UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP CÂMPUS DE JABOTICABAL DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE AFECÇÕES ORAIS EM MACACOS PREGO (SAPAJUS sp .) MANTIDOS EM CATIVEIRO Aline Cavalcanti Pereira da Silva Médica Veterinária 2019 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP CÂMPUS DE JABOTICABAL DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE AFECÇÕES ORAIS EM MACACOS PREGO (SAPAJUS sp .) MANTIDOS EM CATIVEIRO Aline Cavalcanti Pereira da Silva Orientador: Prof. Dr. João Moreira da Costa Neto Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP – Campus de Jaboticabal, como parte das exigências para a obtenção do título de Doutor em Cirurgia Veterinária. 2019 FICHA CATALOGRÁFICA CERTIFICADO DE APROVAÇÃO DADOS CURRICULARES DO AUTOR ALINE CAVALCANTI PEREIRA DA SILVA – nascida no dia 30 de Março de 1988, natural de Salvador– BA. Graduada no curso de Medicina Veterinária na Universidade Federal da Bahia, no ano de 2011. Desenvolveu dois projetos de iniciação científica, sob orientação da Profa. Dra. Stella Barrouin, na área de Clínica Médica. Durante a graduação, participou de vários cursos e estágios, sendo a maioria relacionada com as áreas de Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais. No período de 2013 a 2015 fez especialização na área de Odontologia de Pequenos Animais, sob orientação do Prof. Dr. Marcello Roza. Neste Período, também fez o Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia, no Instituto de Ciência da Saúde da UFBA, sob orientação do Prof. Dr. Antônio Luiz Barbosa Pinheiro, na área de Laserterapia e Reparo Ósseo. Em Outubro de 2015 foi aprovada no Programa de Pós-Graduação (Doutorado) em Cirurgia Veterinária, na FCAV/UNESP de Jaboticabal, sob orientação do Prof. Dr. João Moreira da Costa Neto. Palestras e aulas foram ministradas, durante o período do Mestrado e Doutorado, abordando temas relacionados às áreas de Cirurgia de pequenos animais e Odontologia Veterinária. DEDICATÓRIA À minha razão de viver. A pessoa que quando nasceu, me fez renascer. Dedico, como uma ínfima amostra de minha gratidão, a Maria Clara Cavalcanti Pereira de Oliveira, minha filha amada. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, por ter me proporcionado tantos momentos desafiantes, alegres, alguns tristes, durante este período. Agradeço, sobretudo, pela forma a qual me guiou para lidar com cada um destes, e descobrir qual era a mensagem de aprendizado por trás das situações. Agradeço por tanto ter evoluído e me tornado uma pessoa melhor. À minha avó, Nadege Farias (in memoriam) por ser meu exemplo de força e superação, obrigada por seu amor em todos os momentos de minha vida, sempre se fazendo presente, mesmo que ausente. Aos meus pais, Almir Pereira e Kátia Farias, pelo apoio incondicional, incentivo constante, sempre mostrando que o estudo é o meio mais gratificante para vitória. Aos meus irmãos e ídolos, Silvia Fleming e Alexandre Cavalcanti, pelos conselhos e pela oportunidade de convívio e amor nesta vida, que se repita eternamente. Ao meu marido, Rafael Oliveira, por ser meu porto-seguro, meu companheiro, enxugando minhas lágrimas e vibrando com minhas vitórias, sempre ao meu lado. Ao meu orientador, Prof. João Moreira, que confiou em mim como aluna e orientada, sempre com grandes soluções na construção e execução deste trabalho. À Profa., Melissa Hassen pelo apoio e ajuda, por me acolher como aluna desde o primeiro dia que nos conhecemos. Ao CETAS -IBAMA e à médica veterinária Fernanda Libório, por permitirem a execução do trabalho, sempre muito disponíveis e atenciosos. Ao médico veterinário, Roberto Fecchio, sempre disponível para acrescentar nas pesquisas odontológicas, com sua experiência e aconselhamento, nos momentos de maior necessidade. Aos meus amigos da UFBA, Eunice Andrade e Lucas Nogueira, obrigada por todos os momentos vividos durante esses meses, pela disponibilidade, parceria e apoio durante toda a pesquisa. Aos meus eternos amigos, que sempre entendem minhas ausências pelo estudo, escutam minhas lamentações pelo cansaço e me amam independente de qualquer situação, obrigada. Aos funcionários do HOSPMEV, que de maneira direta ou indireta contribuíram para realização deste trabalho. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. A todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a conclusão deste trabalho. Muito obrigada! i SUMÁRIO CERTIFICAÇÃO DA COMISSÃO DE ÉTICA NO USO DE ANIMAIS iii SISTEMA DE AUTORIZAÇÃO E INFORMAÇÃO EM BIODIVERSIDADE - SISBIO iv RESUMO v ABSTRACT vi CAPÍTULO 1 – Considerações Gerais 1 1.1 Introdução 1.2 Objetivo 1 2 1.3 Revisão de Literatura 3 1.3.1 Macacos-prego 3 1.3.2 Odontologia de animais selvagens 4 1.3.3 Anatomia dentária 5 1.3.4 Microbiota oral 9 1.3.5 Avaliação odontológica 10 1.3.6 Principais afecções orais em primatas não-humanos 11 1.4 Referências 15 CAPÍTULO 2 – Frequência de afecções orais e clínico-cirúrgico em macaco- prego (sapajus sp) 18 RESUMO 18 2.1 Introdução 19 2.2 Material e Métodos 20 2.2.1 Considerações éticas 20 2.2.2 Animais 20 2.2.3 Protocolo anestésico 20 ii 2.2.4 Avaliação odontológica 21 2.2.5 Período de acompanhamento 21 2.2.6 Análise estatística 23 2.3 Resultados 23 2.4 Discussão 29 2.5 Conclusão 32 2.6 Referências 32 CAPÍTULO 3 – Avaliação do perfil microbiológico e de suscetibilidade antimicrobiana de bactérias da mucosa oral e biofilme supra e sub gengival em Macacos-prego (Sapajus sp.) 34 Resumo 34 3.1 Introdução 35 3.2 Material e Métodos 37 3.2.1 Considerações Éticas 37 3.2.2 Animais 37 3.2.3 Coleta de amostras 37 3.2.4 Microbiota residente 38 3.2.5 Avaliação da formação de biofilme supra e sub-gengival 39 3.2.6 Isolamento, identificação e sensibilidade antimicrobiana 40 3.3 Resultados 42 3.4 Discussão 46 3.5 Conclusão 48 3.6 Referências 48 iii CERTIFICADO DA COMISSÃO DE ÉTICA NO USO DE ANIMAIS iv SISTEMA DE AUTORIZAÇÃO E INFORMAÇÃO EM BIODIVERSIDADE - SISBIO v DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE AFECÇÕES ORAIS EM MACACOS PREGO (SAPAJUS sp .) MANTIDOS EM CATIVEIRO RESUMO A avaliação e o tratamento das afecções orais servem como instrumento clínico e de sanidade de animais domésticos e selvagens. A detecção das lesões orais, em animais em cativeiro, ocorre mais frequentemente após a manifestação dos sinais clínicos das afecções como anorexia, perda de peso, ptialismo, mudanças na preensão e mastigação do alimento, dor e desconforto. A cavidade oral e seus componentes apresentam como função básica a apreensão e mastigação dos alimentos, defesa e predação, auxilia no mecanismo da fonação, bem como, servir como ferramenta para a limpeza corpórea. Traumas e microrganismos patogênicos são as principais causas das doenças relacionadas à saúde oral dos animais em cativeiro, promovendo inflamação dos tecidos moles, abrasão, erosão, reabsorção e desgaste dentário, podendo agravar estes quadros a depender do manejo nutricional oferecido aos animais. A prevenção da ocorrência de enfermidades orais é fundamental para que se mantenha a sanidade geral dos plantéis, evitando a necessidade de realização de procedimentos cirúrgicos sofisticados, trabalhosos e de alto custo, gera a eficiência dos processos digestórios, contribuindo para a manutenção da saúde geral, melhorando suas habilidades reprodutivas, aumentando sua expectativa de vida e melhorando substancialmente a qualidade de vida dos animais. Estas descrições ainda são pouco delineadas em animais silvestres, principalmente relacionando a análises microbiológicas da cavidade oral. Diante da relevância da saúde bucal nos animais silvestres, justifica-se este estudo, que fornecerá dados de aplicabilidade imediata nos campos da clínica e odontologia veterinárias. Assim sendo, a hipótese é que a identificação das lesões auxiliará na prevenção das mesmas e a medicina odontológica veterinária instaurada preventivamente contribui para reduzir problemas estomatognáticos e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida dos animais, habilidades reprodutivas, expectativa de vida e a conservação das espécies. Palavras – chave: Primatas, afecções orais e Microbiologia vi DIAGNOSIS AND TREATMENT OF ORAL INFECTIONS ON MONKEYS PREGO (SAPAJUS sp.) MAINTAINED IN CAPTIVITY ABSTRACT The evaluation and treatment of oral conditions serve as a clinical and sanitary instrument for domestic and wild animals. The detection of oral lesions in captive animals occurs more frequently after clinical signs of anorexia, weight loss, ptyalism, changes in grip and chewing of food, pain and discomfort. The oral cavity and its components present as a basic function the seizure and chewing of food, defense and predation, aids in the phonation mechanism, as well as serve as a tool for bodily cleansing. Trauma and pathogenic microorganisms are the main causes of diseases related to the oral health of animals in captivity, promoting soft tissue inflammation, abrasion, erosion, reabsorption and tooth wear, which may aggravate these conditions depending on the nutritional management offered to the animals. The prevention of the occurrence of oral diseases is fundamental to maintain the general sanity of the plants, avoiding the need to perform sophisticated, laborious and expensive surgical procedures, generates the efficiency of digestive processes, contributing to the maintenance of general health, improving their reproductive abilities, increasing their life expectancy and substantially improving the quality of life of the animals. These descriptions are still poorly delineated in wild animals, mainly relating to microbiological analyzes of the oral cavity. Given the relevance of oral health in wild animals, this study is justified, which will provide data of immediate applicability in the fields of veterinary clinic and dentistry. Therefore, the hypothesis is that the identification of the lesions will aid in their prevention and the preventive veterinary dental medicine will contribute to reduce stomatognathic problems and, consequently, improve the animals' quality of life, reproductive abilities, life expectancy and the conservation of species. Key words: Primates, oral conditions and Microbiology 1 CAPÍTULO 1 – Considerações Gerais 1.1 INTRODUÇÃO A grande variedade de habitat, organização social e hábitos alimentares geram grande diversidade comportamental, morfológica e ecológica em primatas não- humanos. O risco de extinção de animais silvestres se dá pela destruição dos ambientes em que vivem por conta da ocupação, caça e comércio ilegal dos espécimes (Andrade et al., 2010). A avaliação e tratamento das afecções orais servem como instrumento para sanidade de animais silvestres. As que mais afetam os animais de cativeiro são doenças periodontais, traumas dentários e endodônticos, porém existe uma carência literária no que tange diagnóstico e tratamentos orais, principalmente relacionando a acompanhamento trimestral do peso corpóreo e circunferência abdominal em primatas mantidos em cativeiro no Brasil (Dias Neto et al., 2016). A realização desses estudos somente é possível mediante a adequada contenção destes animais. Já é difundido na literatura que para adequada avaliação clínica, coletas de amostras e pesquisas, a contenção química de primatas é fundamental (Capriglione et al., 2013). A manifestação tardia de sinais clínicos se deve às forças evolucionistas que essas espécies sofreram ao longo do seu desenvolvimento, o que compromete a detecção antecipada da doença, bem como, o tratamento e a recuperação destes animais quando mantidos em cativeiro (Andrade et al., 2010). Dessa forma, o exame da cavidade oral associado a métodos diagnósticos e tratamento das afecções encontradas e seu acompanhamento trimestral em Macacos- prego, consiste em um importante levantamento e ação preventiva para melhoria da Saúde Pública. 2 1.2 OBJETIVO 1.2.1 Objetivo geral Avaliar a saúde oral em animais do gênero Sapajus mantidos em cativeiro, assim como, realizar o diagnóstico e tratamento das afecções orais encontradas. 1.2.2 Objetivos específicos • Descrever as afecções orais encontradas em animais do gênero Sapajus mantidos em cativeiro • Realizar o tratamento das afecções orais encontradas no momento da avaliação. • Analisar a microbiota da cavidade oral como a placa bacteriana subgengival e supragengival dos primatas do gênero Sapajus • Avaliar a suscetibilidade antimicrobiana de bactérias da mucosa oral e do biofilme dentário. 3 1.3 REVISÃO DE LITERATURA 1.3.1 Macaco-prego (sapajus sp.) Os primatas são animais presentes em diversos ecossistemas, dentre estes, os classificados como neotropicais são facilmente encontrados em centros de triagens e zoológicos e, em geral, possuem uma boa adaptação ao manejo antroporfomizado. Na vida livre, estes animais ocupam diversas regiões e atuam como dispersores, polinizadores, predadores e presas, o que torna a ordem Primata importante na manutenção da cadeia alimentar (Alfaro et al., 2012a; Andrade et al., 2010). Dentre estes primatas, os macacos-prego (Sapajus sp.) são pertencentes à família Cebidae, composta por 11 gêneros e 58 espécies. Possuem classificação taxonômica amplamente estudada e com constantes modificações, devido a ocorrência de hibridizações e a escassez de avaliações dinâmicas que compreendam as migrações desses animais no sentido de facilitar sua adaptação a ambientes variados (Vaz & Port-Carvalho, 2010; Verona & Pissinatti, 2014). Em estudos recentes, o gênero Cebus foi dividido em dois grupos: os indivíduos com tufos (Sapajus sp.) e sem tufos (Cebus sp.) na cabeça. Outras características são relevantes para esta nova classificação como: diferenças anatômicas e distribuição geográfica e devido à grande variabilidade morfológica do gênero, a caracterização de cada espécie permanece como um dos maiores desafios taxonômicos para primatologia (Vaz & Port-Carvalho, 2010; Alfaro et al., 2012b). A evolução dos primatas iniciou-se há aproximadamente 70 milhões de anos. Assim, diversas formas foram extintas modificando a vida selvagem, principalmente devido a destruição dos seus habitats. O gênero Sapajus é composto por sete espécies com distribuição geográfica em toda a América no Sul e, no Brasil, as espécies mais encontradas são o Sapajus apella, o Sapajus libidinosus, o Sapajus flavius, o Sapajus xanthosternos, o Sapajus robustus, o Sapajus nigritus, o Sapajus cay e o Sapajus macrocephalus. Estas espécies ocupam diversos biomas como a floresta amazônica, o cerrado, a caatinga e a mata. Apresentam expectativa de vida em cativeiro de até 50 anos e podem pesar de 2 a 5 kg (Vaz & Port-Carvalho, 2010; Alfaro et al., 2012a; Alfaro et al., 2012b; Verona & Pissinatti, 2014). 4 Diversas são as causas que justificam a intervenção veterinária nestes animais, como o déficit de condições nutricionais, as lesões traumáticas e as alterações comportamentais que levam a impossibilidade de vida livre ou em domicilio e em muitos destes casos o animal fica sem condições de readequação a vida in situ (Andrade et al., 2010; Abee et al., 2012). 1.3.2 Odontologia de animais selvagens Com o avanço da medicina veterinária, concomitante ao crescimento dos espaços de conservação das espécies selvagens, tende-se ao aperfeiçoamento dos mecanismos de diagnóstico e a melhoria na qualificação dos profissionais, o que é refletido nas técnicas utilizadas para o manejo e controle da sanidade de animais (Andrade et al., 2010; Abee et al., 2012). A avaliação oral e tratamentos odontológicos são instrumentos de sanidade de animais domésticos e selvagens, já que a função é primordial para a eficiência dos processos digestórios, contribuindo para a manutenção da saúde geral, melhorando suas habilidades reprodutivas, aumentando sua expectativa de vida e melhorando substancialmente a qualidade de vida. O desenvolvimento dos estudos tem sido pautado principalmente na utilização de animais selvagens e de laboratório como modelos experimentais para entendimento de doenças estomatognáticas em humanos (Fernandes et al., 2014; Dias Neto et al., 2016; Roux et al., 2017). O diagnóstico de afecções orais seja de ordem infecciosa, traumática, metabólica ou iatrogênica, exige conhecimentos específicos da estrutura dentária, de equipamentos adequados, conhecimento e compreensão da inter-relação da microbiota residente normal com o sistema imune do animal, além de melhores abordagens metodológicas que respeitem o manejo da espécie, como já estudado em diferentes espécies de animais selvagens. As afecções mais comuns são: fratura dentária, doença periodontal, cárie, desgaste dentário e osteodistrofia fibrosa (Dias Neto et al., 2016; Roux et al., 2017). O estudo das condições de saúde oral dos animais selvagens em cativeiro serve como base para a interpretação de possíveis achados clínicos em animais de vida livre, porém particularidades como diferenças entre as espécies ou populações 5 da mesma espécie, variação sexual e sazonalidade devem ser levadas em consideração. No caso dos animais de cativeiro, um programa de saúde oral de animais selvagens deve incluir a odontologia preventiva, para que se detectem precocemente as lesões, eliminando assim as causas de seu agravamento e, consequentemente, aumentando a eficácia do tratamento (Dias Neto et al., 2016; Facchin et al. 2017; Roux et al. 2017). 1.3.3 Anatomia dentária A cavidade oral e seus componentes apresentam como função básica a apreensão e mastigação dos alimentos, defesa, predação, fonação, bem como, ferramenta para a limpeza corpórea. Tal cavidade é a porta de entrada do trato digestivo, de forma que o processamento e a absorção adequada dos nutrientes, se deve a sua funcionalidade adequada (Wiggs & Lobprise, 1997; Fernandes et al., 2014; Dias Neto et al., 2016). A dentição dos primatas caracteriza-se em constituição, formato e distribuição bastante variáveis, sendo classificada como heterodonte, dentição diferenciada em incisivos, caninos, pré-molares e molares; anelodonte que são animais com dentes de crescimento limitado, cessando-se ao atingir a maturidade. Também é classificada em bunodontes, cuja superfície mastigatória dos dentes é formada por tubérculos distintos e de ápice arredondado, e braquiodontes, animais com pequeno desenvolvimento da coroa e crescimento limitado. Estas variações encontradas na dentição de primatas muitas vezes refletem ao padrão adaptativo das espécies em função da preensão, mastigação e higiene. Adicionalmente, a dentição também possui aspectos sociais, sexuais e capacidade defensiva. Cientificamente, sua fórmula dental é apresentada da seguinte forma 2x (Incisivo 1-2/1-3, Canino 0-1/0-1, Pré-Molar 1-3/0-3, Molar 2-3/2- 3) (Wiggs & Lobprise, 1997; Roux et al., 2017; Dechow et al., 2017; Fiorenza e Bruner, 2018). A associação de cada dente com seus tecidos de suporte (periodonto) denomina- se órgão dental (Figura 1). O órgão dentário é constituído de dente (esmalte, dentina e polpa) e de periodonto (cemento, ligamento periodontal, osso alveolar e gengiva) (Dechow et al., 2017). 6 O esmalte é um tecido densamente calcificado e acelular, produzido por células que morrem antes da erupção do dente, denominadas ameloblastos. Na sua composição encontra-se 96% de sais inorgânicos (cristais de hidroxiapatita) e 4% de matéria orgânica e água. O esmalte reveste o exterior da coroa dentária até a região do colo do dente, terminando na junção amelocementária. Sua função é proteger a superfície dentária, vedar os túbulos dentinários e aderir a materiais (Harvey & Emilly, 1993; Leon-Roman & Rossi-Junior, 2014). A dentina é de origem mesenquimal, produzida pelos odontoblastos, e está localizada entre a polpa (internamente) e o cemento e esmalte (externamente). Ela é composta de 70% de sais inorgânicos (hidroxiapatita), 20% de substâncias orgânicas (colágeno e mucopolissacarídeos) e 10% de água. Três tipos de dentina estão presentes durante a vida dos animais: dentina primária nos dentes decíduos; dentina secundária, formada ao longo da vida; e dentina terciária ou reparadora, formada em resposta a irritações ou traumatismos pulpares. As funções da dentina incluem redistribuição hidráulica da tensão mastigatória, resposta protetora da dor e proteção da polpa (através da dentina terciária) (Harvey & Emilly, 1993; Wiggs & Lobprise, 1997). A polpa dentária ocupa a cavidade pulpar é originada a partir da papila dentária embrionária. A polpa é constituída por uma variedade de tecido conjuntivo frouxo, com características próprias e é circundada e protegida pela dentina, ocupando a cavidade interna do dente, tanto na porção coronal como na radicular, denominadas câmara pulpar e canal radicular, respectivamente. O tecido conjuntivo frouxo é formado por artérias e veias, nervos, vasos linfáticos, filetes nervosos, células e substância intercelular. Essas estruturas entram e saem do dente através do forame apical situado na extremidade da raiz, possuindo funções formadora, nutricional, sensorial e de defesa. A polpa está intimamente ligada biológica e fisiologicamente à dentina, formando o complexo dentinapolpa (ou dentinopulpar), constituindo assim a maior porção do dente (Fernandes et al., 2014; Facchini et al., 2017). O periodonto corresponde a um conjunto de estruturas cuja função consiste em proteção e suporte ao dente. É formado por gengiva, ligamento periodontal, osso alveolar e cemento. Essas estruturas em conjunto possibilitam também certa 7 mobilidade do elemento dental, absorvendo e promovendo um sistema de amortecimento capaz de suportar o efeito de micro traumatismos causados pelos movimentos mastigatórios (Rossi Junior, 2014; Wiggs & Lobprise, 1997). O cemento é uma estrutura avascular, semelhante ao osso, tendo como principal função a inserção de fibras do ligamento periodontal à raiz do dente. Possui a capacidade de reabsorção e assim, devido à sua contínua formação, as novas fibras do ligamento unem-se ao cemento recém-formado, resultando na reabsorção das antigas fibras de Sharpey. O cemento também apresenta importante função de reparação, servindo como maior tecido reparador para as superfícies das raízes. Danos aos dentes, como no caso de fraturas ou reabsorções que envolvem tanto cemento como dentina, podem ser reparadas pela aposição de novas camadas de cemento (Harvey & Emilly, 1993; Wiggs & Lobprise, 1997). O ligamento periodontal é formado por fibras de tecido conjuntivo denso constituído de feixes de colágeno, denominado fibras de Sharpey. Também contém vasos, nervos e células, com função de síntese (osteoblastos, cementoblastos e fibroblastos) e de reabsorção (osteoclastos, cementoclastos, fibroclastos). Esta estrutura de tecido conectivo tem como principal função absorver e distribuir as forças geradas pela mastigação, fixando e suportando o dente em seu alvéolo. Assim, a presença do ligamento periodontal é essencial à mobilidade dentária, determinada em grande parte por largura, altura e preservação dessa estrutura (Sant’Anna, 2003; Harvey & Emilly, 1993; Wiggs & Lobprise, 1997). O osso alveolar é formado pelas cristas e projeções dos ossos da mandíbula e maxila que envolvem os dentes. Assim, acomoda as raízes dentárias, sendo uma modificação óssea vascularizada e inervada, pois além de ser formado pelas três camadas básicas de um osso normal, com periósteo, osso denso compacto e osso esponjoso, o osso alveolar possui uma quarta camada, a placa ou lâmina cribiforme, que contorna os alvéolos. Suportando o elemento dentário, o osso alveolar aparece com a sua erupção e se atrofia com sua perda. Os vasos e nervos permeiam a tábua cribiforme para suprir o ligamento periodontal (Wiggs & Lobprise, 1997; Fernandes et al., 2014; Xie et al., 2017). 8 A gengiva, que histologicamente é um epitélio estratificado escamoso, circunda a porção cervical de cada dente, tal estrutura pode ser dividida, anatomicamente, em gengiva aderida e gengiva livre. A gengiva aderida é firme, resistente e se insere firmemente no periósteo do osso alveolar, protegendo-o. O comprimento da gengiva aderida é um importante parâmetro clínico e é definido como a distância entre a junção muco-gengival e a projeção da superfície externa do fundo do sulco gengival ou da bolsa periodontal. A gengiva livre é um tecido que circunda a coroa dentária até a altura do osso alveolar. Ela é uma porção de gengiva que se situa coronalmente em relação ao epitélio juncional, formando a parede externa do sulco gengival. A margem da gengiva livre, quando hígida, fixa-se ao esmalte e forma um sulco gengival de 2mm de profundidade, em média (Harvey & Emilly, 1993; Wiggs & Lobprise, 1997). Figura 1: Estrutura do Órgão Dental. Fonte: Adaptado de Gioso, 2007. 9 1.3.4 Microbiota oral A cavidade bucal dos primatas não-humanos, de modo geral, constitui um meio diversificado, com microrganismos da própria microbiota oral como de outras áreas do corpo, como Staphylococcus spp isolado da região cutânea, Staphylococcus aureus de narinas e abdômen e Staphylococcus sciuri ocasionalmente das narinas. Porém também pode ser associada a floras saprófitas, patogênicas e polimorfas, além de enzimas e produtos de degradação biológica, muitas vezes tóxicos. Estes microrganismos são consequência dos hábitos alimentares ou ao costume de levar constantemente as mãos contaminadas à boca, mesmo com matéria fecal (Vaz & Port-Carvalho, 2010; Pinheiro & Rodrigues, 2014). A microbiota oral de humanos e animais é extensamente diversificada e complexa, necessitando de maiores estudos sobre sua composição e interação, principalmente relacionando a endodôntica. Estudos em humanos indicam que a periodontite apical tem uma etiologia heterogênea, onde combinações de bactérias podem ser os principais patógenos endodônticos, porém em animais ainda não se sabe essa inter-relação. Quando em equilíbrio, a microbiota atua como barreira natural, protegendo a mucosa oral e os canais radiculares contra patógenos exógenos. No entanto, alterações locais do equilíbrio ecológico podem resultar em infecções oportunistas. A microbiota de canais radiculares infectados é uma mistura de bactérias, com uma predominância de microrganismos anaeróbios obrigatórios e facultativos, principalmente em dentes acometidos por doença periodontal (Krygier 1973; Gaetti-Jardim Jr et al., 2012; Sukumar et al., 2016; Van Winkelhoff et al., 2016). O conhecimento dos fatores bacterianos envolvidos na patogênese das lesões orais e radiculares é importante para o entendimento do processo patológico bem como para ajudar no estabelecimento de medidas terapêuticas adequadas e preventivas, pois além do impacto que estas bactérias podem ter sobre a saúde de colônias de animais mantidos em cativeiro, há também o risco potencial de transmissão para os seres humanos, o qual caracteriza o potencial zoonótico destas infecções, principalmente por bactérias multirresistentes (Vaz & Port-Carvalho, 2010; Sukumar et al., 2016). 10 1.3.5 Avaliação Odontológica A manutenção da saúde oral é fundamental para a sanidade de todos os animais, sejam eles domésticos ou selvagens. Em geral, o diagnóstico odontológico da maioria das enfermidades pode ser feito exclusivamente com base no exame físico e radiográfico da cavidade oral (Fecchio et al., 2009). A avaliação odontológica é muitas vezes negligenciada, principalmente devido ao risco de manipulação da boca e o contato com as secreções. Este fato é agravado com relação aos animais silvestres pelo fato de demonstrarem sinais clínicos de forma tardia e à falta de maiores estudos envolvendo a cavidade oral e agentes patogênicos dessas espécies (Gaetti-Jardim Jr et al., 2012). Animais acometidos com doenças odontológicas podem apresentar alterações comportamentais inespecíficas, tais como perda de apetite e de peso, e sinais de dor ou desconforto. Entretanto, em alguns casos é possível detectar alterações mais específicas da localização do problema, como o deixar cair alimentos durante a mastigação, alimentos não digeridos no material fecal, esfregar da face, anormalidades na salivação, fraturas dentárias, secreção oronasal, maloclusão, crescimento dentário excessivo e tumefações na cabeça oral (Fecchio et al., 2009). A anamnese para estas espécies deve ser feita visando informações a respeito da dieta, hábitos de morder objetos duros, tratamentos anteriores, comportamentos atípicos, sangramento e halitose. Porém para o exame físico e odontológico a contenção química é quase sempre inevitável. Após o exame físico geral, efetua-se o exame odontológico, que deve ser registrado em ficha clínica odontológica apropriada também chamada de odontograma. O odontograma de espécies domésticas pode ser adaptado para o uso em animais selvagens. O preenchimento adequado desta ficha é de importância para o acompanhamento, monitoramento e histórico do animal (Wigg & Hall, 2003; Pachaly, 2006). O exame da cavidade oral visa avaliar a integridade dos tecidos moles e duros e utilizam-se neste exame uma sonda periodontal milimetrada, explorador e espelho odontológico. A sequência da avaliação consiste em observar a assimetria craniofacial, aumentos de volume, ptialismo e oclusão dos dentes incisivos. Em seguida é observada a coloração e higidez das mucosas, lábios e gengiva. Os dentes 11 são examinados na busca de alterações oclusivas, fraturas, descoloração, presença de placa bacteriana ou cálculo dentário, mobilidade dental, cárie, reabsorção dentária e defeitos de desenvolvimento (Wiggs & Lobprise, 1997; Fecchio et al., 2009). A partir dos achados, pode-se necessitar exames complementares como radiografia intra-oral e análises microbiológicas. O uso de radiografia intra-oral visa maior acurácia no diagnóstico de afecções em tecidos mineralizados, sendo instrumento crucial também para o tratamento endodôntico. As análises microbiológicas envolvem o isolamento e identificação de bactérias a partir da colheita do material na região perirradicular, radicular e vestibular. Estão diretamente relacionadas ao sucesso da terapia periodontal e endodôntica. O conhecimento dos fatores bacterianos envolvidos na patogênese das lesões perirradiculares é importante para o entendimento do processo patológico bem como para auxiliar no estabelecimento de medidas terapêuticas adequadas (Facchini et al., 2017; Roux et al., 2017). 1.3.6 Principais afecções orais em primatas não-humanos 1.3.6.1 Doença Periodontal A doença periodontal é comum em todos os primatas, porém com maior prevalência nos primatas do gênero Ateles (Macaco-aranha). Acomete o periodonto, em detrimento do acúmulo de bactérias, sob a forma de placa, sobre a superfície dentária, particularmente na margem gengival (Dias Neto et al., 2016; Roux et al., 2017). A presença das placas bacterianas nos espaços supragengival e subgengival, que se situam acima e abaixo da margem da gengiva livre, respectivamente, leva a uma inflamação tanto da gengiva livre quanto da gengiva aderida. Com o acúmulo da placa bacteriana, as bactérias anaeróbias facultativas e estritas, além das gram- negativas, produzem através do seu metabolismo subprodutos capazes de lesar o periodonto, causando inicialmente uma gengivite (Wiggs & Lobprise, 1997; Sousa et al., 2017). A manutenção da doença ocasiona a reabsorção óssea e a retração gengival consequentemente, sendo esse processo irreversível denominado periodontite. Os 12 sinais clínicos se agravam à medida que a inflamação progride e incluem halitose, disfagia, ptialismo, perdas dentárias, alterações de comportamento e anorexia. Fatores como o baixo índice de higiene, dietas macias e ricas em carboidratos e algumas anomalias dentárias (apinhamento e maloclusão) são importantes na patogenia da periodontite. Esta alteração é mais frequente em animais de cativeiro, quando comparados aos de vida-livre. Sendo os primatas frequentemente usados como modelos no estudo da doença, principalmente devido à semelhanças anatômicas e biológicas (Costa et al., 2012; Dias Neto et al., 2016; Roux et al., 2017) 1.3.6.2 Exposição pulpar traumática A exposição pulpar traumática em primatas ocorre em função de fraturas acidentais ou criminosas e geralmente acometem os caninos. Estresse e maus tratos sofridos em cativeiro, mordedura de jaulas, acidentes durante a contenção e o “corte” criminoso dos dentes caninos são uma constante no histórico destes animais justificando a maior incidência de fratura coronária em dentes caninos (Costa et al., 2012; Pachaly, 2014). A polpa exposta sofre contaminação bacteriana, levando à necrose pulpar e à ocorrência de abscessos dento-alveolares. A necrose pulpar faz com que o dente adquira uma coloração escurecida, resultado da penetração de substâncias de degradação sanguínea através dos túbulos dentinários (Wiggs & Lobprise, 1997). As fraturas dentárias, de modo geral, podem induzir à formação de fístula, principalmente quando há lesão periodontal ou periapical concomitante. As fístulas são comuns em primatas, se manifestando externamente na forma das chamadas fístulas infraorbitárias. O exame radiográfico é fundamental para determinar a viabilidade do dente e a melhor escolha do tratamento, que pode ser desde a endodontia até a exodontia (Costa et al., 2012; Dias Neto et al., 2016; Roux et al., 2017). 1.3.6.3 Cárie dental É a denominação para o processo de desmineralização do esmalte e da dentina. Sendo multifatorial pela ação concomitante do pH oral, defeitos da anatomia dentária, dieta rica em carboidratos além de microrganismos cariogênicos e seus 13 ácidos metabólitos. A dieta desempenha um papel importante na incidência da cárie, tanto no homem como em primatas, especialmente em indivíduos senis, quando há mudança da alimentação (Swindler, 2002; Fernandes et al., 2014; Dias Neto et al., 2016) O desequilíbrio imunológico e principalmente o pH oral, são cruciais na formação da cárie, pois a lesões de cárie são formadas devido a uma diminuição acentuada no pH salivar, abaixo de 5,5, geralmente observado durante e após a alimentação (Wiggs & Hall, 2003). A ocorrência de cáries tanto em humanos como em primatas está relacionada com dietas inadequadas, principalmente animais alimentados com dietas destinadas a humanos, devido ao alto teor de carboidratos, purificados e refinados, e de consistência macia, contrapondo a alimentação em vida livre que consiste de alimentos fibrosos. Os dentes pré-molares e molares, devido às características anatômicas são os de maiores incidências. Os primatas idosos apresentam maiores predisposições devido ao desgaste do esmalte oclusal que enfraquece o esmalte interproximal, facilitando o acúmulo de debris alimentares e expondo a dentina a bactérias cariogênicas (Swindler, 2002; Costa et al., 2012; Roux et al., 2017). 1.3.6.4 Desgaste Dentário O desgaste dentário é a perda progressiva da superfície dentária que ocorre durante a mastigação, é causada por processos físicos ou químicos, sendo exacerbada quando sofrem injúrias, maloclusão, brigas ou contato. Objetos duros e grades de recintos podem estar envolvidos, conjuntamente ou individualmente no mecanismo de favorecimento ao desgaste, que são: atrito, abrasão e erosão (Fecchio et al., 2009; Costa et al., 2012). O atrito é definido como o desgaste fisiológico e gradual dos tecidos dentários, resultante da ação mecânica do contato entre os dentes antagonistas. Pode ser devido à mastigação ou maloclusão, e ocorre por toda a vida do animal. A abrasão é o desgaste patológico dos dentes por meio de processos mecânicos anormais, não incluindo a mastigação. Em animais, a mordedura e roedura de objetos (grades, barras metálicas, portas, paredes) e o prurido devido a dermatoses são as maiores 14 causas de abrasão, sendo identificado em animais com problemas psicológicos relacionados ao estresse crônico (agressão, frustração ou tédio). A erosão é uma perda localizada, crônica e patológica da superfície dentária através de dissolução química causada por substâncias ácidas e quelantes (Dias Neto et al., 2016; Facchini et al., 2017). O organismo animal responde à perda da superfície dentária produzindo dentina reparadora. Contudo, se a perda for constante e superar a capacidade de reparação do dano, ocorre à exposição da polpa. O tratamento pode ser da simples aplicação profissional de flúor, a aplicação, nos casos mais avançados, de agentes selantes na dentina ou até mesmo extração (Dias Neto et al., 2016; Facchini et al., 2017). 1.3.6.5 Osteofistrofia Fibrosa A osteodistrofia fibrosa é uma doença cuja origem está associada ao desequilíbrio mineral, ou seja, dieta inadequada e erros de manejo. O cálcio é o mineral encontrado em maior concentração no organismo, importante na constituição dos ossos e dentes. O fósforo é fundamental ao crescimento ósseo, participa do metabolismo de carboidratos, componente obrigatório de alguns ácidos nucléicos, proteínas e lipídios. Na correta nutrição de cálcio e fósforo é necessária uma relação de cerca de 2:1, bem como a presença de vitamina D. Esse desbalanceamento ou a falta de algum mineral resulta na desmineralização óssea, fraturas patológicas, entre outras enfermidades (Pachaly, 2006; Rossi Junior, 2014). O periodonto que é o tecido de suporte dentário é o primeiro local no organismo em que ocorre a reabsorção óssea e posterior substituição por tecido fibroso. Os sinais clínicos observados são: deformidade facial; tumefação da mandíbula, maxila e pré- maxila; perda dentária; incapacidade de apreensão e mastigação (Pachaly, 2006; Fecchio et al., 2009). 15 1.4 Referências Abee, C.R.; Mainsfield, K.; Tardif, S.; Morris, T. (2012). Nonhuman Primates in Biomedical Research: Biology and Management. Academic Press. 536p. Alfaro, J. W. L.; Boubli, J. P.; Olson, L. E.; Flore, A. D. I.; Wilson, L B.; Gutierrez- Espeleta, G. A.; Chiou, K. I.; Schulte, M.; Neitzel, S.(2012a).Explosive Pleistocene range expansion leads to widespread Amazonian sympatry between robust and gracile capuchin monkeys. Journal of Biogeography, v. 39, p. 272-288. Alfaro, J. W. L.; Silva, J. R. J. S; Rylands, A. B.(2012b). How different are robust and gracile capuchin monkeys? An argument for the use of Sapajus and Cebus. 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A detecção das lesões orais, em animais em cativeiro, ocorre mais frequentemente após a manifestação dos sinais clínicos oriundos das alterações como: anorexia, perda de peso, ptialismo, mudanças na preensão e mastigação do alimento, dor e desconforto. O estudo teve como objetivos identificar as alterações orais em macacos-prego da espécie Sapajus sp. e realizar o tratamento das afecções encontradas. Metodologia: A amostra foi composta por 18 animais, sendo 8 fêmeas e 10 machos, ambos adultos, oriundos do Centro de Triagem Animais Silvestres da Bahia. Foram realizadas as identificações das afecções na cavidade oral e logo depois foram feitos os tratamentos odontológicos especificamente de acordo com cada afecção encontrada em cada primata. Resultados: Dentre os animais avaliados 83,3% (n=15) apresentavam gengivite, 72,2% (n=13) desgaste dentário, 50% (n=9) retração gengival, 22,2% (n=4) fratura dentária, 16,7% (n=3) ausência dentária e cárie, 11,1% (n=2) escurecimento dentário e somente 5,6% (n=1) apresentou mobilidade dentária. Baseado em cada afecção, foram realizados 18 tratamentos periodontais, 04 exodontias e 01 tratamento de canal. Conclusão: Assim sendo, o estudo contribui para redução de problemas estomatognáticos maiores, aumentando o ganho de peso e, consequentemente, melhorando a qualidade de vida dos animais, habilidades reprodutivas, expectativa de vida e a conservação das espécies. Palavras-chave: Primata, afecções orais, Sapajus sp. mailto:alineodontovet@gmail.com 19 2.1 Introdução O Brasil possui aproximadamente 107 espécies de primatas, dentre estes, os classificados como neotropicais são facilmente encontrados em centros de triagens e zoológicos e, em geral, possuem uma boa adaptação ao manejo antroporfomizado. Na vida livre estes animais ocupam diversos ecossistemas, especificamente no estado da Bahia, encontram-se em sua maioria situados em zonas costeiras e de transição de biomas. Devido à grande variedade de habitat, organização social e hábitos alimentares, estes animais apresentam uma grande diversidade comportamental, morfológica e ecológica. O risco de extinção de parte desses animais se dá pela destruição dos ambientes em que vivem por conta da ocupação, caça e comércio ilegal dos espécimes 1,2,3 . A maioria das espécies de primatas possuem um crânio grande e de formato globular. Usualmente as mandíbulas são relativamente curtas e a face é achatada. Muitos primatas possuem o nariz curto e a órbita do crânio é envolta por osso e dirigida para frente. No que tange à esfera morfológica da dentição dos primatas, são classificados como heterodontes e anelodontes. Permitindo-se grande avanço evolutivo, já que, não sendo especializada, sua dentição é capaz de trabalhar uma grande variedade de alimentos 4,5,6 . A avaliação e tratamento das afecções orais servem como instrumento para sanidade de animais silvestres. Dentre essas, as principais enfermidades que afetam os animais de cativeiro são as doenças periodontais, traumas dentários e endodônticos, degeneração e maloclusão dentária, porém existe uma carência literária no que tange avaliação e tratamento orais, principalmente relacionando a acompanhamento do peso corpóreo e circunferência abdominal em primatas de cativeiro no Brasil 7,8. A manifestação tardia de sinais clínicos se deve às forças evolucionistas que essas espécies sofreram ao longo do seu desenvolvimento, o que compromete a detecção antecipada da doença, bem como, o tratamento e a recuperação destes animais quando mantidos em cativeiro 2,9 . A cavidade oral e seus componentes apresentam como função básica a preensão e mastigação dos alimentos, defesa, predação, fonação, bem como, ferramenta para a limpeza corpórea. Tal cavidade é a porta de entrada do trato digestivo, de forma que o processamento e a absorção adequada dos nutrientes, se deve a sua funcionalidade adequadas. Traumas, doença periodontal, fraturas, cáries e abscessos são as principais doenças relacionadas à saúde oral dos 20 primatas em cativeiro, promovendo inflamação dos tecidos moles, abrasão, erosão, reabsorção e desgaste dentário, podendo agravar estes quadros a depender do manejo oferecido aos animais 7 ,8, 10. Tendo em vista a necessidade da saúde da cavidade oral para a melhoria da saúde geral dos animais silvestres, objetivou-se descrever as principais alterações e tratamentos das afecções orais em animais direcionados ao centro de triagem e reabilitação, como também realizar o acompanhamento por três meses desses animais após o tratamento. 2.2 Material e Métodos 2.2.1 Considerações éticas Todos os procedimentos realizados no presente trabalho estavam de acordo com as exigências dispostas na Instrução Normativa ICMBio nº 03/2014, com a devida aprovação mediante o SISBIO, número 58871-2 e também da Comissão de Ética e Bem-Estar Animal da Universidade Federal da Bahia, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia nº 44/2017, com respeito primordial ao bem-estar dos animais utilizados no experimento e aos seus direitos. Todas as atividades foram acompanhadas pela equipe de técnicos, veterinários, funcionários e estagiários do Centro de Triagem em Animais Silvestres (CETAS). 2.2.2 Animais No período de outubro a dezembro de 2017, foram realizados exames, sob anestesia geral, em 18 primatas (Sapajus sp), adultos, de ambos os sexos, mantidos no CETAS, oriundos de vida livre, tráfico ilegal de animais ou domiciliados. 2.2.3 Protocolo Anestésico Os Animais foram retirados do recinto por uma rede de contenção e encaminhados para a anestesia. A administração do anestésico, por via intranasal, teve como objetivo a sedação para a primeira avaliação. O fármaco escolhido para este momento foi o midazolam (0,5 a 1,0 mg/kg). Após averiguação da necessidade de procedimentos mais invasivos, foi adicionado ao protocolo de analgesia o cloridrato de tramadol (2,0 a 3,0 mg/kg) e após canulação da veia cefálica, os animais foram induzidos a anestesia com propofol (5 a 10mg/kg), entubados e paramentados para anestesia geral inalatória com isoflurano diluído em oxigênio a 100%. 21 A monitoração dos parâmetros vitais foi efetuada durante todo o procedimento. Passado o tempo de monitorização, os animais foram liberados em seus recintos de origem. 2.2.4 Avaliação odontológica A avaliação da cavidade oral foi realizada em outubro de 2017 e consistiu na inspeção visual dos lábios, mucosa alveolar, mucosa bucal, gengivas, palato duro, palato mole e língua. Em seguida, todos os dentes foram avaliados com o auxílio de sonda periodontal milimetrada, explorador e espelho odontológico e inspecionados quanto à presença de lesões macroscópicas, que foram classificadas segundo parâmetros estabelecidos por Wiggs & Lobprise (1997), segundo a gravidade da lesão em grau I, grau II e grau III. A documentação do exame da cavidade oral foi realizada com o preenchimento de fichas odontológicas, que seguem o sistema de Triadan modificado pelo Laboratório de Odontologia Comparada (LOC), com o registro fotográfico da cavidade oral e das lesões encontradas por câmera digital (Canon®). Exame radiográfico intraoral (periapical e oclusal) foi realizado nos animais em que se suspeitava de comprometimento de tecido calcificado (Figura 1). Para tal, utilizou-se aparelho de raio-x odontológico (Odontocase®) com a técnica de 70 KV, 10 miliamperagem e 1,5 segundos de tempo de exposição, a fim de verificar se havia comprometimento ósseo. As revelações das radiografias foram realizadas em câmara escura odontológica (VH®), contendo três recipientes com revelador (Carestream®), água e fixador (Carestream®). O tempo de permanência do filme em cada recipiente foi de 20 segundos para revelação, seguido de 30 segundos em água e 40, segundo o fabricante. Logo após a avaliação foram realizados os tratamentos odontológicos especificamente, de acordo com cada afecção encontrada nos primatas. 2.2.5 Período de acompanhamento O período de acompanhamento (três meses) pós-tratamento caracterizou-se na avaliação do peso e circunferência abdominal de cada animal. Sendo realizado no dia dos tratamentos (D0), após 30 dias (D30) e finalizando com 90 dias (D90). 22 Figura 1: Exame radiográfico intra-oral em Macaco-prego (Sapajus sp.). Figura 2: A – Detecção de possível ausência dentária na inspeção visual, B – Raio-x da região para confirmação da ausência e detecção de fratura dentária com raíz empactada. C- Cavidade oral com Doença Periodontal Grau II, D – Raio-x para avaliação da estrutura óssea. 23 2.2.6 Análise estatística A análise estatística foi feita segundo o teste Mann-Whitney, sendo considerado significativo para uma probabilidade de significância menor que 5% (P<0,05), com Intervalo de confiança de 95%. 2.3 Resultados 2.3.1 Diagnóstico das afecções orais As três afecções orais mais encontradas foram: gengivite, cálculo e desgaste dentário. Os primatas também apresentaram retração gengival (9/18,50%) e fratura dentária (4/18,22.2%) (Figura 2, Tabela 1). Ainda, salienta-se que a maioria (17/18, 94,4%) dos animais apresentaram mais de uma lesão (Tabela 2). Tabela 1: Frequência das afecções dentárias em Primatas Neotropicais (Sapajus sp.) no Nordeste Brasileiro. Teste Mann-Whitney (P<0,05). Ao avaliar isoladamente cada lesão observou-se gengivite em 15 animais. Neste trabalho teve maior frequência de lesões do tipo grau II, sendo detectada em oito animais, com predomínio nos dentes caninos e pré-molares. Cálculo dentário generalizado foi observado em 14/18 animais, também variando em graus I, II e III, sendo o grau II o mais comum (Figura 2). A retração gengival variou de 2 a 3 mm no geral, com exceção de um animal (animal 8) que Afecções orais Nº de animais porcentagem Valor de P Gengivite 15/18 83.3% 0.912 Cálculo Dentário 14/18 77.8% 0.158 Desgaste 13/18 72.2 1.000 Retração Gengival 9/18 50% 0.931 Fratura dentária 4/18 22.2% 1.000 Ausência dentária 3/18 16.7% 0.017 Cárie 3/18 16.7% 0.017 Escurecimento Dentário 2/18 11.1 0.837 Mobilidade dentária 1/18 5.6% 0.111 24 apresentou 4 mm de retração no canino superior direito, pois neste dente também havia uma fratura de coroa. Ausência dentária foi observada em três animais, sendo os incisivos superiores os dentes acometidos. Desgaste dentário ocorreu em 13 animais, sendo que em quatro destes animais também apresentavam fratura dentária acometendo principalmente o dente canino. Escurecimento dental foi visualizado em dois animais, com predileção para o dente fraturado cronicamente. Cárie dentária foi observada em três animais, adicionalmente um destes dentes também apresentou mobilidade devido ao estado crônico. Tais lesões estavam presentes em dois pré-molares e um molar. 2.3.2 Tratamento A decisão sobre o tratamento realizado baseou-se nas análises clínicas e radiográficas (Tabela 2). Como tratamento realizou-se: Tratamento periodontal, exodontia e endodontia. Todos os 18 animais foram submetidos ao tratamento periodontal como prática preventiva, corroborando com Roux et al. (2017). Foi realizada a exodontia (Figura 3), na qual baseou-se nos exames radiográficos segundo recomendado por Wiggs & Hall (2003). Cinco animais dos 18 tiveram que passar por esse processo, sendo que a escolha para realização da exodontia fez-se após a realização da radiografia intra-oral do dente. No presente estudo, os dentes que houveram maior necessidade de serem extraídos foram os caninos, incisivos e pré-molares, respectivamente (Tabela 2). A endodontia foi realizada em apenas um animal, devido a linha de fratura ter exposto a polpa dentária sem comprometimento ósseo, confirmado após a radiografia intra-oral. Assim, em detrimento da clínica do dente ser favorável a preservação dentária, realizou-se o tratamento de canal (Figura 3). Tabela 2: Correlação entre lesões e tratamentos com posterior acompanhamento do peso e circunferência abdominal no pós-operatório. D90 – D0 = Ganho de peso depois de três meses de tratamento odontológico. c2-c1 = Diferença da Circunferência abdominal. Teste Mann- Whitney (P<0,05). ID Animal Descrição geral das lesões Tratamento Adotado Diferença entre pesos no Período de Acompanhamento (D90 – D0) Diferença Circunferência no Período de Acompanhamento c2-c1 25 Animal 1 Gengivite GrauI, Cálculo dentário GrauI Tratamento Periodontal 216g 0 Animal 2 Gengivite GrauI, Cálculo dentário GrauII e desgaste leve de esmalte dentário de todos os caninos e incisivos. Tratamento Periodontal 319g 1 Animal 3 Gengivite GrauIII, Cálculo dentário GrauIII, Retração dentária GrauI, desgaste leve do esmalte dos incisivos, Fratura do canino superior direito, Ausência dentária do incisivo superior direito. Tratamento Periodontal, Exodontia e Endodontia 415g 2 Animal 4 Gengivite GrauI e Cálculo dentário GrauI Tratamento Periodontal 98g 1 Animal 5 Gengivite GrauII, Cálculo dentário GrauII, Retração gengival, desgaste de esmalte do canino superior direito Tratamento Periodontal 175g 0 Animal 6 Gengivite GrauII, Cálculo dentário GrauII, Retração gengival, desgaste leve de esmalte dos caninos superior e inferior Tratamento Periodontal 261g 0 26 direito, pré- molares. Animal 7 Gengivite GrauII, Cálculo dentário GrauII, Retração gengival, desgaste leve de esmalte dos incisivos. Tratamento Periodontal 41g 0 Animal 8 Gengivite GrauII, Cálculo dentário GrauII, Retração gengival, Fratura do canino superior direito com escurecimento dentário, desgaste leve do esmalte dos incisivos. Tratamento Periodontal e Exodontia 490g 1 Animal 9 Gengivite GrauII, Retração gengival, Fratura dentária do incisivo superior direito, Desgaste dos pré-molares e cárie do pré- molar inferior. Tratamento Periodontal e Exodontia 152g 2 Animal 10 Desgaste dentário Tratamento Periodontal 49g 3 Animal 11 Gengivite GrauII, Cálculo dentário GrauII, Retração gengival, Desgaste leve dos esmaltes dos incisivos, Ausência incisivo superior e Cárie no pré- molar inferior Tratamento Periodontal e Exodontia 123g 1 27 Animal 12 Retração gengival e desgaste leve do esmalte dos incisivos Tratamento Periodontal 46g 2 Animal 13 Gengivite GrauII e Desgaste leve do esmalte dos incisivos Tratamento Periodontal 65g 1 Animal14 Gengivite GrauI e Cálculo Dentário GrauI Tratamento Periodontal 48g 1 Animal 15 Gengivite e Cálculo dentário GrauIV, Retração gengival, Desgaste do esmalte dos pré- molares inferiores, escurecimento dentário, Fratura dos caninos contralaterais superiores, Ausência dentária, mobilidade e cárie no incisivo inferior. Tratamento Periodontal e Exodontia 270g 2 Animal 16 Gengivite GrauI e Cálculo GrauI Tratamento Periodontal 14g 1 Animal 17 Gengivite GrauI Tratamento Periodontal 12g 1 Animal 18 Cálculo GrauI e Desgaste do esmalte dos incisivos Tratamento Periodontal 209g 2 2.3.3 Período de Acompanhamento O tratamento de cada afecção contribuiu com o ganho de peso após 90 dias (D90) de pós-operatório. Principalmente nos casos de gengivite, cálculo e fratura dentária. No gráfico 2 28 observa-se aumento mais significativo do peso D0 para o D30. Porém a circunferência abdominal se manteve constante do D0 ao D30, apresentando aumento significativo do D30 ao D90 (gráfico 1). Ressalta-se que durante o período de acompanhamento de pós-operatório, nenhum tipo de medicamento, vermifugação ou suplementação, foram inseridas na rotina dos animais. Assim como nenhuma alteração na alimentação normalmente oferecida. Figura 3: A – Primeiro Raio-x antes do início do tratamento endodôntico, B – Último Raio-x do tratamento endodôntico. C- Fratura de cora e raiz no dente canino superior esquerdo, D – Região após a exodontia. 29 Gráfico 1: Comparação da evolução do peso antes e após 30 dias (D30) e 90 dias de tratamento oral especializado (D90). Teste Mann-Whitney (P<0,05). Gráfico 2: Relação entre ganho de peso e circunferência abdominal nos dias D0, D30 e D90. Teste Mann-Whitney (P<0,05). 2.4 Discussão No presente estudo com a utilização de uma abordagem clínico-cirúrgica na cavidade oral de primatas (Sapajus sp.), objetivando prática conservacionista, foi possível descrever as 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 Afecções orais X Ganho de peso pré e pós tratamento Peso D0 Peso D30 Peso D90 21,8 22 22,2 22,4 22,6 22,8 23 23,2 23,4 23,6 2100 2150 2200 2250 2300 2350 2400 2450 Peso D0 Peso D30 Peso D90 Acompanhamento Peso X Circunferência Abdominal Média C. Abd 30 principais afecções orais e intervenção terapêutica em indivíduos mantidos em CETAS. Possibilitou-se a identificação de 83.3% de gengivite e 77.8% de cálculo dentário, o que corrobora com os dados de Roux et al. (2017). Atribui-se a ocorrência de tal enfermidade aos fatores relacionados a alimentação oferecida, predominantemente baseada em frutas e com baixa quantidade de alimento fibroso, favorecendo ao acúmulo de matéria orgânica e placa bacteriana, principalmente nos dentes pré-molares e molares. Possivelmente a alimentação desta espécie em vida livre, baseada de folha madura e novas, pecíolo, meristema e frutos propicie melhor limpeza dos dentes e consequentemente, menor acúmulo de placa bacteriana2. O raio-x foi um instrumento decisivo nos casos de doença periodontal, cárie e fratura dentária, principalmente para definir o nível da linha de fratura e desgaste, assim como na decisão sobre a manutenção do elemento dentário. A retração gengival também compõe a doença periodontal e foi vista em nove primatas mesmo sem causa aparente ou outras patologias. Assim, apesar da doença não ter sido manifestada de forma igual em todos os animais, optou-se realizar o tratamento periodontal em todos os primatas mesmo que em alguns o tratamento apresentasse viés profilático, pois já se sabe que mesmo que mínima, a manutenção de processo infeccioso desencadeia alterações que levam à perda do elemento dentário e bacteremia crônica, causando o comprometimento sistêmico, lesão em diversos órgãos e morte11. Inferimos que o tratamento periodontal melhorou substancialmente a qualidade de vida desses animais, devido ao ganho de peso e aumento na circunferência abdominal de forma significativamente demonstrado nos gráficos 1 e 2. O desgaste dentário é uma das afecções mais comuns em animais silvestres mantidos em cativeiro³, neste trabalho apresentou 72.2% (13/18) de ocorrência, igualmente observado por Dias Neto et al. (2016) em que 81% dos primatas apresentaram desgaste. A abrasão dentária é causada pelo traumatismo continuado dos dentes em função da mordedura constante, obsessiva e compulsiva de obstáculos encontrados no recinto, como barras ou telas metálicas, postes de concreto e comedouros, entre outros. A resposta dental normal à abrasão natural que ocorre ao longo da vida é a produção de dentina reparadora 1. Em condições normais, a taxa de reparação é suficiente para compensar a taxa de abrasão, não sendo necessário nenhum tipo de tratamento ou a profilaxia dentária regular para manutenção da saúde oral e acompanhamento deste desgaste. A maioria dos animais apresentou 31 desgaste nos incisivos e pré-molares, estes desgastes se manifestaram de forma leve no esmalte dentário, confirmado pelo raio-x intraoral. Assim, efetivou-se o tratamento periodontal, ao invés da restauração, corroborando com Roux et al. (2017). Sugere-se que a escolha do tratamento periodontal neste caso de desgaste foi benéfica, confirmado pelo gráfico 1, observando ganho de peso do D0 ao D90. O comportamento dos primatas mantidos em cativeiro que levam ao desgaste dentário pode também ocasionar acidentalmente fratura do dente, visto pelos dados obtidos neste estudo em que as quatro ocorrências de fraturas foram em animais que tinham desgastes 2. Costa et al. (2012) registrou fratura em 81% dos primatas estudados, porém não correlacionou às alterações de abrasão dental. Neste trabalho, o animal 15 que apresentou os dois caninos superiores fraturados era aparentemente o mais velho do grupo e três dos quatro dentes acometidos eram os caninos superiores. Segundo Wiggs & Lobprise (1997), o tratamento da fratura dentária deve se basear na análise clínica e radiográfica do dente, podendo envolver tratamento endodôntico ou exodontia. Nos quatro animais que apresentaram fratura dentária, três necessitaram da realização da exodontia, pois a fratura estava na base da coroa dentária e apresentava necrose tecidual. Destes animais, o animal 3, realizou o tratamento endodôntico. Todos os quatro animais apresentaram ganho de peso, observado na tabela 2. O primata que realizou tratamento endodôntico teve ganho de peso significativo de 415g e semelhante a Facchini et al. (2017). Este tratamento conservador só foi realizado após uma análise prévia e detalhada da estrutura do osso alveolar, por meio da radiografia. A ausência dentária (16.7%) principalmente nos incisivos, foi observada também por Dias Neto et al. (2016) (38%), ao analisar macacos-prego (Sapajus sp.) mantidos em cativeiro. A presença de fraturas, desgastes e ausência dentária, localizadas na região rostral (dentes incisivos e caninos), sugerem o trauma como o principal fator, como constatado por Costa et al. (2012). Apesar da etiologia destas lesões serem desconhecidas, os processos traumáticos são as principais causas desses tipos de injúrias 10 . A cárie pode ser superficial ou profunda, sendo a última mais comumente localizada na superfície oclusal dos dentes pré-molares e molares, entre suas cúspides 8. Observou-se que três animais apresentaram cárie profunda, sendo mais frequente no pré-molar, que devido ao grau 32 desencadeou a mobilidade dentária, caracterizando a perda de toda estrutura. Todos os dentes que apresentaram cárie tiveram que ser extraídos devido a cronicidade e gravidade da lesão, tal abordagem também foi relatada por Roux et al. (2017). 2.5 Conclusão O atendimento odontológico especializado realizado aos primatas do Centro de Triagem em Animais Silvestres mostrou-se necessário devido a alta incidência de patologias orais, pois todos os animais foram diagnosticados com lesões dentárias de gravidade variável. A gravidade das lesões dentárias resultou em tratamentos diversificados, como exodontia e endodontia. O tratamento odontológico proporcionou ganho de peso e circunferência abdominal. Assim, sugere-se que o diagnóstico e tratamento das lesões odontológicas em primatas podem melhorar a qualidade de vida dos animais, expectativa de vida e a conservação das espécies. 2.6 Referências 1 Abee, C.R.; Mainsfield, K.; Tardif, S.; Morris, T. (2012). Nonhuman Primates Biomedical Research: Biology and Management. Academic Press. 536p. 2 Andrade, A., Andrade, M.C.R., Marinho, A.M., Ferreira Filho, J. (2010) Biologia, Manejo e Medicina de Primatas não humanos na pesquisa biomédica. Rio de Janeiro: Fiocruz.472p. 3 Vaz, L.L. & Port-Carvalho, M. (2010) Ecologia e comportamento de um grupo de macacos- prego (Cebus spp.) (Primates: Cebidae) e frequência de contato com visitantes do Parque Estadual Alberto Löfgren. IF Sér. Reg., São Paulo, 42:121-125. 4 Dechow, P, C. Panagiotopoulou, O., Gharpure, P. (2017). Biomechanical implications of cortical elastic properties of the macaque mandible. Zoology 124, 3–12. Doi: dx.doi.org/10.1016/j.zool.2017.06.008. 5 Fiorenza, L & Bruner, E. (2018) Cranial shape variation in adult howler monkeys (Alouatta seniculus). American Journal of Primatology, 80(1), 227-29. Doi: 10.1002/ajp.22729. 6 Wiggs, R. B & Lobprise, H. B. (1997) Exotic animal oral disease and dentistry. In: Wiggs, R. B.; Lobprise, H. B. Veterinary dentistry. Principles & practice. New York: Lippincott Raven.v(56), p.538-556. 33 7 Dias Neto, R. das N., Fecchio, R. S., Rahal, S. C., Teixeira, C. R., Gioso, M. A., Pereira, C. T., et al. (2016) Dental disorders in brown howler monkeys (Alouatta guariba clamitans) maintained in captivity. Journal of Medical Primatology, v.45(2). Doi: 79–84. doi:10.1111/jmp.12208. 8 Roux ,P., Brecheisen, Muriel., Carvalho, R., Bergadano, A. (2017) Diagnoses and Treatment of Dental Disorders in a Research Colony of Macaca fascicularis: A Case Series. Journal of Veterinary Dentistry, 34(3), 179-189. DOI: 10.1177/0898756417722021. 9 Capriglione, L. G. A., Fuchs, T.., Soresini, G. C. G., Ribas, C. R.., Sant'Anna, N. T., D´Ámico Fam, A. L, Sarraff-Lopes., A. P., Pimpão, C. T. (2013) Avaliação eletrocardiográfica de macacos-prego (Sapajus apella) sob contenção química com midazolam e propofol. Semina: Ciências Agrárias, Londrina, 34(6), 3801-3810. Doi: 10.5433/1679- 0359.2013v34n6Supl2p3801. 10 Fernandes L.M.P., Nascimento E.M., Nunes C.S.R., Vieira E.P., Lins P.D., Teixeira F.B., Couto R.S.D.A. & Lima R.R. (2014) Root morphology of the permanent dentition Sapajus apella: morphometry, gross anatomy, ultrastructure and physical properties. Pesq. Vet. Bras. 34(8),791-796. Doi: 10.1590/S0100-736X2014000800015. 11 Facchini, F., Lacopetti, Ilaria., Gaudio, E., Zotti, A., Boldrin, M., Fante, F., Mutinelli, F., Cozzi, E., Benedictis, G. (2017). Endodontic treatment of canine teeth in a cynomolgus monkey (Macaca fascicularis). Laboratory Animals. 52(3), 308- 312 doi: 10.1177/0023677217737568. http://www.joponline.org/author/Brecheisen%2C+Muriel http://www.joponline.org/author/de+Carvalho%2C+Rafael http://www.joponline.org/author/Bergadano%2C+Alessandra 34 CAPÍTULO 3 - Avaliação do perfil microbiológico e de suscetibilidade antimicrobiana de bactérias da mucosa oral e biofilme supra e sub gengival em Macacos-prego (Sapajus sp.) Aline Cavalcanti Pereira da Silva¹; Lucas Nogueira Paz² ; Fernanda de Azevedo Libório³ ; Eunice Santos de Andrade² ; Josy de Lima Godoi² ; Joice Neves Reis² ; Marcelo teles Bastos Ribeiro² ; Melissa Hanzen Pinna Valentim² ; João Moreira da Costa Neto² ¹ Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” ² Universidade Federal da Bahia ³ Médico Veterinário Aline Silva, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Jaboticabal - São Paulo -alineodontovet@gmail.com +5511952901377 RESUMO Introdução: A resistência bacteriana é considerada problema de saúde pública, envolvendo não só seres humanos, mas também animais, principalmente sua inter-relação. O biofilme é uma estrutura amorfa, capaz de causar infecções locais nos órgãos de predileção. O trabalho teve como objetivos isolar, identificar o biofilme dentário e avaliar a susceptibilidade de antibióticos, através do método convencional e automatizado (VITEK2). Metodologia: 18 primatas da espécie Sapajus sp., adultos, oriundos de vida livre, tráfico ilegal ou domiciliados, foram incluídos no estudo e assim, realizadas a colheita da microbiota residente através de swabs estéreis e do biofilme supra e sub-gengival, através de raspagem com instrumental odontológico. Após o crescimento, as colônias foram primariamente identificadas de acordo com técnicas laboratoriais rotineiras com base nas características morfotintorias e depois foram encaminhadas para realização do isolamento e identificação automatizado, VITEK2. Adicionalmente, utilizou-se os cartões GN-ID e GP-ID e os cartões AST-N239 para identificação antibiograma das bactérias Gram negativas e Gram positivas respectivamente. Resultados: Foram isoladas 41 colônias da microbiota residente, dentre essas 27/41 (65,85%) foram bactérias Gram-negativas enquanto 14/41 (34,15%) bactérias Gram-positivas. Obtivemos 108 isolados das amostras oriundas da placa bacteriana e do conteúdo sub-gengival. 83/108 (76,85%) isolados foram caracterizadas como Gram-negativas, enquanto 25/108 (23,15%) apresentaram-se com bactérias Gram-positivas. Conclusão: Este estudo gerou resultados válidos para a avaliação da suscetibilidade antimicrobiana de bactérias da mucosa oral e biofilme dentário. Palavras – chave: Primatas, afecções orais e Microbiologia clínica mailto:alineodontovet@gmail.com 35 3.1 Introdução A cavidade bucal dos primatas não-humanos, de modo geral, constitui um meio diversificado, colonizado com cepas de microrganismos que habitam esse ambiente de forma permanente (residente) e transitória. Porém também pode ser associada a microbiota saprófita, patogênica e polimorfa, além de enzimas e produtos de degradação biológica, muitas vezes tóxicos. Estes microrganismos são consequência dos hábitos alimentares e do costume de levar constantemente as mãos contaminadas à boca, principalmente com matéria fecal (Aspis et al., 2003). A microbiota residente tem um papel fundamental para a manutenção e saúde do organismo. Os microrganismos colonizadores atuam como indutores da maturação de todo o sistema imune, e assim tornam-se capazes de reconhecer patógenos e desenvolver uma resposta protetora, enquanto também adquire tolerância ao que é inócuo, como alimentos e microrganismos comensais. Portanto, qualquer fator externo que possa alterar o equilíbrio da microbiota, tais como dieta ou tratamento com antibióticos, deve ser considerado como potencial fator de risco para o desenvolvimento de doenças. Assim, a microbiota desempenha papel fundamental na manutenção das interações com o sistema imune e metabolismo do hospedeiro (Kosiewicz et al., 2011). No entanto, pouco é conhecido sobre a microbiota oral dos primatas não-humanos, principalmente com relação a identificação de bactérias envolvidas na formação dos biofilmes dentários e suas consequências locais e sistêmicas. O isolamento e identificação dos agentes bacterianos é realizado a partir de materiais clínicos colhidos adequadamente do sítio de infecção, Por meio de exame bacteriológico ou cultura. Pode-se fazer por métodos convencionais, métodos moleculares e automáticos (Gaetti-Jardim Jr. et al., 2012). Sabe-se que as infecções odontogênicas são causadas não apenas por um único organismo, mas por biofilme microbiano. O biofilme é uma estrutura amorfa, capaz de causar infecções locais no sítio de predileção. Além disso, relata-se que infecções afetam o controle metabólico de doenças crônicas sistêmicas como diabetes mellitus. Assim, o tratamento antimicrobiano evita a continuidade da infecção, reduzindo a propagação bacteriana e danos posteriores a tecidos e órgãos circundantes. Os medicamentos para antibioticoterapia mais comumente usados nas infecções odontogênicas em animais são gentamicina, trimetopirm, 36 sulfadiazina e amoxicilina. Esse último é a primeira escolha no tratamento de infecções odontogênicas em primatas não-humanas (Brandão et al., 2011; Sukumar et al., 2016). De forma geral, seus benefícios são de amplo espectro, excelente biodisponibilidade, meia-vida longa e penetração tecidual superior. No entanto, algumas bactérias estão se tornando resistentes aos antibióticos de rotina, produzindo um problema de saúde pública, gerando tratamentos ineficazes e aumentando o risco de propagação de infecções refratárias, principalmente relacionados a animais (Lysakowska et al, 2016). Alguns estudos relatam que a resistência bacteriana pode ser influenciada por células que vivem dentro do biofilme onde trocam informação genética, produzindo mecanismos fisiológicos de resistência. Segundo a literatura, o biofilme mostra maior resistência aos antibióticos até 1000 vezes em comparação com bactérias planctônicas (Bidault et al., 2007; Lysakowska et al., 2016; Sukumar et al., 2016). Segundo Sukumar et al (2016), essa resistência se deve à estrutura, fisiologia e microbiologia resultantes do biofilme. As diversas pressões ecológicas na cavidade oral são consequência de variações físicas e químicas nesse ambiente, o que requer que os membros do biofilme oral ajustem sua atividade metabólica e genômica para lidar com essas tensões. Assim, a natureza do biofilme oral permite e favorece interações bacterianas complexas. A resistência adquirida representa um fenótipo mais flexível e sua prevalência é mais imediatamente responsiva à pressão de seleção (Abusleme et al., 2013). Atualmente, sistemas automatizados como o VITEK-2, têm sido amplamente estudados para identificação de espécies e avaliação de suscetibilidade antimicrobiana, principalmente pela sua eficácia e rapidez nos resultados (Van Winkelhoff et al., 2016). Os objetivos deste estudo foram analisar a microbiota transitória e residente da cavidade oral, como a placa bacteriana subgengival e supragengival dos primatas do gênero Sapajus e analisar a suscetibilidade antimicrobiana de bactérias da mucosa oral e do biofilme dentário. Neste estudo, foi avaliado o método convencional de isolamento, identificação e susceptibilidade de antibióticos de bactérias comparado ao sistema Vitek-2. 37 3.2 Material e Métodos 3.2.1 Considerações éticas Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Bahia (processo 44/2017) e pelo Departamento de Meio Ambiente do Brasil (IBAMA-SISBIO) número 58871-2 e foi desenvolvido com respeito primordial ao bem-estar dos animais utilizados no experimento e aos seus direitos. 3.2.2 Animais Foram avaliados 18 primatas da espécie Sapajus sp., adultos, sem distinção de sexos (10 machos e 08 fêmeas), mantidos no Centro de Triagem de Animais Silvestres da Bahia (CETAS). Os animais eram alimentados com uma dieta normalmente composta de cereais, frutas e água ad libidum. Os espécimes eram oriundos de vida livre, tráfico ilegal de animais ou domiciliados. A coleta foi realizada após sedação química como descritos por Silva et al (2018) – Manuscrito submetido. Os animais estudados não apresentaram história de desordem sistêmica. 3.2.3 Coleta de amostras As amostras destinadas ao cultivo bacteriano foram coletadas em dois momentos diferentes. Primariamente, obteve-se amostras destinada a análise da microbiota bacteriana residente na cavidade oral. Posteriormente, no momento do procedimento odontológico (Silva et al., 2018 – Manuscrito submetido), foram coletadas placa bacterina supra-gengival e amostras da porção sub-gengival (Figura 6) . 38 3.2.4 Microbiota residente As amostras foram obtidas com auxílio de swabs estéreis como meio de transporte (Absorve®) através de movimentos rotacionais delicados na da cavidade oral (bochechas palato e língua) (Figura 1). A coleta foi realizada em dez animais, divididos em três momentos entre Figura 1: Primeira coleta, microbiota bacteriana residente na cavidade oral Figura 2: Segunda coleta, coleta do biofilme supra gengival (seta vermelha) na face vestibular do dente canino superior direito do Macaco -prego (Sapajus sp.) e do biofilme sub-gengival (seta amarela) foi realizada com auxílio de cones de algodão absorvíveis (Tanari®). 39 agosto e setembro de 2017. Após a obtenção, os swabs foram devidamente identificados transportados imediatamente em temperatura ambiente para o Laboratório de Bacterioses, Hospital Veterinário da Universidade Federal da Bahia. Tais amostras foram semeadas através da técnica rotineira de esgotamento por estria em placas de Petri contento Ágar sangue de ovelha a 6% (ASG), Ágar MacConkey (MC) e Água azul de metileno (EMB). Ao mesmo tempo, os swabs foram mergulhados em caldo triptose (CT). Os inóculos foram incubados a 37 °C em ambiente aeróbio por 24-48 h. Figura 3: Técnica rotineira de esgotamento por estria em placas de Petri contento Ágar sangue. 3.2.5 Avaliação da formação de biofilme supra e sub-gengival A microbiota do biofilme supra-gengival foi avaliada por raspado da placa bacterina coletada na face vestibular do dente canino superior direito de cada animal (Figura 2). O material foi obtido com auxílio de cureta odontológica esterilizada e imediatamente inoculado em tubos de vidro contendo caldo triptose. A coleta do material para avaliação da microbiota do biofilme sub-gengival foi realizada com auxílio de cones de algodão absorvíveis (Tanari®) com ajuda de sindesmótomo esterilizado. Tal material foi obtido do sulco gengival do dente 40 canino superior direito de cada animal e imediatamente inoculado em tubos de vidro contendo caldo triptose. Os inóculos provenientes da placa bacteriana foram incubados a 37° C, em ambiente aeróbio por 24 h. Já os tubos contendo os inóculos do material sub-gengival foram incubados a 37° C em jarras de anaerobiose por 24 h, para o crescimento de microrganismos anaeróbios estritos ou facultativos. Após esse período, os tubos cultivados em aerobiose e anaerobiose cujo caldos apresentaram turvação (indício de crescimento), foram semeados em placas de petri utilizando as técnicas e meios anteriormente citados (Figura 3) e novamente incubados a 37 ° C por 24 h, com presença de oxigênio e ou nas jarras de anaerobiose respectivamente. Os tubos que não apresentaram crescimento em 24 horas foram novamente incubados pelo mesmo período de tempo e posteriormente semeados como anteriormente descrito. 3.2.6 Isolamento, identificação e sensibilidade antimicrobiana Após o crescimento, as colônias foram primariamente identificadas de acordo com técnicas laboratoriais rotineiras com base nas características morfotintorias (morfologia das colônias e coloração de Gram), além da presença ou ausência hemólise em ágar sangue e características bioquímicas (teste de catalase, teste de oxidação-fermentação, teste de coagulase, oxidase, teste vermelho de metila, teste de motilidade, Ágar TSI (Triple Sugar Iron), produção de indol, ágar citrato Simmons, urease, fermentação do malonato e de carboidratos: glicose, sacarose, lactose, manitol, adonitol, arabinose e dulcitol). Após identificação, as cepas foram congeladas em microtubos plásticos (Eppendorf®) a -20º C, até o momento da confirmação pelo método automatizado. Uma amostra de cada cepa previamente triada foi encaminhada para confirmação automatizada no Instituto Couto Maia, Salvador, Bahia, com auxílio do Teste de Sensibilidade aos Antimicrobianos e a confirmação da identificação da espécie, utilizando o sistema automatizado VITEK® 2 (bioMérieux, Inc., Durham, NC, EUA), o qual fornece > de 95% de precisão na identificação de bactérias Gram-negativas e Gram- positivas. A suspenção dos isolados foi preparada utilizando o segundo repique, após o descongelamento das cepas em 3mL de solução salina (cloridrato de sódio) a 0,45%, obtendo- se uma concentração do inóculo entre 0,50 – 0,63, na escala de Mc Farland, segundo as instruções do fabricante. Adicionalmente, utilizou-se os cartões GN-ID e GP-ID (Figura 4) e os cartões AST-N239 (Figura 5) para identificação antibiograma das bactérias Gram negativas e 41 Gram positivas respectivamente (Quadro 1). As leituras e interpretações dos resultados foram realizadas em acordo com o disposto pelo fabricante. Quadro 1: Descrição dos antimicrobianos contidos no Cartão AST – N e no Cartão AST – P Cartão AST – N Antimicrobianos para Gram Negativas Cartão AST – P Antimicrobianos para Gram Positivas BLSE (Beta-lactamases) Ampicilina Amoxicililina+ Ácido clavulânico Piperacilina/Tazobactam Cefalotina Cefuroxima Axetil Ceftriaxina Cefepima Ertapenem Meropenem Amicacina Gentamicina Teste de screening de cefoxitina Benzilpenicilina Ampicilina Oxacilina Gentamicina Alto Nível (sinergia) Estreptomicina Alto Nível (sinergia) Gentamicina Ciprofloxacina Moxifloxacina Norfloxacina Resistência induzida a Clindamicina Eritromicina Figura 4: Cartão ID – Identificação Gram-positiva e Gram-negativa Figura 5: Cartão AST N239 – Antibiograma das bactérias Gram negativas e Gram positivas 42 Ácido nalidixico Ciprofloxacina Norfloxacina Nitrofloxacina Trimetoprim/Sulfametaxazol Clindamicina Linezolida Teicoplanina Vancomicina Tigeciclina Ácid Fusidico Rifampicina Trimetoprim/Sulfametaxazol 3.3 Resultados 3.3.1 Microbiota residente da cavidade oral Foram primariamente isoladas 41 colônias com morfologia aparentemente distinta, dentre essas 27/41 (65,85%) foram bactérias Gram-negativas enquanto 14/41 (34,15%) Figura 6: Fluxograma da metodologia utilizada na execução do estudo. 43 bactérias Gram-positivas. Após a identificação prévia com provas bioquímicas, obteve-se 24/28 (85,71%) cepas de bactérias Gram-negativas, e 4/28 (14,29%) de bactérias Gram-positivas. Os resultados de identificação e perfis de sensibilidade estão descritos no quadro 2. Ressalta-se que a identificação automatizada demostrou duas cepas com a mesma identificação nos animais A2 e A12, porém com perfil de sensibilidade diferentes. Adicionalmente, O animal A14 apresentou duas cepas idênticas tanto para identificação quanto para o perfil de sensibilidade antimicrobiana. Dentre as cepas Gram-positivas, a técnica não foi capaz de identificar três cepas. Quadro 2: Susceptibilidade antimicrobiana das colônias isoladas da microbiota residente da cavidade oral dos animais avaliados. Animal Colônias Isoladas Resistência Intermediário 1 Proteus mirabilis Klebsiella oxytoca Ampicilina Staphylococcus xylosus Benzilpenicilina Eritromicina ; Clidamicina ; Ac.Fusídico 2 Escherichia coli - Cefalotina Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil 3 Klebsiella pneumoniae ssp pneumoniae Ampicilina - Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil - Escherichia coli - Cefalotina Klebsiella oxytoca Ampicilina - 4 Klebsiella oxytoca Ampicilina 5 Acinebacter baumannii complex Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil - Escherichia coli - - 10 Leclercia adecarboxylata - Cefalotina 11 Serratia marcescens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil - 12 Escherichia coli Ampicilina ; Ácido nalidixico Cefalotina 13 Escherichia coli Ácido nalidixico 44 Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Enterobacter cloacae ssp dissolvens Nitrofloxacina 14 Escherichia coli Ácido nalidixico Cefalotina Sphingomonas paucimobilis Ácido nalidixico Escherichia coli Ácido nalidixico Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil 3.3.2 Bactérias formadoras de biofilme supra e sub-gengival Obtivemos 108 isolados das amostras oriundas da placa bacteriana e do conteúdo sub- gengival. 83/108 (76,85%) isolados foram caracterizadas como Gram-negativas, enquanto 25/108 (23,15%) apresentaram-se com bactérias Gram-positivas. Dente essas, após a identificação com provas bioquímicas, foram identificadas 57 cepas distintas essas foram enviadas para a confirmação pelo método automatizado. 43/58 (75,44%) eram cepas Gram- negativa, e 14/58 (24,56%) eram cepas Gram-Positivas. Não foi possível a identificação automatizada de duas (2/43 – 4,65%) cepas Gram-negativas dentre as dentre as 43 enviadas. Ao mesmo tempo, isolados dos animais A2, A6, A10. A17, apresentaram cepas com mesma identificação, mas com perfis de sensibilidade distintos. Enquanto dos animais A5, A11, A12, A13 e A15 foram obtidas cepas com a mesma identificação e perfis de sensibilidade (Quadro 3). Observamos que sete (7/14 – 50,00%) das cepas Gram-positivas não foram identificadas utilizando o método automatizado. Animal Colônias Isoladas Resistência Intermediário 1 Leuconostoc mesenteroides ssp mesenteroides 2 Proteus mirabilis Amoxicilina+Clavulan ato Acinebacter baumannii complex Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil Ceftriaxina 3 Leclercia adecarboxylata - - Quadro 3: Susceptibilidade antimicrobiana das colônias isoladas da placa bacteriana supra e subgengival dos animais avaliado. 45 Staphylococcus aureus BenzilPenicilina ; Eritromicina ; Clidamicina - 4 Escherichia coli Ácido nalidixico - Lactococcus garvieae - Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil - 5 Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxcilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima Axetil - Klebsiella pneumoniae ssp pneumoniae Ampicilina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil - Staphylococcus lentus BenzilPenicilina ; Oxacilina ; Moxifloxacina ; Eritromicina ; Clidamicina ; Linezolida ; Teicoplanina ; Vancomicina ; Ac. Fulsidico ; Rifampicina - 6 Enterobacter cloacae ssp dissolvens Ampicilina ; Amoxicilina+Clavulanato ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil - 7 Enterobacter cloacae ssp dissolvens Ampicilina ; Amoxicilina+Clavulanato ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil - Enterobacter cloacae complex Ampicilina ; Amoxicilina+Clavulanato ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil - 8 Raoultella ornithinolytica Ampicilina ; Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina Cefuroxima ; Cefuroxima+Axetil Escherichia coli Ácido nalidixico - Enterobacter cloacae ssp dissolvens Ampicilina ; Amoxicilina+Clavulanato ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil - 10 Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxicilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - Escherichia coli Ampicilina ; Ácido nalidixico Cefalotina ; Cefuroxima. Axetil 11 Escherichia coli - - 46 3.4 Discussão O Macaco-prego é o modelo animal mais estudado atualmente, principalmente por ter fácil reprodução em cativeiro, resposta biológica e rápida maturidade sexual. No entanto, a falta de dados sobre sua microbiota residente e transitória limitou seu uso em pesquisas biológicas, particularmente em estudos envolvendo biofilmes dentais e susceptibilidade antimicrobiana. Além disso, pouco se sabe sobre o evolução das doenças infecciosas orais nesta espécie, particularmente gengivite e periodontite. Além disso, estudos sobre a microbiota oral de macacos e sua potencial resistência a antibióticos comumente utilizados, pode contribuir para elucidar o processo de infecções endógenas em humanos, uma vez que certos patógenos, podem Enterobacter cloacae complex Amoxicilina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - 12 Serratia plymuthica - Cefalotina Enterococcus faecium Clidamicina - 13 Klebsiella pneumoniae ssp pneumoniae Ampicilina ; Cefalotina - Enterobacter cloacae ssp dissolvens Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - Enterobacter cloacae complex Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - 14 Pantoea spp Sem resultados Klebsiella oxytoca Ampicilina 15 Enterobacter aerogenes Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - Proteus mirabilis - - 16 Enterobacter cloacae complex Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - 17 Escherichia coli Ac. Nali Cefalotina Enterobacter cloacae complex Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - Streptococcus uberis Não testado 18 Klebsiella pneumoniae ssp pneumoniae Amp - Enterobacter cloacae complex Amoxiciclina+Clavulanato ; Cefalotina ; Cefuroxima ; Cefuroxima Axetil. - 47 ter se originado de microrganismos que colonizaram primatas não humanos (Vaz & Port- Carvalho, 2010; Bobenchiki et al., 2016). O tempo despendido pelo sistema Vitek-2 foi de máximo de 2h para identificação e 13h para o teste de sensibilidade aos antimicrobianos enquanto o método convencional apresentou resultados dentro de 18 a 24h. Uma vantagem na utilização do método automatizado é o fluxo de trabalho simplificado. Um total de 41 amostras de 18 animais estão incluídos neste estudo, perfazendo um total de 34,15% gram-positivos, 65,85% gram-negativos. Os resultados foram comparados entre o método manual e o Vitek-2. Apesar de obter 100% de acurácia na identificação das colônias, o sistema Vitek-2 apenas identificou 72% das colônias analisadas, taxa de sucesso próxima a relata por Hansen et al. (2002) que obtiveram 83% de sucesso na identificação das amostras. Comparado com o sistema convencional, o sistema Vitek-2 identificou corretamente 100% das bactérias isoladas. O índice de sucesso reportado no presente trabalho não é achado inédito, tendo outros pesquisadores publicado taxas entre 90 e 100% (Ko et al., 2017). Azevedo et al (2004) relataram divergência de resultados entre 76,9% e 87,5% quando comparado o método automatizado do Vitek-2 com os testes fisiológicos convencionais. Apesar do índice ser pequeno (1,4%), existem relatos onde o sistema Vitek-2 apresentou erros de identificação, com troca de espécies (Lappe et al., 2014; Vila et al., 2016; Kim et al., 2018). Apesar de relato na literatura, não houveram erros de identificação no presente trabalho. Mesmo sendo capaz de diminuir o tempo para diagnóstico, possibilitando uma rápida decisão para tratamento de infecções bacterianas, ressalta-se que a técnica apresenta algumas limitações, pode apresentar identificação cruzada com organismos semelhantes, não ser capaz de identificar determinadas cepas ou detectar falsa sensibilidade a antibióticos (Ko et al., 2017 ; Bobenchik et al., 2016 ; Vila et al., 2016 ; Embers et al., 2011). Dentre as limitações relatadas na literatura, não houve ocorrência de nenhuma delas neste estudo. A porcentagem de 72% microrganismos identificados no presente trabalho foi alta quando comparada com outros estudos. Entretanto, ressalta-se que há poucos trabalhos utilizando tal sistema na veterinária e não há estudos publicados em macacos prego (Brower et al., 2017; Elhariri et al., 2017; Embers et al., 2011). 48 Bobenchiki et al. (2016) e Ko et al. (2017) relataram que o Vitek-2 MS não identificou colônias de Klebsiella pneumoniae e Staphylococcus aureus, divergindo dos achados presentes onde a técnica apresentou alta sensibilidade para tais microrganismos. A espécie predominante na microbiota residente transitória encontrada em maior prevalência foi Escherichia coli seguido de Enterobacter cloacae. Na avaliação microbiológica da placa cone houve uma inversão, com predomínio de Enterobacter cloacae, seguido de Eschericia coli. Tais resultados divergem dos achados de Gaetti-Jardim Jr et al., (2012), que publicaram predominância de Staphylococcus sp. e Streptococcus sp. na microbiota oral em macacos prego. Apesar dessa divergência, houve predomínio de bactérias gram-negativas em ambos os estudos. Tal divergência nos grupos microbiológicos pode ser atribuída a diferença de pressão ambiental que os animais estão submetidos. Não foi possível correlacionar perfil de sensibilidade e resistência aos antimicrobianos junto aos autores pois estes critérios não foram avaliados no trabalho. Colônias de Enterobacter spp. E Serratia ssp., apresentaram-se 100% resistentes aos antibióticos amoxicilina e cefalotina, corroborando com estudos