UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ENGENHARIA DE ILHA SOLTEIRA DEPARTAMENTO DE FÍSICA E QUÍMICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DOS MATERIAIS CINÉTICA DE CRISTALIZAÇÃO EM VIDROS TELURITOS DO SISTEMA TLWN EDI CARLOS PEREIRA DE SOUSA Ilha Solteira 2013 EDI CARLOS PEREIRA DE SOUSA CINÉTICA DE CRISTALIZAÇÃO EM VIDROS TELURITOS DO SISTEMA TLWN Dissertação apresentada ao Programa de Pós– Graduação em Ciência dos Materiais da Univer- sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de mestre em Ciência dos Materiais. Área de Concentração: Física da Matéria Condensada. Orientador: Prof. Dr. Keizo Yukimitu Ilha Solteira 2013 Aos meus pais, pela edificação dos meus valores. Este trabalho foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Keizo Yukimitu, meu orientador, pelas valiosas contribuições, direcionamento, empenho, pela amizade e contínuo envolvimento com a pesquisa; Aos professores Dr. Luis Carlos Barbosa e Dr. Oswaldo Luiz Alves (IQM/Unicamp) por colaborarem para que as dúvidas preliminares sobre a síntese dos vidros pudessem ter sido sanadas; Ao Prof. Dr. Erich Meyer (IF/UFRJ) pelas oportunas discussões sobre teorias de nucleação, por fornecer cópia de seu artigo publicado recentemente, por sua disposição em ministrar um seminário para o meu grupo de pesquisa e por colaborar com a correção deste trabalho; Ao Prof. Dr. Antonio Pedro Novaes de Oliveira (EMC/UFSC) pelas indicações de valiosas referências bibliográficas, sem as quais este trabalho seria apenas um mero esboço; Ao Prof. Dr. Antonio Carlos Ferreira Seridonio pela amizade, oportunidade de explorar um pouco mais a física e pelo aprendizado ímpar que me foi proporcionado; Ao Prof. Dr. Daniel Zanetti de Florio (UFABC) por permitir a realização das medidas de espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier; Aos Professores Dr. Edgar Dutra Zanotto (DEMa/UFSCar) e Dr. Eudes Borges de Araújo pela dispo- nibilização de artigos sobre cristalização em vidros e pelas discussões; Ao Prof. Dr. Walter Maigon Pontuschka (IF/USP) e Prof. Dr. João Carlos Silos Moraes por terem aceitado o convite para compor a banca de defesa e ao Prof. Dr. Victor Ciro Solano Reynoso pelas valiosas contribuições como banca do exame geral de qualificação; Aos demais professores e funcionários do Departamento de Física e Química e da Seção Técnica de Pós– Graduação; Aos meus pais e irmãs por sempre me apoiarem a prosseguir nos estudos. Tenho certeza de que é com trabalho e estudo que posso retribuir todo o apoio que sempre me proporcionaram; A Francisco Bezerra de Sousa, meu avô, (in memoriam) como a última homenagem que posso prestar a este grande homem, uma das pessoas mais serenas com quem tive o prazer de conviver; Aos amigos Égon Futigami, Paulo Rossi, Lincon Zadorosny, Natália Novo, Rafael Zadorosny, Francine Bettio Costa e Alex Otávio Sanches por proporcionarem diversos momentos agradáveis durante estes anos; A Midilane Sena Medina pela sólida amizade, troca contínua de experiências, pela agradável estadia e por ter me ajudado com as medidas de FTIR; A Fernanda Garcia e Silva, Salmo Moreira Sidel e Aline Alcamin Monteiro por todo o auxílio prestado na parte experimental, meus profundos agradecimentos; A Deus por permitir esse momento tão importante na minha vida e na minha carreira. És precária e veloz, Felicidade. Custas a vir e, quando vens, não te demoras. Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo, e, para te medir, se inventaram as horas. Epigrama número 2. Cecília Meireles (1901-1964) RESUMO Vidros preparados a partir de massa fundida podem nuclear ou cristalizar novas fases quando são submetidos a tratamentos térmicos acima da temperatura de transição vítrea. Neste traba- lho foram apresentados estudos sobre a cinética de cristalização de vidros teluritos do sistema 80TeO2–10WO3–(10–x)Li2O–xNa2O, x = 0, 2, 4, 6 e 10% mol, denominado sistema TLWN. As principais teorias sobre nucleação e cristalização de vidros foram detalhadas, tais como: Teoria Clássica de Nucleação, Teoria Clássica de Nucleação Modificada, Teoria de Nucleação Adiabática e Teoria JMAK. Classicamente, o estudo da cristalização de vidros pode ser realizado através da teoria formulada por Johnson–Mehl–Avrami–Kolmogorov (JMAK), a qual descreve os processos de nucleação e cristalização, por intermédio das curvas de calorimetria exploratória diferencial – DSC. Os vidros foram sintetizados pelo método de resfriamento rápido (melt–quenching ). Medidas de DSC foram realizadas a diferentes taxas de aquecimento e com diferentes tama- nhos de partículas para estudar a cinética de cristalização dos vidros. Foi evidenciado o caráter amorfo de alguns vidros e para o vidro TLWN6 foram encontradas diferentes fases cristalinas, tais como: Na2(TeW2O9), Li2Te2O5, WO3, α–TeO2 e γ–TeO2, dispersas na matriz devido aos di- versos tratamentos térmicos realizados em torno das temperaturas correspondentes aos máximos dos picos de cristalização e evidenciadas por DRX. Deconvoluções foram realizadas utilizando funções gaussianas para separar os picos sobrepostos da amostra TLWN6. Ficou evidente, por intermédio da análise dos termogramas, que o número de picos de cristalização aumenta com o incremento do óxido de sódio e também que os vidros teluritos deste sistema não possuem boa estabilidade térmica, quando comparados a vidros clássicos. As energias de ativação das fases cristalinas foram obtidas utilizando-se o modelo de JMAK. Medidas de FTIR para o vidro TLWN6 mostraram uma banda de absorção em 621 cm-1 e outra em 669 cm-1 , atribuídas à existência da fase cristalina α–TeO2 e concorda com os difratogramas de raios X. Também foram evidenciadas bandas em torno de 615 cm-1 referentes à vibrações do grupo TeO6 e em 850 cm-1, atribuídas às vibrações de estiramento assimétricas W–O das ligações W–O–W entre átomos de tungstênio com coordenação seis O=WO5. Palavras-Chave: Vidros teluritos. Nucleação. Cristalização. DSC. DRX. FTIR. Energia de ativação. ABSTRACT The glasses prepared from the melt mass may crystallize or nuclear new phases when subjected to heat treatment above the glass transition temperature. In this work were presented studies on the kinetics of nucleation and crystallization of glasses tellurite of the system 80TeO2–10WO3– (10–x)Li2O–xNa2O, x = 0, 2, 4, 6 e 10% mol called TLWN system. The main theories on nucleation and crystallization of glasses have been detailed, such as: Classical Theory of Nucle- ation, Modified Classical Theory of Nucleation, the Nucleation Adiabatic Theory and Theory JMAK. Classically, the study of crystallization of glasses can be performed by theory formu- lated by Johnson–Mehl–Avrami–Kolmogorov (JMAK) which describes processes of nucleation and crystallization through of differential scanning calorimetry curves – DSC. The glasses were synthesized by the method of melt - quenching. DSC measurements were made at different hea- ting rates and with different particle sizes to study the crystallization kinetics of glass. It became evident amorphous character of some glasses and glass TLWN6 different crystalline phases have been found, such as Na2(TeW2O9), Li2Te2O5, WO3, α–TeO2 e γ–TeO2, dispersed in the matrix due to the different heat treatments performed in around the temperatures corresponding to the peak maximum crystallization and evidenced by XRD. Deconvolutions were performed using gaussian functions to separate overlapping peaks TLWN6 sample. It became evident through the examination of thermographs, that the number of peaks of crystallization increases with the increase of sodium oxide and also that this system tellurite glasses do not have good thermal stability when compared to traditional glasses. The activation energies of the crystalline pha- ses were obtained using the model JMAK. FTIR measurements for glass TLWN6 showed an absorption band at 621 cm-1 and the other at 669 cm-1, attributed to the presence of α–TeO2 crystal phase and agrees with the X ray diffractograms Bands were also observed around 615 cm-1 related to vibrations group TeO6 and 850 cm-1, attributed to the asymmetrical stretching vibration of W–O bonds of W–O–W tungsten atoms with coordination six O=WO5. Keywords: Tellurite glasses. Nucleation. Crystallization. XRD. FTIR. Activation energy. Sumário 1 Introdução 11 2 Estudo dos Vidros 14 2.1 Histórico Conciso do Vidro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 2.2 Natureza do Vidro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 2.3 Transição Vítrea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.4 Obtenção de Estados Vítreos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.5 Vidros Teluritos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.5.1 Propriedades do TeO2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.5.2 Aspectos Estruturais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 3 Mecanismos de Nucleação e Cristalização 26 3.1 Cinética de Formação Vítrea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 3.2 Processos de Nucleação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 3.3 Modelos Teóricos de Nucleação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 3.3.1 Teoria Clássica de Nucleação (CNT) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 3.3.1.1 Nucleação Homogênea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 3.3.1.2 Nucleação Heterogênea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 3.3.1.3 Crescimento de cristais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 3.3.2 Teoria Clássica de Nucleação, Adaptada por Turnbull e Fischer . . . . . . . . . . . 39 3.3.3 Teoria Clássica de Nucleação Modificada (CD–CNT) . . . . . . . . . . . . . . . . 40 3.3.4 Teoria de Nucleação Adiabática (TNA) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.4 Cristalização em Vidros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 3.5 Estudo da Cinética de Cristalização: Teoria JMAK . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 3.5.1 Tratamento Isotérmico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 3.5.2 Tratamento Não–Isotérmico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4 Materiais e Métodos Experimentais 50 4.1 Materiais Utilizados e Preparação das Amostras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 4.2 Métodos de Caracterização dos Vidros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 4.2.1 Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 4.2.2 Difratometria de Raios-X (DRX) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 4.2.3 Espectroscopia no Infravermelho por Transformada de Fourier (FTIR) . . . . . . . 55 5 Resultados e Discussões 57 5.1 Estudo das propriedades térmicas dos vidros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 11 5.2 Difratometria de Raios X . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 5.3 Espectroscopia no Infravermelho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74 6 Considerações Finais 78 Referências 80 Capítulo 1 Introdução O vidro é um sólido amorfo ou não cristalino. Um material é caracterizado como amorfo quando não possui simetria de longo alcance, também caracterizado como isotrópico, uma vez que suas propriedades independem da orientação cristalográfica. Historicamente foram atribuídas muitas definições para os vidros, mas muitas não satisfaziam as condições de formação destes. Por muitos anos a definição de que vidro é um produto inorgânico fundido, baseado prin- cipalmente em sílica, o qual foi resfriado para uma condição rígida sem cristalização, formando uma rede tridimensional com ausência de simetria e periodicidade foi usada. Anos de pesquisas sobre a concepção vítrea foram empregados, até que se chegou a um consenso sobre a melhor definição: “vidro é um sólido não cristalino que exibe o fenômeno da transição vítrea” [1]. Atualmente, o objetivo de alguns trabalhos é a substituição de sistemas eletrônicos por dispositivos ópticos, cuja intenção é utilizar a luz na transmissão, modulação, amplificação e armazenamento de informações [2, 3]. Dentro do panorama científico atual, o desenvolvimento de fibras ópticas e lasers pulsados têm despertado um grande interesse em pesquisas com óptica não linear em vidros fotônicos. Embora outros tipos de materiais, como polímeros, também apresentem propriedades ópticas interessantes, o vidro é o material que mais se destaca por sua durabilidade e facilidade de emprego prático. Uma classe especial de vidros é conhecida como vidros óxidos teluritos. Vidros telu- ritos são de interesse na aplicação em fotônica, devido às suas propriedades estruturais e ópticas, tais como: altos valores de índices de refração linear, acentuadas não-linearidades ópticas quando comparados com outros materiais vítreos, baixa estabilidade térmica e resistência química rela- tivamente alta [2, 3, 4]. Como vidro óxido telurito entende-se aquele em que o principal formador da rede é o óxido de telúrio TeO2. Os vidros à base de TeO2 apresentam propriedades interessantes não somente do ponto de vista fundamental, como também do prático. Exibem baixos pontos 12 de fusão (1073 K) quando comparados com vidros silicatos, altas constantes dielétricas, baixas dispersões, transparência em uma extensa faixa espectral e, dependendo da composição, apre- sentam a geração do terceiro harmônico (χ(3)) com cerca de uma ordem de magnitude maior do que outros vidros óxidos importantes, como por exemplo, os vidros boratos e silicatos, sendo, portanto, bons candidatos para uso em amplificadores e dispositivos ópticos não lineares [5]. Em determinadas ocasiões, o óxido de telúrio forma vidro sozinho mas, em alguns percentuais, necessita de outros óxidos como o WO3, Li2O, CaO, ZnO ou Na2O para formar vidro. Uma vez adicionados outros íons modificadores, há uma alteração na estrutura da rede ocasionada pela quebra de ligações entre os átomos. Os vidros teluritos são compostos de unida- des estruturais TeO4 em forma de bipirâmide trigonal (tbp). Acrescendo-se íons alcalinos como modificadores de rede, a estrutura vítrea modifica-se de bipirâmides trigonais TeO4 para polie- dros TeO3+1 e então, para pirâmides trigonais (tp) TeO3 . Os vidros ora apresentados exibem propriedades estruturais que revelam duas formas cristalinas estáveis para o TeO2: α–TeO2 (pa- ratelurito) [6] e β–TeO2(telurito) [7]. A estrutura básica é constituida pela bipirâmide trigonal (TeO4), ligada pelos vértices na fase α–TeO2 e pelas arestas na fase β–TeO2. Trabalhos recentes [8, 9] indicaram a formação de novas fases cristalinas polimórficas: δ–TeO2 e γ–TeO2 nos vidros teluritos, sendo que a fase δ aparece exclusivamente em vidros com dopagem em alta gama. A estrutura γ–TeO2 é constituída por uma bipirâmide trigonal distorcida (TeO4E), com um dos vértices ocupados por um par de elétrons livres. A introdução de óxidos alcalinos na estabilização dos vidros teluritos leva a diminui- ção do índice de refração. Este fato está relacionado à diminuição da estrutura TeO4 no vidro. A incorporação de um terceiro óxido, principalmente óxido de metal de transição, dificulta a forma- ção da estrutura TeO3 e facilita a formação da estrutura TeO4 e, consequentemente, um aumento no índice de refração do material é observado. A introdução de Na2O na matriz vítrea contribui para diminuir a temperatura de fusão, facilitando este processo e também a homogeneização da matriz. Por outro lado, a inserção de um modificador como o Li2O altera as propriedades da rede influenciando, por exemplo, na condutividade térmica. Os modificadores contribuem para a formação do vidro, pois modificam a rede, quebrando pontes [10]. O conhecimento do comportamento estrutural da matriz vítrea é muito importante, pois influencia em variadas propriedades ópticas. Embora o estudo dessas propriedades ópticas seja fascinante para o campo da Ciência dos Materiais e apresente inúmeras propriedades e benefícios, como o estudo do índice de refração do vidro, neste trabalho enfatizou-se apenas um estudo básico de propriedades estruturais de vidros teluritos, enfocando os processos de cristalização das matrizes vítreas obtidas com base no óxido de telúrio como principal formador 13 e discutindo-se processos de nucleação que possam ocorrer, devido à influência do tratamento térmico nessas matrizes. O vidro pode ter suas propriedades elétricas, mecânicas ou químicas suficientemente melhoradas quando submetido a um processo de tratamento térmico. Este, por sua vez, pode ocasionar cristalização em vidros e passam a ser chamados de vitrocerâmicas. Vitrocerâmicas são sólidos policristalinos obtidos a partir da cristalização controlada de vidros. Dois processos fundamentais estão envolvidos neste estágio: a nucleação e a cristalização. A nucleação é carac- terizada pela formação de pequenos núcleos na matriz vítrea. Após a formação do núcleo estável, a cristalização ocorre por crescimento das fases cristalinas. Os vidros são materiais frágeis, sus- ceptíveis a defeitos mecânicos em sua superfície, tais como rachaduras e trincas. Esses defeitos podem surgir devido à exposição dos vidros à umidade atmosféricas ou a danos mecânicos. A resistência mecânica desses materiais pode ser consideravelmente melhorada com os tratamentos térmicos, pois proporciona a cristalização da matriz vítrea [11]. O resfriamento muito lento con- tribui para que haja a cristalização em um vidro. Quando o tempo é controlado na temperatura de nucleação pode-se controlar o número de cristais. Já controlando o tempo de tratamento na temperatura de crescimento pode-se controlar o tamanho dos grãos cristalinos e a fração da fase cristalina. A aplicabilidade de materiais vítreos merece um estudo contínuo, com o intuito de ob- ter materiais cujas propriedades estruturais, térmicas e ópticas apresentem valores comparáveis ou superiores quando confrontados aos vidros clássicos. Neste trabalho foram sintetizados e estudados vidros óxidos, contendo telúrio, tungs- tênio, lítio e sódio na matriz. Tal sistema vítreo será doravante denominado sistema TLWN. As percentagens em mol do óxido de lítio e de sódio da composição das matrizes foram sendo gradativamente variadas, enquanto que os percentuais em mol dos óxidos de telúrio e tungstê- nio se mantiveram fixos. Tratamentos térmicos foram realizados em diferentes temperaturas, objetivando promover uma possível nucleação e cristalização dessas matrizes, às quais foram caracterizadas por meio de calorimetria exploratória diferencial (DSC), difratometria de raios X (DRX) e espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR). As principais fases cristalinas foram identificadas e as energias de ativação para as reações de cristalização obtidas. Capítulo 2 Estudo dos Vidros 2.1 Histórico Conciso do Vidro Os vidros existem há milhares de anos e nem sempre foram fabricados pelo homem. Os vidros naturais são formados de alguns tipos de rochas, quando estas são fundidas em altas temperaturas e solidificadas rapidamente, em seguida; geralmente em erupções vulcânicas e são denominados obsidianas e tectitas[12]. Algumas características destes vidros os tornaram valiosos ao longo da história. Egípcios os utilizavam em adornos nos sarcófagos, nas tumbas e engastados em máscaras mortuárias de ouro dos antigos Faraós. O início da fabricação do vidro ainda é incerto pelos historiadores. Plínio, um natu- ralista romano, atribui aos fenícios a obtenção dos vidros, afirmando que quando estes desem- barcaram nas costas da Síria há cerca de 7000 anos a.C., improvisaram fogões usando blocos de salitre sobre a areia e observaram que, passado algum tempo de fogo, escorria uma substância líquida e brilhante que rapidamente se solidificava. Sabe-se que os fenícios dedicaram um tempo razoável à reprodução deste fenômeno, chegando à obtenção de alguns materiais. De posse dos conhecimentos necessários à fabricação deste vidro de baixa qualidade, a arte de fabricação de vidros foi expandida através do Egito e Mesopotâmia, desenvolvendo e consolidando-se em todos os continentes. O Egito desenvolveu a arte de confeccionar vidros e adicionar cobalto ou cobre para originar a coloração azulada. No entanto, os primeiros vidros incolores somente foram obtidos em Alexandria, por volta de 100 d.C., devido à introdução de óxido de manganês nas composições e de significativas melhorias nos fornos, como a produção de altas temperaturas e o controle da atmosfera de combustão, os quais tiveram marcada influência sobre a qualidade dos vidros e permitiram a eficiência da fusão dos materiais constituintes. Muitos anos depois, no século XVII, alguns artesãos venezianos (Veneza teve papel fundamental, sobretudo na Idade Média, 15 por contar com um grande número de vidreiros, fortemente influenciados pela arte islâmica) trabalharam nas florestas da Bavária e da Bohemia e começaram a produzir um vidro de cor esverdeada que, depois de polido, recebia o nome de “vidro da floresta”. A moldagem dos vidros, no entanto, é mais antiga: documentos históricos registram que artesãos sírios da região de Sidon e Babilônia obtiveram a técnica de sopragem, que consistia na utilização de um tubo de ferro de 1 metro de comprimento, com abertura aproximada de 1 cm de diâmetro. Este tubo era introduzido no forno contendo a massa de vidro fundida, onde retirava-se determinada quantidade que, soprada pela extremidade oposta, originava uma peça oca. A arte de melhoramento do vidro foi se ampliando e se aperfeiçoando, permitindo a obtenção de vários utensílios para decoração. No século XV catedrais, igrejas, átrios e palácios eram decorados com os chamados vitrais - pedaços de vidro polido, rejuntados com tiras de chumbo e fixados em algumas contruções, formando janelas. Desenvolvimentos da química e da física se tornaram necessários a partir do século XVI, para o entendimento dos processos que ocorriam a partir do fundido resultante como a solidificação e a formação dos vidros. Os séculos XVIII, XIX e XX marcaram importantes desenvolvimentos tanto na fabricação quanto na aplicação dos vidros, os quais experimentaram a sua popularização enquanto material de produção intensiva. A Tabela 01 mostra os avanços nas pesquisa em vidros nos últimos 100 anos: TABELA 01: Principais Estudos e progressos dos vidros nos últimos 100 anos. Data Estudos e Desenvolvimentos 1915 A Universidade de Sheffield, na Inglaterra, funda o Departamento de Tecnologia do Vidro, hoje chamado Centro para a Pesquisa do Vidro. 1920 Griffith propõe a teoria que permite compreender a resistência dos bulbos de vidro, o que levou ao entendimento e aperfeiçoamento da resistência dos vidros. 1932 Zachariasen publica seu famoso trabalho sobre a hipótese da rede aleatória e as regras para a formação de vidros no Journal of American Chemical Society. 1950 A companhia americana Ford Motor Co. funda o principal centro de pesquisa em vidro. A Ciência do Vidro torna-se sua maior área de pesquisa. 1960 Turnbull e Cohen propõem modelo para a formação de vidros, com base na cristalização. 1970 A Corning Glass americana produz primeira fibra óptica de sílica, usando técnicas de deposição de vapor químico para reduzir a atenuação e aumentar o sinal da transmissão. 1984 Marcel e Michel Poulain e Jacques Lucas descobrem os primeiros vidros fluoretos em Rennes, na França. Fonte: Alves (2001) [12]. 16 2.2 Natureza do Vidro Após o final da Segunda Guerra Mundial, os vidros passaram a ganhar um maior destaque no cenário global, sendo estudado sistematicamente, tornando-se fundamental no final dos anos 1970, destacando-se em sistemas de comunicações, como um dos principais componentes, sob a forma de fibras ópticas. Atualmente, diversas composições vítreas têm sido estudadas ao redor do mundo. Entretanto, antes de sistematizar um estudo sobre os vidros, é necessário formalizar precisamente de que se trata este material. Por muitos anos, as definições acerca de vidros encontraram controvérsias entre os pesquisadores. No início do século XX, o vidro era classificado como um “produto inorgânico fundido, que atinge por resfriamento uma condição rígida, sem que ocorra cristalização” [13]. Como a hipóstese de cristalitos para a explicação da estrutura vítrea deixou de ser aceita e sabendo-se que o método de melting-quenching não era mais o único possível para a obtenção do vidro, essa definição foi gradativamente abandonada. Por muitos anos, quando os vidros ainda eram preparados por este método, as definições de vidro foram embasadas no conceito de viscosidade de sólidos. Segundo o critério de viscosidade, um sólido é um material rígido, que não escoa quando submetido a forças moderadas [12]. Quantitativamente, um sólido pode ser definido como um material com viscosidade maior do que 1015 P (poises). Em 1932, Zachariasen [14] propôs que uma rede tridensional estendida, com ausência de simetria e periodicidade, caracteriza o arranjo nos vidro e que as forças interatômicas eram comparáveis às do cristal correspondente. A Figura 01 mostra uma configuração para um arranjo cristalino e para um vidro. FIGURA 01: Representação bidimensional: (a) do arranjo cristalino simétrico e periódico de um composto hipotético; (b) representação da rede do vidro do mesmo composto, na qual fica caracterizada a ausência de simetria e periodicidade. Fonte: Sanches (2007) [15]. Várias outras definições para os vidros são apontadas na literatura. De acordo com Akerman [16] “Vidro é um sólido, não cristalino, que apresenta o fenômeno de transição vítrea”. 17 Segundo Shelby [2] “Vidro é um sólido amorfo com ausência completa de ordem a longo alcance e periodicidade, exibindo uma região de transição vítrea.” Cientificamente, o vidro pode ser definido operacional e estruturalmente. A definição operacional afirma que o vidro é um sólido obtido pelo congelamento de um líquido, sem sofrer cristalização. A definição estrutural afirma que um vidro é um sólido não-cristalino. Entretanto, o termo sólido não-cristalino é usado como sinônimo de sólido amorfo e vidro. É necessário que se faça uma distinção entre esses termos. Do ponto de vista da Termodinâmica, um sólido não- cristalino pode ser dividido em duas categorias: vidros e sólidos amorfos [17]. Assim sendo, um sólido não-cristalino tornar-se-á vidro quando o ordenamento de sua estrutura a longo alcance for idêntico ao de sua massa fundida. Quando o vidro se forma, pelo tradicional método fusão- resfriamento, essa condição se torna satisfeita, uma vez que a estrutura aleatória a longo alcance do líquido permance no vidro e permanece no material solidificado pelo resfriamento rápido. Atualmente, através da espectroscopia, difração de raios–X, bem como outros mé- todos de análise de estruturas, é possível confirmar a ausência de simetria de longo alcance nos vidros. O avanço dos métodos de síntese e análise possibilitou o advento de outras espécies de vidros como os óxidos, orgânicos e metálicos a partir de métodos variados. Assim sendo, uma renovação contínua da definição de vidro necessita ser feita. Nos dias de hoje, podemos conside- rar como uma definição aceitável a seguinte: “vidro é um sólido amorfo, com ausência completa de ordem a longo alcance e periodicidade, exibindo o fenômeno da transição vítrea. Qualquer material, inorgânico, orgânico ou metal, formado por qualquer técnica, que exibe um fenômeno de transição vítrea é um vidro [17].” 2.3 Transição Vítrea O método de fusão-resfriamento, por meio do qual a maioria dos vidros são produ- zidos, envolve a fusão dos componentes à altas temperaturas, seguida do resfriamento da massa vítrea (fundido). O arranjo estrutural interno do fundido se modifica à medida que ocorre o resfriamento e pode percorrer caminhos diferentes, dependendo da taxa de resfriamento. Par- tindo do estado líquido e descendo gradativamente a temperatura, chegamos à temperatura de fusão Tf . Nesta temperatura, dois fenômenos podem ocorrer: a cristalização do material, ca- racterizada por uma descontinuidade do volume específico do material, associada possivelmente à uma contração, ou então, a passagem a um estado de líquido super-resfriado [1]. Para esta hipótese, o volume específico não é descontínuo em Tf e a taxa de contração de volume não varia bruscamente. Neste momento, entretanto, o líquido super-resfriado atravessa uma região 18 de equilíbrio metaestável, podendo ceder a pequenas perturbações e cristalizar-se. Para que a cristalização ocorra, faz-se necessário um determinado intervalo de tempo até que pequenas unidades se orientem e atinjam posições específicas para a formação de um cristal [18]. É notável o bom desempenho do resfriamento rápido neste ponto, pois o mesmo faz com o líquido permaneça no estado metaestável, uma vez que essas unidades perdem mobilidade antes de se ordenarem. Prosseguindo com o decréscimo da temperatura, o que implica dizer em diminuir um pouco mais o volume específico, chegará um momento em que a mobilidade atômica será muito reduzida e então os átomos começarão a fixar-se em suas posições em uma determinada tempe- ratura Tg, definida como temperatura de transição vítrea. A Figura 02 ilustra o comportamento do volume específico em função da temperatura, onde Tg pode ser observada. FIGURA 02: Mudança de volume durante o resfriamento de um líquido. Se o aparecimento de cristais ocorrer facilmente, o volume diminuirá de maneira brusca na temperatura Tf. Por outro lado, na ausência de cristalização, o líquido permanecerá em equilíbrio metaestável até atingir a Tg, quando os rearranjos estruturais passarão a ser cineticamente impedidos. Fonte: Araújo (1997) [1]. A temperatura de transição vítrea deve ser entendida, portanto, como a temperatura que separa os comportamentos vítreos e viscoelástico do material. O estado em que o corpo responde elasticamente a uma força aplicada é chamado de viscoelástico. Por outro lado, o estado vítreo caracteriza-se pela impossibilidade dos comportamentos plástico ou elástico do material, ficando este propenso a quebrar quando sujeito à ação de uma força. De acordo com a taxa de resfriamento, a posição da Tg pode variar. Um rápido resfriamento desloca Tg para altas temperaturas, enquanto um resfriamento lento acontece o contrário. Assim, é razoável substituir a Tg por um intervalo de transição vítrea [Tg] delimitado por valores de Tg a alta e baixa taxa de resfriamento. A relaxação estrutural tem início na 19 região de transição vítrea, quando algumas propriedades como viscosidade, capacidade calorífica e expansão térmica começam a manifestar um comportamento diferente do padrão verificado até então e surge como consequência do desimpedimento dos movimentos das cadeias. A extrapolação das linhas que definem a região metaestável e a região do vidro, interceptam um ponto, que é justamente o parâmetro definido como temperatura de transição vítrea. 2.4 Obtenção de Estados Vítreos No início dos primeiros estudos sobre vidros, acreditava-se que quaisquer combinações de elementos poderiam formar vidros, desde que fossem submetidas à um resfriamento rápido, a fim de evitar a cristalização. No entanto, o número de componentes químicos formadores de vidro é bastante limitado. Surgia, então, a necessidade de se responder o seguinte questionamento: por que alguns materiais possuem maior facilidade para formarem vidros? A resposta foi obtida através de anos de investigação microscósmica do comportamento dos constituintes do vidro. Segundo Zanotto [19], o estado vítreo é caracterizado por comportamento físico de sólido, com estrutura de líquido congelado, sem liberdade molecular translacional. Assim sendo, materiais com quaisquer tipos de ligações químicas: iônicas, covalentes, metálicas, van der Walls ou mistas podem formar vidros. A primeira teoria estrutural surgiu na tentativa de explicar esse mecanismo complexo de formação dos vidros: buscando condições de vitrificação de óxidos simples, em 1926 Goldschmidt [18] pensou que o critério para vitrificação de óxidos simples com forma estrutural AmOn poderia ser a razão dos raios iônicos do cátion A e do oxigênio O. Para óxidos formadores de vidro, essa razão deveria estar entre 0,2 e 0,4. Seguindo considerações clássicas de química de cristais para estruturas iônicas, essa razão está diretamente relacionada ao número de coordenação do cátion central. Contudo, um exame mais completo de diferentes casos mostra que o critério de Goldschmidt é inadequado: o óxido BeO, por exemplo, satisfaz o critério, mas não pode se vitrificar. Uma condição essencial para a sua formação vítrea é que a substância formadora de vidros deve formar longas cadeias nas redes tridimensionais sem periodicidade [14]. O boro e a sílica possuem propriedades de formar essas cadeias; eles são considerados formadores e são a base de diversas matrizes vítreas com muitas propriedades e aplicações. De acordo com a proposição de Zachariasen [14], a presença ou ausência de simetria e periodicidade em uma rede tridimensional seria o fator de diferenciação entre um vidro e um cristal. Após uma análise me- tódica das estruturas formadas por diversos poliedros de coordenação, Zachariasen desenvolveu quatro regras que adotam alguns critérios para as estruturas óxidas que permitem previsões de 20 substâncias que tendem a formação vítrea: 1. Os átomos metálicos devem ter um número de oxidação reduzido. 2. Nenhum dos oxigênios pode ser compartilhado por mais de dois cátions formadores de vidros. 3. Os poliedros devem ligar-se pelos vértices e não pelas arestas ou faces. 4. Pelo menos três vértices de cada poliedro devem ser compartilhados com outros poliedros. Essas regras foram capazes de explicar a formação de uma infinidade de vidros óxidos; a Tabela 02 nos mostra alguns deles. Óxidos do tipo A2O3 satisfazem as regras 2, 3 e 4, quando os oxigênios formam triângulos em torno do átomo A. Por sua vez, óxidos do tipo AO2 e A2O5 satisfazem as regras quando os oxigênios formam um tetraedro em torno do átomo A. Satisfazem, por fim, as referidas regras, os óxidos AO3 e A2O5, onde os oxigênios estão dispostos em uma forma octaédrica. A letra A corresponde, nesta representação, aos íons das famílias dos elementos químicos formadores, modificadores ou intermediários dos vidros e O corresponde ao oxigênio. TABELA 02: Clássicos óxidos formadores e modificadores de estruturas vítreas. Formadores Vítreos Modificadores Intermediários SiO2 Li2O Al2O3 GeO2 Na2O PbO B2O3 K2O ZnO P2O5 CaO Li2O As2O3 BaO TiO2 As2O5 V2O5 Fonte: Zarzycki (1991) [18]. Os termos formadores, modificadores e intermediários foram introduzidos, após Za- chariasen, para designar os óxidos que participam na formação da estrutura vítrea e modificadores 21 de estrutura para os óxidos que não participam diretamente da estrutura. A ação desses modifi- cadores pode ser melhor visualizada na Figura 03, quando observamos a atuação do Li2O sobre o P2O5. FIGURA 03: Quebra da ponte P-O-P devido ao deformador Li2O. (a) cadeia intacta e (b) formação do par de oxigênio não ponteante P–O-. Fonte: Araújo (1997) [1]. A ação do deformador na cadeia do sistema Li2O–P2O5 provoca uma ruptura nas ligações P–O–P, oxigênio ponteante, entre os tetraedros, formando com isso duas ligações não ponteantes P–O–. As duas cargas negativas são compensadas pela presenca do par de cátions Li+, reestabelecendo a neutralidade eletrostatica requerida pelo conjunto. Zachariasen sugeriu que os cátions deformadores ocupam as vacâncias que se formam na estrutura vítrea e que os mesmos se distribuem ao acaso. A facilidade de formar vidro está intrinsecamente ligada à capacidade de uma subs- tância de incorporar pequenas variações (modificadores de redes), em uma situação de viscosidade alta o suficiente para que as unidades não se ordenem em um arranjo cristalino. As propriedades dos materiais são ditadas pelos tipos de ligações interatômicas, de- feitos e microestruturas, sendo as propriedades dos vidros alteradas através dos modificadores de redes. Introduzindo-se modificadores, as características são conduzidas para as aplicações dese- jadas. Como o vidro possui uma grande quantidade de composições químicas, às quais diversos elementos da tabela periódica podem ser agregados, estes apresentam uma ampla variação de propriedades químicas, ópticas, térmicas e elétricas. A Tabela 03 fornece mais informações sobre alguns desses elementos e suas principais alterações nas propriedades do vidro. O incremento de determinado óxido na composição da matriz favorece algumas ca- racterísticas; por exemplo, o óxido de bário aumenta a densidade, além de aumentar a expansão 22 térmica. É também conhecido que Al2O3 melhora as características de durabilidade da matriz [16]. TABELA 03: Óxidos modificadores atuantes em algumas propriedades vítreas. Propriedade Óxidos Densidade BaO Devitrificação CaO, MgO, ZnO Resistência química Al2O3 Viscosidade SiO2 Baixa dilatação B2O3 Solubilidade em água K2O Condutividade Li2O, Na2O Índice de Refração PbO Cor MnO2, Fe2O3, Cr2O3, CuO Fonte: Akerman (2000) [16]. 2.5 Vidros Teluritos 2.5.1 Propriedades do TeO2 O primeiro pesquisador a sintetizar vidros à base de telúrio foi Berzelius, em 1834. No entanto, o primeiro trabalho citado na literatura com mérito científico foi o de Stanworth em 1954, explicitando pela primeira vez algumas de suas potencialidades e propriedades [20]. O estudo da química e das propriedades físicas e térmicas dos vidros se expandia e era a motivação primordial o interesse na obtenção de lasers e dispositivos ópticos. Stanworth pesquisou vidros em diversos sitemas binários e ternários, comprovando determinadas características e propriedades, servindo seus estudos de base para que outras propriedades desses sistemas continuassem sendo investigadas. Os vidros à base de óxido de telúrio possuem importantes aplicações práticas e pro- priedades de interesse fundamental, como baixos pontos de fusão, boa transmitância no infra- vermelho, altas constantes dielétricas, durabilidade química elevada, bem como altos índices de refração. A Tabela 04 apresenta valores de algumas propriedades físicas para os vidros teluritos em comparação com vidros fluoretos, calcogenetos e silicatos. Diferentes sistemas foram estudados para determinar a região de formação vítrea dos vidros teluritos [5]. As maiores parte dos sistemas estudados eram binários à base de TeO2 com: 23 • Alcalinos e óxidos de alcalinos terrosos; • ZnO, Al2O3, PbO, Nb2O3, WO3, La2O3, TiO2, entre outros. Também foram relatados vidros à base de óxido de telúrio em sistemas ternários, incluindo uma faixa extensa de composições vítreas, como por exemplo, TeO2 –P2O5– BaO, TeO2–ZnO–B2O3 e TeO2–MoO3 –CeO2 . TABELA 04: Comparação de propriedades ópticas e físicas dos vidros. Propriedades Teluritos Fluoretos Calcogenetos Silicatos Constante dielétrica (ε) 13 – 35 – – 4,0 Densidade (g/cm³) 5,5 5,0 4,5 2,2 Energia de fônons mais alta (cm-1) 800 500 300 1100 Gap (eV) ≈ 3 – 1–3 ≈ 10 Índice de refração (n’) (589,9 nm) 1,8 – 2,3 1,5 2,83 1,46 Índice de refração não-linear (n2, m2/W) 2,5 x 10-19 10-21 * 10-20 Transição Vítrea (Tg, °C) 300 300 300 1000 * Valor indeterminado Fonte: Wang et al. (1994) [5]. De acordo com a Tabela 04, podemos destacar a baixa energia de fônons, o alto valor do índice de refração, e o baixo valor da temperatura de transição vítrea dos vidros teluritos em relação aos silicatos. O índice de refração alto de um determinado material é indicativo de maior eficiência na propagação da luz [4]. A baixa energia de fônon condiciona o vidro como promissor hospedeiro de íons terras-raras [21]. Por fim, vidros com baixa temperatura de transição vítrea são preparados com maior facilidade [7]. 2.5.2 Aspectos Estruturais A síntese de vidros à base de óxido de telúrio TeO2 por Stanworth, criou a possibili- dade de se obter vidros a partir de um composto cuja estrutura era completamente diferente do que aqueles obtidos a partir da sílica e que apresentavam propriedades muito interessantes, do ponto de vista fundamental e tecnológico. É considerado como vidro óxido do sistema telurito aquele em que o óxido de telúrio apresenta-se em maior porcentagem em relação a outros compo- nentes. A forma mais estável de óxido de telúrio é exatamente o TeO2 , que é um sólido cristalino branco, que quando aquecido adquire coloração amarela; fundindo-se a aproximadamente 800 °C, 24 tornando-se um líquido vermelho escuro. A altas temperaturas, tanto o TeO é facilmente oxidado quanto o TeO3 é facilmente decomposto. Dessa forma, podemos inferir que em sistemas vítreos o telúrio apresenta-se na forma TeO2. Na forma estável, o TeO2 pode apresentar-se sob duas formas: o α–TeO2 (paratelurito) e o β–TeO2 (telurito). A estrutura básica é constituída por bipirâmides trigonais TeO4, ligadas por vértices no α–TeO2 e pelas arestas no β–TeO2. Devido à presença de um par de elétrons isolado em uma posição equatorial nas unidades estruturais de TeO4, o rearranjo estrutural necessário à formação vítrea é seriamente limitado [22]. Atra- vés da incorporação de determinados componentes, espera-se que as distâncias interatômicas Te–O sejam estendidas, aumentando a mobilidade do poliedro TeO4, suprindo-o das condições necessárias à sua vitrificação. Várias técnicas experimentais tais como espectroscopia no infravermelho por trans- formada de Fourier (FTIR), espectroscopia Raman, difração de raios-X (DRX) e difração de nêutrons têm sido empregadas na caracterização da estrutura local dos teluritos. Estudos recen- tes [23] sugerem que os vidros teluritos são compostos de unidades estruturais TeO4 em forma de bipirâmide trigonal (tbp), ligada pelos vértices, formando cadeias infinitas. Acrescendo-se íons alcalinos como modificadores de rede, a estrutura vítrea modifica-se de bipirâmides trigonais TeO4 para poliedros TeO3+1 e então, para pirâmides trigonais (tp) TeO3. A Figura 04 ilustra as representações de cada uma das unidades estruturais. FIGURA 04: Estruturas do vidro à base de telúrio em suas configurações tradicionais: (a) bipirâmide trigonal TeO4, (b) poliedro trigonal TeO3+1, (c) pirâmide trigonal TeO3. Fonte: Cassanjes (2003) [24]. O telúrio com número de coordenação 4 foi observado pela primeira vez no parate- lurito α–TeO2 [25]. Nessa configuração, o átomo de telúrio está no centro de uma bipirâmide trigonal TeO4 (Figura 05), apresentando 2 átomos de oxigênio axiais e 2 átomos de oxigênio 25 equatoriais, sendo a terceira posição equatorial ocupada por um par de elétrons isolado onde a distância da ligação Te – O é maior na ligação axial (Te–Oax=2,08 Å) do que na ligação equato- rial (Te–Oeq=1,90 Å ). Um par eletrônico livre, representado por E na Figura 05 ocupa a terceira posição equatorial [24]. FIGURA 05: Modelo estrutural para as unidades TeO4 presentes nas fases cristalinas α e β–TeO2 (a seta indica a posição do par de elétrons livres). Oax e Oeq representam as posições axiais e equatoriais dos oxigênios, respectivamente. Fonte: Mirgorodsky et al. (2000) [9]. O átomo de telúrio com coordenação 3+1 apresenta um valor intermediário entre 3 e 4. É um poliedro TeO3+1 assimétrico onde uma distância de ligação axial Te–O é menor e a outra mais alongada. O átomo de telúrio é ligado à 3 átomos de oxigênio e um quarto à uma distância superior à 2,2 Å. Quando a quarta distância Te–O torna-se superior à 2,58 Å, considera-se que o telúrio é tricoordenado. Te–Oax é grande o suficiente para fazer com que sua interação com o telúrio seja desprezível. O agrupamento se descreve então como uma pirâmide trigonal TeO3, onde no topo está localizado o átomo de telúrio e a base é formada pelos átomos de oxigênio. As três ligações curtas Te–O apresentam uma distância em torno de 1,88 Å [26]. De posse destas informações, podemos afirmar que essa coordenação resulta de uma evolução progressiva: TeO4 → TeO3+1 → TeO3. Capítulo 3 Mecanismos de Nucleação e Cristalização 3.1 Cinética de Formação Vítrea A capacidade para a formação de vidro, do ponto de vista cinético, pode ser entendida como uma medida da relutância do sistema em sofrer cristalização durante o resfriamento do fundido. Assim sendo, a formação de vidro pode ser considerada em termos de uma competição entre as velocidades de cristalização e de resfriamento [12]. Inicialmente, para que se tenha a formação de um vidro a partir do processo de fusão– resfriamento, é de fundamental importância levar em consideração a taxa de resfriamento a que o fundido foi submetido, pois muitos vidros que cristalizam completamente com o resfriamento lento, não cristalizam com o resfriamento rápido. A partir daí passou-se a se questionar qual deveria ser a taxa de resfriamento necessária para que um líquido se tornasse um vidro e então os estudos foram direcionados para os processos de nucleação e crescimento de cristais. Em seguida, verificou-se que para uma taxa de nucleação elevada, a cristalização de um vidro se dava de forma rápida e completa. Assim, a condição para que houvesse a formação de um vidro era evitar a nucleação rápida. A busca para as condições de vitrificação tornaram-se então, aquelas de não-cristalização, nas quais as teorias cinéticas de transformações de fases podem ser aplicadas. Com o objetivo de compreender a capacidade de um material em não tornar-se cristal, precisamos, então, entender o processo de cristalização [27]. Formalmente, o termo cristalização se refere à combinação de dois processos: nucleação e crescimento. A etapa de nucleação tem lugar quando o sistema começa a se ordenar em alguns pontos, chamados núcleos. Já a cristalização requer primeiro a formação de um número razoável de núcleos cristalinos, e então, a ocorrência de uma taxa de crescimento de cristais. Na verdade, as duas etapas podem ocorrer simultaneamente, 27 mas são distintas com relação à lei de velocidades que obedecem. A etapa de nucleação é muito importante, pois se não houver núcleos presentes a cristalização jamais ocorreria [12]. Por sua vez, o impedimento do crescimento pode acarretar a existência de núcleos com tamanho muito reduzido, a ponto de não serem detectados, mas o material, em termos práticos, ainda poderá ser considerado um vidro. Neste contexto, as velocidades de nucleação e crescimento, juntamente com a taxa de resfriamento, determinam se um vidro é ou não formado. De acordo com Zanotto [28], o controle da cristalização de vidros inorgânicos é re- quisito essencial para a obtenção de materiais avançados, tais como peças para aplicação em microondas e eletrônica, ossos artificiais e memórias ópticas. Seja para atingir esses objetivos, seja para evitar a devitrificação durante a fabricação ou uso de artefatos de vidro, é fundamen- tal um entendimento detalhado dos mecanismos de cristalização, através de estudos teóricos e experimentais. 3.2 Processos de Nucleação Nucleação é o processo de formação de pequenas estruturas cristalinas precipitadas em uma nova fase, originada a partir de uma fase já existente e separadas desta por uma superfície bem definida. A nucleação de cristais em vidros apresenta considerável importância científica e tecnológica. De especial interesse é a formação de vidros, que depende da ausência de nucleação cristalina durante o resfriamento de líquidos fundidos [29]. A formação de núcleos depende da formação de embriões, ou aglomerados, que cons- tituem o sistema inicial para o desenvolvimento de regiões ordenadas. Estes embriões apresentam variações constantes no tamanho e são criados e destruídos conforme existam mudanças estru- turais devidas à agitação térmica. Existe, entretanto, um tamanho crítico em que os embriões passarão a não serem destruídos e formarão uma nova fase cristalina, o núcleo [27]. A nucleação que ocorre em uma maneira totalmente aleatória através do material como um todo é dita homogênea. A condição necessária para isto ocorrer é que todos os elementos de volume da fase inicial devem ser estrutural, química e energicamente idênticos. Isso só é possível se todo o volume da fase for quimicamente homogêneo e sem imperfeições estruturais. Na prática, isso é difícil de se alcançar: a própria superfície constitui uma imperfeição inevitável e as impurezas também podem estar presentes. Neste caso, a energia necessária para a formação de um núcleo é diminuida nestes sítios e a nucleação ocorrerá preferencialmente na interface. Este processo é chamado de nucleação heterogênea. Esse tipo de nucleação é difícil de evitar e é questionável se uma nucleação totalmente heterogênea é possível. Discutiremos mais amplamente 28 esses dois fenômenos na próxima seção. De acordo com Araújo (1998) [27], se não houver a presença de núcleos, não haverá o crescimento de cristais e, consequentemente, o material formará um vidro. Se somente alguns núcleos estiverem presentes, mas não houver o crescimento de cristais, o tamanho demasiada- mente pequeno e a pequena fração do volume impedirão sua detecção, o que fará com que, na prática, o sólido ainda seja um vidro. Esse processo de nucleação e crescimento de cristais pode ser visualizado na Figura 06, a qual ilustra a variação da taxa de nucleação (I) e da taxa de crescimento de cristais (u) em função da temperatura. FIGURA 06: Variação da taxa de nucleação (I) e a taxa de crescimento de cristais (u) em função da temperatura. Fonte: Araújo (1998) [27]. Observando a Figura 06, estão representadas a taxa de nucleação (I), a qual repre- senta o número de núcleos produzidos em uma unidade de volume por unidade de tempo, e a taxa de crescimento de partículas (u). Tf representa a temperatura de fusão, acima da qual o líquido permanece em uma fase estável. Quando o líquido é rapidamente resfriado abaixo de Tf, o crescimento de cristais se torna possvel entre Tf e T2. Contudo, o processo inicial de nucleação ocorre entre T1 e T3, sendo uma condição necessária antes que o crescimento seja possível [27]. Notamos que existe uma região entre T1 e T2 na qual é verificada a cristalização. Como o cresci- mento de cristais é diretamente dependente à formação de núcleos, a cristalização dependerá do tamanho da área superposta das curvas I e u (região entre T1 e T2). Se a região compreendida pelo intervalo T1–T2 for pequena, nenhuma cristalização ocorrerá e o sistema passará para o estado vítreo. Se I e u são grandes e há uma superposição razoável entre as curvas, haverá grande possibilidade de uma completa cristalização. Se no intervalo T1–T2 a taxa I for pequena e u grande, ocorrerá a cristalização de um pequeno número de cristais no interior da fase amorfa. 29 Por fim, se I for grande e u pequena, teremos a formação de um material parcialmente cristalino com grãos muito pequenos. Este assunto será abordado mais profundamente na próxima seção. 3.3 Modelos Teóricos de Nucleação 3.3.1 Teoria Clássica de Nucleação (CNT) A teoria utilizada para descrever o fenômeno de transição de fase de primeira ordem, conhecida por Teoria Clássica de Nucleação (CNT) foi apresentada por Volmer e Weber no ano de 1925. Na sequência, Becker e Doring aperfeiçoaram o modelo para predições quantitativas do fenômeno de nucleação. Ainda que de acurácia questionável [30], a CNT lançou luz sobre um grande fenômeno de importância tecnológica. Com o avanço das técnicas de nucleação e medidas mais acuradas, o modelo mostrou-se inconsistente [30], fazendo com que várias correções fossem propostas à CNT, as quais serão abordadas mais adiante. A CNT descreve o primeiro estágio da formação dos embriões. Dependendo da origem dos primeiros núcleos formados, a nucleação pode ser classificada como volumétrica (ou interna), onde os embriões se formam no interior do vidro ou superficial, onde eles ocorrem a partir da superfície e crescem em direção ao interior do vidro [31]. A taxa na qual um núcleo cristalino cresce na matriz vítrea depende da taxa na qual os átomos se movimentam e permanecem na superfície do cristal. Estes podem ser originados de uma nucleação homogênea ou heterogênea. 3.3.1.1 Nucleação Homogênea A nucleação homogênea ocorre quando o sítio inicial para formação de núcleos é de mesma constituição dos cristais que crescem sobre ele, ou seja, ela ocorre aleatoriamente no interior dos vidros e não há sítios preferenciais para a cristalização, constituindo-se como uma condição necessária para que este tipo de nucleação ocorra a matriz vítrea ser química, estrutural e energeticamente homogênea. A força motriz para a formação de um cristal no interior de um líquido super-resfriado I ′, de mesma composição é a diferença de energia livre entre as duas fases, em condições de pressão e temperaturas constantes, como é mostrado na Figura 07. A diferença de energia livre entre as duas fases é negativa e é dada por: 30 ∆G = Gl −Gc (3.1) com Gl representando a energia livre de Gibbs da fase líquida e Gc da fase sólida. FIGURA 07: Energia livre de Gibbs (G) de um cristal (c) e de um líquido (l) próximo à tem- peratura de fusão. As curvas contínuas representam as fases estáveis e as tracejadas representam as fases metaestáveis (líquido super-resfriado (l′) e cristal super-aquecido (c′)). Fonte: do próprio autor. Durante a nucleação também ocorre a formação de uma interface entre a fase líquida e a nova fase cristalina. Ocorre também variação de energia livre por unidade de volume. A variação de energia livre total envolvida na formação de um embrião esférico e isotrópico de raio r é dada por: ∆Gr = −4 3 πr3∆Gv + 4πr2∆Gs (3.2) sendo ∆Gv a variação de energia livre por unidade de volume resultante da transformação de uma fase em outra e ∆Gs a variação de energia livre por unidade de área superficial entre as duas fases. ∆Gs que pode ser igualada à tensão superficial (σ) e ∆Gv pode ser dada por: ∆Gv = ∆G Vm (3.3) sendo Vm o volume molar. De acordo com a equação (3.2), quando r é pequeno, o termo da energia interfacial predomina e ∆Gr é positivo, o que determina uma condição de instabilidade. Porém, quando r aumenta, o termo ∆Gv prevalesce e ∆Gr é negativo, determinando uma condição de estabilidade, conforme prevê a Termodinâmica. 31 A Figura 08 apresenta a variação da energia livre em função do raio do embrião e as componentes da energia superficial e volumétrica, a uma temperatura constante, abaixo da temperatura de equilíbrio. Também é possivel observar a existência de um raio crítico r∗ associado a um máximo em ∆G, indicado por ∆G∗. FIGURA 08: Variação das energias livres volumétrica, superficial e total com o raio de um embrião. Fonte: Zanotto (1985) [32]. As coordenadas de ∆G∗ podem ser obtidas derivando-se a equação (3.2) em relação à r e igualando-a a zero e, em seguida, utilizando este resultado na expressão da variação da energia livre total. Desta forma, r∗ = 2σ ∆Gv (3.4) e ∆G∗ = 16πσ3 3 (∆Gv )2 (3.5) Dessa forma, os embriões que possuem raio menor que r∗ são instáveis e tendem a se dissolver, enquanto que aqueles que possuem raio maior que r∗ são estáveis e tendem a crescer. A probabilidade, P , de formação de um núcleo maior que o crítico, à temperatura T , é igual a: P = nv exp ( −∆G∗ kBT ) (3.6) com nv sendo o número de moléculas por unidade de volume e kB a constante de Boltzmann. 32 O número de vezes por segundo que um átomo tenta atravessar a interface líquido- cristal é dada pela frequência vibracional do átomo, ν, e a probabilidade, P ′, de uma tentativa de sucesso é dada por: P ′ = exp ( −∆GD kBT ) (3.7) sendo ∆GD a barreira de ativação para o transporte através da interface líquido-núcleo. Somente aqueles átomos que são adjacentes à interface estão em uma posição para se anexar ao embrião. Se este número é nv, então o número de átomos, N , atravessando a interface por segundo é: N = nvν exp ( −∆GD kBT ) (3.8) sendo ν = kT h e h a constante de Planck. A taxa de formação de núcleos, I, é dada pelo produto do número de núcleos de tamanho crítico presentes por unidade de volume, P , é a taxa na qual os átomos são anexados ao embrião, N . Desta forma, tem-se [32]: I = nvν exp [ −(∆GD + ∆G∗) kBT ] (3.9) Assume-se, convencionalmente, que o transporte na interface ∆GD está relacionado com o coeficiente de difusão, D, por [33]: D = a2 0ν exp ( −∆GD kBT ) (3.10) com a0 e ν representando a distância e a frequência do salto, respectivamente. Dessa forma, combinando-se as equações (3.9) e (3.10), temos a seguinte equação para a taxa de nucleação homogênea: I = nvD a2 0 exp ( −∆G∗ kBT ) (3.11) Em muitos sistemas formadores de vidro, ∆GD geralmente é alta, então ∆G∗ deve ser baixa para que ocorra nucleação em tempo razoável. 33 3.3.1.2 Nucleação Heterogênea Na nucleação heterogênea os núcleos formam-se sobre partículas já existentes de composição diferente à do material fundido. Este tipo de nucleação ocorre em sítios preferenciais, tais como: trincas, bolhas, interface cristal-líquido, discordâncias ou partículas de impureza existentes no vidro. Essas superfícies diminuem a energia interfacial σ, favorecendo uma redução do valor da barreira termodinâmica para a nucleação. Se a nucleação ocorre no contorno de fase entre o vidro e o ar, então a cristalização se dá a partir da superfície em direção ao volume do vidro e é chamada de nucleação superficial. Neste caso, podemos dizer que a nucleação superficial é do tipo heterogênea. A Figura 09 ilustra um núcleo cristalino, de raio r, formado a partir de um líquido, L, super-resfriado, em uma superfície plana de fase sólida, S. FIGURA 09: Formação de um núcleo cristalino sobre uma superfície sólida [34]. Fonte: Zanotto (1985) [32]. A variação de energia livre envolvida nesse tipo de nucleação, de acordo com Paul (1995) [34] é dada por: ∆G = ( Vn Vm ) ∆Gv + Slcσlc + Scs (σcs − σls) (3.12) sendo Vn o volume do núcleo, Vm o volume molar da fase cristalina, Slc e Scs, as áreas da interface líquido–cristal e cristal–superfície, respectivamente, e σlc, σcs e σls as energias interfaciais entre líquido–cristal, cristal–superfície e líquido–superfície. Supondo que haja o equilíbrio entre as três fases, temos: ∆G∗het = 16πσ3 lcNaV 2 m 3∆G2f (θ) = ∆Ghomf (θ) (3.13) 34 sendo f (θ) = ( 2− 3 cos θ + cos3 θ 4 ) (3.14) e r∗ = −2σlcVm ∆Gv (3.15) Assim, a expressão para o raio crítico da calota é semelhante àquela da esfera formada na nucleação homogênea. Sendo f (θ) ≤ 1 para 0 ≤ θ ≤ π, a energia livre, ∆Ghet, envolvida na formação da calota só não será menor do que aquela envolvida na formação do cristal, nos casos em que f (θ) = 1. De acordo com James (1985) [35], a taxa de nucleação heterogênea, Ihet, de um substrato sólido sobre um líquido super–resfriado é dada por: Ihet = Ns ( kBT h ) exp { − [ (∆G∗het + ∆Ga) kBT ]} (3.16) sendo Ns o número de unidades estruturais do líquido em contato com o substrato por unidade de área. Assim, pode-se concluir que a presença da superfície estranha causa a redução da barreira termodinâmica para a nucleação. 3.3.1.3 Crescimento de cristais Os núcleos de tamanho crítico podem continuar crescendo por deposição sucessiva de material até formar cristais propriamente ditos. Este processo de crescimento depende muito mais do que a nucleação, das possibilidades de transporte dos constituíntes químicos até o cristal em desenvolvimento. A velocidade de crescimento dos cristais apresenta, da mesma forma que a nucleação, um máximo em função da temperatura. A temperaturas elevadas, o crescimento é pequeno, como consequência da dificuldade para dissipar do sistema o calor liberado durante a cristalização. A temperaturas baixas, quando esta liberação é favorecida, seu crescimento é freado pelo contínuo e rápido aumento da viscosidade do vidro, o que dificulta a difusão dos elementos constituintes do cristal. O crescimento de cristais a partir de núcleos formados por nucleação heterogênea é o caso mais comum. Esta nova fase receberá da matriz vítrea unidades estruturais, átomos ou moléculas, e tenderá a crescer com o tempo de tratamento térmico. Para que isso ocorra é necessário que a frequência de saltos do vidro para os núcleos, vl′c, seja maior que a frequência de saltos no sentido oposto, vcl′ . 35 Em geral, é bem aceito pela literatura que a natureza da interface cristal–vidro tem uma influência decisiva sobre a cinética de cristalização e as morfologias dos cristais. A Figura 10(a) representa a forma com que os átomos estão arranjados na fase cristalina e vítrea na interface λ entre elas. Para que estes átomos atravessem λ, eles necessitam vencer a barreira de energia ∆G. Na Figura 10(b), ampliando-se o quadro para um duplo poço de potencial, percebe-se com maior nitidez, ∆G. FIGURA 10: (a) Ilustração do arranjo dos átomos na interface líquido–cristal. (b) Duplo poço de potencial representando o mecanismo de crescimento de cristais. Fonte: Paul (1995) [34]. As frequências de saltos do líquido para o cristal, vl′c e vice-versa, vcl′ , são dadas pelas seguintes expressões: vl′c = ν exp ( −∆G′′ RT ) (3.17) e vcl′ = ν exp ( −|∆G|+ ∆G′′ RT ) (3.18) A taxa de crescimento de cristais é: U = λ (vl′c − vcl′) (3.19) Substituindo na equação (3.19) os valores de vl′c e vcl′ das equações (3.17) e (3.18), obtemos: U = λν exp ( −∆G′′ RT )[ 1− exp ( −|∆G| RT )] (3.20) 36 Existem três modelos para descrever o crescimento de cristais em vidros: crescimento normal, em espiral e controlado por nucleação superficial secundária. De acordo com o modelo de crescimento normal, os átomos podem ser incorporados em qualquer sítio da interface líquido– cristal. Para pequenos super–resfriamentos, |∆G| � RT , e assim: 1− exp ( −|∆G| RT ) ≈ |∆G| RT (3.21) Substituindo-se esta equação na equação (3.20), tem-se: U = λν |∆G| RT exp ( −∆G′′ RT ) (3.22) Portanto, U é diretamente proporcional à força motriz termodinâmica, ∆G, ou seja, U aumenta para pequenos ∆T . Para grandes ∆T , |∆G| � RT , assim: exp ( −|∆G| RT ) � 1 (3.23) Logo, a equação (3.20) se reduz a: U = λν exp ( −∆G′′ RT ) (3.24) Desta forma, logU é proporcional a 1/T , ou seja, U diminui para grandes ∆T . Considerando a equação de Stokes–Einstein: D = kBT 3πηλ (3.25) com η sendo a viscosidade e supondo que as barreiras cinéticas para nucleação, ∆GD e cresci- mento, ∆G′′, sejam da mesma ordem de grandeza, obtém-se: U = RT 3πNaηλ [ 1− exp ( −|∆G| RT )] (3.26) No entanto, o modelo normal de crescimento nem sempre corresponde à realidade, porque, geralmente, o crescimento ocorre por mecanismos em que os átomos ocupam sítios energe- ticamente favoráveis, os quais se originam das imperfeições existentes na interface cristal–líquido. No modelo de crescimento em espiral, assume-se que a interface seja lisa, mas im- perfeita em escala atômica, e o crescimento acontece em sítios existentes nas discordâncias em espiral, interceptando a interface. A fração de sítios disponíveis pode ser aproximada por [36]: 37 f ≈ − ∆T 2πTf (3.27) Introduzindo este fator no lado direito da equação (3.20), obtemos a taxa de cresci- mento no modelo em espiral em função da temperatura, a qual é expressa por: U = ∆T 2πTfλ exp ( −∆G′′ RT )[ 1− exp ( −|∆G| RT )] (3.28) Observa-se, então, que U é diretamente proporcional a f . No modelo de crescimento controlado por nucleação superficial secundária, a interface é lisa em escala atômica e livre de discordâncias. O crescimento ocorre devido à formação e crescimento de um núcleo bidimensional na interface. Independentemente do tamanho do cristal que cresce sobre a superfície, a taxa de crescimento do cristal é expressa por [36]: U = C exp ( −∆G′′ RT ) exp [ − B T |∆G| ] (3.29) sendo B e C constantes que, dependendo da relação entre o tempo de formação do núcleo e o de sua propagação através da interface, assumem valores diferentes. Quando o tempo de formação é maior que o de propagação (pequenos cristais), tem-se: C ≈ λNsA0 (3.30) e B = πλVmσ 2 E kB (3.31) sendo Ns o número de átomos por unidade de área na interface, A0 a área da inferface e σE a energia superficial específica do núcleo. Para o caso mais geral, em que a taxa de propagação deve ser considerada (grandes cristais), tem-se: C ∼= (π/3) 1/3 Γ (4/3) N 1/3 s λ 5/3 [ 1− exp ( −|∆G| RT )]2/3 (3.32) e B = πλVmσ 2 E 3kB (3.33) sendo Γ a função matemática gama. Para distinguir esses modelos de crescimento entre si, geralmente se utiliza a taxa de 38 crescimento reduzida, que é expressa por: Ur = Uη[ 1− exp ( − |∆G|RT )] = bf λ (3.34) sendo b uma constante. Nesta equação, Ur é diretamente proporcional a f . Materiais que apresentam crescimento normal possuem gráficos Ur x T caracterizados por uma reta horizontal (inclinação nula). Já aqueles que crescem em espiral têm gráficos Ur x T caracterizados por uma reta com inclinação positiva. E os que crescem por nucleação superficial secundária apresentam gráficos de ln (Uη) x 1/T∆G com inclinação negativa. Os máximos das curvas das taxas de nucleação e crescimento de cristais e o ponto das mesmas não necessitam ser coincidentes. A primeira é situada, em geral, a temperaturas mais baixas que a segunda. A cinética com que transcorrem os processos de nucleação e crescimento influi no resultado final da cristalização. Se o resfriamente acontece com mais rapidez nas imediações da temperatura onde ocorre a taxa máxima de nucleação e com lentidão no intervalo em que se en- contra o máximo de crescimento de cristais, o resultado será um pequeno número de cristais com tamanho elevado. Ao contrário, um resfriamento lento na região de máxima taxa de nucleação levará à formação uniforme de numerosos cristais mais ou menos desenvolvidos segundo a taxa com que se continua resfriando o vidro a partir deste momento [31]. A Figura 11 (a) e (b) mostra pequena e grande sobreposição das curvas das taxas de nucleação e crescimento dos cristais. Na prática industrial é muito importante determinar a curva adequada de resfria- mento do vidro, em alguns casos para evitar cristalizações indesejáveis, e em outros, para obtê-las controladamente. FIGURA 11: (a) Pequena e (b) Grande sobreposição das curvas de nucleação e de crescimento de cristais. Fonte: Paul (1995) [34]. 39 No caso de tratamento térmico simples, se a sobreposição entre as curvas da taxa de nucleação e crescimento é pequena (ou seja, se as taxas de crescimento forem muito baixas a temperaturas correspondentes a altas taxas de nucleação), a observação de cristais nucleados e a estimativa da densidade do número de cristais se tornam tarefas muito difíceis. Por este motivo, Tamman (1985) [31] propôs para estes casos o seguinte procedimento: cristais nucelados em termperaturas baixas, TN , são crescidos até tamanhos microscópicos a temperatauras mais altas TU . Para isso, a temperatura de crescimento, TU , deve obedecer as seguintes condições: I (TN )� I (TU ) e U (TU )� U (TN ), para as taxas de nucleação I e crescimento de cristais U . Assim sendo, são utilizados tratamentos térmicos em dois estágios, sendo o primeiro estágio feito a temperaturas próximas a Tg, para promover a nucleação, e o segundo estágio feito a temperaturas mais altas, para promover o crescimento dos cristais. 3.3.2 Teoria Clássica de Nucleação, Adaptada por Turnbull e Fis- cher A Teoria de Nucleação Clássica Volmer–Weber–Becker–Doring, assim também de- signada, foi adaptada por Turnbull e Fischer pra a transição líquido–sólido, com a posterior suposição, não inclusa originalmente na CNT, que o fenômeno difusional envolvido na nucleação pode ser relacionado com o fluxo viscoso pela equação de Stokes–Einstein [37], a equação geral fica: I = A η exp [ − W ∗ kBT ] (3.35) com W ∗ representando a barreira termodinâmica para a formação de um núcleo com tamanho crítico η é a viscosidade e T é a temperatura absoluta. A é uma constante pré-exponencial, dada por: A = 2Nv 1 3 (kBTσ∞) 1 2 3πλ3 (3.36) com N representando o número de moléculas por unidade de volume molar, v é o volume mo- lecular, σ∞ a energia interfacial de um cristal macroscópico e λ = v1/3 a distância do salto, da ordem de dimensões atômicas. A barreira termodinâmica é dada por: W ∗ = 16πσ3 ∞ 3∆G2 v (3.37) com ∆Gv sendo a energia livre por unidade de volume. 40 Nas equações (3.36) e (3.37), a energia livre superficial é considerada constante e independente tanto da temperatura, quanto do tamanho do núcleo. A CNT assume que σ∞ é igual àquela apresentada por um cristal de tamanho infinito, sendo dada empiricamente pela equação: σ∞ = α∆Hf N 1 3 AV V 2 3 m (3.38) com α representando o coeficiente de proporcionalidade, determinado experimentalmente e pode ser < 0,4 ou > 0,6. ∆Hf é o calor de fusão molar, NAV o número de Avogadro e Vm o volume molar. A curva teórica da taxa de nucleação apresenta, da mesma forma que os resultados experimentais, um aumento até atingir uma taxa máxima Imax a uma determinada temperatura Tmax, e depois uma queda com o aumento da temperatura. Essa curva pode ser deslocada para a direita ou para a esquerda, simplesmente variando o fator de proporcionalidade α na equação (3.37). O seu valor é tomado como aquele que ajusta a curva teórica de modo que a temperatura de máxima taxa de nucleação Tmax coincida com aquela da curva determinada experimentalmente [38]. Neste caso, α é o único parâmetro de ajuste entre as curvas teórica e experimental, e seu valor é utilizado para se determinar a tensão superficial σ∞, através da equação (3.38). Portanto, a determinação da tensão superficial só é possível após a determinação de α, o que por sua vez só é factível quando se tem a temperatura de máxima taxa de nucleação no volume, obtida experimentalmente [37]. 3.3.3 Teoria Clássica de Nucleação Modificada (CD–CNT) Manrich e Zanotto (1995) [37] modificaram a CNT, numa tentativa de melhorar a estimativa teórica. A equação modificada, com um parâmetro ajustável, expressando dependên- cia com a curvatura, aplicada à análise da cinética de nucleação homogênea em um vidro de dissilicato de lítio mostrou melhora substancial, comparada com a equação clássica. Nessa modificação, considerou-se que a energia livre interfacial não é uma constante, mas sim uma variável dependente do tamanho do núcleo σ = σ(r). Assumiu-se que a variação de σ poderia ser descrita pela equação de Tolman, válida para tensão interfacial líquido–sólido: σ(r) = σ∞ ( 1 + 2δ r )−1 (3.39) 41 = α∆Hf N 1 3 AV V 2 3 m ( 1 + 2δ r )−1 (3.40) com 2δ representando a distância do salto através da interface núcleo–matriz, da ordem de v1/3, δ é conhecido por parâmetro de Tolman, cujo valor é estimado como sendo metade da espessura da interface entre as fases líquida e gasosa de um sistema fluído. Substituindo σ∞ por σ(r) na determinação da barreira termodinâmica para a for- mação do núcleo de tamanho crítico, chega-se à equação da Teoria Modificada CD–CNT, cuja taxa de nucleação homogênea é dada por: ICD−CNT = A′ η exp [ −W ′∗ kBT ] (3.41) com os valores de A’ e W’* obtidos, respectivamente, por: A′ = 2Nv 1 3 (kBTb) 1 2 (a+ b+ c) 1 2 3πλ3 (b+ c) 1 2 (3.42) com: a = 2δ∆Gv; b = σ∞; c = (σ2 ∞ − 2δ∆Gvσ∞) 1 2 ou c = (b2 − ab) 1 2 . W ′∗ = H { 4b4 + 5ab3 + 2a2b2 + 5a3b+ c [ −a3 + 4b3 + 7ab2 + 6a2b ]} (3.43) com: H = 4π 3∆G2 v(b+ c) (3.44) Assumindo 2δ = v1/3, o valor de α na CD–CNT, como na CNT, é o único parâmetro utilizado no ajuste da temperatura de máxima taxa teórica e para o cálculo de σ(r) [37]. 3.3.4 Teoria de Nucleação Adiabática (TNA) Meyer (2010) [39] publicou artigos em que desenvolve uma teoria denominada Teoria de Nucleação adiabática (TNA), a qual mostra que existe um limite de estabilidade na transição líquido–sólido, perto da qual o líquido se solidifica por nucleação adiabática homogênea. Na realidade, essa teoria foi proposta há alguns anos e atualmente se encontra solidificada. De acordo com Zanotto (1985) [29], a TNA é pautada em algumas suposições: 42 1. Os calores específicos molares das fases líquidas cpl e sólidas cps no ponto de fusão, são obtidos pela soma de ambos, multiplicado por 0,5 e esse valor deve ser constante; portanto cp representa o calor específico médio; 2. A tensão interfacial sólido–líquido é dependente do tamanho do núcleo e é dada pela equação de Tolman (3.39); 3. A entalpia de fusão depende também do tamanho do núcleo; 4. O tamanho mínimo para um núcleo crítico Nw corresponde à unidade primitiva de Wigner– Seitz, isto é, 13 moléculas para uma estrutura fcc ou hcp e 15 moléculas para uma estrutura bcc. Esta teoria fornece a temperatura máxima de super resfriamento TNw , e o limite de estabilidade para a fase líquida TµNw , em função do número de moléculas que formam o núcleo. É ainda assumido que TµNw é alcançada por Nw moléculas através de flutuações estatísticas ordinárias (de temperatura), e não por flutuações heterofásicas, da temperatura mais alta TNw > TµNw [29]. Para Nw=14 moléculas, temos: Tµ14 TM = 0, 6 [ x exp(x)− 1 ] (3.45) com Tμ14 representando a temperatura de estabilidade; TM é a temperatura de fusão e x = ∆Hlf (cpTM )−1, na qual ΔHlf é o calor latente de fusão e cp é o calor específico médio da fase líquida e sólida, à temperatura de fusão [40]. Este modelo foi utilizado para prever se metais líquidos puros, polímeros e óxidos metálicos fariam núcleos homogeneamente ou não [41]. Tμ14 na equação (3.45) indica a formação de núcleos com 14 moléculas, e deve estar próxima do limite de estabilidade para a fase líquida. Se existir este limite, é razoável assumir que o mesmo é próximo à temperatura onde a probabilidade de nucleação é máxima (Tmáx). O cálculo de Tμ14 é mais fácil do que o de Tmax e leva a um número menor de erros, pois não é necessário o conhecimento de η, ΔG e α [29]. Para os sistemas onde Tg > Tμ14 , não é esperada nucleação homogênea. Tais ma- teriais podem ser classificados como bons formadores de vidro [40]. Nos casos em que Tg∼= Tμ14 , a nucleação homogênea (ou heterogênea) pode ser evitada por resfriamento rápido e a temperatura de transição vítrea pode ser aumentada acima de Tμ14 . É bem conhecido que a Tg varia de acordo com a taxa de resfriamento [1]. Sistemas em que a Tg se aproxima de Tμ14 são ditos formadores de vidros instáveis [40]. 43 Quando Tg < Tμ14 , nenhuma formação de vidro é esperada, quando os líquidos são resfriados a partir da massa fundida, porque estes materiais nucleiam e cristalizam perto de Tμ14 , antes de terem uma chance de congelarem próximo à Tg. No entanto, neste caso, a Tg não pode ser encontrada experimentalmente e a relação Tg < Tμ14 deve obrigatoriamente ser postulada sempre que a Tg não pode ser encontrada experimentalmente [40]. 3.4 Cristalização em Vidros O controle da formação de novas fases cristalinas, através do resfriamento de um lí- quido pode ser estudado através da cristalização. A cristalização designa o fenômeno através do qual fases desordenadas dão origem a um sólido estruturalmente ordenado e estável [18]. Subs- tâncias vítreas sob condições apropriadas podem transformar-se em espécies cristalinas estáveis e, neste caso, o processo de cristalização denomina-se devitrificação, uma vez que este processo é entendido como sendo o oposto da formação vítrea. A devitrificação é composta pelos mecanis- mos de nucleação e crescimento de cristais. Dentro destes dois processos o rearranjo e a difusão atômica estão presentes. A nucleação é um processo crítico na formação da estrutura cristalina, porém o crescimento de cristais é de importância fundamental na determinação da morfologia do cristal. O processo de crescimento de cristais está intimamente relacionado à formação de núcleos. Após estes se formarem, o material pode ser submetido à um tratamento térmico onde cristais crescerão. A complexidade deste processo se dá a partir da possível formação de diferentes fases cristalinas simultâneas. Geralmente, a composição do cristal é diferente da composição da matriz vítrea. Isto indica que a composição da interface cristal – vidro está variando ininterruptamente [42]. A devitrificação está relacionada com o processo de obtenção das vitrocerâmicas. Vitrocerâmicas são definidas como “sólidos policristalinos produzidos à partir da devitrificação controlada de vidros” [34]. O tratamento térmico controlado do vidro resulta na nucleação e crescimento de fases cristalinas dentro da matriz vítrea. Nas vitrocerâmicas as fases cristalinas são inteiramente produzidas à partir de uma fase vítrea homogênea, o que distingue estes mate- riais das cerâmicas tradicionais. As vitrocerâmicas são distinguidas dos vidros pela presença de microcristais, já que o vidro é um material amorfo ou não-cristalino. O resultado final da cristalização é fortemente influenciado por ambos os processos de nucleação e crescimento de cristais. A cristalização pode ser superficial ou volumétrica, sendo que a primeira ocorre na superfície livre do componente e seu crescimento é perpendicular a essa 44 superfície. Já a cristalização volumétrica ocorre quando os cristais se formam ao longo de todo o volume de um componente originalmente constituído pelo vidro precursor. Técnicas de aná- lises térmicas como a análise térmica diferencial (DTA) e a calorimetria exploratória diferencial (DSC) são empregadas com frequência no estudo das propriedades cinéticas. Os métodos isotér- mico e não-isotérmico são constantemente empregados na obtenção dos parâmetros que regem o comportamento cinético da cristalização. Embora medidas isotérmicas apresentem, na maioria dos casos, resultados mais precisos, análises não-isotérmicas tornam-se mais vantajosas princi- palmente pelo menor tempo com a qual essas medidas são realizadas em um amplo intervalo de temperatura. 3.5 Estudo da Cinética de Cristalização: Teoria JMAK A cinética do processo de cristalização é usualmente descrita pela teoria desenvolvida no período de 1937–1939 por Kolmogorov, Johnson, Mehl e Avrami, denominada teoria JMAK [43]. Desde aquele tempo essa teoria têm sido empregada por cientistas de materiais de todo o mundo para o estudo de vários mecanismos de transformações de fases em metais, sendo atual- mente empregada com sucesso no estudo de vidros e polímeros. Exemplos de sua importância tecnológica incluem estudos sobre estabilidade de vidros metálicos, tempo de devitrificação dos vidros, vitrocerâmicas e cálculos cinéticos de formação dos vidros [43]. A teoria JMAK parte do princípio, assumido por Avrami, de que um sistema passível de transformação de fase é composto por embriões da nova fase. Esses embriões são arranjos aleatórios e transitórios de moléculas, inerentes do processo de preparo ou formados devido a tratamentos térmicos específicos, com composições semelhantes às moléculas da nova fase. Uma vez iniciada a mudança de fase, alguns desses embriões começam a crescer, adquirindo estabili- dade termodinâmica e não se dissolvendo, atingindo um tamanho crítico e transformando-se em núcleos. No processo, o número de embriões decai com o tempo, devido a dois mecanismos: em- briões que se transformam em núcleos e embriões que são absorvidos por núcleos em crescimento [44, 45]. Assim, a cristalização ocorre devido às aglomerações de núcleos em crescimento que é descrita por processos isotérmicos ou não-isotérmicos. No método isotérmico, a amostra é aquecida acima da temperatura de transição vítrea e o calor absorvido durante o processo de cristalização é medido como uma função do tempo. Por outro lado, no método não-isotérmico, a amostra é aquecida a uma taxa fixa e, em seguida a alteração na entalpia é registada como uma função da temperatura. Este método é útil na obtenção de parâmetros cinéticos relacionados com o processo de cristalização de vidro 45 devido à sua rapidez. A equação de Kissinger é uma das equações comumente utilizada para calcular a maioria dos dados cinéticos [46]. 3.5.1 Tratamento Isotérmico A teoria JMAK foi desenvolvida quando núcleos são distribuídos aleatoriamente e a taxa de crescimento é dependente da temperatura sobre as condições isotérmicas. A mudança da fração de cristalização x em relação ao tempo é expressa pela equação: x = 1− exp [− (Kt)n] (3.46) com t representando o tempo efetivo e n o expoente de Avrami, o qual depende do mecanismo de crescimento e da dimensionalidade do cristal, e K a constante cinética definida como a taxa de reação efetiva, a qual depende da temperatura e é expressa pela equação de Arrhenius: K = B exp ( −EA RT ) (3.47) sendo EA a energia de ativação mínima necessária para inicio da formação dos cristais, ou, em outro entendimento, EA representa a barreira energética a ser vencida para que a cristalização ocorra, R a constante dos gases, T a temperatura isotérmica absoluta e B o fator de frequência. Aplicando duas vezes o logaritmo neperiano na equação (3.46) e rearranjando-a, a equação assume a forma da equação de uma reta, dada por: ln[−ln(1− x)] = n lnK + n lnt (3.48) Logo, a uma dada temperatura, os valores de n e k podem ser obtidos por meio do gráfico do ln[-ln(1–x )] versus lnt, como coeficientes angular e linear, respectivamente. A energia de ativação EA e o fator de freqüência B podem ser obtidos pela forma logarítmica da equação (3.47), por meio do gráfico do lnK versus 1/T, como coeficientes angular e linear, respectivamente: lnK = lnB ( −EA RT ) (3.49) A fração cristalizada em função do tempo pode ser obtida por intermédio dos picos de cristalização apresentados em uma curva de DSC. Os valores da cristalinidade [47] podem ser determinados por: 46 x(t) = ˆ t t0 ( dH dt ) dt [ˆ tf t0 ( dH dt ) dt ]−1 = A0 A (3.50) com t0 e tf representando os tempos de início e término da cristalização, respectivamente, H a entalpia e t um tempo intermediário qualquer. Os termos A0 e A são, respectivamente, a área parcial e total sob a curva de DSC. Determinando as áreas parciais e aumentando gradativamente até a área total, é possível obter-se a fração cristalizada fazendo a razão dos diferentes valores de áreas parciais pelo valor da área total, como ilustrado na Figura 12. FIGURA 12: Curva de DSC para o processo de cristalização entre o instante inicial t0 e o instante final tf. A0 é a área parcial, entre o instante inicial t0 e um instante qualquer t e A é a área total entre o instante inicial t0 e um instante final tf. Fonte: do próprio autor. O valor do expoente de Avrami corresponde ao tipo de nucleação, homogênea ou heterogênea, e também a dimensionalidade de crescimento dos cristais. Os valores de n =1 e n >1 indicam que a nucleação é superficial e volumétrica, respectivamente. Assim sendo, o expoente de Avrami para a nucleação volumétrica indica como ocorre o crescimento de cristais: n ≥ 4 , indica crescimento tridimensional dos cristais; n = 3, crescimento bidimensional; e n = 2 , crescimento unidimensional [48]. A taxa de cristalização é obtida através da diferenciação da equação (3.46) com relação ao tempo: x′(t) = nK(1− x) [−ln(1− x)] n−1 n (3.51) A equação (3.51) é conhecida como equação de JMAK e é frequentemente usada para a descrição formal dos dados da análise térmica de cristalização, entretanto, a mesma só é 47 válida somente para processos de cristalização isotérmicos. 3.5.2 Tratamento Não–Isotérmico No método não-isotérmico, os parâmetros cinéticos de cristalização do vidro podem ser obtidos através de monitoração do deslocamento do pico de cristalização, como uma função da taxa de aquecimento ou arrefecimento. Temperaturas de pico de cristalização Tp e frações de volume cristalizada x são determinadas a partir de curvas DSC. A estimativa da fração de volume cristalizado é mostrada na Figura 13. A fração de volume cristalizada em qualquer temperatura T é expressa como: x = ST S (3.52) com S representando a área total do pico exotérmico entre a temperatura Ti em que a cristalização começa e da temperatura Tf , em que a cristalização é completada e ST é a área parcial do pico exotérmico até a temperatura T. FIGURA 13: Representação gráfica para o cálculo da fração de volume cristalizada x. Fonte: Çelikbilek (2011) [46]. A teoria JMAK assume que a taxa de a taxa de aquecimento φ (dada pela taxa de variação da temperatura com relação ao tempo) seja constante para condições de cristalização não-isotérmica. Assim sendo, a temperatura do sistema varia ininterruptamente com o tempo a partir de uma temperatura inicial, de acordo com: T = T0 + φt (3.53) Como a temperatura muda constantemente com o tempo, K já não é mais uma constante, mas varia com tempo, e a equação (3.46) torna-se: 48 x = 1− exp [ − (ˆ t 0 K(t) dt )n] (3.54) Consideremos que a velocidade de cristalização é máxima no pico da curva de análise térmica, então, T = Tp e a derivada segunda de x com relação ao tempo é nula. Uma relação comum utilizada para derivar a energia de ativação dos dados de análise térmica, obtidos pela varredura não–isotérmica a diferentes taxas de aquecimento foi obtida por Kissinger [49]: ln ( T 2 p φ ) = EA RTp + ln ( EA R ) − lnB (3.55) Na equação (3.55), os argumentos dos ln do lado direito da igualdade são constantes. Assim, podemos reescrever a equação de Kissinger como sendo: ln ( T 2 p φ ) = EA RTp + constante (3.56) Fazendo um ajuste linear do gráfico de ln ( T 2 p φ ) versus T−1 p , é possível obter a energia de ativação EA associada ao processo de cristalização, visto que a inclinação será EA/R . O método de Kissinger é apropriado tanto para análises de reações homogêneas quanto para análises de reações heterogêneas de acordo com a equação de JMAK em experimento isotérmicos [50]. Matusita et al. [48] propuseram a modificação da equação de Kissinger: ln[−ln(1− x)] = −n lnφ− 1, 052 [ mEA RTp ] + constante (3.57) sendo m um fator numérico que depende da dimensão do crescimento do cristal relacionado com o parâmetro de Avrami, n. Esta relação permite obter o parâmetro de Avrami através do coeficiente angular do grafico do ln[−ln(1− x)] versus lnφ. A Tabela 05 apresenta os parâmetros n e m, que representa os valores da morfologia do crescimento, dependendo do mecanismo de cristalização. Como pode ser visto, diferentes valores de n e m são calculados para mecanismos de cristalização diferentes quanto à seguintes abordagens: 1. Quando a taxa de nucleação é zero, durante o experimento DSC, n = m; 2. Quando a nucleação ocorre durante a análise térmica, n = m+ 1; 3. Quando a cristalização de superfície é o mecanismo predominante, n = m = 1. 49 TABELA 05: Valores de n e m para diferentes mecanismos de cristalização Mecanismo de Cristalização n m Cristalização volumétrica com um número constante de núcleos Crescimento de cristais em três dimensões 3 3 Crescimento de cristais em duas dimensões 2 2 Crescimento de cristais em uma dimensão 1 1 Cristalização volumétrica com um número crescente de núcleos Crescimento de cristais em três dimensões 4 3 Crescimento de cristais em duas dimensões 3 2 Crescimento de cristais em uma dimensão 2 1 Cristalização superficial 1 1 Fonte: Çelikbilek (2011) [46]. Para a primeira condição, o número de núcleos das amostras pré-nucleadas não de- pende da taxa de aquecimento. Para a segunda condição, quando a nucleação tem lugar durante a análise térmica, o número de núcleos das amostras é proporcional à taxa de aquecimento. Portanto, enquanto o número de núcleos permanecer constante durante a análise térmica para as amostras pré-nucleadas, a primeira abordagem (n = m) para a determinação do mecanismo de cristalização deve ser preferida. No entanto, a segunda abordagem (n = m + 1) é adequada para a fundição de amostras, enquanto um estado de nucleação não-estável tem lugar durante as medições de DSC. Diferentes mecanismos de cristalização aparecem para diferentes fatores numéricos, tais como uma esfera, para crescimento em três dimensões, como um disco para cres- cimento em duas dimensões e como uma haste para crescimento unidimensional ou cristalização de superfície. Capítulo 4 Materiais e Métodos Experimentais 4.1 Materiais Utilizados e Preparação das Amostras Os vidros sintetizados neste trabalho foram obtidos através do tradicional método de resfriamento rápido – melt-quenching. O sistema vítreo composto por diferentes óxidos recebeu então a nomenclatura 80TeO2–(10−x)Li2O–10WO3–xNa2O (x = 0, 2, 4, 6 e 10% mol) ou TLWN. As percentagens em mol do óxido de lítio e de sódio da composição das matrizes estudadas foram sendo gradativamente variadas, enquanto que os percentuais em mol dos óxidos de telúrio e tungstênio se mantiveram fixos. As amostras com óxido de sódio foram nomeadas segundo o percentual do componente. Sendo assim, a amostra TLWN2, por exemplo, corresponde à amostra com composição de 2% em mol de óxido de sódio. A amostra sem óxido de sódio será chamada doravante TLW, apenas. As amostras foram preparadas utilizando óxidos e carbonatos, a partir dos seguin- tes reagentes analíticos: óxido de telúrio TeO2(Sigma Aldrich - 99,995%), óxido de tungstênio WO3(Sigma Aldrich - 99,999%), carbonato de sódio Na2CO3 (pureza P.A.) e carbonato de lítio Li2CO3 (Sigma Aldrich - 99,995%). A Tabela 06 mostra as concentrações em mol para cada componente dos vidros que foram sintetizados, das famílias que são objeto deste estudo: TABELA 06: Concentração dos compontes dos vidros da família TeO2–Li2O–WO3–Na2O, denominado sistema TLWN. Vidro TeO2 (%mol) WO3 (%mol) Li2O (%mol) Na2O (%mol) TLWN2 80 10 8 2 TLWN4 80 10 6 4 TLWN6 80 10 4 6 TLW 80 10 10 0 Fonte: do próprio autor. 51 A quantidade em massa de cada componente foi determinada através de cálculos estequiométricos. Cada carga de vidro foi obtida de modo a ter aproximadamente 15,0 g. As quantidades de óxidos e carbonatos foram determinadas individualmente em uma balança ana- lítica (Shimadzu – Modelo AY–220). Os reagentes foram misturados e homogeneizados manualmente em cadinho de por- celana por aproximadamente 1 hora e, em seguida, a massa foi levada ao forno resistivo EDG (Modelo EDGCON 3P), em cadinho de platina, para calcinação e fusão. O material fundido foi vazado em um molde de aço inoxidável, à temperatura ambiente. Posteriormente, as amostras foram levadas ao forno, por um tempo pré-determinado, numa temperatura próxima da tempera- tura de transição vítrea (Tg) para aliviar as possíveis tensões mecânicas provocadas pelo choque térmico do resfriamento. A Figura 14 apresenta diversos materiais e equipamentos utilizados durante a síntese dos vidros. FIGURA 14: Materiais e equipamentos utilizados em laboratório para sintetizar vidros: (A) reagentes analíticos; (B) almofariz e pistilo de porcelana, contendo as quantidades de reagentes determinados estequiometricamente; (C) cadinho de platina; (D) molde de aço-inoxidável e (E) forno mufla. Fonte: do próprio autor. As amostras de vidro pulverizadas, sem e com seleção de tamanho de grão por peneiras analíticas: 75–63 µm, 45–63µm, 38–45 µm e < 0,38 µm, foram submetidas à análise de calorimetria exploratória diferencial (DSC) com um equipamento da T. A. Instruments (Modelo MDSC 2920), usando uma massa de amostra de 12,0 mg, encerradas hermeticamente em panela de alumínio, com a câmara de aquecimento submetida à atmosfera de nitrogênio seco, sob um fluxo de 50 cm³/min a diferentes taxas de aquecimento: 1,0; 2,5; 5,0; 7;5 e 10 °C/min. Para obtenção das curvas preliminares, a taxa de 1,0 °C/min foi escolhida e para isto, utilizamos vidros 52 em pó sem nenhuma seleção de tamanho de partículas. As estruturas dos vidros TLWN foram analisadas utilizando-se a técnica de difração de raios-X (DRX), usando radiação CuKα em um equipamento Rigaku Ultima IV. Para o estudo da cristalização, os vidros foram submetidos a tratamentos térmicos em diferentes temperaturas durante 10 minutos. As temperaturas para os tratamentos térmicos foram selecionadas entre a temperatura de transição vítrea e temperatura de fusão, com base nas curvas de DSC, obtidas utilizando vidros em pó, selecionados por tamanho de partículas. A Figura 15 ilustra o esquema de aquecimento e fusão dos vidros teluritos, onde as misturas foram inicialmente aquecidas com taxa de 3 °C/ min até uma temperatura de 400 °C, permanecendo nesse patamar por 1 hora. Esse procedimento preliminar foi o mesmo para a sín- tese das quatro amostras vítreas, sendo realizado para calcinar eventuais resíduos orgânicos, para evitar a perda descontrolada de massa durante a liberação de gás carbônico (CO2), proveniente do carbonato de lítio (Li2CO3) e do carbonato de sódio (Na2CO3). Vencido esse patamar a tem- peratura do forno foi novamente elevada com taxa de aquecimento igual a 10°C/min até atingir a temperatura de fusão (850 °C), permanecendo neste patamar de temperatura por 30 minutos. A taxa de aquecimento e o tempo de fusão foram iguais para as quatro matrizes vítreas. Vidros sintetizados preliminarmente apresentaram cristalização na parte superior da amostra. Tal fenô- meno se deu em virtude do recozimento das amostras estar sendo realizado muito próximo da temperatura de transição vítrea. Tais vidros foram novamente fundidos e o procedimento ade- quado para evitar essa cristalização foi abaixar a temperatura de recozimento. Isto foi verificado de maneira experimental. Sendo assim, o recozimento das amostras foi realizado 20 °C abaixo da temperatura de transição vítrea, suficiente para se obter boas amostras vítreas, conforme ilustra a Figura 16. FIGURA 15: Gráfico da temperatura em função do tempo, ilustrando o aquecimento durante a produção da amostra vítrea. Fonte: do próprio autor. 53 Os estudos por espectroscopia no infravermelho foram realizados com um equipa- mento Varian–Agilent – Modelo 640-IR FT-IR, com ATR, utilizando amostras com tamanho de partículas menores do que 38 µm e tratadas termicamente. Os tratamentos térmicos foram realizados no interior de um forno elétrico EDG – Modelo EDGCON 3P em diferentes tempe- raturas durante 10 minutos, da mesma forma como foram obtidos para as análises de DRX. As temperaturas para os tratamentos térmicos foram selecionadas entre a temperatura de transição vítrea (Tg) e a temperatura de início da cristalização (Tx). FIGURA 16: Vidros teluritos do sistema TLWN, sintetizados através do método de melt– quenching : (A) TLWN2; (B) TLWN4; (C) TLWN6 e (D) TLW. Fonte: do próprio autor. 4.2 Métodos de Caracterização dos Vidros 4.2.1 Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) As propriedades térmicas dos vidros são normalmente estudadas por técnicas de análises térmicas, particularmente, Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC). Esta técnica é muito utilizada para determinar propriedades térmicas dos vidros associadas às transições de fase e costuma ser empregada por apresentar vantagens consideráveis no processo de medida, por exemplo, facilidade de aplicação, sensibilidade térmica e por trabalhar com uma quantidade mínima de amostra. Trata-se de uma técnica simples, que permite comparar a variação da tem- peratura entre a amostra (material de estudo) e a referência (material inerte: alumina em pó ou simplesmente a cápsula vazia), segundo um processo controlado de aquecimento ou resfriamento [51]. Assim, transições envolvendo trocas de calor são detectadas como uma mudança na linha 54 de base (background) da curva ou como picos endotérmicos ou exotérmicos. A Figura 17 mos- tra uma típica curva de DSC para um vidro. As temperaturas de transição vítrea, de pico de cristalização e de fusão estão evidenciadas. FIGURA 17: Curva de DSC para um material amorfo com baixa temperatura de transição vítrea e de fusão. Fonte: do próprio autor. Mudanças na linha de base são associadas a transições de segunda ordem, como a transição vítrea. Os picos endotérmicos (reação de fusão) e exotérmicos (mudança de fase cristalina) são associados a transições de primeira ordem. 4.2.2 Difratometria de Raios-X (DRX) A técnica de Difração por Raios-X (DRX) baseia-se da interação da radiação ele- tromagnética de raios-X com a matéria e envolve a análise da diferença no caminho percorrido pelos raios difratados por planos adjacentes da estrutura cristalina [52]. Os raios-X são ondas eletromagnéticas de comprimento de onda da ordem de Å (angstroms). Para a ocorrência da difração é necessário que o comprimento de uma onda da ra- diação incidente seja da mesma ordem de grandeza dos espaçamentos interatômicos do material analisado, ou seja, da ordem de Å. A incidência de raios-X sobre um átomo, provoca o espa- lhamento de radiação em todas as direções e a interferência construtiva da radiação espalhada proveniente de vários átomos caracteriza a difração. Assim, considerando uma estrutura cris- talina, com átomos arranjados de forma organizada e periódica, a radiação por eles espalhada 55 fornece um padrão de interferência construtiva ou destrutiva quando analisada em uma determi- nada direção. A técnica de difração de raios-X tem sido utilizada com o intuito de confirmar a característica amorfa dos vidros e identificar possíveis fases cristalinas dispersas na estrutura vítrea, induzidas por tratamento térmico. A identificação das fases cristalinas costuma ser reali- zada pela indexação dos picos utilizando padrões difratométricos individuais de cada fase. Esses padrões difratométricos são disponibilizados em cartas Joint Committee of Powder Diffraction Standards - JCPDS, os quais permitem avaliar o grau de cristalinidade, bem como quantificar as fases presentes. A quantificação das fases cristalinas apóia-se na intensidade dos picos do difrato- grama, os quais, além de guardarem uma relação característica da estrutura cristalina de cada fase componente, refletem suas proporções na amostra. 4.2.3 Espectroscopia no Infravermelho por Transformada de Fou- rier (FTIR) A técnica denominada espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR), também é importante no estudo de vidros, pois, fornece informações a respeito das ligações entre os átomos arranjados na estrutura vítrea, podendo ainda ser fundamental para o estudo da dinâmica de nucleação e cristalização. A importância dessa técnica na caracterização de vidros reside no fato de boa parte dos sistemas considerados possuírem freqüências normais de vibração ativa na região do infravermelho e suas freqüências são sensíveis a pequenas deformações nas estruturas sofridas devido a vários fatores, como o tratamento térmico para controle da nucleação e cristalização. O espectro infravermelho é dividido em três regiões: o infravermelho distante 400 a 40 cm-1, o infravermelho médio 4000 a 400 cm-1 e o infravermelho próximo que se estende até 12000 a 4000 cm-1. A técnica de espectroscopia no infravermelho é amplamente utilizada par