UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA CAMPUS DE MARÍLIA FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS Raimundo Luna Neres APLICAÇÃO DOS REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA NO ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA: um estudo com alunos do sexto ano do ensino fundamental Marília-SP 2010 Raimundo Luna Neres APLICAÇÃO DOS REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA NO ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA: um estudo com alunos do sexto ano do ensino fundamental Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus de Marília, para exame de defesa do Curso de Doutorado, como exigência para obtenção do título de Doutor em Educação. Área de Concentração: Ensino na Educação Brasileira. Orientador: Prof. Dr. Raul Aragão Martins Marília-SP 2010 Neres, Raimundo Luna. N444a Aplicação dos registros de representação semiótica no ensino- aprendizagem da matemática: um estudo com alunos do sexto ano do ensino fundamental / Raimundo Luna Neres. – Marília, 2010. 196 f. ; 30 cm. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, 2010. Orientador: Prof. Dr. Raul Aragão Martins Bibliografia: f. 170-176 1. Educação Matemática – Ensino. 2. Registros de representação. 3. Ensino – aprendizagem. 4. Tratamento e conversões. I Autor. II. Título. CDD 372.7 Raimundo Luna Neres APLICAÇÃO DOS REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA NO ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA: um estudo com alunos do sexto ano do ensino fundamental Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências - UNESP – Campus de Marília, para obtenção do título de Doutor em Educação BANCA EXAMINADORA _____________________________________________________ Prof. Dr. Raul Aragão Martins (Orientador) ______________________________________________________ Prof. Dr. José Carlos Miguel _____________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Sergio Teixeira Prado _____________________________________________________ Prof. Dr. Adriano Rodrigues Ruiz _____________________________________________________ Prof. Dr. Nelson Antonio Pirola Marília, 29 de setembro de 2010 Aos meus pais “in memoriam” que me deram vida. Aos meus dois filhos, Marcelo Davis e Paulo Ricardo, que vi crescer, chorar e sorrir, meus verdadeiros amigos. Em especial, às minhas duas mulheres, minha esposa Dorivan e minha neta Danielle, meus grandes amores. AGRADECIMENTOS A Deus, pela criação de tudo, e a seu filho que se sacrificou por todos nós. Aos meus colegas do DINTER em Educação, pela boa química que sempre existiu entre nós. Ao meu orientador Professor Dr. Raul Aragão Martins, pela orientação segura e por ter-se tornado um grande companheiro. Aos meus colegas de trabalho do NEC, extensivo aos professores do DEMAT, pela compreensão. A todos os que, direta ou indiretamente, me ajudaram, para que este trabalho se tornasse uma realidade em minha vida. RESUMO Aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica no ensino-aprendizagem da Matemática. O objetivo deste trabalho foi verificar se, com a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica, seria possível melhorar o desempenho escolar em Matemática, mais precisamente, na resolução de problemas envolvendo operações com números naturais, junto aos alunos do sexto ano A do Ensino Fundamental do Colégio Universitário – COLUN, da Universidade Federal do Maranhão, Campus São Luís do Maranhão. A tarefa foi iniciada com a aplicação de um instrumento de avaliação denominado Lista de Exercícios, composta de dez problemas, com o objetivo de diagnosticar o nível de desempenho dos alunos. A partir da análise dos dados desse instrumento, foi elaborado um plano de estudos baseado nos conteúdos do livro de Matemática adotado pelo Colégio. Durante a pesquisa, foram feitas várias reuniões com a professora da turma, para verificar se estava havendo melhoria de desempenho dos alunos e, assim, poder ajustar a forma como os conteúdos deveriam ser desenvolvidos em sala de aula, à luz da aplicação da Teoria das Representações. No acompanhamento diário na sala de aula, também foram aplicados outros instrumentos de avaliação, tais como exercícios individuas e em grupo, para comprovar se estava havendo melhoria de desempenho escolar. A aplicação das operações de tratamento nos registros de representação e na conversão semiótica, nos instrumentos avaliativos e nas atividades realizadas em sala de aula, foi feita de forma aleatória, com o objetivo de se garantir a imparcialidade na análise dos dados. Como resultado final da pesquisa, verificou-se que, aproximadamente, 60% dos alunos tiveram bom rendimento (Bom de 61% a 80%) e 37% rendimento regular (Regular de 41% a 60%). Verificou-se, também, que aproximadamente 3% dos alunos não apresentaram solução nos problemas propostos. Estes resultados mostram que foi possível melhorar o desempenho escolar, em Matemática, da maioria dos alunos pesquisados. Palavras-chave: Problemas com Números Naturais. Registros de Representação Semiótica. Ensino-aprendizagem de Matemática. Ensino Fundamental. Tratamentos e Conversões de registros semióticos. ABSTRACT Semiology Presentation Register, applying theory to Mathematics teaching-learning process. This paper aimed to check whether there was a better student performance after Semiology Presentation Register being applied to Mathematics, that is, with regards to solving problems, natural numbers resolutions for the 6th grade fundamental school children at COLUN – Colégio Universitário (UFMA College School). The first task consisted of a list of exercises based on Semiology Presentation Register with ten problems aiming to measure students performance level. From the analysis of the data collected, a study plan was elaborated based on the mathematics book contents adopted by the school. During the research, several meetings were held with the students teacher to detect if there was any improvement on students performance, and thus adjust the way contents would be developed in the classroom on Presentation Register Theory applied to. In observing the daily classroom, several types of evaluations were made, such as single and groups exercises, in order to secure improvement and school performance. The applying of study, approach and semiology conversions, related to evaluation and classroom activities, were made at random in order to guarantee analysis’ data impartiality. As the research result it was found out that nearly 60% of students had suitable improvement (good: 61% – 80%) and 37% had fair improvement (fair: 41% – 60%). It was also found out that about 3% of students did not show any problem solution whatsoever. Those results show that it was possible to improve school performance on Mathematics for the researched students. Keywords: Natural numbers problems. Semiology Presentation Registers. Mathematics teaching-learning. Fundamental teaching. Semiology Registers conversions and treatments. LISTA DE FIGURAS Fig.1 Modelo de Representação da Função de Tratamento por Tentativa– Simulação ............................................................................................ 28 Fig.2 Modelo de Representação Centrado na Função de Objetivação ......... 28 Fig.3 Percentual de Desempenho na Primeira Questão ................................ 82 Fig.4 Percentual de Desempenho na Segunda Questão ................................ 84 Fig.5 Procedimento Usado pela Aluna ...... .................................................. 85 Fig.6 Desempenho dos Alunos ao resolverem o Terceiro Problema ........... 86 Fig.7 Desempenho dos Alunos ao resolverem o Item a do Quinto Problema ... .......................................................................................... 90 Fig.8 Desempenho dos Alunos ao resolverem o Item b do Quinto Problema .............................................................................................. 91 Fig.9 Desempenho dos Alunos ao resolverem o Item c do Quinto Problema .... ......................................................................................... 93 Fig.10 Solução 1 – usando Representação Figural ......................................... 95 Fig.11 Solução 2 – usando Representação Figural ......................................... 95 Fig.12 Desempenho dos Alunos no Sétimo Problema ................................... 97 Fig.13 Percentual de Desempenho no Oitavo Problema ................................ 98 Fig.14 Percentual de Desempenho no Primeiro Problema ............................. 102 Fig.15 Percentual de Desempenho no Segundo Problema ............................. 102 Fig.16 Desempenho dos Alunos com Referência à Solução do Primeiro Problema............................................................................................... 110 Fig.17 Desempenho dos Alunos no Segundo Problema ................................. 111 Fig.18 Percentual de Desempenho no Segundo Problema – 4º Instrumento.. 117 Fig.19 Desempenho dos Alunos no Quinto Problema ................................... 119 Fig.20 Desempenho dos Alunos no Primeiro Problema ................................. 124 Fig.21 Dados do Terceiro Problema ............................................................... 124 Fig.22 Percentual de Desempenho no Terceiro Problema ............................. 126 Fig.23 Enunciado do Problema Expresso em Registro Figural ...................... 127 Fig.24 Dados do Sexto Problema ................................................................... 131 Fig.25 Dados do Sétimo Problema ................................................................. 131 Fig.26 Dados do Oitavo Problema ................................................................. 133 Fig.27 Desempenho dos Alunos com Referência à Solução do Problema Proposto ............................................................................................... 139 Fig.28 Desempenho do Aluno Js na Questão no 10 ........................................ 140 Fig.29 Desempenho da Aluna Br na Situação Problema ................................ 143 Fig.30 Solução Dada pelo Aluno Anl à Questão Proposta ............................. 145 Fig.31 Representação da Solução Dada pela Aluna Rais à Questão 3 ........... 152 Fig.32 Desempenho Obtido pelos Alunos na Solução do Problema Proposto 153 Fig.33 Representação da Solução Dada pelo Aluno Luc ao Exercício 4 ....... 155 Fig.34 Solução Dada pelo Aluno à Questão 7................................................. 156 Fig.35 Desempenho dos Alunos na Solução do Problema Proposto .............. 160 Fig.36 Resultados Divulgados pelo SAEB – em Média ................................. 162 Fig.37 Evolução do Desempenho Escolar nas Operações de Tratamento e Conversão ............................................................................................ 165 Fig.38 Evolução do Desempenho Escolar nas Operações de Tratamento e Conversão Não-Congruente ao Mesmo Tempo .................................. 166 Fig.39 Evolução do Desempenho Escolar nas Operações de Conversão ....... 167 Fig.40 Resultados Obtidos com a Aplicação da Conversão e Tratamento por Alguns Pesquisadores Analisados ................................................. 168 LISTA DE QUADROS Quad.1 Transformações de uma Representação Semiótica em outra Representação Semiótica ..................................................................... 30 Quad.2 Tipos de Funções e de Representações ............................................... 31 Quad.3 Fenomenologia das Representações Mentais ..................................... 33 Quad.4 Formas de Expansão Discursiva de uma Expressão ........................... 35 Quad.5 Diferentes Tipos de Registros Semióticos Utilizados na Atividade de Matemática .......................................................................................... 36 Quad.6 Sequência de Aplicação dos Instrumentos de Avaliação de Desempenho ........................................................................................ 70 Quad.7 Classificação dos Diferentes Registros Utilizados no Fazer Matemático da Pesquisa ...................................................................... 77 Quad.8 Algumas Respostas Construídas pelos Alunos................................... 83 Quad.9 Respostas Construídas Por Alguns Alunos......................................... 86 Quad.10 Desempenho dos Alunos ao Resolver o Quarto Problema ................. 88 Quad.11 Algumas Soluções Construídas pelos Alunos ..................................... 89 Quad.12 Algumas Soluções do Sétimo Problema – 1º Instrumento................... 96 Quad.13 Algumas Soluções do Quinto Problema ..- 2º Instrumento.................. 104 Quad.14 Algumas Soluções do Sétimo Problema – 2º Instrumento................... 105 Quad.15 Aplicação da Conversão Não-Congruente .......................................... 108 Quad.16 Continuação da Aplicação da Conversão Não-Congruente ................ 109 Quad.17 Conversão do Registro Linguagem Natural para o Numérico -2º Problema............................................................................................... 112 Quad.18 Conversão do Registro Linguagem Natural para o Numérico – 4º Problema............................................................................................... 114 Quad.19 Complete o Quadro 19 ........................................................................ 115 Quad.20 Complete o Quadro 20 ........................................................................ 120 Quad.21 Aplicação das Operações de Tratamento Solução Correta ................. 121 Quad.22 Desempenho dos Alunos no Primeiro Problema ................................. 121 Quad.23 Conversão Congruente e Tratamento com Registros Numéricos ....... 123 Quad.24 Soluções Usando Tratamento de Registros Numéricos ...................... 125 Quad.25 Algumas Soluções Usando Registro Figural ....................................... 128 Quad.26 Continuação das Soluções Usando Registro Figural ..................................... 129 Quad.27 Desempenho dos Alunos Usando o Registro Figural .......................... 130 Quad.28 Quadro Complementar do Enunciado do Sétimo Problema ............... 132 Quad.29 Uso do Registro Figural e Tratamento de Registros Numéricos ......... 133 Quad.30 Dados do Nono Problema ................................................................... 134 Quad.31 Utilização da Conversão e Tratamento com Registros Numéricos ..... 136 Quad.32 Utilização de Tratamento com Registros Numéricos – Aluno Eri....... 137 Quad.33 Utilização de Tratamento com Registros Numéricos – Aluno Tm...... 137 Quad.34 Utilização de Tratamento com Registros Numéricos – Alunos: MS, Mht e Fep............................................................................................. 138 Quad.35 Utilização da Conversão e Tratamento na Construção da Solução ..... 141 Quad.36 Aplicação da Conversão e das Operações de Tratamento ................... 146 Quad.37 Desempenho da Solução do Problema Proposto ................................. 147 Quad.38 Atividades com Uso da Conversão e do Tratamento nos Registros Numéricos ........................................................................................... 148 Quad.39 Efeito Comparativo entre as Representações de Conversão e de Tratamento .......................................................................................... 150 Quad.40 Desempenho das Soluções Apresentadas ............................................ 154 Quad.41 Transcrição das Soluções Construídas pelos Alunos .......................... 158 LISTA DE TABELAS Tab. 1 Preços de Materiais Escolares .............................................................. 80 LISTA DE APÊNDICES Apênd. A Primeiro Instrumento de Avaliação .............................................. 178 Apênd.B Termo de Consentimento Livre e Esclarecido da Professora Objeto da Pesquisa ....................................................................... 180 Apênd.C Termo de Consentimento Livre e Esclarecido da Bolsista Colaboradora da Pesquisa ............................................................ 181 Apênd.D Termo de Consentimento Livre e Esclarecido da Coordenadora Pedagógica Responsável pelo COLUN Unidade da Vila Palmeira ........................................................................................ 182 Apênd.E Segundo Instrumento de Verificação de Desempenho ................. 183 Apênd.F Terceiro Instrumento de Verificação de Desempenho ................. 184 Apênd.G Quarto Instrumento de Verificação de Desempenho ................... 186 Apênd.H Quinto Instrumento de Verificação de Desempenho ................... 187 LISTA DE ANEXOS Anexo.A Folha de Rosto para Pesquisa Envolvendo Seres Humanos ............. 191 Anexo.B Parecer do Comitê de Ética ............................................................... 194 Anexo.C Declaração de Aceite do Colégio Universitário – COLUN/UFMA.. 196 SUMÁRIO CAPITULO 1 Introdução.................................................................................................. 15 CAPITULO 2 Teoria das Representações Semióticas: um enfoque teórico..................... 22 2.1 Teoria das Representações Semióticas....................................................................... 22 2.2 Sistemas Semióticos como Atividades Cognitivas.................................................... 25 2.3 Tipos de Representações Semióticas.......................................................................... 31 CAPITULO 3 Revisão de Literatura................................................................................ 37 3.1 Pesquisas aplicando a Teoria dos Registros de Representação Semiótica.................. 38 3.2 Pressupostos................................................................................................................ 50 CAPITULO 4 Procedimentos Metodológicos.................................................................. 68 4.1 Percurso Metodológico............................................................................................... 68 CAPITULO 5 Aprendizagem Matemática Utilizando Registros de Representação Semiótica................................................................................................. 78 5.1 Análise do Primeiro Instrumento de Avaliação.......................................................... 80 5.2 Análise do Segundo Instrumento de Verificação de Desempenho............................. 101 5.3 Análise do Terceiro Instrumento de Verificação de Desempenho............................. 107 5.4 Análise do Quarto Instrumento de Verificação de Desempenho................................ 116 5.5 Análise do Quinto Instrumento de Verificação de Desempenho................................ 119 5.6 Comparação de duas Operações Discursivas: em Linguagem Natural e em Linguagem Numérica................................................................................................. 136 5.7 Transformação de um Registro em Outro................................................................... 141 CAPÍTULO 6 Considerações Finais.................................................................................. 162 REFERÊNCIAS........................................................................................................................ APÊNDICES........................................................................................................................... ANEXOS................................................................................................................................. 170 177 190 15 CAPÍTULO 1 Introdução A resolução de problemas é a forma mais eficaz não somente do desenvolvimento da atividade matemática, mas também da aprendizagem dos conhecimentos, das habilidades, dos métodos e das aplicações matemáticas. (Anna Zofia Krygowska, 1970) Quase 20 anos após o Mestrado, temos a oportunidade agora de continuar a Pós- Graduação com este Doutorado em Educação, produto de Convênio DINTER – Doutorado Interinstitucional, celebrado entre a Universidade Federal do Maranhão – UFMA e a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP, Campus de Marília, São Paulo. Formação básica em Matemática, inicialmente com um Bacharelado e, posteriormente, com a Licenciatura e, em seguida, com o Mestrado em Ciências, na área de Geofísica de Prospecção, cursamos o ginásio1 (hoje, Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano), na década de 1960, época do Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Nos tempos de acadêmico, ministramos aulas no Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), na década de 1970. Finalmente, em 1979, ingressamos como professor de Matemática na Universidade Federal do Maranhão, lotado no Centro de Ciências Exatas e de Tecnologias, com exercício no Departamento de Matemática. Como Coordenador do Curso de Matemática, no período de 1995 a 1999, vivenciamos uma experiência muito gratificante, pois, apesar de ter sido aluno do próprio Curso de Matemática, foi como professor e dirigente que tivemos a oportunidade de nos inteirarmos do dia a dia do curso, seus acertos e desacertos, além do contato permanente que mantínhamos com os alunos, tanto do Bacharelado como de Licenciatura, ouvindo suas reivindicações e sugestões. Também como professor de Estágio Supervisionado, aprendemos bastante, tanto com a disciplina, quanto com os alunos. Além disso, pudemos, na 1 A LDB – Lei N. 5.692 de 11/08/1971 de Diretrizes e Bases para o Ensino de 1º e 2º. Grau, a partir do ano letivo de 1972, extinguiu o exame de admissão ao ginásio e criou o 1º grau, de oito séries, assim como, o ensino secundário (CARVALHO, 2003). 16 oportunidade, perceber quanto o professor universitário, às vezes, está distanciado dos problemas que a educação básica brasileira enfrenta. Acompanhando os alunos em seu Campo de Estágio, desenvolvido ora no Colégio Universitário – COLUN, escola de aplicação da Universidade Federal do Maranhão e campo de estágio para os alunos dos Cursos de Licenciatura, ora em escolas da rede pública municipal e estadual de ensino, verificamos “in loco” como os alunos e os professores de Matemática estavam desmotivados, respectivamente, em relação ao ensino que estavam recebendo e em relação a profissão docente. Pensamos que não dava mais para continuar; algo deveria ser feito, para mudar a realidade do ensino de Matemática do nosso Estado. Desde a época de estudante do Curso Científico (hoje Ensino Médio), inquietava- nos, e ainda continua nos inquietando, o porquê de a Matemática ser conotada de difícil, quase impossível para alguns, e esses não são poucos, alunos que, a priori, não possuem afinidades com ela. Fomos aluno do Método Tradicional, da memorização e da Matemática Moderna, época das demonstrações com suas hipóteses e teses. Passamos pela época da Resolução de Problemas e Matemática Renovada. Nos tempos atuais, fala-se muito em Matemática Crítica. Naturalmente, o ensino dessa disciplina mudou durante todas essas fases. Mas mudou de fato? Ou só houve ensaios, pequenas nuances? Observamos que, apesar das mudanças ocorridas no ensino da Matemática, muitos professores ainda permanecem apegados ao ensino tradicional (ensino baseado na memorização de conceitos). Freire e Guimarães (1984) afirmam que: o homem precisa ser um homem do seu tempo, o que, para muitos, não tem a menor importância. Desinformação? Ou talvez gostam do tradicionalismo, confiam mais nesse método, ou simplesmente não querem mudar? A cada dia que se passa, as distâncias entre o ensino da Matemática nos níveis Fundamental, Médio e Universitário se tornam mais evidentes. Razões existem e são muitas, perpassando pela má formação da mão de obra especializada, por questões salariais, condições de trabalho e, talvez a mais séria e, ultimamente, relegada, à questão da moralidade na família e na escola. Os valores familiares estão sumindo; a escola e os professores não estão preparados para assumir a missão de resolver esse problema. Voltando à Matemática, a forma como vem sendo ministrada no Ensino Fundamental, embora a bibliografia venha mudando constantemente e o currículo passando por algumas modificações, ao que parece, em particular, no Maranhão, a aprendizagem não tem ocorrido de forma satisfatória, haja vista encabeçarmos a lista do SAEB como um dos piores índices de desempenho escolar (BRASIL, 2007a, 2007b). 17 Muitas razões são elencadas como causas para esse fracasso escolar, desde a estigmatização de que essa área de conhecimento é difícil até a falta de modernização do ensino, mão de obra despreparada e quantidade insuficiente de bons professores, para o exercício de sala de aula. No entanto, na maioria das vezes, o problema não está somente no professor, menos ainda na escola, mas sim nas políticas governamentais. Segundo a direção do COLUN, todo início de ano, quando da entrada de novos alunos nos quatro anos finais do Ensino Fundamental, os professores se deparam com quadros desanimadores, recebem alunos quase analfabetos, uma vez que esses alunos estão ingressando com o nível de aprendizagem muito aquém do esperado. Embora a Educação Matemática no Brasil venha evoluindo consideravelmente nas últimas décadas, a Matemática ensinada nas escolas de educação básica não tem produzido resultados satisfatórios; essa disciplina tem contribuído para elevadas taxas de retenção escolar e o insucesso de muitos alunos (BRASIL, 2007a, 2007b). Os resultados divulgados pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB, pelo Ministério da Educação - MEC e pela Avaliação da Escola Pública (2003, 2005) do Governo do Estado do Maranhão mostraram que o desempenho escolar dos alunos do quinto ano do Ensino Fundamental em todo o Brasil não foi satisfatório, conforme relatório expedido pela Supervisão de Avaliação Educacional (2005). Isto porque a média nacional de proficiência em Matemática obteve apenas um acréscimo de 5,3 pontos, passando de 177,1 em 2003, para 182,4 em 2005. Por outro lado, a média de proficiência em Matemática, ainda no quinto ano do Ensino Fundamental, em escolas urbanas estaduais, também não foi relevante, haja vista que a média nacional só obteve um acréscimo de 3,5 pontos, ou seja, passou de 178,3 em 2003, para 181,8 em 2005. No Maranhão, passou de 164,0 em 2003, para 164,8 em 2005, tendo um acréscimo de apenas oito décimos (0,8), bem abaixo da média nacional, que é de, aproximadamente, 180,0. Nas escolas federais, a média nacional de desempenho dos alunos passou de 233,0 em 2003, para 244,0 em 2005, resultado um pouco melhor, se comparado ao desempenho dos outros alunos. No entanto, também não foi um resultado considerado bom pelos avaliadores do MEC. Essa mesma disciplina foi avaliada pelo governo do Estado do Maranhão (2003, 2005). Em média, essa avaliação passou de 151,5 pontos em 2003, para 159,8 em 2005. Mesmo com o acréscimo de 8,0 pontos, considerando-se a escala de mensuração nacional, os alunos não tiveram ainda um resultado satisfatório, se comparados aos da média nacional, que foi de 180,0. 18 Convém ressaltar que, embora tenhamos apresentado dados referentes à avaliação em Matemática de alunos do quinto ano do Ensino Fundamental, neste trabalho, optamos por trabalhar com alunos do sexto ano desse mesmo nível de ensino, em função do quinto ano já ter sido avaliado pelo MEC. Revendo a literatura científica atual sobre o ensino-aprendizagem de Matemática, apresentada no Capítulo 3, a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, que trata do funcionamento e desenvolvimento cognitivo, sobretudo, em atividades de Matemática, chamou nossa atenção, motivando-nos a questionar: A aplicação desta teoria pode ajudar a melhorar o desempenho escolar dos alunos em Matemática? Segundo Dias (2007), nos últimos trinta anos, as pesquisas em Didática da Matemática têm tentado compreender, através de trabalhos teóricos e experimentais, os processos de aprendizagem nessa área do conhecimento. Um dos aspectos que vêm sendo considerados como componentes na eficácia do funcionamento matemático são as formas de abordagens de conteúdos e suas representações semióticas. A Didática da Matemática tem como um dos seus objetos de estudo os processos de transmissão e de aquisição de conhecimentos em Matemática. Daí o nosso interesse em investigar como a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica em Matemática poderia contribuir para melhorar o desempenho escolar dos alunos, principalmente, nos conteúdos referentes ao Ensino Fundamental. Para isso, elegemos como lócus de nossa investigação o Colégio Universitário – COLUN, mais especificamente, o sexto ano, Turma A. Para a análise epistemológica, adotamos como pressuposto a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, desenvolvida por Duval (1993, 1995, 2004, 2007, 2009), teoria que, nos últimos anos, vem sendo discutida e estudada em diferentes Universidades do Brasil, por várias correntes metodológicas da Educação e da Educação Matemática. Segundo esse autor, para que haja a compreensão em Matemática, deve haver a coordenação de, pelo menos, dois registros de representação semiótica: tratamento que é a transformação de uma representação dentro do próprio registro e a conversão que é a transformação de um registro em outro. Além disso, essa compreensão implica na capacidade de o aluno saber mudar de registro. A articulação dos registros constitui uma condição de acesso à aprendizagem em Matemática. Além do autor da Teoria dos Registros de Representação Semiótica, também trabalhamos com outros autores. Dentre eles, destacamos: Brousseau (2008), D’Amore (2007) e Freitas (2008). Principalmente no que se referiu às situações didáticas, formas de 19 apresentação de conteúdos de Matemática e referências aos conceitos, baseado em Lovell (1988). Concentramos, portanto, nossa investigação no ensino-aprendizagem da Matemática, tendo o apoio da professora A que aplicou a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, objetivando melhorar o desempenho dos seus alunos, nas aulas de Matemática, sem desprezar os conhecimentos já adquiridos pelos discentes, considerado de grande importância para o ensino-aprendizagem dos conceitos matemáticos. Além disso, esse tipo de conhecimento faz o aluno se sentir mais à vontade para discutir com a professora problemas relacionados ao seu dia a dia e ao meio social em que vive. Convém ressaltar que o ensino da Matemática, desde a época das Reformas Francisco Campos2, Capanema3 e das LDBs – Lei N˚ 5692/71 e N˚ 9.424/96, respectivamente, vêm sofrendo algumas mudanças metodológicas, tanto na forma de apresentação curricular, quanto na forma de ensino. No entanto, embora os movimentos em prol da modernização do ensino da Matemática venham ocorrendo, o método tradicional (baseado na memorização e autoritarismo), continua ainda a fazer parte do contexto de muitos professores, fato observado no COLUN, local de desenvolvimento desta pesquisa. Assim, procuramos mostrar e incentivar a professora pari passu, quanto à aplicação da Teoria das Representações como meio facilitador da aprendizagem matemática, haja vista que, no trabalho de sala de aula, a construção do conhecimento matemático sempre foi uma tarefa desafiadora. Isto porque, na aprendizagem da Matemática, o desenvolvimento cognitivo deve ser buscado incessantemente pelos alunos, sob a orientação do mestre. Nesse contexto, colocamo-nos no centro do foco pesquisado, para que pudéssemos sentir não apenas como interlocutor, mas como o próprio aluno que buscava conhecimento. A prática docente e as questões que dela emergem nos fizeram ver, a cada dia, o quanto tínhamos ainda que aprender e apreender, e nada melhor do que aprender e apreender na base da construção da pirâmide escolar que poucos têm o privilégio de construir. Para que a aprendizagem possa lograr êxito, segundo Godino (2007), devemos considerar, no desenvolvimento da didática, as contribuições de diversos campos do saber, como: psicologia, pedagogia, filosofia, sociologia dentre outros. Além disso, devemos levar 2 A Reforma Francisco Campos data de 1931, promulgada pelo Decreto Lei n. 19.890, de 18 de abril de 1931. Nela foi fixada a duração de sete anos para o ensino secundário, 5 dos quais constituíam o ciclo fundamental e os dois últimos o complementar, de preparação para os cursos superiores. 3 A Reforma Capanema foi promulgada pelo Decreto Lei n. 4.244, de 9 de abril de 1942. Dividiu o ensino secundário em duas partes: o curso ginasial, de 4 anos e o colegial, de 3 anos, dividido em duas modalidades, o clássico e o científico, depois foi regulamentado o Curso Normal (CARVALHO, 2003, p. 123-124). 20 em conta a natureza dos conteúdos matemáticos a ser ministrados, o desenvolvimento cultural e pessoal do aluno, principalmente, no seio das instituições escolares. Na literatura pesquisada para a elaboração deste trabalho, principalmente no Brasil, alguns dos teóricos como Colombo (2008), Karrer (2006) e Brandt (2005), em geral, tomam como base, para as suas análises, a aplicação de exercícios, sem que haja um acompanhamento diário do desenvolvimento das aulas ministradas pelo professor, em determinado conteúdo. Ou são trabalhos, apenas, de cunho bibliográfico. Nos trabalhos levantados, não encontramos nenhum que enfocasse, exatamente, a aplicação da Teoria das Representações Semióticas diretamente, no conteúdo de livro texto ou programas adotados. Dessa forma, podemos afirmar que falta ainda ser investigada a aplicação da Teoria das Representações Semióticas no dia a dia da sala de aula, para verificar se melhora o desempenho escolar dos alunos em Matemática. Daí porque nos propusemos desenvolver este trabalho, no sentido de contribuir com a divulgação de conhecimento construído nessa área de saber. Assim, definimos como objetivos a serem executados: a) Identificar dificuldades de aprendizagem na resolução de problemas envolvendo operações com números naturais. b) Propor situações de ensino com base na Teoria em estudo e nas dificuldades de aprendizagem identificadas. c) Analisar os resultados das situações de ensino vivenciadas à luz do referencial adotado. A opção de trabalhar apenas com problemas envolvendo números naturais, fui em função de termos optado pela sequência do livro, e ainda porque no período de realização da pesquisa esse foi o assunto mais trabalhado em sala de aula . Delimitamos o quantitativo de informações, na tentativa de deixar o texto menos cansativo a quem se dispuser a lê-lo. Seguindo essa linha de pensamento, organizamos essa tese em seis capítulos, que passamos a enunciá-los. Antes, porém, justificamos que a escolha dos conteúdos, postos nos capítulos, foi no sentido de dar uma sequência lógica de apresentação e desenvolvimento da pesquisa, assim como facilitar o entendimento da leitura. O Capítulo 1, INTRODUÇÃO, procura situar o leitor sobre nosso objeto de estudo, justificando a trajetória percorrida para desvelamento do objeto focado. No Capítulo 2, procuramos desenvolver a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, fazendo uma retrospectiva teórica, mas focando, principalmente, nos aspectos voltados para os objetivos definidos nesta tese. Ou seja, visando a uma melhoria do desempenho escolar dos alunos em Matemática. Também foi dada ênfase na aplicação das 21 funções de tratamento e conversões, em que, na conversão de uma representação em outra representação, priorizamos a conversão congruente; apenas em alguns casos, foi utilizada a conversão não congruente. Ainda foi dada atenção à análise das funções de tratamento, por estas já serem de conhecimento de muitos alunos. Nesse nível de ensino, foi possível identificar mais rapidamente o desenvolvimento dos processos de cognição. Por outro lado, os alunos conseguiram um rendimento melhor com a utilização do tratamento dos registros de representação, pois esse tipo de registro estava mais intimamente ligado ao assunto desenvolvido em sala de aula pela professora. No Capítulo 3, foi feita uma revisão de literatura. Nela, buscamos embasamento teórico-metodológico que pudesse contribuir para a melhoria do ensino- aprendizagem da matemática, com a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica, assim como para a melhoria do desempenho em Matemática dos alunos, sujeitos desta pesquisa. Ainda neste Capítulo, buscamos trabalhos que, de certo modo, estivessem ligados diretamente aos objetivos aqui definidos. Além disso, procuramos levantar o estado da arte, direcionando esse levantamento para os trabalhos com algum tipo de interseção com a tese proposta. O Capítulo 4 trata dos procedimentos metodológicos adotados nesta pesquisa, dando ênfase ao trabalho realizado pela professora A com seus alunos em sala de aula, com a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica, assim como à produção matemática de seus alunos, desenvolvida no dia a dia da sala de aula. Também acompanhamos, através de exercícios aplicados em sala de aula e fora dela, se houve evolução no desempenho escolar dos alunos, em atividades relacionadas à resolução de problemas com números naturais, utilizando a Teoria em estudo. No capítulo 5, foram feitas as análises das produções dos alunos no transcorrer desta pesquisa, prioritariamente, na solução de problemas de aritmética, envolvendo operações com números naturais. Analisamos, também, a evolução do desempenho em Matemática dos alunos, durante o período da pesquisa, compreendido de março a setembro de 2009. Nesse período, os alunos trabalharam com a aplicação dos registros de representação semiótica, em situações que envolveram a utilização do tratamento dos registros de representação e a conversão de um registro em outro. E, finalmente, no Capítulo 6, encerramos com as Considerações Finais, fazendo uma reflexão sobre este trabalho. E, apresentamos os dados analisados mostrando que com a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica é possível contribuir para a melhoria do desempenho escolar dos alunos em matemática. 22 CAPÍTULO 2 Teoria das Representações Semióticas: um enfoque teórico Os matemáticos nunca estiveram de acordo sobre a matéria que estudam e, todavia, supõe-se que a matemática seja a ciência das verdades absolutas, eternas e indiscutíveis. (Henri Lebesgue, 1875-1941) Este capítulo faz uma retrospectiva de alguns aspectos da Teoria dos Registros de Representação Semiótica, desenvolvida por Raymond Duval4, tendo como foco o papel dos registros de representação na aprendizagem de Matemática que esteja relacionada aos objetivos deste trabalho. Esse enfoque foi construído, sobretudo, para permitir a análise de resolução de problemas envolvendo operações com números naturais, aplicados a alunos do sexto ano A do Ensino Fundamental, do Colégio Universitário – COLUN, colégio de aplicação da Universidade Federal do Maranhão, durante o ano de 2009. 2.1 Teoria das Representações Semióticas A Teoria das Representações Semióticas estuda o funcionamento e o desenvolvimento cognitivo do pensamento humano, principalmente em atividades relacionadas à Matemática. Segundo Duval (2007), para desenvolvermos o entendimento da Matemática nas séries iniciais do Ensino Fundamental, é necessária uma abordagem cognitiva, haja vista que, no ensino da Matemática, buscamos desenvolver nos alunos habilidades e competências que possam vir contribuir para o desenvolvimento de suas capacidades de raciocínio e de análise. O interesse de Duval (2007), no desenvolvimento cognitivo do aluno, está para ele, segundo Flores (2006), no pensamento ligado às operações semióticas e, consequentemente, nas suas representações, pois não haverá compreensão, sem os recursos das representações semióticas. Através de operações concretas e com a utilização de uma 4 Raymond Duval é filósofo e psicólogo de formação. Desenvolveu pesquisas em Psicologia Cognitiva no Instituto de Pesquisa em Educação Matemática, no (IREM) de Strasbourg, na França, de 1970 a 1999. 23 variedade de registros de representação, o aluno consegue visualizar mais facilmente os objetos matemáticos, visto que nem sempre esses objetos são passíveis de percepção. Segundo Duval (1993), as dificuldades de aprendizagem da Matemática estão relacionadas ao fato de que o aluno não consegue fazer a distinção entre um objeto matemático e sua representação. Esta distinção é um ponto estratégico para a compreensão da Matemática. Por outro lado, quando os objetos matemáticos são confundidos com a sua representação, em geral, o aluno sofre uma perda da compreensão dos conhecimentos já adquiridos, tornando-se dessa forma fora do contexto da aprendizagem (como por exemplo: uma adição de dois números naturais e sua representação semiótica). Segundo Godino (2007), podemos considerar como objeto matemático tudo aquilo que pode ser indicado, que pode ser sinalizado ou ao que podemos fazer referência. Para Peirce (2005), um objeto é a representação real de um signo, podendo ser perceptível ou apenas imaginável (abstrato), uma entidade puramente mental ou imaginária. O acesso aos objetos matemáticos passa necessariamente por representações semióticas. Dessa forma, a compreensão em Matemática está condicionada a uma capacidade de permutação de registros. Para Duval (1993), as diversas representações semióticas de um objeto matemático são mais do que necessárias, haja vista que os objetos matemáticos não estão diretamente acessíveis à percepção, numa experiência intuitiva imediata, como estão os objetos comumente ditos reais ou físicos. Neste caso, é preciso poder dar aos objetos uma representação semiótica. Peirce (2005) definiu Semiótica como a tarefa de determinar o que deve ser verdadeiro quanto ao representâmen utilizado por toda inteligência científica, a fim de que possa incorporar um significado qualquer. A diferenciação entre um objeto matemático e sua representação é fator essencial para o desenvolvimento cognitivo. Torna-se, portanto, uma condição importante para que haja, de fato, compreensão dos objetos matemáticos, condição sine qua non na utilização de resolução de problemas. A utilização das representações semióticas no estudo e análise de resolução de problemas envolvendo números naturais se faz necessária, em função de essas representações permitirem fácil comunicação entre as diversas formas de registros, além da possibilidade de facilitar o tratamento e a conversão dos objetos matemáticos. De maneira geral, a evolução da aprendizagem matemática está associada ao desenvolvimento de novos sistemas semióticos relacionados aos já existentes e conhecidos dos alunos. Dessa forma, a formação do 24 pensamento científico possui estreita relação com os simbolismos específicos que servem para representar os objetos e suas relações, ou mesmo, pode-se afirmar que é inseparável deles. Segundo Da Silva (2008), a introdução da reta graduada como um registro semiótico para os números racionais amplia a possibilidade de enfrentamento das dificuldades consagradas na aprendizagem desses números. Para ele, o registro da reta graduada é mais apto a criar um elo entre números e grandezas relativas, pois a reta se encontra envolvida em meio a números que a atribuem uma ordem crescente, sendo assim, as frações equivalentes são criadas em condições mais favoráveis. Para Colombo (2008), na aprendizagem da Matemática, deve existir uma relação de dupla entrada entre sistemas cognitivos e sistemas semióticos, visto que não devemos prestigiar mais um sistema do que o outro; se assim ocorrer, poderá haver dificuldades de absorção de conhecimento. Do ponto de vista genético, as representações semióticas e as representações mentais não podem pertencer a domínios distintos. Duval (2004) afirma que o desenvolvimento das representações mentais se efetua como uma assimilação das representações semióticas, da mesma forma que acontece com as imagens mentais que são assimilações dos perceptos, de imagens recentemente formadas. Normalmente, consideram-se as representações semióticas como apenas um meio de exteriorização das representações mentais, para fins de comunicação, ou seja, torná-las visíveis ou acessíveis a outras pessoas. Olhando sob este ponto de vista, é possível o cometimento de engano (DUVAL, 1993, p.39). Por outro lado, não devemos conjecturar que as representações sirvam apenas para externar comunicação entre indivíduos; elas também podem ser vistas como um meio preponderante de desenvolvimento de atividades cognitivas do pensamento humano. As representações semióticas desempenham um papel extremamente necessário ao a) desenvolvimento das representações mentais: estas dependendo da interiorização das representações semióticas, de igual forma que as imagens mentais. b) permitir a realização de uma variedade de funções cognitivas, tais como a função de objetivação (interna ao indivíduo) que independe da função de comunicação (expressão de outra pessoa) e principalmente a função de tratamento, que não deve ser preenchida pelas representações mentais, nessa, a maioria das atividades de tratamento estão ligadas a utilização de sistemas semióticos, tais como as operações desenvolvidas quando da solução numérica de determinado problema. c) produzir conhecimento, haja vista que, com a utilização das representações, é possível apresentar diferentes tipos de representações para um mesmo objeto. (DUVAL, 1993, p. 39). 25 Além disso, essas representações possibilitam ao aluno compreender, efetuar e ter domínio da variedade de ações matemática que lhes são apresentadas no ensino. Duval (1993) afirma ainda não ser possível estudar os fenômenos relativos ao conhecimento, sem recorrer à noção de representação. Para ele, as representações semióticas desempenham um papel fundamental nas atividades relacionadas à Matemática, uma vez que estamos em presença daquilo que poderíamos chamar de paradoxo cognitivo do pensamento matemático: de um lado, a apreensão de objetos matemáticos não pode ser senão apreensão conceitual; de outro lado, é somente através das representações semióticas que uma atividade sobre os objetos matemáticos é possível. Em geral, o aluno em fase de aprendizagem deveria não confundir os objetos matemáticos com suas representações semióticas. Entretanto, Duval (1995) afirma que a impossibilidade do acesso direto aos objetos matemáticos se dá em função de esses objetos serem exteriores às representações, tornando-se assim uma confusão quase inevitável. Ele afirma ainda que, pensando o inverso, comumente os alunos podem adquirir domínios de tratamentos matemáticos necessariamente ligados às representações semióticas e, a priori, se eles não possuem uma apreensão conceitual dos objetos representados, este paradoxo é tanto mais forte, quando identificamos atividade matemática e atividade conceitual e quando consideramos as representações semióticas como secundárias ou extrínsecas. Em matemática, toda comunicação se torna mais fácil, se ela é baseada em representações. Os objetos a serem estudados são conceitos, propriedades, estruturas, relações que podem expressar diferentes situações, portanto, para seu ensino, precisa-se levar em consideração as diferentes formas de representação de um mesmo objeto matemático. Os primeiros passos a ser dado é a compreensão do que seriam essas representações, essenciais ao funcionamento do conhecimento e ao desenvolvimento dos conhecimentos. (DAMM, 2008, p. 167). 2.2 Sistemas Semióticos como Atividades Cognitivas Para que um sistema semiótico possa ser um registro de representação, ele deve permitir três atividades cognitivas fundamentais ligadas à semiósis, quais sejam: a) Formação de uma representação identificada como uma representação de um registro dado, como por exemplo, o enunciado de uma frase – compreensão numa linguagem natural dada – composição de um texto, desenho de uma figura geométrica, elaboração de um esquema, expressão escrita de uma fórmula etc. Dessa forma, a formação de uma representação poderia ser comparada à realização de uma tarefa de descrição. 26 b) Tratamento de uma representação – pode ser entendido como sendo a transformação desta transformação dentro do próprio registro em que ele foi enunciado – a solução analítica de uma expressão numérica é uma forma de tratamento dentro do próprio registro proposto. c) Conversão de uma representação – deve ser admitida como sendo a transformação de uma representação em outra representação de outro registro – devendo conservar a totalidade ou apenas uma parte do registro dado como ponto de partida. (DUVAL, 1993, p. 41-42). Os tratamentos e as conversões dos objetos matemáticos em estudo também serão tratados mais amiúdes posteriormente. Neste trabalho, em que buscamos comprovar uma evolução da aprendizagem escolar, particularmente na resolução de problemas, envolvendo operações com números naturais, trabalhamos com tratamento (operações realizadas dentro do próprio registro) e conversão (operações realizadas de um registro em outro registro de representação semiótica). No entanto, foi através das atividades envolvendo conversão que a aprendizagem dos alunos ficou mais evidenciada. A passagem de um sistema de representação a outro, ou seja, a mobilização simultânea de vários sistemas de representação, no decorrer do mesmo percurso, fenômeno evidente e espontâneo freqüentemente usado em atividade matemática, em geral, para a maioria dos alunos, não se apresenta assim de forma tão evidente, visto que a passagem espontânea de uma representação semiótica a outra só acontece quando as mesmas são congruentes. Essa passagem, segundo Duval (2009), só ocorre de forma espontânea, quando: a) Existe uma correspondência semântica entre as unidades significantes que as constituem. b) Há a mesma ordem possível de apreensão dessas unidades nas duas representações. c) Há conversão de uma unidade significante da representação de saída em uma só unidade significante de chegada. Para o autor, caso uma dessas hipóteses não seja verificada, a passagem de uma a outra representação não ocorre mais de forma imediata, visto que, nesse caso, as representações não são mais congruentes. Ele assegura que a conversão não deve ser confundida com as atividades que estão próximas destas e, sim, da codificação e da interpretação, pois a mudança em um registro nem sempre implica em mudança no outro registro. É possível haver uma exclusão do registro dado inicialmente. Nesse caso, a conversão não satisfaz as condições impostas como ponto de partida e não contribui para uma aprendizagem significativa. Assim, a conversão é uma atividade cognitiva diferente e não está sujeita às atividades de tratamento (DUVAL, 1995). Embora, do ponto de vista matemático, na representação de registros, o uso de conversão, segundo Freitas (2007), não desempenhe papel tão importante, do ponto de vista 27 cognitivo, é a conversão que leva a uma melhor compreensão, haja vista que a originalidade da atividade matemática está na possibilidade de utilização de pelo menos dois registros de representação para cada situação problema, ou de perspectivas de mudanças de registros de representação. Nos registros de representação semiótica, a aplicabilidade da conversão e do tratamento no ensino de Matemática torna-se, portanto, necessária no processo de ensino- aprendizagem; permite, desta forma, disponibilizar aos professores instrumentos que podem viabilizar uma melhora considerável de aproveitamento e compreensão de conteúdos ministrados. A partir do momento em que o professor utiliza novos recursos didáticos e procura representar o conteúdo ministrado de várias formas, a perspectiva de aprendizagem, com certeza, poderá ter o resultado desejado. Por outro lado, quando um aluno não consegue aprender de uma forma, outras formas podem ser utilizadas pelo professor, como, por exemplo, a utilização das conversões congruentes, as quais podem contribuir para facilitar essa aprendizagem. Segundo Pavlopoulou (1993), as regras para a conversão podem parecer muito simples, mas a passagem da representação de um objeto em um cadastro de sua representação em outro registro é, na maioria das vezes, muito mais complexa do que parece. Por outro lado, em atividades de matemática trabalhadas com os alunos, em que a conversão das representações é congruente, segundo Duval (2009), existe uma taxa elevada de sucesso. No entanto, se a atividade envolve representação não congruente, as pesquisas têm mostrado que os resultados têm atingido taxas mais ou menos fracas de sucesso. O tratamento dado a uma representação é visto como sendo a transformação dessa representação realizada no próprio registro em que ela foi concebida. Ou seja, as operações de tratamento ocorrem internamente num registro. As funções de tratamento, em geral, no nível de ensino-aprendizagem deste trabalho, normalmente os alunos o fazem por tentativas (simulação), em primeiro plano, para depois apresentar uma solução mais formal. Às vezes, nem conseguem expressar a solução de outra forma que não a feita por tentativa. Para soluções por tentativas (simulação), Duval (2004) apresenta um modelo de representação o qual define esse processo: É interessante observar neste modelo que a representação não se restringe à simples relação: representante - representado como na definição, por analogia com signo logístico. Mas integra as ações e tratamento para que a representação possa levar (comportamento - representante e comportamento - representado). Assim, o relacionamento entre estes dois sistemas de ação 28 (comportamento 1 e 2) é predominante em relação ao representante – representado. (DUVAL, 2004, p. 66). A figura1 retrata bem essa função de tratamento. Conceito Representante Representado 1 comportamento a adotar 2 Comportamento adotado Figura 1 – Modelo de Representação da Função de Tratamento por Tentativa – simulação Fonte: Adaptado de Duval (2009). Em relação à figura 1, podemos supor que aparecem duas possibilidades relacionadas entre o que é representante e o que é representado, quais sejam: • A relação a partir de cada representante é superficial, no entanto é suficiente para a função de expressão ou para a função de tratamento (Figura 1). • A relação a partir da convertibilidade dos representantes, própria ao sujeito de conhecimento (seta C, Figura 2), é necessária para a função de objetivação. (Conceito, objeto cognitivo representado) C Representante de um registro A Representante de outro registro Tratamento sobre Tratamento sobre Figura 2 – Modelo de Representação Centrado na Função de Objetivação Fonte: Adaptado de Duval (2004) 29 A figura 2 é a expressão da hipótese de aprendizagem definida e defendida por Duval (1993), em que faz a seguinte formulação: A compreensão (integral) de um conteúdo conceitual repousa sobre a coordenação de pelo menos dois registros de representação e esta coordenação manifesta-se pela rapidez e espontaneidade da atividade cognitiva de conversão. (DUVAL, 1993, p. 51). De fato, para Duval (2004), a percepção ou a reprodução de uma representação semiótica não significa que, em decorrência do próprio fato, não há diferenciação entre representante e representado. Ou seja, há a possibilidade de considerar esta representação apenas a partir da perspectiva do representante, ou só do ponto de vista do representado. Duval (1993) considera que existe uma diferença fundamental na análise de atividades de matemática, na concepção de aprendizagem e de ensino, numa conjuntura de pesquisa por matemático. Ele afirma que, quando analisamos a solução de determinadas situações problemas desenvolvidas por alunos, em geral, não levamos em consideração os aspectos da diferenciação das transformações de um registro em outro. Para Almouloud (2007), boa parte dos problemas de ensino e de aprendizagem, em alguns conteúdos, como, por exemplo, o de geometria, pode ser de origem didática e linguística e não propriamente de matemática em si, haja vista que A coordenação dos diferentes registros de representação – escrita algébrica, as figuras geométricas, o discurso na língua natural ligados ao tratamento dos conhecimentos não se opera espontaneamente, mesmo no curso de um ensino que mobilize uma diversidade de registros. [...], a dificuldade dos alunos para interpretar corretamente um problema e sua incapacidade em produzir a explicação de sua solução com um mínimo de vocabulário apropriado mostram sua limitação para entender os textos mais simples. Ao compreender o senso global, o aluno estará capaz de selecionar as informações principais e de revelar as relações das instruções e conseqüentemente a cometer erros. (ALMOULOUD, 2007, p. 130). O autor afirma ainda que, em geral, os livros didáticos não costumam propor exercícios ou problemas que envolvam interpretações de textos matemáticos em seus enunciados, nem propõem no ensino-aprendizagem tratamentos e conversões, ao mesmo tempo. Dessa forma, devemos admitir que as representações sejam produções advindas de uma variedade de signos que podem ou não pertencer a um mesmo sistema de representação, com peculiaridades próprias e intrínsecas ao funcionamento e desenvolvimento do objeto de estudo. 30 Por outro lado, a compreensão conceitual, a diferenciação e o domínio das diferentes formas de raciocínio, as interpretações hermenêuticas e heurísticas dos enunciados são intimamente ligadas à mobilização e à articulação quase imediata da variedade de registros que se pode mobilizar (DUVAL, 2009, p. 20) Convém salientar que, em geral, no processamento da função de conversão, devemos levar em consideração as conversões congruentes e as não congruentes. Em geral, o aluno escolhe a conversão congruente, por comodidade e por demandar menos tempo de construção da função de representação do objeto. Segundo Duval (1993, p. 43), Mesmo que a atividade cognitiva de conversão de uma representação possa freqüentemente parecer estar estreitamente ligada a uma representação ou a um código, às vezes ela parece ser irredutível, visto que a conversão nem sempre pode ser obtida por simples aplicação de formulas ou regras. No quadro 1, Duval (2007) mostra como se efetuam as mudanças de comportamento em relação às atividades de tratamento e conversão. (Operações de tratamento e conversão) Permanecendo no mesmo sistema: Tratamento Mudança de registro, mas conservando as mesmas características dos objetos: Conversão Em geral, este tipo de transformação é mais usado, pois ele corresponde a procedimentos de provas, justificativas. Pedagogicamente, a procura do melhor registro, nestes casos, produz uma melhor compreensão e os resultados são mais visíveis para os alunos Neste tipo de transformação pode ocorrer o fenômeno da não-congruência. Em geral, isso acontece em função de os alunos não conseguirem perceber duas representações diferentes dos mesmos objetos. No processo de conversão, os fatores de não-congruência mudam de acordo com os tipos de registros envolvidos, em que a conversão pode e deve ser efetivada. Quadro 1: Transformações de uma Representação Semiótica em outra Representação Semiótica Fonte: Adaptado de Duval ( 2007) 31 2.3 Tipos de Representações Semióticas Dentre os vários tipos de representações, Duval (2004) também chama a atenção para as características das representações conscientes e não conscientes, em que a oposição consciente/não consciente é o contraste entre o que parece um assunto em estudo e o que ele não percebeu dele. Por outro lado, pode ser visto como o que está faltando para complementar e ele não pode apontar o que falta. Nesse sentido, a consciência pode ser caracterizada pelo objetivo de algo a ser conquistado. Assim, a parcela da consciência não consciente tem um correspondente processo de objetivação, para que o sujeito se torne consciente. As representações conscientes podem ser vistas como aquelas que apresentam caráter intencional e desempenham uma função de objetivação. Para Duval (1995), o caráter intencional das representações conscientes é essencial do ponto de vista cognitivo, pois permite levar em consideração o papel fundamental da significação nas determinações dos objetos que podem ser notados pelo sujeito. Para ele, as representações geométricas são exemplos típicos desses tipos de representações. As representações conscientes externas são essenciais para a função de tratamento. As atividades de tratamento por sua vez estão diretamente ligadas à utilização de um sistema semiótico. Já as funções conscientes internas são designadas como funções de objetivação e a função de objetivação de si, quase sempre, é equiparada à de expressão para as outras funções. Dessa forma, é independente. O quadro 2 caracteriza bem esses dois tipos de funções e de representações. INTERNA EXTERNA Consciente Mentais Função de objetivação Semiótica Função de objetivação Função de expressão Função de tratamento intencional Não Consciente Computacional Função de tratamento Automática Ou quase instantânea - Quadro 2: Tipos de Funções e de Representações 32 Fonte: Adaptado de Duval (1995) Convém informar que não fizemos referência à função de tratamento computacional, por não termos trabalhado com esse tipo de tratamento. Os tratamentos intencionais são aqueles que levam menos tempo. O controle consciente do indivíduo se concentra exclusivamente em dados do objeto observados anteriormente. Duval (2004) também relaciona como essencial a oposição entre as representações externas e internas. Para ele, a oposição ocorre entre uma pessoa, organização ou sistema e é diretamente visível e observável. Por outro lado, as representações externas são produzidas por um sujeito ou por um sistema. As representações internas são representações que pertencem a um sujeito e não são disponibilizadas para outrem, através da produção de uma representação externa. As representações externas são por natureza representações semióticas. Dessa forma, essas representações estão ligadas a um estudo de desenvolvimento e controle de um sistema semiótico. Assim, percebemos que, em Matemática, existe uma diversidade de registros de representação de um mesmo objeto. Entretanto, é a mobilização e a articulação desses diferentes registros que levam a uma compreensão em Matemática, embora algumas abordagens didáticas não reproduzam esse aspecto. Por outro lado, a idéia de que todos os registros de representações de um mesmo objeto tenham conteúdo semelhante, ou que se permita ver em outros, é muito duvidosa. Nessa perspectiva, Duval (2007) afirma que a oposição, muitas vezes feita entre a compreensão que seria conceitual ou puramente mental e as representações semióticas que seriam externas, aparece como enganadora, haja vista que as representações mentais, na maioria das vezes, não passam de representações semióticas internas. Sendo assim, as representações semióticas não são nem internas nem externas. O quadro 3 exemplifica essa situação. 33 SISTEMA DE PRODUÇÃO - MENTAL INTERNA MATERIAL EXTERNA - - Oral Visual (suporte de papel ou tela de computador) - Produção para si próprio Produção para os outros Produção para si próprio ou para os outros Semiótico (Produção intencional) Discurso interior Objetivação e funções de tratamento Interações verbais Funções de comunicação Escrita, figuras funções de tratamento de comunicação e de objetivação Natural (Produção automática) Memória visual Função de objetivação - - Quadro 3: Fenomenologia das Representações Mentais Fonte: Adaptado de Duval (2007) Do quadro 3, concluímos que as representações mentais que tenham aplicação em Matemática são representações interiores, em processo de interação e tratamento com representações semióticas externas. Por outro lado, para Duval (2007), a compreensão em Matemática implica a capacidade de mudar de registro, dado que os objetos matemáticos nem sempre são perceptíveis. Dessa forma, o acesso aos objetos matemáticos passa, necessariamente, por representações semióticas. Além do mais, isso mostra porque a evolução dos conhecimentos matemáticos nos conduz ao desenvolvimento e à variedade de registros de representação. Um dos pontos dessa pesquisa consistiu de procurar desenvolver no aluno a percepção, reconhecimento e explicitação de expressões numéricas advindas de formulação de problemas, em linguagem natural e vice-versa. Além desse aspecto, em se tratando de expressões numéricas, foi possível por parte do aluno o reconhecimento de expressões escritas de formas diferentes, sem que necessariamente se tratasse do mesmo objeto. Isso porque, trabalhando com expressões numéricas, mesmo em nível de problemas envolvendo números 34 naturais, ao mudarmos a posição de certos números, podem ocorrer resultados totalmente diferentes, em relação à expressão anterior ou mesmo nem existir uma solução, no conjunto dos números naturais. Segundo Duval (2004), a distinção entre sentido e referência está estreitamente ligada ao princípio da substituição, que é essencial nas operações de cálculo. Dessa forma, duas expressões, possuindo a mesma referência, podem ser modificadas ou trocadas uma pela outra, em uma fórmula, ou ser operado apenas o deslocamento de algum símbolo, podendo o conjunto verdade mudar ou não. Por outro lado, ainda segundo Duval (2004), o trânsito entre as várias representações possíveis de um mesmo objeto matemático tem um papel fundamental. O valor cognitivo desse trânsito vai depender, principalmente, da noção de congruência semântica. Em síntese, o aluno pode perfeitamente reconhecer a operação 5-4, entretanto, pode não reconhecer que 5-4 é o mesmo que 5º. Pode também ocorrer que, para uma expressão do tipo20 (4 : 2) 22+ = , o aluno consiga formular um enunciado, um problema, utilizando a linguagem natural, sem que necessariamente consiga dar uma solução à expressão dada. Ou pode ocorrer que o aluno não consiga visualizar que os números dispostos na expressão (20+4):2=12, embora sejam os mesmos da expressão anterior, diferem da anterior, portanto objeto diferente, com resposta diferente. Para Moretti (2007), em discussões sobre ensino-aprendizagem de conceitos em Matemática, uma preocupação, frequentemente levantada, é de como transformar objetos de pesquisa em objetos de ensino. Essa preocupação é fruto do papel das representações semióticas e da noção de congruência semântica na aprendizagem em Matemática. Convém ressaltar que nem sempre a semelhança semiótica e semântica é suficiente para satisfazer a continuidade do discurso matemático. Neste caso, deve ser dada uma segunda dimensão ao objeto matemático que torne necessário ou não a se recorrer a uma terceira maneira de expressão do objeto. Para que uma declaração possa estabelecer a continuidade entre duas frases, expressão, como entender o que está escrito e satisfazer as mesmas condições, uma semelhança semiótica ou semântica de cada uma das declarações está ligada ao ato da produção intencional da pergunta e da expressão numérica que sucede ao enunciado. Portanto, não há expansão discursiva de um enunciado que não se baseie na combinação de uma semelhança semiótica ou semântica e de uma semelhança interna ou externa. 35 O quadro 4 objetiva explicitar melhor essas situações de semelhança entre semiótica e semântica. Mecanismo de Expansão Semelhança Interna - continuidade sem ter enunciado Semelhança Externa - continuidade com enunciado Semelhança semiótica (se recuperam alguns significantes) Associações verbais Linguagem do inconsciente Expansão dos símbolos, escrita algébrica etc. Semelhança semântica, significantes diferentes e mesmo objeto Expansão suficiente com o conhecimento da linguagem natural Descrição, narração e argumentação Expansão cognitiva: exige o conhecimento de definições, regras ou leis para um domínio do objeto. Explicação, demonstração por dedução ou por absurdo Quadro 4: Formas de Expansão Discursiva de uma Expressão Fonte: Adaptado de Duval (2004) Observamos, no quadro 4, que as formas de expansão discursiva são opostas às situadas nas posições diagonais desse quadro e caracterizam tipos de discursos, sem que se tenha nenhum ponto comum entre eles. Em função da grande variedade de representações semióticas utilizadas em Matemática, tais como: sistemas de numeração, enunciados de problemas em linguagem natural, expressões numéricas e representação geométrica de um problema, figural, mesmo que utilizadas de forma diferenciada da linguagem corrente, os quadros apresentados anteriormente facilitarão bastante a análise dessas situações problemas correntes em Matemática. Mesmo que a utilização dessas formas diferenciadas seja diferente das da linguagem corrente, Duval (2007) propõe o quadro 5 para designar esses tipos diferentes de representação semiótica e que melhor sintetiza as argumentações para esse trabalho. 36 TIPOS DE REGISTROS REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA REPRESENTAÇÃO NÃO DISCURSIVA MULTIFUNCIONAIS Neles, os tratamentos em geral não podem ser expressos em forma de algoritmos. Linguagem natural Associações verbais (conceituais) Formas de raciocinar: Argumentação a partir de observação. Dedução por tentativas ou por definição Figuras geométricas planas em uma ou duas dimensões. Apreensão operatória, desenvolvimento. Construção com instrumentos. MONOFUNCIONAIS Em geral, os tratamentos podem ser expressos em forma de algoritmos. Sistema de escrita: Numérica Algébrica Simbólica Gráficos cartesianos: Mudança de sistema de coordenadas Interpolação ou extrapolação Quadro 5: Diferentes Tipos de Registros Semióticos utilizados na Atividade de Matemática Fonte: Adaptado de Duval (2007) A aprendizagem em Matemática deve ser precedida da mobilização simultânea de, pelo menos, dois registros de representação ao mesmo tempo, ou na viabilidade de haver permuta a todo instante de registros. Dessa forma, se quisermos analisar as dificuldades de aprendizagem em Matemática, devemos estudar, principalmente, a conversão das representações semióticas. 37 CAPÍTULO 3 Revisão de Literatura Se o professor atormenta os seus alunos e, em lugar de conquistá-los, estimula ódio contra si mesmo e contra a matemática que ensina, não apenas o seu ensinamento será negativo, mas ter que conviver com tantos inimigos será para ele um tormento contínuo. (Giuseppe Peano, 1858-1932) A educação é fator preponderante para promover o desenvolvimento de uma nação. A cada dia, torna-se mais evidente que a economia moderna avança, a partir de sujeitos dotados de capacidades e de saberes que possam processar informações, em menor espaço de tempo. Assim, as competências cognitivas, sociais e tecnológicas são fatores primordiais para o progresso social. Por conseguinte, a aprendizagem construída na base da pirâmide educacional torna-se cada vez mais imprescindível para alcançarmos esses objetivos. Sem educação de qualidade, caminhamos para a formação de sujeitos sem perspectivas de qualidade de vida. Quando surge uma nova metodologia, um novo currículo ou um novo movimento em favor de mudanças de atitudes, em geral, não é aceito de forma imediata, sempre vão existir desconfianças e rejeição por parte da maioria dos professores. Por outro lado, qualquer teoria de aprendizagem, aplicada à educação, estará sempre em busca de uma educação que privilegie o aprender das crianças. Assim, a prática de ensino precisa ser uma ação pedagógica em processo contínuo, visando à melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem da criança. Várias pesquisas em Educação Matemática têm sido feitas no Brasil, em particular as que estudam a aprendizagem escolar e o desenvolvimento cognitivo. Entretanto, acreditamos, muitas delas com enfoques um pouco diferentes da Teoria dos Registros de Representação Semiótica. Essa Teoria foi aplicada na investigação de que trata este trabalho, cujo objetivo foi o de melhorar o desempenho escolar em Matemática, dos alunos do sexto ano A do Ensino Fundamental, do Colégio Universitário da UFMA, principalmente, em atividades relacionadas à resolução de problemas de aritmética, envolvendo operações com números naturais. 38 3.1 Pesquisas Aplicando a Teoria dos Registros de Representação Semiótica Sobre a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, buscamos o que havia de publicações realizadas nos últimos anos. Dentre os trabalhos levantados e pesquisados, selecionamos apenas aqueles que, de certa forma, possuem alguma interseção com este trabalho e que tenha aplicado essa Teoria. Pavlopoulou (1994) investigou a aplicação da Teoria dos Registros de Representação Semiótica no ensino propedêutico de álgebra linear. O objetivo foi promover a coordenação dos diferentes registros de representação. Ele propôs aos alunos de álgebra linear, do DEUG A (Primeiro ano universitário), da Universidade de Strasbourg, uma variedade de situações para as famílias de vetores em cada um dos seus registros, assim como tarefas que levassem a explorar sistematicamente as possíveis variações que estivessem representadas em um cadastro e fornecer, ou observar as variações concomitantes de performances em outro registro. Foram desenvolvidas quatro pesquisas com os alunos. Nessas pesquisas, foi pedido para os alunos realizarem conversões, representações de famílias de vetores no plano e no espaço e representarem três registros: gráfico, tabelas e simbólico. Foi organizada uma sequência didática de ensino de oito horas, a fim de promover a coordenação da aplicação dos registros de representação semiótica, com o objetivo de: a) verificar se era possível conseguir aprendizagem, usando conversão; b) se essa aprendizagem, se bem sucedida, facilitava o acesso a objetos e conceitos matemáticos. O experimento foi realizado com alunos que já haviam concluído o programa tradicional de ensino de álgebra linear, mas que não tinham concluído os exames finais do primeiro semestre. Foram escolhidos ainda três grupos (população experimental) que seguiam a sequência de ensino e dois outros (grupo controle) que foram monitorados, durante este tempo de educação formal feita pelo próprio professor. Um primeiro questionário foi aplicado em duas populações (144 alunos), antes da sequência de ensino. O questionário constou de três partes: a primeira tratava da aplicação da conversão e trabalhava com questões de representação de uma família de vetores, no plano ou no espaço tridimensional; a segunda dizia respeito à noção de vetor e a terceira constou de exercícios clássicos de álgebra linear. Para avaliar a evolução das duas populações, foi aplicado um segundo questionário, após o término da sequência de ensino. Os resultados das duas populações 39 foram analisados, comparando os resultados obtidos da população experimental com o da população do grupo de controle. Os resultados que Pavlopoulou (1994) encontrou como respostas dos alunos, sujeitos da pesquisa, foram considerados ruins. Ele justificou, afirmando que isso ocorreu, devido às dificuldades que os discentes tiveram em realizar as passagens de um tipo de registro a outro, especificamente: a) nas soluções algébricas, usadas pela maioria dos alunos. Nesses tipos de registros, apareceram três tipos de dificuldades: • transição de registros, em termos de equações, expressos em linguagem natural para o registro simbólico. • pouco desenvolvimento com o tratamento de registros simbólicos. • dificuldade de interpretar graficamente os resultados obtidos. b) nas soluções geométricas, apenas dois registros foram estabelecidos: a linguagem natural e a representação através de gráficos. Pavlopoulou (1994) observou, também, que houve uma tendência geral de representação dos estudantes em traduzir os conceitos abstratos da álgebra linear. Essa abstração parece ser a preocupação central das propostas já conhecidas. O autor notou, no entanto, que, em geral, o conceito de representação utilizado fora ainda de forma vaga: não soube se foram em função das representações mentais de representações semióticas ou de exemplos de uso em áreas supostamente mais familiares. Em geral, Pavlopoulou (1994) considerou que a passagem de um registro para outro é uma compreensão natural dos conceitos matemáticos envolvidos. Entretanto, os resultados das investigações e as avaliações feitas mostraram que os alunos fizeram justamente o contrário. Muitos calouros universitários não conseguiram realizar a função de conversão em tarefas relativamente simples. Além disso, o sucesso realizado em determinadas tarefas de conversão não sinalizou para que se pudesse prever que o comportamento a ser realizado em outras atividades de conversão aparentemente semelhantes também tivesse sucesso. Pavlopoulou ainda observou que os alunos confundiram o objeto matemático com o vetor de seu representante, em especial, com a seta desenhada no plano ou no espaço tridimensional. Os discentes também apresentaram grandes dificuldades para realizar conversões de representações de um registro para outro registro, especialmente quando combinado com vários tipos de registros, como, por exemplo, figural, vetorial e os registros da escrita simbólica. 40 No ensino-aprendizagem da Matemática não devemos levar em consideração apenas os aspectos tais, como, procedimentos e métodos que levam o aluno a construir conceitos matemáticos. Devemos, também, considerar os aspectos cognitivos em que analisemos como o aluno aprende. Dominoni (2005) investigou como se dava o processo da aplicação dos diferentes registros de representação na aprendizagem de função exponencial. Na pesquisa, foram utilizados os procedimentos metodológicos da Engenharia Didática, considerados adequados ao estudo dos processos de ensino-aprendizagem referentes à construção do conceito de função exponencial, desenvolvidos por meio de uma sequência didática, por se caracterizar por um esquema experimental baseado em “realizações didáticas” na sala de aula. O autor enfatizou a concepção, a observação e a análise da sequência de ensino. Depois de realizada a pesquisa do referencial teórico, foi elaborada uma sequência didática baseada na teoria dos registros de representação semiótica. Essa sequência ocorreu por meio de um processo interativo entre professor e alunos, buscando estratégias mais efetivas e constou, inicialmente, de sete atividades de ensino que permitiam ao aluno compreender função exponencial e lidar com diferentes registros de representação desta função (linguagem natural, registro tabular, registro gráfico e registro algébrico). A segunda sequência foi realizada numa única aula e constituiu-se de seis atividades, planejadas de modo a contemplar a conversão, o tratamento e a coordenação entre os diferentes registros. Participaram da pesquisa 27 alunos da primeira série do ensino médio de uma escola particular da cidade de Arapongas, na faixa etária de 13 a 15 anos, em que a pesquisadora atuou como professora. Os alunos foram distribuídos em doze duplas e um trio, embora no trabalho o autor tenha utilizado apenas 8 duplas. O critério utilizado de escolha das duplas foi a frequência dos alunos às aulas. Os resultados da pesquisa revelaram que os alunos, em geral, apresentavam dificuldades para representar os pontos no gráfico, estranhavam o traçado da curva, iniciavam tentando traçar uma reta; como não era possível, perguntavam se o registro estava correto e solicitavam ajuda do professor. Apenas a conversão do registro tabular para o registro gráfico não apresentou muitas dificuldades para a maioria das duplas. No entanto, as conversões e coordenações entre registros não ocorreram de forma espontânea; em geral, os alunos solicitavam ajuda ao professor. A conversão entre o registro em linguagem natural e o registro algébrico apresentou o maior grau de dificuldade de operacionalização. Revelaram, também, que, em geral, nos livros didáticos, é enfatizada apenas a identificação de função, usando 41 diferentes registros de tratamento. Esses instrumentos de ensino não enfatizam com a mesma intensidade a conversão e a coordenação entre elas. Buehring (2006) investigou de que forma era possível elaborar uma sequência de ensino de noções básicas de análise de dados, para alunos da primeira série do ensino fundamental, utilizando e coordenando diferentes registros de representação semiótica. Para desenvolver a investigação dessa questão de pesquisa, a autora aplicou um pré-teste que constou de uma sequência didática composta de quatro aulas, com duração de uma hora e meia cada aula, em quatro dias seguidos, para observar as possíveis dificuldades dos alunos e para verificar as idéias que as crianças poderiam construir sobre conceitos de análise de dados. Na aula 1, a autora desenvolveu as seguintes atividades: a) Perguntou aos alunos os nomes deles e sugeriu que cada um deles escrevesse seu nome numa ficha. Combinou coletivamente uma cor para os meninos pintarem suas fichas e uma cor para as meninas pintarem, também, suas fichas. Pediu que todos os alunos colassem as fichas num papel pardo em frente ao quadro de giz. b) Perguntou às crianças quantos meninos e quantas meninas havia na sala e deixou que eles fizessem esses registros de forma aleatória. Na aula 2, foram repetidos os mesmos trabalhos realizados na aula 1, tendo-se em seguida feito a comparação desses dados. Na aula 3, foram retomados os dados das aulas anteriores e construídas malhas quadriculadas, formando gráficos de colunas de diferentes tipos, registrando esses gráficos em cartazes. Na aula 4, foi revisado o que já tinha sido feito nas aulas anteriores. Foi solicitado que cada aluno definisse o que era gráfico e o que era tabela. Também, foi distribuído aos alunos vasto material impresso, para que eles identificassem tabelas e gráficos, recortassem- nos e colassem em separado os tipos semelhantes. Nas atividades, foi observado que os alunos utilizaram os registros de conversão, ao passarem do real para a representação nas fichas, tendo isso acontecido gradualmente. Observou a autora que houve crescimento significativo, com o desenvolver das aulas e de forma natural, embora, às vezes, provocado pela professora. Foi observado, também, que os alunos conseguiram representar vários tipos de registros de representação semiótica: pintados em tabela, icônica e numericamente. Foi constatado que os discentes perceberam que os diferentes tipos de tabelas e gráficos poderiam servir para representar semioticamente uma mesma informação. 42 Foi observado, ainda, que, nas atividades desenvolvidas, usando diferentes tipos de registros de representação semiótica, as respostas obtidas foram muito boas, em relação à visualização da realidade pela criança, no tratamento com o objeto de estudo. A pesquisa revelou, também, a capacidade das crianças em operar e coordenar diferentes registros de representação, além de terem desenvolvido suas capacidades de ler e de fazer interpretação de dados. Buratto (2006) fez um estudo reflexivo sobre a formação inicial de professores de Matemática e o ensino-aprendizagem do conteúdo de áreas de figuras geométricas planas. Desenvolveu uma proposta alternativa de metodologia que buscava uma nova prática pedagógica, assim como a formação de conceitos geométricos. O suporte teórico utilizado foi baseado na Teoria dos Registros de Representação Semiótica. A pesquisa foi realizada em três fases: revisão bibliográfica, trabalhos com os alunos de licenciatura, o que foi denominado de experiência, e elaboração de uma proposta pedagógica de atividade didática. A revisão bibliográfica foi feita através da seleção de pesquisas baseadas no ensino-aprendizagem da geometria e tendo como aporte a teoria dos registros de representação semiótica. A experiência foi realizada com 30 alunos do quinto semestre do Curso de Licenciatura em Matemática, da Universidade do Planalto Catarinense – UNIPLAC. Esses alunos foram escolhidos pelo fato de já haverem concluído as disciplinas básicas de licenciatura. Essa fase da pesquisa teve início com a aplicação de um questionário aos alunos, objetivando explorar a utilização dos registros de representação semiótica, quanto à aplicação de diferentes registros, no uso de tratamento e conversão em problemas de geometria. A análise do questionário foi feita por meio de simples correção de itens e serviu para orientar quanto à elaboração de nove atividades de aprendizagem que serviriam de base para a adequação da proposta de atividade didática. Essas atividades foram aplicadas ao longo da pesquisa. Foi constatado que a estratégia utilizada pelos alunos, para resolver os exercícios que envolviam cálculo de áreas de figuras geométricas, na maioria das vezes, ainda foi a da memorização. Poucos alunos utilizaram a figura geométrica e a mudança de registros de representação como ferramenta na resolução dos problemas. Foi constatado, também, que os tipos de problemas propostos e a metodologia de trabalho adotada pelo professor da turma constituíram-se fatores determinantes para o desenvolvimento da aprendizagem dos alunos. E, ainda, que as atividades apresentadas pelo processo das apreensões, envolvendo a aplicação 43 dos diferentes registros, muito contribuíram para o desenvolvimento do ensino-aprendizagem da geometria. A autora constatou que as dificuldades de domínio em trabalhar com os diferentes tipos de registros de representação semiótica, na apreensão da aprendizagem da geometria, ocorreram muito mais em função de deficiências de conteúdo. Alguns alunos ainda desconheciam que a Matemática, para ser compreendida, não basta que ela seja ensinada apenas de modo lógico, ou seja, como funciona ou como pode ser aplicada; depende, também, da habilidade do professor e do interesse em fazer com que os alunos aprendam. Como proposta didática, Buratto (2006) propôs adotar uma postura crítica e autônoma e compreender que o ensino da geometria deve ser visto para além do uso de técnicas, fórmulas, identificação. Deve ser vista, também, como uma atividade do pensamento que pode proporcionar grande desenvoltura no olhar, no resolver e no saber e que, dominando as mudanças de linguagem (linguagem natural para linguagem figural) das representações semióticas, o ensino e a aprendizagem da Matemática se tornarão mais objetivos. Silva (2007) investigou como os estudantes do ensino médio utilizaram os registros de representação semiótica na resolução de problemas de Matemática. Segundo a autora, os enunciados dos problemas estão escritos normalmente na língua natural ou, às vezes, em linguagem gráfica, geométrica etc. Assim, em geral, o aluno precisa traduzir os enunciados dos problemas para outra linguagem, implicando numa mudança de registro que, normalmente, com os quais o aluno não possui habilidades para operar. Como procedimento da pesquisa, foi aplicado um teste exploratório em duas escolas da Rede Pública de Ensino do Estado de São Paulo, com a função de preparar para o teste final. Na primeira escola, o teste foi aplicado numa turma de segundo e de terceiro ano do ensino médio; na outra escola, apenas numa turma do segundo ano do ensino médio, totalizando 114 alunos. A escolha dos sujeitos foi aleatória, em relação à faixa etária e gênero. No teste, havia quatro questões selecionadas do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM – 2003. Essas questões foram selecionadas em conformidade com o assunto que estava sendo ministrado em sala de aula. Numa primeira análise, foi constatado que os alunos haviam respondido apenas uma questão, das quatro propostas. O segundo teste foi elaborado com duas questões do ENEM, sendo uma delas a que obteve sucesso de respostas no teste exploratório, e mais duas questões elaboradas pelo pesquisador. Esse teste foi aplicado em outra escola, para evitar que os estudantes que já haviam participado do teste exploratório influíssem no resultado. As questões retiradas do 44 ENEM sofreram pequenas alterações na formulação da pergunta, assim como em relação ao gabarito divulgado pelo ENEM. O segundo teste foi replicado em outra escola, para 56 alunos do terceiro ano do ensino médio. Para a análise dos resultados, ele levou em consideração: a) análise do enunciado o qual trazia como um registro de partida aspectos sintáticos e semânticos. b) análise e objetivos do problema c) conhecimentos requeridos d) registros de representação semiótica presentes no enunciado do problema e prováveis registros presentes na resolução. Durante a análise, verificou-se que foram poucos os alunos que recorreram a uma variedade de registros de representação semiótica. Em 114 respostas, apenas uma conversão foi realizada com sucesso; em 78, apenas duas e em 7, apenas 03 alunos apresentaram suas soluções, usando a função de conversão corretamente. Silva (2007) observou que os alunos apresentaram muitas dificuldades no uso da linguagem algébrica, consequentemente poucos resolveram problemas dessa área. Observou, também, que, em função do desconhecimento da representação do objeto, isso influenciou negativamente no desempenho do aluno. Constatou, ainda, que, na utilização da conversão da linguagem natural para um registro figural, a maioria dos alunos não conseguiu representar de forma adequada. Em função dos resultados obtidos, a autora sugeriu que fosse aplicada a Teoria dos Registros de Representação Semiótica, nas aulas de Matemática, para que os alunos pudessem ter um melhor desempenho na resolução de problemas. Brandt (2005) procurou investigar quais as formas de organizar e propor, no processo de ensino, situações que permitissem aos alunos compreender o sistema de numeração decimal, enquanto forma de comunicação e de registro da medida de um conjunto. Também investigou como atribuir sentido e significação aos registros de representação do número, em suas formas de escrita e numeral arábico que veiculam a estrutura do Sistema de Numeração Decimal. Como metodologia, foram utilizadas, como instrumento de coleta de dados, provas distribuídas em tarefas. Essas provas foram testadas em menores grupos de sujeitos, a fim de refinar o instrumento em relação às compreensões buscadas. Foram elaborados dois instrumentos pilotos, propostos em dois momentos distintos. O primeiro constou de uma replicação de uma prova de Kamii (1992) e de outras 45 duas provas de outros pesquisadores, mas com algumas alterações. As provas foram aplicadas a dois sujeitos do ensino fundamental: um de uma escola estadual de Ponta Grossa, Paraná; o outro, de uma escola estadual do Balneário de Camboriú, Santa Catarina. Num segundo momento, outras provas foram elaboradas e aplicadas a oito alunos da terceira série de uma escola estadual de Navegantes, em Santa Catarina. Num terceiro momento, foi organizado o instrumento final de coleta de dados, composto das provas já aplicadas e replicadas a 47 crianças de 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental de uma escola de Ponta Grossa, Paraná. Foi utilizado o método “clínico-crítico”, para conduzir as provas e proceder com a análise interpretativa dos desempenhos e conduta dos sujeitos. A aplicação das provas foi feita pela pesquisadora. Após a aplicação destas, foi procedida a identificação dos tipos de respostas para uma mesma questão e categorizadas pelas diferentes soluções. Na primeira prova, os sujeitos tinham que contar fichas, anotar o valor num papel e circular, na escrita arábica, o número de fichas correspondentes a cada dígito da representação, de acordo com o seu valor relativo. Para os valores escritos em escrita arábica, num cartão, separavam o número de objetos correspondentes e os circulavam de modo a representar os algarismos. Na segunda prova, os sujeitos realizaram, numa folha de papel , uma operação de adição mental, com reserva, envolvendo números de dois algarismos e uma subtração, também, com reserva. Eles deveriam justificar a necessidade do empréstimo e a sua transformação em 10 unidades – caso da subtração – e o procedimento adotado para a soma que ultrapassasse 10 unidades. Numa terceira prova, os sujeitos receberam os cartões nos quais estava escrito: 1 unidade, 2 unidades ...; 3 dezenas, 5 dezenas ... centenas etc. Um número determinado aleatoriamente pelo sujeito, pertencente a um intervalo dado, deveria ser escolhido e os cartões representativos da quantidade separados. Outra prova aplicada envolvia a operação de conversão. Devido às variações nas unidades, sempre levavam a uma referência em outro objeto, no caso, outro número. Foi também realizada uma prova de reconhecimento do conteúdo, com a aplicação dos registros de representação semiótica, no sistema de numeração decimal. Os dados foram analisados de duas formas: identificação das respostas dadas, dos procedimentos e estratégias adotadas e das explicações e argumentações à interpretação dos resultados construídos pelas crianças. 46 Na pesquisa, foi observado que os alunos não reconheciam um mesmo objeto em representações diferentes. Este reconhecimento era absolutamente necessário para que um sujeito pudesse utilizar formas alternativas de mobilização do registro. Concluiu, também, que as crianças utilizavam os nomes de números e a escrita arábica, para denominar objetos de uma coleção ou para se referir à medida de um conjunto. Entretanto, essas crianças não reconheciam, nesses registros de representação, a estrutura do sistema de numeração decimal. Nesse caso, constatou que o não reconhecimento do objeto nos registros, pelas crianças, configurou um retrocesso. Observou que as crianças não conseguiram realizar a conversão não congruente entre a palavra e o numeral arábico. Esta função de não congruência foi maior, quando a função de estudo acontecia para valores no intervalo [11;15]. Observou, também, que a maioria das crianças não foi capaz de identificar, nos dígitos da representação semiótica por algarismos, o valor relativo das unidades de acordo com a posição que ocupava. Poucas crianças foram capazes de enxergar, nos dígitos da representação por algarismos, os agrupamentos e os agrupamentos de agrupamentos. Entretanto, todas as crianças produziram números com três algarismos, mudando de posição os algarismos no numeral, identificando- os e ordenando-os, segundo o critério pedido. Identificou, também, nas produções dos alunos, atribuição de sentido pertencente à função apofântica5 em que conseguiram lidar com as dez unidades como uma dezena e com cem unidades como uma centena. Karrer (2006) pesquisou que tipo de mecanismo cognitivo de compreensão foi desencadeado pelos estudantes, quando se deparavam com uma abordagem diferenciada do conteúdo das transformações lineares, na perspectiva dos registros de representação semiótica. A metodologia utilizada constou de análise de livros didáticos e aplicação,