UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA CONTROLE VISUAL DE AUTOMÓVEIS EM CURVAS EM SITUAÇÃO SIMULADA: EFEITOS DA EXPERIÊNCIA EM CONTEXTO REAL Gabriel Keine Kuga BAURU 2016 GABRIEL KEINE KUGA CONTROLE VISUAL DE AUTOMÓVEIS EM CURVAS EM SITUAÇÃO SIMULADA: EFEITOS DA EXPERIÊNCIA EM CONTEXTO REAL Orientador: Sérgio Tosi Rodrigues BAURU 2016 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Educação Física da Faculdade de Ciências do Campus de Bauru, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte do requisito para obtenção do grau de Bacharel em Educação Física. AGRADECIMENTOS Primeiramente, gostaria de fazer um agradecimento especial a todos os membros do LIVIA pela recepção desde o primeiro dia em que entrei no Laboratório. Foi um período muito especial e de muito aprendizado. E quando digo aprendizado, não me refiro apenas a questões acadêmicas, mas também de conduta para a vida. Se pudesse dividir minha graduação em duas metades, certamente seria antes e depois de entrar para o Laboratório. Sou e sempre serei muito grato ao Laboratório e os membros. Agradeço muito especialmente ao meu orientador, Professor Sérgio Tosi Rodrigues, que me acolheu em um momento que não tinha muito rumo no curso de graduação, precisava iniciar um projeto de TCC e queria desenvolver um projeto de Iniciação Científica, mas sem nem saber por onde começar ou o que fazer. O Professor Sérgio me abriu as portas do Laboratório e as coisas foram se encaixando aos poucos. Foram muitas lições valiosíssimas, mas uma das mais importantes e que certamente levarei para toda vida é a importância do trabalho duro, não importa qual for a adversidade, de cumprir as responsabilidades e sempre ser solícito e humilde com seja quem for. Às vezes tudo que uma pessoa precisa é que alguém lhe ofereça uma oportunidade. Sempre agradeci, mas acho que sempre é necessário dizer mais uma vez “Obrigado Professor”. Um agradecimento também muito especial a colega e amiga Gisele, que no início, com muita paciência, mostrou e explicou como funciona o Laboratório e cada equipamento, o que faz e para que serve. Espero não ter dado muito trabalho, aposto que tiveram piores (risos). Sempre é muito bom discutir ideias contigo, acho que você tem uma visão muito privilegiada sobre as coisas e respeito muito sua opinião, mesmo que seja diferente da minha, porque para você não basta apenas afirmar uma coisa, mas sim apresentar argumentos e espero que ensine isso aos seus futuros orientandos para construir uma sociedade melhor. Sempre respeitando todo mundo e se matando para socorrer todo mundo, mesmo que já tenha prometido para si mesma 100000 vezes não fazer mais isso. Te desejo todo sucesso Gi e aposto que terá uma carreira brilhante pela frente. Agradeço muito também à Professora Paula Polastri e ao Professor Fábio Barbieri por sempre estimularem os alunos com sugestões, críticas e perguntas. Sempre que apresentava alguma coisa no Laboratório, ficava aquele frio na barriga de que tipo de pergunta cabeluda iria vir, o que no fundo sempre me levou a me preparar um pouco melhor. Acho que fui levando um pouco disso para todo o resto da vida acadêmica, e aos poucos fui melhorando. Talvez tenha deixado de ser um aluno muito ruim para ser apenas ruim agora (risos). Bem que dizem que todo estímulo provoca uma resposta. Obrigado Professores. Agradecimento aos companheiros de turma e amigos Gabriel Claus, Lucas Alarcon e Rodrigo Araujo pela parceria em todos os infinitos trabalhos, seminários, estágios, relatórios, e etc, etc, etc. Não fosse pela parceria não teria como acabar esse curso, ou ainda teríamos uns bons anos pela frente. Espero que a gente se encontre bastante ainda. Ou não, porque não aguento mais olhar pras caras feias de vocês todo dia. Um forte abraço a todos vocês e sucesso nas carreiras e na vida, tenho certeza que vão conseguir tudo o que almejam. Agradeço também a todos os professores do Departamento de Educação Física da UNESP de Bauru por todos os ensinamentos, foi um privilégio ter aula com vocês. Agradecimento especial a Professora Sandra por toda didática e atenção no ensino, outro dia ouvi a frase “poucos tem o dom de ensinar” e com certeza você tem esse dom. Obrigado, Professora. Agradeço ao amigo Bruno pela amizade de longa data e pelo companheirismo durante todo esse tempo. Certamente todas as festas me atrapalharam muito para desenvolver qualquer produtividade acadêmica e não vão me dar futuro nenhum, mas valeu mesmo assim. Tamo junto brunão! E aquele abraço também para os amigos Pedro e Matheus (garapa), pessoas muito especiais que estiveram presentes durante este período. Muito sucesso e paz a vocês! Também agradeço a prope/UNESP Reitoria e ao CNPq pela bolsa de iniciação científica que muito me auxiliou durante o curso de graduação e também para desenvolver este projeto. Agradeço aos participantes desta pesquisa pela colaboração e também a todos aqueles que de alguma maneira estiveram presentes durante este período. Por fim, e não menos importante, agradeço a meus pais por todo carinho e suporte durante estes anos todos de caminhada e luta. Todos os ensinamentos estão aqui e levarei comigo para sempre, esteja onde estiver. Obrigado. DEDICATÓRIA Dedico este e todo trabalho que desenvolver ao longo da vida ao meu melhor amigo que foi para o céu este último ano, Tota. Para quem não conhece o amor verdadeiro, faça amizade com um cachorro. Não há um dia em que não venha a lembrança e não escorra uma lágrima de saudade. RESUMO Dirigir é uma tarefa altamente complexa que requer sincronia entre informações adquiridas e comandos motores, sendo a visão fonte primordial de recursos para o controle do volante por parte do motorista, para que este possa fazer a manobra na quantidade correta e no momento apropriado. Simulações nem sempre preservam os aspectos relevantes do ambiente. O ponto tangente (PT), local mais interno da curva, é onde os motoristas olham em situações de curva ao conduzir um veículo durante contexto natural, e, de acordo com a literatura, este fenômeno também ocorre em situações experimentais com o uso de simuladores específicos de trânsito. Este estudo visa verificar se este comportamento se reproduz em situação simulada de videogame e como a experiência de dirigir naturalmente afeta o desempenho na simulação. Foram recrutados vinte participantes, divididos em dois grupos de dez pessoas cada, com e sem Carteira Nacional de Habilitação e todos com experiência em videogame. A tarefa foi conduzir um veículo em circuito gerado por um jogo de videogame, enquanto seus olhos, e seus respectivos movimentos, foram monitorados e gravados por sistema eye-tracker. Para análise dos dados, foi utilizado o vídeo da imagem gerada pelo videogame com a adição do cursor referente ao olhar do participante. Foram analisadas apenas as situações nas quais os participantes executavam a manobra de cada uma das onze curvas do percurso, utilizando o software ASL Results Plus (versão 1.8.2.18) para estabelecer Áreas de Interesse (AI) de 3º e 10º ao redor do ponto tangente da curva. As variáveis dependentes foram Número Total de Fixações (NF) e Duração Total das Fixações (DF). Os dados foram submetidos à análise de variância de medidas repetidas, tendo fatores grupo (HA ou NH), AI (outros 3º ou 10º) e curvas (onze curvas). Não houve efeito significativo de grupo para ambas as variáveis dependentes. Houve efeito principal de AI e curvas para ambas as variáveis, sendo que os participantes realizaram mais fixações e por mais tempo na AI de 10º e outros do que na AI de 3º. Houve interação entre AI e curva para NF, indicando que as características da curva podem influenciar o comportamento do olhar do motorista. Os resultados sugerem que os participantes não utilizaram preferencialmente a visão focal para obter a informação visual do ponto tangente da curva, mantendo a projeção de PT na parafóvea, que envolve a região mais periférica da retina ao redor da fóvea; a experiência dos participantes em jogar videogame pode ter modulado o comportamento de olhar de maneira a utilizar tal recurso para captar informação durante a manobra da curva, justificando a maior utilização da AI de 10º durante o experimento. PALAVRAS CHAVE: Dirigir, Simuladores, Videogame. SUMÁRIO Página Resumo ...................................................................................................................................... 3 1. Introdução ............................................................................................................................. 6 2. Objetivos ............................................................................................................................. 10 3. Método ................................................................................................................................ 10 3.1 Participantes .......................................................................................................... 10 3.2 Equipamentos ........................................................................................................ 10 3.3 Procedimentos ....................................................................................................... 12 3.4 Análise e Tratamento dos Dados ........................................................................... 13 3.5 Variáveis Dependentes .......................................................................................... 14 3.6 Análise Estatística ................................................................................................. 14 4. Resultados ........................................................................................................................... 14 5. Discussão ............................................................................................................................ 17 6. Conclusão ........................................................................................................................... 20 7. Referências ......................................................................................................................... 21 Apêndice A ............................................................................................................................. 25 Apêndice B .............................................................................................................................. 27 Lista de Tabelas e Figuras Página Figura 1 – Modelo e Diagrama do Ponto Tangente ................................................................ 12 Figura 2 – Circuito percorrido pelos participantes .................................................................. 13 Figura 3 – Número Total de Fixações por AI ......................................................................... 15 Figura 4 – Duração Total das Fixações por AI (em segundos) ............................................... 16 Tabela 1 – Média e Desvio Padrão do Número Total de Fixações por curva ......................... 15 Tabela 2 – Média e Desvio Padrão da Duração Total das Fixações por curva ....................... 16 6 1. INTRODUÇÃO A habilidade de dirigir um automóvel é fundamental hoje em dia para facilitar a logística de transporte de motoristas e seus passageiros, exigindo fina coordenação de diversas partes do corpo e trabalho do sistema cognitivo (MOURANT & ROCKWELL, 1972; BALL et al., 2010). Dirigir envolve processar informações, tomar decisões importantes em tempos mínimos e ajustar o controle motor às demandas ambientais. Eventualmente este processo pode não ocorrer adequadamente e acidentes de trânsito acontecerem, sendo que alguns destes podem ser causados por imperícia do condutor em obter as informações importantes da cena visual disponível, analisá-las e interpretá-las corretamente, tomar a decisão adequada e, por fim, emitir a resposta motora desejada. Dirigir eficientemente requer que os braços e as mãos sejam guiados pela informação visual para poder girar o volante na direção apropriada e, assim, manter o veículo na pista com a direção correta (OWSLEY & McGWIN JR., 2010). Devido a essa necessidade de rápida obtenção de informações do ambiente, o ato de dirigir é uma tarefa altamente visual (MOURANT & ROCKWELL, 1972; OWSLEY & McGWIN JR., 2010; COUTTON-JEAN et al., 2009; AUTHIÉ & MESTRE, 2011), e esta interação entre visão e direção tem sido amplamente estudada, tanto em situações laboratoriais, fazendo uso de simuladores, como em situações reais. Os simuladores utilizados experimentalmente são capazes de criar uma experiência virtual de dirigir, enquanto que nas situações reais são filmados a visão e o olho do participante enquanto dirige um carro em determinado percurso, sendo possível através de equipamento de monitoramento e rastreamento do olhar. Este mesmo equipamento é utilizado em situação de laboratório quando se faz uso de simulador; a diferença é que na situação real existe necessidade de adaptação ao veículo que será conduzido. Os estudos experimentais envolvendo os movimentos dos olhos durante a condução de veículos se iniciou em 1968, quando Rockwell, Overby e Mourant fizeram estudo piloto para testar a calibração de equipamento inovador para o nível tecnológico da época, que possibilitou o monitoramento e gravação dos movimentos dos olhos de motoristas ao dirigirem automóveis em contexto natural (SHINAR, 2008). Os resultados mostraram que os movimentos da cabeça, a distância percorrida e as sessões, referentes à tarefa, não apresentaram efeito significante na calibração, permitindo pesquisas posteriores a respeito do comportamento visual de motoristas. 7 Este sistema foi um primeiro passo para saber onde os motoristas olham para obter informação (SHINAR, 2008). Mourant e Rockwell (1970) fizeram o mapeamento dos padrões dos movimentos dos olhos da cena visual, em contexto natural, de oito motoristas, com devido documento de habilitação para dirigir e sem histórico de acidentes, entre 21 e 31 anos. Os objetivos foram estudar os efeitos da familiarização do percurso nos mecanismos de busca e reconhecimento do motorista, identificar os tipos e locais utilizados para obter informação e determinar se havia diferença em obter informação entre dirigir seguindo um veículo ou à vontade. Concluíram que: (i) a familiarização com o trajeto fazia com que as direções dos movimentos dos olhos do motorista se compactassem em torno do centro e esquerda do motorista; (ii) a função da visão periférica foi analisar a sinalização de trânsito, o tráfego de outros veículos e a posição na pista, mantendo a posição da fóvea para analisar situações que exigiam maior detalhamento da informação para tomada de decisão; (iii) o papel da experiência em utilizar as informações visuais periféricas foi fundamental pela menor acuidade proporcionada pelas regiões periféricas do olho. Durante a condição de seguir um veículo, as fixações se concentravam mais neste veículo e menos nos sinais de trânsito do que na condição de dirigir à vontade, sugerindo uma confiança no veículo líder para determinar a rota do percurso. Os padrões dos movimentos dos olhos de motoristas se modificam com a experiência, passando a selecionarem os alvos mais relevantes para o olhar (visão focal) e conseguindo fazer uso da visão periférica para monitorar a posição do próprio veículo na pista, tráfego e sinalizações de trânsito, assim como utilizando com mais eficiência os equipamentos disponíveis, como os espelhos retrovisores (KONSTANTOPOULOS, CHAPMAN & CRUNDALL, 2010). A falta de experiência justifica a maior probabilidade de acidentes envolverem motoristas jovens ou inexperientes, com a habilitação recém adquirida (MAYCOCK, LOCKWOOD & LESTER, 1991; CHAPMAN, UNDERWOOD & ROBERTS, 2002; McKNIGHT, J. & McKNIGHT, S., 2003). Naturalmente, observações sobre os padrões dos movimentos dos olhos de motoristas só foram possíveis pelo aperfeiçoamento dos equipamentos de rastreamento do olhar, os eye- trackers, possibilitando portabilidade para uso em situação natural de dirigir um automóvel, abrindo margem para uma ampla gama de pesquisas na área, cada vez mais sofisticadas. Nesta linha, Land e Lee (1994) investigaram tais padrões visuais em um trajeto de pista sinuosa para verificar onde os motoristas olham em situações de curva, e verificaram que estes olham para 8 um ponto interno da curva, denominado ponto tangente (PT), de 1 a 2 segundos antes e durante a execução. Este ponto tangente é relativo a cabeça do motorista e prediz a curvatura da pista, conforme descrito na Figura 1, contendo modelo proposto por Land (2006), baseado no estudo de Donges (1978): Neste contexto de feedforward, que consiste no mecanismo antecipatório da curvatura da pista, este exige precisa calibração para ser efetivo, ao passo em que o sinal de feedback, mecanismo compensatório, envolve apenas a execução de uma ação até que alguma condição desejável seja atingida. Na antecipação, o motorista precisa aprender a relacionar a aparência da pista com a distância e o tempo anterior à curva em que deve girar o volante. Caso haja algum erro neste processo, o mecanismo de correção (feedback) é acionado para que o veículo possa retornar ao centro da pista. Isto se dá para evitar a hipotética e errática situação do veículo já estar fora da pista, acionar o mecanismo de feedforward e realizar a manobra do volante na mesma angulação da curvatura da pista, deixando de realizar a correção para que o veículo retorne ao centro da pista. O ponto tangente possui a função de alimentar o mecanismo de feedforward, mas também é possível, para o motorista, controlar o volante quando este ponto não está disponível ou quando simplesmente olha para outro lugar da pista (LAND & HORWOOD, 1995). Acontece que este controle se torna menos preciso, fazendo com que o ponto tangente se torne 9 a fonte de informação preferida, mesmo não sendo a única (KANDIL, ROTTER & LAPPE, 2009). A observação destes padrões, originalmente obtidos pelo monitoramento do olhar de motoristas em condição natural (exceto o estudo de Donges, que em 1978 já fez uso de simulador), é corroborada por resultados obtidos através do uso de simuladores, mas pouco existe na literatura sobre o comportamento visual de pessoas ao jogarem videogames, mais especificamente em jogos de corrida de automóvel, capazes de criarem situações cada vez mais realistas, com o avanço da tecnologia eletrônica e computacional, e compatíveis com a sensação de conduzir um veículo. Videogames são produtos de ampla utilização pela população para usufruírem de seus momentos de lazer. Cerca de 56 milhões de pessoas fazem uso de computador ou videogame no Brasil, o que equivale a 29,6% da população (IBGE, 2010). Em pesquisa mais específica a jogos de videogame promovida pelo instituto IBOPE (2012), 23% dos entrevistados declararam jogar videogame ou algum tipo de jogo eletrônico ao menos ocasionalmente, sendo que 10% preferem o gênero de jogos de corrida. Portanto, uma parcela considerável da população brasileira tem acesso a este recurso. Ciceri e Ruscio (2014) compararam os padrões visuais de jogadores de videogame com e sem habilitação, exibindo dois vídeos de trajetos semelhantes, sendo um real e outro proveniente de um jogo de videogame (os participantes apenas observavam e movimentavam volante/pedais como se estivessem dirigindo, mas não chegaram a conduzir, ao menos virtualmente, um veículo), e verificaram que os jogadores habilitados reproduziram no vídeo do cenário virtual o mesmo padrão de busca visual realizado no vídeo em um cenário real, enquanto os não-habilitados ignoraram sinais de trânsito e outros veículos na cena. As vantagens de se utilizar um simulador para pesquisar o comportamento de motoristas, segundo Davenne et al. (2012), se constituem por ser método seguro de observar situações possivelmente perigosas para o motorista, oferecer possibilidade de controle da situação experimental, isolando fatores intervenientes, para avaliar apenas o que se deseja observar e por economia de tempo e dinheiro em relação a protocolos para testes de condução de veículos em situação natural. O presente estudo é importante para investigar o comportamento visual de motoristas, na busca de soluções em termos de pesquisa para subsidiar cientificamente a segurança de 10 trânsito. Sendo assim, seria possível que uma pesquisa feita utilizando um videogame como ferramenta de simulação de dirigir forneça resultados semelhantes aos que seriam obtidos com o participante dirigindo um veículo real ou um simulador? 2. OBJETIVOS Os objetivos do presente estudo são analisar o controle do olhar durante situação simulada de conduzir um veículo em situações de curvas em videogame, e os efeitos da experiência de dirigir em situação real. Adicionalmente, este estudo busca verificar e atestar a possibilidade do uso do videogame como opção metodológica para estudo de simulação de dirigir. 3. MÉTODO 3.1. PARTICIPANTES Foram recrutados para participar do estudo de modo voluntário vinte participantes, divididos igualmente entre os grupos Não Habilitados (NH; média de idade 19,5 ± 3,74 anos) e Habilitados (HA; média de idade 24,5 ± 2,36 anos). Os critérios de inclusão foram os seguintes: (i) não possuir histórico de problemas musculares, neurológicos, posturais e locomotores; (ii) possuir acuidade visual normal ou corrigida para normal através do uso de óculos ou lentes; (iii) possuir experiência declarada com jogos de corrida em videogames; (iv) apenas para o grupo HA: possuir Carteira Nacional de Habilitação há no mínimo um ano. A participação de todos voluntários foi condicionada à autorização por escrito, através do termo de consentimento livre e esclarecido, devidamente aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da UNESP – Campus de Bauru. 3.2. EQUIPAMENTOS SISTEMA DE MEDIDAS DO MOVIMENTO DOS OLHOS E DA CABEÇA Foi utilizado sistema integrado de rastreamento de movimentos dos olhos e da cabeça de marca Applied Sciences Laboratories (ASL, modelo H6), que tem acurácia de 1° de ângulo visual e é monocular, funciona detectando a posição da pupila e da reflexão da córnea (uma 11 pequena fonte de luz quase infra-vermelha refletida na superfície da córnea) numa imagem de vídeo do olho (RODRIGUES, 2001), usando reflexões na parte interna de um visor acoplado a um suporte fixo à cabeça de quem usa o sistema. As posições relativas da pupila e da reflexão na córnea são identificadas em tempo real por um programa de computador (pertencente ao conjunto do sistema ASL), com base nos seus distintos níveis de contraste. A seguir, os centróides da pupila e da reflexão da córnea são calculados e suas coordenadas horizontais e verticais (em unidades de vídeo) são usadas para determinar a linha do olhar em relação ao sistema óptico do aparato. Com base na posição da linha do olhar e em informações oriundas do procedimento de calibração, o sistema gera um cursor que é adicionado a cada quadro de imagem da câmera da cena, para indicar onde o participante está olhando naquele instante (RODRIGUES, 2001). Foi utilizada, além da imagem do olho, uma segunda imagem que corresponde ao vídeo gerado pelo videogame, com a projeção do cursor referente à onde o participante está olhando na tela, em forma de interseção dos eixos horizontal e vertical no vídeo. Isto foi possível por aparelho conversor de sinal de vídeo RCA (gerado pelo videogame) para VGA (reconhecido pelo computador e software do sistema ASL). A frequência de aquisição de dados foi de 60 Hz. PROJETOR MULTIMÍDIA, TELA, VIDEOGAME, SOFTWARES E EQUIPAMENTOS Foi utilizado um videogame modelo Playstation 2, produzido pela empresa Sony, combinado com o jogo Gran Turismo 4 (Sony e Polyphony Digital, Tóquio, Japão) e conectado com o conjunto de volante/pedais/câmbio de marca/modelo Logitech G27. Foi conectada de maneira auxiliar uma televisão, marca Sony (Modelo Triniton KV-29I76), apenas para fins de áudio, com o objetivo de manter constante o som gerado pelo videogame, aumentando o realismo e imersão do motorista na situação simulada. Após passar pelo adaptador de sinal RCA para VGA, a imagem gerada pelo videogame foi enviada para o sistema ASL, que a redistribuiu à um projetor, modelo BenQ MX720, que fez a projeção numa tela retrátil de 204x154 cm, marca Projetelas e modelo Infinity. O videogame foi conectado ao conjunto de volante/pedais/câmbio em uma mesa posicionada frontalmente à tela e com distância de dois metros (contando do encosto da cadeira onde os participantes sentaram). Foram feitos, quando necessários, ajustes da mesa e dos pedais para diferentes alturas e conforto da pessoa para devido alcance do equipamento, mas a posição da cadeira permaneceu constante para todos os participantes, preservando o ângulo visual em relação à tela. A televisão ficou disposta numa mesa auxiliar, fornecendo apenas o áudio. 12 3.3. PROCEDIMENTOS Os procedimentos experimentais foram realizados no LIVIA (Laboratório de Informação, Visão e Ação), Departamento de Educação Física, UNESP – Câmpus de Bauru, onde os participantes receberam informações sobre os procedimentos e assinaram o Termo de Consentimento. Os participantes menores de 18 anos assinaram o Termo de Assentimento, mediante prévia autorização e consentimento dos pais, que assinaram o Termo de Consentimento. Todos os participantes realizaram inicialmente 5 minutos de ambientação e familiarização com o videogame e o conjunto volante/pedais (freio e acelerador), já com o veículo e o percurso que serão utilizados para a coleta de dados. Logo após, foi realizada a calibração do equipamento responsável pelo monitoramento do olhar, já acoplado ao participante. Para tal, eram dispostos nove pontos na tela de projeção e era solicitado ao participante olhar para cada um deles, inserindo a confirmação no sistema relativa à posição da pupila e da córnea para cada ponto, permitindo posteriormente ao sistema mapear onde o participante está olhando. Dentro das opções do jogo, o câmbio foi mantido em disposição automática por questão de compatibilidade do jogo com o conjunto de volante/pedais/câmbio. Foram ajustadas e mantidas constantes as opções do jogo com relação à disposição gráfica da tela, informações disponíveis sobre os percursos e todas os demais detalhes de jogabilidade. Cada participante foi orientado a conduzir um veículo durante três voltas em circuito virtual pré-determinado – denominado Autumn Ring Mini e de caráter fictício, produzido pela firma que desenvolveu o jogo – da maneira mais rápida possível, ficando a estratégia para tal a critério do próprio indivíduo (se iria dirigir mais devagar com o intuito de cometer menos erros ou mais rápido, correndo o risco de eventualmente sair da pista). Antes do início da coleta de dados, a precisão da calibração era aferida, solicitando ao participante que olhasse para partes específicas da tela e, quando necessário, a calibração foi refeita para assegurar a precisão dos dados a serem adquiridos. 13 Figura 2 - Circuito percorrido pelos participantes. Disponível em http://gran- turismo.wikia.com/wiki/File:Autumn_Ring_Mini_Forward.png. 3.4 ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS A sincronização dos equipamentos permitiu a análise integrada dos dados coletados. Os vídeos e arquivo de dados gerado pelo sistema de rastreamento do olhar foram analisados no software ASL Results Plus (versão 1.8.2.18). Para esta análise foram separadas cada uma das onze curvas do percurso, tendo como início o quadro de vídeo onde há movimento do olhar horizontalmente em direção ao PT e tendo como fim o último quadro de vídeo onde o PT está disponível na imagem. Foram criadas Áreas de Interesse (AI) proporcionais ao ângulo horizontal do participante na situação experimental. As AI estabelecidas foram de 3º e 10º tendo o PT da curva como centro. Todas as fixações foram registradas e definidas pelo software como dentro da área de interesse de 3º, 10º ou fora delas (outros). Mais especificamente, outros corresponde a todo espaço da cena que não correspondem às áreas das AI. Foi, adicionalmente, utilizado o software Matlab (The Matworks Inc., 2010- versão 7.10.0.499) para formatar os dados gerados pela análise das AI e gerar as matrizes submetidas para análise estatística posterior no software SPSS (SPSS Inc., 2008 – versão 17.0.1). http://gran-turismo.wikia.com/wiki/File:Autumn_Ring_Mini_Forward.png http://gran-turismo.wikia.com/wiki/File:Autumn_Ring_Mini_Forward.png 14 3.4. VARIÁVEIS DEPENDENTES Os dados fornecidos pelo sistema de monitoramento do olhar determinaram as seguintes variáveis dependentes, mediante posterior análise no software ASL Results Plus: Número total de fixações (NF): corresponde ao número total de fixações obtidas em cada área de interesse de cada curva; Duração total das fixações (DF): corresponde ao tempo total de duração das fixações em cada área de interesse de cada curva. 3.5. ANÁLISE ESTATÍSTICA Os dados de cada variável foram submetidos à análise de variância tendo como fatores Grupo (NH e HA), Área de Interesse (3º, 10º e outros) e Curva (onze curvas), com medidas repetidas nos dois últimos fatores. Comparações aos pares foram realizadas através do Teste LSD de Tukey, aplicando-se o ajuste de probabilidades de Bonferroni quando necessário; nas análises nas quais os dados não se enquadrem ao pressuposto de esfericidade, ajustes de Greenhouse-Geisser foram utilizados (MAXWELL & DELAYNE, 1990). O nível de significância adotado foi de 0,05 para todas as análises. 4. RESULTADOS Não houve efeito de grupo para a variável NF (M: 2,890 ± 0,209). Houve efeito principal de Área de Interesse para a variável NF, F (2315,24, 79,48) = 29,13, p < 0,001. Os participantes realizaram menor número de fixações na AI de 3º (M: 0,727 ± 0,194) do que na AI de 10º (M: 3,986 ± 0,480), p < 0,001. Também houve significativamente menos fixações na AI de 3º do que em outros (M: 3,956 ± 0,321), p < 0,001. Não houve diferença significativa entre a AI de 10º e outros, p = 1,000. Do ponto de vista descritivo, está claro que houve mais fixações nas AI ao redor do PT, uma vez que a soma dos números médios de fixações nas áreas de 3º e 10º (M: 4,713) é superior ao de outros. 15 Figura 3 - Número Total de Fixações por AI Houve efeito principal de curvas, F (228,52, 9,72) = 23,5, p < 0,001. De maneira geral, quando houve curvas isoladas houve maior número de fixações do que em relação à quando houve curvas sucessivas. Os participantes realizaram significativamente maior número de fixações durante a execução das curvas 1, 2 e 11 do que nas demais curvas. Não houve diferença significativa entre a curva 4 e as demais curvas. Tabela 1 – Média e Desvio Padrão do Número Total de Fixações (NF) por curva. Curva Média Desvio Padrão 1 3,789 0,326 2 5,333 0,402 3 2,711 0,199 4 3,056 0,586 5 2,73 0,263 6 2,006 0,232 7 1,822 0,174 8 1,739 0,141 9 2,217 0,145 10 2,200 0,213 11 4,178 0,359 16 Não houve efeito de grupo para a variável DF (M: 0,838s ± 0,078s). Houve efeito principal de Área de Interesse para a variável DF, F (212,02, 11,57) = 18,321, p < 0,001. Os participantes realizaram fixações por menos tempo na AI de 3º (M: 0,202s ± 0,070s) do que na AI de 10º (M: 1,026s ± 0,170s), p < 0,001. Os participantes também realizaram significativamente menos fixações na AI de 3º do que em outros (M: 1,288s ± 0,140s), p < 0,001. Não houve diferença significativa entre 10º e outros, p = 0,804. Figura 4 - Duração Total das Fixações por AI (em segundos) Houve efeito principal de curvas, F (239,646, 44,892) = 5,338, p = 0,027. De maneira geral, quando houveram curvas isoladas os participantes produziram maior tempo de fixações do que em relação à quando houveram curvas sucessivas. Os participantes fixaram significativamente por mais tempo durante a execução das curvas 1, 2 e 11 do que nas demais curvas. Não houve diferença significativa entre a curva 4 e as demais curvas. Tabela 2 – Média e Desvio Padrão da Duração Total das Fixações (DF) por curva, em segundos. Curva Média Desvio Padrão 1 1,160 0,083 2 1,586 0,117 3 0,726 0,057 4 1,280 0,554 5 0,876 0,088 6 0,477 0,051 7 0,447 0,039 8 0,438 0,035 17 9 0,576 0,048 10 0,540 0,047 11 1,116 0,095 5. DISCUSSÃO O objetivo do presente estudo foi investigar os efeitos da experiência de dirigir em contexto real sobre a condução de automóvel durante a execução de curvas em situação simulada de videogame. A experiência de dirigir em contexto real não interferiu na utilização visual do PT ao conduzir um automóvel durante curvas em situação simulada, uma vez que não houve efeito de grupo sobre as variáveis dependentes estabelecidas. A especificidade da experiência em relação à tarefa foi mais importante, sendo que dirigir em situação simulada gerou uma exploração visual própria, não afetada pela experiência de dirigir um automóvel em contexto real. Ciceri e Ruscio (2014) encontraram diferenças entre grupos de motoristas e jogadores de videogame quando compararam a utilização de Áreas de Interesse, mas investigaram a utilização de sinalizações de trânsito através da exibição de vídeos mostrando a visão de um motorista em situação simulada e real. O vídeo era exibido de maneira a induzir o participante a ter a sensação de estar dirigindo o automóvel em que houve a filmagem. No presente estudo, os participantes efetivamente conduziram um veículo em situação simulada de videogame, gerando uma necessidade própria de aquisição de informações para que o controle do volante e do automóvel seja possível. Os contextos experimentais entre o estudo de Ciceri e Ruscio (2014) e o presente estudo eram bastante diferentes, portanto é compreensível que os resultados também sejam diferentes, apesar de ambos investigarem os efeitos da experiência de dirigir em contexto real sobre a tarefa em contexto simulado de videogame. Conforme motoristas se tornam mais experientes no desempenho da tarefa, são observáveis mudanças em seu padrão de busca visual, produzindo fixações mais longas nos pontos mais relevantes da cena, especialmente em situações de potencial perigo ou quando uma rápida tomada de decisão é necessária (CHAPMAN, UNDERWOOD & ROBERTS, 2002). Da mesma maneira, é possível que pessoas experientes em conduzir automóveis em situação simulada desenvolvam exploração visual pertinente a este tipo de tarefa, principalmente na situação de videogame, na qual rápidos ajustes do volante são necessários para manter o 18 controle do automóvel na pista. Os resultados obtidos neste estudo parecem indicar que a especificidade da experiência em relação à tarefa é predominante, ou seja, a experiência em situação simulada é predominante na situação simulada, não sendo afetada pela experiência em contexto real. Todos os participantes deste estudo possuíam experiência declarada em jogar jogos de videogame que envolvem condução simulada de veículos, especialmente jogos de corrida. Esta é uma explicação para não ter sido encontrada diferença significativa entre os grupos, já que os participantes apenas foram avaliados em contexto simulado. Portanto, a experiência em contexto real pareceu não interferir no contexto simulado, refutando a ideia de que os motoristas, se comparados aos não motoristas, iriam realizar maior número de fixações e/ou por mais tempo no PT. Por questões de segurança, é inviável elaborar um delineamento experimental para investigar a busca visual de pessoas que não possuam carteira de habilitação enquanto dirigem um automóvel em contexto real. Nesta hipotética situação, é de se esperar que um jogador de videogame e não-motorista ao dirigir um automóvel de verdade ignore inicialmente certos aspectos que são aprendidos com a prática em trânsito; conforme os resultados de Ciceri e Ruscio (2014), que indicaram que os jogadores de videogame e não-motoristas ignoraram sinalizações de trânsito. Este é um ponto chave a se considerar quando se argumenta sobre os benefícios da utilização de simuladores durante o processo de aprendizado de uma tarefa que virá a ser desempenhada em contexto real. Muitos aspectos que envolvem a condução em situação simulada não são transferíveis para o contexto real e vice-versa, gerando dificuldades relativas à validade ecológica. Apesar disso, investigações que possam oferecer riscos para o participante em contexto real são possíveis de serem reproduzidas em contexto simulado, desde que as referidas restrições sobre as eventuais diferenças entre os contextos real e simulado sejam consideradas. Exemplos disso são estudos com objetivo de investigar os efeitos do consumo de agentes farmacológicos ou patologias sobre a condução de automóveis. Apesar de os participantes terem realizado menor número de fixações e por menos tempo total, a parte da cena visual referente aos 3º em relação ao PT, a região correspondente aos 10º foi utilizada através de número similar de fixações e tempo que o restante da cena visual. Somando-se descritivamente as médias das fixações nas AI de 3º e 10º houve mais fixações e por mais tempo nas AI relativas ao PT do que em outros. Isso indica que participantes não utilizaram preferencialmente a fóvea para buscar o PT, mas a parafóvea foi utilizada para captar a informação dos arredores do PT. Estes resultados indicam a importância da utilização da visão periférica para obtenção de informação da cena visual para o desempenho da tarefa. Devido ao 19 fato de a visão focal abranger apenas uma pequena fração do campo visual, sua utilização se torna bastante limitada por se restringir à apenas esta pequena porção da cena, como a AI de 3º em torno do PT. Apesar disso, a utilização da AI de 10º ressalta a importância do PT como fonte de informação durante a execução de uma curva. Authié e Mestre (2011) solicitaram aos participantes que conduzissem um automóvel o mais rápido possível em um simulador de trânsito e encontraram que a maior parte das fixações se localizaram na área entre 3,1º e 7º ao redor do PT, justificando tal achado através de um conjunto de movimentos dos olhos denominado nistagmo optocinético. O nistagmo optocinético consiste na atração do olhar por um atrator (no caso, o PT) e num rápido retorno do olhar na direção inicial, sendo que no intervalo entre os dois movimentos sacádicos ocorrem lentos movimentos dos olhos para estabilizar a imagem retinal. O nistagmo optocinético não constitui uma fixação exatamente sobre o centro do PT ou a região de 3º que o envolve, mas estabelece que o motorista está explorando o PT através de uma série de movimentos consecutivos dos olhos para captar a informação relevante que está gerando atração para o motorista. Apesar do conhecimento desta informação, Authié e Mestre (2011) argumentam que para investigar esta questão de maneira fina a frequência de aquisição dos dados deve possuir resolução temporal suficiente para diferenciar uma fixação de um movimento optocinético, e, para tal, talvez esta frequência tenha de ser superior a até 250 Hz. No presente estudo, a frequência de aquisição dos dados foi 60 Hz. A posição angular entre o PT e a localização do veículo pode predizer a curvatura da pista, potencialmente fornecendo o sinal necessário para o controle do volante, sendo que muitas vezes durante a manobra de curvas o ângulo de movimento do olhar e do volante são semelhantes (LAND & LEE, 1994; LAND, 2006). Land e Tatler (2001) investigaram a exploração visual de um piloto profissional de corrida e verificaram que ele realizava fixações próximas, mas não exatamente sobre o PT das curvas do circuito em que o experimento foi realizado. No estudo de Land e Tatler (2001), o piloto participante por vezes olhava mais para a esquerda ou para a direita do PT (variações verticais não foram consideradas devido à elevada oscilação do veículo de corrida), havendo variações nestas diferenças angulares de localização do olhar entre as curvas. Este resultado é congruente ao encontrado no presente estudo com relação à utilização periférica do PT e também do efeito das curvas sobre o comportamento do olhar, tendo em comum o fato de que os participantes deste estudo foram instruídos para completarem o percurso o mais rápido possível. É possível que durante condução em alta velocidade o motorista não olhe exatamente sobre o PT, mas sim aos arredores do PT. A 20 instrução da tarefa de dirigir de maneira segura (como no dia-a-dia) ou da maneira mais rápida possível (como em uma situação de jogos de videogame de corrida) já foi apontada por Itkonen, Pekkanen e Lappi (2015) como um fator que pode modificar as estratégias de busca visual do participante, aliado ao fato de que a condução em situação simulada (onde a cena da pista na verdade é projetada em uma tela) dificulta o julgamento de velocidade e distância por parte do condutor. Quando ocorreram curvas sucessivas, os participantes realizaram menos fixações e por menos tempo no PT. Isto parece indicar que a utilização do PT está relacionada com o planejamento da manobra do volante e que isto está estritamente associada com o tempo disponível antes da entrada do veículo na curva, adquirindo antecipadamente a informação de qual ângulo de rotação será necessário para execução da curva. O mecanismo de feedforward apresenta a vantagem de fornecer planejamento para a execução do movimento, enquanto o mecanismo de feedback atua de maneira compensatória, ou seja, realizando ajustes momento a momento de acordo com as diferenças entre o que ocorreu e o estado desejado. O planejamento é importante para que recursos atencionais sejam liberados para a obtenção de outras informações sensoriais, tornando o sistema muito mais flexível e fluente. Quando ocorreram curvas sucessivas durante o desempenho da tarefa do presente estudo, o tempo era bastante limitado até mesmo para que os participantes pudessem reagir suficientemente para executar a curva com perfeição, mantendo o veículo no centro da pista. Esta noção segundo a qual o tempo de planejamento da manobra interfere no comportamento do olhar, é reforçada pela instrução da tarefa de completar o percurso o mais rápido possível. Apesar disso, a possível influência que a complexidade da curva exerce sobre o comportamento do olhar do motorista é passível de futuras investigações para melhor detalhamento acerca do tema. 6. CONCLUSÃO A experiência em contexto real não afetou a exploração visual do ponto tangente durante a execução de curvas em situação simulada de videogame. Todos os participantes eram experientes em jogar videogame, logo esta experiência em contexto virtual foi preponderante nos resultados. Os participantes realizaram maior número de fixações e por mais tempo no ponto tangente da curva do que o restante da cena, preferencialmente para AI de 10º do que 3º. 21 Curvas sucessivas parecem modificar a aquisição de informação do PT para planejamento da manobra, uma vez que durante a manobra de curvas isoladas os participantes realizaram maior número de fixações e por mais tempo. 7. REFERÊNCIAS AUTHIÉ, C. N.; MESTRE, D. R. Optokinetic nystagmus is elicited by curvilinear optic flow during high speed curve driving. Vision Research, v.51, n.16, p.1791-1800, jun. 2011. BALL, K.; EDWARDS, J. D.; ROSS, L. A.; McGWIN JR., G. Cognitive Training Decreases Motor Vehicle Collision. Journal of American Geriatrics Society, v.50, n.11, p.2107-2113, nov. 2010. CICERI, M. R.; RUSCIO, D. Does driving experience in video games count? Hazard anticipation and visual exploration of male gamers as function of driving experience. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior, v.22, p.76-85, jan. 2014. CHAPMAN, P.; UNDERWOOD, G.; ROBERTS, K. Visual search patterns in trained and untrained novice drivers. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior, v.5, n.2, p.157-167, jun. 2002. COUTTON-JEAN, C.; MESTRE, D. R.; GOULON, C.; BOOTSMA, R. J. The role of edge lines in curve driving. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior, v.12, n6, p.483-493, nov. 2009. DAVENNE, D.; LERICOLLAIS, R.; SAGASPE, P.; TAILLARD, J.; GAUTHIER, A.; ESPIÉ, S.; PHILIP, P. Reliability of simulator driving tool for evaluation of sleepiness, fatigue and driving performance. Accident Analysis and Prevention, v.45, p.677-682, mar. 2012. DONGES, E. A two-level model of driving steering behavior. Human Factors, v.20, n.6, p.691-707, dez. 1978. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Um Panorama da Saúde no Brasil: Acesso e utilização dos serviços, condições de saúde e fatores de risco e proteção à saúde em 2008. Pesquisa nacional por amostra de domicílios. Rio de Janeiro, 2010. IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística. Pesquisa Games Pop. Disponível em: . Acesso em: 10 de julho de 2014. ITKONEN, T.; PEKKANEN, J.; LAPPI, O. Driver Gaze Behavior Is Different in Normal Curve Driving and when Looking at the Tangent Point. Plos One, v.10, n.8, p.1-19, ago. 2015. 22 KANDIL, F.; ROTTER, A.; LAPPE, M. Driving is smooter and more stable when using the tangent point. Journal of Vision, v.9, n.1, art.11, jan. 2009. KONSTANTOPOULOS, P.; CHAPMAN, P.; CRUNDALL, D. Driver’s attention as a function of driving experience and visibility. Using a driving simulator to explore drivers’ eye movements in day, night and rain driving. Accident Analysis and Prevention, v.42, n.3, p.827-834, mai. 2010. LAND, M. F.; LEE, D. N. Where we look when we steer. Nature, v.369, n.6483, p.742-744, jun. 1994. LAND, M. F.; HORWOOD, J. Which parts of the road guide steering? Nature, v.377, n. 6547, p.339-340, set. 1995. LAND, M. F.; TATLER, B. W. Steering with the head: The visual strategy of a racing driver. Current Biology, v.11, p.1215-1220, ago. 2001. LAND, M. F. Eye movements and control of actions in everyday life. Progress in Retinal and Eye Research, v.25, n.3, p.296-324, mai. 2006. MAXWELL, S. E.; DELAYNE, H. D. Designing experiments and analyzing data: A model comparison perspective. Pacific Grove, CA: Brooks/Cole. 1990. MAYCOCK, G.; LOCKWOOD, C. R.; LESTER, J. F. The accident liability of car drivers. TRL Research Report 315, Crowthorne, UK, Transport Research Laboratory, 01 jan, 1991. McKNIGHT, A. J.; McKNIGHT, A. S.; Young novice drivers: careless or clueless? Accident Analysis and Prevention, v.35, n.6, p.921-925, nov. 2003. MOURANT, R. R.; ROCKWELL, T. H. Mapping Eye-Movements Patterns to the Visual Scene in Driving: An Exploratory Study. Human Factors, v.12, n.1, p.81-87, fev. 1970. MOURANT, R. R.; ROCKWELL, T. H. Strategies of Visual Search by Novice and Experienced Drivers. Human Factors, v.14, n.4, p.325-335, ago. 1972. OWSLEY, C.; McGWIN JR., G. Vision and driving. Vision Research, v.50, n.23, p.2348- 2361, nov. 2010. ROCKWELL, T. H.; OVERBY, C.; MOURANT, R. R.. Driver’s eye-movements: An apparatus and calibration. Highway Research Record, n.247, p.29-42, jan. 1968. RODRIGUES, S. T. O Movimento dos Olhos e a Relação Percepção-Ação. In: TEIXEIRA, L. A. Avanços em Comportamento Motor. Rio Claro, SP: Movimento, 2001, p.122-146. SHINAR, D. Looks Are (Almost) Everything: Where Drivers Look to Get Information. Human Factors, v.50, n.3, p.380-384, jun. 2008. WIKIA. Gran Turismo Wiki. Disponível em: < http://gran- turismo.wikia.com/wiki/File:Autumn_Ring_Mini_Forward.png>. Acesso em: 11 de janeiro de 2016. 23 Bauru, 6 de Fevereiro de 2016. Gabriel Keine Kuga Orientando Sérgio Tosi Rodrigues Orientador 24 APÊNDICE A TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Título do Projeto de Pesquisa: Controle visual de automóveis em curvas em situação simulada: Efeitos da experiência em contexto real Aluno Responsável: Gabriel Keine Kuga Orientador: Dr. Sérgio Tosi Rodrigues. Este formulário de consentimento, uma cópia do qual lhe foi dada, é apenas parte do processo de consentimento informado. Ele deve proporcionar-lhe uma ideia básica do assunto da pesquisa e o que sua participação envolve. Se desejar mais detalhes sobre alguma coisa mencionada, ou informação não contida aqui, sinta-se à vontade para pedir-nos. Por favor, leia este formulário cuidadosamente. A presente pesquisa estuda o controle visual de indivíduos experientes em situação simulada em videogame durante a tarefa de condução de automóvel em curvas. Nossa tarefa requer que você participe do jogo de videogame proposto, que consiste em dirigir um automóvel em um determinado circuito. Deste modo, este estudo vai requerer que você execute esta tarefa algumas vezes. Seus movimentos de olhos e cabeça serão gravados. A duração total do teste será de aproximadamente 40 minutos. As informações coletadas, juntamente com as de outros vinte e três participantes do estudo, serão usadas para aprimorarmos nosso conhecimento sobre o tema. Sua participação será voluntária, sem o recebimento de qualquer quantia em dinheiro. Você tem a liberdade de desistir de participar desta investigação a qualquer momento durante a coleta de dados. Como forma de agradecimento pela sua participação, ficaríamos satisfeitos em enviar- lhe um sumário dos resultados deste estudo, assim que ele estiver concluído (provavelmente, em seis meses). Este sumário apresentará sua média pessoal e a média do grupo de participantes, assim como as principais conclusões do estudo. Caso deseje receber este sumário, informe-nos o endereço no qual gostaria de recebê-lo: Toda informação coletada será armazenada de modo que seu nome não seja associado com ela, através da identificação dos participantes por meio de um número arbitrário. As imagens e os outros dados poderão ser publicados e/ou apresentados desde que não permitam sua identificação. Quando os resultados forem escritos, em forma de relatórios, artigos, entre outros, não será incluída qualquer informação que possa ser ligada diretamente a você. Os materiais desta pesquisa serão armazenados com segurança completa durante toda a investigação. Você tem qualquer dúvida sobre este aspecto do estudo? 25 A sua assinatura neste formulário indica que você entendeu satisfatoriamente as informações relativas à participação neste projeto de pesquisa, e concorda em participar. Este documento em nenhum modo restringe seus direitos legais, nem altera as responsabilidades legais e profissionais dos pesquisadores, patrocinadores ou instituições envolvidas. Você é livre para não responder a qualquer um dos itens ou questões específicas em entrevistas ou questionários. Você é livre para desistir do estudo a qualquer momento sem nenhuma penalidade. A continuidade de sua participação deve ser tão informada quanto o seu consentimento inicial, de modo que você se sinta livre para pedir explicações ou informações novas durante toda sua participação. Caso possua questões adicionais sobre assuntos relacionados a esta pesquisa, por favor, entre em contato com: Gabriel Keine Kuga, Estudante do Departamento de Educação Física UNESP-Campus de Bauru, Laboratório de Informação, Visão e Ação - (14)3103-6082 – Ramal 7611, xgabriel@gmail.com Dr. Sérgio Tosi Rodrigues, Professor do Departamento de Educação Física UNESP-Campus de Bauru, Laboratório de Informação, Visão e Ação - (14)3103-6082 – Ramal 7617, srodrigu@fc.unesp.br Participante: Data de nascimento: Data: ___________________________________ Assinatura Investigador: Data da coleta: ___________________________________ Assinatura Uma cópia deste formulário foi dada a você para os seus arquivos e futura referência. 26 APÊNDICE B TERMO DE ASSENTIMENTO (Para Menores de 18 anos) Título do Projeto de Pesquisa: Controle visual de automóveis em curvas em situação simulada: Efeitos da experiência em contexto real Aluno Responsável: Gabriel Keine Kuga Orientador: Dr. Sérgio Tosi Rodrigues. Este formulário de assentimento, uma cópia do qual lhe foi dada, é apenas parte do processo de consentimento informado do responsável e do participante. Ele deve proporcionar-lhe uma ideia básica do assunto da pesquisa e o que a participação envolve. Se desejarem mais detalhes sobre alguma coisa mencionada, ou informação não contida aqui, sintam-se à vontade para pedir-nos. Por favor, leiam este formulário cuidadosamente. A presente pesquisa estuda o controle visual de indivíduos experientes em situação simulada em videogame durante a tarefa de condução de automóvel em curvas. Nossa tarefa requer que o participante realize o jogo de videogame proposto, que consiste em dirigir um automóvel em um determinado circuito. Deste modo, este estudo vai requerer que o participante execute esta tarefa algumas vezes. Seus movimentos de olhos e cabeça serão gravados. A duração total do teste será de aproximadamente 40 minutos. As informações coletadas, juntamente com as de outros vinte e três participantes do estudo, serão usadas para aprimorarmos nosso conhecimento sobre o tema. A participação será voluntária, sem o recebimento de qualquer quantia em dinheiro. O participante tem a liberdade de desistir de participar desta investigação a qualquer momento durante a coleta de dados. Como forma de agradecimento pela participação, ficaríamos satisfeitos em enviar-lhe um sumário dos resultados deste estudo, assim que ele estiver concluído (provavelmente, em seis meses). Este sumário apresentará sua média pessoal e a média do grupo de participantes, assim como as principais conclusões do estudo. Caso desejem receber este sumário, informe-nos o endereço no qual gostaria de recebê-lo: Toda informação coletada será armazenada de modo que o nome do participante não seja associado com ela, através da identificação dos participantes por meio de um número arbitrário. As imagens e os outros dados poderão ser publicados e/ou apresentados desde que não permitam sua identificação. Quando os resultados forem escritos, em forma de relatórios, artigos, entre outros, não será incluída qualquer informação que possa ser ligada diretamente ao participante. Os materiais desta pesquisa serão armazenados com segurança completa durante toda a investigação. Vocês têm qualquer dúvida sobre este aspecto do estudo? 27 As suas assinaturas neste formulário indicam que vocês entenderam satisfatoriamente as informações relativas à participação neste projeto de pesquisa, e concordam com a participação. Este documento em nenhum modo restringe seus direitos legais, nem altera as responsabilidades legais e profissionais dos pesquisadores, patrocinadores ou instituições envolvidas. O participante é livre para não responder a qualquer um dos itens ou questões específicas em entrevistas ou questionários. O participante é livre para desistir do estudo a qualquer momento sem nenhuma penalidade. A continuidade da participação deve ser tão informada quanto o seu consentimento inicial, de modo que vocês se sintam livres para pedir explicações ou informações novas durante toda participação. Caso possuam questões adicionais sobre assuntos relacionados a esta pesquisa, por favor, entrem em contato com: Gabriel Keine Kuga, Estudante do Departamento de Educação Física UNESP-Campus de Bauru, Laboratório de Informação, Visão e Ação - (14)3103-6082 – Ramal 7611, xgabriel@gmail.com Dr. Sérgio Tosi Rodrigues, Professor do Departamento de Educação Física UNESP-Campus de Bauru, Laboratório de Informação, Visão e Ação - (14)3103-6082 – Ramal 7617, srodrigu@fc.unesp.br Responsável pelo Participante: __________________________________________________ Data:____/____/______ ___________________________________ Assinatura Participante: __________________________________________________________ Data: ____/____/______ ___________________________________ Assinatura Investigador: __________________________________________________________ Data da coleta: ____/____/______ ___________________________________ Assinatura Uma cópia deste formulário foi dada a vocês para os seus arquivos e futura referência.