas ...II O objetivo era mesmo o de registrar a memória. E a memória não existe linearmente. Pode-se verificar que o método por mim realizado nesta pesquisa se aproxima das atividades características de um pesquisador / “bricoleur”: Leitura de boletins, consultas aos livros de atas, idas aos arquivos, buscas em listas telefônicas, conversas com minha mãe, perguntas e mais perguntas, viagens de carro, de ônibus, entrevistas com personagens dessa história, investigações, buscas por referências, costura de pedaços de informação, revelações fotográficas, recuperação de partituras musicais, identificação de figuras em fotos, pontuação em mapas da cidade, delírios da memória, recuperando arquiteturas que não existem mais, audição de músicas que não soam mais, a não ser pelo entendimento possível e constantes espantos frente aos descasos para com a Memória!...III E eis que percebo, durante o andamento da pesquisa que, por detrás da minha busca, ia nascendo, quase que de repente, uma história maior, a história das mudanças ou variações dos perfis da Cidade de São Paulo, assim como se fosse um entorno para a fisionomia que estava procurando. E, neste, comecei a perceber alguns índices, cujos referentes tentarei encontrar. Esta situação de uma narrativa encaixada em outra, como se fossem bonecas “berioskas”, já se pode observar na capa, através da foto, que aponta a Igreja Presbiteriana Unida em 1922. Naquele tempo, a torre da Igreja mostrava seu relevo junto às arquiteturas ao redor. Na foto à pág. 29, o sol ilumina os vitrais livremente. Hoje, envolvida pelos prédios, a Igreja e seus vitrais passam a ser pano de fundo para os ruídos da cidade. Não pretendo, porém, escrever uma história da grande São Paulo, mas apenas captá-la através de uma angulação, seja sob o ponto de vista arquitetônico, em si mesmo, seja sob o ponto de vista da Significação, desde que a significação de uma cidade só vai acontecendo de acordo com os modos como os cidadãos vão se movimentando através dela e, assim, determinando para seus espaços “funções de uso”. E, no caso, somente quando este “enfoque” estiver apontando ou envolvendo lugares, onde, para onde ou por onde as personagens dos fatos narrados estejam se movimentando. Em um terceiro momento, pensei que, como pesquisador, deveria também procurar uma fundamentação histórica. Mas logo percebi que não tenho acompanhado as últimas discussões, que sei, às vezes, acaloradas, dos grupos de historiadores. Não tinha condição de por mim mesmo elaborar uma fundamentação. Mas se sabia o que não sabia, sabia, e muito bem, o que não queria: “o princípio VIII da causalidade, a busca da objetividade, a noção de progresso e outras tantas preocupações da historiografia positivistaIV.” “A História mostra que a realidade social é muito diversa. O curso do desenvolvimento histórico nunca é traçado por diretrizes teoréticas, ainda que excelentes, embora se conceda que estes esquemas possam exercer alguma influência, a par da influência de muitos fatores menos racionais – ou francamente irracionais”, já dizia Karl Raimund Popper, em 1902, em A Miséria do Historicismo. Sendo assim, preferi me apoiar em 4 afirmaçõesV a respeito da história: uma, a de um filósofo, outra, a de um pensador da estética, outra, a de um poeta, e, finalmente, a de um literato-historiador: “... O conhecimento do passado em todos os tempos, só é desejável quando está a serviço do presente, quando ele desenraíza os germes fecundos do futuro.” Friedrich Nietzsche “Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo como ele de fato foi. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo ... O perigo ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem ... Em cada época é preciso arrancar a tradição ao conformismo, que quer apoderar-se dela.” Walter Benjamin “... Mas a diferença entre o presente e o passado é que o presente consciente constitui de certo modo uma consciência do passado, num sentido e numa extensão que a consciência que o passado tem de si mesmo não pode revelar ”. T. S. Elliot “... A trivialidade do passado é feita de pequenas particularidades insignificantes que, ao se multiplicarem, acabam por compor um quadro bem inesperado.” Paul Veyne (E, sendo assim, esta “fisionomia” tende a ser “sincrônica”, ou seja, tende a ser uma construção que, partindo do momento atual, vivido pela Igreja, permitiu-me reler o passado, colhendo índices e seus referentes através de comparações e de seus desvendamentos... Mas, por detrás da “sincronia”, no ato experencial da leitura, o leitor pode recompor a diacronia, conferindo datas ou documentos ou variações arquitetônicas... E nos fica claro, também, que, apesar da percepção constante de recorrências entre fatos e acontecimentos, o meu objetivo não foi o de usar os dados apreendidos para realizar uma escritura poética, mesmo porque a linguagem poética se faz a partir da absolutização dessas recorrências, seja em nível do semântico, do sintático, ou das sonoridades.VI IX Aqui, a “História” procurada permanecerá como um anseio prioritário, apesar dessa evidente tendência para o poético, para o artístico, portanto. Agora, assumindo mais claramente a função de narrador em 1a pessoa e personagem, quero dizer que este modo de pesquisar assim foi escolhido porque corresponde, também, ao meu modo de ser como músico, como regente e como animador de movimentos corais. Meus trabalhos com o Canto Coral sempre se caracterizaram pela inter-relação com outros tipos de linguagem, assim como acontece na vida, na percepção cotidiana do mundo que nos circunda e no estabelecimento de novos pontos de vista e de escuta, na busca de uma perspectiva renovada para o canto em conjunto e para a atividade do músico. Na montagem dos meus espetáculos corais e para o embasamento de oficinas e experimentos corais, tenho recorrido ao que chamo de “partituras de utopia”, através das quais, realizadas ou somente articuladas, a memória das comunidades afloram, trabalhadas a partir de fragmentos e relacionadas com todos os recursos de expressão disponíveis, costurando um novo repertório musical e uma nova maneira velha de cantar em coral. Do fundo de minha memória emocionada deixo emergir, aqui, meus verdadeiros desejos: Ah! Se fosse possível recolher os dados, lembranças, saudades, registros, fatos e muitas histórias de todas as pessoas que se envolveram com a música na Igreja Unida, teríamos uma narrativa do tipo caleidoscópio, multiplicada muitas vezes pelo número de acontecimentos que emocionaram e marcaram a vida de todas elas. Quantas pessoas não ajudariam a recompor esses quase cem anos de atividade musical, contando das ações e emoções de cantores, instrumentistas e regentes que ao som da música descobriram caminhos, determinaram condutas, registraram momentos, influenciaram pessoas outras, enfim, fizeram suas próprias histórias enquanto conduziam a história musical da Igreja, ou eram por ela conduzidos a fazer suas próprias histórias ... Gostaria ainda de, nesse instante, poder me transformar na Sherazade - Shahrazad - do Livro das Mil e Uma Noites. Quando esta se ofereceu ao amor do rei, não pretendia encantá-lo com suas narrativas, apenas para salvar sua vida e o desposar. Não, o seu ideal era maior. Era o de encontrar um modo de impedir que o rei matasse todas as mulheres daquela comunidade e a destruísse, pois só restavam ela e sua irmã. A cada noite que passava, a comunidade ia sendo salva, sua memória recuperada, as mulheres, desaparecidas, revividas nos relatos, os costumes preservados, os adereços e arabescos salvos, todo o repertório da comunidade perpetuado, pois Sherazade a ela pertencia. Conhecia a maldade do rei e conseguiu exorcizá-la, para sempre, oferecendo-lhe a fruição prazerosa desse encaixe de narrativas. Realmente, como disse até agora, as histórias recuperam a memória e podem desnudar e salvar a fisionomia de uma comunidade. No caso de Sherazade, podemos ir mais X longe e interpretar seu gesto como uma metáfora da vida humana, como o fez Tzvetan Todorov, quando analisou o Livro das Mil e Uma Noites. Parafraseando-o: o destino do homem é o de contar histórias, deixar de contar é morrerVII. Mas, é preciso observar que, em As Mil e Uma Noites as situações narradas, são fundamentadas no imaginário da narradora/personagem e, através dela, no Imaginário e na dimensão do “fantástico” das comunidades apontadas, e não na realidade factual, propriamente dita. No caso deste trabalho, através da pesquisa acurada de indícios, procurou-se a demarcação de fatos, que realmente aconteceram, em um momento dado e cujos atores são indivíduos específicos. E estes fatos, se recontados, não serão mais os mesmos, desde que passarão a depender do ponto de vista de um outro narrador. Daí a importância dos textos–documentos, aqui enfatizados, que não funcionam como textos estáticos, mas como verdadeiros “ operadores”, que vão demarcando e localizando as narrativas e outros textos, que vão sendo inseridos, ou por mim apropriados. Justifica-se deste modo o caráter histórico da fisionomia procuradaVIII. E cabe a este pesquisador ir reconstruindo, por detrás da “bricolagem”, tramas inteligíveis, aptas a demostrarem aos leitores o assunto central, assim valorizado. Neste caso, a compreensão da atividade musical na Igreja Presbiteriana Unida de São Paulo. E não nos esqueçamos de que, para a maioria dos historiadores, a grande contribuição da Reforma Religiosa do Século XVI para a civilização ocidental foi a do desenvolvimento e amplificação dos procedimentos musicais. Gostaria, por fim, que esta pequena fisionomia da história da Igreja Unida pudesse estar sempre aberta a novas histórias, novos documentos, novas contribuições. E creio que assim poderá vir a ser ...) “ ... um pensamento é o que é graças somente ao fato de endereçar-se a um pensamento futuro que, em seu valor como pensamento, é idêntico ao primeiro, mas mais desenvolvido. Dessa maneira, a existência do pensamento depende agora do que ele será mais tarde; ele só tem existência potencial, dependendo do pensamento futuro da comunidade.” Assim afirmou Charles Sanders Peirce, filósofo e cientista norte–americano, fundador da SemióticaIX. I Leia-se a respeito da possibilidade de as regras da pontuação serem transformadas em “signos”, ou seja, de adquirirem uma semântica própria: XI ADORNO, Theodor W. – “Signos de pontuación” in Notas de Literatura, 1962 Ediciones Ariel, Barcelona, páginas 115 a 122. II “O têrmo bricolage, assim como bricoler e bricoleur, não encontra correspondente adequado em português. Bricoleur é aquele que trabalha com as próprias mãos, não obedecendo nenhum esquema preliminar, servindo-se não de matérias primas mas de restos de matéria já elaborada e utilizando processos distintos do desenvolvimento tecnológico normal; bricolage, o resultado de sua ação.” Esta é uma interpretação para estes termos, realizada por Bernard Pingaud, a partir, também, do livro O Pensamento Selvagem, no artigo – documento: “Como alguém se torna estruturalista” in Lévi – Strauss – L’Arc Documentos n.° 2 – Editora Documentos Ltda., 1968. III Os documentos formais, escritos, que foram pesquisados são os seguintes: Relatórios Anuais – “Annuários ” – cobrindo o período de 1902 a 1927. Boletins Dominicais, publicados para distribuição a todos os freqüentadores dos serviços religiosos, desde o ano de 1926 até o ano de 1982. Relatórios pastorais do Rever. José Borges dos Santos Júnior de 1948 a 1961. Atas das reuniões do Conselho da Igreja desde o ano de 1900 até 1960. A Mensagem, órgão oficial da Igreja Presbiteriana Unida de São Paulo, cobrindo os anos de 1922 a 1924, do n° 12 ao 34. Revista das Missões Nacionais, órgão oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil, coleção do Arquivo Presbiteriano, exemplares de 1901 a 1921. O Expositor Cristão, órgão oficial da Igreja Metodista do Brasil, coleção do Arquivo Presbiteriano. O Estandarte, órgão oficial da Igreja Presbiteriana Independente. Coleção do Escritório Central da IPI, em São Paulo. Por entre estes documentos, o pesquisador encontrou apenas alguns indícios que apontavam para a atividade musical. Coube-lhe, portanto, procurar, e tão circunstancialmente quanto possível, os referentes destes índices. Quando os documentos valem, por si mesmos, aparecerão como tais, dentro de espaços acinzentados. IV Perrone - Moisés Leyla Altas Literaturas: escolha e valor na obra crítica de escritores modernos, São Paulo, Companhia das Letras, 1998, página 21. V As afirmações, que alicerçaram esta possível visão de história, foram localizadas a partir das seguintes obras: Nietzche, in “De l’utilité et de l’inconvénient des études historiques pour la vie”, Seconde consideration intempestive. Paris, GF, Flammacion, 1988, pág. 103, tradução deLeyla Perrone- Moysés, na obra acima citada, pág. 24. Walter Benjamin, in Obras Escolhidas, trad. Sérgio Paulo Rouanet, São Paulo, Brasiliense, 1985, vol. I, pág. 230. – Citação de Leyla Perrone - Moysés, na obra já citada, pág. 25. T. S. Elliot, in “Tradição e Talento Individual”, Ensaios, Trad. Ivan Junqueira, Art Editora, 1989 pág. 41. Veyne, Paul, in “Rien qu’un récit véridique” Comment on écrit l’histoire. Editions du Seil, pág. 18. XII VI A respeito das definições conceituais e das definições operacionais em torno da linguagem de funcionamento poético, veja-se os seguintes autores: Roman Jakobson – “Dois aspectos da linguagem e dois tipos de afasia”; “A procura da essência da linguagem”; “Lingüística e Poética”, in Lingüística e Comunicação, tradução de Izidoro Bliktein e José Paulo Paes. São Paulo, Editora Cultrix, 9ª edição. Haroldo de Campos: A arte no horizonte do provável. Editora Perspectiva, São Paulo, 1969. Max Bense: Estética de la Informacion. Alberto, Madrid, 1972. Max Bense: Estética. Consideraciones metafísicas sobre lo bello. Nueva Vision, Buenos Aires. VII Leia-se, a respeito, o artigo “Os tradutores do livro das Mil e Uma Noites” in Obras Completas de Jorge Luiz Borges, em traduções que estão sendo feitas por vários tradutores, com assessoria editorial de Jorge Schwartz, primeiro volume, São Paulo: Globo, 1999. As traduções analisadas por Borges são as seguintes: Les Mille et Une Nuits, contes arabes traduits par Galland. Paris, s.d. The Thousand and One Nights, commonly called The Arabian Nights´Entertainments. A new translation from the Arabic, by E. W. Lane. London, 1839. The Book of the Thousand Nights and a Night. A plain and literal tranlation by Richard F. Burton. London (?), s.d. Vols. VI, VII, VIII. The Arabian Nights. A complete (sic) and unabridged selection from the famous literal translation of R. F. Burton. New York, 1932. Le Livres des Milles et Une Nuit. Traduction littérale et complète du texte arabe, par le Dr. J. C. Mardrus. Paris, 1906. Tausend und eine Nacht. Aus dem Arabischen übertragen von Max Henning. Leipzig, 1897. Die Erzählungrn aus den Tausendundein Nächten. Nach dem arabischen Urtex der Calcuttaer Ausgabe von Jahre 1839 übertragem von Enno Littmann. Leipzig, 1928. A estas, tomo a liberdade de acrescentar: Libro de las mil y una noches, tradução diretamente do árabe para o castelhano, realizada por R. Cansinos Assens, Coleção Obras Eternas, assessor Arturo del Hoyo, Aguilar S. A . Ediciones, 1969, Madrid. VIII Leia-se a esse respeito a 1a e a 2a parte da obra Como se escreve a história de Paul Veyne, pois os termos grifados a ela se referem. Esta obra encontra-se traduzida para a língua portuguesa por Alda Baltar e Maria Auxiliadora Kneip, Editora UNB, 4a edição, Brasília, 1998. IX Esse trecho foi traduzido de: Collected Papers of Charles Sanders Peirce, - Harvard University Press, 8 v. – 1931/1958 5. 316. A citação foi feita de modo habitual, pois no caso de Peirce, o primeiro algarismo indica o volume e o segundo, o parágrafo. Este critério continua válido para a nova edição, em 4 volumes duplos, mas não para a edição da obra global, que segue a ordem cronológica e que está sendo editada pela Universidade de Indiana. THE HISTORY OF THE MUSICAL ACTIVITY IN THE UNITED PRESBYTERIAN CHURCH OF SÃO PAULO A POSSIBLE PHYSIOGNOMY Abstract My basic objective was to write a possible history of a community's musical activity: The United Presbyterian Church of Sao Paulo. Under the point of view of the studies with the languages, the History has its equivalent procedures of a Narrative. In a first moment I took a look in the authors that studied the structures of the narratives, among them Svetan Todorov and Roland Barthes. My search was not the one of studying the thought structuralist that, for most of the authors it finished giving results in the decade of 1970. But, I found important one, of the firsts and more varied statements from those thinkers, the one that a great narrative is resulted of a construction of small narratives. To these, Roland Barthes denominated sequences, and it showed that the name of each sequence already predicted the abstract drawing of the plans of the significance of the narrative. Immediately I thought the opposite: what such to build small narratives with the little material that was appearing and to let that the whole think showed the physiognomy, was it for coordination or subordination? I went to review the book O Pensamento Selvagem by Lévi-Strauss, wrote in the same decade. It was worth me, and plenty, the knowledge of the method "bricolage", that this author believes to be capable to give bill of composing physiognomies of societies or ignored groups. I found, also, that here it was another resource, not more for analyses, but for creations, as they make some plastic artists today and, same, some historians. And the historical fundamentals? I didn't know, by myself, how to accomplish it, because I am moved away of the great historical debates. But it was known what I didn't know, knew, and very well, what I didn't want:: the basic concerns and the times, absolutely, of the historiography positivism. I determined, then, to base me in statements, not of consecrated historians. One, of a philosopher - Nietzche, other the one of a thinker of the aesthetics - Benjamin, other the one of a poet - Elliot, and finally, the one of a writer - historian, Paul Veyne. And, then, assuming my narrator position / character, in first person, I decided to let to erupt my true desires. Ah! if it roots possible to pick up the data, memories, longings, registrations, facts and all the people's a lot of histories that wrapped up with the music in the United Church, we would have a narrative of the type kaleidoscope, multiplied a lot of times by the number of events that moved and marked their life of all! I got to envy the narrative talent of Sherazade, but soon after I noticed that, in the Thousand and one Nights the narrated situations are based in the Imaginary of the narrator / character and, through her, in the imaginary fantastic of the pointed communities and not in the reality factual. In the case of this work, starting from the deciphering of indications I tried to demarcate facts, that really happened in a given moment and whose actors were specific individuals. Then the importance of the use of texts / documents, true operators that locate the narratives and other texts, that go being inserted or for me appropriate. Was given to this researcher, therefore, the attempt of going reconstructing, from behind of the “bricolage" intelligible plots capable of they demonstrate the readers the valued subject. In this case, the understanding of the musical activity of the Presbyterian Church United of Sao Paulo and, if possible during your a hundred years of existence. 1 O Relato de Isaura Dona Emma estava grávida da Isaura. Haviam chegado de Jaú, mudando-se para São Paulo, por causa do serviço do marido. 1917. Católica fervorosa, precisava rezar ... precisava de uma Igreja ... um refúgio para proteger-se de um casamento infeliz. Insistiu muito com o marido para ajudá-la a localizar uma Igreja, nessa cidade onde nada conhecia. O marido havia visto uma, perto da casa, e antes de ir jogar “bocha”, no Domingo de manhã, deixou a esposa à porta da Igreja. Era uma igreja bonita, de construção recente. Subiu a escadaria, nem reparou no letreiro em cima do portal de madeira pesada e entrou. Então viu que não era uma igreja católica, mas, fascinada com o som do órgão e do coral, ficou para ouvir. Gostou da música, gostou do sermão, foi muito bem recebida, voltou no Domingo seguinte e nunca mais deixou a Igreja Unida. Nasceu Isaura, que era a segunda filha, e mais duas ainda vieram e cresceram na Igreja, rodeadas do carinho das crianças da Escola Dominical e das senhoras da Sociedade de Senhoras. Muitas lembranças, muitos caminhos, depois que Dona Emma morreu, mas no remoto da memória, a emoção causada pelo som do Coro da Igreja Unida. Esta história foi criada a partir do depoimento de Isaura Macedo, dia 27/09/94. (Logo após a escritura desta história tive a confirmação de sua verossimilhança, através de um telefonema ocasional da irmã de Isaura, Lydia, que até muito gentilmente me cedeu fotos de Emma Cremaschi e de seu marido Santo Cremaschi). A Torre do Farol ou a Igreja do Farol ou Os sinos silenciosos As alunas internas do Mackenzie saiam em grupo, lideradas pela Profª. D. Nicota Calandra, em direção à Igreja Unida, para assistirem ao culto da noite, descendo a pé a Rua D. Veridiana. Era final dos anos 20 e começo dos anos 30. Em meio ao arvoredo do bairro, era possível avistar durante o trajeto, a Torre da Igreja com o seu farol colorido. O Rev. Mattathias gostava de dizer que era a Igreja do Farol. Em cada face do telhado pontiagudo da torre da Igreja Unida havia uma ogiva, com vidro colorido, oito janelinhas 2 redondas, oito cores, iluminadas por um holofote em movimento circular qual carrilhão silencioso, anunciando que o serviço religioso estava para começar. Enquanto o farol estivesse funcionando, as moças sabiam que estavam a tempo, mas que precisavam apressar os passos pois cantavam no coro e tinham que chegar cedo. Quem contava desse trajeto era a Ondina1, lembrando-se dos tempos em que estudava no Colégio Normal do Mackenzie e dos tempos em que havia a “Roda” no Hospital da Santa Casa de Misericórdia2, um dos marcos do caminho. Quem instalou o farol na torre foi Norberto Wey, engenheiro, presbítero e cantor do Coro da Igreja Unida, que teve a seu cargo a parte elétrica do templo da R. Helvetia durante a construção. Era uma instalação que distinguia a Igreja, além da edificação com forma externa de igreja. Desde os tempos do Império que se proibia às igrejas protestantes, acatólicas, de construírem templos com aspecto de templo, assim como o não soar sinos e, desde a Proclamação da República, quando foram liberadas as restrições, era a primeira Igreja Presbiteriana, em São Paulo, orgulhosa do seu templo com torre, só que sem sinos. Era moderna – tinha um farol movido a eletricidade. * “O meu quarto faz frente para a Rua Jaguaribe de sorte que, mesmo da cama, posso avistar os Campos Elyseos, Santa Cecília e aquillo que mais me interessa desses lados: Vê–se perfeitamente a Egreja Unida. Fartei–me de vel–a toda a tarde. Á noite conservei, por algum tempo, abertas as janelas, para ver as luzes do pharol. Como é lindo o brilho daquellas luzes que se vão despejando ao redor! Eu nunca imaginei que fosse assim, tão bonito o brilho d’aquella luz verde, que de momento a momento se precipita dentro do meu quarto como jactos de esperança ...” Carta do diácono3 Pedro França internado na Santa Casa de Misericórdia – Pavilhão Novo – quarto n.º 16, publicada no Boletim4 n.º 14 de 22 de agosto de 1926. 1 Ondina de Moraes Kerr, mãe deste pesquisador 2 A Roda dos Expostos – Um aparelho mecânico formado por um cilindro, fechado por um dos lados, que girava em torno de um eixo e ficava incrustado no muro da Sta. Casa no lado da Rua D. Veridiana. Recolhiam recém-nascidos abandonados, para que fossem cuidados pela Irmandade da Misericórdia de S. P. e funcionou até 1948. (Informações obtidas no Museu da Sta. Casa de Misericórdia de S. P. que ainda conserva no seu acervo essa Roda). 3 Diácono – O diaconato foi instituído no início da Igreja Cristã. Existem, na Igreja Presbiteriana duas classes de oficiais: Presbíteros e Diáconos. Ao diácono compete distribuir as ofertas dos fiéis para fins piedosos e ter sob sua guarda os bens temporais da Igreja. Vide texto “Para aqueles que não conhecem a Igreja Presbiteriana”. 4 Boletim – Publicação dominical, editada pela Igreja desde 1926, inicialmente só com informações, posteriormente com meditações, artigos e ordem litúrgica dos serviços religiosos. É distribuído a todas as pessoas que freqüentam a Igreja. 3 Para aqueles que não conhecem a Igreja Presbiteriana: A Igreja Presbiteriana tem esse nome porque é temporalmente governada pelos presbíteros, palavra que vem do grego e que quer dizer “mais velho”, o ancião, o bispo (como no Novo Testamento). Um Conselho, formado pelo Presbítero Docente, chamado Pastor ou Ministro do Evangelho e os Presbíteros Regentes, chamados Presbíteros , dirige a comunidade dos fiéis, que elege os membros desse conselho em Assembléia , como em um sistema representativo. Os Presbíteros são qualificados pela vida exemplar na comunidade e o Pastor é qualificado por um Curso Superior de Teologia, chamado de Seminário Teológico. Recebe o tratamento de Reverendo e seu nome é indicado pelo Presbitério. Presbitério é a reunião de igrejas em determinada circunscrição. Mais de um Presbitério formam um Sínodo e os Sínodos se reúnem no Supremo Concílio, sempre com representantes eleitos pelos Conselhos das Igrejas. 4 São também oficiais da igreja os Diáconos, os quais administram os bens temporais da Igreja e cuidam da distribuição das ofertas para fins de caridade e de assistência aos necessitados, reconhecidos pela comunidade. Formam a Junta Diaconal. Os fiéis são aceitos como Membros da Igreja, quando fazem Profissão de Fé, depois de examinados pelo Conselho na sua fé em Cristo, e no conhecimento da Bíblia e depois de batizados, se não o foram pelos pais quando crianças. Passam a ser Membros Comungantes e participam da Santa Comunhão, a Ceia do Senhor. O Batismo é por aspersão. A Profissão de Fé acontece, sempre que possível, em presença da Congregação. Congregação pode ter dois significados: um, representando os fiéis no Culto, outro, as comunidades que ainda não têm um governo próprio, filiadas a uma Igreja. “O Culto público é um ato religioso, através do qual o povo de Deus adora o Senhor, entrando em comunhão com ele, fazendo-lhe confissão de pecados e buscando, pela mediação de Jesus Cristo, o perdão, a santificação da vida e o crescimento espiritual. É ocasião oportuna para proclamação da mensagem redentora do Evangelho de Cristo e para doutrinação e congraçamento dos crentes.” (Artigo 7 do Capítulo III dos Princípios de Liturgia do Manual Presbiteriano). Em todos os Cultos há sempre três associações indissociáveis: a Oração, a Leitura Bíblica e o Canto de Hinos. A Igreja Presbiteriana pertence a um grupo da Reforma Protestante do Século XVI, chamado “Igrejas Reformadas”, originário do movimento liderado por João Calvino e firmado, na Escócia, por John Knox, segundo a Confissão de Westmnister, documento definido na Assembléia, realizada na Abadia de Westmnister, em Londres, entre os anos de 1643 e 1649. A Igreja Presbiteriana chega ao Brasil em 1859 com a vinda do missionário norte-americano Ashbel Green Simonton. Na cidade de São Paulo é construído um primeiro templo presbiteriano no ano de 1884, na Rua XXIV de Maio. Em 1900, duas Igrejas Presbiterianas de São Paulo se unem, formando a Igreja Presbiteriana Unida, instalada na Rua dos Bambus n.º 4, hoje Av. Rio Branco. Em 1903, as Igrejas Presbiterianas do Brasil da época, reunidas em São Paulo, sofrem uma grande ruptura que faz surgir “Igreja Presbiteriana” e “Igreja Presbiteriana Independente”. 5 “Depois da Teologia, não existe arte que se possa equiparar à Música, porque somente ela, depois da Teologia, é que consegue uma coisa que no mais só a Teologia proporciona: um coração tranqüilo e alegre”. Martinho Lutero Carta a Ludovico Senfl in Pelo Evangelho de Cristo (selecta de textos do Reformador) R. G. Sul, Concórdia, Sinodal, 1984, pág. 216 6 Dois Hinos soam em endereços históricos e em um momento histórico O VI Sínodo5 da Igreja Presbiteriana, em 1903, acontecia na Igreja Unida, à Rua dos Bambus. Era 31 de julho, bem tarde da noite, o assunto momentoso, a discussão angustiante e um clima de rompimento no ar. A Igreja estava repleta. Crentes de várias igrejas assistiam ao desenrolar dos debates até que diante de impasse criado, o Rev. Eduardo Carlos Pereira desce da tribuna, atravessa o auditório, seguido dos seus partidários e deixa a assembléia em meio a um grande rumor. Saem à rua e sob o comando de “vamos para a 1a Igreja!” seguem em direção a Rua XXIV de Maio. Enquanto caminham pela Rua dos Bambus escutam o povo da igreja cantando: Deus vos guarde pelo seu poder Sempre esteja ao vosso lado Vos dispense o seu cuidado Deus vos guarde pelo seu poder Pelo seu poder e no seu amor Té nos encontrarmos com Jesus; Pelo seu poder e no seu amor Oh! Que Deus vos guarde em sua luz! 5 Em 1903 Sínodo era a reunião maior da Igreja Presbiteriana no Brasil. 7 O Rev. Vicente Themudo Lessa, no seu livro: “Anais da Primeira Igreja”, conta-nos que, ao longe, sobressaía a voz do Rev. Júlio Sanguinetti. O hino era novo entre os presbiterianos, havia sido traduzido em 1901 por Stuart Edmond Mc Nair e ainda não fazia parte do “Salmos e Hinos”. Ao chegarem à 1a Igreja, à Rua XXIV de Maio, vencendo o cansaço do trajeto a pé pela Rua dos Bambus e Rua Ipiranga, cantam: “Um pendão real vos entregou o Rei”, que veio a se tornar o hino oficial da Igreja Presbiteriana Independente6. Ali perto, um pouco adiante, próximo ao Viaduto do Chá, começavam a construir o Teatro Municipal de São Paulo. A Avenida Rio Branco se chamava Rua dos Bambus e a Rua Ipiranga ainda não era avenida. Um Re-forço para o Coro Júlio Sanguinetti foi o último pastor ordenado pela Igreja Presbiteriana antes da Cisão de 1903. Em São Paulo cuidava da igreja dos italianos, congregação da Igreja Unida que veio a se tornar a Igreja Presbiteriana do Brás. 6 Foi nesta noite de 31 de julho de 1903 que a Igreja Presbiteriana do Brasil cindiu-se. E desta cisão foi criada a Igreja Presbiteriana Independente. 8 A Revista das Missões Nacionais, de 25 de setembro de 1907, traz notícias do trabalho missionário do Rev. Júlio na cidade de Tatuí, com uma observação preciosa para a busca deste pesquisador: “A Egreja de Tatuhy recebeu no dia 22 do passado a visita do seu pastor, o Rev. Júlio Sanguinetti, que dirigiu o culto nessa mesma noite. No dia 23, o pastor e vários irmãos que foram reforçar o coro, dirigiram-se para o sítio de Barreira ...” (Como Júlio Sanguinetti, que freqüentava a Igreja Unida, não prescindia da atuação do coro no seu trabalho missionário, a ponto de providenciar reforços, para este, em Tatuí, esta informação se faz extremamente importante, não só na inferência de que na Igreja Unida se praticava o Canto Coral, mas ainda pela falta de notícias de Coro na Igreja Unida, nos primeiros anos, pelo menos até o presente momento da minha pesquisa). A história do menino Péricles Dona Mariquinhas e seu filho entraram na Igreja, lá na Rua dos Bambus, e o coro estava ensaiando sob a regência do Rev. Mattathias. Era o ano de 1914. Haviam chegado a São Paulo, vindo do estado do Espírito Santo e Damaris, a filha mais nova, não tinha ainda um ano de vida e o Péricles, 6. O pai, o Rev. Samuel Barbosa, havia morrido no início do ano anterior. D. Maria Eliza Morato Barbosa, a Dona Mariquinhas, viúva, havia deixado a cidade de São José do Calçado e estava em São Paulo, pretendendo voltar para a sua cidade natal, Botucatu, mas não sem antes visitar o Rev. Mattathias para agradecer a ajuda que a Igreja Unida lhe havia dado, durante a sua repentina e prematura viuvez e para aplicar o dinheiro do seguro de vida do marido na construção do novo templo, que a Igreja Unida estava erigindo na Rua Helvetia. Providencialmente, o Rev. Samuel Barbosa havia feito esse seguro, 6 meses antes da febre tifóide, que o levou à morte. Damaris, ainda um bebê, estava dormindo em casa sob os cuidados da família do presbítero Alberto Araújo que hospedava D. Mariquinhas em São Paulo. Péricles, impressionado com o som do coro e com a figura do regente, largou das mãos da mãe e chegou perto do Rev. Mattathias. Esse momento em que o futuro regente do Coro da Igreja Unida se encontra com o regente fundador do Coro não foi fixado por nenhum fotógrafo e nem sequer foi observado pelos cantores, mas o menino Péricles jamais esqueceu este dia e sua memória sempre foi capaz de repetir a música que cantavam: “Ai, ai, morreu o Bom Jesus Meu Soberano, meu Senhor. Quis ele a tudo se entregar Por mim tão pobre pecador.” 9 Este hino, com a música lembrada pelo Péricles, aparece no 3o volume de Coros Sacros, editado pelo Maestro Artur Lakschevitz, com a colaboração do Rev. Mattathias, como ele vinha fazendo desde o 1° volume, editado em 1931. Na época, o Rev. Mattathias era pastor da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro e Lakschevitz, o regente do coro. “A morte de Jesus”, com texto traduzido do original de Isaac Watts, pelo Rev. James Theodore Houston, existe em Salmos e Hinos, com música de H. S. Irons, mas, no 3o volume de Coros Sacros7, a música é outra, sem indicação de autor. Entretanto, o Rev. Mattathias a conhecia e já fazia o Coro da Igreja Unida cantá-la em 1914. Reverendo Mattathias ou O fundador do Coro da Igreja Unida (e os meus próprios pensamentos) “Ao ministro compete promover tudo quanto concorra para o progresso da Egreja, particularmente zelando com carinhoso cuidado do serviço coral, de modo que os hymnos contribuam para o contentamento e intensificação espiritual da Egreja.” Era dessa forma que o Rev. Mattathias se expressava no editorial de “A Mensagem” n.º 19 ano II, de 1o de abril de 1923. Fazia 10 anos que organizara o Coro da Igreja Unida, auxiliado por Gaspar Schlittler, Evangelina de Toledo, Taufik Daud Kurban e Aziz, quatro colaboradores cujos nomes o Rev. Mattathias sempre fez questão de lembrar. 7 Coros Sacros: “Coletânea, para coro misto, em 8 volumes (1931-1956), com 190 peças. Compilada por Arthur Lakschevitz. Publicada pela antiga Casa Publicadora Batista, atual JUERP”. Dicionário de Música Evangélica. Organizado por Rlando de Nassau. 1. ed. do autor. 10 (Creio que o envolvimento do Rev. Mattathias com música começou quando entrou para o Seminário Presbiteriano em 1895. Lá teve dois professores de música: José Benedicto Rodrigues e H. Rugger. José Benedicto, além de professor no Seminário, foi regente do Coro da 1a Igreja Presbiteriana, na Rua XXIV de Maio. Posso imaginar o aluno Mattathias cantando no coro, observando o regente e aprendendo música com ele. No ano em que entrou para o Seminário, era organista da 1a Igreja e também professor de música no Seminário, H. Rugger, músico suíço que esteve em São Paulo alguns anos, atuando na cidade. Foi H. Rugger quem inaugurou o órgão da Igreja do Sagrado Coração de Jesus em 19018 e seu nome aparece também como um dos professores de Luiz Levy9. Nesse ambiente de grande espiritualidade, entre Seminário e Igreja no mesmo endereço, quanto foi importante para sua formação a prática musical, ali desenvolvida, quanto o ajudou a entender a importância do coro na igreja!). Ao completar o curso no Seminário, Mattathias parte para uma fantástica epopéia no campo missionário presbiteriano, enfrentando reveses e conquistando vitórias para a Igreja no Alto Jequitibá, em Minas Gerais (1902 – 1905) e no Estado da Bahia (1906 – 1912). Sabe-se que, nesse período, o músico Mattathias só se manifesta com a sua bonita voz de tenor para ensinar os hinos que deveriam soar em uníssono e sem acompanhamento. Mas, ao voltar para São Paulo, para trabalhar ao lado do Rev. Carvalhosa na Igreja Unida, Mattathias encontra ambiente para os assuntos da música e encontra pessoas que o assessoram e o entusiasmam a concentrar os talentos musicais a favor da igreja, organizando um coro. “ Providencialmente está entre nós, ajudando-nos no trabalho da Egreja, o Rev. Mattathias Gomes dos Santos” - Rev. Carvalhosa assim se dirigindo à Assembléia da Igreja no início de 1913. É difícil admitir não haver coro na Igreja Unida desde a sua constituição em 1900, pois o pastor que se associou ao Rev. Carvalhosa, na fundação da Igreja Unida, o Rev. Zacarias de Miranda, era músico e tinha vindo da Igreja de Sorocaba, onde, além de pastorear, regia o coro com tal proficiência, que esta se tornou lendária! E era também violinista! Mas era, também, um lutador em muitas frentes do evangelismo brasileiro, sem tempo para exercitar seu talento musical em São Paulo. (Mas gosto de imaginar que este regente sem coro e esse violinista sem instrumento, prepara a Igreja com o zelo de quem ama a música e é por ela envolvido...) “Apesar das difficuldades dos tempos, é grande a somma de trabalho feito e o relatório todo tem como que sons de clarins que tocam a victoria”. Zacarias de Miranda, escrevendo sobre a Igreja Unida, na Revista das Missões Nacionais, n.º 17, ano XIX, de 6 de maio de 1905... 8 “A cerimônia de inauguração do órgão italiano”. Notícia publicada no jornal “O Comércio de São Paulo”, do dia 26 de março de 1901. Informação fornecida por Dorotéa Machado Kerr. 9 Vasco Mariz: História da Música no Brasil 4a edição 1983 Civilização Brasileira. 11 Zacarias não teve tempo de organizar o Coro. A Igreja precisou esperar pela chegada do ano de 1913, para canalizar suas potencialidades musicais em um corpo musical, que veio a ser conduzido ao longo deste século por músicos continuadores de Zacarias e Mattathias! Rev. Mattathias Gomes dos Santos (1913 – 1915?) Gaspar Schlittler (1915 – 1919) José da Costa Moellmann (1920? – 1926) Silas Gomes dos Santos (1927 – 1929) Luiz Arruda Filho (1929 – 1931) Nicolau Kiritchenko (1932?) Felix Darkevitz (1933? – 1935) Péricles Morato Barbosa (1935 – 1955) Nilce Borges do Val Galante (1955 – 1962) David Machado (1963) Samuel Kerr (1964) Jonas Christensen (1964) Ondina de Moraes Kerr (1965 – 1970) Sergio Paulo Licio (1971) Ondina de Moraes Kerr (1972) Alberto Corazza (1972 – 1975) Ondina de Moraes Kerr (1976 – 1978) Jorleia do Amaral Pinto (1978 – 1980) Helena Olivetti Stefen Velasco (1981) Dorotéa Machado Kerr (1981 – 1983) Gerson Raffaini (1984) Miriam Carpinetti (1985 – 1988) Heloisa Martoni (1988 – 1992) Suely de Paula Nuno Grecco (1993 – 1999) Vanessa Guimarães Monteiro Ferreira da Costa (1999) (Voltando ao que dissemos antes, o Rev. Mattathias se referia a Gaspar Schlittler como “baixo profundo”, Evangelina de Toledo “a boa e inteligente irmã”, Taufik Kurban, “tenor abaritonado” e Aziz ,“notável tenor, armênio de nascimento”, grafado às vezes Assis, outras Oassis, que sendo armênio deve ser Aziz. Os quatro “Campeões nessa bella campanha”. Hildaléa Gaidzkian, cantora brasileira de origem armênia, informou-me que passou por São Paulo, entre as décadas de 10 e de 20, um tenor armênio, Aziz Bilezikdjian. No Rol da Igreja Unida há um Asis -com s- de sobrenome Martin, recebido por jurisdição, vindo da Igreja Luterana armênia em 1915. Como o Rev. Mattathias não cita o seu sobrenome fica-nos a dúvida ... O sobrenome Martin não seria fácil citar? Ele não estaria tendo dificuldade em se lembrar do sobrenome complicado?) 12 1. Júlio Cardoso 2. ? 3. Gaspar Jr 4. Gaspar Schlittler 5. Rev. Mattathias 6. ? 7. João Wey 8. Norberto Wey 9. Sr. Barros (Presbítero) 10. ? 11. Ana Clara (Nonoca) 12. Provavelmente, Anna Barnsley Pessoa 13. ? 14. Evangelina de Toledo 15. D. Belinha 16. ? 17. ? 18. Ernesta. Pacheco Salgado 19. ? Alguns trechos de um discurso “direto” do Rev. Mattathias, extraídos do texto “Musica e Hinologia” (Apresentado no Congresso de Cultura Religiosa em 1947 no Rio de Janeiro ) “... Há seguramente trinta anos regia eu com extremo interesse, carinho e profunda sensibilidade, o coro da igreja Unida de São Paulo.” “... Em boa hora compreendi que o púlpito e o grupo coral deveriam ser duas fontes de inspiração ...” “... A fase áurea dessa cooperação durou três lustros ...” 13 “... Hoje, tantos anos depois, lembro-me daquele grupo coral, com saudades e profunda gratidão ...” “... O côro era praticamente uma continuação do púlpito ...” “... Apareceram músicos de valor artístico e notável consagração. Fixarei aqui, sem prejuízo de muitos outros, os nomes de Gaspar Schlittler, baixo profundo; Taufic Curban, tenor abaritonado; e Assis, notável tenor, armênio de nascimento...” “... Pareceu-me de tal modo excelente o valor da contribuição musical para a edificação do povo, para inspirar a oração e o trabalho no Reino de Deus, que resolvi criar na Igreja Unida de São Paulo um outro coro, o coro n.º 2, de cujos elementos, devidamente instruídos, educados e treinados pudesse eu ir suprindo as vagas que se abrissem no primeiro grupo coral. A este segundo grupo ministrei um curso elementar de música. Entre outros, lembro –me de que lá estavam firmes e atentos, alguns rapazes crentes do Mackenzie College que vieram a ser bons regentes de grupos corais e que hoje são Ministros do Evangelho como o Rev. Prof. Antonio Marques10 e Rev. Dr. Laudelino de Oliveira Lima Filho e outros . Só Deus sabe o bem que esses dois coros fizeram à minha alma e ao meu pobre coração. E sei que grande bem fizeram a muitas outras pessoas. Releva constatar e fixar que foram incalculáveis os serviços espirituais e artísticos prestados por esses grupos corais particularmente à Igreja Unida de São Paulo...” “... Já surgem compositores nacionais. Além de homens como os Reverendos Antônio Pedro de Cerqueira Leite, Zacarias de Miranda e Constâncio Homero Omegna, chamados para o descanso eterno, outros há contemporâneos e em pleno florescimento, que muito prometem para enriquecer a hinologia nacional...” A Família do Rev. Zacharias de Miranda em São Paulo ou O Organista Antonio Sebastião de Miranda Ao redor do ano de 1890, o Rev. Zacharias de Miranda matriculou seus filhos na Escola Normal, chamada “da Praça”, em São Paulo e transferiu-os de Sorocaba, instalando-se no Largo do Arouche, em São Paulo, dividindo sua vida entre o endereço novo da família e o do seu pastorado em Sorocaba, até 1899. Neste período, anterior à instalação da Igreja Philadepha11, a família freqüentava a 1a Igreja Presbiteriana, à Rua XXIV de Maio e Antonio Sebastião de Miranda, seu filho, tornara–se organista da igreja, antecedendo no cargo à D. Felicíssima de Souza Barros. A vida de estudante na Escola Normal devia solicitar de Antonio Sebastião de Miranda um longo trajeto entre o Largo do Arouche e a Rua do Carmo, primeiro endereço da escola antes de tornar-se, em 1894, a Escola Normal da Praça, na Praça da República. Mas para suas funções de 10 Rev. Antonio Marques, Pastor Presbiteriano que comemorou no ano de 1999, cem anos de vida! 11 Igreja Philadelpha: Nome da Igreja organizada em 22 de outubro de 1899, na Rua Rego Freitas, reunindo presbiterianos vindos da Igreja da Rua XXIV de maio, pastor o Rev. Zacharias de Miranda. Era a 3a Igreja Presbiteriana em São Paulo. Em 26 de agosto de 1900 funde-se com a 2a Igreja para formar a Igreja Unida. 14 organista na Igreja da Rua 24 de Maio, ao sair de casa, no Largo do Arouche, devia passar em frente ao prédio em construção da Escola Normal, no Largo dos Curros, a Praça da República. Nessa época está sendo construído o Viaduto do Chá, inaugurado em 1892. O Bairro dos Campos Elísios já é uma novidade imobiliária e um bem sucedido loteamento. A cidade se movimenta para além do Anhangabaú. Cinqüenta anos depois, Antonio Sebastião de Miranda retorna a estas imediações, na Igreja fundada por seu pai. Conforme registra a ata da reunião do Conselho da Igreja Unida em 31 de agosto de 1940: “Compareceu ainda o irmão Antonio Sebastião de Miranda, nascido em Itapira, neste Estado, em 20 de janeiro de 1871, viuvo, filho do Rev. José Zacharias de Miranda e de D. Henriqueta de Miranda, residente nesta Capital no Largo da Pólvora n.º 96 que declarou desejar voltar a pertencer a Igreja novamente, da qual se achava afastado desde muitos anos. O Conselho depois de o examinar, resolveu restaurar esse venerando irmão.” (Parece-me ser este o momento adequado para nos lembrarmos dos músicos que atuaram, em São Paulo, na Igreja Presbiteriana, antes da formação da Igreja Unida, estabelecendo uma linhagem, cujo início se deu na Igreja da Rua XXIV de maio, a Igreja “Tronco”12: 12 “Igreja Tronco”- A Igreja base, o tronco, de onde surgiram ramificações como a Igreja Unida. 15 MARY PARKER DASCOMB, missionária norte americana, organista já em 1880, organiza o coro da Igreja em 1887. ANTONIO SEBASTIÃO DE MIRANDA, organista por volta de 1890 FELICÍSSIMA DE SOUZA BARROS, organista em 1894 quando manda vir da Alemanha um harmônio de 2 teclados e pedaleira JAIRO BUENO, regente em 1894 e 1895 HENRI RUGGER, organista em 1895 JOSÉ BENEDICTO RODRIGUES, regente em 1896 J. THENN, organista a partir de 1898). Informações contidas em: Música Sacra Evangélica no Brasil (1961) de Henriqueta Rosa Fernandes Braga e Annaes da 1a Egreja Presbyteriana de São Paulo de Vicente Themudo Lessa. Reminiscências Os cultos da Igreja Presbiteriana eram celebrados na “sala grande” da Escola Americana, com entrada pela rua de São João, antes do ano de 1883. Em 25 de janeiro deste ano, foi lançada a pedra fundamental do templo, que ainda está servindo, com frente para a rua 24 de Maio. Já completou 50 anos o nosso templo. Na “sala grande”, que tinha pouco espaço para as nossas reuniões, tive o privilégio de assistir muitas vezes aos nossos cultos. Ainda conservo saudosas reminiscências desses cultos, um tanto apagadas, é verdade; entretanto ainda me é permitido apelar para elas. O púlpito, colocado sobre um estrado alto. Ao lado direito de quem entra, o harmonium. Os assentos eram as carteiras, ocupadas nos dias úteis pelos alunos da escola. Nesta “sala grande”, em 1880, foi minha “profissão de fé”, juntamente com um amigo íntimo. Fomos recebidos pelo Rev. Chamberlain, que ocupava o púlpito. Os hinos eram tocados por Miss Dascomb. Como disse atras, as minhas reminiscências começam já a desaparecer, como essas antigas fotografias que amarelecem e se apagam com o passar dos anos. Procuro, às vezes, chamá-las à vida, mas inutilmente. Dizem pouco; falam truncadamente; mas ainda sinto saudades ao evocá-las, o que é sempre alguma coisa. No púlpito o Rev. Chamberlain. Ao harmonium, Miss Dascomb. Nos assentos da frente, os alunos e alunas da Escola Americana. A sala geralmente cheia. Entre os crentes – ah! quanta saudade! – o Josézinho Barbosa, o Manoel da Costa, Remigio de Cerqueira Leite, Herculano de Gouvêa, Manoel da Paixão, José de Castilho, José Pereira Rangel ... e outros e outros. Entre as senhoras, Miss Mary Chamberlain, irmã do Rev. Chamberlain, Miss Kuhl, amiga e companheira de Miss Dascomb e tantas outras. D. Vicencia e a filha D. Isabel. D. Adelaide Molina, professora na Escola Americana, com o pessoal dela. D. Maria Antonia, Sr. Cesário de Araujo, D. Ernestina de Araujo. Entre as senhoras da igreja, uma havia que chamava a atenção de todos pela formosura do seu caráter cristão, pela sua piedade evangélica, pela sua profunda humildade; chamava-se Maria Luiza. 16 Quando nas reuniões de oração, pedia-se o número de um hino para ser cantado, ela geralmente sugeria, em voz alta: “Falamos do Mundo feliz.” Era o hino 31 da Segunda parte. (naquele tempo, os livros de hinos tinham Primeira e Segunda Parte). Falamos do mundo feliz, Do gôzo que nele haverá, Das glórias do lindo país, Mas achar-nos ali? Que será? Cantávamos as belíssimas e inspiradas palavras do Dr. Kalley. A Maria Luiza não podia cantar, pois sofria de moléstia gravíssima que a privava desse privilégio. Os seus lábios repetiam as palavras; os seus olhos marejados de lágrimas, pareciam contemplar “as glórias do lindo país”, antecipando o “gôzo que nele haverá!” Alma regenerada pelo Espírito Santo, profundamente crente, o Espírito dava testemunho ao seu espírito de que era filha de Deus. Entre as senhoras da igreja ocupou lugar de destaque, por muitos anos, D. Henriqueta Soares de Couto, salientando-se pela sua piedade evangélica, pelo seu espírito de liberalidade. Pode ser impressão errônea: parece-me entretanto, como já afirmou um dos nossos presbíteros, que em tempos passados a nossa igreja orava muito mais do que no presente. Havia cultos para oração. Havia um culto de preparação para a Santa Ceia. Os presbíteros tomavam parte na direção destes cultos. Vi por vezes o Sr. Manoel da Costa a dirigir estes cultos. Ainda não me esqueci da insistência com que ele anunciava o hino 139 da Segunda Parte: Vem! Espírito Divino, Grande Ensinador! Vem” descobre ás nossas almas Cristo, o Salvador. Não será verdade que hoje, mais do que nunca, estamos necessitados de pedir a Deus, nas belíssimas palavras desse hino, que nos envie o Espírito Santo, o Grande Ensinador? O Sr. Manoel da Costa tinha grande predileção pelo Salmo que assim começa: “Dae graças a Jeová porque Ele é bom; pois a sua benignidade dura para sempre.” Desses nomes referidos a quasi totalidade já passou para a igreja triunfante. Passadas as dificuldades de uma vida tão cheia de limitações e sofrimentos, eles se encontram no mundo feliz, no gôzo das “glórias do lindo país.” Que o Espírito Santo nos prepare para essa jornada bendita! Silvaro. (Pseudônimo de Dr. Silva Rodrigues) O Estandarte, primeira e segunda páginas, Ano XLI – Num. 37 de 20 de outubro de 1933. As lembranças de D. Alice Schlittler O velho Gaspar era a alma da Igreja! Um dos vitrais, à esquerda, perpetua o seu nome. Tinha bigodes, usava “pincenê” (“pince-nez”) e cortava o cabelo escovinha, “buscarrê”, como diziam na época para os cabelos de corte curto (“brosse carré”). 17 Morreu no dia 20 de fevereiro de 1920. Era de origem suíça e gostava de cantar à maneira do Tirol. Tinha voz linda, que todos admiravam. Desafiava os filhos a cantarem pelo menos um hino com os trinados tirolêses e oferecia 500 réis a quem o conseguisse. Quem contava isso era o Silas, para sua esposa D. Alice. Este, por mais que tentasse, tentado pelo prêmio, não conseguia. Teve muitos filhos. Dentre os quais: o Gaspar Jr., violinista – tocava em violino feito por ele mesmo; Melchior, médico, organista, que morreu em 1939 e teve seu corpo velado na Igreja, no templo; Francisco, também médico, e Silas que, como o pai, foi tesoureiro da Igreja. Dona Chiquinha, a mãe de todos eles. (Entrevista dada pela D. Alice Schlittler no dia 14/07/1994 viúva de Silas Schlittler que era filho de Gaspar Schlittler). Gaspar Schlittler veio para a Igreja Presbiteriana em São Paulo, à Rua 24 de Maio, em 1886, por carta demissória da Igreja Luterana de Desterro, (RS) e, em 1896, transferiu–se para a 2a Igreja Presbiteriana que já funcionava no andar térreo da sua residência, à Rua dos Bambus, n.º 4, um sobrado, cujo 1o pavimento com 3 portas, era uma área destinada ao comércio e foi alugada pelos membros da 2a Igreja, em fevereiro de 189413. Essa relação de senhorio com a Igreja sempre foi muito generosa. Em 1907, o Rev. Carvalhosa dizia em relatório: “o irmão, Sr. Gaspar Schlittler, no intuito de auxiliar a nossa igreja, diminuiu o aluguel da casa de culto, sem que lhe pedíssemos.” “O salão é vasto e tem acomodações para umas 300 pessoas ...” ainda o Rev. Carvalhosa, em relatório a Igreja, em 1906. Quando o Rev. Mattathias começa a construção em 1914, Gaspar Schlittler se torna o “mestre de obras,” o grande auxiliar no acompanhamento da edificação do templo na Rua Helvetia. (Imagino a facilidade com que Gaspar Schlittler ia todos os dias de sua casa à Rua dos Bambus, hoje Av. Rio Branco, até a Rua Helvetia, acompanhar o trabalho de construção do templo, projetado pelo Rev. Mattathias). E, Gaspar Schlittler não chegou a ver a consagração do Templo. 13 Anais da Primeira Igreja: Vicente Themudo Lessa. 18 Quatro operários da construção da Igreja, Rev. Mattathias Gomes dos Santos com seu filho Paulo ao colo, provavelmente com dois anos de idade, Gaspar Schilittler, Silas Gomes dos Santos e Presbítero Moraes Barros, em foto tirada circa 1916. “... O Sr. Moraes Barros propõe que, levando-se em consideração os constantes trabalhos prestados graciosamente à Egreja pelos Srs. Silas Gomes dos Santos, como organista e Antonio Rangel, como violinista, sejam os mesmos contemplados com pequena gratificação que signifique o reconhecimento da Egreja: o organista com a importancia de 20$000 mensaes e o violinista com a importancia 50$000, de uma só vez. A Assembléia votou que fosse a Mesa Administrativa auctorizada a decidir esse assumpto como julgasse acertado.” ( Acta da Assembléia Geral Annual 1º/ 05/1919 ) “... que seja elevada a trinta mil réis a gratificação mensal ao organista da Egreja, e que seja offerecida a quantia de cincoenta mil réis ao violinista, Senhor Antonio Rangel pelo bom serviço graciosamente prestado à Egreja ...” ( Acta da Assembléia Geral 15/04/1920) “A Assembleia toma conhecimento do officio que o irmão Senhor Silas Gomes dos Santos dirigiu a Mesa Administrativa, solicitando tres mezes de licença do cargo de organista e declarando que, ao reassumir o seu cargo, deseja prestar a sua cooperação graciosamente à Egreja. A assembleia approvou o acto da Mesa concedendo a referida licença e delibera que seja dirigido um officio áquelle irmão agradecendo a cooperação que tem prestado e a resolução de continuar no trabalho da Egreja.” Acta da Assembléia Geral da Sociedade Egreja Presbyteriana Unida de SP aos 12/04/1923 19 Um diagrama do Coro da Igreja Unida de 1917 até os anos cinqüenta “O nosso côro se ressente da falta de bons sopranos, e tenores. Os sopranos são especialmente necessários e, entretanto, são os que mais nos faltam ...” Rev. Mattathias em relatório apresentado a Assembléia Geral da Igreja no dia 19 de abril de 1917. “O côro da Egreja Unida tem progredido bastante sob a direção do Rev. Mattathias e do Dr. José da Costa Moellmann, sendo um verdadeiro prazer ouví-lo, com suas vozes afinadas e com o som mavioso dos seus vários instrumentos.” A Mensagem n.º 25 de 7 de outubro de 1923, pág. 14. “É com grande satisfação que registramos nestas linhas achar-se o Côro da Egreja Unida entre aquelles que primam pela correção e belleza dos seus cânticos.” A Mensagem n.º 31 de 6 de abril de 1924, em artigo assinado por J. Canto e Mello Dias (evidente pseudônimo – de quem? Mattathias? Moellmann?) “O côro da nossa Egreja está vivamente empenhado em conseguir maior número de membros, de forma a poder realizar um trabalho ainda maior e melhor do que o que tem sido feito até o presente.” Boletim 430 de 27 de janeiro de 1935. (Péricles Morato Barbosa ainda não é o regente. Rev. Renato Ribeiro dos Santos é o Pastor Auxiliar). “... Como sabem os irmãos, são poucos os elementos com que conta actualmente o nosso côro, considerando-se, especialmente, os vastos recursos de que dispõe a Egreja para esse trabalho... precisamos especialmente de vozes femininas ...” Boletim 456 de 25/08/1935 (Péricles M. Barbosa já é o regente). “Foi comemorado, a 26 do corrente, o 48o aniversário da Igreja com um culto solene em que mais uma vez se fez ouvir, com grande mérito e êxito, o côro da Igreja.” Boletim 1.110 de 29 de agosto de 1948. “O côro, graças ao esforço do seu diretor e membros, desempenhou-se da sua tarefa à contento de todos e para edificação do povo.” Boletim 1.163 de 4 de setembro de 1949, comentando a comemoração do 49o aniversário da Igreja. 20 “A parte substancial do programa do dia 26 (50o aniversário da Igreja) tocou ao Côro da Igreja que, como sempre, foi um motivo de inspiração.” Boletim 1215 de 3 de setembro de 1950. Lélio lembra que o Coro da Igreja Unida era pequeno, número compensado por valores como o Lara14 ... Entrevista de Lélio Lauretti15 no dia 18 de março de 1995 lembrando-se dos anos 40 e 50. “A rotina dos ensaios do coral era tão difícil de manter-se como nos dias de hoje; quem vinha ao ensaio, não aparecia no culto e quem aparecia no culto, não havia ido ao ensaio ...” Entrevista com a Ruth Simões Ferreira no dia 03 de julho de 1998. A Igreja Unida, na Rua dos Bambus, n° 4. 14 Ataliba Lara - baixo solista. 15 Lélio Lauretti, líder da mocidade na Igreja Unida nos anos 50, vide pág. 98. 21 Uma pausa para falar da Rua dos Bambus A Rua dos Bambus, antigo nome da Rua que hoje é chamada Av. Rio Branco, foi o primeiro endereço da Igreja Unida. Rua antiga, que atravessava quintais cheios de touceiras de bambus, em direção à Chácara do Campo Redondo, vindo desde o Largo do Paissandu. A Rua já fora famosa pelas repúblicas estudantis. As pessoas tinham medo de andar por ela, receosas de alguma brincadeira dos seus jovens moradores, lá pelos meados do século XIX. Em 1870, é pavimentada com pedregulho de ótima qualidade, ficando tão bonita quanto as ruas do centro, conforme anunciava, na época, o Correio Paulistano16. Em 1874, ela aparece na história do Mackenzie, pois no n.º 20, onde residia o Rev. J. B. Rowel, é instalado o primeiro internato para as moças, não muito longe da casa do Rev. Chamberlain17, que morava na Rua Visconde de Congonhas do Campo18. Em 1879, a chácara do Campo Redondo, ponto final da rua, foi vendida para Frederico Glete e seu sócio Vitor Nothman que, entre 1882 e 1890, traçam as ruas que vão compor o Bairro dos Campos Elísios. Glette era suíço, por isso uma das ruas ganha o nome de Rua Helvetia! Em 1893, a Igreja Presbiteriana instala, no n.º 56 da Rua dos Bambus, o Instituto Theologico19, mas por pouco tempo, mudando-o em um mês para a Casa Pastoral da Igreja, na Rua XXIV de Maio. No dia 1o de fevereiro de 1894, a 2a Igreja Presbiteriana, que nascera no ano anterior, na Rua Conceição n.º 58, muda-se para a Rua dos Bambus, no n.º 4, no andar térreo da casa de Gaspar Schlitller, membro da Igreja da Rua XXIV de maio, desde 1886, quando chegou a São Paulo, vindo da cidade gaúcha de Desterro. (Imagino que o suíço Gaspar Schlitller vai morar nos Campos Elísios por influência do suíço Glette, assim que o bairro é loteado. Solidário com a recém formada 2a Igreja, oferece a ela as dependências térreas da sua residência, onde três portas davam acesso a um salão espaçoso, destinado a alguma atividade externa, enquanto que o 1o andar do sobrado era destinado à moradia do seu proprietário). O Rev. Carvalhosa, o pastor da nova Igreja, também se muda para a Rua dos Bambus, para uma casa vizinha. 16 Conforme Ernani Silva Bruno em História e Tradições da Cidade de São Paulo, Editora Hucitec 17 O Mackenzie, Benedicto Novaes Garcez, Casa Editora Presbiteriana, 1970. 18 Rua situada nas imediações do Largo dos Guaianases, hoje Praça Princesa Izabel, conforme Benedicto Novaes Garcez no livro O Mackenzie. A Praça Pricesa Isabel ganha esse nome em 1921. 19 Annaes da 1a Igreja Presbiteriana de SP Vicente Themudo Lessa, Edição da 1a Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, 1938. 22 Em 1896, Gaspar Schlitller é recebido como membro da 2a Igreja. Além de morar na Rua dos Bambus, passa a freqüentar uma Igreja também na Rua dos Bambus. Bastava para isso, descer do 1o andar para o andar térreo da sua casa. Ele e toda a sua família: D. Francisca e seus filhos Daniel, Margarida, Francisca, Noemi, Lydia, Gaspar e Melchior. Em 1900, chegam à Rua dos Bambus os integrantes da Igreja Philadelpha, para se juntarem à 2 a Igreja e constituírem a Igreja Unida, que ali permanece até dezembro de 1914, quando é deslocada para a Rua Helvetia. De Rua dos Bambus, passa a Rua Rio Branco e, depois, Av. Rio Branco e o Largo dos Guaianases, ali perto, passa a ser a Praça Princesa Izabel. Natais na Igreja Unida nos primeiros cinqüenta anos O templo da Rua Helvetia foi inaugurado em um dia de Natal. Ainda sem a torre e sem as galerias laterais (e outras providências que não impediam a imediata mudança da Casa n.º 4 da Rua dos Bambus). No dia 25 de dezembro de 1914, aconteciam “os primeiros actos do culto divino” conforme notícia da Revista das Missões Nacionais20. Não há registro da música nesse culto de Natal, mas o primeiro registro de prática de música na Igreja Unida aconteceu em uma “pequena festa para comemorar o nascimento de nosso Senhor Jesus Christo, à qual assistiram mais de 200 pessoas. Depois dos cânticos (grifo meu) e exercícios religiosos, foram distribuídos doces a todos os circunstantes que se retiraram satisfeitos.” Foi assim que o redator da seção “De Norte a Sul” da Revista das Missões Nacionais21 escreveu a respeito da noite de 24 de dezembro de 1901 na Igreja Unida. Sabe-se, pelas notícias, que houve música mas não sabemos quais cânticos. No Natal de 1904, sempre pela informação da mesma Revista22, a festa de Natal da Igreja Unida começou “cantando-se o hymno Conta – me a velha história, do Grande Salvador,” revelando-nos que o repertório musical, mais do que melodicamente, era identificado, no tempo litúrgico, pela adequação do texto. Em 1907, não na Igreja Unida, mas na Igreja Presbiteriana de Botucatu, a Revista das Missões Nacionais23 publicava uma reportagem do Rev. Samuel Barbosa a respeito de “O Natal de Botucatu”. (Penso que o Rev. Samuel24 devia estar noivando com a D. Mariquinhas). Com seu ouvido musical ele observa que, “o Côro que fôra muito bem disciplinado pelo nosso irmão João Baptista de Almeida25 20 Revista das Missões Nacionais n.º 341 ano 29 de fevereiro de 1915. 21 Revista das Missões Nacionais ano 16 n.º 6 de 11/01/1902. 22 RMN ano 19 n.º 12 de 04/01/1905 23 RMN ano 21 n.º 9 de 15/02/1907 24 Rev. Samuel Barbosa casou-se com Maria Eliza Morato em Botucatu no dia 18 de setembro de 1907. São eles os pais de Péricles Morato Barbosa. 25 Que a Igreja Presbiteriana de Botucatu se manifeste sobre esse regente! 23 cantou diversos hymnos, que são próprios do Natal. Alguns dos hymnos foram executados, não somente pelo orgam, mas também por bandolim e flauta.” (Que pena que os redatores da Revista não detalhavam, como o Rev. Samuel, as participações musicais na Igreja em São Paulo. Sabe-se apenas que em Botucatu a Igreja possuía um coro disciplinado, organista, flautista, bandolim e um regente!) Em 1924, as informações são mais detalhadas graças à Mensagem26, periódico publicado pela Igreja Unida, noticiando a participação do Coro da Igreja na Festa de Natal, cantando os hinos 318 e 553 e encerrando a festa com o Hino Nacional27! Através do Boletim n.º 20, de 3 de outubro de 1926, comenta – se: “Sentimos que alguns dos membros do Côro tenham sido obrigados a faltar aos ensaios, justamente agora que estão sendo iniciados os estudos dos hymnos para o Natal. Esperamos, todavia, que, removidos os obstáculos, estejam todos a póstos, na próxima 5a feira. O Dr. Moellmann deseja preparar com antecedência os hymnos para o Natal, a fim de evitar os atropelos, as aprehensões e os aborrecimentos de ultima hora ...” (Como foi a apresentação do coro naquele Natal, de 1926, não se tem notícias, mas imagino que o repertório teria sido mais característico do tempo do Natal, pela preocupação do José da Costa Moellmann em ensaiar, com antecedência, músicas específicas para o Natal). “Transcorreu com muita alegria o Culto do Natal e o Culto de Vigilia. O Culto de Natal se destacou pela contribuição muito edificante e inspiradora do côro. O Culto de Vigília marcou o mais alto nível de assistência que esta Igreja já teve.” Era o Natal de 1949 e o Coro já tinha no seu repertório coros de “O Messias” de Haendel e, no Culto 26 A Mensagem n.º 28 de 6 de janeiro de 1924. 27 Os números dos Hinos são dos “Salmos e Hinos” anteriores a edição de 1975. O hino 318 é “Eis dos anjos a harmonia” de Félix Mendelssohn – Bartholdy cantado com letra em português de M. A . de M. “Eis os anjos a cantar”, da edição de 1899. O hino 553 pertence a 3a parte editado em 1917 “Oh! Que descanso em Jesus encontrei” com letra em português de H. M. W. e música de Herbert H. Booth. 24 de Vigília, terminada a oração da passagem do ano, rompeu da galeria do coro o “Aleluia”. As pessoas dentro da Igreja, emocionadas, começaram as comemorações do Cinqüentenário. (Poderíamos rever dezenas de Natais se todas as festas e cultos tivessem sido registrados! Mas só para aguçar a nossa imaginação, nessa possível corrida pelos dezembros antigos, aceitemos o convite do Boletim n.º 1282 de 23 de dezembro de 1951: “Foi estreado ontem, o Programa de Natal com o qual a UMP e a Escola Dominical estão comemorando o Natal. Não perca esta festa de rara beleza que tem a orientação da Maria Amélia28! Haverá novas apresentações nos dias 24, 25 e 26 as 20:30 horas.” Apreciemos o programa à página 23. Os Natais, nas décadas seguintes, ganharam novas roupagens, novos enfeites, novas músicas. A galeria de regentes empenhou-se sempre em ensaios, traduções, arranjos e programas especiais, influenciados pela solicitação, cada vez maior, aos corais, para que figurassem como imagem e som característicos do Natal. O excessivo envolvimento comercial nas festas se, de um lado, projetou os efeitos musicais dos corais para além da igreja, por outro, afastou, um pouco a atuação dos corais com relação ao ideário inicial). A Crônica de Moellmann “Eu cantava no coro, que era, na época, regido por um regente de sobrenome alemão29 ...” Moellmann. É o regente do coro na consagração do templo em 1922. José da Costa Moellmann nasceu em Florianópolis e veio a São Paulo em 1916 para cursar engenharia no Mackenzie. Conhece Ana Elisa Ribeiro e por causa dela se aproxima da Igreja Unida, onde passa a integrar o coro e professa sua fé em 31 de dezembro de 1921. Em 1922 organiza e dirige “uma esplendida orchestra que deliciou as pessoas presentes com magníficos números de música”30 e em 1923 “pretende organizar uma orchestra dentro de nossa Egreja, afim de auxiliar o coro em reuniões especiais, quando não seja em todas as reuniões de culto, executar o preludio e abrilhantar as festas que se realizem no pavimento térreo31.” 28 Maria Amélia Rizzo, filha mais velha do Rev. Miguel Rizzo Jr., marcou sua passagem pela Igreja Unida como dramaturga e diretora de teatro mobilizando a mocidade da Igreja com encenações de textos seus como “Não pasmes nem te espantes”, uma biografia dramatizada sobre Simonton, apresentada no ciquentenário da Igreja Unida e “Embaixador em Cadeias” sobre a vida do Apóstolo Paulo, peça apresentada em 1951, ambas as produções, do Departamento Teatral da UMP Unida. 29 Frase colhida em entrevista com D. Esther de Almeida Mesquita no dia 15 de outubro de 1994 no “Monte Refúgio”, em Mogi das Cruzes. Musicista, substituiu várias vezes, Silas Gomes dos Santos ao harmônio. Na ocasião da entrevista estava com 92 anos e ajudou a identificar os cantores do Coral da Igreja Unida, em foto tirada em 1915. 30 A Mensagem n.° 15 de 3 de dezembro de 1922. 31 A Mensagem n.° 24, de 2 de setembro de 1923. 25 José da Costa Moellmann Ele havia sido batizado na infância e fez o Curso primário na Escola Evangélica da Igreja Luterana de Florianópolis e o Ginásio com os jesuítas, no Colégio Catarinense, onde aprendeu violino e fez prática de orquestra com grande aproveitamento. Na época, era violinista de um conjunto que acompanhava os filmes mudos no cinema da cidade. Não se tem notícia do desenvolvimento de uma orquestra na Igreja Unida como o Moellmann pretendia, mas A Mensagem n.° 25, elogiando o coro em 1923, “com suas vozes afinadas e com o som mavioso dos seus vários instrumentos,” dá a entender que havia um conjunto instrumental. Norberto Wey, presbítero que cantava no coro, tocava trombone32. Em 1924, Ana Elisa Ribeiro e José da Costa Moellmann se casam no dia 27 de novembro. Como os boletins ainda não eram editados (só a partir de 1926) não se tem a oportunidade de ver publicada a nota social do enlace, na Igreja Unida, mas podemos imaginar o acontecimento musical que teria sido a cerimônia do casamento do regente e violinista do coro da Igreja. No final de 1926, o Dr. José da Costa Moellmann retorna a Florianópolis para abrir estradas de rodagem no interior do estado de Sta. Catarina. E abrir muitas outras estradas como Prefeito, como Secretário da Fazenda e como membro da Sociedade de Cultura Musical, mantenedora da Orquestra Sinfônica de Florianópolis, atuando também como violinista da orquestra, desde a fundação, em 1944. Faleceu no dia 19 de abril de 1966, em Florianópolis. Uma rua recebe seu nome. (Este texto foi escrito a partir de dados biográficos fornecidos pela filha do Dr. José da Costa Moellmann, Carmen da Costa Moellmann Santaella.) 32 A Mensagem n.° 34de 6 de julho de 1924 - Notícias da Lapa – “A referida congregação conta com disciplinado coro, do qual é diretor o presbítero Noé Wey e ao qual presta inestimável concurso seu trombone o presbítero Norberto Wey.”(Se ele tocava na congregação, imagino que fazia parte do conjunto instrumental na Igreja Unida!) Segundo informação de Heloisa Martoni, Noé Wey, na década de 1930, organizou e regeu o Coro da Igreja Presbiteriana de Ribeirão Preto. 26 Consagração do templo Esteve sobremaneira solenne e tocante a consagração do templo da Egreja Unida, realizada em 7 de Setembro ultimo. As quinze horas, estando o recinto inteiramente repleto e garridamente enfeitado, teve início a reunião com oração pelo pastor, que em seguida, fez a leitura de dois psalmos. Foi, então, pelo coro entoado o hymno “A Esperança”, letra do Rev. Mattathias Gomes dos Santos e música de Rossini, o qual agradou extraordinariamente a assistencia. Após esse hymno, o presbytero Sr. Carlos José Rodrigues profere um bello discurso, entregando á Egreja o templo acabado e livre de dividas. O Rev. Mattathias, em nome da Egreja, recebe o templo, proferindo bellas palavras, e convida a congregação a orar a Deus em acção de graças e a consagrar-lhe o templo ao seu serviço; e dirige a Egreja nessa oração e consagração. Canta-se, a seguir, o hymno 225. O pastor declara então conceder a palavra a quem della quizesse fazer uso. Levanta-se o Sr. Benedicto R. Aranha, que recita a poesia “Ode á Egreja Unida”, de sua lavra e publicada em o numero anterior d’ “A Mensagem”. Falou em seguida, o Sr. Attilio Borio, que, com eloquentes palavras, inaugura uma placa de bronze, collocada num dos pilares do templo, com os seguintes dizeres: - HOMENAGEM DA EGREJA PRESBYTERIANA UNIDA DE S. PAULO, AO SEU PASTOR, REV. MATTATHIAS GOMES DOS SANTOS. CONSTRUCÇÃO DO TEMPLO 1913 – 1922 O Rev. Mattathias, visivelmente commovido, agradece essa prova de gratidão. E, logo após, cantado pela Sra. D. Aurora G. dos Santos Costa e Srtas. Percides Mesquita e Thamar Gomes dos Santos o hymno “Caridade” de Rossini, que produziu excellente impressão. Encerram-se as solennidades com o cantico, por toda a congregação, do hymno 263 – “A Ti, ó Deus, o sanctuario dedicamos”. Como acima dissemos, a reunião em que se consagrou ao serviço do Altissimo o bello templo da Egreja Unida, esteve verdadeiramente imponente e, sem duvida alguma, perdurará por longos annos na memoria dos que tiveram a ventura de assistir a ella. O côro, sob a proficiente direcção do nosso irmão Dr. José da Costa Moellmann, concorreu grandemente para o maior brilhantismo das solennidades. Notícia publicada na pág. 2 de A Mensagem n.º 13 de 1o de outubro de 1922. 27 Visão parcial de foto de Valério Vieira São Paulo em 1922. A Igreja Unida indicada no círculo. Uma idéia feliz O nosso irmão Dr. José da Costa Moellmann pretende organizar uma orchestra dentro da nossa Egreja, afim de auxiliar o côro em reuniões especiais, quando não seja em todas as reuniões de culto, executar o preludio e abrilhantar as festas que se realizam no pavimento terreo. Qualquer pessoa que toque algum instrumento pode considerar-se convidada por nosso intermedio a tomar parte na futura orchestra, devendo se entender a respeito com o Dr. Moellmann. A Mensagem ano III n° 24 de 2 de setembro de 1923, pg. 11 Philopea e Ebenezer D. Henedina atravessou o templo em direção à escada que levava ao andar térreo33 e desceu os degraus, ladeada pelas moças da Classe Organizada Philopéa, que a saudavam com pétalas de rosas como uma delicada chuva de carinho. Ao chegarem ao salão de festas, cantaram um hino, seguido de oração pelo Rev. Mattathias pelo aniversário da querida presidente. (Reparem que não cantaram o “Parabéns a você”,34 ainda não conhecido no ano de 1924). 33 Vide foto na página 29. Essa escada não existe mais. 34 A música que vem a servir como saudação aos aniversariantes não havia sido ainda difundida como “Parabéns a você”, embora enquanto música já fosse conhecida e usada com outras letras de teor didático. Voltaremos a esse assunto. 28 As cadeiras em círculo. No centro, uma longa mesa coberta de doces, decorada com fitas que vinham presas ao teto, sustentando cestinhas com bombons. Muita alegria, completada com o hino das Philopeanas, composto pela D. Grace Kolb, respondido com saudação e hino dos Ebenezeristas, os rapazes da Classe Organizada Ebenezer. Essas classes organizadas entre moços e moças da igreja haviam surgido no ano anterior por iniciativa de Eliezer dos Santos Saraiva e por inspiração dos Andersons. O Sr. John Anderson e D. Henedina Anderson haviam chegado do Rio, em 1923, com toda a sua família: William, 4 anos, Myron, 8 anos, M. Josefina, 7 anos e Fanny, Francis Elizabeth, 6 anos, logo depois da chegada da família Kolb e encontraram na Igreja, recém consagrada, uma Escola Dominical forte, onde puderam desenvolver grande impulso espiritual e de sociabilidade também. “As classes Philopéa e Ebenezer dinamizaram a Igreja Unida, que era uma igreja muito paulista no sentido de pouca comunicação. Foi preciso a presença de um inglês e uma mineira para revolucionar o ambiente.”35 O inglês, o presbítero John Anderson e a mineira, sua esposa Dona Henedina. Ele, presidente da classe Ebenezer. Ela, da classe Philopéa. Este casal encontra outro casal, o Dr. Alexandre Orecchia e Dona Dulce, líder da Sociedade de Senhoras, membro do coro e líder da campanha pela compra de um piano para a Igreja, piano este colocado no andar térreo para servir à Escola Dominical e às lindas festas, em cuja organização se revezavam Dona Grace Kolb e Lysenor Calimério36. Um momento único. Mais distante, mas presente, o Mackenzie e a Associação Cristã de Moços. (Por que um momento único? Igreja pronta Convívio entre professores do Mackenzie A família Kolb A família Anderson A família Orecchia Moços e moças em constante convivência) 35 Depoimento de D. Fanny (Francis Elizabeth Anderson Duffles de Andrade) em fevereiro de 1999. 36 Porque Lysenor Calimério? Lysenor era casada com Calimério Santos e seu nome as vezes aparece com C. que pode ser de Cerqueira Leite, pois era filha de Antônio Pedro Cerqueira Leite, mas todos que a conheceram se lembram dela como Lysenor Calimério. 29 Já nas primeiras décadas do século, crescentes antagonismos sociais punham nas ruas da capital as bandeiras que carregavam o apelo à emancipação dos oprimidos. Desde 1929, ou mesmo antes, ao impulso mundial, capitais, fazendas do interior e casarões dos Campos Elíseos ou da Avenida Paulista deslocavam-se de mãos, abalando as tradições forjadas pela sociedade do café. No entanto, continuava de pé a simbologia da prosperidade paulista, no arranha-céu denominado Martinelli, na locomotiva que continuava a abrir frentes pioneiras e nas jardineiras que anunciavam a era rodoviária. Em direção ao alto do país, ao norte do Paraná e a Mato Grosso, esses monumentos e veículos davam curso, nos anos 30 e 40, aos mais novos empreendimentos da modernidade. Um eldorado errante: São Paulo na ficção histórica de Oswald de Andrade. Antonio Celso Ferreira, Ed. UNESP, 1986 Observe-se nesta foto da Igreja Unida no início de 1915 a escada de acesso ao pavimento inferior, à esquerda 30 “O desenvolvimento de canto de hymnos é um dos mais importantes elementos da Escola Vespertina.” Das conclusões do 2o retiro annual realizado em Suzano, no dia 13/05/1925. Annuario da Egreja 1924 – 1925. Esse texto ganhou uma frase como nome, não porque eu pretendesse, fosse o título, mas, porque fazia parte de outras frases que se agrupavam no assunto “Escola Vespertina” e que acabou se separando e se colocando no alto da página e se tornando título. Assim como não pretendi que Escola Vespertina fosse um tema, uma história, mas sim o que nela aconteceu no dia 14 de julho de 1926, noticiado no boletim n.° 9 da Igreja Unida: “Conforme foi annunciado realizou-se no dia 14 a festa da Escola Vespertina ... Abrilhantaram a festa o jovem Cyrus Orecchia, executando ao violino a Pastorale de Oscar Rieding e Dona Lysenor C. Santos cantando lindo e comovente Hymno sacro do saudoso Rev. Antonio Pedro de Cerqueira Leite, seu progenitor.” (No momento em que li esta notícia, eu estava no começo da presente pesquisa e nada sabia sobre Cyrus Orecchia e Lysenor C. Santos, mas sabia a respeito do Rev. Antônio Pedro de Cerqueira Leite e por causa dele destaquei a notícia e a registrei na hora da leitura, imaginando que ligações eu iria estabelecer entre a música na Igreja Unida e a figura do pastor/músico, Antônio Pedro de Cerqueira Leite, fundador do 1o coro presbiteriano, lá em Sorocaba, coro esse continuado por outro pastor/músico, o Rev. Zacharias de Miranda, co-fundador da Igreja Unida. Mas, ao mesmo tempo em que inferia 31 ligações, me perguntava o que seria Escola Vespertina, onde o fato noticiado acontecera. Lendo o livro “Nas mãos de Deus”, uma biografia de Maria Josefina Anderson, escrita por Isabel Botelho de Camargo Schützer, fiquei sabendo o que era a Escola Vespertina: “As ruas, porões e cortiços que circundavam o templo da Igreja Unida apresentavam um aspecto confrangedor nas manhãs domingueiras, enquanto se processavam os trabalhos da Escola Dominical Central. Um enxame de crianças maltrapilhas, descalças, despenteadas, em plena rua, entregavam-se a toda sorte de tropelias, que muito perturbavam o andamento das aulas. Perturbavam sim, mas também lançavam um repto à Central: ... onde está a nossa classe? ... Pois a classe surgiu e surgiu com este lindo nome: Vespertina. Funcionava aos domingos, de tarde.” Pois numa festa da Escola Vespertina, em 1926, tocava o violinista Cyrus Orecchia, com 14 anos, filho do professor do Mackenzie, Alexandre Orecchia, presbítero da Igreja Unida e de D. Dulce Orecchia, cantora do coro, presidente da Sociedade de Senhoras na época. E fazendo parte do programa, cantava Dona Lysenor C. Santos. O Boletim dizia ser ela filha do Rev. Antônio Pedro Cerqueira Leite. Depois verifiquei que era casada com Calimério Nestor dos Santos, e mais, que a lembrança carinhosa de D. Fanny a chamava de D. Lisenor Calimério, que animava as festas da Igreja Unida com seu personagem “Nha Tuca e a fiarada”. A voz deveria ter herdado de sua mãe Palmyra Rodrigues, que Antônio Pedro conheceu, tocando piano e cantando na Escola Americana em 1873. Cyrus ao violino, Lysenor cantando, Antônio Pedro em Sorocaba, regendo o 1o coro presbiteriano, Zacharias de Miranda que também tocava violino, continuando a regência do coro da Igreja de Sorocaba, lindo e comovente hino sacro do saudoso Rev. Antônio Pedro, a Escola Americana, D. Palmyra Rodrigues, a Escola Vespertina ... tudo passando pela minha cabeça, e eu, assim, tentando colocar as informações em ordem, achando que haveria nesse redemoinho uma história para contar ... ) E se fosse um roteiro cinematográfico? 32 À maneira de um roteiro cinematográfico, ou de um Vídeo Clip? Trilha sonora: Música de Antônio Pedro Cerqueira Leite para paráfrase do Salmo I 1926, dia 14 de julho, na Igreja Unida: Cyrus Orecchia toca violino na Festa da Escola Vespertina; 1876, Teatro São José, em São Paulo, ainda na Praça João Mendes: Zacarias de Miranda toca violino para a Cia. Ferrari em um espetáculo de ópera, seu primeiro emprego ao chegar em São Paulo. 1926, dia 14 de julho, na Igreja Unida: Lysenor C. Santos canta na festa da Escola Vespertina. 1873, dia 18 de setembro na “Sala Grande” da Escola Americana, em São Paulo: Casamento de Antônio Pedro de Cerqueira Leite com Palmyra Rodrigues (Conheceram-se na Escola Americana...) 1926, dia 14 de julho, na Igreja Unida: As crianças da Escola Vespertina escutam Lysenor cantando o Salmo I. 1876, na Igreja Presbiteriana de Sorocaba: Antônio Pedro rege o Coral. Cantam o Salmo I. 1926, dia 14 de julho, na Igreja Unida: Cyrus Orecchia segura o violino, sem tocar, ouvindo Lysenor cantando. 1880, em Sorocaba, na Igreja Presbiteriana: Zacarias, a caminho de Brotas, seu primeiro pastorado, ouve o Coral da Igreja sob a regência de Antônio Pedro. 1926, dia 14 de julho, na Igreja Unida: As crianças aplaudem Lysenor. Cyrus a aplaude a maneira dos violinistas, batendo o arco nas cordas. 1881, na Igreja Presbiteriana de Brotas: Zacarias ensaia o coral, segurando o arco do violino como batuta de regente. 1882(?), em Sorocaba: Nasce Lysenor, filha de Palmyra e Antônio Pedro. 1883, dia 22 de junho, em Paranapanema, Antônio Pedro escreve uma carta: “Espero que os membros do nosso coral se tenham adeantado nos ensaios e que a nossa jovem organista tenha aprendido a tocar muitos hymnos durante estes 32 dias que já tenho estado ausente, afóra os que ainda vou gastar para chegar em Sorocaba. Quando lá chegar, quero ter o prazer de ouvi-la tocar bastante.” 1883, em Setembro, na casa de Palmyra e Antônio Pedro em Sorocaba: Palmyra recebe a notícia do falecimento de seu esposo, ocorrido no dia 31 de agosto, no Rio de Janeiro. 1883, na Igreja Presbiteriana de Sorocaba: Zacarias de Miranda, empossado no cargo de Pastor, rege o Coral. 1976, no Templo atual, da Igreja Presbiteriana de Sorocaba: Comemorações do centenário do Coral da Igreja. 1900, 26 de agosto, na Rua dos Bambus, n.º 4: Zacarias de Miranda canta junto com os membros fundadores da Igreja Unida. 1926, 14 de julho, na Igreja Unida: As crianças da Classe Vespertina cantam junto com Lysenor, acompanhados por ela ao piano e por Cyrus ao violino. Fusões Cyrus e Zacarias ao violino: Zacarias e Antônio Pedro regendo o Coral da Igreja Presbiteriana de Sorocaba. A foto do Coro da Igreja Unida em 1915. 33 Registra-se um voto de agradecimento às seguintes pessoas: Sr. Silas Gomes dos Santos, como organista; ao irmão Dr. José da Costa Moelmann, como regente do côro; ao irmão Jorge Moreira, como guarda – livros; e ao Rev. R.F. Lenington, pelo zelo, esforço e dedicação no trabalho cristão em que está empenhado no nosso meio. Encerraram-se os trabalhos às 22 horas, com o cantico do hymno 462 e oração pelo presbytero Carlos José Rodrigues. Pág. 26 (Na acta da assembleia Geral da Egreja) 06/05/1926. Côro Reuniu – se extraordinariamente na 3 ª feira transacta. Elegeu uma Directoria que ficou assim constituida. Pres. Dr. Moelmann; Vice – Dr. Winifred Lane; Secretario Luiz Topan; Thes. Srta. Carmen Orecchia. Organista: Silas G. dos Santos. Substituto: Brasilina Alessio Para o estudo de novas musicas haverá mais duas reuniões mensaes: uma na Segunda e outra na quarta Terça–feira. Domingo 23 de maio de 1926 Boletim n.º 1 A história do Dr. Ruben Dr. Ruben Duflles de Andrade contou- me que, de formação católica muito rigorosa desde a infância, alcançou a juventude em uma crise espiritual muito forte, descrente e com profunda tristeza no coração. Mas, amparado por uma visão luminosa, em sonho, em forma de cruz, procurava, ansiosamente, por uma melhor orientação religiosa37. Em uma noite de quinta-feira, andando pela Rua Helvetia, ouviu um som que o fez perceber que estava em frente a uma igreja. Atraído pela música do órgão que vinha do interior do templo, subiu as escadas, entrou na igreja e sentou-se em uma das últimas cadeiras, bem próxima à porta, para poder sair facilmente, quando quisesse. 37 Entrevista com o Dr. Ruben Duffles de Andrade no dia 13 de fevereiro de 1999. Foto: L. Guimarães 34 Ao órgão (era o harmônio Hinkel)38 tocava Zoraide Mesquita e, próximo à mesa de comunhão, o Rev. Rizzo dirigia o culto de 5a feira, diante de grupo pequeno de membros da Igreja Unida, num mês de abril de 1930. Contou-me, ainda, que, emocionado com a música, começou a ouvir o sermão do Rev. Rizzo e que, inundado por uma alegria transbordante, teve a certeza de que havia encontrado o que tanto ansiava. Será que Dona Zoraide Mesquita, tão zelosa do seu trabalho musical, na ordem litúrgica, podia imaginar que era ouvida desde a calçada da rua e que estava sendo instrumento de modificações espirituais? Segundo o Rev. Boanerges Ribeiro em seu livro A Igreja Presbiteriana no Brasil, da Autonomia ao Cisma, “o órgão é equipamento prioritário, mesmo antes de construir-se a Casa de Oração39”. Em 1907 a Revista das Missões Nacionais publicava no dia 25 de setembro uma notícia de Araguary: “outra coisa que contribui para attrahir pessoas estranhas ao culto, é o harmonium que a nossa presada irmã D. Lucy Morton offereceu á egreja e que esta sendo por ella executado em nossa sala de cultos.” Em 1923 o periódico da Igreja Unida, A Mensagem, do dia 4 de fevereiro noticia que, na Congregação da Casa Verde, “O orgam tem dado grande animação ao serviço, despertando o interesse d as crianças que, attrahidas pela música, deixam suas distrações na rua e entram para assistir às lições da Escriptura Sagrada ... É grato constatar que não tem faltado quem toque o harmonio, graças a boa vontade dos prestimosos membros do Centro de Discipulos de Christo Sr. Noé Wey, João C. Wey, Srta. Mary Kolb e D. Gigina Bevilacqua Bruno.” (A sintaxe entre a linguagem falada, familiar e a linguagem documental, escrita, pareceu-me, aqui, uma oportunidade feliz que tive, como pesquisador, de tornar real e, ao mesmo tempo mágica a narrativa que fluiu da entrevista com Dr. Ruben). O Harmônio Hinkel Depois que o órgão Hammond foi comprado, o harmônio Hinkel em uso desde 1909, foi colocado atrás do praticável do coro. Quem subisse a escada da direita, em direção à galeria, podia vê– lo, ali, encostado com sua fachada falsa de tubos, teclado fechado, pedais do fole, também. Silencioso. Nadir gostava de assistir ao culto nas cadeiras extras que ficavam ali perto, para olhar o harmônio e lembrar-se do seu pai, Silas Gomes dos Santos, que a emocionava quando tocava nos cultos. Ela, ainda menina ... Quando o Rev. Borges começou a realizar cultos na Al. Jaú, no Jardim das Oliveiras, para lá levaram o harmônio e lá este recomeçou a soar e soava plenamente, quando o Paulo Herculano40, em 38 Órgão e Harmônio são termos genericamente citados como órgão, seja para Harmônio ou Órgão. 39 Nota de rodapé n.º 19 na pág. 127 da Edição da Livraria O Semeador Ltda. de 1978 40 Paulo Herculano, músico paulista, sobremaneira conhecido, nasceu em Rio Claro, sobrinho neto de Antônio Pedro Cerqueira Leite. 35 1957, atendendo a pedido do Rev. Borges, acompanhava quartetos ou solistas e a congregação e fazia acordar os lindos registros do Harmônio, tocando prelúdios–corais do barroco alemão. Mas, antes do harmônio Hinkel ir para a Al. Jaú, voltou a servir à Igreja Unida, quando, em