Taila de Lima Ferreira RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO NO PROGRAMA DE BEM-ESTAR ANIMAL DO ZOOBOTÂNICO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO - SP São José do Rio Preto 2024 Taila de Lima Ferreira RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO NO PROGRAMA DE BEM-ESTAR ANIMAL DO ZOOBOTÂNICO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO - SP Relatório apresentado ao Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNESP, como parte da exigência para a conclusão do curso de graduação em Ciências Biológicas na modalidade de Bacharelado. Orientador: Dr. Guilherme Guerra Neto Coorientador: Profª. Drª. Lilian Casatti São José do Rio Preto 2024 Taila de Lima Ferreira RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO NO PROGRAMA DE BEM-ESTAR ANIMAL DO ZOOBOTÂNICO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO - SP Relatório apresentado ao Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNESP, como parte da exigência para a conclusão do curso de graduação em Ciências Biológicas na modalidade de Bacharelado. Comissão Examinadora Dr. Guilherme Guerra Neto Orientador MSc. Melissa Freitas da Silva FPZSP/UFSCar Parecerista externo São José do Rio Preto 2024 RESUMO Os zoológicos modernos não têm mais a função apenas de lazer, pois com o passar do tempo com o tempo passaram de espaços de atração e lucro para instituições com funções de conservação, educação ambiental, pesquisa e lazer. Atualmente, possuem crescente preocupação pelo bem-estar dos animais ali presentes. Além disso, também realizam reabilitação e reintrodução de animais ao seu habitat, contribuindo para a conservação das espécies e a manutenção do equilíbrio ecológico. Mesmo com os efeitos negativos que a situação de cativo causa nos animais do plantel, o bem-estar é praticado a partir da aplicação de enriquecimentos ambientais e condicionamento animal. Neste documento são descritas as atividades realizadas no programa de Bem-Estar Animal do Zoobotânico de São José do Rio Preto, que se mostra de grande valor tanto para o aprendizado dos estagiários que realizam as atividades, quanto para os animais que são beneficiados com enriquecimentos ambientais e condicionamento. Palavras-chave: bem-estar, zoológico, enriquecimento ambiental, condicionamento animal. ABSTRACT Modern zoos no longer have just a leisure function, as over time they have changed from spaces of attraction and profit to institutions with functions of conservation, environmental education, research and leisure. Currently, they are increasingly concerned about the well-being of the animals present there. In addition, they also carry out rehabilitation and reintroduction of animals to their habitat, contributing to the conservation of species and the maintenance of ecological balance. Even with the negative effects that the captive situation causes on the animals in the herd, welfare is practiced through the application of environmental enrichments and animal conditioning. This document describes the activities carried out in the Animal Welfare program of the Zoobotânico de São José do Rio Preto, which proves to be of great value both for the learning of the interns who carry out the activities, and for the animals that benefit from environmental enrichment and conditioning. Keywords: welfare, zoo, environmental enrichment, animal conditioning. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Entrada do Zoobotânico Municipal de São José do Rio Preto. 13 Figuras 2, 3 e 4: Enriquecimento Ambiental do tipo alimentar para papagaios (Amazona sp.), Cervos Dama (Dama dama) e Rapinantes do Zoobotânico, respectivamente. 15 Figura 5: Enriquecimento ambiental do tipo físico para coruja-buraqueira (Athene cunicularia). 15 Figura 6: Enriquecimento ambiental do tipo físico e sensorial para gato-do-mato (Leopardus tigrinus). 15 Figura 7: Enriquecimento ambiental do tipo físico e cognitivo para gato-do-mato (Leopardus tigrinus). 16 Figura 8: Enriquecimento ambiental do tipo alimentar e cognitivo para papagaios (Amazona sp.) 16 Figura 9: Enriquecimento ambiental do tipo alimentar e sensorial para Cervos Dama (Dama dama). 16 Figura 10: Ambientação de recinto de duas cobras-do-milho (Pantherophis guttatus). 18 Figura 11: Instrumentos utilizados para o condicionamento. Targets, clicker e apito. 20 Figuras 12 e 13: Condicionamento com tucano-toco (Ramphastos toco) e lobo-guará (Chrysocyon brachyurus). 21 Figuras 14 e 15: Condicionamento com macacos-prego (Sapajus sp.). 21 Figuras 16 e 17: Pesagem de gato-do-mato (Leopardus tigrinus) e de filhote de onça-parda (Puma concolor) utilizando condicionamento. 22 Figura 18: Pesagem tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) utilizando indução. 22 Figuras 19 e 20: Coleta de sangue de lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e vacinação de Anta (Tapirus terrestris). 23 Figuras 21, 22 e 23: Ambientação de recinto de papagaios (Amazona sp.) com poleiros e elementos para estimular o desgaste do bico. 24 Figura 24: Ambientação do recinto de coruja-buraqueira (Athene cunicularia). 25 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 10 2. LOCAL DE ESTÁGIO 11 3. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS 13 3.1 Enriquecimento ambiental 13 3.2 Serpentário 187 3.3 Condicionamento animal 19 3.4 Ambientação de recintos 23 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 255 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 26 10 1. INTRODUÇÃO A cultura de manutenção de animais silvestres em cativeiro datam desde as antigas civilizações egípcias, que os mantinham em seus templos e os utilizavam como símbolo de poder. Com o passar do tempo, a prática se perpetuou na nossa sociedade, em que possuir animais silvestres significava status social (Sanders e Feijó 2007), hábito visto até o momento atual. O histórico dos zoológicos públicos iniciou-se no século XVIII, porém, mesmo com outras finalidades inicialmente, os animais passaram a ser utilizados como atração, lazer e lucro. Consequentemente, ocorre a retirada desnecessária das espécies do seu habitat natural e explorados dentro das instituições da época, onde até mesmo os recintos eram planejados de forma a proporcionar ao visitante melhor visão do animal sem visar o bem-estar (Sanders e Feijó, 2007). Após a criação do “Stellingen Zoo” em Hamburgo, na Alemanha, em 1900, houve uma mudança significativa no espaço destinado aos animais, com ambientações mais complexas a fim de simular o habitat natural da espécie. A fundação deste jardim zoológico influenciou diversas outras instituições a realizarem mudanças em seus recintos (Bostock 1998, apud em Sanders e Feijó 2007). Atualmente, mesmo ainda fornecendo entretenimento e lazer, os jardins zoológicos possuem outras funções na sociedade, já que a evolução que a comunidade alcançou permitiu a criação de programas de preservação de espécies ameaçadas e desenvolvimento da educação ambiental com o público (Rabello, 2020). Assim, Segundo Azevedo e Barçante (2018), os quatro pilares e funções destas instituições são: conservação, educação ambiental, pesquisa científica e lazer, sendo assim, a preocupação com o bem-estar dos animais silvestres em cativeiro são de crescente interesse. Segundo Molento (2007), o objetivo geral de se proporcionar bem-estar aos animais é diminuir o sofrimento físico, comportamental e psicológico dos mesmos, aumentando sua qualidade de vida. Deste modo, cinco domínios são utilizados para avaliar o bem-estar do animal: nutrição, ambiente, saúde física, comportamento e mental, sendo este último o resultado da soma dos outros quatro domínios (WAZA, 2015). De acordo com Leira et al. (2017), o estresse é uma resposta a um agente estressor que afeta a homeostasia do animal e ocorre ao tentar adaptar-se à nova condição, a fim de manter este equilíbrio. Esta resposta pode ser definida em três estágios: a reação de alarme, que ocorre ao deparar-se com o agente estressor e consiste na tentativa inicial de habituar-se, adaptação ou 11 resistência, quando o agente estressor mantém-se, e a exaustão, a qual o animal perde a capacidade de adaptar-se após o estímulo não cessar. Caso a natureza do estresse seja um eustresse, ou seja, um estresse necessário à sobrevivência do animal, o indivíduo tende a habituar-se com a presença do estressor e não resulta em fatores prejudiciais, mantendo-se na primeira fase de resposta. Já quando se trata de um distresse, tende a levar o animal à exaustão, afetando a manutenção da homeostasia. Deste modo, ao impedir a homeostasia do animal, o estresse pode manifestar-se no comportamento, resultando em estereotipias e automutilação, por exemplo, comprometendo o bem-estar do indivíduo (Leira et al., 2017). Para o controle do estresse e evitar o distresse, utiliza-se ferramentas a fim de aumentar o bem-estar animal: o enriquecimento ambiental e o condicionamento animal. O enriquecimento tem como objetivo proporcionar diferentes estímulos, distração e incentivar comportamentos naturais do animal. Enquanto o condicionamento tem como finalidade facilitar o manejo e cuidados com os animais silvestres (Garcia, 2021). Os zoológicos modernos também desempenham o papel de resgate, reabilitação e soltura de animais silvestres injuriados, vítimas do tráfico ilegal, filhotes órfãos e entregas voluntárias, que são resultados das ações antrópicas, tanto realizadas diretamente ao animal, quanto destruindo seu habitat natural (Rabelo, 2020; Leira et al. 2017). Portanto, ao decorrer deste documento relato a minha experiência com atividades de bem-estar animal no Zoobotânico Municipal de São José do Rio Preto, aplicando técnicas de enriquecimento ambiental e condicionamento animal com os animais do plantel durante 570 horas de estágio. 2. LOCAL DE ESTÁGIO O Zoobotânico Municipal de São José do Rio Preto foi fundado em 1973 e está localizado no bairro Jardim Nazareth, no estado de São Paulo. A reforma do Zoobotânico iniciou-se no dia 20 de fevereiro de 2023 e foi finalizada em 01 de outubro de 2024, portanto as informações presentes neste documento são referentes ao período de fevereiro a outubro de 2024. A instituição conta com uma cozinha onde são preparados os tratos diários, baseados nas recomendações nutricionais e estado de saúde do animal, os setores administrativos, serviços gerais e onze tratadores que dividem as tarefas dentro dos quatro setores do zoológico. 12 Por sua vez, os setores são divididos em recintos, que podem abrigar mais de um animal, sendo eles: setor Clínica, setor Hipopótamo com 18 recintos, setor Leão com 9 recintos e o setor Macaco com 16 recintos. Além disso, o Serpentário, que pertence ao setor Macaco, possui 18 recintos internos, 3 recintos externos e 7 recintos de aracnídeos, além do biotério, que comporta os roedores, tenébrios e baratas. Com o fim da revitalização do zoológico esta divisão entre setores modificou-se em trilhas, sendo: trilha Onça-pintada, trilha Lobo-guará, trilha Tamanduá-bandeira e o setor Clínica, que mantém-se apesar das mudanças. O sistema descrito neste documento segue sendo dos quatro setores. Figura 1: Entrada do Zoobotânico Municipal de São José do Rio Preto. Fonte: Acervo Zoobotânico. O setor Clínica é composto pela equipe de Médicos Veterinários, estagiários da área e três tratadores responsáveis pelo setor extra, quarentenário, maternidade e recintos externos (RAC), visto que 3 recintos destes são destinados ao teste de vôo, para a reabilitação de aves com intuito de soltura. Neste setor não há um número fixo de animais, devido a grande rotatividade entre soltura e recebimento. Os animais recebidos no zoológico são trazidos pela Policia Militar Ambiental e pelo IBAMA, provindos de diversos motivos, como desastres ambientais, entrega voluntária de animais silvestres mantidos ilegalmente, filhotes órfãos, animais injuriados e apreensão de animais destinados ao comércio ilegal. Os médicos veterinários do setor Clínica são responsáveis pelo recebimento e posterior análise da condição de saúde dos animais e quando possível, são destinados à soltura ou inseridos no plantel dependendo das condições do indivíduo após a recuperação. 13 Durante a reforma foi necessário a realocação dos animais do plantel em recintos extras conforme os recintos definitivos estavam sendo construídos ou revitalizados, utilizando até mesmo os recintos RAC. O Zoobotânico possui um programa de Bem-Estar Animal, o qual tem as atividades realizadas por estagiários da área das Ciências Biológicas, divididas em dois tipos: o enriquecimento ambiental e o condicionamento animal. O enriquecimento ambiental conta com pelo menos um estagiário por setor, e realizamos uma rotatividade dos setores designados para cada um a cada três meses. Também há estagiários exclusivos do serpentário, que são responsáveis principalmente por atividades com os répteis ali presentes, mas também com os animais do biotério, como os roedores. O condicionamento conta com quatro estagiários, que realizam os treinos no período de disponibilidade, com sessões pela manhã e à tarde. Além disso, há uma rotatividade a cada 6 meses com outros estagiários. As atividades do programa de Bem-Estar Animal são supervisionadas pelo gestor Guilherme Guerra Neto, pela tratadora líder Melissa Freitas da Silva até o mês de julho e pelo tratador líder Bruno de Lima Barbosa, de julho até o presente momento. 3. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS As atividades que realizei no Zoobotânico consistem na elaboração, entrega e observação de enriquecimentos ambientais para dois setores, limpeza e ambientação dos recintos do serpentário a cada três meses, condicionamento animal por três meses e ambientação tanto de recintos provisórios, quanto dos recintos definitivos. 3.1 ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL O enriquecimento ambiental consiste em uma técnica para promover o bem-estar animal e minimizar efeitos negativos do cativo, já que encontram-se em um ambiente fora de seu habitat. Portanto, muitos dos seus comportamentos naturais são reprimidos, como a busca por alimentos, levando à diminuição de estímulos do animal. Dito isso, de acordo com a condição do animal e necessidades da espécie, são utilizadas técnicas de enriquecimento, que podem ser de cinco categorias: alimentar, sensorial, físico, social e cognitiva, de preferência à estimular os comportamentos naturais da espécie (Sanders e Feijó, 2007). 14 Segundo Saad et al. (2011), diversos comportamentos podem ter alterações com a aplicação de enriquecimentos ambientais, como melhora nas condições gerais de saúde, diminuição de hormônios suprarenais relacionados ao estresse, redução de estereotipias, redução de agressão intraespecífica, melhora no comportamento social e diminuição do nível de excitabilidade dos animais diante dos procedimentos de manipulação experimentais (Frajblat et al., 2008 apud Saad et al., 2011). Os enriquecimentos alimentares podem ser descritos como uma forma diferente de ofertar o alimento, muitas vezes estimulando o animal para a obtenção do trato, assim como no ambiente natural. Já os enriquecimentos sensoriais tem como objetivo estimular os cinco sentidos do animal, portanto materiais com aromas e texturas diferentes são utilizados, como diferentes substratos, temperos e sangue. Os enriquecimentos físicos compreendem a mudança da paisagem do recinto, também chamado de ambientação, na tentativa de aproximar-se do habitat da espécie, utilizados elementos como, madeiras, poleiros, vegetação e substratos diferentes. Ademais, o enriquecimento social consiste na interação intra ou interespecífica dos animais, estimulando principalmente animais de hábito social. Por fim, o enriquecimento cognitivo tem como objetivo trabalhar a capacidade de resolução de problemas dos animais. A mistura das categorias também é possível, como fiz no período que atuei no enriquecimento ambiental no Zoobotânico, onde utilizei de enriquecimentos alimentares envolvidos com atividades cognitivas e físicas para a obtenção do alimento, simulando a experiência do habitat natural. Atividades sensoriais também são de agrado de diversas espécies do plantel, como a utilização de camomila e canela para felídeos e vinagre para tamanduás, simulando o aroma de formigas. 15 Figuras 2, 3 e 4: Enriquecimento Ambiental do tipo alimentar para papagaios (Amazona sp.), Cervos Dama (Dama dama) e Rapinantes do Zoobotânico, respectivamente. Fonte: Acervo Zoobotânico Figura 5: Enriquecimento ambiental do tipo Figura 6: Enriquecimento ambiental do tipo físico físico para coruja-buraqueira (Athene cunicularia). e sensorial para gato-do-mato (Leopardus tigrinus). Fonte: Acervo Zoobotânico. 16 Figura 7: Enriquecimento ambiental do tipo físico Figura 8: Enriquecimento ambiental do tipo e cognitivo para gato-do-mato (Leopardus tigrinus). alimentar e cognitivo para papagaios (Amazona sp.). Fonte: Acervo Zoobotânico. Figura 9: Enriquecimento ambiental do tipo alimentar e sensorial para Cervos Dama (Dama dama). Fonte: Acervo Zoobotânico. No setor Hipopótamo desenvolvi atividades de enriquecimentos ambientais de fevereiro à maio com dois carrapateiros (Milvago chimachima), dois carcarás (Caracara plancus), duas suindaras (Tyto furcata), uma coruja-orelhuda (Asio clamator), uma coruja-buraqueira (Athene cunicularia), dois gaviões-de-rabo-branco (Geranoaetus albicaudatus), um mutum-de-penacho (Crax fasciolata), duas jacupembas (Penelope superciliaris), cerca de 15 papagaios (Amazona sp.), uma casuar de capacete (Casuarius casuarius), dois macacos-aranha-de-cara-branca 17 (Ateles marginatus), diversos jabutis (Chelonoidis sp.), um queixada (Tayassu pecari), um javaporco (Sus scrofa), dois cervos-dama (Dama dama), um cervo-nobre (Cervus elaphus) e dois hipopótamos-comum (Hippopotamus amphibius). Já no setor Clínica, tive a oportunidade de trabalhar com diversas espécies devido à grande rotatividade de indivíduos, além dos animais do plantel que estavam provisoriamente em recintos deste setor. Os animais dos testes de vôo com os quais desenvolvi enriquecimentos incluíram diversos papagaios (Amazona sp.) e maritacas (Pionus sp.), tanto do plantel quanto em reabilitação para soltura, dez araras-canindé (Ara ararauna), um tucano-toco (Ramphastos toco), um mutum-de-penacho (Crax fasciolata), duas jacupembas (Penelope superciliaris), um canário (Sicalis flaveola), um udu-de-coroa-azul (Momotus momota), um anu-preto (Crotophaga ani) e outros passeriformes. Além disso, desenvolvi atividades com diversos tamanduás-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), tanto jovens quanto adultos, um filhote de veado-catingueiro (Mazama gouazoubira), um filhote de gato-do-mato (Leopardus tigrinus), uma jaritataca (Conepatus semistriatus), passeriformes em gaiolas para reabilitação, um macaco-prego (Sapajus sp.), três saguis (Callithrix jacchus) e um papagaio-galego (Alipiopsitta xanthops). Os animais liberados para a implementação de enriquecimentos no setor são aqueles que já estavam com o quadro de saúde estável, realocações do plantel e indivíduos levemente debilitados, onde as atividades não apresentariam riscos. Para esses, há uma grande restrição quanto aos alimentos e materiais utilizados nos enriquecimentos. No Programa de Bem-Estar, realizei as atividades de enriquecimento diariamente, sendo necessário a elaboração de uma planilha com os enriquecimentos planejados para cada animal, para que o tratador líder realizasse a análise com o objetivo de garantir que não houvesse uso de materiais restritos para a espécie. As implementações dos enriquecimentos foram realizadas na presença de um tratador do setor e a periodicidade foi determinada pela necessidade de cada animal e partir das observações feitas, uma vez que animais que apresentavam comportamentos atípicos, como estereotipia e automutilação, houve necessidade de aumentar a frequência e dificuldade dos enriquecimentos, já que se encontravam em estresse. 18 3.2 SERPENTÁRIO O serpentário do Zoobotânico é composto por uma sucuri verde (Eunectes murinus), três jiboias (Boa constrictor amarali e Boa constrictor constrictor), uma cobra-cega (Amphisbaena alba), três pítons birmanesas (Python molurus bivittatus), uma cobra rateira oriental (Pantherophis obsoletus), três píton bola (Python regius), dez cobras-do-milho (Pantherophis guttatus) e duas suaçuboia (Corralus hortulanos). Além disso, há sete recintos de aranhas, constituído por duas tarântulas-mexicana-de-joelho-vermelho (Brachypelma hamorii), duas tarântulas de pernas vermelhas (Brachypelma boehmei), uma tarântula-zebra- da-costa-rica (Aphonopelma seemanni), uma caranguejeira-brasileira (Lasiodora sp.) e uma caranguejeira-rosa-salmão-brasileira (Lasiodora parahybana). No serpentário, realizei limpeza e ambientação dos recintos das serpentes com a ajuda de outros estagiários e funcionários. A limpeza foi realizada a cada três meses, visto que os recintos foram divididos entre os indivíduos presentes, realizando a retirada das serpentes e de quaisquer materiais presentes no recinto, a limpeza, ambientação e realocação das serpentes. As ambientações foram elaboradas de acordo com os hábitos das espécies, como serpentes com hábitos arborícolas requerem estruturas elevadas, enquanto espécies como serpentes com hábitos aquáticos necessitam de elementos mais próximos do tanque de água. Além disso, materiais como folhas secas, feno, casca de pinus e areia também foram usados como substrato, proporcionando diferentes estímulos às serpentes. Figura 10: Ambientação de recinto de duas cobras-do-milho (Pantherophis guttatus). Fonte: Acervo Zoobotânico 19 3.3 CONDICIONAMENTO ANIMAL O condicionamento consiste na associação de mais de um estímulo e o aprendizado do animal a partir desta associação. O histórico do condicionamento possui um marco importante com a atuação de Ivan Pavlov, que propôs o condicionamento clássico a partir de seus experimentos com cães, associando a carne, como um estímulo incondicionado, desencadeando uma resposta incondicionada nos cães, a salivação. Posteriormente, ao associar um estímulo sonoro com a apresentação da carne ao animal, a salivação ocorreu apenas com o estímulo sonoro. Portanto, o som, anteriormente considerado um estímulo neutro, já que não desencadeava resposta quando apresentado isolado, passa a ser considerado um estímulo condicionado e a salivação uma resposta condicionada (Garcia, 2021). Posteriormente, Frederic Skinner propôs o condicionamento operante a partir da Lei de Thorndike, a qual descreve que um comportamento desencadeia uma consequência e, caso seja de natureza positiva, o animal tende a repetir o comportamento, da mesma forma que uma consequência negativa tende a resultar em menos frequência no comportamento (Garcia, 2021). No condicionamento utilizado para treinar os animais silvestres, a abordagem positiva é a mais utilizada, sendo a consequência descrita como um “reforço positivo”, que deve ser entregue ao animal logo após o comportamento realizado. Neste ponto, é possível a introdução de um estímulo ponte, como o clicker, recriando então o condicionamento clássico, ao associar o som do clicker com o reforço positivo (Garcia, 2021). Para o condicionamento no Zoobotânico, utilizamos a técnica do condicionamento operante, onde o reforço positivo são “recompensas’’, geralmente um alimento que o animal aprecia, e os estímulos ponte chamamos de marcadores, como o clicker ou apito, e marcadores verbais, como as palavras good e yes. Portanto, ao animal realizar o comportamento esperado, acionamos o marcador e entregamos a recompensa e repetimos esse ciclo algumas vezes durante a sessão de treinos. Um dos métodos existentes para guiar o animal a realizar o comportamento desejado é a utilização de targets, que facilita o aprendizado de novos comportamentos, assim como exemplificado na figura 11. 20 Figura 11: Instrumentos utilizados para o condicionamento. Targets, clicker e apito. Fonte: Acervo Zoobotânico. Atuei no condicionamento por três meses, acompanhada por mais três estagiárias do programa de Bem-Estar Animal. Diariamente realizamos o preparo das recompensas e os treinos de acordo com o planejamento e necessidade, como transporte para novos recintos. Uma vez por semana, os adestradores Dante Camacho e Laís Milani acompanham as atividades do condicionamento, fornecendo auxílio para ajustes e mudanças nos treinos. No Zoobotânico, realizamos o condicionamento com aproximadamente 55 animais, sendo eles três veados-catingueiros (Mazama gouazoubira), dois cervos-dama (Dama dama), três cachorros-do-mato (Cerdocyon thous), um filhote de gato-do-mato (Leopardus tigrinus), dois ouriços-cacheiros (Erinaceus europaeus), uma jacupemba (Penelope superciliaris), dois macacos-aranha-de-cara-branca (Ateles marginatus), dois macacos-aranha-de-cara-preta (Ateles chamek), cinco macacos-prego (Sapajus sp.), um filhote de onça-parda (Puma concolor), uma onça-parda adulta (Puma concolor), dois lobos-guará (Chrysocyon brachyurus), um tucano-toco (Ramphastos toco), uma garça-vaqueira (Bubulcus ibis), um quati (Nasua nasua), quatro antas (Tapirus terrestris), aproximadamente quinze araras (Ara sp.), uma jaguatirica (Leopardus pardalis), um queixada (Tayassu pecari), um javaporco (Sus scrofa), dois hipopótamos (Hippopotamus amphibius), uma ema (Rhea americana), um casuar (Casuarius casuarius), um emu (Dromaius novaehollandiae) e diversos tamanduás-bandeira (Myrmecophaga tridactyla). 21 Figuras 12 e 13: Condicionamento com tucano-toco (Ramphastos toco) e lobo-guará (Chrysocyon brachyurus). Fonte: Acervo Zoobotânico. Figuras 14 e 15: Condicionamento com macacos-prego (Sapajus sp.). Fonte: Acervo Zoobotânico. Semanalmente realizamos a pesagem dos animais, que possuem a periodicidade determinada de acordo com o planejamento e necessidade, podendo ser semanal, quinzenal ou mensal. Os animais que pesamos semanalmente foram principalmente os tamanduás-bandeira do setor Clínica, que chegaram ao zoológico ainda filhotes e necessitam do acompanhamento do peso para determinar o crescimento saudável. Para realizar a pesagem dos tamanduás 22 utilizamos um equipamento similar a um target, porém com um copo na ponta com ovo cru dentro, para indução do animal até a balança, como na Figura 18. Outros animais utilizamos o treino ou indução a recompensa. Figuras 16 e 17: Pesagem de gato-do-mato (Leopardus tigrinus) e de filhote de onça-parda (Puma concolor) utilizando condicionamento. Fonte: Acervo Zoobotânico. Figura 18: Pesagem tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) utilizando indução. Fonte: Acervo Zoobotânico. Durante três semanas acompanhei as atividades observando e me aproximando dos animais, para que se habituassem com a minha presença. Após esse período, passei a realizar os treinos gradualmente, com o auxílio e supervisão de duas estagiárias que já possuíam experiência no condicionamento. 23 O condicionamento proporciona menos estresse no animal e maior facilidade para manejo veterinário, como aplicação de medicamentos e vacinas, coleta de sangue, avaliação da saúde física do animal e pesagens, sendo feitas sem a contenção invasiva ou sedação. Em minha experiência neste período, presenciei a primeira coleta de sangue de um lobo-guará sem contenção química ou física, resultado de um longo caminho de dessensibilização do animal. Também realizamos o condicionamento para a coleta de sangue e aplicação de vacinas contra a raiva em 3 antas do plantel, onde foi possível realizar os procedimentos com facilidade tanto para os animais, quanto para os Médicos Veterinários. Figuras 19 e 20: Coleta de sangue de lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e vacinação de Anta (Tapirus terrestris). Fonte: Acervo Zoobotânico. 3.4 AMBIENTAÇÃO DE RECINTOS Ambientações são enriquecimentos ambientais do tipo físico e tem como objetivo simular o habitat natural da espécie. É importante que os componentes do recinto criem condições para a manutenção da saúde em geral, seja mentalmente, emocionalmente e fisicamente, para que se mantenham aptos a lidar com estressores diários que o cativeiro apresenta (WAZA, 2015). Para que uma ambientação seja positiva é necessário o planejamento baseado nas características da espécie, quantidade de elementos no recinto, já que podem causar diferentes estímulos e a capacidade do animal de realizar seus comportamentos naturais (WAZA, 2015). 24 Deste modo, para elaborar um ambiente favorável ao animal é necessário compreensão do repertório comportamental da espécie e forma de interação com os componentes do seu habitat natural. Neste período de estágio, participei das ambientações de recintos provisórios, definitivos e de animais em reabilitação. Alguns dos recintos que realizei ambientação foram de maritaca, corujas-suindara em reabilitação, coruja-buraqueira, iguanas, saguis, ouriço cacheiro, coruja-de-orelha, gavião-de- cauda-branca, onças-parda, casuar-de-capacete, jaguatirica e papagaios. Os elementos utilizados nas ambientações foram escolhidos de acordo com os hábitos da espécie, fisiologia, condição atual do animal e restrições de materiais, como aves, que necessitam de poleiros de acordo com o porte da espécie, e animais com alguma deficiência, como aves que não voam e necessitam de poleiros com contato ao chão para possibilitar o alcance de poleiros mais altos. Figuras 21, 22 e 23: Ambientação de recinto de papagaios (Amazona sp.) com poleiros e elementos para estimular o desgaste do bico. Fonte: Acervo Zoobotânico. 25 Figura 24: Ambientação do recinto de coruja-buraqueira (Athene cunicularia). Fonte: Acervo Zoobotânico. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Integrar a equipe de estagiários do Zoobotânico de São José do Rio Preto foi uma experiência enriquecedora, repleta de diferentes aprendizados acerca dos animais silvestres e seus comportamentos. Presenciar os resultados do condicionamento e enriquecimento no dia a dia apenas reforçou a importância do trabalho do Biólogo no Bem-Estar animal, principalmente para o manejo no transporte e coleta de amostras biológicas. O Zoobotânico de São José do Rio Preto realiza seu papel na sociedade com excelência, promovendo o bem-estar desses animais sempre que possível, desenvolvendo atividades de educação ambiental e participando de programas de conservação. A reabilitação dos animais injuriados feita pela equipe de Médicos Veterinários demonstra grande esforço e resultados favoráveis, promovendo uma vida sem desconforto ao animal e, quando possível, a reintrodução na natureza, sendo de grande importância para a manutenção da fauna local. 26 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO, Cristiano Schetini de; BARÇANTE, Luciana. Enriquecimento ambiental em zoológicos brasileiros: em busca do bem-estar animal. Revista Brasileira de Zoociências, v. 19, p. 15-34, , 2018. Disponível em: . 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