Eurides Costa Tavares Nogueira 50 anos de ciência da informação no Brasil: trajetória e consolidação, a partir do periódico Ciência da Informação Marília - SP 2023 Eurides Costa Tavares Nogueira 50 anos de ciência da informação no Brasil: trajetória e consolidação, a partir do periódico Ciência da Informação Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação como parte das exigências para a obtenção do título de Doutora em Ciência da Informação pela Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Marília Área de concentração: Informação, Tecnologia e Conhecimento. Linha de Pesquisa: Produção e Organização da Informação Orientadora: Ely Francina Tannuri de Oliveira Coorientadora: Leilah Santiago Bufrem Marília - SP 2023 N7785 Nogueira, Eurides Costa Tavares. 50 ANOS DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NO BRASIL: trajetória e consolidação, a partir do periódico Ciência da Informação / Eurides Costa Tavares Nogueira. - Marília, 2023. 111f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – UNESP, Marília/SP, 2023. Referências bibliográficas: f. 82 – 94. Orientadora: Ely Francina Tannuri de Oliveira Coorientadora: Leilah Santiago Bufrem 1.Ciência da Informação no Brasil. 2. Correntes teóricas da CI. 3. Acoplamento Bibliográfico de Período. 4. Periódico Ciência da Informação. 5. Bibliometria. 6. Estudos Métricos da Informação. 7. Cientometria. Eurides Costa Tavares Nogueira 50 anos de ciência da informação no Brasil: trajetória e consolidação, a partir do periódico Ciência da Informação Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação como parte das exigências para a obtenção do título de Doutora em Ciência da Informação pela Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Marília Área de concentração: Informação, Tecnologia e Conhecimento. Linha de Pesquisa: Produção e Organização da Informação Membros das Banca Examinadora 1. Titular. Prof(a). Dr(a). ELY FRANCINA TANNURI DE OLIVEIRA – UNESP/Marília 2. Titular. Prof(a). Dr(a). MARIA CLÁUDIA CABRINI GRÁCIO – UNESP/Marília 3. Titular. Prof(a). Dr(a). HELEN DE CASTRO SILVA CASARIN – UNESP/Marília 4. Titular. Prof(a). Dr(a). SAMILE ANDREA DE SOUZA VANZ – UFRGS/Porto Alegre 5. Titular. Prof(a). Dr. FÁBIO MASCARENHAS E SILVA – UFPE/Recife Marília/SP, 27 de março de 2023. Agradecimentos Agradeço a Deus pela força necessária e diária, também por não me deixar desistir. Existiram dias de choro, desespero, inquietação e em meio a tudo isso, a certeza de que eu iria conseguir. Nunca duvidei de minha capacidade, mas em alguns momentos o fardo pesou sobre meus ombros e eu caí. É uma caminhada longa e solitária. Obrigada à Universidade Estadual Paulista-UNESP campus Marilia/SP, pelo apoio institucional durante o curso, na participação dos eventos, na publicação de trabalhos e pela oportunidade de fazer parte de uma das melhores instituições do país na área de Ciência da Informação. Obrigada à Universidade Estadual de Londrina – UEL, instituição pela qual passei e guardo ótimas lembranças, que despertou meu interesse pela pesquisa e que foi casa por dois anos e meio durante o mestrado. Agradeço principalmente à biblioteca Central pelo espaço oferecido para estudo e também por todo apoio e suporte das bibliotecárias do setor de referência. Estou imensamente grata ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão – IFMA, campus Codó, por me proporcionar a chance de adquirir os conhecimentos necessários para atender com eficiência às exigências institucionais, além de me ajudar a alcançar meus objetivos pessoais. Agradeço à minha orientadora Ely Francina Tannuri de Oliveira, obrigada por ter me ajudado a concluir a minha tese de doutorado. Tudo o que eu aprendi com você me ajudou muito a evoluir como pesquisadora e poder compartilhar isso comigo foi uma honra. O seu guia, apoio e orientação foram cruciais para o sucesso deste projeto e estou muito grata por tudo o que você fez por mim. Espero manter o bom trabalho e poder continuar contando com sua colaboração no futuro. Assim como a minha coorientadora Leilah Santiago Bufrem, o meu muito obrigada por todo o seu apoio durante a minha tese de doutorado. Sem a sua orientação, não teria sido possível concluí-la. Obrigada também pelas muitas horas que passou lendo e corrigindo meus textos. Sua ajuda foi crucial para o meu sucesso. Agradeço à banca composta para a defesa pelo tempo e atenção dados a minha pesquisa e por sua rica colaboração. Agradeço aos meus pais, familiares e amigos, em especial a minha vó Maria Nogueira Tavares (in Memoriam), por ter suportado a dor da minha ausência e da saudade. Muitas vezes amenizada por uma ligação de vídeo, cheia de boas risadas, amor, carinho e atenção. Agradeço às amigas Eliane Maria da Silva Jovanovich, Vilma Aparecida Feliciano Sanglard e também a Elisangela Celli, por todo apoio e principalmente pela amizade. Ter uma amizade verdadeira em tempos de amor liquido é raro e valioso. Agradeço com todo meu amor a Ketlen Cristina Sá de Souza pela paciência, por se fazer presente, pela dedicação, amor e companheirismo. Em tempos difíceis quem permanece ao seu lado merece o seu reconhecimento. Esses quatro anos foram complicados, mas os últimos dois anos principalmente. E você escolheu ficar. Desejo expressar minha gratidão a Cleonice Arrais por ter me ajudado com a revisão em português. Por fim, quero agradecer a mim mesmo. Por não me desanimar diante das adversidades, por reconhecer meus próprios erros, por não ter desistido. Sei que não preciso ser sempre tão forte, mas ter a resistência necessária para suportar e enfrentar o que vier. E essa coragem, acredito, vem da fé. Resumo Em 1970, o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) iniciou o curso de pós-graduação em nível de mestrado em Ciência da Informação no Brasil e América Latina. Dois anos mais tarde, lançou a revista com o mesmo nome, tornando-se assim o primeiro periódico científico da área no país, destinado à divulgação dos resultados da pós-graduação em Ciência da Informação. Comemorando seu 50º aniversário, torna-se relevante a compreensão do conteúdo de suas publicações ao longo das últimas cinco décadas. Adota como metodologia a observação das variações de acoplamento, especificamente o Acoplamento Bibliográfico de Autor, identificando os autores mais citados e utilizando o Acoplamento Bibliográfico de Período para reunir os autores mais citados ao longo de dez períodos de cinco anos, permitindo identificar tanto os pesquisadores transeuntes como os permanentes e transgeracionais. Apresenta, ainda, uma percepção mais aprofundada das temáticas abordadas pela Ciência da Informação, bem como o desenvolvimento de suas principais correntes teóricas no Brasil. Como recurso para análise dos dados, utiliza o The Coupler, uma ferramenta online útil para gerar Redes de Acoplamento Bibliográfico, Frequências de Acoplamento, Unidades de Acoplamento, Matriz de Citação e Matriz de Acoplamento, adotando para a normalização dos resultados, o cosseno de Salton e o índice de Jaccard. Investiga a contribuição dos pesquisadores mais citados nos últimos 50 anos na revista Ciência da Informação e constata que 98% deles receberam entre quatro a uma citação. Observa, por outro lado, que os 304 autores com cinco citações ou mais correspondem a 2% dos pesquisadores analisados nesta investigação. Conclui-se, que após cinco décadas de institucionalização da Ciência da Informação no Brasil, é possível afirmar que os primeiros vinte anos desta área estavam profundamente relacionados à Bibliometria. No entanto, apesar de seu foco atualmente se voltar para a dimensão social, a CI ainda preserva um vínculo estreito com a Teoria Matemática, à Documentação, as Técnicas Bibliométricas e os Estudos Métricos de Informação. Palavras-chave: Ciência da Informação no Brasil; Correntes teóricas da CI; Acoplamento Bibliográfico de Período; Periódico Ciência da Informação; Bibliometria; Estudos Métricos; Cientometria. Abstract In 1970, the Brazilian Institute of Information Science and Technology (IBICT) started a graduate course in Information Science in Brazil and Latin America. Two years later, it launched the journal with the same name, thus becoming the first scientific journal of the area in the country, aimed at disseminating the results of graduate studies in Information Science. Celebrating its 50th anniversary, it becomes relevant to understand the content of its publications over the last five decades. It adopts as methodology the observation of the coupling variations, specifically the Author Bibliographic Coupling, identifying the most cited authors and using the Period Bibliographic Coupling to gather the most cited authors along ten five-year periods, allowing the identification of both transient and permanent and trans-generational researchers. It also presents a deeper insight into the themes addressed by Information Science, as well as the development of its main theoretical currents in Brazil. As a resource for data analysis, it uses The Coupler, a useful online tool to generate Bibliographic Coupling Networks, Coupling Frequencies, Coupling Units, Citation Matrix and Coupling Matrix, adopting for the normalization of the results, Salton's cosine and Jaccard's index. It investigates the contribution of the most cited researchers in the last 50 years in the journal Information Science and finds that 98% of them received between four and one citation. It notes, on the other hand, that the 304 authors with five citations or more correspond to 2% of the researchers analyzed in this investigation. In conclusion, after five decades of institutionalization of Information Science in Brazil, it is possible to affirm that the first twenty years of this area were deeply related to Bibliometrics. However, despite its current focus on the social dimension, IC still preserves a close link with Mathematical Theory, Documentation, Bibliometric Techniques and Information Metrics Studies. Keywords: Information Science in Brazil; IC theoretical currents; Period Bibliographic Coupling; Periodical Information Science; Bibliometrics; Metric Studies; Scientometrics. Lista de Quadros Quadro 1 - Grupos de trabalhos do ENANCIB e suas ementas ................................................ 27 Quadro 2 - Programas de pós-graduação em Ciência da Informação no Brasil, Mestrado acadêmico/profissional e Doutorado ............................................................................................... 30 Quadro 3 - Volumes temáticos do periódico Ciência da Informação do IBICT ao longo dos anos ...................................................................................................................................................... 45 Quadro 4 - Relação entre a intensidade de citação e a frequência nos períodos .................. 52 Quadro 5 - Autores mais citados e intensidade de citação recebida nos 1.018 artigos, veiculados pela revista Ciência da Informação no período de 1972 a 2021 ............................ 54 Quadro 6 - Matriz de valores absolutos de acoplamento bibliográfico por período ................ 62 Quadro 7 - Força de acoplamento entre os períodos, normalização por Cosseno de Salton e autores acopladores. ......................................................................................................................... 64 Quadro 8 - Quantidade de períodos de permanência dos autores ........................................... 72 Lista de Gráficos Gráfico 1 - Ranking de maior intensidade de citação e de frequência nos períodos: uma amostra dos pesquisadores com alto índice de citações recebidas .......................................... 53 Gráfico 2 - Rede da força de acoplamento bibliográfico por período, normalizada por cosseno de Salton. ............................................................................................................................................. 63 Lista de siglas AB – Acoplamento Bibliográfico ABA – Acoplamento Bibliográfico de Autor ABEBD – Associação Brasileira de Ensino de Biblioteconomia e Documentação ABECIN – Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas ABP – Acoplamento Bibliográfico de Período ADI – American Documentation Institute ANCIB – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação ASIS – American Society for Information Science ASIST – American Society for Information Science Technology BRAPCI – Base de Dados em Ciência da Informação CI – Ciência da Informação CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico EMI – Estudos Métricos da Informação ENANCIB – Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação ENIAC – Eletronic Numerical Integrator and Computer FCRB – Fundação Casa de Rui Barbosa FGV – Fundação Getúlio Vargas FID – Federação Internacional de Documentação FUMEC – Fundação Mineira de Educação e Cultura IBBD – Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação IBICT – Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia IBM – International Business Machines IIB – International Institute of Bibliography IID – International Institute of Documentation ISI – Institute of Scientific Information IUPAC – International Union on Pure and Applied Chemistry MEC – Ministério da Educação OJS – Open Journal Systems PDF – Portable Document Format PPGB – Programa de Pós-graduação em Biblioteconomia PPGCI – Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação PPGDA – Programa de Pós-graduação em Gestão de Documentos e Arquivos PPGGOC – Programa de Pós-graduação em Gestão e Organização do Conhecimento PPGMA – Programa de Pós-graduação em Memória e Acervos PPGSIGC – Programa de Pós-graduação em Sistema de Informação e Gestão do Conhecimento SCI – Science Citation Index SciELO – Scientific Eletronic Library Online UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina UEL – Universidade Estadual de Londrina UFAL – Universidade Federal de Alagoas UFBA – Universidade Federal da Bahia UFC – Universidade Federal do Ceará UFCA – Universidade Federal do Cariri UFES – Universidade Federal do Espírito Santo UFF – Universidade Federal Fluminense UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais UFPA – Universidade Federal do Pará UFPB – Universidade Federal da Paraíba UFPE – Universidade Federal de Pernambuco UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFS – Universidade Federal de Sergipe UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina UFSCAR – Universidade Federal de São Carlos UNB – Universidade de Brasília UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNESP – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNIRIO – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas USP – Universidade de São Paulo SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 12 2 CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO .......................................................................... 17 2.1 Ciência da Informação e marcos históricos ......................................... 17 2.2 Ciência da Informação no Brasil ........................................................... 24 3 ESTUDOS MÉTRICOS DA INFORMAÇÃO ................................................... 33 3.1 Análise de citação ................................................................................... 38 3.2 Acoplamento Bibliográfico e Acoplamento Bibliográfico de Autores 41 4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ....................................................... 43 4.1 Objeto da pesquisa: periódico Ciência da Informação ........................ 43 4.2 Procedimentos para coleta e análise de dados ................................... 47 5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS .................................... 51 5.1 Autores considerados pilares científicos em ciência da informação no Brasil a partir do periódico analisado ......................................................... 52 5.2 Correntes teóricas predominantes ........................................................ 69 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 75 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 81 APÊNDICES ...................................................................................................... 95 APÊNDICE A – LISTA DE AUTORES MAIS CITADOS – 1972 A 2021 ........... 96 APÊNDICE B - QUADRO COM OS DEZ PERÍODOS, AUTORES MAIS CITADOS, E SUAS RESPECTIVAS INTENSIDADES DE CITAÇÃO RECEBIDA ......................................................................................................................... 104 1 INTRODUÇÃO Desde que foi institucionalizada a Ciência da Informação (CI) no Brasil, na década de 1970, várias questões surgiram quanto ao seu objeto de pesquisa, sua afirmação enquanto ciência e quanto às correntes teóricas adotadas na literatura científica produzida no país. Para ajudar no processo de institucionalização, a CI contou com a contribuição do desenvolvimento científico e tecnológico, especialmente em relação às dimensões social, cultural e política. O período entre 1969 e 1974 marca o auge do terrorismo de Estado, quando se registrou um maior número de denúncias sobre tortura, invasões de domicílios, assassinatos e desaparecimentos no país. Professores e funcionários públicos sofreram expurgos. Livros, discos, revistas, filmes e peças de teatro foram proibidos. A censura tornou-se extremamente rígida, fazendo com que vários intelectuais e artistas se sentissem duramente perseguidos, sendo obrigados a sair do país (PEIXOTO, 2011). Diante dos desenvolvimentos sociais do Brasil e da necessidade de aprimorar o conhecimento científico nacional, as instituições de ensino superior foram forçadas a buscar soluções para a falta de recursos. Assim, criaram múltiplos projetos de melhoria da qualidade dos programas de pós-graduação, com o objetivo de desenvolver profissionais competentes para promover a ciência brasileira. Estes programas foram alvo de um minucioso diagnóstico e avaliação de seus aspectos estruturais e, também, de aprimorar suas grades de cursos. Ao tempo em que o Brasil contava com catorze instituições de ensino para graduação em Biblioteconomia, a Lei de Diretrizes e Bases (1961) exigia que o Conselho Federal de Educação estabelecesse um currículo mínimo. Em 1962, o Ministério da Educação aprovou a Resolução do Parecer 326, definindo a duração de três anos do curso superior. O Ministério do Trabalho reconheceu a Biblioteconomia como uma profissão liberal em 1959. A Metodologia de Pesquisa tornou-se obrigatória em 1982, fazendo com que houvesse disciplinas de análises quantitativas. (BRASIL... 1961). Havia também três cursos de Arquivologia, regulamentados pelo Decreto 82.590 de 06 de novembro de 1978, e dois de Museologia. O primeiro curso de Museologia no Brasil foi criado em 1932, tendo como local de desenvolvimento o Museu Histórico Nacional. Logo, foi transferido para a Universidade Federal do Estado 13 do Rio de Janeiro (UNIRIO). Já o segundo foi implementado em 1970, na Universidade Federal da Bahia-(UFBA) (TANUS, 2013; FAROL, 2022). Com a reforma universitária de 1968, o contexto foi preparado para gerar grandes expectativas para as universidades. Se, por um lado, foi possível ampliar o acesso aos cursos superiores e aumentar os programas de pós-graduação, discutindo o modelo de universidade ideal para o país, por outro, permitiu que o governo militar controlasse o meio universitário e sufocasse as resistências internas. No entanto, conforme Romanelli (1988, p. 205), foi por meio da educação que as classes médias tiveram a possibilidade de obter melhores postos de trabalho e, com isso, as empresas passaram a contar com profissionais aptos a atender às suas necessidades de pessoal. E assim se inicia o processo de ampliação das universidades, mesmo que isso não tenha suprido plenamente a demanda por ensino superior no país. Laura Garcia Moreno Russo (1966), presidente do Conselho Federal de Biblioteconomia e participante de outras entidades ligadas à área de biblioteconomia no país, defendia a posição do profissional bibliotecário como intermediário entre o mundo dos leitores e o mundo dos livros. Em sua obra sobre a biblioteconomia brasileira, comemorativa dos cinquenta anos do primeiro curso de biblioteconomia no país, recolheu dados informativos sobre 14 cursos então presentes no cenário brasileiro. Para ampliar as possibilidades da área e formar profissionais pesquisadores, foram iniciadas as atividades do Curso de Pós-graduação em Ciência da Informação no país (CPGCI), pois o contexto da época nos revela uma situação pouco favorável aos ideais democráticos, devido à desinformação dos ingressos no ensino superior e à incapacidade crítica, resultante do regime repressivo. Com essas mudanças nas instituições de ensino superior, o governo obteve meios mais eficientes para controle de qualquer manifestação contrária aos seus desígnios. Ao analisar a situação política da época, Ruth Cardoso denunciava que a universidade teria perdido “o papel de fator criador na cultura brasileira” (MOTA,1985, p. 261). A pós-graduação stricto sensu na área de CI no Brasil, viria a ser concretizada na década de 1970, por iniciativa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o Curso passou a ser mantido pelo então Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD), atual Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). O Programa originou-se do Curso de Especialização 14 em Documentação Científica (CDC), criado em 1955, oferecido por cerca de 35 anos ininterruptamente. Em 1970, o IBICT deu início ao curso de mestrado em Ciência da Informação, tornando-se pioneiro na inserção desse campo do conhecimento no Brasil e na América Latina. Fruto de uma parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ao iniciar seu curso, contou com a presença de notáveis docentes estrangeiros como Tefko Saracevic, Wilfrid Lancaster, LaVahn Marie Overmyer, Bert Roy Boyce, Jack Mills, Derek Langridge, John Joseph Eyre, Derek de Solla Price, Engetraut Dahlberg e Suman Datta, especialista indiano na área, que desenvolveu suas atividades na Inglaterra. Grandes nomes da CI, provindos da Europa e dos Estados Unidos, tiveram influência na instituição do curso de mestrado brasileiro, tendo orientado o desenvolvimento de dissertações, conforme explica Pinheiro (2007). Eles traziam consigo pensamentos distintos para o mesmo assunto, refletindo em suas análises as questões culturais e sociais presentes em suas origens. É importante destacar que sua participação na construção da CI no Brasil é considerável e impactante para as novas gerações de pesquisadores. O Mestrado em Ciência da Informação, supervisionado pelas bibliotecárias Célia Ribeiro Zaher e Hagar Espanha Gomes, então presidente e vice-presidente do IBBD, tinha três propósitos principais: capacitar, por meio da pós-graduação, os professores, estudiosos e especialistas em CI; promover estudos avançados na área e, assim, contribuir para o seu progresso; e incrementar os profissionais que já atuavam na área de documentação, comunicação, ciência e tecnologia, objetivando transformar os bibliotecários em pesquisadores. Esta iniciativa se deve ao fato de que muitas vezes os profissionais focavam apenas na aplicação de técnicas, desprezando a investigação (SOUZA, 1990; IBICT, 2021). Em 1972, para apresentar os resultados das pesquisas do curso de mestrado, resultantes das dissertações, o IBBD lançou a revista Ciência da Informação, o primeiro periódico lançado para fomentar o desenvolvimento científico da área no Brasil. Em 2021, o periódico Ciência da Informação completou 50 anos, nesse sentido, torna-se relevante entender o conteúdo de suas publicações por meio das citações feitas em seus artigos, sob o olhar dos pesquisadores produtores dentro da janela temporal de 50 anos. A problemática desse trabalho converge para a questão 15 de pesquisa dela decorrente: qual é o conjunto de cientistas que ajudou a moldar o caminho percorrido pela CI no país ao longo dos últimos 50 anos? Para responder a essa questão, objetiva-se analisar quais autores se fizeram presentes, as correntes teóricas existentes, como se constitui e se consolida a ciência da informação no Brasil. Mais especificamente, pretende-se: a) apontar quais caminhos científicos a Ciência da Informação percorreu; b) verificar quais correntes teóricas fundamentaram a Ciência da Informação no Brasil ao longo dos 50 anos; c) identificar os autores que fundamentaram e se destacaram em diferentes momentos desse percurso, utilizando para tanto, a análise de Acoplamento Bibliográfico de Autores; d) verificar se há pesquisadores transgeracionais na CI no Brasil, por meio do Acoplamento Bibliográfico de Período. Neste momento histórico dos 50 anos de existência da Ciência da Informação no Brasil, contados a partir da implantação do curso em 1970, esta pesquisa se justifica pela grande relevância em compreender seu desenvolvimento e consolidação científica no país, bem como, identificar os autores transgeracionais que tem como característica a produção de conteúdo que transcende as gerações, com obras relevantes para todos, independentemente da idade da publicação. Isso significa que eles tratam de temas universais, dentro de uma área do conhecimento, tornando-se pesquisadores fundamentais. Ainda, busca-se identificar as principais referências citadas nos artigos do periódico Ciência da Informação nos últimos 50 anos, a fim de entender os fenômenos sociais e cognitivos que ocorreram no período. Para além disso, visa-se também conhecer aqueles que influenciaram o crescimento científico e sustentaram as teorias desde o início da Ciência da Informação até os dias atuais. Nenhuma geração é capaz de existir por si só, tendo sempre necessidade da conexão com aquelas que a precederam. De outro modo, para se chegar a algum resultado, haveria que começar tudo desde o início. Assim, há a obrigação e a urgência de passar adiante os conhecimentos, dando às gerações seguintes a garantia de poder seguir em frente. Pela sua natureza interdisciplinar, a CI trata de temáticas dentro e fora de sua conjuntura científica, prospectando novos pensamentos, estruturando domínios científicos, novas teorias e influenciando pesquisadores que compõem tanto o seu 16 núcleo científico quanto os de questões periféricas. Essas questões podem ou não estar contidas na análise dos 50 anos de CI no Brasil, considerando exclusivamente as publicações desse período no periódico Ciência da Informação do IBICT. A Ciência da Informação compreende seis vertentes: os estudos matemáticos envolvendo recuperação de informação e bibliometria; a Teoria Sistêmica; a Teoria Crítica; as Teorias de Representação; os Estudos em Comunicação Científica; os Estudos de Usuários. Ao se analisar como cada uma destas teorias trata o conceito de informação, percebe-se como elas contribuíram, ao longo do tempo, para o estabelecimento de um paradigma positivista para o campo científico (ARAÚJO, 2014). Esta tese está dividida em seis partes. A primeira delas tem como intuito a abordagem do assunto, além de identificar o problema, estabelecer o objetivo e a justificativa para que os resultados possam contribuir com a evolução histórica e o desenvolvimento científico na área da Ciência da Informação no Brasil. Na segunda, destacamos a CI, suas influências históricas e seu processo de institucionalização. Além disso, destacamos os conceitos e as teorias paradigmáticas envolvidas, assim como os principais porta-vozes da CI no Brasil, suas entidades, grupos de estudos, programas e cursos de pós-graduação oferecidos. Na terceira, expomos uma parte teórica, particularmente a respeito de análises de citação e das relações entre elas. Utilizamos especificamente, o acoplamento bibliográfico de autores para obter uma visão profunda e singular da estrutura científica, social e cognitiva da Ciência da Informação e do periódico em estudo, apresentando uma abordagem nova de acoplamento, a saber, o acoplamento bibliográfico de período. Na quarta, explicamos as técnicas e sua aplicação para os levantamentos fundamentais, alvo da investigação e métodos usados para reunir dados que pudessem responder à pergunta inicial e atingir os objetivos esperados. Na quinta, o conteúdo se desdobra em duas subdivisões que abrangem as análises, a exposição dos dados e as respostas significativas para os propósitos da tese, bem como, para as questões levantadas. Na sexta e última, oferecemos uma síntese dos resultados, avaliando a pergunta feita e fornecendo as limitações da nossa pesquisa, bem como, sugestões para ampliações posteriores. 17 2 CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO A Ciência da Informação é o campo da ciência que estuda a aquisição, o armazenamento, a recuperação, a transmissão e a utilização de informações. É interdisciplinar e engloba diversas áreas, tais como, as Ciências da Computação, Estatística, Matemática, Linguística e Comunicação. Tem como principal objetivo auxiliar na tomada de decisões por meio do fornecimento de dados e informações relevantes, para isso, utiliza diversas ferramentas e técnicas, como a mineração de dados, a indexação automática e os estudos métricos da informação. 2.1 Ciência da Informação e marcos históricos Alguns marcos históricos contribuíram para o desenvolvimento da Ciência da Informação, como a criação do International Institute of Bibliography (IIB), que aconteceu durante a I Conferência Internacional de Bibliografia, no ano de 1895 em Bruxelas. O IIB nasceu a partir das ideias de uma organização universal do conhecimento de Paul Otlet e Henri de La Fontaine (MATTELART, 2005). Em 1931, foi transformado em Instituto Internacional de Documentação (IID), com a preocupação de fornecer meios de controle para os novos tipos de suporte do conhecimento. No entanto, essa organização universal serviria como referência da produção mundial e não como acervo bibliográfico. Em 1934, a publicação da obra Traité de Documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique, de Paul Otlet, trouxe ideias de integração dos componentes da documentação, já apresentando concepções a respeito do que viria a ser a Bibliometria ou os Estudos Métricos da Informação. Três anos depois, em 1937, foi criado o American Documentation Institute (ADI), que passou a ser American Society for Information Science – ASIS, nos anos 2000 transformou-se em American Society for Information Science Technology – ASIST. Já em 1938, houve a transformação do IID em Federação Internacional de Documentação (FID), subsidiando pesquisas teóricas que se tornaram as bases científicas da Ciência da Informação (PINHEIRO, 2002). O artigo de Vannevar Bush, na década de 1940 no período pós-guerra, apresentava a preocupação em encontrar soluções para o que foi chamado de explosão informacional, fenômeno derivado do crescimento exponencial da informação e de seus registros, principalmente nas áreas de ciência e tecnologia. E para solucionar esse problema, ele propôs o uso de uma máquina, o MEMEX, um dispositivo de armazenamento e recuperação da informação, composto por uma mesa 18 com telas de visualização, teclado, botões e alavancas de seleção e armazenamento de microfilme (BUSH, 1945). Vannevar Bush foi um matemático e físico renomado. Em 1945, ocupava o cargo de diretor do gabinete de guerra de Pesquisa e Desenvolvimento Científico, era doutor e usou sua posição para promover uma nova era de investigação científica em Tecnologia da Informação. Uma década antes à idealização do MEMEX, Bush havia concebido uma calculadora analógica ultrarrápida, que tinha desempenhado um papel fundamental para o financiamento do Electronic Numerical Integrator and Computer (ENIAC), que se tornou a primeira máquina de cálculo eletrônica digital (FLLORESS, 2010). Tendo em vista que os avanços científicos e tecnológicos estavam em alta, Bush (1945) sugeriu aos cientistas que já tinham expandido as capacidades físicas com as máquinas, que também expandissem a nossa capacidade cognitiva com o uso da tecnologia. Para isso, Bush propôs a construção de uma máquina com uma capacidade gigantesca de armazenamento de informação, na qual o próprio usuário teria a possibilidade de criar "vias" de informação, ou seja, ligações (links) entre textos e ilustrações relacionadas; essas ligações poderiam ser armazenadas e utilizadas para uma futura recuperação da informação. Ele acreditava que este método associativo de acumulação de informação, além de prático, seria a maneira mais próxima de como a mente humana trabalhava e organizava as informações. Além da preocupação de Bush, alguns eventos também contribuíram para o surgimento da Ciência da Informação, tais como: a) Conferência de Informação Científica, da Royal Society, em 1948, na cidade de Londres; b) Conferência do International Union on Pure and Applied Chemistry (IUPAC), em Londres, no ano de 1955; c) Conferência Internacional de Informação Científica, da Academia Nacional de Ciências, em Washington, no ano de 1958. Além dos eventos acima citados, foram apresentados trabalhos como o artigo de Farradane e o glossário de termos da documentação científica, de Taylor. Novas tecnologias foram ampliando as oportunidades de armazenamento e disseminação da informação, tais como o microfilme e os cartões perfurados, da International Business Machines - IBM. O surgimento dos periódicos foi essencial para o avanço da época: Journal Documentation, em 1945, na Grã-bretanha; Nachrichten für Dokumentation, 19 em 1950, na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas - URSS; e American Documentation, em 1950, nos Estados Unidos (PINHEIRO, 2002). No período pós-guerra, especialistas começaram a demonstrar preocupação com a grande quantidade de informação resultante das novas tecnologias, o que contribuiu para a institucionalização da Ciência da Informação. Oliveira (2005) diz que a Ciência da Informação recebeu influência de estudos como o de Norbert Wiener, com a Teoria da Informação e com sua obra Cybernetics or control and communication in the animal and the machine, do ano de 1947. Vale considerar, também, a influência de Claude Shannon e Warren Weaver que inspiraram a Ciência da Informação com a Teoria Matemática da Comunicação ou Teoria da Informação, do ano de 1948, trazendo conceitos de ruído, entropia e redundância, essenciais para os sistemas de recuperação da informação. No entanto, tal teoria não pode ser totalmente aplicada à Ciência da Informação, tendo em vista que foi idealizada para máquinas e não para pessoas. Bertalanffy influenciou a Ciência da Informação com a Teoria Geral dos Sistemas, de 1956, e também com os conceitos de redes e sistemas de informação (OLIVEIRA, 2005). É na década de 1960 que de fato surge a Ciência da Informação, pautando-se nos estudos da recuperação da informação. Ela surge precisamente nos Estados Unidos, entre os anos de 1961 e 1962 (SARACEVIC, 1996). O primeiro conceito de Ciência da Informação foi idealizado por Taylor, em duas reuniões, uma em outubro de 1961 e a outra em abril de 1962, com cerca de 60 profissionais, entre docentes e bibliotecários, realizadas no Georgia Institute of Technology, na Natural Science Foundation, no estado da Georgia, nos Estados Unidos (BARRETO, 2007). Na década de 1960, Taylor (1966), Rees, Saracevic (1967) e Borko (1968) trouxeram a ideia de que a Ciência da Informação mantém uma forte conexão com os estudos de produção, organização, armazenamento, distribuição e utilização da informação. Consequentemente, a informação passa a ser encarada como um fator aprimorador da produção, fazendo com que a gestão da informação se torne essencial para a tomada de decisões e a otimização da passagem de dados, de modo a evitar atrasos e redundâncias, contribuindo para o aumento da produtividade, seja acadêmica ou organizacional. Parece haver consenso entre estudiosos citados de que a CI teria surgido na década de 1960, com a elaboração dos primeiros conceitos sobre essa nova ciência, iniciando-se o debate sobre suas origens e seus fundamentos teóricos (ARAÚJO, 20 2003). Importante para sua concepção é seu relacionamento direto com o fim da Segunda Guerra e o início da guerra fria. A informação passou a ser vista como um recurso estratégico que impulsionou a CI ao lidar com o grande volume de informações registradas em várias fontes. O Conceito de Ciência da Informação foi fundado com a ideia de tratar a informação como um objeto que segue leis e princípios bibliométricos independentemente dos sujeitos e seus contextos histórico-culturais. Além disso, a análise do comportamento da informação leva em consideração as forças agindo sobre ela para servir a determinado propósito (ARAÚJO, 2009). Borko em 1968, baseado nas ideias de Taylor, concebe um conceito para a Ciência da Informação enunciando seu significado como disciplina que aprofunda os mecanismos governantes e os efeitos que a informação tem na sociedade. Seu estudo inclui desde a produção de dados, até seu armazenamento, recuperação, interpretação, transmissão, transformação e uso para garantir acessibilidade e usabilidade satisfatórias. Além disso, é responsável por investigar e entender como a informação é representada. É possível observar que Borko ainda se refere à CI como uma disciplina investigativa da informação e do seu fluxo para uma melhor usabilidade e recuperação. Essa preocupação vai desde a sua origem, passa pelo caminho percorrido, indo até o destino final, o uso efetivo da informação. Dois anos depois, Mikhailov e Giljarevskij (1970) trazem um novo conceito sob uma nova perspectiva, para eles, a Ciência da Informação é um campo de estudo que examina as estruturas e características da informação científica, bem como, as normas relativas ao trabalho científico, teorias, história, metodologia e organização. Ao adotar uma nova perspectiva, a CI passa de disciplina de pesquisa para disciplina investigativa. De acordo com o dicionário etimológico de BUENO (1975), pesquisa é vista como ação de indagar, procurar conhecimento científico ou literário, e fazer um estudo sistemático. Já investigação, refere-se à busca de informação, seguir pistas, analisar dados e esclarecer questões. O pesquisador, por sua vez, corresponde a alguém que se dedica à pesquisa científica, literária, investigação e estudo, ao passo que o investigador tem a responsabilidade de buscar esclarecimentos. Essa transformação, torna o conceito mais amplo em relação às suas características investigativas, se aprofundando na busca por respostas mais precisas 21 e com um caráter mais científico do que por mera investigação. Deixando de buscar somente respostas, agora a CI se preocupa em entender os caminhos da informação em toda sua complexidade. No mesmo ano, Goffman (1970) afirma que a Ciência da Informação tem o propósito de abordar de forma científica e unificada, os vários aspectos que envolvem a noção de informação, sejam eles encontrados na natureza, na realidade humana ou nos produtos da ciência. Com isso, o assunto se liga ao estabelecimento de princípios direcionadores do comportamento ao longo do processo de comunicação e dos sistemas de informação que surgem dele. Ainda, Goffman (1970) não se preocupou apenas em conceituar a CI, como também a associou com o processo de transferência de informação, não somente da produção em si, mas em como ela seria trasladada e no comportamento desse processo, pois produzir informação e não a disseminar de forma eficiente, deveria ser uma preocupação naquele momento. Entre a formulação dos conceitos de Ciência da Informação, estava outra preocupação, o seu objeto de estudo, que também foi debatido por pesquisadores durante o seu processo de afirmação, enquanto área científica capaz de se consolidar. Assim como Goffman (1970), Wersig e Neveling (1975), também observam que o objetivo da CI é tratar a informação para facilitar sua utilização pelo usuário, pois esta área do conhecimento se fundamenta na percepção de que certos indivíduos ligados às atividades sociais, têm necessidades informativas e estuda métodos para organizar os fluxos de comunicação, de modo a atender a essas necessidades. No final da década, Shera e Cleveland (1977) introduziram um conceito significativo para a Ciência da Informação como sendo uma disciplina que estuda as características e comportamentos da informação, além de controlar o seu fluxo. É responsável por abranger questões como aquisição, distribuição, organização, arquivamento, busca, interpretação e uso da informação. Estas atividades têm a ver com Matemática, Lógica, Linguística, Psicologia, Tecnologia da Computação, Pesquisa Operacional, Gráficos e Comunicação, Biblioteconomia e Administração. Com essa definição, além de ter sido considerada uma ciência investigativa, a CI também se torna interdisciplinar quando os autores a relacionam com outras áreas científicas. A cada novo conceito, a ciência da informação vai se tornando mais complexa e abrangente, há sempre um novo olhar e uma nova perspectiva no seu processo evolutivo. 22 Para evoluir, é necessário haver mudanças, com a CI não foi diferente. Ao longo do caminho, a mudança de perspectiva foi essencial para a sua consolidação enquanto ciência. Foi necessário observar qual era de fato o seu objeto de estudo e como deveriam ser abordadas as pesquisas sobre esse objeto, a informação. No contexto da CI, toda e qualquer informação foi recebendo tratamento e enfoques diferentes ao longo do tempo e ajustadas às suas diferentes características, que foram enfatizadas e discutidas para uma melhor compreensão. No primeiro momento, Capurro (1985) aponta que para desenvolver um melhor entendimento sobre a Ciência da Informação é necessário, antes, entender a noção de paradigma. Isso nos ajuda a estabelecer a relevância de uma análise epistemológica. Além disso, defende-se a criação de uma Ciência da Informação global, que seja capaz de abranger relações, tais como: similares, equívocas ou unívocas entre todos os conceitos de informação, suas teorias e ramos aplicados. Em um segundo momento, Capurro (2003) destaca a trajetória evolutiva da Ciência da Informação, que parte do paradigma físico, passa para o cognitivo e, eventualmente, para o paradigma social. É mencionado que o paradigma físico é questionado por uma visão cognitiva idealista e individualista, que foi, posteriormente, superado por um paradigma pragmático e social, que foi abraçado e debatido por diversos pesquisadores. As três teorias paradigmáticas foram elencadas em momentos e contextos diferentes. A do paradigma físico (1945 até meados da década de 1970) em que a informação é representada por unidades com características de “objetos”, que, segundo Buckland (1991) podem ser armazenados e transmitidos por canais sem sofrer qualquer influência contextual em nenhum dos processos, e a capacidade de compreensão da informação transmitida não é discutida, levando em consideração apenas o recebimento da mensagem pelo receptor, independente se ela foi ou não entendida por ele. No segundo momento, do paradigma cognitivo (1980 até meados da década de 1990), prevalece a noção do sujeito como agente transformador da informação em conhecimento, quando o indivíduo passa a ocupar o papel principal, trazendo consigo a consciência de que a realidade do mundo material é uma construção mental. A produção do conhecimento depende totalmente do entendimento da informação pela mente humana, a partir dessa ideia, todos os processos estão centrados no usuário, 23 mas sempre um usuário individual, isolado, não inserido numa dimensão coletiva (INGWERSEN, 1992). As mudanças paradigmáticas só foram possíveis depois da mudança de perspectiva epistemológica da área em diversos setores, tais como: organização e tratamento da informação, gestão da informação, tecnologias de informação e de comunicação, fontes e recursos de informação, estudo de usuários da informação, processos e fluxos de informação, entre outros. Principalmente em relação ao paradigma cognitivo, pois esse se estabeleceu a partir de diferentes correntes teóricas, como o behaviorismo, funcionalismo e estruturalismo, evidenciando a importância para as pesquisas em CI com muita ênfase nos estudos sobre sistemas de recuperação de informação centrados nos estudos de usuários da informação. No terceiro momento, a partir da década de 1990, o paradigma social é sustentado pela tríade sujeito-objeto-contexto. O usuário passa a agir de acordo com suas necessidades informacionais, relacionadas ao contexto ao qual está inserido, devendo assim relacionar a sua busca com os seus valores, conhecimentos individuais e sociais, elaborando perguntas que sejam capazes de suprir suas necessidades infocomunicacionais ao tentar acessar as informações das quais precisa (SANTOS, 1987). Dado esse contexto, a Ciência da Informação pode ser apresentada como uma área de estudo, experimentando um complexo processo de construção teórica, histórica e epistemológica, o que se reflete nos conceitos necessários para assegurar um conhecimento consistente em todas as dimensões, nas diversas áreas do conhecimento, desde as ciências humanas e sociais, até as ciências naturais e exatas. Conforme o exposto, fica evidenciado que os três paradigmas descritos por Capurro tentam explicar os fundamentos da Ciência da Informação. Esses paradigmas são complementares e a compreensão da amplitude dos três, de forma integrada, fornece os subsídios para o entendimento dos fundamentos epistemológicos da Ciência da Informação, embora a CI seja uma área científica ainda em processo de institucionalização para se pautar em quebra ou mudança de paradigma. Considerando que a construção acontece de forma acelerada e complexa, seria mais bem interpretado como fases construtivas do processo evolutivo do que quebra de um paradigma em si. 24 2.2 Ciência da Informação no Brasil Durante a década de 1950, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - (UNESCO) incentivou o estabelecimento de políticas nacionais com o intuito de promover o crescimento científico e tecnológico nos países periféricos, e aconselhou a Fundação Getúlio Vargas (FGV) à criação de um centro de bibliografia no Brasil. Por sua vez, o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) passou a ser responsável por manter contatos com instituições nacionais e estrangeiras para intercâmbio de material técnico-científico. Para dar sequência às metas propostas pela UNESCO, o Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD) foi fundado em 27 de fevereiro de 1954 pelo decreto do presidente da república n° 35.124, sendo ligado ao atual Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (IBICT, 2022). Na década de 1970, o IBBD passou por profundas modificações, alterando seu nome para Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), em 1976, quando foi publicada a Resolução Executiva n° 20/76 do CNPq. Na mesma década, o Instituto promoveu o primeiro curso de pós-graduação em Ciência da Informação da América Latina. Em 1980, sua sede foi transferida para Brasília e cinco anos depois foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). O IBICT se tornou, então, subordinado ao MCT, sendo responsável pela coordenação de atividades de informação científica e tecnológica para a comunidade acadêmica, considerado um setor produtivo e de pesquisa governamental (IBICT, 2021). Após sua institucionalização, a CI começou a se desenvolver no Brasil, a crescer, a disseminar, comunicar informação de pesquisas científicas e a formar recursos humanos qualificados (CARDOSO, 1996; ANDRADE; OLIVEIRA, 2005). Após o lançamento do curso, foram criados os dois primeiros periódicos científicos no Brasil, ambos iniciando sua produção a partir de 1972, o periódico Ciência da Informação, sob responsabilidade do IBICT e a Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG, publicada até o volume 24, número 2, de 1995, tendo seu título alterado em 1996, para Perspectivas em Ciência da Informação, editada pela Escola de Ciência da Informação da UFMG. Representantes institucionais da área da Ciência da Informação no Brasil podem ser caracterizados por diferentes formatos científicos. Em 1989, depois de quase duas décadas de desenvolvimento na área desde o lançamento do Curso de 25 Mestrado do IBBD em 1970, a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação e Biblioteconomia (ANCIB) foi criada. Isso indicou que apenas uma entidade destinada às escolas de Biblioteconomia e Documentação não era suficiente para atender às demandas complexas da área. A ANCIB busca desenvolver a Ciência da Informação no Brasil, incentivando a produção de trabalhos científicos, como teses e dissertações. Ela é uma sociedade civil sem fins lucrativos, criada para facilitar o intercâmbio e a cooperação entre seus membros. Estes podem ser categorizados como sócios institucionais (Programas de Pós-Graduação em Ciência da Informação) e sócios individuais (professores, pesquisadores, estudantes de pós-graduação e profissionais egressos dos programas) (ANCIB, 2022). A ANCIB tem se dedicado a aperfeiçoar os Programas de Pós-graduação stricto sensu sob a liderança dos seus coordenadores. Por meio dos Fóruns de Debates e Reflexões, procura-se intensificar os conhecimentos sobre Ciência da Informação, reunindo pesquisadores interessados em discutir assuntos especializados. Os Grupos de Trabalho pretendem auxiliar e incentivar ações de ensino e pesquisa na área de Ciência da Informação no Brasil. Esta associação contribui, tanto no país como no exterior por meio do Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ENANCIB), para que os trabalhos neles divulgados reflitam a mais recente evolução da pesquisa desenvolvida nos Programas de Pós- graduação e pela comunidade científica (MINISTÉRIO..., 2022). Em abril de 1994, o ENANCIB deu início à sua primeira edição, sediada na Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Contava com sete Grupos de Trabalho e apresentou 23 trabalhos, redigidos por 36 autores. Dois anos depois, em 1995, o evento foi realizado em Valinhos-SP, atraindo 56 trabalhos, elaborados por 76 pesquisadores. A terceira edição, no ano de 1997, ocorreu no Rio de Janeiro, aumentando consideravelmente o número de trabalhos aprovados, chegando a 135, enviados por 195 pesquisadores. Desde então, o número de artigos e pesquisadores produtores e participantes continuou crescendo nas edições seguintes (BENANCIB, 2023). Ao longo dos anos, alguns Grupos de Trabalho (GTs) sofreram alterações, como o GT 1 - Informação e Tecnologia, que teve seu nome mudado para Informação Tecnológica e Administração de Serviços na segunda edição, e passou a se intitular Informação Tecnológica e Informação para Negócios na quarta edição, em 2000. 26 Posteriormente, na quinta edição de 2003, foi desativado e, desde a sexta edição, em 2005, passou a ser denominado Estudos Históricos e Epistemológicos da Informação, mantendo-se assim até a décima edição, em 2009. No entanto, na décima primeira edição, em 2010, foi incluída a palavra que caracteriza sua área de atuação, passando a se denominar Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação (FORUM...2023). O Grupo de Trabalho 2 – Informação e Sociedade/Ação Cultural foi descontinuado após a quinta edição do ENANCIB, em 2003. Na sexta edição, o GT foi substituído pelo Grupo de Trabalho 2 – Organização do Conhecimento e Representação da Informação, que mudou seu nome para Organização e Representação do Conhecimento, persistindo desde então até a vigésima segunda edição, ocorrida em 2022 (FORUM..., BENANCIB, 2023). O GT 8, planejado para debater Políticas de Pesquisa e de Cursos de Pós- Graduação, foi sugerido na primeira edição do ENANCIB em 1994, porém, foi desativado e substituído pelo extinto Grupo de Trabalho Informação e Tecnologia na nona edição do evento em 2008. O evento se manteve com oito GTs até a edição de 2009, quando foi criado o GT 9 – Museologia, patrimônio e informação, na décima primeira edição foi inserido o GT 10 – Informação e memória; e na décima segunda, o GT 11, para discutir sobre Informação e saúde. Após 10 edições do evento, em 2022, foi inserido o GT 12, com o objetivo de introduzir discussões acerca dos Estudos étnico-raciais, gênero e diversidades (FORUM..., BENANCIB, 2023). O ENANCIB foi sediado por quase todas as regiões brasileiras, promovendo a democratização do conhecimento científico e incentivando o seu desenvolvimento. A maioria das edições tem ocorrido no Sudeste (11), devido ao fato de que a região concentra o maior número de programas de pós-graduação na área. O Sul (5), o Nordeste (4) e o Centro-Oeste (2) também foram beneficiados. A Região Norte, apesar de oferecer programa de pós-graduação em Ciência da Informação, ainda não recebeu edição do evento (BENANCIB, 2023). Em 2021, com a realização da vigésima primeira edição, sediado no Rio de Janeiro pela UFRJ, celebraram-se os 50 anos de CI no Brasil, com o tema: "50 anos de Ciência da Informação no Brasil: saberes, diversidade e transformação social". O evento teve como objetivo: debater e refletir sobre a produção de conhecimento na área; estimular amplos diálogos entre pesquisadores; permitir a troca de experiências acadêmico-científicas; fortalecer os vínculos acadêmicos em nível nacional e 27 internacional; incentivar o intercâmbio científico entre os diferentes membros da comunidade da Ciência da Informação, bem como, discutir e refletir sobre os temas, perspectivas e tendências da pesquisa, contribuindo para o avanço da geração de conhecimento nesta área. Para discutir tais questões e alcançar os objetivos propostos, os 12 grupos de trabalho têm um enfoque diferente, promovendo a relação entre a CI e sua história, teorias, terminologias, conceitos, epistemologia, políticas de desenvolvimento, metodologias e perspectivas, pois a complexidade devido à interdisciplinaridade e diversidade temática da CI enquanto ciência, a torna abrangente e ao mesmo tempo focada no seu objeto de estudo, a informação, bem como, em todo o processo de usabilidade. O quadro 1, apresenta os grupos de trabalhos e suas respectivas ementas. Quadro 1 - Grupos de trabalhos do ENANCIB e suas ementas GT 1 – Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação Estudos históricos e epistemológicos da Ciência da Informação (escolas de pensamento, correntes teóricas, autores e obras de fundamentação, leituras teórico-metodológicas e conceituações). Constituição, desenvolvimento e inovação conceitual, teórica e metodológica do campo científico informacional. Os objetos de estudos da Ciência da Informação e suas transformações teórico- conceituais. Reflexões e discussões sobre disciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. GT 2 – Organização e Representação do Conhecimento Teorias, metodologias, políticas, instrumentos, processos e produtos para a organização e representação do conhecimento recuperação e acesso à informação, nas suas dimensões epistemológicas, aplicadas, sociais, culturais e terminológicas enquanto conhecimento socializado, institucionalizado ou não, em ambientes informacionais (tais como: arquivos, museus, bibliotecas e congêneres), incluindo o uso e desenvolvimento das tecnologias de informação e as relações inter, multi e transdisciplinares neles verificadas. GT 3 – Mediação, Circulação e Apropriação da Informação Estudo dos processos e das relações entre mediação, circulação e apropriação de informações, em diferentes contextos e tempos históricos, considerados em sua complexidade, dinamismo e abrangência, bem como relacionados à construção e ao avanço do campo científico da Ciência da Informação, compreendido em dimensões inter e transdisciplinares, envolvendo múltiplos saberes e temáticas, bem com contribuições teórico- metodológicas diversificadas em sua constituição. GT 4 – Gestão da Informação e do Conhecimento Gestão de ambientes, sistemas, unidades, serviços, produtos de informação e recursos informacionais. Estudos de fluxos, processos, usos e usuários da informação como instrumentos de gestão. Gestão do conhecimento e aprendizagem organizacional no contexto da Ciência da Informação. Marketing da informação, monitoramento ambiental e inteligência competitiva. Estudos de 28 redes para a gestão. Aplicação das tecnologias de informação e comunicação à gestão da informação e do conhecimento. GT 5 – Política e Economia da Informação Políticas e regimes de informação. Informação, Estado e governo. Propriedade intelectual. Acesso à informação. Economia política da informação e da comunicação. Produção colaborativa. Poder, ativismo e cidadania. Conhecimento, aprendizagem e inovação. Ética da informação. Informação e ecologia. GT 6 – Informação, Educação e Trabalho O mundo do trabalho informacional: atores, cenários, competência em informação, dimensões e habilidades. Organização, processos de trabalho em dispositivos de informação e cultura. As relações entre informação, educação, trabalho, saúde e tecnologia. Regulamentação profissional, entidades sindicais, associações de classe e mercado de trabalho e competência profissional. Diversidade cultural, representações sociais, práticas e construção identitária dos profissionais da informação. Responsabilidade social, ética e profissional na Ciência da Informação. As bases curriculares e experiências pedagógicas: formação e perfil profissional ou docente GT 7 – Produção e Comunicação da Informação em Ciência, Tecnologia & Inovação Estudos teóricos, aplicados e metodológicos sobre a produção, comunicação e uso da informação em Ciência, Tecnologia e Inovação. Inclui pesquisas relacionadas aos processos de comunicação, divulgação, análise e formulação de indicadores para planejamento, avaliação e gestão em CT&I. GT 8 – Informação e Tecnologia Estudos e pesquisas teórico-práticos sobre e para o desenvolvimento de tecnologias de informação e comunicação que envolvam os processos de geração, representação, armazenamento, recuperação, disseminação, uso, gestão, segurança e preservação da informação em ambientes digitais. GT 9 – Museu, Patrimônio e Informação Análise das relações entre o museu (fenômeno cultural), o patrimônio (valor simbólico) e a informação (processo), sob múltiplas perspectivas teóricas e práticas de análise. Museu, patrimônio e informação: interações e representações. Patrimônio musealizado: aspectos informacionais e comunicacionais. GT 10 – Informação e Memória Estudos sobre a relação entre os campos de conhecimento da Ciência da Informação e da Memória Social. Pesquisas transdisciplinares que envolvem conceitos, teorias e práticas do binômio ‘informação e memória’. Memória coletiva, coleções e colecionismo, discurso e memória. Representações sociais e conhecimento. Articulação entre arte, cultura, tecnologia, informação e memória, através de seus referenciais, na contemporaneidade. Preservação e virtualização da memória social. GT 11 – Informação & Saúde Estudos das teorias, métodos, estruturas e processos informacionais em diferentes contextos da saúde, considerada em sua abrangência e complexidade. Impacto da informação, 29 tecnologias, e inovação em saúde. Informação nas organizações de saúde. Informação, saúde e sociedade. Políticas de informação em saúde. Formação e capacitação em informação em saúde. GT 12 – Informação, Estudos Étnico- Raciais, Gênero e Diversidades Estudos teóricos e aplicados em informação sobre Raça, Classe, Gênero, Sexualidades e Interseccionalidades. Teorias Críticas, Culturais, Racial, Feministas e Queer. Correntes teóricas, escolas de pensamento, bases metodológicas-conceituais e aplicações técnico- científicas dos estudos étnico-raciais, de gênero e de diversidade. Teorias, discursos, saberes, atividades científicas e profissionais em ambientes informacionais comunitários, populares e organizacionais. Relações sociais, de poder e resistências. Epistemicídio, violências e insurgências. Estudos Pós-Coloniais, De coloniais e Anticoloniais. Estudos Críticos da Branquitude. Justiça Social, Informacional, Racial e de Gênero. Fonte: ANCIB, 2022. Com vista a debater a existência e as práticas profissionais relacionadas, a comunidade de pesquisadores da CI reuniu-se em associações científicas, entre elas, a notória Associação Brasileira de Ensino de Biblioteconomia e Documentação (ABEBD). Esta foi instituída em 13 de janeiro de 1967 com a colaboração de 27 docentes nacionais, em resposta à necessidade de enriquecer a profissão no Brasil, de criar vias de diálogo com organizações semelhantes na América Latina e de tornar o magistério mais técnico, bem como, de representar o campo bibliotecário e os profissionais no contexto político do país à época. A Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação (ABECIN) substituiu a ABEBD em 2001, tornando-se uma parte significativa do ecossistema de ensino e ação política. Ela está oficialmente reconhecida como uma instituição constituída para assegurar o debate acerca da informação sobre a Ciência da Informação (ABECIN, 2022). Além das já mencionadas entidades, a Ciência da Informação no Brasil é primordialmente operada por instituições públicas e federais de ensino superior. Essas mantêm cursos de graduação em Biblioteconomia e Documentação e em todas as cinco regiões, existem 27 programas de pós-graduação e 40 cursos de Mestrado e Doutorado, oficialmente avaliados pelo Ministério da Educação. O quadro 2 detalha a distribuição dos Programas de Pós-graduação e seus relacionados Mestrados Acadêmicos, Profissionais e Doutorados Acadêmicos. 30 Quadro 2 - Programas de pós-graduação em Ciência da Informação no Brasil, Mestrado acadêmico/profissional e Doutorado Instituição de Ensino Superior Programa de pós- graduação Mestrado Acadêmico/ Profissional Doutorado Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB) Memória e Acervos (PPGMA) 1 0 Universidade Federal de Sergipe (UFS) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 Universidade de Brasília (UNB) Ciência da Informação (PPGCINF) 1 1 Universidade de São Paulo (USP) Ciência da Informação (PPGCI) e em Gestão da Informação (PPGGI) 2 1 Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) Ciência da Informação (PPGInfo) 1 0 Universidade Estadual de Londrina (UEL) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Federal da Bahia (UFBA) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Federal de Alagoas (UFAL) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ciência da Informação (PPGCI) e em Gestão e Organização do Conhecimento (PPGGOC) 2 2 Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Ciência da Informação (PGCIn) 1 1 Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 Universidade Federal do Cariri (UFCA) Biblioteconomia (PPGB) 1 0 Universidade Federal do Ceará (UFC) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 31 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) Biblioteconomia (PPGB) e em Gestão de Documentos e Arquivos (PPGDA) 2 0 Universidade Federal do Pará (UFPA) Ciência da Informação (PPGCI) 1 0 Instituto Brasileiro de Informação, Ciência e Tecnologia (IBICT)/Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Gestão da Informação e do Conhecimento (PPGIC) 1 0 Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Ciência da Informação (PPGCIN) 1 0 Universidade Federal Fluminense (UFF) Ciência da Informação (PPGCI) 1 1 Fundação Mineira de Educação e Cultura (FUMEC) Sistema de Informação e Gestão do Conhecimento (PPGSIGC) 1 1 TOTAL 27 13 Fonte: Plataforma Sucupira, 2022. A maior concentração de PPGCI (13) está na Região Sudeste, a mais desenvolvida social e economicamente, correspondendo a 48,15% do total de programas, localizados nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Em seguida a Região Nordeste, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Bahia, Alagoas e Sergipe, com oito cursos, ou seja, 29,6% do total. O Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, com quatro cursos, relativos a 14,8%. No Centro Oeste, em Brasília e no Norte, no Pará, há apenas um curso em cada unidade, correspondendo a 7,45%. As 24 instituições apresentam em seu PPGCI linhas de investigação semelhantes, no entanto, algumas apresentam enfoques diferentes, contemplam 27 cursos em nível de mestrado, sendo oito profissionais, 19 acadêmicos e 13 cursos em nível de doutorado acadêmico. Em geral os cursos têm a terminologia PPGCI, no entanto, existem outras nomenclaturas relacionadas com a CI, como Mestrado em Sistema de Informação e Gestão do Conhecimento (PPGSIGC), em Biblioteconomia (PPGB), em Gestão de 32 Documentos e Arquivos (PPGDA), em Gestão e Organização do Conhecimento (PPGGOC) e Memória e Acervos (PPGMA). É possível observar que a Região Norte e Centro-Oeste são as menos favorecidas em relação à quantidade de programas de pós-graduação stricto sensu em CI no Brasil. O curso de mestrado da região Centro-oeste foi implantado em 1975 e o doutorado em 1992. O primeiro curso da região Norte foi criado no ano de 2017, a data de criação desses cursos denota a disparidade regional referente à evolução da área, pois a ausência de mestres e doutores formados na região Norte evidencia que o crescimento da CI é desproporcional e tardio, se comparado às outras regiões do país (GUIMARÃES, 2019). Editores e livreiros desempenharam um papel importante no desenvolvimento da Ciência da Informação no Brasil, contribuindo para a popularização das ideias de autores estrangeiros ao traduzirem os documentos para o português, visto que a falta de domínio das línguas estrangeiras pode ser um obstáculo para muitos pesquisadores brasileiros. O professor e livreiro Antonio Briquet de Lemos, autor de uma obra que narra, em 28 capítulos, a evolução das bibliotecas e da biblioteconomia no país, realçando os avanços e recuos da área, e também um editor que contribui com a disseminação da informação na área de CI. A editora Briquet de Lemos traduziu e publicou livros de autores estrangeiros, dentre eles: Arthur Jack Meadows, Frederick Wilfrid Lancaster, Douglas John Foskett, Kevin McGarry e Yves François Le Coadic, voltados tanto para a área da biblioteconomia quanto da Ciência da Informação, com temáticas sobre a comunicação cientifica, contexto dinâmico da informação, indexação e resumos e, precisamente, sobre conceitos da CI e temáticas por ela abordadas. As entidades, editores, grupos de pesquisa, programas e cursos de pós- graduação em CI no Brasil, têm ajudado no seu desenvolvimento científico e na disseminação da maior parte da produção científica gerada na área. As pesquisas científicas não só promovem o progresso da ciência, como também da humanidade, pois permitem expandir a perspectiva do campo científico e do conhecimento adquirido. Para se tornar aceita, a informação deve ser avaliada, organizada e mensurada. E da necessidade de avaliar as atividades inerentes à produção e comunicação científicas, surgem os Estudos Métricos da Informação (EMI). É a partir do desenvolvimento de leis empíricas, métodos e técnicas de aperfeiçoamento que 33 quantificam a informação, que se torna possível a obtenção de uma avaliação qualitativa que, aliada às tecnologias da informação, explicam o comportamento da literatura produzida, bem como, dos meios de comunicação utilizados por ela. Para Mugnaini et al. (2004), é necessário usar técnicas de medição para entender a evolução científica e a expressão do conhecimento humano. Essas medidas têm sido utilizadas como ferramentas para tomada de decisões no estabelecimento de políticas públicas institucionais, associadas a várias áreas do conhecimento. A necessidade de se estabelecer indicadores específicos para a ciência gerada, vem associada ao contexto no qual a pesquisa está inserida. É importante salientar que cada área do conhecimento tem sua peculiaridade e fontes de dados distintas, o que sugere a aplicação de estudos métricos que atendam ao objetivo proposto. 3 ESTUDOS MÉTRICOS DA INFORMAÇÃO Os Estudos Métricos da Informação (EMI) constituem uma subárea da CI que, assim como ela, tiveram uma evolução gradual. O aumento da produção do conhecimento foi influenciado, principalmente, pelos avanços tecnológicos, bem como, a quantidade de informação científica registrada por meio das tecnologias de comunicação. Com o surgimento da internet, tornou-se necessário o desenvolvimento de metodologias eficazes de acesso e disseminação da informação. Para tanto, começaram a desenvolver pesquisas e estudos experimentais com o objetivo de realizar uma melhor representação e recuperação da informação em sistemas e bases de dados. Desenvolveram-se sistemas e softwares para otimizar o uso das leis e teorias bibliométricas que permitisse explicar o comportamento e a estrutura da literatura científica. Ao conceituar bibliometria, Guedes e Borschiver (2005) se referem a uma ferramenta estatística que se propõe a mapear e criar indicadores diversos para lidar com a informação, o conhecimento e a produtividade, contribuindo, significativamente, com o planejamento, a análise e a gestão científica e tecnológica de uma determinada comunidade ou país. A bibliometria se apoia em princípios e leis estabelecidos que auxiliam a Ciência da Informação a desenvolver sua fundamentação teórica. Alguns estudiosos, como Quoniam et al. (2001), Urbizagástegui Alvarado (2002), Bufrem e Prates (2005), 34 Guedes e Borschiver (2005), Araújo (2006), Noronha e Maricato (2008) e Pinto e Gonzales-Aguilar, (2014), destacam três leis bibliométricas: a de 1926, Lei de Lotka, responsável por medir a produtividade dos autores; a de 1934, Lei de Bradford, para analisar a dispersão da produtividade e compreender o conhecimento científico que se dissemina em publicações; e a de 1949, Lei de Zipf, que busca otimizar as terminologias em documentos, comparando a distribuição de palavras e destacando as de maior significância semântica. Alfred J. Lotka, a partir de um estudo no Chemical Abstracts, entre 1909 e 1916, identificou que grande parte da produção científica é produzida por um número restrito de autores. À medida que o número de artigos publicados aumenta, os autores que produzem essas publicações tornam-se menos frequentes. Até hoje, quase 90 anos após sua publicação, essa relação é notória e ocorre nos mais diferentes campos da ciência (URBIZAGÁSTEGUI ALVARADO, R., 2002). Passaram-se oito anos desde que a Lei de Lotka foi anunciada quando, em 1934, Bradford publicou um estudo sobre a distribuição de frequência de trabalhos em periódicos - a lei da dispersão bibliográfica de periódicos. O seu início foi motivado por um facto "perturbador" - menos da metade dos documentos úteis e científicos são registrados nos periódicos secundários, enquanto que mais da metade das descobertas e invenções valiosas ficam guardadas para sempre nos estoques das bibliotecas (BRADFORD, 1961). Como diretor da Biblioteca do Museu de Ciências, em Londres, Bradford se sentiu preocupado ao perceber falhas nos serviços de índices e resumos, como dispersão, duplicação de referências bibliográficas e omissão de alguns tipos de documentos. Intrigado com o tópico, ele descobriu que a distribuição de artigos seguia um padrão que poderia ser decifrado tanto teoricamente através do conceito de unidade das ciências, quanto empiricamente, através da análise da literatura. De acordo com Bradford, quando se analisa o número de publicações sobre um determinado tópico, é possível observar uma diminuição na produtividade. Esta pode ser mensurada pela distribuição em um núcleo de artigos voltados ao assunto e em diversos grupos ou áreas adjacentes, cada um contendo o mesmo número de documentos, seguindo a fórmula 1:n:n²:n³ ... (BRADFORD, 1961). A Lei de Zipf, formulada em 1949, é ligada tanto a Bibliometria quanto a Estatística Linguística, relaciona a frequência de uso das palavras num texto com a ordem delas. O Ranking de cada palavra é a sua posição na lista de série. Zipf 35 expandiu sua proposta original, dividindo-a em duas partes: a primeira aplicada às palavras de alta frequência e a segunda com várias palavras de baixa frequência (GÜNTHER, R.; LEVITIN, L.; SCHAPIRO, B.; WAGNER, P., 1996). O ponto de transição ou (T) de Goffman é a posição de transição de palavras de baixa frequência para as de alta frequência. As palavras de alto conteúdo semântico estão na região ao redor desse ponto (T) e, geralmente, são usadas para a indexação de um texto. Assim, semanticamente é possível determinar o conteúdo dos textos por meio deste procedimento bibliométrico para a indexação temática automática, delimitando três zonas de ocorrência de palavras: a primeira zona com poucas palavras das categorias de substantivo, adjetivo e verbo; a segunda zona, com uma grande quantidade de substantivo, adjetivo e verbo; a terceira zona, com palavras que jamais serão consideradas como termos de indexação porque são de baixa frequência, de forma que ocorrem uma única vez no texto (GUEDES, V. e BORSCHIVER, S., 2005) Em 1963, Solla Price formula a Lei de Elitismo, conhecida como Lei da Raiz Quadrada. E afirma que toda população científica de tamanho N possui uma elite do tamanho da raiz quadrada de N, sendo que essa elite, é responsável por metade da produção total dos artigos. Assim, por exemplo, para uma população de 65 autores, sua raiz quadrada é aproximadamente 8, significando que a elite científica dessa população é composta pelos 8 autores mais produtivos. Se essa população publicou um total de 300 artigos, pela Lei de Elitismo, os oito autores mais produtivos seriam responsáveis pela publicação de, no mínimo, 150 artigos, ou seja, metade dos 300 artigos publicados. Nessa situação, os oito autores tornam-se a elite de uma determinada área do conhecimento cientifico. Além das leis, outros conceitos relevantes são citados como a obsolescência literária, colégios invisíveis, acoplamento bibliográfico e índices como o fator de impacto e o índice h, todos originados da aplicação de pesquisas mais aprofundadas. Nesta pesquisa, o acoplamento bibliográfico será amplamente apresentado. Segundo a FAPESP (2005), os indicadores bibliométricos estão categorizados em três grupos, produção, citação e ligação. Podem ser descritos da seguinte maneira: a) indicadores básicos de produção: tem como objetivo refletir o impacto dos pesquisadores junto à comunidade científica, destacando os de perfil mais produtivo e temáticas mais abordadas; 36 b) indicadores de citação: analisa a frequência das citações e cocitações entre si mesmas, podendo refletir a comunidade discursiva e constituir um domínio; c) indicadores de ligação: considera a concorrência de autoria, citações ou palavras, são usados para mapear e elaborar redes de colaboração científica. Por meio da confluência de técnicas estatísticas, matemáticas e computacionais, os indicadores de ligação que compreendem a coautoria de citações ou palavras, são usados para montar e desenvolver a rede de colaboração científica entre pesquisadores, instituições e países. As temáticas levantadas nos eventos nacionais e nas pesquisas das bases de dados Scopus destacam assuntos relevantes. A parceria científica é estabelecida através da interação entre os pesquisadores, partilhando seus objetivos e hipóteses centrais, alocando-se tarefas a serem cumpridas, coordenando as informações e investimentos a serem compartilhados (OLMEDA GÓMEZ; PERIANEZ RODRIGUEZ; OVALLE- PERANDONES, 2008). A colaboração científica é usada para mapear e identificar parcerias locais, nacionais ou globais. De acordo com Balancieri et al (2005), a colaboração científica é um meio de apoiar e maximizar o desempenho da produção científica, ampliando assim, as possibilidades de abordagens e ferramentas para uma rede de contatos. O destaque são os indicadores de citação, explorados sob vários aspectos e em concordância ao objetivo proposto por cada pesquisador. Cada autor emite seu olhar sobre o que escreve e como quer referenciar o documento produzido, de acordo com Braga (1974), há uma perspectiva madura, em que o pesquisador prefere citar trabalhos antigos, pois é necessário digerir tudo o que já foi publicado para então se produzir algo novo. Velho (1986), apresenta outra realidade em que a distribuição da idade das citações varia entre as áreas científicas, pois se um campo de pesquisa é considerado jovem, é possível que existam poucos trabalhos a serem citados e, assim sendo, as citações se concentrariam em publicações recentes. Bavelas (1978), vai além disso, ela discute sobre os aspectos sociopsicológicos das citações e reúne uma série de razões que levam um autor a citar, tais como: a) pela significância do uso de determinada teoria ou paradigma; b) para promover artigos ou autores; 37 c) para se mostrar a par dos trabalhos desenvolvidos na área; d) para ter uma avaliação positiva por pares; e) em trabalho que exige revisão da literatura, o autor precisa deixar claro que conhece a literatura existente; f) mostrar familiaridade com o campo de pesquisa. Em estudos anteriores, já se evidenciava que, além dos motivos para citar, existiam também algumas funções relevantes às citações, Weinstock (1971) e Carvalho (1975), as enumeraram: a) prestar homenagem; b) dar crédito para trabalhos relacionados; c) identificar metodologia e/ou equipamento; d) oferecer leitura básica; e) retificar o próprio trabalho; f) opinar sobre o trabalho de outros; g) analisar trabalhos anteriores; h) sustentar declarações; i) informar trabalhos futuros; j) dar destaque a trabalhos (não citados); k) validar dados; l) identificar publicações originais nas quais uma ideia ou um conceito são discutidos; m) identificar publicações originais que descrevam conceitos ou termos epônimos, ou seja, descobertas que receberam o nome do pesquisador responsável, por exemplo, Doença de Chagas; n) contestar trabalhos ou ideias de outros; o) debater a preferência das declarações de outros; p) estabelecer direitos de propriedade e prioridade da contribuição científica de um autor; q) identificar fontes de informação; r) auxiliar na avaliação dos hábitos de coleta de informações; s) expor a literatura relevante na área. Tendo em vista as várias funções e motivos para citar, não se pode deixar de lembrar que a familiaridade com a língua na qual o documento foi publicado, também 38 influencia na escolha do pesquisador, no entanto, é complicado afirmar como um pesquisador seleciona suas referências, a não ser que se estude o padrão de citação desse pesquisador. O que se pode afirmar é que a citação é um elemento fundamental que, por vezes, pode determinar o grau de relevância de um documento. No entanto, é necessário observar os vários aspectos que envolvem as citações feitas, pois os aspectos sociais, epistemológicos, de acesso à língua original e até mesmo o quão profundo é o conhecimento do autor citante, tudo isso faz parte de um contexto no momento da produção de um artigo e deve ser observado no momento da análise da citação. 3.1 Análise de citação Um artigo publicado por Garfield em 1972 apresenta a importância da análise de citação, referindo-se a um estudo estatístico das referências citadas no periódico científico The Journal of the American Chemistry Society em seu volume editado em 20 de outubro de 1926, por Gross e Gross que, em 1927, registra o uso da análise de citações por estudiosos como Allen (1929), Gross e Woodford (1931), Hooker (1935), Henkle (1938), Fussler (1949), Bradford (1953) e Brown (1956), esses pesquisadores usaram as análises de citação como ferramenta para avaliação de periódicos. Devido ao expressivo aumento de pesquisas utilizando análises de citação durante a década de 1960, o Science Citation Index (SCI) do Institute of Scientific Information (ISI) foi criado, permitindo a cartografia das relações entre publicações científicas e tecnológicas reconhecidas a nível internacional. De acordo com Swales (1986), o desenvolvimento tecnológico e a acessibilidade aos computadores contribuíram significativamente para o crescimento do uso das análises de citação e para o lançamento do Science Citation Index do Institute of Scientific Information em 1964 por Eugene Garfield. A análise de citação é usada como ferramenta para a avaliação do conhecimento em uma determinada área científica, para a tomada de decisões e, principalmente, para subsidiar decisões sobre investimentos no setor público. Possibilita a realização de diagnóstico e prognóstico de fatos que permeiam a comunicação científica em uma determinada área ou instituição, sendo um dos métodos mais utilizados dentre os estudos métricos da informação para medir o impacto e a visibilidade de determinados autores dentro de uma comunidade científica. 39 Em 1975, Moravcsik e Murugesan usavam as citações para mensurar a produção científica individual, de grupos, instituições ou países. Como resultado, era possível apresentar a evolução da ciência em geral ou de um campo específico, além de medir o impacto das fontes de informação utilizadas, como o tipo de documento, o idioma e os periódicos mais citados, usando as citações para estabelecer os links entre os autores por meio das análises relacionais de citação. Décadas depois, Peritz (1992), aplica as análises de citação em três áreas distintas: a) na avaliação de pesquisadores, publicações e instituições científicas; b) na investigação de hipóteses a respeito da história e sociologia da ciência e tecnologia; c) no estudo das características dos procedimentos de busca e recuperação da informação. A literatura nacional e internacional oferece insights sobre as citações, Urbizagástegui (1984), Mostafa (2002) e Vanz (2003), em seus estudos, comprovam que a análise de citação está entre as temáticas de maior interesse dos pesquisadores no Brasil, pois os estudos de citação constituem um importante indicador da atividade científica, além de contribuir para entender a estrutura e o desenvolvimento da ciência e também identificar as regularidades básicas de seu funcionamento, ao fornecer dados para suprir as necessidades estatísticas da produção científica do país. Uma pesquisa realizada por Silveira e Caregnato (2017), sobre os estudos de citação no Brasil, no período de 1973 a 2014, na Base de Dados em Ciência da Informação – BRAPCI, apresenta um panorama científico em que as análises de citação estão presentes ao longo dos 40 anos analisados. Nas décadas de 1980 e 1990 as pesquisas são oriundas das dissertações do Curso de Mestrado em Ciência da Informação do (IBICT); nas décadas de 2000 e 2010 o cenário dos estudos de citação também é resultado de dissertações e teses defendidas, no entanto, não somente do programa de pós-graduação do IBICT e sim dos programas de pós- graduação em CI do país. A utilização das análises de citação nas diferentes áreas pode apresentar padrões diferentes de uso das citações, sendo possível identificar o tipo de material citado nos documentos por pesquisadores, periódicos ou instituições entre diferentes disciplinas (ENGER, 2009; STEPHENS et al., 2013; ROSENBERG, 2015). Algumas 40 características como o idioma da publicação citada e a idade da citação também são observadas, assim como, a facilidade de acesso ao material citado. Vale ressaltar que algumas barreiras de acesso, relativas ao idioma ou ao conteúdo, podem influenciar o padrão de citação no período analisado, dentro de uma área científica ou de um canal de comunicação e disseminação, como um periódico por exemplo. Um estudo de análise de citação em teses e dissertações realizado por Rosenberg (2015), identificou que nos quatro anos analisados, mais de 90% do material utilizado como referência se encontrava dentro da biblioteca da instituição que produziu os resultados de pesquisas da pós-graduação em Antropologia e Sociologia. A facilidade de acesso ao material utilizado cria padrões de uso de citação e, por consequência, pode influenciar no crescimento exponencial de um pesquisador quando citado com frequência. Embora a análise de citação seja uma técnica relativamente antiga, é intensamente utilizada na CI, Strader, 2012; Hoffmann; Doucette, 2012; Stephens et al., 2013; Condic, 2015; Waltman, 2016, afirmam que a amplitude de sua aplicação sugere novas formas de análise, como estudos de redes de citações, visualização da informação, comportamentos de citação e análise de citação baseados no conteúdo citado e não apenas na lista de referências utilizada (HOU, 2017; DING et al. 2014). De acordo com Hyland (1999), práticas de citação acadêmica desempenham um papel fundamental na criação de áreas de conhecimento, desde que sejam avaliadas com um olhar tanto quantitativo quanto qualitativo. Isso porque a avaliação de citações baseia-se na hipótese de que a citação fornece um indicador confiável da influência de um trabalho citado em outro em análise, sugerindo conexões teórico/metodológicas. Analisar as citações ajuda a identificar a dinâmica de um campo científico e dos seus participantes. É importante usar a metodologia certa para conseguir resultados melhores. Além disso, existem análises de citação relacionais, como a cocitação e o acoplamento bibliográfico. O Acoplamento Bibliográfico (AB), conforme evidenciado por Kesller (1963), consiste em uma análise retrospectiva de citações realizada através da ligação de artigos que citem o mesmo documento. Por outro lado, a cocitação é estudada por Small (1973), para mensurar a associação entre diferentes artigos compartilhando a mesma referência. 41 Marshakova (1981), destaca a sutil diferença entre Acoplamento Bibliográfico e Cocitação, com base em suas metodologias próximas. O primeiro método avalia o nível de conexão entre artigos que citam o mesmo documento, enquanto o segundo método mede o grau de ligação de dois ou mais artigos pelo número de documentos que os mencionam simultaneamente. 3.2 Acoplamento Bibliográfico e Acoplamento Bibliográfico de Autores Segundo Kessler (1963), para realizar o acoplamento bibliográfico é necessário identificar e mensurar a relação existente entre dois artigos, com base no número de referências em comum citadas entre eles. A metodologia de Acoplamento Bibliográfico (AB) usando documentos, possibilita o estudo do desenvolvimento das linhas de pesquisa e seus núcleos, bem como, os pesquisadores e os artigos mais importantes de um domínio científico (GRÁCIO, 2016). Deste modo o AB conecta dois artigos que utilizam as mesmas referências, destacando-se que o conjunto das referências utilizadas pelos autores em seus artigos, retrata a ambientação dos fundamentos intelectuais no qual pesquisam dois artigos e quando apresentam bibliografias, cujas referências se repetem, há uma forte relação entre eles (KESSLER,1965). A força do vínculo entre dois trabalhos não muda com o passar do tempo, o que significa que a análise de acoplamento bibliográfico é um estudo retrospectivo e imutável. Pesquisadores distinguem dois métodos de estudos que envolvem citações: o sincrônico, que retrocede do presente para o passado, abrangendo os pesquisadores mais citados em um certo período; e o diacrônico, que considera as citações recebidas por um autor, instituição ou país ao longo de anos sucessivos. Segundo Glänzel (2003), os estudos sincrônicos são "estudos retrospectivos" estáticos, enquanto que os diacrônicos se focam em "estudos prospectivos" de citação, que se modificam com o tempo (OLIVEIRA, 2018). Para Carvalho (1975), Egghe e Rousseau (2002), a realização da análise de Acoplamento Bibliográfico possibilita entender o desenvolvimento das linhas de pesquisa, o que permite identificar seus núcleos, apresentando os autores e suas produções mais relevantes e os artigos importantes de uma determinada área científica dentro dos domínios identificados. Glänzel (2003) considera a metodologia baseada na análise do conjunto de referências como relevante para a visualização de um domínio. 42 É por meio do Acoplamento Bibliográfico que avaliamos a proximidade teórica, metodológica e temática entre artigos. Ao confrontar suas referências, podemos identificar esses detalhes. Quanto maior o número de referências compartilhadas, maior a similaridade (LUCAS; GARCIA-ZORITA; SANZ-CASADO, 2013). Zhao e Strotmann (2008), aprofundaram o Acoplamento Bibliográfico e desenvolveram o Acoplamento Bibliográfico de Autores (ABA), uma melhoria ao método sugerido por Kessler (1963). O objetivo do ABA é fazer um mapeamento das atividades científicas dos autores e gerar uma visualização palpável da estrutura intelectual de um ramo da ciência para expandir a compreensão das análises de redes de citações que envolvam autores. Segundo o ABA, quanto maior for o número de autores compartilhados por dois pesquisadores, maior será a semelhança entre as suas respectivas investigações científicas (QIU; DONG; YU, 2014). Esta abordagem responde à necessidade de melhor entendimento de um determinado tema, pois o estudo do acoplamento bibliográfico de documentos se destina a identificar tendências de pesquisa em áreas científicas. Enquanto na metodologia de acoplamento bibliográfico de autores (ABA), quanto mais referências dois autores compartilham em seus trabalhos, mais semelhantes são as pesquisas que realizam (QIU; DONG; YU, 2014). Ainda, a partir da caracterização científica de um pesquisador é possível visualizar sua identidade científica que ocorre a partir do uso constante e de forma recorrente das referências que ele faz, estas explicam sua identidade de citação. Segundo Cronin e Shaw (2002), as citações que ele recebe, a partir de quem o cita e com quem é citado simultaneamente, definem a imagem do pesquisador. Assim, a identidade intelectual de um autor decorre das próprias citações que ele faz, dependendo do foco de interesse de pesquisa naquela temporalidade, enquanto a imagem dele decorre do conjunto de pesquisadores com os quais ele é citado, destacando-se que tanto um quanto o outro são passíveis de mudanças, tanto em relação aos interesses de pesquisa (identidade do autor) ou mesmo foco científico (imagem), podendo determinar ou não o domínio científico do autor. Nesse cenário, a imagem de um pesquisador é formada pela cooperação de todos aqueles que foram citados juntos nos estudos científicos. O resultado é determinado pela comunidade de estudiosos ativos, também conhecidos como citers. Autocitações, apesar de contribuírem para uma melhor imagem do autor, devem ser 43 usadas com cuidado quando se trata de construir a imagem pessoal do autor e do domínio científico em que ele se insere. Hjørland (2003, 2004) propõe a análise de domínio como um método particularmente organizacional para caracterizar um campo de estudo. Ao combinar teoria e prática, esse método apresenta um panorama completo dos principais conceitos abrangidos pela área, permitindo que disciplinas correlatas, como Bibliometria, Organização do conhecimento e Recuperação da informação, possam interagir entre si. Considerando uma área da ciência representada por um grupo e o interesse em relação à institucionalização científica, temos a necessidade de compreender melhor as relações de pesquisa e institucionais da Ciência da Informação. Sua trajetória e produção científica que abrange vários períodos, dando lugar a debates sobre os temas discutidos pelos autores citantes, com a ajuda dos citados. 4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Esta pesquisa possui caráter bibliográfico e documental, realizada com a ajuda de material já publicado, disponível online, para atender aos requisitos da revisão teórica e da coleta de dados. É uma pesquisa descritiva, com a finalidade de descrever e estudar as características dos pesquisadores que se tornaram fundamentais na Ciência da Informação do Brasil ao longo dos últimos 50 anos. Foram analisados dados quantificáveis e utilizados métodos bibliométricos e estatísticos para examinar e interpretar os resultados, a fim de compreender melhor as questões relacionadas a esse percurso, isto é, os caminhos trilhados pela Ciência da Informação no Brasil, por meio das citações feitas por seus pesquisadores. Apresentam-se, a seguir, os procedimentos e recursos utilizados para o seu desenvolvimento. 4.1 Objeto da pesquisa: periódico Ciência da Informação Os artigos publicados no periódico Ciência da Informação, desde 1972 até 2021, foram tomados como fonte de dados empíricos para a realização da pesquisa. Ao longo destes 50 anos de publicação periódica na área de Ciência da Informação no Brasil, tais referências são fundamentais para a análise relacional de citação. O conjunto de 1.018 artigos foi publicado em 128 fascículos e 50 volumes, com periodicidade irregular em alguns anos. De 1972 a 1991, a periodicidade foi semestral, os volumes 1 ao 20 produziram 41 fascículos e 237 artigos. De 1992 a 2021 esse número aumentou expressivamente, os volumes 21 ao 50 tiveram diminuído seu 44 tempo de publicação. O periódico passou a ser quadrimestral, tendo aumentado o número de fascículos para 87, com 781 artigos. Lançado em 30 de junho de 1972, o periódico Ciência da Informação foi considerado um marco histórico, tanto para o curso de mestrado em Ciência da Informação quanto para o próprio IBICT. Seu primeiro fascículo continha seis artigos, abordando assuntos sobre a importância do uso de bibliografia e o surgimento da CI no Brasil. Sua periodicidade era semestral e continuou assim até o ano de 1991. Em 1992 passou a ser quadrimestral e mantém essa característica até os dias atuais em seu último fascículo publicado durante esta pesquisa. Sendo este uma Edição Retrospectiva com informações sobre os conselhos editoriais dos anos de 2013 a 2021, contidos no volume 50, número 3 de 2021(IBICT, 2022). A relevância do periódico Ciência da Informação fica bem clara a partir dos estudos conduzidos por Cunha (1985), Foresti (1990) e Silveira e Moura (2006). Esta revista está entre as mais antigas e relevantes no meio acadêmico brasileiro, tendo mais de meio século de presença ativa e impacto significativo. O seu grupo editorial é formado por profissionais altamente qualificados e experientes, com políticas e diretrizes claras e objetivas. Destinando-se a publicar artigos inéditos que versam sobre os processos envolvidos na produção, organização, disseminação, recuperação e utilização da informação, abarcando tanto os aspectos teóricos quanto os práticos da Ciência da Informação. Estudos como o de Silveira e Caregnato (2017) apresentam o periódico como um dos veículos disseminadores preferenciais dos autores na produção científica sobre os estudos de citação, a pesquisa analisou os anos de 1972 a 2014 e a revista Ciência da Informação se destacou dentre os demais periódicos nacionais da área de CI com, pelo menos, 19 artigos relacionado a análise de citação. O periódico indexa e publica 17 tipos de documentos, conforme classificação listada abaixo. Para esta pesquisa, foi considerado apenas o artigo, descartando qualquer outra tipologia publicada, pois cada documento apresenta uma característica peculiar ao objetivo proposto. a) Artigos j) Panorama a) Cartas k) Planos de Pesquisa em CI b) Comunicação l) Pontos de vista c) Documentos m) Recensão 45 d) Entrevistas n) Relatos de experiência e) Especial o) Resenhas f) Fórum p) Revisão de literatura g) Índice q) Sistemas e serviços h) Livros e Periódicos Com a exacerbada produção informacional e tecnológica, o que levou à popularização da internet, houve a necessidade de disseminação da informação em meio digital. Para enfrentar esse desafio, em 1996, o periódico C