Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 501Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... FITOSSOCIOLOGIA DE COMUNIDADES DE PLANTAS DANINHAS EM AGROECOSSISTEMA CANA-CRUA1 Phytosociology of Weed Community in No-Burn Sugar Cane Agroecosystems KUVA, M.A.2, PITELLI, R.A.3, SALGADO, T.P.2 e ALVES, P.L.C.A.3 RESUMO - Objetivou-se neste trabalho estudar a fitossociologia de comunidades de plantas daninhas de canaviais colhidos no sistema mecanizado, sem queima prévia da palha, e a similaridade entre talhões quanto à composição de espécies. Os levantamentos foram realizados em 28 talhões comerciais na região de Ribeirão Preto-SP. Em cada talhão foram demarcadas áreas de coleta e avaliação, na proporção de duas por hectare, mantidas sem controle, e que serviram de local para as amostragens de plantas daninhas. As amostragens foram feitas com quadrados vazados (0,5 x 0,5 m), lançados aleatoriamente duas vezes em cada uma das áreas. Essas amostragens foram realizadas determinando-se a densidade e a biomassa específica aos 120 dias após o corte da cana. Cyperus rotundus foi a principal espécie, destacando-se quanto aos valores de importância relativa (IR). As plantas dicotiledôneas anuais de propagação por sementes também se destacaram, dentre as quais diversas espécies das famílias Euphorbiaceae e Convolvulaceae. Em contrapartida, as gramíneas tradicionais de áreas de cana colhida queimada tiveram pouco destaque. O índice de Shannon (H) de diversidade de espécies das comunidades variou de 0 a 1,61, e o índice de similaridade entre os talhões (S) foi muito variável. A maioria das espécies ou grupo de espécies apresentou padrão agregado (V/m > 1,00), com valores relativamente altos de índice de agregação (V/m). Entretanto, na maioria dos casos, Cyperus rotundus e as Convolvulaceas apresentaram os maiores índices. Palavras-chave: Cyperus rotundus , Ipomoea spp., índice de agregação, índice de similaridade. ABSTRACT - A study was carried out in northeastern São Paulo, Brazil to evaluate the similarity between species composition and phytosociological index in weed communities of no-burn sugar cane crop harvest at different times and number of cut-cycles. Assessments were carried out in twenty-eightsugar cane plots in the Ribeirao Preto-SP region. In each plot, collection and evaluation areas were established, two per hectare, kept without control and used as weed sampling sites. The samplings were made using squares (0.5 x 0.5 m), randomly cast twice in each area. Weed density and biomass were evaluated per species 120 days after sugar cane harvesting. The phytosociological studies showed that Cyperus rotundus presented the highest values of relative density, dominance, frequency and relative importance index. The seed-propagated dycot plants also presented high values for phytosociological index, mainly the species belonging to the families Euphorbiaceae and Convolvulaceae. On the other hand, the grass weeds, traditionally found in burned sugar cane areas, had very little relevance under the no-burn system. The diversity index (Shannon - H) varied from 0 to 1.61 and the similarity index(S) was low, except when groups of weeds were compared. The majority of the weed populations showed geographic distribution in match pattern. Areas withhigh infestationof C. rotundusand/or Convolvulaceae species showed the highest aggregation index. Keywords: Cyperus rotundus, Ipomoea spp., aggregation index, similarity index. 1 Recebido para publicação em 2.8.2006 e na forma revisada em 21.3.2007. Parte da tese do primeiro autor apresentada à FCAV/UNESP para obtenção do título de Doutor em Agronomia. 2 Herbae Consultoria e Projetos Agrícolas Ltda. Rua José Antonio Fernandes Sobrinho, 118, B. Aparecida, Jaboticabal-SP, 14882-046; 3 Professor, Doutor, Dep. de Biologia Aplicada à Agropecuária da FCAV/UNESP. Via de acesso prof. Paulo Donato Castellane, km 5, s/n, Jaboticabal-SP, 14870-000. KUVA, M.A. et al. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 502 INTRODUÇÃO O grau de interferência das plantas dani- nhas nas culturas agrícolas pode ser definido como a redução percentual da produção econô- mica provocada pela convivência com a comu- nidade infestante. Esse grau de interferência depende de fatores ligados à própria cultura (espécie ou variedade, espaçamento e densida- de de plantio), à comunidade infestante (com- posição específica, densidade e distribuição) e à época e extensão do período de convivência, podendo, ainda, ser influenciado pelas con- dições edáficas, climáticas e pelos tratos cul- turais (Pitelli, 1985). Em uma comunidade de plantas dani- nhas, nem todas as espécies exercem a mes- ma intensidade na interferência imposta ao desenvolvimento e à produtividade da cultura. Existem espécies dominantes, que são as que originam a maior parte da interferência, as espécies secundárias, presentes numa me- nor densidade e cobertura, e as acompanhan- tes, cuja presença é ocasional e que dificil- mente resultam em problemas econômicos aos cultivos (Fernández-Quintanilla et al., 1991). Do ponto de vista agronômico, o conheci- mento da estrutura de uma comunidade de plantas daninhas é muito importante. Antes de determinar um programa de controle, é ne- cessário estabelecer uma ordem de prioridades entre as espécies presentes. As espécies pre- dominantes, pela sua abundância e nocivida- de, deverão receber uma atenção especial, con- centrando quase todos os esforços de controle. Embora as espécies secundárias não requei- ram atenção individualizada, não se deve ig- norar sua presença (Fernández-Quintanilla et al., 1991). Há exemplos de inversão das im- portâncias relativas das espécies devido à adoção de métodos de controle (Monquero & Christoffoleti, 2003) e à alteração no sistema de cultivo (Voll et al., 2001) ou no esquema de rotação de culturas (Buhler et al., 1997). A cultura da cana-de-açúcar vem passan- do por um grande processo de mudança no seu sistema produtivo, em razão da adoção de co- lheita mecanizada sem queima prévia da pa- lha. Qualquer mudança no sistema de produ- ção agrícola acarreta alterações ambientais, que, com freqüência, resultam em grande impacto no tamanho da população de plantas daninhas, pois atuam como fator ecológico não-periódico (Pitelli & Kuva, 1998). Com a repetição sistemática, passam a atuar como fator ecológico periódico, e a tendência é de que a comunidade se restabeleça até a capaci- dade suporte do meio, porém com uma compo- sição específica que poderá ser diferente. A manutenção da palha e a eliminação da quei- mada alteraram a composição de plantas dani- nhas em áreas antigas de cana-crua e vêm alterando em áreas mais recentes nesse sis- tema. A escolha de herbicida e da época de sua aplicação, bem como a sua distribuição, tem sido realizada com critério definido, mas sem incluir todas as variáveis necessárias para maximizar o efeito de controle e de redução da interferência das plantas daninhas sobre a cana-de-açúcar. Dentre essas variáveis não consideradas, o melhor conhecimento da co- munidade infestante poderá ser útil para sus- tentar decisões e torná-las mais criteriosas. Diante do exposto, este trabalho teve o pro- pósito de avaliar a composição e distribuição da flora de plantas daninhas emergidas em agroecossistemas de cana-de-açúcar, assim como verificar a similaridade entre talhões colhidos no sistema de cana-crua, em dife- rentes épocas da safra. MATERIAL E MÉTODOS O presente trabalho foi conduzido durante a safra de 2004, na região de Ribeirão Preto, SP, em talhões de cana-soca destinados à pro- dução comercial, com diferentes históricos de colheita mecanizada. Esses talhões foram se- parados em três grupos, de acordo com a época de corte. O primeiro grupo foi composto por ta- lhões colhidos no início de safra (época 1 - ju- lho); o segundo, por talhões colhidos no meio da safra (época 2 - agosto e setembro); e o ter- ceiro, por aqueles colhidos no final de safra (época 3 - outubro e novembro). As localizações dos talhões monitorados, bem como as datas de corte, são mostradas na Tabela 1. Os dados de precipitações pluviométricas e de tempera- turas mínimas, máximas e médias registra- das na região durante a fase de coleta de dados foram obtidos na estação agrometeorológica da FCAV-UNESP e são apresentados na Figura 1. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 503Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... Os talhões variaram de três a cinco hecta- res e, após o corte da cana, tiveram seus perí- metros georreferenciados. Em cada talhão fo- ram demarcadas áreas de coleta e avaliação, que ficaram sem aplicação de herbicidas e que serviram de local para realização dos levanta- mentos e coleta das amostras. Essas áreas fo- ram locadas aleatoriamente, na quantidade de duas a cada hectare, e constituídas de áreas retangulares variáveis em função do espaça- mento entre-linhas (4 linhas x 4 metros de comprimento). A flora emergente foi avaliada aos 120 dias após o corte (DAC), utilizando-se de quadrados vazados de 0,5 x 0,5 m lançados ao acaso por duas vezes dentro de cada área de coleta e avaliação.As plantas abrangidaspelo quadrado de amostragem foram identificadas, contadas e recolhidas, para determinação da Tabela 1 - Localização e informações dos talhões utilizados para levantamento e monitoramento de plantas daninhas Fonte: Departamento de Ciências Exatas – Unesp Jaboticabal. Figura 1- Registrodos parâmetrosclimatológicos deprecipitação mensal acumulada e temperaturas média, mínima e máxima mensais durante o período de coleta de dados. Área Fazenda – Município Data de corte Cortes (crua) FSI-1 Fazenda Santa Isabel – Jaboticabal 04/07/04 Quinto FBV-2 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 16/07/04 Quinto NSF-3 Fazenda N. Sra. de Fátima - Taquaritinga 02/07/04 Sexto FSC-4 Fazenda Sta. Cecília – Jaboticabal 05/0704 Terceiro FBV-5 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 19/07/04 Sexto UDP-6 Usina da Pedra – Ribeirão Preto 07/07/04 Quarto UAN-7 Fazenda Trindade – Pitangueiras 30/07/04 Terceiro FSI-8 Fazenda Sta. Isabel – Jaboticabal 27/07/04 Terceiro FSI-9 Fazenda Sta. Isabel – Jaboticabal 25/07/04 Sétimo USB-10 Fazenda Diamantina – Taquaritinga 14/05/04 Quinto USB-11* Fazenda Cucuhy – Guariba 13/08/04 Terceiro COP-13 Fazenda Coplana – Guariba 18/09/04 Segundo FM-14 Fazenda Morumbi – Guariba 25/08/04 Terceiro FM-15 Fazenda Morumbi – Guariba 28/08/04 Sexto FM -16 Fazenda Morumbi – Guariba 05/09/04 Sexto FSA-17 Fazenda Sto. Antônio – Matão 19/08/04 Terceiro FM -18 Fazenda Morumbi – Guariba 12/09/04 Segundo USM-19 Fazenda Porto Pinheiro 17 – Pradópolis 03/09/04 Quinto USM-20 Fazenda Porto Pinheiro 17 – Pradópolis 03/09/04 Quinto FSC-21 Fazenda Sta. Cecília – Jaboticabal 12/09/04 Terceiro FBV-22 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 08/10/04 Segundo FBV-23 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 17/10/04 Quinto FBV-24 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 17/10/04 Quarto FBV-25 Fazenda Bela Vista – Jaboticabal 21/10/04 Primeiro FSO-26 Fazenda Santa Olívia – Jaboticabal 06/11/04 Terceiro FSO-27 Fazenda Santa Olívia – Jaboticabal 10/11/04 Sexto USM-28 Fazenda Barrinha – Barrinha 28/10/04 Quinto USM-29 Fazenda Conceição – Jaboticabal 13/11/04 Terceiro KUVA, M.A. et al. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 504 biomassa acumulada por população, após secagem em estufa com aeração forçada ajusta- da para 75 oC e pesagem em balança com preci- são de centigramas. Com os dados obtidos, calcularam-se os ín- dices fitossociológicos: densidade relativa (De.R), freqüência relativa (Fr.R.) e dominân- cia relativa (Do.R), que por sua vez foram usadas no cálculo da Importância Relativa (IR). Além desses índices, foi determinado o Índice de agregação (V/m), utilizando metodologiapro- postapor Mueller-Dombois & Ellemberg (1974). Também foi calculado o índice de diversidade de espécies de Shannon – (H), utilizando a fór- mula H = -Pi*logPi, contida em Odum (1985), em que Pi é a probabilidade de importância de cada espécie, calculado pela fórmula Pi = ni*N-1, sendo ni o valor de importância de cada espécie e N o total dos valores de importância. Os ta- lhões monitorados foram comparados pelo ín- dice desimilaridade (S)descritoemOdum(1985), considerando o conjunto de espécies (Tabela 2) por meiodafórmula S = (2C*(A+B)-1)*100, em que C é o número de conjunto de espécies comuns aos 120 DAC; A, número de conjunto de espé- cies do talhão A aos 120 DAC; e B, o número de conjunto de espécies do talhão B aos 120 DAC. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os levantamentos de campo detectaram 49 táxons de plantas daninhas; algumas não foram identificadas até o nível de espécie, limitando-se ao gênero, dentre as quais Digitaria spp., Amaranthus spp. e Sida spp. No caso de Cynodon dactylon, não foram medidas sua densidade e biomassa, e sua presença foi detectada visualmente em 10,7% das áreas monitoradas (três áreas). Quanto à importância relativa (IR) das po- pulações de plantas daninhas nos talhões ava- liados (Tabela 3), observou-se que 16 espécies ou gêneros de plantas daninhas apareceram entre as quatro primeiras em pelo menos um dos talhões. A importância relativa (IR) é uma ponderação da distribuição das populações na área, dos seus números de indivíduos e bio- massas acumuladas e infere sobre quais são as espécies mais importantes em termos de infestação (Pitelli, 2000). Os índices fitossocio- lógicos são importantes para analisar o impacto dos sistemas de manejo e das práticas agrícolas na dinâmica de crescimento e ocupa- ção de comunidades infestantes em agroecos- sistemas (Pitelli, 2000). Cyperus rotundus destacou-se em 20 áreas avaliadas, sendo, em 13 delas, a principalplan- ta daninha. Nestas áreas, quase sempre apre- sentou elevados índices de importância relati- va (IR), superior a 90%. Em trabalho realizado por Silva et al. (2003), camadas de palha de até 8 t ha -1 não reduziram a emissão de mani- festações epígeas de C. rotundus, proporcio- nando apenas efeito retardatário. Com 16 t ha-1, houve redução no número de brotações, mas sem afetar a biomassa da parte aérea e o Tabela 2 - Relação das principais espécies de plantas daninhas que compuseram os conjuntos estabelecidos para determinação dos coeficientes de similaridade (S) entre as comunidades Conjunto Componente CY Cyperus rotundus CD Cynodon dactylon CV Ipomoea hederifolia; I. quamoclit; I. nil; I. grandifolia; I. purpurea; Merremia cissoides FL Amaranthus spp.; Chamaesyce hissopifolia; Croton glandulosus; Bidens pilosa; Solanum americanum; Emilia sonchifolia; Tridax procumbens; Sida spp.; Conyza bonariensis; Physalis angulata; Commelina benghalensis; Euphorbia heterophylla; Phylanthus tenellus; Cleome affinis; Parthenium hysterophorus GR Brachiaria decumbens; Brachiaria plantaginea; Eleusine indica; Panicum maximum; Digitaria spp.; Digitaria insularis; Cenchrus echinatus PER Vernonia polyanthes; Cissampelos glaberrima; Pyrostegia venusta; Talinum paniculatum; Mikania cordifolia; além de outras espécies não identificadas Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 505Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... Ta be la 3 - Va lo re s de im po rt ân ci a re la ti va (I R )d as qu at ro pr in ci pa is es pé ci es pr es en te s no s ta lh õe s ao s 12 0 D A C O bs .: nã o fo i co n si de ra da a es pé ci e C yn od on d ac ty lo n . KUVA, M.A. et al. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 506 desenvolvimento de novos tubérculos. Em outro trabalho, Durigan et al. (2004) consta- taram que 10 t ha-1 de palha reduziram a emis- são de manifestações epígeas, porém não im- pediram a formação de grandes densidades. As diferentes espécies de corda-de-viola (Ipomoea nil , I. quamocl it, I. hederifol ia, I. grandifolia, I. purpureae Merremiacissoides) destacaram-se em 17 áreas; em cinco delas, uma destas espécies foi a principal planta da- ninha; em uma área foram detectadas duas espécies; e em duas áreas foram detectadas três espécies. Trabalhando com uma camada de 15 t ha-1 de palha de cana, Azania et al. (2002) constataram que as sementes de I. quamoclit e M. cissoides ainda conseguiram germinar e emergir sob a palha, embora com redução de 46 e 62%, respectivamente, quando comparado à ausência de palha. Adicional- mente, esses autores concluíram que, entre as diferentes espécies estudadas, I. hederifolia foi a menos suscetível à cobertura de palha, enquanto M. cissoides foi a mais sensível. Quanto a I. grandifolia, constatou-se redução na emergência na presença de 15 t ha -1 de palha e estímulo quando a camada foi de 2 a 10 t ha-1 (Martins et al., 1999). Outras espécies que se destacaram como a principal em alguma das áreas foram: Chamaecy ce hyss op if ol ia (dua s ár eas ), Amaranthus sp p. (t rê s áre as ), So lanum americanum (uma área), Conyza bonariensis (uma área), Vernonia polyanthes (uma área) e Croton glandulosus (uma área). Fato interes- sante e que caracteriza a mudança de flora é a presença deV. polyanthes em cana-crua– plan- ta daninha até então restrita às pastagens. Dentre as gramíneas tradicionais, Brachiaria plantaginea e Digitaria spp. destacaram-se em apenas duas áreas cada, ao passo quePanicum maximum foi destaque em uma das áreas. Segundo Gravena et al. (2004), a camada de palha reduziu as densidadesdas populações de B. plantaginea, D. horizontalis, P. maximum, Sida glaziovii e Amaranthus hibridus a níveis de infestação considerados baixos. Por outro lado, para Senna obtusifolia, I. nil, I. hederifolia e I. grandifolia, a população foi reduzida, mas para níveis de controle ainda insatisfatórios. No trabalho de Correia & Durigan (2004), ca- madas de palha com 5, 10 e 15 t ha-1 inibiram a emergência de plântulas das espécies B. decumbens e Sida spinosa. Quanto a D. horizontalis , a inibição somente ocorreu com camada igual ou superior a 10 t ha-1. Além de V. polyanthese Mikaniacordifolia, vale mencionar a presença de plantas de pro- pagação vegetativa, como Talinum paniculatum (uma área ) e Cissampelos glaberrima (duas áreas), duas espécies ainda pouco dissemina- das, mas que acumulam grande quantidade de massa seca por planta. Segundo Mattos et al. (2001), C. glaberrimaé uma planta de difícil controle, apresentando vasto sistema subter- râneo e parte aérea com hábito trepador, que se entrelaça na cana. Considerando a importância relativa acu- mulada (IR ) apresentada na Tabe la 4, C. rotundus foi a espécie com maior destaque, seguida de várias espécies anuais propagadas por semente, sendo a maioria dicotiledôneas, com destaque para I. hederi fol ia, I. ni l , C. hissopifolia, Amaranthus spp.,C. glandulosus, I. quamoclit e S. americanum. Das gramíneas tradicionalmente encontradas em áreas de ca- na colhida manualmente após queima da pa- lha, somente B. plantaginea e Digitaria spp. es- tiveram presentes, mas somente na 12 a e 14a Tabela 4 - Lista das espécies de plantas daninhas encontradas nas áreas monitoradas, ordenadas de forma decrescente, em função da importância relativa acumulada aos 120 DAC Obs.: não foi considerada a espécie Cynodon dactylon. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 507Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... posições em termos de importância relativa acumulada. AlémdeC. rotundus, V. polyanthes e M. cordifolia foram outras plantas perenes em destaque entre as amostras. Pelos resultados obtidos, pode-se inferir que os herbicidas ou métodos de controle para uso em cana-crua deverão apresentar, além de capacidade de passagem pela palha, eficiên- cia de controle sobre C. rotundus e as diversas espécies de corda-de-viola (M. cissoides e Ipomoea spp.). Uma maneira de analisar a distribuição espacial das comunidades e populações de plantas daninhas emergidas dentro do talhão é por meio do índice de agregação (V/m), apresentado na Tabela 5. Segundo Dessaint et al. (1991), esse índice mede o desvio da uni- dade, e valores maiores indicam um padrão de agregação espacial. A distribuição das es- pécies nos agroecossistemas pode apresentar três diferentes padrões: agregado, aleatório e regular (Radosevich & Holt, 1984). Analisando os dados obtidos para as principais espécies ou grupo de interesse, nas diferentes áreas monitoradas, observou-se que as plantas da- ninhas apresentam distribuição agregada, com diferentes graus de contagiosidade. Os va- lores obtidos para as comunidades infestantes indicaram padrão agregado de distribuição (V/ m > 1,00) com valores relativamente altos de índicede agregacão – em média, V/m = 125,88. Entretanto, constatou-se que, na maioria dos casos em que a agregação foi alta, C. rotundus e as convolvuláceas, as quais apresentaram índices médios de 172,9 e 20,45, foram as res- ponsáveis pelo elevado valor. Quando o índice de agregação (V/m) das comunidades ou popu- lações é elevado, a distribuição horizontal dos indivíduos forma manchas bastante definidas. Nesses casos, existe a possibilidade de gera- ção, com bastante segurança e confiabilidade, de mapas de infestação, conforme trabalhos de Benoit et al. (1992) e Cardina et al. (1997). Esses mapas, por sua vez, podem suportar a aplicação localizada ou diferencial de herbici- das, que certamente resultará em redução do custo de produção, menor impacto ambiental e uso de herbicidas, conforme demonstradopor Lindquist et al. (1998) em soja e milho e Shiratsuchi et al. (2002) na cultura da soja. No caso dos talhões de cana monitorados, a ap licação loca liz ada é pouco viável , considerando-se a comunidade infestante in- tegralmente. Contudo, a aplicação diferencial com acréscimo de produto específico para C. rotundus em determinadas regiões de al- guns dos talhões poderia implicar economia de herbicidas e redução de custos de controle de plantas daninhas. A flora emergente das áreas monitoradas apresentou índices de diversidade (H) de espé- cies variando entre o mínimo de zero, observa- do na área USB-10, onde apenas uma espécie foi observada aos 120 DAC, até um máximo de 1,61, obtido na área FSO-26 (Tabela 6). De modo geral, as comunidades mais diversifica- das tendem a requerer mais complementa- ções de controle ou mais combinações de di- ferentes herbicidas, devido à sensibilidade diferencial das diferentes espécies aos herbi- cidas. Os índices de similaridade (S) calculados em função de C. rotundus, C. dactylon e das demais espécies agrupadas em quatro conjun- tos (cordas-de-viola, outras folhas largaspropa- gadas por sementes, gramíneas e perenes oriundas de rebrotas) variaram entre 25 e 100% (Tabela 7), indicando que pode haver con- dição para o estabelecimento de agrupamentos de talhões com certo nível de semelhança quanto à composição específica. No entanto, é importante destacar que esse índice de simila- ridade (S) considera somente a ausência ou presença da espécie ou conjunto de plantas, deixando de considerar informações de densi- dade, biomassa e padrão de distribuição. Tam- bém deve ser ressaltado que o índice de simi- lar idade (S) normalmente é calculado em função das espécies individuais presentes. Contudo, como nesse caso ele foi utilizado so- mente para obter um indicativo da existência ou não de agrupamentos-padrões, foi adaptado para comparar talhões considerando as espé- cies mais importantes e os conjuntos de espé- cies estabelecidos por critérios agronômicos. Tendo em vista os resultados obtidos, con- cluiu-se que C. rotundus foi a principal espé- cie, com os maiores valores de importância relativa (IR), seguida das espécies de corda- de-v iola, pr incipalmente I. hederi fol ia e I. quamoclit, e outras plantas de folha larga de propagação por sementes. O conjunto de cor- das-de-viola e, principalmente, a população de KUVA, M.A. et al. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 508 Ta be la 5 -V al or es de ín di ce de di sp er sã o (V /m )o bt id os pa ra as pr in ci pa is es pé ci es ou gr up os de in te re ss ee m fu nç ão da am os tr ag em de pl an ta s da ni nh as em er gi da s ao s 12 0 D A C , re al iz ad a na sá re as m on ito ra da s * Ip om oe a sp p. e M er re m ia ci ss oi de s; ** fo lh as la rg as pr op ag ad as po r se m en te , ex ce to as co rd as -d e- v io la . Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 509Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... Tabela 6 - Índice de diversidade (Shannon – H) das comunidades de plantas daninhas presentes nas áreas monitoradas aos 120 DAC Tabela 7 - Coeficientes de similaridade (S) obtidos na comparação entre talhões, considerando grupos de plantas Continua... Áreas Índice de diversidade (H’) Áreas Índice de diversidade (H’) USB-10 0,0000 FM-16 0,8539 USM-20 0,0705 FM-18 0,9676 FSI-9 0,0893 FSO-27 1,0099 USM-19 0,3051 UAN-7 1,1600 FSC-21 0,3318 FSA-17 1,2084 USM-29 0,3768 UDP-6 1,2513 FBV-2 0,4854 FBV-22 1,3131 FM-14 0,5118 FSI-1 1,3272 FBV-24 0,5623 FBV-5 1,3456 FBV-25 0,5623 FSI-8 1,3612 USM-28 0,6299 FM-15 1,4257 NSF-3 0,7393 USB-11 1,5155 COP-13 0,7437 FBV-23 1,5268 FSC-4 0,7615 FSO-26 1,6063 FBV 2 NSF 3 FSC 4 FBV 5 UDP 6 UAN 7 FSI 8 FSI 9 USB 10 --- FSI-1 75 89 80 89 75 75 89 100 57 --- FBV-2 --- 89 80 89 75 100 89 75 57 --- NSF-3 --- --- 91 100 89 89 100 89 50 --- FSC-4 --- --- --- 91 80 80 91 80 67 --- FBV-5 --- --- --- --- 89 89 100 89 50 --- UDP-6 --- --- --- --- --- 75 80 67 25 --- UAN-7 --- --- --- --- --- --- 89 75 57 --- FSI-8 --- --- --- --- --- --- --- 89 50 --- FSI-9 --- --- --- --- --- --- --- --- 57 --- USB 11 COP 13 FM 14 FM 15 FM 16 FSA 17 FM 18 USM 19 USM 20 FSC 21 FSI-1 75 50 56 86 86 100 100 86 100 89 FBV-2 75 75 86 86 86 75 75 86 75 89 NSF-3 89 67 75 75 75 89 89 75 89 100 FSC-4 80 80 67 67 67 80 80 67 80 91 FBV-5 89 67 75 75 75 89 89 75 89 100 UDP-6 89 44 50 50 50 67 67 50 67 80 UAN-7 75 75 86 86 86 75 75 86 75 89 FSI-8 89 67 75 75 75 89 89 75 89 100 FSI-9 75 50 86 86 86 100 100 86 100 89 USB-10 29 86 67 67 67 57 57 67 57 50 KUVA, M.A. et al. Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 510 Tabela 7, cont. FBV 22 FBV 23 FBV 24 FBV 25 FSO 26 FSO 27 USM 28 USM 29 --- --- FSI-1 75 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- FBV-2 75 89 --- 67 57 100 86 40 --- --- NSF-3 89 100 --- 57 75 89 75 33 --- --- FSC-4 80 91 --- 50 67 80 67 29 --- --- FBV-5 89 100 --- 57 75 89 75 33 --- --- UDP-6 89 80 --- 57 75 67 50 33 --- --- UAN-7 75 89 --- 67 57 100 56 40 --- --- FSI-8 89 100 --- 57 75 89 75 33 --- --- FSI-9 75 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- USB-10 29 50 --- 40 33 57 67 50 --- --- COP 13 FM 14 FM 15 FM 16 FSA 17 FM 18 USM 19 USM 20 FSC 21 --- USB-11 50 57 57 57 75 75 57 75 89 --- COP-13 --- 57 57 57 50 50 57 50 67 --- FM-14 --- --- 100 100 86 86 100 86 75 --- FM-15 --- --- --- 100 86 86 100 86 75 --- FM-16 --- --- --- --- 86 86 100 86 75 --- FSA-17 --- --- --- --- --- 100 86 100 89 --- FM-18 --- --- --- --- --- --- 86 100 89 --- USM-19 --- --- --- --- --- --- --- 86 75 --- USM-20 89 --- FBV 22 FBV 23 FBV 24 FBV 25 FSO 26 FSO 27 USM 28 USM 29 --- --- USB-11 100 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- COP-13 50 67 --- 33 29 75 86 40 --- --- FM-14 57 75 --- 80 67 86 67 50 --- --- FM-15 57 75 --- 80 67 86 67 50 --- --- FM-16 57 75 --- 80 67 86 67 50 --- --- FSA-17 75 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- FM-18 75 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- USM-19 57 75 --- 80 67 86 67 50 --- --- USM-20 75 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- USM-21 89 100 --- 57 75 89 75 33 --- --- FBV 23 FBV 24 FBV 25 FSO 26 FSO 27 USM 28 USM 29 FBV-22 89 --- 67 86 75 57 40 --- --- --- FBV-23 --- --- 57 75 89 75 33 --- --- --- FBV-24 --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- FBV-25 --- --- --- 80 67 40 67 --- --- FSO-26 --- --- --- --- 57 33 50 --- --- FSO-27 --- --- --- --- --- 57 40 --- --- USM-28 --- --- --- --- --- --- 50 --- --- USM-29 --- --- --- --- --- --- --- --- --- Planta Daninha,Viçosa-MG, v.25, n. 3, p. 501-511,2007 511Fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em ... C. rotundus apresentaram distribuição com elevados índices de agregação (V/m) - o bastan- te para despertar a possibilidade de geração de mapas para aplicação localizada de herbi- cidas. A variabilidade dos coeficientes de simi- laridade (S) obtida nas comparações entre ta- lhões mostrou que existe tendência de os talhões formarem agrupamentos-padrões, em razão da maior ou menor semelhança quanto à composição específica. AGRADECIMENTOS À profa Dra Maria do Carmo Morelli Damas- ceno Pavani, pelo auxílio na identificação das plantas daninhas. À Dow Agrosciences Ltda., Milenia Agro Ciências Ltda. e aos agrônomos e técnicos das usinas e fazendas envolvidas (U. Bonfim, U. da Pedra, U. Andrade, São Martinho, F. Santa Isabel, F. Santa Cecília e F. Santo Antonio), pelas diversas formas de apoio. LITERATURA CITADA AZANIA, A. A. P. M. et al. Interferência da palha de cana- de-açúcar (Saccharum spp.) na emergência de espécies de plantas daninhas da família Convolvulaceae. 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