GUSTAVO JOSÉ GONÇALVES MOLLICA ANÁLISE DE CUSTO EXERGÉTICO DE CICLO HÍBRIDO PARA QUEIMA DE LIXO URBANO Guaratinguetá - SP 2017 GUSTAVO JOSÉ GONÇALVES MOLLICA ANÁLISE DE CUSTO EXERGÉTICO DE CICLO HÍBRIDO PARA QUEIMA DE LIXO URBANO Trabalho de Graduação apresentado ao Conselho de Curso de Graduação em Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do diploma de Graduação em Engenharia Mecânica. Orientador: Prof. Dr. José Antônio Perrella Balestieri Guaratinguetá - SP 2017 Scanned by CamScanner DADOS CURRICULARES GUSTAVO JOSÉ GONÇALVES MOLLICA NASCIMENTO 12.01.1992 – Guaratinguetá / SP FILIAÇÃO Marco Antônio Mollica Isabel Cristina Gonçalves 2011/2017 Curso de Graduação Engenharia Mecânica – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus de Guaratinguetá Dedico este trabalho, de modo especial, à minha mãe e avó - sem elas, realizar este curso de graduação seria muito mais difícil. AGRADECIMENTOS A Deus, por ter me dado saúde, ânimo e força em toda a minha vida e em especial durante esses anos de graduação. Ao meu orientador, Prof. Dr. José Antônio Perrella pela ajuda indispensável durante esta jornada, por aumentar ainda mais meu interesse pela área de máquinas térmicas e me fornecer ensinamentos únicos. A todos meus familiares, em especial minha mãe, Isabel Cristina Gonçalves, avó, Antônia Gonçalves e tia, Marcia Gonçalves, por sempre me incentivar e fazer com que esses anos fossem muito mais fáceis. Um agradecimento especial também ao meu irmão e colega de classe, por toda ajuda durante o curso. A todos amigos feitos durantes esses anos de graduação e também aos amigos feitos durante meu período na Columbia University. A todos professores e funcionários da Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, que se esforçam constantemente para fazer o curso de engenharia cada vez melhor. “Your assumptions are your windows on the world. Scrub them off every once in a while, or the light won't come in.” Isaac Asimov RESUMO A geração crescente de resíduos sólidos urbanos é um dos maiores problemas da sociedade atualmente. A disposição incorreta deste material causa grandes impactos para a saúde do ser humano e para o meio ambiente. Uma forma encontrada por muitos países para amenizar esta situação está na incineração deste material com aproveitamento energético em plantas conhecidas como WTE (Waste to Energy). Porém, estas plantas têm custos elevados, o que faz com que países em desenvolvimento como o Brasil ainda prefiram os meios atuais de disposição destes resíduos. Outro problema enfrentado pela sociedade e muito discutido atualmente é a emissão de gases causadores do efeito estufa na queima de combustíveis fósseis. Como uma forma de controlar a emissão desses poluentes, tratados internacionais, como o de Quioto, introduziram o conceito de taxação do carbono emitido, que vem sendo utilizado em muitos países. O objetivo deste trabalho é aplicar o método da taxa de exergia de carbono em plantas WTE a fim de investigar sua aplicação e propor meios que incentivem a utilização desta tecnologia. O método da taxa de exergia de carbono utiliza a Termoeconomia e baseia-se na eficiência e tipo de combustível utilizado nos ciclos estudados a fim de se obter um valor de taxa de carbono que diferentemente das taxas atuais não se baseia em considerações políticas. Para isto, utilizou-se a teoria do custo exergético para cálculo dos custos exergéticos unitários e consequente cálculo das exergias perdidas para o ambiente e exergias destruídas. A partir dos resultados encontrados, foi proposta uma modificação no método de modo a considerar o caráter ambiental da destruição do resíduo sólido urbano, incentivando a destruição desse material. Os resultados encontrados promovem o uso desta tecnologia frente às que utilizam combustíveis fósseis, através da imposição de um menor valor de taxa de exergia de carbono para os ciclos queimando resíduos sólidos urbanos. PALAVRAS-CHAVE: Resíduo sólido urbano. Ciclos híbridos. Incineração. Taxas ambientais. Termoeconomia. Penalidade exergética. ABSTRACT The increasing generation of municipal solid waste (MSW) is one of the biggest problems of society nowadays. Incorrect disposition of this material causes major impacts to the human health e also to the environment. Incineration of MSW with energy recovery in plants know as Waste to Energy (WTE) is one of the main ways found by many countries to try and soften this situation. Those plants have a very high operation and maintenance cost, though, which make developing countries as Brazil to give preference for current means of waste disposition. Another big problem faced by society and that has also been very discussed in the last decades is the pollutant gas emissions, mostly the ones responsible for the greenhouse effect, launched in the atmosphere in the burning of fossil fuels. To control these pollutant emissions international treaties as the Kyoto protocol have introduced the concept of carbon tax, a tax to be charged for the emission of carbon dioxide, which has already been used in many countries. The objective of this study is to apply the carbon exergy tax method in WTE plants to investigate its application and try and propose ways that encourage the utilization of this technology. The carbon exergy tax method utilizes concepts brought from Thermoeconomics and bases itself in the efficiency and type of fuel used in the cycles studied to obtain a value for the carbon tax, that differently from current taxes, is not based on political considerations. For that it was used the theory of exergetic cost to calculate the exergetic costs e subsequent values of exergy lost to the environment and destroyed exergy. From the results found it was possible to propose a modification to the method to consider the environmental aspect of waste’s destruction, in this way promoting the destruction of this material. The results found promote the use of incineration accompanied by energy recovery technology against the ones that use fossil fuels, through the imposition of a lesser value of carbon exergy tax to the cycles burning municipal solid waste. KEYWORDS: Municipal solid waste. Hybrid cycles. Incineration. Environmental tax. Thermoeconomics. Exergetic penalty. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Fontes de biomassa ................................................................................................ 22 Figura 2 – Oferta Interna de energia elétrica por fontes ......................................................... 23 Figura 3 – Quantidades de resíduos sólidos, características e índice de desenvolvimento .... 25 Figura 4 – Seções de uma planta WTE ................................................................................... 33 Figura 5 – Classificação esquemática dos ciclos combinados e opções de integração de CS e CI ............................................................................................................. 35 Figura 6 – Representação esquemática das configurações (A) hot windbox e (B) cold windbox ......................................................................................................... 36 Figura 7 – Esquema da integração lado vapor/água entre uma planta WTE de incineração de lixo e uma turbina a gás ................................................................ 38 Figura 8 – Exemplo de matriz de incidência .......................................................................... 47 Figura 9 – Estrutura física de uma central térmica ................................................................. 49 Figura 10 – Esquema do ciclo combinado híbrido ................................................................. 55 Figura 11 – Esquema do ciclo Rankine .................................................................................. 56 Figura 12 – Pontos de interesse do ciclo de referência Rankine ............................................ 58 Figura 13 – Equipamentos do ciclo de referência Rankine .................................................... 59 Figura 14 - Pontos de interesse do ciclo combinado híbrido .................................................. 64 Figura 15 – Equipamentos do ciclo combinado híbrido ......................................................... 65 Figura 16 – CET vs. Eficiência ............................................................................................... 81 Figura 17 - 𝛥𝑐𝑒𝑙 devido à imposição da CT e CET para os diferentes ciclos ......................... 83 Figura 18 – Efeito do Custo Unitário do RSU na CET .......................................................... 83 Figura 19 – Variação da CET com o aumento do preço do gás natural ................................. 84 Figura 20 – CET versus eficiência para modificação do método ........................................... 86 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Teor de umidade de componentes não compactados encontrados nos resíduos ......................................................................................................... 27 Tabela 2 - Estimativa da composição gravimétrica dos RSUs ............................................. 29 Tabela 3 – Composição química e poder calorífico do RSU não reciclado .......................... 29 Tabela 4 – Composição física e química dos resíduos sólidos urbanos para São José dos Campos ........................................................................................... 55 Tabela 5 – Dados das turbinas selecionadas .......................................................................... 55 Tabela 6 – Parâmetros de projeto do ciclo combinado híbrido .............................................. 56 Tabela 7 – Valores mássicos e termodinâmicos dos pontos selecionados do ciclo Rankine ........................................................................................................ 57 Tabela 8 – Valores de exergia do ciclo Rankine .................................................................... 58 Tabela 9 – Equações derivadas da proposição 1 do método desenvolvido por Valero, Lozano e Muñoz (1986) para o ciclo Rankine ................................................................... 60 Tabela 10 – Classificação F, P e L dos fluxos em cada equipamento do ciclo Rankine ............................................................................................................... 61 Tabela 11 - Equações complementares do ciclo Rankine elaboradas a partir das proposições enunciadas por Valero, Lozano e Muñoz (1986) ...................... 62 Tabela 12 - Custos exergéticos do ciclo Rankine ................................................................... 63 Tabela 13 – Classificação F, P e L dos fluxos em cada equipamento do ciclo combinado híbrido .............................................................................................. 66 Tabela 14 – Equações derivadas da proposição 1 do método desenvolvido por Valero, Lozano e Muñoz (1986) para o ciclo combinado híbrido ...................... 67 Tabela 15 - Equações complementares do ciclo combinado híbrido elaboradas a partir das proposições enunciadas por Valero, Lozano e Muñoz (1986) .......... 68 Tabela 16 - Custos exergéticos do ciclo combinado híbrido para turbina PG7241(FA) ........ 69 Tabela 17 - Custos exergéticos do ciclo combinado híbrido para turbina AE64.3A .............. 70 Tabela 18 - Custos exergéticos do ciclo combinado híbrido para turbina H-25 ..................... 71 Tabela 19 - Custos exergéticos do ciclo combinado híbrido para turbina GT 10 (2x) ........... 71 Tabela 20 - Custos exergéticos do ciclo combinado híbrido com uma turbina GT-10 .......... 72 Tabela 21 – Custos das exergia destruída e residual para o ciclo Rankine ..............................76 Tabela 22 - Custos das exergia destruída e residual para o ciclo híbrido PG 7241(FA) ........ 77 Tabela 23 – Valores de Cw e Cirr para o ciclo híbrido com a turbina Ansaldo AE64.3A …. 78 Tabela 24 – Custos de 𝐶𝑤 e 𝐶𝑖𝑟𝑟 para o ciclo híbrido com a turbina Hitachi H-25 .............. 78 Tabela 25 – Custos das exergia destruída e residual para o ciclo combinado híbrido com 2 turbinas GT-10 .................................................................................................. 79 Tabela 26 – Custos das exergia destruída e residual para o ciclo combinado híbrido com a turbina GT-10 ................................................................................................... 79 Tabela 27 – Dados para o cálculo da CET ............................................................................ 80 Tabela 28 – Vazão de combustível dos ciclos ...................................................................... 80 Tabela 29 – Valores de CET e 𝛥𝑐𝑒𝑙 para todos ciclos ........................................................... 80 Tabela 30 – Valores de 𝛥𝑐𝑒𝑙 devido à imposição das CT e CET .......................................... 82 Tabela 31 – CET vs. Preço do gás natural ............................................................................ 84 Tabela 32 – Custos das exergia destruída e residual para o ciclo Rankine método modificado ........................................................................................................ 85 Tabela 33 – Novos valores de CET ...................................................................................... 85 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas ABRELPE Associação Brasileira de empresas de limpeza publica AIE Agência Internacional de Energia ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica CET Carbon Exergy Tax CG Conjunto a gás CI Ciclo Inferior CS Ciclo Superior EES Engineering Equation Solver EPE Empresa de Pesquisa Energética HRSG Heat recovery steam generator NBR Norma Brasileira Regulamentadora PCI Poder Calorifico Inferior PCS Poder Calorífico Inferior PNRS Política Nacional de Resíduos Sólidos RSU Resíduos Sólidos Urbanos TG Turbina a gás TV Turbina a vapor VC Volume de Controle WTE Waste to Energy LISTA DE SÍMBOLOS [C] Porcentagem de carbono no combustível - 𝐵∗ Custo exergético de um fluxo exergético kW B Fluxo Exergético kW BD Exergia destruída kW 𝐵𝑒 Exergia de entrada de um componente do sistema kW 𝐵𝑖𝑟𝑟 Exergia destruída pela irreversibilidade dos componentes da planta kW BL Perdas de exergia kW bf Exergia física kW BF Valor exergético do combustível kW BP Valor exergético do produto kW b̃q Exergia química molar kJ/kmolK �̇�𝑞 Exergia de um fluxo de calor kW 𝐵𝑠 Exergia de saída de um componente do sistema kW 𝐵𝑤 Exergia residual rejeitada por um componente do sistema kW �̇�𝑊 Exergia de um fluxo de trabalho kW 𝐶𝐶𝑂2 Encargo aplicado as emissões de CO2 US$/h ĊD Custo de destruição de exergia US$/s Ċe Custo associado a transferência de exergia na entrada US$/s 𝑐𝐹 Custo unitário do combustível do sistema US$/kJ 𝑐𝑖𝑟𝑟 Custo unitário da irreversibilidade produzida por um componente US$/kJ 𝐶𝑖𝑟𝑟 Custo da exergia destruída em um componente do sistema US$/h Cp Calor específico a pressão constante kJ/kg Ċq Custo associado a transferência de calor US$/s Ċs Custo associado a transferência de exergia na saída US$/s Ċw Custo associado as potências geradas ou consumidas US$/s 𝐶𝑤 Custo da exergia residual rejeitada por um componente do sistema US$/h 𝑐𝑤 Custo unitário da irreversibilidade produzida por um componente US$/kJ do sistema CET Taxa de exergia de carbono US$/t CO2 d Peso final (seco) de uma amostra g 𝐹∗ Custo exergético total dos combustíveis de um subsistema kW 𝑓𝑐 Fator de utilização s/h g Aceleração da gravidade 9,81 m/s2 𝐺𝐶𝑂2 Vazão mássica de CO2 emitido pela planta kg/h 𝐺𝐹 Vazão mássica de combustível kg/h 𝐼𝐶𝑂2 ∗ Índice de emissão de CO2 - 𝐼0 Índice de referência de emissão de CO2 1 kgCO2/kWh 𝑘∗ Custo exergético unitário kJ/kJ 𝑘𝑒 Custo exergético unitário do fluxo de entrada de um componente kJ/kJ do sistema 𝑘𝑝 Custo exergético unitário do produto de um componente do sistema kJ/kJ 𝐿∗ Custo exergético total dos resíduos/perdas de um subsistema kW M Teor de umidade - 𝑀𝑑 Teor de umidade em base seca LISTA DE SÍMBOLOS (continuação) �̇�𝑒 Vazão mássica entrando em um volume de controle kg/s �̇�𝑠 Vazão mássica saindo de um volume de controle kg/s 𝑃∗ Custo exergético total dos produtos de um subsistema kW PE Penalidade por ineficiência U$/h �̇�𝑉.𝐶 Taxa de transferência de calor em um volume de controle kW R Constante universal dos gases kJ/molK �̇�𝑔𝑒𝑟 Taxa de geração de entropia no volume de controle kW/K T0 Temperatura no estado ambiente K xi Fração molar do componente i de uma mistura de gases - Z Custo de investimento anual dos componentes da planta US$/h Żtot CI Taxa de custos associado com investimento de capital US$/h Żtot OM Taxa de custos associado com a operação e manutenção US$/h w Peso inicial (úmido) de uma amostra g �̇�𝑉.𝐶 Taxa de realização de trabalho associado ao volume de controle kW Letras gregas 𝛼 Massa de CO2 produzida pela oxidação de 1 kg de carbono kg(CO2)/kg(C) Δ𝑐𝑒𝑙 Custo da eletricidade produzida devido à imposição do CET US$/kWh ϵ Eficiência exergética - SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 18 1.1 OBJETIVOS ............................................................................................................. 19 1.2 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................... 20 2 RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS ..................................................................... 21 2.1 BIOMASSA COMO FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA ......................... 21 2.2 CONCEITO DE RSU E O CENÁRIO ATUAL ...................................................... 23 2.3 CLASSIFICAÇÃO E COMPOSIÇÃO DO RSU ..................................................... 24 2.3.1 Umidade .................................................................................................................... 26 2.3.2 Poder calorífico ........................................................................................................ 27 2.3.3 Composição física e parâmetros químicos ............................................................ 28 2.4 FORMAS DE DISPOSIÇÃO E O MEIO AMBIENTE ........................................... 30 2.4.1 Aterros versus Incineração ..................................................................................... 30 2.4.2 Plantas WTE ............................................................................................................ 32 2.5 CICLOS COMBINADOS HÍBRIDOS .................................................................... 34 2.5.1 Terminologia ............................................................................................................ 34 2.5.2 Repotenciação windbox ........................................................................................... 35 2.5.2 Integração lado vapor/água .................................................................................... 37 2.6 CONCEITOS TERMODINÂMICOS ...................................................................... 38 2.6.1 Primeira Lei da Termodinâmica ............................................................................ 38 2.6.2 Segunda Lei da Termodinâmica ............................................................................ 39 2.6.3 Análise Exergética ................................................................................................... 40 2.6.4 Eficiência exergética ................................................................................................ 43 2.7 TERMOECONOMIA ............................................................................................... 44 2.7.1 Teoria do custo exergético ...................................................................................... 46 2.8 MÉTODO DA TAXA DE EXERGIA DO CARBONO .......................................... 50 3 METODOLOGIA .................................................................................................... 54 3.1 DESCRIÇÃO DO CICLO HÍBRIDO ...................................................................... 54 3.2 CÁLCULO DO CUSTO EXERGÉTICO ................................................................ 57 3.2.1 Ciclo térmico de referência – Rankine .................................................................. 57 3.2.2 Ciclo combinado híbrido ......................................................................................... 64 3.2.3 Matriz de Incidência Modificada 𝑨 e vetor 𝐘 ∗ para o ciclo híbrido. ................. 64 3.2.4 Turbina Hitachi - PG7241(FA) .............................................................................. 68 3.2.5 Turbina Ansaldo – AE64.3A .................................................................................. 69 3.2.6 Turbina Hitachi – H-25 ........................................................................................... 70 3.2.7 Turbina Hitachi – (2x) GT 10 ................................................................................. 71 3.2.8 Turbina Hitachi – (1x) GT 10 ................................................................................. 72 3.3 CÁLCULO DA TAXA DE EXERGIA DE CARBONO (CET) ............................. 73 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 76 4.1 CÁLCULO DA CET ................................................................................................ 76 5 CONCLUSÃO .......................................................................................................... 87 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 89 APÊNDICE A - MATRIZ DE INCIDÊNCIA MODIFICADA 𝑨 E O VETOR 𝒀 ∗ PARA O CICLO RANKINE. ............................................................................................................ 93 PÊNDICE B - MATRIZ DE INCIDÊNCIA MODIFICADA 𝑨 E O VETOR 𝒀 ∗ PARA O CICLO HÍBRIDO (TURBINA PG 7241 (FA)). ................................................................... 93 ANEXO A – REPRESENTAÇÃO AUXILIAR PARA DEFINIÇÃO EM INSUMO (F), PRODUTOS E PERDAS (L). ................................................................................................ 95 18 1 INTRODUÇÃO Em 11 de dezembro de 1997 foi assinado o protocolo de Kyoto, que visava, principalmente, a redução em 5% dos gases causadores do efeito estufa com relação aos níveis de 1990. Este protocolo, no entanto, só entrou em vigência no dia 16 de fevereiro de 2005 devido a um número insuficiente de países terem ratificado o acordo. Atualmente, após 12 anos do início do período de vigência, o tratado encontra-se em seu segundo período de compromisso (UNITED NATIONS, 2014). Este tratado foi responsável por introduzir dois dos principais mecanismos de redução dos gases do efeito estufa, (1) comércio internacional de emissões, no qual países engajados com as metas de redução de emissões dos gases do efeito estufa podem negociar o excedente da meta entre si e (2) mecanismo de desenvolvimento limpo, que busca que países desenvolvidos implementem projetos em países em desenvolvimento que contribuam para a redução das emissões, em troca de reduções certificadas de emissões (UNITED NATIONS, 2014). Visando o fim do tratado de Kyoto em 2020, em 12 de dezembro de 2015 foi assinado o acordo de Paris, que também visa mitigar os efeitos das mudanças climáticas e está focado em manter o aumento médio da temperatura global no fim deste século abaixo de 2 ̊ C em relação aos níveis pré-industriais. É neste contexto, que surge a necessidade de investimento em tecnologias inovadoras e em combustíveis renováveis como a biomassa, assim como, também, se torna importante discutir a melhor forma de enfrentar os problemas ambientais, principalmente os relacionados aos gases poluentes. Atualmente, além do problema com a emissão de gases poluentes pela queima de combustíveis fósseis, outra das maiores preocupações da sociedade quando se refere ao meio ambiente é a geração crescente de resíduos sólidos urbanos que decorre, dentre vários outros fatores, da acelerada industrialização, estimulada pelo aumento populacional. O principal problema apresentado por este cenário é o fato de que se estes resíduos não forem manejados corretamente podem acabar colocando em risco a saúde humana e o meio ambiente (SANTOS; DIAS, 2012). Segundo dados fornecidos pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE) a geração anual de resíduos sólidos urbanos (RSU) no Brasil em 2015 foi de 79,9 milhões de toneladas. Desse montante, da fração que é coletada, 58,7% 19 foram dispostos em aterros sanitários, 24,1% em aterros controlados e 17,2% em lixões (ABRELPE, 2015). O que se pode destacar desses dados é o fato do Brasil não seguir ainda a tendência atual observada em países como Japão, Alemanha e Estados Unidos de utilizar os resíduos sólidos urbanos para aproveitamento energético, principalmente no que se refere a incineração destes resíduos em plantas WTE (Waste to Energy) (BALCAZAR, DIAS e BALESTIERI, 2013). A incineração dos resíduos, além de fornecer uma nova opção para a disposição de resíduos sólidos, é um método utilizado para geração de energia a partir de um combustível alternativo, agindo assim, como uma possível solução para a redução da utilização dos recursos fósseis e consequentemente das emissões dos gases do efeito estufa. No entanto, a eficiência deste processo é limitada devido à natureza dos gases gerados na combustão desse material. Como forma de se obter maiores eficiências e tornar o processo mais economicamente atrativo, soluções foram e vêm sendo propostas, como por exemplo, a conjunção de um ciclo Rankine tradicional queimando RSU a um ciclo a gás queimando gás natural, o que caracteriza um ciclo combinado híbrido. 1.1 OBJETIVOS Este trabalho tem como objetivo a aplicação do método da taxa de exergia de carbono (CET) desenvolvido por Borchiellini, Massardo e Santarelli (2000) em um ciclo Rankine queimando resíduos sólidos urbanos (RSU) e um ciclo combinado híbrido queimando gás natural e RSU para quatro diferentes tipos de turbinas, a fim de se analisar o comportamento do método quanto à eficiência e ao tipo do combustível do ciclo estudado. Estes ciclos foram descritos no trabalho realizado por Balcazar, Dias e Balestieri (2013) visando apresentar maneiras mais eficientes de se realizar o aproveitamento energético dos resíduos sólidos. Foi realizada a aplicação do método da taxa de exergia de carbono nestes ciclos de modo a avaliar-se a aplicação do método em plantas WTE, método este que foi idealizado inicialmente para aplicação em combustíveis fósseis. Assim, o principal objetivo deste trabalho é adaptar o método para que o RSU seja equacionado do ponto de vista ambiental, ou seja, diferentemente de um combustível fóssil, a queima com consequente destruição do RSU deve ser incentivada e isto deve ser refletido no método. A primeira parte do trabalho consiste em uma breve revisão acerca de resíduos sólidos urbanos, de forma a apresentar, as características que influenciam o seu aproveitamento 20 energético, o cenário atual da disposição final desse material no Brasil e no mundo e um meio mais eficiente de realizar a incineração deste material para a geração elétrica. Para se realizar os cálculos da taxa de exergia de carbono, foi primeiro necessário realizar os cálculos dos custos exergéticos de todos os fluxos dos ciclos investigados; isto foi feito através da utilização do método da teoria do custo exergético (Theory of Exergetic Cost) descrito por Valero, Lozano e Muñoz (1986). 1.2 JUSTIFICATIVA A geração de resíduos sólidos urbanos nos últimos anos tem aumentado consideravelmente, e isto decorre, principalmente, de fatores como aumento populacional, industrialização e a característica consumista da população e a tendência é que a geração deste material aumente ainda mais (IEA, 2016a). Um problema associado com essa tendência está na disposição final do RSU. Nos últimos vinte anos, porém, devido a um maior foco no meio ambiente e em energias renováveis e limpas, o lixo urbano passou a ser visto de uma maneira diferente, de um passivo ambiental, se tornou uma fonte potencial de geração de energia, podendo até servir de atenuador da utilização de combustíveis fósseis. Dentre uma das principais formas de aproveitamento energético do RSU está a incineração deste material para geração de vapor e consequente geração elétrica. No entanto, por se tratar de uma tecnologia cara, devido, entre outros fatores, à utilização de um sistema rigoroso de tratamento dos gases gerados na combustão do RSU, poucos países ainda fazem uso de tal tecnologia. É neste contexto, a fim de encontrar meios de incentivar a utilização deste material para geração de energia elétrica em plantas WTE, que se torna importante a proposta deste trabalho de adaptar o método da taxa de exergia de carbono para que se possa, assim, incentivar a utilização desse material frente aos combustíveis fósseis. 21 2 RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS 2.1 BIOMASSA COMO FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA A biomassa vem sendo utilizada como combustível desde os primórdios da humanidade, mas com o avanço tecnológico e a descoberta de combustíveis mais eficientes, esse insumo teve sua importância na matriz energética minimizada. No entanto, o interesse em fontes de energia alternativa tem crescido muito nos últimos anos; isto se deve principalmente a um conjunto de fatores, tais como, constante expansão da demanda energética, uma preocupação cada vez maior com o meio ambiente, com os efeitos da emissão de gases poluentes como o CO2 e com a utilização descontrolada de combustíveis fósseis (PETROV, 2003). Neste cenário, a biomassa se apresenta, como uma fonte renovável de energia de grande potencial para utilização tanto elétrica quanto térmica (ANEEL, 2005). Nos últimos 100 anos a biomassa se viu substituída pelo carvão e outros combustíveis fósseis e teve sua utilização restringida a residências rurais sendo utilizada principalmente para aquecimento e cozimento. Porém, atualmente, tanto os países desenvolvidos como os subdesenvolvidos têm visado a inclusão desse insumo em suas matrizes energéticas. Estimativas feitas pela IEA (2016b, 2017) indicam que dentro dos próximos anos, até 30% da energia elétrica gerada em todo o mundo será gerada de fontes renováveis, e que do total de energia consumida no mundo atualmente o percentual advindo de biomassa é de aproximadamente 10%. Essa fonte de energia se destaca perante outras fontes alternativas por sua flexibilidade, ou seja, podendo ser usada tanto para geração de eletricidade ou calor quanto para conversão em combustíveis líquidos ou gasosos (CORTEZ; LORA; OLIVARES GÓMEZ, 2008). Há, no entanto, alguns empecilhos que limitam o uso da biomassa para geração de energia. Biocombustíveis possuem poder calorífico inferior (PCI), uma medida do calor gerado por quilograma de combustível queimado, da ordem de até 15 MJ/kg, valor relativamente inferior ao encontrado em combustíveis fósseis como, por exemplo, o do gás natural, que é de 50,0 MJ/kg (BALCAZAR; DIAS; BALESTIERI, 2013). O teor de umidade encontrado na biomassa é um dos principais fatores que influenciam o seu PCI, pois a evaporação da água consome boa parte do calor liberado na combustão, sendo que o calor envolvido na câmara de combustão pelo processo de evaporação só poderá ser recuperado em níveis muito baixos de temperatura, na hipótese de que haja uso para a energia em tal nível. O teor de umidade pode ainda influenciar nos poluentes emitidos, como o CO, 22 produto gerado pela combustão incompleta (PETROV, 2003). Outros fatores que se apresentam como entraves são as baixas eficiências das plantas e os custos elevados de produção e transporte (ANEEL, 2005). A biomassa pode ser obtida a partir de quatro fontes, vegetais lenhosos e não lenhosos, biofluidos e resíduos orgânicos que podem ainda ser divididos em urbanos, agrícolas ou industriais. A Figura 1 contém em maiores detalhes tal divisão. É interessante, aliás, destacar que dentre essas fontes, os resíduos são os que apresentam melhor potencial para gerar energia (CORTEZ ; LORA; OLIVARES GÓMEZ, 2008). Figura 1 – Fontes de biomassa Fonte: Cortez, Lora e Olivares Gómez (2008). Dentre os resíduos, os resíduos sólidos urbanos (RSU), popularmente conhecidos como lixo urbano, referem-se aos materiais descartados em áreas urbanas em sua maior parte por domicílios residenciais ou comerciais. Os RSU contêm em sua composição uma significante fração de fontes de biomassa, como madeira, restos de comida, papel, e também possuem materiais derivados de combustíveis fósseis como plástico e borracha (CHENG; HU, 2010). 23 Como pode-se ver na Figura 2, o Brasil possui uma matriz elétrica predominantemente renovável com os três maiores contribuintes sendo energia hidráulica, gás natural e biomassa respectivamente, sendo que a geração hidráulica é responsável por mais de 60% da oferta interna. A biomassa torna-se então, uma possível alternativa para períodos de estiagem prolongados e, é de grande importância para a diversificação da matriz elétrica brasileira que atualmente é muito dependente da energia hidráulica, aumentando desse modo a segurança energética do país (EPE, 2016). A biomassa apresenta grande potencial no Brasil e no mundo, mas quando utilizada para produção energética por meios tradicionais como combustão e cocção esta fonte tem baixas eficiências e um potencial elevado para emissão de gases poluentes (ANEEL, 2008). Sendo assim, para que haja um uso mais intensivo desse insumo na geração de energia, é necessário o desenvolvimento de novas tecnologias de conversão e políticas de incentivos ao uso de tais fontes. Figura 2 – Oferta Interna de energia elétrica por fontes Fonte: Balanço energético nacional, EPE (2016). 2.2 CONCEITO DE RSU E O CENÁRIO ATUAL Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), resíduos sólidos são: Resíduos nos estados sólidos e semi-sólidos, que resultam de atividades de origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornam inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou corpos d’água, ou exijam, para isso, soluções técnicas e economicamente inviáveis em face à melhor tecnologia disponível (ABNT, 2004, p.1). 24 Dentre esses materiais destaca-se os provenientes de atividades domésticas e comercial, que constituem os resíduos sólidos urbanos. Ou seja, o RSU é tudo aquilo que não possui valor aparente na sociedade e, sendo assim, acaba sendo descartado. Historicamente, até por volta do século XVIII, o lixo era produzido em pequenas quantidades, resultado do descarte de resto de alimentos e artesanatos. Atualmente esse tipo de resíduo se apresenta como um dos grandes problemas da sociedade, pois agravam os problemas ambientais que se fazem presentes e levam ao aparecimento de inúmeros outros, que em sua maior parte estão relacionados com a forma incorreta de sua disposição final. Outros fatores importantes de se salientar são a crescente urbanização aliada a um vasto desenvolvimento econômico e industrial e um elevado crescimento populacional experienciado pela sociedade que levam a uma intensificação na produção desses resíduos (SANTOS; DIAS, 2012). Contudo, pode-se dizer que a geração de lixo é um ato inevitável, pois está atrelado com o padrão de vida estabelecido pelos seres humanos, da mesma forma que outros seres vivos também geram resíduos de acordo com seus próprios estilos de vida; a diferença, no entanto, está na incompatibilidade do lixo gerado com a natureza. Indiferentemente se gerado no processo ou após o fim da vida útil do material produzido, o ser humano continuará produzindo resíduos. Porém, devem ser planejadas maneiras de diminuir a quantidade de lixo gerado e/ou conceder meios para se dispor dos resíduos mais eficientemente. Dentre as iniciativas mais comumente tomadas atualmente estão (1) a redução da geração de resíduos propriamente dita, como, por exemplo, ao não usar sacolas de plásticos ou produtos descartáveis, (2) o reuso, como no caso de garrafas reutilizáveis e (3) a reciclagem, que acontece quando não é possível a reutilização do material. Materiais como papel, plástico e inúmeros outros são exemplos de materiais que podem ser reciclados. Quando nenhuma dessas alternativas é possível, a fim de se evitar o despejo desses materiais no meio ambiente, uma nova alternativa tem mostrado ser uma solução promissora para esse problema, 4) a recuperação energética com a queima dos resíduos (EPE, 2008). 2.3 CLASSIFICAÇÃO E COMPOSIÇÃO DO RSU Em 2010 foi instituída a Lei nº 12.305 referente à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), na qual foram dispostos os instrumentos, objetivos, princípios e diretrizes da gestão integrada e gerenciamento dos resíduos sólidos às responsabilidades do poder público 25 (BRASIL, 2010). Segundo a PNRS, os resíduos sólidos urbanos podem ser classificados de acordo com a seguinte divisão: I - Quanto à origem: a) Resíduos domiciliares: os originários de atividades domésticas em residências urbanas; b) Resíduos de limpeza urbana: os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana; c) Resíduos sólidos urbanos: os englobados nas alíneas “a” e “b”; d) Resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços: os gerados nessas atividades, excetuados os referidos nas alíneas “b”, “e”, “g”, “h” e “j”; (BRASIL, 2010, p.4). De modo a se realizar o gerenciamento integrado do lixo municipal, deve-se ter conhecimento de todas as características desse resíduo, pois existem vários fatores que influenciam a sua origem e produção, dentre eles pode-se destacar: número de habitantes do município, poder aquisitivo, condições climáticas, hábitos e costumes da população, nível educacional, dentre outros (JARDIM, 1995). Estes fatores estão intimamente correlacionados ao que diferencia as comunidades e/ou cidades entre si. A Figura 3 permite realizar uma breve análise da comparação dos lixos gerados por diferentes culturas e níveis de desenvolvimento. Desta análise percebe-se, por exemplo, que países de baixa renda possuem resíduos com frações maiores de conteúdo orgânico do que os países desenvolvidos. Em contrapartida países de alta renda possuem no conteúdo dos seus resíduos uma fração predominante de papel, plástico e outros materiais inorgânicos. Figura 3 – Quantidades de resíduos sólidos, características e índice de desenvolvimento. Fonte: Adaptado de Chandrappa e Das (2012) 26 Conhecer a composição e os parâmetros físico-químicos dos resíduos sólidos urbanos é fundamental para o prognóstico de situações futuras, assim como para a avaliação dos problemas de acondicionamento, coleta, transporte, tratamento e/ou disposição final do lixo. Quando o lixo for disposto em aterros, por exemplo, esses fatores são de menor importância, sendo que os únicos fatores que devem ser examinados mais seriamente são a quantidade de lixo gerado e possíveis problemas com a disposição de materiais perigosos. No caso da reciclagem, ou recuperação energética por combustão, os resíduos destinados para esses processos devem ter estes fatores conhecidos ou estimados (WORRELL; VESILIND, 2012). Segundo Riber, Petersen e Christensen (2009), a produção energética em plantas de incineração depende da composição dos resíduos sólidos urbanos, principalmente com relação a plásticos e papel. Yi, Yoo e Hanaki (2011) corroboram a afirmação anterior e enfatizam a dependência a um baixo nível de restos de comida. Torna-se de grande importância então, de modo a avaliar a viabilidade da recuperação energética dos resíduos como parte do sistema de gestão, realizar uma análise destes fatores e conhecer também seu poder calorífico. Dois conjuntos de fatores são importantes ao se avaliar o conteúdo dos resíduos sólidos urbanos, que são os parâmetros físico-químicos e composição física. Os parâmetros físico- químicos são expressos pelas características como densidade, poder calorífico, umidade e teor dos elementos químicos presentes nestes materiais como, por exemplo, carbono, hidrogênio, enxofre entre outros. E a composição física dos resíduos sólidos urbanos é obtida através da análise da fração dos seus componentes mais comuns, tais como, papel, plástico, metais (JARDIM, 1995). 2.3.1 Umidade O teor de umidade encontrado no RSU representa a quantidade de água presente nesses materiais, medido em percentual de peso. A umidade é um fator importante no caso de os resíduos serem destinados à recuperação energética, seja por processamento em combustíveis ou no evento de combustão direta (WORRELL; VESILIND, 2012). O teor de umidade pode ser calculado de acordo com a equação (1). 𝑀 = 𝑤 − 𝑑 𝑤 × 100 (1) sendo: 27 𝑀 = Teor de umidade, em base úmida, % 𝑤 = Peso inicial (úmido) da amostra 𝑑 = Peso final (seco) da amostra O teor de umidade pode também ser definido em base seca como pode ser visto na equação (2). 𝑀𝑑 = 𝑤 − 𝑑 𝑑 × 100 (2) sendo: 𝑀𝑑 = Teor de umidade, em base seca, % Muitos dos processos de incineração para aproveitamento energético dos resíduos estão atualmente, realizando um pré-tratamento deste material de modo a homogeneizá-los, diminuir a sua umidade e, assim, aumentar o seu poder calorífico. Com isso é obtido um combustível de qualidade para máxima geração de energia (HENRIQUES, 2004). Alguns valores típicos do teor de umidade de vários dos componentes encontrados nos resíduos podem ser vistos na Tabela 1. Tabela 1 – Teor de umidade de componentes não compactados encontrados nos resíduos Fonte: Traduzido e adaptado de Worrell e Vesilind (2012). 2.3.2 Poder calorífico Componente Faixa de variação Média Típica Residencial Latas de alumínio 2–4 3 Papelão 4–8 5 Particulado (Sujeira, etc.) 6–12 8 Resto de comida 50-80 70 Vidro 1–4 2 Grama 40-80 60 Couro 8–12 10 Folhas 20-40 30 Papel 4–10 6 Plásticos 1–4 2 Borracha 1–4 2 Latas de aço 2–4 3 Materiais Têxteis 6–15 10 Madeira 15-40 20 Aparas de Jardim 30-80 60 Comercial Resto de comida 50-80 70 Comercial misto 10–25 15 Caixas de madeiras e paletes 10–30 20 Materiais de construção (misto) 2–15 8 TEOR DE UMIDADE 28 O poder calorífico é a medida que representa a quantidade de calor gerada na queima de 1 kg de combustível, que neste caso é o RSU; a unidade do poder calorífico no Sistema Internacional de unidades é o kJ/kg. O poder calorífico de materiais heterogêneos, como os resíduos, é geralmente medido com o auxílio de um calorímetro. Este parâmetro pode ainda ser expresso em poder calorífico superior (PCS) e poder calorífico inferior (PCI). O PCS é calculado assumindo que todo o vapor d’agua gerado durante a queima tenha condensado. No caso do RSU, a água pode estar presente tanto intrinsecamente no material como ser proveniente da umidade contida nele. O PCI é calculado subtraindo do PCS o valor do calor latente de vaporização. Ou seja, o PCI sempre possuirá um valor menor que o PCS. O poder calorífico é de grande importância quando o destino final do lixo é a combustão, pois este parâmetro é fundamental na avaliação das instalações de incineração. Segundo Zhou et al. (2014) a variação de poder calorífico irá impactar fortemente a operação estável de um incinerador. 2.3.3 Composição física e parâmetros químicos A composição física dos resíduos sólidos apresenta as porcentagens das várias frações do lixo, tais como plástico, papel, vidro, matéria orgânica entre outros. O governo federal brasileiro, no plano nacional de resíduos sólidos, utiliza os dados da composição gravimétrica média do Brasil para estimar a quantidade dos diferentes tipos de resíduos produzidos; tais dados são provenientes da média de 93 estudos de caracterização física realizados entre 1995 e 2008 (BRASIL, 2012). Devido ao fato de nem todos os estudos utilizarem a mesma metodologia, este resultado nada mais é que uma estimativa do comportamento real da situação. A Tabela 2 apresenta a composição gravimétrica média do RSU no Brasil, tendo como base o ano de 2008. Os parâmetros químicos são importantes na definição da forma mais adequada de disposição final (JARDIM, 1995). São importantes também no cálculo do poder calorífico e na estimativa da quantidade de carbono antropogênico e não antropogênico, ou seja, aquele derivado da atividade humana e os que ocorrem em ambientes naturais sem influência humana, respectivamente. Essa estimativa, por sua vez, é essencial ao avaliar a emissão de gases do efeito estufa (RYU, 2010). 29 Tabela 2 - Estimativa da composição gravimétrica dos RSUs Composição Gravimétrica dos RSUs Resíduos Participação (%) Quantidade (t/dia) Material Reciclável 31,9 58.527,40 Metais 2,9 5.293,50 Aço 2,3 4.213,70 Alumínio 0,6 1.079,90 Papel, papelão e tetrapak 13,1 23.997,40 Plástico total 13,5 24.847,90 Plástico filme 8,9 16.399,60 Plástico rígido 4,6 8.448,30 Vidro 2,4 4.388,60 Materia orgânica 51,4 94.335,10 Outros 16,7 30.618,90 Total 100,0 183.481,50 Fonte: Adaptado de Brasil (2012). Ryu (2010) compôs a Tabela 3 que explicita a composição química para as diferentes frações dos componentes contidos no RSU na Coréia do Sul. Além da composição química, a tabela também contém a porcentagem de cinzas, a porcentagem de carbono antropogênico e não antropogênico, o valor de PCI e percentual de contribuição de cada componente. Algumas características são interessantes de se destacar dessa tabela, como o fato de 53,6 % do conteúdo de energia ser provido do plástico e somente 2,5 % de resto de comida. Tabela 3 – Composição química e poder calorífico do RSU não reciclado Fonte: Traduzido de Ryu (2010) 30 2.4 FORMAS DE DISPOSIÇÃO E O MEIO AMBIENTE A principal questão ambiental relacionada ao RSU está ligada à poluição local, pertinente principalmente à destinação final desses resíduos. Dentre os principais problemas pode-se destacar os relacionados ao despejo em depósitos de lixo, tais como, perda de atratividade das áreas vizinhas, presença de animais que podem ser vetores de doenças, risco de contaminação de lençóis freáticos, de poluição do solo e de emissões de gases do efeito estufa. Com a determinação de fatores dos resíduos, como quantidade produzida per capita, composição, localização, disponibilidade para disposição, impactos sociais e ambientais e possíveis possibilidades de reaproveitamento, pode-se elaborar um plano de gestão e hierarquizar os caminhos existentes para disposição de resíduos (EPE, 2008). Dentre os principais caminhos é interessante frisar os quatro principais: - Reciclagem: Consiste em retirar do lixo urbano os materiais que não estejam contaminados e que possam ser reaproveitados para fabricação do mesmo material ou de outros produtos. - Compostagem: É o processo que gera composto ou adubo orgânico, resultante do processamento de resto alimentares e/ou outros componentes orgânicos. - Recuperação energética: O aproveitamento energético dos resíduos pode acontecer, por exemplo, com a geração de biogás tanto a partir de aterros sanitários como a partir da digestão anaeróbica, ou também pela incineração de resíduos em plantas WTE. Ou ainda, fazendo o aproveitamento em ciclos combinados, que possuem a finalidade de aumentar a eficiência do processo de aproveitamento energético de incineração do lixo. - Aterro sanitário: É um método de disposição dos resíduos sólidos municipais no solo, em local apropriado, com garantias sanitárias. 2.4.1 Aterros versus Incineração A questão do tratamento e disposição final dos resíduos sólidos se torna bem complicada quando analisada de uma forma mais abrangente, pois não existe uma única solução para essa questão. É um assunto que deve ser analisado individualmente, ou seja, caso a caso e sua complexidade dependerá do local e dos recursos existentes. Existem, por exemplo, vários locais no mundo que fazem uso de múltiplas soluções, como reciclagem, aproveitamento energético de resíduos, compostagem e aterros. O que importa é que haja uma integração entre essas soluções a fim de se ter uma resposta adequada e extensiva para o problema dos resíduos sólidos municipais. 31 Dentre as principais soluções encontradas no Brasil e no mundo estão os aterros sanitários e a incineração. O aterro é uma solução que requer pouco investimento tanto para sua construção como para sua manutenção. É fundamentado em critérios e normas operacionais específicas, que permite a confinação relativamente segura com relação ao controle ambiental e a saúde pública. O confinamento do lixo no solo se dá em camadas cobertas com material inerte; essa é uma das precauções que são tomadas pensando no meio ambiente (existem algumas outras tais como, sistema de drenagem da água da chuva, coleta e drenagem do lixiviado também conhecido como chorume, utilização e/ou queima de gases gerados). Embora seja uma solução relativamente barata e que tenha sido por muito tempo a melhor maneira de se dispor dos resíduos, despejo em aterros, não é uma solução totalmente sustentável devido a possibilidade de vazamentos subterrâneos e de gases para atmosfera e para muitos países como o Japão e outros do continente europeu é até mesmo inviável, pois com o crescimento populacional a quantidade de espaço disponível, que já é limitada, está diminuindo ainda mais. Com uma mentalidade mais sustentável, ou seja, visando atender às necessidades do presente sem prejudicar as gerações futuras, outras soluções estão sendo propostas. A incineração é uma das alternativas encontradas no caso de materiais não recicláveis (em países como Japão a porcentagem do lixo incinerado chega a 34% (MULLIGAN, 2009)). Incineração é uma tecnologia que pode ser utilizada para reduzir de forma eficiente o volume e o peso do lixo, em aproximadamente 90% e 75%, respectivamente, (MENEZES; GERLACH; MENEZES, 2000) reduzindo-se assim a necessidade da utilização de aterros. Outro fator de interesse é que as plantas de incineração podem ser localizadas perto dos grandes centros, ou seja, onde a maior quantidade de lixo é gerada, diminuindo, por conseguinte, o custo com transporte. Incineração produz altas temperaturas, então há também a possibilidade de realizar recuperação de energia na forma de calor ou energia elétrica, tornando os resíduos sólidos urbanos um possível substituto dos combustíveis fósseis de modo a auxiliar na redução da emissão de gases do efeito estufa. Embora, como mencionado, se observem várias vantagens da incineração de resíduos sólidos urbanos, este processo ainda vem sendo muito pouco utilizado e a razão decorre de vários fatores. A incineração de resíduos não é uma ideia nova; esta técnica vem sendo realizada na Europa desde o fim do século XIX, e desde o início vem sofrendo grandes pressões do público contra sua utilização, devido, principalmente, ao fato do processo ser realizado queimando os resíduos sem nenhuma preocupação com os gases gerados, que estavam muitas vezes associados à emissão de poluentes prejudiciais à saúde pública. Ainda que atualmente haja restrições estipuladas por órgãos governamentais quanto ao nível de poluentes emitidos 32 por essas plantas e que tenha havido um avanço considerável no que se refere à tecnologia de tratamento dos gases gerados na combustão dos resíduos sólidos, como, por exemplo, na mitigação de componentes altamente prejudiciais como dioxinas, furanos e NOx, o público em geral ainda se mostra receoso com o uso desta tecnologia (ATHANASIOS; ATHANASIOS; ILIAS, 2014). Outros fatores que são desfavoráveis à construção de plantas de incineração de resíduos são o alto investimento requerido e os altos custos de operação. Em tais plantas se faz necessária a utilização de mão de obra qualificada devido à complexidade de operação e também é imprescindível que certos requisitos ambientais sejam cumpridos, e como mencionado, isso somente é alcançado com a utilização de tecnologia de tratamento de gases que, por serem processos recentes ou em desenvolvimento, aumentam muito o custo de operação. Estes fatores levam países, principalmente os subdesenvolvidos e em desenvolvimento, a dar preferência a outras alternativas de disposição de resíduos. 2.4.2 Plantas WTE Existem atualmente várias tecnologias diferentes de recuperação energética dos resíduos, ou como também são conhecidas tecnologias WTE, tais como incineração, digestão anaeróbica, gaseificação e pirólise. No entanto, a tecnologia predominante ainda consiste da incineração por combustão sobre uma grelha móvel e geração de vapor supersaturado com o objetivo de alimentar uma turbina a vapor operando em um ciclo Rankine. As características do RSU que irá alimentar essa planta, as tecnologias de combustão e da caldeira de recuperação são alguns dos fatores que serão decisivos na quantidade de energia recuperada por esse processo (BRANCHINI, 2015). Na Figura 4 pode ser visto em destaque as quatro principais seções de uma usina de incineração WTE que são descritas a seguir. Entrega e armazenamento: seção onde acontece a entrega e o armazenamento do lixo. É importante para um bom funcionamento do processo que o lixo armazenado nesse depósito seja constantemente movido e misturado a fim de se evitar a formação de gases como o metano (CH4) e de forma a realizar a homogeneização do material a ser fornecido a seção seguinte. Combustão: seção onde acontece a queima dos resíduos, que se resume basicamente na oxidação dos materiais combustíveis contidos no lixo. A queima acontece quando essas substâncias atingem a temperatura necessária para ignição e uma suficiente quantidade de oxigênio se faz presente. 33 Recuperação energética: seção responsável por fazer o aproveitamento do calor gerado na combustão dos resíduos sólidos. Nesta etapa do processo será gerado o vapor superaquecido para utilização nas turbinas a vapor; isso é conseguido com auxílio de uma caldeira composta de economizador (seção onde a água de alimentação da caldeira é aquecida pelos gases da combustão até aproximadamente a temperatura de ebulição), de evaporador (a água nesse estágio é aquecida até a temperatura de saturação) e por fim de um superaquecedor (estágio final onde a água é superaquecida até uma temperatura máxima). Limpeza dos gases de combustão: É o último estágio do processo de incineração e tem importância fundamental, pois tem a responsabilidade de limpar os poluentes gerados durante a combustão. Dentre esses poluentes pode-se destacar os principais gerados durante o processo, como CO, NOx, HCl, SO2 entre outros, que são extremamente prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. Figura 4 – Seções de uma planta WTE Fonte: Adaptado e traduzido de Branchini (2015) A geração de energia em usinas WTE ocorre, geralmente, de forma contínua ao longo do dia, de forma a evitar o acúmulo dos resíduos. Diferentemente de outras usinas térmicas, no entanto, a eficiência na conversão para energia elétrica é relativamente baixa, na ordem de 20 e 25 % (EPE, 2008). Segundo Korobitsyn, Jellema e Hirs (1999), a baixa eficiência deste processo está relacionada a algumas precauções que devem ser tomadas na operação, devido à agressividade do gás gerado na combustão do RSU, tais como rearranjo da caldeira a fim de evitar corrosão, 34 erosão e formação de escórias. Os tubos do evaporador e do superaquecedor devem ser posicionados de forma que o gás gerado na combustão chegue com temperaturas aceitáveis na seção convectiva da caldeira. Essas precauções fazem com que a temperatura do vapor superaquecido gerado seja muito baixa (da ordem de 400 e 450 ̊C). Outro fator que prejudica a eficiência dessas plantas é o fato da temperatura dos gases na chaminé não poder ser menor do que cerca de 200 ̊C, de modo a diminuir os riscos de condensação dos componentes agressivos que se fazem presentes no gás de exaustão. Em tais condições, uma instalação WTE pode gerar entre 450 e 600 kWh por tonelada de RSU (EPE, 2008). 2.5 CICLOS COMBINADOS HÍBRIDOS Algumas formas de contornar esse problema e aumentar o rendimento do aproveitamento energético do processo de incineração, tornando-o mais interessante energeticamente, foram e vêm sendo propostas. Otamaa et al. (1997) propuseram a integração de um ciclo com turbina a gás (TG) em uma planta de incineração de RSU. Quando o combustível usado na turbina a gás for de um tipo diferente do usado na planta de incineração dá-se o nome a esse ciclo de ciclo combinado híbrido. 2.5.1 Terminologia O termo ciclo combinado, é a expressão geralmente usada para se referir à conexão térmica entre sistemas diferentes. O conceito de ciclo combinado não é novo, é um conceito amplamente utilizado, por exemplo, na integração de uma turbina a gás a um ciclo a vapor sendo a turbina a gás o ciclo superior (ou topping) e o ciclo a vapor o ciclo inferior (ou bottoming). O termo ciclo superior (CS) se refere ao ciclo de potência de qualquer máquina térmica que aceita calor a um alto nível de temperatura e que o calor excedente é explorado em outro ciclo a um menor nível de temperatura. Por outro lado, o termo ciclo inferior (CI) refere-se aos ciclos de potência em que a fonte de calor provém da parcela rejeitada por um outro ciclo. Um exemplo de CS é a turbina a gás; esses sistemas utilizam combustíveis gasosos ou líquidos de alta qualidade, enquanto o ciclo Rankine seria um exemplo de ciclo inferior CI. O termo ciclo híbrido designa ciclos de potência que especificamente utilizam dois combustíveis diferentes para o CS e o CI. Como mencionado anteriormente, o CS utiliza 35 geralmente um combustível de alta qualidade e, assim, essa configuração permite que no CI seja utilizado combustíveis de qualidade inferior como, por exemplo, RSU. A Figura 5 representa os cenários dos ciclos combinados, e os dois possíveis arranjos de ciclos híbridos, repotenciação windbox e integração lado vapor/água. Figura 5 – Classificação esquemática dos ciclos combinados e opções de integração Fonte: Adaptado e traduzido de Branchini (2015) 2.5.2 Repotenciação windbox É o arranjo onde os gases de exaustão do CS são enviados à caldeira do CI para então serem usados como ar de queima do combustível utilizado neste ciclo. Os gases de exaustão do CS podem ainda passar por um processo de resfriamento antes de serem enviados a caldeira do CI. Quando este é o caso, este arranjo ganha o nome de cold windbox; caso contrário a 36 denominação é hot windbox, ou seja, quando os gases de exaustão são enviados diretamente a caldeira. Estas configurações são apresentadas na Figura 6. Figura 6 – Representação esquemática das configurações (A) hot windbox e (B) cold windbox Fonte: Adaptado de Branchini (2015) Esta configuração muitas vezes requer que inúmeras modificações sejam realizadas em seus elementos componentes devido a um considerável aumento da taxa de fluxo volumétrico dos gases da combustão. Exemplos de algumas das possíveis modificações são as realizadas nos aquecedores de ar e sistemas de tubulações que podem ter que passar por alterações dependendo do novo fluxo de ar e de gás. Isso faz com que essa configuração tenha uma complexidade elevada quando comparada com outras configurações. Dentre as vantagens de se realizar a integração de uma planta de incineração queimando RSU a uma turbina a gás com repotenciação windbox pode-se destacar: - Eliminação da necessidade de pré-aquecimento do ar de combustão do RSU devido às altas temperaturas dos gases de exaustão da turbina a gás. - Redução do impacto ambiental quando comparado com sistemas isolados, devido ao fato dos gases de exaustão da turbina a gás passarem pelo mesmo sistema de tratamento dos gases resultantes da queima do RSU. - Redução da fração de água contida nos gases de exaustão da planta WTE permitindo, assim, menores temperaturas na rejeição e um maior aproveitamento energético. 37 2.5.2 Integração lado vapor/água Neste arranjo os gases de exaustão da turbina a gás são direcionados a uma caldeira de recuperação HRSG (heat recovery steam generator), onde o vapor do ciclo a vapor é superaquecido. Como resultado de usar um combustível de alta qualidade na turbina a gás não há necessidade de se preocupar com problemas de corrosão no superaquecedor do HRSG; sendo assim, o vapor pode atingir temperaturas comparáveis às que se obtém em plantas movidas a combustíveis fósseis, de até 560 ̊C (BRANCHINI, 2015). Basicamente, a planta WTE, neste caso, age como uma fonte adicional de vapor saturado e, também, em algumas situações, de água quente para o ciclo combinado. O fato de o vapor saturado ser gerado fora do HRSG auxilia na geração de um perfil de temperatura mais favorável, ou seja, gera uma menor diferença de temperatura entre o lado do vapor/água e do gás, fazendo com que o processo se torne mais eficiente. A Figura 7 ilustra uma possível configuração de uma planta integrada WTE e TG em configuração lado vapor/água. O processo de aumentar externamente a temperatura do vapor no ciclo Rankine irá aumentar a eficiência na geração de eletricidade em plantas de incineração de lixo. Porém, este procedimento de integração de um CS com um CI usando combustíveis diferentes deve possuir uma conexão térmica bem concebida de modo que ambos os ciclos tirem proveito da situação. Dentre as vantagens de se realizar a integração de uma planta de incineração queimando RSU a uma turbina a gás neste arranjo pode-se destacar: - Transição da temperatura máxima do vapor da caldeira do processo WTE para o HRSG, eliminando-se assim uma situação problemática em plantas WTE convencionais, de corrosão no superaquecedor. - Devido ao fato da turbina a vapor estar sendo usada tanto pela seção da planta WTE e pelo HRSG, geralmente se requer neste caso maiores turbinas que, por sua vez, possuem melhores eficiências que as turbinas a vapor normalmente usadas em processos convencionais. - Redução de custos, como consequência da eliminação do superaquecedor na caldeira do incinerador e do compartilhamento de equipamentos na planta integrada. 38 Figura 7 – Esquema da integração lado vapor/água entre uma planta WTE de incineração de lixo e uma turbina a gás. Fonte: Traduzido e adaptado de Branchini (2015) 2.6 CONCEITOS TERMODINÂMICOS 2.6.1 Primeira Lei da Termodinâmica A Primeira Lei da Termodinâmica ou, como também é conhecida, princípio de conservação de energia, estabelece que energia não se cria ou se destrói durante um processo, ela apenas muda de forma, ou seja, a primeira lei é a base de estudo das interações de energia em suas diversas formas. A análise das aplicações da primeira lei é na maioria dos casos realizada utilizando o conceito de volume de controle. O volume de controle é um volume no espaço escolhido de forma arbitrária na região de interesse a ser estudada. A lei de conservação da massa aplicada a um volume de controle (VC) estabelece que a taxa de variação da massa na unidade de tempo (t) dentro do volume é igual à vazão mássica que entra menos a vazão mássica que sai, como apresentado na equação (3). 39 dmV.C dt = Σ�̇�𝑒 − Σ�̇�𝑠 (3) Sendo ṁ, a vazão mássica, Em que: dmV.C dt : é a taxa de variação da massa com o tempo no volume de controle em (kg/s) Σ�̇�𝑒: é a somatória de todas as vazões mássicas entrando no volume de controle em (kg/s) Σ�̇�𝑠: é a somatória de todas as vazões mássicas saindo do volume de controle em (kg/s) A primeira lei da Termodinâmica pode então ser aplicada a um volume de controle conforme apresentado na equação (4) para condição de regime permanente. 0 = �̇�𝑉.𝐶 − �̇�𝑉.𝐶 + Σ �̇�𝑒 (ℎ𝑒 + 1 2 𝑉𝑒 2 + 𝑔𝑍𝑒) − Σ �̇�𝑠 ( ℎ𝑠 + 1 2 𝑉𝑠 2 + 𝑔𝑍𝑠 ) (4) Sendo: �̇�𝑉.𝐶 : é a taxa de transferência de calor no volume de controle em kW. �̇�𝑉.𝐶: é a taxa de realização de trabalho associada ao volume de controle em kW. Σ �̇�𝑒: é a somatória das vazões mássicas que entram no volume de controle em kg/s. Σ �̇�𝑠: é a somatória das vazões mássicas que saem do volume de controle em kg/s. ℎ𝑒: é a entalpia específica na entrada do volume de controle em kJ/kg. ℎ𝑠: é a entalpia específica na saída do volume de controle em kJ/kg. g: é a aceleração da gravidade em m/s2. 𝑉𝑒: é a velocidade do fluxo mássico de entrada no volume de controle em m/s. 𝑉𝑠: é a velocidade do fluxo mássico de saída no volume de controle em m/s. 𝑍𝑒: é a cota na entrada do volume de controle com relação a uma referência em m. 𝑍𝑠: é a cota na saída do volume de controle com relação a uma referência em m. 2.6.2 Segunda Lei da Termodinâmica Para garantir que um processo ocorra, o cumprimento da Primeira Lei por si só não é suficiente, é necessário que se considere a direção de realização do processo. Foi a introdução da Segunda Lei da Termodinâmica por Kelvin, Planck e Clausius, com base no trabalho desenvolvido por Carnot, que possibilitou a descrição singular dos fenômenos naturais. É importante destacar, no entanto, que a Segunda Lei não se limita à determinação da direção do 40 processo, é também um modo de determinar a “qualidade” da energia. Do mesmo modo como feito para a Primeira Lei, a Segunda Lei da Termodinâmica também pode ser aplicada a um volume de controle, como pode ser visto na equação (5) (SONNTAG; BORGNAKKE; WYLEN, 1998). 𝑑𝑆𝑉.𝐶 𝑑𝑡 = Σ̇�̇�𝑒𝑠𝑒 − Σ�̇�𝑠𝑠𝑠 + Σ �̇�𝑉.𝐶 𝑇 + �̇�𝑔𝑒𝑟 (5) Na qual: 𝑑𝑆𝑉.𝐶 𝑑𝑡 : Taxa de variação total de entropia no volume de controle em kW/K. Σ̇�̇�𝑒𝑠𝑒: Taxa de transporte de entropia entrando no volume de controle em kW/K. Σ̇�̇�𝑠𝑠𝑠: Taxa de transporte de entropia saindo do volume de controle em kW/K. Σ �̇�𝑉.𝐶 𝑇 : Taxa de transferência de entropia devida a transferência de calor ao volume de controle em kW/K. �̇�𝑔𝑒𝑟 : Taxa de geração de entropia no volume de controle em kW/K. 2.6.3 Análise Exergética A exergia de uma porção de matéria pode ser definida como o máximo trabalho reversível obtido quando esse material for levado do estado em que se encontra ao equilíbrio termodinâmico com o ambiente, sem intervenções além dos realizados entre si e o ambiente. Ou seja, exergia pode ser compreendida como uma medida do desequilíbrio entre a matéria e o ambiente sendo que este pode ser especificado por sua temperatura, pressão e composição química (QUEROL; GONZALES-REGUERAL; PEREZ-BENEDITO, 2013). O cálculo da exergia total é geralmente reduzido à soma da exergia química e física, sendo que em alguns casos são também incluídos as exergias potencial e cinética. A exergia física 𝑏𝑓 é o trabalho reversível máximo obtido ao passar uma unidade de massa de uma substância em um dado estado (T, P) para o estado do ambiente (T0, P0) através somente de processos físicos (QUEROL; GONZALES-REGUERAL; PEREZ-BENEDITO, 2013). A exergia pode ser determinada de acordo com os valores de entropia e entalpia do fluxo em ambos os estados, genérico e ambiente, respectivamente, como mostra a equação (6) (QUEROL; GONZALES- REGUERAL; PEREZ-BENEDITO, 2013). 41 bf = [h(T, P) − h(T0, P0)] − T0[s(T, P) − s(T0, P0)] (6) Para um gás ideal com calor específico a pressão constante, cp, a exergia física pode ser dada como mostra equação (7) (KOTAS, 1985). bf = cp [(𝑇 − 𝑇0) − 𝑇0 ln ( 𝑇 𝑇0 )] + RT0 ln ( 𝑃 𝑃0 ) (7) A exergia química, por sua vez, é o máximo trabalho que seria obtido ao passar do estado do ambiente para o estado morto, por meio de processos químicos com os reagentes e produtos à temperatura e pressão ambiente quando a composição do fluxo não está em equilíbrio com o ambiente. É importante para compreensão desta definição elucidar o significado de estado morto. Segundo Çengel e Boles (2013), o estado morto é atingido por um sistema quando ele se encontra em equilíbrio termodinâmico com o ambiente, ou seja, possuem a mesma temperatura e pressão, não possuem energia cinética ou potencial relativos entre si e, também, não reage com o ambiente, ou seja, é quimicamente inerte. O cálculo da exergia química de uma mistura de fluxos gasosos, em que se assume que se comportam como uma mistura de gases ideais é mostrado pela equação (8) (KOTAS, 1985). b̃q = Σxib̃q,i + �̃�𝑇0 Σ𝑥𝑖 𝑙𝑛𝑥𝑖 (8) Sendo: b̃q,i : é a exergia química molar especifica de cada componente (tabulado) em kJ/kmol. xi: é a fração molar de cada componente �̃� : é a constante universal dos gases em base molar em kJ/kmol.K. Por fim, é interessante evidenciar o cálculo da exergia para fluxos que não forem materiais como, por exemplo, trabalho, eletricidade e calor. Exergia do fluxo de trabalho é dada pela equação (9): �̇�𝑊 = �̇� (9) Ou seja, como exergia é definida como o trabalho potencial máximo, o trabalho realizado em termos de energia é equivalente em termos de exergia. 42 A mesma equivalência é válida para a exergia do fluxo elétrico, pois energia elétrica pode ser totalmente convertida em trabalho. O cálculo da exergia do fluxo elétrico é mostrado na equação (10). �̇�𝑊 = �̇�𝑒 (10) O cálculo da exergia do fluxo de calor se faz a partir da equação (11). �̇�𝑞 = (1 − 𝑇0 𝑇 ) �̇� (11) Existem alguns pontos de interesse que valem a pena destacar ao se analisar a equação (11) como, por exemplo, o fato de que quando T for próximo de T0 pode se concluir que a exergia será menor para um mesmo fluxo de calor no caso de T distante de T0. Outro ponto importante que se pode concluir a partir de tal equação é o caso de T