RESSALVA Atendendo solicitação do(a) autor(a), o texto completo desta tese será disponibilizado somente a partir de 25/01/2026. PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MARCELO ALEXANDRE ALBINO FILHO POR UMA ÉTICA DA NÃO VIOLÊNCIA E A FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE Linha de Pesquisa: Educação, Diferença, relações de Gênero e Étnico-raciais Orientador: Dr. Divino José da Silva Presidente Prudente - SP 2024 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MARCELO ALEXANDRE ALBINO FILHO POR UMA ÉTICA DA NÃO VIOLÊNCIA E A FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE Tese apresentada ao Programa de Pós- graduação em Educação, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente, como parte dos requisitos para obtenção do título de “Doutor em Educação”. Linha de Pesquisa: Educação, Diferença, relações de Gênero e Étnico-raciais Orientador: Dr. Divino José da Silva Presidente Prudente - SP 2024 A todas as vítimas, familiares e amigos afetados pela Pandemia da Covid-19. AGRADECIMENTOS Ao meu marido, Gabriel Mendes Plantier e nossa filha Alice Plantier por todo apoio e carinho, meus alicerces de vida. Aos meus pais, Marcelo Alexandre Albino e Ana Maria da Silva Albino, e ao meu irmão Matheus Augusto Albino pela educação, confiança e energias positivas e todo investimento. Ao professor Divino José da Silva, pela paciência, confiança, cuidado e disposição para escutar, acolher e orientar com maestria, respeito e dedicação. Ainda em 2020, antes mesmo da pandemia da Covid-19, me acolheu e incentivou durante minha trajetória como aluno especial e, no ano seguinte, me aceitou como seu orientando. Aos professores Rodrigo Barbosa Lopes, Pedro Pagni, Raphael Guazelli e Ademir Manfre pela participação na banca de defesa. Suas contribuições foram extremamente importantes e pertinentes. Aos professores e demais profissionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESP – campus de Presidente Prudente/SP. À UNESP, por proporcionar-me uma formação humana. Até que a filosofia Que mantém uma raça superior E outra inferior Seja finalmente e permanentemente Desacreditada e abandonada Em todo lugar haverá guerra Eu digo que haverá guerra Bob Marley RESUMO A pandemia da Covid-19 evidenciou, ainda mais, que as vidas não enlutáveis são as mais vulneráveis. Assim, a adesão às medidas de combate à pandemia foi subjetivada em prol dos diferentes interesses políticos, com consequente tentativa de normalização da morte e fortalecimento de um imaginário sociopolítico racista. Portanto, as medidas adotadas pelo governo federal, como política de gestão da pandemia, incidiram sobre a população e sobre os profissionais da saúde de forma violenta, subjetivando o próprio exercício profissional, bem como a ocorrência de dilemas bioéticos vivenciados por eles, tais como: aderir ao isolamento ou ir para a linha de frente? Atualizar-se frente às evidências científicas ou prescrever e/ou administrar medicamentos sem eficácia comprovada? Aderir a protocolos de priorização de atendimentos ou garantir o direito à saúde a todos? A hipótese inicial é de que os dilemas éticos vivenciados pelos profissionais da saúde durante a pandemia da Covid-19 são formas de violência que subjetivaram o próprio exercício profissional. Assim, o objetivo desta pesquisa é pensar em uma ética da não violência na formação em saúde a partir dos desafios postos aos profissionais dessa área pela pandemia. Trata-se de um estudo teórico, organizado em seis seções, que buscou analisar o quanto as medidas de contingenciamento do vírus implicaram em dilemas éticos no âmbito das orientações em saúde, para, então, refletir sobre uma formação ética da não violência em saúde. Com essa finalidade, como eixo norteador para as reflexões aqui propostas, o estudo se baseou no conceito de dispositivo de segurança para descrever as implicações bioéticas no campo da saúde, tendo em vista pensar em uma formação ética em saúde a partir das acepções da força da não violência. Palavras-chave: Pandemia; Ética; Vidas Enlutáveis; Saúde; Formação. ABSTRACT The Covid-19 pandemic has further highlighted that lives considered “non-bereavable” are the most vulnerable. Thus, adherence to measures to combat the pandemic was subjective influenced by various political interests, with a consequent attempt to normalize death and strengthen a racist sociopolitical imaginary. Therefore, the measures adopted by the federal government, as a pandemic management policy, had a violent impact on the population and health professionals, subjectivizing their own professional practice, as well as the occurrence of ethical dilemmas experienced by them, such as: adhere to isolation or work on the front line? Staying updated on scientific evidence or prescribing and/or administer medications without proven efficacy? Adhering to protocols for prioritizing care or guaranteeing the right to health for everyone? The initial hypothesis is that the ethical dilemmas experienced by health professionals during the Covid-19 pandemic are forms of violence that subjectivized their professional practice itself. Thus, the objective of this research is to think about an ethics of non-violence in health training based on the challenges posed to health professionals by the pandemic. This is a theoretical study, organized into six sections, which aims to analyze the extent to which virus contingency measures resulted in ethical dilemmas within the scope of health action guidelines, to then reflect on an ethical formation of non-violence in health. To this end, as a guiding axis for the reflections proposed here, the study was based on the concept of a safety device to describe the ethical implications in the field of health, with a view to thinking about ethical training in health based on the meanings of the strength of non violence. Keywords: Pandemic; Ethic; “Non-Bearavable”Lives; Health; Training. SUMÁRIO Prólogo 11 Introdução 17 1. Dispositivos de Segurança diante das Doenças Infectocontagiosas 28 2. Práticas Violentas adotadas pelo governo na Pandemia da Covid-19 44 2.1 A Disseminação de Notícias Falsas 45 2.2 O Isolamento Social 48 2.2.1 O Isolamento Social e o Senso Imunitário 51 3. Normalização da Morte no Governo da Pandemia 58 4. O Uso dos Discursos e Saberes em Saúde para Fins Violentos 82 4.1 A Normatividade Biológica em Saúde 85 4.2 A Prática Baseada em Evidências 94 5. Dilemas Bioéticos presentes na Pandemia da Covid-19 101 5.1 Dilema Bioético: Aderir ao isolamento ou ir para a linha de frente? 103 5.2 Dilema Bioético: Atualizar-se frente às evidências científicas ou prescrever e/ou administrar medicamentos sem eficácia comprovada? 108 5.3 Dilema Bioético: Aderir a protocolos de priorização de atendimentos ou garantir o direito à saúde a todos? 111 6. Por uma Formação Ética da Não Violência em Saúde 121 Considerações finais 149 Referências 153 APÊNDICE: O SUS como Instituição Democrática 165 11 Prólogo Meu contato com os serviços de saúde pública na infância e adolescência sempre foi voltado às ações de prevenção e promoção da saúde. Nunca passei por um processo fisiopatológico que culminasse na necessidade de uma hospitalização ou algo mais grave. Lembro de várias ocasiões em que fui até as unidades básicas de saúde do meu bairro para atualização vacinal e consultas de rotina. Meus pais, jovens adultos assalariados, também usuários do sistema público de saúde, sempre buscaram os serviços para essas mesmas ações de promoção e prevenção de saúde. Somente agora, no final da fase adulta, eles os têm utilizado para ações mais agudas, em especial, devido às deficiências (auditiva e visual) que meu pai enfrenta. Por conta das condições socioeconômicas, nunca fizeram uso da saúde suplementar. Lembro de um episódio em que meu irmão com quatro anos de idade broncoaspirou a tampa de uma caneta e sofreu sérias complicações pulmonares, necessitando de internação e transferência para um serviço de saúde de outro município para realização de uma broncoscopia. Foi essa minha primeira vivência do funcionamento das redes de atenção à saúde e das diferenças de tecnologia em saúde. Mas foi no fim da adolescência e início da vida adulta que optei por prestar o vestibular para graduação em Enfermagem. Inicialmente, não fazia ideia do que se tratava a profissão, mas dado o contexto e viabilidade do que era possível no momento e da aprovação no vestibular, iniciei minha formação em Enfermagem, numa faculdade pública no ano de 2011. Os dois primeiros anos de formação ocorreram juntamente com o curso de Medicina. Nas atividades práticas, que aconteciam na atenção primária à saúde, íamos até uma unidade de saúde e acompanhávamos famílias em busca da compreensão do processo saúde/doença, bem como para realizar ações de promoção da saúde e prevenção de agravos. Tais ações eram embasadas na autonomia do paciente e na promoção do autocuidado. A vivência de uma formação em saúde na companhia de graduandos de Medicina foi importante, pois o eixo comum das disciplinas básicas mostrou que a estrutura desta formação deve ser a mesma a todos os profissionais dessa área, além de suscitar a importância de ações em saúde de caráter multiprofissional. Os dois últimos anos do curso de graduação em Enfermagem foram destinados para as competências exclusivas exercidas pelo Enfermeiro. Mas foi no meu último ano de graduação, na vivência prática de um estágio no pronto-socorro, que tive insights importantes sobre a 12 formação em saúde. Lembro da superlotação do serviço e de muitas macas com corpos ali deitados aguardando atendimento. Uma enfermeira veio até mim e solicitou que eu realizasse o procedimento técnico de sondagem nasoenteral em um paciente idoso que não estava se alimentando. Nesse dia o pronto-socorro estava tão cheio que não havia espaço reservado para que eu realizasse tal procedimento, a fim de garantir o conforto, segurança e sigilo cabíveis. Diante disto, ou eu faria ali mesmo ou deixaria o paciente com fome. Não pensei duas vezes e realizei o procedimento ali mesmo no corredor. Logo após, a gerente do serviço me repreendeu por não ter realizado o procedimento conforme as normativas éticas. Mas como fazê-lo diante deste cenário? Não havia sala, não havia biombo, não havia condições mínimas para a execução correta da técnica. Foi somente no último ano do curso que tive contato com os aspectos éticos teóricos da minha profissão e com nosso código de ética, bem como com o nosso conselho profissional. Ali pude me aproximar das normas deontológicas e diceológicas da profissão, em especial aquelas que definem o que seria uma imprudência, negligência e imperícia. Em outra situação, a ambulância chegou à porta do pronto-socorro com um paciente em parada cardiorrespiratória. A equipe realizou todo o atendimento possível, mas infelizmente ele morreu. Lembro do choro profundo e desespero da esposa e da comoção da enfermeira ao verbalizar que gostaria de mudar de setor, pois não estava mais conseguindo lidar com a morte e com o sofrimento todos os dias, além do espanto dos pacientes que estavam nas camas ao lado, diante desta situação. Outro episódio foi acompanhar uma intervenção cirúrgica cardíaca que exigia a tecnologia da circulação extracorpórea. Quando o sangue foi drenado para a máquina e o coração parou de bater, lembro de ter me questionado se o paciente havia morrido e onde estaria a vida naquela situação. Dizem que nunca esquecemos do primeiro paciente que perdemos. Para mim, isso é verdade. Lembro dos primeiros dias de estágio numa enfermaria, onde fiquei responsável pelos cuidados de um paciente com comprometimento hepático grave. Em dois dias, o quadro clínico piorou e ele acabou morrendo ali mesmo. Situações como estas e muitas outras são vividas todos os dias pelos profissionais da saúde. Diante da vulnerabilidade do outro e das vivências que me colocaram muito próximo dos limites entre a vida e a morte, busquei na filosofia, em especial no meu mestrado em filosofia da mente, referenciais que discutiam o dilema corpo e mente, o dualismo cartesiano e as formas de monismo. Estas aproximações teóricas foram essenciais, pois me deram a base 13 para realizar atravessamentos importantes no que diz respeito às minhas crenças religiosas. Vim de uma família espírita, em que a vida espiritual se contrapõe à vida carnal, o espírito é a essência, a carne e o corpo somente um vestuário e a morte, portanto, o fechamento de uma reencarnação. Dessa forma, romper com esse dogma e me reposicionar diante desta crença, quase como uma ética espiritualista, me direcionou para a vida como existência do que acontece agora, das decisões e sustentação do desejo do que quero, do que sou e do que faço. Isso me permitiu romper com assujeitamentos que me colocavam na posição de espectador da minha própria existência. A partir disso, pude concretizar meu desejo de ser docente, bem como me posicionar melhor na minha vida pessoal e sexual. Cheguei então, no ano de 2018, ao exercício da minha atividade docente em uma universidade privada e familiar para ministrar aulas no curso de graduação em Enfermagem. No ano seguinte, encontro a pessoa com quem decidi dividir a minha vida e em nosso casamento, no mês de dezembro, já circulavam as notícias de um vírus mortal na China. Inicialmente, dado ao momento feliz em minha vida e ao excesso de trabalho, não dei muita importância a esta notícia, até que os rumores da chegada do vírus no Brasil e possível cancelamento do carnaval começaram a mobilizar as pessoas. Em meados do mês de março de 2020 ocorreu o primeiro óbito na cidade de São Paulo ocasionado pelo vírus da Covid-19. As autoridades sanitárias do município que resido no interior de São Paulo decidiram, então, fechar os serviços não essenciais e a universidade soltou o primeiro comunicado para suspensão das aulas durante 15 dias. Inicialmente, pareceu um exagero, pois até esse momento havia casos de disseminação do vírus por aqui. Muitos, sem entender o que estava acontecendo, se atentaram aos noticiários da situação epidemiológica nos outros países. Um verdadeiro caos estava instalado. Cada vez mais óbitos, cada vez mais sobrecarregamento dos serviços de saúde, profissionais de saúde morrendo e a população ainda sem saber muito o que fazer. Próximo ao término dos 15 dias de suspensão das aulas, fui convocado pela minha então coordenadora para uma reunião remota. Estavam nesta reunião apenas os professores que, naquele momento, ministravam aula para o último semestre do curso. Sob a égide do argumento de responsabilidade social e de que os serviços de saúde precisariam de mão-de-obra, fomos convocados a retornar para as atividades práticas no hospital a fim de antecipar a formação dos enfermeiros. A empresa forneceria a máscara específica para proteção individual e acordamos que não iríamos realizar as práticas com os alunos nos setores de entrada de pacientes (pronto-socorro). 14 Com muito medo de retornar, em especial diante da possibilidade de perder a minha vida ou o meu emprego, retornei com minha atividade docente junto aos meus alunos. Deixei meu marido e nossa filha em casa, e fui para o hospital. Naquele momento, pouco ainda se sabia sobre o vírus, mas dada experiências anteriores com outros tipos de vírus, já se imaginava que sua transmissão poderia ocorrer por partículas de ar presentes no ambiente; assim, o uso de máscaras específicas e lavagem intensa das mãos são práticas essenciais quando se deseja barrar a transmissão de microrganismos. O hospital suspendeu todas as atividades eletivas, dedicando-se somente aos atendimentos de urgência e emergência. Enfermarias foram adaptadas para leitos intensivos, protocolos foram criados, a testagem tornou-se obrigatória e cada vez mais a letalidade da doença se manifestava. Diante disso, minha preocupação era me manter vivo e fornecer uma série de orientações aos meus alunos para que fizessem o mesmo. Os componentes curriculares para formação em saúde, neste momento da graduação, foram deixados de lado e todas as orientações e supervisão do estágio estavam voltadas para as medidas de segurança dos alunos. Eles foram orientados, inicialmente, a não prestarem cuidados a pacientes com suspeita ou confirmação pelo vírus da Covid-19, mas em dado momento, todos os pacientes hospitalizados apresentavam este risco. A situação só se agravava, as aulas teóricas ocorriam de forma virtual e somente as aulas práticas do último semestre ocorriam de forma presencial. O noticiário estava veemente, a cada nova onda de contágio, o número de mortes diária só aumentava. Era nítida a ambiguidade das atitudes adotadas pelas autoridades e uma grande força de disputa política sobre as medidas de contingenciamentos subjetivava a população, bem como os profissionais de saúde. Uma das medidas mais polêmicas foi o chamado lockdown, em que apenas os serviços essenciais poderiam funcionar. Assim, o hospital e as aulas práticas continuaram acontecendo, e cuidados domiciliares precisaram ser empregados. Ao sair do hospital e chegar em casa, era necessária a retirada de toda a roupa contaminada e a realização de sua lavagem separadamente das demais. Os calçados não adentravam ao domicílio. O banho e a higiene pessoal aconteciam imediatamente, sem contato com ninguém em casa ou com o mobiliário. Meu deslocamento acontecia somente para o hospital e para o supermercado. Essa rotina perdurou por todo o ano de 2020. Durante esse período, a abertura do comércio era defendida por grande parte dos empresários e me recordo que, em meados do mês de outubro, o comércio local foi reaberto. Mas no mês de dezembro, com a piora dos indicadores epidemiológicos, novas medidas restritivas foram adotadas. 15 Sempre estava muito atento com o que acontecia na capital, pois as variações da taxa de contágio, bem como da evolução do número de óbitos eram parâmetros para o que aconteceria no interior do estado. Assim, sempre que possível, entrava em contato com meus familiares que residiam na capital. Meus tios e minhas três primas estavam no epicentro do contágio. No mês de janeiro, mais ou menos no final da primeira quinzena, recebi uma ligação da minha mãe me informando de que minhas primas haviam contraído o vírus. Entrei em contato com minha tia, que me informou que uma das minhas primas apresentava alguns sintomas moderados e outros leves. Orientei minha tia a tomar as medidas de segurança e a monitorar a evolução dos sintomas. Poucos dias depois, minha tia informou que contraiu o vírus e que apresentava sintomas mais graves, como a falta de ar. Por meio de uma ligação telefônica, falei com meu tio que a acompanhava no hospital e me atualizava do quadro clínico. Acontece que não havia leito e minha tia foi orientada a retornar à sua casa e a acompanhar os sintomas. No dia seguinte, meu tio apresentou sintomas graves da doença, necessitando ser hospitalizado. Após três dias, fomos informados que seu quadro clínico se agravara, necessitando de internação em um leito de UTI. Minhas primas, sendo duas delas ainda adolescentes, encontravam-se muito preocupadas e com medo do pior. Minha tia sempre me ligava, pedindo orações e solicitando que eu explicasse o que poderia estar acontecendo com ele. Era uma situação difícil, pois além de não conter todas as informações e não ter propriedade sobre a evolução do quadro, minha tia buscava esperança na minha fala, mas a situação epidemiológica era extremamente grave. Meu tio não possuía nenhuma comorbidade, era jovem, ativo e sempre muito presente na vida das minhas primas e na minha infância., em mais um telefonema, minha tia me informou que meu tio necessitara de hemodiálise. Péssimo sinal, pois a falência dos rins significava um prognóstico muito ruim. No outro dia, a notícia do óbito. Um momento nunca vivenciado, pois não poderia haver velório, o caixão deveria estar/precisava estar fechado e agora minhas tias e primas sozinhas na grande capital; todos os demais familiares residem no interior. Minhas primas tão jovens, agora sem pai. Para mim, o momento mais triste de toda a vivência pandêmica. E quantas famílias também estavam passando por esse luto! Mas o discurso dos empresários e do governo federal para a volta da normalidade, retomada das atividades presenciais e reabertura das escolas predominava nos noticiários. Aos poucos, fomos sendo 16 convencidos de que o risco de contaminação era o “novo normal”, pois a vida precisava continuar. No segundo semestre de 2021, parte das aulas já havia retornado de forma presencial, mesmo diante da possibilidade de contágio. As notícias sobre a confecção das novas vacinas estavam acaloradas. Até que, no mês de outubro, fui convocado para uma reunião na faculdade, ali fomos informados que a vigilância epidemiológica havia recebido as primeiras doses da CoronaVac®, e o município precisava de ajuda para vacinar os grupos prioritários. Foi assim que, junto aos estudantes, nos movimentamos para início da vacinação. Logo também fui vacinado com a primeira dose e, conforme o poder público disponibilizava as vacinas, grandes mobilizações eram feitas pelo nosso curso para emprego da vacinação. Participávamos de campanhas, montávamos postos de vacinação, íamos até os serviços de saúde. O senso de coletividade foi muito importante para propagação dessas ações. Conforme a vacinação avançava, as atividades acadêmicas retornavam quase que em sua totalidade. Às vezes, nos deparávamos com pessoas que se negavam a tomar a vacina. Alguns direitos foram atrelados à vacinação, como o acesso a viagens internacionais. No âmbito local, a vacinação era obrigatória para os profissionais da saúde e docentes que atuavam no hospital. Na universidade, a vacinação não era obrigatória e as atividades presenciais estavam autorizadas. E assim, pouco a pouco, as atividades foram sendo retomadas. Algumas medidas foram caindo em desuso, mas até hoje o uso de máscaras faciais e a vacinação são obrigatórias nos serviços de saúde. Por fim, foi o medo do contágio e, possivelmente, da morte o sentimento mais presente durante esse período. Além dele, a pressão para retorno à “normalidade” e o luto coexistiam. Diante da vacinação, a esperança de controle da pandemia. Contribuir com a vacinação foi, neste momento, o ato mais ético, político, moral e civilizatório que vivenciei até então. 17 Introdução A realidade social que se impõe sobre nossa existência imprime um imaginário no qual as desigualdades sociais, o racismo e as vidas não enlutáveis constituem formas de violências que impedem a ocorrência de uma vida digna e plena. É o que George Orwell (2007, p. 106) diz: “Somos todos iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”. A pandemia da Covid-19 nada mais fez do que escancarar essa realidade. Identificado pela primeira vez em Wuhan, na China, o vírus é causador da síndrome respiratória aguda, doença infectocontagiosa, denominada Covid-19, que causou quase sete milhões de óbitos no mundo (Organização Mundial da Saúde, 2023). Diversas medidas foram tomadas pelas lideranças mundiais. Dentre elas, o isolamento social, o uso de equipamentos de proteção individual, a restrição de circulação de pessoas, o fechamento do comércio e de locais públicos e o acompanhamento da taxa de contágio. Desta forma, as principais medidas de contingenciamento da doença foram a higienização das mãos, o isolamento social e o uso de máscaras faciais, ainda de acordo com a OMS (2023). Entretanto, o consenso sobre a adoção dessas medidas não foi unânime e diferentes condutas foram tomadas pelos líderes mundiais. Nesse contexto, o embate entre diferentes forças políticas se fez presente, com consequente desencadeamento de práticas de violência contra a população e os profissionais da saúde. Silva e Ribeiro (2023), ao analisarem práticas discursivas presentes nos enunciados proferidos pela Agência Pará de Notícias, durante a pandemia da Covid-19 no estado, identificaram que os efeitos de sentido se concentraram: [...] na repartição dos corpos bons e ruins, em que a discursividade de proteção da vida normaliza as interdições do poder durante a pandemia; da criatividade governamental que coloca em funcionamento a mecânica de “fazer viver e deixar morrer” justificada por uma racionalidade, um cálculo, uma média e, por fim, a linha de força do dispositivo de segurança atuando sobre o engajamento da população, no agenciamento de condutas da própria população, cuja finalidade em si mesma é a otimização da força governamental (Idem, p. 94 e 95). Muñoz et al (2024) analisaram a comunicação em saúde do Ministério da Saúde (MS) brasileiro e sua correspondência com as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os autores concluíram que, no primeiro ano da pandemia, o objetivo político de poder parece ter sido, em determinados momentos, a produção de cidadãos disciplinados e submissos, em 18 nome da preservação da vida e da prevenção da morte. Vale salientar que, durante esse período, o MS ainda era comandado pelo Ministro Luiz Henrique Mandetta, comprometido no combate à disseminação do vírus. Lara e Cruz (2023) procuram compreender os diferentes modos de gestão da vida e da morte pelo governo Bolsonaro, por meio da governamentalidade algorítmica, uso das redes sociais e das fake news. As autoras concluíram que: A gestão do governo Bolsonaro da pandemia da Covid-19, à revelia das análises que se centravam em intervenções biopolíticas para o controle do coronavírus, fez avançar no cenário nacional uma gestão centrada na manipulação dos discursos que circulam entre os apoiadores do governo e são gestadas pelo regime digital de exceção. Trata- se da centralização das práticas do governo em fazer valer “verdades” não baseadas na ciência e na estatística, mas como efeito da manipulação e criação discursiva nas redes sociais (Lara, Cruz, 2023, p. 37). Montenegro (2023) mapeou os elementos que compuseram a rede sociotécnica do tratamento precoce – uso de medicamentos sem eficácia. O autor argumenta que o tratamento precoce, prática denominada por ele de necrofarmacológica, se operacionalizou em grande medida pela captura política da incerteza, mas também trabalhou para se estabilizar como enquadramento alternativo às medidas não farmacológicas de prevenção da Covid-19. Santos (2023) avalia que as medidas de isolamento social e do lockdown, adotadas para controle da disseminação do vírus da Covid-19, constituíram uma radicalização da biopolítica numa forma de estado de exceção. A partir disso, os discursos proferidos pelo então presidente Jair Bolsonaro performaram uma tática de governamentalidade pautadas em fake news que viabilizariam um projeto biopolítico próprio, apoiado numa tese de sobrevivência dos mais fortes. Tal argumento remete ao darwinismo aplicado à vida social, em que a imunidade do rebanho é que vai definir quem sobreviverá e ao ideário neoliberal de concorrência e competição entre os indivíduos, pois, no neoliberalismo econômico, cada pessoa é transformada em empresária de si mesmo, a partir da ideia de que a concorrência está baseada na premissa de que os mais hábeis e mais competentes naturalmente vencerão. Assim, as discussões no campo da filosofia política realizadas por Butler (2021) ajudam a compreender que as medidas adotadas durante a pandemia da Covid-19 foram formas de violência sobre a população e os profissionais da saúde. A autora argumenta que atos de violência são construções sociopolíticas exercidas num quadro de referência influenciado por relações de poder, no qual o Estado é detentor do monopólio da violência legítima. Assim, a 19 violência constitui-se como uma ameaça à interdependência social que, diante da pandemia da Covid-19, expressou-se na ambiguidade do isolamento social, na disseminação de notícias falsas, no uso de medicações sem eficácia comprovada e no uso da autocracia profissional para decisões clínicas diante da escassez de recursos. Para a autora, práticas de violência e de não violência não podem ser reduzidas às decisões de quem detém o poder, pois é no campo do saber do direito que essas práticas são justificadas como formas de violência. Assim, a violência é sempre interpretada (Butler, 2021). Desta forma, parte-se da premissa de que as medidas adotas pelo governo brasileiro contrárias à disseminação do vírus durante a pandemia da Covid-19, tais quais o uso de medicamentos sem eficácia comprovada, o não incentivo ao uso de máscaras e o isolamento social, configuraram práticas de violência contra a população e contra os profissionais da saúde. A partir do conceito de “dispositivo” em Foucault (2021), é argumentado que as diferentes interpretações de alguns dispositivos utilizados para gestão da pandemia da Covid- 19 redundaram em violências, inclusive aquelas empregadas no âmbito da saúde, em que as vidas precárias e não enlutáveis se viram expostas e submetidas à exclusão aos cuidados médicos e à proteção da vida. Por esse termo [dispositivo] tento demarcar, em primeiro lugar, um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre esses elementos (Foucault, 2021, p. 364). Por se tratar de uma rede de elementos que se relacionam e constituem uma prática, o conceito de dispositivo se faz pertinente como recurso interpretativo para as diferentes práticas e manejos adotados pelo Estado brasileiro durante a pandemia da Covid-19, pois diante do potencial de disseminação do vírus, a sua governamentalidade passou a ser o centro dos debates políticos, econômicos, éticos e morais. Para Foucault (1999), as diferentes tecnologias de poder usadas pelo Estado, por um lado, promovem o cuidado com a população e, por outro, produzem subjetividades que colocam em movimentos diferentes os domínios do saber e do poder. Tomamos como exemplo o conceito de saúde proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1946, sendo ela um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade. Assim, se constitui um regime de verdade que é instaurado a partir dos dispositivos de saberes. Por um lado, produzem um esquema 20 referencial e normalizador de saúde, que permite práticas e cuidados e, portanto, age como um dispositivo de controle e de poder sobre os corpos e. Por outro lado, sujeições que atravessam o campo do saber e poder com consequente ocorrência de relações que atravessam as condições de vida e de saúde da pessoa, família e comunidade. Assim, a biopolítica tem por característica o exercício do poder diretamente sobre a população como um problema político, científico e biológico. Tem por objeto fenômenos coletivos, aleatórios e imprevisíveis que ocorrem numa população em determinado período, além de contar com mecanismos estatísticos, previsões e medições globais (Foucault, 1999). Desta forma, a governamentalidade é entendida como o exercício do cálculo das forças, relações, riquezas e fatores de poder intrínsecos ao Estado, numa forma de racionalidade que considera a estatização do biológico, com consequente poder de fazer viver e de deixar morrer (Foucault, 2008b). É o que Foucault (2008b) denominou de biorregulamentação do Estado – mecanismos reguladores da ordem da população e dos processos biológicos – em que o fazer viver é expresso como arte de governar. Butler (2021), por sua vez, analisa a causalidade entre poder, vida e morte: Os dias de morte que se abate sobre vida não acabaram, mesmo que às vezes Foucault escreva como se tivessem acabado, a fim de ressaltar outro tipo de poder. Para ele, poder e violência são agora mais indiretos, menos espetaculares, menos orquestrados pela violência do Estado. Mas não é fácil separar o poder soberano do biopolítico – como ele mesmo apontaria em aulas subsequentes -, e deveríamos considerar suspeito qualquer esforço para estabelecer uma sequência histórica ordenada em que um claramente se segue ao outro (Butler, 2021, p. 94). Assim, no contexto das endemias e epidemias, como doenças que afetam a população e produzem subtração das forças, diminuição do tempo de trabalho, baixa de energias e aumento dos custos econômicos, o exercício do biopoder culmina num conflito entre o Estado e aqueles que exercem sua liberdade individual, de forma que, no contexto pandêmico, a desvalorização da vida e a tomada de decisão sobre aqueles que podem morrer, culminaram em dilemas bioéticos complexos que reverberam nas práticas discursivas proferidas pelo Estado, pela mídia e pela sociedade. Mansano, Carvalho, Carvalhaes (2021) argumentam que a biopolítica que incidiu diretamente sobre os brasileiros durante a pandemia da Covid-19 foi pautada numa dualidade: por um lado, o saber econômico prezava pela continuidade das atividades laborais e, por outro, 21 a proteção incondicional da vida pautou-se nos saberes sanitários que priorizavam o isolamento social. Neste ínterim: [...] a governamentalidade continua fiel às suas origens neoliberais que prezam por um estado mínimo, cujas intervenções devem ser realizadas respeitando os interesses de agentes sociais como, por exemplo, os empresários. [...] O Estado se mostrou enfraquecido para realizar especificamente a tarefa de criar dispositivos estratégicos para proteger a vida da população, em especial no que se refere à saúde em contexto de crise sanitária. [...] O que vimos nos dados apresentados e analisados foram ações isoladas, pouco planejadas e nada articuladas, tanto entre os níveis governamentais, quanto na relação do governo com a sociedade civil organizada e a população. Os desgastes decorrentes dessa irracionalidade governamental geraram dúvidas, confrontos desnecessários, medo, desconfiança e, o mais grave de tudo, uma tendência negacionista quanto à gravidade da doença (Mansano, Carvalho, Carvalhaes, 2021, p. 317). Para Neves e Gomes (2021), a biopolítica exercida durante a pandemia da Covid-19 é resultado de uma construção social e histórica de marginalização e desumanização dos corpos, que exclui parte da população ao selecionar os corpos que serão levados à morte. Assim, a articulação dos interesses políticos e econômicos com o negacionismo mobilizado pelo governo em exercício “reforçou o fazer morrer como uma sistematização do seu domínio” (Idem, 2021, p. 56). Willrich et al (2022) analisaram as implicações psicossociais decorrentes da pandemia da Covid-19 e concluíram que, diante da instabilidade e incertezas sobre a doença, o medo da contaminação e da morte, a angústia, o desânimo e a tristeza foram modos de sujeição e subjetivação presentes durante esse período. No que diz respeito aos profissionais da enfermagem, um dos grupos mais afetados pela pandemia, por meio do projeto de atendimento de enfermagem em saúde mental realizado pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), apresentaram, nos primeiros meses da pandemia, os sentimentos de ansiedade, medo, ambivalência, depressão e exaustão (Humerez, Ohl, Silva, 2020). No que tange aos profissionais da saúde, além dos sentimentos vivenciados a cada dia, configurava-se um cenário de escassez de recursos, em especial dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), além do aumento do número de afastamentos do trabalho e de profissionais em adoecimento, jornadas prolongadas e sobrecarga de trabalho. Todos esses fatores contribuem para o aumento das chances de infecção destes profissionais, uma vez que o 22 impedimento do uso das melhores capacidades das equipes e serviços ficaram restritas; sem contar com o distanciamento que muitos deles executaram de seus familiares e da rede de apoio que dispunham no cotidiano (Almeida, 2020). Almeida (2020) resgata princípios éticos que foram descritos após a pandemia de H1N1 em 2009: Trata-se de esquemas de planejamento baseados em princípios éticos, regras legais, papel de fornecedores e engajamento da comunidade, pavimentando o caminho para decisões que permitam equidade e justiça na entrega de serviços médicos para aqueles que necessitam em situações de escassez de recursos. Os comitês de resposta à pandemia devem se guiar por critérios como justiça, dever de cuidar, dever de administrar recursos, de transparência, proporcionalidade e responsabilidade de modo a não desfavorecer os mais vulneráveis e a minimizar as chances de situações-limite. De modo similar são apontados três deveres éticos na provisão de cuidados de saúde em tempos de COVID-19: o dever de planejar, gerenciando incertezas; o dever de proteger, oferecendo suporte a trabalhadores e a populações vulneráveis; e o dever de orientar níveis de cuidados e padrões de cuidados em situações de crise (Almeida, 2020, p. 3). Assim, princípios éticos precisam ser seguidos para alocação de recursos durante uma crise de proporções pandêmicas como a Covid-19. Satomi et al (2020) argumentam, ainda, que a alocação justa requer uma estrutura ética: [...] que norteie as relações individuais, como respeito irrestrito à autonomia, cuidados centrados em valores, preferências e necessidades individuais, e valores éticos de necessidades de grupos, que permitam promover a saúde da maior parte da população, por meio do uso prudente de recursos escassos, de forma a minimizar a morbidade e a mortalidade (Satomi et al, 2020, p. 2). Além disso, o respeito à dignidade humana precisa ser empregado em práticas que garantam: O direito à triagem, com critérios objetivos justos e transparentes, além de acesso a informações adequadas sobre seu estado de saúde, as condições do sistema de atendimento e dos próprios critérios estabelecidos. Devem também receber todo suporte necessário para seu quadro dentro do grupo para o qual foi triado (Satomi et al, 2020, p. 2). 23 Assim, os valores fundamentais a serem considerados na construção de protocolos em momentos de crise são: (1) justiça na distribuição dos recursos; (2) maximização dos benefícios globais na alocação e na utilização de recursos; (3) o valor instrumental dos profissionais da saúde; (4) não prioridade por doença e; (5) oferta de cuidados paliativos adequados (Satomi et al, 2020). Lima et al (2022) afirmam que os profissionais da saúde vivenciaram dilemas bioéticos durante a pandemia da Covid-19 no que diz respeito ao dever de assistir o paciente e a garantia da segurança pessoal, lidando com o desafio de agir com ética em meio à sobrecarga e à insegurança do contexto. Cruz et al (2021) afirmam que dois dilemas bioéticos emergiram durante a pandemia da Covid-19: o papel da ciência, da pesquisa científica e das tecnologias para confecção de diretrizes e protocolos e na administração de recursos econômicos e humanos. Para os autores, a credibilidade e validade das pesquisas científicas durante o período pandêmico, aliada à ampla divulgação das fake news, “contribuiu para gerar a desconfiança nas instituições que produzem e executam diretrizes científicas, dificultando o consenso e a adesão aos protocolos de combate à pandemia” (Idem, 2021, p. 2). No que tange a administração de recursos econômicos e humanos, os conflitos bioéticos centraram-se: a) na gestão da estrutura física e financeira das instituições do Estado e de suas relações com entes privados e; b) nos procedimentos nacionais e locais de disseminação de medidas de contenção do avanço da pandemia e de atenção à população. [...] Os resultados desses conflitos éticos geraram a falta de infraestrutura de atendimento público e privado e de leitos hospitalares, o racionamento de equipamentos e medicamentos para tratamento de infectados, a carência de testes para detectar o agente patógeno, a insuficiência de recursos para produzir ou adquirir vacinas (Cruz et al, 2021, p. 2). Os autores concluem, assim, que o conflito entre o interesse pessoal e o interesse coletivo, bem como os processos de decisão, devem ser vinculados aos princípios da bioética (Cruz et al, 2021). A bioética principialista, diante da pandemia da Covid-19, enquanto campo de saber, foi sobreposta pela bioética utilitarista. O método utilitarista defende que as decisões clínicas devem proporcionar o maior bem-estar para o maior número possível de pessoas, independentemente de sua vulnerabilidade; assim, há um rompimento com o princípio da 24 equidade, pois não se trata apenas de disponibilizar recursos e tecnologia, mas, também, de usá- los naqueles que mais precisam, isto é, priorizá-los aos mais vulneráveis. Dessa forma, o utilitarismo é importante no que diz respeito à distribuição universal de recursos, porém, no que se refere ao emprego deles, a principiologia é o campo a ser considerado para aplicabilidade equânime desses (Dadalto, Santos, 2020). Nessa mesma premissa, Uchôa e Uchôa (2020) analisaram, do ponto de vista do ordenamento jurídico, os instrumentos previstos na Lei n. 13.979/2020, em especial da quarentena e do isolamento, bem como da Portaria Interministerial n. 5, de 17 de março de 2020, editada pelos Ministérios da Justiça e Segurança Pública e da Saúde, e a Portaria n. 356 do Ministério da Saúde. Os autores concluíram que: Ao estabelecer que a saúde é direito fundamental de todos e dever do Estado, que será garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, o artigo 196 da Constituição da República é a base constitucional em que a Lei n. 13.979/2020 foi promulgada. O equilíbrio entre o direito individual e o direito à saúde pública na implementação da quarentena e do isolamento requer que os agentes envolvidos tornem público o racional científico por trás das medidas, a sua eficiência e a sua necessidade diante da pandemia, bem como que submetam esses requisitos ao escrutínio da sociedade (Uchôa, Uchôa, 2020, p. 454). Assim, as questões bioéticas presentes durante a pandemia da Covid-19 concentram-se em: (1) ações de planejamento, proteção e orientação, que devem ser pautadas nas necessidades individuais e coletivas; (2) profissionais da saúde que sofreram com sentimentos incapacitantes, bem como com a falta de recursos materiais e humanos; (3) prestação de cuidados em saúde que depende, necessariamente, do cuidado para com o profissional da saúde; (4) uso de protocolos importantes diante de situações de extrema vulnerabilidade como a pandemia da Covid-19 e; (5) o papel da ciência não apenas se circunscreve à busca por evidências, mas, também, na comunicação com a população. Estes aspectos estiveram presentes durante toda a pandemia da Covid-19. No entanto, as decisões do governo Bolsonaro foram tomadas em prol do negacionismo. O uso de práticas discursivas baseadas na mentira – fake news – bem como o uso da governamentalidade em prol dos interesses do capital a partir da premissa da sobrevivência dos mais fortes, e também a insistência no uso de medicamentos sem eficácia comprovada, culminaram em dilemas bioéticos importantes no que diz respeito à prática dos profissionais da saúde. 25 As discussões bioéticas emanam das contradições existentes entre o desenvolvimento técnico e científico, dos desrespeitos presentes na relação profissional da saúde-paciente e da vulnerabilidade de alguns grupos da população na era do Antropoceno. Além disso, visam evitar abusos dos detentores de poder, bem como para conciliar tecnologia e responsabilidade. Desta forma, essas discussões buscam promover debates relacionados às questões morais, sociais, jurídicas e antropológicas de ampla visibilidade, envolvendo a saúde pública, as doenças infecciosas e crônicas, a saúde ambiental, a biotecnologia, o aborto, os cuidados paliativos e, nesta discussão, a pandemia da Covid-19, dentre outros campos de debate (Carvalho, Gustin, 2020; Dadalto, Sarsur, 2020). Nesse sentido, a bioética enquanto campo de saber, diante do contexto de exacerbação do biopoder, possui papel importante ao direcionar, por meio de práticas discursivas, orientações aos profissionais da saúde. Entretanto, as medidas adotadas pelo governo Bolsonaro contrárias à disseminação do vírus, intensificaram ainda mais a atuação clínica dos profissionais da saúde, de forma a fazer com que eles tomassem decisões limítrofes no que diz respeito ao exercício profissional. Decidir a quem deve ser disponibilizado o recurso, julgar a chance ou expectativa de vida das pessoas e, a partir delas, tomar decisão em disponibilizar ou não procedimentos invasivos; prescrever e administrar medicamentos sem eficácia comprovada e favorecer ou opor-se à disseminação de notícias falsas configuram um campo ético no qual os profissionais de saúde tiveram que lidar durante a pandemia da Covid-19. Assim, a hipótese inicial é de que os dilemas bioéticos vivenciados pelos profissionais da saúde durante a pandemia da Covid-19 são formas de violência que subjetivaram o próprio exercício profissional. Sendo assim, o objetivo geral desta pesquisa é pensar em uma ética da não violência na formação em saúde a partir dos desafios postos aos profissionais da saúde pela pandemia. Para isso, na primeira seção, são resgatados os aspectos históricos das epidemias a partir das obras ‘História da Epidemias’ de Stefan Cunha Ujvari (2022) e ‘A Bailarina da Morte’ de Lilia Mortiz Schwarcz e Heloisa Murgel Starling (2020), para relacionar as intersecções com os dispositivos de segurança descritos por Foucault (2008a). Compreende-se aqui como dispositivos de segurança, decisões políticas que afetam as populações diante das doenças infectocontagiosas, tais como o acompanhamento da taxa de contágio, vacinação, taxa de mortalidade, probabilidade de adoecimento e óbitos, periculosidade da doença, entre outras. Assim, diante desse contexto, muitas medidas que foram adotadas durante a pandemia da Covid-19 não possuem caráter de novidade ou exclusividade, e muitas delas também foram 26 acompanhadas de ambiguidades e incertezas, culminando em diferentes desfechos. Portanto, se trata de um resgate histórico para refletir sobre a aplicabilidade dos dispositivos de segurança durante uma epidemia. Na segunda seção, a partir do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) realizado pelo Senado Federal e pelas notícias veiculadas pela mídia durante a pandemia da Covid-19, são discutidos como a disseminação de fake news e o isolamento social foram utilizados como dispositivos de subjetivação durante a pandemia da Covid-19 pelo governo federal. Para isso, são apresentadas as principais notícias falsas que foram disseminadas e as ambiguidades presentes na adoção do isolamento social, a fim de demonstrar que a subjetivação diante destas medidas fora cooptada por diferentes interesses. Assim, as contribuições de Espósito (2017) sobre o senso imunitário e comunitário são pertinentes e ajudam na discussão sobre os aspectos individuais e coletivos presentes para adoção destas medidas. Portanto, se trata de uma reflexão teórica que busca, a partir de Espósito (2017), identificar a aplicabilidade dos conceitos elaborados pelo autor para descrever as subjetividades e ambiguidades presentes na disseminação de notícias falsas e no isolamento social. Na terceira seção, é argumentado que os interesses do governo federal, ao adotar medidas contrárias à preservação das vidas, configuram-se como práticas de violência que incidiram sobre a população e sobre os profissionais da saúde. Assim, são nomeadas como tentativas de normalização da morte das vidas não enlutáveis, as estratégias de exposição das populações mais vulneráveis, cujo fim almejava a correspondência dos interesses neoliberais e neofascistas do governo Bolsonaro. Para isso, são resgatadas as discussões realizadas por Foucault (2008b), Chamayou (2020) e Lazaratto (2019) no que diz respeito ao neoliberalismo, o neofascismo e ao racismo de Estado, para então, a partir de Butler (2021), caracterizar as medidas adotadas pelo governo federal como práticas de violência. Portanto, se trata de uma reflexão teórica que buscou relacionar a gestão da pandemia às práticas violentas realizadas pelo Estado com consequente tentativa de normalização da morte das vidas não enlutáveis. Na quarta seção, é apresentado como a medicina e a saúde, a partir da ciência positivista e do conceito de normalização biológica, foram capturadas pelos diferentes interesses e discursos políticos, para então caracterizar que os dispositivos de segurança, durante a gestão da pandemia pelo governo Bolsonaro, tornaram-se dispositivos de insegurança que incidiram sobre a população e sobre os profissionais da saúde. Para isso, são resgatados os aspectos históricos de como a medicina foi utilizada como dispositivo biopolítico, reverberando o conceito de normalização em saúde, para descrever que a subjetividade presente na atual 27 conjuntura médica foi cerceada pelos interesses políticos, em que a autonomia foi campo de poder utilizada sobre a vida e a morte da população. Portanto, se trata de uma reflexão teórica que buscou evidenciar práticas em saúde que foram subjetivadas durante a pandemia da Covid- 19 e culminaram em dilemas bioéticos aos profissionais da saúde. Na quinta seção, é realizada uma revisão sobre os dilemas bioéticos vivenciados pelos profissionais da saúde durante a pandemia da Covid-19 e categorizadas em três aspectos: (1) Aderir ao isolamento ou ir para a linha de frente? (2) Atualizar-se frente às evidências científicas ou prescrever e/ou administrar medicamentos sem eficácia comprovada? (3) Aderir a protocolos de priorização de atendimentos ou garantir o direito à saúde a todos? Trata-se de uma revisão, a partir das principais publicações realizadas durante a pandemia, dos periódicos específicos sobre a bioética e a ética na saúde, os quais visaram descrever como essas medidas incidiram sobre os profissionais de saúde, que também foram violentados durante a pandemia. Na sexta seção, é apresentada uma reflexão teórica sobre práticas de não violência a partir da formação dos profissionais da saúde. Para isso, são utilizadas as discussões de Butler (2021) em sua obra ‘A força da não violência’, buscando descrever caminhos possíveis para uma formação ética em saúde capaz de refutar práticas de violência. Assim, são revisadas as principais publicações na área da saúde sobre a formação ética em saúde para, então, encontrar intersecções possíveis para aplicabilidade de uma ética da solidariedade dentro das práticas em saúde. 149 Considerações finais O objetivo desta pesquisa foi pensar em uma formação ética da não violência em saúde a partir dos desafios postos aos profissionais da área durante a pandemia da Covid-19. Para isso, a partir do conceito de “dispositivo”, nas seções iniciais, foi argumentado que os profissionais da saúde foram subjetivados frente aos diferentes interesses políticos, com consequente ocorrência de práticas de violência contra eles e a população. Para sustentar essa constatação, a filosofia política de Butler (2021), no que se refere à violência e não violência, contribuiu para caracterizar que o uso dos saberes e práticas em saúde, da forma como foram empregados durante a pandemia da Covid-19, foram construções sociopolíticas exercidas em um quadro de referência influenciado por relações de poder, sendo o Estado o agente executivo legítimo destas ações, subjetivando, assim, o próprio exercício profissional em saúde, com consequente diversidade de práticas entre negacionistas e aqueles que fizeram defesa da ciência e da vida. Dessa forma, as violências presentes durante a pandemia da Covid-19 configuraram um ataque à vida, bem como aos laços sociais, de forma a fomentar a cultura do individualismo e negar o que Butler (2021) denominou de “interdependência social”. No que diz respeito às práticas dos profissionais da saúde, eles foram confrontados e obrigados a tomar decisões a partir dos limites éticos, diante do desmonte do SUS, das incoerências administrativas, da indisponibilidade de recursos, do uso de protocolos controversos, da ausência de evidências científicas e do negacionismo, com consequente prática da autocracia como campo do exercício de poder sobre a vida e a morte das vidas enlutáveis e das não enlutáveis. Assim, diante das vulnerabilidades, das injustiças e das desigualdades sociais, os profissionais da saúde exerceram seu papel social, ético e político de proteção da vida. A autonomia requer capacidade por parte dos profissionais, e autorização por parte dos conselhos. Na autocracia, o poder reside em si mesmo; dessa forma, os profissionais da saúde, a partir de seus saberes e valores, foram subjetivados, com consequente ocorrência de dilemas bioéticos vividos durante a pandemia da Covid-19, diante dos quais encontraram-se despreparados e vulnerabilizados, dada a impossibilidade de proteção da vida. A pandemia da Covid-19 foi uma situação de guerra e de extrapolação de todas as estruturas e recursos médico-hospitalares. Assim, diante do que foi possível, protocolos de gerenciamento de recursos, bem como priorização de atendimentos, precisaram ser elaborados e seguidos pelos profissionais da saúde. Dada a escassez de recursos e em razão dos protocolos, o processo de atendimento foi seletivo, com consequente exposição da população mais pobre e 150 vulnerável. Portanto, aos profissionais que atuaram na linha de frente do combate ao coronavírus, não restava muita opção a não ser seguir os protocolos e as orientações realizadas pelos gestores e pelo Estado. Dessa forma, a falta de recursos escapa a qualquer ingerência dos profissionais de saúde, sendo esta situação não apenas ética, mas também política. É diante desse contexto que a filosofia política de Butler (2021) se faz pertinente, de forma a contribuir para a fundamentação de práticas não violentas. No âmbito da saúde e diante da ocorrência da pandemia da Covid-19, o que houve foi o exercício da autocracia para a tomada de decisões clínicas, atribuindo aos profissionais da saúde a responsabilização pela vida e pela morte das pessoas acometidas pela doença. Assim, tanto os profissionais da saúde quanto a população foram violentados quando o Estado, mais especificamente o governo federal, orientou práticas contrárias à vida e ausentou-se de sua responsabilidade política. Assim, atribuir aos profissionais da saúde a responsabilidade pelas tomadas de decisões, a partir do uso da autocracia como dispositivo de poder sobre a população, configurou-se como uma crueldade, ainda mais diante do sucateamento da formação ética que eles têm vivido ao longo dos últimos anos. Entretanto, esses profissionais se depararam com limites do exercício profissional, pois, se de um lado as orientações eram para a execução de práticas controversas, do outro, os códigos de ética eram claros quanto ao emprego de medidas sem comprovação científica e ao uso da medicina e da saúde para fins políticos contrários à vida. O Código de Ética Médica (2018) alerta os profissionais que o uso da medicina, quando alinhado a finalidades políticas, ideológicas e religiosas, caracteriza infração ética, com descumprimento da legislação referente à saúde e rompimento do paradigma científico, uma vez que essas práticas podem possibilitar o extermínio da população. Dito isso, o código de ética médica respeita o contexto histórico da medicina, quando, em outros momentos, foi utilizada para fins eugênicos com interferências políticas e/ou religiosas. Entretanto, diante do contexto da pandemia da Covid-19, grupos de médicos, inclusive dentro do próprio CFM, agiram em prol de fins políticos quando defenderam e propagaram o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19. Assim, diante deste cenário, os profissionais da saúde foram subjetivados, cabendo-lhes tomar decisões limítrofes. Portanto, deixar suas casas e atuar na linha de frente contra a Covid- 19, questionar e opor-se às medidas sem comprovação científica e aderir a protocolos de priorização de atendimentos foram medidas possíveis dentro do escopo ético em saúde. Neste ínterim, é preciso pensar na formação ética da não violência em saúde, a fim de ampliar e fortalecer práticas em saúde que não coadunam com interesses contrários à vida. Desse modo, 151 o exercício da não violência consiste numa prática crítica frente ao reconhecimento da “interdependência social” como campo coletivo de resistência motivada pelo reconhecimento da injustiça social. Logo, uma formação ética em saúde precisa partir desse reconhecimento como base de sustentação para práticas que visam contrapor-se a todas as tentativas de normalização da morte. Para isso, é preciso, de acordo com Butler (2021), opor-se à destrutividade, à guerra e à intolerância. Dessa forma, uma formação ética para a não violência em saúde consiste em possibilitar campos de prática nos quais o exercício de competência e habilidades humanas, de caráter multidisciplinar, voltados para o exercício da responsabilidade social e que fortaleça o senso de comunidade, solidariedade e cooperatividade sejam fomentadas. Além disso, o reconhecimento da vulnerabilidade como política para transformação das estruturas de poder faz parte de um novo imaginário ético e político, capaz de ressignificar a destrutividade presente nos atuais interesses políticos. Dessa forma, um abandono da perspectiva individualista, reconhecimento do caráter ambivalente e das resistências presentes nas relações e vínculos sociais constituem uma prática de “igualdade radical”, defendida por Butler (2021), para construção de novas e reforçadas solidariedades. Portanto, é necessário imaginar a transformação das estruturas de poder, pois elas perpassam por processos de subjetivação produzidos no nível do inconsciente. A ascensão da extrema direita só tem fortalecido as práticas de violência e, apesar de haver resistências a elas, ainda é preciso que estas práticas de subjetivação passem pelo crivo do embate político. Assim, “a não violência se torna uma obrigação ética à qual estamos ligados precisamente porque estamos ligados uns aos outros” (Butler, 2021, p. 119). Atualmente, na formação em saúde, há uma redução ontológica e metodológica no campo da ética; ela acontece apenas no campo da deontologia, ou seja, no campo do juízo, do certo e do errado, do bom e do mal, do que pode ou não ser feito. Portanto, trata-se de uma ética que não está embasada na prática da liberdade e da autonomia, e sim como um cumprimento normativo do dever. Assim, atravessamentos precisam ocorrer dentro do campo da formação ética em saúde, em especial na aplicabilidade dos conceitos de normalização, medicalização e população em saúde, uma vez que esse quadro referencial possibilitaria a construção de outros processos e modos de subjetivação que tenham como referência a solidariedade e perspectiva da coletividade. 152 Dessa forma, a filosofia política da não violência de Butler (2021) contribui com a formação ética dos profissionais da saúde quando tece as bases filosóficas da não violência a partir da qual os convoca a, primeiramente, reconhecer essas práticas (disseminação de notícias falsas, uso de medicamentos sem eficácia, oposição a medidas de contingenciamento do vírus, silêncio diante do desmonte das políticas de seguridade social e de saúde, uso de protocolos clínicos controversos) como formas de violência, para então redirecionar o efeito destrutivo inerente à psique e aos vínculos sociais contra a própria destrutividade. Assim, uma formação ética da não violência em saúde deve voltar-se ao que Butler (2021) denominou de “pacifismo militante”, ou seja, redirecionar os vetores da violência contra a própria violência e não mais em direção ao “eu” e ao “outro”. Por fim, a formação dos profissionais da saúde precisa transcender os aspectos técnicos e biológicos para uma formação que também seja social e humana. Para isso, é preciso ir além da atual formação bioética em saúde que, diante das implicações causadas pela pandemia da Covid-19, evidenciou a necessidade da busca por mais caminhos para o exercício de práticas solidárias que defendam a vida de todos que e se oponham às tentativas de normalização da morte, vigentes dentro do campo de referência político. Pois se a moral é um sistema de julgamento, à medida que a ética desarticula o passo do julgamento, é preciso abandonar o critério de julgamento e optar por uma nova tipologia, um novo imaginário, no qual não haja diferença qualitativa dos modos de existência. Assim, esta pesquisa buscou evidenciar aos próprios profissionais da saúde que o exercício de suas atividades são campo de disputa e de poder para diferentes finalidades e, portanto, convocando-os a práticas em saúde baseadas na não violência, contribuindo, assim, para um novo imaginário ético-político em saúde. Imaginário este que consiste numa prática não excludente, onde haja uma interdependência entre os papéis sociais, o fortalecimento da justiça social e da cidadania; uma prática antirracista, onde não ocorra a normalização da morte. Ademais, é preciso fomentar uma ética da existência solidária e não da doutrina do julgamento; sair de uma autocracia, de um poder centrado em si próprio, para um poder que parte de si, mas como cuidado do outro. 153 REFERÊNCIAS ABBAS, A.K.; LICHTMAM, H.H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e molecular. 9.ed. Rio de Janeiro: GEN, 2022. AGOSTINI, R. et al. “Novo normal”, velhos problemas: ciências sociais e humanas na formação médica em tempos de pandemia. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 47, n. 1, 2023. ALBERT, B. Yanomami: os mortos “desaparecidos” da pandemia. In: PELBART, P.P; FERNANDES, R. M. (Org). Pandemia Crítica outono 2020. São Paulo: edições SESC; n-1 edições, 2021. ALBUQUERQUE JÚNIOR, D. M. A palavra como luto e como luta. In: PELBART, P.P; FERNANDES, R. M. (Org). Pandemia Crítica outono 2020. São Paulo: edições SESC; n-1 edições, 2021. ALMEIDA, I.M. Proteção da saúde dos trabalhadores da saúde em tempos de COVID-19 e respostas à pandemia. Rev. Bras. 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