UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Graduação em Geologia ESTRUTURAS SEDIMENTARES E TECTÔNICA SINSEDIMENTAR DA FORMAÇÃO ARARIPINA, BACIA DO ARARIPE, NORDESTE DO BRASIL ANDRÉ SANTIAGO MARTINS DE ANDRADE Orientador: Prof. Dr. Lucas Veríssimo Warren Rio Claro (SP) 2016 Andrade, André Santiago Martins de Estruturas sedimentares e tectônica sinsedimentar da Formação Araripina, Bacia do Araripe, Nordeste do Brasil / André Santiago Martins de Andrade. - Rio Claro, 2016 94 f. : il., figs., tabs. Trabalho de conclusão de curso (Geologia) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas Orientador: Lucas Veríssimo Warren 1. Sedimentação e depósitos. 2. Estratigrafia. 3. Sistema deposicional. 4. Paleocorrentes. 5. Deformações sinsedimentares. I. Título. 551.303 A553e Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP Dedico esta obra à minha família, que sempre me apoiou, confiou e me deu forças. AGRADECIMENTOS Ao convênio PETROBRAS / UNESP / FUNDUNESP (Nº SAP – 4600479561), projeto 2014/00519-9 intitulado “Relações entre Tectônica e Sedimentação em Bacias do interior do Nordeste do Brasil”, pelo apoio acadêmico e financeiro, indispensáveis à realização deste trabalho. E também pela oportunidade de aprendizagem e de contato com a Bacia do Araripe. Aos Profs. Drs. Lucas Veríssimo Warren e Mario Luis Assine, grandes cientistas, pela amizade, paciência e pelos tantos ensinamentos que, com uma didática incrível, foram passados a mim. Agradeço pelas discussões seja em sala, campo ou bar e pelo incentivo que muito contribuíram para meu aprendizado e realização desta obra. Agradeço também pela oportunidade de fazer parte dessa equipe excelente, que está em constante busca por conhecimento. Ao Centro de Geociências Aplicadas ao Petróleo - UNESPetro (Rio Claro – SP) pelo fornecimento de material, espaço e equipamentos fundamentais na realização desta monografia. Também ao Departamento de Geologia Aplicada (DGA) por fornecer o Laboratório de Estudos Quaternários (LEQ), que mais tardiamente veio a se tornar nosso local de estudo e pesquisa. E por todos os funcionários envolvidos nesses ambientes. Ao Prof. Dr. Eric Tohver, amigo e grande pesquisador, que me acolheu do outro lado do mundo e me deu a oportunidade de aprender mais sobre geologia. Aos meus queridos pais, André e Cláudia, minha irmã Ana Júlia, meus avós André, Leila, vó Zezé e Vô Hernani, tia Roxane (Dinda) e tia Lúcia, ao grande tio Fernando Moraes (tio Nando) por ter me apresentado a essa ciência incrível e pelo primeiro martelo Estwing, a Leilinha (minha outra irmã), tia Ignêz, e a todos os queridos tios(as), primos(as) e familiares por serem meus pilares e sempre acreditarem em mim. Aos amigos e geólogos do Laboratório de Estudos Estratigráficos (LEE), Filipe Varejão, Michele Custódio e Patrícia Mescolotti por me receberem tão bem como novo integrante da equipe e pelo companheirismo e discussões sempre muito proveitosas. Também ao Prof. Dr. Maurício dos Santos e o Dr. Luciano Alessandretti pelos ensinamentos e por serem sempre solícitos a ajudar. Aos grandes amigos e companheiros de infância Thomaz, Tiago, Guilherme, Daniel, Raphael, Lucas Leal, Mateus (primo), Matheus, Lucas Farias, Amandinha, Caíque, Joãozinho, Rafael (Carioca), Marcelo, pessoal inesquecível da Marquês de Pombal: Rafael, Renatinho, Lucas, Aruã, Marcella, Caroline, Shayna, Marcos, Fernandos; aos amigos pra vida toda que fiz e pessoas especiais que conheci na UNESP, Yuri (Mullets) e toda Rep. Grosa, Ramon (Presunto), Vinicius (Placenta), toda Rep. Velhas: Pedro (Tupã), Andrey (Mofo), Leonardo (Lumbriga), Rodolfo (Baby), ao Rodrigo, Samuel (Bala), Ito, Gean (Ganso), Tatiany (melhor dupla de campo 2), Tatiana (Xena), Marina, Flávia, Isabella (Xilique), Laura (Gina), Igor, Pikachu, Matheus, Cleberson e toda sala Geobilados 2011, melhor time do interclasse da história, Maria, Luís Felipe (Forman), Vinícius (Cheba), Caio (Boca), Antonio (Stopa), Diego (Cindi), José Antonio (Zé), Felipe (Xuxa), Felipe (Guaxina), e a toda Rep. Mansão, Vany, Breno (Bide), Leonardo (Patolino) e toda Rep. Fossa, Sérgio, (Modelo), Alessandro, Cibele, Caio, Ricardo, Bergo, Jonas (Ralo), Caio (Ferrugem), Juliana (Peteca), Helder (Buda), Larissa, Vanderlei F. (salvador), Eduardo (Morróida), Fernando (Itaí), Fabio Tosi, Gabriel (Leite), Thomas (bixão Fritz) e todos os integrantes do EGRIC, Santiago, Rogerinho e aos irmãos que fiz na Austrália Gustavo (ia ia o), Gustavo (Anelli), Thomas (Cano), Murilo, Pedro, Camilo, Sara, Ana (bolacha), Ana (biscoito), Jade, Igor, Alan, Pedro (UFOP), Leandro, Kape, Chisha, Rhander, Leo, Rodrigo, Eduardo, Karen, Matus, Laura, Beatriz, Torrin, Cam, Andrew, Giulio, Kamila, Nicholas, Charmaine, Gary, Graham, Acad, Theis, Kris, Kev, Felix, Bataa, e todos os outros amigos, que sempre me apoiaram e fizeram essa jornada ser a melhor possível. Aos professores e funcionários do Colégio Rosário que contribuíram para o meu crescimento como pessoa. A todos os Professores da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” e The University of Western Australia que contribuíram para a minha formação, passando seus conhecimentos e experiências sobre os diversos campos dessa maravilhosa ciência que é a geologia. “O primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida.” Carl Sagan i RESUMO A Bacia do Araripe é a mais extensa bacia interior do Nordeste do Brasil. Apresenta complexa evolução tectono-estratigráfica relacionada aos regimes de esforços que originaram o Oceano Atlântico Sul. A Formação Araripina faz parte da sequência pós-rifte desta bacia, tem idade mesoalbiana e é composta predominantemente por ritmitos com evidências localizadas de deformação penecontemporânea, como pseudonódulos, injectitos e dobras convolutas. Essas deformações estão relacionadas ora à atividade sísmica (sismitos), ora à compactação por sobrecarga oriunda de processos inerentes ao sistema deposicional. As fácies e associação de fácies da Formação Araripina sugerem paleoambiente deposicional continental. A sedimentação se deu em planícies distais de leques aluviais, canais de rios e lagos efêmeros e lagos tectônicos. A sucessão como todo está limitada na base por discordância litológica com o embasamento (ou com a Formação Romualdo) e no topo por discordância erosiva (localmente angular) com a Formação Exu. O padrão de paleocorrentes da Formação Araripina sugere mergulho deposicional para leste e áreas-fonte a oeste. Desta forma, as paleocorrentes para oeste da Formação Exu sugerem mudança polarizada da sedimentação, resultado de basculamento da bacia com soerguimento mais intenso da porção leste, reconfigurando a paleodrenagem continental. A ação de tectônica formadora e modificadora na Formação Araripina é incisiva e é atribuída às reativações de estruturas do embasamento durante o Albiano. Essas reativações estão relacionadas, principalmente, à abertura do Oceano Atlântico Equatorial e originaram tanto deformações sinsedimentares (tectônica formadora) como falhas e estruturas basculadas posteriores (tectônica modificadora). A ocorrência de fraturamentos e falhamentos (normais e inversos) com padrões NE-SW, E-W e NW-SE, concordantes com lineamentos do embasamento cristalino, corroboram com essa hipótese. A unidade é principalmente afetada pelo Lineamento de Patos que inflete na porção oeste da bacia para sudoeste por meio da Falha de Farias Brito. Palavras-chave: Bacia do Araripe. Formação Araripina. Sistema Deposicional. Paleocorrentes. Deformações sinsedimentares. ii ABSTRACT The Araripe Basin is the most extensive interior basin in Northeast of Brazil and presents a complex evolution of its stratigraphic framework related to tectonics that originated the South Atlantic Ocean. The Araripina Formation is part of the post-rift sequence of this basin and it is dated from middle Albian. The unit is composed predominantly of rhythmites with local evidences of synsedimentary deformation such as pseudonodules, injectites and convoluted folds. These deformations are related either to seismic activity (seismites) or to compaction caused by overload which is inherent to the depositional system. Facies and facies association suggest continental paleoenvironment. The sedimentation occurred in distal-fan “flat” environment, ephemeral lakes and river channels and tectonic lakes. The stratigraphic succession is limited at the base by a lithological unconformity with the basement (or Romualdo Formation) and by erosional unconformity (locally angular unconformity) with Exu Formation at the top. The paleocurrents pattern of Araripina Formation suggests deposition towards east and source-areas at west. Therefore, the paleocurrents pattern towards west shown by Exu Formation indicates a polarized change in sedimentation. This change is product of epirogenetic uplift of the basin which was more intensive at the east portion and rearranged all the Brazilian northeastern continental paleodrainage. The action of syn and post tectonics in Araripina Formation is incisive and it is attributed to reactivations of basement structures during Albian. These reactivations are related mainly to the opening of Equatorial Atlantic Ocean and originated both synsedimentary deformations (syn tectonics) and posterior faults and tilted structures (post tectonics). The occurrence of fractures and faults (normal and reverse) that show NE-SW, E-W and NW-SE patterns, concordant with tectonic lineaments of the crystalline basement, corroborates with this hypothesis. The unit is mainly affected by the Patos Lineament which, in this area, inflows to the southwest through the Farias Brito Fault. Keywords: Araripe Basin. Araripina Formation. Depositional System. Paleocurrents, Synsedimentary Deformations. iii ÍNDICE DE FIGURAS FIGURA 1 - BACIAS SEDIMENTARES DO NORDESTE BRASILEIRO COM DESTAQUE PARA A BACIA DO ARARIPE (ASSINE, 1990). ............................................................................................................................. 1 FIGURA 2 - IMAGEM SRTM DA BACIA DO ARARIPE COM DESTAQUE PARA A CHAPADA DO ARARIPE (FORMAÇÃO ARARIPINA E EXU; GRUPO ARARIPE) .................................................................................................. 2 FIGURA 3 – LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO NO OESTE DA CHAPADA DO ARARIPE E SUAS RESPECTIVAS VIAS DE ACESSO ................................................................................................................................ 4 FIGURA 4 – LOCALIZAÇÃO DOS PONTOS ESTUDADOS NA PORÇÃO OESTE DA CHAPADA DO ARARIPE ............... 7 FIGURA 5 – MAPA GEOLÓGICO E PERFIL W-E DA BACIA DO ARARIPE (ASSINE, 2014). .............................. 12 FIGURA 6 – CARTA ESTRATIGRÁFICA DA BACIA DO ARARIPE COM DESTAQUE PARA FORMAÇÃO ARARIPINA (ASSINE, 2007). ........................................................................................................................... 16 FIGURA 7 – CARTA ESTRATIGRÁFICA DA BACIA DO ARARIPE MOSTRANDO O PÓS-RIFTE II, COM DESTAQUE PARA A FORMAÇÃO ARARIPINA (ASSINE, 2007). ...................................................................................... 18 FIGURA 8 - LEGENDA PARA AS SEÇÕES DAS FIGURAS 9 A 14. ..................................................................... 22 FIGURA 9 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA PRÓXIMA AO AEROPORTO (PONTO 1), MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. ................................................................................................................................................ 23 FIGURA 10 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA NO SÍTIO TORRE GRANDE (PONTO 2), MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. ................................................................................................................................................ 24 FIGURA 11 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA NA LOCALIDADE FAZENDA (PONTO 3), MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. ................................................................................................................................................ 25 FIGURA 12 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA NA LOCALIDADE RIACHO MARINHEIRO (PONTO 6), NO MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. ............................................................................................................................ 26 FIGURA 13 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA NAS PROXIMIDADES DO RIACHO BOM JARDIM (PONTO 7), MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. ....................................................................................................... 27 FIGURA 14 – SEÇÃO COLUNAR LEVANTADA NO SÍTIO BARRO (PONTO 8), MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE. .... 28 FIGURA 15 - CORRELAÇÃO ESTRATIGRÁFICA DAS SEÇÕES LEVANTADAS. .................................................... 29 FIGURA 16 – FÁCIES ARENOSAS ST, SR, SH, SM. ...................................................................................... 33 FIGURA 17 – FÁCIES HETEROLÍTICAS (H) .................................................................................................. 35 FIGURA 18 – FÁCIES RÍTMICAS (R) COM INTERCALAÇÕES ENTRE ARENITO MUITO FINO/SILTOSO ALARANJADO E ARGILITO/LAMITO ROXO. .................................................................................................................. 38 FIGURA 19 – BIOTURBAÇÕES ABUNDANTES EM FÁCIES P (MARCAS DE RAÍZES EM A E D) E EM FÁCIES R (ICNOFÓSSEIS NÃO IDENTIFICADOS EM B E C). EM B, ESTRUTURAS VERTICAIS E EM C, HORIZONTAIS (FOTO EM PLANTA) .......................................................................................................................... 39 FIGURA 20 – FÁCIES DE SEDIMENTOS PELÍTICOS FM E FL. ......................................................................... 41 FIGURA 21 – FÁCIES P (PALEOSSOLOS) ................................................................................................... 42 FIGURA 22 – ROSETAS DE PALEOCORRENTES DAS FORMAÇÕES ARARIPINA E EXU NO OESTE DA BACIA DO ARARIPE ......................................................................................................................................... 45 FIGURA 23 – PROCESSO DE RECUO DA ESCARPA DA CHAPADA DO ARARIPE E ESTRUTURAS RESULTANTES .. 46 FIGURA 24 - RELAÇÕES ESTRATIGRÁFICAS E GEOMORFOLÓGICAS ENTRE AS UNIDADES QUE LIMITAM A FORMAÇÃO ARARIPINA .................................................................................................................... 48 iv FIGURA 25 – CICLOS DE GRANODECRESCÊNCIA ASCENDENTE ................................................................... 49 FIGURA 26 – BLOCO-DIAGRAMA DO SISTEMA DEPOSICIONAL PROPOSTO PARA A BASE DA FORMAÇÃO ARARIPINA. ..................................................................................................................................... 53 FIGURA 27 – TRUNCAMENTOS INTERESTRATAIS ........................................................................................ 58 FIGURA 28 – HORIZONTE BEM MARCADO DE SISMITO NA FÁCIES RITMITO (R), COM PRESENÇA DE ESTRUTURAS SINDEPOSICIONAIS COMO DOBRAS CONVOLUTAS MÉTRICAS LIMITADAS POR CAMADAS PLANO-PARALELAS ...................................................................................................................................................... 59 FIGURA 29 – DOBRAS CONVOLUTAS RECUMBENTES (COM PLANOS AXIAIS HORIZONTAIS A SUB-HORIZONTAIS) LIMITADAS POR ESTRATOS PLANO-PARALELOS, EM HORIZONTES PREFERENCIAIS ................................ 60 FIGURA 30 – BRECHAS INTRAFORMACIONAIS GERADAS A PARTIR DO RETRABALHAMENTO DOS RITMITOS ...... 61 FIGURA 31 – INJECTITOS NA FORMAÇÃO ARARIPINA ATRIBUÍDOS A ABALOS SÍSMICOS. ................................ 62 FIGURA 32 – PSEUDONÓDULO DE ARENITO FINO A MÉDIO DE PORTE MÉTRICO PODE SER ENCONTRADO EM MEIO À FÁCIES R ............................................................................................................................. 62 FIGURA 33 – ESTRUTURAS DE FLUIDIFICAÇÃO (ONDE O ACAMAMENTO ORIGINAL É OBLITERADO E O MATERIAL SE COMPORTA COMO FLUIDO) EM FÁCIES HETEROLÍTICAS (H) E RÍTMICAS (R) .................................... 64 FIGURA 34 – ESTRUTURAS SINDEPOSICIONAIS DE CARGA FORMADAS POR COMPACTAÇÃO DOS SEDIMENTOS COM AUMENTO DE PRESSÃO DE FLUIDOS NOS POROS E CONSEQUENTE LIQUIDIFICAÇÃO ...................... 65 FIGURA 35 – DEFORMAÇÕES PLÁSTICAS PENECONTEMPORÂNEAS NA FORMAÇÃO EXU (ALMOFADA – AREIA; CHAMA – ARGILA), LIMITADAS POR NÍVEIS TABULARES PLANOS ........................................................... 66 FIGURA 36 – FALHAS NORMAIS E INVERSAS .............................................................................................. 68 FIGURA 37 – FALHAS INVERSAS ............................................................................................................... 69 FIGURA 38 – ESTEREOGRAMA DE SCHMIDT (HEMISFÉRIO INFERIOR) MOSTRANDO A DISPERSÃO DOS PÓLOS PARA AS FRATURAS NA FORMAÇÃO ARARIPINA ................................................................................. 69 FIGURA 39 – ESTRUTURAS EM SPLAY E LINEAMENTOS DO EMBASAMENTO (PROVÍNCIA BORBOREMA) COM PREDOMINÂNCIA DE DIREÇÕES NE-SW E E-W, E ALINHAMENTO DE DRENAGENS NA DIREÇÃO NW-SE 70 FIGURA 40 – ESTEREOGRAMA DE SCHMIDT (HEMISFÉRIO INFERIOR) MOSTRANDO A DISPERSÃO DOS PÓLOS PARA AS FRATURAS NA FORMAÇÃO EXU ........................................................................................... 71 v ÍNDICE DE TABELAS TABELA 1 – COORDENADAS GEOGRÁFICAS DAS SEÇÕES ESTRATIGRÁFICAS LEVANTADAS (DATUM WGS84 – UTM; ZONA 24S). .......................................................................................................................... 20 TABELA 2 – TABELA DE FÁCIES SEDIMENTARES DESCRITAS PARA A FORMAÇÃO ARARIPINA. ........................ 21 TABELA 3 – ASSOCIAÇÃO DE FÁCIES E RESPECTIVO SISTEMA DEPOSICIONAL INTERPRETADO. ..................... 52 vi SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 1 2 OBJETIVOS ................................................................................................................................................. 4 3 MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................................................... 5 3.1 SENSORIAMENTO REMOTO ....................................................................................................................... 5 3.2 ANÁLISE DE FÁCIES E ASSOCIAÇÃO DE FÁCIES SEDIMENTARES ..................................................................... 6 3.3 LEVANTAMENTO DE SEÇÕES COLUNARES ................................................................................................... 7 3.4 ANÁLISE DE DEFORMAÇÕES SINSEDIMENTARES .......................................................................................... 9 3.5 ANÁLISE DE PALEOCORRENTES ................................................................................................................. 9 3.6 ANÁLISE ESTRUTURAL ............................................................................................................................ 10 4 CONTEXTUALIZAÇÃO GEOLÓGICA ...................................................................................................... 11 4.1 BACIA DO ARARIPE ................................................................................................................................ 11 4.2 FORMAÇÃO ARARIPINA ........................................................................................................................... 17 5 FÁCIES SEDIMENTARES......................................................................................................................... 20 5.1 ARENITOS COM ESTRATIFICAÇÃO CRUZADA ACANALADA (FÁCIES ST) ......................................................... 30 5.2 ARENITOS COM LAMINAÇÃO CRUZADA CAVALGANTE/CLIMBING RIPPLES (FÁCIES SR) ................................... 30 5.3 ARENITO MACIÇO (FÁCIES SM) ............................................................................................................... 31 5.4 ARENITO COM ESTRATIFICAÇÃO PLANO-PARALELA (SH) ............................................................................ 32 5.5 HETEROLÍTICAS WAVY, FLASER E LINSEN (FÁCIES H) ................................................................................ 34 5.6 RITMITO (FÁCIES R) ............................................................................................................................... 36 5.7 ARGILITO (FÁCIES FM) ........................................................................................................................... 39 5.8 LAMITO LAMINADO (FÁCIES FL) ............................................................................................................... 40 5.9 PALEOSSOLOS (FÁCIES P) ...................................................................................................................... 41 6 PALEOCORRENTES DO GRUPO ARARIPE NA PORÇÃO OESTE DA BACIA DO ARARIPE ............ 43 7 SISTEMAS DEPOSICIONAIS DA FORMAÇÃO ARARIPINA .................................................................. 47 8 DEFORMAÇÕES SINSEDIMENTARES ................................................................................................... 54 8.1 ESTRUTURAS DE DEFORMAÇÃO SINSEDIMENTAR: ESTADO DA ARTE ........................................................... 54 8.1.1 Mobilidade de sedimentos após sua deposição .......................................................................... 54 8.1.2 Agentes Desencadeadores de deformações (Triggers) .............................................................. 55 8.1.3 Estruturas de deformação em sedimentos inconsolidados ......................................................... 55 8.1.4 Remobilização de sedimentos já consolidados: um caso à parte ............................................... 56 8.2 TECTÔNICA SINSEDIMENTAR (FORMADORA) DA FORMAÇÃO ARARIPINA ...................................................... 57 9 TECTÔNICA RÚPTIL (MODIFICADORA) NA PORÇÃO OESTE DA BACIA DO ARARIPE .................. 66 10 CONCLUSÕES ........................................................................................................................................ 72 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................ 75 APÊNDICE .................................................................................................................................................... 82 1 1 INTRODUÇÃO A Bacia do Araripe (Figura 1) é a que apresenta evolução geológica mais complexa dentre as bacias interiores do Nordeste do Brasil. Seu arcabouço estratigráfico é constituído por diferentes sequências estratigráficas que registram sucessões sedimentares depositadas em contextos tectônicos distintos (ASSINE, 1992). O registro mesozoico da bacia está associado aos eventos de ruptura de Gondwana (Jurássico superior/ Cretáceo inferior) e abertura do Oceano Atlântico Sul. Os esforços tectônicos da fragmentação do supercontinente provocaram o desenvolvimento de embaciamentos gerados por reativação de estruturas do embasamento, depositando sequências estratigráficas limitadas por discordâncias regionais (ASSINE, 2007). A evolução poli-histórica (BRITO NEVES, 1990) é organizada em quatro sequências tectono-sedimentares distintas: (1) paleozoica; (2) pré-rifte; (3) rifte; e (4) pós-rifte (ASSINE, 2007). Figura 1 - Bacias sedimentares do nordeste brasileiro com destaque para a Bacia do Araripe (ASSINE, 1990). 2 A sequência pós-rifte é subdividida em duas sucessões depositadas em pulsos tectônicos distintos: pós-rifte I e II. O primeiro pulso, neoaptiano-albiano, é representado pelo Grupo Santana, e o segundo, albo-cenomaniano, é formado pelos depósitos da Formação Araripina e da Formação Exu (Grupo Araripe; Figura 2). Apesar de serem depositadas ainda em condições globais de eustasia positiva (HAQ et al., 1987), a sucessão pós-rifte II apresenta sedimentação exclusivamente continental (ASSINE, 2007). Figura 2 - Imagem SRTM da Bacia do Araripe com destaque para a Chapada do Araripe (Formação Araripina e Exu; Grupo Araripe) em tom laranja, que evidencia sua maior elevação em relação às áreas adjacentes. Destaque também para o embasamento da Província Borborema marcado por grandes estruturas regionais em splay, como o Lineamento de Patos e suas ramificações. Fonte: INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). A Formação Araripina aflora somente na porção oeste da bacia e recobre em discordância angular as unidades inferiores (Grupo Santana – Formação Romualdo), ou ainda, é depositada diretamente sobre o embasamento cristalino (rochas pré- cambrianas/eopaleozoicas). As rochas do embasamento são cortadas por antigos falhamentos de direção NE-SW que foram reativados durante o Mesozoico e são relacionados à terminação oeste das estruturas do Lineamento da Paraíba ou 3 Lineamento de Patos (PONTE & PONTE FILHO, 1996; ASSINE, 2007). A unidade é sobreposta pela Formação Exu em discordância erosiva (quando não se encontra completamente erodida), com pequena angularidade em determinados locais (ASSINE, 2007). A Formação Araripina tem espessura máxima de 100 metros e é constituída predominantemente por ritmitos (arenitos finos e lamitos intercalados) com lentes de arenito médio. Apresenta uma associação de fácies que é interpretada de três maneiras diferentes na literatura: (1) registro de sedimentação em planícies de leques aluviais (ASSINE, 2007); (2) sistemas lacustres rasos assoreados (ALMEIDA, 2010); (3) ambiente transicional litorâneo (PONTE & PONTE FILHO, 1996), em condições de clima quente e árido (LIMA, 1978b). A unidade destaca-se pela ocorrência de diversas estruturas de deformação sin-deposicionais como estruturas de carga (chama, almofada, ball-and-pillow, pseudonódulos), além de slumps, dobras convolutas, brechas intraformacionais e truncamentos internos (ASSINE, 2007). Face o acima exposto, o estudo sistemático da Formação Araripina se mostra bastante promissor visto que não há na literatura trabalhos de detalhe sobre a sedimentologia da unidade e as estruturas deformacionais presentes. Além disso, as interpretações conflitantes quanto ao paleoambiente deposicional da unidade não permitem delinear com precisão os sistemas deposicionais então atuantes neste estágio de evolução da bacia. Desta forma, este trabalho visa contribuir para o melhor entendimento da relação entre sedimentação e tectônica não só dessa sucessão, mas também das demais bacias interiores do Nordeste brasileiro. Localização e acesso à área de estudo A Formação Araripina apresenta suas melhores exposições na região dos municípios de Marcolândia (PI) e Araripina (PE). Em função disto, a área selecionada para este trabalho compreende à divisa dos estados do Piauí, Pernambuco e Ceará. O acesso à área (Figura 3) se dá pelas rodovias CE-292, BR122 e PE-585, que ligam os municípios de Juazeiro do Norte (CE) e Araripina (PE). A BR316 liga os municípios de Araripina (PE) e Marcolândia (PI). 4 Figura 3 – Localização da área de estudo (quadrado vermelho) no oeste da Chapada do Araripe (linha branca) e suas respectivas vias de acesso partindo-se do município de Juazeiro do Norte (CE). Mapa do Brasil no canto superior direito da imagem com a localização da Bacia do Araripe no retângulo azul. Fonte: Imagem de satélite adquirida no dia 20 de Abril de 2016 - Google Earth (Pro). 2 OBJETIVOS O presente trabalho tem por objetivo estabelecer o quadro deposicional e evolutivo da Formação Araripina. Conceitos modernos de sedimentologia, tais como análise de fácies e de paleocorrentes, serão aplicados a fim de compor o quadro deposicional e paleogeográfico atuante durante a deposição da unidade. Além disso, pretende-se caracterizar e interpretar as evidências de tectonismo sindeposicional da unidade a partir da descrição das estruturas de deformação penecontemporâneas (fluidificações, convoluções, deformações interestratais, feições de escorregamento, etc.) e associadas a movimentos ao longo de planos de falha (brechas, dobras de arrasto, fraturas, estrias). 5 3 MATERIAIS E MÉTODOS Os trabalhos laboratoriais de tratamento de dados obtidos na fase de campo foram desenvolvidos no Laboratório de Estudos Estratigráficos (LEE) do UNESPetro (Centro de Geociências Aplicadas ao Petróleo) e no Laboratório de Estudos do Quaternário (LEQ) – ambos da UNESP, Câmpus Rio Claro. Os métodos e técnicas investigativas aplicados a fim de se obter dados de cunho sedimentológico, estratigráfico e estrutural sobre a Formação Araripina, estão listados abaixo. 3.1 Sensoriamento Remoto Esta etapa incluiu o uso de softwares como Google Earth (Pro) e ArcGIS 10.2 para confecção de mapas de localização e geológicos, além do Global Mapper 15 para análise de imagens de satélite SRTM obtidas através dos websites do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), USGS (United States Geological Survey) e Global Land Cover Facility (Earth Science Data Interface). A obtenção destas imagens e o tratamento das mesmas foram fundamentais para a caracterização geomorfológica e definição das áreas de ocorrência da Formação Araripina. Este procedimento foi priorizado devido ao fato dessa unidade apresentar-se nas escarpas da Chapada do Araripe (Figura 2), feição geomorfológica de fácil identificação. Desta forma, facilitando a prospecção de exposições verticalmente contínuas da Formação Araripina. Além disso, a imagem de satélite SRTM possibilitou a constatação de topografia leste mais alçada que a oeste na Chapada do Araripe e permitiu delinear os lineamentos tectônicos do embasamento cristalino e as fraturas que cortam a bacia. 6 3.2 Análise de fácies e associação de fácies sedimentares A análise de fácies sedimentares (concomitantemente ao levantamento de seções estratigráficas) constitui de método fundamental na caracterização de sucessões sedimentares por sistematizar a descrição e interpretação dos aspectos litológicos, geométricos, paleontológicos e composicionais da unidade estudada (CATUNEANU, 2006). Este método é amplamente aplicado para a descrição de exposições de rochas sedimentares ou sedimentos, bem como testemunhos de sondagem (CATUNEANU, 2006). Uma fácies sedimentar é definida como um conjunto de rochas geneticamente relacionadas e corresponde ao registro geológico de um processo sedimentar particular (WALKER, 1992). É uma unidade que pode ser distinguida das demais por suas características litológicas, sua granulometria, grau de seleção e de arredondamento dos grãos, estruturas sedimentares, geometria dos estratos, fósseis e sua coloração (WALKER, 1992). Para a caracterização das litofácies sedimentares foi utilizada uma adaptação à classificação proposta por Miall (1978), que corresponde ao Código de Identificação de Fácies em que são utilizadas duas (ou três) letras, uma inicial maiúscula para a litologia seguida por uma (ou duas) letras minúsculas que designam a estrutura sedimentar presente. A partir do levantamento de seções colunares, o empilhamento vertical das fácies da Formação Araripina foi descrito e, desta forma, foram caracterizadas as associações de fácies. Isso permitiu o estabelecimento de modelos de fácies que serviram como parâmetro de comparação. Estes procedimentos são importantes na reconstituição de paleoambientes deposicionais, na análise de mudanças climáticas e da história de subsidência das bacias (CATUNEANU, 2006). 7 3.3 Levantamento de seções colunares Foi estudado um total de 15 pontos (Tabela de pontos no Apêndice), todos na porção oeste da Bacia do Araripe, nos quais apenas 6 foram realizados levantamentos de seções estratigráficas por apresentarem melhores sucessões verticais (Figura 4). As seis seções estratigráficas verticais (Figuras 8 a 14) foram levantadas na escala 1:200 com o uso de trena manual e bússola. Os dados de localização dos pontos analisados e seções foram obtidos com o uso do receptor GPS (Global Position System). Figura 4 – Localização dos pontos estudados na porção oeste da Chapada do Araripe, destacando- se em azul os pontos onde foram realizados os levantamentos de seções: (1) Seção Aeroporto; (2) Seção Sítio Torre Grande; (3) Seção Lagoa de Dentro; (6) Seção Riacho Marinheiro; (7) Seção Riacho Bom Jardim; (8) Seção Sítio Barro. Fonte: INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). 8 A seção Aeroporto (ponto 1) está localizada a oeste do perímetro urbano de Araripina (PE), próxima ao Aeroporto Regional do Araripe e possui 34 metros aflorantes da Formação Araripina. É depositada diretamente sobre o embasamento, porém não apresenta a Formação Exu preservada no topo (Figura 9). A seção Sítio Torre Grande (ponto 2) está situada no sítio homônimo, a sudoeste da cidade de Araripina (PE) onde ocorrem relevos residuais (inselbergs) da unidade com 23 metros de seção aflorante, também depositada diretamente sobre o embasamento e limitada pela discordância de topo com a Formação Exu (Figura 10). A seção Lagoa de Dentro (ponto 3) está situada próxima às duas seções anteriores, no Bairro homônimo também a sudoeste do perímetro urbano de Araripina (PE) e possui a menor espessura dentre as seções descritas, apresentando somente 10 metros da unidade, que mostra-se bem definida com uma só fácies e limitada por discordância basal com o embasamento e de topo com a Formação Exu (Figura 11). A seção Riacho Marinheiro (ponto 6) está situada próxima ao riacho homônimo nas proximidades do Bairro de Rancharia no município de Araripina (PE) e com aproximadamente 30 metros aflorante. É também limitada pela discordância com o embasamento na base e pela Formação Exu no topo (Figura 12). A seção Riacho Bom Jardim (ponto 7) está situada próxima ao riacho homônimo, sendo a seção levantada mais a sudoeste da cidade de Araripina (PE). Sua base e contato com o embasamento apresentam-se encobertos por depósitos de tálus e não apresenta o contato com a Formação Exu no topo (Figura 13). Já a seção Sítio Barro (ponto 8) está localizada no sítio homônimo e representa a única seção estratigráfica levantada a leste da cidade de Araripina (PE), situando-se entre as cidades de Araripina (PE) e Trindade (PE). Tem aproximadamente 28 metros de espessura. É encoberta também por depósitos de tálus em sua base, estando o embasamento a 20 metros de profundidade em relação ao primeiro afloramento e é limitada pela Formação Exu no topo (Figura 14). Apesar de não ser possível definir nenhum marco estratigráfico (datum) para a Formação Araripina até o momento, pode-se fazer uma correlação estratigráfica (Figura 15) entre as seções levantadas a partir do embasamento e sua altitude, que 9 evidencia um paleorrelevo de altos e baixos sobre o qual foram depositados os sedimentos da unidade. 3.4 Análise de deformações sinsedimentares Foi também realizada a descrição e classificação de estruturas de deformação sinsedimentar observadas de acordo com sua gênese, que pode ser tectônica ou atectônica. Ambos os casos podem induzir a formação de estruturas similares, o que dificulta sua exata definição e exige a observação de uma gama de aspectos particulares sumarizados nos trabalho de Allen (1986), Montenat et al. (2007), Moretti & Sabato (2007), Owen (1987, 1996), Owen & Moretti (2011), Owen, Moretti & Alfaro (2011), Rossetti & Goes (2000) e Seilacher (1969, 1984). 3.5 Análise de paleocorrentes As medidas de paleocorrentes constituem um método bastante eficaz e frequentemente utilizado para reconstrução da evolução paleogeográfica de bacias, pois fornece dados estatísticos do rumo do aporte indicando, assim, os padrões de dispersão sedimentar. Segundo Assine (1994), devido à natureza incompleta do registro sedimentar da Bacia do Araripe e às poucas informações de subsuperfície disponíveis, a análise de paleocorrentes tem sido uma ferramenta essencial para a reconstituição da evolução tectono-sedimentar desta bacia. A importância do uso dessa metodologia no presente estudo se reforça no fato que o preenchimento sedimentar dessa bacia ocorreu predominantemente a partir de sistemas deposicionais continentais (caso da Formação Araripina) como aluviais e fluviais, nos quais a declividade topográfica controla o sentido de fluxo das águas em superfície. Deste modo, as formas de leito tendem a gerar estruturas direcionais e as medidas de paleocorrentes registram o mergulho deposicional original, permitindo reconhecer e interpretar mudanças nas áreas-fonte, reconstruir a 10 paleogeografia e interpretar fases de movimentação tectônica, contribuindo para a reconstituição da paleodrenagem continental (ASSINE, 2007). As medidas de paleocorrentes foram realizadas nas Formações Araripina e Exu com o uso da bússola Clar/Brunton modelo Geo Pocket Transit 5010. As paleocorrentes da Formação Araripina foram agrupadas em duas estações: (1) Seção Sítio Torre Grande, com 24 medidas; e (2) Ponto 15, com 9 medidas, totalizando 33 medidas. Na Formação Exu foram agrupadas em três estações: (1) Ponto 2, com 26 medidas; (2) Ponto 3, com 20 medidas; e (3) Ponto 8, com 18 medidas, totalizando 64 medidas. Para análise estatística dessas paleocorrentes, foi utilizado o software RockWorks® versão 14, gerando rosetas de isofrequência com vetor médio e intervalos de classes de 30º. 3.6 Análise Estrutural Medidas de falhas e juntas foram realizadas com o uso de bússola Clar/Brunton modelo Geo Pocket Transit 5010. Esses dados foram inseridos no software Openstereo, onde as medidas foram plotadas na forma de pólos no estereograma de Schmidt (hemisfério inferior), permitindo uma análise estrutural dos pontos estudados. 3.7 Documentação fotográfica A documentação fotográfica foi realizada concomitantemente ao levantamento das seções colunares e descrição de fácies. Feições sedimentares foram fotografadas em diferentes escalas, desde o nível de detalhe das fácies até paíneis fotográficos construídos a partir de uma série de imagens panorâmicas. Esses registros foram importantes para caracterização e ilustração das fácies e associação de fácies sedimentares (tanto lateral como verticalmente), feições deformacionais 11 diversas, além das relações estratigráficas com outras unidades litoestratigráficas contíguas. 4 CONTEXTUALIZAÇÃO GEOLÓGICA As bacias interiores do Nordeste do Brasil são um conjunto de pequenas bacias de idade Fanerozoica situadas entre as bacias do Parnaíba, Potiguar e Tucano-Jatobá (ASSINE, 1994). A Bacia do Araripe é a mais extensa bacia interior do Nordeste do Brasil, totalizando uma área de aproximadamente 9000 km² (ASSINE, 2007). 4.1 Bacia do Araripe Situa-se sobre terrenos pré-cambrianos pertencentes à Zona Transversal da Província Borborema (BRITO NEVES et al., 2000), entre os Lineamentos de Pernambuco e de Patos (Figura 1) a sul e a norte da bacia, respectivamente. A Zona de Cisalhamento ou Lineamento de Patos apresenta terminação oeste em uma série de falhas que formam geometrias sigmoides (semelhantes a splays). Estas falhas, de componente normal, sofreram diversas distensões de direção NW- SE no Cretáceo Inferior, invertendo as falhas originalmente transpressionais da Província Borborema (MATOS, 1992). Este processo resultou na reativação de pequenos segmentos (grabens) e gerou espaço de acomodação, dando origem às bacias interiores do Nordeste Brasileiro (MATOS, 1992). Essas reativações teriam ocorrido no período compreendido entre o Jurássico Superior e o Cretáceo Inferior, como resultado da separação dos continentes sul-americano e africano (MATOS, 1992). A Bacia do Araripe (Figura 5) possui forma alongada no eixo E-W e apresenta duas feições geomorfológicas principais: um altiplano do tipo mesa sedimentar que perfaz cerca de 70% da bacia (MORALES & ASSINE, 2015) e um vale localizado na parte leste. O altiplano é denominado Chapada do Araripe (Figura 2) e é composto de rochas datadas do albo-cenomaniano (LIMA, 1978b), enquanto que o vale é 12 denominado Vale do Cariri, no qual se encontram rochas datadas do Paleozoico ao Cretáceo Inferior (ROJAS, 2009). Em subsuperfície, na parte central da Chapada do Araripe, há a Sub-Bacia de Feira Nova, situada entre os altos de Araripina e Dom Leme, enquanto que na porção do Vale do Cariri há a Sub-Bacia do Cariri (Figura 5; ASSINE, 2007). Figura 5 – Mapa geológico e perfil W-E da Bacia do Araripe, com destaque para a área de estudo no quadrado vermelho (ASSINE, 2014). A evolução geológica da bacia é complexa, com arcabouço estratigráfico constituído por diferentes sequências estratigráficas limitadas por discordâncias regionais (ASSINE, 1992). É o registro de ciclos de subsidência gerados em ambientes tectônicos distintos (ASSINE, 1992). Seu registro Mesozoico está associado aos eventos de ruptura do Gondwana e abertura do Oceano Atlântico-Sul, no Jurássico superior/Cretáceo inferior (ASSINE, 2007). Desta forma, apresenta uma evolução complexa com quatro sequências deposicionais distintas (BRITO NEVES, 1990), a Paleozoica, Pré-rifte, Rifte e Pós-rifte (ASSINE, 2007; Figura 6). 13 A sequência Paleozoica aflora na porção leste da bacia, definindo os contornos do Vale do Cariri, e consiste na Formação Cariri (BEURLEN, 1962). Na parte oeste da bacia, esta unidade não é aflorante, ocorrendo apenas em subsuperfície na Sub- Bacia de Feira Nova (ASSINE, 2007). É constituída por arenitos imaturos, de granulação média a muito grossa, com grãos angulosos a subangulosos, interpretados como fácies geradas em sistemas fluviais entrelaçados (ASSINE, 2007). Esta sequência é correlacionada com a Formação Tacaratu, Ordoviciano da Bacia do Jatobá, devido a sua similaridade litológica (ASSINE, 2007). A supersequência pré-rifte foi depositada em fase de subsidência mecânica produzida por estiramento litosférico visco-elástico e é composta pelas formações Brejo Santo e Missão Velha (ASSINE, 2007). A Formação Brejo Santo é constituída por folhelhos e lamitos vermelhos, nos quais se encontram ostracodes característicos do Andar Dom João (Jurássico à base do Cretáceo; VIANA et al., 1971; ARAI et al. 1989). A presença de formas exclusivamente não-marinhas indica sedimentação lacustre em ambientes propícios à formação de red beds (BRAUN, 1966). A Formação Missão Velha, que sobrepõe concordantemente a Formação Brejo Santo, caracteriza-se por arenitos quartzosos, por vezes feldspáticos e/ou caoliníticos, localmente conglomeráticos, portadores de abundantes fósseis vegetais como troncos e fragmentos de madeira silicificada. A associação faciológica é condizente com a interpretação de planícies fluviais de sistemas entrelaçados caracterizados por canais rasos e de alta energia (ASSINE, 2007). A supersequência rifte teve seu início no Cretáceo Inferior com a deposição da Formação Abaiara. Esta unidade é composta por folhelhos e siltitos vermelhos na base e por intercalações de camadas decimétricas de arenitos finos com lâminas de carbonatos argilosos no topo (ASSINE, 1992). A Formação Abaiara contém ostracodes típicos do Andar Rio da Serra/Aratu (PONTE & APPI, 1990). Atribui-se a este intervalo a origem continental em sistemas de lagos rasos associados a canais fluviais (ASSINE, 1992). A supersequência pós-rifte (neoaptiano-neocenomaniano) é dividida em dois pulsos distintos delimitados por discordâncias de caráter regional (pós-rifte I e II), resultado da subsidência flexural térmica ocorrida na Bacia do Araripe nesse período (ASSINE, 2007). É separada das sequências sotopostas por discordância angular regional (pré-Alagoas), reconhecida também em todas as bacias da margem leste brasileira (ASSINE, 2007). Na Bacia do Araripe, a discordância pré-Alagoas envolve 14 um hiato no registro sedimentar cuja duração se estende desde o Andar Buracica ao Andar Alagoas inferior (ASSINE, 2007). A sedimentação da sequência do pós-rifte I, Andar Alagoas, é constituída pelas Formações Barbalha, Crato, Ipubi e Romualdo do Grupo Santana (ASSINE et al., 2014). Apresenta depósitos localizados de sedimentos marinhos que conformam o topo de tratos transgressivos (ASSINE et al., 2014). O padrão de paleocorrentes fluviais nessa sucessão é direcionado para sul-sudeste, sugerindo ingressão marinha de sul-sudeste para norte-noroeste (ASSINE et al., 2016). A Formação Barbalha corresponde ao registro de dois ciclos fluviais com granodecrescência ascendente, que variam de arenitos grossos a folhelhos escuros, por vezes betuminosos. O nível de folhelho betuminoso é papiráceo e fossilífero, bastante rico em ostracodes pertencentes à biozona RT-011 (Andar Alagoas), conchostráceos e palinomorfos (ASSINE, 1992). O paleoambiente de deposição é interpretado como sendo flúvio-lacustre (PONTE & APPI, 1990). Acima da Formação Barbalha, as Formações Crato, Ipubi e Romualdo afloram, de modo geral, em torno de quase todo o sopé da Chapada do Araripe, tanto na porção norte e leste, correspondente ao Estado do Ceará, quanto na porção sul, correspondente ao Estado de Pernambuco (CHAGAS, 2006). São as unidades mais estudadas da Bacia do Araripe devido ao seu rico e abundante conteúdo fossilífero, bem como por sua complexidade litológica. A Formação Crato é constituída por calcários micríticos laminados, com registro fossilífero abundante (Konservat-Lagerstätte), interdigitados lateralmente com folhelhos verdes. A rica associação fossilífera nos calcários laminados e folhelhos associados, caracterizada pela ausência de formas marinhas, indica ambiente de sedimentação lacustre (NEUMANN, 1999). A Formação Ipubi é composta predominantemente por gipsita intercalada com folhelhos esverdeados calcíferos, portadores de conchostráceos, níveis dolomíticos e camadas de anidrita subordinadas (ASSINE, 1990). Essa predominância em gipsita a torna a maior responsável nacional pela produção de gesso (DE LYRA SOBRINHO et al., 2001). A Formação Romualdo sobrepõe discordantemente (diastema) ora a Formação Crato ora a Formação Ipubi (ASSINE, 2007). Essa unidade apresenta diferentes interpretações quanto seu ambiente deposicional, variando entre condições marinhas rasas (SANTOS, 1982) e ambiente lacustre (MOURA, 2007). 15 A parte inferior da unidade é caracterizada pela presença de arenitos interestratificados com folhelhos, bem expostos em seção levantada na antiga mina de gipsita na localidade de Romualdo, entre Crato e Barbalha (CHAGAS, 2006). Para o topo, o empilhamento é transgressivo e os arenitos costeiros cedem lugar a uma seção de folhelhos verdes, ricos em ostracodes e fósseis de peixes em concreções carbonáticas. O sentido da ingressão marinha é controverso devido à existência de fósseis tethyanos (ARAI, 2014). Contudo, paleocorrentes fluviais para sudeste sugerem invasão do mar via paleovales fluviais em direção a noroeste (ASSINE et al., 2016; VAREJÃO et al., 2016). A sucessão pós-rifte I é correlacionável com as sequências deposicionais presentes nas bacias da margem nordeste quanto aos seus aspectos genéticos, litológicos e paleontológicos, com registro de condições marinhas transgressivas até o Albiano (ASSINE, 2007). Já os depósitos neocretáceos da sequência Pós-rift II, separados do Grupo Santana por discordância erosiva, apresentam características bastante distintas, com registro continental aluvial e fluvial (ASSINE, 2007). Fazem parte da sequência pós-rifte II duas unidades com características litológicas distintas, separadas por discordância erosiva e inicialmente referidas como membros inferior e superior da Formação Exu (BEURLEN, 1963; MABESOONE & TINOCO, 1973). Atualmente a denominação Exu é usada apenas para designar o antigo membro superior (PONTE & APPI, 1990; ASSINE, 2007), sendo o membro inferior denominado Formação Araripina (ASSINE, 2007), foco do presente trabalho. A Formação Exu é representada por arenitos fluviais com estratificações cruzadas de médio porte, com fácies conglomeráticas nas bases dos foresets, apresentando granodecrescência ascendente. Esta unidade recobre por discordância erosiva a Formação Araripina subjacente (ASSINE, 2007). 16 Figura 6 – Carta estratigráfica da Bacia do Araripe com destaque para Formação Araripina (ASSINE, 2007). 17 4.2 Formação Araripina A Formação Araripina foi inicialmente descrita como membro inferior da Formação Exu (BEURLEN, 1963; MABESOONE & TINOCO, 1973) e posteriormente referida como Formação Arajara (PONTE & PONTE FILHO, 1996). No entanto, através da análise de testemunhos de sondagem (poço 2-AP-1-CE), notou-se que a mesma não apresenta correlação estratigráfica com a seção de topo da Formação Romualdo, como aparentemente ocorre na parte leste da bacia, de modo que se abandonou a designação Arajara para tal sucessão (ASSINE, 2007). A designação de Formação Araripina foi então proposta pelo fato de constituir uma unidade distinta e mapeável na escala 1:25.000 e por apresentar as melhores exposições nos arredores do município homônimo (ASSINE, 2007). É importante ressaltar que o nome Formação Araripina já havia sido anteriormente proposto por Silva (1986) para designar o conjunto dos membros Crato e Ipubi (Formação Santana), porém não foi adotado por outros autores. A Formação Araripina é restrita à porção oeste da bacia (Figura 7) e recobre em discordância angular as unidades inferiores (Grupo Santana - Formação Romualdo), ou ocorre diretamente sobre o embasamento cristalino (rochas pré- cambrianas/eopaleozoicas), por vezes formando cunhas (ASSINE, 2007). Apresenta-se sobreposta pela Formação Exu (quando não erodida) em discordância erosiva, com pequena angularidade em determinados locais (ASSINE, 2007). Comumente aflora nas escarpas a oeste da Chapada do Araripe, quando não recobertas por depósitos de tálus da Formação Exu. 18 Figura 7 – Carta estratigráfica da Bacia do Araripe mostrando o pós-rifte II, com destaque para a Formação Araripina aflorante somente na porção oeste da bacia (ASSINE, 2007). Dados de poços, como o poço 2-AP-1-CE, indicam que a Formação Araripina apresenta espessura máxima de 100 metros (ASSINE, 2007). A Formação Araripina é constituída por fácies heterolíticas, caracterizada por grande variedade de litotipos, tais como ritmitos compostos por arenitos finos e lamitos, de colorações arroxeadas, amareladas e avermelhadas e corpos lenticulares de arenitos médios a grossos intercalados que podem ultrapassar os três metros de espessura (ASSINE, 2007). A unidade é interpretada como oriunda de deposição em planícies de leques aluviais (ASSINE, 2007), em sistemas lacustres rasos assoreados (ALMEIDA, 2010) ou em ambiente transicional litorâneo (PONTE & PONTE FILHO, 1996). A Formação Araripina é ainda caracterizada pela presença de abundantes estruturas deformacionais sinsedimentares, como estruturas de carga (chama, almofada, ball-and-pillow, pseudonódulos), além de slumps, dobras convolutas, brechas intraformacionais com clastos de ritmitos e feições de truncamentos internos, o que indica a possibilidade de tectônica sindeposicional (ASSINE, 2007). Possivelmente a reativação tectônica mesoalbiana afetou as porções subjacentes da Formação Santana, já que esta apresenta basculamento formando ângulos de até 20º de mergulho nas minas da Lagoa de Dentro e Rancharia, a sul do município de Araripina – PE (ASSINE, 2007). Acredita-se que esse tectonismo pode estar relacionado a uma mudança no regime de tensões no interior do 19 Nordeste, decorrente da mudança do pólo de rotação da deriva dos continentes sul- americano e africano (ASSINE, 2007), mudança essa datada em cerca de 106 Ma (RABINOWITZ & LABRECQUE, 1979). A Formação Araripina, assim como a Formação Exu, faz parte do Grupo Araripe (mesoalbiano-neocenomaniano) e, apesar de ambas depositadas em condições globais de eustasia positiva, apresentam sedimentação continental e mudança na direção das paleocorrentes, o que indica que a região sofreu reativação tectônica (ASSINE, 2007). Tal evento, porém, não se prolongou com mesma intensidade até a sedimentação da Formação Exu, pois esta se encontra subhorizontalizada e se apresenta muito menos deformada do que a Formação Araripina (ASSINE, 2007). Registros de tectonismo Albiano também são documentados na sequência rifte da Bacia de Pernambuco, mais especificamente na sucessão sedimentar da Formação Cabo (ASSINE, 2007). A Província Magmática do Cabo (NASCIMENTO et al., 2004) inclui rochas básicas a intermediárias e ácidas, sendo o Granito do Cabo datado entre 105±2 Ma e 102±1 Ma (LONG et al. 1986; NASCIMENTO, 2003). A região oeste da Bacia do Araripe recobre terrenos pré-cambrianos seccionados por antigos falhamentos NE-SW que foram reativados e são relacionados à terminação oeste das estruturas do Lineamento da Paraíba (PONTE & PONTE FILHO, 1996; ASSINE, 2007). A região também é caracterizada por falhas de direções E-W, NW-SE, NE-SW que afetam as rochas da Formação Araripina (ALMEIDA, 2010). Do ponto de vista paleontológico, a Formação Araripina apresenta extenso conteúdo palinológico, com cerca de 141 espécies de palinomorfos reconhecidas, sendo que 18 destas ausentes no Grupo Santana (LIMA, 1978b; LIMA, 1978c). Destaca-se a presença de pólens tricolpados, considerados o primeiro registro indubitável da presença de angiospermas na região (LIMA, 1978b). Com isso, Lima (1978b) concluiu que a associação palinológica presente na Formação Araripina é consideravelmente distinta e mais evoluída que as do Grupo Santana, e que a Formação Araripina foi depositada sob condições de clima quente e árido durante o mesoalbiano. Não são descritos macrofósseis, apesar de haver fortes indícios de bioturbação (icnofósseis) observados e relatados no presente trabalho. 20 5 FÁCIES SEDIMENTARES As fácies sedimentares foram descritas em afloramentos e perfis estratigráficos verticais (Tabela 1; Figuras 8 a 14). Para todas as fácies foram interpretados os processos físicos que resultaram em sua formação, utilizando como principais parâmetros o tipo de transporte de grãos e o fluxo sob o qual foram geradas as formas de leito. A análise permitiu a identificação de nove fácies sedimentares siliciclásticas (Tabela 2). Tabela 1 – Coordenadas geográficas das seções estratigráficas levantadas (Datum WGS84 – UTM; Zona 24S). Seções Estratigráficas Coordenadas Espessura Verticalizada X Y Z (base) Seção Aeroporto 329103 9161810 701m 34m Seção Sítio Torre Grande 330177 9156792 684m 23m Seção Lagoa de Dentro 327484 9154770 711m 10m Seção Riacho Marinheiro 322797 9150256 682m 30m Seção Riacho Bom Jardim 319715 9148065 705m 36m Seção Sítio Barro 346145 9158394 687m 25m 21 Tabela 2 – Tabela de fácies sedimentares descritas para a Formação Araripina. Código Fácies Litologia Estrutura e Geometria Processo Deposicional St Arenito fino a médio Estratificação cruzada acanalada, geometria de lentes ou tabular Migração de formas de leito (dunas) em fluxo unidirecional, sob regime de fluxo inferior Sr Arenito muito fino a médio Laminação cruzada cavalgante (climbing ripples), geometria tabular ou de lentes Migração de marcas onduladas em condições subaquosas na direção das correntes de fundo por processos de suspensão/ tração, sob regime de fluxo inferior. Sm Arenito fino a médio Maciço, provavelmente com estrutura primária obliterada ou estratificação incipiente, geometria tabular. Provável perda das estruturas primárias por processos pós- deposicionais Sh Arenito muito fino a fino Estratificação plano-paralela podendo conter clastos de argila, geometria tabular Forma de leito planar desenvolvida por alta velocidade de fluxo, em regime de fluxo superior/crítico R Intercalações rítmicas de arenito fino a muito fino siltoso com lamitos ou argilitos Acamamento plano-paralelo; geometria tabular; porção de finos: maciço ou com laminação incipiente e presença de laminação cruzada em lentes de arenito; porção de arenito: laminação plano- paralela ou laminações cruzadas com presença de lentes de argila; bioturbado Alternância periódica de processos de corrente com processos de decantação com água estagnada H Arenito fino e argila Acamamentos wavy, linsen e flaser; a depender da razão arenito/argilito; geometria tabular Tração e suspensão em corrente subaquosa. Atividades de correntes com pausas periódicas P Paleossolo Marcas de raízes e gretas de ressecamento; geometria tabular Desenvolvimento de solos em ambiente com exposição subaérea de material Fm Argilito, lamito Por vezes bioturbado e contendo lentes e/ou pseudonódulos de arenito; geometria tabular Decantação em ambiente aquoso com fluxo ausente Fl Lamito Laminado, por vezes contendo lentes e/ou pseudonódulos de arenito; geometria tabular Decantação em ambiente subaquoso com fluxo ausente 22 Figura 8 - Legenda para as seções das Figuras 9 a 14. 23 Figura 9 – Seção colunar levantada próxima ao Aeroporto (Ponto 1), município de Araripina – PE. 24 Figura 10 – Seção colunar levantada no Sítio Torre Grande (ponto 2), município de Araripina – PE. 25 Figura 11 – Seção colunar levantada na localidade Fazenda (Ponto 3), município de Araripina – PE. 26 Figura 12 – Seção colunar levantada na localidade Riacho Marinheiro (Ponto 6), no município de Araripina – PE. 27 Figura 13 – Seção colunar levantada nas proximidades do Riacho Bom Jardim (Ponto 7), município de Araripina – PE. 28 Figura 14 – Seção colunar levantada no Sítio Barro (Ponto 8), município de Araripina – PE. 29 Figura 15 - Correlação estratigráfica das seções levantadas mostrando grande variação no paleorrelevo do embasamento (linha preta pontilhada) e na superfície erosiva da Formação Exu (linha vermelha pontilhada). Linha azul pontilhada representa a cota de 700 metros. As fácies sedimentares sintetizadas na Tabela 2 e empilhadas nas seções estratigráficas apresentadas (Figuras 9 a 14) são pormenorizadas nos subitens 5.1 ao 5.9. 30 5.1 Arenitos com estratificação cruzada acanalada (Fácies St) Descrição: Disposta em camadas de geometria tabular de espessuras centimétricas a métricas sem aparente grande extensão lateral e, principalmente, disposta como lentes de arenito de porte centimétrico a métrico (podendo chegar a 3 metros de espessura). Quartzo-arenitos de granulação fina a média, com grãos arredondados, de coloração creme-esbranquiçada com tons avermelhados. A fácies St (Figuras 16 D e F) apresenta estratificação cruzada acanaladas de porte decimétrico. Interpretação: A fácies é interpretada como o produto da migração de formas de leito subaquosas, com dunas de cristas sinuosas (3D), sob a ação predominante de fluxo unidirecional em regime de fluxo inferior. O transporte dos grãos é dado por arrasto, rolamento (areia mais grossa) e saltação (areia mais fina; ALLEN, 1963; PICARD & HIGH JR., 1973). 5.2 Arenitos com laminação cruzada cavalgante/climbing ripples (Fácies Sr) Descrição: Essa fácies se materializa em camadas tabulares de arenito fino com aparente grande extensão lateral (Figura 16 E) e em lentes de arenito fino a médio que variam de espessura centimétrica a métrica (Figura 16 C), podendo chegar a espessuras de até 3 metros. A fácies Sr é composta por quartzo-arenitos de granulação nas frações muito fina a média, grãos arredondados e com boa a moderada seleção e cor amarelo- alaranjados. Apresentam laminações cruzadas cavalgantes (climbing ripple cross- lamination) da ordem de 3 a 6 centímetros com presença de material mais fino nos forsets, que varia de arenito muito fino laranja a silte creme-esbranquiçado. 31 Possuem caráter assimétrico com crista reta (2D) e predominantemente baixo ângulo de cavalgamento. Interpretação: A fácies Sr é formada pela migração de marcas onduladas produzidas por correntes de fundo com alternância ou concomitância de processos de tração e suspensão em condições subaquosas (ALLEN, 1963; MIALL, 1977). Essas correntes são fluxos unidirecionais sob regime de fluxo inferior no qual a partícula que é transportada por suspensão e depositada em trajetória balística (PICARD & HIGH JR., 1973). 5.3 Arenito Maciço (Fácies Sm) Descrição: São camadas tabulares de espessuras centimétricas a decimétricas que aparentam apresentar grande extensão lateral. Composta por arenitos arcoseanos de granulometria fina a média, bem selecionado, grãos arredondados, coloração avermelhada e aparentemente maciço, sem apresentar nenhuma estrutura visível (Figuras 16 A e B). Interpretação: Possivelmente o sedimento depositado foi submetido a processos posteriores que resultaram na fácies Sm. Segundo Picard e High Jr. (1973), alguns processos podem destruir os vestígios de estratificação e, desta forma, deixam a rocha com aspecto maciço. A liquidificação (liquefação ou fluidificação) dos sedimentos são exemplos desses processos e consistem na perda de fluidos por sobrecarga sedimentar durante a diagênese, obliterando as estruturas pré-existentes. Esses processos são de comum ocorrência na Formação Araripina, porém uma homogeneidade elevada da granulometria da rocha também pode gerar o aspecto maciço (MIALL, 1978). 32 5.4 Arenito com estratificação plano-paralela (Sh) Descrição: A fácies Sh é disposta em camadas tabulares de grande extensão lateral e apresentam-se geralmente na base de ciclos com granodecrescência ascendente (Figura 25). Essa fácies é composta por quartzo-arenitos com níveis de muscovita criptocristalina e clastos de argila, apresentam granulometria fina a muito fina, cor amarela e são dispostos em sets centimétricos a decimétricos com estratificação plano-paralela (Figuras 16 A). Variações granulométricas nos sets são características da fácies, com intercalações de lâminas de silte brancas ou argila marrom que marcam bem as estratificações plano-paralelas. . Interpretação: O fato de a fácies Sh apresentar clastos de argila dispersos indica alta energia de corrente e, portanto, é característica de regime de fluxo superior. A estratificação plano-paralela é formada em leito plano, onde os grãos são transportados predominantemente por arrasto (FROSTICK & REID, 1977; BEST & BRIDGE, 1992). 33 Figura 16 – Fácies arenosas: A) Arenitos com estratificação plano-paralela (Sh) sobre arenitos maciços (Sm); B) Arenito maciço (Sm) sobre fácies pelíticas (Fl) C) Lente de arenito médio com cerca de 0,5 metro de espessura e com laminação cruzada cavalgante (St) em meio à fácies pelítica (Fl); D) Arenito com estratificação cruzada acanalada (St) com geometria tabular sobre fácies rítmicas (R), afetados por falha normal; E) Nível com cerca de 25 cm de laminação cruzada cavalgante (Sr); F) Intercalações entre ritmitos e camadas tabulares de arenito com estratificação cruzada acanalada (St). (Martelo com cerca de 40 cm). 34 5.5 Heterolíticas wavy, flaser e linsen (Fácies H) Descrição: Camadas tabulares de porte decimétrico a métrico de grande variação lateral. Caracterizada pela intercalação em diferentes proporções de argilito roxo com areia fina a muito fina amarela, com laminação cruzada de porte centimétrico (Figura 17). O acamamento formado por argilitos capeando arenitos na proporção 1:1 é denominado acamamento ondulado (wavy). Lentes de areia em argilitos apresentam acamamento lenticular (linsen), com proporções argila/areia 2:1. Quando a argila é decantada nas calhas da laminação cruzada, o acamamento é denominado flaser (proporção argila/areia 1:2). Deformações penecontemporâneas, como estruturas de carga do tipo “ball- and-pillow” são comumente associadas a esta fácies. Interpretação: A fácies heterolítica (H) tem sua origem interpretada como produto da alternância de fluxos de corrente/onda com períodos de águas estagnadas. Os níveis arenosos são transportados tanto por tração ou por suspensão, a depender da granulometria da areia, enquanto que as porções pelíticas são produto da decantação em períodos onde o fluxo é ausente (BHATTACHARYA, 1997). 35 Figura 17 – Fácies heterolíticas (H) com presença de laminações cruzadas cavalgantes centimétricas: A a C e E) Acamamento ondulado wavy e presença de nível com brecha intraformacional na Figura E; D) Acamamento lenticular; F) Acamamento flaser nas camadas entre as lentes de arenito Sr (Tampa de caneta com cerca de 4 cm – B; martelo com cerca de 40 cm – C; lapiseira com cerca de 15 cm – D e F). 36 5.6 Ritmito (Fácies R) Descrição: A fácies ritmito (R) é a mais recorrente no registro da Formação Araripina. Composta de camadas tabulares de espessuras centimétricas a métricas de grande extensão lateral. Consiste em intercalações rítimicas de argilitos de coloração roxa a vermelha ou de siltitos amarelos com arenitos de granulação muito fina a fina siltosos, de cor amarela. Essas intercalações apresentam estrutura plano-paralela, dispostas em lâminas milimétricas ou em níveis centimétricos a decimétricos (Figura 18). As porções arenosas apresentam, por vezes, laminação cruzada de porte milimétrico a centimétrico. Por vezes, contêm lentes de arenito fino a médio. Estruturas de deformação penecontemporâneas de dimensões centimétricas a métricas são recorrentes nessas intercalações, como dobras convolutas, estruturas de carga (almofadas, chamas, boudins, pseudonódulos) e injectitos. Presença de bioturbações de dimensões entre 0,5 cm e 4 cm com preenchimento de areia fina também são comuns. São descritos dois conjuntos distintos de bioturbações: escavações verticais não ramificadas, cilíndricas e afuniladas com curvatura na porção inferior, normais à estratificação (Figura 19 B), e pistas alongadas de paredes planas, também não ramificadas, levemente sinuosas e preservadas em epirelevo convexo (Figura 19 C). Interpretação: A fácies R é interpretada como resultado de variações na energia do fluxo, que resultam na intercalação de pelitos e areias. As frações de pelitos dos ritmitos indicam deposição predominantemente por decantação dos sedimentos em suspensão, com ausência total de fluxo. Níveis de arenitos são interpretados como produto de correntes subaquosas de fluxo laminar não confinado (sheet flood), gerados em períodos de aumento de descarga fluvial (ASSINE, 1990). São processos predominantemente de suspensão e, com a desaceleração do fluxo, a deposição é rápida e há, eventualmente, o aparecimento de laminações cruzadas 37 cavalgantes diminutas (ASSINE, 1990). Estas estruturas, por sua vez, geradas por processos predominantemente trativos. Os processos deformadores do substrato são atribuídos a sismos e ao escape de fluidos por compactação, a depender da estrutura e de suas dimensões. Uma discussão mais detalhada acerca das deformações penecontemporâneas encontradas é apresentada no Capítulo 8. As bioturbações verticais com curvatura na porção inferior, discordantes ao acamamento, e as horizontais, concordantes ao acamamento, não puderam ser identificadas de forma precisa. Porém, estruturas semelhantes a estas encontradas na unidade são interpretadas por Fernandes et al. (1998) como icnofósseis dos icnogêneros Skolithos (quando verticais), mostrando características de alimentação e habitação; e Taenidium (quando horizontais), como registro de alimentação ou simplesmente de locomoção. De qualquer forma, esses registros de bioturbações indicam ambiente oxidante. 38 Figura 18 – Fácies rítmicas (R) com intercalações entre arenito muito fino/siltoso alaranjado e argilito/lamito roxo. A a C) intercalações centimétricas, com presença de lentes de arenito. Em B, é possível identificar a presença de truncamento interestratal, característico da Formação Araripina; e D a F) Interlaminações com presença de níveis heterolíticos (H) com laminações cruzadas cavalgantes, formando em E acamamento lenticular. (Martelo: 40 cm). 39 Figura 19 – Bioturbações abundantes em fácies P (marcas de raízes em A e D) e em fácies R (icnofósseis não identificados em B e C). Em B, estruturas verticais e em C, horizontais (foto em planta). Preenchimento das cavidades por areia muito fina. (Ponta da lapiseira com cerca de 2 cm – A; metade de dedo indicador com cerca de 4 cm – C e moeda de 50 centavos – D). 5.7 Argilito (Fácies Fm) Descrição: Camadas tabulares de espessura centimétrica a decimétrica com grande extensão lateral. Formada por argilitos roxos que, por vezes, apresentam pseudonódulos (diâmetro milimétrico a centimétrico) de arenito fino amarelo dispersos (Figura 20 A e B). Apresenta-se no topo de ciclos de granodecrescência ascendente sobrepostos a arenitos com estratificação plano-paralela (Figura 25 C). Bioturbações semelhantes às da fácies R também são encontradas, preenchidas por arenito muito fino. 40 Interpretação: É interpretada como produto de decantação de partículas na fração argila em ambientes aquosos com ausência total de fluxo. Pseudonódulos de arenito fino dispersos representam estruturas de carga inerentes aos processos de decantação da argila. Essas estruturas são formadas a partir de porções de níveis arenosos sobrepostos às camadas de argila que, por diferenças de densidade e liquidificação do sedimento inconsolidado, se desprenderam de sua posição original e foram agregados aos argilitos. As bioturbações encontradas também não puderam ser identificadas, mas indicam fundo oxidante. 5.8 Lamito laminado (Fácies Fl) Descrição: Disposta em camadas tabulares de espessuras centimétricas a decimétricas e de grande extensão lateral. Fácies formada por sedimentos pelíticos (argila roxa e silte branco), constituindo lamitos com laminação plano-paralela. Apresenta-se também no topo dos ciclos de granodecrescência ascendente descritos (Figuras 20 C e D e 25 A). Interpretação: A fácies Fl é interpretada como depósitos de decantação de sedimentos finos em ambientes aquosos com ausência de fluxo, ou seja, águas estagnadas sem ação de correntes de fundo. Apresenta-se laminado devido ao contraste de granulometria entre as lâminas formadas. 41 Figura 20 – Fácies de sedimentos pelíticos. A e B) Fácies de argilito roxo maciço com ocorrência de pseudonódulos de areia fina milimétricos a centimétricos dispersos aleatoriamente na matriz; C e D) Pacotes de Lamitos laminados com ocorrência de laminações cruzadas diminutas dispersas. (Ponta de lápis com aproximadamente 2 cm – A; e Martelo com aproximadamente 40 cm – D) Pseudonódulos com dimensões de 3 a 5 cm. 5.9 Paleossolos (Fácies P) Descrição: Camadas tabulares de grande extensão lateral de porte decimétrico. Paleossolos constituídos por siltitos e argilitos de cor roxa que se apresentam intensamente bioturbados, com estruturas verticais a subverticais ramificadas, normais ao acamamento e preenchidas por arenito fino. Apresenta laminação plano- paralela pretérita e, por vezes, um padrão que se assemelha a brechas. Níveis bioturbados são intercalados por níveis sem bioturbação. Gretas de contração centimétricas são recorrentes no topo das camadas (Figura 21). 42 Interpretação: Os paleossolos descritos são interpretados como solos desenvolvidos em ambiente com exposição subaérea de material sujeito à ocupação de gramíneas, visto que as bioturbações ramificadas recorrentes representam marcas de raízes. A intercalação de níveis com e sem marcas de raízes é indício de parada de sedimentação com ocupação vegetal e posterior retomada da sedimentação. Figura 21 – Fácies P (Paleossolos). A e B mostram níveis de paleossolos com intensa bioturbação (marcas de raízes); C e D mostram níveis com gretas de ressecamento com cerca de 18 cm que indicam exposição subaérea do sedimento e presença também de marcas de raízes. (Martelo com cerca de 40 cm – A; caneta com cerca de 20 cm – B; Tampa de caneta com cerca de 4 cm – C e D). 43 6 PALEOCORRENTES DO GRUPO ARARIPE NA PORÇÃO OESTE DA BACIA DO ARARIPE As paleocorrentes medidas em arenitos com estratificação cruzada e laminação cruzada da Formação Araripina foram agrupadas em duas estações: (1) Seção Sítio Torre Grande, com 24 medidas; e (2) Ponto 15, com 9 medidas. Estas 33 medidas mostram padrão unimodal e mergulho deposicional para predominantemente para leste (Figura 22), com área-fonte provavelmente a oeste. Para a Formação Exu foram medidas paleocorrentes em três estações (Pontos 2, 3 e 8), totalizando 64 medições e apresentam padrão unimodal com fluxo para oeste, como já apresentado por Assine (1990). Isso denota significativa mudança no mergulho deposicional da bacia entre o período de deposição das formações Araripina e Exu (Figura 22). A base do Grupo Santana (Formação Barbalha) apresenta paleocorrentes fluviais que indicam paleodrenagem para sul-sudeste em direção ao mar (ASSINE, 1994). Durante a transgressão marinha (representada pelo topo do Grupo Santana), o caminho preferencial da ingressão seria no sentido oposto ao da paleodrenagem continental, de sul-sudeste para norte-noroeste (ASSINE, 1994). Porém, mesmo com nível eustático global positivo no mesoalbiano, as condições marinhas transgressivas do topo do Grupo Santana já não atuavam à época de deposição da Formação Araripina, que representa o retorno às condições continentais. Desta maneira, a Formação Araripina representa o registro de um momento ímpar na história da evolução da Bacia do Araripe. A mudança polarizada no sentido das paleocorrentes da Formação Exu, por sua vez, seria resultado do soerguimento epirogênico diferenciado do bloco nordestino, mais intenso a leste, promovendo esse rearranjo da paleodrenagem continental no interior do Nordeste do Brasil (ASSINE, 1990). Os rios da Formação Exu faziam parte da bacia hidrográfica de um paleo-rio São Francisco e fluíam para norte, no sentido da Bacia do Parnaíba, sendo captado pelo Oceano Atlântico Equatorial recém-formado (ASSINE, 1990). O rearranjo das drenagens para oeste gerou uma diminuição no afluxo de sedimentos terrígenos nas bacias costeiras de Sergipe-Alagoas e, 44 consequentemente. permitiram o desenvolvimento de sequências carbonáticas espessas (ASSINE, 1990). A movimentação vertical positiva diferenciada está provavelmente atrelada ao alojamento do Granito do Cabo na Bacia de Pernambuco, datado entre o mesoalbiano e o neoalbiano (LONG et al. 1986; NASCIMENTO, 2003). Tal basculamento para oeste pode ser notado no perfil geológico de Assine (2014; Figura 5) e na imagem SRTM, que mostra a maior elevação da porção leste em relação à porção oeste (Figura 2). 45 Figura 22 – Rosetas de paleocorrentes das Formações Araripina e Exu no oeste da Bacia do Araripe. As rosetas apresentam setas pretas representativas do vetor médio e intervalos de classe de 30º. P: População de medidas; C.F.= Fator de consistência. Mapa geológico da Bacia do Araripe modificado de Assine (2014). 46 É importante destacar que a obtenção desses dados de paleocorrentes e o levantamento de seções estratigráficas foram realizados somente a partir de camadas subhorizontalizadas a horizontalizadas. Isso porque em muitos trechos a Formação Araripina apresenta-se muito falhada e fraturada, o que impede uma medição precisa. Também é comum a presença de “slumps”, blocos abatidos no sopé da Chapada do Araripe criados por movimentos rotacionais em uma ou mais superfícies de rotação de geometria lístrica, que formam um tálus decorrente do recuo da escarpa (Figura 23). Esses blocos apresentam basculamentos, por vezes, de até 70º de inclinação contra a escarpa. Por essas razões, o número de medições e de estações foi limitado. Além disso, a maioria das medidas foi obtida em laminações cruzadas cavalgantes, já que são estruturas abundantes na Formação Araripina. Essas laminações cruzadas, porém, possuem porte centimétrico (1 - 6 cm), o que aumenta o grau de dificuldade de obtenção da medida. Algumas medições foram realizadas em estratificação cruzada acanalada, porém níveis St não são muito recorrentes na Formação Araripina, aparecendo somente em sua porção média. Figura 23 – Recuo da escarpa da Chapada do Araripe gerou tálus com blocos rotacionados que apresentam basculamento de até 70º. 47 7 SISTEMAS DEPOSICIONAIS DA FORMAÇÃO ARARIPINA A sucessão sedimentar da Formação Araripina encontra-se limitada por duas discordâncias regionais bem marcadas: a basal (embasamento ou Grupo Santana – Formação Romualdo) e a de topo (Formação Exu), usadas como datum para as correlações estratigráficas neste trabalho (Figura 15). Constitui, portanto, uma sequência deposicional única (sensu VAIL et al., 1977). As relações estratigráficas e geomorfológicas entre a Formação Araripina e as unidades adjacentes são expostas na Figura 24. 48 Figura 24 - Relações estratigráficas e geomorfológicas entre as unidades que limitam a Formação Araripina. A) Fm. Araripina depositada em cunha sobre o embasamento cristalino; B) Inselberg da Fm. Araripina sobre o embasamento, que evidencia a maior extensão outrora ocupada por esses sedimentos; C) Fm. Exu sobreposta à Fm. Araripina; D) Fm. Exu depositada sobre a Fm. Araripina na forma de grande canal com superfície erosiva; E) Relação geomorfológica entre as unidades, com chapada de relevo plano e limitada por escarpas íngremes, sobre o embasamento cristalino. 49 Essa sequência deposicional apresenta-se em afloramentos com cerca de 30 metros de espessura, sendo que a maior seção estratigráfica descrita no presente trabalho possui aproximadamente 36 metros de empilhamento, coberta por espesso tálus na base. No entanto, o poço 2-AP-1-CE, perfurado na Sub-Bacia de Feira Nova, não apresenta recuperação no intervalo que corresponderia à Formação Araripina, mas sugere que a unidade possui espessura máxima de 100 metros (ASSINE, 1990). A Formação Araripina apresenta caracteristicamente grande diversidade de litotipos geneticamente relacionados (ASSINE, 1990). É representado por sucessões heterolíticas com presença de fácies rítmicas na base em padrão de granocrescência ascendente (coarsening upwards) para fácies arenosas na porção média e com retorno de fácies rítmicas e argilosas no topo num padrão de granodecrescência ascendente (fining upwards). Este padrão de granodecrescência ascendente também pode ser observado em escalas menores evidenciando ciclos de deposição distintos (Figura 25). Figura 25 – Ciclos de granodecrescência ascendente. A) Fácies arenosas (Sh) passando para fácies pelíticas laminadas (Fl); B) Fácies arenosas de fluxo superior (Sh) gradando para fácies também arenosas de fluxo inferior (Sr); C) Fácies arenosas (Sh) gradando para fácies heterolíticas (H) até o topo dos ciclos com fácies pelíticas (Fm). (Martelos possuem cerca de 40 cm). 50 A Formação Araripina apresenta predominantemente fácies rítmicas e heterolíticas, bem como níveis pelíticos maciços e laminados com intercalações esporádicas de arenito. As porções arenosas se materializam em forma de lentes e, concentradas no meio da sucessão, camadas tabulares de fácies areníticas. Níveis de paleossolos (P) com marcas de raízes abundantes e gretas de ressecamento também são observados e se concentram no topo da sucessão. Outras bioturbações são encontradas nas fácies R e Fm. No entanto, essas não puderam ser identificadas de maneira precisa e conclusiva. São descritos para a unidade, porém, icnofósseis de invertebrados provavelmente dos icnogêneros Skolithos e Taenidium (FERNANDES et al., 1998). Desta maneira, essas bioturbações, aliadas aos palinomorfos descritos por Lima (1978b), perfazem o registro paleontológico da Formação Araripina realizado até então. O icnogênero Skolithos é considerado característico de ambientes marinhos rasos, porém é bastante registrado também em ambientes continentais de planícies de inundação ou de margens de ambientes lacustres (FERNANDES et al., 1998). Já os icnofósseis do icnogênero Taenidium são característicos de margens de rios ou lagos, ou ainda, fundo de lagos rasos sujeitos a exposição subaérea e ressecamento periódicos (FERNANDES et al., 1998). Não são encontrados fósseis esqueletais, porém, os icnofósseis de invertebrados permitem levantar hipóteses sobre as características da biota continental mesoalbiana, que incluiria insetos, aracnídeos e anelídeos, os quais seriam agentes bioturbadores frequentes nesses depósitos (FERNANDES et al., 1998). As diferentes interpretações quanto ao sistema deposicional são conflitantes. As proposições são de deposição em ambiente transicional marinho (PONTE & PONTE FILHO, 1996), planície de leques aluviais (ASSINE, 2007) ou lagos rasos assoreados (ALMEIDA, 2010). Desta maneira, as associações de fácies, as estruturas sedimentares, a presença de palinomorfos continentais (LIMA, 1978b) e de icnofósseis atribuídos a ambientes também continentais (FERNANDES et al., 1998), contribuíram para uma 51 interpretação mais conclusiva acerca dos paleoambientes nos quais essa sedimentação era atuante. A ausência de fácies marinhas e de fósseis marinhos torna a hipótese de paleoambiente transicional marinho de Ponte & Ponte Filho (1996) inconsistente. Já as propostas de planície de leques aluviais de Assine (2007) e de lagos rasos assoreados de Almeida (2010) corroboram ambos com o aqui descrito. Na porção basal da sucessão, os ritmitos são interpretados como sistema lacustre de origem tectônica. A porção média com camadas tabulares de arenito é interpretada como planície distal de leques aluviais. Arenitos de geometria lenticular com base erosiva presentes nessa porção são interpretados como sedimentos de canais efêmeros (ASSINE, 1990) e os sedimentos pelíticos nessa porção representam lagos efêmeros com eventuais exposições subaéreas. Os ritmitos e paleossolos do topo também são interpretados como sistema lacustre de origem tectônica. Interpreta-se, portanto, que o registro analisado seja representativo de planície distal de leques aluviais em condições oxidantes (dada a intensa bioturbação; ASSINE, 1990), limitada por lagos tectônicos na base e no topo da sucessão. Além desses sistemas deposicionais, interpreta-se que o empilhamento de fácies St, Sh, Sr, P ou R é indicativo de inunditos (Tabela 3). O modelo deposicional consiste em fluxos turbulentos bipartidos que geram plumas de flotação e consequente deposição de níveis micáceos (ZAVALA et al., 2011). A presença de níveis de arenito muito fino (Sh) rico em micas com estratificação plano-paralela (fluxo superior), corrobora com essa hipótese, segundo o modelo. 52 Tabela 3 – Associação de fácies e respectivo sistema deposicional interpretado. Foi elaborado um bloco-diagrama para representar o trato deposicional descrito e interpretado para a unidade nas porções basal (lago tectônico) e média (planície distal de leque aluvial; Figura 26), de acordo com modelos de Assine (1990) e Hill (1989). Esse sistema seria, então, sucedido por outro sistema lacustre, topo da sucessão. 53 Figura 26 – Bloco-diagrama do sistema deposicional proposto para a base da Formação Araripina. Sedimentos de maior granulometria, que representariam as fácies proximais dos supostos leques aluviais, não foram observados. Tais sedimentos supostamente seriam encontrados a oeste da bacia (área-fonte), onde atualmente não há registro sedimentar devido a processos erosivos. Além disso, pode-se interpretar que a Formação Exu poderia ter retrabalhado o material mais grosso à jusante, de menor coesão que os ritmitos da Formação Araripina. As condições quentes e áridas apresentadas para a Formação Araripina (LIMA, 1978b) indicam natureza de pouca frequência de precipitações que resultaria em enxurradas esporádicas e consequente instalação de leques aluviais e lagos e rios efêmeros (FROSTICK & REID, 1989). As porções mais distais destes leques aluviais com lagos e canais de rios efêmeros e os sistemas lacustres vieram, então, a constituir os depósitos da Formação Araripina. 54 8 DEFORMAÇÕES SINSEDIMENTARES A Formação Araripina, como já mencionado anteriormente, é caracterizada pela presença abundante de estruturas de deformação penecontemporâneas. Os possíveis processos de formação de algumas destas estruturas e os agentes desencadeadores prováveis dos mesmos são abordados no subitem 8.1. Os horizontes que apresentam indícios de deformação sinsedimentar são atribuídos a processos sísmicos ou por processos atectônicos, já que ambos podem induzir a formação de estruturas similares. 8.1 Estruturas de deformação sinsedimentar: Estado da Arte 8.1.1 Mobilidade de sedimentos após sua deposição Os materiais granulares, como sedimentos siliciclásticos, têm comportamento peculiar que dificulta sua caracterização como sólido, líquido ou gás (JAEGER et al., 1996). A ocorrência de fluidos (comumente água) preenchendo os poros intergranulares acrescenta uma complexidade extra ao comportamento desses sedimentos inconsolidados. Isso porque a pressão que esses fluidos exercem nesses poros pode ocasionar a perda de resistência mecânica do sedimento e a consequente transformação de um material que se comporta como sólido (sustentado por grãos) para um estado liquefeito (em suspenção por um líquido), gerando uma série de estruturas de deformação sinsedimentar. Há diferentes classificações propostas por Lowe (1975), Allen (1986) e Owen (1987) para os mecanismos de deformação em sedimentos inconsolidados, como os que incluem deformação plástica (limite de elasticidade reduzido) e viscosa (liquidificação). Porém, de um modo geral, o mecanismo de deformação precisa ser iniciado ou alavancado por um agente desencadeador externo (trigger, nos termos propostos por Owen, 1987). 55 8.1.2 Agentes Desencadeadores de deformações (Triggers) A ideia de que feições de deformação sindeposicional estão quase sempre relacionadas a episódios de sismicidade é precipitada, uma vez que muitas dessas estruturas têm origens atectônicas e são mais comuns no registro sedimentar do que anteriormente se pensava (MONTENAT et al., 2007). Os principais agentes desencadeadores (triggers) incluem: (1) movimento artesiano de águas subterrâneas; (2) influxo de fluidos pressurizados de outras regiões da bacia; (3) escape de água de sedimentos subjacentes sofrendo compactação ou liquidificação; (4) sobrecarga induzida por deposição rápida de sedimentos; (5) escorregamentos, deslizamentos; (6) arrebentação das ondas; (7) variação cíclica de pressão associada à passagem de ondas; (8) subida rápida no nível da água associada a tempestades, inundações ou macromaré; (9) flutuações de pressão turbulenta associadas a separação de fluxo; (10) mudanças intermitentes nas condições de fluxo em sistemas fluviais; (11) migração de canais; (12) ciclos de congelamento/ degelo em permafrost; (13) glaciotectônica; (14) pisoteamento por grandes animais (tetrápodes, por exemplo); (15) stress tectônico regional; (16) terremotos; (17) tsunamis e (18) impactos de bólidos extraterrestres (OWEN, 1987; SEILACHER, 1984; MONTENAT et al., 2007; OWEN et al. 2011). 8.1.3 Estruturas de deformação em sedimentos inconsolidados Os tipos de estruturas de deformação geradas dependem basicamente da geometria inicial do sedimento em si, do depósito e de características do mecanismo de deformação, sendo determinado principalmente pela orientação dos esforços atuantes, os quais fazem parte de um sistema de forças motrizes gerado por um agente desencadeador externo (ver diferentes fatores deflagradores no subtópico anterior; OWEN, 1987). Em materiais não-coesivos como areias, pode ocorrer um mecanismo de deformação denominado ‘liquidificação’, com fluxo não-coesivo que pode ser dividido em liquefação (a qual mantém laminação coerente) e em fluidificação (com laminação rompida devido a fluxo turbulento) e que depende de um suprimento externo de fluido, seja proveniente da própria saturação dos sedimentos ou de camadas subjacentes (OWEN, 1987). 56 O mecanismo de liquefação gera estruturas como (1) slumping; (2) dobras recumbentes simples; (3) dobras recumbentes complexas; (4) loaded ripples (5) laminação convoluta; (6) estruturas em pratos (dishes); (7) load casts (almofadas e chama); (8) deformação passiva; (9) pseudonódulos; (10) faixas de minerais pesados contorcidas e (11) estruturas do tipo ball-and-pillow (OWEN, 1987). Já o mecanismo de fluidificação pode gerar estruturas como: (1) vulcões de areia; (2) diques e soleiras clásticas; (3) cúspides e pilares, além de também formarem estruturas de load casts, pseudonódulos, ball-and-pillow e estruturas em pratos (dishes). Outras estruturas que podem ser geradas em sedimentos inconsolidados são descontinuidades como falhas sedimentares e de colapso rúptil em lamas e areias (OWEN, 1987). Com relação aos diques e soleiras clásticos, segundo Jolly & Lonergan (2002), a escala e a geometria de um complexo intrusivo são governadas pela profundidade, estado de stress e fraturas (juntas e/ou falhas) na sucessão sedimentar, assim como a natureza dos sedimentos hospedeiros. Na configuração tectônica mais simples, onde o stress máximo atuante na bacia é o litostático (vertical), pequenas e irregulares intrusões resultam comumente na formação de sills em profundidades rasas, próximas à superfície, enquanto a profunidades maiores é mais comum a formação de redes de diques e soleiras. Há, porém, exceções como os mecanismos de deformação que ocorrem em materiais coesivos (tais como lamas) que, segundo proposto por Owen (1987), configuram dois tipos atuantes: um de comportamento tixotrópico (recuperação da resistência coesiva do material, quando colocado em repouso) e um de alta sensibilidade (perda da resistência deste material devido a destruição de sua estrutura original). Para esses materiais, o fluxo é coesivo e pode gerar laminação convoluta, loaded ripples, crioturbação, diápiros de lama, crescimento de cristais e bioturbação, a depender do sistema de esforços (OWEN, 1987). 8.1.4 Remobilização de sedimentos já consolidados: um caso à parte Diques e sills de arenito são fenômenos bastante comuns no registro geológico. Segundo Lonergan et al. (2000) assume-se que geralmente são formados antes que a camada de areia fonte dessas estruturas seja consolidada, o que 57 implicaria em formações rasas (em subsuperfície). Apesar disso, há evidências que alguns diques de arenito foram formados após a consolidação do arenito-fonte, abrindo a possibilidade de formação destas estruturas em maiores profundidades (PARNELL et al., 1996b). Essa mobilização de areia por meio de desagregação de arenitos está particularmente ligada a rápidos fluxos de fluido causados por hidrofraturamento de uma sucessão sedimentar que está sob altas pressões litostáticas. Essa mobilização forma intrusões de uma mistura de areia e água, causando uma consequente formação de veios e diques discordantes. A formação de diques clásticos após desenvolvimento de clivagens em rochas consolidadas também mostra que as condições de mobilização de areia podem ser mais variadas que o que se pensava (PARNELL et al., 1996b). 8.2 Tectônica Sinsedimentar (Formadora) da Formação Araripina . Brechas intraformacionais, truncamentos interestratais, estruturas de carga, dobras convolutas e injectitos são exemplos de estruturas encontradas na Formação Araripina e descritas neste item. Como mencionado por Assine (2007), truncamentos interestratais são característicos na Formação Araripina e podem ser encontrados em diferentes pontos na região oeste da Bacia do Araripe (Figura 27). Esses truncamentos são evidência de tectônica ativa durante a deposição da Formação Araripina, pois consistem no basculamento (movimentação diferencial), que causou erosão e consequente descontinuidade no registro sedimentar (ASSINE, 1990). Esses diastemas angulares poderiam ser interpretados também como produtos de compactação diferencial (que teria causado os basculamentos) porém, conforme indicado por Assine (1990), as estruturas observadas em superfície são de natureza rúptil e dão, portanto, mais consistência à hipótese de tectonismo. 58 Figura 27 – Truncamentos interestratais. (Lapiseira: 15 cm; martelo com cerca de 40 cm e pessoas com cerca de 175 cm). Deformações de escala métrica (Figura 28) são encontradas em níveis restritos, geralmente em fácies rítmicas (R) ou heterolíticas (H), limitadas por camadas horizontais a sub-horizontais, indicando eventualidade sísmica no momento de deposição daquele horizonte específico. 59 Figura 28 – Horizonte bem marcado de sismito na fácies Ritmito (R), com presença de estruturas sindeposicionais como dobras convolutas métricas limitadas por camadas plano-paralelas (A e B). A estrutura em ambas as figuras apresenta cerca de 1,5 m de altura. Há presença significativa de estruturas como dobras convolutas recumbentes (Figura 28 e 29), que estão confinadas a horizontes específicos e limitadas por camadas plano-paralelas. São interpretadas como produto de atividade sísmica e representam uma deformação dúctil da rocha, uma vez que o aspecto da estratificação é mantido (VAN RENSBERGEN et al., 2003). 60 Figura 29 – Dobras convolutas recumbentes (com planos axiais horizontais a sub-horizontais) limitadas por estratos plano-paralelos, em horizontes preferenciais. Sua formação envolve fluxo hidroplástico interestratal causado por atividade sísmica. (Lapiseira: 15 cm; Martelo: 40 cm e cartão com escala: total de 8cm). Brechas tectônicas, produto de falhamentos durante a tectônica deformadora, são recorrentes. Contudo, também são descritas brechas que foram interpretadas como brechas intraformacionais (Figura 30), isto é, produto do rompimento do acamamento original e retrabalhamento dos ritmitos, sendo restritas a corpos de 61 geometria e espessura variáveis. Geralmente limitados por camadas plano- paralelas, assim como os dobramentos convolutos, porém com ligeira superfície erosiva em sua base. Tal presença evidencia a ocorrência de processos de deformação penecontemporâneas e são interpretados também como resultantes de sísmica ativa. Figura 30 – Brechas intraformacionais geradas a partir do retrabalhamento dos ritmitos: A) clastos de argila (lapiseira: 15 cm); B) Clastos angulosos de ritmitos. Ocorrem também injectitos (Figura 31), estruturas discordantes ao acamamento usualmente atribuídas à atividade sísmica, que consistem na injeção de material liquidificado e menos denso que o sedimento envoltório por meio de fraturas a partir de camadas subjacentes. Essas fraturas podem ser geradas por hidrofraturamento, quando a pressão de fluidos nos poros da rocha excede o limite crítico de elasticidade ou ser uma descontinuidade pré-existente no sedimento semi- consolidado, constituindo uma deformação de caráter mais rúptil (MONTENAT et al., 2007). 62 Figura 31 – Injectitos na Formação Araripina atribuídos a abalos sísmicos. Há casos de estruturas de carga de porte métrico como pseudonódulos destacados (Figura 32) que tem sua origem atribuída a eventos sísmicos que teriam separado essas frações arenosas e as transportado por fluxo hidroplástico para outras áreas. Figura 32 – Pseudonódulo de arenito fino a médio de porte métrico pode ser encontrado em meio à fácies R. Atribui-se que tal estrutura tenha se originado a partir de atividade sísmica devido a sua dimensão e possível movimentação. Essas estruturas aqui consideradas como sismitos, além dos truncamentos interestratais, podem ser resultado de um evento tectônico cretáceo na Bacia do 63 Araripe de pequena amplitude e contemporâneo à deposição da Formação Araripina no mesoalbiano descrito por Assine (1990). Esse evento é em sua essência restrito à porção oeste da bacia e, portanto, seria reflexo da movimentação ao longo do Lineamento de Patos (a norte da Bacia do Araripe) que tem direção E-W e inflete para sudoeste por meio da falha de Farias Brito e seria responsável pelos basculamentos nesta área de até 20º de inclinação no Grupo Santana subjacente (ASSINE, 1990; PONTE & PONTE-FILHO, 1996). Desta forma, a ação de uma tectônica gravitacional seria a responsável pelos fluxos interestratais (ASSINE, 1990) e liquidificação (tanto liquefação como fluidificação) dos sedimentos inconsolidados a semi-consolidados que vieram a formar a gama de estruturas penecontemporâneas descrita. É importante frisar que a grande variedade de sismitos depende das características sedimentológicas, hidrodinâmicas e diagenéticas dos depósitos sujeitos a atividade sísmica (MONTENAT et al., 2007) e não somente do sismo em si. Algumas estruturas descritas apresentam menores dimensões e foram interpretadas como estruturas resultantes de mecanismos de liquefa