Campus de São José do Rio Preto Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Formulação de Coquetéis de Enzimas Produzidas por Fungos em Cultivo Sólido e Aplicação na Hidrólise de Bagaço de Cana-de-Açúcar São José do Rio Preto 2020 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Formulação de Coquetéis de Enzimas Produzidas por Fungos em Cultivo Sólido e Aplicação na Hidrólise de Bagaço de Cana-de-Açúcar Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutora em Química, junto ao Programa de Pós-Graduação em Química, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, Campus de São José do Rio Preto. Orientador: Prof. Dr. Roberto da Silva São José do Rio Preto 2020 Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. 1. Bioquímica. 2. Enzimas de fungos. 3. Etanol celulósico. 4. Fermentação em estado sólido. 5. Bagaço de cana. I. Título. Frassatto, Priscila Aparecida Casciatori Formulação de coquetéis de enzimas produzidas por fungos em cultivo sólido e aplicação na hidrólise de bagaço de cana-de-açúcar / Priscila Aparecida Casciatori Frassatto. -- São José do Rio Preto, 2020 181 f. : il., tabs., fotos Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto Orientador: Roberto Da Silva F843f Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Formulação de Coquetéis de Enzimas Produzidas por Fungos em Cultivo Sólido e Aplicação na Hidrólise de Bagaço de Cana-de-Açúcar Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutora em Química, junto ao Programa de Pós-Graduação em Química, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, Campus de São José do Rio Preto. Comissão Examinadora _____________________________________ Prof. Dr. Roberto da Silva UNESP – São José do Rio Preto Orientador _____________________________________ Profa. Dra. Vera Aparecida de Oliveira Tiera UNESP – São José do Rio Preto _____________________________________ Prof. Dr. Antonio José Gonçalves da Cruz UFSCar – São Carlos _____________________________________ Profa. Dra. Cristiane Sanchez Farinas Embrapa Instrumentação – São Carlos _____________________________________ Prof. Dr. Marcel Otavio Cerri UNESP – Araraquara São José do Rio Preto 13 de março de 2020 Dedicatória Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Dedico este trabalho a Deus, o maior orientador da minha vida, e a Nossa Senhora, a fonte da minha perseverança. Sem a força de Deus, que me sustentou em todos os momentos e sem a direção dada por Nossa Senhora, a conquista desta vitória não seria possível. Agradecimentos Priscila Aparecida Casciatori Frassatto AGRADECIMENTOS À Deus, fonte de toda sabedoria e da felicidade plena; por ser meu amparo nos momentos de dificuldade; por colocar em meu coração a certeza de que ―tudo posso naquele que me fortalece‖ e de que ―nada é impossível para Deus‖; pela presença constante em minha vida; por sempre conduzir meus passos e iluminar minha estrada. À Nossa Senhora Desatadora dos Nós, que com suas mãos cheias do amor de Deus, desatou todos os obstáculos do meu caminho e solucionou o que me parecia impossível. Muito obrigada Mãezinha querida, por interceder por mim junto de vosso diletíssimo filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, em todos os momentos da minha vida! Ao meu amado esposo Vinicius Augusto Frassatto, pelo companheirismo, compreensão, admiração, incentivo e paciência; por fazer parte da minha história. Sem você tudo seria mais triste e difícil na minha vida. Obrigada amor, por nunca me deixar desistir e por me dar forças todos os dias para continuar e chegar até o final desta caminhada. À minha mãe Ana Maria Marques Casciatori, que me ensinou acima de tudo a ter fé e perseverança; por todas as vezes que me disse ―Ore, Espere e Confie‖. Obrigada mãe, por todas as suas orações, por manter a sua fé inabalável, pelo seu apoio incondicional e por, mais uma vez, acreditar em mim, mesmo quando eu já não acreditava. Ao meu pai Aparecido Donizetti Casciatori, que sempre me incentivou a continuar, por estar ao meu lado em todos os momentos da minha vida, por todos os ensinamentos e por tudo que sempre me proporcionou. Obrigada pela dedicação e esforço de uma vida inteira à minha educação. Hoje você me deixa a maior riqueza que um pai pode dar ao seu filho: o conhecimento. Muito obrigada! À minha irmã Profa. Dra. Fernanda Perpétua Casciatori, por sua colaboração no desenvolvimento deste trabalho com disponibilidade, competência e destreza incomuns, pelas sábias sugestões que contribuíram imensamente para a minha formação acadêmica e pessoal e por toda ajuda nos artigos científicos. Fer, obrigada pela parceria, pelo companheirismo de todos os momentos e pela amizade única e incomparável. Agradecimentos Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Ao meu sogro Walter Brás Frassatto e à minha sogra Maria Aparecida da Cunha Frassatto pela oportunidade de emprego no meu horário de almoço, o que, financeiramente, me ajudou muito ao longo do desenvolvimento deste doutorado. Ao meu orientador Prof. Dr. Roberto da Silva, pelo privilégio e oportunidade concedidos, e, sobretudo, pela confiança, por todo empenho, sabedoria, compreensão, motivação e incentivo para realização deste trabalho. Ao Prof. Dr. João Cláudio Thoméo pela ajuda, carinho, amizade, dedicação e assessoria. A todas as minhas amigas e amigos do laboratório de Engenharia de Processos e Biorreatores e do Laboratório de Bioquímica e Microbiologia Aplicada que sempre estiveram presentes, me ajudando, incentivando ou trabalhando junto comigo com carinho e colaboração. À minha amiga e madrinha de casamento Giulliana Tornelli Lucas pela paciência e auxílio em todas as etapas deste doutorado e pela presença e apoio constante em minha vida pessoal. Ao Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas (IBILCE) de São José do Rio Preto, da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖ (UNESP) e, em especial, ao Programa de Pós-Graduação em Química, por proporcionarem oportunidade, apoio, suporte e infraestrutura necessários ao desenvolvimento desta pesquisa. Ao coordenador do Programa de Pós-Graduação em Química, Prof. Dr. Luis Octávio Regasini, pelo apoio e compreensão em todos os momentos necessários e por conduzir o programa com fiel dedicação. Ao Departamento de Química e Ciências Ambientais, em especial à Profa. Dra. Vera Aparecida de Oliveira Tiera, pela oportunidade de ministrar aulas para os cursos de graduação em Química, Engenharia de Alimentos e Ciências Biológicas, na condição de Bolsista Didática, e à Eliani Nobuco Ikeguchi Ohira pelo auxílio técnico nas atividades práticas. Agradecimentos Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Aos membros da Comissão Examinadora do Exame Geral de Qualificação, Prof. Dr. Gustavo Orlando Bonilla Rodriguez e Profa. Dra. Vera Aparecida de Oliveira Tiera, que, por meio de suas sugestões, contribuíram para com o direcionamento das etapas finais deste trabalho. Aos membros da Comissão Examinadora da Defesa de Tese, Profa. Dra. Vera Aparecida de Oliveira Tiera, Prof. Dr. Antônio José Gonçalves da Cruz, Profa. Dra. Cristiane Sanchez Farinas e Prof. Dr. Marcel Otavio Cerri, que com muita destreza avaliaram esta tese e proporcionaram uma rica discussão do seu conteúdo, tendo em vista o melhor fechamento deste trabalho e a prospecção de trabalhos futuros. À UNIVESP, pelo apoio financeiro com bolsa e pela oportunidade de atuação como facilitadora na Educação a Distância e aos meus alunos virtuais, por todo o carinho e admiração. Aos membros do Grupo de Oração São João Batista, da Igreja Santuário das Almas, por todas as orações dedicadas ao término deste trabalho. A todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para a realização deste trabalho, todos que torceram e oraram por mim, e todos que de alguma maneira fazem parte da minha vida acadêmica ou pessoal. Muito obrigada! Epígrafe Priscila Aparecida Casciatori Frassatto “É justo que muito custe, o que muito vale.” (Santa Teresa D’Avila, 1995, p. 563) Resumo i Priscila Aparecida Casciatori Frassatto RESUMO Esta tese aborda a produção de enzimas celulolíticas por cultivo sólido (CS) dos fungos termofílicos Myceliophthora thermophila I-1D3b e Thermoascus aurantiacus CBMAI756 e do mesofílico Trichoderma reesei QM9414 em substrato composto por bagaço de cana-de- açúcar (BC) e farelo de trigo (FT); a caracterização dos extratos obtidos quanto a temperatura e pH ótimos e a estabilidade; a formulação de coquetéis enzimáticos para aplicação na hidrólise de bagaço de cana não tratado (BNT), pré-tratado com ozônio, álcali e ultrassom (BOU) e com pré-tratamento hidrotérmico (BHT); e, por fim, as condições e a cinética da reação de sacarificação enzimática. O CS de M. thermophila levou à obtenção de extratos com as maiores atividades de endoglucanase (32 U/mL), β-glicosidase (3,5 U/mL) e FPA (0,7 U/mL). Os extratos apresentaram diferentes perfis de atividade e estabilidade em função de variações de pH e temperatura de reação e incubação, características desejáveis para aplicação na hidrólise de biomassa visando a produção de etanol de segunda geração (E2G). Após 24 h de hidrólise, maiores rendimentos em açúcares redutores totais (ART) foram atingidos empregando coquetel 1:1 v/v de extratos enzimáticos provenientes do CS de T. aurantiacus (TA) e T. reesei (TR) no BOU. Foi possível obter maior teor de ART (464 mg/g BOU vs. 396 mg/g BOU) com menor carga enzimática (9,9 FPA/g BOU com coquetel TA:TR 1:1 v/v vs. 12,6 FPA/g BOU com extrato de TA, respectivamente). Denota-se que há sinergismo entre as enzimas secretadas pelos dois fungos e que o uso de coquetéis é promissor, já que a liberação de ART aumentou 17 % com 78 % da carga enzimática. Para BNT, a maior liberação de ART foi 124 mg/g BC a 65 ºC, com carga enzimática 17,9 FPA/g BC. Nas hidrólises de BHT e BOU, foram liberados, respectivamente, 190 e 464 mg/g BC a 55 ºC, com carga enzimática 9,9 FPA/g BC, confirmando que o pré-tratamento aumenta a digestibilidade do BC e favorece a conversão de celulose, além de que a temperatura de hidrólise é relevante, sobretudo ao se empregar coquetel de enzimas produzidas por fungos distintos. Na cinética de hidrólise, observou-se que os teores de ART liberados aumentaram rapidamente no início da reação, tendendo a ficar constantes após 8 a 12 h, provavelmente em consequência de depleção da fração amorfa de celulose no substrato, adsorção improdutiva e gradual desativação das enzimas. Os parâmetros do ajuste do modelo hiperbólico à cinética de hidrólise são úteis para dimensionamento da etapa de sacarificação em busca de melhores rendimentos, a fim de tornar a produção de E2G atrativa e competitiva no mercado de biocombustíveis. Palavras-chave: Celulases. Sacarificação. Pré-tratamento. Fermentação sólida. Bioetanol. Abstract ii Priscila Aparecida Casciatori Frassatto ABSTRACT This thesis addresses the production of cellulolytic enzymes by solid cultivation (CS) of the thermophilic fungi Myceliophthora thermophila I-1D3b and Thermoascus aurantiacus CBMAI756 and of the mesophilic Trichoderma reesei QM9414 on a substrate composed of sugarcane bagasse (SCB) and wheat bran (WB); the characterization of the extracts obtained in terms of optimum temperature and pH and stability; the formulation of enzymatic cocktails for application in the hydrolysis of untreated SCB (BNT), pretreated with ozone, alkali and ultrasound (BOU) and with hydrothermal pretreatment (BHT); and, finally, the conditions and kinetics of the enzymatic saccharification reaction. The CS of M. thermophila provided extracts with the highest activities of endoglucanase (32 U/mL), β-glucosidase (3.5 U/mL) and FPA (0.7 U/mL). The extracts showed different profiles of activity and stability due to variations in pH and temperature of reaction and incubation, desirable characteristics for application in the hydrolysis of biomass aiming the production of second generation ethanol (E2G). After 24 h of hydrolysis, higher yields of total reducing sugars (TRS) were achieved using cocktail 1:1 v/v of enzymatic extracts from the CS of T. aurantiacus (TA) and T. reesei (TR) in BOU. It was possible to obtain a higher TRS content (464 mg/g BOU vs. 396 mg/g BOU) with lower enzyme load (9.9 FPA/g BOU with cocktail TA:TR 1:1 v/v vs. 12.6 FPA /g BOU with TA extract, respectively). It denotes there is synergism between the enzymes secreted by both fungi and the use of cocktails is promising, since TRS release increased by 17 % with 78 % of the enzyme load. For BNT, the highest TRS release was 124 mg/g BC at 65 ºC, with enzymatic load 17.9 FPA/g BC. In the hydrolysis of BHT and BOU, TRS released were 190 and 464 mg/g BC, respectively, at 55 ºC, with enzymatic load 9.9 FPA/g BC, confirming the pretreatment increases the SCB digestibility and favors the conversion of cellulose; additionally, hydrolysis temperature is relevant, especially when using a cocktail of enzymes produced by different fungi. In the hydrolysis kinetics, it was observed that the levels of ART released rapidly increased at the beginning of the reaction, tending to remain constant after 8 to 12 h, probably as a result of depletion of the amorphous fraction of cellulose in the substrate, unproductive adsorption and gradual deactivation of enzymes. The parameters of hyperbolic model fitted to the hydrolysis kinetics are useful for designing the saccharification stage aiming to better yields, in order to make E2G production attractive and competitive in the biofuels market. Keywords: Cellulases. Saccharification. Pretreatment. Solid fermentation. Bioethanol. Lista de Ilustrações iii Priscila Aparecida Casciatori Frassatto LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 3.1. Estrutura da parede celular vegetal (POSTEK et al., 2011)..................................33 Figura 3.2. União das moléculas de glicose por ligações glicosídicas do tipo β-(1,4) (Adaptado de FARINAS, 2011)................................................................................................36 Figura 3.3. Estrutura característica da hemicelulose mostrando as diferentes ligações e grupos encontrados nas ramificações (Adaptado de DODD; CANN, 2009)……....................38 Figura 3.4. Representação esquemática de unidades estruturais precursoras da lignina (Adaptado de FARINAS, 2011)……………. …………………….… ………………………39 Figura 3.5. Híbridos de ressonância da molécula de ozônio (PERRONE, 2015)....................43 Figura 3.6. Exemplos de reações do ozônio com (a) alcenos, (b) alcanos e cadeira lateral do anel aromático e (c) aldeídos (Adapatado de GIERER, 1986).................................................43 Figura 3.7. Representação esquemática da ação das celulases sobre a celulose (SANDGREN; STAHLBERG; MITCHINSON, 2005).....................................................................................54 Figura 3.8. Novo mecanismo proposto de degradação enzimática da celulose (DIMAROGONA; TOPAKAS; CHRISTAKOPOULOS, 2012).............................................59 Figura 4.1. Embalagem de polipropileno utilizada no cultivo sólido......................................73 Figura 4.2. Crescimento fúngico e produção de β-glicosidase (a) Thermoascus aurantiacus; (b) Trichoderma reesei ( Atividade de β-glicosidase; ---- Ajuste da equação logística para β- glicosidase; Biomassa estimada pelo teor de proteínas totais (mg); — Ajuste da equação logística para biomassa)............................................................................................................84 Lista de Ilustrações iv Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Figura 4.3. Efeito do pH e da temperatura sobre as atividades de (a, c) β-glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Myceliophthora thermophila (*) .........90 Figura 4.4. Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas (a, c) β- glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Myceliophthora thermophila, após 24 horas de incubação (*) .............................................................................93 Figura 4.5. Efeito do pH e da temperatura sobre as atividades de (a, c) β-glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Thermoascus aurantiacus (*) ..............95 Figura 4.6. Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas (a, c) β- glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Thermoascus aurantiacus, após 24 horas de incubação (*) .............................................................................97 Figura 4.7. Efeito do pH e da temperatura sobre as atividades de (a, c) β-glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Trichoderma reesei (*) ........................99 Figura 4.8. Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas (a, c) β- glicosidase e (b, d) FPA do extrato produzido por cultivo sólido do fungo Trichoderma reesei, após 24 horas de incubação (*) .................................................................................................101 Figura 5.1. Teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado e percentual de conversão de celulose em função da carga enzimática do extrato produzido pelo fungo Myceliophthora thermophila em diferentes temperaturas após 24 horas ( 45 ºC; 55 ºC; 65 ºC; 75 ºC).................................................................................113 Figura 5.2. Teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado e percentual de conversão de celulose em função da carga enzimática do extrato produzido pelo fungo Trichoderma reesei em diferentes temperaturas após 24 horas ( 45 ºC; 50 ºC; 55 ºC; 60 ºC)...................................................................................................116 Lista de Ilustrações v Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Figura 5.3. Superfícies de resposta da hidrólise por ação das enzimas produzidas por cultivo sólido do fungo Myceliophthora thermophila a 65 ºC, dadas por ART (mg/g BC) em função do tempo (h) e da carga enzimática (FPA/g BC) para (a) BNT; (b) BHT; (c) BOU..............120 Figura 5.4. Teor de açúcar quantificado por HPAEC-PAD nos hidrolisados de BNT, BHT e BOU por ação das enzimas produzidas por Myceliophthora thermophila, aplicando-se 24,5 FPA/g BC por 4 horas a 65 ºC e 2 % de sólidos ( ) glicose; ( ) xilose; ( ) celobiose..................................................................................................................................121 Figura 5.5. Superfícies de resposta da hidrólise por ação das enzimas produzidas por cultivo sólido do fungo Trichoderma reesei a 45 ºC, dadas por ART (mg/g BC) em função do tempo (h) e da carga enzimática (FPA/g BC) para (a) BNT; (b) BHT; (c) BOU..............................125 Figura 5.6. Teor de açúcar quantificado por HPAEC-PAD nos hidrolisados de BNT, BHT e BOU por ação das enzimas produzidas por Trichoderma reesei, aplicando-se 7,2 FPA/g BC por 4 horas a 45 ºC e 2 % de sólidos ( ) glicose; ( ) xilose; ( ) celobiose..............126 Figura 6.1. Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado empregando o extrato enzimático produzido pelo fungo Myceliophthora thermophila (24,5 FPA/g BC), expressa em teores de ART (mg/g BC) e percentual de conversão de celulose em função do tempo de hidrólise (h) ( 45 ºC; 55 ºC; 65 ºC; 75 ºC)........................................136 Figura 6.2. Ajuste do modelo hiperbólico aos dados experimentais dos teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado em função do tempo (h) aplicando- se o extrato enzimático produzido pelo fungo Myceliophthora thermophila (24,5 FPA/g BC) (a) 45 ºC; (b) 55 ºC; (c) 65 ºC; (d) 75 ºC.................................................................................138 Figura 6.3. Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado empregando o extrato enzimático produzido pelo fungo Trichoderma reesei (7,2 FPA/g BC), expressa em teores de ART (mg/g BC) e percentual de conversão de celulose em função do tempo de hidrólise (h) ( 45 ºC; 50 ºC; 55 ºC; 60 ºC)............................................................140 Lista de Ilustrações vi Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Figura 6.4. Ajuste do modelo hiperbólico aos dados experimentais dos teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado em função do tempo (h) aplicando- se o extrato enzimático produzido pelo fungo Trichoderma reesei (7,2 FPA/g BC) (a) 45 ºC; (b) 50 ºC; (c) 55 ºC; (d) 60 ºC.................................................................................................141 Figura 6.5. Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado (BNT) e pré-tratado (BHT e BOU) empregando o coquetel enzimático (1:1 v/v) de Thermoascus aurantiacus e Trichoderma reesei (9,9 FPA/g BC) a 55 ºC, expressa em teores de ART (mg/g BC) e percentual de conversão de celulose em função do tempo de hidrólise (h) ( BNT; BHT; BOU)...................................................................................................................143 Figura 6.6. Ajuste do modelo hiperbólico aos dados experimentais dos teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado em função do tempo (h) aplicando- se o coquetel enzimático (1:1 v/v) de Thermoascus aurantiacus e Trichoderma reesei (9,9 FPA/g BC) a 55 ºC (a) BNT; (b) BHT; (c) BOU....................................................................145 Figura 6.7. Evolução temporal da liberação de ART (mg/g BC) na hidrólise enzimática de bagaço de cana não tratado a 55 ºC ( Trichoderma reesei (6,3 FPA/g BC); Thermoascus aurantiacus (12,6 FPA/g BC); coquetel enzimático (1:1 v/v) (9,9 FPA/g BC)).........................................................................................................................................146 Figura 6.8. Teor de açúcar quantificado por HPAEC-PAD nos hidrolisados de bagaço de cana não tratado, por ação das enzimas produzidas por Thermoascus aurantiacus e Trichoderma reesei, isoladamente e combinados (coquetel enzimático 1:1 v/v) a 55 ºC. Para T. aurantiacus, hidrólise com 12,6 FPA/g BC; para T. reesei com 7,2 FPA/g BC; e para coquetel 9,9 FPA/g BC (6,3 FPA/g BC fornecida pelo extrato de T. aurantiacus e 3,6 FPA/g BC pelo extrato de T. reesei) ( ) glicose; ( ) xilose; ( ) celobiose..............................................................148 Figura 6.9. Ajuste do modelo hiperbólico aos dados experimentais dos teores de ART (mg/g BC) liberados na hidrólise de bagaço de cana não tratado em função do tempo (h) (a) Trichoderma reesei (6,3 FPA/g BC); (b) Thermoascus aurantiacus (12,6 FPA/g BC); (c) coquetel enzimático (1:1 v/v) (9,9 FPA/g BC).......................................................................149 Lista de Tabelas vii Priscila Aparecida Casciatori Frassatto LISTA DE TABELAS Tabela 4.1. Planejamento experimental dos ensaios do efeito da umidade e da composição do substrato na produção de enzimas β-glicosidase e FPA para o cultivo sólido dos fungos Thermoascus auratiacus e Trichoderma reesei........................................................................74 Tabela 4.2. Atividades de β-glicosidase dos extratos enzimáticos obtidos por cultivo sólido do fungo termofílico Thermoascus aurantiacus e do fungo mesofílico Trichoderma reesei em três combinações de composição do substrato e teor de umidade (*) ........................................80 Tabela 4.3. Atividades sobre papel de filtro (FPA) dos extratos enzimáticos obtidos do cultivo sólido do fungo termofílico Thermoascus aurantiacus e do fungo mesofílico Trichoderma reesei em três combinações de composição do substrato e teor de umidade (*) ..82 Tabela 4.4. Atividades enzimáticas (U/gss) dos extratos obtidos por cultivo sólido dos fungos Myceliophthora thermophila (BC:FT 7:3 (m/m) e 75 % (b.u) por 96 horas a 45 ºC), Thermoascus aurantiacus (BC:FT 9:1 (m/m) e 70 % (b.u) por 120 horas a 50 ºC) e Trichoderma reesei (BC:FT 9:1 (m/m) e 70 % (b.u) por 168 horas a 28 ºC)...........................87 Tabela 5.1. Planejamento experimental central composto dos ensaios de hidrólise enzimática de bagaço de cana não tratado e pré-tratado empregando-se os extratos produzidos pelos fungos Myceliophthora thermophila e Trichoderma reesei...................................................110 Tabela 5.2. Planejamento experimental Box-Behnken dos ensaios de hidrólise enzimática de bagaço de cana não tratado e pré-tratado empregando-se os extratos produzidos pelos fungos Thermoascus aurantiacus (TA) e Trichoderma reesei (TR)..................................................111 Tabela 5.3. Hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado a 65 ºC por ação das enzimas produzidas por cultivo sólido do fungo Myceliophthora thermophila de acordo com o delineamento experimental central composto rotacional........................................................118 Lista de Ilustrações viii Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Tabela 5.4. Hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado a 45 ºC por ação das enzimas produzidas por cultivo sólido do fungo Trichoderma reesei de acordo com o delineamento experimental central composto rotacional........................................................123 Tabela 5.5. Açúcares redutores totais liberados e percentual de conversão de celulose da hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado por ação das enzimas produzidas por cultivo sólido dos fungos Thermoascus aurantiacus (TA) e Trichoderma reesei (TR) de acordo com o delineamento experimental Box-Behnken.......................................................127 Tabela 6.1. Teores de ART (mg/g BC) e percentual de conversão de celulose da cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado (BNT) e pré-tratado (BHT e BOU) empregando o coquetel enzimático (1:1 v/v) de Thermoascus aurantiacus e Trichoderma reesei (9,9 FPA/g BC) a 55 ºC.............................................................................................................................142 Lista de Abreviaturas ix Priscila Aparecida Casciatori Frassatto LISTA DE ABREVIATURAS a Coeficiente linear da curva padrão na Equação (4.4) Abs Absorbância na Equação (4.4) ANOVA Análise de variância AR Açúcares redutores ART Açúcares redutores totais ASD Agar Sabouraud Dextrose aw Atividade de água b Coeficiente de extinção em µmol/mL na Equação (4.4) BC Bagaço de cana-de-açúcar BDA Agar Batata Dextrose BGL β-glicosidases BHT Bagaço de cana com pré-tratamento hidrotérmico BNT Bagaço de cana não tratado BOU Bagaço de cana pré-tratado com ozônio, álcali e ultrassom b.u Base úmida (%) C1 Componente responsável pelo inchaço e ruptura da celulose C5 Carboidratos de cinco carbonos C6 Carboidratos de seis carbonos Cglicose Concentração de ART expressa em glicose (g/L) nas Equações (5.1) e (6.1) CBH Celobiohidrolase CBM33 Enzimas da família de enzimas com módulos de ligação ao carboidrato 33 CDH Celobiose desidrogenase CMC Carboximetilcelulose CMCase Carboximetilcelulase CS Cultivo sólido CSm Cultivo submerso CTBE Laboratório Nacional de Ciências e Tecnologia do Bioetanol Cx Componente que representa atividade endoglucanase D Diluição do extrato enzimático na Equação (4.4) Lista de Abreviaturas x Priscila Aparecida Casciatori Frassatto DNS Ácido 3,5-dinitrosalicílico EG Endoglucanases E1G Etanol de primeira geração E2G Etanol de segunda geração F Razão entre o volume de extração e a massa de substrato sólido na Equação (4.4) f Fração mássica de celulose (g) no material hidrolisado nas Equações (5.1) e (6.1) FE Fator estequiométrico da razão entre os pesos moleculares (g/mol) do anidro glucano e da glicose nas Equações (5.1) e (6.1) FPA Atividade sobre papel de filtro FT Farelo de Trigo G Porcentagem de celulose convertida nas Equações (5.1) e (6.1) GH Glicosil hidrolase GH61 Monoxigenase polimérica da família 61 das glicosil hidrolases gss Grama de substrato sólido seco HMF Hidroximetilfurfural HPAEC-PAD High performance anionic exchange chromatography – Pulsed amperometric detection IUBMB International Union of Biochemistry and Molecular Biology IUPAC União Internacional de Química Pura e Aplicada k Constante cinética específica da produção de β-glicosidase máxima (h -1 ) na Equação (4.5) mhidrolisável Massa seca de material (g) utilizado na hidrólise nas Equações (5.1) e (6.1) mH2O Massa de água (g) na Equação (4.1) ML Lamela média m/m massa por massa mss Massa de sólido seco (g) na Equação (4.1) M. thermophila Myceliophthora thermophila m/v massa por volume NREL National Renewable Energy Laboratory P Produção de β-glicosidase (U/gss) na Equação (4.5) P1 Concentração máxima de ART (mg/g BC) na Equação (6.2) P2 Tempo no qual a concentração de ART é metade da máxima na Equação (6.2) P0 Produção inicial de β-glicosidase (U/gss) na Equação (4.5) Pmáx Máxima produção de β-glicosidase (U/gss) na Equação (4.5) Lista de Abreviaturas xi Priscila Aparecida Casciatori Frassatto pH Potencial hidrogeniônico pKa Constante de acidez POA Processo oxidativo avançado PMOs Polissacarídeos mono-oxigenases PNPG 4-nitrofenol-β-D-glicopiranosídeo PVC Policlorato de vinila S1 Camada da parede secundária da parede celular vegetal S2 Camada dominante da parede secundária da parede celular vegetal S3 Camada da parede secundária da parede celular vegetal t Tempo t/ha Toneladas por hectare TA Thermoascus aurantiacus T. aurantiacus Thermoascus aurantiacus TR Trichoderma reesei T. reesei Trichoderma reesei TU Teor de umidade (%) μ Constante da taxa de crescimento específico máxima (h -1 ) na Equação (4.2) U Unidade internacional para atividade enzimática UV Irradiação ultravioleta UNICA União da Indústria de cana-de-açúcar V Volume da alíquota de enzima (mL) na Equação (4.4) v Volume total (L) da solução adicionada na hidrólise nas Equações (5.1) e (6.1) v/v Volume por volume X Concentração de biomassa (mg/gss) na Equação (4.2) Xm Máxima concentração de biomassa (mg/gss) possível na Equação (4.2) X0 Concentração inicial de biomassa (mg/gss) no sistema na Equação (4.3) Sumário Priscila Aparecida Casciatori Frassatto SUMÁRIO ORGANIZAÇÃO DA TESE CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ........................................................... 26 CAPÍTULO 2. OBJETIVOS ................................................................................................ 29 CAPÍTULO 3. REVISÃO DA LITERATURA .................................................................... 30 3.1 Etanol celulósico ................................................................................................ 30 3.2 Biomassa como fonte de energia......................................................................... 31 3.3 Biomassa e parede celular vegetal ...................................................................... 33 3.4 Bagaço de cana-de-açúcar .................................................................................. 35 3.4.1 Celulose .......................................................................................................... 36 3.4.2 Hemicelulose .................................................................................................. 37 3.4.3 Lignina ........................................................................................................... 38 3.5 Pré-tratamento do material lignocelulósico ......................................................... 40 3.5.1 Processos oxidativos avançados ...................................................................... 41 3.5.1.1 Ozonólise associada à irradiação de ultrassom em meio alcalino .................... 42 3.5.2 Pré-tratamento hidrotérmico ........................................................................... 45 3.6 Enzimas ............................................................................................................. 47 3.6.1 Atividade enzimática ...................................................................................... 49 3.6.1.1 Fatores que afetam a atividade enzimática ...................................................... 50 3.7 Enzimas lignocelulolíticas .................................................................................. 52 3.7.1 Enzimas hidrolíticas na degradação da celulose .............................................. 53 3.7.1.1 Celulases ....................................................................................................... 54 3.7.1.1.1 Endoglucanases ....................................................................................... 55 3.7.1.1.2 Exoglucanases ......................................................................................... 55 3.7.1.1.3 β-glicosidases .......................................................................................... 56 3.7.1.2 Hemicelulases ................................................................................................ 56 3.7.2 Enzimas oxidativas na degradação da celulose ................................................ 57 3.8 Sinergismo e coquetéis enzimáticos .................................................................... 59 3.9 Produção de enzimas fúngicas por cultivo sólido ................................................ 61 3.10 Hidrólise enzimática ........................................................................................... 64 Sumário Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 3.10.1 Fatores que afetam a hidrólise enzimática ....................................................... 65 CAPÍTULO 4. PRODUÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE ENZIMAS CELULOLÍTICAS..69 RESUMO....................................... ....................................................................................... 69 4.1 INTRODUÇÃO................... ......................................................................................... 70 4.2 MATERIAIS E MÉTODOS ......................................................................................... 72 4.2.1 Microrganismos e substratos .............................................................................. 72 4.2.2 Cultivo sólido em embalagens de polipropileno .................................................. 73 4.2.3 Efeito do teor de umidade e da composição do substrato na produção de enzimas por cultivo sólido dos fungos T. aurantiacus e T. reesei ................................................... 74 4.2.4 Produção de β-glicosidase associada ao crescimento fúngico de T. aurantiacus e T. reesei............... ................................................................................................................. 75 4.2.5 Produção das enzimas para os ensaios de caracterização ..................................... 76 4.2.6 Extração das enzimas ......................................................................................... 76 4.2.7 Determinação das atividades enzimáticas ........................................................... 76 4.2.7.1 Endoglucanase ............................................................................................... 77 4.2.7.2 Atividade sobre papel de filtro ....................................................................... 77 4.2.7.3 β-glicosidase .................................................................................................. 77 4.2.8 Caracterização das enzimas ................................................................................ 78 4.2.8.1 Efeito do pH e da temperatura sobre a atividade das enzimas ......................... 78 4.2.8.2 Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas ..................... 78 4.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................................ 79 4.3.1 Efeito do teor de umidade e da composição do substrato sobre a atividade β- glicosidase do extrato produzido por T. aurantiacus e T. reesei ........................................ 79 4.3.2 Efeito do teor de umidade e da composição do substrato sobre FPA do extrato produzido por T. aurantiacus e T. reesei........................................................................... 81 4.3.3 Correlação entre atividade de β-glicosidase e cinética de crescimento fúngico de T. aurantiacus e T. reesei ..................................................................................................... 83 4.3.4 Atividades enzimáticas dos extratos celulolíticos obtidos por cultivo sólido dos fungos M. thermophila, T. aurantiacus e T. reesei ............................................................ 87 Sumário Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 4.3.5 Caracterização das enzimas ................................................................................ 89 4.3.5.1 Efeito do pH e da temperatura sobre a atividade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo M. thermophila ................................................................. 89 4.3.5.2 Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo M. thermophila ................................................................. 92 4.3.5.3 Efeito do pH e da temperatura sobre a atividade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo T. aurantiacus ................................................................... 94 4.3.5.4 Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo T. aurantiacus ................................................................... 96 4.3.5.5 Efeito do pH e da temperatura sobre a atividade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo T. reesei ............................................................................ 98 4.3.5.6 Efeito do pH e da temperatura sobre a estabilidade das enzimas β-glicosidase e FPA produzidas pelo fungo T. reesei .......................................................................... 100 4.4 CONCLUSÃO............. ............................................................................................... 103 CAPÍTULO 5. HIDRÓLISE ENZIMÁTICA DE BAGAÇO DE CANA-DE-AÇÚCAR .... 104 RESUMO............................................................................................................................ 104 5.1 INTRODUÇÃO................. ......................................................................................... 105 5.2 MATERIAIS E MÉTODOS ....................................................................................... 107 5.2.1 Bagaço de cana-de-açúcar ................................................................................ 107 5.2.2 Pré-tratamento do bagaço de cana-de-açúcar .................................................... 107 5.2.3 Ensaios de hidrólise enzimática ........................................................................ 108 5.2.3.1 Efeito da temperatura e da carga enzimática dos extratos produzidos por M. thermophila e T. reesei na hidrólise de bagaço de cana não tratado ............................. 108 5.2.3.2 Planejamento experimental para aplicação das enzimas produzidas por M. thermophila e T. reesei na hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado ........ 109 5.2.3.3 Planejamento experimental para aplicação das enzimas produzidas por T. aurantiacus e T. reesei na hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado ......... 110 5.2.4 Quantificação de açúcares redutores totais liberados na hidrólise ...................... 111 5.2.5 Cálculo de conversão de celulose ..................................................................... 112 Sumário Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 5.2.6 Quantificação, por HPAEC-PAD, do teor de glicose, xilose e celobiose liberados na hidrólise .................................................................................................................... 112 5.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES .............................................................................. 113 5.3.1 Efeito da temperatura e da carga enzimática do extrato produzido por M. thermophila na hidrólise de bagaço de cana não tratado ................................................. 113 5.3.2 Efeito da temperatura e da carga enzimática do extrato produzido por T. reesei na hidrólise de bagaço de cana não tratado .......................................................................... 115 5.3.3 Aplicação das enzimas produzidas por M. thermophila na hidrólise bagaço de cana não tratado e pré-tratado de acordo com o planejamento experimental ............................ 117 5.3.4 Aplicação das enzimas produzidas por T. reesei na hidrólise bagaço de cana não tratado e pré-tratado de acordo com o planejamento experimental .................................. 122 5.3.5 Aplicação das enzimas produzidas por T. aurantiacus e T. reesei na hidrólise bagaço de cana não tratado e pré-tratado ........................................................................ 126 5.4 CONCLUSÃO.................. .......................................................................................... 129 CAPÍTULO 6. CINÉTICA DE HIDRÓLISE DE BAGAÇO DE CANA-DE-AÇÚCAR .... 131 RESUMO.................................... ........................................................................................ 131 6.1 INTRODUÇÃO................. ......................................................................................... 132 6.2 MATERIAIS E MÉTODOS ....................................................................................... 133 6.2.1 Preparo do bagaço de cana para hidrólise ......................................................... 133 6.2.2 Ensaios de cinética de hidrólise de bagaço de cana ........................................... 134 6.2.2.1 Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado empregando os extratos enzimáticos produzidos pelos fungos M. thermophila e T. reesei ................................ 134 6.2.2.2 Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado empregando coquetel enzimático de T. aurantiacus e T. reesei ....................................................... 135 6.2.2.3 Avaliação do sinergismo das enzimas produzidas por T. aurantiacus e T. reesei na cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado ................................................ 135 6.2.3 Ajuste da cinética de hidrólise de bagaço de cana ............................................. 135 6.2.4 Quantificação de açúcares por cromatografia de troca aniônica (HPAEC-PAD) 135 Sumário Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 6.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES .............................................................................. 136 6.3.1 Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado empregando o extrato enzimático produzido pelo fungo M. thermophila ........................................................... 136 6.3.2 Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado empregando o extrato enzimático produzido pelo fungo T. reesei ..................................................................... 139 6.3.3 Cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado empregando coquetel enzimático proveniente da mistura das enzimas de T. aurantiacus e T. reesei ... 142 6.3.4 Avaliação do sinergismo entre as enzimas produzidas por T. aurantiacus e T. reesei na cinética de hidrólise de bagaço de cana não tratado .......................................... 145 6.4 CONCLUSÃO................... ......................................................................................... 150 CAPÍTULO 7. CONCLUSÕES FINAIS ............................................................................ 151 CAPÍTULO 8. SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS ....................................... 153 REFERÊNCIAS........................ ......................................................................................... 154 Organização da Tese Priscila Aparecida Casciatori Frassatto ORGANIZAÇÃO DA TESE Esta tese está organizada em sete capítulos visando uma melhor distribuição e entendimento dos assuntos abordados. O capítulo 1 apresenta a introdução e justificava do trabalho, no qual se descreve o contexto da pesquisa realizada, assim como a sua relevância e importância para a área de conhecimento, com foco na produção de enzimas fúngicas por cultivo sólido, pré-tratamento da biomassa, sacarificação enzimática e formulação de coquetéis enzimáticos. O capítulo 2 é composto pelos objetivos gerais e específicos do presente trabalho. O capítulo 3 refere-se à revisão da literatura, abordando informações a respeito das características dos materiais lignocelulósicos, do uso de resíduos agroindustriais na produção de enzimas por cultivo sólido de fungos filamentosos, dos tipos de pré-tratamento da biomassa, da degradação enzimática da celulose, dos fatores que afetam a hidrólise enzimática dos materiais lignocelulósicos, da formulação de coquetéis enzimáticos e do efeito sinérgico entre as enzimas. O capítulo 4 é dedicado aos dados de produção de enzimas celulolíticas pelos fungos Myceliophthora thermophila I-1D3b, Thermoascus aurantiacus CBMAI756 e Trichoderma reesei QM9414 obtidas por cultivo sólido e caracterização dos extratos obtidos quanto a temperatura e pH ótimos e a estabilidade, bem como avaliação das condições de cultivo e estimativa indireta da cinética de crescimento fúngico associada à produção de β-glicosidase. Este capítulo é composto pela introdução, descrição da metodologia empregada nesta etapa do projeto, além da apresentação e discusão dos resultados obtidos, assim como a conclusão referente a esta parte do trabalho. O capítulo 5 contempla os resultados da aplicação das enzimas produzidas por cultivo sólido na hidrólise de bagaço de cana não tratado, com pré-tratamento hidrotérmico e pré- tratado com ozônio, álcali e ultrassom, bem como das condições da reação de sacarificação enzimática. Para avaliar o efeito da carga enzimática, da composição do coquetel enzimático, da temperatura e do tempo de reação no processo hidrolítico foram adotados planejamentos experimentais do tipo Central Composto Rotacional, com análise por superfície de resposta, e Box-Behnken. O capítulo compreende introdução do tema, metodologia experimental, resultados e discussões e conclusão. O capítulo 6 aborda a cinética de hidrólise de bagaço de cana-de-açúcar não tratado e pré-tratados, os quais são relevantes para o aperfeiçoamento da etapa de sacarificação, bem como a determinação de parâmetros cinéticos úteis para o projeto e aprimoração do processo hidrolítico. Neste capítulo também foi avaliado o sinergismo entre as enzimas secretadas por Organização da Tese Priscila Aparecida Casciatori Frassatto fungos distintos, por meio da formulação de coquetéis enzimáticos. O capítulo é composto pela introdução, descrição da metodologia empregada nos ensaios de cinética, ajuste do modelo hiperbólico, apresentação e discusão dos resultados obtidos e conclusão. Os resultados do capítulo 6, complementados com dados de produção de enzimas, cinética de crescimento fúngico e avalição das condições reacionais do processo de hidrólise enzimática, apresentados nos capítulos 4 e 5, culminaram em um artigo intitulado ―β- glucosidase production by Trichoderma reesei and Thermoascus aurantiacus by solid state cultivation and application of enzymatic cocktail for saccharification of sugarcane bagasse‖ publicado no periódico Biomass Conversion and Biorefinery. O capítulo 7 é composto pelas conclusões finais, no qual são retomados os principais aspectos observados nos capítulos 4, 5 e 6 da presente tese. No capítulo 8 são apresentadas as sugestões para trabalhos futuros. Por fim, são apresentadas as referências bibliográficas utilizadas para a elaboração desta tese. 26 Capítulo 1. Introdução e Justificativa Priscila Aparecida Casciatori Frassatto CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA Diante da iminente escassez das reservas de petróleo, principal fonte energética mundial, em áreas de mais fácil acesso à exploração (que são as reservas de petróleo acima da camada de sal, denominadas pós-sal), as companhias petrolíferas buscam fontes de acesso mais complexas (a camada pré-sal). Tal prática resulta em elevação de custos e possibilidades de desastres ambientais. Além disso, a preocupação mundial com o efeito estufa e com o desenvolvimento sustentável requer redução do consumo de combustíveis fósseis e incentivam os governos a buscarem técnicas para aumentar a produção e o consumo de combustíveis renováveis e fontes alternativas de energia. Neste contexto, pesquisas visando a produção de etanol a partir de materiais lignocelulósicos mostram-se relevantes, pois permitem empregar a biomassa residual da produção agroindustrial, tornando o processo economicamente e ambientalmente amigável. A produção de combustíveis menos poluentes, como o etanol celulósico, também denominado etanol de segunda geração (E2G), em larga escala é atrativa e o mercado é promissor. O desenvolvimento tecnológico de uma matriz energética limpa e renovável é estratégico para o Brasil e os coquetéis enzimáticos chamam atenção da comunidade científica e industrial, tendo em vista sua aplicação na hidrólise de materiais lignocelulósicos, resíduos da agroindústria, na cadeia de produção do etanol celulósico. O processo envolvendo a conversão dos materiais lignocelulósicos a etanol celulósico consiste basicamente em quatro etapas: pré-tratamento, hidrólise, fermentação e destilação do produto. O pré-tratamento é essencial para desestruturar o material lignocelulósico tornando as fibras de celulose e hemicelulose mais acessíveis às enzimas. Por sua vez, as enzimas são responsáveis por hidrolisar as fibras em açúcares fermentescíveis, utilizados pelas leveduras na etapa de fermentação e produção do etanol. Várias tecnologias de pré-tratamento, sozinhas ou combinadas, têm sido propostas na literatura. A ozonólise é um tipo de processo oxidativo avançado (POA), que pode ser empregado no pré-tratamento químico da biomassa lignocelulósica e sua ação se deve à exposição do material a ozônio, um poderoso agente oxidante. O principal efeito deste pré- tratamento é a remoção da lignina e parte das hemiceluloses, favorecendo o aumento da digestibilidade enzimática da celulose presente no material pré-tratado. Devido às diferenças nas cargas eletrônicas entre lignina e carboidratos, o emprego de POAs seletivos, tais como os baseados em ozônio, apresenta grandes possibilidades de sucesso. O tratamento hidrotérmico é um dos métodos mais comuns de pré-tratamento da biomassa, o qual pode ser descrito como 27 Capítulo 1. Introdução e Justificativa Priscila Aparecida Casciatori Frassatto um processo termoquímico. Nesse processo a água, sob temperaturas e pressões elevadas, é usada para fracionar a biomassa vegetal em seus constituintes através da clivagem dos complexos lignina-carboidrato, além de romper as ligações glicosídicas dos polissacarídeos. A etapa seguinte ao pré-tratamento, de despolimerização dos carboidratos a açúcares fermentescíveis, pode ocorrer por duas vias, enzimática ou química. A via química, embora eficiente e rápida, gera resíduos tóxicos que devem ser tratados, aumentando o número de operações, consumindo energia e tornando o processo pouco competitivo. A hidrólise enzimática apresenta diversas vantagens sobre a química, dentre as quais se destacam menor gasto energético e alta especificidade pelo substrato, evitando a produção de compostos indesejáveis. No entanto, a via enzimática é mais lenta e tem como uma das principais barreiras processos eficientes e viáveis de produção de enzimas a custo que não inviabilize seu uso. Uma alternativa que vem sendo estudada para a produção dessas enzimas é o cultivo sólido, uma vez que este processo permite obter tais enzimas a partir de rejeitos agroindustriais, o que pode ser tanto econômica quanto ambientalmente interessante. Os fatores que afetam a hidrólise enzimática incluem o tipo de substrato, a atividade celulolítica e as condições de reação (temperatura, pH, tempo, entre outros parâmetros). Para melhorar o rendimento e a taxa de hidrólise, as pesquisas focam na otimização do processo hidrolítico e no aumento da atividade celulolítica, bem como na formulação de coquetéis enzimáticos. A degradação enzimática completa de moléculas complexas como hemiceluloses e celuloses, além de pectinas e proteínas presentes na biomassa nativa, como é o caso do bagaço de cana-de-açúcar (BC), requer a ação de várias enzimas atuando conjuntamente. Além das enzimas hidrolíticas que atuam diretamente sobre os polissacarídeos da parede celular de plantas, enzimas que atuam indiretamente, chamadas de enzimas auxiliares, podem também ser importantes na degradação da celulose. Coquetéis enzimáticos obtidos a partir da mistura de extratos produzidos por diferentes métodos e microrganismos são alternativas para elevar a eficiência do processo de hidrólise enzimática, uma vez que as diferentes enzimas poderiam trabalhar em consorciação, atuando de forma sinergística sobre a biomassa. Neste sistema, dificuldades e barreiras que uma enzima não vencesse seriam contornadas ou complementadas pela ação de outra enzima não sujeita às mesmas restrições, o que pode vir a aumentar a eficiência global do processo de hidrólise. Desta forma, a formulação de coquetéis balanceados constituídos por enzimas hidrolíticas e auxiliares produzidas por fungos em cultivo sólido e a determinação das condições operacionais do processo de hidrólise enzimática, avaliando-se o efeito da temperatura, da carga enzimática e do tempo na eficiência de sacarificação, bem como o 28 Capítulo 1. Introdução e Justificativa Priscila Aparecida Casciatori Frassatto estudo cinético da hidrólise de bagaço de cana, são alternativas promissoras para reduzir os custos e aumentar a eficiência de conversão de celulose, viabilizando a produção de etanol celulósico comercialmente competitivo, um objetivo almejado da indústria de biocombustíveis. Dado os resultados promissores com as cepas de Myceliophthora thermophila I-1D3b, Thermoascus aurantiacus CBMAI756 e Trichoderma reesei QM9414 obtidos pelo grupo de pesquisa de Bioenergia do IBILCE/UNESP, integrante do Centro Paulista de Pesquisa em Bioenergia, justifica-se a pesquisa para formulação de coquetéis enzimáticos, bem como a aplicação na hidrólise de bagaço de cana-de-açúcar não tratado e pré-tratado, avaliando-se as condições reacionais do processo de hidrólise enzimática e o efeito sinérgico das enzimas na degradação do material lignocelulósico, visando o aumento da eficiência de sacarificação. Capítulo 2. Objetivos 29 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto CAPÍTULO 2. OBJETIVOS O objetivo geral desta pesquisa de doutorado foi produzir celulases pelos fungos Myceliophthora thermophila I-1D3b, Thermoascus auranticaus CBMAI756 e Trichoderma reesei QM9414 por cultivo sólido para formular coquetéis enzimáticos para aplicação na hidrólise de bagaço de cana-de-açúcar submetidos ou não aos pré-tratamentos com ozônio, hidrotérmico, alcalino e com ultrassom. Para alcançar os objetivos gerais os seguintes objetivos específicos foram desenvolvidos:  Avaliar as condições de cultivo, produzir e caracterizar as enzimas secretadas por fungos filamentosos em cultivo sólido;  Aplicar e avaliar a eficiência das enzimas na hidrólise de bagaço de cana-de-açúcar não tratado e pré-tratado e estudar as condições reacionais do processo;  Avaliar os parâmetros do modelo cinético da hidrólise enzimática de bagaço de cana não tratado e pré-tratado;  Formular coquetéis e avaliar o sinergismo das enzimas na hidrólise de bagaço de cana não tratado e pré-tratado. Capítulo 3. Revisão da Literatura 30 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto CAPÍTULO 3. REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Etanol celulósico A busca por energia renovável tem crescido nas últimas décadas, como estratégia de substituição dos combustíveis fósseis e políticas de energia verde. O etanol celulósico, ou de segunda geração, tem como matéria-prima açúcares provenientes da quebra das cadeias de celulose e hemicelulose, utilizando biomassa residual, não alimentar, como caules, bagaços, folhas e cascas. Diante disso, a biomassa lignocelulósica tem grande potencial para produção de energia, pois tem baixo custo, é renovável, está prontamente disponível e possui alto teor de açúcares fermentáveis para produção de E2G (TRAVAINI; BARRADO; BOLADO- RODRÍGUEZ, 2016). No Brasil, uma matéria-prima abundante para conversão a etanol celulósico é o bagaço da cana-de-açúcar, resíduo da produção do etanol de primeira geração (E1G). O bagaço de cana é predominantemente constituído por celulose, hemicelulose e lignina, sendo assim uma potencial fonte de açúcares fermentescíveis (PANDEY et al., 2000). A produção brasileira de cana-de-açúcar foi de aproximadamente 620 milhões de toneladas na safra 2018/2019 (UNICA, 2020), o que gerou cerca de 155 milhões de toneladas de bagaço, denotando o potencial de biomassa conversível a etanol no país. De acordo com Moretti e colaboradores (2014) uma parte deste material é queimada para geração de eletricidade, porém uma parte considerável ainda permanece na planta de produção de etanol. Perrone et al. (2017) também relata que a biomassa da cana-de-açúcar tem uma vantagem sobre outros materiais lignocelulósicos, já que não compete diretamente com as culturas alimentares e nem requer mais espaço para cultivo no campo, pois mesmo após o uso do bagaço de cana-de-açúcar como fonte de energia na cogeração de eletricidade, há um considerável excesso de biomassa residual nas usinas, bem como uma abundância de palha depositada nos campos. Devido ao seu alto teor de carboidratos, esse excedente de biomassa lignocelulósica pode ser usado para a produção de etanol celulósico, com uma projeção de produzir até 3 bilhões de litros de etanol celulósico por ano pelo processo de hidrólise e subsequente fermentação alcoólica dos açúcares polimerizados (MORETTI et al., 2014). A produção do etanol celulósico envolve o pré-tratamento do bagaço de cana-de- açúcar, em que ocorre a desestruturação do material lignocelulósico; hidrólise dos carboidratos de cadeia longa, em que ocorre a liberação dos açúcares fermentescíveis; Capítulo 3. Revisão da Literatura 31 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto fermentação dos açúcares por leveduras até o etanol; e finalmente a destilação, em que o etanol é separado do caldo fermentado. Na hidrólise, as estruturas moleculares da celulose e da hemicelulose são quebradas, liberando carboidratos de cinco (xilose e arabinose, por exemplo) ou seis (glicose, manose e galactose, dentre outros) carbonos. A hidrólise dos materiais lignocelulolíticos pode ocorrer por via química, principalmente a ácida, que além de agressiva, pode gerar subprodutos inibidores de fermentação, ou por via enzimática, utilizando enzimas em condições mais amenas e livres de resíduos indesejáveis. É conveniente que a hidrólise para produção do E2G seja enzimática, com baixo gasto energético, alta especificidade pelo substrato e não geração de compostos inibidores de fermentação. As principais enzimas envolvidas neste processo são as celulases, bioproduto de interesse deste trabalho. Todavia, a hidrólise enzimática é lenta e tem como uma das principais barreiras processos eficientes e viáveis de produção de enzimas a custo que não inviabilize seu uso (MISHIMA et al., 2006; MENDES; ATALA; THOMÉO, 2017). Muitas unidades pilotos e algumas unidades industriais para produzir E2G foram construídas, porém tem encontrado dificuldades de operação na fase de pré-tratamento e alimentação da matéria-prima nos tanques onde ocorre o tratamento enzimático (ou através de ácidos), que quebram as cadeias celulósicas em açúcares fermentáveis (GOLDEMBERG, 2016). Neste contexto, mostram-se relevantes as pesquisas por diferentes tipos de pré- tratamentos da biomassa lignocelulósica, bem como técnicas de obtenção das enzimas utilizadas no processo de produção do E2G. A alternativa estudada no presente trabalho para a produção das enzimas, as quais podem ser aplicadas na hidrólise do material lignocelulósico, é o cultivo sólido, processo que permite obter tais enzimas, com a vantagem de que fungos filamentosos se adaptam muito bem a esse sistema e rejeitos sólidos agroindustriais são empregados como substratos economicamente viáveis e ambientalmente amigáveis. 3.2 Biomassa como fonte de energia Diante do cenário ambiental e energético mundial, a biomassa surge como uma fonte de energia promissora pela sua disponibilidade, baixas emissões de gases do efeito estufa e por ser uma fonte renovável (NAKASHIMA et al., 2017). Para satisfazer diferentes necessidades energéticas, a biomassa é utilizada para geração de eletricidade, combustíveis para veículos e fornecimento de calor para processos industriais (BRIDGEWATER, 1999). A biomassa é a única fonte de carbono, dentre as fontes de energia renováveis, eficiente no Capítulo 3. Revisão da Literatura 32 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto armazenamento da energia solar e capaz de ser convertida em combustíveis sólidos, líquidos e gasosos através de diferentes processos (OZBAY el al., 2001). Uma grande variedade de recursos de biomassa encontra-se disponível na Terra para a conversão em bioprodutos. Dentre esses recursos pode-se incluir a madeira e seus resíduos, as safras agrícolas e seus subprodutos e resíduos, rejeitos do processamento de alimentos, materiais de origem marinha (plantas aquáticas e algas) e os dejetos municipais e industriais (BALAT et al., 2009). A biomassa vegetal é geralmente composta por celulose, hemicelulose, lignina, lipídeos, proteínas, extrativos, açúcares simples, amido, água e cinzas. Os principais constituintes da biomassa são a celulose, hemicelulose e a lignina, os quais podem ser considerados como a massa orgânica predominante em qualquer material biológico (MOHAN; PITTMAN; STEELE, 2006). A maior parte da energia produzida a partir de biomassa utiliza a madeira e seus resíduos (64 %), seguida dos rejeitos sólidos municipais (24 %), agrícolas (5 %) e gases de aterros sanitários (5 %) (BALAT, 2008). Entretanto, alguns tipos de biomassa podem ser cultivados com o propósito específico de produção energética, tais como a cana de açúcar, milho, beterraba, grãos, algas marinhas, entre outros (DEMIRBAS, 2005a). Neste caso, é de suma importância que a colheita tenha um alto rendimento de material seco por unidade de área plantada (toneladas/hectares), resultando em uma diminuição das áreas necessárias ao plantio, bem como no custo de produção da energia a partir desta biomassa (DEMIRBAS, 2005b). A biomassa fornece aproximadamente 14 % do consumo global de energia sendo, portanto, a quarta maior fonte de energia do mundo, logo após do carvão, petróleo e gás natural (SAXENA; ADHIKARI; GOYAL, 2009). Na matriz energética brasileira, a biomassa tem uma participação importante devido ao uso de cana-de-açúcar para a produção de etanol e eletricidade (17,5 %) e o uso de lenha e carvão vegetal (10,1 %) para a produção de eletricidade e na siderurgia. Na distribuição da oferta de energia elétrica no Brasil, a contribuição da biomassa é de 7 % (GOLDEMBERG, 2016). Para a criação de novos biomateriais todos os recursos podem ser utilizados e, para isso, é necessário um entendimento completo da composição da matéria-prima, seja ela a planta inteira ou algum de seus constituintes, de modo que os elementos funcionais desejados possam ser obtidos e utilizados na produção de bioprodutos (HOWARD et al., 2003). Capítulo 3. Revisão da Literatura 33 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 3.3 Biomassa e parede celular vegetal A biomassa lignocelulósica das culturas, cujos principais componentes são polissacarídeos poliméricos como celulose e hemicelulose (75-80 %), é uma importante fonte de energia renovável (MORETTI et al., 2012). Apesar da parede celular das plantas ser a fonte mais abundante de carbono orgânico do planeta, a elevada recalcitrância dessa biomassa vegetal dificulta a viabilização do seu uso como fonte de energia renovável (FARINAS, 2011). Uma das características principais da célula vegetal é a presença de uma fina, porém muito resistente camada, denominada parede celular. A parede celular vegetal é uma estrutura biológica complexa formada por uma mistura de polissacarídeos e outros compostos secretados pela célula, cujas proporções e arranjo estrutural variam de acordo com o tipo e idade da planta, os quais são dispostos e conectados de uma forma muito bem organizada através de ligações covalentes e não-covalentes (FARINAS, 2011). A parede celular vegetal encontra-se dividida em lamela média (ML), parede primária (P) e parede secundária, sendo que essa compreende-se em 3 camadas: S1, S2 e S3, como é possível observar na Figura 3.1. Figura 3.1. Estrutura da parede celular vegetal. Fonte: (POSTEK et al., 2011) A lamela média, rica em substâncias pécticas, é o componente presente entre as células, situada entre paredes primárias de células vizinhas, permitindo a união e a comunicação química entre elas (PERRONE, 2015). A parede primária é depositada durante o crescimento celular, e deve ser ao mesmo tempo mecanicamente estável e suficientemente flexível para permitir a expansão das células, evitando sua ruptura. As paredes celulares primárias consistem principalmente de polissacarídeos como celulose, hemicelulose e pectina, que representam 85 % de sua Capítulo 3. Revisão da Literatura 34 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto composição e proteínas estruturais, que correspondem a 10 % (FARINAS, 2011; MCNEIL et al., 1984). As fortes microfibrilas de celulose cristalina encapsulam a célula, em uma estrutura de malha, e a hemicelulose se associa intimamente com as microfibrilas de celulose, fortalecendo a estabilidade (TEERI et al., 2007). As pectinas unem-se por ligações cruzadas covalentes e iônicas para formar redes estruturais independentes, mas com sinergismo com a rede de celulose/hemicelulose (CHANLIAUD et al., 2002). As propriedades físicas da hemicelulose e pectina são largamente determinadas pela natureza e abundância de cadeias laterais, e dependem das concentrações locais de sais ligados ionicamente e covalentemente, como cálcio e boro, e potenciais agentes ligantes, como os ácidos ferúlico e cumárico (GRABBER et al., 2004). Variando as estruturas ou o meio químico desses polímeros, as propriedades mecânicas das paredes celulares podem ser alteradas durante os estágios de desenvolvimento e em diferentes tecidos da planta (BURGERT, 2006). A parede celular secundária é depositada após cessar o crescimento celular e confere estabilidade mecânica à planta. Essa estrutura contêm cadeias poliméricas das paredes primárias, apresentando compostos de celulose e hemicelulose, e que são muitas vezes impregnados de lignina nos estágios posteriores de formação do vegetal (FARINAS, 2011). As microfibrilas de celulose são depositadas nas paredes secundárias por um processo altamente organizado, levando a uma estrutura hierárquica com três camadas (S1, S2 e S3). Na camada dominante, S2, as microfibrilas de celulose são muito alinhadas, contribuindo para a resistência mecânica do vegetal (TEERI et al., 2007). O principal componente não carboidrato presente na biomassa vegetal é a lignina, a qual é depositada na rede de carboidratos da parede celular durante o crescimento da parede secundária. Trata-se de um polímero ramificado complexo, altamente insolúvel, de unidades fenilpropano substituídas, unidas por ligações carbono-carbono e éter, formando uma extensa rede reticulada dentro da célula (ARO; PAKULA; PENTILLA, 2005). Encontra-se covalentemente ligada à hemicelulose, através de ligações éster com a xilana, formando uma complexa matriz que envolve as microfibrilas de celulose. A propriedade física mais importante dessa macromolécula orgânica é a rigidez, que não apenas promove força aos tecidos da planta, mas também previne o colapso dos elementos condutores de água e previne o ataque de microorganismos celulolíticos à parede celular da planta, além de dificultar o acesso das enzimas na etapa de hidrólise (SANDGREN; STAHLBERG; MITCHINSON, 2005; TUOMELA et al., 2000; BARAKAT et al., 2015; MOSIER et al., 2005; ZHANG, 2008). Capítulo 3. Revisão da Literatura 35 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 3.4 Bagaço de cana-de-açúcar O bagaço de cana-de-açúcar é um subproduto fibroso de natureza lignocelulósica proveniente dos processos de extração do suco pela moagem da cana-de-açúcar, rico em sacarose, para produção do etanol de primeira geração. De acordo com Hugot (1977), o bagaço de cana-de-açúcar pode ser definido como ―resíduo da cana moída‖, representando de 24 a 40 % da cana-de-açúcar. Esse material é, sem dúvida, o resíduo agroindustrial obtido em maior quantidade no Brasil, sendo gerado, aproximadamente, 280 Kg de bagaço por tonelada de cana moída (SANTOS et al., 2012). Considerando-se os dados referentes à safra 2018/2019, de moagem de cana-de-açúcar e produção de açúcar e etanol, foram obtidos 250 Kg de bagaço por tonelada de cana moída (UNICA, 2020). Trata-se de um tipo de biomassa vegetal que apresenta grande heterogeneidade morfológica sendo constituída principalmente de fibras (função estrutural), vasos (elementos de condução) e parênquima (função de armazenamento) (SANJUÁN et al., 2001). Esse material lignocelulósico é composto por, aproximadamente, 50 % de celulose, 25 % de hemicelulose e 25 % de lignina. Quimicamente, o bagaço de cana-de-açúcar contém cerca de 50 % de celulose, 30 % de pentosanas e 2,4 % de cinzas (PANDEY et al., 2000). No entanto, a composição química do bagaço varia de acordo com diversos fatores, dentre eles, o tipo de cana, o tipo de solo, as técnicas de colheita e até o manuseio (SANTOS et al., 2012). Devido ao baixo teor de cinzas (2,4 %), o bagaço de cana apresenta uma grande vantagem para o processo de bioconversão por microrganismos quando comparado com outros resíduos, como a palha de arroz e de trigo, que contêm aproximadamente 17,5 e 11 % de cinzas, respectivamente. Além disso, em comparação com outros resíduos agroindustriais, o bagaço pode ser considerado um rico reservatório de energia solar devido ao seu alto rendimento (aproximadamente 80 t/ha, em comparação com 1, 2 e 20 t/ha para trigo, gramíneas e árvores, respectivamente) e capacidade de regeneração anual (PANDEY et al., 2000). No Brasil, o bagaço de cana-de-açúcar tem sido utilizado para produção de energia elétrica (PANDEY et al., 2000) e, mais recentemente, para a produção de etanol celulósico, com a criação de usinas de produção de etanol 2G (MORETTI et al., 2014). No entanto, a produção de etanol a partir do bagaço de cana-de-açúcar requer um processo de produção mais complexo, sendo necessário que ocorra a hidrólise dos polissacarídeos para obtenção dos açúcares passíveis de fermentação. O bagaço de cana-de-açúcar, como todo material lignocelulósico, é altamente recalcitrante devido à presença de lignina, celulose cristalina e ligações cruzadas entre hemicelulose e lignina impedindo o acesso da enzima ao substrato e Capítulo 3. Revisão da Literatura 36 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto reduzindo o rendimento da hidrólise, tornando o processo economicamente inviável (PANDEY et al., 2000). Portanto, para a efetiva utilização deste rejeito agroindustrial na produção de E2G é necessário realizar o pré-tratamento da polpa para alterar a estrutura lignocelulósica presente no bagaço de cana-de-açúcar. 3.4.1 Celulose A celulose é o polímero orgânico mais abundante do planeta, com uma produção anual de mais de 50 bilhões de toneladas, e o principal componente da biomassa vegetal (SILVA et al., 2009). Constitui, aproximadamente, 50 % da biomassa das plantas, representando uma das fontes mais importantes para obtenção de açúcares solúveis. Encontra-se amplamente distribuída na natureza, ocorrendo tanto nas plantas primitivas como nas altamente evoluídas. Quimicamente, é um homopolissacarídeo linear constituído unicamente por moléculas de glicose unidas entre si por ligações glicosídicas do tipo β-(1,4). Duas unidades de glicose adjacentes formam uma ligação glicosídica através da eliminação de uma molécula de água (Figura 3.2). Devido à configuração espacial alternada das ligações glicosídicas, a unidade de repetição da celulose é a celobiose, um dissacarídeo (FARINAS, 2011). Esta unidade repetitiva contém seis grupos hidroxila que estabelecem interações do tipo ligações de hidrogênio intra e intermolecular (SILVA et al., 2009). O final da cadeia de glicose com um carbono anomérico que não está ligado a outro resíduo de glicose é conhecido como extremidade redutora do polímero. A outra extremidade do polímero é conhecida como não redutora (SANDGREN; STAHLBERG; MITCHINSON, 2005). Figura 3.2. União das moléculas de glicose por ligações glicosídicas do tipo β-(1,4). Fonte: (Adaptado de FARINAS, 2011) A estrutura da celulose apresenta regiões muito organizadas, denominadas de cristalinas, e regiões com orientação randomizada, chamadas amorfas. A celulose amorfa é menos regular e, consequentemente, mais solúvel, tornando mais fácil a sua degradação Capítulo 3. Revisão da Literatura 37 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto (ALIYU; HEPHER, 2000; POSTEK et al., 2011; MOON et al., 2011). Por outro lado, as regiões cristalinas são altamente ordenadas e de difícil degradação, as quais são formadas pela configuração paralela das cadeias lineares, o que implica na formação de ligações de hidrogênio intermoleculares, contribuindo para a insolubilidade da celulose e sua baixa reatividade, tornando-a mais resistente à hidrólise ácida e enzimática, dificultando a entrada de água e modificando a elasticidade das fibras (RAMOS, 2003; DA SILVA; GOMES; FRANCO, 1997; BOBBIO; BOBBIO, 2003; NELSON; COX, 2014; FARINAS, 2011). As ligações de hidrogênio intra e intermoleculares formadas entre as longas cadeias de celulose originam as microfibrilas de celulose, que formam um conjunto de agregados insolúveis em água (FENGEL; WEGENER, 1989). Essas microfibrilas podem variar em comprimento, largura e grau de ordenação (FARINAS, 2011). As microfibrilas se unem formando fibrilas e estas constroem as fibras celulósicas. Como consequência dessa estrutura fibrosa a celulose possui alta resistência à tração e é insolúvel na maioria dos solventes orgânicos (SILVA et al., 2009). 3.4.2 Hemicelulose O termo hemicelulose é usado para os polissacarídeos que ocorrem normalmente associados à celulose, em paredes celulares (SILVA et al., 2009). Portanto, estão estruturalmente mais relacionadas com a celulose do que a lignina e são depositadas na parede celular nos primeiros estágios da biossíntese. Elas são derivadas principalmente de cadeias de pentose, e atuam como um material cimentante, mantendo unidas as micelas e fibras de celulose (DEMIRBAS, 2008). As hemiceluloses das plantas são polissacarídeos cuja natureza química varia de tecido para tecido e de espécie para espécie. Consistem em heteropolissacarídeos formados por vários resíduos de carboidratos de cinco carbonos (xilose, ramnose e arabinose), seis carbonos (glicose, manose e galactose), ácidos urônicos (ácido 4-O-metil-glucurônico e ácidos galacturônicos) e grupos acetila (FARINAS, 2011; MARTÍNEZ et al., 2005). Esses carboidratos encontram-se ligados entre si, principalmente, por ligações glicosídicas β-(1,4), formando uma estrutura principal, composta por um tipo específico de resíduo, a partir da qual surgem ramificações laterais de cadeias curtas de outros compostos (Figura 2.3) (FARINAS, 2011). É bastante hidrofílica e contém considerável grau de ramificação entre suas cadeias, com natureza altamente amorfa. Também é definida como a fração da parede celular que pode ser extraída com álcali (MOHR; SCHOPFER, 1995). Capítulo 3. Revisão da Literatura 38 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto As principais hemiceluloses encontradas em plantas são os xiloglucanos, os glucuronoarabinoxilanos e os mananos. Em todos os casos, há uma cadeia principal de monossacarídeos de glicose, xilose e manose, respectivamente, que pode ser ramificada com diferentes monossacarídeos, como mostra a Figura 3.3 (FARINAS, 2011). Figura 3.3. Estrutura característica da hemicelulose mostrando as diferentes ligações e grupos encontrados nas ramificações. Fonte: (Adaptado de DODD; CANN, 2009) Em vegetais lenhosos, a xilana é o polímero mais abundante na hemicelulose, e consiste num polissacarídeo composto de resíduos de xilose unidos por ligações glicosídicas do tipo β-(1,4), contendo ramificações de cinco e seis carbonos. Trata-se do maior polissacarídeo estrutural das células vegetais e o segundo polissacarídeo mais abundante em vegetais. Calcula-se que esteja entre as três primeiras fontes de carbono orgânico renovável (BEG et al., 2001; KATAPODIS; CHRISTAKOPOULOU; CHRISTAKOPOULOU, 2006). Diante disso, a desconstrução da xilana em seus açúcares constituintes, principalmente xilose e arabinose, é fundamental, para se utilizar a biomassa lignocelulósica em processos de bioconversão, seja nos processos para a fermentação alcoólica ou para a indústria de alimentos na produção do adoçante xilitol (DA SILVA, 1992; DODD; CANN, 2009). 3.4.3 Lignina A lignina é um biopolímero encontrado associado à celulose e a hemicelulose na composição de materiais lignocelulósicos, sendo o principal componente não-carboidrato da biomassa vegetal. Possui natureza química bem distinta dos carboidratos, sendo caracterizada por uma estrutura aromática de natureza eminentemente fenólica (FARINAS, 2011). A lignina é constituída por um arranjo irregular de várias unidades de fenilpropano, o qual pode Capítulo 3. Revisão da Literatura 39 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto conter grupos hidroxila e metoxila como substituintes no grupo fenil, podendo ser classificado como polifenol, apresentando estrutura tridimensional, altamente ramificada (SILVA et al., 2009). A concentração de lignina varia entre diferentes espécies de plantas em função da proporção dos álcoois envolvidos na sua formação (BAURHOO; RUIZ-FERIA; ZHAO, 2008). A lignina pode representar até 25 % de toda a biomassa lignocelulósica produzida no planeta e seu teor nos resíduos vegetais pode atingir até 40 % do seu peso seco (FARINAS, 2011). O teor de lignina em base seca, geralmente varia entre 20 e 40 % do peso nas madeiras duras e moles, e de 10 a 40 % para espécies herbáceas, como o bagaço de cana de açúcar, a espiga de milho, casca de amendoim, casca de arroz e a palha (YAMAN, 2004). A lignina encontra-se concentrada em tecidos relacionados com condução de solutos e suporte mecânico e representa um conjunto de polímeros amorfos, de alto peso molecular e muitas ligações cruzadas (FARINAS, 2011). As unidades monoméricas precursoras da lignina são hidroxilas fenólicas dos alcoóis trans-p-cumarílico, trans-coniferílico e álcool trans-sinapílico (FENGEL; WEGENER, 1989; SACON; WEISSHEIMER, 1996), cuja representação química pode ser observada na Figura 3.4. Figura 3.4. Representação esquemática de unidades estruturais precursoras da lignina. Fonte: (Adaptado de FARINAS, 2011) A complexa matriz formada pelas ligações entre esses precursores resulta em uma grande variedade de grupos funcionais, tais como hidroxil, metoxil e carbonil, que concedem uma alta polaridade à macromolécula de lignina (FELDMAN et al., 1991). Devido a essas estruturas complexas, a lignina forma polímeros com regiões amorfas, que atuam como um cimento entre as fibrilas e como um agente enrijecedor no interior das fibras (TSUJINO; Capítulo 3. Revisão da Literatura 40 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto KAWAMOTO; SAKA, 2003; POUTEAU et al., 2003). A força de adesão entre as fibras de celulose e a lignina é ampliada pela existência de ligações covalentes entre as cadeias de lignina e os constituintes da celulose e da hemicelulose. Devido à natureza fenólica da lignina, essa fração não pode ser diretamente convertida em etanol. A lignina dificulta o uso do material lignocelulósico para produzir etanol, pois impede as reações químicas que liberam os açúcares da parede celular para a fermentação. Portanto, quanto menor o teor de lignina, mais fácil de obter etanol. Por outro lado, aumentar o teor de lignina também é interessante para se produzir ―cana-energia‖, que pode ser queimada para geração de energia em usinas termoelétricas. Neste contexto, a lignina tem sido usada para a produção de energia pelo processo de combustão (LARSEN et al., 2008) ou para a conversão em outros bioprodutos de interesse comercial (FARINAS, 2011). 3.5 Pré-tratamento do material lignocelulósico O pré-tratamento é o primeiro estágio necessário na bioconversão dos materiais lignocelulósicos em biocombustíveis. A natureza da matéria presente no bagaço de cana-de- açúcar evidencia a importância da etapa de pré-tratamento do material lignocelulósico, pois os componentes estruturais contidos na parede celular vegetal são fortemente associados, formando um complexo estável e recalcitrante. Diante disso, o pré-tratamento tem como objetivo aumentar o tamanho dos poros e reduzir a cristalinidade da celulose, bem como reduzir a estabilidade das fibras, solubilizando a hemicelulose e/ou a lignina, e tornando o substrato mais acessível às enzimas que convertem os carboidratos em açúcares fermentescíveis (CHANG; NAGWANI; HOLTZAPPLE, 1998; JORGENSEN; KRISTENSEN; FELBY, 2007). De maneira geral, o pré-tratamento deve promover os seguintes requisitos: aumentar a formação de açúcares ou facilitar a subsequente hidrólise enzimática; evitar a degradação ou perda de carboidratos; evitar a formação de subprodutos inibitórios para as etapas de hidrólise e fermentação; ser viável do ponto de vista econômico (SUN; CHENG, 2002; MOSIER et al., 2005; PERRONE et al., 2016). Nesse sentido, diferentes alternativas tecnológicas têm sido empregadas na etapa de pré-tratamento e esses métodos são divididos em quatro categorias básicas: físicos, químicos, físico-químicos e biológicos. Os pré-tratamentos físicos aumentam a área superficial das partículas da biomassa lignocelulósica por redução do tamanho de partícula, como é o caso da moagem. Os pré-tratamentos físico-químicos consistem de reações químicas realizadas a altas temperaturas e pressões, como é o caso da explosão a vapor, já os métodos químicos degradam a hemicelulose ou removem a lignina e então a rede Capítulo 3. Revisão da Literatura 41 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto lignocelulósica é desestruturada, como é o caso do cozimento com ácido ou base forte e dos processos oxidativos avançados. Por fim, os pré-tratamentos biológicos são métodos que empregam enzimas lignolíticas para deslignificação do material, para os quais pode ocorrer perda considerável de carboidratos devido ao longo tempo requerido (CANILHA et al., 2012). A combinação de métodos distintos é comum na conversão dos materiais lignocelulósicos em diferentes produtos (TAHERZADEH; KARIMI, 2008). Vários processos de pré-tratamento, que podem reduzir a cristalinidade da celulose e aumentar a porosidade da biomassa, mostraram-se eficazes no aumento do rendimento da hidrólise enzimática do bagaço de cana-de-açúcar. Esses processos incluem o uso de: moagem mecânica, explosão a vapor, água quente líquida, hidrotérmico, ácido diluído, reagentes alcalinos, peróxido de hidrogênio, solventes orgânicos, irradiação ionizante, irradiação de micro-ondas, ultrassom, líquido iônico, entre outros (PERRONE et al., 2016; MORETTI et al., 2014). No entanto, alguns métodos ainda enfrentam muitos problemas, como: relação custo e benefício; alto uso de energia; formação de inibidores enzimáticos e/ou inibidores de fermentação alcoólica; alto consumo de produtos químicos e geração de resíduos tóxicos (MOSIER et al., 2005; BI et al., 2016). Diante disso, além de desenvolver técnicas de pré- tratamento economicamente viáveis e ambientalmente sustentáveis, a otimização da sacarificação enzimática tem sido uma busca constante no âmbito das pesquisas em etanol celulósico. 3.5.1 Processos oxidativos avançados Os processos oxidativos avançados (POAs) surgiram inicialmente para tratar efluentes ricos em compostos biológicos recalcitrantes, como pesticidas, compostos tóxicos, inibidores microbiológicos e outros, os quais não podiam ser tratados por métodos biológicos convencionais de tratamento. Os POAs são caracterizados pela formação de radicais hidroxila em meio líquido em quantidade suficiente para oxidar compostos orgânicos. São processos simples, os quais podem ser homogêneos ou heterogêneos e que utilizam na maioria dos casos a combinação de reagentes comuns, como: H2O2, TiO2, ZnO, Fe 2+ , Fe 3+ , O3, O2 e em algumas vezes técnicas de ultrassom, feixe de elétrons e irradiação UV (MEDEIROS, 2008). Os POAs apresentam características bastante interessantes como pré-tratamento de biomassa, pois a produção de grandes quantidades de oxidantes fortes, principalmente radicais hidroxila, em conjunto com os oxidantes reagentes do processo permite mineralizar e desestruturar compostos altamente recalcitrantes, como a lignina que faz parte do sistema de proteção mecânica e estrutural da parede celular da biomassa em geral (TRAVAINI, 2011). Capítulo 3. Revisão da Literatura 42 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto 3.5.1.1 Ozonólise associada à irradiação de ultrassom em meio alcalino A ozonólise ou oxidação por ozônio é um tipo de processo oxidativo avançado, que pode ser utilizado no pré-tratamento químico da biomassa lignocelulósica e sua ação se deve à exposição do material ao ozônio, um poderoso agente oxidante. A ozonólise foi estudada décadas atrás como um pré-tratamento oxidativo químico de materiais lignocelulósicos (NEELY, 1984) e foi redescoberta recentemente (GARCÍA-CUBERO et al., 2010, 2012; LI et al., 2015; TRAVAINI et al., 2013; DE CASSIA PEREIRA et al., 2016). A degradação promovida pela utilização do ozônio está principalmente relacionada com a lignina, com ligeiro ataque a hemicelulose, facilitando o acesso das enzimas ao substrato (QUESADA; RUBIO; GOMEZ, 1999; GARCÍA-CUBERO et al., 2009). O ozônio é um poderoso eletrófilo devido a uma deficiência de elétrons em um dos oxigênios terminais durante a ressonância. Assim, a reação do ozônio com o substrato lignocelulósico afeta principalmente compostos com alta densidade eletrônica, como ligações duplas e anéis aromáticos, fazendo com que o ozônio prefira a estrutura da lignina aos carboidratos (TRAVAINI; BARRADO; BOLADO-RODRÍGUEZ, 2016; PERRONE et al., 2017). A degradação da lignina e a conseqüente quebra da estrutura lignocelulósica aumentam a eficiência do procedimento de hidrólise enzimática, possibilitando a produção de etanol celulósico. A lignina é, portanto, o material mais provável de ser oxidado pela ação do ozônio devido principalmente a estrutura aromática dos seus precursores e a grande quantidade de ligações duplas entre carbono, uma vez que o ozônio é altamente reativo com compostos que possuem ligações duplas conjugadas e grupos funcionais com alta densidade de elétrons (GARCÍA-CUBERO et al., 2009). A complexa estrutura da lignina baseia-se em três principais precursores monoméricos: álcool coniferílico, álcool sinapílico e álcool p- coumarilico (AMEN-CHEN; PAKDEL; ROY, 2001). As ligações duplas da lignina podem pertencer tanto ao anel aromático quanto à cadeia alifática da lignina e sua clivagem normalmente gera grupos carboxílicos, quebrando a cadeia polimérica da lignina em fragmentos menores, mais oxigenados e mais solúveis (NASCIMENTO et al., 1998). A reação do ozônio pode acontecer por radicais livres ou por ataque eletrofílico direto, dependendo do pH (GLAZE; KANG; CHAPIN, 1987; TEZCANLI-GÜYER; INCE, 2004). Durante a ressonância da molécula de ozônio, o oxigênio terminal positivo torna-se o sítio eletrofílico da molécula, sendo, por sua vez, mais reativo que o sítio nucleofílico (Figura 3.5). Capítulo 3. Revisão da Literatura 43 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto Figura 3.5. Híbridos de ressonância da molécula de ozônio. Fonte: (PERRONE, 2015) As principais estruturas de ressonância da molécula de ozônio são as duas primeiras apresentadas na Figura 3.5, pois quanto mais estável uma estrutura de ressonância, maior é a contribuição para o híbrido de ressonância. É sabido que quanto mais ligações covalentes uma estrutura tem, maior é a sua estabilidade. Por outro lado, a separação de cargas diminui a estabilidade da estrutura de ressonância (BRUICE, 2006). Assim, o maior número de ligações presentes nas duas primeiras estruturas, bem como a presença da dupla ligação e a menor separação de cargas, faz com que essas sejam as principais estruturas de ressonância do ozônio. Na Figura 3.6 são apresentadas as reações do ozônio com diferentes compostos orgânicos. As reações mostradas nas Figuras 3.6a e 3.6b são as rotas mais importantes de degradação de alcenos e de compostos aromáticos pela ozonólise (GIERER, 1986). Figura 3.6. Exemplos de reações do ozônio com (a) alcenos, (b) alcanos e cadeira lateral do anel aromático e (c) aldeídos. Fonte: (Adaptado de GIERER, 1986) O passo inicial para ozonização é o ataque eletrofílico das posições ativadas pelo oxidante (GIERER, 1986). Após a reação, é consumida uma molécula de água e liberado peróxido de hidrogênio, porém, o mais importante é a abertura do anel aromático provocada pela reação. Em meio alcalino, o ozônio é instável e sua decomposição gera radicais Capítulo 3. Revisão da Literatura 44 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto hidroxilas, que possuem maior potencial de oxidação. Por outro lado, em pH ácido a estabilidade do ozônio é mantida (MASTEN; DAVIS, 1994; NASCIMENTO et al., 1998; GIERER, 1986). Algumas particularidades dos POAs envolvendo ozônio podem ser destacadas como: alta seletividade, fácil geração e baixíssima concentração da formação de compostos tóxicos entre lignina e o oxidante, altos rendimentos de sacarificação; uma única fase sólida é gerada, evitando problemas relacionados à diluição de produtos; o ozônio pode ser gerado in situ e o ozônio residual pode ser facilmente destruído, evitando problemas ambientais (TRAVAINI; BARRADO; BOLADO-RODRÍGUEZ, 2016; DE CASSIA PEREIRA et al., 2016). Além disso, o processo geralmente é conduzido à pressão e temperatura ambiente e não leva à formação de compostos inibidores de fermentação microbiana, como furfural e hidroximetilfurfural (HMF). Entretanto, pelas reações de degradação, o processo de ozonólise pode gerar ácidos orgânicos, como ácido carboxílico e fórmico (VIDAL; MOLINIER, 1988). Com base nas características da ozonólise muitos trabalhos têm sido desenvolvidos e apontam resultados bastante promissores no uso de ozônio na degradação de compostos recalcitrantes, corantes têxteis, compostos altamente tóxicos, no aumento da biodegradabilidade de efluentes industriais e no branqueamento de polpa celulósica, onde o objetivo é muito similar ao dos pré-tratamentos, ou seja, a remoção ou solubilização da lignina (TRAVAINI, 2011). Purí (1983), por meio da ozonólise de diversos materiais lignocelulósicos, entre eles bagaço de cana-de-açúcar e farelo de trigo (FT), obteve aumento na hidrólise enzimática que passaram de 1 a 30 % para 80 a 90 %. García-Cubero e colaboradores (2009) obtiveram aumentos de 29 % e 16 % para 88,6 % e 57 % na hidrólise enzimática pós ozonólise, para farelo de trigo e centeio, respectivamente. Outros estudos utilizando o ozônio como pré- tratamento de biomassa obtiveram 80 % (LI et al., 2015) e 84 % (TRAVAINI et al., 2016) de conversão da celulose em glicose após a hidrólise enzimática do material pré-tratado. O tratamento alcalino do material lignocelulósico tem sido relatado como eficaz na remoção de fragmentos de hemicelulose e lignina (CHAUDHARY; SINGH; GHOSH, 2012), enquanto o tratamento com ultrassom em meio aquoso produz um fenômeno conhecido como cavitação acústica que pode perturbar as paredes celulares e facilitar a penetração de solventes nos materiais celulósicos, aumentando a transferência de massa e melhorando o efeito alcalino no tratamento (LIU et al., 2007; VELMURUGAN; MUTHUKUMAR, 2012). A técnica empregando ultrassom é baseada na formação de bolhas de cavitação dentro do meio líquido pelas ondas de ultrassom. Essas bolhas geradas podem implodir gerando condições extremas Capítulo 3. Revisão da Literatura 45 Priscila Aparecida Casciatori Frassatto de temperatura e pressão (500 K e 50 MPa) e cavitação, o que ocasiona uma degradação da estrutura do material lignocelulósico e produção de radicais livres, causando a oxidação química. Na literatura tem sido reportado que ultrassom com frequências de 23 kHz a 45 kHz incrementa a porosidade das fibras da celulose, rompe ligações α-O-4 ou β-O-4 da lignina e diminui a cristalinidade do material lignocelulósico (LIU et al., 2007; SUN et al., 2004). Perrone e colaboradores (2016) também relataram excelentes resultados empregando-se a combinação de ozonólise, lavagem com NaOH e irradiação de ultrassom no pré-tratamento do bagaço de cana-de-açúcar, apresentando rendimentos de conversão da celulose em glicose de 94 %. Sendo assim, a aplicação de ozônio no tratamento da biomassa tem sido amplamente relatada na literatura e o uso deste oxidante tem produzido bons resultados, devido à baixa formação de compostos inibidores, bem como aos altos rendimentos de glicose obtidos na etapa de hidrólise enzimática. Portanto, a quebra da lignina causada pela ozonólise, associada aos efeitos da lavagem alcalina assistida por ultrassom, resulta em um tratam