UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS CÂMPUS DE BAURU PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A CIÊNCIA Alessandra Aparecida Viveiro AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO NNOO EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS:: IINNVVEESSTTIIGGAANNDDOO CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS EE PPRRÁÁTTIICCAASS DDEE UUMM GGRRUUPPOO DDEE PPRROOFFEESSSSOORREESS BBAAUURRUU 22000066 Alessandra Aparecida Viveiro AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO NNOO EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS:: IINNVVEESSTTIIGGAANNDDOO CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS EE PPRRÁÁTTIICCAASS DDEE UUMM GGRRUUPPOO DDEE PPRROOFFEESSSSOORREESS Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, da Área de Concentração em Ensino de Ciências, da Faculdade de Ciências da UNESP/Câmpus de Bauru, como requisito à obtenção do título de Mestre em Educação para a Ciência. ORIENTADOR: Prof. Dr. Renato Eugênio da Silva Diniz BBAAUURRUU 22000066 DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO UNESP – BAURU Viveiro, Alessandra Aparecida. Atividades de campo no ensino das ciências : investigando concepções e práticas de um grupo de professores / Alessandra Aparecida Viveiro, 2006. 172 f. Orientador: Renato Eugênio da Silva Diniz. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2006. 1. Ciência – Estudo e ensino. 2. Prática de ensino. 3. Professores de ciências. 4. Educação – Estudo e ensino. I – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências. II - Título. Ficha catalográfica elaborada por Diva de Oliveira Campos – CRB 1902 ft|É ÑtÜt t ÅâÄà|wûÉ wÉá vÉÅutàxá Ä|äÜx ÑÉÜÖâx xÅ Å|Ç{t ÅûÉ ät| t àât ÅûÉ vÉÇÖâ|áàtÇwÉ tÄxzÜ|tá |ÇwÉÅöäx|áA ctuÄÉ axÜâwt `â|àÉá tÅ|zÉá |ÇvxÇà|ätÜtÅ x vÉÄtuÉÜtÜtÅ ÑtÜt Öâx xáát ÑÜÉwâ†ûÉ áx vÉÇvÜxà|étááxA V|àtÜ É ÇÉÅx wx vtwt âÅ wxÄxá áxÜ|t |ÅÑÉáá•äxÄA TzÜtwx†É t vtwt âÅ wx äÉv£áAAA fxâá ÇÉÅxá xáàtÜûÉ Çtá xÇàÜxÄ|Ç{tá wÉ àÜtutÄ{É x ÇÉ Åxâ vÉÜt†ûÉA AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS � Agradeço, sempre, a Deus, por tudo de bom que permitiu acontecer em minha vida. Por todas as criaturas que colocou em meu caminho. Por todas as portas, abertas e fechadas. Pela força, pela vida que sempre teima em renascer quando tudo parece quase o fim. � Ao Centro de Divulgação Científica e Cultural, da Universidade de São Paulo, em especial ao Prof. Dr. Antonio Aprígio da Silva Curvelo, ao Prof. Dr. Dietrich Schiel, à Profa. Ms. Silvia Ap. Martins dos Santos, ao técnico Alexandro Lancelotti e aos monitores do Setor de Biologia e Educação Ambiental, por possibilitarem diretamente a realização desse trabalho. � Aos professores que participaram dessa pesquisa. A colaboração de vocês é fundamental para qualquer avanço. � Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, em especial àqueles que contribuíram diretamente em minha formação, durante as disciplinas que cursei, no Grupo de Pesquisa em Ensino de Ciências e nas Reuniões Técnicas. Às funcionárias Ana Lúcia, Andressa e Toninha, por todo o apoio, compreensão e carinho. � À Profa. Haydée Torres de Oliveira, à Profa. Dra. Jandira Líria Biscalquini Talamoni – carinhosamente chamada de Janda – e à Profa. Dra. Luciana Maria Lunardi Campos pelas grandes contribuições que deram ao trabalho no Exame de Qualificação e na Defesa. Sobretudo, pela delicadeza e carinho com que fizeram cada uma das observações, críticas e sugestões. � À Diretoria de Ensino – Região de São Carlos pela imensa contribuição graças ao Projeto Bolsa Mestrado, sobretudo quanto à experiência incomparável de aprender todos os dias trabalhando junto à Oficina Pedagógica. Em especial, à Dirigente Regional de Ensino, Profa. Débora Gonzalez Blanco e aos supervisores Profa. Antonia Clara Jorge de Mello, Profa. Sônia Mercedes Antunes Silva e Prof. Edvaldo Valério Franco de Oliveira, por possibilitarem minha atuação nessa instituição. E a todas as pessoas tão especiais que ali encontrei... �� Novamente, à Silvia, por um dia ter acreditado em mim, permitindo que eu fosse monitora. Por ter sido sempre a profissional competente e a pessoa companheira e carinhosa durante os anos que estive no CDCC. Por ter me avisado das inscrições no processo seletivo da pós. Por ter me auxiliado na elaboração do projeto. Por ficar feliz quando meu nome saiu na lista dos selecionados para entrevista. Por ter ficado ainda mais feliz quando fui aprovada. Por continuar sendo essa pessoa maravilhosa, dedicada e tão especial, apesar da minha ausência. Perdoe-me se o trabalho não ficou tão bom, queria muito poder fazer melhor, mas espero ter contribuído de alguma forma. Obrigada por existir em minha vida. � À minha querida mãe – minha companheira, colaboradora, incentivadora – ao meu pai, à Jessica, ao Paulinho, à Rose e ao Riva, pela paciência em tantos momentos, os inúmeros quilômetros rodados só para me fazer companhia, a presença tão importante, sempre. Amo muito vocês... � E ao Prof. Dr. Renato Eugênio da Silva Diniz, pela orientação, paciência, compreensão, incentivo e carinho em todos os momentos. Pela pessoa inteligente, competente, humilde e iluminada que é... Muito obrigada. XÅ ÜxÄt†ûÉ t àÉwÉá Éá tàÉá wx |Ç|v|tà|ät wx vÜ|t†ûÉ xå|áàx âÅt äxÜwtwx yâÇwtÅxÇàtÄ vâ}É wxávÉÇ{xv|ÅxÇàÉ Åtàt |ÇØÅxÜtá |w°|tá x ÑÄtÇÉá xáÑÄ£Çw|wÉáM t wx Öâx ÇÉ ÅÉÅxÇàÉ xÅ Öâx ÇÉá vÉÅÑÜÉÅxàxÅÉá wxy|Ç|à|ätÅxÇàx? t cÜÉä|w£Çv|t ÅÉäx@áx àtÅu°ÅA gÉwt âÅt vÉÜÜxÇàx wx tvÉÇàxv|ÅxÇàÉá uÜÉàt wt wxv|áûÉ ytéxÇwÉ áâÜz|Ü t ÇÉááÉ ytäÉÜ àÉwt áÉÜàx wx |Çv|wxÇàxá x xÇvÉÇàÜÉá Öâx ÇxÇ{âÅ {ÉÅxÅ áÉÇ{tÜ|t Öâx ä|xááx xÅ áât w|Üx†ûÉA b Öâx ÖâxÜ Öâx äÉv£ ÑÉáát ytéxÜ? Éâ áÉÇ{x Öâx ÑÉáát? yt†t@ÉA VÉÜtzxÅ vÉÇà°Å zxÇ|tÄ|wtwx? ÑÉwxÜ x Åtz|tA VÉÅxvx@É tzÉÜtA Z�xà{x VIVEIRO, A. A. Atividades de campo no ensino das ciências: investigando concepções e práticas de um grupo de professores. 2006. 172 f. Dissertação (Mestrado em Educação para a Ciência) – Faculdade de Ciências, Universidade Estadual Paulista, Bauru, 2006. RREESSUUMMOO O ensino das ciências deve favorecer a aprendizagem significativa de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais. Para tanto, o uso de diversas modalidades didáticas possibilita diferentes caminhos que conduzam ao aprendizado, envolvendo estudantes com interesses variados. Nesse sentido, as atividades de campo constituem uma modalidade didática importante, uma vez que permitem explorar conteúdos diversificados, motivam os estudantes, possibilitam o contato direto com o ambiente e a melhor compreensão dos fenômenos. No entanto, para que sejam eficazes, é imprescindível que sejam bem preparadas e adequadamente exploradas. Dentro dessa perspectiva, esse trabalho teve por objetivo identificar e problematizar como um grupo de professores insere a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, promovida pelo CDCC/USP, em sua prática pedagógica, visando discutir o papel das atividades de campo como modalidade didática no ensino das ciências. Procedeu-se a uma análise da proposta da visita, que apontou um forte enfoque para a temática ambiental. Um grupo de monitores foi entrevistado, procurando analisar o que estes esperavam dos professores e alunos que participavam da atividade. Por fim, sete professores, usuários freqüentes da visita, também participaram de uma entrevista, além de preencherem uma ficha que possibilitou a caracterização dos envolvidos. Os dados foram analisados qualitativamente, procurando investigar aspectos como a motivação dos professores para a realização de atividades de campo, a forma como as exploram em sala de aula, as dificuldades com as quais se deparam para realizá-las, e suas sugestões para melhoria da visita em questão. Notou-se predomínio do uso de atividades de campo para ilustração e/ou complementação de conteúdos conceituais abordados em sala de aula, com reduzida interação entre os diferentes componentes curriculares. Além disso, são pouco exploradas em programas de Educação Ambiental, havendo divergências entre as expectativas dos professores e a proposta da visita promovida pelo CDCC. Nesse sentido, apontou-se a necessidade de um roteiro mais maleável para a visita, de formação do professor para explorar as atividades de campo de maneira diversificada e não restrita aos conteúdos conceituais, além de uma adequada formação dos monitores que acompanham essas visitas. PPaallaavvrraass--cchhaavvee:: ensino das ciências, atividades de campo, professores de ciências. AABBSSTTRRAACCTT Science teaching must favor a significant learning of concepts, procedures and behavioral contents. Therefore, the methodological pluralism represents a possible basis to provide different ways to learn, comprising students of quite diverse concerns. Under this focus, field classes play an important role as a didactical modality, since they allow to exploit diversified contents, motivate the students by the direct contact with the environment and lead to a better comprehension of the phenomena involved. However, in order to be effective, it is mandatory that they have been well prepared and properly approached. Based on this approach, the goal of the present work was to identify and contextualize how a group of teachers has been including a scientific visit to the hydrographic basin of Itaqueri river, promoted by CDCC/USP, into their pedagogical practices, aiming to discuss the role of field classes as a didactic tool for teaching science. An analysis of the visit’s proposition was carried out, pointing out particularly the environmental focus. A group of monitors was interviewed, in order to verify what they have been expecting from both teacher and students who were involved into the activity. In the end, seven teachers who usually join the visits, have also taken part in an interview and filled out a form to help us characterize the people involved. The data were analyzed qualitatively, searching for answers about the teacher’s motivation on performing field classes, the way they use them and the hinderings they face to perform them, as well as their suggestions to improve such a visit. It was noticed a predominance of using field classes as an illustration and/or complementation of conceptual contents presented in the classroom and a reduced interaction among the distinct curricular components. Besides, they have been scarcely exploited by Environmental Education programmes and there are divergences between the expectations from the teachers and the visit proposition presented by CDCC. Thus, it is pointed out the need of a more flexible schedule for the visitors and further teaching’s training allowing them to exploit the field classes under a broad-range focus, unrestricted to conceptual contents, besides a proper training of monitors who accompany the visitors. Key-words: science teaching, field classes, science teachers. SSUUMMÁÁRRIIOO AGRADECIMENTOS .......................................................................................................... 04 RESUMO .............................................................................................................................. 07 ABSTRACT .......................................................................................................................... 08 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 11 1 ENSINO DAS CIÊNCIAS: TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES .................... 16 1.1 O ensino das ciências e a temática ambiental .................................................................. 28 2 ATIVIDADES DE CAMPO NO ENSINO DAS CIÊNCIAS E NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ....................................................................................................................... 31 2.1 Atividades de campo: técnica, recurso, procedimento, modalidade didática? ................ 33 2.2 Atividades de campo e educação ambiental .................................................................... 38 2.3 Atividades de campo como objeto de estudo .................................................................. 39 2.4 A Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri: uma atividade de campo promovida pelo CDCC/USP ................................................................................................. 43 3 METODOLOGIA ............................................................................................................. 49 3.1 Definindo os sujeitos e descrevendo a coleta de dados ................................................... 51 3.2 Análise dos dados ............................................................................................................ 54 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ...................................................................................... 57 4.1 Caracterização da proposta da Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri: da concepção inicial à configuração atual ............................................................................. 58 4.2 Os monitores e a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri ....................... 65 4.3 Os professores e a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri ..................... 70 4.3.1 Caracterização dos professores .................................................................................... 70 4.3.2 Inserção da Visita Científica na prática pedagógica .................................................... 79 4.3.3 Motivação para a realização de atividades de campo ................................................... 97 4.3.4 Dificuldades na realização de atividades de campo ..................................................... 103 4.3.5 Sugestões para melhoria do programa de visitas à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri ................................................................................................................................... 112 4.4 O papel das atividades de campo na visão dos professores ............................................ 121 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 129 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ..................... 133 ANEXOS ............................................................................................................................... 144 Anexo I – A Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri .................................... 145 A. Localização e descrição da área ................................................................................... 146 B. Roteiro .......................................................................................................................... 148 C. Normas para visita ........................................................................................................ 159 D. Carta enviada ao professor ........................................................................................... 160 E. Ficha de inscrição ......................................................................................................... 161 F. Chave de identificação da vegetação ............................................................................ 162 G. Questionário preenchido pelo professor após a visita .................................................. 164 H. Questionário preenchido pelo monitor após a visita .................................................... 165 Anexo II – Questionário: Perfil do Professor Entrevistado ................................................... 166 Anexo III – Roteiros de Entrevista ........................................................................................ 170 A. Monitor ......................................................................................................................... 171 B. Professor ....................................................................................................................... 172 IInnttrroodduuççããoo PPooddeemm--ssee rreeaaffiirrmmaarr ooss eessqquueemmaass pprroonnttooss ee ffiinnggiirr qquuee nnaaddaa eessttáá aaccoonntteecceennddoo.. MMaass éé ddaaíí qquuee nnaassccee ttooddoo oo ddeesseennccaannttoo ddee uummaa eedduuccaaççããoo qquuee ssee pprrootteeggee eemm rreessppoossttaass ffeeiittaass ppaarraa ccaallaarr aass ppeerrgguunnttaass ee nnããoo ppaarraa ssee aavveennttuurraarr ddiiaannttee ddoo qquuee iinnqquuiieettaa.. AA oouuttrraa ssaaííddaa éé nnããoo rreeccuuaarr aannttee aa iinnttrriinnccaaddaa ttrraammaa ddee rreellaaççõõeess qquuee tteeccee aa rreeaalliiddaaddee,, oouuvviinnddoo aa ppeerrmmaanneennttee ppuullssaaççããoo ddoo mmuunnddoo ddaa vviiddaa,, aaiinnddaa qquuee eellaa ssooee iinnccoommpprreeeennssíívveell.. -- IISSAABBEELL CCRRIISSTTIINNAA DDEE MMOOUURRAA CCAARRVVAALLHHOO –– ((CCAARRVVAALLHHOO,, 11999988,, pp.. 99)) 12 A graduação, no curso de Licenciatura em Ciências Exatas, proporcionou-me uma formação ampla, estudando disciplinas de Matemática, Química, Física e Biologia, além daquelas relacionadas à formação pedagógica. A existência de disciplinas de Biologia e o desejo de atuar no ensino de Ciências permitiram que eu pudesse ingressar, no segundo ano da graduação, como monitora no Setor de Biologia e Educação Ambiental do Centro de Divulgação Científica e Cultural da Universidade de São Paulo, Campus de São Carlos (CDCC/USP). Durante três anos, de 2001 a 2003, atuei em plantões de dúvidas, minicursos, entre outras atividades ligadas ao público de Ensino Fundamental e Médio, e também aos professores. Mas, sem dúvidas, a atividade que mais me estimulava era monitorar a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri. Todas as quartas-feiras recebíamos turmas de diferentes cidades para a visita. Para nós, monitores, era um prazer colaborar com uma atividade diversificada e que fugia à rotina da sala de aula, e fazíamos o possível para tornar a saída a campo agradável e produtiva. Entretanto, passávamos um período de seis a oito horas com esses alunos e, depois, perdíamos o contato com eles, com os quais permanecia o professor. Durante essas visitas, pude observar a diversidade de comportamentos das turmas, e os distintos posicionamentos dos professores. Alguns, bastante participativos, outros, alheios a tudo o que era trabalhado. Além disso, algumas turmas iam a campo com objetivos bem definidos, com propósitos, enquanto outras pareciam tentar entender o que faziam ali. Os demais monitores (éramos quatro, realizando essa visita) compartilhavam as mesmas percepções. Por meio das fichas preenchidas pelos professores, tentávamos avaliar a atividade, mas restavam angústias, dúvidas, que cresciam a cada visita: será que esses professores trabalhavam com seus alunos os conteúdos relacionados à visita em sala de aula? Seria a visita um evento pontual e sem continuidade? Ou estaria inserida dentro de seu plano pedagógico? Será que ocorria uma preparação anterior à visita? Seria essa uma aula ou simplesmente uma atividade de lazer? Ocorreria uma avaliação dessa atividade? Para o professor, qual o papel dessas atividades de campo? Esses questionamentos exigiam uma reflexão sobre a utilização de atividades de campo no ensino das ciências, e constituíram o estímulo para a elaboração de um projeto de pesquisa que pudesse contribuir nesse sentido. Pensando na educação científica, o processo de ensino e aprendizagem deve ter seu ponto de partida no universo vivencial entre professores e alunos, investigando o meio natural e social, e colocando em prática conhecimentos de especialistas, criando condições para um diálogo de caráter interdisciplinar (BRASIL, 1999). Entende-se que o ensino das 13 ciências da natureza deve permitir ao educando a compreensão da ciência como um processo humano e desenvolver uma postura crítica e reflexiva mediante suas técnicas e procedimentos, proporcionando um olhar crítico sobre os fenômenos naturais e a forma como o ser humano atua sobre o ambiente. Desse modo, deve contribuir para torná-lo apto também a intervir na realidade em que está inserido (BRASIL, 1998b; MATIAS, 2000; BRASIL, 2001a). Mas, “como ensinar sobre coisas vivas utilizando objetos tão inanimados como a palavra e o giz” (MACHADO, 1996 apud LOPES; ALLAIN, 2002, p. 1)? Uma atividade de campo, planejada e bem elaborada, por exemplo, constitui-se uma alternativa de atuação metodológica que permite trabalhar como o aluno suas múltiplas possibilidades de aprendizagem. Além disso, possibilita integrar diferentes áreas do conhecimento em torno de uma atividade significativa e contextualizada, o que pode acarretar melhoria do rendimento escolar (CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISA EM EDUCAÇÃO, CULTURA E AÇÃO COMUNITÁRIA, [2000 ou 2001]). A partir daí, surgem as questões norteadoras desse trabalho: Como um conjunto de professores que realizam com seus alunos a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri integra essa atividade aos seus trabalhos de sala de aula? Existem relações entre os conteúdos programáticos e as atividades de campo realizadas? Essas atividades mobilizam professores de diferentes áreas na exploração de suas potencialidades ou restringem-se ao universo do professor que sai a campo com seus alunos? Com quais entraves deparam-se os professores que se dispõem a realizar atividades de campo? Qual seria o papel das atividades de campo no processo de ensino e aprendizagem das ciências para esse conjunto de professores? Enfim, as atividades de campo, da maneira como são utilizadas, constituem uma modalidade significativa para o ensino das ciências? Desse modo, o presente trabalho tem como objeto geral identificar e problematizar como um grupo de professores insere a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri em sua prática pedagógica, visando discutir o papel das atividades de campo como modalidade didática no ensino das ciências. Como objetivos específicos, essa pesquisa pretende: caracterizar a proposta da Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, promovida pelo CDCC; investigar o que os monitores esperam de professores e alunos em relação a essa atividade de campo; conhecer o que motiva os professores a realizarem uma atividade de campo; analisar como 14 eles empregam a atividade de campo em sala de aula; investigar se existe relação entre os conteúdos programáticos e as atividades de campo realizadas por esses professores; investigar se essas atividades mobilizam professores de diferentes áreas na exploração de suas potencialidades ou restringem-se ao universo do professor que sai a campo com seus alunos; conhecer os entraves com os quais se deparam esses professores que se dispõem a realizar atividades de campo; levantar sugestões dos professores para melhoria do Programa de Visitas à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri; relacionar e comparar a proposta da Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri com as expectativas e necessidades dos professores que utilizam essa atividade de campo. A apresentação do trabalho foi organizada em cinco capítulos. No Capítulo I, apresentam-se algumas considerações sobre o ensino das ciências, discutindo a necessidade de uma aprendizagem significativa de conteúdos e traçando-se um breve histórico do ensino das ciências no Brasil. Além disso, aborda-se a necessidade de que o ensino das ciências não se restrinja ao ensino de conteúdos conceituais, e discute-se a necessidade de diversificar estratégias como meio para estimular os estudantes e facilitar a construção do conhecimento. Por fim, explora-se a relação do ensino das ciências com a temática ambiental. No Capítulo II, tem-se uma discussão sobre as atividades de campo como modalidade didática no ensino das ciências e suas potencialidades relacionadas à Educação Ambiental. Além disso, apresenta-se um levantamento das atividades de campo como objeto de estudo, discorrendo-se sobre alguns trabalhos que tratam do tema e que permitem uma visão geral das pesquisas nessa área. Finalizando o capítulo, volta-se o olhar para a Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, uma atividade de campo promovida pelo CDCC/USP, e que foi foco da pesquisa desenvolvida. No Capítulo III, são descritos os procedimentos metodológicos utilizados para realização dessa investigação, com apresentação dos critérios utilizados para definição dos sujeitos da pesquisa, breve descrição das técnicas de coleta de dados e o processo de análise dos mesmos. No Capítulo IV, são apresentados e discutidos os resultados. Inicialmente, tem-se uma análise da proposta da Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, elaborada a partir da análise dos documentos disponíveis. Na seqüência, tem-se uma breve exploração das entrevistas realizadas com um grupo de monitores, procurando, a partir de suas falas, 15 investigar o que esperam dos professores e alunos durante a atividade de campo. Tem-se, então, a caracterização e análise das entrevistas realizadas com um grupo de professores, procurando abordar aspectos como a utilização que fazem da visita promovida pelo CDCC, a motivação para que realizem esta atividade de campo, as dificuldades com as quais se deparam para realizá-la e suas sugestões para a melhoria do programa de visitas. Finalizando o capítulo, tem-se uma discussão acerca do papel das atividades de campo para o grupo de professores entrevistados, procurando também explorar a relação entre a proposta da visita em questão, a postura dos monitores que acompanham as visitas e as expectativas e/ou necessidades desses educadores. Finalmente, no Capítulo V, têm-se algumas considerações, tecidas a partir de todo o trabalho desenvolvido e apresentado nos capítulos anteriores. Em anexo, estão alguns materiais complementares. Como Anexo I, tem-se um texto com a localização e descrição da Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, um roteiro detalhado da visita realizada pelo CDCC, além das normas da visita, a ficha de inscrição, a carta enviada ao professor por ocasião do agendamento da atividade, uma chave de identificação da vegetação – utilizada durante a saída a campo –, além das fichas de avaliação preenchidas por professores e monitores após a atividade. No Anexo II tem-se o questionário preenchido pelos professores, utilizado na caracterização dos mesmos. Finalizando, o Anexo III traz os roteiros que orientaram as entrevistas com os monitores e professores. CCaappííttuulloo II EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS:: TTEECCEENNDDOO AALLGGUUMMAASS CCOONNSSIIDDEERRAAÇÇÕÕEESS SSeemm uumm oollhhaarr ssoobbrree oo iinnssttiittuuííddoo,, ccrriiaammooss llaaccuunnaass,, ddeessffiigguurraammooss mmeemmóórriiaass ee iiddeennttiiddaaddeess,, ppeerrddeemmooss oo vvíínnccuulloo ccoomm aa nnoossssaa hhiissttóórriiaa,, qquueebbrraammooss ooss eessppeellhhooss qquuee ddeesseennhhaamm nnoossssaass ffoorrmmaass.. -- RREEGGIINNAA AALLCCÂÂNNTTAARRAA DDEE AASSSSIISS -- ((IINN:: BBRRAASSIILL,, 11999999,, pp.. 110099)) 17 CCAAPPÍÍTTUULLOO II -- EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS:: TTEECCEENNDDOO AALLGGUUMMAASS CCOONNSSIIDDEERRAAÇÇÕÕEESS O ensino das ciências deve favorecer a aprendizagem significativa do conhecimento historicamente acumulado, de modo a permitir a construção de uma concepção de ciência que englobe suas relações com a tecnologia, a sociedade e o ambiente (BRASIL, 2001a). A expressão aprendizagem significativa remete-se a teoria da aprendizagem verbal significativa, proposta por Ausubel – suas formulações iniciais, ainda na década de 1960, figuram entre as primeiras propostas psicoeducativas que procuravam explicar o processo de ensino e aprendizagem escolar em uma perspectiva cognitiva (SALVADOR et al., 2000). Entre outros aspectos, (...) significa (...) entender a aprendizagem como um processo de modificação do conhecimento, em vez de comportamento em um sentido externo e observável, e reconhecer a importância que os processos mentais têm nesse desenvolvimento (SALVADOR et al., 2000, p. 231). Pensando nos novos conteúdos que o estudante deve aprender, “quanto mais se relaciona o novo material de maneira substancial e não-arbitrária com algum aspecto da estrutura cognitiva prévia que lhe for relevante, mais próximo se está da aprendizagem significativa” (SALVADOR et al., 2000, p. 232). Ao contrário, quando se distancia dessa relação entre novos conteúdos e estrutura cognitiva prévia, aproxima-se da chamada aprendizagem mecânica ou repetitiva. “A aprendizagem será muito mais significativa na medida em que o novo material for incorporado às estruturas de conhecimento de um aluno e adquirir significado para ele a partir da relação com o seu conhecimento prévio” (op. cit., p. 232). Para Ausubel, a interação entre a estrutura cognitiva prévia do aluno e o material ou conteúdo de aprendizagem origina um processo de modificação de ambos, constituindo o núcleo da aprendizagem significativa. Nesse processo, três noções básicas estão presentes: o conceito inclusor (ou conceitos inclusores) – conceitos ou idéias prévias, que são utilizadas como ponto de localização de novas idéias ou conceitos que constituem objeto de aprendizagem; a inclusão obliteradora – processo de interação entre conceitos inclusores e material de aprendizagem; a assimilação (SALVADOR et al., 2000). “O resultado dos processos de inclusão obliteradora é uma autêntica assimilação entre os velhos significados e os novos, o que implica uma estrutura mais rica que a original” (op. cit., 234). Segundo Salvador (1994, p. 127), “mediante a realização de aprendizagens significativas, o aluno 18 constrói a realidade, atribuindo-lhe significados”. Além disso, para que a aprendizagem seja realmente significativa, o conteúdo deve ser potencialmente significativo – o que significa ter significância lógica e psicológica – e, além disso, o estudante deve apresentar uma atitude favorável para aprender significativamente – tendo motivação para relacionar o novo com aquilo que já conhece. Assim, o ensino das ciências deve estar diretamente associado aos conhecimentos prévios do estudante que deve, antes de tudo, ser motivado para o processo de ensino e aprendizagem. Pela abrangência e pela natureza dos objetos de estudo das ciências, é possível desenvolver a área de forma muito dinâmica, orientando o trabalho escolar para o conhecimento sobre fenômenos da natureza, incluindo o ser humano e as tecnologias mais próximas e mais distantes, no espaço e no tempo (BRASIL, 2001a, p. 32). O ensino das ciências deve merecer especial atenção desde as séries iniciais, por diversos motivos: as necessidades geradas por uma sociedade com crescente desenvolvimento científico e tecnológico; a importância de formar cidadãos críticos, que tenham conhecimentos suficientes para tomar decisões fundamentadas sobre temas científicos e tecnológicos, bem como participar ativamente da conservação do meio em que vivem; a curiosidade inerente ao ser humano, de conhecer possibilidades e limitações de seu próprio corpo, e as interações deste com o meio; a oportunidade de proporcionar aprendizado que possibilite a criação de hábitos saudáveis, pessoais e coletivos, que melhorem a qualidade de vida; a possibilidade de transferir valores formativos para outros contextos da vida cotidiana (BRASIL, 1998b, 2001a; BUENO, 2003). Para a criança ou adolescente, “conhecer ciência é ampliar a sua possibilidade presente de participação social e viabilizar sua capacidade plena de participação social no futuro” (BRASIL, 2001a, p. 25). Entretanto, ensinar ciências nunca foi uma tarefa fácil, e os desafios parecem aumentar mediante a ocorrência de mudanças aceleradas, tanto no âmbito do conhecimento sobre os conteúdos que se deve ensinar ou os melhores métodos para ensinar, bem como mudanças nos alunos a quem esse ensino é dirigido, e também nas demandas da escola e da sociedade (SANMARTÍ, 2002; ALEIXANDRE, 2003b). Métodos tradicionais, muitas vezes, não dão conta de despertar o interesse dos estudantes, e também pouco contribuem para a construção de conhecimentos relevantes (SANMARTÍ, 2002). 19 Nesse sentido, faz-se necessário um constante repensar acerca do que ensinar e como ensinar ciências. Para tanto, os aspectos históricos do ensino das ciências corroboram fornecendo elementos no sentido de interpretar a atual situação e pensar em transformações. No Brasil, o ensino das ciências naturais teve diferentes objetivos e propostas, ao longo do século XX (BRASIL, 1998b). Em 1924, foi criada a Associação Brasileira de Educação (ABE), no Rio de Janeiro, fruto da organização de educadores brasileiros que tinham como pretensão sensibilizar a sociedade e o poder público acerca dos problemas presentes na educação e a urgente necessidade de buscarem-se soluções (ROMANELLI, 1987). Nessa mesma década, no âmbito da educação em ciências, destacava-se o ensino das verdades clássicas, apresentando aos estudantes uma ciência universal e permanente, inquestionável, criada por grandes cientistas. A experimentação era uma reprodução dos feitos realizados pelos grandes “gênios” das ciências, e o método de ensino baseado no trinômio “exposição - memorização - repetição” (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998). Predominava, portanto, o ensino por transmissão, onde o professor transmitia “idéias pensadas por si próprio ou por outros ao aluno que as armazena[va] seqüencialmente em seu cérebro” (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000, p. 7). Em 1930, a publicação do livro Introdução ao Estudo da Escola Nova, de Lourenço Filho, marcou o início de um movimento renovador e de uma luta ideológica, que resultou na publicação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nacional1, em 1932, e mais tarde nas discussões acerca do projeto de lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Esse movimento foi representado por “uma pluralidade e confusão de doutrinas, que mal se encobriam sob a denominação genérica de Educação Nova ou Escola Nova” (ROMANELLI, 1987, p. 130). Na verdade, a chamada Pedagogia da Escola Nova, que inspirou os movimentos no Brasil, surgiu no final do século XIX, segundo relata Luckesi (1994), num contexto onde a burguesia européia caminhava no sentido da contra-revolução. Para o autor, de certa forma, a Pedagogia da Escola Nova representa a situação da sociedade na época, uma vez que “em nome de uma equalização social, trabalha[va] com diferenças individuais” (op. cit., p. 135). Assim, o ensino deveria caminhar no sentido de formação do indivíduo respeitando 1 Segundo Romanelli (1987, p. 130), o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nacional foi “fruto de debates acirrados em torno de questões cruciais, como a gratuidade e obrigatoriedade do ensino, a laicidade, a co- educação e o Plano Nacional de Educação”. 20 suas potencialidades e interesses, através da vivência de experiências variadas do cotidiano. A escola deveria ser equivalente à vida. O que importa agora é a formação dos sentimentos dos educandos, através da vivência de múltiplas experiências compatíveis com os interesses e liberdades de cada um. Então, os alunos entram na escola em condições diversificadas de aprendizagens e desta mesma forma saem dela (op. cit., p. 135). Gadotti (1994) relata que, no movimento da Escola Nova, somente o aluno poderia ser autor de sua experiência. Para tanto, eram necessários “métodos ativos e criativos também centrados no aluno” (op. cit., p. 144). Nessa perspectiva, uma das contribuições foi o Método dos Projetos – proposto por William Heard Kilpatric –, onde o aluno deveria ser envolvido em uma atividade prática. O autor exemplifica que esses projetos poderiam ser manuais, como uma construção; de descoberta, como uma excursão; de competição, como um jogo (...) etc. A execução de um projeto passaria por algumas etapas: designar o fim, preparar o projeto, executá-lo e apreciar o resultado (op. cit., p. 144). Na década de 1950, o ensino das ciências refletia a situação da sociedade ocidental após a Segunda Guerra Mundial. Ocorria a industrialização e forte movimentação política na luta contra as ditaduras. O curso ginasial tinha como objetivos formar futuros universitários, o ensino do latim preponderava sobre disciplinas científicas e as componentes História Natural, Física e Química estavam presentes somente no curso colegial. Nesse panorama, ocorriam propostas de transformações pautadas no Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova cujas idéias eram analisadas para discussão acerca do projeto de lei sobre as Diretrizes e Bases da Educação (KRASILCHIK, 1987). Nessa época, era forte a influência da Escola Nova (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998). Pretendia-se substituir os métodos tradicionais pela chamada metodologia ativa, dando autonomia ao aluno para que pudesse atuar de forma ativa na construção do conhecimento. Para tanto, propunha-se a substituição de métodos expositivos por métodos ativos, onde o laboratório ganhava destaque, com a realização de aulas práticas que proporcionassem motivação dos estudantes e favorecessem a compreensão de conceitos. Além disso, até então, as descobertas no campo científico ocorridas durante o período de guerra não haviam sido incorporadas ao ensino das ciências – Física, Química e Biologia –, e os alunos ocupavam-se de informações ultrapassadas (KRASILCHIK, 1987). 21 No início da década de 50, foi criado o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), resultante de um movimento em prol da melhoria do ensino das ciências. Um grupo de professores trabalhou no sentido de melhoramento dos conteúdos ensinados e de propostas para aulas de laboratório (op. cit.). Não havia, entretanto, nenhuma discussão acerca da “relação da ciência com o contexto econômico, social, político e tampouco os aspectos tecnológicos e as aplicações práticas” (op. cit., p. 9). Em 1961, por ocasião da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, o ensino ainda era pautado na mera transmissão de conteúdos conceituais, onde quantidade era tida como sinônimo de qualidade. O saber era transmitido como verdade absoluta e incontestável (BRASIL, 1998b). Contudo, desde então, tanto a necessidade do currículo adequar-se aos crescentes avanços científicos, quanto a proposição de abordagens metodológicas diversas das práticas até então adotadas, vinham sendo discutidas. Discutia-se a valorização da formação, em detrimento da mera informação, a participação do aluno ganhou destaque e as atividades práticas entraram em evidência como elementos de grande relevância para a compreensão de conceitos – embora fosse forte a tendência em usar “a experiência pela experiência” (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998, p. 194), chegando-se ao extremo de negar a ciência enquanto construção histórica, em prol da valorização da realidade imediata do aluno. A partir daí, ganhou força o chamado “método científico”, como necessário à formação do cidadão – trabalhando-se com a proposta de aprendizagem por redescoberta, pautada na “compreensão de processos científicos e ênfase na instrução” (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000, p. 4). Nessa perspectiva, o conhecimento deriva exclusivamente da experiência, e o professor atua organizando situações de aprendizagem a serem “descobertas pelos alunos”, numa metáfora do “aluno cientista” (op. cit.). Nesse sentido, muitos educadores passaram a fazer um uso inadequado da metodologia de pesquisa no contexto do ensino das ciências. Ainda assim, para alguns autores, pode-se considerar tal proposta um avanço, uma vez que se valorizou o trabalho em grupo, organizaram-se os conteúdos por faixa etária, e os materiais produzidos traziam orientações para os professores (KRASILCHIK, 1987; BRASIL, 1998b; DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998; CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000). Na década de 1970, nas discussões sobre o ensino das ciências, ganharam destaque os impactos causados ao ambiente por um desenvolvimento social inconseqüente, 22 traduzidos, sobretudo numa crise energética. “O mito da ciência começa a desmoronar diante dos sinais cada vez mais inequívocos da crise ambiental, que ela ajudara a deflagrar, contrariando suas promessas de absoluto controle da natureza” (AMARAL, 1998, p. 218). Cresce, então, o interesse pela temática ambiental, e passou-se a entender que o ensino das ciências deveria “fazer com que os alunos discutissem também as implicações sociais do desenvolvimento científico” (KRASILCHIK, 1987, p. 17). Tem início a idéia de incorporar ao conhecimento científico também a análise de valores, introduzindo questionamentos quanto a neutralidade da ciência (op. cit.). Nessa época, o Behaviorismo parece ser centro das discussões acerca do ensino das ciências, com a valorização da “operacionalização de objetivos no nível comportamental” (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998, p. 196), onde a qualidade do pacote instrucional se sobressaía, em detrimento dos conteúdos das ciências. Por outro lado, em 1971, a promulgação da Lei 5.692, causou várias conseqüências na estrutura do sistema educacional. A escola secundária passou a ter como objetivo formar um trabalhador adaptado às exigências do mercado. Assim, o currículo deu destaque para disciplinas de cunho profissionalizantes, em detrimento de componentes curriculares científicas. Segundo Krasilchik (1987), havia incoerência entre o objetivo do ensino secundário – que era formar um trabalhador para um sistema de produção massificador – e o ensino das ciências, “como sendo o de desenvolver a capacidade de pensar lógica e criticamente” (op. cit., p. 19). Os cursos de formação de professores lançavam no mercado profissionais incapacitados para a função, e o livro texto passou a ganhar destaque como guia – ou “muleta” – para as aulas. Com as condições de trabalho cada vez mais precárias, tornava-se bastante comum o ensino “baseado na apresentação, pelo professor, por meio de aulas expositivas ou textos impressos, de fatos esparsos e desconexos que os alunos memoriza[vam], sem interesse, apenas para usar na época das provas” (op. cit., p. 20). Nos anos 80, pesquisas assinalavam mudanças: muitos professores percebiam que atividades práticas descoladas de uma atitude investigativa mais ampla, não eram suficientes. Também nessa época, a partir das discussões geradas pela crise econômica mundial, ocorrida em meados da década de 1970, torna-se crescente a necessidade de se inserir nos currículos os problemas de saúde e ambiente causados pelo desenvolvimentismo (BRASIL, 1998b). Ressaltava-se a importância de se considerarem as relações existentes numa sociedade capitalista, com queda na qualidade de vida, problemas ambientais e, ainda, os impactos 23 causados na sociedade pela Revolução Científica que, necessariamente, forçaria o componente curricular Ciências a ter como eixo norteador “a ciência e a tecnologia na sociedade” (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998, p. 196). A ciência deixou de ser vista como algo neutro e o desenvolvimento tecnológico passou a ser encarado de maneira mais crítica, fazendo surgir a tendência de ensino conhecida como Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS). A união destas palavras (ciência, tecnologia, sociedade) indica que a ciência, como conhecimento proposicional, deve recorrer à tecnologia como conhecimento de ação, para construir uma ponte, seja entre ela e as tecnologias altamente complexas presentes no mundo do trabalho, seja entre ela e os problemas cotidianos que se impõem aos alunos, futuros cidadãos (DOMINGUES; KOFF; MORAES, 1998, p. 197). A interface entre ciência e tecnologia proporciona um enfoque interdisciplinar e problematizador, que passaria a ser a base do ensino das ciências. O aprendizado em ciências deveria, então, propiciar conhecimentos que subsidiassem a identificação e compreensão de como as ações humanas interferem no ambiente natural e social, formando indivíduos capazes de atuar sobre esses ambientes de modo a prevenir, resolver e/ou minimizar impactos, utilizando-se de conhecimentos científico-tecnológicos. Entretanto, esse modelo também sofre críticas, servindo de base para as pesquisas da área. Além disso, o processo educacional passou a ressaltar a perspectiva da construção do conhecimento e, desde então, surgiram muitas pesquisas relativas aos conhecimentos prévios dos estudantes acerca dos fenômenos estudados. “Um importante linha de pesquisa acerca dos conceitos científicos intuitivos [relacionados a concepções alternativas] é aquela que, norteada por idéias piagetianas, se desenvolve acompanhada por estudos sobre História das Ciências, dentro e fora do Brasil” (BRASIL, 2001a, p. 22). Por outro lado, tem-se o modelo de aprendizagem por mudança conceitual, que tem por princípios a idéia de que a aprendizagem resulta “do envolvimento ativo do aluno com a construção do conhecimento e das idéias prévias dos alunos [que] têm papel fundamental no processo de aprendizagem, que só é possível embasado naquilo que ele já sabe” (op. cit., p. 23). Entretanto, para Cachapuz, Praia e Jorge (2000), o ensino por mudança conceitual é simplista e, em contrapartida, sugerem uma perspectiva que denominam como ensino por pesquisa. 24 Trata-se de mudar atitudes, bem como processos metodológicos e organizativos de trabalho. A informação que se procura nasce mais na discussão com os alunos com a ajuda do professor e menos de um processo curricular muito estruturado e exaustivo. Os problemas amplamente discutidos na aula nascem de problemáticas abertas, com raízes ou incidências sociais fortes, que pouco a pouco vão delimitando e preparando para o exercício da pesquisa (...). Trata-se de envolver cognitiva e afetivamente os alunos, sem respostas prontas e prévias, sem conduções muito marcadas pela mão do professor (op. cit., p. 45). A proposta, segundo os mesmos autores, é garantir que o aprendizado construído ao estudar ciências seja utilizável no cotidiano, numa perspectiva de ação, contribuindo para o desenvolvimento pessoal e social do estudante. No contexto escolar cotidiano do ensino das ciências, entretanto, embora surjam prenúncios de mudanças, as abordagens atuais tendem a se configurar de forma fragmentada, descritiva e descontextualizada, tornando a aprendizagem desinteressante para a maior parte dos alunos. Por que isso ocorre? Talvez, a principal falha resida na importância demasiada e quase que exclusiva dada à transmissão de conteúdos conceituais, esquecendo-se quase por completo dos conteúdos procedimentais e atitudinais (CANTO, 1999). Ainda é dominante nas escolas um ensino focado na aprendizagem de conceitos, esperando-se que um dia os alunos saibam usar esses conceitos fora do contexto acadêmico de modo a responder aos problemas cotidianos, ou mesmo que esses conceitos sejam ponto de partida para eventualmente desenvolver atitudes, embora com a visão simplista de que a quantidade de conceitos relaciona-se diretamente com as atitudes do indivíduo mediante às ciências (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000). E o que seriam esses conteúdos? Segundo Zabala (1998), o termo “conteúdo” deve ser entendido como tudo aquilo que se deve aprender para alcançar determinados objetivos que não apenas abrangem as capacidades cognitivas, como também incluem as demais capacidades, possibilitando o desenvolvimento das competências motoras, afetivas, de relação interpessoal e de inserção social. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2001a, p. 73), o conteúdo é definido como “meio para que os alunos desenvolvam as capacidades que lhes permitam produzir e usufruir dos bens culturais, sociais e econômicos”. Optando por uma definição de conteúdos de aprendizagem ampla e não-restrita aos conteúdos disciplinares, permite-se que o currículo oculto desenvolvido nas escolas – aquelas aprendizagens que se realizam na escola, mas não aparecem nos planos de ensino e, portanto não são comumente avaliadas – seja manifesto e que se possa avaliar sua pertinência como conteúdo expresso de aprendizagem e ensino. 25 Assim, os conteúdos podem ser agrupados em conceituais, procedimentais ou atitudinais, procurando responder as perguntas “o que se deve saber?”, “o que se deve saber fazer?” e “como se deve ser?”, respectivamente, com o fim de alcançar as capacidades propostas nas finalidades educacionais. Desse modo, os conteúdos conceituais estariam relacionados a fatos, conceitos e princípios2; os conteúdos procedimentais seriam aqueles relacionados aos procedimentos3; e, por fim, os conteúdos atitudinais compreenderiam valores, normas e atitudes4 (BRASIL, 1998c; ZABALA, 1998; CANTO, 1999; SALVADOR et al., 2000; BRASIL, 2001a; BUENO, 2003). Conteúdos científicos conceituais adquirem importância cada vez maior em nossa sociedade tecnológica. Mas ensinar atitudes permite dar sentido ao conhecimento científico em nossa vida e sociedade. Ensinar procedimentos consiste em fazer a ponte entre o ponto de partida e o objetivo de uma seqüência de ações. Equivale a ensinar meios para alcançar modos de fazer (CANTO, 1999). Entretanto, o fato de haver representado uma tipologia variada de conteúdos não pode conduzir-nos a pensar que haverá propostas educativas compartimentadas (agora se ensinará e aprenderão os conceitos, amanhã os procedimentos, mais adiante as atitudes etc.). (...) deve-se ter presente que não se consolida nenhuma aprendizagem e, portanto, não se desenvolvem suficientemente as capacidades, sem atender de modo conveniente as diferentes dimensões dos saberes, que poucas vezes (...) se aprende de uma só perspectiva ou dimensão. Aprender de maneira significativa (...) envolve poder desfrutar, ao mesmo tempo, das perspectivas conceitual (...) e atitudinal com as quais os saberes escolares se revestem (SALVADOR et al., 2000, p. 330). Assim, “o educador se proporia a ler ou interpretar qualquer conteúdo curricular, em todas as dimensões possíveis que possam contribuir para completar ao máximo o 2 Segundo Salvador (2000, p. 308), entende-se por fato “algo que ocorre em um determinado momento e se podem referir características pelas quais se chegaram a produzir (...); os conceitos constituem representações das relações que estabelecemos entre alguns objetos, fatos ou símbolos e definem os traços essenciais ou que queremos destacar com uma determinada finalidade (...); os princípios são conceitos muito gerais, de um grande nível de abstração, que conformam a base da organização conceitual de um campo abrangente do conhecimento, já que transpassam todos os conteúdos”. 3 Os procedimentos são definidos “como conjuntos de ações ordenadas que se orientam à realização de uma meta ou de um objetivo” (REIGELUTH; STEIN, 1983 e COLL, 1986 apud SALVADOR et al., 2000, p. 314). 4 Os valores “atuam como objetivos e referências na vida, constituindo no marco que proporciona sentido, orienta os juízos e as ações e permite tomar decisões” (SALVADOR et al., 2000, p. 322); as atitudes “são predisposições relativas para atuar em relação a um objeto, situação, fato, pessoa ou conjunto de pessoas ou idéias (...) e preparam-nos para atuar de uma determinada maneira, segundo as crenças, os valores e as pautas de conduta assumidas” (op. cit., p. 323); as normas “são prescrições para atuar de uma determinada maneira em situações específicas (...) e, portanto, regulam o comportamento individual e o coletivo e tornam as condutas previsíveis (...). O respeito a um determinado tipo de norma (...) ajuda a formar determinadas atitudes” (op. cit., p. 323). 26 significado educativo” (SALVADOR et al., 2000, p. 331). Nesse sentido, Bueno (2003) salienta que é importante ter em mente que essa diferenciação de conteúdos é semântica, pois os conteúdos estão relacionados, e deve-se pensar em ciência de forma mais integrada do que somativa. Salvador (1994) reforça que o mais importante não é que a educação escolar forneça exclusivamente o aprendizado de conteúdos conceituais, procedimentais, atitudinais, mas sim que favoreça a aprendizagem significativa desses conteúdos. Quando o aprendizado das ciências (...), além de promover competências como o domínio de conceitos (...), pretende desenvolver atitudes e valores (...), toda a escola deve ter uma nova postura metodológica difícil de implementar, pois exige a alteração de hábitos de ensino há muito consolidados (BRASIL, 1999, p. 263). Além desse aspecto acerca dos conteúdos, é indispensável considerar alguns pontos que vêm ganhando destaque nas discussões que envolvem o ensino em ciências: faz-se cada vez mais necessário recorrer à interdisciplinaridade e à transdisciplinaridade, mediante a complexidade e globalidade necessárias à compreensão do mundo, em acelerada transformação; há um apelo às abordagens relacionadas ao cotidiano, como forma de construir e consolidar conhecimentos que permitam a reflexão sobre os avanços das ciências e suas implicações para a sociedade e o ambiente, proporcionando o desenvolvimento de competências, valores e atitudes, articuladas ao movimento Ciência-Tecnologia-Sociedade- Ambiente (CTSA); emerge a necessidade de pluralismo metodológico em nível de estratégias de trabalho, isto é, recorrer aos métodos possíveis e a estratégias variadas; nesse sentido, destaca-se a importância de uma avaliação educativa, formadora e não classificatória (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000). As idéias de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade não devem ser associadas ao cancelamento dos componentes curriculares, mas na interação entre eles. Nesse sentido, ... o aprendizado deve ser planejado desde uma perspectiva a um só tempo multidisciplinar e interdisciplinar, ou seja, os assuntos devem ser propostos e tratados desde uma compreensão global, articulando as competências que serão desenvolvidas em cada disciplina e no conjunto de disciplinas (...). Mesmo dentro de cada disciplina, uma perspectiva mais abrangente pode transbordar os limites disciplinares (BRASIL, 1999, p. 211). . Ao pensar em uma diversidade de procedimentos metodológicos, deve-se “envolver e respeitar a pessoa do aluno nas suas características e interesses cognitivo-afetivos, tendo em conta suas dificuldades, motivações, desempenhos e pontos de vista” 27 (BRASIL, 1999, p. 57). É importante não perder de vista que nem todos os alunos têm as mesmas características e conhecimentos prévios. Nesse sentido, é imprescindível considerar- se os conhecimentos intuitivos e as representações que os estudantes trazem consigo acerca dos conteúdos a serem explorados, discutidos e sistematizados pela escola (BRASIL, 2001a). Portanto, faz-se necessário uma pluralidade metodológica de modo a criar situações de aprendizagem que sejam válidas para a maior parte dos estudantes (BUENO, 2003). A educação escolar, ao considerar a diversidade dos alunos como elemento essencial para a aprendizagem, atende às necessidades singulares de determinados alunos, analisa as possibilidades de aprendizagem de cada um e avalia a eficácia das medidas adotadas (BRASIL, 1998c, p. 92). Assim, é imprescindível que o professor recorra a ações que potencializem a construção do conhecimento, de modo que o aluno tome “para si a necessidade e a vontade de aprender” (BRASIL, 1998c, p. 93). O aluno deve ser capaz de compreender a construção e organização da ciência, colocando-se como ser ativo, que partilha responsabilidades e deve saber decidir em situações onde os conhecimentos científicos estão envolvidos. É possível, desse modo, contribuir para a percepção de que “os conteúdos acadêmicos são limitados quando vistos pelas áreas restritas” (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2000, p. 58) e, portanto insuficientes para a resolução de problemas globais. Nesse sentido, temáticas com incidência social e ambiental deveriam ser “o grande desafio a colocar numa Educação em Ciência” (op. cit., p. 58). As Diretrizes Curriculares para a Educação Básica (2002) também apontam para a necessidade de reformular ambientes e materiais de aprendizagem, pois é indispensável que, numa sociedade de múltiplas linguagens, o ensino também potencialize diversas fontes de informação, não se restringindo ao costumeiro uso da lousa, livro didático e comunicação oral. Ensinar ciências deve ser um processo dinâmico, como a própria essência dos conhecimentos-científicos. 28 11..11 OO EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS EE AA TTEEMMÁÁTTIICCAA AAMMBBIIEENNTTAALL Pensando num ensino que deve permitir que o estudante utilize os conhecimentos construídos em sua vida diária, é coerente que se pense também na temática ambiental. Para compreender os problemas ambientais e poder agir de maneira consciente e coerente sobre eles, dentro de suas possibilidades, é de suma importância o conhecimento científico. O senso comum, muitas vezes, gera compreensões errôneas acerca dos problemas e soluções relacionadas ao ambiente, e cabe à educação escolar o papel de revisar e enriquecer os conhecimentos prévios com as informações mais recentes que a ciência oferece em relação à temática ambiental (BRASIL, 2001a). “É necessário conhecer o conjunto das relações na natureza para compreender o papel fundamental das Ciências Naturais nas decisões importantes sobre os problemas ambientais” (op. cit., p. 46). Inicialmente, poder-se-ia pensar em definir meio ambiente, termo bastante presente nas discussões relacionadas à temática ambiental. Entretanto, como afirma Sauvé (2003), é difícil apresentar uma definição que seja precisa e consensual, uma vez que o meio ambiente é uma realidade culturalmente e contextualmente determinada, socialmente construída. Assim, um caminho mais interessante é pensar em meio ambiente segundo suas representações. Nessa perspectiva, como exemplos, a autora sugere que se pode entender o meio ambiente como: sinônimo de natureza, a ser apreciado e preservado; recurso, a ser administrado, partilhado; problema, a ser resolvido, prevenido; meio de vida, que se deve conhecer, perceber, entender, arrumar; contexto, constituindo um “tecido de elementos espaço-temporais entrelaçados, trama de emergência e de significação” (traduzido de SAUVÉ, 2003, p. 4); sistema, que deve ser compreendido para que sejam tomadas as melhores decisões; território, lugar ao qual se pertence e de identidade cultural; paisagem, a ser percorrida, observada, interpretada; biosfera, onde se vive juntos, em comunidade, um longo tempo; projeto comunitário, onde é necessário comprometer-se. Para Sauvé, pelo conjunto dessas dimensões interrelacionadas e complementares é que se dá a relação do indivíduo com o meio ambiente (Figura 1). 29 Figura 1 – Tipologia de representações do meio ambiente. Fonte: Traduzido e adaptado de SAUVÉ, 2003, p. 5. Para Carvalho (1998, p. 26) “o meio ambiente é um retrato (...) das interações, das ações, dos estilos de vida e dos valores empreendidos historicamente pelas sociedades humanas”. Dias (2004, p. 7) salienta que “muitos danos ambientais são causados por decisões políticas e econômicas erradas”, frutos de um modelo desenvolvimentista que, segundo o autor, “produz exclusão social e miséria, por um lado, e consumismo, opulência e desperdício, por outro” (op. cit., p. 11). Da mesma forma, também o conceito de “natureza” não é algo simples ou facilmente definido, pois cada sociedade tem uma idéia do que seja natureza, que certamente norteia suas relações sociais, sua produção material, sua cultura e sua educação (PORTO- GONÇALVES, 1990). Portanto, para que um indivíduo compreenda o meio em que está inserido, e onde exerce ações transformadoras, “é preciso participar de forma ativa perguntando, buscando os diferentes pontos de vista, formulando respostas, hipóteses, ou seja, significa agir como um observador que sabe ‘ler’ as relações naturais e sociais que constituem os fatos ambientais” (CARVALHO, 1998, p. 25). Além disso, é indispensável reconhecer que, apesar da condição humana atual ser indissociável das perspectivas histórica e social, é a condição natural, de estrutura viva, anterior a qualquer outra, que torna possível as relações sociais. O homem é, antes de tudo, 30 um ser natural, imerso numa realidade histórica e cultural. “Partindo deste pressuposto, nossa garantia de existência como seres naturais está intrinsecamente relacionada com a manutenção de outros sistemas e formas de vida” (SENICIATO, 2002, p. 22). E é dentro dessa perspectiva que o ensino das ciências deve atuar. Estimulando a ampliação do conhecimento sobre a diversidade da vida nos ambientes naturais e construídos, discutindo a dinâmica da natureza e como a vida se processa em diferentes espaços, ao longo do tempo. Deve visar uma reconstrução crítica da relação homem-natureza, superando visões distorcidas, utilitaristas, onde o homem surge como “senhor” e o ambiente natural como fonte inesgotável de recursos. Para tanto, é de suma importância à construção de conceitos, procedimentos e atitudes relativos à temática ambiental, em todos os níveis da educação escolar (BRASIL, 1998b). Assim, pode-se falar da necessidade de uma Educação Ambiental (EA), entendida como um processo educativo permanente, participativo, articulando teoria e prática, com a finalidade de contribuir para compreensão da temática ambiental, considerando as dimensões natural, socioeconômica, filosófico-política, cultural e histórica, desenvolvendo valores e atitudes, e permitindo agir na transformação da realidade e das condições de vida de forma consciente, através de decisões coletivas, para a construção de uma sociedade sustentável (LEFF, 2001; SAUVÉ, 2003; LOUREIRO, 2004). O Brasil é um dos poucos países do mundo que possui uma política de Educação Ambiental, estabelecida pela Lei Federal 9.795, de 1999 (DIAS, 2004). Nela, a EA é apresentada como um componente essencial e permanente da educação, e deve ser desenvolvida como “uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal” (SÃO PAULO, 1999, p. 37). CCaappííttuulloo IIII AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO NNOO EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS EE NNAA EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO AAMMBBIIEENNTTAALL CCoonnttee--mmee,, ee eeuu vvoouu eessqquueecceerr.. MMoossttrree--mmee,, ee eeuu vvoouu lleemmbbrraarr.. EEnnvvoollvvaa--mmee,, ee eeuu vvoouu eenntteennddeerr.. -- CCOONNFFÚÚCCIIOO -- 32 CCAAPPÍÍTTUULLOO IIII -- AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO NNOO EENNSSIINNOO DDAASS CCIIÊÊNNCCIIAASS EE NNAA EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO AAMMBBIIEENNTTAALL A diversificação de atividades e do uso de recursos didáticos contribui para motivar os estudantes, possibilitando atender a distintas necessidades e interesses dos alunos. A motivação é fundamental para que o estudante tenha uma aprendizagem significativa. Além disso, não há um único caminho que conduza com segurança à aprendizagem, pois são inúmeras as variáveis que se interpõem nesse processo. Assim, o pluralismo metodológico pode garantir maiores oportunidades para a construção do conhecimento, além de fornecer subsídios para que mais alunos encontrem a(s) atividade(s) que melhor o ajude(m) a compreender o tema estudado. A diversidade de modalidades didáticas torna os assuntos atraentes a estudantes com diferentes interesses (SANMARTÍ, 2002; BUENO, 2003; KRASILCHIK, 2004). Nesse sentido, Krasilchik (2004) discute que, em qualquer curso, devem-se incluir diferentes modalidades didáticas. A opção por uma ou outra modalidade depende do conteúdo que se pretende trabalhar e dos objetivos selecionados, do público-alvo, tempo e recursos disponíveis. Dentre as diferentes modalidades que o educador dispõe para o ensino das ciências podem-se mencionar as aulas expositivas, as discussões, as demonstrações, as aulas práticas (aulas de laboratório) e as atividades de campo (op. cit.). Estas últimas serão o foco de discussão no presente capítulo. Quando se pensa num ensino de qualidade, sobretudo em ciências, é indispensável um planejamento que articule trabalhos de campo com as atividades desenvolvidas em classe (BRASIL, 1998b). As atividades de campo permitem a exploração de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, o que permite que sejam também de grande valia em projetos de Educação Ambiental. 33 22..11 AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO:: TTÉÉCCNNIICCAA,, RREECCUURRSSOO,, PPRROOCCEEDDIIMMEENNTTOO,, MMOODDAALLIIDDAADDEE DDIIDDÁÁTTIICCAA?? No presente trabalho, optou-se por considerar “atividade de campo” como uma modalidade didática, como sugere Krasilchik (2004). Entretanto, nas obras consultadas, encontra-se diferentes terminologias para “classificar” as atividades de campo. Harlen (1989), por exemplo, ao tratar do ensino e aprendizagem de Ciências, discute sobre como a utilização de diferentes recursos pode estimular a participação dos alunos nos conteúdos trabalhados e, em conseqüência, melhorar o aproveitamento, mencionando as excursões e visitas como recursos de grande utilidade para complementar assuntos já discutidos ou incentivar estudos posteriores. Para o autor, recursos são “estímulos organizados para desenvolver os conteúdos conceituais, selecionados como necessários em função de um objetivo previamente estabelecido como prioritário” (op. cit., p. 120). Sato (1995) refere-se às atividades de campo como um tipo de metodologia que contribui eficazmente em trabalhos de Educação Ambiental. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) apresentam a “excursão ou estudo do meio” como uma modalidade do procedimento de “busca de informações em fontes variadas” (BRASIL, 1998, p. 121). Assim como ocorre nos PCN, não raro se encontra a expressão “estudo do meio” como sinônimo de excursão, atividade de campo, visita etc.. Entretanto, é importante ressaltar que, segundo Libâneo (1991), mais que uma técnica didática, o estudo do meio caracteriza-se como componente do processo de ensino, não se restringindo a visitas ou excursões, mas “a todos os procedimentos que possibilitam o tratamento, a discussão e a compreensão de problemas concretos do cotidiano do aluno (...). Sendo possível, (...) [deve ser] vivamente enriquecido com visitas a locais determinados” (op. cit., p. 171). O estudo do meio permite que o aluno tome “contato com o complexo vivo, com um conjunto significativo que é o próprio meio, onde natureza e cultura se interpenetram. O aluno sintetiza, observa, descobre” (BALZAN, 1987, p. 123). De maneira geral, quando se refere ao estudo do meio, associa-se a idéia de uma modalidade didática em que se substitui a sala-de-aula por outro ambiente, seja uma fábrica, um museu, uma feira-livre, um quarteirão, a praça em frente à escola etc.. (...) [Refere-se] a um ambiente (natural ou não) habitado por vários seres vivos, onde haja condições para o estudo e a compreensão das relações entre os vários seres vivos que o habitam, das relações entre eles e os outros componentes do meio e da interação do homem com todos eles (SÃO PAULO, 1993, p. 56). 34 O estudo do meio constitui, nesse contexto, uma importante modalidade para tornar o ensino diversificado, atraente e, portanto, mais eficaz e produtivo (BRASIL, 1998b). Ainda em relação à denominação, freqüentemente se observa, na literatura disponível, a expressão “excursão” como sinônimo de “trabalho de campo”, não havendo distinção entre os termos (AGUAYO, 1954; CRAIG, 1970; FESQUET, 1971; FROTA- PESSOA; GEVERTZ; SILVA, 1979; GONÇALVES, 1988; BRASIL, 1998b; CAMPBELL; CAMPBELL; DICKISON, 2000). De Frutos e outros (1996), entretanto, apresentam três modalidades de trabalhos de campo: as excursões, as visitas monitoradas e as trilhas ecológicas. No presente trabalho, optou-se por discutir trabalhos de campo de uma forma genérica, sem subdividi-lo em modalidades, embora não haja enfoque específico para trilhas ecológicas, uma vez que estas apresentam um conteúdo organizacional bastante peculiar5. Considera-se, ainda, “trabalho de campo” como sinônimo de “atividade de campo” ou “aula de campo”, justificando assim a ocorrência dessas expressões ao longo do texto. É interessante mencionar que, embora o uso direto do ambiente na educação escolar soe como uma modalidade nova, graças a sua tímida inserção como prática pedagógica, sua utilização teve início há um tempo considerável. Em 1946, o Field Studies Council of Britain fundou o primeiro centro, objetivando desenvolver trabalhos de campo numa perspectiva educacional. Foi o movimento da Escola Nova que formalizou e sistematizou uma proposta concreta para que os trabalhos de campo figurassem como proposta pedagógica, quando o estudo do meio passou a ser aceito como importante modalidade didática no processo educacional (MORRISON, 1974 e CARSON, 1978 apud CARVALHO, 1989). No Brasil, o estudo do meio teve início no final da década de cinqüenta, com a instalação das classes experimentais, em determinadas escolas públicas e privadas, baseadas numa portaria do Ministério da Educação e Cultura. A expressão máxima veio com o surgimento dos Ginásios Vocacionais e Colégios de Aplicação (BALZAN, 1987). Não se trata, portanto, de uma modalidade nova no ensino, embora estudos recentes apontem para a reduzida exploração das atividades de campo na educação escolar (PEGORARO, 2003). Diversos autores ressaltam as potencialidades das atividades de campo. Gardner (2000 apud CARBONELL, 2002) discute que a mente tem a capacidade de aprender e reter 5 Nessa modalidade de trabalho de campo, o aluno realiza a trilha com um roteiro das atividades que deve realizar e questões que deve responder, preparadas previamente pelo(s) professor(es) responsável(eis) pela saída (SCHIAVETTI, 2003). 35 melhor as informações quando o corpo interage de maneira ativa na exploração de lugares, enquanto experiências onde o sujeito é passivo tendem a ter impacto de curta duração e atenuam-se com o tempo. Nesse sentido, Carbonell (2000, p. 88) afirma que são necessários espaços físicos, simbólicos, mentais e afetivos diversificados e estimulantes (...), aulas fora da classe, em outros espaços da escola, do campo e da cidade. Porque o bosque, o museu, o rio, o lago (...), bem aproveitados, convertem- se em excelentes cenários de aprendizagem. O contato direto com o ambiente torna o aprendizado mais fácil, uma vez que o estudante envolve-se em situações reais (FRACALANZA; AMARAL; GOUVEIA, 1986). Fagionato (1999) destaca que as saídas a campo são de fundamental importância na vida do educando, já que estes compreendem, de maneira mais rápida, à medida que visualizam in situ o que está sendo tratado. Assim, as aulas de campo possibilitam aos alunos observarem os fenômenos tal qual como ocorrem na natureza e, portanto, na realidade (DE FRUTOS et al., 1996; SENICIATO, 2002). Desse modo, o aluno pode aprofundar conhecimentos, além de confrontar teoria e prática. Além disso, uma atividade de campo permite que “o aluno se sinta protagonista de seu ensino, que é um elemento ativo e não um mero receptor de conhecimento” (DE FRUTOS et al., 1996, p. 15). Para Carvalho (1989), a abordagem dos conteúdos relacionados ao ambiente não pode ser descritiva, desconsiderando as relações entre os fatores bióticos e abióticos; deve, sim, ser ecológico-evolutiva, sobretudo no contexto do Ensino Fundamental, e aponta para as aulas de campo como uma modalidade eficaz para esta abordagem. Como discorre Fiumari Júnior (2001), a relação com o meio natural possibilita um maior entendimento das interações ambientais e ecológicas, pois ilustra os conteúdos, despertando a curiosidade, que pode revelar o primeiro passo para o conhecimento. “A excursão põe o aluno em contato direto com o mundo natural, exercita os sentidos, provoca a atividade do pensamento, (...) estreita as relações de estima entre o professor e alunos (...).” (AGUAYO, 1954, p. 210). Surge um companheirismo resultante da experiência em comum e da convivência agradável entre os sujeitos envolvidos que perdura na volta ao ambiente escolar (EISNER, 1979 apud KRASILCHIK, 2004). Campbell, Campbell e Dickinson (2000, p. 79), ao tratarem de inteligências múltiplas, apontam as atividades de campo como uma entre tantas atividades táctil-cinestésicas que possibilitam “a experiência educacional mais forte, agradável e memorável para todos os alunos”. 36 Entretanto, embora as atividades de campo possam fornecer importantes contribuições à educação escolar, a forma como são desenvolvidas pode limitar a exploração mais plena das potencialidades que as caracterizam. Em grande parte dos trabalhos de campo formais o integrante se vê parte de processos semelhantes aos que se estabelecem no interior das salas de aula, havendo quase uma transferência das aulas expositivas para o campo. Atividades educativas nas quais o educando interage com o ambiente, de modo que as características do meio sejam de fato fundamentais para a atividade e não apenas configurem um cenário distante, um palco que pode ser substituído por outro qualquer, necessitam de reflexão para que sejam uma prática qualitativamente mais empregada (PEGORARO, 2003). Desse modo, é importante salientar que um trabalho de campo compreende não só a saída propriamente dita, mas as fases de planejamento, execução, exploração dos resultados e avaliação (BALZAN, 1987; MATSUSHIMA, 1987; CARVALHO, 1989; LIBÂNEO, 1991; NÉRICI, 1992; KRASILCHIK, 2004). Pode e deve haver uma integração dos diferentes componentes curriculares em todas as fases do trabalho, do planejamento à avaliação, envolvendo diversas áreas do conhecimento (LOPES; ALLAIN, 2002). Limitar esta atividade apenas à visita propriamente dita constitui-se num desperdício das potencialidades passíveis de serem trabalhadas por meio das aulas de campo. Lopes e Allain (2002) lembram que a complexidade que envolve uma atividade de campo, onde os educandos se deparam com uma grande quantidade de fenômenos que ainda não compreendem, pode confundi-los na construção do conhecimento; lidar com esta complexidade requer o prévio estabelecimento de objetivos claros, além de um educador bem preparado. O professor “deve conhecer o produto e o processo que se dispõe a compartilhar com seus estudantes” (BUENO, 2003, p. 50). Sobretudo os alunos devem saber que a saída não é apenas lazer, mas outra forma de aprender e conhecer lugares, novos ou não (CARVALHO, 1989; BRASIL, 1998b; MERGULHÃO; VASAKI, 2002). O estudante deve ser preparado para participar da atividade de campo, intelectual e afetivamente, como ilustra a Figura 2 (CARVALHO, 1989; BRASIL, 1998b). Carvalho (1989) sugere que se aprofundem aspectos do conteúdo a serem trabalhados no campo e discuta-se o roteiro previamente, permitindo um ganho de qualidade durante a saída. No decorrer da visita, os alunos devem ser estimulados a observações cuidadosas, pode-se despertar questões, incentivar a formulação de hipóteses, propor coleta de dados etc.. No campo, o aluno deve ter a oportunidade de transcender o imediato e o particular, de pensar sobre o significado da vida, de maravilhar-se com a natureza. 37 Figura 2 - É indispensável que o aluno esteja preparado para a atividade de campo. Fonte: SCHULZ, 2004, p. 60. A escolha do local para uma aula de campo também é muito importante. Os ambientes mais próximos à escola normalmente são mais acessíveis e oferecem menores obstáculos à saída. Entretanto, saídas a ambientes mais distantes devem ser realizadas, uma vez que quanto maior for a diversidade biológica do ambiente escolhido para o estudo, maior a gama de conteúdos que poderão ser tratados, enriquecendo-se assim, o contexto das aulas. Além disso, é fundamental que o professor tenha conhecimento sobre o ambiente a ser trabalhado, a fim de explorar possibilidades e orientar as atividades antes, durante e após a saída a campo (CARVALHO, 1989; CHAPANI; CAVASSAN, 1997; BENETTI, 2002). No caso das visitas monitoradas, com um itinerário pré-determinado, o trabalho do educador é aparentemente facilitado, uma vez que se supre a necessidade de que conheça detalhadamente todo o ambiente visitado. Entretanto, De Frutos e outros (1996) lembram que, muitas vezes, o conteúdo abordado durante a visita não é totalmente adequado aos objetivos de cada série e de cada professor. Portanto, sugerem que o educador aproveite as informações trabalhadas pelos guias – ou monitores – e proponha atividades a serem realizadas durante a atividade de campo, de modo a adequar ao máximo a visita às suas necessidades. 38 22..22 AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO EE EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO AAMMBBIIEENNTTAALL As atividades de campo podem ser utilizadas como importante estratégia em programas de Educação Ambiental, uma vez que o contato com o ambiente permite a sensibilização acerca dos problemas ambientais. Além disso, surgem oportunidades de reflexão sobre valores, imprescindíveis às mudanças comportamentais e, sobretudo, atitudinais (DIAS, 1994; CARVALHO, 1998; FIUMARI JÚNIOR, 2001; MERGULHÃO; VASAKI, 2002). Para Sato (2004), o processo de sensibilização das pessoas ocorre, sobretudo, pela observação, contato e “imersão” na natureza. Uma caminhada no ambiente escolar ou em seu entorno pode constituir uma ótima atividade para desencadear um programa de Educação Ambiental na escola ou na comunidade, permitindo uma sensibilização acerca dos problemas locais (CARVALHO, 1998; MERGULHÃO; VASAKI, 2002). Mergulhão e Vasaki (2002) sugerem uma excursão a ambientes da própria cidade como uma atividade para reconhecimento do ambiente – natural ou construído – para iniciar trabalhos de Educação Ambiental. Os alunos devem ser estimulados, segundo as autoras, a explorar e sentir o ambiente, de modo que a curiosidade despertada facilite a aprendizagem. Já a observação de diferentes áreas como o cerrado e uma monocultura, por exemplo, possibilita a discussão sobre qual ambiente apresenta maior diversidade florística e/ou faunística, além de comparar fatores como umidade, temperatura etc., abrindo espaço para uma reflexão sobre a importância da conservação dos ambientes visitados. Junto com esse reconhecimento do ambiente, muitos conteúdos curriculares podem ser trabalhados e, sempre que possível, deve-se procurar envolver todas as componentes curriculares, explorando a visita de maneira interdisciplinar (MERGULHÃO; VASAKI, 2002). Conhecimentos de todas as áreas podem ser acionados para a compreensão e a discussão sobre o entorno ambiental. É importante salientar que o ensino interdisciplinar no campo ambiental deve trabalhar no “estudo das relações entre processos naturais e sociais, dependendo da capacidade das ciências para articular-se, oferecendo uma visão integradora da realidade” (LEFF, 2001, p. 228). Nessa perspectiva, a interdisciplinaridade, “se traduz como um trabalho coletivo que envolve conteúdos, disciplinas e a própria organização da escola” (LOUREIRO, 2004, p. 76). 39 Muito mais que uma cena estática, o ambiente cotidiano está em permanente mutação, é dinâmico e o ser humano faz parte dessa dinâmica (CARVALHO, 1998). Assim, mais que transmitir conhecimentos, quando se utiliza uma saída a campo dentro de um programa de Educação Ambiental, deve-se estimular a observação e o respeito a todos os elementos que compõem o ambiente visitado (MERGULHÃO; VASAKI, 2002). Krasilchik (2004) alerta para que haja coerência entre o discurso de conservação que se utiliza em sala de aula, ou mesmo na saída a campo, e o comportamento do professor e estudantes. Os impactos causados pela visita devem ser mínimos, e somente o essencial deve ser coletado para posterior estudo, desde que não cause danos significativos ao ambiente. Uma visita a um ambiente natural não deve deixar vestígios, como resíduos sólidos, plantas pisoteadas, galhos quebrados, água contaminada etc.. Até mesmo restos de lanche e cascas de frutas devem ser levados de volta, pois o processo de decomposição pode ser lento, e os locais visitados ficarão com aspecto desagradável para outras pessoas que posteriormente visitarão o lugar (MERGULHÃO; VASAKI, 2002). Nessa perspectiva, os procedimentos e atitudes podem ser trabalhados. 22..33 AATTIIVVIIDDAADDEESS DDEE CCAAMMPPOO CCOOMMOO OOBBJJEETTOO DDEE EESSTTUUDDOO O potencial educativo das atividades de campo, tanto do ponto de vista da EA, quanto de ensino das ciências, vem sendo objeto de inúmeras investigações. Alguns exemplos serão apresentados a seguir. Brinker (1997) pesquisou quais as possíveis aprendizagens em Biologia alunos de Ensino Fundamental poderiam desenvolver ao se defrontarem com situações encontradas em uma trilha ecológica. Nesse sentido, concluiu que um melhor planejamento no ensino de Ciências poderia auxiliar o desenvolvimento de linguagens e conceitos próprios da Biologia, além de auxiliar o professor a utilizar as trilhas ecológicas, ao trabalhar com conteúdos passíveis de serem desenvolvidos a partir delas. Guimarães (1999) realizou uma análise das atividades de um projeto de Educação Ambiental em duas microbacias, enfatizando os trabalhos de campo desenvolvidos por professores das escolas públicas de Campinas. Desta forma, apresentou uma reflexão sobre o potencial educativo dos trabalhos de campo para a melhoria da qualidade do ensino, enfatizando o desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental que adotem a bacia 40 hidrográfica como recorte temático e espacial para a realização de atividades interdisciplinares. Nesse estudo, seu enfoque foi direcionado à utilização dos trabalhos de campo, em projetos tendo como norteador estudos ligados à Geografia. Benayas, Blanco e Gutiérrez (2000) apresentaram uma avaliação da qualidade de visitas monitoradas a espaços naturais protegidos. O enfoque, nesse caso, foi direcionado ao público que faz uso dessas visitas, bem como à postura pedagógica dos guias que as monitoram. Vitiello (2001) estudou o perfil dos professores que desenvolvem atividades de campo direcionadas à Educação Ambiental, no Parque Estadual da Cantareira-SP; seus resultados possibilitaram perceber que grande parte das escolas que desenvolvem trabalhos nesse local não apresentava objetivos claros nem um planejamento adequado, e que a visita oferecida pelo Parque constituia-se num “passeio monitorado”. Nunes e Carvalho (2001) realizaram uma análise de um programa de educação desenvolvido no Zoológico Municipal de Piracicaba-SP, que se constitui numa visita monitorada ao local. Esses autores destacaram a importância da exploração do potencial educativo que áreas naturais ou modificadas oferecem, por meio de trabalhos de campo, e a necessidade de que o educador conscientize-se dessa potencialidade, tendo clareza sobre os objetivos que procura alcançar ao realizar uma atividade dessa natureza, bem como a necessidade de avaliação do trabalho realizado. Garcia e Mergulhão (2001) avaliaram um roteiro de visita orientada, desenvolvido pelo Zoológico de Sorocaba; segundo as autoras, um “passeio” ao zoológico é uma atividade estimulante, uma vez que proporciona o lazer aliado à construção do conhecimento. Lopes e Allain (2002) procuraram discutir as contribuições da saída de campo para a construção do conhecimento científico e de habilidades cognitivas nos alunos de Biologia, tomando como base uma experiência realizada com alunos de uma classe de Ensino Médio, em Belo Horizonte. Ao investigarem o conhecimento dos alunos acerca dos conteúdos explorados durante a atividade de campo, perceberam a predominância de diferentes concepções alternativas, o que pode estar associado, segundo os pesquisadores, ao fato dos conteúdos discutidos na visita não estarem relacionados àqueles trabalhados em sala de aula. Assim, os autores enfatizam que as saídas a campo devem estar articuladas a várias áreas de conhecimento, e possuir estratégias bem definidas, para que não sejam atividades vazias e, sim, capazes de desenvolver competências nos alunos. Os resultados apontaram, ainda, que a 41 relação entre o planejamento da atividade e a ação, muitas vezes, não é linear ou previsível, e necessitam por isso de certa improvisação por parte do professor. Seniciato (2002) analisou quais emoções e sensações estão envolvidas no desenvolvimento de uma aula de Ciências realizada em um ecossistema terrestre natural, e como as sensações e as emoções despertadas em uma aula num ambiente desse tipo poderiam contribuir para a construção de conhecimentos relacionados à ecologia. Para tanto, trabalhou com sextas séries do Ensino Fundamental de uma escola municipal em Bauru-SP, e com aulas de campo desenvolvidas no Jardim Botânico Municipal de Bauru, ambiente que possui fragmentos dos ecossistemas terrestres brasileiros, como o cerrado e a mata estacional semidecidual. Os resultados apontaram sensações e sentimentos que surgem nestas aulas: paz, tranqüilidade, alegria e empatia com a natureza. Além disso, permitiram observar que os alunos recorrem aos sentidos e às emoções para construírem novos conceitos e valores. Outras pesquisas mencionam a visitas como meio para se trabalhar conteúdos específicos de ecologia (BONILLA et al., 2003; LIMA, 2003), embora tenham enfoques distintos. Menegazzi (2003) também trabalhou com excursões a zoológicos e sua utilização no ensino de Ciência, realizando uma comparação dessas atividades com o uso do laboratório. Pegoraro (2003) apresentou uma reflexão sobre as atividades educativas desenvolvidas ao ar livre, a partir da utilização que escolas públicas da região de Campinas- SP fazem do Minipantanal de Paulínia-SP, uma área úmida com avifauna conspícua. O pesquisador revelou um quadro bastante comum em outras regiões: quantitativamente, essa modalidade de trabalho pedagógico é pouco empregada. As dificuldades que tentam justificar essa reduzida utilização perpassam pelos custos envolvidos na realização da atividade, que contrasta com o baixo poder aquisitivo dos alunos. Além disso, o pesquisador apontou serem os zoológicos os locais preferidos pelas escolas para realização de trabalhos extraclasse, uma vez que oferecem observação direta de animais. Pinheiro e Cavassan (2003) realizaram um estudo objetivando investigar a diversidade de concepções de floresta adquiridas na educação informal, presente em um grupo de alunos de 6ª série do Ensino Fundamental de uma escola estadual no município de Lençóis Paulista-SP, além de avaliar o quanto uma atividade prática em um ambiente natural contribui para o desenvolvimento de programas de EA. Em suas considerações finais, apontam a relevância das aulas práticas de campo, sobretudo quando estas ocorrem antes da aula teórica 42 em sala de aula, permitindo um contato direto do aluno com a complexidade da vegetação tropical brasileira, estimulando o questionamento e envolvimento dos estudantes, além de evitar a formação de concepções distorcidas da realidade. Xavier, Ferraz e Macedo (2003) trabalharam com a prática de campo como recurso didático para a preservação ambiental, utilizando o que denominam de “excursões motivadoras” – atividades de caráter investigativo, crítico e construtor do conhecimento, em contraposição a forma expositiva normalmente utilizada –, desenvolvendo conteúdos relacionados a Geociências com alunos de Educação Básica da região de Jequié, no sudoeste da Bahia. Concluíram que os procedimentos metodológicos usuais em Geociências só fazem contribuir para o conformismo dos alunos, inibindo a criatividade, e que programas alternativos sofrem variados tipos de restrições para serem realizados; entretanto, o trabalho por eles desenvolvido e avaliado mostrou resultados motivadores no que tange o interesse pelas questões abordadas a partir das práticas de campo. Outros trabalhos também apontam a utilização de visitas ou excursões como estratégia para a percepção do ambiente como sensibilização em programas de Educação Ambiental (MOREIRA; SOARES, 2002; CAMACHO et al., 2003; OLIVEIRA; SILVA, 2003; PONT, 2003; SOARES et al., 2003; MENGHINI; GUERRA; FANTONI, 2005). Pelos trabalhos apresentados, tem-se um quadro bastante variado da utilização das atividades de campo, tanto no ensino formal quanto informal, como estratégia para o ensino – de Ciências, Biologia, Geografia e áreas afins – ou em programas de Educação Ambiental. Entretanto, percebe-se uma lacuna no que tange a utilização das atividades de campo em sala de aula no ensino das ciências. Nesse sentido, pautando-se na visão dos professores que participam com seus alunos de uma atividade de campo promovida pelo Centro de Divulgação Científica e Cultural da Universidade de São Paulo (CDCC/USP), o presente trabalho pretende fornecer contribuições ao ensino das ciências, além de colaborar também no sentido de sinalizar possíveis mudanças e apontar sugestões para melhoria da atividade em questão. 43 22..44 AA VVIISSIITTAA CCIIEENNTTÍÍFFIICCAA ÀÀ BBAACCIIAA HHIIDDRROOGGRRÁÁFFIICCAA DDOO RRIIOO IITTAAQQUUEERRII:: UUMMAA AATTIIVVIIDDAADDEE DDEE CCAAMMPPOO PPRROOMMOOVVIIDDAA PPEELLOO CCDDCCCC//UUSSPP O Centro de Divulgação Científica e Cultural (CDCC) pertence à Universidade de São Paulo (USP) e está vinculado à Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, ao Instituto de Física de São Carlos (IFSC) e ao Instituto de Química de São Carlos (IQSC). Está localizado em São Carlos, município situado na região central do Estado de São Paulo. Suas instalações são em um prédio histórico, no centro da cidade, construído em 1902 pela Società Dante Alighieri, e adquirido em 1985 pela USP; ainda como parte do CDCC, há um Observatório Astronômico, o Centro de Divulgação da Astronomia (CDA), sediado no Campus I da USP. Seu objetivo primordial é o estabelecimento de um vínculo entre a universidade e a comunidade, permitindo um fácil acesso da população aos meios e aos resultados da produção científica e cultural da universidade (CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005a, 2005b). Foi criado em 1980, de modo a contribuir para a melhoria da educação e a divulgação da ciência, atuando desde então de modo integrado com a rede de ensino (SCHIEL, 2003). Assim, promove e orienta atividades objetivando despertar, em especial nos jovens, o interesse pela ciência e pela cultura. Colabora, ainda, na formação dos estudantes de Licenciatura em Ciências Exatas, do Câmpus da USP de São Carlos, repassando a eles a experiência que surge da execução de projetos. Também estudantes de graduação de outros cursos, em especial alunos da USP-São Carlos, têm a oportunidade de vivenciar o sistema educacional através de atividades de monitoria nos diversos setores do CDCC (CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005a). Os professores do Ensino Fundamental e Médio, da rede pública e particular de ensino, têm acesso a materiais instrucionais, equipamentos e a capacidade científica e tecnológica da Universidade de São Paulo. “Pretende-se (...) que os professores tenham oportunidade de realizar pesquisas para o desenvolvimento e aplicação de métodos alternativos de ensino” (op. cit.). Estima-se que, nas diversas atividades oferecidas pelo CDCC a professores, alunos e o público em geral, atende-se aproximadamente setenta e cinco mil usuários a cada ano (CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005c). 44 Além de fornecer diversos recursos que subsidiam o trabalho de professores da cidade e região, o CDCC tem também importante atuação na promoção de cursos de formação continuada para educadores, nas áreas de Química, Física, Matemática, Biologia, Educação Ambiental e Astronomia. Nesse sentido, o Setor de Biologia e Educação Ambiental do CDCC vem desenvolvendo, desde 1985, diversos cursos voltados à temática ambiental. Em 1986, iniciou-se um projeto conjunto do CDCC e do Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada (CRHEA/USP) – sob coordenação dos professores Dietrich Schiel, então coordenador do CDCC, e José Galizia Tundisi, na ocasião, diretor do CRHEA – que utilizou a exploração das interfaces de uma bacia hidrográfica num curso destinado a professores de Ciências e Geografia, de modo a proporcionar a educadores e educandos uma visão interdisciplinar de um sistema natural submetido a impactos múltiplos. A bacia hidrográfica onde esse trabalho foi desenvolvido foi a do Rio Itaqueri, devido a sua dimensão e ao conhecimento acumulado sobre essa área. Na metodologia utilizada para o curso, uma das atividades de destaque eram excursões para a área de estudo, com os professores envolvidos e depois, desses com seus alunos. Graças aos bons resultados obtidos a partir do trabalho com os alunos, os professores sugeriram que as excursões deveriam ser realizadas continuamente, e que não estivessem limitadas ao projeto em que estavam participando (SANTOS, 1998; TUNDISI; SCHIEL, 2003). Com base nisso, foi criado um roteiro de excursão à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri, uma área rural pertencente aos municípios de Itirapina e Brotas, proporcionando aos participantes um contato com diferentes ambientes (cerrado, mata ciliar, monocultura de vegetação exótica e corpos d’água) e os impactos causados pela ocupação humana (LEME, 1994; FAGIONATO, 1999). A partir de 1997 foi elaborado um roteiro para visita à Bacia Hidrográfica do Córrego do Gregório, principal afluente do Rio Monjolinho, o qual drena a cidade de São Carlos-SP. Com exceção da área de nascente, é um córrego totalmente urbanizado, permitindo aos estudantes conhecerem os impactos ambientais causados pela ocupação urbana, além de se fazer um resgate histórico dessa ocupação (SANTOS; VIVEIRO; SILVA, 2002; CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005d). Mais tarde elaborou-se ainda um programa de visitas ao Aterro Sanitário da cidade, de modo a sensibilizar os estudantes a respeito do volume de resíduos produzidos na área urbana e mostrar a estrutura e manutenção de um aterro, bem como as medidas de minimização de impactos ambientais causados por esses resíduos. Nessa visita, os estudantes 45 conhecem também o Centro de Reciclagem de Plásticos do CDCC. Além dessas visitas, o Centro de Divulgação da Astronomia (CDA) e o Museu de Ciências6 também recebem visitas monitoradas de escolas, sendo abertos também à visitação pública (CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005d). Durante o ano de 2005, eram oferecidas, por semana, duas visitas à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri (uma para escolas da cidade de São Carlos e outra para escolas de outros municípios), atendendo, em média, 40 alunos em cada visita. Em média, 2000 alunos são atendidos anualmente (CENTRO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E CULTURAL, 2005c, 2005d). O programa de visitas é bastante procurado pelos educadores de São Carlos e também de outras cidades, percebendo-se assiduidade na participação de certos professores, que têm essa atividade, muitas vezes, previstas em seus planos de curso. O agendamento é feito por telefone ou pessoalmente, normalmente pelo professor responsável pela turma que participará da visita ou pelo coordenador pedagógico da escola. Para as escolas públicas ou que comprovem atender um público carente, o CDCC fornece transporte gratuito em todo o trajeto da visita. Os professores interessados em participar, com seus alunos, dessa visita recebem um material de apoio via correio ou pessoalmente, junto ao técnico responsável pelos agendamentos, e também uma ficha de inscrição que contém informações como, por exemplo, quais objetivos pretendem alcançar, como pretendem trabalhar o assunto em sala de aula, quais os temas que gostariam que fossem abordados e de que forma costumam avaliar seus alunos mediante o que foi visto durante a visita, para que os monitores saibam com antecedência sobre o público com o qual irão trabalhar, além de firmar um compromisso maior com o professor. Além disso, os professores devem encaminhar ao CDCC um projeto pedagógico que justifique a relação entre a visita e o trabalho desenvolvido em sala de aula. Pede-se que os professores reencaminhem a ficha de inscrição com, no mínimo, uma semana de antecedência. 6 O Museu de Ciências é composto pela Sala de Física, Sala de Ecologia, Serpentário e o saguão de entrada onde estão expostos um espelho acústico, alguns computadores onde os visitantes podem assistir a vídeos educativos sobre diversos temas etc.. Na ocasião da elaboração do presente trabalho, esses espaços passavam por reformas e novas áreas de exposição estavam em construção. 46 Os monitores que acompanham as visitas são alunos de graduação ou pós- graduação, normalmente estudantes da USP7, de diferentes cursos; preferencialmente, são aqueles que têm alguma formação em ensino de Ciências e/ou Biologia, ou que tenham experiência na área ambiental. Os novos monitores têm acesso a uma bibliografia de apoio, e acompanham as visitas com os monitores mais experientes, até que se sintam preparados para monitorá-las. Ainda assim, um monitor o acompanha durante mais algumas visitas, de modo a garantir que todo o conteúdo programado está sendo trabalhado e que os pontos de parada são de conhecimento do novo monitor. Ao final da visita, com o objetivo de analisar o trabalho desenvolvido, o professor deve preencher uma ficha de avaliação onde são colocados os pontos positivos e negativos observados, sua opinião sobre a adequação da linguagem utilizada e alcance dos seus objetivos, entre outros fatores, além de dar sugestões para melhoria do roteiro. Ainda como forma de avaliar o programa e a participação do grupo, os monitores também preenchem uma ficha, apontando itens como a participação dos alunos e professores, interesse, problemas ocorridos etc.. O Quadro 1 apresenta sinteticamente o roteiro da visita, com breve descrição das atividades desenvolvidas em cada ponto de visitação. 7 Em certas épocas, têm-se alunos de outras instituições, como a Universidade Federal de São Carlos, por exemplo, graças a financiamentos que permitem o fornecimento de bolsas a esses estudantes. Normalmente, os monitores são alunos da própria USP, devido às exigências da instituição para concessão de bolsas. 47 Quadro 1 – Roteiro da Visita Científica à Bacia Hidrográfica do Rio Itaqueri PPOONNTTOO DDEE VVIISSIITTAAÇÇÃÃOO LLOOCCAALL DDEESSCCRRIIÇÇÃÃOO 1 Vista Geral da Bacia e Divisor de Águas - Localização do ponto de visitação no mapa, tomando como referência a cidade de São Carlos. - Retomada do conceito de Bacia Hidrográfica. - Comentário sobre os pontos a serem visitados. - Observação de diferentes manchas de vegetação e breve discussão sobre a ação do homem modificando o ambiente e utilizando recursos da bacia hidrográfica. - Discussão sobre divisor de águas, explicando-se que se trata do divisor da Bacia do Ribeirão Feijão. 2 Ribeirão Feijão - Localização do ponto de visitação no mapa. - Observação das condições da mata ciliar e ma