UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Filosofia e Ciências – Campus Marília NATÁLIE IANI GOLDONI ORIENTAÇÃO PARA FAMILIARES DE ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL USUÁRIOS DE SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA Marília 2014 Goldoni, Natalie Iani. G621o Orientação para familiares de alunos com paralisia cerebral usuários de sistemas de comunicação suplementar e alternativa / Natalie Iani Goldoni. – Marília, 2013. 119f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências, 2013. Bibliografia: f. 107-116 Orientador: Débora Deliberato. 1. Educação especial. 2. Família. 3. Paralisia cerebral. 4. Comunicação. I. Autor. II. Título. CDD 371.9 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Filosofia e Ciências – Campus Marília NATÁLIE IANI GOLDONI ORIENTAÇÃO PARA FAMILIARES DE ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL USUÁRIOS DE SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - UNESP - Campus Marília, como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Educação. Área de concentração: Ensino na Educação Brasileira. Linha de pesquisa: Educação Especial. Orientador: Profa Dra Débora Deliberato Marília 2014 NATÁLIE IANI GOLDONI ORIENTAÇÃO PARA FAMILIARES DE ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL USUÁRIOS DE SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - UNESP - Campus Marília, como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Educação. Área de concentração: Ensino na Educação Brasileira. Linha de pesquisa: Educação Especial. Orientador: Profa Dra Débora Deliberato Data da Aprovação BANCA EXAMINADORA: Presidente e Orientador: ______________________________________________________________ Profª. Drª. Débora Deliberato. Docente do Departamento de Educação Especial Faculdade de Filosofia e Ciências – FFC – da Universidade Estadual Paulista – UNESP, Campus de Marília –SP. Membro Titular:______________________________________________________________ Profª. Drª. Dionísia Aparecida Cusin Lamônica. Docente do Departamento de Fonoaudiologia, Faculdade de Odontologia de Bauru – FOB – da Universidade de São Paulo– USP – Campus de Bauru – SP. Membro Titular:______________________________________________________________ Prof. Dr. Sadao Omote. Docente do Departamento de Educação Especial, Faculdade de Filosofia e Ciências – FFC – da Universidade Estadual Paulista – UNESP, Campus de Marília – SP. Com carinho e saudosismo aos meus familiares especiais que alçaram aos céus nesse processo de tanto conhecimento e que só acrescentaram amor e ensinamentos em minha vida. “Eu já estou com o pé nessa estrada qualquer dia a gente se vê Sei que nada será como antes, amanhã [...].” AGRADECIMENTOS Àqueles que apoiaram e colaboraram para a concretização deste trabalho, e que de alguma forma me completaram, meus sinceros e cordiais agradecimentos: Deus, meu pai amado, muito obrigado, primeiramente a você. A fé que me movimenta e não falha vem da certeza de que sua imensidão me acompanha a todo instante. Meu pai Angelo, minha mãe Vera e minha irmã Camila que nunca me abandonaram e desde sempre estiveram ao meu lado me proporcionando alegrias, amor, incentivos, momentos de reflexão, afastando minhas angustias, aumentando e fortalecendo meus sonhos... Meus grandes amores da vida, sou grata pela existência de cada um de vocês, como eu os amo. Ao meu noivo, um amor de contos de fada, meu companheiro Rafael, por ter me incentivado, acreditado e dado forças para o encerramento desse trabalho, por sua paciência e compreensão nos momentos de maior dificuldade, por seu carinho e cuidado quando mais precisei. Por possibilitar a descoberta do que é preciso para viver um grande amor. Aos meus familiares que dedicaram tanto amor e cuidado nesse processo, Tia Mirtes e Tia Dô pelos bolos de cenoura, ombros, mãos, braços e tantos abraços. Tia Cida por sua hospitalidade e generosidade que sempre me recebeu nas idas a Araraquara para matar a saudade de uma infância tão feliz. Tio Lei, Tia Magali por tanto carinho, proteção e acolhimento. Tio Nei e Tia Roseli que mesmo distantes transmitem luz intensa, conhecimentos e um modelo a ser seguido. Vó Célia por seu amor incondicional, pelo abrigo nos teus abraços, pelas gargalhadas e ligações a qualquer hora. Meus primos, mais que primos, muita gratidão por estarem sempre próximos em algum momento importante nesse processo, acompanhando minhas risadas, tropeços e dificuldades. Meu refúgio. Fernanda, Guilherme, Daniel, Beatriz, Júlia, Rafaela, Letícia, Marina, Kaio, Bianca, Bruno e Rennan. A minha comadre Patrícia e compadre Clever por terem me proporcionado uma das maiores alegrias nesse processo, ser madrinha. A dona Edith pelo imenso carinho e generosidade. Aos meus amados sobrinhos luiz Felipe, Miguel e Manuela por me possibilitarem voltar a ser criança. Meus amigos, meus companheiros de tantos desafios e amadurecimento. Um imenso amor. Eternamente grata por me apoiarem nesse processo, por todas as divertidas situações e encontros, pelas muitas risadas e gargalhadas, por me ouvirem insistentemente tantas vezes, pelos abraços apertados e por sentir sempre a presença de cada um mesmo que distante ou mesmo tão perto. Marina (limã), Karina, Suzana, Danilo (Didilo), Luciana, Amanda (piu), Gabriel (Bá), Frederico, Emiliano, meus queridos que a mais de dez anos caminham junto a mim. Aline, Fernanda, Iana, Renata, Ana Carla, Mariana, Carolina, minhas companheiras Marilienses, como foi importante conhecê-las nesse processo e que tanto me possibilitaram aprendizados, partilhas, companheirismo, sinceridade. Carrego-as sempre comigo. Minha querida orientadora Profª. Drª. Débora Deliberato, pelo exemplo de dedicação e ética profissional, por acreditar em mim e na realização desse trabalho, respeitando minhas dificuldades e vibrando com minhas conquistas, sobretudo pelo cuidado e amizade. Sempre se empenhando em fazer com que aqueles que a acompanham aprendam a produzir conhecimento, sem dúvidas é uma inspiração para minha carreira profissional. Aos professores Dr. Sadao Omote e Dra. Dionísia Aparecida Cusin Lamônica, pelas sugestões na qualificação da dissertação. Aos colegas do grupo de pesquisa “Deficiências Físicas e Sensoriais”, que discutiram e sugeriram diversos encaminhamentos em diferentes etapas deste trabalho; A minha amada prima Fernanda que com todo amor e cuidado se dispôs a concretizar a correção ortográfica da dissertação e minha querida amiga Luciana que realizou a correção da tradução do resumo desta dissertação; A querida amiga e Prof. Dra. Maria da Graça Chamma Ferraz e Ferraz por todo apoio, amizade, carinho e dedicação dentro e fora da vida acadêmica, sem sua escuta e cuidado eu não teria vivenciado esse processo com tanta perseverança e garra. À todas as mães participantes desta pesquisa, pela confiança depositada e pela possibilidade do enorme aprendizado que adquiri por meio das experiências compartilhadas. Aos amigos do Centro de Estudos da Educação e da Saúde –CEES – pelo respeito, auxilio e acolhimento durante este trabalho. Aos funcionários da seção de Pós-graduação da Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília – UNESP pelo atendimento competente e dedicado. À Agencia de fomento CNPQ que financiou esse trabalho e possibilitou o auxílio necessário para o cumprimento do mesmo. Para ser grande, sê inteiro: nada Teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és No mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda Brilha, porque alta vive. Ricardo Reis RESUMO A literatura da área da comunicação alternativa discute a necessidade de inserir a família no processo de avaliação, implementação e acompanhamento de sistemas de comunicação suplementar e alternativa. Incluir os familiares do usuário de comunicação suplementar e alternativa nas tomadas de decisão ao longo de todo o processo de adaptação, bem como capacitá-los adequadamente como interlocutores, devem compor o conjunto de ações adotado pela equipe de profissionais. No entanto, são escassos, ainda, os materiais, programas e orientações sistematizadas para serem utilizados com estas famílias. A partir disso, o objetivo do presente estudo foi sistematizar conteúdo necessário para orientação a famílias de alunos com paralisia cerebral usuários de sistemas suplementares e alternativos e comunicação. Desta forma, a pesquisa foi realizada em dois estudos: Identificar por meio da Revisão bibliográfica os programas de orientação familiar no contexto da comunicação suplementar e alternativa (Estudo 1); Identificar as potencialidades e problemas de famílias das crianças e jovens usuários de sistemas gráficos (Estudo 2). No estudo 1 compuseram o material de análise quinze artigos publicados em um periódico nacional e dois internacionais. Foram identificados 118 excertos que remetiam à orientação familiar, recomendação clara ou forneciam indicadores qualitativos relevantes para o aconselhamento familiar em Comunicação suplementar e alternativa. Deste total, apenas sete trechos puderam ser categorizados como sendo de orientação familiar, 48 tinham características de recomendação e 63 foram compreendidos como sendo indicativos de recomendação a respeito de algum aspecto da comunicação alternativa. Dentre as recomendações identificadas, foi observada a tendência dos autores em tecer considerações a respeito de aspectos da mediação e da atuação profissional na área. No estudo 2 participaram da pesquisa mães e ou pais de alunos com paralisia cerebral usuários de sistemas suplementares e alternativos de comunicação assistidos em um Centro de atendimento especializado e que participaram do programa de oficina de comunicação alternativa do Laboratório de Tecnologias de Comunicação Alternativa de uma Universidade pública, durante um período de 2008 a 2012. Os dados coletados foram as filmagens do programa de capacitação realizado pelo Laboratório de Tecnologias de Comunicação alternativa. O procedimento de análise contou com a transcrição das filmagens e em seguida a análise dos temas e subtemas. Os subtemas permitiram organizar e indicar conteúdos necessários para serem inseridos nos programas de orientação as famílias. Os resultados dos estudos indicaram escassez de orientações sistematizadas para famílias de crianças e jovens usuários de sistemas suplementares e alternativos de comunicação, mas contribuíram com os conteúdos necessários para sistematizar programas de orientações. Palavras-Chave: Educação Especial. Comunicação alternativa. Família. Paralisia Cerebral. ABSTRACT The argumentative and alternative communication area literature discusses the need of filling in the family in the evaluation, implementation and monitoring processes of supplementary and alternative communication. Including user’s family on the decisions along the adapting process, as well as training them as interlocutors should be part of the group of actions adopted by the professional team. However, materials, programs and orientation are still poor for those families. Taking from that, the objective of this paper was systematizing the needed content to orient the families of student’s with cerebral palsy using supplementary and alternative communication. The research was done in two papers: Identify programs of family orientation in the context of supplementary and alternative communication by revision bibliography (Study 1); Identify potentials and problems of children’s families using chart system (Study 2). On the first study fifteen national and international published articles composed the analyzed material. There were identified 118 pieces noting family orientation, clear recommendation or qualitative and relevant information to family advice in supplementary and alternative communication. With this total, only seven parts could be categorized as family orientation, 48 presented recommendation characteristics and 63 were understood as an aspect of alternative communication. Among the given recommendation, a tendency of the authors in considering mediation and professional performance were observed. Parents of students with cerebral palsy using supplementary and alternative communication took part on the second study. They were assisted on a specialized Centre and attended on a workshop of alternative communication program of Alternative Communication and Technology Laboratory on a public University from 2008 to 2012. The collected data were shooting of the capacitation program done on the Laboratory. The analyzing procedure was footage transcription followed by themes and subthemes analysis. The subthemes allowed the organization of the needed content to be included on families’ orientation programs. The results point to the lack of systematized orientation to families of supplementary and alternative communication systems users, but they also show needed content to systematize orientation programs. Keywords: Special Education. Alternative Communication. Family. Cerebral Palsy. LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Títulos dos periódicos incluídos na coleta de dados e abreviações utilizadas neste artigo.........................................................................…...........................................................58 Quadro 2 – Abreviações utilizadas nas categorias...................................................................59 Quadro 3 – Codificação dos artigos incluídos na coleta de dados..........................................61 Quadro 4 – Categorias e Subcategorias de análise...................................................................66 Quadro 5 – Exemplos de excertos analisados e relações com as categorias de análise...........71 Quadro 6 – Registro das filmagens das gravações de Vídeo Cassete da Oficina de Comunicação alternativa..........................................................................................................87 Quadro 7 – Registro das filmagens das gravações de Mini DV da Oficina de Comunicação alternativa.................................................................................................................................87 Quadro 8 – Temas e subtemas de análise.................................................................................89 LISTA DE TABELA TABELA 1 – Índice de concordância obtido intra e entre juízes por meio do número de concordância e discordância dos dados do estudo 1.................................................................69 TABELA 2 – Excertos identificados nos trabalhos analisados em função das categorias de análise........................................................................................................................................70 TABELA 3- Índice de concordância obtido intra e entre juízes por meio do número de concordância e discordância dos dados da estudo 2.................................................................91 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CEES Centro de Estudos da Educação e Saúde CSA Comunicação Suplementar e Alternativa PCS Picture Communication Symbols UNESP Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho FUNDAP Fundação do Desenvolvimento Administrativo RBEE Revista Brasileira de Educação Especial PCDSCLDP Perspectives on Communication Disorders and Sciences in Culturally and Linguistically Diverse Population PAAC Perspectives on Augmentative and Alternative Communication LSHSS Language, Speech and Hearing Services in Schools JID Journal of Intellectual Disability ETMRDD Education & Training in Mental Retardation & Developmental Disabilities DR Disability and Rehabilitation CDQ Communication Disorders Quaterly AAC Augmentative and Alternative Communication OF Orientação Familiar RC Recomendação Clara IR Indicativo de Recomendação SUMÁRIO 1 APRESENTAÇÃO..................................................................................................16 2 REFERENCIAL TEÓRICO.....................................................................................19 2.1 Aluno com paralisia cerebral e as questões da linguagem......................................19 2.2 Interlocutor do aluno com paralisia cerebral no contexto da comunicação suplementar e alternativa..............................................................................................28 2.3 Família do aluno com paralisia cerebral usuário de sistemas suplementares alternativos de comunicação.........................................................................................37 3 OBJETIVO.................................................................................................................55 4 MATERIAL E MÉTODO.........................................................................................56 4.1 Aspectos éticos........................................................................................................56 4.1.1 Submissão ao comitê de ética..............................................................................56 4.2 ESTUDO 1 – Identificar as recomendações da literatura científica quanto a estratégias e recursos de orientação à família de usuários de comunicação suplementar e/ou alternativa..............................................................................................................57 4.2.1 Primeira etapa: periódicos....................................................................................57 4.2.1.1 Critério de seleção dos periódicos....................................................................57 4.2.1.2 Procedimento de análise de seleção dos periódicos selecionados....................59 4.2.2 Segunda etapa: dissertações e teses.....................................................................61 4.2.2.1 Critérios de seleção...........................................................................................61 4.2.2.2 Organização dos referenciais bibliográficos selecionados: identificação dos excertos.........................................................................................................................64 4.2.3 Terceira etapa: procedimentos de análise dos dados das etapas um e dois........65 4.2.4 Quarta etapa: resultados e discussões iniciais do Estudo ..................................69 4.3 ESTUDO 2 – Identificação das potencialidades e problemas de famílias das crianças e jovens usuários de sistemas gráficos...........................................................83 4.3.1 Participantes da pesquisa.....................................................................................83 4.3.1.1 Critérios de inclusão.........................................................................................83 4.3.2 Local de Coleta dos dados................................................................................ 83 4.3.3 Instrumento de coleta dos dados.........................................................................84 4.3.3.1 Procedimento de coleta dos dados...................................................................85 4.3.4 Organização do material......................................................................................85 4.3.4.1 Procedimento de Análise da coleta dos dados.................................................88 4.3.5 Resultados e discussões do Estudo 2..................................................................92 5 CONCLUSÕES.......................................................................................................103 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................105 REFERÊNCIAS.........................................................................................................107 ANEXOS....................................................................................................................117 ANEXO A- PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA....................................................118 16 1 APRESENTAÇÃO O primeiro contato com o ensino a respeito da família aconteceu na graduação. Aprender a lidar com a distância da família e das pessoas que tanto se ama possibilitou maior sensibilidade para o olhar à família e para a percepção quanto a sua importância fundamental para o sentido da vida. Ao longo do segundo ano de graduação (2007) em Fonoaudiologia, na Faculdade de Filosofia e Ciências – UNESP – Marília, na disciplina de “Psicopatologia da Comunicação“, foram possíveis não apenas os encantos do autoconhecimento como, também, a descoberta, por meio dos estudos de Lacan e Freud, do papel fundamental da família na constituição de um sujeito psíquico e de um sujeito linguístico. Certos conceitos pareciam, no início, por vezes, inatingíveis. Foi assim, pois, que ocorreram as primeiras indagações sobre os aspectos relacionados à comunicação e à interação humana. Nesse universo, foi possível sentir a dor e a angústia das famílias de crianças com distúrbios de linguagem em decorrência das psicopatologias. Tratou-se de um momento bastante enriquecedor, no qual foi possível a descoberta da vontade em fazer parte, de alguma forma, da vida dessas crianças e seus familiares. Ainda na graduação, em 2009, um novo encontro se concretizou: o contato com as famílias de crianças com paralisia cerebral. Outro universo bastante denso do ponto de vista das questões relacionadas à aceitação e a tantas batalhas por parte das famílias e de seus filhos que apresentavam não só as dificuldades da linguagem, mas que ainda carregavam o peso do olhar do outro a respeito de suas tantas deformidades e desencontros de músculos e articulações. Nesse encontro, a família de uma criança com paralisia cerebral me proporcionou a inserção nesse universo da família do deficiente e só fez crescer o amor e a vontade pela luta do espaço dessas crianças e jovens na sociedade em que vivemos. Nesse mesmo ano, surge a oportunidade do contato com a professora Débora Deliberato, quem me possibilitou adentrar a novos conceitos e conhecimentos e de colocar em prática todo desejo e vontade. Assim, foi que, dentre tantos crescimentos e possibilidades, a visão era continuar aprendendo mais e mais com o que era de fato a paralisia cerebral e suas diversas indagações teóricas e práticas. Em 2009, ao fim da graduação veio o processo de seleção no Programa de Aprimoramento Profissional em Fonoaudiologia da UNESP de Marília. Neste momento 17 a comunicação suplementar e alternativa apareceu como uma oportunidade para aprimorar a prática na atuação junto aos jovens e crianças com paralisia cerebral, em especial os que não tinham prognóstico de fala. O desafio era torná-los aptos a se comunicar e, então, conquistarem a autonomia de seus interesses, vontades e necessidades. No programa de aprimoramento, a colaboração das relações em grupo e dos conhecimentos de outras áreas, como a Fisioterapia e a Terapia Ocupacional, possibilitaram novas descobertas em uma equipe que proporcionava experiências de cumplicidade, amizade e colaboração. Atendíamos em torno de 16 clientes do setor de comunicação suplementar e alternativa do Centro de Estudos da Educação e Saúde (CEES) da UNESP de Marília, bem como participávamos da discussão de estudos de caso do Grupo de Pesquisa Deficiências Físicas e Sensoriais, liderado pelo Prof. Eduardo José Manzini e, nessas ocasiões, acompanhávamos o delineamento do projeto de pesquisa, e de aulas direcionadas às necessidades do aluno com deficiência como parte das atividades deliberadas e como bolsistas FUNDAP. Naquele ano, adquirimos vasta experiência e mais conhecimento relacionado às pessoas acometidas por múltiplas deficiências. O enfoque terapêutico proporcionava troca de informações e aprendizados interdisciplinares, contribuindo no atendimento especializado visando às potencialidades do deficiente. Foi um ano de muitos aprendizados, com a clareza de que, para atuar com o deficiente, fazia-se necessário o uso de recursos e sistemas de comunicação suplementar e alternativa. Nesse momento, as contribuições pessoais foram imensas, o aprimoramento proporcionou a noção real do interesse pela área e possibilitou o aprofundamento em um estudo que mais tarde possibilitaria desenvolver a atual pesquisa. Assim, se fez a monografia, Material sistematizado de orientação a alunos usuários de comunicação suplementar e alternativa: Uma revisão da literatura, cujo objetivo era uma revisão bibliográfica referente a pesquisas dos últimos 10 anos que tratavam da orientação familiar do aluno usuário de comunicação alternativa e quais contribuições esses materiais disponibilizavam. Nesse contexto, o contato com a literatura específica proporcionou o aprofundamento das questões relacionadas à família e à comunicação suplementar e alternativa. Perceber a escassez de estudos envolvendo a família do usuário de comunicação suplementar e alternativa foi um dos grandes incentivadores para o caminho avante sobre a questão, uma vez que a percepção da angústia dessas famílias 18 diante da situação dos recursos e sistemas de comunicação suplementar e alternativa foi possível por meio do contato diário, da prática e das constantes observações, além da participação em auxílio aos trabalhos desenvolvido pela Professora Débora Deliberato no Laboratório de Tecnologia de Comunicação Alternativa da UNESP de Marília. Assim, com o início do mestrado no Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESP de Marília em 2011, foi possível dar aos estudos já iniciados no Programa de Aprimoramento Profissional, ou seja, identificar os estudos a respeito de orientação familiar de crianças e jovens usuários de sistemas suplementares e alternativos de comunicação e propor uma sistematização de conteúdos necessários na prática de orientações a essas famílias. Sendo assim, a presente pesquisa foi realizada por meio de dois estudos: estudo I, foi realizada a análise da revisão bibliográfica referente à orientação familiar no contexto da comunicação suplementar e alternativa e no Estudo II foram estabelecidos os conteúdos a respeito da área de comunicação suplementar e alternativa necessários para sistematizar a orientação das crianças e jovens usuários de sistemas suplementares e alternativos de comunicação. 19 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Aluno com paralisia cerebral e as questões da linguagem. A paralisia cerebral vem sendo estudada há vários anos e algumas propostas interessantes serão consideradas. Bobath (1982), uma das referências na área, definiu a paralisia cerebral como uma desordem da postura e do movimento que acomete o cérebro imaturo e não é progressiva. Vivone, et. al. (2007) acrescentou que a paralisia cerebral é uma desordem do tônus, do movimento e da postura de caráter não progressivo, devido a uma lesão que atinge o cérebro imaturo e interfere na maturação do Sistema Nervoso Central, provocando, assim, dificuldades na coordenação da ação muscular, resultando na incapacidade da manutenção de posturas e na realização de certos movimentos. A literatura da área apontou que as desordens motoras da paralisia cerebral, com frequência, são acompanhadas por distúrbios de sensação, percepção, cognição, comunicação, comportamento e epilepsia (SOUZA, 2005; BAX, et. al, 2005; ROSENBAUM, et. al, 2007). Para tanto, segundo Bax, et. al. (2005), as dificuldades no movimento, postura e no comportamento motor em si são as características centrais da paralisia cerebral. Porém, os autores discutem que pessoas com paralisia cerebral podem também ter alterações relacionadas às questões ambientais e, apontam também para as características específicas de cada um dos indivíduos com paralisia cerebral (BAX, et. al, 2005). As dificuldades tanto em relação aos aspectos sensoriais, perceptuais, motores, entre outras características, podem interferir de forma relevante na interação da criança com o meio social, familiar e escolar, influenciando a aquisição e o desempenho das questões motoras (rolar, sentar, engatinhar, andar), como das atividades da rotina diária (tomar banho, alimentar-se, vestir-se, locomover-se) em ambientes variados (MANCINI, et. al, 2004). Nesse contexto de discussão, Limongi (2000) destaca que, na paralisia cerebral, condições importantes quanto ao sistema motor oral podem prejudicar demasiadamente a fala, enquanto emissão oral, pela própria dificuldade de articulação, devido a alterações respiratórias e pela incoordenação entre ambas. Destaca também as condições de inteligibilidade da linguagem oral provocando dificuldades na estruturação da sintaxe e redução do léxico. 20 Permeando a complexidade dessas considerações, é possível visualizar que a fala, enquanto atividade motora fina que envolve estruturas fonoarticulatórias, leva crianças e jovens com paralisia cerebral não apenas a uma leve dificuldade de articulação, mas a possível ausência total da mesma, prejudicando, assim, a comunicação verbal. Limongi (2000, 2003) também discute que os estudos e pesquisas nacionais e internacionais têm demonstrado a preocupação com a linguagem e a comunicação da criança com paralisia cerebral. Compreender as habilidades comunicativas da paralisia cerebral para além das questões da articulação da fala tem permitido ampliar as discussões da literatura especializada e entender de forma mais ampla as habilidades e necessidades das crianças e jovens com paralisia cerebral (DELIBERATO, 2010). Nesse contexto, Lamônica (2004) de forma memorável também considera a necessidade do olhar para as habilidades comunicativas da pessoa com paralisia cerebral para além da fala. Segundo a autora, a falta de considerar a linguagem poderia acarretar um prejuízo nas questões linguísticas “[...] um vácuo para a compreensão global do processo comunicativo e, desse modo específico, das habilidades linguísticas [...]” (LAMÔNICA, 2004, p. 967). É possível adentrar as discussões das possibilidades expressivas dessas crianças e jovens com paralisia cerebral. Na ausência parcial ou total da fala, portanto, da comunicação verbal, Limongi (2003) destacou que esses jovens e crianças, com paralisia cerebral, buscam nas intenções comunicativas, por meio da direção do olhar como também pela troca de olhares quando há mais de um interlocutor, uma forma de comunicação. Ainda, Limongi (2000) argumentou: [...] Os problemas encontrados na comunicação das crianças com paralisia cerebral podem variar. Podemos encontrar desde ausência de atitude comunicativa, passando por grandes dificuldades na comunicação oral devido a alterações orais importantes que impeçam a articulação dos sons, palavras e frases, até distúrbios no nível da linguagem [...] Deve-se ainda, considerar o caso em que a comunicação oral encontra-se totalmente ausente, mas a atitude comunicativa está presente por meio de gestos, sinais e algumas poucas vocalizações. (LIMONGI, 2000, p.25). Sendo assim, entre as diferentes habilidades identificadas entre as pessoas com paralisia cerebral, seria possível identificar crianças e jovens com um vocabulário receptivo adequado para as interações sociais, mas, sem a possibilidade de expressá-lo pelo uso da fala convencional, ou seja, seria possível utilizar outras habilidades 21 expressivas, nem sempre elas seriam compreendidas por interlocutores que conhecem ou não a rotina de vida desses jovens e crianças (ALVES, 2006; DELIBERATO; ALVES, 2009). Lamônica (2004) apresentou dados importantes quando constatou a existência de estudos segundo os quais a eclosão das várias etapas do desenvolvimento linguístico é muitas vezes mais tardia nas crianças com paralisia cerebral do que na população que não apresenta paralisia cerebral. Nesse ínterim, estudos apontaram que crianças e jovens com paralisia cerebral podem apresentar comprometimento na linguagem de modo geral, tanto na compreensão, quanto na expressão, enquanto outros podem desenvolver a linguagem, porém, ainda assim evidenciando dificuldades quanto à produção da fala (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). O aluno com paralisia cerebral encontra, portanto, também no ambiente escolar problema para estabelecer os diversos vínculos (afetivo, social, pessoal, etc.), dificultando o âmbito das relações humanas assim como o processo de ensino- aprendizado, não só pelas dificuldades motoras encontradas interferentes, mas principalmente pelas necessidades complexas de comunicação. 1 Na área da comunicação alternativa é possível, por meio das definições de Milikin (1997), caracterizar as diversas habilidades expressivas utilizadas por crianças e jovens com paralisia cerebral. A autora define a comunicação verbal como as habilidades expressivas nas quais o indivíduo se apropria de um código linguístico, como no caso do uso da fala e da língua de sinais. A comunicação não verbal é definida pela autora como as habilidades expressivas cujas ações e comportamentos não fazem uso de um código linguístico, como no caso dos gestos, vocalizações, expressões corporais. Ainda se tratando de comunicação verbal e não-verbal, a autora classifica essas habilidades em: verbal-vocal (Fala); verbal e não-vocal (Sistema Pictográfico; escrita; língua de sinais – LIBRAS); não-verbal e vocal (entonação, choro, vocalizações) e não-vocal e não-verbal (expressões faciais, gestos) (MILIKIN, 1997). Ainda, segundo Deliberato, (2011) os comportamentos verbais e não verbais mantêm uma complexidade de vínculo com impossibilidade de separação. Ambas as modalidades se completam e, em determinadas situações, a comunicação não verbal 1 Necessidade complexa de comunicação: terminologia utilizada na área de comunicação suplementar e alternativa para referir às crianças, jovens e adultos sem a linguagem falada (DELIBERATO, 2011). 22 pode vir a ocorrer isoladamente, pois, ela permite ser compreendida pelo fato de o interlocutor utilizá-la com intenção comunicativa. Ainda, nesse raciocínio, ao se pensar no uso da entonação (vocal/ não verbal) ou gestos e expressões faciais e corporais (não vocal/ não verbal), verifica-se que ambos podem fazer parte de um contexto verbal, se forem usados com sentido e intencionalidade (KANPP; HALL; 1999). Assim, a intencionalidade é um comportamento importante a ser observado nas crianças e jovens com paralisia cerebral e a combinação das modalidades expressivas utilizadas por esses jovens no momento da interação dialógica pode determinar um comportamento verbal ou não verbal (DELIBERATO, 2010, 2012). Lamônica (2004, p. 968) destacou que a preocupação com o desenvolvimento dos indivíduos com paralisia cerebral [...] passa necessariamente pela compreensão de suas necessidades de integração e, sob essa perspectiva, o processo comunicativo deve ser revisado [...]. Nesse contexto, se faz necessária a capacitação de interlocutores nas diferentes habilidades comunicativas, para que a criança e jovem com paralisia cerebral possa compartilhar seus desejos, conhecimentos com diferentes pessoas nos diversos contextos (ALVES, 2006; FERREIRA-DONATI; DELIBERATO, 2009a). Com essas preocupações aplicadas ao ambiente escolar, Alves (2006) discute em sua pesquisa, o uso do sistema gráfico por um aluno com paralisia cerebral perante diferentes interlocutores. A autora nota que diante da mesma tarefa, o aluno modificou o uso de suas habilidades expressivas em função do interlocutor: quanto maior o conhecimento do parceiro comunicativo frente aos comportamentos não verbais do aluno, a frequência no uso de habilidades não verbais (uso do olhar, expressões faciais, vocalizações) por parte do aluno com paralisia cerebral foi maior em relação à demais habilidades. Por outro lado, foi observado maior uso dos sistemas suplementares e alternativos de comunicação (habilidade verbal, não oral) com os interlocutores desconhecidos perante a mesma tarefa proposta com os parceiros de comunicação de sua rotina. Ainda nesse contexto de preocupação, Deliberato e Guarda (2007) analisaram as diferentes habilidades expressivas de um aluno com paralisia cerebral, durante atividades de conto e reconto de histórias por meio do uso de sistema de comunicação alternativa na escola. Participou desse estudo um aluno de 14 anos de idade, com paralisia cerebral, não alfabetizado e comunicando-se pela forma não verbal, que frequentava classe especial. Dentre os procedimentos da coleta de dados, o aluno 23 escolhia um livro, dentre cinco previamente selecionados, de acordo com seu interesse, idade e grau de escolaridade. A história era contada, por um dos interlocutores e, em seguida, era solicitado que o participante a recontasse por meio do sistema de comunicação alternativa. Na análise dos dados, as principais categorias referentes ao discurso narrativo foram: tema e ações principais e secundárias, personagens principais e secundários, local, finalização da história e outras informações, como particularidades do enredo. Quanto às modalidades de expressão empregadas naquelas ocasiões, categorizaram-se as expressões verbais (emissão de sons e de palavras), expressões não verbais (gestos indicativos, gestos representativos, movimentos de cabeça, expressões faciais e expressões combinadas) e expressões verbais e não verbais associadas. As autoras concluíram que o uso dos recursos de comunicação suplementar e alternativa favoreceu o desenvolvimento de conteúdos do discurso narrativo do aluno, bem como colaborou para ampliar suas formas de expressão verbal e não verbal. Os estudos apontaram para a necessidade de se caracterizar as diferentes habilidades comunicativas das crianças e jovens com paralisia cerebral em função de suas características físicas e ambientais, uma vez que as pessoas com paralisia cerebral podem ter habilidades distintas não só por suas características sensoriais- perceptivas, motoras, cognitivas e linguísticas, mas, também, apresentar diferentes modalidades comunicativas em função do interlocutor, ambiente e tarefa na qual está envolvida (MILLER; CLARK, 2002; NUNES, 2003; VON TETZCHNER, 2009; DELIBERATO, 2010). Nesse contexto, pode-se dizer que os indivíduos com paralisia cerebral, por apresentarem problemas motores, sensoriais e/ou cognitivos, poderão ter dificuldades adicionais para demonstrar seu conhecimento em diversos ambientes; sendo um dos ambientes mais importantes oseu papel de aluno em sala de aula. Em se tratando do aluno da educação especial, sabe-se que grande parte pode apresentar dificuldades tanto na modalidade oral quanto na modalidade gestual, em consequência das diferentes manifestações motoras e/ou cognitivas, ou seja, muitas vezes a criança e jovem com paralisia cerebral teve a intencionalidade da comunicação, mas o interlocutor não compreendeu a mensagem (DELIBERATO, 2007a, 2013). Os pesquisadores estão preocupados em entender como fatores biológicos e ambientais poderiam interferir no desenvolvimento da criança com paralisia cerebral. Mancini (2004) apresentou como objetivo de sua pesquisa a avaliação do impacto do grau de comprometimento neuromotor no perfil funcional de crianças com paralisia 24 cerebral. Participaram da pesquisa 36 crianças com paralisia cerebral. Os resultados e discussões apontados mostraram evidências sobre o impacto da gravidade do comprometimento neuromotor em crianças com paralisia cerebral quanto ao desempenho de atividades e tarefas da rotina diária, bem como sobre a independência funcional. Ainda, o estudo sugeriu que a atitude das famílias das crianças com paralisia cerebral influencia diretamente o desempenho dessas crianças. O estudo citado reforça que fatores da rotina dos jovens e crianças com paralisia cerebral podem ser afetados por conta da falta de conhecimento de suas habilidades e potencialidades. Reforça também o quanto a participação das pessoas envolvidas na rotina, como a família, poderia interferir e influenciar nas atividades sociais e no desempenho dessas crianças. Nesse contexto, Limongi (2000) e Deliberato (2010, 2013) ressaltaram a importância da intervenção terapêutica, em específico de crianças com paralisia cerebral, a fim de objetivar a própria construção da linguagem e o favorecimento de condições para efetivar as possibilidades de trabalho com outros sistemas de códigos e símbolos. Nesse contexto, elas se referem, como um dos exemplos, à comunicação suplementar e alternativa. Assim, as autoras argumentaram no sentido de apresentar uma visão importante que permite a reflexão acerca da tecnologia de comunicação alternativa, bem como acerca dos critérios de escolha dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa para cada especificidade das crianças e jovens com paralisia cerebral. Pesquisadores e profissionais de saúde e educação discutem a importância da comunicação suplementar e alternativa no ensino e no ambiente social para a inclusão de crianças, jovens e adultos com necessidades complexas de comunicação. O uso da comunicação suplementar e alternativa pode favorecer o desenvolvimento da linguagem de uma maneira eficaz em crianças e jovens com necessidades complexas de comunicação e melhorar as habilidades comunicativas em diferentes ambientes naturais, uma vez que promove a acessibilidade comunicativa (NUNES, 2003; LIGHT, 2003; DELIBERATO, MANZINI, 2012; DELIBERATO, 2012). As questões da linguagem nas crianças e jovens usuários de sistemas gráficos foram apresentadas e discutidas por Chun (2002). A autora destacou que o uso das tecnologias da comunicação alternativa são meios importantes que permitem ações além de um caráter instrumental, por permitir trabalhar com a linguagem. Chun (2002), Light (2003), Deliberato (2009a) ainda alertaram que os sistemas de comunicação suplementar 25 e alternativa atuarão no indivíduo dependendo de suas características biológicas e ambientais. É importante ressaltar que a implementação de sistema suplementar e alternativo de comunicação não será reduzida ao ensino de símbolos, mas sim deve ser incluído nas atividades vinculadas ao desenvolvimento da linguagem enquanto atividade constitutiva do sujeito. Deliberato e Manzini (2012) discutem ainda que tem sido um grande desafio para a saúde e educação inserir esses sistemas de comunicação suplementar e alternativa no ambiente natural de jovens e crianças com necessidades complexas de comunicação que mesmo apresentando comportamentos comunicativos nem sempre são entendidos por interlocutores de diferentes origens sociais. Segundo Deliberato (2013) além da atenção à questões linguísticas discutidas por pesquisadores que atuam com crianças e jovens com paralisia cerebral, Light (2003) destaca a necessidade e preocupação com relação aos domínios operacional e de estratégia para que a pessoa com paralisia cerebral possa ter acesso aos sistemas gráficos. Ainda, definiu o domínio operacional como a competência na produção técnica com os sistemas de comunicação suplementar e alternativa por meio do uso de diferentes recursos de baixa ou alta tecnologia. O domínio operacional é essencial para garantir uma comunicação efetiva e é dependente das capacidades motora, cognitiva, linguística, sensorial e perceptiva de cada pessoa. A autora definiu, também, domínio de estratégia como os procedimentos da pessoa usuária de sistemas gráficos no uso do recurso de tecnologia para a comunicação, permitindo a diminuição nas limitações dos domínios operacional, linguístico e social. Manzini (2005) discute a necessidade de selecionar e adequar os recursos tecnológicos de acordo com as necessidades de cada pessoa, ou seja, as adaptações dos recursos devem atender à funcionalidade da tarefa a ser realizada (ROCHA, 2013). A adaptação de um recurso deve considerar os fatores: características motoras, cognitivas, emocionais e sociais da criança e as exigências sociais, pedagógicas, psicológicas e físicas impostas pelo meio (ARAUJO; MANZINI, 2001; ROCHA, 2010, 2013). Manzini e Deliberato (2006, 2007) apresentam recursos adaptados para serem utilizados no uso de sistemas gráficos e discutiram a necessidade de critérios para as modificações de um recurso de acordo com as necessidades de cada criança com deficiência física. 26 Rocha (2010, 2013) apresenta e discute, nos seus estudos, a operacionalidade da seleção, implementação e uso do recurso de tecnologia assistiva no ambiente escolar a partir do estudo de caso de duas crianças com paralisia cerebral. A autora identificou a necessidade de que o recurso tecnológico fosse funcional de acordo com tarefa proposta na rotina escolar. A funcionalidade do recurso e o seu uso também foram discutidos por Braccialli et. al. (2008). Esses autores argumentam que a falta de critérios na seleção e uso dos recursos tecnológicos frente às especificidades dos usuários e do seu meio acarreta o abandono do mesmo. Os autores ainda destacam os motivos que acarretam o abandono de recursos prescritos e adquiridos: [...]1) falta de participação do usuário durante a seleção do dispositivo; 2) desempenho ineficaz do dispositivo; 3) mudanças nas necessidades do usuário; 4) falta do treinamento do usuário; 5) dispositivo inadequado às necessidades do usuário; 6) dispositivos de uso complicado; 7) aceitação social do dispositivo; 8) falta de motivação; para o uso do dispositivo; 9) falta de treinamento e conhecimento do dispositivo; 10) dispositivo com aparência,peso e tamanho não-estéticos[...] ( BRACCIALLI, 2008, p. 142). O recurso tecnológico selecionado pode permitir ao usuário do sistema gráfico maior independência e funcionalidade durante as situações de interação com as diferentes pessoas. Sendo assim, cabe destacar a necessidade dos profissionais da educação e da saúde estarem atentos para as questões da inserção de um sistema de representação que permita o acesso ao desenvolvimento da linguagem, mas também os profissionais devem estar preocupados com as adequações dos recursos tecnológicos que permitam domínios operacionais e de estratégias que sejam acessíveis às especificidades de cada pessoa com deficiência (DELIBERATO, 2010, 2012). Sendo assim, os professores e terapeutas que trabalham com o aluno com paralisia cerebral além da busca de critérios para a seleção do recurso, devem ter o cuidado no que se refere à avalição, seleção e implementação dos sistemas gráficos para o aluno com deficiência. Deliberato e Manzini (2012) discutem a necessidade da inserção da família no momento de avaliar, selecionar e inserir os sistemas gráficos com crianças e jovens com paralisia cerebral. Os autores defendem que os membros da família são os principais interlocutores dos usuários de sistemas gráficos e devem ser os informantes mais atentos quanto as demais habilidades expressivas utilizadas pelo jovem com deficiência. 27 A inserção da família na rotina das atividades relacionadas ao uso dos sistemas gráficos e de recursos tecnológicos tem sido defendida por profissionais e pesquisadores da área da comunicação alternativa para que os mesmos possam ser capacitados não só na tecnologia, mas, também, no aprendizado das diferentes linguagens alternativas (ALVES, 2006; FERREIRA-DONATI; DELIBERATO, 2009b; DELIBERATO; MANZINI, 2012). Por isso é tão importante orientar a família quanto à seleção do sistema de comunicação suplementar e alternativa para que esse sistema seja o mais eficaz possível, ou seja, a família deve ser empoderada quanto a esse sistema, o porquê das porque das escolhas dos vocabulários, da disposição do conteúdo colocado no recurso e da escolha do melhor conteúdo buscando uma maior adequação às necessidades do indivíduo. Huang, Sugden e Beveridge (2009) realizaram um estudo com o objetivo de explorar o uso de tecnologia assistiva no ambiente familiar de crianças com paralisia cerebral, ainda buscaram avaliar os fatores relacionados à utilização desses recursos considerando a perspectiva da criança. Os participantes do estudo foram 15 crianças com paralisia cerebral e 15 mães. Os resultados apontaram uma baixa frequência no uso dos recursos em casa pelas crianças participantes. Dentre os fatores que poderiam contribuir para o não uso estão em destaque a resistência das crianças em utilizar os recursos, a baixa perspectiva das mães, as barreiras físicas e o ambiente não apropriado. Assim, os pesquisadores discutiram a necessidade de considerar três fatores ao se prescrever a utilização de recursos: as características do indivíduo, as características do recurso e os fatores ambientais. Em relação aos parceiros de comunicação, deve-se ter atenção aos diferentes parceiros em cada ambiente, às oportunidades de comunicação que eles dão ao indivíduo e o modo como interagem, pois, segundo Nunes (2003), a principal característica das dificuldades de comunicação desses indivíduos é a baixa expectativa que seus parceiros têm em relação à sua capacidade de veicular e produzir novas informações de forma complexa. Ainda, sobre o papel do interlocutor no contexto de avaliação, seleção, implementação e acompanhamento dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa, Alves (2006) destaca a importância da inserção do sistema de comunicação suplementar e alternativa de forma eficaz não apenas com a família, mas também com os educadores. 28 Deliberato (2007b, 2008) discute a necessidade de incluir as famílias, os educadores, fonoaudiólogos, e outros interlocutores, como terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, psicólogos e assistentes sociais durante o processo de avaliação, seleção, implementação e acompanhamento dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa para garantir seu uso de forma funcional. Como já discutido anteriormente a autora destacou a importância de identificar habilidades de comunicação para o uso dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa na presença de diferentes interlocutores. Ressalta que o professor é o mediador da comunicação e da interação que acontece na escola, ambiente propício para o desenvolvimento dessas competências. Além de desenvolver a comunicação e a interação, a escola é o lugar-chave para o desenvolvimento intelectual desde que a mediação do educador seja de excelente qualidade para os alunos. Sabe-se que é mais trabalhoso para os alunos, com necessidades complexas de comunicação, participarem das atividades escolares que requerem habilidades comunicativas. Esses alunos precisam utilizar recursos alternativos de comunicação, além da presença de uma pessoa que formule aos demais o que eles querem dizer (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). Isso demanda a competência desse interlocutor, que também passa a ser o mediador da interação do aluno com as pessoas participantes do diálogo. A comunicação suplementar e alternativa pode ser a área de conhecimento que proporciona a ampliação de possibilidades de interação da criança com paralisia cerebral, ampliando as situações de trocas comunicativas, tornando os usuários dos sistemas gráficos mais independentes e participativos, possibilitando o desenvolvimento de potencialidades, e assim favorecendo a construção da linguagem. 2.2 Interlocutor do aluno com paralisia cerebral no contexto da comunicação suplementar e alternativa Com a finalidade de contemplar a complexidade da discussão a respeito do processo de interação da criança e do jovem usuário de comunicação suplementar e alternativa com os demais interlocutores, seria importante caracterizar estas crianças e jovens, assim como, definir a Comunicação Suplementar e Alternativa. A comunicação suplementar e alternativa possibilita que pessoas com necessidades complexas de comunicação possam se expressar e tenham seus desejos e necessidades compreendidos. O termo comunicação suplementar e alternativa é 29 utilizado para definir formas suplementares e alternativas de comunicação (MOREIRA; CHUN, 1997; VON TETZCHNER, 1997; MANZINI; DELIBERATO 2004). A comunicação suplementar e alternativa auxilia e modifica a capacidade do usuário de se comunicar, aumentando o desenvolvimento de habilidades comunicativas dessas pessoas incapazes ou limitadas de utilizar a comunicação oral. A American Speech-Language-Hearing Association (ASHA, 1989) define a Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA) como: [...] uma área da prática clínica que procura compensar de modo temporário ou permanente, padrões de incapacidades ou perturbações exibidos por pessoas com severos distúrbios de comunicação expressiva, da fala ou da escrita. (ASHA, 1989, p.107). A ASHA (1989) define, também, que um sistema de comunicação alternativa deveria consistir em um grupo integrado de componentes, incluindo símbolos, estratégias e técnicas que poderiam ser utilizados para modificar a comunicação e, com isso, ampliar as possibilidades de participação da criança e jovem com deficiência nos diferentes ambientes. Alguns autores enfatizam que comunicação suplementar e alternativa é usada quando o indivíduo se comunica face a face por meio de outros caminhos que não a fala (VON TETZCHNER, 1997) Lamônica; Caldana definiram ainda que: [...] O termo comunicação suplementar enfatiza o fato de usar suporte, ou seja, que o treinamento em formas alternativas tem duplo objetivo, tanto promover, quanto suplementar a fala e garantir uma forma alternativa para o indivíduo começar a se comunicar[...] (LAMÔNICA; CALDANA, 2007, p. 97). Para Pires; Limongi, (2002) a comunicação alternativa é: [...] uma área da clínica prática e de educação para fonoaudiólogos que se propõem a compensar (temporária ou permanentemente) pela incapacidade ou deficiência do indivíduo com desordem severa de comunicação expressiva [...] (PIRES; LIMONGI, 2002, p.52). Para Nunes (2003) a comunicação alternativa possibilita uma maior integração do usuário com o meio social. Assim, os sistemas de comunicação alternativa implicam estratégias que complementam ou substituem a linguagem falada, permitindo que a comunicação se estabeleça. Glennen (1997) define a comunicação suplementar e alternativa como outras formas de comunicação além da fala: uso de gestos, língua de sinais, expressões faciais, uso de pranchas de alfabeto, símbolos pictográficos e, inclusive, o uso de 30 sistemas mais sofisticados, como no caso de recursos com voz digitalizada ou sintetizada, e também no caso de vocalizadores ou comunicadores eletrônicos. De acordo com von Tetzchner et al. (2005) o “[...] desenvolvimento de meios alternativos de comunicação não constitui apenas a aprendizagem de um modo diferente de comunicação; implica um caminho alternativo de constituição cultural do sujeito [...]” (VON TETZCHNER et. al., 2005, p.155). Por meio das definições apresentadas, os autores destacaram a função dos sistemas suplementares e alternativos de comunicação para o desenvolvimento da linguagem, destacando a necessidade de inserir as pessoas com deficiência nos vários contextos comunicativos. Tais contextos dependem das circunstâncias em que essas pessoas vivem, bem como o tipo e grau das dificuldades de comunicação que o usuário possa apresentar (AMERICAN SPEECH-LANGUAGE-HEARING ASSOCIATION, 1989). Assim, pode-se refletir sobre a importância de formas alternativas de comunicação para o desenvolvimento dessas pessoas com necessidades complexas de comunicação. Crianças com deficiência física, sensorial, perceptiva associada com as necessidades complexas de comunicação, por exemplo, podem ouvir as palavras, mas ter meios limitados para testar hipóteses sobre o significado dessas palavras, devido ao acesso restrito ao ambiente pela sua condição motora (LIGHT, 2003). Considerando que a comunicação alternativa promoverá e suplementará a fala, bem como garantirá uma forma alternativa de comunicação e pensando nas crianças e jovens com paralisia cerebral que apresentam acesso restrito ao ambiente pelas condições motoras, a comunicação suplementar e alternativa subdivide-se em comunicação apoiada e comunicação não apoiada. Segundo Manzini e Deliberato (2006) a comunicação apoiada engloba: [...] todas as formas de comunicação que possuem expressões linguísticas na forma física e fora do corpo do usuário, como objetos reais, miniaturas de objetos, pranchas de comunicação com fotografia, fotos e outros símbolos gráficos e, ainda, os sistemas computadorizados. Esses são os recursos adaptados. (MANZINI, DELIBERATO, 2006, p.5). Em decorrência das atividades motoras, muitas crianças e jovens com paralisia cerebral, usuários de comunicação suplementar e alternativa, vão depender de um interlocutor para selecionar e indicar estímulos necessários para que sejam interpretados (MANZINI; DELIBERATO, 2006). A comunicação não apoiada engloba: 31 [...] as expressões próprias daquela pessoa, tais como os sinais manuais, expressões faciais, língua de sinais, movimentos corporais, gestos, piscar de olhos, para indicar “sim”ou “não. Esses são recursos da própria pessoa. As expressões são totalmente produzidas pelos seus usuários [...] sem o auxílio de outra pessoa ou equipamento. (MANZINI; DELIBERATO, 2006, p. 5). No contexto da comunicação alternativa apoiada ou não apoiada é possível constatar a necessidade e importância do interlocutor capacitado quer seja no domínio do sistema gráfico, quer no domínio do uso do recurso tecnológico. Os símbolos gráficos utilizados nos diferentes recursos podem ser desenhos lineares mais simples e neutros, icônicos, fáceis de aprender e memorizar, ou ainda, de forma mais simples os recursos tangíveis: objetos reais idênticos ou similares aos que representam e os objetos parciais, que representam uma atividade, e miniaturas, que são símbolos similares ao que representam em tamanho menor. Esses objetos podem ser manipulados por pessoas com deficiência visual ou déficit intelectual (BASIL, 2003; PELOSI, 2009). Há diversos sistemas de símbolo, dentre eles os mais conhecidos: sistema Bliss (BLISS, 1965); o sistema P. I. C. (MAHARAJ, 1980) e o sistema P. C. S. (JOHNSON, 1992, 2004). Isso possibilita às crianças com paralisia cerebral que apresentam impedimento da linguagem falada explorar diferentes modos de comunicação até conquistarem e encontrarem um sistema ideal e funcional por meio dos sistemas gráficos e demais habilidades. São diversas as formas de comunicação das pessoas que necessitam da comunicação suplementar e alternativa; nas crianças, por exemplo, é comum o uso do olhar para objetos, vocalizações mais ou menos articuladas, como expressão de desejo e interesse, choro ou emissão de outros sinais de excitação (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). As crianças e jovens usuários de sistemas de comunicação suplementar e alternativa que apresentam dificuldades no desenvolvimento da fala parcial ou completa e se apoiam nesse sistema para estabelecimento do ato comunicativo, buscando assim, de forma efetiva, uma comunicação nas relações interpessoais. Para abordar a importância desses sistemas de comunicação da vida dos usuários Silvia e Friedman (2008) desenvolveram um estudo com o objetivo de compreender como os recursos utilizados na comunicação suplementar e alternativa podem influenciar a comunicação e a vida de dois jovens com paralisia cerebral, com 32 comunicação não verbal, institucionalizados, bem como influenciar a instituição em que se encontram. Esta pesquisa, de natureza exploratória e de perfil qualitativo, trabalha os dados obtidos a partir da interação de dois jovens com alguns trabalhadores (cuidadores e profissionais de saúde) de uma instituição do estado de São Paulo. Alguns dos resultados e discussões apontaram a falta de dados sobre os vínculos familiares e, de modo geral, a falta de informações mais detalhadas sobre a história de vida e a saúde das crianças com paralisia cerebral; ainda, um apagamento de vínculos se observou na rotina da instituição evidenciando que a vida desses jovens fica limitada não apenas em função da deficiência, mas também em função da organização do trabalho na instituição que apresenta poucos cuidadores com excesso de trabalho; também constataram que a comunicação suplementar e alternativa foi efetiva como instrumento mediador da expressão subjetiva e linguística dos jovens e ainda, influiu de forma positiva no cotidiano dos jovens na instituição possibilitando a eles expressarem suas vontades, gostos e interesses. Um estudo de caso de Silva, Baldrighi e Lamônica (2007) teve como objetivo instrumentalizar um indivíduo com paralisia cerebral espástica, com grave comprometimento motor, porém, grande potencial comunicativo para a utilização de procedimentos de comunicação alternativa nas atividades escolares. O participante da pesquisa foi um jovem de 13 anos inserido em uma escola especial. Diante dos procedimentos realizados e análise dos dados coletados, os resultados e discussões apontaram que por meio da utilização de procedimentos de comunicação suplementar e alternativa, foi possível instrumentalizar o aluno com paralisia cerebral a participar de atividades dialógicas e acadêmicas na escola especial. É possível constatar que os diversos interlocutores, seja a família ou o educador, carecem de informações a respeito do que é e quais os benefícios da comunicação suplementar e alternativa para as crianças e jovens com paralisia cerebral e também do uso funcional dessa comunicação na rotina dessas crianças e jovens. Percebe-se também que esses interlocutores devem ter competência para atuar nessa mediação. Ainda, algumas pesquisas demonstraram que a família e outros parceiros de comunicação normalmente não são sensíveis às tentativas de comunicação com esses indivíduos usuários do sistema de comunicação suplementar e alternativa, assim, acabam dominando as interações comunicativas; fornecendo poucas oportunidades de comunicação; não fazendo uso de perguntas abertas, apenas questões de sim-não; 33 interrompendo as crianças quando estão usando a comunicação suplementar e alternativa; e ainda, enfocando o recurso ou a estratégia de comunicação ao invés da criança e a sua mensagem (KENT-WALSH; MCNAUGHTON, 2005). A família e outros parceiros de comunicação, podem adquirir conhecimentos sobre o papel de interlocutor para propiciar a interação, bem como, estratégias para melhorar o suporte na comunicação de crianças e jovens usuários de comunicação suplementar e alternativa (KENT-WALSH; MCNAUGHTON, 2005). O objetivo final de uma intervenção por meio da comunicação suplementar e alternativa não é encontrar uma solução tecnológica para os problemas de comunicação, mas permitir que as crianças e jovens usuários desse sistema anunciem efetivamente seu envolvimento em uma variedade de interações e ainda, participem de atividades de sua escolha (BEUKELMAN; MIRANDA, 2007). Light (1988) em uma extensa revisão de literatura referente à comunicação suplementar e alternativa, identificou quatro propósitos das intenções comunicativas a serem cumpridas pelas crianças e jovens com paralisia cerebral usuários desse sistema de comunicação alternativa: 1) Comunicação das necessidades/desejos, 2) Transferência de informações, 3) Proximidade social e 4) Inserção social. E ainda, um quinto item referente à comunicação dos usuários com ele mesmo ou seja, a condução de um diálogo interno. As competências comunicativas a partir das perspectivas de crianças e jovens com paralisia cerebral usuários do sistema de comunicação suplementar e alternativa, envolve habilidades, de forma eficiente e efetiva, quanto à transmissão das mensagens em todas as quatro categorias de interação, com base em interesses individuais e circunstanciais. Alguns autores como Light; Binger (1998) sugeriram que bons comunicadores são capazes de: Retratar uma autoimagem positiva para seus parceiros de comunicação; mostrar interesse nos outros e atrair outros para interações; participar ativamente e se revezar de forma simétrica; ser sensível a seus parceiros de comunicação, por exemplo, fazendo comentários pertinentes, perguntas sócias focalizadas, e negociação de temas comuns; colocar os seus parceiros à vontade com o seu sistema de comunicação alternativa, por exemplo, uma estratégia introdutória. Além disso, o humor e sinais não-verbais podem servir a esse propósito. Equipes de sistema de comunicação suplementar e alternativa devem estar cientes do fato de que diferentes 34 tipos de parceiros devem perceber a importância de várias estratégias relacionadas com a competência comunicativa de forma diferente. Para algumas crianças e jovens com paralisia cerebral usuários de comunicação suplementar e alternativa isso se torna ainda um desafio. Porém, a família dessas crianças e jovens são figuras centrais para a busca desse ideal, sendo parceiros importantes na intervenção, pois “as crianças não se tornarão usuários competentes de signos gestuais, gráficos e tangíveis sem que os membros da família compreendam e apoiem esse esforço” (VON TETZCHNER; MARTISEN, 2000). Isso se aprofunda na ideia de que as famílias devem ser ensinadas a utilizar formas de comunicação suplementar e alternativa para, transformar as atividades de rotina dessas crianças e jovens com paralisia cerebral tão agradáveis, variadas e interessantes quanto possíveis, pois, a família é norteadora para o desenvolvimento da linguagem e consequente eficácia comunicativa de seu filho (VAN RIPER; EMERICK, 1997). A importância da família no desenvolvimento da comunicação de crianças e jovens usuários de comunicação suplementar e alternativa é relevante, pois a família é o primeiro parceiro comunicativo dessas crianças e jovens. É a família que irá promover as possibilidades de interação social, a apresentação de modelos comunicativos e respostas aos esforços contínuos de comunicação dessas crianças e jovens (ANGELO, 1997). Outros autores também salientaram que a família é um contexto de socialização muito relevante para criança e jovens usuários de comunicação suplementar e alternativa, já que por vários anos foi em muitos momentos o único, bem como, o principal meio que favoreceu o crescimento do funcionamento da interação dessas crianças e jovens com outros contextos. São os pais que possibilitam os contatos sociais da criança com pessoas que não fazem parte da família (BORGES; SALOMÃO, 2003). Desta forma, crianças e jovens com paralisia cerebral usuários de comunicação suplementar e alternativa dependem principalmente de seu contexto familiar para viabilizar a aquisição e o desenvolvimento da linguagem, bem como, proporcionar oportunidades de desenvolvimento e interação social. No entanto, a participação da família não se restringe apenas a esse processo. Conforme referiram Angelo (1997) e von Tetzchner; Martinsen (2000), é necessário que a família aprenda a utilizar o sistema de comunicação alternativa que sua 35 criança ou jovem faça uso para que seja acionada a integração dos recurso de comunicação alternativa em ambiente familiar e na comunidade. A importância da família na implementação do sistema de comunicação alternativa é ainda discutida por outros autores. Diante dessas discussões é possível ponderar a respeito da inserção do sistema comunicação suplementar e alternativa em ambiente familiar. Um estudo que foi conduzido por Mccord e Soto (2004) identificou as percepções de quatro famílias de imigrantes mexicanos que vivem nos Estados Unidos a respeito das habilidades comunicativas de seus filhos e ainda, descreveram o impacto do uso da comunicação suplementar e alternativa na vida dessas famílias. Os participantes do estudo foram as quatro famílias de crianças com idades entre sete e dez anos. Em todas as famílias as crianças faziam uso de sistema de comunicação suplementar e alternativa. Para coletar as informações necessárias as pesquisadoras entrevistaram as famílias participantes, observaram os familiares e seus respectivos filhos em ambientes naturais e revisaram os prontuários, fichas escolares de cada um dos filhos participantes. Após a coleta os dados foram analisados e os achados sugeriram que os recursos de comunicação suplementar e alternativa não foram percebidos pelos membros familiares como facilitadores da interação com os filhos e, além disso, as famílias perceberam que a fluência e a complexidade da conversa com as crianças participantes não melhoraram com o uso do recurso de comunicação suplementar e alternativa. A opinião dos pais, segundo os resultados, foi devida ao fato de os recursos alternativos de comunicação de seus filhos serem confeccionados de acordo com a cultura e a língua norte-americana e os pais, sendo mexicanos, tinham dificuldades em compreender o que o filho queria dizer quando este fazia o uso do recurso. Os familiares informaram também que não foram convidados a participar dos processos de avaliação, seleção e implementação dos recursos de comunicação alternativa de seus filhos, o que dificultou ainda mais o uso desse novo tipo de comunicação em ambiente familiar. No entanto, todas as famílias desse estudo relataram dar valor ao uso do sistema de comunicação alternativa com propósito educativo e em ambientes educacionais. A pesquisa citada reforça que, por vezes, familiares de usuários de comunicação alternativa têm atitudes negativas frente ao uso desse tipo de comunicação por parte de seus filhos. Este tipo de atitude pode estar vinculado aos fatos de esses familiares não terem participado da escolha e da implementação dos recursos, além de 36 não terem suas opiniões e desejos bem formados em relação à comunicação de seus filhos. Segundo Deliberato, (2007b, 2008) identificar a rotina dessas crianças e jovens com necessidades complexas de comunicação por meio de relatório de informações da família e da escola ofereceria aos interlocutores que atuam com essas crianças e jovens com necessidades complexas de comunicação um maior controle durante o processo de implementação de recursos de comunicação suplementar e alternativa. Autores, ainda, enfatizam que as habilidades de comunicação dos diferentes interlocutores com os usuários dos sistemas e a sua capacitação para lidar com a comunicação suplementar e alternativa demonstradas contribuíram para o sucesso no estabelecimento do uso dos diferentes materiais (NUNES, 2003; ALVES, 2006). Nesse sentido, pesquisadores e atuantes na área de comunicação suplementar e alternativa têm demonstrado a preocupação com um conjunto de temas a respeito do uso da comunicação suplementar e alternativa na comunicação com interface da interação social, de forma a considerar que o sucesso na implementação de um determinado recurso ocorrerá quando esse material estiver ampliando a capacidade funcional do usuário de comunicação suplementar e alternativa (PELOSI, 2009). Pensar a respeito da diversidade de aspectos comunicativos da criança e jovem com deficiência frente ao uso do sistema de comunicação alternativa reforça a importância do trabalho não só com as especificidades dessas crianças e jovens, mas também, o trabalho com as necessidades comunicativas dos diferentes interlocutores, como, por exemplo, no caso da família (VON TETZCHNER et. al., 2005; MANZINI; DELIBERATO, 2004, 2007a; DELIBERATO 2008, 2009b; DELIBERATO; MANZINI, 2012). É fundamental que as famílias conheçam a diversidade e a complexidade de seus filhos, desta forma possibilitarão maior compreensão a respeito das estratégias de ensino- aprendizado que deverão ser estimuladas não somente no ambiente escolar, mas especialmente nos ambientes social e familiar para que essas crianças e jovens possam vir a desenvolver efetivamente suas habilidades. Nesse contexto, o trabalho de orientação familiar tem sido objeto de destaque nos programas de reabilitação nas diferentes áreas, mas são escassas as pesquisas ou trabalhos que sistematizam o conteúdo necessário para programas de orientação às famílias de crianças e jovens usuários de sistemas suplementares e alternativos de comunicação. 37 2.3 Família do aluno com paralisia cerebral usuário de sistemas suplementares e alternativos de comunicação A família é o primeiro contexto social da criança, são os seus primeiros educadores e assim serão ao longo de toda a vida (GLAT, 2004). É consenso na literatura que a família é importante no desenvolvimento da linguagem da criança. Os diversos contextos de jovens e crianças com paralisia cerebral influenciam com maior importância as questões do desenvolvimento, mais especificamente ao desenvolvimento da linguagem. Assim, de todas as pessoas envolvidas no processo educacional de crianças e jovens com paralisia cerebral, a família tem papel essencial, principalmente os pais, a base da formação. Independente da cultura ou localização geográfica, a família é o primeiro grupo social do ser humano. A família desempenha papel fundamental e determinante no desenvolvimento da personalidade, atitude e modo de agir do indivíduo, mesmo quando este se encontra na idade adulta. É através das relações estabelecidas entre os integrantes da família e as reações destes integrantes ao seu comportamento, que os filhos têm seu primeiro contato com o mundo e aprendem a desenvolver os papéis e atitudes essenciais ao seu processo de socialização (GLAT ; DUQUE, 2003). A partir da década de 50, iniciam-se mudanças que exigem uma revisão, em todo o mundo, pois, a visão a respeito do processo de aprendizagem e desenvolvimento passou a ter um enfoque sociocultural, histórico e ecológico, com a preocupação dirigida à história e cultura. E nesse sentido, a primeira grande referência quanto à atenção à família da criança deficiente é Patterson (1956) que organizou uma lista de dez recomendações a profissionais em vista da negligência por parte dos familiares, com relação aos dramas vivenciados pela família de crianças deficientes, sintetizando a maneira como a questão da deficiência de seus filhos vinha sendo tratada pelos profissionais da área da saúde. No Brasil, inicialmente, essa preocupação sobre o envolvimento familiar no treinamento dessas famílias passou a existir na década de 70. Um dos trabalhos é o de Marchezi (1973) que retratou os sentimentos vivenciados por esses pais devido ao nascimento de seus filhos deficientes mentais. Quanto às necessidades de programas de atenção à família passou a existir preocupação a partir da década de 80. Um estudo é o de Omote (1980), no qual alerta sobre a necessidade de serviços direcionados a pais de crianças deficientes, argumentando que o ambiente familiar integrado e saudável tem 38 papel capital tanto para o desenvolvimento de crianças deficientes quanto para a saúde mental e qualidade de vida dos demais membros da família. Segundo Dessen e Silva (2004) é muito importante conhecer e definir o tipo de família que está sendo orientada [...] já que o modelo nuclear tradicional de família já não representa a única e/ou a mais importante forma de família nas sociedades ocidentais contemporâneas [...] (DESSEN; SILVA, 2004, p. 181). Para Siaulys et. al.(2010), Cada grupo familiar se apresenta com características muito próprias, com um universo e uma dinâmica de funcionamento e de vinculação emocional muito particulares, expressas no sistema de crenças e valores refletidos nas regras, papéis, símbolos, formas de comunicação e modos de enfrentamento de problemas. (SIAULYS et.al, 2010, p. 94). Ao se tratar da família de crianças e jovens com deficiência é muito difícil para essas famílias assimilarem esse fato. Inicialmente os pais sonham com o filho saudável, forte e quando descobre que esse filho terá limitações que não esperam, a família imaginária construída desaparece e uma nova família terá que ser criada. Com isso, a família passa a vivenciar algumas fases com reações emocionais marcantes (GLAT; DUQUE, 2003). Assim, uma aspecto marcante seria a “[...] facilitação ou o impedimento que a família traz para a integração da pessoa com deficiência na sua própria família.” (GLAT, 1996, p. 111) Portanto, quanto mais integrada as crianças e jovens com deficiência em sua família, mais esta família vai tender a tratá-los com naturalidade, deixando que, na medida de suas possibilidades, participem e usufruam dos recursos e serviços gerais da sua comunidade, consequentemente, essas crianças e jovens com deficiência serão mais integrados na vida social (GLAT, 1996). Quando um aluno não consegue utilizar a fala ou mesmo os gestos para se comunicar, suas possibilidades de interação podem estar limitadas e sua inclusão social e escolar prejudicada. Omote (2001) discutiu essa dificuldade pontuando os prejuízos conseqüentes da limitação na comunicação oral: A limitação na comunicação oral pode ser especialmente prejudicial, não só pelo seu uso constante como mediador imprescindível para a ocorrência e manutenção de relações interpessoais na grande maioria das situações, como também pela sua visibilidade (na realidade, audibilidade), o que torna impraticável qualquer expediente de dissimulação da dificuldade. (OMOTE, 2001, p. 160). 39 Assim, o papel da família mais do que em qualquer outro grupo social apresenta fronteiras individuais e há uma constante troca de afetos, influências mútuas, expectativas e cobranças, conscientes ou não e há conflitos e divergências internas, porém ainda assim, a família se comporta como uma unidade, e tudo o que acontece com um dos membros afeta diretamente todos os demais (GLAT; PLETSCH, 2004). Para Omote: [...] No desempenho do papel de mães, pais, irmãos e irmãs de uma criança que não só pode demandar atenção e cuidados especiais como também pode ser profundamente estigmatizada, podem ser igualmente desacreditados socialmente e necessitar de suporte e orientação para o enfrentamento das dificuldades de natureza psicossocial, que podem ser geradas a partir da atribuição do estigma de cortesia a eles. Significa, então, que atendimento a famílias de deficientes deve pautar-se por uma perspectiva dupla: a de prover condições favoráveis para o desenvolvimento da criança deficiente e a de auxiliar cada familiar a enfrentar as dificuldades decorrentes da sua condição de ser mãe, pai, irmão, irmã de uma criança vista e tratada como desviante, Essas duas razões são solidariamente interdependentes. (OMOTE, 2003, p. xvi). No contexto da diversidade de habilidades comunicativas das crianças e jovens com deficiência é possível perceber que uma parcela da população pode ser incapaz de comunicar-se com outras pessoas. Isso ocorre, como já discutido, seja por meio da fala ou não, como no caso de crianças, jovens com comprometimentos motores, pessoas com deficiência intelectual, crianças com autismo, crianças com atrasos no desenvolvimento da linguagem e pessoas com transtornos do sistema nervoso central congênito ou transtorno adquirido, entre outros (UDWIN; YULE, 1990; VON TETZCHNER; MARTINSEN, 1996; LIGHT, 1997; NUNES, 2003). Embora a área das Tecnologias de Comunicação Alternativa tenha propiciado ações que viabilizem a ampliação e inserção de novas possibilidades comunicativas para as crianças e jovens com deficiência, o uso dos sistemas suplementares alternativos de comunicação ainda está restrito a centros de reabilitação e clinicas de atendimentos especializados (DELIBERATO, 2009a, 2010). Nesse sentido, as famílias devem ser orientadas e inseridas nos programas de intervenção frente às especificidades de seus filhos para que as novas habilidades sejam compartilhadas de forma funcional no processo de inclusão em um grupo maior de pessoas de seu convívio social (DELIBERATO, MANZINI, GUARDA, 2004). Von Tetzchner e Grove (2003) apontaram para a necessidade dos ambientes naturais, como, por exemplo, a necessidade de o ambiente familiar ser capacitado para o uso de linguagens alternativas para que, as diferentes pessoas possam compartilhar 40 práticas comunicativas com as crianças e jovens com deficiência. O modelo do ambiente para o uso da linguagem alternativa poderá contribuir para que a criança com deficiência conquiste sua competência linguística (SMITH, 2003; VON TETZCHNER; GROVE, 2003; DELIBERATO; MANZINI, 2012). Autores como Von Tetzchner e Martisen (2000) afirmaram que os pais e irmãos de crianças com severas alterações de comunicação são figuras centrais na vida das crianças, sendo parceiros importantes na intervenção. Sobre isso, escreveram: “[...] as crianças não se tornarão utilizadores competentes de signos gestuais, gráficos e tangíveis sem que os membros da família compreendam e apoiem esse esforço.” (VON TETZCHNER; MARTISEN, 2000, p. 67). É necessário, então, que a família perceba que os recursos de comunicação suplementar e alternativa permitem às crianças e jovens com deficiência a possibilidade de desenvolverem habilidades para comunicação. Isso aperfeiçoa suas possibilidades de interação e integração social, bem como as possibilidades de expressão, afetividade e melhoria da qualidade de vida. Desta forma, pode -se dizer que a família é essencialmente importante no processo de seleção de vocabulário ou mesmo na identificação de comportamentos comunicativos da criança com deficiência, seja para determinar as palavras e/ou comportamentos comunicativos ou mesmo para expressar suas vontades durante as atividades de sua rotina (DELAGRACIA, 2007; DELIBERATO; MANZINI, 2012). Pesquisa discutem ainda que a participação efetiva da família pode: gerar e manter o comportamento comunicativo nos filhos, tanto em situações escolares quanto no lar (REICHLE, 1997); garantir, cientificamente, o avanço do desenvolvimento comunicativo dos filhos (HETZRONI; LANDAU; BEM-ZVI, 2000). Apesar desses resultados positivos, Parette e Angelo (1996) apontaram que poucas famílias estão envolvidas no processo de avaliação e implementação de sistemas de comunicação alternativa. Eles observaram também que são escassos os estudos direcionados a sistematização de programas de orientação a famílias de crianças e jovens com deficiência e severa complexidade de comunicação. Os avanços na tecnologia têm ampliado o uso dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa para a criança com deficiência, seja no ambiente escolar ou em casa, porém, esses sistemas são muitas vezes inconsistentes quanto à permanência do uso. Portanto, a visão da família proporciona benefícios para o usuário de sistemas 41 de comunicação alternativa nos diversos ambientes, sejam eles escola ou em casa (BAILEY et.al., 2006). As vozes da família estão sendo cada vez mais enfatizadas durante o processo de planejamento das tecnologias de comunicação alternativa para crianças com deficiências. A sensibilidade profissional quanto às questões familiares referentes à tomada de decisões a respeito dos sistemas de comunicação alternativa é essencial para bons resultados (PARETTE et.al., 2000). Parette et. al. (2000) argumentam que o profissional deve entender as especificidades de cada criança com deficiência e as condições dos ambientes naturais, como no caso do ambiente familiar, bem como as dificuldades e os pontos fortes de cada unidade familiar. Os autores ainda discutem que é importante dar a voz à família na tomada de decisão sobre os sistemas de comunicação alternativa. Angelo, Jones e Kokoska (1995) também discutiram que tanto pais como mães de crianças e jovens usuários de sistemas de comunicação suplementar e alternativa compartilham a necessidade em aumentar o conhecimento a respeito dos sistemas e recursos de comunicação suplementar e alternativa, em vista, das futuras necessidades de comunicação de seus filhos. Nesse contexto de discussão, os mesmos autores alertaram que o uso do recurso por parte da criança ou jovem com deficiência depende do envolvimento e da participação efetiva da família. Segundo Jones, Angelo e Kokoska (1998) as famílias indicam necessidades de orientação sistematizada e muitas delas conhecem a necessidades de seus filhos, mas não sabem como trabalhar com a tecnologia de comunicação alternativa. Nesse contexto, as famílias acabam abandonando o uso dos recursos devido ao stress e à frustração decorrentes da falta de orientações. Embora a orientação familiar seja tema de discussão entre pesquisadores e profissionais da área da comunicação suplementar e alternativa, quer do ponto de vista da capacitação de interlocutores frente a um novo sistema de representação para a linguagem (VON TETZCHNER; GROVE, 2003; VON TETZCHNER, 2009; DELIBERATO; MANZINI, 2012) quer do ponto de vista do envolvimento enquanto parceiro de comunicação (WALSH; MCNAUGHTON, 2005; WINE, 2007), trabalhos ou pesquisas a respeito de material impresso sistematizado de orientação para famílias de crianças e jovens com paralisia cerebral usuários de sistemas de comunicação suplementar e alternativa são escassos. 42 Estudo revela que pais de crianças e jovens com paralisia cerebral usuários de sistemas de comunicação suplementar e alternativa discutiram os benefícios e desafios a respeito da aprendizagem no uso dos recursos e sistemas de comunicação suplementar e alternativa. As discussões identificaram como temas relevantes questões relacionadas à seleção dos sistemas e recursos de comunicação suplementar e alternativa; o conhecimento e habilidades dos pais para utilização dos recursos e sistemas; as barreiras na aprendizagem dos próprios pais a respeito dos recursos e sistema; o ensino à sociedade para entender e aprender sobre os recursos e sistemas e recomendações a respeito do tema. Suportes importantes para oportunizar o uso funcional da família e da comunidade referente aos sistemas de comunicação alternativa (MCNAUGHTON et.al., 2008). O estudo descrito reforça a necessidade de suportes que proporcionem orientações às famílias segundo suas necessidades, bem como, a importância de orientações acerca das tecnologias de comunicação alternativa para tornar o uso dos sistemas funcional. As famílias de crianças usuárias de comunicação suplementar e alternativa necessitam do apoio de uma infinidade de áreas para facilitar o uso dos sistemas com seus filhos. Por isso, a orientação à família deve ser realizada de forma cuidadosa e bem detalhada, pois o aprendizado a respeito do uso dos sistemas de comunicação suplementar e alternativa pode ser difícil de reter e processar, assim retardando ou impedindo a implementação de tecnologias de comunicação alternativa (WINE, 2007). Essa discussão leva a pensar que a sistematização de programas de orientação a famílias é um fator crítico que contribui para o êxito da intervenção para o uso das tecnologias de comunicação suplementar e alternativa. Muitos são os indicativos de que as famílias são importantes na obtenção de resultados positivos no uso das tecnologias de comunicação alternativa. Os profissionais da saúde e educadores precisam compreender como os sistemas de comunicação suplementar e alternativa afetam não somente o usuário, mas toda a família (ANGELO, 2000). Angelo (2000) descreveu que as implicações para a intervenção e a orientação familiar realizada pelos profissionais devem ser discutidas para promover resultados positivos na efetividade do uso dos sistemas de comunicação alternativa pelas famílias. 43 Estudos têm mostrado que a participação da família não se limita apenas ao emprego das tecnologias de comunicação suplementar e alternativa por criança e jovens usuários desses sistemas; eles têm ressaltado a necessidade de a família aprender, ela própria, a utilizar esses sistemas, com intuito de dar início à generalização dos mesmos sistemas no ambiente familiar, escolar e na comunidade (BASIL, 1992; ANGELO; JONES; KOKOSKA, 1995, 1996; PARETTE; ANGELO, 1996; PENNINGTON; MCCONACHIE, 1999; GOLDBART; MARSHALL, 2004; MCCORD; SOTO, 2004; WALSH; MCNAUGHTON, 2005; MCNAUGHTON et.al., 2008). Diante de tal quadro, o papel dos profissionais da saúde e educação é fundamental para inserir as famílias no contexto da diversidade de possibilidades de comunicação e promover orientações e esclarecimentos sobre as capacidades do filho especial, bem como provocar um olhar dos pais sobre si mesmos. Segundo Glat: O apoio dado à família minimiza as ansiedades frente ao filho portador de necessidades especiais, e promove a busca de novas alternativas para a organização da vida dessa criança, possibilitando um enfrentamento dos problemas cotidianos. (GLAT, 2004, p.4). O direito da criança e jovem com deficiência e severa complexidade de comunicação está contemplado nas políticas públicas e deve tornar-se elemento comum à cultura social. Toda a sociedade deve empenhar-se em romper as barreiras comunicativas e em colaborar na promoção de uma cultura da comunicação da qual todos possam se beneficiar, inclusive as pessoas com grave deficiência verbal e graves dificuldades comunicativas (GAVA, 1999). A pessoa com deficiência necessita ter o domínio da língua natural do seu meio, mas terá que aprender um sistema de representação que lhe possa garantir a qualidade de novos aprendizados e, com isso, propiciar o acesso à comunicação com diferentes pessoas (DELIBERATO, 2007a). Para isso é necessária a obtenção da competência comunicativa, sendo que para garantir o seu sucesso, é importante que ocorra a interação do conhecimento e habilidades entre quatros domínios - linguístico, operacional, social e estratégico. Crianças e jovens usuários de comunicação suplementar e alternativa podem enfrentar desafios para desenvolvê-la, uma vez que é necessário que antes adquiram conhecimentos e habilidades de linguagem receptiva no idioma nativo da sua família e da comunidade social, pois os parceiros de comunicação raramente falam usando a comunicação suplementar e alternativa. Além disso, as crianças também precisam ter 44 conhecimentos e habilidades de linguagem receptiva e expressiva no código linguístico dos sistemas alternativos de comunicação que utilizam. O domínio operacional aparece como necessário para acessar ou produzir os símbolos de comunicação suplementar e alternativa, ou seja, refere-se às habilidades para a produção técnica e operação dos sistemas de baixa ou alta tecnologia. Nelas incluem-se as habilidades para produzir movimentos, posições, orientações, formas de mão e de corpo, por isso dependem das capacidades motora, cognitiva, linguística e sensório-perceptiva dos usuários. O social envolve as habilidades para usar efetivamente as ferramentas de comunicação suplementar e alternativa para a comunicação com os indivíduos do meio social que o usuário está inserido. Por fim, o estratégico é necessário para minimizar as limitações nos domínios linguístico, operacional e social. As estratégias utilizadas pelo usuário de comunicação suplementar e alternativa podem ser temporárias ou de longo prazo (LIGHT, 2003). As habilidades proporcionam, portanto, o discurso efetivo, as funções comunicativas, a interação e o interesse aos parceiros de comunicação. Possibilitam ainda a atração dos parceiros nas interações, a manter um contato positivo com os parceiros e a projeção de uma imagem positiva do usuário de comunicação suplementar e alternativa (LIGHT, 2003). Portanto, o grande desafio é para o desenvolvimento da competência linguística. A competência linguística é mais desafiadora para as crianças que usam comunicação suplementar e alternativa, segundo Light (2003) por pelo menos três razões: 1. existe uma diferença significativa entre o input de linguagem recebida pelos usuários de comunicação suplementar e alternativa e o output utilizado por eles; 2. a comunicação por meio da comunicação suplementar e alternativa combina vários códigos linguísticos para expressar significados (por exemplo, sinais manuais, gestos convencionais, fotos, símbolos gráficos); e 3. a muitos sistemas de comunicação suplementar e alternativa faltam aspectos fonológicos, semânticos, sintáticos e ou pragmáticos. Nesse sentido, a autora argumentou que indivíduos com mínima competência linguística “[...] poderiam expressar necessidades básicas por meio das habilidades não simbólicas, como o choro, olhar, expressões faciais, mas seriam incapazes de compartilhar com outros interlocutores, ideias, sentimentos e pensamentos mais complexos.” (LIGHT, 2003. p. 3). 45 Os familiares não sentem a necessidade de compreender a forma da comunicação dos usuários de comunicação suplementar e alternativa, principalmente quando estes apresentam boa compreensão da linguagem oral, daí resulta uma comunicação de sentido único, ou seja, apenas a intenção comunicativa do interlocutor para o usuário de comunicação suplementar e alternativa (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). A família necessita de um aprofundamento referente aos conhecimentos sobre a comunicação suplementar alternativa e isso é de grande importância, tanto entre as pessoas que convivem com o usuário de comunicação suplementar e alternativa como, por meio da formação e orientação sistemática desses familiares, amigos e profissionais (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). Ainda, para os autores, Como o processo de aquisição de um sistema alternativo de comunicação costuma ser lento e laborioso, a formação e o apoio à família, aos amigos e aos profissionais ocorre a longo prazo. A formação e o treino torna todos melhores interlocutores, fazendo dos indivíduos melhores comunicadores, o que sucinta novas necessidades de formação à equipe e aos familiares. (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000, p. 262). Isso mostra que o contexto linguístico só será possível por meio da interação com um contexto que apoia a linguagem, sendo a família um dos contextos que geralmente rodeiam esses jovens e crianças usuários de Comunicação suplementar e alternativa a família (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000). Quanto a competência linguística, ainda, segundo Von Tetzchner e Martinsen: As crianças não se tornarão utilizadores competentes de signos gestuais, gráficos e tangíveis sem que os membros da família compreendam e apoiem esse esforço. As famílias precisam de conhecimento sobre as possibilidades comunicativas das crianças e têm de saber comunicar com elas, ou seja, aprender a usar estratégias que suscitem nelas a iniciativa de comunicar e a participação em diálogos com conteúdo real. (VON TETZCHNER; MARTINSEN, 2000, p. 267). Nesse sentido, é possível inserir as discussões referentes a “educação familiar”, ou seja, processo educativo no próprio grupo familiar (DESSEN; SILVA, 2004, p. 186). Kaiser et. al. (1999) discutiu a respeito da educação de pais, definindo o termo parent education como “o fornecimento sistemático de informações a pais com o objetivo de dar suporte e de estimular o desenvolvimento de seus filhos” (KAISER et. 46 al.,1999, p. 2). Ainda, é possível compreender segundo os mesmos autores que ”o fornecimento de informações deve acontecer em função da necessidade da família quanto a conteúdos específicos e os métodos de informação devem estar de acordo com o estilo de aprendizagem, educação e cultura de cada pai individualmente” (KAISER et. al.,1999, p. 2). Diante desses aspectos, é possível considerar o empoderamento uma proposta em dar poder para aqueles indivíduos tradicionalmente definidos como receptores de ajuda (RAPAPPORT, 1986). Sight et. al. (1995) definiu o empoderamento [...] processo pelo qual as famílias têm acesso ao conhecimento, às habilidades e aos recursos que as tornam capazes de adquirir controle positivo sobre suas vidas, como também, de melhorar a qualidade de seu estilo de vida. (SIGHT, et. al, 1995, p.85). A família torna-se empoderada quando “[...] a família passa de uma posição passiva (de ser mera receptora de serviços) para ser agente de transformação social, capaz de mudar e enfrentar com dignidade as múltiplas adversidades da vida [...]” (WILLIAN; AIELLO, 2004, p. 201). Para Omote (2010) o conceito de empoderamento de famílias significa: [...] dar poder de decisão às famílias que tradicionalmente vêm sendo vistas e tratadas como constituídas por pessoas que recebem ajuda baseada em decisões tomadas unicamente pela equipe de profissionais. Recomenda-se agora que os pais participem do processo de t