KAREN FABIANE LEONEL CORRÊA OS CONECTIVOS E SUA IMPORTÂNCIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA HABILIDADE ESCRITA ASSIS 2018 KAREN FABIANE LEONEL CORRÊA OS CONECTIVOS E SUA IMPORTÂNCIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA HABILIDADE ESCRITA Dissertação apresentada à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis, para a obtenção do título de Mestra em Letras (Área de Conhecimento: Linguagens e Letramento). Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Carolina Sperança Criscuolo Bolsista: CAPES ASSIS 2018 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca da F.C.L. – Assis – Unesp C824c Corrêa, Karen Fabiane Leonel Os conectivos e sua importância para o desenvolvimento da habilidade escrita / Karen Fabiane Leonel Corrêa. Assis, 2018. 166 f. : il. Dissertação de Mestrado – Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis Orientador: Drª Ana Carolina Sperança Criscuolo 1. Língua portuguesa (Ensino fundamental). 2. Língua portuguesa - Conectivos. 3. Ensino fundamental. 4. Escrita. 5. Língua portuguesa - Gramática. I. Título. CDD 370.193 DEDICATÓRIA Aos meus pais, Francisco e Luiza, dedico este trabalho, os responsáveis pelo que sou, mesmo longe estiveram sempre presentes dando-me incentivo, amor e compreensão a todo momento, o meu porto seguro. AGRADECIMENTOS A DEUS, por todo sempre, pela vida, pelas conquistas diárias. Meu esposo Evandro, que soube com maestria superar os dias que estive ausente, mesmo de corpo presente. A quem amo e admiro como homem, companheiro, amante. A minha avó (in memoriun) que sem nenhuma formação acadêmica, apenas com formação na escola da vida, despertou em mim o desejo de estudar (saudades). Aos meus irmãos, Matheus e Karla, que tenho muito carinho e admiração pela garra, meus amores. A meu sogro José Maria e sogra Maria, minhas tias Célia e Eunice, pela compreensão e incentivo, apoio incondicional. A minha orientadora Profª. Dr ª. Ana Carolina Sperança Criscuolo agradeço-lhe por compartilhar de sua sabedoria, orientação, estímulo e compreensão por minhas limitações, enriquecendo o meu saber, indicando os caminhos, sempre com muito respeito e carinho, sempre me impulsionando para frente, uma grande apaixonada pelo que faz, colocando-se à disposição, colaborando e ajudando sempre que se fez necessário. Uma grande guerreira. Aos amigos que fiz durante a passagem pelo mestrado, Fabiana, Sônia, Vinícius e Adalberto pelas tantas viagens e parcerias, aos momentos de descontração, agonia, ajuda, colaboração, e tantos outros compartilhados. Aos colegas de classe, pelo incentivo, companheirismo, alegrias e dificuldades que passamos juntos em todas as horas. A professora Fabiana Cristina Lopes, amiga e companheira de trabalho, que ajudou na adaptação das atividades para os alunos que não têm ainda as habilidades de escrita e leitura consolidadas. Tornando possível que todos fossem incluídos no desenvolvimento do trabalho. A agência de fomento CAPES. Todo jardim começa com uma história de amor, antes que qualquer árvore seja plantada ou um lago construído é preciso que eles tenham nascido dentro da alma. Quem não planta jardim por dentro, não planta jardins por fora e nem passeia por eles… e não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses… Rubem Alves CORRÊA, Karen Fabiane Leonel. Os conectivos e sua importância para o desenvolvimento da habilidade escrita. 2018. 154 f. Mestrado (Mestrado Profissional em Letras). – Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis, 2018. RESUMO Consideramos neste trabalho o papel importante que as conjunções têm dentro da escrita proficiente. Os conectivos fazem parte da competência textual/discursiva que o falante da Língua Portuguesa deve possuir. Aprender a utilizar esses mecanismos de coesão é imprescindível, pois esses conectores dão ao texto maior legibilidade, explicitando os tipos de relações estabelecidos entre os elementos linguísticos que permitem a progressão das ideias de forma clara. Resultados apresentados em provas externas (Saresp, Prova Brasil, Avaliações da Aprendizagem em Processo) e produções escritas internas (realizadas em sala de aula) pelos alunos de uma escola pública estadual de São Paulo, em relação ao uso dos conectivos, mostram que os discentes não conseguem compreender o papel importante desses elementos linguísticos na sucessão do encadeamento do fluxo informacional no texto e nos sentidos por eles produzidos. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivos: (a) analisar livros didáticos (Ensino Fundamental II) e compreender como é proposto o trabalho com os elementos de coesão, mais especificamente, as conjunções, e (b) desenvolver uma sequência didática que contribua para a compreensão das conjunções como elementos importantes para uma comunicação eficiente e um texto mais claro, que cumpre melhor o papel de interação entre o aluno e o meio em que está inserido (contexto social). Acredita-se que esse trabalho possa auxiliar os estudantes a utilizarem os elementos de coesão, mais especificamente as conjunções, de forma proficiente, o que os levará a desenvolver a habilidade escrita. A partir das limitações encontradas nos materiais didáticos analisados, em relação à abordagem dos conectivos (conjunções), discute-se esse conteúdo gramatical com base em trabalhos que trazem uma reflexão pautada no uso e na funcionalidade comunicativa desses elementos linguísticos (KOCH, 2001; NEVES, 2015; TRAVAGLIA, 2003, 2013), com a finalidade de se propor uma sequência didática (DOLZ, NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2004) para o ensino das conjunções, de forma a contribuir para o desenvolvimento da habilidade de escrita dos alunos. Palavras-chave: Conectivos. Conjunções. Escrita. CORRÊA, Karen Fabiane Leonel. The connectives and their importance for the development of written ability. 2018. 154 f. Dissertation (Professional Masters in Languages). São Paulo State University (UNESP), School of Sciences, Humanities and Languages, Assis, 2018. ABSTRACT We consider in this work the important role that conjunctions have within proficient writing. The connectives are part of the textual / discursive competence that the speaker of the Portuguese Language should possess. Learning to use these mechanisms of cohesion is essential, as these connectors give the text greater readability, explaining the types of relationships established between the linguistic elements that allow the progression of ideas clearly. Results presented in external tests (Saresp, Prova Brasil, Evaluations of Process Learning) and written internal productions (carried out in the classroom) by the students of a state public school in São Paulo, regarding the use of connectives, show that the students they fail to understand the important role of these linguistic elements in the succession of the chain of information flow in the text and in the meanings they produce. In this context, the present work aims to: (a) analyze didactic books (Elementary School II) and understand how it is proposed to work with the elements of cohesion, specifically the conjunctions, and (b) develop a didactic sequence that contributes for the understanding of conjunctions as important elements for efficient communication and a clearer text, which better fulfills the interaction role between the student and the environment in which he / she is inserted (social context). It is believed that this work can help students to use the elements of cohesion, more specifically the conjunctions, in a proficient way, which will lead them to develop writing skills. From the limitations found in the didactic materials analyzed, in relation to the connective approach (conjunctions), this grammatical content is discussed based on works that bring a reflection based on the use and communicative functionality of these linguistic elements (KOCH, 2001; NEVES, 2004), for the purpose of proposing a didactic sequence (DOLZ, NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2004) for the teaching of conjunctions, in order to contribute to the development of students' writing skills. KEY-WORDS: Connective. Conjunctions. Writing. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11 Problema de pesquisa ...................................................................................... 12 Objetivos............................................................................................................. 16 Metodologia ................................................................................................ ....... 17 Corpus da pesquisa .......................................................................................... 18 1 Limitações na abordagem dos conectivos na sala de aula ...................... 22 2 Concepções de linguagem, de gramática e de ensino ............................... 56 2.1 Concepções de Linguagem ........................................................................... 56 2.2 O ensino de Língua Portuguesa e as conjunções nos Parâmetros Curriculares Nacionais e no Currículo do Estado de São Paulo ......................... 57 2.3 As gramáticas de uso, reflexiva, teórica, normativa e funcional: meios para que o aluno alcance a competência comunicativa .............................................. 62 2.3.1. As concepções de gramática .................................................................... 63 2.3.2. Os tipos de gramática ............................................................................... 64 3 Abordagem dos conectivos a partir da sua funcionalidade ...................... 69 3.1 A coesão do texto e a sua inter-relação com a coerência ............................ 69 3.2 Como as abordagens tradicionais trabalham as conjunções ........................ 73 3.3 As gramáticas funcionais .............................................................................. 78 3.4 Outros estudos funcionalistas sobre as conjunções ..................................... 90 4 Uma sequência didática para o trabalho com os conectivos .................... 106 4.1 Uma Sequência Didática para o trabalho com as conjunções ...................... 107 4.2 Análise dos resultados .................................................................................. 135 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 152 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 154 APÊNDICES ....................................................................................................... 156 ANEXOS.............................................................................................................. 161 11 INTRODUÇÃO “Minha pátria é minha língua”. Nesse verso da canção “Língua”, num processo intertextual com a obra de Fernando Pessoa, Caetano Veloso apresenta de forma belíssima o que a língua é para cada sociedade: o meio que possibilita aos indivíduos se apresentarem aos outros, ao mundo, transmitirem sua cultura. Cultura que ganha forma por meio das diversas linguagens, especialmente a linguagem verbal. E, é cultura que forja a identidade de um povo. Dessa forma, devemos pensar a língua como identidade e, sendo assim, não podemos mais vê-la meramente como um sistema de signos, reduzida à classificação de palavras, frases, classificação de classes gramaticais, mas passamos a enxergá-la como um elemento complexo que integra o sistema em si mesmo e ao mesmo tempo a língua em uso, que está intimamente ligada ao contexto histórico, social, cultural e político de cada indivíduo, de cada sociedade e, por isso, não está pronta, acabada, mas se faz a cada interação. Ensinar a língua em seus sistemas de uso é tão importante quanto ensinar o próprio sistema, ou, nas palavras de Antunes: “Nessa concepção, a língua só pode ser vista como um conjunto sistemático, mas heterogêneo, aberto, móvel, variável: um conjunto de falares, na verdade, já que é regulado por uma comunidade de falantes”. (2009, p.22) Entretanto, para que essa concepção de língua seja desenvolvida dentro do universo escolar, é necessário que o docente ultrapasse a barreira do ensino das regras, do certo e do errado, e capacite os estudantes para compreenderem a língua como um importante instrumento de significação, de mediação das relações interpessoais. Nesse ínterim, a língua nesse trabalho é compreendida “como um conjunto de práticas sociais e cognitivas historicamente situadas” (MARCUSCHI, 2008, p.61), e por estar dentro desse princípio traz para o debate a importância dos conectivos, especificamente, as conjunções, dentro das produções dos alunos. 12 Esses elementos são relevantes dentro da manutenção da textualidade, dando conta da estruturação da sequência do texto, auxiliando a transmitir conhecimentos e sentidos e saem, dessa forma, da simples sintaxe do texto. Nesse sentido, é necessário que o professor seja o mediador, e que proponha práticas que auxiliem o estudante a se apropriar da língua. Segundo Geraldi (2014), só se aprende a língua praticando, e escrever um texto não é aprender regras, mas compreender que há princípios que nortearão essa escrita (condições de produção, instrumentos de produção, relações de produção, agentes de produção). A partir dessas considerações, e incomodados com os resultados apresentados em provas externas (SARESP, Prova Brasil, Avaliações da Aprendizagem em Processo) e produções escritas internas (realizadas em sala de aula) pelos alunos de uma escola estadual de Jahu (interior de São Paulo) em relação ao uso dos conectivos, o presente trabalho investiga como a “conexão sequencial frástica” (KOCH, 2001), com foco nas conjunções, é trabalhada nos livros e materiais didáticos. A partir da compreensão das possibilidades e limitações contidas nesses materiais, propõe-se uma sequência didática que auxilia os estudantes a utilizarem esses mecanismos de coesão para conseguirem aprimorar sua competência textual/discursiva e, por fim, faz uma avaliação do que os alunos aprenderam após o desenvolvimento da Sequência Didática. Essa avaliação acontece por meio da análise de produções escritas dos alunos participantes do projeto. Problema de pesquisa A linguagem é própria do ser humano e se constitui de sistemas simbólicos, por meio dos quais o ser humano constrói o conhecimento e sua relação com o mundo que o cerca. Lerner (2002, p. 17) coloca que participar na cultura escrita supõe apropriar-se de uma tradição de leitura e escrita, supõe assumir uma herança cultural que envolve o exercício de diversas operações com os textos e a colocação em ação de 13 conhecimentos sobre as relações entre os textos; entre eles e seus autores; entre os próprios autores; entre os autores, os textos e seu contexto. Contudo, a autora afirma que o grande propósito educativo da escrita no curso da educação obrigatória é o de incorporar as crianças à comunidade escritores; é o de formar os alunos como cidadãos da cultura escrita. Desse modo, explicitar as relações linguísticas é fundamental para auxiliá-los a tornarem-se autônomos, pois perceberão que estas relações longe de serem uniformes marcam, segundo Bourdieu (apud HANKS, 2008), o poder simbólico acumulado por seus protagonistas. Ao utilizar a língua nos mais variados contextos sociais, o sujeito é incorporado ao universo de caracterização, que tende a trazer as diferenças de posição social e econômica, por meio do conhecimento desigual da língua, que torna mais restrito a alguns indivíduos o acesso aos locais de prestígio social. Assim, ensinar a ler e a escrever são objetivos fundamentais da escola. E desse modo, pensar sobre essas habilidades torna-se fundamental no processo educacional dos alunos. Sob essa perspectiva, este trabalho tem como foco principal o ensino da coesão sequencial frástica, mais especificamente, as conjunções. A coesão sequencial, segundo Koch (2001, p.49), “diz respeito sobre os procedimentos linguísticos por meio dos quais se estabelecem, entre segmentos do texto (enunciados, partes de enunciados, parágrafos e mesmo sequências textuais), diversos tipos de relações semânticas e/ou pragmáticas, à medida que se faz o texto progredir”. Por sua vez, a sequenciação frástica se realiza por meio de procedimentos que permitem a manutenção temática com o auxílio de termos de um mesmo campo semântico e progressão temática que vai sendo construída a partir de informações já dadas e a apresentação de novas informações. Muitas vezes, é a utilização precária desses conectivos que faz com que os estudantes não consigam expressar o que pensam e defender suas ideias. Deveriam compreender que a língua escrita não é apenas uma competência linguística abstrata, mas, sim, cerceada pelas condições de produção e de interpretação. Desse modo, obrigando o enunciador a ser o mais explícito possível para que o receptor o entenda. A atividade escrita requer uma atividade reflexiva constante (que exige o planejar, analisar, revisar, elaborar estratégias, reescrever). 14 A partir desses apontamentos, tem-se como pressupostos: a) conectivos devem ser utilizados de forma reflexiva; b) conectivos não devem ser trabalhados apenas como elementos gramaticais que devem ser decorados e encaixados nos textos sem a devida observação do contexto de produção; c) conectivos não devem ser ensinados por meio de exercícios repetitivos, mas sim a partir de sua funcionalidade no texto. Mediante as reflexões pontuadas anteriormente, apresentamos as seguintes questões de pesquisa: (1) Quais concepções de língua subjazem aos usos dos conectivos? Como o trabalho com os conectivos aparece nos livros e materiais didáticos? (2) Uma sequência didática com foco nos conectivos, mais especificamente nas conjunções, seria capaz de auxiliar os alunos na utilização desses importantes mecanismos linguísticos para o desenvolvimento da mensagem que se pretende enunciar? Desse modo, o desenvolvimento da competência linguística do aluno, de acordo com o Currículo do Estado de São Paulo, não está focado apenas no domínio técnico do uso da língua, focado no ensino da norma-padrão, mas sim na capacidade de usar a língua em situações subjetivas e objetivas que exigem do enunciador a reflexão sobre os contextos comunicativos em que a língua será utilizada, desenvolvendo tanto as habilidades que se relacionam com a estrutura do texto quanto com as condições sociais de produção e recepção, refletindo sobre sua funcionalidade. Assim, destaca-se a relevância do tema a “coesão sequencial frástica” (KOCH, 2001) e sua importância para o desenvolvimento da habilidade de escrita, levando-se em consideração que esse elemento é responsável pela progressão textual, auxiliando no desenvolvimento de um tema e garantindo a boa articulação entre as ideias, informações e argumentos. 15 Justifica-se o presente trabalho, ainda, pelo resultado insatisfatório de muitos estudantes ao serem avaliados em provas como SARESP1, Avaliações da Aprendizagem em Processo (AAPs)2, Prova Brasil3, nas habilidades que envolvem o conhecimento sobre esses elementos. Uma das possibilidades apresentadas nas matrizes de referência do SARESP (material enviado pela Secretaria da Educação com a avaliação do desempenho dos alunos em questões aplicadas nestas avaliações) é que os discentes não conseguem compreender o papel importante desses elementos linguísticos na sucessão do encadeamento do fluxo informacional do texto e nos sentidos por eles produzidos. 1 O Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP) é aplicado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo com a finalidade de produzir um diagnóstico da situação da escolaridade básica paulista, visando orientar os gestores do ensino no monitoramento das políticas voltadas para a melhoria da qualidade educacional. No Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP), os alunos do 3º, 5º, 7º (por amostragem) e 9º anos do Ensino Fundamental e da 3ª série do Ensino Médio têm seus conhecimentos avaliados por meio de provas com questões de Língua Portuguesa, Matemática. Os resultados são utilizados para orientar as ações da Secretaria de Educação e também integram o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP). 2 Diagnosticar o nível de aprendizado dos estudantes matriculados na rede estadual de ensino é o objetivo da Avaliação de Aprendizagem em Processo dos alunos das escolas Estaduais do Estado de São Paulo. O caderno de perguntas e respostas é formado por uma redação, questões dissertativas e de múltipla escolha de língua portuguesa e matemática, tendo como base o conteúdo do Currículo Oficial do Estado de São Paulo. O exame é aplicado três vezes ao longo do ano letivo para alunos a partir do 2º Ano do Ensino Fundamental, Anos Finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) e todas as séries do Ensino Médio, totalizando um número superior a 3,9 milhões de participantes. Os índices extraídos são utilizados pela Educação do Estado de São Paulo para produzir orientações aos educadores, desenvolver programas e projetos que atuem nas dificuldades dos alunos. Nas escolas, os educadores recebem o manual “Comentários e Recomendações Pedagógicas”, desenvolvido por especialistas da Pasta, que contém sugestões de trabalho para cada etapa da escolaridade. 3 A Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) são avaliações para diagnóstico, em larga escala, desenvolvidas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC). Têm o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários socioeconômicos. Nos testes aplicados na quarta e oitava séries (quinto e nono anos) do ensino fundamental, os estudantes respondem a itens (questões) de língua portuguesa, com foco em leitura, e matemática, com foco na resolução de problemas. A partir das informações do Saeb e da Prova Brasil, o MEC e as secretarias estaduais e municipais de Educação podem definir ações voltadas ao aprimoramento da qualidade da educação no país e a redução das desigualdades existentes, promovendo, por exemplo, a correção de distorções e debilidades identificadas e direcionando seus recursos técnicos e financeiros para áreas identificadas como prioritárias. As médias de desempenho nessas avaliações também subsidiam o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), ao lado das taxas de aprovação. No caso da Prova Brasil, ainda pode ser observado o desempenho específico de cada rede de ensino e do sistema como um todo das escolas públicas urbanas e rurais do país. 16 Nesse processo de formação, para desenvolver a habilidade escrita, de forma mais específica, foram desenvolvidas atividades que auxiliam os alunos na compreensão dos conectivos de forma reflexiva. De acordo com Hanks (2008, p.49) , “o acesso a língua padrão através da educação fornece acesso aos lugares de poder na qual ela é empregada”. Por sua vez, o “processo completo constitui um tipo de dominação simbólica na qual as variantes não-padrão são suprimidas e aqueles que as falam são excluídos ou levados a aceitar esta exclusão” (p.49). Percebe-se, assim, que a escola é o espaço para orientação do bom uso linguístico, e, se faz necessário que haja atividades que levem o aluno a refletir sobre a língua, percebendo esses jogos de poder, em que O comportamento linguístico é um indicador claro de estratificação social. Os grupos sociais são diferenciados pelo uso da língua. Em sociedades com histórica distribuição desigual de renda (entre as quais o Brasil pode ser considerado paradigmático), as diferenças são acentuadas e tendem a se perpetuar. Pode-se afirmar que a distribuição injusta de bens culturais, principalmente de formas valorizadas de falar, é paralela à distribuição iníqua de bens materiais e oportunidades. (BORTONI-RICARDO, 2005, p.14) Levar o discente a compreender as relações de coesão que permitem o desenvolvimento das ideias é primordial, para que o uso da língua seja feito de modo consciente e lhes permita acesso aos meios sociais dos quais são alijados. Objetivos: Ao considerar todos os aspectos previamente apresentados, os objetivos desse trabalho são: • Analisar materiais didáticos utilizados em uma escola pública no que tange ao tratamento dado aos estudos dos conectivos; • Desenvolver uma sequência didática que contribua com os discentes a compreenderem o uso dos conectivos como elemento importante para uma comunicação eficiente de um texto mais claro e que cumpre melhor o papel de interação entre ele (aluno) e o meio em que está inserido (contexto social); 17 • Avaliar os estudantes a utilizarem os elementos de coesão, mais especificamente as conjunções, de forma proficiente, o que os levará a desenvolver a habilidade escrita. Metodologia Este trabalho é uma investigação de natureza qualitativa e escolheu-se a pesquisa-ação como método de pesquisa, entendendo que a pesquisa “trata-se de uma ocasião privilegiada, reunindo o pensamento e a ação de uma pessoa, ou de um grupo [professores], no esforço de elaborar o conhecimento de aspectos da realidade que deverão servir para a composição de soluções propostas aos seus problemas” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p.02). Nesse sentido, Triviños (1992, p.133) salienta que o “pesquisador orientado pelo enfoque qualitativo tem ampla liberdade teórico-metodológica para realizar seu estudo”. Além da pesquisa bibliográfica, para este estudo, escolheu-se como técnica a coleta de dados (aplicação de uma produção inicial para observar o uso que os alunos fazem das conjunções em suas produções escritas) para o desenvolvimento de uma sequência didática. Lakatos e Marconi (1991) afirmam que, em geral, nunca se utiliza apenas um método ou técnica, nem somente os que se conhece, mas todos os que forem necessários ou apropriados para determinado caso, havendo uma combinação de dois ou mais, usados concomitantemente. Foram seguidas as seguintes etapas: 1) Seleção de materiais didáticos (livros didáticos e gramáticas pedagógicas) e avaliação da abordagem que fazem dos conectivos, a fim de identificar as limitações em relação à abordagem desses elementos; 2) Pesquisa bibliográfica acerca dos conectivos (trabalhos e pesquisas científicas que apresentam uma abordagem desses elementos, que possa contribuir para sanar as limitações encontradas na etapa anterior); 3) Análise de uma produção escrita, sem a intervenção do professor, que serviu como diagnóstica, principalmente, observando-se o uso dos conectivos; 18 4) Elaboração e aplicação de uma sequência didática focada no trabalho com os conectivos. Corpus da pesquisa Para a análise da abordagem dos conectivos no contexto escolar, optou-se por três coleções que chegam à escola por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e uma enviada pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, por meio do Programa “São Paulo faz Escola”. Para o desenvolvimento da sequência didática, as propostas de produção textual são vinculadas às necessidades de escrita dos próprios alunos e, deste modo, o desenvolvimento da competência linguística do aluno não está focado apenas no domínio técnico do uso da língua, focado no ensino da norma-padrão, mas sim na capacidade de usar a língua em situações subjetivas e objetivas que exigem do enunciador a reflexão sobre os contextos comunicativos em que a língua será utilizada. Pensando o trabalho no contexto específico em que foi desenvolvido, faz-se necessário apresentar a escola, seu entorno e os alunos que fazem parte deste local. A pesquisa foi realizada numa unidade escolar pública da rede estadual de São Paulo, no centro oeste do estado, de Ensino Fundamental II e Médio (nas modalidades regular e Educação de Jovens e Adultos). A escolha do local foi intencional por ser a pesquisadora uma profissional dessa unidade escolar, pela abertura da escola e aceite por parte da equipe gestora. Com a escolha da turma, foram convidados os alunos a participarem do projeto. Antes do início da pesquisa os participantes preencheram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCL), tendo sido esclarecido aos pais os objetivos do estudo e da possibilidade de declinar da permissão da participação do filho a qualquer momento, e o Termo de Assentimento, destinado aos alunos, esclarecendo sobre o projeto e deixando claro que poderiam deixar de participar a qualquer momento que desejassem. Para atender a todos os requisitos éticos da pesquisa, o projeto foi 19 encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Letras – UNESP Campus de Assis. Devido à discrepância entre os prazos do Comitê de Ética e o cronograma de realização da pesquisa, não foi possível aguardar a avaliação do trabalho e retorno do Comitê antes da coleta dos dados, tendo em vista também os prazos do Programa de Pós-Graduação (PROFLetras). Vale ressaltar, contudo, que o trabalho passou por uma avaliação e está de acordo com as questões éticas que devem ser respeitadas. No que se refere aos participantes envolvidos nesse estudo, foram convidados 32 alunos, de um 6º ano do Ensino Fundamental II, contudo participaram efetivamente 30 alunos, pois durante a realização do trabalho duas crianças mudaram de cidade e, consequentemente, de escola. Para a análise e avaliação da SD elaborada, trabalhou-se com os alunos mencionados, tendo-se a finalidade de observar se houve ou não avanços referentes à aplicação da proposta em questão, podendo-se identificar as potencialidades de um trabalho com as conjunções, por meio da Sequência Didática elaborada, a partir da compreensão das dificuldades reais de uso desses elementos de coesão. Para compreender as dificuldades da turma em questão, foi aplicada uma produção inicial. A definição desses alunos aconteceu por questões objetivas: a pesquisadora é também a professora de Língua Portuguesa, o que possibilitou um maior tempo para o desenvolvimento das atividades e a possibilidade de acompanhar os resultados do trabalho. Nessa pesquisa, os estudantes envolvidos participaram de ações presenciais fundamentadas nas ações e análises concretas da docente, guiadas pelo suporte teórico que teve como meta novos meios de abordar as conjunções e possibilitar uma prática pautada na “reflexão-ação-reflexão” que, para Saviani (1982), se constitui no conhecimento do professor passado a prática, analisando-a e avaliando a partir das devolutivas do público-alvo, permitindo assim o replanejar que garanta a aprendizagem do aluno. A escola em que se desenvolveu a pesquisa foi criada em dezembro de 1953, de acordo com o Plano de Gestão Escolar (PGE) e oferece os cursos de Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano) no período diurno e o Ensino Médio (modalidades regular 20 e EJA), período diurno para 1ª, 2ª e 3ª séries e noturno para 1ª, 2ª e 3ª séries regulares e 1ª, 2ª e 3ª séries EJA. O Ensino Fundamental conta com aproximadamente 570 alunos e o Ensino Médio com 335 alunos. Os alunos são agrupados em salas heterogêneas quanto ao nível de aprendizagem, havendo pouca distorção idade/série, pois os alunos em defasagem podem ser reclassificados. Essa unidade escolar está localizada no Distrito de Potuntuva, pertencente ao município de Jahu,, no estado de São Paulo. Esse distrito está cercado pelos canaviais, ao redor da Usina Canavieira de Açúcar e Álcool, RAÍZEN, que atrai muitos migrantes, população sazonal, além da população já estabelecida. A partir desse cenário, percebe-se que a comunidade é oriunda da “classe baixa” e “classe média baixa”, a clientela (alunos) em sua maioria apresenta índice de desenvolvimento humano com problemas de ordem financeira e familiar, com a predominância de famílias em que os pais e as mães trabalham como empregados nas indústrias de calçados locais, comércio e trabalhos rurais (maioria na cana de açúcar). A região onde a escola está instalada é, predominantemente, de residências populares e comércio de pequeno porte, possui infraestrutura considerada boa: ruas asfaltadas, água e esgotos encanados, transporte coletivo, posto de saúde, creche, escola de Ensino Fundamental I (1º ao 5º ano) municipal. Contudo, a violência e o vandalismo estão presentes na região, sendo um dos bairros conhecido pelo tráfico de drogas e criminalidade, o que é ocasionado, segundo o PGE, pela falta de emprego para os jovens e adultos bem como pela falta de atividades e áreas de lazer. Neste contexto, a escola em seu PGE (quadriênio 2015/2018) apresenta como objetivos gerais para o Ensino Fundamental a preparação para a formação do indivíduo em processo construção da sua identidade como cidadão e para o Ensino Médio visa à preparação e direcionamento nas decisões futuras em sociedade, desenvolvimento das competências e habilidades mínimas para o mercado de trabalho e preparação para os estudos na educação superior. No que se refere à integração da escola com a comunidade busca incentivar a participação dos pais, comunidade e comunidade escolar no desenvolvimento do aluno. 21 Já o processo de ensino e aprendizagem é avaliado de forma contínua, cumulativa e sistemática, tendo como objetivo, entre outros, de diagnosticar e registrar os progressos e dificuldades do aluno, possibilitando que esse se auto avalie. As avaliações são realizadas por meio de provas escritas, trabalhos, pesquisas e observação direta, sendo que os aspectos qualitativos sempre prevalecerão sobre os aspectos quantitativos. O trabalho está organizado em 4 capítulos: No capítulo 1, avaliamos quatro coleções de livros didáticos (do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II), com o intuito de compreender como os conectivos são trabalhados nesses materiais, pontuando os pontos positivos e aqueles que precisam ser revistos ou ampliados. A escolha pela apresentação da análise dos materiais didáticos antes dos pressupostos teóricos tem a função de chamar a atenção do leitor para limitações associadas à abordagem das conjunções, justificando, assim, a motivação e a relevância do tema escolhido. No capítulo 2, apresentamos as concepções de linguagem que norteiam os documentos oficiais (Parâmetros Curriculares Nacionais e o Currículo do Estado de São Paulo) e as diferentes concepções de gramática relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa. No capítulo 3, abordamos os conectivos a partir da sua funcionalidade. Fazemos isso a partir da análise, num primeiro momento, das gramáticas mais tradicionais, e depois dos materiais que trabalham com a língua em uso. No capítulo 4, apresentamos uma Sequência Didática (SD) para trabalhar as conjunções. Essa SD foi elaborada com os conhecimentos linguísticos que julgamos necessários que os alunos desenvolvam sobre as conjunções no Ensino Fundamental II. Nesse capítulo, ainda, apresentamos os resultados obtidos com a aplicação da SD. 22 1 Limitações na abordagem dos conectivos na sala de aula Os livros didáticos são um dos recursos mais presentes em sala de aula, auxiliando os professores na organização dos trabalhos pedagógicos. Nesse contexto, é importante para esta pesquisa compreender como é proposto o trabalho com as conjunções, importantes elementos coesivos, nesses materiais. No entanto, por existirem inúmeras coletâneas e sendo impossível realizar uma análise em todas, optamos por três coleções que chegam à escola por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e uma enviada pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, por meio do Programa “São Paulo faz Escola”. As três primeiras coleções selecionadas são: “Português Linguagens” de Cereja e Magalhães (2015); “Universos: língua portuguesa”, Pereira (2015); “Para viver juntos: português” Penteado (2015); por último o Material de Apoio ao Currículo do Estado de São Paulo As três primeiras coleções selecionadas são: (1) “Português Linguagens” de Cereja e Magalhães (2015); (2) “Universos: língua portuguesa”, Sequeto (2015); (3) “Para viver juntos: português” (2015); por último, (4) o Material de Apoio ao Currículo do Estado de São Paulo (2014). Nesse recorte, as escolhas tiveram motivações distintas. “Português Linguagens” e o “Material de Apoio ao Currículo do Estado de São Paulo” foram selecionados por serem o material utilizado na escola em que o projeto foi desenvolvido, e as coleções “Universos: língua portuguesa” e “Para viver juntos: português” foram selecionadas por serem obras aprovadas pelo MEC, no processo de credenciamento do PNLD. Finalmente, é importante mostrar o que queremos dizer quando usamos o termo “gramática normativa” ou “gramática tradicional” e “gramática contextualizada” na análise dos exercícios das coleções analisadas, pois cada autor desses materiais define no “Manual do Professor” a concepção de língua que adota ao propor o trabalho com a gramática. Quando utilizamos o termo gramática tradicional (ou gramática normativa), estamos nos referindo à concepção de gramática que ensina regras, o certo e o errado e foca em exercícios descontextualizados, que visam à memorização de regras e nomenclaturas. Essa gramática tem como pressuposto teórico que há regras e 23 informações que precisam ser transmitidas ao aluno, sem que haja qualquer reflexão prévia sobre a língua. Ao utilizarmos gramática contextualizada estamos nos referindo à perspectiva do ensino de gramática pelo viés da interação comunicativa e do funcionamento textual- discursivo, que vê a língua como uma ação interlocutiva situada e presa pela reflexão. Feitas estas considerações iniciais, passamos à análise dos materiais, tendo como foco de observação as conjunções que estão dentro da “coesão sequencial frástica” (KOCH, 2001), nos exercícios propostos para o desenvolvimento da compreensão e apreensão do aluno desse conteúdo. Para esta análise buscaremos compreender qual o objetivo dos exercícios propostos e qual concepção de língua subjaz nesses. A primeira coleção a ser analisada é “Português Linguagens” de Cereja e Magalhães (2015). Essa obra está disposta em 4 unidades, e cada unidade em 4 capítulos. Cada unidade está organizada em torno de um tema, que segundo os autores, são escolhidos levando-se em consideração as recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais quanto a faixa etária, temas transversais (meio ambiente, ética, pluralidade cultural etc) grau de interesse. Os capítulos, por sua vez, são subdivididos em 5 seções: Estudo do Texto; Produção de texto; Para escrever com adequação/coerência/coesão/expressividade; A língua em foco e De olho na escrita. Diante do recorte proposto por este trabalho, iremos nos deter na seção A língua em foco. Cereja e Magalhães pontuam que procuram redimensionar o ensino da língua portuguesa, procurando não focar apenas na gramática tradicional, mas em questões como enunciado, texto e discurso, intencionalidade linguística, o papel da situação de produção, preconceito linguístico, variedades linguísticas, semântica, variações de registro. Os autores assumem que a língua não é estanque, um sistema fechado, mas sim como um processo de interação, de agir e atuar sobre o outro. Dessa forma, os autores dizem que o trabalho linguístico não se resume a frase, mas busca o domínio do texto. Por fim, concluem que utilizam a gramática normativa (tradicional), as gramáticas de uso (gramática internalizada do falante) e a gramática reflexiva (explora os aspectos ligados à semântica e ao discurso). 24 Seguindo “os fios condutores” apontados pelos autores, iniciamos as observações pelo livro do 6º ano. Nesse volume os únicos exercícios com os conectivos aparecem na unidade 4, capítulo 2, p. 236-237. O conteúdo é trabalhado por meio de seis exercícios, sendo que desses apenas dois com as conjunções. Esses exercícios são propostos a partir de textos, o que nos permite perceber que há uma preocupação em ensinar os conteúdos gramaticais de forma contextualizada. Num desses exercícios, apresentado na figura 2, o enunciado apresenta o conceito de coesão textual e pede ao leitor que observe com atenção o primeiro parágrafo. O exercício tem questões “a” e “b”. No item “b”, o exercício de múltipla escolha, destaca-se a conjunção “mas” e pede-se que o estudante indique qual o melhor sentido expresso por este conectivo dentro do contexto dado. 25 Figura 1. Atividade 6º ano Fonte: (CEREJA; MAGALHÃES, 2015a, p.237). 26 Podemos perceber pela análise do exercício que há uma preocupação dos autores em trabalhar a ideia que essa conjunção estabelece no texto apresentado. Após esse exercício há uma nova conceituação sobre o que é coesão e se propõe uma nova leitura e a proposição de um exercício parecido com o anterior, entretanto, nesse o estudante deve dizer a ideia que as conjunções “mas” e “e” estabelecem numa das frases do texto lido. Nos parece que os exercícios são poucos para auxiliar os estudantes a desenvolverem a competência para utilizá-los em suas produções escritas, além disso há também uma preocupação muito maior em conceituar a coesão do que mostrar ao aluno como ela acontece, permitindo que o próprio estudante vá construindo esse conceito a partir das suas reflexões. Esses mecanismos de coesão no livro do sétimo ano são trabalhados na unidade 4, capítulo 3, nas páginas 247 e 248. 27 Figura 2. Atividade 7º ano Fonte: (CEREJA; MAGALHÃES, 2015b, p.247). 28 Figura 3. Atividade 7º ano Fonte: (CEREJA; MAGALHÃES, 2015b, p.248). 29 Nestes exercícios a conjunção trabalhada é o “mas”. Há a preocupação em trazer esse conectivo dentro de um texto. Os três primeiros exercícios são elaborados a partir de uma história em quadrinho do “Calvin”. Essas atividades têm como objetivo auxiliar os alunos a compreenderem as diferenças entre “mas” e “mais”. Desta forma, a atividade 1 traz uma frase em que a conjunção “mas” é utilizada. Depois nas subdivisões “a” e “b” pede-se, respectivamente, que sejam observados os sentidos produzidos por esta conjunção (se oposição ou adição) e que as frases sejam reescritas substituindo o “mas” por outro conectivo sem alterar o sentido. Na sequência, na atividade 3, tem um exercício idêntico ao 1, mas o foco é o intensificador “mais”. Após as atividades é apresentada uma definição de “mas” e “mais”. E para finalizar são apresentados mais quatro pequenos textos, em que estes vocábulos foram retirados. Nestes exercícios pede-se que os discentes preencham as lacunas com um ou outro de acordo com o contexto. Constatamos que são poucos os exercícios com as conjunções e que o foco deste não é o papel de conectivo “mas” tem dentro do texto, mas permitir que o discente aprenda a utilizar estas palavras que muitas vezes, quando estamos aprendendo, parecem não ter diferença. Não achamos este trabalho dispensável, contudo seria importante que os estudantes tivessem um trabalho mais consistente com as conjunções. Pois as relações estabelecidas por estes conectivos nos textos têm um papel importante na ampliação da habilidade escrita. Quanto ao livro do oitavo ano, identificamos diversos exercícios nas unidades 3 e 4. Estes são elaborados a partir de contextos comunicativos reais (textos em gêneros textuais diversos). Entretanto, alguns são realizados com frases soltas. Um exemplo destes exercícios é o 5 na unidade 3, capítulo 1, página 15 30 Figura 4. Atividade 8º ano Fonte: 8º ano (CEREJA; MAGALHÃES, 2015c, p.152). Esse exercício solicita que o estudante una duas frases garantindo que a coesão e a coerência sejam garantidas. Neste enunciado também são apresentadas várias conjunções que deverão ser utilizadas para a junção das frases. Percebemos que embora não haja um texto o exercício permite ao aluno ir ampliando seu conhecimento sobre as relações que as conjunções estabelecem e ainda permitem ao professor trabalhar com conectivos que não são muito usados pelos alunos. Deste modo, há a possibilidade de que este indivíduo seja menos repetitivo ao produzir seus textos. Outra atividade interessante é a número 4 da unidade 4, capítulo 1, página 222 (Figura 5): 31 Figura 5. Atividade 8º ano Fonte: 8º ano (CEREJA; MAGALHÃES, 2015c, p.222). 32 Aborda-se neste exercício a conjunção “e” e as relações de sentido que este conectivo pode estabelecer dependendo do contexto em que está inserido. Com esta atividade o aluno é levado a refletir sobre o papel da conjunção “e”. Podendo desta maneira compreender que uma mesma conjunção, dependendo do contexto, adquiri sentidos diferentes, o que os auxilia na compreensão das conjunções como importantes elementos para a produção textual. Tendo em vista os volumes anteriores, percebemos que há uma intensificação no trabalho com as conjunções. Acreditamos que este aumento se deve as orientações curriculares, que indicam que neste ano/série este conteúdo é trabalhado por meio das orações coordenadas. A opção por este conteúdo, nesta série segue as divisões da gramática tradicional. Por fim, ao analisarmos o livro do nono ano percebemos que as conjunções estão presentes desde os primeiros capítulos e que há uma intensificação do trabalho com as conjunções. Novamente este aumento deve-se ao conteúdo ensinado: as orações subordinadas. As conjunções são trabalhadas, em sua maioria, por meio de contextos comunicativos reais. Entretanto é neste volume que encontramos mais exercícios que seguem as orientações tradicionais, pedindo ao estudante que classifique orações. Um exemplo é o exercício 2, da unidade 1. 33 Figura 6. Atividade 9º ano Fonte: 9º ano (CEREJA; MAGALHÃES, 2015d, p.102). O enunciado deste exercício traz uma afirmação sobre período composto. Depois divide-se em “a” e “b”. Em “a” pede que o aluno ache, no texto de apoio (propaganda), o período composto por coordenação e em “b” que encontre o período composto por subordinação e a classifique. Em “a” a frase seria “Bebeu e está dirigindo?”. O sentido que a conjunção “e” estabelece neste enunciado não é explorado e em “b” seria a frase “Se o carro pegar fogo, será cremado”. Novamente a relação que o “se” estabelece dentro do contexto comunicativo é negligenciado. Fixa-se o trabalho apenas na capacidade de reconhecer os principais recursos para a montagem de orações compostas, observando apenas o tipo de relação de dependência que estabelecem. As conjunções são observadas 34 apenas para classificar as orações, sem que haja reflexão sobre o tipo de relação que estabelecem. Acha-se a conjunção e a classifica, seguindo a tabela das orações coordenadas e subordinadas. A segunda coleção analisada é “Universos: língua portuguesa” de Pereira (2015). Essa obra tem 4 volumes e todos são divididos em 4 unidades, sendo que cada uma dessas se subdivide em três capítulos. Cada capítulo tem uma seção denominada Antes da Leitura, Durante a leitura, Depois da Leitura, A Gramática na reconstrução dos sentidos do texto, Avalie o que você aprendeu. A concepção adotada para a proposição de exercícios que visam o ensino da Língua Portuguesa, segundo a autora, é o reflexivo, tendo o texto como unidade de ensino. Entretanto, esse ensino linguístico é dividido em dois momentos: A gramática na reconstrução dos sentidos do texto, em que são privilegiados aspectos gramaticais mais voltados para o contexto de uso e o Mais Gramática em que há uma volta à gramática normativa. Começamos a análise dos exercícios que trabalham com os conectivos desse material pelo livro do sexto ano. É importante ressaltar que os exercícios com conjunções aparecem no capítulo 12, na seção Mais Gramática. Como sinalizado pela autora, em suas orientações ao professor, o trabalho com as conjunções é realizado por meio da apresentação do conceito teórico sobre os conectivos. Esta opção metodológica, em nossa opinião, negligencia o conhecimento que a criança já tem sobre este conteúdo. Pois apresenta uma definição pronta, sem uma reflexão que permita ao estudante compreender qual a função das conjunções dentro do contexto comunicativo e assim possa construir o conceito. Quando a criança reflete primeiro sobre o sentido das conjunções dentro do texto, sobre as relações de dependência que ajudam a estabelecer nesse, isso lhe permite usá-las com propriedade e não apenas gravar nomes. Contudo, nas atividades do 6º ano, as conjunções “e”, “ou” e, “portanto”, são abordadas dentro de um contexto comunicativo, o que possibilita que a criança compreenda quando essas são utilizadas, qual o sentido que articulam (Figura 7). 35 Figura 7. Atividade 6º ano Fonte: 6º ano (PEREIRA; BARROS; MARIZ, 2015a, p.227). 36 Entretanto, nessa mesma unidade e página há (como pode ser observado na Figura 7) um exercício cujo enunciado pede que o aluno separe as diversas conjunções que são dadas em uma tabela. Essa tabela é construída tendo cinco divisões, que seguem as classificações gramaticais tradicionais para a coordenação. Observamos, como um problema desse exercício, o fato de não ter um contexto, pois desse modo as crianças passam a associar cada conjunção a uma única relação semântica, o que não acontece em situações comunicativas reais. Outro ponto que chama atenção são os poucos exercícios com esses mecanismos de coesão. Passando a análise do livro do sétimo ano percebemos que também são poucos os exercícios com as conjunções. Por exemplo, a atividade 7 da página 171, da unidade 10, abaixo reproduzida (Figura 8): Figura 8. Atividade 7º ano Fonte: 7º ano (PEREIRA; BARROS; MARIZ, 2015b, p.171). Esse exercício apresenta um pequeno texto. Na sequência há questões “a” e “b”. A questão “a” solicita que o estudante separe as orações desse texto em “explicativa” e “justificativa”. Depois em “b” pede que o discente escolha as conjunções que poderiam ligar estas duas orações sem que o sentido fosse modificado. 37 Percebemos na análise que essa atividade requer da criança um conhecimento que não consolidou ainda: a compreensão do que é período composto. Nos parece que o melhor exercício, nesse momento, seria explorar com as crianças um texto que trouxesse conjunções e as relações de sentido, as articulações que estabelecem e garantem a progressão das ideias desenvolvidas nesse contexto. Dessa maneira o estudante iria compreendendo como utilizar as conjunções para o desenvolvimento dos seus próprios textos. Tomando como referência o livro do oitavo ano, para averiguar o trabalho com as conjunções, temos exercícios que iniciam o aluno na análise dos períodos compostos que serão também trabalhados nos exercícios do 9º. No último ano do Ensino Fundamental II as atividades com as conjunções aparecem nos primeiros capítulos da unidade 1. Esses exercícios trabalham a gramática tradicional (Figura 9). 38 Figura 9. Atividade 9º ano Fonte: 9º ano (PEREIRA; BARROS; MARIZ, 2015c, p.242). 39 Antes de iniciar os exercícios, há a definição de período composto por subordinação. Após a parte teórica, no exercício 1, temos um HQ do Calvin. E no enunciado é solicitado ao aluno que leia esse texto e responda as questões “a”, “b” e “c”. A questão “c”, mais especificamente, trabalha com as conjunções e pede ao leitor que classifique uma oração destacada do texto lido. Esse exercício é bastante próximo aos da gramática tradicional de análise sintática, pois percebemos que não há preocupação com critérios semânticos em primeiro lugar, mas sim com a classificação da frase apresentada. Essas constatações nos levam a compreender que as conjunções aparecem mais intensamente no livro do nono ano. Provavelmente por a autora seguir a divisão das gramáticas tradicionais. Enquanto que os exercícios do sexto e sétimo anos “fogem” um pouco das divisões das gramáticas normativas, pois esse conteúdo é trabalhado por meio da apresentação de várias conjunções dentro de contexto comunicativos (com exceção, dos exercícios comentados anteriormente), o que auxilia os estudantes a ampliarem um pouco o conhecimento sobre esses elementos de coesão. A terceira coleção analisada, “Para viver juntos: português” (2015), tem para cada série autores distintos. Essa coleção está estruturada em 9 capítulos, que estão subdivididos em Converse com os colegas, Estudo do texto, Produção de texto, Reflexão Linguística, Língua Viva, Atividades Globais e Oralidade. Segundo as autoras, o trabalho linguístico é realizado de forma contextualizada e opta-se pela gramática de usos. Após essa breve apresentação da coleção, passamos a sua análise. Nos livros da coleção destinados ao sexto ano do Ensino Fundamental, a coesão é trabalhada por meio das preposições, pronomes e não com as conjunções, foco desse trabalho. No livro do sétimo ano há apenas a sugestão de um trabalho com as conjunções, que está no capítulo 7, na página 230, na seção Produção de Texto, em que se solicita aos alunos que copiem um pequeno texto e completem as lacunas com quatro palavras, entre essas estão duas conjunções, a saber: porém e contudo. Percebemos que a atividade não desenvolve no aluno a consciência linguística necessária para utilizar as conjunções de maneira autônoma, proficiente. Deveriam 40 haver atividades que colocassem para o estudante como esses elementos são utilizados dentro dos textos, qual o papel que assumem nesses enunciados. No livro do 8º ano desta coleção, dentre as coleções analisadas, essa traz a abordagem mais tradicional para o trabalho com as conjunções. Em vários exercícios do livro do oitavo ano pede-se que o leitor faça a classificação das orações apresentadas nas atividades. Os exercícios da página 259, Figura 10, mostram bem essa abordagem. 41 Figura 10. Atividade 8º Fonte: 8º ano (PENTEADO et al., 2015, p.259). 42 Na proposta do exercício 3, o enunciado solicita a leitura de um texto e se divide em questões “a” e “b”. Em “a” apresenta uma frase retirada do texto e solicita que o aluno classifique qual oração coordenada esse enunciado apresenta. O exercício seguinte tem a imagem de um garoto fazendo manobras no skate e a seguinte orientação: escrever dois períodos compostos que contenham uma oração coordenada explicativa e uma conclusiva. A solicitação do exercício nos parece bastante inadequada, pois em situações reais de comunicação não nos preocupamos em utilizar oração coordenada ou subordinada para nos expressarmos. Nossa real preocupação é nos fazer entender de forma clara por nosso receptor. E para alcançarmos esse objetivo utilizamos ambas as orações. Deste modo, a intenção desses exercícios é levar o aluno a decorar o conectivo sem se preocupar com a importância dos sentidos que esses elementos veiculam, dar progressão às ideias, em articular o que se pretende enunciar e as relações de sentido que estabelecem. Outra atividade que expõe esta opção pelo ensino tradicional da conjunção pode ser observada na Figura 11. 43 Figura 11. Atividade 8º ano Fonte: 8º ano (PENTEADO et al., 2015, p.261). 44 Nesta atividade, mais especificamente o item 3, letra “a”, pede-se que o aluno copie duas orações coordenadas alternativas e em “b” questiona-se os sentidos estabelecidos por estas dentro do texto apresentado. Há, ainda, ao finalizar estes exercícios, uma definição teórica sobre a conjunção alternativa. Definição essa que é usada pelas autoras para responder ao questionamento “b”. Observamos assim que o exercício vai encaminhando o aluno para dar a resposta que se espera, sem grandes preocupações em auxiliá-los a refletirem sobre o uso dessa conjunção. Deste modo, o estudante deixa de compreender que as orações coordenadas unidas pela conjunção “ou” mantêm uma relação lógica, que vai justificar a combinação das duas enunciações. Além disso, seria interessante mostrar ao aluno que a conjunção “ou” expressa, como colocado por Neves (2011), as relações de alternância entre um fato e a modificação desse fato; alternância entre um fato e uma eventualidade; alternância entre duas eventualidades. Na análise do livro do nono ano percebe-se a mesma opção pela gramática normativa, pois o foco principal é fazer análises sintáticas. Embora não apareçam os exercícios típicos de análise sintática (várias frases soltas, em que são circuladas as conjunções e as orações classificadas a partir dessa), os exercícios pedem a classificação de frases retiradas de texto previamente dado ou para preencher lacunas com as orações subordinadas e/ou coordenadas previamente estipuladas, como podemos observar nas atividades 2 e 3, Figura 12. 45 Figura 12. Atividade 9º ano Fonte: 9º ano (MACHETTI; STRECKER; CLETO, 2015, p.102) 46 Concluímos que a coleção “Para viver juntos: Português”, embora coloque no Manual do Professor que trabalha com uma gramática de usos, não o faz, trazendo exercícios bem tradicionais para trabalhar as conjunções. Entretanto, não estamos aqui condenando a gramática normativa, mas pontuando que a língua também deve ser trabalhada dentro dos seus contextos de uso. Por fim, passamos à análise do material Caderno do Professor/Caderno, que é enviado pelo governo paulista para as escolas públicas do estado. Esse material tem dois volumes por série e está dividido em situações de aprendizagem. Nas orientações aos professores, aponta que suas unidades apresentam sequências didáticas, que buscam desenvolver no aluno as competências e habilidades de leitura e escrita, que a concepção de Língua que ampara o desenvolvimento das atividades com gramática é a de uso e a forma de avaliação é a contínua. No volume I do Caderno do Professor, página 48, do 6º ano do Ensino Fundamental, há orientação para o trabalho com os conectivos. Depois há um exercício que traz uma atividade que apresenta um trecho do texto “A causa secreta” de Machado de Assis. Nesse excerto, estão grifadas várias expressões que marcam tempo e espaço e servem como elementos coesivos. Como atividade é solicitado que os alunos separem estes termos em uma tabela. 47 Figura 13. Atividade 6º ano Fonte: 6º ano (SÃO PAULO, 2014a, volume I p.48). 48 Percebemos que há uma preocupação em apresentar ao aluno os acontecimentos centrais a que esses vocábulos se ligam. Desse modo, embora não haja um espaço único, destinado ao estudo das conjunções, essas são estudadas dentro do conteúdo “conectivos”. Essa abordagem visa permitir ao aluno compreender os elementos de coesão como importantes instrumentos para a construção da mensagem. Compreendemos essas atividades como mais próximas da gramática contextualizada, pois o foco principal é levar os estudantes a compreenderem os sentidos gerados pelas escolhas lexicais e que estas são intencionais, pautadas no que se deseja comunicar. Exercícios parecidos aparecem no volume I, do sétimo ano. Para trabalhar os conectivos é sugerido ao docente que escolha um texto narrativo sem os conectivos (a comanda aparece para a pontuação e sugere-se o mesmo trabalho com os conectivos, como pode ser averiguado nas orientações da página 44). Depois, pede-se que os alunos leiam em voz alta. Seguindo com as atividades, no exercício 3 se propõe que os alunos trabalhem em duplas para completarem as lacunas deixadas no texto. Após esta atividade, com o auxílio do professor, os estudantes devem compartilhar o que fizeram, observando que diferentes preenchimentos trouxeram diferentes entendimentos para o texto. Depois, para finalizar, o professor é orientado a colocar o texto original na lousa para que se discuta coletivamente se, ao colocar outros conectores, houve interferência no sentido pretendido pelo autor. 49 Figura 14. Comanda 7º ano Fonte: 7ºano (SÃO PAULO, 2014a, volume I, p.44). Outros exercícios, com a finalidade de estudar os conectivos, são sugeridos. Também se propõe ao docente que escolha outros exercícios para trabalhar as dificuldades averiguadas nas produções dos alunos. 50 Observamos que os exercícios trabalham a partir da necessidade dos alunos. Buscam com as atividades sugeridas levar os estudantes a refletirem sobre os usos dos mecanismos de coesão dentro de situações concretas de comunicação. Entretanto, cabe ressaltar que não há um trabalho específico com conjunções. Já no oitavo ano os elementos coesivos são trabalhados de forma indireta por meio do estudo de parágrafos. Podemos observar este trabalho no exercício 2, da página 62, do volume 2. 51 Figura 15. Exercício 2, 8º ano Fonte: 8º ano (SÃO PAULO, 2014a, volume II p.62). Para iniciar apresenta-se um pequeno fragmento textual elaborado especialmente para o material do Estado São Paulo Faz Escola. Depois, o exercício 2 faz questionamentos. No questionamento “d” o aluno deve refletir sobre quais palavras 52 permitiram “ligar” os parágrafos apresentados no texto e qual o sentido que este traz para o contexto enunciativo. Sugere-se ainda que o professor realize a mesma atividade com outros textos. A proposta é interessante, embora seja muito pouco explorado o uso das conjunções. Embora se oriente ao docente que desenvolva mais atividades com o tema há muito conteúdo e pouco tempo para desenvolvê-lo. Desse modo nos parece improvável que o estudante desenvolva conhecimento suficiente que lhe permita usar as conjunções de forma eficiente. Outro ponto discutível é que os textos trabalhados sejam escritos especialmente para o desenvolvimento das atividades, o que afasta o ensino de situações reais de uso. Por fim, concluímos as análises com a observação do livro do 9º ano. Percebemos nesse ano uma intensificação do trabalho com as conjunções. Vemos, pelos exercícios propostos, uma “mistura” da gramática tradicional com a contextualizada, com ênfase na gramática tradicional. Um exemplo de exercício dentro da gramática tradicional aparece na página 81, volume I. 53 Figura 16. Atividade 9º ano Fonte: 9º ano (SÃO PAULO, 2014d, volume I,p.81). 54 Esse solicita que o professor separe os discentes em grupo para pesquisarem em gramáticas normativas e livros didáticos os tipos de conjunções. E que depois escrevam duas frases para cada uma das conjunções subordinadas. Diante do exposto, percebemos que há nessa atividade a opção pela gramática tradicional e nos parece um exercício incapaz de auxiliar no desenvolvimento da competência escrita dos alunos, pois o objetivo primordial do exercício é levar o aluno a decorar o nome das relações estabelecidas pelas conjunções. Negligencia-se que toda fala tem um objetivo e que é em função desse que utilizamos cada elemento linguístico. Concluindo nossa análise, percebemos que há ainda muito da gramática tradicional nos livros e materiais didáticos, embora haja uma grande variedade de exercícios que já tragam abordagens mais contextualizadas das conjunções e que permitem um desenvolvimento mais efetivo dessas para auxiliar os alunos a escreverem de forma mais proficiente. Outro ponto que também nos parece claro é que as conjunções são trabalhadas mais intensamente no 9º ano. Acreditamos que isso ocorra porque esses materiais ainda seguem as divisões de conteúdo tradicionais. Esse é um fator negativo, pois para escrever com proficiência os alunos devem dominar esse conteúdo, o que em nossa concepção é impossível se for trabalhado apenas no último ano do Ensino Fundamental II de forma ostensiva e seguindo apenas a forma tradicional de análise sintática e morfológica. Cabe ressaltar, no entanto, que após as análises dos materiais didáticos, nos parece que o material proposto pelo Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo pressupõe um trabalho mais pessoal do professor com a Língua Portuguesa, permitindo ao docente adaptar melhor a matéria a ser dada a cada turma com a qual irá trabalhar, o que privilegiará realmente a língua em uso. O objetivo das reflexões apresentadas é compreender quais são os pontos frágeis dos materiais apresentados e por meio dessa análise elaborar uma sequência didática (SD) que desenvolva a consciência dos discentes sobre o uso das conjunções, de forma que os auxilie no desenvolvimento da habilidade escrita. Nessa SD serão propostas atividades focadas na gramática de usos e reflexiva, de forma contextualizada, que poderá ser aplicada em qualquer ano/série do Ensino 55 Fundamental II e, até mesmo no Ensino Médio, desde que realizadas as adaptações necessárias pautadas no desenvolvimento cognitivo de cada turma. 56 2 Concepções de linguagem, de gramática e de ensino Neste capítulo apresentamos, de forma sucinta, as concepções de Linguagem que norteiam o trabalho dos professores de Língua Portuguesa nas escolas do Estado de São Paulo, por meio de uma breve apresentação dos documentos oficiais: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e o Currículo do Estado de São Paulo e alguns autores que abordam o tema específico do nosso trabalho, as conjunções, e dão embasamento para a elaboração da SD. 2.1 Concepções de Linguagem A compreensão do homem sobre os diversos conceitos (religião, família, escola, aprendizagem etc.) determina sua forma de ser e agir em sociedade. Nesse sentido, o modo como o professor concebe o ensino de Língua Portuguesa irá interferir no modo como pensa e ensina a língua, pois como bem pontua Antunes Em se falando de ensino, os pontos de vista sobre os fenômenos linguísticos são decisivos: o que se faz em sala de aula; o que se deixa de fazer; o que se escolhe, o que se rejeita; o que se prioriza; o que se adia; tudo tem seu começo naquilo que acreditamos que seja linguagem, língua, gramática, texto e, ainda, os complexos processos de aprender e ensinar. Toda proposta pedagógica da escola, toda metodologia adotada, cada postura do professor têm seu fundamento maior nos pontos de vista, nas concepções defendidas (ANTUNES, 2014, p.16). Seguindo nesse direcionamento, Travaglia (2009) pontua três possibilidades distintas de conceber a linguagem, que podem ser organizadas dentro de três principais vertentes: linguagem como expressão do pensamento; linguagem como instrumento de comunicação e como meio objetivo para a comunicação; linguagem como forma ou processo de interação. A linguagem como expressão do pensamento parte do princípio que as pessoas não conseguem se comunicar bem porque não pensam. Nessa concepção, para Travaglia (2009, p.21), a expressão ocorre dentro da mente e quando exteriorizada seria apenas uma tradução e assim “o modo como o texto, que se usa em cada 57 situação de interação comunicativa está constituído não depende em nada de para quem se fala, em que situação se fala (onde, como, quando), para que se fala Na concepção da linguagem como instrumento de comunicação e como meio objetivo para a comunicação a língua é concebida como um código, um conjunto de signos que se combinam de acordo com regras específicas e para transmitir uma mensagem os indivíduos devem dominar esse código, em que [...] o falante tem em sua mente uma mensagem para transmitir a um ouvinte, ou seja, as informações que quer que cheguem ao outro. Para isso ele coloca em código (codificação) e a remete para outro através de um canal (ondas sonoras e luminosas). O outro recebe os sinais codificados e os transforma de novo em mensagem (informações) (TRAVAGLIA, 2009, p. 22). A terceira concepção de linguagem como forma ou processo de interação pressupõe que o ser humano ao usar a língua não deseja apenas traduzir um pensamento ou traduzir informações. Mas sim, influenciar, agir e realizar ações sobre seus interlocutores. Vale lembrar, de maneira geral, que linguagem como forma ou processo de interação é a concepção de linguagem adotada por documentos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais e o Currículo do Estado de São Paulo, os quais orientam o trabalho com a língua portuguesa no ensino fundamental e médio, conforme apresentado na sequência. 2.2 O ensino de Língua Portuguesa e as conjunções nos Parâmetros Curriculares Nacionais e no Currículo do Estado de São Paulo Nesta seção, apresentam-se algumas das características do ensino de Língua Portuguesa e, especificamente, das conjunções, com base na sequência de itens que compõem os PCN e o Currículo do Estado de São Paulo. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a perspectiva adotada para o trabalho com a Língua Portuguesa é o uso-reflexão-uso, o que implica em trabalhar a língua a partir de uma visão mais funcional, propondo um ensino que compreenda os indivíduos e a relação desses com os locais em que estão inseridos. 58 A partir dessa concepção funcional, a gramática aparece dentro do trabalho realizado com a escrita e a oralidade. Mas, é especificamente no momento em que se direciona o trabalho com a escrita que há apontamentos nos PCN de como trabalhar com a metalinguagem4, a gramática. Conforme consta nos PCN (BRASIL, 1998, p. 53), as atividades de análise linguística são aquelas que permitem que uma determinada característica da Linguagem seja analisada reflexivamente de forma epilinguística5 e metalinguística, sendo que a primeira deve ser anterior ao processo de análise da segunda, para que haja assim real aprendizado pelos alunos. Ou seja, a questão não é ensinar o certo ou o errado, por meio de exercícios mecânicos que levam ao mero decorar de regras, mas priorizar a reflexão, que permita utilizar a língua considerando os contextos de comunicação, sabendo coordenar o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz um determinado assunto. Para ilustrar essas colocações, no caso específico das conjunções, não deveríamos trabalhar com exercícios que trazem frases soltas e pedem ao aluno que classifique as orações coordenadas (ou mesmo subordinadas) em aditivas, adversativas, alternativas, conclusivas e explicativas, mas propor atividades que levem o aluno a refletir sobre o sentido que cada conjunção, ao ser utilizada, veicula no texto. Uma dessas propostas seria a de Antunes (2017), que propõe trabalhar com o reconhecimento das conjunções dentro do texto, observando o tema principal desse, seu objetivo central, o núcleo pretendido para as ideias desenvolvidas, não apontando apenas as conjunções como aditivas ou alternativas, por exemplo, mas percebendo as relações de sentido que esses conectivos criam e sinalizam para auxiliar o emissor a transmitir a mensagem que deseja, para desenvolver o tema que se propôs. De acordo com os PCN, o ensino da gramática deve apoiar-se em dois fatores: o primeiro remete à capacidade humana de refletir, analisar, pensar sobre os fatos e fenômenos da linguagem, já o segundo é a propriedade que a linguagem tem de poder referir-se a si mesma, de falar sobre a própria linguagem. 4 A metalinguística relaciona-se à análise descritiva, que ocorre por meio da categorização e sistematização. 5 Análise epilinguística conduz a reflexão para o uso, no interior da atividade linguística em que se realiza. 59 Dessa forma, no decorrer desse documento, especificamente no subtítulo “Aspectos Gramaticais”, é pontuada a função do ensino da gramática A propriedade que a linguagem tem de poder referir-se a si mesma é o que torna possível a análise da língua e o que define um vocabulário próprio, uma metalinguagem. Em relação a essa terminologia característica, é preciso considerar que, embora seja peculiar a situações de análise linguística (em que inevitavelmente se fala sobre língua), não se deve sobrecarregar os alunos com um palavreado sem função, justificado exclusivamente pela tradição de ensiná-lo. O critério do que deve ser ou não ensinado é muito simples: apenas os termos que tenham utilidade para abordar os conteúdos e facilitar a comunicação nas atividades de reflexão sobre a língua excluindo-se tudo o que for desnecessário e costuma apenas confundir os alunos. (BRASIL, 1998, p. 60). Esse entendimento mostra o que não deve ser feito no ensino de gramática: não sobrecarregar os alunos com classificações desnecessárias; realizar o ensino por meio do processo de reescrita dos textos dos próprios estudantes, partir do que eles já sabem e assim, progressivamente, desenvolver a capacidade de monitorar sua própria atividade linguística. Percebe-se claramente que esses direcionamentos apontam para um trabalho que deve ser feito por meio de um ensino contextualizado, entretanto há também uma orientação para que o trabalho metalinguístico não seja esquecido, para que a língua seja também abordada no ensino como um sistema, o que implica que ela tem regras que devem ser observadas ao escrever. Na segunda parte dos PCN, no espaço dedicado aos objetivos de Língua Portuguesa para o segundo ciclo6, novamente, é pontuada a necessidade de levar os alunos a produzirem textos que sejam coesos e coerentes, dentro dos gêneros previstos para o ciclo, que se adequem aos objetivos e leitores previamente determinados. Essa questão será abordada no capítulo “Tratamento didático” do documento, cujo foco está no trabalho com a coesão, ao apresentar o que o discente deve aprender. A coesão aparece descrita nos conteúdos gerais previstos para o ciclo como a “utilização de recursos coesivos oferecidos pelo sistema de pontuação e pela introdução de conectivos mais adequados à linguagem escrita, expressões que marcam 6 Segundo Ciclo: termo usado para se referir aos anos de ensino que vão do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental. 60 temporalidade e causalidade, substituições lexicais, manutenção do tempo verbal, etc.” (BRASIL, 1998 p.84). Nesse ínterim, o Currículo do Estado de São Paulo também pontua as diretrizes para o trabalho a ser desenvolvido nas aulas de Língua Portuguesa. Nesse documento, a língua também é essencialmente uma língua que deve ser ensinada dentro de contextos comunicativos, ou seja, não a partir de frases ou períodos soltos, mas em contextos de real interação comunicativa, em seu espaço de interação entre as pessoas, num espaço histórico-social determinado. Diferentemente dos PCN, o Currículo Oficial de São Paulo apresenta os conteúdos de leitura, escrita e oralidade de forma concomitante e é apontada a necessidade de que a coesão seja ensinada já no sexto ano do Ensino Fundamental. Contudo, não são pontuadas habilidades específicas para o trabalho com os elementos coesivos, mais especificamente com as conjunções. Mas se propõe que a língua seja estudada como [...] um espaço de interação entre as pessoas, num determinado contexto de comunicação, implica a compreensão da enunciação como eixo central de todo sistema linguístico e a importância do letramento, em função das relações que sujeito mantém em seu meio (SÃO PAULO, 2010, p. 55). No sétimo ano o trabalho com os conectivos é referendado de forma mais pontual: pede-se que sejam trabalhados os elementos coesivos e a habilidade que deve ser desenvolvida é “distinguir conectivos e demais elementos de coesão próprios dos relatos orais e escritos” (SÃO PAULO, 2010, p. 61). Para esse ano também são pontuadas as competências cobradas nas provas do SARESP7 (Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo), a saber: “Competência III-Coesão/Coerência- Organizar o texto de forma lógica, demonstrando conhecimento dos mecanismos coesivos linguísticos e textuais necessários para a construção coerente do texto” (SÃO PAULO, 2011, p. 61). Essas mesmas competências e habilidades são requeridas no oitavo ano, entretanto, os elementos coesivos só aparecerão nos conteúdos de forma bem pontual 7 O Sistema de Avaliação do Estado de São Paulo (SARESP) é uma prova externa, aplicada anualmente desde de 1996, pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e tem como objetivo avaliar de forma sistemática o rendimento do Ensino Básico no estado. 61 no nono ano. Nesse ano, os estudos linguísticos enfatizam os elementos coesivos e, mais especificamente, as conjunções. Entre os conteúdos abordados encontram-se: as preposições e conectivos, período composto por coordenação, articuladores sintáticos argumentativos, conjunção, período composto por subordinação. Após esses breves apontamentos sobre as diretrizes para o trabalho com as conjunções nos documentos oficiais, percebe-se a necessidade de trabalhar com a coesão para auxiliar os alunos na produção de textos mais coerentes. Entretanto, ao analisarmos os materiais oficiais, constatamos que as conjunções são estudadas com maior profundidade apenas no nono ano. Desse modo, percebe-se que embora haja uma mudança da perspectiva do ensino de Língua Portuguesa quanto aos aspectos linguísticos, de forma geral, o ensino ainda é bastante “tradicional”. Quanto ao trabalho com as conjunções, especificamente, tem-se esse tradicionalismo marcado pelo momento de introduzir e direcionar o conteúdo das conjunções, o qual está focado no estudo das orações coordenadas e subordinadas por meio da classificação dos tipos de oração e com a função dos termos constituintes dessas orações, em detrimento do estudo que se paute pela compreensão semântica e pragmática desses elos de ligação. Ainda que nesses documentos ressalte-se que o trabalho com a sintaxe é importante, desde que seja realizado por meio de um trabalho que leve à reflexão sobre a língua e que permita aos alunos utilizarem os elementos linguísticos que estão à disposição para produzirem comunicação de forma clara e que atenda aos mais variados contextos de interação social, percebemos que a concepção da gramática normativa continua sendo muito utilizada e valorizada. Portanto, a linguagem e as gramáticas de uso, reflexiva, teórica, entre outras, são meios relevantes para que o aluno possa ampliar e alcançar a sua competência comunicativa, atendendo assim às diretrizes que são estabelecidas tanto nos PCN quanto no Currículo Oficial de São Paulo. Após compreendermos quais as orientações dos documentos oficiais para o trabalho com a língua portuguesa no Ensino Básico, na seção seguinte apresentaremos algumas concepções de linguagem que estão presentes no trabalho. 62 2.3 As gramáticas de uso, reflexiva, teórica, normativa e funcional: meios para que o aluno alcance a competência comunicativa Sabe-se que cada falante adquire e internaliza a língua na variedade que é predominante em seu meio. Dessa forma, o objetivo do professor de Língua Portuguesa é auxiliar o estudante a ampliar a sua capacidade de utilizar a língua, desenvolvendo sua competência comunicativa (a capacidade comunicativa é entendida, aqui, como a competência de utilizar a língua nas mais variadas situações de interlocução). Entretanto, essa competência comunicativa só pode ser alcançada por meio de um ensino da língua que conduza o estudante a pensar, refletir sobre a sua língua. Esse ensino pode ser de três tipos: prescritivo, descritivo e produtivo, compreendidos a partir das contribuições de Halliday, McIntosh e Strevens, apresentadas por Travaglia (2009). O ensino prescritivo tendo como principal objetivo levar o estudante a substituir seus próprios padrões de atividades linguísticas, considerados como errados/inaceitáveis por outros corretos/aceitáveis; o descritivo mostra como a língua funciona, observa as habilidades já adquiridas sem procurar alterá-las, mas mostrando como podem ser utilizadas, e o produtivo tem o objetivo de ensinar novas habilidades linguísticas, ampliando os recursos que o estudante possui e o capacitando a compreender todas as potencialidades de sua língua. Cabe aqui pontuarmos que tanto os PCN quanto o Currículo do Estado de São Paulo orientam o professor a um ensino produtivo, entretanto também sugerem algumas ações do ensino descritivo, principalmente nos trabalhos linguísticos. A partir dessa ótica de ensino (o ensino produtivo), torna-se necessário compreender que a gramática é analisada por meio da perspectiva da linguagem como forma de atuação social e se faz presente nas interações de cada um dos indivíduos, e por isso, está presente sempre que falamos ou dizemos qualquer coisa. Na ótica de Travaglia (2009, p. 28) a “Gramática corresponde ao saber linguístico que o falante de uma língua desenvolve dentro de certos limites impostos pela sua própria dotação genética humana, em condições apropriadas de natureza social e antropológica”. 63 Sob essa perspectiva teórica, não há o conceito de erro, mas sim o uso inadequado da língua em uma situação comunicativa e para desenvolver a habilidade de adequar sua linguagem aos contextos comunicativos a que será exposto ao longo da sua vida, o indivíduo deve ter a competência gramatical, textual e discursiva. Todavia, o que se pretende aqui é desenvolver a aprendizagem da competência gramatical ou linguística dos estudantes em relação ao uso das conjunções, compreendendo a competência gramatical como a capacidade de cada indivíduo de gerar sequências linguísticas gramaticais pelo estabelecimento e uso de regularidades linguístico-discursivas de forma reflexiva. Dessa forma, o ensino das conjunções será proposto por meio de uma abordagem funcional da língua. Torna-se relevante, assim, uma breve apresentação de alguns conceitos e tipos de gramática, por estarem esses presentes em muitas obras que serão utilizadas e mencionadas. Tal procedimento justifica-se por permitir aos possíveis receptores, que não estão familiarizados com os termos, compreender as concepções apresentadas no trabalho. Outro ponto relevante para que essas formas de abordagem da gramática sejam aqui explicitadas é o fato de interferirem no trabalho que é realizado pelo professor, que deve conhecê-las para eleger aquela que melhor atenda às necessidades de seus alunos. Como destaca Travaglia (2009), não há necessidade de que essas abordagens sejam trabalhadas de forma estanque com os alunos, mas deve haver, por parte do professor, compreensão dos motivos para que opte por uma ou outra num dado momento do desenvolvimento do trabalho que realiza com sua turma. Diante do contexto anteriormente explanado, apresenta-se, no próximo tópico, a definição das abordagens gramaticais e os tipos de gramática. 2.3.1. As concepções de gramática São três os conceitos principais de gramática: normativo, descritivo e internalizado e a partir desses se desenvolvem os tipos de gramática. A primeira concepção, a normativa, prescreve regras para o bom uso da língua. Nessa abordagem será considerado gramatical a produção (oral e escrita) que segue 64 às regras que postulam o que é permitido ou não para o uso do falar e escrever. Essa concepção se basearia no ensino prescritivo. No caso da abordagem descritiva, a gramática é entendida como “um sistema de noções mediante as quais se descrevem os fatos de uma língua, permitindo associar a cada expressão dessa língua, uma descrição estrutural e estabelecer suas regras de uso, de modo a separar o que é gramatical do que não é gramatical” (TRAVAGLIA, 2009, p. 27). Nessa abordagem o ensino será o descritivo e a gramática descritiva analisará a língua a partir do uso que delas faz o falante na produção real de seus enunciados. A terceira concepção compreende a língua como um conjunto de variedades que são utilizadas pelos falantes de uma sociedade, observando-se as exigências da situação de comunicação a qual se está exposto. Nessa abordagem, saber gramática, segundo Franchi (apud TRAVAGLIA, 2009, p. 28) [...] não depende, pois, em princípio da escolarização, ou de quaisquer processos de aprendizado sistemático, mas da ativação e amadurecimento progressivo (ou da construção progressiva), na própria atividade linguística, de hipóteses sobre o que seja linguagem e de seus princípios e regras. Desse modo, essa última concepção de gramática seria a internalizada e o ensino produtivo. 2.3.2. Os tipos de gramática A partir das concepções de gramática verificam-se os vários tipos de gramática, a saber: a normativa, a descritiva e internalizada. Entretanto, encontram-se ainda outros tipos, que derivam da estrutura e funcionamento da língua: a gramática implícita, explícita ou teórica, reflexiva, a funcional além das gramáticas: constrastiva ou transferencial, geral, universal histórica e comparada. Diante da diversidade dos tipos de gramática, apresenta-se a seguir um breve relato das gramáticas de a) uso, b) reflexiva, c) teórica, d) normativa e, e) funcional. a) A gramática de uso: essa pode ser definida como “uma gramática que relaciona padrões gramaticais e padrões discursivos, abrigando estrutura e função” 65 (NEVES,1997, p.15). Para Travaglia, esse tipo de gramática “se estrutura em atividades que buscam desenvolver automatismo de uso das unidades, regras e princípios da língua (ou seja, dos mecanismos destas), bem como os princípios de uso dos recursos das diferentes variedades da língua” (TRAVAGLIA, 2009, p. 111). Assim, percebe-se que essa abordagem da gramática compreende que o indivíduo usa a gramática, visto que não fala “a menino” e sim “o menino”, mas que esse não é consciente dessa gramática. Dessa forma, essa abordagem trabalharia focando na capacidade que os indivíduos possuem de internalizar as regras gramaticais mesmo sem saber defini-las. b) A gramática reflexiva: a gramática reflexiva leva o aluno a conscientizar-se dos arranjos linguísticos que já possui inconscientemente e trabalha, ainda, com os recursos linguísticos que ele não domina, levando-o a construir habilidades linguísticas, por meio de um trabalho produtivo e não apenas uma descrição. Ou seja, ao invés de o professor passar a teoria gramatical pronta para o aluno, são selecionadas atividades que levam o estudante a compreender a estrutura da língua. Por exemplo, se o professor deseja ensinar o plural para os alunos, esse profissional trará várias frases no singular e no plural e levará a turma a pensar o que diferencia uma frase da outra. c) A gramática teórica: é definida por Travaglia (2009, p.215) como: “uma gramática explícita, é uma sistematização teórica a respeito da língua, dos conhecimentos a seu respeito, construída utilizando-se uma metalinguagem apropriada estabelecida segundo as teorias e modelos da ciência linguística para esse fim”. Essa abordagem tem como finalidade mostrar ao aluno que a língua é um sistema com forma e função próprias, e desse modo levar o aluno a refletir sobre a sua língua. Nessa gramática o professor apresenta a estrutura da língua, por exemplo, define o que são os adjetivos e depois passa uma lista de frases, solicitando aos alunos que grifem os adjetivos que estão presentes nesses enunciados. d) A gramática normativa: pode ser definida como o trabalho realizado por meio apenas da língua culta, a norma adotada como oficial para o país. Tem como foco 66 principal o estudo da língua escrita em detrimento da oral, e por muito tempo, essa foi a abordagem das escolas brasileira, sendo ainda hoje muito presente no ambiente escolar, por meio da adoção da gramática tradicional. Compreende-se o termo “gramática tradicional” por meio do enfoque dado à língua pelo viés da gramática normativa, ou seja, que tem como ponto de partida o estudo dos elementos linguísticos como um fim em si mesmo, em que não há uma abordagem que dialogue com contextos reais de produção. Nessa concepção há apenas a apresentação de regras que apontam o que é certo ou errado, pautado nas determinações da linguagem culta, ignorando qualquer outra variedade linguística. Dessa maneira, o ensino de Língua Portuguesa é feito por meio de atividades pautadas em frases soltas e há predileção por exercícios de caracterização e sistematização. De acordo com Lakoff citado por Abreu (1997, p. 121) Segundo a teoria clássica, as categorias gramaticais se distribuem por conjuntos claramente separados, definidos por propriedades compartilhadas por todos os membros do grupo. A tradição gramatical do Ocidente se assenta nessa convicção, que atravessa igualmente a gramática portuguesa. Na base dessa tradição, está a crença de que a língua espelha o mundo, mas com ele não se confunde, e suas categorias são definidas a partir de propriedades essenciais. Mais precisamente, a língua é feita de símbolos relacionados com as coisas. Com isso, as categorias gramaticais se distanciam da percepção do mundo que nos cerca, pois mente e corpo são aqui considerados como entidades independentes, sustentando-se ditas categorias como construtos sem a carne de que são feitos seus criadores, “desencorpando-se” a língua, por assim dizer. Nesse sentido, corrobora Antunes (2014, p.27) ao afirmar que “confere-se a gramática o estatuto de componente único, de componente suficiente ou mais significativo que outros. É a gramática, entendida apenas como um conjunto de normas, de prescrições”. Um exemplo do que disse a autora seriam os exercícios de análise sintática em que se pede ao aluno que determine o sujeito de uma frase apenas para que decore termos como sujeito oculto, sujeito indeterminado, etc sem que seja explorado que ao utilizarmos um ou outro buscamos alcançar um objetivo específico, um efeito de sentido. e) A gramática funcional: por fim, a gramática funcionalista seria, na definição de Neves (2010, p.73), aquela que se fixa na noção de sistema como um conjunto de 67 escolhas e na noção de estrutura linguística como uma organização em diferentes níveis. Isso implica dizer que a gramática funcionalista estuda como a língua se manifesta nas diferentes circunstâncias de interação, busca compreender quais os processos para a produção dos textos, sejam orais ou escritos, formais ou informais, nos vários contextos de comunicação. Um exemplo seria trabalhar com o gênero receita culinária. O professor questiona os alunos sobre a estrutura do texto, sobre a ordem das orações, se essas são aleatórias ou têm um critério, se há uma ordem para que os verbos apareçam, se há mais períodos simples ou compostos. Dessa forma o aluno compreende que numa receita o emissor utiliza a forma do imperativo para direcionar as ações do receptor, que esses mesmos verbos aparecem no início por retratar as ações necessárias para a elaboração da comida, que utiliza mais o período simples para ser o mais objetivo possível e que a sequência em que aparecem os ingredientes e as instruções não são ao acaso, mas levam quem está fazendo a receita a se lembrar da ordem em que cada item tem que ser utilizado. Castilho (2016, p. 68) corrobora ao destacar que a gramática funcional tenta “correlacionar as classes, as relações e as funções com as situações sociais concretas em que elas foram geradas. Para situar a língua em seu contexto social, ela ultrapassa o limite da sentença e avança na análise de textos”. Após essas colocações, nesse trabalho, a abordagem adotada para o desenvolvimento de atividades que levem o aluno a desenvolver uma consciência linguística, para tornar-se autônomo no uso da língua em variados contextos de comunicação, tem foco na gramática de usos e reflexiva pois, como Travaglia (2009) ressalta, o trabalho com gramática não precisa ser feito apenas por meio de uma abordagem gramatical, mas deve ser determinado pelo professor a partir dos objetivos que são estipulados, as características da turma etc. Assim, na SD, os exercícios que privilegiam o conhecimento da língua terão ênfase na gramática de usos enquanto que os conhecimentos sobre a língua seguirão a gramática reflexiva, mas sempre tendo o texto como ponto de partida, tendo assim uma situação comunicativa mais real. Nesse ponto, torna-se relevante apresentar uma miríade de autores que permitem que seja feita uma reflexão sobre o trabalho com as conjunções sob a 68 perspectiva da coesão, de maneira produtiva, o que possibilitará ao aluno desenvolver sua habilidade escrita. 69 3 Abordagem dos conectivos a partir da sua funcionalidade Nesse capítulo buscamos apresentar alguns pontos que julgamos fundamentais sobre a coesão, conceito relevante para o trabalho com as conjunções. Num primeiro momento, sua inter-relação com a coerência, evidenciando assim sua grande importância na construção da habilidade escrita. Prosseguimos apresentando como as gramáticas tradicionais abordam as conjunções, pois essas ainda são muito utilizadas como modelos para a elaboração dos livros didáticos. Por fim, apresentamos a coesão a partir da abordagem funcionalista, que embasou a SD e a aplicação da mesma em sala de aula. 3.1 A coesão do texto e a sua inter-relação com a coerência Antunes (2005) coloca que a coesão tem sido pouco abordada nas gramáticas e nos livros didáticos, sendo tratada superficialmente, e por isso não sabemos explicar que recursos concorrem para que um texto seja coeso ou o que falta aos textos sem coesão. Contudo, se nós, professores conseguirmos ensinar aos nossos alunos o que torna um texto coeso ou o que falta para que o seja, estaremos tornando o aprendizado sobre a coesão significativo, estaremos os auxiliando a enxergar as tramas que as escolhas lexicais proporcionam aos enunciados e permitindo que eles estejam mais próximos de alcançar a competência discursiva necessária para o sucesso nas interações sociais. Por isso, não há sentido em aprender noções sobre pronomes ou classificar conjunções, saber o nome que elas têm, se não se sabe que tipos de relações semânticas elas estabelecem no ponto do texto onde aparecem. Desse modo, ampliar a competência verbal dos alunos é ampliar as possibilidades deles de criarem e receberem textos. Faz-se, desse modo, necessário que o aluno compreenda que todo texto é um encadeamento de ideias, em que cada parte se liga a outra, ligando cada segmento e não permitindo que nada fique solto; assim se sobressai a questão da coesão, sendo a 70 “propriedade pela qual se cria e se sinaliza toda espécie de ligação, laço, que dá ao texto unidade de sentido ou unidade temática” (ANTUNES, 2005, p. 47). Nesse ínterim, a função da coesão é “criar, estabelecer e sinalizar os laços que deixam os vários segmentos do texto ligados, articulados, encadeados” (p.47); estes “laços” estão não apenas na superfície do texto, mas também nos encadeamentos de nível semântico. Essas relações coesivas acontecem por vários procedimentos que se desdobram em diversos recursos, conforme apresentado no Quadro 1, a seguir: Quadro 1. Coesão do texto A c o e s ã o d o t e x to Relações Textuais (Campo 1) Procedimentos (Campo 2) Recursos (Campo 3) 1. Reiteiração 1.1 Repetição 1.1 Paráfrase 1.1.2 Paralelismo 1.1.3 Repetição propriamente dita • De unidades do léxico • De unidades de gramática 1.2 Substituição 1.2.1 Substituição gramatical Retomada por: • Pronomes • Advérbios 1.2.2 Substituição lexical Retomada por: • sinônimo • hiperônimos • caracterizador es situacionais 1.2.3 Elipse Retomada • elipse 2. Associação 2.1 Seleção lexical Seleção de palavras semanticamente próximas • Por antônimos Por diferentes modos de relações de parte/todo 3. Conexão 3.1 Estabelecimento de relações sintático- semânticas entre termos, períodos, parágrafos e blocos supraparagráficos. Uso de diferentes conectores • Preposições • Conjunções • Advérbios • E respectivas locuções Fonte: adaptado de Antunes (2005, p.51) 71 As informações no Quadro 1 conduzem à percepção das diferentes formas possíveis de coesão em um texto. Assim, a conexão se diferenciará das demais formas de coesão [...] por envolver um tipo específico de ligação: aquela efetuada em pontos bem determinados do texto (entre orações e períodos, sobretudo) e sob determinações sintáticas mais rígidas. Por exemplo, enquanto o nexo por repetição pode formar-se por palavras que estão em quaisquer pontos do texto- como no primeiro e último parágrafo – e fora de qualquer limite sintático, a conexão só acontece em determinados pontos e na dependência de certas condições sintáticas” (ANTUNES, 2005, p. 140). Nesse sentido, Marcuschi (2008) pontua que os fatore