FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS LEVANTAMENTO SOROLÓGICO PARA LEPTOSPIROSE NOS ANIMAIS PERTENCENTES AO BOSQUE ZOOLÓGICO MUNICIPAL “Dr. FÁBIO DE SÁ BARRETO” DE RIBEIRÃO PRETO, ESTADO DE SÃO PAULO Carolina dos Santos Silva Médica Veterinária JABOTICABAL, SP – BRASIL 2008 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL LEVANTAMENTO SOROLÓGICO PARA LEPTOSPIROSE NOS ANIMAIS PERTENCENTES AO BOSQUE ZOOLÓGICO MUNICIPAL “Dr. FÁBIO DE SÁ BARRETO” DE RIBEIRÃO PRETO, ESTADO DE SÃO PAULO Carolina dos Santos Silva Orientador: Prof. Dr. Raul José Silva Gírio JABOTICABAL, SP – BRASIL 2008 Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – Unesp, Câmpus de Jaboticabal, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Medicina Veterinária (Medicina Veterinária Preventiva). i DADOS CURRICULARES DO AUTOR CAROLINA DOS SANTOS SILVA – nascida em 25 de janeiro de1979, em São Paulo – estado de São Paulo, médica veterinária formada pela Universidade Estadual de Londrina, estado do Paraná, em fevereiro de 2003. Atuou como médica veterinária do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, estado de São Paulo entre maio de 2003 e março de 2004, contratada por tempo determinado pela Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto. Mestre em Medicina Veterinária, do curso de Medicina Veterinária Preventiva, pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Jaboticabal durante o período de 2006 a 2008. ii Dedico: A todas as pessoas que colaboraram com a realização deste trabalho, pois sabemos o quanto é importante a ajuda quando se trata de pesquisa com animais selvagens. A minha querida avó e grande amiga D. Wilma e com muita saudade espero que ela esteja me acompanhando nesse momento como fez durante toda minha vida. iii AGRADECIMENTOS Ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico) pela bolsa concedida para a realização do meu mestrado. Ao meu orientador Prof. Dr. Raul Jose Silva Gírio pela oportunidade e apoio para a realização deste projeto e por acreditar na possibilidade de trabalho com os animais selvagens. À Profa. Dra. Fernanda Senter Magajevski pelo apoio e pelas correções dos textos. Aos amigos do Laboratório de Leptospirose de Jaboticabal, Assis, Michelle e Lucas, muitíssimo obrigada por tudo, vocês me ajudaram no momento mais importante da minha vida e sem o apoio de vocês eu não teria conseguido. Aos meus pais, Wander e Mara pelo apoio incondicional sempre. Ao meu marido, Rodrigo, por me apoiar em todos os acontecimentos da minha vida desde minhas aulas, viagens, meus fins de semana no zoológico até nos cuidados com o barrigão e com nosso filhote, Caíque, sempre os amores da minha vida. A todos os amigos do Zoológico de Ribeirão Preto, técnicos, funcionários, estagiários que durante um ano “passaram” pelo trabalho, uns ficaram outros apenas “visitaram”, mas todos ofereceram sua forma de ajuda. A Marisa, Bin, Pedro, Ronaldo, Douglas, Michele, Orival, Vinin, Alan, Alexandre, Gustavo... Ao amigo e biólogo, Leno, o mais sincero obrigada por me ajudar desde estagiário até se transformar em um primoroso profissional, sempre ao meu lado. A amiga e colega, Julia, por me ajudar no trabalho pesado de verdade, carregando gaiola, armadilha, bicho, anestésicos para cima e para baixo, me oferecendo uma dedicação própria dos grandes amigos. Aos queridos Mariana e Ingo que começaram o trabalho apenas como colegas e se transformaram em amigos. Aos amigos e colegas, Prof. Pachaly, Gui, Fabio, Tati, Ciro, Jean, Letícia, Pedro, como nos divertimos, nos ajudamos e aprendemos, ou seja, formamos uma bela equipe, não é verdade? Ao Prof. Dr. Antonio Sergio Ferraudo pela confecção dos mapas utilizados e ajuda com os programas. Ao Projeto Macaco Prego pelo empréstimo das armadilhas utilizadas para a contenção dos animais. iv SUMÁRIO Página LISTA DE TABELAS..........................................................................................................v LISTA DE QUADROS.......................................................................................................vi LISTA DE GRÁFICOS.....................................................................................................vii LISTA DE FIGURAS........................................................................................................vii RESUMO........................................................................................................................viii 1. INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA.............................................................1 2. JUSTIFICATIVAS........................................................................................................14 3. OBJETIVOS................................................................................................................15 4. MATERIAL E MÉTODOS............................................................................................16 4.1. Área de estudo......................................................................................................16 4.2. População estudada..............................................................................................17 4.3. Contenção.............................................................................................................24 4.4. Captura dos animais de vida livre.........................................................................24 4.5. Obtenção das amostras de sangue e soro sanguíneo..........................................25 4.6. Prova de Soroaglutinação Microscópica (SAM)....................................................26 5. RESULTADOS............................................................................................................28 6. DISCUSSÃO...............................................................................................................39 7. CONCLUSÕES...........................................................................................................47 8. REFERÊNCIAS...........................................................................................................48 ANEXOS..........................................................................................................................64 v LISTA DE TABELAS Página 1. Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nas famílias de animais cativos do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar, os sorovares encontrados e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008........................................................ 2. Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nos animais de vida livre capturados nas dependências do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar, os sorovares encontrados e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008.................................................................................................................... 3. Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nos animais do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para dois ou mais sorovares com o mesmo título, os sorovares e os títulos encontrados. Jaboticabal. 2008.......................................................................... 4. Número e Freqüência (%) de animais reagentes na SAM por grupo animal analisado do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, os sorovares mais encontrados em cada grupo e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008................................................... 5. Número de animais cativos reagentes na SAM para um sorovar relacionado aos setores do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados. Jaboticabal. 2008. ...................... 29 31 32 33 34 vi 6. Número de animais de vida livre reagentes para um sorovar na SAM relacionado ao local de captura por armadilha dentro do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados. Jaboticabal. 2008.......................................................................... 7. Número de animais cativos e de vida livre reagentes para dois ou mais sorovares na SAM relacionado aos setores e aos locais de captura por armadilha dentro do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados. Jaboticabal. 2008.................... 8. Títulos e freqüência de aglutininas de 103 amostras de soro sanguíneo de animais reagentes para leptospirose pela prova de SAM para um sorovar, sendo 92 amostras de animais cativos e 11 amostras de animais de vida livre do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto no período de março a outubro de 2006. Jaboticabal. 2008.............................. LISTA DE QUADROS Página 1. Caracterização dos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto cujas amostras de soro foram submetidas à SAM para diagnóstico da leptospirose. Jaboticabal. 2008.................................................. 2. Caracterização dos animais de vida livre capturados na área do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto cujas amostras de soro foram submetidas à SAM para diagnóstico da leptospirose. Jaboticabal. 2008........... 3. Estirpes de Leptospira interrogans empregadas como antígeno na reação de soroaglutinação microscópica aplicada à leptospirose, segundo o código, sorogrupo e sorovar........................................................................................... 18 22 35 37 38 27 vii LISTA DE GRÁFICOS Página 1. Freqüência de sorovares encontrados nos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar Jaboticabal. 2008.................................................................... 2. Freqüência de sorovares encontrados nos animais de vida livre capturados nas dependências do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar Jaboticabal. 2008...................... LISTA DE FIGURAS Página 1. Localização dos recintos dos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, São Paulo. Brasil. 2008............... 2. Locais de armadilhamento (L) e captura de animais de vida livre no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto. Brasil. 2008................................ 3. Mapa do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” ilustrando a distribuição espacial dos animais reagentes dentro do zoológico relacionando os animais cativos e os de vida livre. Brasil. 2008............................................. 30 31 21 23 36 viii Resumo A leptospirose acomete todos os animais domésticos, selvagens e o ser humano. Alguns levantamentos sorológicos realizados têm demonstrado o envolvimento de espécies selvagens na epidemiologia da doença. Uma vez que populações cativas de animais selvagens são pouco estudadas, principalmente no Brasil, o presente estudo teve como objetivos a realização de um levantamento sorológico para leptospirose no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto localizado na cidade de Ribeirão Preto, SP, por meio da prova de Soroaglutinação Microscópica (SAM) em amostras de soro sanguíneo de aves, peixes, répteis e mamíferos cativos, animais sinantrópicos e de vida livre e também de funcionários. Foi realizada uma distribuição dos animais reagentes dentro do zoológico a fim de se verificar os locais de risco de exposição às leptospiras. Durante o período de março a outubro de 2006 foram colhidas 388 amostras de sangue de 110 répteis, 143 aves, 110 mamíferos e 25 peixes. Dentre as 388 amostras analisadas, 339 foram de animais cativos e 49 foram de animais de vida livre selvagens, sinantrópicos e domésticos capturados pelo uso de armadilhas distribuídas dentro do zoológico. Foram colhidas amostras de soro de 15 funcionários do zoológico entre tratadores, técnicos, manutenção, estagiários e todas foram negativas na SAM. Do total de amostras de soro sanguíneo de animais examinadas, 112 (28,9%) foram reagentes para leptospirose, sendo 100 (29,4%) amostras de animais cativos e 12 (24,5%) de animais de vida livre. Os setores do zoológico onde foram encontrados mais animais reagentes cativos foram o Tanque das Tartarugas (60%), o Jardim Japonês (50%) e a Praça das Aves (36,6%). Os títulos sorológicos nas amostras reagentes variaram de 40 a 5.120 com predominância dos títulos 40 e 80 e os sorovares Patoc, Andamana, Canicola, Icterohaemorrhagiae e Panama foram os mais freqüentes. Palavras-chave: leptospirose, animais selvagens, zoológico, sorovares. 1 1. INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA Em muitos países, as populações de animais selvagens, têm sofrido grande ameaça de extinção devido à ocorrência de alterações ecológicas como o aquecimento global e alterações climáticas, fatores esses que vêm sendo associados à intensa atividade humana como a expansão urbana descontrolada, degradação de florestas e emissão de gases poluentes pelas indústrias e automóveis. No Brasil, florestas tropicais remanescentes vêm sofrendo déficits consideráveis devido à degradação de grandes áreas para a expansão da agricultura e pecuária, exploração de madeira, mineração, construção de usinas hidrelétricas e plantação de cana de açúcar para a maciça produção de álcool nos últimos tempos. Ecossistemas como a Floresta Amazônica, Cerrado e Caatinga correm o risco de serem reduzidos a porcentagens tão pequenas quanto a Mata Atlântica, que hoje possui apenas 7% de seu território original, o que pode tornar inviável a sobrevivência de muitas espécies da fauna e flora locais. Devido a este cenário, muitas instituições, zoológicos, criadouros, fundações e organizações localizadas em todo o mundo têm realizado trabalhos de conservação e preservação de ecossistemas, de espécies animais ameaçadas de extinção em vida livre ou em cativeiro e pesquisa de doenças em populações selvagens. As doenças em populações selvagens fazem parte do conjunto de elementos que compõe um ecossistema e a inter-relação entre eles contribui para a dinâmica da população. Desta maneira , não só os agentes, mas também fatores ambientais, disponibilidade de alimentos, abrigo, temperatura, predadores, integridade do habitat atuam sobre a população mantendo seu equilíbrio. Nos animais que sofrem com a degradação do habitat, proximidades com áreas urbanas e com animais domésticos, muitas dessas inter-relações podem ser afetadas e tornando-os mais predispostos a agentes infecciosos que podem causar doenças com efeitos devastadores. Animais selvagens mantidos em cativeiro são especialmente expostos aos mais variados desequilíb rios dos fatores do meio ambiente onde vivem, pois convivem com a proximidade de muitas espécies selvagens diferentes assim como espécies domésticas e sinantrópicas (gatos domésticos, pombos, roedores, insetos). Elas possuem uma 2 subnutrição decorrente do desconhecimento das corretas necessidades alimentares das diferentes espécies, vivem em locais limitados predispondo-os a processos de reinfecção ou reinfestação, sofrem de estresse crônico decorrente de ambientes inadequados e muito distintos do habitat na tural, têm contato com seres humanos e faltam de atividades que geram disfunções orgânicas e comportamentais. Com este quadro, o elo frágil de equilíbrio entre parasita e hospedeiro fica bastante comprometido, pois os fatores ambientais do agente e do hospedeiro são alterados e os animais selvagens tornam-se predispostos aos agentes causadores de doenças. Especialistas do mundo todo têm dirigido esforços para inserir os jardins zoológicos no contexto social e têm-se deliberado estratégias de conservação e monitoramento médico veterinário nessas instituições (THE WORLD ZOO ORGANIZATION e THE CAPTIVE BREEDING SPECIALIST GROUP, 1993). Os zôos oferecem oportunidades de estudos em animais selvagens em situações controladas e proporcionam a aplicação de novas tecnologias no diagnóstico das enfermidades transmissíveis nesses animais (MUNSON & COCK, 1993), assim como constituem importantes fontes de informação para estudos epidemiológicos (THRUSFIELD, 1995). A leptospirose é uma doença que acomete todos os animais domésticos, selvagens e o ser humano, manifestando ou não os sinais clínicos e sintomas decorrentes da infecção. Inúmeros animais domésticos, bem como a maioria das espécies selvagens pode tornar-se portadora e contribuir para a disseminação do microrganismo na natureza. Além da importância para os animais, a leptospirose assume papel relevante do ponto de vista de saúde pública, uma vez que o contato com animais infectados é uma importante via de transmissão para o ser humano (MICHNA, 1970; AMATREDJO et al., 1975; HIGGINS et al., 1980). As leptospiras são espiroquetas pertencentes à ordem Spirochaetales, família Leptospiraceae, gênero Leptospira (NOGUCHI, 1918). O gênero Leptospira era anteriormente dividido em duas espécies: Leptospira interrogans, apresentando uma variação antigênica caracterizada por 23 sorogrupos e 202 sorotipos (BARATON & POSTIC, 1989) e Leptospira biflexa, englobando variedades de comportamento saprófita de vida livre presentes em água doce de superfície caracterizada por 38 3 sorogrupos e 65 sorotipos (FAINE, 1994). Essa classificação baseava-se em critérios estritamente relacionados a reações sorológicas relativamente específicas que forneciam os sorogrupos e os sorovares de leptospiras patogênicas e saprófitas. A identificação dos sorotipos só era possível pelo emprego da técnica de absorção cruzada de aglutininas, realizada por laboratórios de referência (CENTRO PANAMERICANO DE ZOONOSIS, 1985). Em 1992, o Subcomitê de Taxonomia da Leptospira propôs uma nova divisão para esse gênero e atualmente é formado por oito genomoespécies patogênicas: L. borgptersenii, L. interrogans sensu stricto, L. noguchii, L. santarosai, L. weilii, L. kirschneri, L. inadai e L. fainii, distribuídas em 26 sorogrupos e 250 sorovares, e três genomoespécies saprófitas ou de vida livre: L. biflexa, L. meyeri, L. wolbachii, com raros registros de infecções (KMETY & DIKKEN, 1993). A leptospirose é de distribuição mundial e tem sido detectada em todos os países que realizam investigações epidemiológicas (PANDEY, 1994), principalmente nos países tropicais e subtropicais (SULZER & JONES, 1980) devido à sua forte associação com áreas de alta pluviosidade e clima quente (SULZER & JONES, 1980; ACHA & SZYFRES, 1986; PLANK & DEAN, 2000). Em países temperados as infecções têm ocorrência sazonal com maior número de casos nos meses quentes e chuvosos, em regiões secas as infecções ocorrem próximas a águas represadas e com grande concentração de animais (SZYFRES, 1976). CÔRTES (1993) relatou a ocorrência da leptospirose de forma variável de acordo com a região geográfica. São freqüentes situações de endemia com variações sazonais e ocorrência de picos epidêmicos nos meses chuvosos associados às condições ambientais propícias à disseminação da doença, tais como o crescimento desordenado dos grandes centros urbanos, deficiências nas condições de saneamento básico, acúmulo de lixo atraindo e aumentando a população de roedores sinantrópicos com conseqüente acúmulo de urina e fezes desses roedores, obstrução de cursos d’água e canais e impermeabilização de vias públicas favorecendo a ocorrência de enchentes. A infecção pela Leptospira spp. ocorre pelo contato direto ou indireto com urina (PANDEY, 1994) e produtos provenientes de animais infectados (BLOOD & RADOSTIS, 1989). Segundo BLAHA (1995) a transmissão também pode ocorrer pelo 4 contato com água parada contaminada com urina de animais infectados e de um animal infectado a outro através do coito. As leptospiras sobrevivem por longos períodos no meio ambiente mantendo capacidade infectante em solo úmido por duas semanas ou mais e na superfície das águas por muitos meses (PANDEY, 1994). As leptospiras patogênicas possuem um período de vida variável em águas que depende da temperatura, pH, salinidade e grau de poluição (BROD et al., 2005). A penetração da Leptospira spp. ocorre através das mucosas, lesões na pele ou pela pele íntegra seguindo-se sua multiplicação no sangue e praticamente em todos os órgãos e tecidos (BROD et al., 2005). Nos animais que conseguem sobreviver à fase aguda da leptospirose, os microrganismos alcançam a luz dos túbulos contornados renais e são eliminados pela urina por períodos de tempo variados, caracterizando a modalidade de fonte de infecção (VASCONCELLOS, 1987). A prova de soroaglutinação microscópica (SAM) é tida como a técnica de referência pela Organização Mundial de Saúde, tanto para o diagnóstico sorológico da leptospirose humana como animal (ANDRADE, 1993). É uma técnica laboriosa que detecta anticorpos contra leptospira em amostras de soro sanguíneo e exige o uso de leptospiras vivas como antígenos (CHAPPEL et al., 1998). Os roedores, silvestres ou sinantrópicos, são uma fonte de infecção importante na cadeia epidemiológica da leptospirose, pois podem exercer o papel de reservatórios das leptospiras e, além de manterem o agente, o disseminam por meio da urina no ambiente (FAINE, 1982). Os reservatórios, na maioria dos casos, são os roedores das espécies Mus musculus, Rattus rattus e, principalmente, o Rattus norvegicus (MASCARO & SANTOS, 1990; LANGONI, 1999), sendo comum esses animais albergarem o agente e não manifestarem qualquer sinal clínico (ACHA & SZYFRES, 1986). Os variados sorovares possuem diferentes características patogênicas (ARGENTINA, 2006) e pode ocorrer de um único hospedeiro se infectar com um ou mais sorovares (ACHA & SZYFRES, 1986). 5 Em muitos países, investigações sobre a presença de leptospiras nos animais selvagens têm sido demonstradas em roedores, edentatas, carnívoros e artiodáctilos, os quais podem atuar como fonte de infecção (REILLY et al., 1968, MICHNA & CAMPBEL, 1997). SOSA et al. (1988) já relatavam a importância do melhor conhecimento da leptospirose na fauna selvagem para se estabelecer a profilaxia da enfermidade nas espécies domésticas e no ser humano. Baseado em estudos sorológicos e isolamentos, as espécies selvagens e sinantrópicas das ordens Rodentia e Didelphimorfia, há alguns anos, têm sido apresentadas como potenciais disseminadores de diferentes sorovares de Leptospira spp. (McCAUGHEY & FAIRLEI, 1971; SANTA ROSA et al.,1975, 1980; AL SAAD & POST, 1976; CIRONE et al., 1978; CORDEIRO et al., 1981; THIERMANN, 1981; EVERARD et al., 1983; SHIMIZU, 1984; PEREIRA & ANDRADE, 1988; RIM et al., 1993; LILENBAUM et al., 1993; RIEDEMANN et al., 1994; ZAMORA et al., 1995; HARTSKEERL & TERPSTRA, 1996). KOSITANONT et al. (2003) realizaram exames sorológicos em roedores sinantrópicos das regiões urbana e rural de Bangkok na Tailândia e observaram soropositividade em 7,9% (39/496) dos Rattus norvegicus analisados e 4,7% (23/492) dos Rattus rattus. Na Alemanha, STRAUBE et al. (2004) avaliaram a importância do Rattus norvegicus na cadeia epidemiológica da leptospirose em zoológicos do país por meio de análise de DNA da Leptospira spp por PCR de tecido renal de 920 animais capturados nos zôos e imediações, encontrando 11,4% de amostras positivas. Entre os marsupiais da ordem Didelphimorfia, em gambás de orelha preta (Didelphis marsupialis) foram descritos títulos para os sorovares Ballum, Bataviae, Icterohaemorrhagiae, Szwajizam e Grippotyphosa (SANTA ROSA et al., 1975; HATHAWAY et al., 1981; CALDAS et al., 1992). CORDEIRO et al. (1981) isolaram o sorovar Pomona de gambás de orelha branca (Didelphis albiventris) e o sorovar Grippotyphosa de cuícas (Philander opossum) na região sudeste do Brasil. Os gambás norte americanos (Didelphis virginianus) foram descritos como potenciais reservatórios de espiroquetas por DUHAMEL et al. (1998) e nos Trichosurus vulpecula na Nova 6 Zelândia foram encontrados títulos contra o sorovar Balcanica (HATHAWAY et al., 1978; DAY et al., 1997, 1998). A leptospirose tem sido estudada em populações de animais selvagens de vida livre fora do Brasil, principalmente em países Norte Americanos e Europeus. Muitos destes estudos realizados com mamíferos da Ordem Carnívora, que são espécies que ocupam o topo da cadeia alimentar, desenvolvendo papel de predadores e por isso apresentam importante papel na cadeia epidemiológica de determinadas doenças atuando como indicadores de saúde do meio ambiente. CIRONE et al. (1978), avaliando métodos de diagnóstico sorológico para leptospirose em animais selvagens, encontraram 89% de soropositividade nas 62 amostras de soro sanguíneo de carnívoros selvagens representados por sete espécies distintas e os sorovares mais encontrados foram: Pomona, Autumnalis, Pyrogenes, Icterohaemorrhagiae, Australis e Canicola. MARLER et al.(1979) analisaram amostras de sangue de coiotes (Canis latrans) de vida livre que habitavam o centro-norte do Estado do Kansas e foram encontradas 10% de amostras sororeagentes. No Parque Nacional de Yellowstone estudos com coiotes adultos e filhotes demonstraram a presença de anticorpos contra o sorovar Pomona em 7% das amostras de animais adultos de 9% das amostras dos filhotes e contra o sorovar Grippotyphosa o mesmo estudo demonstrou que 17% dos animais adultos eram soro reagentes (GESE et al., 1997). No Estado de Wisconsin, EUA, amostras de soro de raposas vermelhas (Vulpes vulpes) e raposas cinzas (Urocyon cinereoargenteus) de vida livre foram analisadas e constatou-se a presença de 47% de sororeagentes dentre as raposas vermelhas e 31% das raposas cinzas (AMUNDSON & YUILL, 1981). Em Ontário, Canadá, KINGSCOTE (1986) relatou um estudo com raposas vermelhas (Vulpes vulpes) onde foram encontradas 12% de amostras positivas para o sorovar Autumnalis e em 6% das mesmas amostras houve reação positiva também para o sorovar Pomona com títulos menores. Os racoons norte-americanos (Procyon lotor), espécie representante da família Procyonidae, são considerados sinantrópicos na América do Norte e foram descritos 7 como potenciais reservatórios da leptospiras. O sorovar Bratislava foi descrito nesta espécie por MIKKAELIAN et al. (1997) e os sorovares Grippotyphosa, Canicola e Icterohaemorrhagiae descritos por MITCHELL et al. (1999). BISCHOF & ROGERS (2005) avaliaram 63 soros de racoons de Nebraska nos EUA e detectaram 11% dos soros com presença de anticorpos contra leptospiras. RICHARDSON & GAUTHIER (2003) analisaram 109 amostras de soro de pequenos mamíferos peridomésticos em Connecticut, EUA, 31 racoons (Procyon lotor), 30 cangambás (Mephitis mephitis), 28 gambás (Didelphis virginiana) e 20 esquilos (Sciurus carolinensis) e observaram que 36% dos racoons eram sororeagentes para o sorovar Icterohaemorrhagiae e 13% dos cangambás eram sororeagentes para o sorovar Grippotyphosa. Um esquilo apresentou altos títulos para os sorovares Grippotyphosa e Canicola e todos os gambás foram negativos. Estudos anteriores já haviam detectado diferentes sorovares de leptospiras em cangambás, espécie da Família Mustelidae muito comum nas áreas periurbanas nos EUA. FERGUSSON & HEIDT (1981) demonstraram que 46,6% dos mustelídeos estudados foram positivos para leptospirose e CARPIO et al. (1987) isolaram o sorovar Pomona desta família. Outros mustelídeos já estudados e que apresentaram positividade para leptospirose foram os texugos (Meles meles), os minks (Lutreola lutreola), (HATHAWAY et al., 1983), os ferrets (Mustela putorius furo) (TORTEN, 1979) e arminhos (Mustela erminea) (TWIGG et al., 1968). MODRIC & HUBER (1993) estudaram 42 ursos marrons (Ursus arctos) de vida livre e de cativeiro na Croácia e 17 deles apresentavam anticorpos contra os sorovares Australis, Sejroe, Canicola e Icterohaemorrhagiae, enquanto que ZARNKE (1983) encontrou positividade em 5% das 122 amostras de soro sanguíneo de ursos grizzly (Ursus arctos grizzly) e 4% das 28 amostras de soro sanguíneo de ursos negros (Ursus americanus) em um estudo realizado no Alaska. ANDERSON et al. (1978) descreveram a ocorrência de leptospirose em dois tratadores de animais de zoológico e concluíram que a transmissão da doença para tais tratadores ocorreu pelo contato direto e intenso com filhotes de ursos os quais foram aleitados artificialmente. 8 Animais da Família Felidae, assim como os gatos domésticos parecem ser mais resistentes à leptospirose (CARLOS et al., 1971; GREENE, 1984; CORRÊA & CORRÊA, 1992; QUINN et al., 1994). Estudando a leptospirose em grandes grupos de gatos domésticos, LARSSON (1981) e DICKESON & LOVE (1993), relataram uma maior freqüência do sorovar Pomona, porém também foram encontrados os sorovares Icterohaemorrhagiae, Canicola, Grippotyphosa, Autumnalis, Ballum, Tarassovi, Copenhageni e Zanoni. AGUNLOVE & NASH (1996) investigando a prevalência de infecção leptospírica em 87 gatos da área de Glasgow, Escócia, detectaram 9,2% de positividade sendo os sorovares Hardjo (5/87), Autumnalis (2/87) e Icterohaemorrhagiae (1/87) os mais encontrados. Quatro desses gatos positivos eram de área rural. LANGONI et al. (1998) estudaram 200 amostras de soro de gatos atendidos em clínicas particulares e no Hospital Veterinário da FMVZ-Unesp, Campus de Botucatu, dentre as quais, 4,5% eram reagentes e os sorovares encontrados foram Icterohaemorrhagiae, Patoc, Canicola, Grippotyphosa, Copenhageni e Andamana. Em felinos selvagens de vida livre os estudos sobre leptospirose são bastante escassos. HEIDT et al. (1988) estudaram linces americanos (Felis rufus) nos Estados Unidos da América e conseguiram demonstrar reação sorológica positiva para leptospirose em 25% dos animais avaliados. Levantamentos sorológicos para leptospirose envolvendo animais da Ordem Primata demonstraram positividade tanto em primatas do Velho Mundo quanto do Novo Mundo (BRACK, 1987). MINETTE (1966) já descrevia a ocorrência de anticorpos contra o sorovar Ballum em babuínos (Papio sp), chimpanzés (Pan troglodytes), macacos africanos (Cercopithecus patas) e sagüis (Oedipomidas oedipus) e contra o sorovar Icterohaemorrhagiae em chimpanzés de cativeiro. BAULU et al. (1987) estudaram 646 macacos verdes africanos (Cercopithecus aethiops sabaeus) em Barbados, América Central e conseguiram verificar 28,5% de animais positivos e os sorovares relatados foram: Ballum, Icterohaemorrhagiae, Autumnalis, Pyrogenes e Pomona. 9 Em aves, a leptospirose é pouco estudada, pois se dá pouca importância a essa classe de animais como reservatório da doença, porém GUBLER et al. (2001) afirmaram que as aves podem ser portadoras de leptospiras e apresentarem papel importante no ciclo da doença. LINDTNER (1989) realizou infecção experimental em ovos embrionados de galinhas e observou lesões características e numerosas leptospiras no fígado do embrião. Na Argentina, CAFFARENA et al. (1989) estudaram galinhas, bovinos e suínos de uma mesma propriedade e demonstraram que 20% dos bovinos e 35% das galinhas eram reagentes para o sorovar Butembo e todos os suínos eram negativos para leptospirose. Em um levantamento sorológico realizado nas ilhas Trinidad e Grenada entre 1976 e 1979 envolvendo várias espécies animais, inclusive aves, 11% das amostras de soro de galinhas foram reagentes e as amostras de soro de patos e gansos não foram reagentes (EVERARD et al., 1983). Em répteis, pode ocorrer a presença de leptospiras em animais saudáveis, evidenciando esses animais como reservatórios, porém em alguns casos pode-se observar nefrite intersticial (OLIVEIRA, 2003). Sorologias realizadas em amostras de soro de serpentes peçonhentas e não peçonhentas sugeriram que a infecção pode ser transmitida por roedores infectados predados por esses animais e os sorovares relacionados a estas serpentes foram: Andamana, Icterohaemorrhagiae, Ballum, Grippotyphosa e Pomona (SANTA ROSA et al., 1980). Estudos sorológicos com amostras de soro de tartaruga de orelha vermelha (Trachemys scripta elegans) demonstraram que os sorovares Ballum e Tarassovi foram os mais prevalentes nesta espécie (ANDREWS et al., 1965; GLOSSER et al., 1974). Estudos envolvendo a ocorrência de leptospiras em peixes mostraram a ocorrência de infecção nesses animais e nos humanos em centros de pisciculturas relacionando a transmissão à ração de peixes contaminada com urina de roedores portadores da Leptospira (DOUGLAS, 1995; HOLK et al., 2000, FATTAKHOV & MEFODIEV, 2002). A leptospirose é considerada tradicionalmente uma doença ocupacional com maior ocorrência em criadores de animais (BRASIL, 1995; NATARAJASEENIVASAN et 10 al., 2005). VASCONCELOS et al. (1993) analisaram 249 amostras de soro sanguíneo humano de açougueiros, trabalhadores de fazendas, crianças e serventes da cidade de Londrina, Paraná e obtiveram 22,1% de soropositividade com títulos variando de 200 a 3.200. Alguns grupos profissionais correm grandes riscos de contrair a infecção devido ao freqüente contato com animais portadores, seus produtos e ainda ao próprio ambiente de trabalho. Pessoas que trabalham com animais selvagens também correm o risco de contrair a infecção, pois muitos destes animais se tornam importantes hospedeiros de manutenção das leptospiras por toda sua vida. Em conseqüência, tornam-se fontes de infecção para o ser humano e animais domésticos, sendo às vezes a causa de emergência ou re -emergência dessa enfermidade (FAINE, 1994). No Brasil, a leptospirose ainda é pouco estudada nos animais selvagens tanto em vida livre quanto em cativeiro e, embora alguns trabalhos científicos tenham se iniciado por toda a América do Sul, ainda há uma grande lacuna no conhecimento da cadeia epidemiológica da doença dificultando a elaboração de planos de controle da enfermidade. CORDEIRO et al. (1981) examinaram soro sanguíneo e amostras de tecidos de um total de 1.064 animais selvagens de vida livre de 43 espécies diferentes nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Foram analisadas 572 amostras de tecidos e isolou-se leptospiras de 99 (17,31%) delas, a análise de soro sanguíneo foi realizada em 328 amostras e 21 (6,4%) foram consideradas reagentes na prova de soroaglutinação microscópica (SAM). MATHIAS et al. (1999) pesquisaram a presença de anticorpos contra Brucella abortus e Leptospira interrogans em 17 amostras de soro sanguíneo de veados campeiros (Ozotocerus bezoarticus) de vida livre no Pantanal Matogrossense, Mato Grosso do Sul e em 24 amostras de animais do Parque Nacional de Emas, Goiás. Todas as amostras de soro dos animais do Parque Nacional de Emas foram negativas para leptospirose e quatro (24%) amostras dos animais do Pantanal Matogrossense foram positivas apresentando os sorovares Hardjo (n=2), Wolffi (n=1) e Mini (n=1) com títulos variando entre 100 e 200. 11 SOUZA JUNIOR et al. (2006) realizaram um estudo sorológico em 427 animais de vida livre resgatados do lago da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, Tocantins, sendo 286 macacos prego (Cebus apella), 82 bugios (Alouatta caraya), 31 quatis (Nasua nasua), 10 cachorros do mato (Cerdocyon thous), sete cutias (Dasyprocta sp), seis tamanduás mirins (Tamandua tetradactyla) e cinco tatus (Euphractus sexcintus) e encontraram soros positivos em 16,1% dos macacos prego, 2,4% dos bugios, 12,9% dos quatis, 20% dos cachorros do mato e os títulos variaram de 100 a 1600. Todas as cutias, tamanduás e tatus foram negativos para leptospirose. Em cativeiro, as informações sobre a fauna selvagem são bastante escassas e ainda há uma relutância por parte dos profissionais da área em manejar esses animais com o uso de contenções químicas para realização de exames clínicos e colheita de material para exames laboratoriais (MONTALI & MIGAKI, 1980; MUNSON & COOK, 1993). Frequentemente a leptospirose se encaixa nas doenças de coleções de animais em cativeiro que não são corretamente diagnosticadas, havendo, muitas vezes, apenas informações sobre casos suspeitos (McNAMARA et al., 1997). Um estudo retrospectivo de 30 anos realizado por DINIZ et al. (1999) na Fundação Parque Zoológico de São Paulo com lobos-guará (Chrysocyon brachyurus) demonstrou que 2% dos animais vieram a óbito devido à nefrite e convulsões epileptiformes causada por Leptospira spp.. No mesmo ano, no Zoológico de Brasília foi relatado por FARIAS et al. (1999) um caso de leptospirose em uma ariranha (Pteronura brasiliensis). Recentemente, KIK et al. (2006) relataram um surto de leptospirose em focas (Phoca vitulina) em um zoológico da Holanda onde cinco animais adultos morreram em 12 dias e na necropsia foram observados sinais compatíveis com a fase aguda da doença. Testes sorológicos confirmaram que um dos animais era positivo para o sorovar Icterohaemorrhagiae. Uma investigação sorológica realizada no zoológico de Chapultepec na Cidade do México por LUNA-ALVAREZ et al. (1996), apontou a ocorrência de Leptospira spp. em 48 amostras de soro de 19 espécies de mamíferos entre carnívoros, cervídeos e primatas, detectando 25 (52%) delas positivas para um ou mais sorovares. Os 12 sorovares mais freqüentes foram Icterohaemorrhagiae, Canicola, Pyrogenes, Hebdomadis, Pomona, Grippotyphosa, Autumnalis e Panama. No Brasil, são escassos os estudos epidemiológicos nos animais selvagens (GIRIO et al., 1999), porém atualmente alguns levantamentos sorológicos têm sido realizados em zoológicos e criadouros a fim de se obter mais dados sobre a leptospirose em populações cativas. LILENBAUM et al. (2002) analisaram amostras de soro de 77 animais de 38 espécies diferentes de mamíferos albergados no Zoológico do Rio de Janeiro, por meio da SAM e detectaram 51 (66,2%) amostras reagentes sendo que 29 (37,7%) obtiveram título maior ou igual a 200, 15 (19,5%) com título 100 e sete (9,1%) demonstraram título 50. Os anticorpos contra Leptospira spp. foram mais comuns em animais das famílias Canidae, Myrmecophagidae e Procyonidae. GUERRA-NETO et al. (2004) realizaram um estudo com 61 felídeos neotropicais do Criadouro de Animais Silvestres da Itaipu Binacional e do Zoológico Municipal Bosque Guarani em Foz do Iguaçu, Paraná e 28 (45,9%) animais apresentaram reação positiva na prova de SAM. Os sorovares encontrados foram Castellonis, Hardjo, Grippotyphosa, Bratislava, Patoc, Butembo, Andamana e Autumnalis. CORRÊA et al. (2004) realizaram uma pesquisa sorológica em 309 animais selvagens atendidos na Divisão de Veterinária da Fundação Parque Zoológico de São Paulo sendo 290 animais mantidos em cativeiro e 12 animais sinantrópicos, e encontraram 59 (19,5%) animais sororeagentes para leptospirose na SAM. Diversas famílias foram estudadas incluindo primatas, carnívoros, roedores, marsupiais, cervídeos, bovídeos e a freqüência de positividade, quando verificada do ponto de vista da localização espacial dos recintos dos animais, permitiu a demonstração de áreas críticas para a exposição às leptospiras dentro do zoológico. ESTEVES et al. (2005) estudaram 166 animais cativos do Zoológico Municipal de Uberaba, Minas Gerais entre aves, répteis, mamíferos e peixes, além de gatos domésticos errantes e roedores sinantrópicos. Foram positivos 17 (10,2%) animais, apresentando título maior ou igual a 100, sendo oito mamíferos, dois répteis, seis peixes e um roedor sinantrópico e os sorovares envolvidos foram Canicola, Icterohaemorrhagiae, Andamana, Grippotyphosa e Patoc. Amostras de soro sanguíneo 13 dos 36 funcionários da instituição também foram submetidas à prova de SAM e assim como as amostras das aves e dos gatos domésticos foram negativas na análise sorológica. 14 2. JUSTIFICATIVAS Este trabalho se justifica pela importância da leptospirose como doença distribuída mundialmente e que afeta diversas espécies animais e o ser humano, além de ocorrer em ambientes com grande concentração de pessoas, animais domésticos, selvagens e sinantrópicos como parques, criatórios, fazendas e zoológicos, Como o estudo da leptospirose em animais selvagens é escasso há necessidade de se conhecer melhor o envolvimento desses animais na cadeia epidemiológica da doença para poder estabelecer seu real papel na conservação das espécies. A utilização de amostras de soro de animais cativos em zoológico permite avaliar como a leptospirose se comporta nas diferentes espécies que convivem num ambiente comum, além de poder determinar os pontos críticos de exposição às leptospiras e sua implicação na saúde de funcionários, técnicos, estagiários e visitantes do zoológico. 15 3. OBJETIVOS O estudo realizado no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto teve como objetivo determinar: 1. a freqüência de anticorpos contra Leptospira spp. em animais selvagens mantidos em cativeiro no Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, São Paulo; 2. a freqüência de anticorpos contra Leptospira spp. em animais de vida livre (selvagens, sinantrópicos e domésticos) capturados dentro da área do zoológico. 3. a freqüência de anticorpos contra Leptospira spp. em amostras de soro sanguíneo de funcionários do zoológico. 4. os sorovares predominantes e realizar uma distribuição espacial dentro do zoológico. 5. os pontos mais propícios para exposição às leptospiras . 16 4. MATERIAL E MÉTODOS O presente trabalho foi autorizado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) com a licença N° 150/2006 – CGFAU expedida pela Coordenação de Manejo de Fauna na Natureza em Brasília, Distrito Federal, após avaliação de projeto encaminhado e registrado pelo número de processo: 02027.003483/2005-44. Todas as atividades realizadas foram previamente agendadas e acompanhadas pela equipe de técnicos, veterinário e/ou biólogo, funcionários e estagiários do zoológico. 4.1. Área de Estudo O Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto está localizado no Parque Municipal Morro de São Bento no município de Ribeirão Preto, estado de São Paulo. O Parque tem uma área de 25,088ha e está localizado próximo à área central do município. É constituído por complexos de áreas verdes (Bosque e Zoológico Municipal), espaços culturais (Teatro de Arena, Teatro Municipal, Casa da Cultura) e espaços esportivos (Conjunto Poliesportivo Cava do Bosque). O Parque tem formação rochosa basáltica com solo denominado latossolo roxo com textura pedregosa revestido de dois tipos predominantes de florestas tropicais: Mesófila Semidescídua e Caducifólica que albergam 47 espécies arbóreas diferentes. Além da fauna cativa, existem também muitas espécies de animais vivendo em liberdade dentro do Parque como fauna nativa, tatus (Euphractus sexcintus e Dasypus novemcinctus) e gambás (Didelphis sp), fauna introduzida, bugios (Alouatta caraya), cutias (Dasyprocta sp) tucanos (Ramphastus toco), sagüis (Callithrix sp) e fauna restrita ao zoológico, mantida em cativeiro que serve à visitação pública (PLANO DE MANEJO DO PARQUE MUNICIPAL DO MORRO DO SÃO BENTO, 1998). 17 A área total do zoológico é de aproximadamente 13.000m² que compreende estruturas como recintos de animais, setor técnico, prédios administrativos, portarias, lanchonete, banheiros, jardim japonês, trilhas e mirante. A vegetação do zoológico é bastante densa formando áreas fechadas com pouca inserção de raios solares e alta umidade, principalmente nas regiões onde se encontram os lagos e as regiões próximas às trilhas onde a mata é bastante preservada. Em épocas chuvosas é possível observar acúmulo de água em alguns recintos e cama de folhagens úmidas. Ao longo das trilhas e áreas de preservação da floresta a vegetação é praticamente intocada e podem-se observar tocos de árvores e bambus rachados propiciando fonte de água e abrigo aos animais silvestres e sinantrópicos. 4.2. População Estudada O zoológico possui atualmente um plantel constituído por 538 animais distribuídos em 128 espécies diferentes de répteis, aves, mamíferos e peixes, segundo o senso apresentado ao IBAMA em março de 2007. Durante o período de março a outubro de 2006 foram capturados e contidos 388 animais (110 répteis, 143 aves, 110 mamíferos e 25 peixes) no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto em Ribeirão Preto, dentre os quais 339 eram animais cativos (Quadro 1 e Figura 1) e 49 eram animais de vida livre (Quadro 2) capturados através de armadilhas distribuídas pela área do zoológico (Figura 2). Além disso, foram colhidas amostras de soro de 15 funcionários do zoológico entre tratadores, técnicos, manutenção e estagiários. Sendo assim, a pesquisa foi realizada com um total de 403 amostras de soro sanguíneo. 18 Quadro 1. Caracterização dos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto cujas amostras de soro foram submetidas à SAM para diagnóstico da leptospirose. Jaboticabal. 2008. FAMÍLIA NOME CIENTÍFICO NOME COMUM Nº. DE ANIMAIS Accipitridae Buteo magnirostris Gavião Carijó 02 Buteo albicaudatus Gavião de rabo branco 02 Alligatoridae Caiman latirostris Jacaré de Papo Amarelo 01 Anatidae Anas sp Pato doméstico 08 Alopochem aegyptiacus Ganso do Egito 04 Cygnus atratus Cisne Preto 02 Dendrocygna bicolor Marreca Caneleira 05 Dendrocygna viduata Irerê 07 Anas sp Marreco de Pequim 10 Coscoroba coscoroba Coscoroba 02 Anseranatidae Anser sp Ganso Doméstico 06 Boidae Boa c. amarali Jibóia Cinzenta 11 Boa c. constrictor Jibóia da Amazônia 01 Eunectes murinus Sucuri 01 Python regius Píton Real 01 Epicrates c. crassus Salamanta do Sudeste 03 Callithrichidae Leontopithecus rosalia Mico Leão Dourado 01 Canidae Cerdocyon thous Cachorro do Mato 07 Chrysocyon brachyurus Lobo Guará 02 Cathartidae Sarcoramphus papa Urubu Rei 03 Caviidae Cavia porcellus Porquinho da Índia 12 Cebidae Alouatta caraya Bugio 01 Cebus apella Macaco Prego 11 Saimiri sciureus Mico de Cheiro 02 19 Cercopithecidae Mandrillus sphinx Mandril 02 Papio hamadryas Babuíno Sagrado 02 Cervidae Dama dama Cervo Dama 02 Mazama gouazoubira Veado Catingueiro 04 Chelydridae Chelydra serpe ntina Tartaruga mordedora 03 Chelidae Phrynops geoffroanus Cágado de Barbicha 02 Cichlidae Oreochromis sp Tilápia do Nilo 25 Colubridae Hydrodynastes gigas Surucucu do pantanal 01 Cracidae Crax blumembachii Mutum do Sudeste 05 Crax f. fasciolata Mutum de Penacho 09 Mitu tuberosa Mutum Cavalo 01 Penelope superciliaris Jacupemba 06 Pipile p. nattereri Cujubi 03 Pipile p. cumanensis Jacutinga Barbela Azul 01 Dasyproctidae Agouti paca Paca 01 Emydidae Trachemys s. elegans Tartaruga de Orelha 44 Erethizontidae Coendou preensilis Ouriço Cacheiro 02 Falconidae Polyborus plancus Carcará 02 Felidae Panthera leo Leão 06 Panthera onca Onça Pintada 03 Panthera onca melanica Onça Preta 01 Puma concolor Suçuarana 01 Leopardus tigrinus Gato do mato pequeno 02 Leopardus pardalis Jaguatirica 02 Gekkonidae Iguana iguana Iguana 04 Myrmecophagidae 20 Myrmecophaga trydactyla Tamanduá - bandeira 03 Pelomedusidae Podocnemis expansa Tartaruga da Amazônia 04 Podocnemis unifilis Tracajá 02 Phasianidae Pavo cristatus Pavão Azul 08 Crysolophus pictus Faisão Dourado 01 Procyonidae Nasua nasua Quati 04 Psittacidae Amazona aestiva Papagaio Verdadeiro 03 Amazona amazonica Papagaio do Mangue 04 Anodorhynchus hyacinthinus Arara Una 01 Ara ararauna Arara Canindé 07 Ara macao Arara Canga 01 Ara chloroptera Arara Vermelha 02 Aratinga leucophthalmus Jandaia Maracanã 06 Cyanoliseus patagonus Ararinha da Patagônia 01 Pionus maximilliani Maitaca Bronzeada 02 Ara manillata Maracanã do Buriti 01 Pionus menstrous Maitaca de cabeça azul 01 Diopsittaca nobilis Ararinha nobre 02 Amazona xanthops Papagaio galego 01 Deroptyus accipitrinus Anacã 01 Aratinga guarouba Ararajuba 01 Ramphastidae Ramphastos vitellinus Tucano Bico Preto 02 Ramphastos dicolorus Tucano Bico Verde 02 Ramphastos toco Tucano Toco 02 Rheidae Rhea americana Ema 01 Strigidae Rhynoptynx clamator Coruja de Orelha 03 Tapiridae Tapirus terrestris Anta 02 Testudinidae Geochelone carbonaria Jabuti Piranga 27 Geochelone denticulata Jabuti Tinga 02 Tytonidae 21 Tyto alba Suindara 02 Ursidae Ursus arctos Urso Pardo 01 TOTAL: 35 77 339 lagos praça das aves tanque das tartarugas praça dos felinos praça dos primatas URSO porquinhos da india educação ambiental jardim japonês cervídeostamanduás setor extra praça das araras recanto das aves terrário tucanos Figura 1. Localização dos recintos dos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, São Paulo. Brasil. 2008. 22 Quadro 2. Caracterização dos animais de vida livre capturados na área do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto cujas amostras de soro foram submetidas à SAM para diagnóstico da leptospirose. Jaboticabal. 2008. FAMÍLIA NOME CIENTÍFICO NOME COMUM Nº. DE ANIMAIS Accipitridae Buteo magnirostris Gavião Carijó 02 Canidae Cerdocyon thous Cachorro do Mato 01 Cebidae Alouatta caraya Bugio 01 Columbinae Columba lívia Pombo doméstico 07 Dasyproctidae Dasyprocta agouti Cutia 12 Didelphidae Didelphis albiventris Gambá de orelha branca 05 Erethizontidae Coendou preensilis Ouriço Cacheiro 01 Felidae Felis catus Gato doméstico 03 Gekkonidae Iguana iguana Iguana 01 Muridae Rattus rattus Rato de telhado 09 Mus musculus Camundongo 04 Teiidae Tupinambis sp Lagarto teiú 02 Tytonidae Tyto Alba Suindara 01 TOTAL: 12 13 49 23 L7 L4 L6L5 L2 L1 L3 Figura 2. Locais de armadilhamento (L) e captura de animais de vida livre no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto. Brasil. 2008. 24 4.3. Contenção Os animais capturados para o estudo foram submetidos à contenção física e/ou química para a colheita de sangue. O tipo de contenção foi escolhido de modo a minimizar o estresse e os riscos para o animal e a equipe levando-se em consideração a espécie e o tamanho do animal, os equipamentos de contenção disponíveis, o temperamento individual dos animais e o estado de saúde. A contenção física foi realizada com o auxílio de redes, puçás, luvas de raspa de couro e caixas de prensa (Anexo 1). A contenção química ocorreu mediante a utilização de fármacos anestésicos dissociativos e tranqüilizantes associados, como a associação de cloridrato de quetamina com cloridrato de xilazina e a associação de cloridrato de tiletamina com zolazepam. Os fármacos foram aplicados com o auxílio de seringas, diretamente no animal contido fisicamente ou com o uso de dardos anestésicos lançados a longas distâncias, com o auxílio de zarabatanas ou pistolas de pressão (Anexo 2). As dosagens anestésicas (miligrama por quilograma de peso) respeitaram dosagens pré-estabelecidas de acordo com a espécie ou foram calculadas por extrapolação alométrica (CUBAS et al., 2006). As aves, répteis e peixes foram contidos apenas fisicamente e então submetidos à colheita de sangue. Os mamíferos foram contidos física e quimicamente e após a realização dos procedimentos, foram colocados em caixas ou nos cambiamentos dos recintos para recuperação e depois foram liberados. 4.4. Captura dos animais de vida livre No decorrer do trabalho realizado dentro do zoológico efetuou-se uma análise visual para determinar quais os animais que circulavam livremente na área do Bosque e em que locais eles eram mais freqüentes. Com essas informações foi possível se estabelecer o tipo de armadilha necessária para as contenções e o tipo de isca ideal para atrair os animais. A captura dos animais de vida livre foi realizada pelo uso de armadilhas tipo Tomahawk em dois tamanhos diferentes, 40x20x15cm para captura de 25 roedores (Anexo 3) e outra com 150x60x50cm para a captura de animais maiores (Anexo 4). As armadilhas foram montadas durante os meses de agosto a outubro de 2006 sendo armadas três vezes ao dia, (manhã, tarde e noite) a fim de se adequar aos diferentes hábitos de vida de espécies como cutias (Dasyprocta agouti), gambás (Didelphis sp), gatos domésticos (Felis catus), teiús (Tupinambis sp) e roedores (Rattus rattus, Mus musculus e Rattus norvegicus). As iscas utilizadas foram bananas, espiga de milho, cenoura crua, amendoim, mel, carne crua e ração de cachorro. Nos animais capturados nas armadilhas era realizada uma estimativa de peso para em seguida fazer-se a contenção com o auxílio de um puçá, sedação anestésica e só então proceder-se a colheita de sangue. Todos os animais selvagens, capturados nas armadilhas, receberam uma marcação por meio de tricotomia na região dos flancos direito e esquerdo e foram soltos após a recuperação anestésica, no mesmo local em que foram capturados. Os gatos e os pombos domésticos foram encaminhados ao Centro de Controle de Zoonoses do Município de Ribeirão Preto e todos os roedores sinantrópicos foram eutanasiados. 4.5. Obtenção das amostras de sangue e soro sanguíneo A colheita de sangue foi realizada por punção venosa utilizando-se seringas e agulhas estéreis descartáveis. O acesso venoso escolhido, a quantidade de sangue e o tamanho das agulhas e seringas variaram de acordo com a espécie, tamanho, idade e condições físicas do animal (Anexo 5). O sangue dos funcionários foi colhido por enfermeiros da Secretaria Municipal de Saúde de Ribeirão Preto, nas dependências do próprio zoológico em um dia destinado à campanha de vacinação dos servidores municipais. Apesar de toda a estrutura montada, somente 15 dos quase 40 funcionários quiseram colaborar com esta pesquisa. O sangue total colhido foi colocado em tubos de ensaio estéreis e permaneceram em temperatura ambiente em inclinação de 45° por uma hora para dessora e, após esse período, foi centrifugado a 700G por 5 minutos para completa separação do soro 26 do coágulo. Os soros obtidos foram transferidos para tubos tipo “eppendorf” de 1ml, identificados com o número da amostra de acordo com o livro de registro de colheita de material, congelados e mantidos em freezer a -20° C até a realização dos testes sorológicos. 4.6. Prova de Soroaglutinação Microscópica (SAM) A pesquisa de anticorpos contra Leptospira spp. nas amostras de soro foi realizada por meio da prova SAM utilizando-se uma coleção de antígenos composta de 22 sorovares de leptospiras patogênicas e dois sorovares de leptospiras não patogênicas (Quadro 3). Os antígenos foram provenientes de matrizes repicadas semanalmente em meio líquido de EMJH (Difco) tendo como inoculo 10% do volume do meio a semear e mantidas em estufa bacteriológica a 28°C. Os antígenos utilizados foram aqueles puros, livres de autoaglutinação e isentos de contaminação que apresentaram, por estimativa de densidade, de 100 a 200 leptospiras por campo microscópico. Os soros foram diluídos em solução tamponada de Sörensen, segundo SANTA ROSA (1970), em uma diluição inicial de 1/10 e em seguida foram colocadas alíquotas de 50 µL em placas de poliestireno, com fundo em formato de U e adicionada igual quantidade de antígeno das 24 variantes antigênicas, resultando em uma diluição de 1/20. A mistura soro-antígeno foi levemente agitada e incubada em estufa bacteriológica à temperatura de 28°C por duas horas e logo procedeu-se a leitura em microscópio de campo escuro com objetiva de 40x e ocular de 15x, colocando-se uma gota da mistura sobre uma lâmina de vidro tamanho 26x76mm . Foram considerados reagentes os soros que demonstraram pelo menos 50% de aglutinação, ou seja, metade das leptospiras aglutinadas no campo microscópico no aumento de 100 vezes e estes foram então reexaminados com sete diluições seriadas de razão dois a fim de se obter o título final. Os soros considerados reagentes para esta pesquisa foram aqueles que apresentaram reação de aglutininas igual ou maior a 50% a partir da diluição 1/40. Quando um soro apresentou reação cruzada de dois sorovares 27 ou mais foi considerado apenas o sorovar com maior título. Os soros que apresentaram o mesmo título para dois ou mais sorovares foram considerados como reagentes nos resultados gerais, porém foram tabelados separadamente. Quadro 3. Estirpes de Leptospira interrogans empregadas como antígeno na reação de soroaglutinação microscópica aplicada à leptospirose, segundo o código, sorogrupo e sorovar. Código Sorogrupo Sorovares 1-A Australis Australis 1-B Australis Bratislava 2-A Autumnalis Autumnalis 2-B Autumnalis Butembo 2-C Ballum Castellonis 3 Bataviae Bataviae 5 Canicola Canicola 6 Celledoni Whitcombi 7 Cynopteri Cynopteri 8 Grippotyphosa Grippotyphosa 9 Hebdomadis Hebdomadis 10-A Icterohaemorrhagiae Copenhageni 10-B Icterohaemorrhagiae Icterohaemorrhagiae 11 Javanica Javanica 12 Panama Panama 13 Pomona Pomona 14 Pyrogenes Pyrogenes 15-A Sejroe Hardjo 15-B Sejroe Wolffi 16 Shermani Shermani 17 Tarassovi Tarassovi 18 Andamana Andamana 20 Seramanga Patoc ST Djasiman Sentot 28 5. RESULTADOS Os resultados das análises sorológicas realizadas foram organizados em tabelas e gráficos dividindo os animais entre cativos e de vida livre e ainda, animais reagentes para um sorovar e animais reagentes para dois ou mais sorovares. Foram relacionadas, ainda as freqüências dos sorovares e a distribuição espacial dos reagentes dentro do zoológico. Das 388 amostras de sangue de animais analisadas, 112 (28,9%) foram reagentes para leptospirose. Do total de soros colhidos, 339 eram de animais cativos, sendo que 100 (29,4%) foram reagentes e 49 de animais de vida livre selvagens, sinantrópicos e domésticos, sendo que 12 (24,5%) foram reagentes para leptospirose. Das 112 amostras reagentes, 103 foram para somente um sorovar (92 cativos e 11 de vida livre) e nove para dois ou mais sorovares com o mesmo título (oito cativos e um de vida livre). Os sorovares mais encontrados nas amostras de animais cativos reagentes para um sorovar foram: Patoc (27/92 = 29,3%), Andamana (21/92 = 22,8%), Canicola (10/92 = 10,8%), Icterohaemorrhagiae (7/92 = 7,6%) e Panama (7/92 = 7,6%). Nas amostras de animais de vida livre reagentes para um sorovar, os sorovares encontrados foram Patoc (5/11 = 45,4%), Autumnalis (2/11 = 18,2%), Copenhageni (2/11 = 18,2%), Pyrogenes (1/11 = 9,1%) e Australis (1/11 = 9,1%). Os resultados da prova de SAM para leptospirose realizada nas diversas famílias de animais cativos do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto, reagentes para um sorovar assim como os sorovares encontrados estão expressos na Tabela 1. 29 Tabela 1.Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nas famílias de animais cativos do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar, os sorovares encontrados e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008. GRUPO ANIMAL (FAMÍLIA) REAGENTES/EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS TÍTULOS Anatidae 12/38 (31,7%) Patoc 5/12 (41,6%) 40-320 Copenhageni 4/12 (33,3%) 40-640 Andamana 1/12 (8,3%) 40 Panama 1/12 (8,3%) 40 Icterohaemorrhagiae 1/12 (8,3%) 40 Boidae 6/17 (35,3%) Canicola 2/6 (33,3%) 40 Patoc 2/6 (33,3%) 40-80 Andamana 1/6 (16,6%) 40 Sentot 1/6 (16,6%) 40 Canidae 2/9 (22,2%) Patoc 1/2 (50%) 80 Sentot 1/2 (50%) 40 Caviidae 1/12 (8,3%) Andamana 1/1 (100%) 40 Cebidae 2/14 (14,8%) Patoc 2/2 (100%) 80 Cervidae 1/6 (16,6%) Pyrogenes 1/1 (100%) 40 Chelidae 1/2 (50%) Canicola 1/1 (100%) 40 Cichlidae 2/25 (8%) Icterohaemorrhagiae 1/2 (50%) 40 Bratislava 1/2 (50%) 40 Cracidae 13/25 (52%) Patoc 8/13 (61,5%) 40-1.280 Panama 3/13 (23%) 40-80 Castellonis 1/13 (7,6%) 160 Icterohaemorrhagiae 1/13 (7,6%) 40 Dasyproctidae 1/1 (100%) Icterohaemorrhagiae 1/1 (100%) 40 Emydidae 26/44 (59%) Andamana 17/26 (65,3%) 40-5.120 Tarassovi 5/26 (19,2%) 80-320 Canicola 4/26 (15,3%) 40-160 Felidae 2/15 (13,3%) Canicola 1/2 (50%) 40 Icterohaemorrhagiae 1/2 (50%) 40 Gekkonidae 1/4 (25%) Butembo 1/1 (100%) 40 Myrmecophagidae 1/3 (33,3%) Icterohaemorrhagiae 1/1 (100%) 160 Pelomedusidae 5/6 (83,3%) Panama 3/5 (60%) 2.560 Pomona 2/5 (40%) 1.280 continua... 30 Phasianidae 1/7 (14,2%) Patoc 1/1 (100%) 80 Psittacidae 5/34 (14,7%) Patoc 2/5 (40%) 40-160 Andamana 1/5 (20%) 80 Sentot 1/5 (20%) 640 Icterohaemorrhagiae 1/5 (20%) 80 Ramphastidae 1/6 (16,6%) Patoc 1/1 (100%) 40 Testudinidae 8/29 (27,5%) Patoc 5/8 (62,8%) 40-160 Hebdomadis 2/8 (25%) 80 Canicola 1/8 (12,5%) 40 Ursidae 1/1 (100%) Canicola 1/1 (100%) 320 TOTAL 92/ 339 (27,2%) A freqüência dos sorovares encontrados nos animais cativos reagentes para um sorovar está demonstrada no Gráfico 1. Patoc 29,3% Andamana 22,8% Canicola 10,8% Icterohaemorrhagiae 7,6% Panama 7,6% Tarassovi 5,4% Copenhageni 4,3% Sentot 3,2% Outros 9% Gráfico 1. Freqüência de sorovares encontrados nos animais cativos do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar Jaboticabal. 2008. Os resultados da prova de SAM para leptospirose realizada nos animais de vida livre capturados nas dependências do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto , reagentes para um sorovar assim como os sorovares encontrados estão expressos na Tabela 2. 31 Tabela 2. Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nos animais de vida livre capturados nas dependências do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar, os sorovares encontrados e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008. GRUPO ANIMAL (FAMÍLIA) NOME COMUM REAGENTES/ EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS TÍTULOS Accipitridae Gavião Carijó 1/2 (50%) Patoc 1/1 (100%) 160 Canidae Cachorro do Mato 1/1 (100%) Australis 1/1 (100%) 40 Columbinae Pombo doméstico 1/7 (14,2%) Patoc 1/1 (100%) 40 Dasyproctidae Cutia 3/12 (25%) Autumnalis 2/3 (66,6%) 40 Patoc 1/3 (33,3%) 160 Didelphidae Gambá orelha branca 2/5 (40%) Patoc 2/2 (100%) 80 Muridae Rato de telhado 3/9 (33,3%) Copenhageni 2/3 (66,6%) 160 Pyrogenes 1/3 (33,3%) 80 TOTAL 11/49 (22,4%) A freqüência dos sorovares encontrados nos animais de vida livre reagentes para um sorovar está demonstrada no Gráfico 2. Patoc 45,4% Autunmalis 18,2% Copenhageni 18,2% Pyrogenes 9,1% Australis 9,1% Gráfico 2. Freqüência de sorovares encontrados nos animais de vida livre capturados nas dependências do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto reagentes para um sorovar Jaboticabal. 2008. 32 Os resultados da prova de SAM para leptospirose realizada nos animais do Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto, reagentes para dois ou mais sorovares com o mesmo título assim como os sorovares encontrados estão expressos na Tabela 3. Tabela 3. Resultados da SAM para diagnóstico da leptospirose nos animais do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto reagentes para dois ou mais sorovares com o mesmo título, os sorovares e os títulos encontrados. Jaboticabal. 2008. GRUPO ANIMAL (FAMÍLIA) NOME COMUM REAGENTES/ EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS TÍTULOS Cativos Psittacidae Ararinha de barriga vermelha 1/1 (100%) Butembo e Andamana 40 Anseranatidae Ganso 1/6 (16,6%) Canicola e Icterohaemorragiae 80 Phasianidae Pavão azul 1/8 (12,5%) Icterohaemorragiae e Panamá 40 Boidae Sucuri 1/1 (100%) Sentot, Andamana e Patoc 40 Felidae Jaguatirica 1/2 (50%) Bratislava e Pyrogenes 80 Cervidae Veado catingueiro 1/4 (25%) Icterohaemorragiae e Patoc 40 Cervo Dama 1/2 (50%) Autumnalis e Icterohaemorragiae 40 Myrmecophagidae Tamanduá bandeira 1/3 (33,3%) Icterohaemorragiae e Patoc 80 Vida Livre Dasyproctidae Cutia 1/12 (8,3%) Patoc e Copenhageni 160 TOTAL 09 33 Considerando o total de 388 animais analisados, 112 foram reagentes na SAM, dos quais 48 (42,8%) répteis, 37 (33%) aves, 25 (22,3%) mamíferos e dois (1,8%) peixes. Esses resultados e os sorovares mais encontrados em cada grupo estão expressos na Tabela 4. Tabela 4. Número e Freqüência (%) de animais reagentes na SAM por grupo animal analisado do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto, os sorovares mais encontrados em cada grupo e a variação do título para cada sorovar. Jaboticabal. 2008. GRUPO NÚMERO / REAGENTES (FREQUÊNCIA) SOROVARES MAIS ENCONTRADOS TÍTULOS Répteis 48/112 (42,8%) Andamana 18/48 (37,5%) Canicola 13/48 (27,1%) Tarassovi 5/48 (10,4%) Panama 3/48 (6,25%) 40-5.120 40-160 80-320 40-2.560 Aves 37/112 (33%) Patoc 19/37 (51,3%) Copenhageni 4/37 (10,8%) Panama 4/37 (10,8%) 40-1.280 40-640 40-80 Mamíferos 25/112 (22,3%) Patoc 6/25 (24%) Icterohaemorrhagiae 3/25 (12%) Copenhageni 2/25 (8%) Autumnalis 2/25 (8%) 80-160 40-160 160 40 Peixes 2/112 (1,8%) Icterohaemorrhagiae 1/2 (50%) Bratislava 1/2 (50%) 40 40 TOTAL 112 Os animais sororreagentes foram distribuídos espacialmente dentro do zoológico de acordo com o setor e o local onde foram contidos e capturados. Na Tabela 5, são apresentados os animais cativos reagentes para um sorovar de acordo com o setor do zoológico e os sorovares mais encontrados. Verifica-se que os setores com os maiores percentuais de animais reagentes foram:Tanque das Tartarugas (60%), Jardim Japonês (50%), Praça das Aves (36,6%), Setor dos Tamanduás (33,3%), Praça das Araras (30%), Educação Ambiental (28,9%) e Terrário (28%). 34 Tabela 5. Número de animais cativos reagentes na SAM para um sorovar relacionado aos setores do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados . Jaboticabal. 2008. SETOR DO ZOOLÓGICO REAGENTES /EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS Terrário 7/25 (28%) Canicola 2/7 (28,5%) Patoc 2/7 (28,5%) Andamana 1/7 (14,3%) Sentot 1/7 (14,3%) Butembo 1/7 (14,3%) Educação Ambiental 11/38 (28,9%) Patoc 5/11 (45,4%) Hebdomadis 2/11 (18,2%) Pomona 2/11 (18,2%) Canicola 1/11 (9,1%) Icterohaemorrhagiae 1/11 (9,1%) Lagos 14/66 (21,2%) Patoc 5/14 (35,7%) Copenhageni 4/14 (28,6%) Panama 2/14 (14,3%) Icterohaemorrhagiae 2/14 (14,3%) Andamana 1/14 (7,1%) Porquinhos da Índia 3/16 (18,7%) Panama 2/3 (66,6%) Andamana 1/3 (33,3%) Recanto das Aves 5/36 (13,9%) Patoc 3/5 (60%) Icterohaemorrhagiae 1/5 (20%) Sentot 1/5 (20%) Praça dos Felinos 1/15 (6,6%) Icterohaemorrhagiae 1/1 (100%) Tanque das Tartarugas 27/45 (60%) Andamana 17/27 (63%) Tarassovi 5/27 (18,5%) Canicola 5/27 (18,5%) Urso 1/5 (20%) Canicola 1/1 (100%) Praça dos Primatas 1/9 (11,1%) Canicola 1/1 (100%) Praça das Araras 3/12 (25%) Sentot 1/3 (33,3%) Andamana 1/3 (33,3%) Patoc 1/3 (33,3%) Tucanos 1/11 (9,1%) Icterohaemorrhagiae 1/1 (100%) Praça das Aves 11/30 (36,6%) Patoc 8/11 (72,7%) Panama 2/11 (18,2%) Castellonis 1/11 (9,1%) Tamanduás 1/3 (33,3%) Icterohaemorrhagiae 1/1 (100%) continua... 35 Cervídeos 1/5 (20%) Pyrogenes 1/1 (100%) Setor Extra 4/21 (19%) Patoc 3/4 (75%) Panama 1/4 (25%) Jardim Japonês 1/2 (50%) Bratislava 1/1 (100%) TOTAL 92/339 A Tabela 6 demonstra o número de animais de vida livre reagentes para um sorovar relacionado ao local de captura por armadilha dentro do zoológico e os sorovares mais encontrados Tabela 6. Número de animais de vida livre reagentes para um sorovar na SAM relacionado ao local de captura por armadilha dentro do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados. Jaboticabal. 2008. LOCAL DE CAPTURA REAGENTES/EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS L1 3/6 (50%) Patoc 3/3 (100%) L2 1/7 (14,3%) Patoc 1/1 (100%) L3 2/3 (66,6%) Pyrogenes 1/2 (50%) Copenhageni 1/2 (50%) L4 2/13 (15,4%) Patoc 1/2 (50%) Copenhageni 1/2 (50%) L5 3/14 (21,4%) Autumnalis 2/3 (66,6%) Australis 1/3 (33,3%) L6 0/2 (0,0%) ----- L7 0/4 (0,0%) ----- TOTAL 11/49 Patoc (5/11 = 45,4%) Autumnalis (2/11 = 18,2%) Copenhageni (2/11 = 18,2%) Australis (1/11 = 9,1%) Pyrogenes (1/11 = 9,1%) 36 A Figura 3 ilustra a distribuição espacial dos animais reagentes dentro do zoológico relacionando os animais cativos e os de vida livre. animais reagentes de vida livre animais reagentes cativos Figura 3. Mapa do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” ilustrando a distribuição espacial dos animais reagentes dentro do zoológico relacionando os animais cativos e os de vida livre. Brasil. 2008. 37 A Tabela 7 demonstra o número de animais cativos e de vida livre reagentes para dois ou mais sorovares relacionado ao setor do zoológico e local de captura por armadilha e os sorovares encontrados. Tabela 7. Número de animais cativos e de vida livre reagentes para dois ou mais sorovares na SAM relacionado aos setores e aos locais de captura por armadilha dentro do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto e os sorovares encontrados. Jaboticabal. 2008. SETOR DO ZOOLÓGICO REAGENTES/EXAMINADOS SOROVARES ENCONTRADOS Cativos Recanto das Aves 1/1 (100%) Butembo e Andamana Lagos 1/6 (16,6%) Canicola e Icterohaemorragiae Praça das Aves 1/7 (14,2%) Icterohaemorragiae e Panamá Terrário 1/1 (100%) Sentot, Andamana e Patoc Felinos 1/2 (50%) Bratislava e Pyrogenes Cervídeos 1/4 (25%) Icterohaemorragiae e Patoc 1/2 (50%) Autumnalis e Icterohaemorragiae Tamanduás 1/3 (33,3%) Icterohaemorragiae e Patoc Vida Livre L1 1/12 (8,3%) Patoc e Copenhageni TOTAL 09/339 38 Os títulos sorológicos nas amostras reagentes variaram de 40 a 5.120 sendo que houve predominância dos títulos 40 e 80 e os sorovares Patoc, Andamana, Canicola, Icterohaemorrhagiae e Panama foram os mais freqüentes, como mostra a Tabela 8. Tabela 8.Títulos e freqüência de aglutininas de 103 amostras de soro sanguíneo de animais reagentes para leptospirose pela prova de S.A.M. para um sorovar, sendo 92 amostras de animais cativos e 11 amostras de animais de vida livre do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto no período de março a outubro de 2006. Jaboticabal. 2008. SOROVAR TÍTULO 40 80 160 320 640 1.280 2.560 5.120 TOTAL 1 (%) Patoc 12 13 05 01 00 01 00 00 32 31,06 Andamana 09 07 01 01 00 02 00 01 21 20,38 Canicola 07 01 01 01 00 00 00 00 10 9,70 Icterohaemorrhagiae 05 01 01 00 00 00 00 00 07 6,80 Panama 02 02 00 00 00 00 03 00 07 6,80 Copenhageni 01 01 02 00 01 01 00 00 06 5,82 Tarassovi 00 02 02 01 00 00 00 00 05 4,85 Sentot 02 00 00 00 01 00 00 00 03 2,91 Pomona 00 00 00 00 00 02 00 00 02 1,94 Hebdomadis 00 02 00 00 00 00 00 00 02 1,94 Autumnalis 02 00 00 00 00 00 00 00 02 1,94 Pyrogenes 01 01 00 00 00 00 00 00 02 1,94 Castellonis 00 00 01 00 00 00 00 00 01 0,97 Butembo 01 00 00 00 00 00 00 00 01 0,97 Australis 01 00 00 00 00 00 00 00 01 0,97 Bratislava 01 00 00 00 00 00 00 00 01 0,97 TOTAL 44 30 13 04 02 06 03 01 103 100 1= Freqüência do o total de animais cativos e de vida livre reagentes para um sorovar. As 15 amostras de soro sanguíneo humano analisadas nessa pesquisa foram negativas frente à prova de soroaglutinação microscópica para diagnóstico de leptospirose a partir do título 20. 39 6. DISCUSSÃO Os estudos sobre leptospirose em animais selvagens são bastante escassos, principalmente em populações mantidas em cativeiro (LUNA-ALVAREZ et al.,1996), alguns trabalhos relatam a ocorrência de óbito em guanaco (HODGIN, et al., 1984), primatas (SHIVE et al.,1969; SÁ et al.,1999), e ariranhas (FARIAS et al., 1999) mantidos em cativeiro. ESTEVES et al. (2005) estudaram 166 animais cativos do Zoológico de Uberaba, Minas Gerais entre aves, répteis, mamíferos e peixes, além de gatos domésticos errantes e roedores sinantrópicos. Foram positivos 17 (10,2%) animais, apresentando título maior ou igual a 100, e os sorovares envolvidos foram Canicola (08/17 = 47,05%), Icterohaemorrhagiae (05/17 = 29,41%), Andamana (02/17 = 11,76%), Grippotyphosa (01/17 = 5,88%) e Patoc (01/17 = 5,88%). Estes resultados demonstram semelhança com os sorovares envolvidos no presente estudo, porém com porcentagens distintas. Em estudo semelhante realizado por CORRÊA et al. (2004) em 309 animais selvagens atendidos na Divisão de Veterinária da Fundação Parque Zoológico de São Paulo, 290 animais mantidos em cativeiro e 12 animais sinantrópicos, foram encontrados 59 (19,5%) animais sororeagentes para leptospirose na SAM. Diversas famílias de mamíferos foram estudadas incluindo primatas, carnívoros, roedores, marsupiais, cervídeos e bovídeos e os sorovares mais encontrados foram Copenhageni (15/59 = 25,4%), Pomona (13/59 = 22%) e Castellonis (10/59 = 16,9%). LILENBAUM et al. (2002) analisaram amostras de soro de 77 animais de 38 espécies diferentes de mamíferos albergados no Zoológico do Rio de Janeiro, por meio da SAM e detectaram 51 (66,2%) amostras reagentes sendo que 29 (37,7%) obtiveram título maior ou igual a 200, 15 (19,5%) com título 100 e sete (9,1%) demonstraram título 50. Os sorovares encontrados foram Copenhageni (27/29 = 93%), Icterohaemorrhagiae (01/29 = 3,5%) e Pomona (01/29 = 3.5%). O estudo realizado no zoológico de Chapultepec na Cidade do México por LUNA-ALVAREZ et al. (1996) apontou a ocorrência de Leptospira spp. em 48 amostras de soro de 19 espécies de mamíferos entre carnívoros, cervídeos e primatas, detectando 25 (52%) delas positivas para um ou 40 mais sorovares. Os sorovares encontrados foram Icterohaemorrhagiae (17/42 = 40.4%), Canicola e Pyrogenes (11/42 = 26,1%), Hebdomadis (10/42 = 23,8%), Pomona e Grippotyphosa (05/42 = 11,9%), Autumnalis e Panama (1/42 = 2.3%). LILENBAUM et al. (2002) e LUNA-ALVAREZ et al. (1996) pesquisaram apenas leptospiras patogênicas em seus estudos, sendo assim, os sorovares Patoc e Andamana não foram considerados em suas análises. No Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto foram capturados 49 animais de vida livre entre selvagens (aves, répteis e mamíferos), sinantrópicos (roedores, pombos e gambás) e domésticos (gatos e iguana) e 12 amostras foram reagentes sendo 11 para um sorovar e os sorovares encontrados foram Patoc (5/11 = 45,4%), Autumnalis (2/11 = 18,2%), Copenhageni (2/11 = 18,2%), Pyrogenes (1/11 = 9,1%) e Australis (1/11 = 9,1%) e uma amostra foi reagente para dois sorovares com o mesmo título, Patoc e Copenhageni. Os animais reagentes foram um gavião carijó, um cachorro do mato, um pombo, três cutias, dois gambás e três ratos de telhado. Todos os répteis e os gatos domésticos foram negativos na SAM. No estudo de CORREA et al. (2004) foram capturados cinco gambás e sete ratazanas e foram encontrados e 42,8% e 40%, respectivamente de sorologia positiva para o sorovar Icterohaemorrhagiae. ESTEVES et al. (2005) capturaram 27 ratos de telhado no Zoológico de Uberaba, MG e detectaram um animal positivo também para o sorovar Icterohaemorrhagiae. No presente estudo, os dois gambás reagentes apresentaram o sorovar Patoc diferente dos trabalhos realizados por SANTA ROSA et al. (1975), HATHAWAY et al. (1981), CALDAS et al. (1992) e CORDEIRO et al. (1981) que citam os sorovares Ballum, Bataviae, Icterohaemorrhagiae, Szwajizam, Grippotyphosa e Pomona nesse gênero animal, enquanto que os três ratos de telhado foram reagentes para os sorovares Copenhageni (02/03), mesmo sorogrupo Icterohaemorrhagiae e Pyrogenes (01/03), semelhante aos estudos de CORREA et al. (2004) e ESTEVES et al. (2005). Algumas amostras testadas neste estudo (nove amostras, sendo oito de animais cativos e uma de animal de vida livre) foram reagentes para dois ou mais sorovares apresentando o mesmo título que variou de 40 a 160 (Tabela 3.). Os exemplares 41 envolvidos foram três aves, um réptil e cinco mamíferos sendo um de vida livre, uma cutia (Dasyprocta agouti) que apresentou reação positiva para os sorovares Copenhageni e Patoc com título 160 discordando do estudo sorológico de SOUZA JUNIOR et al. (2006), que avaliaram sete cutias de vida livre dentre outros animais resgatados do lago da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, Tocantins e não encontraram animais reagentes. Todas as 15 amostras de soro sanguíneo humano analisadas nessa pesquisa foram negativas na SAM para diagnóstico de leptospirose coincidindo com o estudo de ESTEVES et al. (2005) que analisaram 36 amostras de soro dos funcionários do Zoológico de Uberaba e não encontraram positivos. Considerando o total de animais analisados neste estudo, 388 animais entre cativos e livres, 112 foram reagentes na SAM sendo 48 (42,8%) répteis, 37 (33%) aves, 25 (22,3%) mamíferos e dois (1,8%) peixes. O estudo sorológico para leptospirose em répteis, aves e peixes é de fundamental importância já que ainda é desconhecido o comportamento da doença nesses animais. Com os levantamentos sorológicos é possível verificar se esses animais entraram em contato com as leptospiras e se houve multiplicação no organismo, mas não se sabe o tipo de resposta imunológica que eles desenvolvem nem se a padronização da SAM é correta, então as reações encontradas, mesmo com títulos baixos, são informações de grande importância. Os poucos estudos realizados com o grupo dos répteis apontaram estes animais como possíveis reservatórios da leptospirose, pois foram encontrados animais saudáveis portadores de leptospiras (OLIVEIRA, 2003) demonstrando a importância de estudá-los grupo. Neste estudo, os répteis foram responsáveis por um grande número de amostras reagentes envolvendo os quelônios (Famílias Chelidae, Emydidae, Pelomedusidae e Testudinidae), sáurios (Família Gekkonidae) e os ofídeos (Família Boidae) (Tabela 1.). As serpentes da família Boidae foram reagentes aos sorovares Canicola, Patoc, Andamana e Sentot discordando do estudo realizado por SANTA ROSA et al. (1980) que analisaram o soro de serpentes peçonhentas e não peçonhentas e encontraram reação positiva para os sorovares Andamana, Icterohaemorrhagiae, Ballum, 42 Grippotyphosa e Pomona. ESTEVES et al. (2005) analisaram três amostras de soro sanguíneo de jibóias (Boa constrictor amarali) no Zoológico de Uberaba, MG e não encontraram sororeagentes. Animais da Família Emydidae, tartarugas de orelha vermelha (Trachemys scripta elegans), foram reagentes (26/44) para os sorovares Andamana, Tarassovi e Canicola e em estudos sorológicos de ANDREWS et al. (1965) e GLOSSER et al. (1974) com o mesmo animal, foram demonstrados os sorovares Ballum e Tarassovi como os mais prevalentes nesta espécie. ESTEVES et al. (2005) analisaram o soro sanguíneo de 20 exemplares de tartarugas de orelha vermelha e encontraram uma amostra positiva para o sorovar Patoc. Exemplares da Família Testudinidae, Jabuti Piranga (Geochelone carbonaria) e Jabuti Tinga (Geochelone denticulata) foram reagentes (08/29) para os sorovares Patoc (05/08), Hebdomadis (02/08) e Canicola (01/08) e somente um relato foi feito em literatura por ESTEVES et al. (2005) que analisaram 16 amostras de soro sanguíneo e encontraram apenas uma amostra positiva para o sorovar Andamana. Além de serpentes, tartarugas de orelha vermelha e jabutis foram reagentes na SAM répteis da Família Chelidae, cágado de barbicha (Phrynops geoffroanus) (01/02), Família Pelomedusidae, tartaruga da amazônia (Podocnemis expansa) (03/04) e tracajá (Podocnemis unifilis) (02/02), e da Família Gekkonidae, Iguana (Iguana iguana)(01/04) e não foram encontrados na literatura relatos de sorologia positiva para leptospirose nesses animais. O grupo das aves representou 33% (37/388) dos animais reagentes no presente estudo e, apesar de ser pouco estudado, por acreditarem que as aves possuem papel pouco significativo na cadeia epidemiológica da leptospirose, alguns autores já relataram sorologia positiva em galinhas como CAFFARENA et al. (1989) na Argentina e EVERARD et al. (1983) nas ilhas Trinidad e Grenada entre 1976 e 1979. No mesmo estudo sorológico realizado por EVERARD et al. (1983) foram realizadas sorologias em patos e gansos e não houve animais positivos. A literatura traz pouquíssimos estudos sobre leptospirose em aves selvagens, ESTEVES et al. (2005) analisaram o soro sanguíneo de 48 aves do Zoológico de 43 Uberaba, MG e não encontraram animais positivos na SAM. No presente estudo, foram reagentes 37 aves das Famílias Accipitridae (01/02), Anatidae (12/38), Anseranatidae (01/06), Columbinae (01/07), Cracidae (13/25), Phasianidae (02/08), Psittacidae (06/34) e Ramphastidae (01/06) e os sorovares mais freqüentes foram Patoc (19/37), Copenhageni (04/37) e Panama (04/37). Estudos sorológicos para leptospirose em peixes também são bastante escassos, DOUGLAS (1995), HOLK et al. (2000) e FATTAKHOV & MEFODYEV (2002) relacionaram a ocorrência de infecção em peixes à contaminação da ração por urina de roedores portadores da Leptospira. No Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto foram analisadas 25 amostras de soro sanguíneo de peixes e duas foram reagentes (08%) para os sorovares Icterohaemorrhagiae e Bratislava. Também no estudo de ESTEVES et al. (2005) foram analisadas sete amostras de soro sanguíneo de peixes e seis (85,75%) delas positivas para o sorovar Canicola. Os autores relacionaram essa alta porcentagem à via alimentar por contaminação da ração ou da água no ambiente aquático onde todos os exemplares viviam juntos. Os resultados obtidos no Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto foram distribuídos geograficamente dentro da área do zoológico a fim de se verificar quais os pontos críticos de exposição às leptospiras. Com isso, pode-se verificar que os setores com o maior número de animais cativos reagentes foram: Tanque das Tartarugas (27/45 = 60%), Jardim Japonês (01/02 = 50%), Praça das Aves (11/30 = 36,6%), Setor dos Tamanduás (01/03 = 33,3%), Praça das Araras (03/10 = 30%), Educação Ambiental (11/38 = 28,9%), Terrário (07/25 = 28%) e Lagos (14/66 = 21,2%). No estudo de CORRÊA et al. (2004), no Zoológico de São Paulo, os pontos críticos de exposição às leptospiras foram o Setor Extra, que alberga grande variação de espécies animais, e a Alameda dos Felinos. Os autores relacionaram essas áreas críticas à grande ocorrência de animais sinantrópicos. O Tanque das Tartarugas (27/45 = 60%), a Praça das Araras (03/10 = 30%) e os Lagos (14/66 = 21,2%) tiveram animais reagentes para os sorovares Andamana, Tarassovi, Canicola, Sentot, Patoc, Copenhageni, Panama e Icterohaemorrhagiae. Esses setores estão próximos uns aos outros no zoológico e a área do Bosque onde se 44 localizam é caracterizada por uma densa cobertura vegetal com árvores altas e de copa vasta , o que bloqueia bastante a inserção de raios solares. Os recintos dos animais que formam estes setores são amplos, com bastante terra, vegetação e muita água. Além da característica natural dessa área também há a presença de alta umidade na pista asfaltada entre os recintos, destinada ao trânsito de visitantes, pois as águas de chuva e de lavagem das partes mais altas do zôo se acumulam neste local. Com isso, pode-se atribuir ao ambiente propício à leptospira o fato desses setores possuírem muitos animais reagentes e com uma variedade grande de sorovares. O Jardim Japonês (01/02 = 50%) é um local afastado dos outros setores do zôo que possui alguns pequenos lagos com peixes. Embora a porcentagem de reagentes tenha sido alta, apenas dois animais foram analisados e a avaliação fica comprometida. A Praça das Aves (11/30 = 36,6%) e o Setor dos Tamanduás (01/03 = 33,3% para um sorovar e 01/03 = 33,3% para dois sorovares) são setores dispostos um ao lado do outro, mas possuem características ambientais bastante diferentes. A Praça das Aves também é um local de vegetação densa, pouquíssima inserção de raios solares e alta umidade, os recintos que tiveram o maior número de animais reagentes foram os que albergam exemplares da Família Cracidae e todos eles possuem lâmina de água corrente. Os sorovares encontrados foram Patoc, Andamana e Castellonis. O Setor dos Tamanduás é composto por recintos amplos, com vegetação rasteira e alta inserção de raios solares, porém a alimentação fornecida aos tamanduás atrai uma grande quantidade de animais sinantrópicos (roedores e gambás), e selvagens de vida livre, principalmente as cutias. O sorovar encontrado nos animais deste setor foi o Icterohaemorrhagiae que se trata do sorovar mais relacionado aos roedores (FAINE, 1982), portanto pode-se supor que a sororreação dos tamanduás esteja relacionada ao contato com animais sinantrópicos e de vida livre. A Educação Ambiental (11/38 = 28,9%) e o Terrário (07/25 = 28%) também estão dispostos lado a lado dentro do zoológico e foram encontrados animais reagentes a oito diferentes sorovares nesses setores, Canicola, Patoc, Andamana, Sentot, Butembo, Hebdomadis, Pomona e Ic terohaemorrhagiae. Trata-se de uma área do zoológico com movimentação restrita de pessoas e com algumas construções abandonadas, portanto 45 há uma grande quantidade de animais de vida livre que se abrigam nas áreas de vegetação abundante que cercam esses setores assim como nas construções (forros de telhado, cômodos vazios). Além disso, alguns recintos de répteis, no Terrário e de roedores, na Educação Ambiental possuem tanques de água mantendo a alta umidade no local. Com isso, pode-se dizer que os animais cativos estão expostos a diferentes sorovares já que mantêm contato com muitas espécies diferentes de animais de vida livre e o ambiente oferece condições de manutenção das leptospiras. O número de animais de vida livre reagentes também foi relacionado ao local de captura dentro do zoológico (Tabela 6) e pode-se verificar que os locais com o maior número foi o local L3 (Recinto do Urso) com 66,6% (02/03) de reagentes para os sorovares Pyrogenes e Copenhageni e o local L1 (local entre o Terrário e a Educação Ambiental) com 50% (03/06) de animais reagentes para o sorovar Icterohaemorrhagiae. A Figura 4 demonstra como foram distribuídos os animais reagentes cativos e de vida livre e verifica-se que houve uma distribuição homogênea dentro do zoológico e em alguns setores coincidiram animais reagentes cativos e de vida livre, mas os sorovares encontrados foram quase sempre distintos (Tabela 5 e 6). Ainda assim, a falta de barreiras físicas nos recintos favorece o contato de animais de vida livre e sinantrópicos com os cativos, tornando possível a transmissão da leptospirose entre eles. Em períodos de seca, bastante longos no município, a vegetação do zoológico se torna escassa e a oferta de água pequena o que faz com que muitos animais de vida livre (selvagens, sinantrópicos e domésticos) procurem comida e água dentro dos recintos dos animais cativos tornando a convivência entre eles bastante próxima, podendo predispor os animais ao risco de contraírem doenças infecciosas e ou parasitárias incomuns às espécies selvagens. Os títulos sorológicos encontrados em todas as amostras reagentes do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto variaram de 40 a 5.120 com predominância de títulos baixos como 40 e 80 (Tabela 8), o que demonstra a baixa intensidade de infecção, mas grande circulação do agente , já que esses resultados apontam que os animais entraram em contato com as leptospiras. 46 Títulos inferiores a 100 não são considerados como positivos na SAM, mas podem demonstrar que em algum momento aquele animal esteve em contato com a leptospira e produziu anticorpos contra ela. Títulos entre 100 e 200 são considerados baixos, possivelmente expressando casos de infecção passada ou recém instalada. Títulos iguais ou maiores que 400 podem representar casos de infecção manifesta ou compatível com enfermidade clínica (ALMEIDA et al., 1994). Nesta pesquisa, houve a ocorrência de títulos altos em exemplares de aves e répteis (Tabela 4) indicando infecção ativa, podendo ou não, apresentar manifestação clínica da doença e, consequentemente, eliminação de leptospiras na urina. Porém, não se sabe como as leptospiras desenvolvem seu ciclo nesses animais. Isso destaca ainda mais a ocorrência da leptospirose nesses grupos e alerta para a necessidade de pesquisar a doença em aves e répteis. Todas as 15 amostras de soro sanguíneo dos funcionários do zoológico analisadas não foram reagentes na SAM, porém pôde-se verificar que 11 animais foram reagentes para o sorovar Icterohaemorrhagiae com títulos que variaram de 40 a 160 (marreco irerê, tilápia, cujubi, paca, leão, dois tamanduás-bandeira, papagaio do mangue, pavão azul, ganso e cervo dama). Sendo assim, a circulação deste sorovar no zoológico pode representar um risco de infecção para os seres humanos envolvidos nas atividades diretas ou indiretas com os animais, caracterizando um problema de saúde pública. Além disso, vale ressaltar que das espécies reagentes para o sorovar Icterohaemorrhagiae, o papagaio, pavão e o ganso são muitas vezes criados como animais de estimação com convívio próximo ao ser humano. Este fato pode servir como alerta para que o uso de animais selvagens e exóticos como “pets” seja realizado com cautela, já que podem ser portadores e transmissores de muitas doenças. De maneira geral, os sorovares mais freqüentes dentro do Bosque Zoológico Municipal “Dr. Fábio de Sá Barreto” de Ribeirão Preto foram os não patogênicos, Patoc e Andamana, mas as características ambientais do zôo favorecem a multiplicação e manutenção de todas as leptospiras. 47 7. CONCLUSÕES No estudo realizado no Bosque Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto de Ribeirão Preto conclui-se que: 1. A Leptospira spp. estava presente no zoológico acometendo tanto animais cativos quanto animais de vida livre selvagens e sinantrópicos; 2. Os sorovares mais freqüentes entre os animais foram os não patogênicos, Patoc e Andamana; 3. As amostras de soro sanguíneo de répteis, aves e peixes foram reagentes para diversos sorovares de Leptospira spp. demonstrando a susceptibilidade desses grupos ao agente e apontando a necessidade de novos estudos com esses animais; 4. Apesar das amostras de soro sanguíneo dos funcionários apresentarem sorologia negativa há possibilidade de infecção por Leptospira spp., pois há presença do agente no zoológico; 5. O zoológico possui três áreas críticas de exposição à leptospirose que comportam os setores: 1) Tanque das Tartarugas, Praça das Araras e Lagos, 2) Praça das Aves e Setor dos Tamanduás e 3) Terrário e Educação Ambiental. 48 8. 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