UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS JOYCE MARIANO SANTOS REQUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR PARA REINGRESSO AO MERCADO DE TRABALHO E A EXCLUSÃO POR IDADE NA CONTRATAÇÃO DO EMPREGADO Franca 2022 Joyce Mariano Santos REQUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR PARA REINGRESSO AO MERCADO DE TRABALHO E A EXCLUSÃO POR IDADE NA CONTRATAÇÃO DO EMPREGADO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel, junto ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Franca. Orientadora: Prof. Dra. Eliana dos Santos Alves Nogueira Franca 2022 FOLHA DE APROVAÇÃO REQUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR PARA REINGRESSO AO MERCADO DE TRABALHO E A EXCLUSÃO POR IDADE NA CONTRATAÇÃO DO EMPREGADO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel, junto ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Franca. Banca Examinadora Orientadora: ___________________________________ Dr. (a) Eliana dos Santos Alves Nogueira, UNESP Franca 1º Examinador: _________________________________ Dr. (a) Prof. Ms. Eduarda Camargo Sansão, UNESP Franca 2º Examinador: _______________________________ Dr. (a) Prof. Ms. Luiza Macedo Pedroso, UNESP Franca Franca, 05 de agosto de 2022 Envelhecer é o único meio de viver muito tempo. A idade madura é aquela na qual ainda se é jovem, porém com muito mais esforço. O que mais me atormenta em relação às tolices de minha juventude não é havê-las cometido... e sim não poder voltar a cometê-las. Envelhecer é passar da paixão para a compaixão. Muitas pessoas não chegam aos oitenta porque perdem muito tempo tentando ficar nos quarenta. Aos vinte anos reina o desejo, aos trinta reina a razão, aos quarenta o juízo. O que não é belo aos vinte, forte aos trinta, rico aos quarenta, nem sábio aos cinquenta, nunca será nem belo, nem forte, nem rico, nem sábio... Quando se passa dos sessenta, são poucas as coisas que nos parecem absurdas. Os jovens pensam que os velhos são bobos; os velhos sabem que os jovens o são. A maturidade do homem é voltar a encontrar a serenidade como aquela que se usufruía quando se era menino. Nada passa mais depressa que os anos. Quando era jovem dizia: “Verás quando tiver cinquenta anos”. Tenho cinquenta anos e não estou vendo nada. Nos olhos dos jovens arde a chama, nos olhos dos velhos brilha a luz. A iniciativa da juventude vale tanto a experiência dos velhos. Sempre há um menino em todos os homens. A cada idade lhe cai bem uma conduta diferente. Os jovens andam em grupo, os adultos em pares e os velhos andam sós. Feliz é quem foi jovem em sua juventude e feliz é quem foi sábio em sua velhice. Todos desejamos chegar à velhice e todos negamos que tenhamos chegado. Não entendo isso dos anos: que, todavia, é bom vivê-los, mas não tê-los. Albert Camus https://www.pensador.com/autor/albert_camus/ AGRADECIMENTOS Agradeço à Deus primeiramente, pelo dom da vida, por me proporcionar a oportunidade de cursar o ensino superior e me ajudar em todos os momentos ao longo da trajetória acadêmica. Minha fé mostrou que Deus tem o poder de todas as coisas, inclusive realizar sonhos inconcebíveis do meu coração. Toda honra e glória ao meu Deus! À minha família, pelo amor e apoio incondicional, também ao esforço que tiveram nesses anos, seja na ajuda financeira e emocional que me proporcionaram. Hoje, como a primeira filha formada da família, me sinto grata por todos os momentos que precisei me afastar e dedicar aos estudos, abrir mão de pequenos momentos familiares me fizeram perceber o quanto a família é um laço de amor e solidariedade, então agradeço as pessoas mais importantes da minha vida: Silvana, Jairo, Jéssica, Geovana e a Dudinha, minha irmã caçula. Ao meu esposo, amor da minha vida, que suportou muitas lágrimas, noites sem dormir, reclamações, ansiedades de uma jovem estudante, e ao apoio enorme e paciência que demostrou nesse caminho, você é meu alicerce, meu companheiro, a quem quero dedicar esse trabalho, com todo meu amor, amo você João Paulo. Aos amigos que construí na faculdade, os dias se tornaram mais doces, os desafios se tornaram suportáveis, vencemos, sou orgulhosa de todo caminho que percorremos juntos. Agradeço também à minha orientadora Eliana dos Santos Alves Nogueira, uma mulher que é símbolo de força e dedicação. Me apaixonei quando essa professora entrou em sala de aula e ministrou com autoridade e conhecimento o direito processual do trabalho, sua inteligência e o dom de ensinar me mostraram que as atitudes e escolhas corretas podem tornar o operador do direito como instrumento de justiça na terra. À UNESP de Franca/SP que me acolheu, me ensinou, me tirou da zona de conforto, me confrontou, mudou minha visão de mundo, mudou a realidade da cidadezinha pequena que cresci, aos bons e maus momentos, ao conhecimento adquirido, aos professores exemplares, a boa qualidade de disciplina que me forneceram. Santos, Joyce Mariano. Requalificação profissional do trabalhador para reingresso no mercado de trabalho e a exclusão por idade na contratação do empregado 2022. 76 f. Trabalho de Conclusão de Curso- Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Franca/SP, 2022. RESUMO A partir da perspectiva do quadro demográfico de envelhecimento populacional segundo as projeções do IBGE, futuramente a força do mercado de trabalho será integrada principalmente de pessoas com idade madura, neste contexto, os trabalhadores mais velhos têm enfrentado dificuldades no ambiente de trabalho e sido vítimas de discriminação. Pesquisa-se sobre a dificuldade de reinserção e requalificação na atividade laboral deste grupo. Para tanto, é necessário verificar o conceito de desemprego, e suas consequências para os trabalhadores maduros, indicando sua relevância para o mercado de trabalho a partir das experiências profissionais adquiridas ao longo de sua trajetória profissional, e ainda, explora-se a mesma problemática em países estrangeiros onde é possível apontar semelhanças no contexto brasileiro. Realiza-se, então, uma pesquisa pautada na metodologia bibliográfica compreendida entre leitura, estudo e compreensão de artigos da Constituição Federal, artigos de lei, resoluções, livros doutrinários de Direito do Trabalho, e artigos científicos relacionados ao tema. Diante do problema demográfico o qual aponta que os trabalhadores brasileiros estão envelhecendo, é necessário neste contexto que as políticas públicas e as empresas prestem o devido auxílio e apontem mudanças no cenário do trabalho para esta classe. Palavras-chave: envelhecimento; mercado de trabalho; trabalhadores maduros; requalificação; ABSTRACT From the perspective of the ageing population frame according by the IBGE projections, here fter the labour market will be integrated by older people in mostly. Howver, these older workes have been faced so much hardship on working evironment and become victims of discrimination. There’s such a great difficulty of upgrading and returning to the labour of them. For this purpose, it’s necessary to check the un employment concept and its consequences to the oldes workens, signalling how nuice they are important to the environmet labour to their qualifications and life long leaning for their work áreas. This study also bung the same perspective from foreing countries with possible similarities with Braziliam culture. This ressarch is nade by bibliographif references through Reading, tudyhg and understang the Brazilian Federal Constitution, law articles, resolutions, labour law books, and scientific papers related to this issue. Consequently, the demographic indicatos porhts that brazilian workes are getting older, its necessary that public policies and companies provide the adequade assistance to create the right changes on working environment to this group. Key Words: aging; labor Market; mature workers; requalification; SUMÁRIO INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 07 CAPÍTULO 1 ENVELHECIMENTO NO MERCADO DE TRABALHO ................. 09 1.1 Discriminação por idade no momento da contratação – Etarismo no trabalho .................. 11 1.2 Desemprego devido ao Envelhecimento ............................................................................ 14 1.3 Trabalho Informal – Subdesemprego ................................................................................. 19 CAPÍTULO 2 RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO FRENTE AOS DIREITOS DOS TRABALHADORES MADUROS ................................................................................. 24 2.1 Ordenamento jurídico na proteção do idoso ...................................................................... 27 CAPÍTULO 3 ENVELHECIMENTO EM PORTUGAL E O MERCADO DE TRABALHO ........................................................................................................................... 37 3.1 Expectativas profissionais em Portugal .............................................................................. 42 CAPÍTULO 4 DESAFIO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO CONTEXTO BRASILEIRO .......................................................................................................................... 48 4.1 Requalificação Profissional ................................................................................................ 56 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................. 67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 70 7 INTRODUÇÃO O direito ao trabalho deve estar intrinsecamente ligado à necessidade do trabalho e a dignidade da pessoa humana, a idade do trabalhador não deve ser fator determinante de rescisão contratual de emprego como um rótulo de validade. Nessa perspectiva, o mundo capitalista exige maiores conhecimentos a um trabalhador, discriminando quem não possui oportunidade de requalificação. De acordo com PERES (2005, p. 3) situações de exclusão “vividas por trabalhadores de mais idade, tem como justificativa um conjunto de estereótipos negativos acerca do envelhecimento”, pois o amadurecimento é visto a partir da perspectiva da improdutividade, atraso e desatualização. Sob essa perspectiva, a presente pesquisa tem como objetivo geral compreender as dificuldades dos trabalhadores com idade avançada em obter recolocação profissional, bem como discutir as perspectivas e possíveis soluções a serem adotadas no mundo do trabalho. A partir da orientação principal, os objetivos específicos estão baseados em: verificar como o fator de envelhecimento é encarado no mercado de trabalho, a partir das categorias discriminação, desemprego e trabalho informal; analisar a responsabilização do Estado frente aos direitos dos trabalhadores maduros; estudar a perspectiva de países estrangeiros a partir da experiência de Portugal; assim como verificar a construção de políticas públicas sobre o tema estudado no contexto brasileiro. A pesquisa será pautada na metodologia bibliográfica compreendida entre leitura, estudo e compreensão por meio do mapeamento de pesquisas e publicações acadêmicas que tratam do tema proposto. Para contextualização, será aplicado o método de abordagem histórico do tema, a fim de se entender como o envelhecimento da população ocorreu e quais serão suas implicações para o mercado de trabalho. Para o aporte teórico, considera-se a utilização de livros doutrinários, artigos científicos disponibilizados em periódicos, documentos, materiais legislativos – com base na Constituição Federal, Consolidação das Leis Trabalhistas, entre outras resoluções. De forma teórica, considera-se que: A pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de trabalho dessa natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas. Boa parte dos estudos exploratórios pode ser definida como pesquisas bibliográficas. As pesquisas sobre ideologias, bem como aquelas que se propõem à análise das diversas posições acerca de um problema, também costumam ser desenvolvidas quase exclusivamente mediante fontes bibliográficas (GIL, 2002, p. 44). 8 A partir da articulação entre os objetivos e metodologia de pesquisa, este trabalho está estruturado em 4 (quatro) capítulos. O primeiro capítulo aborda o contexto do envelhecimento da força de trabalho a partir do quadro demográfico global, com análise dos fatores que levaram a uma perspectiva de maior longevidade e quais suas implicações em todas as áreas do indivíduo no contexto social, econômico e político. O segundo capítulo apresenta a responsabilização do Estado frente as pessoas mais velhas, mostrando como o ordenamento jurídico brasileiro dedica-se na proteção e estabelecimento de direitos e garantias por meio das normas e diretrizes presente na legislação, seguindo para uma análise das principais leis que foram constituídas especialmente para pessoa idosa, indicando quais os desafios para efetivação de seus direitos. Para o terceiro capítulo, observa-se a questão estudada a partir do contexto estrangeiro, sob a consideração da experiência de envelhecimento da população portuguesa. Concomitantemente, serão descritas as tendências internacionais e nacionais que levam à internalização de políticas públicas acerca do tema quanto à implementação de políticas ativas de emprego e qualificação profissional, a partir de um paralelo com possíveis desdobramentos análogos na experiência brasileira. O quarto capítulo trata sobre as políticas públicas no Brasil que versam sobre as garantias e direitos das pessoas mais velhas, com análise da experiência de organizações que produzem ações voltadas para a diversidade de faixas etárias no mercado de trabalho privado. Trata, ainda, de iniciativas governamentais que objetivam equilibrar o problema da discriminação na reinserção profissional. 9 CAPÍTULO 1 ENVELHECIMENTO NO MERCADO DE TRABALHO Os impactos do envelhecimento na atual conjuntura do mercado de trabalho trazem questionamentos em como as empresas, as organizações, o governo e a população enfrentarão as mudanças produzidas pelo envelhecimento, assim como as novas possibilidades e os novos cenários capazes de equilibrar os impactos negativos que a idade avançada traz na força de trabalho. Segundo a projeção do IBGE, o envelhecimento da população brasileira vem aumentando significativamente nos últimos anos, assim, a expectativa de vida no Brasil, que na década de 40 era estimada em 45 anos, em 2018 essa estimativa passa a ser de 76 anos, (IBGE, 2019) desta forma, é de suma importância colocar em pauta a diversidade etária no mercado de trabalho, tema importante nas políticas públicas, no monitoramento das condições sociais de vida, além da seguridade social. O aumento da esperança de vida ao nascer deve-se, principalmente, à evolução da medicina, à ampliação dos programas de saneamento básico e ao avanço da tecnologia; aliados à menor taxa de fecundidade, alcançada após o advento e a popularização dos métodos anticoncepcionais, a revolução feminina e sua inserção no mercado de trabalho, fatos determinantes no planejamento familiar e profissional da mulher, que alteraram a formação as famílias brasileiras. (CARVALHO, 2009) Esse panorama de uma maior longevidade possui um impacto nas várias dimensões do corpo social, inclusive no mercado de trabalho, visto que os indivíduos atuarão por mais tempo em seus postos de trabalho. Outro fator significativo é a entrada de empresas digitais, uma demanda alta de conhecimento tecnológico para os profissionais que anteriormente não necessitavam dessas ferramentas, o que gera grande desequilíbrio nas relações de trabalho atuais. Uma pesquisa realizada pela Aging Free Fair em parceria com a FGV/EAESP sobre o envelhecimento nas organizações e como gerir os trabalhadores com 50 anos ou mais mostrou que as empresas possuem dificuldade em apresentar práticas direcionadas para os profissionais mais maduros, apontando barreiras como o problema em manejar ferramentas tecnológicas, além da flexibilidade e não adaptação ocorridas no ambiente de trabalho (FGV, 2019). A Era do Envelhecimento – segundo a ONU, está ocorrendo de forma acelerada ao longo dos últimos anos, e esse processo ocorre nos países desenvolvidos e nos menos desenvolvidos, havendo a necessidade de se adaptar a este fenômeno. Nesta perspectiva, “envelhecer é um processo natural característico da vida do homem, e ocorre por meio de 10 mudanças principalmente físicas, mas também psicológicas e sociais que se dão de forma única para cada indivíduo que tem sua vida prolongada”. (CEDENHO, 2014, p. 2) Complementa o referido autor que o processo do envelhecer representa uma soma de fatores que perpassam uma idade determinada, devendo-se levar em conta, as condições biológicas relacionadas à idade cronológica, o qual se manifesta pelo declínio harmônico do conjunto orgânico do ser humano. Afirma-se que o envelhecimento se relaciona com o momento histórico e cultural em que o indivíduo está inserido. A partir do contexto social, um dos campos a ser destacado é o mundo do trabalho, com base na nova realidade demográfica, o mercado de trabalho será composto por muitas pessoas maduras que ocuparão os empregos perante a era do envelhecimento. O mundo do trabalho deve estar se preparando para o novo quadro populacional, não apenas pelo aumento em números de pessoas idosas, mas também, pelo perfil ativo e atuante nas atividades laborais. Com base na relação do ambiente de trabalho com o idoso, os interesses da população madura não se restringem ao campo relacionado à saúde, aposentadoria, atividades de bem- estar. Todavia, devido à evolução da sociedade atual é inevitável a preparação de um novo contingente de pessoas com faixas etárias mais altas dentro do mercado de trabalho. não só o indivíduo, mas as próprias organizações buscam adaptações diante dessa nova perspectiva pela qual a sociedade está passando, especialmente no campo do trabalho. Tais adaptações, ou a falta delas, podem ser percebidas por meio da cultura organizacional e seus elementos que legitimam e oferecem significado às práticas organizacionais. (KAI, 2019, p. 7) Ao pensar na relevância de trabalhadores maduros na composição do mercado de trabalho diante do quadro de crescimento dessa população, algumas empresas começaram a preparar sua gestão a fim de manter ou contratar pessoas na faixa etária madura. Isto porque muitas características dos trabalhadores com idade de 50 anos ou mais justificam este avanço, é notório a gama de conhecimentos adquiridos ao longo da carreira profissional. Assim, estes trabalhadores auxiliam nas dificuldades que as organizações enfrentam, como também se tornam referência para os jovens que ainda trilharão o mercado de trabalho. Uma análise que demonstra a síntese de Indicadores Sociais elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, no ano de 2012, revelou que o índice de envelhecimento populacional brasileiro obteve um aumento considerável, passando de 31,7% em 2001 para 51,8% em 2011. Dentro desta análise, constatou-se que os indivíduos com 60 anos ou mais representavam 27% das vagas de emprego no mercado de trabalho. Neste sentido, espera-se que a população madura permaneça na carreira profissional por mais tempo. 11 Os valores, as atitudes, a sabedoria, a paciência e o respeito destes trabalhadores são ainda mais ressaltados nesta idade, o comprometimento organizacional e o valor afetivo (social e emocional) que esta classe atribui ao trabalho lhes concedem uma característica apreciada pelas instituições (CARVALHO, 2009, p. 9). Neste sentido, a empresa aprecia pessoas comprometidas e responsáveis, e isto ocorre com as pessoas mais velhas. Observa CORRÊA que: o conhecimento intelectual é mais valorizado, pois as pessoas com mais de 50 anos estão no auge de sua capacidade produtiva e carregam uma bagagem diferente da geração atual, muito aproveitada em áreas como finanças, vendas, pelo network, onde há necessidade de liderança, relacionamentos humanos e conhecimentos técnicos específicos. (CORRÊA, 2018, s. p.) Nesta perspectiva, são muitas evidências que denotam a necessidade de uma revisão dos valores e dos processos na administração das empresas, principalmente, em relação à Gestão de Pessoas no que tange à incorporação de políticas que contemplem a nova realidade demográfica global. (CARVALHO, 2009, p. 8) As dificuldades do público com 50 anos ou mais, vai além de conseguir uma vaga de emprego, o dia-a-dia desse profissional pode apresentar muitos transtornos. Para isso, é imprescindível que o trabalhador desenvolva competências psicológicas, a fim de não se sentir inferior frente ao preconceito etário. Um ambiente de trabalho preconceituoso pode enfraquecer a produtividade e o ânimo do empregado, um tratamento que traz desequilíbrio na vida profissional desrespeita aos princípios da dignidade e igualdade estabelecidos pela Carta Magna. O envelhecimento do profissional mostra o propósito da empresa, sendo um fator positivo no ambiente laboral, mostrando a seriedade de diferentes faixas etárias, assim, as organizações podem preencher as lacunas organizacionais e trazer novas ideias. Portanto, os trabalhadores mais velhos podem ser absorvidos em cargos ou postos que exigem pouco esforço físico, a fim de valorizar as habilidades e conhecimentos que serão necessários na prestação de serviço, conseguindo desta forma desempenhar tarefas em que o acúmulo de experiência adquirida na vida profissional seja um ponto positivo a ser considerado e um facilitador na permanência no mercado de trabalho. 1.1 Discriminação por idade no momento da contratação – Etarismo no trabalho O trabalho como um dos principais aspectos da vida de um indivíduo, seja no seu desenvolvimento, identidade ou dignidade, faz com que cada pessoa se estabeleça em meio a 12 sociedade, neste sentido, considera-se que “o trabalho pode ser considerado um dos valores fundamentais do ser humano e desempenha um importante papel para a autorrealização, sociabilidade e constituição das subjetividades do indivíduo” (KAI, 2019, p. 37) A construção do desenvolvimento da pessoa passa pelo emprego, que constitui a inserção do sujeito no mundo do trabalho como parte elementar ao longo do seu amadurecimento. Logo, considera-se que o trabalho pode ser compreendido como uma categoria essencial da construção da pessoa humana. Deste modo, o processo de envelhecimento relaciona-se ao ambiente de trabalho e pode produzir muitos impactos que prejudicam o desempenho das atividades laborais. O envelhecimento visto de forma preconceituosa e padronizada pode afetar a saúde mental, física e psíquica do profissional. Sobre essas relações, destaca-se o termo etarismo, o qual diz respeito à discriminação com base na idade do indivíduo, colocando estereótipos acerca do envelhecimento como fator negativo ao trabalhador. Butler, responsável por introduzir os estudos sobre o envelhecimento, utilizou a palavra “ageismo” para explicar o preconceito contra a idade, assimilando essa intolerância com o racismo e o sexismo. Nas pesquisas de Butler, o termo etarismo foi definido como o processo sistêmico que utiliza estereótipos negativos para discriminar pessoas pela sua idade. A partir das contribuições desse autor, os estudos sobre discriminação etária foram inseridos e aprofundados nas instituições acadêmicas. (BUTLER, 1969, p. 243, apud HANASHIRO e PEREIRA, 2020, p. 191) O “ageism negativo” tem como justificativa um conjunto de estereótipos negativos acerca do envelhecimento, que “significa essencialmente a discriminação com base na idade ocorrida em diversas esferas da sociedade, dentre as quais a do mercado de trabalho” (PERES, 2055, p.3) O ageism ou etarismo pode se manifestar em âmbito pessoal e em institucional. Neste sentido, em âmbito pessoal ele diz respeito ao preconceito e discriminação preconizados por indivíduos, enquanto em âmbito institucional refere-se à prática de uma instituição ou organização por meio de suas rotinas e políticas. Assim, o etarismo aparece de forma sutil ou marcante em diversas situações. (HANASHIRO e PEREIRA, 2020, p. 191) O etarismo é tema de bastante responsabilidade para o Direito, visto o contexto de envelhecimento populacional que resulta no envelhecimento da força produtiva de trabalho, assim, se faz necessário apontamentos e estudos de como as empresas vão enfrentar este desafio 13 de reinserção e quais serão as mudanças organizacionais necessárias perante o envelhecimento acelerado. A discriminação contra os trabalhadores em idade avançada é praticada de forma implícita, o que dificulta as estratégias de intervenção tanto nas contratações de trabalhadores mais velhos, quanto em programas de retenção e desenvolvimento dessas pessoas, de forma a melhorar sua produtividade (LEME DE MATTOS, 2021). As ocorrências suaves dessa forma de preconceito não inseridas no texto legal, ocorre principalmente na esfera interpessoal, que acarreta várias repercussões negativas para o grupo de trabalhadores mais velhos. Essa discriminação permeia o ambiente laboral, não ficando exclusivamente nas mãos dos gestores, e pode ser vista nas promoções dentro da empresa, nos benefícios concedidos, além da exclusão dessas pessoas das atividades sociais. Assim, destaca-se que o “viés etarista pode ser tão sutil que as pessoas podem não perceber como eles se incorporam às atitudes e comportamentos nas organizações, funcionando como normas de conduta compartilhadas pelos membros de um determinado grupo ocupacional em relação à idade” (HANASHIRO e PEREIRA, 2020, p. 193). O envelhecimento populacional é um fato, o preconceito enfrentado pelas pessoas maduras acontece todos os dias, isto porque a sociedade relaciona o amadurecimento como velhice e incapacidade. A idade interfere na vida profissional, mas também é utilizada como justificativa para desligamentos nas organizações. O preconceito pela idade recentemente nomeado, acaba intitulando idade para cada etapa da vida, podemos citar essas ocorrências na vida das mulheres, a cobrança é um fator determinante, idade para casar, ser mãe, e consequentemente, o etarismo interfere na empregabilidade (ALVES, 2019). Esses comportamentos compartilhados amplamente podem representar uma norma social para as organizações. Na ótica feminina, as mulheres mais velhas sofrem discriminação múltipla, intensificada pelo gênero e pela idade. O sexismo é apontado por diversas mulheres dentro das empresas, os gestores e empresários do sexo masculino preferem trabalhadores do mesmo gênero pela atração da similaridade, que muitas vezes estão associados a raça, classe social, entre outros preconceitos, mas nem sempre manifestado isoladamente, um paradigma que reforça a discriminação múltipla das mulheres mais velhas (KAI, 2019). Porém, é possível observar que ao longo das décadas houve muitas melhorias na medicina, na alimentação, o que contribuiu para uma longevidade maior, trazendo um aspecto positivo das tecnologias de acesso para estabelecer um padrão de vida apropriado capaz de 14 aumentar a expectativa de vida dos trabalhadores. Nesta perspectiva, surge o desafio de adaptação nas novas demandas das empresas e organizações, que também foram alvas da industrialização e ferramentas tecnológicas. O etarismo pode influenciar nos processos de recrutamento, desta forma, algumas empresas utilizam estratégias com a finalidade de reter os profissionais engajados e produtivos com idade avançada, preferindo ampliar esforços para aproximar jovens, com o intuito de criar novas lideranças para a organização, ficando cada vez mais evidente que a discriminação no momento da contratação acontece e deve ser evitada (PEREIRA e HANASHIRO, 2014, p. 191) A discriminação por idade no local de trabalho vem do mito de que há uma diminuição do desempenho conforme o envelhecimento do profissional, porém provar esse tipo de discriminação é bem difícil, pois gestores acabam trazendo aos seus discursos de forma inconsciente que a empresa precisa renovar seus funcionários, partindo da premissa que a inovação não condiz com a idade de seus empregados. O preconceito no contexto organizacional é um problema social que persiste, como a pobreza, a exclusão social, e ainda inclui a crise da previdência, que está sobrecarregada e não utiliza meios e caminhos eficazes para requalificação profissional. É possível observar que muitos profissionais maduros adquirem um conhecimento consistente ao longo dos anos na seara do trabalho, suas habilidades, aptidões, são exemplos de atributos que estes funcionários possuem, a conotação negativa do envelhecimento é irrelevante perante o desenvolvimento da sociedade, não é correto incorporar estes estereótipos que prejudicam uma etapa que faz parte da vida humana. Por fim, o profissional maduro é parte fundamental de uma organização que carece das expertises e competências dessa classe. 1.2 Desemprego devido ao Envelhecimento Em contrapartida, o desemprego é um elemento que também deve ser discutido pela perspectiva do envelhecimento. Trata-se de um dos maiores problemas sociais na atualidade, e segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o 4º trimestre do ano de 2021 alcançou 12 milhões de desempregados, gerando um agravamento de exclusão em muitas dimensões. O desemprego se refere aos indivíduos que estão disponíveis para trabalhar, porém não encontram trabalho, essas pessoas, de forma simplificada, são aquelas com idade superior a 14 anos. (IBGE, 2021). Para o Instituto Nacional de Estatística (INE, 2019) desempregado é a 15 pessoa entre 15 e 74 anos que não possui trabalho remunerado ou procurou uma oportunidade de emprego e não encontrou nada específico (dentro de três semanas). REINERT (2001) afirma que o desemprego “é caracterizado como sendo a não possibilidade do trabalho assalariado nas organizações de um modo geral”. Assim, o desemprego do ponto de vista social e político assume consequências negativas para todo o corpo social. Outra possível definição de desemprego seria “o resultado da falta de capacidade do sistema econômico em promover ocupação produtiva para todos aqueles que a buscam” (MARTINS, 2006, p. 30) O trabalho no contexto socioeconômico é a principal ferramenta para se obter o próprio sustento, mantendo a dignidade da pessoa humana, além da construção da própria identidade do indivíduo. Nesta perspectiva, o emprego assume um valor significativo para os trabalhadores mais maduros, pois o trabalho compreende uma relevância que pode ser modificada ao longo das experiências vivenciadas, garantindo autonomia em meio a sociedade, além de poder alcançar a aposentadoria, direito obtido com um grande sacrifício ao longo da vida. Para CARVALHO (2009, p. 6) as dimensões do trabalho estão relacionadas ao exercício mental, pois o indivíduo que trabalha sente-se participante da sociedade em que vive; e aos aspectos de sociabilidade, visto que é uma oportunidade de relacionar-se com o próximo. O trabalho como grande influência na construção da identidade do indivíduo, afirma o reconhecimento de pertencimento, desempenhando um pilar fundamental na autoestima, senso de utilidade e identidade da pessoa. À vista disso, o desemprego demonstra a perda do vínculo social e pessoal, impactando na qualidade de vida durante seu processo, e “em larga escala, suas consequências diretas e indiretas são a desmoralização dos trabalhadores, o desperdício dos meios de produção, o enfraquecimento dos sindicatos e a sobrecarga dos programas de seguridade social” (MARTINS, 2006, p. 30). A sociedade moderna advinda da revolução do sistema socioeconômico exige cada vez mais do profissional, pois as rápidas transformações tecnológicas assumiram uma competição global que afeta toda estruturação e organização da forma de trabalho, que anteriormente não necessitava de um gama de conhecimento industrial acelerado, sendo na sua maioria trabalhos manuais e ensinados de pai para filho. A globalização juntamente com as crises econômicas contribuíram para a crescente taxa de desemprego, o desemprego estrutural que substitui a mão de obra pelas máquinas, apresenta 16 um lado negativo da tecnologia que modificou muitas carreiras profissionais. Conforme destaca SALERT: Em um capitalismo que passa a ter em seu cerne o desemprego estrutural, criando verdadeiro exército de trabalhadores reservas, o medo de perder o emprego se torna complemento da necessidade, e esses dois componentes são desvelados enquanto causas e efeitos da ausência do direito de resistência dos trabalhadores brasileiros” (2019, p. 21) Também é necessário pontuar que, além da substituição da mão de obra humana, há empregos que exigem uma alta qualificação em tecnologia da informação, fechando oportunidades para aqueles que não tiveram o acesso ao ensino superior ou tecnólogo. Esse fenômeno ocasionou consequências negativas que atingiram os trabalhadores diretamente, acentuando a desigualdade socioeconômica, a pobreza, e o desemprego. O século XXI trouxe um impacto profundo nas estruturas de carreiras, devido às transformações tecnológicas, desta forma, uma grande empresa precisou se moldar para atender as demandas do capitalismo, trazendo para os profissionais instabilidade e imprevisibilidade durante sua trajetória laboral. As novas exigências para os trabalhadores se resumem em um considerável aumento da quantidade de trabalho, adquirir conhecimento rápido, estar sempre atualizado em sistemas que precisam contato com a automação e tecnologia, desempenhar trabalho em equipe e por projetos. O trabalhador se vê pressionado pelas imposições da nova era, desmotivado pela exclusão quando compete com um trabalhador mais jovem, que resulta em períodos de desemprego mais prolongado, desta forma: o aumento do desemprego cria uma legião de excluídos, unidos pela sua condição comum de marginalidade, mas diferenciados por categorias. Dentre os desempregados de hoje, não estão somente os trabalhadores sem qualificação, pertencentes às classes mais baixas. A exclusão do mercado de trabalho tem atingido também os ocupantes da classe média, detentores, em geral, de elevado grau de formação e vasta experiência profissional. Esses profissionais, porém, possuem um aspecto em comum: a sua faixa etária. (PERES, 2005, p.2) A adaptação dos novos paradigmas organizacionais não respeita o processo de envelhecimento do empregado, e sim, confronta as mudanças na carreira profissional fragmentada do novo modelo, as consequências são a realidade do desemprego, um aumento do stress para alcançar uma colocação no posto de trabalho, e o sentimento de fracasso quando não consegue se reinserir nesse mercado que não mostra medidas eficazes para esta classe. O desemprego dos trabalhadores de meia idade, ou mais velhos, é a resposta desse fator contextual da sociedade tecnológica, carreiras longas e estáveis são o oposto requisito das novas carreiras, os profissionais devem ser adaptáveis de acordo com os gestores e da nova política. 17 Segundo CARVALHO (2009, p. 7), há uma exclusão no mercado de trabalho atual, não somente para idosos, como também para as pessoas com mais de 40 anos. Este dado relaciona- se com as oportunidades educacionais que as pessoas dessa faixa etária receberam. Atualmente nos deparamos ao mesmo tempo com a melhora da saúde e segurança do empregado, menos duração do trabalho e otimização do tempo, mas, também, com a extinção de empregos em alguns setores da economia, em especial, entre os menos qualificados, substituídos pela robotização e informática. (CAVALCANTE, 2020, p. 3) O subdesemprego, ou empregos de período parcial, são preenchidos pelos trabalhadores mais maduros, que tentam sobreviver com as novas exigências na seara trabalhista, essa problemática, afeta a recolocação no mercado de trabalho, pois o período despendido na procura se torna um fator que exclui o candidato, sendo visto como ponto negativo ao trabalhador. Outro ponto a ser considerado, é a qualificação do profissional maduro, que se torna o principal aspecto para sua manutenção ou reingresso no mercado de trabalho. Quanto menor seja a escolaridade, cursos ou diplomas do candidato, menor é sua chance de ser reinserido como empregado, consequentemente esses trabalhadores menos qualificados se submetem a trabalhos de baixa remuneração, em locais precários, pela necessidade de ganhar a subsistência da família ou complementar sua renda. (LEME DE MATTOS, 2021, p. 23) Já os profissionais que tiveram uma formação maior conseguem se manter no trabalho mesmo se apresentar uma diminuição de produtividade ao longo da carreira, evidenciando como é importante o investimento em cursos que requalifiquem o profissional mais velho. Os autores HANASHIRO e PEREIRA (2020) analisaram trabalhadores entre 45 e 68 anos, sua pesquisa possuiu o objetivo de mostrar a composição etária nas empresas e o desligamento pela discriminação. O estudo identificou que os trabalhadores com essa idade compunham a minoria de empregados dentro da companhia, levando em conta os estereótipos negativos por pertencerem ao menor número na organização, outro fator analisado sugeriu que havia normas de idade presente nas empresas, mostrando implicitamente ou explicitamente a valorização de trabalhadores mais jovens, característica de uma sociedade cada vez mais centrada na atuação da juventude. Destarte, os autores puderam corroborar na percepção de como o etarismo atua nas organizações, assim: o etarismo no contexto organizacional foi provocado pelos estereótipos, preconceitos e discriminação aos trabalhadores mais velhos, e pelas normas etárias implícitas. Esses fatores foram determinantes para a ocorrência de um tipo de saneamento de profissionais acima de 45 anos, que foi materializado por práticas de cortes de efetivo e substituição por empregados mais jovens. As organizações procuram elaborar justificativas plausíveis para si (ou seja, não etaristas), em torno da necessidade do corte, para promover mudanças estruturais de ajuste às demandas do mercado. (HANASHIRO e PEREIRA, 2020, p. 197) 18 Os autores concordam que as normas de idade implícitas dentro das organizações é condição determinante para afirmar qual idade ideal para cada cargo, utilizando argumentos subjacentes que sustentam justificativa razoável para o desligamento etário, onde recorrem-se a alegação da necessária reestruturação da empresa ou o custo elevado dos trabalhadores que possuem maior experiência na carreira profissional. E, ainda, a percepção da demografia etária (não se referindo somente a idade real) no grupo de trabalho, a qual beneficia o grupo composto por trabalhadores mais jovens e autocategoriza o grupo dos mais velhos que não recebem privilégios na empresa. A imagem deteriorada dos trabalhadores mais velhos enquadrada no etarismo deve ser revista, as mudanças no novo cenário demográfico das populações, traz a necessidade de alterar os sistemas de concepção sobre o envelhecimento, exigindo mudanças na produção de maneira geral. A idade não pode ser fator limitante para reinserção no mercado de trabalho, este preconceito exclui e coloca a margem indivíduos que carecem de prover seu sustento e de sua família (CARVALHO, 2009). O desligamento na empresa é visto pelos empregados como fator negativo, que pode comprometer a saúde física e psicológica do trabalhador. O corte representa uma justificativa que pode ser conjuntural que responde a crise ou declínio na demanda, ou pode ser estrutural referente ao incentivo na competitividade da organização. Desta forma, os trabalhadores mais velhos acabam sendo a primeira escolha de corte para reestruturação do emprego, vítimas pela faixa etária durante o recrutamento. Afirma SARLET: nos tempos atuais, o trabalho deixa de compor a esfera das liberdades humanas e passa a adentrar apenas e tão somente na esfera da necessidade. Sem contar com quaisquer mecanismos institucionais que garantam o emprego, a disseminação do medo e da necessidade do emprego (em sua pior acepção) tornam-se os principais componentes para a ineficácia ou ausência do direito de resistência. (2019, p. 20) As mudanças estruturais no mercado de trabalho interferem na vida dos trabalhadores mais velhos, porém, os critérios para demissões vão além das transformações dentro da empresa, isso se deve ao fato de que os gestores colocam em primeiro plano histórico de desempenho, e confiabilidade, deixando a experiência profissional e o potencial crescimento do trabalhador analisados posteriormente. Isso evidencia que os trabalhadores com idade avançada são alvos do corte, pois estes critérios que fundamentam a decisão de demissão não levam em conta a experiência profissional, fator que contribui na estereotipação de jovens gestores contra os mais velhos (PERES, 2005, p. 19). 19 Na perspectiva da empresa, o desligamento caracteriza a impessoalidade do evento, a qual exime seus gestores de maiores explicações, tornando-se uma solução confortável. Em desacordo com os princípios da Constituição Federal de 1988, o qual estimula relações de trabalho em continuidade, igualdade, sem discriminação. Neste cenário, é possível verificar o etarismo na organização de forma clara, pois não há esforços para realocar o profissional em outro cargo ou função, ou até mesmo planos que ajudem o profissional a se especializar ou requalificar-se para a manutenção do emprego. O sentimento de quem é desligado implica desconforto e instabilidade para aquele que presenciou essa experiência. Em linhas gerais, o preconceito se manifesta de muitas formas e em várias áreas do nosso cotidiano, como o autojulgamento de se achar velho demais para fazer tal coisa, ou as próprias limitações que infringimos pela cultura do nosso país. Diante do quadro de discriminação pela idade do trabalhador nas organizações é necessário a busca e incentivo pela diversidade etária dentro do mundo empresarial, pois: se o mercado de trabalho é excludente no que se refere à mão-de-obra de terceira idade, e o idoso necessita trabalhar para não se tornar um problema crônico para os governos, surge um problema social que exige reflexão das instituições sociais (governo, empresas e sociedade). (UYEHARA E CORTE 2006, p. 108, apud CARVALHO, 2009, p. 7) As discussões sobre envelhecimento abrangendo o mercado de trabalho devem ser inseridas como ferramenta para enfrentar o cenário de pré-julgamentos que atribuem à velhice a conotação negativa de encerramento da vida humana. Os resultados de pesquisas que assinalam a maior taxa de desempregados pela idade fomentam a necessidade de inserir debates que tratam do tema envelhecimento. De modo geral, o desemprego é um espelho da discriminação. Conclui-se que o trabalhador não pode ser desligado pelo fator único da idade, as habilidades e conhecimentos mostram como é importante e relevante que o mercado de trabalho contenha profissionais maduros. O significado de envelhecimento deve estar atrelado ao conjunto de sabedoria, experiência e maturidade adquiridas ao longo da vida. 1.3 Trabalho Informal – Subdesemprego O trabalho informal ou temporário acaba sendo a saída para esta classe de trabalhadores em meio a um mercado excludente. Neste sentido, os trabalhadores que necessitam sustentar 20 sua família e cumprir com as responsabilidades dentro do seio familiar recorrem para subempregos frente ao cenário vivenciado. Em termos de conceituação, trabalho informal refere-se àquela atividade laboral sem garantias normativas, como assinatura na CTPS, seguro-desemprego, FGTS, entre outras seguranças firmadas por lei. Para NORONHA, “o entendimento popular de “trabalho formal” ou “informal” deriva da ordem jurídica de cada país. São informais os empregados que não possuem carteira de trabalho assinada” (2003, p. 112) O subemprego ou emprego informal nada mais é que uma estratégia de sobrevivência. No Brasil, sua ascensão aconteceu na década de 70, mas o tema é tratado desde o início da Revolução Industrial. De acordo com ULYSSEA, “a partir de 1990 tem início um processo de elevação sem precedentes no grau de informalidade no mercado de trabalho brasileiro, totalizando um aumento de dez pontos percentuais ao final dos anos 90” (2006, p. 596-597). Neste sentido, muitos estudos teóricos e políticos passaram a atribuir ao emprego informal um dos maiores problemas dos países subdesenvolvidos, descartando o desemprego como fator principal de desregulação. Num primeiro momento, o trabalho informal era caracterizado pelo atraso no desenvolvimento da economia do país, porém, o setor informal passou a ser visto como saída para momentos de crises, em razão da flexibilidade e dinamismo, auxiliando indivíduos que se encontram na pobreza. Diante do paradigma do setor informal, muitas pesquisas e questionamentos tentaram compreender o fenômeno, para os teóricos da marginalidade, o trabalho informal não é capitalista, mas coexiste no mesmo modo de produção, acarretando o aumento de indivíduos à margem da economia ativa, o que justifica o subdesenvolvimento de muitos países. Já a Comissão Econômica para América Latina – CEPAL, acredita que a marginalização de muitos setores da população urbana causa dependência econômica dos países latino-americanos frente ao mercado internacional, o que justifica o impedimento da população excluída ingressar no mercado formal (ALVES E TAVARES, 2006, apud PEREIRA E CABRAL, 2019, p. 96) Superada a visão dualista que tenta explicar o setor informal, nos dias de hoje, tanto a formalidade quanto a informalidade estabelecem uma relação de subordinação e interdependência no mundo capitalista. O trabalho informal é considerado atividade essencial nessa dinâmica socioeconômica. A informalidade aborda duas categorias de empregados, aqueles que recebem salário sem ter carteira assinada, e aqueles que trabalham por conta própria como se fosse um microempresário, porém sem regulação. A primeira categoria se refere aos trabalhadores que 21 foram contratados ilegalmente, pois sua atividade não está inserida na legislação laboral, assim, esses trabalhadores não possuem as garantias sociais estabelecidas no direito brasileiro. A segunda categoria diz respeito ao autoemprego, ou seja, são trabalhadores que prestam serviço com autonomia e atuam com baixo nível de produtividade. De acordo com ULYSSEA “existe uma parcela de trabalhadores informais que está neste setor por escolha, enquanto que para uma outra parcela a segmentação do mercado de trabalho é uma realidade” (2006, p.17) Os trabalhos informais são também chamados de “bicos”, trabalhos temporários, ou ainda, trabalhos instáveis. O problema da precarização do trabalho se intensifica quando há um aumento no setor da informalidade, segundo o IBGE a taxa de informalidade no mercado de trabalho subiu para 40% no ano de 2021, dados disponibilizados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PANAD, 2021). Para PEREIRA e CABRAL (2019, p. 98) “a precariedade presente nas atividades laborais e o aumento substancial do número de trabalhadores informais no cenário brasileiro” são aspectos comuns da complexidade da informalidade. Os trabalhadores que estão na informalidade atribuem a falta de qualificação como maior excludente do mercado de trabalho. A partir da década de 1990, a informalidade foi expandida devido à abertura comercial externa, o que gerou muitos desempregos enfraquecendo ofertas de trabalhos, trazendo um cenário desanimador para aqueles que necessitavam sobreviver e suprir as necessidades da família. Segundo dados do IBGE (2012), a informalidade da população brasileira com 60 anos ou mais chegou a 71,7%, mostrando que os idosos participam ativamente do mercado de trabalho sem carteira assinada ou garantias constituídas nas leis devido aos fatores de rendimentos, o qual não consegue satisfazer as necessidades básicas do indivíduo e por isso necessitam complementar suas rendas, assim, a informalidade torna-se uma característica da população idosa no cenário brasileiro. (IBGE, 2012, p. 138) Em 2018, a Organização Internacional do Trabalho – OIT emitiu um relatório onde apontou que quase dois terços da força de trabalho mundial estão na economia informal, assim, 61% das pessoas empregadas globalmente estão na economia informal, para a OIT o setor acarreta muitas consequências adversas para toda sociedade. Neste sentido, é muito importante que ocorra uma transição para o setor formal a fim de assegurar proteção social e condições decentes nos postos de trabalho (OIT, 2018). No relatório também foi abordado que países subdesenvolvidos são os mais afetados pela economia informal, o que reforça a heterogeneidade das atividades laborais. Muitos são os 22 fatores afetados pelo nível de informalidade, visto que “a educação secundária e superior têm menos chance de estar no mercado informal na comparação com trabalhadores que não têm escolaridade ou só completaram a educação primária” (OIT, 2018, s. p.). Além disso, os indivíduos que vivem nas zonas rurais possuem mais chances de recorrer ao mercado informal se comparado com as pessoas que vivem em áreas urbanas, “para centenas de milhões de trabalhadores, a informalidade significa falta de proteção social, direitos no trabalho e condições de trabalho decente, e para as empresas significa baixa produtividade e falta de acesso a financiamento.” (OIT, 2018, s. p.) Há, por outro lado, países que apresentam certo otimismo em relação aos novos empreendimentos criados a partir do mercado informal, promovido pelo discurso de empreendedorismo e empregabilidade que são concebidos pela onda da informalidade. Nessa visão, muitos impactos negativos na vida dos trabalhadores informais são ocultados, como por exemplo, a proteção da previdência social, o que acarreta precariedade nas condições de vida, pois os rendimentos são menores e menos qualificados. É claro que o desemprego é um problema social maior, porém, a informalidade adquire perspectivas sombrias no mercado de trabalho atual, visto que, a inserção de trabalhadores sem proteção de forma contínua desestabiliza as condições de trabalho, minimizando direitos que foram construídos para segurança e plenitude da vida do ser humano. A desestruturação do trabalho passou por muitas transformações desde a Revolução Industrial. Em consequência disso, elevou-se o número de desemprego, informalidade e precarização. Ainda, afirma-se que o crescimento da informalidade contribui não somente para acumulação do capital, mas sim para mão de obra barata, que desvaloriza o trabalhador, e segura a contradição de funcionar como um socorro imediatista para aqueles que precisam sobreviver em meio às dificuldades do presente momento. Como alternativa para muitos trabalhadores, a informalidade vem mascarada como superação de crise, desemprego, recuperarão do mercado de trabalho, solução rápida, entretanto, demanda análise imediata para entender como vivem os milhares de indivíduos que estão inseridos no setor de informalidade econômica, pois: um dos principais fatores de preocupação decorrentes do elevado grau de informalidade no Brasil é o fato de os trabalhadores informais não se beneficiarem da proteção concedida pela legislação trabalhista. Sendo assim, seria especialmente preocupante a constatação — comum à literatura nacional e estrangeira — de que a incidência da informalidade é maior no grupo de trabalhadores que tradicionalmente apresenta menores rendimentos. Nesse caso, os trabalhadores que mais precisam da proteção da legislação são exatamente aqueles que estão (relativamente) mais desprotegidos. (ULYSSEA, 2006, p. 17) 23 Portanto, a informalidade aprofunda a desigualdade e enfraquece os direitos sociais relacionados ao trabalho e dignidade da pessoa humana. Esse quadro de incerteza e instabilidade gerados pelo interesse do capital e que coloca o lucro acima da proteção conquistada nas lutas sociais ao longo da trajetória humana devem ser revistas e tratadas no contexto do mercado de trabalho hodierno. Nas palavras de PEREIRA e CABRAL: A informalidade no Brasil se apresenta de forma heterogênea, subordinada aos interesses do capital, aprofunda a precarização e as desigualdades. Compreende-se, portanto, que são necessárias políticas que visem proteger os trabalhadores, principalmente no que concerne o acesso e permanência ao trabalho e melhora na qualidade de vida do trabalhador, políticas inclusivas que possibilitem alternativas para geração de renda e garantia de direitos. (2019, p. 101) Em vista do que foi colocado sobre a informalidade, é importante concluir que a crescente taxa de informalidade no mercado de trabalho no contexto brasileiro expõe expressamente que muitos trabalhadores se encontram marginalizados de garantias estabelecidas na legislação trabalhista, do sistema previdenciário e da segurança de diversos dispositivos normativos. Segundo dados do IBGE, a exclusão abrange mais de 38 milhões de pessoas (IBGE, 2012). Por fim, a informalidade, por não gerar vínculo empregatício e nenhuma prerrogativa de lei para o indivíduo, é considerada prejudicial ao trabalhador, limitando o exercício do pleno emprego por não respaldar o trabalho e garantir ao indivíduo uma renda fixa, pagamento de horas extras, seguro-desemprego e muitos outros direitos que são assegurados ao trabalhador formal. 24 CAPÍTULO 2 RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO FRENTE AOS DIREITOS DOS TRABALHADORES MADUROS É importante destacar que o processo de envelhecimento é singular para cada indivíduo, isso ocorre de forma distinta e depende de fatores como condição social, escolhas, dimensão biológica e psicológica. A velhice deve ser compreendida como extensão da vida do ser humano, e como continuidade que engloba sabedoria, experiências e momentos adquiridos ao longo da trajetória humana. No mercado de trabalho, o desenvolvimento de uma pessoa deve ter fulcro no seu desempenho e performance, logo, o crescimento da organização deve estar pautado na entrega e qualidade de serviço prestados, e nunca na idade. Nesta perspectiva, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece princípios norteadores que demonstram a responsabilização do Estado e das organizações empresariais frente ao mercado de trabalho e a pessoa madura. Na sociedade atual, as relações trabalhistas e os direitos dos trabalhadores maduros são temas de extrema importância, uma vez que as organizações são essenciais para o desenvolvimento econômico do país, e o mercado de trabalho será composto em sua maioria por trabalhadores maduros devido a redução do índice de natalidade e aumento da expectativa de vida. Em vista disso, este tópico traz o contexto dos trabalhadores maduros no ordenamento jurídico brasileiro e as garantias estabelecidas pelo Estado na legislação constitucional. Afinal, a proteção dada aos indivíduos com faixas etárias mais altas, constituem deveres obrigatórios de seus direitos fundamentais. Os direitos dos trabalhadores consagrados na Constituição Federal representam direitos fundamentais, sem prejuízo de outros direitos decorrentes em outros diplomas legais ou tratados internacionais. Assim, os direitos dos trabalhadores como direitos fundamentais devem ser atribuídos a um regime jurídico reforçado, “típico da concepção corrente de direitos fundamentais e também consagrada pela Constituição de 1988” (SARLET, 2019, p. 73). Neste sentido: Significa dizer que os direitos fundamentais dos trabalhadores obrigam, de forma primária, o Estado, devedor de prestações materiais ou normativas (v. g., aposentadoria, normas de saúde, higiene e segurança), e o empregador ou tomador do trabalho, devedores de prestações materiais, em retribuição à prestação de trabalho. De forma secundária, sobrevêm os deveres de proteção dos poderes estatais. Do Poder Judiciário, se lhe for dirigida ação judicial voltada à reparação de lesão ou ameaça a direito. (LEDUR, 2017, p. 3) 25 Primeiramente, o princípio da igualdade estabelecido pela Constituição Federal de 1988 abrange todos os trabalhadores. Desta forma, as oportunidades e os tratamentos devem ser iguais independentemente da idade, raça, sexo ou nacionalidade. O princípio da igualdade exerce relação íntima com a função da proteção, pois está voltado ao exercício da liberdade ao sujeito vulnerável perante as forças sociais e econômicas que exercem poder. Dito isto, considera-se que as políticas públicas são auxiliares na requalificação profissional do trabalhador para reingressar ao mercado de trabalho, bem como aplicar políticas voltadas a sanar a exclusão por idade no momento da contratação para que o princípio da igualdade seja eficaz para profissionais maduros. Sobre essa questão, aponta COUTINHO (2015, p. 20) que: “deve ser garantida, apenas para começo, a igualdade na contratação de empregados nas empresas, para que idosos possam retornar ao mercado de trabalho ou dar continuidade às suas funções, sem serem dispensados apenas por conta da idade”. O princípio do valor social do trabalho refere-se a um trabalho prestado livremente (não análogo à escravidão) e que proporcione o livre desenvolvimento do indivíduo e de sua personalidade, sendo um direito fundamental que objetiva o livre exercício do trabalho ou qualquer outra profissão. Destaca SARLET que “o princípio estará atendido se a atividade econômica assegurar a todos existência digna e justiça social” tendo como base “o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e justiça social, definindo a força normativa do princípio” (2019, p. 6) A Constituição Federal de 1988, juntamente com a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, estabelece que não é permitido ao empregador utilizar práticas discriminatórias na admissão profissional ou manutenção do posto de trabalho. O art. 5º da Carta Magna preconiza a igualdade de todos perante a lei, garantindo a todas as pessoas a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à prosperidade. Desta forma, é função subjetiva a não discriminação presente no direito fundamental, sendo seu propósito reduzir as desigualdades sociais. Posteriormente, o inciso XLI aduz a punição de qualquer tipo de discriminação que atente aos direitos e liberdades fundamentais (BRASIL, 1988). Subsidiariamente, a Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995 proíbe: a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal. (BRASIL, 1995) (grifos nossos) http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#art7xxxiii 26 Os limites estabelecidos na Lei Maior também se referem a objetivos constitucionais, qual seja, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária – art. 3º, I, buscando o bem a todos os indivíduos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra forma de discriminação – art. 3º, IV. Todas essas normas constitucionais, que expressam princípios e objetivos de suma relevância, evidenciam, sem dúvida, a presença, de um princípio geral de notável destaque, ou seja, o princípio da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e na vida socioeconômica. (DELGADO, 2018, p. 553) Neste sentido, a busca pelo pleno emprego compõe o princípio da centralidade da pessoa humana, incluindo na vida socioeconômica do indivíduo o direito ao emprego para subsistência da família e dignidade. Complementa o ilustre professor Maurício Godinho Delgado: Essa matriz constitucional de 1988, estruturada em princípios, fundamentos e também objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, todos com inquestionável natureza e força normativas, contingência, limita, restringe fórmulas surgidas na economia e na sociedade de desequilibrado exercício de poder sobre pessoas humanas e de desproporcional utilização de sua potencialidade laborativa. Nessa moldura lógica e sistemática da Constituição, não cabem mecanismos de utilização do trabalho que esgarcem o patamar civilizatório mínimo instituído pela ordem jurídica constitucional do País, reduzindo a valorização do trabalho e do emprego, exacerbando a desigualdade social entre os trabalhadores e entre estes e os detentores da livre iniciativa, instituindo formas novas e incontroláveis de discriminação, frustrando o objetivo cardeal de busca do bem-estar e justiça sociais. (DELGADO, 2018, p. 554) Deste modo, fica evidente a vedação de requisitos que discrimine o candidato à vaga de emprego, sendo permitido solicitar apenas requisitos técnicos para admissão ou seleção para o posto de trabalho, em conformidade com a necessidade da organização, não podendo considerar preferências pessoais ou vantagem que atenda ao interesse próprio. Particularidades que interferem no sexo, faixa etária, gênero, raça, ou expressões como “boa aparência” não validam ou determinam o desempenho ou a produtividade do candidato. Também é vedado ao empregador fazer exigência de investimento prévio ao candidato ou empregado para que este efetue treinamentos, cursos de especialização ou taxas atribuídas a capacitação, pois a responsabilidade é única da empresa, ou seja, investimentos financeiros para admissão é proibido, o art. 2º da CLT afirma que é do empregador a responsabilidade da atividade econômica, sendo seu dever assalariar e dirigir a prestação pessoal do serviço, ficando isento o empregado de qualquer ônus que advenha da atividade profissional. (BRASIL, 1943) Atualmente, tem se falado sobre discriminação positiva nas vagas de emprego, essa nova política se fundamenta no equilíbrio das relações trabalhistas perante as desigualdades de grupos que sofrem exclusão como os negros, as pessoas mais maduras, ou pela questão do 27 gênero do indivíduo. Assim, essa ação de igualdade em muitas empresas cumpre o dispositivo presente na Constituição Federal, o qual incentiva medidas que promovam a igualdade – art. 51. Um exemplo muito comum no Brasil pode ser encontrado no caso das vagas exclusivas para pessoas deficientes, um sistema de cotas que possibilita a esta classe de indivíduos atuar no mercado de trabalho, uma ação afirmativa que objetiva reduzir as disparidades nas contratações. Essas ações afirmativas - tanto em caráter público, como as políticas públicas, e ainda, em caráter privado advindo de algumas organizações - servem para corrigir os efeitos da discriminação presente na sociedade atual, proporcionando medidas de igualdade entre os trabalhadores e de acesso a bens fundamentais como o emprego e a educação. 2.1 Ordenamento jurídico na proteção do idoso O ordenamento jurídico brasileiro apresenta muitas leis que demonstram a preocupação com a população mais velha, desta forma, muitas políticas públicas e medidas de proteção estão inseridas nas normas, entretanto, grande parte da população desconhece estes mecanismos de segurança e defesa, e muitas instituições não adotam estes instrumentos de proteção. Nesta perspectiva, é necessário pontuar os principais códigos jurídicos para torná-los eficazes. Primeiramente, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu um rol de fundamentos elencados no art. 1º, como primeira proteção aos indivíduos mais velhos, onde nos traz o direito à cidadania e a dignidade da pessoa humana. No que tange a cidadania: sua importância está em possibilitar ao idoso conservar a capacidade de analisar e compreender a realidade política e social, criticá-la e atuar sobre ela, interagindo com a sociedade, conservando sua integridade física, psíquica e moral, com o devido e necessário amparo e proteção (GONÇALVES, 2019, s. p.). Já a dignidade da pessoa humana, princípio de maior valor axiológico do ordenamento constitucional, se refere à garantia de uma vida digna, ou seja, o respaldo de necessidades básicas para que o indivíduo possa usufruir de uma existência decente. Neste segmento, o princípio da dignidade da pessoa humana está intrinsecamente ligado ao trabalho da pessoa idosa, pois através do trabalho, o indivíduo assegura um patamar civilizado de ganhar recursos para sua sobrevivência e de sua família, com sua própria força e habilidades, sendo o meio de alcançar uma vida digna, capaz de suprir as necessidades elementares do universo econômico, assim: 28 a conquista e afirmação da dignidade da pessoa humana não mais podem se restringir à sua liberdade e intangibilidade física e psíquica, envolvendo, naturalmente, também a conquista e afirmação de sua individualidade no meio econômico e social, com repercussões positivas conexas no plano cultural —, o que se faz, de maneira geral, considerado o conjunto mais amplo e diversificado das pessoas, mediante o trabalho e, particularmente, o emprego, normatizado pelo Direito do Trabalho (DELGADO, 2019, p. 94) O princípio da dignidade da pessoa humana vai além da proteção à vida, a dignidade da pessoa mais velha diz respeito também a sua autodeterminação considerando o gozo de sua autonomia. Preconiza LEDUR (2017) que é importante para ciência jurídica, para o intérprete e aplicador do direito interpretar o princípio da dignidade da pessoa humana com densidade, mediante a consideração dos aspectos que lhe conferem conteúdo, sendo a inviolabilidade, intangibilidade e a inalienabilidade. A Constituição Federal ainda estabelece em seu art. 230 a responsabilidade do Estado, da família e da sociedade em amparar os idosos, além de assegurar sua participação em meio ao corpo social, e atuar na defesa de sua dignidade e bem-estar, garantindo-lhes o direito à vida. (BRASIL, 1988). A tutela constitucional coerente com o princípio da solidariedade social, impõe aos pilares da sociedade o compromisso em amparar as pessoas mais velhas, sob a ideia de que “a solidariedade, que se projetou para o mundo jurídico, significa um vínculo de sentimento racionalmente guiado, limitado e autodeterminado que impõe a cada pessoa deveres de cooperação, assistência, amparo, ajuda e cuidado em relação às outras” (LÔBO, 2013, s. p.). Em âmbito internacional, a Organização das Nações Unidas – ONU deu o primeiro passo ao estabelecer uma agenda que tratava de políticas públicas para o público mais velho, em 1982 ocorreu em Viena um plano internacional de ação voltado para favorecer a população idosa, o Brasil posteriormente aderiu ao pacto incorporando na Constituição Federal recomendações com a finalidade de amparar a terceira idade. Em 1991, a ONU novamente retomou o debate acerca da população idosa, constituindo 18 princípios que foram ulteriormente aprovados em assembleia a Proclamação sobre o envelhecimento. Na mesma década, o Brasil concebeu a Política Nacional do Idoso – Lei nº 8.842 de 04 de janeiro de 1994. Sobre a política, destaca-se o comentário de que ela: surgiu devido aos influxos internacionais, e também devido às pressões da sociedade civil, sendo, neste âmbito interno, influenciada por extenso rol de recomendações do documento Políticas para a 3a Idade nos anos 90, produzido pela Associação Nacional de Gerontologia (CEDENHO, 2014, p. 6). Conforme observa ALCANTÂRA (2016, p. 360), a Política Nacional do Idoso reafirmou o preceito constitucional ao eleger a família, a sociedade e o Estado como 29 responsáveis e provedores, pela efetiva contribuição do idoso na sociedade, assim como, na defesa do seu bem-estar e dignidade, mostrando que o envelhecimento é um fenômeno social que necessita de informações e esclarecimentos sobre seu processo. A referida lei possui o objetivo de garantir os direitos sociais do idoso, fomentando e elaborando a promoção de sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade, (BRASIL, 1994). A partir do crescimento desse público, é indispensável que o Estado represente e assegure os direitos e que este acesso seja eficaz. A Política Nacional do Idoso visa estabelecer uma qualidade de vida onde as pessoas mais velhas possam desfrutar da vida plena em todos seus aspectos, mostrando que a longevidade pode ser integrada na sociedade e bem utilizada se atendidas as políticas de prevenção. O art. 3º do diploma jurídico dispõe que: Art. 3o É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1994) Entendemos que o Poder Público assumiu a responsabilidade em dar suporte a pessoa madura em todos os direitos mencionados no art. 3º da Política Nacional, em especial destacamos o direito ao trabalho, tema central da presente pesquisa, o qual diversas vezes é apontado na legislação brasileira devendo o indivíduo gozar do pleno emprego garantido por muitos diplomas legais. É importante ressaltar que a Política Nacional do Idoso também consolidou o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa – CNDI, um órgão permanente incumbido de supervisionar, fiscalizar, acompanhar e propor o regulamento das políticas direcionadas à pessoa idosa. O crescimento da população mais velha deve apresentar direitos que compensam suas perdas e limitações no processo de envelhecer, principalmente nos aspectos físicos e psicológicos. Diante do quadro de envelhecimento populacional, muitos idosos estão atuando ativamente no mercado de trabalho, desta forma, a legislação brasileira preocupada com as questões relativas a terceira idade e seu maior desempenho em todas as áreas, editou o Decreto nº 9.921, de 18 de julho de 2019, substituindo o antigo decreto nº 1.948/1996, que trata dos atos normativos que dispõem sobre a temática da pessoa idosa. O segundo marco internacional ocorreu em 2002 na Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento organizado pela ONU, em Madri, caracterizando a colaboração do tema entre Estado e sociedade civil. A Assembleia aprovou novas ferramentas, como o Plano de Ação para orientar as medidas normativas que tratam do envelhecimento no século XXI. 30 Em seguida, no mesmo contexto que mostrava a preocupação com a população idosa, o Brasil sanciona em 1º de outubro de 2003 a Lei nº 10.741 – mais conhecida como Estatuto do Idoso, com fulcro nos princípios constitucionais que estabelecem as pessoas idosas os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Destaca-se o art. 2º da referida lei, na seguinte ideia: “sem prejuízo da proteção integral, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade” (BRASIL, 2003). A Lei nº 10.741 representa um grande passo da legislação brasileira no combate às discriminações relacionadas ao etarismo presente no corpo social. O Estado como garantidor dos direitos deve sempre ampliar as respostas às demandas apresentadas pelas pessoas com idade avançada, mantendo o equilíbrio entre as relações em meio ao corpo social. Neste segmento, “percebe-se que os legisladores tomaram o cuidado de abordar o tema de forma ampla, sistêmica, intersetorial e transversal, no sentido de identificar e atender a todas as necessidades das pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos”. (SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA, 2021, p. 19). O Estatuto do Idoso como avanço legislativo é o caminho para a consolidação da proteção social dos mais velhos, porém, é necessário que as políticas se apresentem afetivamente. O Estatuto composto por 118 artigos traz as prerrogativas do comando constitucional, as normas que tratam das garantias das pessoas mais velhas têm aplicação imediata. Segundo leciona DIAS (2021, p. 423) o Estatuto do Idoso: “se constitui em um microssistema e tem o mérito de reconhecer as necessidades especiais dos mais velhos, estipulando obrigações ao Estado. Deve ser considerado como um verdadeiro divisor de águas na proteção do idoso”. No que concerne à profissionalização e trabalho da pessoa madura, o Estatuto do Idoso dedica em seu capítulo VI diretrizes que regem e administram as relações laborais. O artigo 26 estabelece o direito ao exercício da atividade profissional, desde que sejam respeitadas as condições físicas, intelectuais e psíquicas do trabalhador mais velho. (BRASIL, 2003). O artigo 27 também proíbe a discriminação por idade, em consonância com a Constituição Federal e Consolidação das Leis do Trabalho, as quais asseguram o princípio da isonomia, vedando estipulação máxima de idade para exercer cargo ou concursos, salvo os casos que a natureza do emprego exigir, não tratando a faixa etária como limitação para o trabalho. (BRASIL, 1988) Outra benfeitoria da lei é a preferência no critério idade no caso de desempate em concursos públicos, desta forma, o primeiro critério a ser usado no concurso público para definir 31 quem tem preferência no cargo ou função será a maior idade (idade mais elevada). Entretanto, o maior problema do parágrafo único, do art. 27, do Estatuto é a fiscalização. De acordo com Paulo Frange: Este artigo da Lei, embora seja muito importante, pode ficar apenas em letras escritas e não cumpridas. A falta de uma cultura em lidar com o idoso é um grande entrave. Conhecemos leis estaduais, e também municipais, no Brasil que buscam proteger os idosos em cargos e trabalho, mas, na verdade, não são cumpridas. A realidade mostra uma discriminação dos idosos, que já começa bem antes de ser idoso do ponto de vista da definição. Para os desempregados do Brasil, a discriminação começa aos 40 anos. (2021, p. 41) Ainda no capítulo VI do Estatuto do Idoso, é atribuído ao Poder Público o dever de criar e estimular projetos e programas de: I – profissionalização especializada para os idosos, aproveitando seus potenciais e habilidades para atividades regulares e remuneradas; II – preparação dos trabalhadores para a aposentadoria, com antecedência mínima de 1 (um) ano, por meio de estímulo a novos projetos sociais, conforme seus interesses, e de esclarecimento sobre os direitos sociais e de cidadania; III – estímulo às empresas privadas para admissão de idosos ao trabalho. (BRASIL, 2003) A evolução processual advinda do Estatuto do Idoso viabiliza também a tutela jurisdicional coletiva quando traz capítulo específico que trata da proteção judicial dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, que estão dispostos nos artigos 78 a 92. Desta forma, a lei indica que “os legitimados para a proposição de ação civil pública para a defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos também o façam em relação à proteção dos direitos individuais indisponíveis do idoso, mesmo que seja para a defesa de direito de idoso único”. (ALCÂNTARA, 2016, p. 374) O art. 10 do Estatuto do Idoso dispõe que o Estado, juntamente com a sociedade, deve assegurar ao idoso a liberdade, respeito e a dignidade, neste sentido, defender a dignidade da pessoa madura e seu bem-estar é dever do Estado com a devida participação da sociedade, essa integração se refere principalmente à justiça social, a qual busca fornecer e assegurar os direitos e liberdades a cada cidadão de forma justa e sem discriminação. Atualmente, foi criado no Brasil o Pacto Nacional de Implementação dos Direitos da Pessoa Idosa- PNDPI, por meio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que possui o objetivo de formalizar o compromisso entre o âmbito federal, estadual e municipal na implementação de políticas públicas destinadas às pessoas idosas. Até o presente momento, 18 estados brasileiros fazem parte do programa que busca auxiliar na ampliação de conselhos que tratam dos direitos referente às pessoas mais velhas, e, ainda, no aumento de fundos 32 municipais para este propósito (MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, 2021). O PNDPI estabelece o compromisso com a década do envelhecimento, que foi estipulada de 2020 até 2030 pela Organização das Nações Unidas. Com a finalidade de contextualizar o avanço das políticas públicas voltadas para esse público, é preciso compreender a evolução da trajetória das pessoas mais velhas no nosso país. No Brasil, a concepção predominante no início do século XX era a exclusão e segregação das pessoas idosas, as práticas de distanciamento afetivo, internações em asilos, afirmava os aspectos sociais, políticos e econômicos presenciados naquela época. Foi na década de 1960 que o olhar para o idoso mudou, marcada pela expansão do assistencialismo, principalmente pelo Serviço Social do Comércio – SESC, que deram enfoque nas dificuldades e desafios enfrentados por esta classe, inaugurando assim, um trabalho pioneiro voltado a atender as necessidades das pessoas maduras. (MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, 2021) Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a legislação brasileira trouxe em seu contexto uma maior “participação popular”, colocando em pauta as questões inerentes ao idoso, destacando o direito à cidadania, mostrando que o Estado, a família, juntamente com a sociedade em geral possuem a obrigação de responder as questões voltadas à velhice. Atualmente, vemos um progresso na participação do governo quanto à estimulação de ações direcionadas aos estados e municípios para capacitação da década do envelhecimento. O Pacto Nacional de Implementação dos Direitos da Pessoa Idosa ainda propõe a criação de conselhos municipais em consonância com a Política Nacional do Idoso de 1994, desta maneira, “qualquer pessoa, organização governamental, entidade da sociedade civil podem propor ou promover ações para criação de um Conselho Estadual ou Municipal de Direitos da Pessoa Idosa. A ação de criar um conselho é a mobilização e participação ativa da sociedade” (MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, 2021, p. 28), outro objetivo do pacto, se refere a criação dos fundos municipais do idoso como instrumento capaz de viabilizar as políticas, assim como, as ações que promovam, protegem, defendem e melhore a qualidade de vida dos mais velhos, conforme a Lei nº 8.842/94 e Lei nº 10.741/03. Uma pesquisa feita pela Unidade de Envelhecimento e Curso de Vida da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostra como o envelhecimento carece de uma política de saúde e ações que promovam um envelhecimento ativo. O envelhecimento ativo pode ser considerado como um processo de otimização de saúde, participação na sociedade e segurança, com a 33 finalidade de melhorar as aptidões e qualidade de vida na medida em que os indivíduos envelhecem, deste modo, o envelhecimento ativo “permite que as pessoas percebam o seu potencial para o bem-estar físico, social e mental ao longo do curso da vida, e que essas pessoas participem da sociedade de acordo com suas necessidades, desejos e capacidades” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2005, p. 14). Estima a Organização Mundial de Saúde, que até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo em número de idosos. Neste cenário, é importante que os indivíduos permaneçam independentes e ativos, sendo fundamental a promoção de campanhas e políticas públicas que incentivem o cuidado com a saúde, qualidade de vida, desempenho profissional centralizado aos mais velhos. A partir da pesquisa produzida pela OMS, é possível destacar que “as políticas e programas de envelhecimento ativo são necessários para permitir que as pessoas continuem a trabalhar de acordo com suas capacidades e preferências à medida que envelhecem, e para prevenir e retardar incapacidades e doenças crônicas que são caras para os indivíduos” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2005, p.12). Desta maneira, manter a autonomia do indivíduo durante o envelhecer é fundamental para a sociedade, pois este processo, envolve outras pessoas, como amigos, vizinhos, colegas de trabalho, família, assim, este aspecto se refere a interdependência entre todos e solidariedade das gerações, como princípio elementar para estabelecer o envelhecimento ativo. Deve-se pensar que o envelhecimento é um ciclo em que todas as pessoas estão destinadas a vivenciar, o que contextualiza a necessidade de incentivar uma melhor qualidade de existência para todos os indivíduos. Não podemos deixar de ressaltar que o envelhecimento é uma grande conquista para todas as nações, ao analisarmos o passado e a precariedade da saúde, saneamento, e cuidados que antes não tínhamos acesso. A evolução gradual possibilitou uma perspectiva de vida maior, o que proporciona maior efetividade de pessoas idosas em todas as áreas da vida humana. Sob esse espectro, há muitos desafios no setor social e econômico de todo o mundo, mas devemos considerar as pessoas com idade avançada como recurso vital, que são imprescindíveis na sociedade atual. Para que os indivíduos cheguem a atuar com segurança na velhice é necessário que, durante sua trajetória laboral, os postos de trabalho ofereçam ambiente apropriado, remuneração adequada, proteção em trabalhos que apresentem riscos, em conformidade com os princípios da legislação trabalhista. A partir dessa premissa, a OMS incentiva que todos os países e organizações internacionais adotem programas de incentivo ao envelhecimento ativo, 34 especialmente os países subdesenvolvidos, que auxiliarão no desempenho profissional das faixas etárias mais velhas substituindo a dependência econômica e serviços de assistência, os quais sobrecarregam o sistema previdenciário. A abordagem preventiva de políticas e programas sociais de saúde, de emprego, mercado de trabalho para toda população, pode impedir muitos desafios inerentes do envelhecer, como: menos mortes prematuras em estágios da vida altamente produtivos; menos deficiências associadas às doenças crônicas na Terceira Idade; mais pessoas com uma melhor qualidade de vida à medida que envelhecem; à medida que envelhecem, mais indivíduos participando ativamente nos aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos da sociedade, em atividades remuneradas ou não, e na vida doméstica, familiar e comunitária; menos gastos com tratamentos médicos e serviços de assistência médica. (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2005, p. 19) Em síntese, a pesquisa elaborada pela OMS destaca que as ações para tratar do envelhecimento populacional devem fixar atividades e metas em nível local, regional, nacional e, ainda, internacional, para que as consequências socioeconômicas e políticas não sejam catastróficas com o imperativo demográfico. Incentivar as pessoas mais velhas a continuar suas atividades, seja no trabalho, na comunidade, no ambiente familiar, é responsabilidade de todas as áreas governamentais, por isso, é de extrema importância que tanto o âmbito internacional, quanto o nacional se mobilizem e efetivem ações concretas para reduzir as desigualdades na participação dessa classe. Ao tratar das ações levantadas pelos estados brasileiros na instituição de leis e programas que auxiliem as pessoas mais velhas, a prefeitura de São Paulo, em outubro de 2021, lançou o Plano Intersetorial de Políticas Públicas para o Envelhecimento Saudável. O plano projeta a realização de 70 ações realizadas por 15 secretarias que cuidarão da saúde, educação, proteção, gestão e participação da pessoa madura, implementadas entre os anos de 2021 e 2024. O plano tem como base as diretrizes da Organização Mundial da Saúde – OMS, com a finalidade de aprimorar a autonomia do envelhecimento ativo (SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA, 2021). A ação promovida pela cidade de São Paulo tem o intuito de aumentar a oferta de atividades e serviços para todos os idosos, os dados apresentados foram de que 1,8 milhão de idosos vivem na grande São Paulo, este número ultrapassa a população de 19 capitais do Brasil, foi exposto também, que o maior número de mortes por Covid-19 foi para esta classe, o grupo de pessoas com mais risco de contaminação, que tiveram que se isolar de maneira intensa durante a crise sanitária. Nesta lógica: 35 partindo do pressuposto da integralidade e do tripé biopsicossocial do ser humano, que requer abordagem interdisciplinar e intersetorial no tocante à atuação do poder público frente ao desafio do envelhecimento populacional, as várias mãos constituintes deste Plano buscaram traduzir empiricamente esse princípio, descentralizando responsabilidades e articulando ações estruturais para o fomento do envelhecimento ativo no âmbito municipal. Deste modo, o Plano Intersetorial de Políticas para o Envelhecimento foi pautado pelo entendimento, de que somente a partir de um olhar e de ações amplas e englobantes - com a cooperação das diversas secretarias, acrescidas pela sociedade civil, podemos ambicionar dar aos cidadãos com 60 anos ou mais um envelhecimento pautado nas premissas dos direitos humanos e do envelhecimento ativo e saudável. (SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA, 2021, p. 11) Contudo, mesmo com muitos dispositivos presentes na legislação nacional e internacional, vemos que a efetividade dos direitos relacionados às pessoas maduras ainda carece de existência real e maior concretização, neste sentido: transcorridos quase três décadas da redemocratização do país e de todo esse labor legislativo pró-idoso, as políticas públicas para o envelhecimento ainda não foram efetivadas. Uma rápida leitura da PNI e o do Estatuto do Idoso demonstra uma dívida do Estado com esse segmento populacional, restando às famílias a grande responsabilidade e o ônus de cuidar de seus idosos. (ALCÂNTARA, 2016, p. 360) A generalidade dos seus dispositivos, cominam à ineficácia das medidas de proteção e das muitas ações que estão previstas nas normas. A alta institucionalização no Brasil denota que a falta de consolidação, muita das vezes é por não estabelecer indicadores que acompanhem a eficiência dessas políticas. ROMERO (2019) observa que no Brasil diversas políticas públicas foram formuladas para população idosa, sendo elaborado vasto número de leis, decretos, políticas e portarias como público-alvo os indivíduos com faixas etárias altas. Entretanto, sendo o Brasil um dos pioneiros na proteção dessa classe, surge um problema pressuposto à consolidação das referidas medidas. Sob esse contexto, o envelhecer da população no Brasil encontra-se melindrado, pois, mesmo que esteja acontecendo o amparo progressivo relacionado aos idosos, encontramos vários deles ainda sendo ignorados pela sociedade, mostrando que a legislação vigente até então tem deixado a desejar, visto que o modo como são vistos e tratados pelo resto da população ainda não modificou18, fazendo com que continuem excluídos do contexto social. (PAOLINI, 2015, p. 3) Conforme trata SARLET (2019), os artigos descritos na Constituição Federal, em especial os direitos aos trabalhadores e direitos sociais, possuem níveis de eficácia e efetividade controversos, pois se registram ainda índices significativos de déficit quando falamos de sua realização concreta. Ademais, é nítido o papel importante das empresas quando falamos de desenvolvimento econômico da sociedade na atual conjuntura tecnológica, o lucro e a produção em grande escala 36 são fatores relevantes no mundo capitalista, entretanto, o valor e a dignidade da pessoa humana devem estar acima dos interesses financeiros de qualquer sociedade. O Estado, como garantidor de inúmeras garantias firmadas na legislação, deve promover e incentivar práticas sustentáveis, onde as organizações e o setor público respeitem um parâmetro ético e social. Nesta perspectiva, a Constituição Federal determina a igualdade de todos sem qualquer discriminação com abrangência para a população de idosos, que possuem o direito ao pleno emprego e envelhecer com dignidade, sendo parte do mercado de trabalho. Assim, o trabalhador maduro não deve sofrer discriminação no ambiente de trabalho, e as empresas devem reforçar a permanência de diversas faixas etárias dentro da organização, promovendo a diversidade, garantindo equilíbrio e cumprindo sua função social. Portanto, a função fundamental do Estado em garantir condições dignas para a pessoa idosa atuar em todas as escolhas em que escolher, significa efetivar os direitos fundamentais do indivíduo maduro. 37 CAPÍTULO 3 ENVELHECIMENTO EM PORTUGAL E O MERCADO DE TRABALHO Em Portugal, o envelhecimento também se apresenta com um aumento ininterrupto, transformando a sociedade desenvolvida em sociedade envelhecida. As evoluções das últimas décadas como a modernização econômica e social são fatores que deram origem a este aumento considerável. O cenário demográfico está acentuando o envelhecimento pela baixa taxa de fecundidade e o aumento da esperança média de vida, somando a este fator a forte emigração nos anos de 1960 a 1970, o qual fizeram que a população da sociedade portuguesa esteja com uma quantidade significativa de pessoas com mais de 50 anos. (ROSA, 2016). Conforme dados da OMS (2005), muitos países, como Portugal, também estão “vindo a assistir a um envelhecimento da população, resultante de uma reduzida natalidade e do declínio da mortalidade” (VELOSO e ROCHA, 2016, p. 2). Segundo as projeções demográficas do EUROSTAT 1 – Serviços de Estatística da União Europeia, no ano de 2050, três em cada dez cidadãos em Portugal terão 65 anos ou mais. No ano de 2019, 22% da população portuguesa tinha idade superior aos 65 anos, um grupo heterogêneo com diferentes contextos sociais, como a escolaridade, o percurso profissional e redes familiares distintas. (MOREIRA, 2020, p. 20) Cumpre destacar que o envelhecimento da população é visto como um fator positivo, pois o progresso econômico, social e biomédico conseguiu proporcionar maior longevidade para os indivíduos. Entretanto, a sociedade associa a este processo a redução da capacidade da pessoa, definindo o amadurecimento como atraso, limitação e algo ultrapassado. Neste sentido, o processo de envelhecimento “propicia uma imagem de velhice a que se associam representações sociais depreciativas tais como decrepitude, degenerescência, pobreza e incapacidade física” (VELOSO e ROCHA, 2016, p. 5) Apesar do desgaste natural do ser humano ao longo da vida, a idade não pode ser a razão da exclusão e discriminação. O envelhecimento em plano coletivo demanda exigências e mudanças em todas as suas esferas, como nas relações econômicas, no mercado de trabalho, no sistema de proteção social. 1O EUROSTAT é o Serviço de Estatítica da União Europeia responsável pela publicação de estatísticas e indicadores de elevada qualidade a nível europeu que permite a comparação entre países e regiões. 38 O envelhecimento acentua os riscos inerentes à sustentabilidade dos sistemas de saúde e, sobretudo, da segurança social, o que torna necessária a revisão dos alicerces sociais e económicos em que esses sistemas assentam. Ao mesmo tempo, é necessário ter em conta a equidade das relações intergeracionais no plano das transferências financeiras, da competição nos mercados de trabalho e do apoio mútuo entre as diferentes gerações. (CABRAL e FERREIRA, 2013, p. 12) O envelhecimento não acarreta só custos para a sociedade, o maior desafio é como a coletividade aborda as diferentes faixas etárias, e como está ocorrendo o acesso aos seus direitos de participação social. ROSA (2016) associa ao envelhecimento uma efetiva discriminação de pessoas mais velhas no mundo produtivo em geral, mas também no mercado de trabalho especificamente, e que esta discriminação está baseada em argumentos menos válidos, como por exemplo, o cansaço ou a limitação como falta de empenho. Na Europa, é possível identificar as preocupações acerca do envelhecimento populacional, por exemplo, pela assistência que as organizações governamentais possuem em incentivar o debate acerca do tema. A Comissão Europeia e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) promovem iniciativas voltadas a estimular que as sociedades abordem políticas públicas que respondam a este paradigma. Essas organizações estabelecem os princípios e orientações no envelhecimento ativo, a fim de conhecer as questões colocadas pelo envelhecimento, assim como as preocupações e caminhos capazes de solucionar e equilibrar a sociedade envelhecida. (CABRAL e FERREIRA, 2013, p. 12) A Comissão Europeia traduz o envelhecimento ativo como uma forma de estratégia que permite envelhecer saudavelmente, porém é necessário adquirir práticas que englobam a educação para prolongar a vida profissional e, consequentemente, a saúde do indivíduo. O envelhecimento ativo, em linhas gerais, objetiva aumentar a qualidade de vida, mantendo a autonomia e independência daqueles que estão a envelhecer. O envelhecimento activo/produtivo, assentando numa lógica economicista, pode servir para resolver certos problemas relacionados com a economia: quantas mais pessoas idosas trabalharem, quantas menos estiverem institucionalizados, quantas mais se encontrarem nas suas casas a cuidarem dos seus familiares e outros dependentes, quanto mais as comunidades se envolverem em formas de solidariedade social para com as pessoas idosas necessitadas, quantas mais formas de voluntariado se promoverem menores serão os dispêndios dos Estados com estas pessoas. (VELOSO e ROCHA, 2016, p. 28) O termo ativo se refere à manutenção de atividades motoras e cognitivas das pessoas maduras. Os hábitos saudáveis, que também dependem da condição social de cada pessoa, interferem no processo de envelhecimento, nos mostrando a reprodução de desigualdade na sociedade atual. A segunda dimensão do envelhecimento ativo traz ressalva nas definições 39 dadas pelas organizações internacionais mostrando a necessidade do prolongamento da carreira ativa. (CABRAL E FERREIRA, 2013, p. 14) Os indivíduos vivem mais e possuem melhores condições de saúde no processo de envelhecimento ativo, podendo se manter por mais tempo na atividade profissional, permanecendo ativo em meio à sociedade, aos contatos sociais e institucionais. Aplicar o envelhecimento ativo ajudará na condição dos indivíduos que sofrem discriminação por idade, respondendo os possíveis caminhos para enfrentar o aumento da longevidade, abrindo oportunidades para participação e não exclusão. Em Portugal, um estudo produzido pelo Instituto do Envelhecimento2 acerca do idadismo3 alegou que o fator principal de discriminação pela população portuguesa é devido aos mais velhos não trabalharem (LIMA, 2011, apud CABRAL E FERREIRA, 2013, p. 18). Assim, podemos perceber que o trabalho possibilita uma participação ativa dessa classe, a qual afirma sua cidadania nos processos de decisões na sociedade quando se mantém na vida ativa por um maior período. É indispensável que aspectos sobre a saúde do trabalhador sejam repensados para que o ambiente de trabalho seja satisfatório e essa gradual transição seja possível a longo prazo. Sabemos que o trabalho proporciona muitas redes de participação, sejam os contatos sociais, o acesso a diversas informações, além do envolvimento socioeconômico. O envelhecimento ativo corresponde a um processo em que se mantenha boas condições, seja física, emocional, mental e na saúde, possibilitando autonomia, relacionamento e reconhecimento social. Em consequência do envelhecimento populacional, a reforma4 em Portugal passou por algumas mudanças, como o aumento da idade e mais tempo de contribuição para alcançar o benefício. Essa ação do governo, semelhante a muitos países, tem mostrado a preocupação com os orçamentos de proteção social considerando a implementação de mudanças no mercado de trabalho para adaptação da classe mais madura. As expectativas governamentais não contemplam as medidas que motivam um envelhecimento ativo, e ainda, não consideram desenvolver um prolongamento voluntário da vida profissional. Destacam RIBEIRO e COIMBRA (2007, p. 206) que “a imposição, cada vez 2 O Instituto do Envelh