Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP Faculdade de Filosofia e Ciências PEDRO MAZZIERO OLIVEIRA Morte e vida no Direito Comparado: uma análise do direito civil sul-americano MARÍLIA-SP 2023 PEDRO MAZZIERO OLIVEIRA Morte e vida no Direito Comparado: uma análise do direito civil sul-americano Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Conselho de Curso de Relações Internacionais da Faculdade de Filosofia e Ciências, da Universidade Estadual Paulista – UNESP – Campus de Marília, para a obtenção do título Bacharel em Relações Internacionais. Orientadora: Mariana Moron Saes Braga MARÍLIA 2023 O48m Oliveira, Pedro Mazziero Morte e vida no Direito Comparado : uma análise do direito civil sul-americano / Pedro Mazziero Oliveira. -- Marília, 2023 52 p. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Relações Internacionais) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília Orientadora: Mariana Moron Saes Braga 1. Relações Internacionais. 2. Início da vida. 3. Morte. 4. Direito Comparado. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. PEDRO MAZZIERO OLIVEIRA MORTE E VIDA NO DIREITO COMPARADO: UMA ANÁLISE DO DIREITO CIVIL SUL-AMERICANO Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais, da Faculdade de Filosofia e Ciências, da Universidade Estadual Paulista – UNESP – Campus de Marília, na área de concentração de Direito Internacional Comparado. BANCA EXAMINADORA Orientadora: Mariana Moron Saes Braga Drª. – UNESP – Campus de Marília 2º Examinador: Luiz Fernando de Castro Vascon Dr. – UNESP – Campus de Marília 3º Examinador: Frederico di Palma Xavier Aguiar Mestrando. – UNESP – Campus de Marília Marília, 17 de fevereiro de 2023. AGRADECIMENTOS Ao meu núcleo familiar, especialmente meus pais, por todas as batalhas financeiras, emocionais e espirituais enfrentadas incansavelmente para que eu pudesse chegar até aqui. Agradeço aos amigos que fiz durante esse ciclo de minha vida, a todos que cruzaram meu caminho e puderam acrescentar algo nessa jornada. Agradeço, por fim, aos professores que tive, em especial aqueles que se dedicam constantemente ao ensino apesar das adversidades. RESUMO O principal objetivo deste trabalho foi realizar um estudo de Direito comparado nos países da América do Sul sobre o momento que compreende o início e o fim da vida. De início, pretendeu-se comentar como estão presentes as discussões da vida e da morte no Direito e na sociedade. Para tal, realizou-se uma contextualização acerca de alguns conceitos essenciais descritos no decorrer deste estudo. É fundamental assimilar de que maneira essas temáticas são entendidas no meio social para que a análise dos ordenamentos jurídicos seja feita de forma eficaz. Posteriormente, buscou-se averiguar se a questão que envolve a determinação tanto no início quanto no fim da vida foi regulada em todos os ordenamentos jurídicos pesquisados. Palavras-chave: Início da vida humana; Morte; Direito Comparado. ABSTRACT The main objective of this work was to carry out a study of comparative law in South American countries on the moment that comprises the beginning and end of life. Initially, it was intended to comment on how discussions of life and death are present in Law and in society. For this, a contextualization was carried out about some essential concepts described in the course of this study. It is essential to assimilate how these themes are understood in the social environment so that the analysis of legal systems can be carried out effectively. Subsequently, we sought to ascertain whether the issue involving determination both at the beginning and at the end of life was regulated in all legal systems surveyed. Keywords: Beginning of human life; Death; Comparative law. RESUMEN El objetivo principal de este trabajo fue realizar un estudio de derecho comparado en los países sudamericanos sobre el momento que comprende el inicio y el final de la vida. Inicialmente, se pretendía comentar cómo las discusiones sobre la vida y la muerte están presentes en el Derecho y en la sociedad. Para ello, se realizó una contextualización sobre algunos conceptos esenciales descritos en el transcurso de este estudio. Es fundamental asimilar cómo se entienden estos temas en el medio social para que el análisis de los sistemas jurídicos pueda realizarse de manera efectiva. Posteriormente, se buscó conocer si el tema de la determinación tanto al inicio como al final de la vida estaba regulado en todos los ordenamientos jurídicos relevados. Palabras claves: Comienzo de la vida humana; Muerte; Ley comparativa. LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Instrumentos legais que regulam o início da vida na América do Sul ..... 21 Quadro 2 – Dispositivos jurídicos que regulam o início da vida ................................ 23 Quadro 3 – Instrumentos legais que regulam o fim da vida na América do Sul ........ 37 Quadro 4 – Dispositivos jurídicos que regulam o fim da vida .................................... 40 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CFM Conselho Federal de Medicina DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos ONU Organização das Nações Unidas STF Supremo Tribunal Federal OEA Organização Dos Estados Americanos SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 9 2. O INDIVÍDUO E O DIREITO À VIDA .................................................................. 12 2.2 O Início Da Vida No Direito Civil Sul-Americano e Suas Teorias ................ 17 2.3 Resultados e discussões ................................................................................ 20 3. A MORTE E A DIGNIDADE HUMANA ............................................................... 27 3.1. Métodos de abreviação e prolongamento da vida ....................................... 32 3.2 Resultados e Discussões ............................................................................... 36 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 43 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 45 9 1. INTRODUÇÃO Na sociedade contemporânea, os avanços da ciência e da técnica potencializaram as discussões sobre quando o direito deve considerar o início da vida humana, de modo que os debates, que anteriormente se concentravam em torno do aborto, também passaram a ter como objeto as novas tecnologias. Desse modo, as questões contemporâneas sobre o marco inicial da vida referem-se, principalmente, a dois aspectos: o primeiro, relacionado à interrupção da gestação e o segundo, no que diz respeito às intervenções das novas tecnologias no embrião e sua ingerência na natureza humana. O desenvolvimento científico tornou possível a manipulação do genoma humano, a reprodução humana assistida, o diagnóstico genético de pré-implantação, o congelamento de embriões humanos, a clonagem, as pesquisas com células-tronco embrionárias, a biologia sintética, entre outras tecnologias que surgem com crescente velocidade. Diante das novas tecnologias, passou-se a questionar a possibilidade ou não de utilização de embriões humanos em pesquisas, de sua manipulação e destruição em pesquisas e terapias, de seleção de embriões em razão de diagnóstico de doenças ou escolha de sexo, de intervenções no desenvolvimento embrionário, de descarte destes embriões, de redução embrionária, de ingerências na natureza humana. Nesse contexto, as dúvidas e discussões convergem para a busca de uma definição do marco inicial da vida (LAUXEN, 2014). Da mesma forma, ao longo do tempo, a preocupação com a regulamentação – dentro dos ordenamentos jurídicos – daquilo que caracteriza o fim da vida também aparece como problemática para os estudiosos do direito. Métodos de abreviação e prolongamento da vida - eutanásia, distanásia e ortotanásia - permeiam as questões principais e, ao mesmo tempo, direcionam os pesquisadores a repensarem sobre como tais acontecimentos devem ser regulados nos dispositivos. Em outras palavras, um estabelecimento mais claro da definição de fim da vida humana seria essencial em diversas maneiras. A partir da conceituação da personalidade do ser humano ao longo da história e de uma abordagem contextualizadora da morte na sociedade, o objetivo deste trabalho foi o de realizar um estudo de direito comparado nos países da América do 10 Sul sobre o momento que compreende o início e o fim da personalidade. Primeiramente, pretendeu-se averiguar se a questão que envolve a determinação tanto do início quanto do fim da vida foi regulada em todos os ordenamentos jurídicos pesquisados. Posteriormente, objetivou-se realizar um estudo de direito comparado, ou seja, comparar e analisar o teor dos dispositivos encontrados. Conforme Silva (2009), coisas absolutamente heterogêneas não se prestam a comparação, porque esta consiste precisamente em observar o que é símile e o que é dissímil em uma mesma classe ou espécie de objetos. Comparar significa confrontar, aproximar coisas a fim de individualizá-las e, dessa forma, distingui-las, agrupá-las e classificá-las. Silva (2009) ressalta que muitos estudos que se qualificam como de direito comparado não o são. Segundo ele, muitas vezes se lê em monografias um capítulo sobre o direito comparado a respeito do tema tratado. No mais das vezes não passa do uso abusivo do conceito porque, rigorosamente, não se faz, nesses casos, direito comparado, mas simples indicação da incidência do objeto da monografia ou no direito estrangeiro ou na legislação anterior. O Direito comparado pode ser estudado sob duas perspectivas, a espacial e a temporal. O método comparativo é diacrônico quando compara elementos que se sucedem no tempo numa mesma comunidade. Para ser diacrônica não é necessário que a comparação se dê entre elementos sucessivos imediatos. Podem ser comparados elementos antigos com os mais modernos, inclusive os vigentes, da mesma ordem jurídica. Assim, por exemplo, faz-se comparação constitucional diacrônica tanto quando se compara, por exemplo, o presidencialismo formulado pela Constituição de 1891 com o da Constituição de 1946 quanto quando se compara o federalismo formulado pela Constituição vigente com o que foi estruturado pela Constituição de 1891. Em se tratando da comparação diacrônica, Pereira (1955) esclarece que pode o investigador recuar no tempo e buscar dados informativos da instituição em sua origem, rastreando-a pelos séculos, até alcançar o momento atual. Silva (2009) menciona que o método comparativo é sincrônico quando compara elementos de ordens jurídicas da mesma época, mas de lugares diferentes; assim, se se comparar o federalismo brasileiro com o da Argentina, faz-se comparação sincrônica. A comparação jurídica é sincrônica quando se confrontam ordens jurídicas aproximadas no tempo, mas afastadas no espaço. Para ser comparação sincrônica 11 não é necessário que os elementos a comparar sejam atuais. Podem ser comparados elementos de ordens jurídicas antigas, como seria o caso, por exemplo, de comparar as instituições da Constituição de 1924 com as da Constituição francesa de 1830. É justamente o que pretendeu o presente estudo: comparar como o início e o fim da vida foram formulados nos sistemas jurídicos dos países da América do Sul. Para tanto, inicialmente apresentam-se algumas teorias existentes sobre o início da vida seguidas pela exposição dos resultados da pesquisa referente ao início da vida. Da mesma maneira, após uma apresentação sobre o conceito de dignidade do ser humano, assim como da presença do fenômeno da morte na sociedade, segue-se a exposição dos resultados encontrados à luz dos ordenamentos jurídicos pesquisados. 12 2. O INDIVÍDUO E O DIREITO À VIDA Dentre variadas denominações possíveis, a vida pode ser entendida como uma junção de propriedades e funções que, além de caracterizar, distinguem um ser vivo de um ser morto; em outras palavras, é a parcela de tempo compreendida entre o nascimento e o falecimento desse ser. Todavia, esse entendimento passa longe de ser visto como consenso na sociedade natural, assim como também suas definições oficiais, em dicionários, por exemplo, não são capazes de abarcar toda a complexidade dessa denominada parcela de tempo. Do ponto de vista jurídico, a vida é o bem supremo. Assim sendo, o direito à vida é um direito do ser humano, isto é, o indivíduo o detém apenas por possuir natureza humana, e também fundamental, garantido nas mais variadas legislações pelo mundo. Janaína Varalli (2017), em sua tese, afirma que os direitos humanos são de grandeza universalista, ainda que os debates acerca da universalidade dos direitos humanos sejam numerosos. No âmbito do direito comparado, essas noções vêm disciplinadas de diferentes maneiras, são exemplos, a Constituição da Itália (1947, p. 6), art. 2. “A República reconhece e garante os direitos invioláveis do homem, quer como ser individual, quer nas formações sociais onde se desenvolve a sua personalidade, e requer o cumprimento dos deveres inderrogáveis de solidariedade política, econômica e social”; a Constituição da Alemanha (1949, p. 16), art. 2. “Todas as pessoas têm o direito à vida e à integridade física. A liberdade da pessoa é inviolável. Estes direitos só podem ser restringidos em virtude de Lei”; a Constituição da Espanha (1978), art.15. “Todos tienen derecho a la vida y a la integridad física y moral, sin que, en ningún caso, puedan ser sometidos a tortura ni a penas o tratos inhumanos o degradantes. Queda abolida la pena de muerte, salvo lo que puedan disponer las leyes penales militares para tiempos de guerra”; a Constituição de Portugal (1976, p. 14), art.24.1. “A vida humana é inviolável. Em caso algum haverá pena de morte”, e a “integridade moral e física das pessoas é inviolável” (art. 25,1.); a Constituição da Suíça (1999, p. 3), art. 10. “Todo ser humano tem direito à vida. A pena de morte está proibida”, entre outras. Nesse sentido, cabe destacar a importância do movimento iluminista pela defesa da consciência de que o homem possui direitos intransferíveis, concedidos a ele independentemente do Estado e devendo por ele ser respeitados. Essa ideia fez 13 parte das inspirações que ocasionaram o surgimento das declarações universais e dos tratados internacionais (VARALLI, 2017). No contexto jurídico internacional, o direito à vida está presente nos ordenamentos jurídicos de diversos países de maneira relativamente recente, tendo sua menção mais antiga referente aos textos clássicos na cláusula due process of law, nas emendas 5 e 14 da Constituição dos Estados Unidos da América (1787), a qual reconhece que “nenhum ser humano pode ser privado de sua vida, liberdade ou propriedade sem o devido processo legal”. O caráter recente dessas regulações é motivado pelos grandes conflitos ocorridos ao longo da primeira metade do século XX, com destaque para a Segunda Guerra Mundial. Em face da desumanidade dos atos cometidos pelos nazistas durante o conflito, os Estados no pós-guerra, tomados de uma consciência universal de modo a impedir novas atrocidades, criaram, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), na qual vale a pena mencionar o artigo 3º, que admite que: “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” (ONU, 1948). Além do direito à vida, o conceito de “pessoa”, ao longo do tempo, evolui de uma utilização informal e adquire um significado jurídico-técnico, tornando-se, posteriormente, uma conotação institucional que, desde sua origem no ordenamento jurídico (Direitos Constitucional e Internacional) influencia uma nova interpretação das normas contidas nos dispositivos jurídicos, como no Código Civil colombiano, que em um passado não tão distante negava os plenos direitos ao nascituro, adiando esse reconhecimento da pessoa humana para o momento do nascimento em diante. É essencial compreender que a realidade por vezes ultrapassa noções e conceitos aos quais buscamos atribuir significados. Em outras palavras, os conceitos técnico- jurídicos possuem natureza funcional, porém estão sujeitos, assim como os mais variados aspectos da vida, à imprevisibilidades. No direito romano - e também no ordenamento jurídico medieval - não existiam os conceitos de pessoa nem de direito à vida. Isso não significa que a vida humana não tenha sido compreendida como uma realidade digna de preservação, no entanto essa proteção parece abdicada ao analisar a conjuntura da época e as diferentes noções daquelas julgadas adequadas à cultura jurídica atual. Nesse contexto, o professor Hernán Talciani (2005) afirma que a estrutura jurídica atual é resultado de dois processos históricos, ainda que tenha se consolidado 14 plenamente apenas na segunda metade do século XX, através de alguns dos ordenamentos supracitados. O primeiro processo decorre da progressiva utilização dos chamados “direitos subjetivos”. Esse termo é conceituado por vários autores, Francesco Carnelutti apresenta-o como uma “situação jurídica evidenciada por uma liberdade ou faculdade de comandar para tutela de um interesse próprio” (CARNELUTTI, 1942, p. 262), já os autores Aftalion, Garcia Olano e Vilanova entendem que “o direito subjetivo está constituído pela relação jurídica ou o conjunto de relações jurídicas, cada uma das quais é integrada por faculdades e deveres.” (AFTALION; OLANO; VILANOVA, 1967, p. 1967) e, por fim, a definição esclarecedora de Alberto Trabucchi apresenta o direito subjetivo como o poder de atuar - de acordo com a vontade de determinado sujeito e protegido pelo ordenamento jurídico - em prol da satisfação de seus interesses juridicamente reconhecidos (TRABUCCHI, 1967). O expoente brasileiro Arnoldo Wald ainda define o direito subjetivo como o direito de exigir a alguém que cumpra seu dever jurídico, como exemplo podemos apontar a proteção da reputação ou da honra que acontece através penalização de crimes como injúria ou calúnia, surgindo daí uma articulação dentro do próprio direito à honra. Tal propagação na linguagem dos direitos tem sua origem, primeiramente, no constitucionalismo pós Segunda Guerra Mundial e também no direito internacional dos direitos humanos, com seus registros cada vez mais elaborados em vista da proteção de conceitos como o de pessoa e do direito à vida. O segundo processo que será comentado é referenciado pelo professor Talciani (2005) do livro "El Derecho Civil a finales del siglo XX”, de Carlos Martínez de Aguirre y Aldaz (1991), denominado “personificação do direito”. De maneira muito ampla, é possível dividir a evolução histórica do conceito jurídico de pessoa em três partes: de início, o termo não possui relevância técnica, servindo apenas como sinônimo de homem. A sociedade romana, por exemplo, não teria problemas em considerar seus escravos como pessoas, no entanto, a estes não era reconhecida a capacidade de adquirir direitos e, por isso, para fins legais, eram tratados como coisas. Nas discussões teológicas ocorridas ao longo dos primeiros séculos da expansão cristã, o termo pessoa passa a receber um significado filosófico que alude a um elemento de natureza racional e intelectual. Na fase seguinte, o termo pessoa alcança um significado devidamente jurídico, mas ainda muito limitado, na medida em que servirá para definir como pessoas 15 aquelas que ocupam papéis dentro do conjunto das relações sociais, seja como indivíduos ou como comunidades, de modo a identificá-las no meio social. Mais adiante, com o fim da sociedade estamental e o surgimento do princípio de igualdade aclamado pela Revolução Francesa, as noções jurídicas do termo passam a se apoiar na filosofia, com destaque para os pensamentos de Immanuel Kant, que por sua vez enxergava o ser humano como possuidor de um valor absoluto e existente como um fim, isto é, sendo oposto às coisas de valor limitado utilizadas como meios de se obter interesses pessoais. Kant direcionou o sentido do termo para aquele que desempenha um papel, um ser singular cuja autoconsciência o permite moldar seu próprio caráter. Aqui entra novamente o conceito de “direito subjetivo” como receptor dessa fundamentação (TALCIANI, 2005). Esse direito subjetivo exige um representante, um sujeito, e a esse sujeito é dado o nome de pessoa. Dessa forma a personalidade surge como categoria conceitual jurídica, agora com alcance técnico. A partir disso, a chave para o reconhecimento - ou não - da personalidade jurídica aparece nos direitos patrimoniais e na noção de capacidade para adquiri-los, consolidando a teoria da “pessoa” com o reconhecimento da capacidade de autossuficiência de um elemento (TALCIANI, 2005). Por conseguinte, a segunda etapa dá origem a uma terceira, que surgirá em um contexto de necessidade de superação do fracasso dos modelos positivistas diante das violações cometidas pelos regimes totalitários no século XX. O Direito busca então estruturar princípios fundamentais que sirvam de referência para os indivíduos dentro de um sistema (TALCIANI, 2005). Um desses princípios fundamentais será a integridade essencial a todos os seres humanos, independentemente das circunstâncias ou características vitais. Então, a teorização cristã enxerga a pessoa como digna diante de sua criação à imagem e semelhança de Deus, enquanto a concepção kantiana - nas correntes mais modernas - figura o ser humano como final em si próprio, não podendo ser utilizado como meio de obtenção de interesses de terceiros. Essas correntes transformam o conceito de “pessoa”, antes entendido como sujeito de direitos subjetivos para o de elemento digno e merecedor de proteção legal máxima. Nas palavras de Talciani, “a pessoa se torna um centro de fundação e desenvolvimento de todo o Direito” (TALCIANI, 2005, não paginado). 16 Destarte, o autor aponta que é necessário reconhecer não somente a personalidade dos indivíduos, mas, de maneira mais específica, sua personalidade na conceituação jurídica. Sendo a personalidade uma regra dentro do direito positivo, estando presente em todas as suas esferas, é possível que se exija o reconhecimento da mesma em todos os seres humanos apenas pelo fato de sê-los, isto é, pertencerem à espécie homo sapiens. A Declaração Universal dos Direitos Humanos também contempla essa questão em seus artigo 6º: “todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei” (ONU, 1948), princípio que aparece também na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, no Pacto de San José da Costa Rica, artigo 3º - Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica: “Toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica” (OEA, 1969). Esse conceito jurídico de pessoa é complementado pelos direitos aplicados às particularidades mais fundamentais do ser humano: a própria vida, a honra, a liberdade e a integridade. A eficácia máxima do reconhecimento do ser humano como pessoa perante a lei ocorre quando se alcança a noção que a essência desse conjunto de particularidades do ser humano deve ser protegida e respeitada, mesmo em casos nos quais sua violação se apoiasse em ideais voltados para o bem-estar da grande maioria. Portanto, essa fundamentação do conceito de pessoa, atrelada diretamente ao conceito de dignidade humana, permite compreender que os direitos devem ser invioláveis (ninguém deverá ser privado de seus direitos independentemente dos motivos) e igualitários (todos os seres humanos devem possuir os mesmos direitos fundamentais). Estabelece-se, então, que o ser humano como portador de dignidade difere de todas as outras coisas e criaturas, sendo autoconsciente e racional. Logo, todo ser humano é uma pessoa, e todas as pessoas têm direito à proteção jurídica que garanta a elas respeito por sua existência singular. Depreende-se, ainda, que toda doutrina parte do pressuposto que a qualidade humana do indivíduo, ou seja, seu pertencimento à espécie homo sapiens, está além da capacidade de manipulação de qualquer outro grupo de seres humanos. Em outras palavras, caso admita-se que determinado setor da sociedade seja capaz de estabelecer quais aqueles que se qualificam como seres humanos e quais não, toda essa estrutura jurídica seria tendenciosa. 17 2.2 O Início Da Vida No Direito Civil Sul-Americano e Suas Teorias A temática referente às teorias sobre o início da vida é pauta de diversas discussões e controvérsias, não há efetivo consenso na comunidade científica. Não há nem mesmo consenso em relação à quantidade de teorias explicativas e ao modo de nomeá-las. As teses sobre a temática são fundamentadas nos divergentes critérios biológicos, que têm como base diferentes fases do desenvolvimento humano. Nessa perspectiva, é possível destacar três teorias científicas apontadas pela literatura sobre o momento no qual a vida tem início: a teoria biológica ou concepcionista, a teoria da nidação e a teoria neurológica. A teoria biológica ou concepcionista defende que o começo da vida ocorre com a concepção, ou seja, com a fecundação do espermatozoide no óvulo, ressalvados apenas os direitos patrimoniais, decorrentes de herança, legado e doação, que ficam condicionados ao nascimento com vida. Esta teoria é adotada pela Igreja católica, e entende que desde a união do espermatozoide e do óvulo forma-se um ser dotado de individualidade, diferente dos genitores. A grande discussão sobre essa teoria decorre da possibilidade da divisão de célula formada de tal união em outras células, já que o zigoto pode se dividir antes de se fixar na parede do útero (SOARES, 2015). Segundo a teoria da nidação, a vida se inicia a partir da fixação do embrião na parede uterina, a partir desse momento inicia-se a formação da placenta e os demais anexos que alimentarão e protegerão o embrião, para que possa se desenvolver de forma saudável, propiciando assim o desenvolvimento e a possibilidade do nascimento. Tendo em vista que esta fase começa em torno do sexto dia – quando começam a ocorrer as primeiras trocas materno-fetais – e termina entre o sétimo e o décimo segundo dia após a fecundação, pela doutrina da nidação do ovo, enquanto este estágio evolutivo não for atingido, existe somente um amontoado de células, que constituem o alicerce do embrião. A vida se iniciaria alguns dias após a concepção, e não no exato momento dessa, como apregoa a teoria concepcionista (COSTA; GIOLO JUNIOR, 2015). Nos casos de fertilização in vitro, o embrião passaria a adquirir vida com sua implantação no útero da mulher, antes apenas havia um aglomerado de células que constituem posteriormente os alicerces do embrião. Somente com a implantação as 18 células podem ser consideradas capazes de gerar um indivíduo distinto (SOARES, 2014). De acordo com Moura (2010), o Supremo Tribunal Federal brasileiro, baseado nesta teoria, considerou que a utilização de embriões para fins de pesquisa com células tronco-embrionárias não viola o direito à vida. Esse foi o argumento utilizado pela maioria dos Ministros. E segundo a visão da Ministra Ellen Gracie, não há desrespeito com a vida humana, o pré-embrião que encontra excedente não é considerado como nascituro porque nascituro significa a possibilidade de vir a nascer, que não é o caso de embriões inviáveis ou que estão destinados ao descarte (MOURA, 2010). Muitos ginecologistas argumentam que o embrião fecundado em laboratório morre se não for implantado no útero de uma mulher, não possuindo, portanto, relevância jurídica. Para os defensores dessa teoria, como o início da vida ocorre com a implantação e nidação do ovo no útero materno, não há nenhuma vida humana em um embrião fertilizado em laboratório e, portanto, não precisa de proteção como pessoa humana (SOUZA, 2008). A teoria neurológica, por sua vez, defende que somente após a formação do sistema cerebral do embrião, é possível afirmar a existência de vida. Para os defensores dessa teoria a vida se inicia com o cérebro, porém o que ocorre é que há uma divergência entre seus defensores sobre em qual momento da formação do cérebro se dá o marco inicial da vida. Alguns teóricos defendem que a vida humana se dá apenas com o início das atividades cerebrais, que ocorreria por volta do quarto mês de gestação. Para outros, a simples formação rudimentar do cérebro, que se dá no 14º dia após a concepção, já seria o marco inicial da vida humana. É importante que os ordenamentos jurídicos adotem um posicionamento para proporcionar maior segurança jurídica, pois em determinados casos, apesar da solução prática para o caso ser a mesma em uma ou outra teoria, a solução jurídica poderá ser diferente. Enquanto no cotidiano o vocábulo pessoas é utilizado como sinônimo de ser humano, para o Direito adquire significação própria, de modo que ser pessoa constitui a possibilidade de ser sujeito de direito, ou seja, titular de um direito, integrando um dos polos da relação jurídica. No cenário jurídico, para ser pessoa não é necessário ter direitos, mas sim poder vir a tê-los. A ideia de pessoa está intimamente ligada à de personalidade. 19 Segundo Pereira (2014, p. 181), “personalidade é aptidão genérica para adquirir direitos e contrair deveres. Essa aptidão é reconhecida a todo ser humano o que exprime uma conquista da civilização jurídica”. Nas palavras do autor: A personalidade, como atributo da pessoa humana, está a ela indissoluvelmente ligada. Sua duração é a da vida. Desde que vive e enquanto vive o ser humano é dotado de personalidade. O problema de seu início fala de perto a indagação de quando tem começo a existência da pessoa humana, confundindo se numa só a resposta ambas as perguntas. (PEREIRA, 2014, p. 183) Estas duas noções se confundem de tal modo que os ordenamentos jurídicos utilizam expressões diversas ao abordar o assunto: início da existência, início da vida, início da personalidade. Ao se assentar o começo da personalidade, somente a partir de então existe uma pessoa em que se integram direitos e obrigações. Também no Direito, apesar da diversidade de teorias existentes, o debate primordial sobre o assunto se dá entre a teoria concepcionista abordada anteriormente e as ainda não referidas teorias natalista e da personalidade condicional. Como já mencionado, os concepcionistas defendem a tese de que a personalidade começa a partir da concepção. Já os natalistas entendem que a personalidade tem início com o nascimento com vida. Para a teoria natalista, não há a necessidade de viabilidade ou da forma humana, bastando o nascimento com vida para segurar a condição de pessoa. Ao contrário da visão neurológica, a visão natalista ou ecológica afirma que a vida tem início com o nascimento, ou seja, para essa teoria a capacidade de sobreviver fora do útero é que faz do feto um ser independente e que determina o início da vida. Médicos consideram que um bebê prematuro só se mantém vivo se tiver pulmões prontos, entre a 20ª e a 24ª semana de gestação. Esse foi o critério adotado pela Suprema Corte dos Estados Unidos na decisão que autorizou o direito do aborto (ANDRADE, 2013). A teoria natalista defende que, caso o nascituro, durante toda a fase intrauterina, tivesse personalidade, não haveria necessidade de o Código distinguir os direitos, ou melhor, a expectativa de direitos que se consolidam com o nascimento com vida (SOARES, 2015). O nascituro não tem personalidade jurídica nem capacidade de direitos, sendo protegidos pela lei apenas os direitos que terá possivelmente ao nascer com vida, os quais são taxativamente enumerados pelo Código Civil (SOUZA, 2013, p. 123). 20 A teoria da personalidade condicional consiste na afirmação da personalidade desde a concepção, sobre a condição de nascer com vida. Desta forma aquisição de direitos pelo nascituro operaria sobre a forma de condição resolutiva, portanto, na hipótese de não se verificar nascimento com vida, não haveria personalidade (RODRIGUES, 2007). Para Tartuce (2016), a teoria da personalidade condicional é essencialmente natalista, pois também parte da premissa de que a personalidade tem início com o nascimento com vida. Por isso, em uma realidade que prega a personalização do direito civil, uma tese essencialmente patrimonialista não pode prevalecer. Ainda segundo Tartuce (2016), o problema dessa corrente doutrinária é que ela é apegada às questões patrimoniais, não respondendo ao apelo de direitos pessoais ou da personalidade a favor do nascituro. Essa linha de entendimento acaba reconhecendo que o nascituro não tem direito de efetivos, mas apenas mera expectativa de direitos. 2.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES A América do Sul é formada por 12 países. Os países que integram essa porção continental são: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela. O primeiro passo para atingir o objetivo proposto foi identificar se todos os países possuem normas sobre quando se determina o início da vida em seus respectivos ordenamentos jurídicos. A busca pela legislação foi realizada nas páginas oficiais dos poderes públicos dos referidos países. Da investigação realizada, somente não foi possível identificar a legislação da Guiana e do Suriname. No caso do Suriname houve uma dificuldade ainda maior tendo em consideração que a língua oficial do país é o neerlandês (holandês). Posteriormente, para comparar, ou seja, identificar diferenças e semelhanças em relação à legislação analisada, os dados encontrados foram organizados em quadros. Da busca realizada, foram identificados os instrumentos legais e os preceitos normativos que regulam o momento em que se considera estabelecida a vida. O quadro a seguir mostra os dados encontrados: 21 Quadro 1 – Instrumentos legais que regulam o início da vida na América do Sul País Espécie legislativa Preceito normativo Argentina Código Civil y Comercial de la Nación Ley 26.994, de 1º de outubro de 2014 Art. 19 Bolívia Código Civil Decreto Ley nº 12760, de 6 de agosto de 1975 Art. 1º Brasil Código Civil Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Art. 2º Chile Código Civil de la Republica de Chile Art. 74 Colômbia Código Civil de la Nación Ley 57 de 1887 Art. 90 Equador Código Civil de la Republica del Ecuador Art. 60 Paraguai Código Civil Ley nº 1183/85 Art. 32 Peru Código Civil Decreto Legislativo nº 295, de 20 de julho de 1984 Art. 1º Uruguai Código Civil De La República Oriental Del Uruguay, Ley no 16.603 de 21 de novembro de 1994 Art. 21 Venezuela Código Civil, Gaceta Oficial no 2.990 del 26 de Julio de 1982 Art. 17 Fonte: Elaborado pelo autor (2023). É interessante notar que todas as disposições encontradas estão inseridas no Código Civil do seu respectivo país. Na contemporaneidade existe a discussão sobre uma possível crise da codificação em que a literatura apresenta as vantagens e desvantagens de se organizar grande parte do direito em Códigos, principalmente no direito privado (TARTUCE, 2016; PEREIRA, 2014). 22 Para Venosa (2014), a tendência atual dos Códigos é sistematizar as matérias mais gerais e dotadas de maior estabilidade, deixando para a legislação avulsa ou para os microssistemas ou estatutos as matérias que estão sujeitas a alterações mais rápidas ou mais intensas. O Código Civil brasileiro de 2002, por exemplo, deixou para a legislação autônoma, um microssistema, toda a problemática da fertilização assistida e os problemas correlatos que envolvem um universo de situações, como identificação de paternidade, direitos hereditários, possibilidade de úteros de aluguel, etc. Pode-se perceber também que todos os instrumentos legais encontrados e analisados à disposição sobre o início da vida encontram-se em uma parte introdutória, preliminar dos Códigos. Mesmo nos Códigos do Chile ou da Colômbia, que, pela numeração do artigo parecem estar em uma parte mais avançada, a disposição sobre o início da vida está inserida em uma parte que no Brasil intitulamos de parte geral. Segundo Diniz (2012), a parte geral de um Código Civil é de grande utilidade por conter normas aplicáveis a qualquer relação jurídica. Segundo ela, o direito civil contido na parte geral estabelece os parâmetros de todo ordenamento jurídico e engloba princípios ético-jurídicos de aplicação generalizada e não restritiva as questões cíveis. É consultando o direito civil que o jurista alienígena percebe qual a estrutura fundamental do ordenamento jurídico de um dado país e que o jurista nacional encontra as normas que têm repercussão em outros ramos do direito. Decorre daí, portanto, a importância de estudos de Direito comparado sobre institutos jurídicos que compreendem esta parte estrutural do Direito civil. O quadro a seguir apresenta o teor das normas jurídicas encontradas. 23 Quadro 2 – Dispositivos jurídicos que regulam o início da vida País Dispositivo Argentina Art. 19 - Comienzo de la existencia. La existencia de la persona humana comienza con la concepción. Bolívia Capítulo 1; Artigo I. El nacimiento señala el comienzo de la personalidad. Brasil Art. 2º - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Chile Art. 74 - La existencia legal de toda persona principia al nacer, esto es, al separarse completamente de su madre. La criatura que muere en el vientre materno, o que perece antes de estar completamente separada de su madre, o que no haya sobrevivido a la separación un momento siquiera, se reputará no haber existido jamás. Colômbia Artículo 90. La existencia legal de toda persona principia al nacer, esto es, al separarse completamente de su madre. Equador Art. 60. - El nacimiento de una persona fija el principio de su existencia legal, desde que es separada completamente de su madre. Paraguai Art.28. - La persona física tiene capacidad de derecho desde su concepción para adquirir bienes por donación, herencia o legado. La irrevocabilidad de la adquisición está subordinada a la condición de que nazca con vida, aunque fuere por instantes después de estar separada del seno materno. Peru Art.1. - Sujeto de Derecho La persona humana es sujeto de derecho desde su nacimiento. La vida humana comienza con la concepción. El concebido es sujeto de derecho para todo cuanto le favorece. La atribución de derechos patrimoniales está condicionada a que nazca vivo. Uruguai Art.21. Son personas todos los individuos de la especie humana. Venezuela Art.17. - El feto se tendrá como nacido cuando se trate de su bien; y para que sea reputado como persona, basta que haya nacido vivo. Fonte: Elaborado pelo autor (2023). 24 Da análise dos preceitos encontrados, pode-se perceber que, de um total de dez, seis estabelecem o nascimento como o marco inicial da vida. Essas regras estão inseridas no ordenamento jurídico do Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Venezuela. Vale ressaltar que, ainda que estabeleça o nascimento como marco inicial da vida, a legislação brasileira faz questão de assegurar proteção ao nascituro desde sua concepção. Pode-se, portanto, afirmar que assim como o Brasil, esses cinco países também adotam a teoria natalista para elucidar esta questão que, como já mencionado, é das mais controvertidas enfrentadas pelos juristas. Essa corrente é considerada a majoritária no Brasil, já que segundo o Código Civil, a personalidade jurídica se inicia com o nascimento com vida. Essa teoria foi recepcionada pelo Código Civil vigente, em seu artigo segundo, bem como pelo STF em vários julgados (SOARES, 2015). Posicionamentos diversos ou normas com uma redação mais imprecisa são encontrados nos ordenamentos jurídicos da Argentina, Paraguai, Peru e Uruguai. A Argentina adota um posicionamento diverso do Brasil. O Código Civil e Comercial da Nação, aprovado pela Lei no 26.994 (ARGENTINA, 2014), dispõe, no artigo 19, que a existência da pessoa humana começa com a concepção. Este artigo foi objeto de grande debate e a redação final deixou a proteção do embrião não implantado para a regulamentação de uma lei especial. O projeto do Código Civil Argentino sofreu uma alteração antes de sua votação final em que foi suprimida a segunda parte do referido artigo 19, no qual se dizia que no caso das técnicas de reprodução humana assistida, começa com a implantação do embrião na mulher (LELL, 2017). Também a existência das pessoas no Paraguai começa desde o momento de sua concepção. Para Benítez (2012), o art. 28 do Código Civil prevê que a existência da pessoa física começa a partir de sua concepção no útero, conferindo-lhe capacidade jurídica a partir desse momento; condicionando a aquisição de bens – por doação, herança ou legado – ao nascido vivo, mesmo por momentos após ter sido separado do ventre da mãe. Talciani (2005) aponta três artigos do Código Civil do Chile que exemplificam os conceitos de existência jurídica e de existência natural dos seres humanos no ordenamento jurídico: Art. 74. A existência jurídica de toda pessoa começa com o nascimento, isto é, com a separação total da mãe. 25 A criatura que morre no ventre da mãe, ou que perece antes de ser completamente separada de sua mãe, ou que não sobreviveu à separação nem por um momento, será considerada como nunca tendo existido. Art. 75. A lei protege a vida do nascituro. O juiz, consequentemente, tomará, a requerimento de qualquer pessoa ou de ofício, todas as providências que lhe parecerem convenientes para proteger a existência do nascituro, sempre que entender que esta de alguma forma está em perigo. Qualquer punição da mãe, pela qual a vida ou a saúde da criança em seu ventre possa ser ameaçada, deve ser adiada para depois do nascimento. Art. 77. Os direitos que seriam conferidos à criança que está no ventre, se tivesse nascido e estivesse vivo, ficarão suspensos até que ocorra o nascimento. E se o nascimento constituir um princípio de existência, o recém- nascido entrará no gozo de tais direitos, como se existisse no momento em que foram deferidos. No caso do artigo 74, parágrafo 2º, esses direitos passarão para outras pessoas, como se a criatura nunca tivesse existido. (CHILE, 2000, não paginado). Talciani (2005) afirma que há uma separação entre essas duas noções - existência jurídica e existência natural. Assim sendo, a existência jurídica - como descrita no artigo 74 - tem início no nascimento, enquanto a existência natural tem sua origem na concepção, isto é, na fecundação do óvulo pelo espermatozoide. Dessa forma, o nascituro não pode ser considerado juridicamente ser humano antes do nascimento, tendo este que contemplar as condições previstas no artigo 74: “separação completa da mãe e sobrevivência da criança mesmo por um momento após o parto” (TALCIANI, 2005, não paginado). O conceito de pessoa que o Código Civil Peruano, assim como no modelo chileno, utiliza uma separação entre a existência jurídica da pessoa e a existência natural: a primeira começará com o nascimento, e a segunda com a concepção (LA FUENTE-HONTAÑÓN, 2011). O Código Civil Peruano de 1984 reconhece a condição de sujeito de direito do nascituro e outorga certos direitos em que pode exercê-los mediante representação desde o início de sua existência. Para Heredia (2008), para entender o que indica a legislação do Peru e do Chile, deve-se ter clareza sobre os termos fecundação e concepção; para não nos confundir e criar falsas expectativas: a fertilização nada mais é do que a união do esperma com o óvulo; o mesmo que não implica a geração de um embrião. O Código Civil Peruano é claro quando precisa: a vida humana começa na concepção; ou seja, com a união do óvulo com o esperma, da mesma forma, a formação do embrião, seguida da implantação e seu aninhamento no útero materno (este gerado nas primeiras duas semanas de gestação). Argumenta-se, portanto, que a vida humana é gerada gradualmente e não instantaneamente. 26 Para Quispe, Sanjinez e Sanchez (2017), o artigo I do Código Civil peruano se refere apenas aos direitos econômicos. Porém, para estabelecer que a pessoa concebida é considerada sujeito de direito por tudo que a favorece, este último é o titular, por excelência, dos direitos extrapatrimoniais, como o direito à vida, integridade etc. Esses direitos, por sua natureza, não podem estar sujeitos a quaisquer condições; teria sido adequado se isso tivesse sido contemplado neste corpo de leis. Há uma controvérsia quanto à possibilidade de listar quais direitos podem ser objetos de titularidade do nascituro, ou se basta estabelecer uma cláusula geral desta. Ainda segundo os autores, estabelecer uma cláusula geral é a mais adequada, uma vez que toda enumeração é insuficiente. A fórmula genérica "sujeito de direito por tudo o que o favorece" permite atribuir qualquer direito – patrimonial ou extrapatrimonial – a favor do não nascido (QUISPE; SANJINEZ; SANCHEZ, 2017). Por fim, o artigo 21 do Código Civil Uruguaio, estabelece de modo geral, que todos os indivíduos da espécie humana são pessoas e em consequência, titulares de direitos e obrigações. Para Souza (2008) a disposição do Código Civil Uruguaio confirma que se é pessoa desde o momento da concepção. A amplitude da disposição não distingue entre concebido, nascido ou qualquer outra qualidade que poderia restringir o leque de possibilidades dentro dos indivíduos humanos que são considerados pessoas naturais pelo direito uruguaio. Com base nisso, argumenta-se que sempre que houver um indivíduo da espécie humana (concebido ou nascido, viável ou não) estamos diante de um sujeito de direitos em sentido estrito. Souza (2008) defende que se observa as regras do art. 18 do Código Civil Uruguaio segundo o qual as palavras da lei devem ser entendidas em seu sentido natural e óbvio, de acordo com o uso geral das mesmas palavras, a expressão “indivíduos da espécie humana” refere-se diretamente à ideia de todo ser humano, sem qualquer discriminação. 27 3. A MORTE E A DIGNIDADE HUMANA A finalidade desta seção é abordar a temática da morte em contextos variados ao longo da história, desde suas interpretações feitas pelos povos antigos, através de rituais, celebrações e monumentos, até os tempos modernos em que o debate - principalmente no âmbito do Direito - se inclina sobre o conceito de dignidade, mais especificamente ligado à morte digna, isto é, a dignidade do indivíduo perante o final de sua existência. Além da morte, portanto, o conceito de dignidade, assim como seu entendimento dentro da sociedade, também será abordado neste segmento. Busca- se aqui elucidar, não exaustivamente, definições fundamentais para a análise dos ordenamentos jurídicos que regulam o início e o fim da existência humana, bem como o modo o qual se realizam. Alguns métodos de abreviação e prolongamento da vida serão descritos aqui, pois são parte da conjuntura de entendimento e estruturação da sociedade e do modo como esta lida com as várias situações envolvendo não somente o fim da vida humana, mas este fim de maneira digna. Ao longo da história, numerosas civilizações desenvolveram métodos e rituais para lidar com a morte, cada uma com suas próprias características e cerimônias. Uma constante encontrada por Giacoia Júnior (2005) nessas interpretações foi que “a morte não se refere apenas ao envelhecimento contínuo, à transitoriedade, ao declínio inexorável de todas as forças vivas. Ela evoca também um outro mundo, aterrador” (GIACOIA JUNIOR, 2005, p. 14). Essa alegoria do abismo, espaço indefinido no qual a vida se esvai perante a escuridão, representa, nas palavras de Júnior, a “experiência social e histórica da morte” (GIACOIA JUNIOR, 2005, p. 14). Na cultura hindu, por exemplo, a morte é considerada a passagem para a imortalidade, que possui duas perspectivas: a migração da alma e a libertação da existência material. Segundo o Bhagavad Gita - texto religioso hindu - o corpo material surge, se desenvolve, se degenera e morre, no entanto, a alma humana é imutável, permanecendo e se modificando para continuar sua existência. Na segunda perspectiva, a alma conclui sua existência e atinge o absoluto como horizonte final na existência dos homens. Em grande parte das civilizações antigas, independentemente dos significados atribuídos à noção da morte em cada uma delas, o fim da vida aparece como fronteira intransponível, inalcançável para aqueles que ainda estão vivos (GIACOIA JÚNIOR, 2005). 28 A partir destes pensamentos, a morte pode ser enxergada como portadora de determinado sentido celebrado pela sociedade dos vivos, elucidado pelo antropólogo e filósofo francês Jean-Pierre Vernant no trecho: Em sua função de memória coletiva, a epopeia não é feita para os mortos; quando ela fala deles, ou da morte, é sempre aos vivos que ela se dirige. Da morte, nela mesma, dos mortos entre os mortos, não há nada a dizer. Eles estão do outro lado de um limiar que ninguém pode transpor sem desaparecer, que nenhuma palavra pode alcançar sem perder todo sentido: mundo da noite onde reina o inaudível, ao mesmo tempo silêncio e alarido (VERNANT, 1982, p. 86). Jean-Pierre Vernant (1982) demonstra que a morte e as diferentes cerimônias fúnebres, bem como as edificações, inscrições e homenagens - levando em consideração os diferentes contextos e ideais em que estão inseridas as civilizações e suas representações - caracterizam-se nas civilizações como ritos de passagem. Através destes processos, o morto é transportado para o outro lado, para a margem final da existência, assinalando entre os vivos o vazio de sua ausência. Essas simbologias presentes nos rituais fúnebres viabilizam a compreensão de como as diferentes sociedades ao longo da história assimilam a morte, ressaltando sua importância cultural e fixando-a nas engrenagens que mantém o bom funcionamento da ordem social. Giacoia Junior (2005) afirma, portanto, ser fundamental a observação da maneira como a sociedade se porta diante do fenômeno da morte, visto que esse comportamento desempenha um papel crucial na estruturação de sua identidade coletiva, constituindo-se “um dos elementos mais relevantes para a formação de uma tradição cultural comum” (GIACOIA JUNIOR, 2005, p. 15). O fim da vida em si e todo o debate em torno deste são, historicamente, fonte de inspiração para os mais diversos preceitos religiosos e filosóficos, assim como também a causa de angústias e pavores para os seres humanos. Lidar com a morte evoca no ser humano uma noção de finitude que inexiste em outros seres vivos. O filósofo Arthur Schopenhauer apresenta uma breve comparação entre as noções humanas e animais no trecho: [...] os animais não sentem propriamente sequer a morte: eles só poderiam conhecê-la quando ela se apresenta; mas então, eles já deixaram de ser. Desse modo, a vida dos animais é um prolongado presente. Sem reflexão, eles vivem nele e nele sempre sucumbem inteiramente (SCHOPENHAUER, 1986a, p. 83). 29 Schopenhauer (1986a) define, a partir disso, a morte como “musa inspiradora” da filosofia. Ele afirma que, ao considerar o ser humano como parte inerente da natureza, este seria o único considerado um “animal metafísico” - definido dessa forma pois a condição de sua existência proporciona um fenômeno atípico, o de ser o único que conhece por antecipação o fenômeno da morte. O animal só conhece a morte na morte: o homem, com sua consciência, a cada hora se aproxima mais de sua morte, e isso torna a vida por vezes árdua até para aquele que ainda não reconheceu no todo da vida mesma esse caráter de permanente destruição. Principalmente por causa disso o homem tem filosofias e religiões. (SCHOPENHAUER, 1986b, p. 75) Assim sendo, o homem angustia-se para além do período presente, sofrendo tanto pelo passado quanto pela inevitabilidade do futuro (SCHOPENHAUER, 1986b). Apesar do filósofo ter vivido entre os séculos XVIII e XIX, essa perspectiva de sofrimento em antecipação descrita pelo autor ainda se faz presente nos dias de hoje. Em contrapartida, o homem moderno, segundo Sigmund Freud (2006), enxerga a morte como tabu. Esse termo possui origem na cultura polinésia e alguns de seus significados são misterioso, proibido e perigoso. Desse modo, o conceito define algo relativo ao desconhecido, que não deve ser discutido. O ser humano diante do fim desconhecido da existência busca negar a inevitabilidade do destino. No trecho de Edgard Morin isso fica evidente: As ciências do homem não se ocupam da morte. Dão-se por satisfeitas em reconhecer o homem como um animal do fazer (homo faber), do cérebro (homo sapiens) e da linguagem (homo loquax). Não obstante, a espécie humana é a única para a qual a morte está presente durante toda sua vida, a única que associa à morte um ritual funerário, a única que crê na reencarnação ou na ressurreição dos mortos.[...] Mas, na verdade, as pessoas agem como se a morte fosse algo alheio. Mesmo cientes da mortalidade e, muitas vezes, tomando medidas para o momento da morte, no fundo, não acreditam que isso lhes ocorrerá (MORIN, 1974, p.9). Morin observa que o homem moderno deseja negar a morte. Segundo ele, os seres humanos insistem em atribuir um caráter ocasional à morte, relacionando-a às mais diversas situações da vida; doenças, acidentes, idade avançada, privando o fenômeno de morrer de seu caráter inevitável. Para Canastra (2007), se nas civilizações antigas a morte era um fenômeno relevante na cultura e nas tradições de diversas sociedades, nos tempos atuais ela tem aparecido cada vez mais de uma 30 forma periférica na civilização moderna, deixada de lado dos hábitos e dos pensamentos dos seres humanos. Nesse sentido, os autores tratam da dificuldade do homo sapiens em colocar-se diante de sua finitude, isto é, de encarar a perda de sua individualidade (VARALLI, 2017). Dentro desse raciocínio, após uma explicação breve e contextualizadora da noção de morte que a humanidade vem refinando ao longo dos milênios, realizar-se- á a contextualização de mais uma noção fundamental para este trabalho, o entendimento da sociedade sobre o conceito de dignidade humana. O termo “dignidade”, no vocabulário comum, aparece como uma particularidade ou condição do ser humano. Para Vial Correa e Rodriguez Guerro (2009) apenas as pessoas possuem “dignidade”. Neste raciocínio, obras de arte e/ou concepções, ainda que feitas por humanos, não têm “dignidade”. Percebe-se, portanto, que o termo, mesmo quando aparece em expressões como: “uma obra digna de…”, ainda se configura uma extensão da condição humana de ser digno, remetendo aos humanos que deram origem ao trabalho. Segundo Vial Correa e Rodriguez Guerro (2009), a atual noção de dignidade sofreu diversas mudanças desde seu surgimento na sociedade romana e posterior incorporação à cultura cristã - ela passa de uma conquista individual para uma condição inerente ao ser humano. A sociedade romana pré-imperial caracterizava os méritos de um ser humano, tanto na esfera política quanto na vida pessoal. Em outras palavras, havia condições para se tornar um cidadão digno e entre elas estavam a ação política, como fazer parte do Senado, o pertencimento à nobreza romana, com ancestrais importantes, reis ou heróis de batalha. O romano adquiria sua dignidade, a estabelecia e exibia para a sociedade. Dessa forma, o conceito não possuía solidez, ou seja, poderia ser aumentado, diminuído, perdido ou restaurado. A dignidade era “uma conquista pessoal que, por um lado, dava direito ao poder e, por outro, pelo impulso interior de ser moralmente irrepreensível, exigia um dever.” (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009, p. 56). Em seu surgimento, a dignidade era elitista e definitivamente nem todos os cidadãos possuíam as condições de vida necessárias para sustentar esse modo de viver dignamente. Vale lembrar que, como mencionado no capítulo sobre a vida, a sociedade romana era escravocrata e, portanto, essa dignidade tão associada à 31 política e ascendências nobres era incompatível com a condição de escravo (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009) Após a incorporação do termo pela cultura cristã do Ocidente, a dignidade tem sua matriz fundamentada na qualidade humana de ser feito à imagem de Deus. É definida, igualmente à todos os seres humanos, perante sua conexão direta com a divindade, independentemente de suas origens, do sexo, da idade, crença ou status social. Nessas características, o homem é digno, ainda que dentro de um contexto religioso específico, de direitos intransferíveis e sujeito à princípios de proteção e respeito (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO,2009). Para Vial Correa e Rodriguez Guerro (2009), as qualidades dos homens e das coisas são encontradas em diferentes graus, menores ou maiores. Por exemplo, magnitudes: existem corpos maiores ou menores, mais leves ou mais pesados, mais rápidos ou mais lentos. Mas também nos parece que cores, cheiros ou sabores podem ser mais ou menos intensos. De alguma forma, toda natureza sensível é passível de medida, suas propriedades são quantificáveis. Em outra ordem de coisas, que não são propriamente mensuráveis, reconhecemos também uma espécie de grandeza: parece-nos que o talento matemático, musical, literário, entre outros, pode ser maior ou menor, mesmo quando sua estimativa é muito pouco semelhante a uma medição simples. No campo das coisas morais reconhecemos também a gradação: há pessoas mais ou menos valiosas ou verdadeiras. Mesmo diante de um conjunto complexo de qualidades morais, podemos dizer que há pessoas que nos parecem mais respeitáveis do que outras. À primeira vista, então, tudo parece passível de gradação, qualquer condição que conhecemos pode ser mostrada ou possuída em diferentes graus (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009, p. 56, tradução nossa) Porém, quando se trata da dignidade humana, não existe um elemento passível de comparação, não existe ser humano mais ou menos digno. O conceito supracitado de Immanuel Kant de que o homem é próprio - um fim em si mesmo - e não pode ser utilizado de acordo com interesses de outros homens exemplifica bem esse raciocínio. No quadro social moderno, é repulsiva a aquisição de outro ser humano como escravo, por exemplo (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009). O ser humano enquanto organismo está sujeito às leis da natureza, nascimento, desenvolvimento e morte. Logo, desde o início de sua existência, este deve ser acolhido e amparado. A transformação desse conceito ao longo do tempo, principalmente no Ocidente, leva a pensar que a dignidade humana não deve ser resultado de conquistas pessoais - sem mencionar quando estas “conquistas” são garantidas apenas pela hereditariedade - pois para a grande maioria dos indivíduos 32 ela seria inalcançável (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009). De acordo com o autor, a verdadeira dignidade aparece no auxílio dado ao indivíduo na reta final de sua existência. Quando quase desaparecem os traços das qualidades que deram protagonismo ao indivíduo, é onde mais brilha a dignidade pura. Onde ela se torna inteiramente passiva é onde brilha o valor do acolhimento como condição fundamental para o tratamento das pessoas. Onde o homem se torna impotente para reivindicar o seu direito, resplandece a força da nossa responsabilidade para com ele. Acolhimento e responsabilidade são dois pilares da sociedade humana. A morte de todo ser humano nos traz uma lição dessas virtudes (VIAL CORREA; RODRIGUEZ GUERRO, 2009, p. 57, tradução nossa) A vulnerabilidade criada pela invalidez - seja pela idade avançada ou decorrente de determinada circunstância - é a deixa para o ser humano fazer valer a sua essência. A partir da menção de Vial Correa e Rodriguez Guerro (2009) que a morte do indivíduo oferece ensinamentos sobre tais virtudes, pode-se refletir sobre os métodos de abreviação e prolongamento da vida humana. 3.1. Métodos de abreviação e prolongamento da vida De acordo com Melo (2021), se a morte é um aspecto inevitável da vida e as pessoas possuem sua dignidade atrelada à própria existência, evidencia-se a necessidade de legislar sobre o fim da existência de maneira digna. Nas palavras de Cristian Fetter Mold: “O direito a uma vida humana digna não pode ser truncado com uma morte indigna. O ordenamento jurídico está por conseguinte chamado também a concretizar e proteger este ideal da morte digna.” (MOLD, 2010, p. 65). Nesse sentido, o presente tópico deste trabalho analisará, de forma breve e expositiva, alguns dos métodos empregados atualmente no que tange à abreviação e ao prolongamento da vida. A conceituação destes métodos no trabalho se dá pela intenção de oferecer maior abrangência de perspectivas na análise dos regulamentos pretendida por este estudo. No ordenamento jurídico brasileiro, especificamente no Código Penal, é proibida a prática da eutanásia. Sendo assim, o médico que abrevia a vida de determinado paciente - independentemente da razão para tal - comete um crime. Esses fatos ligam-se aos direitos de proteção à vida e à dignidade discutidos nos tópicos anteriores e regulamentados na Constituição Federal Brasileira. 33 De início, é importante ressaltar que não se deve confundir a morte digna com nenhum método eutanásico. Como Melo explicita no trecho A “morte digna” possibilita a aceitação ou a recusa de tratamentos médicos e/ou o ajuste ou a limitação de esforços terapêuticos (LET) como boa prática médica, por exemplo, em caso de intensidade desmedida do suporte vital em um paciente com enfermidade irreversível, evitando assim a obstinação ou a insistência terapêutica [...] (MELO, 2021, não paginado). Quanto à eutanásia, esta define-se pelo ato de cessar a vida de um ser humano. Existem diferentes situações nas quais a eutanásia já apareceu, sendo alguns exemplos a vontade do próprio enfermo, casos em que o paciente representa algum tipo de risco para a sociedade - caracterizando uma eutanásia eugênica - ou ainda porque o tratamento do indivíduo exige despesas elevadas (DEEKE, 2016). Segundo Deeke (2016) diferentes culturas e religiões não aceitam tal tipo de método, pois este coloca-se diretamente contra a vontade divina de começo e fim da vida, proibindo qualquer tipo de intervenção. Os diferentes posicionamentos em relação ao tema explicitam a complexidade da temática. Entre os argumentos daqueles que defendem esse tipo de prática está a liberdade de escolha do paciente, podendo “optar entre viver ou morrer com dignidade em um momento em que existe a consciência de que o estado da sua enfermidade é tão grave, que não compensa viver em sofrimento até que a morte chegue naturalmente” (DEEKE, 2016, não paginado). Aos contrários ao método, frequentemente surge o argumento religioso de que somente a Deus é permitido dar ou cessar a vida. Essa prática pode ocorrer de duas maneiras: ativa ou passiva. A eutanásia ativa ocorre a partir da cessação da vida do paciente por parte do responsável pelo processo, acontece, em geral, por meio de injeções letais, doses de remédio calculadas, entre outras (DEEKE, 2016). Na eutanásia passiva o processo de tratamento do paciente é suspenso. Para Pessini (2004), esse método, quando aplicado de forma passiva, não consiste em interromper deliberadamente a vida, mas aceitar a morte como horizonte final da doença. Países como Suíça, Bélgica e Holanda permitem a prática. Na América do Sul, foco deste estudo, apenas a Colômbia realizou a descriminalização do método. Ainda que o Tribunal Constitucional colombiano tenha permitido tal atividade em 1997, somente em 2015 os procedimentos foram definidos pelo Ministério da Saúde do país (CASTRO, 2016). No Brasil, a prática - apesar de não regulamentada especificamente 34 nos aparatos jurídicos - não é permitida pelo Código Penal. Dessa maneira, o indivíduo que a realiza, independentemente de sua motivação, comete homicídio perante o art. 121: “Homicídio simples. Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos.” (BRASIL, 1990) Em contrapartida, a distanásia mostra-se como o completo oposto da eutanásia, uma vez que sua realização consiste em prolongar demasiadamente a vida de um paciente através das tecnologias médicas disponíveis. Com o avanço constante da tecnologia, a sobrevivência do ser humano por intermédio de aparelhos se torna cada vez mais possível. No entanto, estes recursos tecnológicos implicam em custos elevados, além do fato do prolongamento da vida significar também a extensão do sofrimento ao paciente e aos familiares, uma vez que o quadro seja irreversível (DEEKE, 2016). No Brasil, não existe nada na legislação brasileira que configure a distanásia como crime. Porém, o Código de Ética Médica, revisado em 2010 pelo CFM (Conselho Federal de Medicina), expõe em seu princípio fundamental XXII, que: “Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados.” (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2009). Apesar disso, os números de ocorrência da distanásia no Brasil, por exemplo, aumentam significativamente na medida em que os médicos não praticantes - bem como aqueles que não indicam a prática - assumem a possibilidade de acusações de recusa de tratamento, dificultando cada vez mais o desenraizamento da prática no cotidiano (FERREIRA, 2017). Neste ponto mostra-se válido ressaltar que tanto a temática quanto o contexto dos casos em que a prática é aplicada são de alta complexidade e que não é objetivo deste trabalho debater intensamente sobre essas noções. A prática apoiada pelo CFM em detrimento da distanásia é a ortotanásia. Nesta, diferentemente da eutanásia passiva na qual ocorre o abreviamento da vida de maneira proposital, a causa do morte se dá pela enfermidade do paciente. Dessa forma, segundo Varalli (2017), não ocorre a abreviação da vida do indivíduo nem margem para caracterização de delito. A prática consiste, portanto, em acompanhar o 35 processo natural da morte do paciente garantindo a este o menor sofrimento possível no processo, aliviando as dores e intensificando o tempo com a família. De acordo com Deeke (2016), o elemento subjetivo da ortotanásia é preservar a dignidade do indivíduo que sofre perante uma enfermidade irreversível. A este ser humano, que já não possui mais chance de recuperação, assume-se a opção de descontinuar tratamentos que prolonguem inutilmente o processo e, por conseguinte, o sofrimento. No direito brasileiro a ortotanásia não possui previsão legal, sendo considerada conduta atípica sob a perspectiva do Direito Penal. Ainda assim, o assunto ganhou campo de debate em território nacional com o advento da Lei nº 10.241/99, elaborada pelo deputado e médico Roberto Gouveia, do Partido dos Trabalhadores de São Paulo. A lei aborda os direitos daqueles que se utilizam dos serviços de Saúde do Estado de São Paulo, prevendo, no art. 2º: Artigo 2º - São direitos dos usuários dos serviços de saúde no Estado de São Paulo: I – Ter um atendimento digno, atencioso e respeitoso; [...] VII – Consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos e terapêuticos a serem nele realizados. [...] XXIII – Recusar tratamentos dolorosos à vida. XXIV – Optar pelo local da morte. (SÃO PAULO, 1999) Um dos casos mais conhecidos de ortotanásia no Brasil foi o de Mário Covas, governador do Estado de São Paulo na época e responsável por sancionar a Lei nº 10.241/99. O governador Covas, acometido por uma doença irreversível, faleceu dois anos após esse acontecimento, utilizando-se desta mesma lei optando por terminar sua vida em sua residência e cercado de seus familiares (DEEKE, 2016). Fora da esfera legislativa, tem-se o exemplo da conclusão adotada pela Igreja Católica na “Declaração sobre a Eutanásia”, de maio de 1980, que atesta: [...] na iminência de uma morte inevitável, apesar dos meios usados, é lícito em consciência tomar a decisão de renunciar a tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem, contudo, interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes. Por isso, o médico não tem motivos para se angustiar, como se não tivesse prestado assistência a uma pessoa em perigo (JOÃO PAULO II, 1980, não paginado) 36 No âmbito do direito comparado acerca da morte digna, uma modificação legislativa promovida pelo parlamento da Argentina assegurou à Lei nº 26.529/09 (Direitos do paciente em suas relações com profissionais e instituições de saúde) o reconhecimento ao direito do paciente em aceitar ou recusar determinados tratamentos médicos. A importância da modificação desta lei evidencia-se na busca por evitar métodos terapêuticos excessivos, de modo a priorizar a autonomia do paciente de acordo com suas vontades no que tange à própria qualidade de vida, além de favorecer os processos que aliviam a dor no prolongamento da vida. O paciente passa a ter o direito, portanto, de renunciar a tratamentos desnecessários (DEEKE, 2016). Essa lei dispõe que, em casos nos quais o paciente não possa exercer suas vontades por determinada razão, o poder de decisão pode ser reclamado por familiares diretos. Além disso, a lei versa especificamente sobre a proibição da eutanásia e do suicídio assistido, métodos não permitidos pela legislação argentina. Dessa forma, ficam isentos de responsabilidades civis, penais ou administrativas os profissionais que trabalharem conforme os termos explicitados. Com a aprovação desta lei, a Argentina junta-se ao Uruguai no status de país detentor de legislação que reconhece a autonomia de pacientes terminais em decidir pelo destino de sua própria vida, enquanto o Brasil se mantém sem regulamentos jurídicos acerca deste tema (LEI..., 2012). 3.2 Resultados e Discussões Em face do exposto, esta seção do trabalho buscará finalizar a proposta iniciada no capítulo 2, identificando se todos os países da América do Sul abarcam, em seus ordenamentos jurídicos, normas sobre quando se determina o fim da personalidade. Como já mencionado, Guiana e Suriname não fazem parte da pesquisa devido à dificuldade de acesso às legislações desses países. Portanto, a partir destes esclarecimentos, onde estão presentes os preceitos normativos que regulam o fim da existência? O quadro a seguir mostra os dados encontrados: 37 Quadro 3 – Instrumentos legais que regulam o fim da vida na América do Sul País Espécie legislativa Preceito normativo Argentina Código Civil y Comercial de la Nación Ley 26.994, de 1º de outubro de 2014 Art. 93 Bolívia Código Civil Decreto Ley no 12760, de 6 de agosto de 1975 Art. 2 Brasil Código Civil Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Art. 6 Chile Código Civil de la Republica de Chile Art. 78 Colômbia Código Civil de la Nación Ley 57 de 1887 Art. 94 Equador Código Civil de la Republica del Ecuador Art. 64 Paraguai Código Civil Ley no 1183 de 1985 Art. 35 Peru Código Civil Decreto Legislativo no 295, de 20 de julho de 1984 Art. 61 Uruguai Código Civil De La República Oriental Del Uruguay, Ley no 16.603 de 21 de novembro de 1994 Não possui Venezuela Código Civil, Gaceta Oficial no 2.990 del 26 de Julio de 1982 Não possui Fonte: Elaborado pelo autor (2023). Nota-se, a partir da observação do quadro, que as noções relativas ao fim da existência estão dispostas no Código Civil dos respectivos países, à exceção de Uruguai e Venezuela. De acordo com Eugênio Facchini Neto (2013), os processos de independência das colônias europeias na América Latina não significaram uma ruptura cultural entre as partes. Nesse contexto, a tendência jurídica para codificações da Europa reflete na América. Esse fator, aliado à vontade dos novos Estados de romper com o passado colonialista e à ausência de outros Códigos-modelo, uma vez que na metade do século XIX poucos Estados haviam codificado seu direito civil, serve de marco para o início das codificações sul-americanas. Não obstante, a realidade é que mesmo estes 38 poucos países - em grande parte - realizaram este processo se utilizando do modelo francês como exemplo. A própria Espanha possui seu modelo promulgado no ano de 1889, utilizando-se, mesmo na condição de país colonizador, do modelo francês como base para a elaboração. Segundo Facchini Neto (2013), a Bolívia, ainda sob controle francês na época, assim como outras nações que não estão no foco deste estudo, tiveram suas codificações integralmente copiadas do modelo francês, como demonstra Amalia Diurni, no trecho: As tentativas iniciais de codificação limitaram-se a ser uma tradução literal dos códigos napoleônicos: em 1825 o Haiti adotou todos os cinco códigos franceses, na própria língua original, e o mesmo fez a República Dominicana em 1844 (aqui os códigos permaneceram redigidos em francês durante quarenta anos) (DIURNI, 2008, p. 67). Um segundo grupo de países descrito por Facchini Neto (2013) remete àqueles que, apesar de apoiarem toda a base da codificação no modelo francês, também se preocuparam em dar originalidade ao modelo jurídico. Estes seriam os casos do Brasil, da Argentina e do Chile. O Código Civil Brasileiro tem sua origem remontada ao Código Civil Francês, conforme explicitado pelo Relator-Geral Josaphat Marinho no “Parecer preliminar sobre o Projeto de Código Civil”, mais especificamente no tópico referente à sistematização do Código, que diz: Essa sistematização toma corpo a partir do começo do século XIX, quando a legislação assume a “forma de códigos”, sendo o Código Civil francês – o Código Napoleão – o marco da transformação, que “suprimiu, de um só golpe, o direito então em vigor”, na observação incisiva de Georges Ripert (Les Forces Créatrices du Droit, Lib. Gén. de Droit et de Jurisp., Paris, 1955, p.p. 348-349). O Código Civil francês, de 1804, e os que lhe sobrevieram – o Alemão – BGB – de 1896, o Suíço, de 1881- 1907 – influíram no direito de outros povos, inclusive fora do continente europeu, afirmando a nova orientação política e técnica de legislar (BRASIL, 2008, p. 536). Além disso, como exemplo claro da “preocupação” com a originalidade do Código brasileiro, esboçado e consolidado por juristas como Augusto Teixeira de Freitas e Clóvis Beviláqua, tem-se que as regulações referentes ao início e fim da vida - buscadas por este estudo - se situam na denominada parte geral do Código, junto a tópicos referentes à pessoas jurídicas e disposições sobre bens materiais. Essa parte geral inexiste no Código francês e tem sua origem remontada ao Código alemão, além das influências citadas por Marinho que incluem o modelo suíço (FACCHINI NETO, 2013). 39 Quanto ao Código Civil argentino, nota-se no quadro que atualmente é combinado ao Código Comercial, possuindo o nome "Código Civil y Comercial de la Nación”. O professor argentino Gustavo Alberto Bossert (2004) comenta que a estrutura da legislação espanhola, em castelhano, foi herdada pelos países pertencentes à Espanha colonizadora. A partir disso, o movimento de codificação iniciado na França, que separava os códigos por matérias, refletiu na América espanhola, de modo que o Código Civil Argentino surge diretamente à luz do Código Civil Francês, e o Código Comercial à luz do Código de Comércio de Napoleão, entre outros. Para elucidar essa codificação com tons de originalidade, Bossert (2004) elucida que Vélez Sarsfield, autor tanto dos mencionados códigos civil e comercial da Argentina, possuía amplo conhecimento da doutrina francesa. Assim, na revisão do Código argentino realizada por Lisandro Segovia “metade dos 2.282 artigos do Código Civil Francês foi transferida, de alguma forma, ao Código Civil Argentino, e, desse número, 145 artigos do código argentino copiam textualmente o modelo francês” (BOSSERT, 2004, p. 126). O Código argentino, por sua vez, além de influenciar amplamente o modelo uruguaio, foi apropriado pelo Paraguai, que se utilizou do texto até 1985, quando se promulgou o Código Civil que figura no quadro logo acima. Mesmo com um novo modelo, as bases de estruturação do código paraguaio ainda remontam aos processos descritos até aqui, existindo ampla influência tanto do modelo francês quanto dos modelos sul-americanos, já consolidados ao final do século XX (BOSSERT, 2004). Quanto ao modelo chileno, este foi promulgado no ano de 1855, e sua elaboração deve-se ao jurista de origem venezuelana Andrés Bello. Conforme o trecho: Ao contrário do que ocorreu na França, ou mesmo no Brasil, o projeto do Código Civil chileno não foi submetido a qualquer tipo de discussão, nem recebeu qualquer sugestão da comunidade jurídica, nem mesmo dos tribunais. Mais do que em qualquer outro país, no Chile a codificação foi obra de um homem só (DELGADO, 2011, p. 114-115). Segundo Bossert (2004), o jurista abarcou em seus escritos, ao longo de vinte anos, referências ao Código Civil francês e à legislação castelhana e buscou converter em leis conceitos populares presentes há muito no Chile. De forma semelhante à 40 apropriação do Paraguai sobre o texto argentino, Equador e Colômbia - entre outras nações - utilizam-se do modelo chileno em seus próprios ordenamentos. Esse método de inspiração na legislação castelhana acontece também no Peru, que ao longo de sua história possuiu três códigos, promulgados nos anos de 1852, 1936 e, por fim, o código de 1984 - que figura no quadro apresentado. Dessa maneira, os códigos sul-americanos apresentam diversas semelhanças quanto às estruturas do texto e, principalmente, no modo como regulam suas matérias. Quadro 4 – Dispositivos jurídicos que regulam o fim da vida País Dispositivo Argentina Art. 93 - La existencia de la persona humana termina por su muerte. Bolívia Art. 2 - La muerte pone fin a la personalidad. Brasil Art. 6 - A existência da pessoa natural termina com a morte; presume- se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva. Chile Art. 78 - La persona termina en la muerte natural. Colômbia Art. 94 - La persona termina en la muerte natural. Equador Art. 64 - La persona termina con la muerte. Paraguai Art. 35 - El nacimiento y la muerte de las personas se probarán por los testimonios de las partidas y los certificados auténticos expedidos por el Registro del Estado Civil. Peru Art. 61 - La muerte pone fin a la persona. Uruguai Não há artigo específico para o fim da vida. Venezuela Não há artigo específico para o fim da vida. Fonte: Elaborado pelo autor (2023). De início, observa-se uma semelhança entre vários dos artigos reunidos no quadro. Dos 10 países analisados, 8 possuem o fim da personalidade regulado em algum de seus dispositivos jurídicos. Durante todo o processo de elaboração deste 41 trabalho, não foi possível encontrar informações acerca dos motivos para Uruguai e Venezuela não regularem o fim da existência em seus respectivos ordenamentos. Julga-se importante, também, mencionar que em ambos os códigos - Uruguai e Venezuela - a morte do indivíduo não é ignorada. Ela aparece recorrentemente em seções relacionadas ao desaparecimento; exemplo no art. 69 do Código Civil uruguaio: art. 69. “A partir do dia do comprovado falecimento do ausente, a herança será expedida aos herdeiros testamentários ou, na falta de testamento, aos que, à data do falecimento, eram herdeiros intestados” (URUGUAI, 1994, p. 7, tradução nossa); ao matrimônio, art. 186: “O casamento é dissolvido por falecimento de um dos cônjuges. [...]” (URUGUAI, 1994, p.18, tradução nossa); e à autoridade parental, art. 280 - “A autoridade parental termina com o falecimento de pais ou filhos. [...]” (URUGUAI, 1994, p. 32, tradução nossa). Da mesma forma, na Venezuela, a noção de morte é recorrente nestas seções de maneira muito semelhante e compreensível, uma vez que a morte - fenômeno natural da vida - não pode de maneira alguma ser ignorada. Portanto, da análise objetificada por este estudo tem-se que estes dois países não regulam o fim da personalidade nos respectivos ordenamentos, mas observa-se que incluem definições de procedimentos em caso de morte do indivíduo. Além disso, uma redação mais imprecisa das normas foi observada no artigo do dispositivo paraguaio. Em seu Código Civil, o Paraguai não dispõe de um capítulo dedicado ao fim da personalidade, na medida em que inclui o artigo apresentado na seção das disposições gerais “Das pessoas e direitos pessoais nas relações de família”, nome do Livro Um do dispositivo. No entanto, o artigo 35, ainda que diferentemente da grande maioria exposta no quadro, define que a morte é provada por testemunhos das partes e pelas certidões autênticas emitidas por órgão competente. Dessa maneira, nos parâmetros estabelecidos para este estudo, o Paraguai caracteriza-se como país que possui o fim da existência regulado em seu ordenamento, embora de maneira imprecisa. Nota-se, também, que o artigo 6 do código brasileiro compreende, ainda que de maneira breve, a sucessão definitiva - quando autorizada pela lei - em casos de ausência do indivíduo. Nos demais códigos civis, dos 7 países restantes no quadro, evidencia-se o fato de que os artigos se dispõem de maneira quase uniforme. Esse fato não causa estranheza diante da observação da origem semelhante dos modelos 42 jurídicos sul-americanos e do processo de codificação ocorrido em grande parte dos países deste continente. Portanto, observa-se que, para os países Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador e Peru, o fim da existência do ser humano é regulado em seus respectivos códigos civis. 43 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O marco inicial da vida humana não é um tema pacífico nem entre estudiosos de uma mesma área. Tanto é que juristas discordam uns dos outros e o mesmo ocorre com filósofos, cientistas de áreas da saúde e até mesmo religiosos. O fato de existirem pesquisas de diferentes áreas científicas, que estudam e descrevem cada fase do desenvolvimento biológico humano, evidencia que existem diferentes formas de enxergar o início da vida. Não foi objetivo da presente pesquisa apresentar todas as teorias existentes, muito menos apontar qual a mais correta. Também não foi objetivo deste trabalho realizar uma pesquisa exaustiva de cada ordenamento jurídico. Refletir sobre o início da vida em toda sua complexidade envolveria, de antemão, deixar de lado uma visão estritamente positivista e adotar outro tipo de abordagem. Além disso, uma abordagem adequada teria como pressuposto o fato de que o conceito jurídico de pessoa constitui o fundamento dos direitos humanos e que, dependendo da visão que se adota a esse respeito, são estabelecidas diferentes condições para os direitos fundamentais. O propósito do presente trabalho foi bem mais modesto. A pretensão da presente pesquisa foi identificar se, e como, o direito de diferentes países estabelece os marcos inicial e final da vida humana. Verificou-se que outros países da América do Sul adotam posicionamentos diversos ao adotado pelo Brasil. Ainda que pesem as controvérsias sobre a redação imprecisa dos dispositivos, da análise realizada, pode- se perceber que a literatura na área do direito dos respectivos países alega que Argentina, Paraguai e Uruguai e Peru estabelecem a concepção como o momento inicial da vida. Em relação ao final da vida humana, Uruguai e Venezuela não regulam o fim da personalidade em suas legislações, enquanto os demais o fazem. Além disto, observou-se que a codificação do Direito civil na América do Sul remete aos modelos legislativos europeus e, nesse sentido, as origens de – pelo menos alguma parte – dos ordenamentos jurídicos sul-americanos presentes neste estudo remetem ao velho continente. Dentro da sociedade moderna, segundo Freud (2006), o fenômeno da morte tem, por vezes, sido deixado na periferia das preocupações cotidianas. A evolução do conceito de dignidade humana e a presença desta no horizonte final da vida garantem 44 aos legisladores temáticas amplamente complexas, trabalhadas brevemente neste estudo como forma de demonstrar a abrangência do tema no debate moderno. Por fim, a conclusão mais importante do presente trabalho é a de que esta questão não é pacífica e muito menos unânime. Portanto, os estudos de direito comparado sincrônicos têm muito a contribuir com as reflexões sobre temas controversos como este ora estudado. A partir do estudo de diferentes sistemas, o operador jurídico tem em mãos diversos olhares sobre um único tema e passa a ter subsídios para refletir e até mesmo alterar sua própria legislação. 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AFTALION Enrique R.; OLANO, Fernando Garcia; VILANOVA Jose. lntroduccion al Derecho: nociones preliminares, teoría general, enciclopedia jurídica, história de las ideias. Buenos Aires: Ed. La Ley, 1967. AGUIRRE Y ALDAZ, Carlos Martínez de. 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