Ynaiá Yamanaka Marques Contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal São José do Rio Preto 2021 Ynaiá Yamanaka Marques Contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Biodiversidade, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES – Proc.: 88887.342363/2019-00 Orientadora: Profª. Drª. Denise de Cerqueira Rossa- Feres Coorientador: Prof. Dr. Eduardo Fernando dos Santos São José do Rio Preto 2021 Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. M357c Marques, Ynaiá Yamanaka Contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal / Ynaiá Yamanaka Marques. -- São José do Rio Preto, 2021 67 f. : il., tabs., fotos, mapas Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto Orientadora: Denise de Cerqueira Rossa-Feres Coorientador: Eduardo Fernando dos Santos 1. Anura. 2. Ecologia da paisagem. 3. História natural. 4. Nicho (Ecologia). 5. Processo estocástico. I. Título. Ynaiá Yamanaka Marques Contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Biodiversidade, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES – Proc.: 88887.342363/2019-00 Comissão Examinadora Profa. Dra. Denise de Cerqueira Rossa-Feres UNESP – Câmpus de São José do Rio Preto Orientadora Profa. Dra. Cynthia Peralta de Almeida Prado UNESP – Câmpus de Jaboticabal Dr. Rodolfo Mei Pelinson USP – Instituto de Biociências São José do Rio Preto 09 de novembro de 2021 Dedico este trabalho às minhas origens, Cristina, José Carlos e Yara, e à minha terna escolha diária, Igor, que me dão todo o suporte para que eu enfrente qualquer desafio. AGRADECIMENTOS Agradeço à minha orientadora, Profa. Dra. Denise de Cerqueira Rossa-Feres, por me acolher no querido Laboratório de Ecologia Teórica (LET) desde a minha Iniciação Científica e depositar sua confiança em mim em todos esses anos. Obrigada por me ensinar a erguer a cabeça e a perseverar diante das dificuldades inerentes à pesquisa, tanto experimental quanto teórica. Obrigada pela empatia e preocupação, pelos ensinamentos profissionais e pessoais e por fazer do LET um local de trabalho sério, mas divertido e interessante! Sempre será uma referência de professora e pesquisadora para mim. Ao meu coorientador, Prof. Dr. Eduardo Fernando dos Santos, pela inesgotável paciência e prontidão para me auxiliar com as análises estatísticas, por me receber como estagiária de docência, pelas discussões ecológicas e também pelas discussões sobre a vida. Aos membros da banca de qualificação, Profa. Dra. Christine Strüssmann e Dr. Rodolfo Mei Pelinson, que possibilitaram a melhoria desta dissertação por meio de suas valiosas contribuições. Aos membros da banca de defesa, Profa. Dra. Cynthia Peralta de Almeida Prado e, novamente, Dr. Rodolfo Mei Pelinson. Me sinto honrada em poder contar com a contribuição de vocês nessa importante etapa da minha vida. Tenho certeza que a qualidade do trabalho final será muito superior com as suas colaborações. Às minhas origens, Cristina e José Carlos. Mãe, você é o meu maior exemplo de força. Você me ensina que é possível ser uma mulher extremamente batalhadora e doce ao mesmo. Uma meta. Pai, você é o meu maior exemplo de paciência. Você me ensina a esperar o tempo das coisas e a enxergar que nem tudo é tão complicado como parece. A personificação de “quem canta seus males espanta”. Obrigada pelo amor incondicional de vocês e por garantirem tudo o que fosse necessário para meus estudos e, sobretudo, para a minha felicidade. Eu sou o que sou e estou onde estou graças a vocês! À minha irmã, Yara, minha companheira e cúmplice desde que me lembro como gente. É impossível tentar imaginar minha vida sem você, e como eu me sinto feliz por isso! Obrigada por me acolher recém-saída da asa da mãe e por fazer da sua casa, a nossa casa. E claro, posterior casa das meninas, com a Morcega e a Ipa, pequenos seres que chegaram para trazer mais alegria em nossas vidas. Agradeço a elas também. Ao meu namorado, Igor, que compartilha comigo os momentos bons e me ajuda a encarar os momentos desafiadores. Obrigada por todo o amor, carinho, paciência e atenção incondicionais. Obrigada por se preocupar tanto comigo e pelas brincadeiras para me fazer rir, a todo custo e a todo momento. Com você tudo fica mais leve (até mesmo enfiar o pé na lama coletando girinos). Aos amigos de laboratório. Katiuce Picheli, obrigada por me introduzir no mundo dos girinos e me ensinar tudo que eu precisava saber para me apaixonar por esses pequeninos. Fabiane Annibale, obrigada por me coorientar na Iniciação Científica, despendendo incontáveis horas pensando comigo em maneiras de tornar meu experimento viável, me acompanhando em coletas, corrigindo meus textos e sendo meu ombro amigo quando tudo que poderia dar errado, de fato, dava! Obrigada por alegrar o LET com seu bom-humor inabalável e por continuarmos nas mais variadas parcerias até hoje. Carlos Sousa, obrigada por, não só topar, mas também por tornar possível todas as ideias mirabolantes para meus experimentos da Iniciação Científica. Agradeço, sobretudo, por tornar o presente trabalho possível, uma vez que integrou a equipe de coleta dos girinos no Pantanal. Vitor Oliveira, obrigada pelas conversas, risadas, cafés e carnes de jaca no LET, e pelos momentos de descontração fora do laboratório também. Agradeço também a todos os demais que direta ou indiretamente fizeram parte desta trajetória. Agradeço especialmente à Fernanda Simioni, que eu não tive a oportunidade de conhecer mas sei que foi uma pessoa incrível pelas conversas no laboratório. Me sinto honrada por dar continuidade à pesquisa que você iniciou com muita dedicação. Fiz questão de tratar a base de dados por você elaborada com muito carinho, apreço e atenção. Você estará eternamente em nossas memórias. Aos queridos amigos. Paula Rosa, amiga e companheira de anos, dentro e fora do laboratório. Obrigada pelas palhaçadas, risadas e choros. Obrigada André Cruz, Ariane Queiroz, João Paulo Silva e Gabriela Faria (Gabriela? Bôta!). Sei que posso contar com vocês para o que eu precisar. Ao IBILCE/UNESP, local de grande aprendizado e amadurecimento, e a todos os professores que participaram da minha formação desde os anos iniciais do meu processo educacional. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001 – Processo: 88887.342363/2019-00. Difícil colocar em palavras o quanto sou grata a todos vocês. RESUMO Um dos principais adventos da ecologia de comunidades nas últimas décadas foi o reconhecimento de que a estrutura de uma comunidade local é influenciada por interações locais e processos regionais. Esse avanço foi possível com o desenvolvimento do conceito de metacomunidade, que incluiu o papel da dispersão nos padrões de diversidade. Diversos estudos indicam que variáveis ambientais e espaciais são fortes estruturadores de comunidades de anuros. Entretanto, dois estudos recentes detectaram uma fraca influência desses dois conjuntos de variáveis em comunidades de anuros do Pantanal brasileiro, sugerindo que processos estocásticos constituem a principal força influenciando a diversidade nesse sistema. Neste estudo, avaliamos a influência de variáveis ambientais (processos determinísticos) e da probabilidade de imigração (processos estocásticos) em metacomunidades de girinos do Pantanal. Analisamos o conjunto de dados proveniente da amostragem de 74 corpos d’água lênticos em escala espacial ampla e em três escalas espaciais restritas. Para isso, empregamos uma abordagem analítica integrativa de estudo de metacomunidades proposta recentemente e um parâmetro estimado com base na Teoria Neutra da Biodiversidade e Biogeografia. Testamos a hipótese de que as metacomunidades estão sob forte influência de processos estocásticos devido à constante redistribuição de indivíduos pela paisagem, em decorrência do pulso de inundação. Esse fenômeno, associado ao hábito habitat-generalista dos indivíduos adultos das espécies levaria a ocupação de habitats de forma estocástica. Contrariando nossa predição, verificamos que as metacomunidades de girinos do Pantanal estão sob influência principalmente de fatores determinísticos, mas também de fatores estocásticos. Detectamos fraca, mas significativa influência do ambiente e do espaço, indicando a atuação de processos determinísticos relacionados ao nicho e fraca ou ausência de restrição à dispersão, que por sua vez é reforçada pela correlação com a probabilidade de imigração. Também encontramos evidências de que a estrutura das metacomunidades resulta da associação de diferentes processos que atuam diferentemente sobre as fases larval e adulta. O evento de inundação do Pantanal em associação com características de história de vida das espécies parecem ser as principais forças que estruturam as metacomunidades de girinos nessa região, promovendo uma redistribuição massiva de indivíduos pela paisagem e possibilitando que eles alcancem habitats com características adequadas ao longo do gradiente ambiental. Palavras-chave: Anura. Ecologia da paisagem. História natural. Nicho (Ecologia). Processo estocástico. ABSTRACT One of the major advances in community ecology in recent decades was the recognition that local interactions and regional processes affect the structure of a local community. This advance was possible with the development of the metacommunity concept, which included the role of dispersal in diversity patterns. Several studies indicate that environmental and spatial variables are strong structuring factors of anuran communities. However, two recent studies detected a weak influence of these two sets of variables on anuran communities in the Brazilian Pantanal, suggesting that stochastic processes are the main force influencing diversity in this system. In this study, we evaluated the influence of environmental variables (deterministic processes) and immigration probability (stochastic processes) on tadpole metacommunities in the Pantanal. We analyzed the dataset from 74 lentic water bodies sampled at a broad and at three fine spatial scales. We employed a recently proposed integrative analytical approach to study metacommunities and an estimated parameter based on the Neutral Theory of Biodiversity and Biogeography. Our hypothesis was that the metacommunities are under strong influence of stochastic processes due to the constant redistribution of individuals across the landscape because of the flood pulse. This phenomenon, associated with the habitat-generalist habit of adult individuals of the species, would lead to stochastic occupation of habitats. Contrary to our prediction, we found that the Pantanal tadpole metacommunities are under the influence mainly of deterministic factors, but also of stochastic factors. We detected weak but significant influence of environment and space, indicating the action of deterministic niche-based processes, and weak or absence of dispersal limitation, reinforced by the correlation with immigration probability. We also found evidences that the metacommunities structure results from the association of different processes acting differently on adults and tadpoles. The Pantanal flood event in association with life history characteristics of the species seems to be the main forces structuring tadpole metacommunities in this region, promoting a massive redistribution of individuals across the landscape and allowing them to reach habitats with suitable characteristics along the environmental gradient. Keywords: Anura. Landscape ecology. Natural history. Niche (Ecology). Stochastic process. SUMÁRIO Introdução Geral ...................................................................................................................... 9 Referências .............................................................................................................................. 14 Sazonalidade e história natural: a contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal ............................ 17 Resumo .................................................................................................................................... 17 Introdução ............................................................................................................................... 19 Metodologia ............................................................................................................................. 22 Locais de estudo ................................................................................................................... 22 Método de amostragem e variáveis ambientais e espaciais ................................................ 23 Análise dos dados ................................................................................................................. 25 Variáveis ambientais, espaciais e estocástica................................................................... 25 Estrutura das metacomunidades ....................................................................................... 28 Resultados ............................................................................................................................... 31 Influência de variáveis ambientais, espaciais e estocástica ............................................... 31 Estrutura das metacomunidades ......................................................................................... 32 Discussão ................................................................................................................................. 33 Referências .............................................................................................................................. 39 Figuras ..................................................................................................................................... 45 Tabelas ..................................................................................................................................... 52 Material Suplementar ............................................................................................................ 60 9 Introdução Geral Entre as organizações mais complexas estudadas pela ciência estão as comunidades ecológicas (VELLEND, 2010; VELLEND et al., 2014). O estudo dos padrões de composição, abundância, distribuição e interação de espécies nessas organizações é o alvo da ecologia de comunidades (LEIBOLD et al., 2004; VELLEND, 2010). Todos os mecanismos já propostos para explicar os padrões em comunidades ecológicas (e.g., relação entre o número de espécies e área; diversidade em gradientes latitudinais e altitudinais; diversidade e distúrbios) envolvem quatro tipos de processos: seleção, deriva, especiação e dispersão (VELLEND, 2010). Esses quatro tipos de processos interagem de inúmeras maneiras e determinam a dinâmica das comunidades e os padrões gerais da natureza em diferentes escalas espaciais (VELLEND, 2010). O termo seleção descreve diferenças determinísticas de aptidão entre indivíduos de diferentes espécies (VELLEND, 2010), com espécies diferentes tendo vantagens adaptativas sob variados conjuntos de condições (CHESSON, 2000). Por esse motivo, todos os eventos relacionados à seleção, por serem relacionados ao nicho, são considerados processos determinísticos (IOP et al., 2012; VELLEND et al., 2014; WILSON, 1992). O espaço de nicho, por sua vez, pode ser entendido como um espaço ambiental abstrato, constituído por quatro eixos: espaço, tempo, recursos, predadores e outros inimigos naturais (CHESSON, 2000; HOLT, 2009). Na prática, o nicho de uma espécie é definido pelo efeito que a população tem em cada ponto no espaço do nicho e pela resposta da população em cada ponto (CHESSON, 2000). Em contrapartida, a deriva ecológica representa a estocasticidade demográfica, ou seja, mudanças estocásticas na abundância de espécies determinadas, principalmente, a partir de nascimentos e mortes (VELLEND, 2010). Tomando-se como exemplo a interação entre seleção e deriva, mesmo com a seleção favorecendo uma espécie, ainda existe uma probabilidade que ela seja extinta pela deriva (VELLEND, 2010). Especiação é o processo por meio do qual novas espécies surgem e é considerado um fator importante na dinâmica e nos padrões de comunidades mesmo em escalas locais, onde a taxa de especiação é insignificante em relação a outros processos (PARTEL, 2002), por conta de seus efeitos sobre o pool regional de espécies (VELLEND, 2010). Muitos estudos relatam aumento na riqueza local de espécies com aumento da riqueza regional, sugerindo uma influência importante na diversidade local de processos que determinam o pool regional de espécies, tais como dispersão e especiação (VELLEND, 2010). Por fim, a dispersão configura o movimento de indivíduos através do espaço e seus resultados podem variar em decorrência 10 da interação com outros processos, especialmente deriva e seleção, bem como em relação ao tamanho e à composição das comunidades de onde os dispersores se originam e para onde migram (HOLYOAK; LEIBOLD; HOLT, 2005; VELLEND, 2010). A dispersão pode ser determinística, quando indivíduos ou populações migram em busca de habitats com características locais que lhes garantam melhor desempenho, ou aleatória, quando os organismos vêm e vão de maneira aleatória através da paisagem (DINIZ-FILHO et al., 2012; HUBBELL, 2001; SEMLITSCH, 2008). Em síntese, espécies são adicionadas às comunidades por meio de dispersão e especiação, e suas abundâncias relativas são moldadas por seleção, deriva e dispersão (VELLEND, 2010). Por muito tempo, os estudos em ecologia de comunidades foram desenvolvidos em pequenas escalas espaciais, abordando processos guiados por fatores bióticos e abióticos locais, os quais refletem as características adaptativas das espécies (LEIBOLD et al., 2004; RICKLEFS, 1987; VELLEND, 2010). Estes estudos certamente resultaram em progressos significativos no conhecimento da dinâmica das comunidades, contudo não abordam como uma espécie, ou um conjunto de espécies, se originou numa determinada área, deixando essas questões para a biogeografia e a macroevolução (RICKLEFS, 1987; VELLEND, 2010). Entretanto, é importante incorporar o contexto biogeográfico e macroevolutivo em estudos ecológicos para comparar padrões em diferentes regiões, bem como ao longo de gradientes ambientais (PARTEL, 2002; RICKLEFS, 1987; VELLEND, 2010). O conceito de metacomunidade, um conjunto de comunidades locais potencialmente conectadas por dispersão de indivíduos (GILPIN; HANSKI, 1991; HOLYOAK; LEIBOLD; HOLT, 2005; WILSON, 1992), possibilitou considerar o papel da dispersão entre comunidades locais nos padrões de diversidade (LEIBOLD et al., 2004). Dessa forma, os efeitos de processos em escala regional foram incorporados, integrando a avaliação da influência de processos determinísticos, relacionados ao nicho ecológico, e de processos estocásticos, relacionados à dispersão, na estruturação de metacomunidades (VELLEND et al., 2014). Este reconhecimento de que a estrutura de uma comunidade local é afetada por interações locais e processos regionais é um dos principais adventos da ecologia de comunidades nas últimas décadas (LOGUE et al., 2011). Analisando os padrões de distribuição, abundância e interação de organismos em escalas locais e regionais, Leibold et al. (2004) propuseram quatro paradigmas de metacomunidades, que diferem de acordo com três gradientes: heterogeneidade de manchas de habitat, taxa de dispersão e equivalência ecológica entre as espécies (LOGUE et al., 2011). De maneira geral, manchas de habitat homogêneas descrevem o padrão de dinâmica de manchas, enquanto manchas de habitat heterogêneas incluem o padrão de filtragem de espécies quando ocorrem 11 baixas taxas de dispersão e o padrão efeito de massa quando ocorrem altas taxas de dispersão (LEIBOLD et al., 2004; LOGUE et al., 2011). A equivalência ecológica entre as espécies engloba o último padrão, o neutro. Este modelo tem fundamento na Teoria Neutra da Biodiversidade e Biogeografia, proposta por Hubbell (2001). Na Teoria Neutra as espécies de um mesmo nível trófico de uma metacomunidade são consideradas equivalentes ecologicamente, o que significa que elas não possuem habilidades competitivas diferentes, uma vez que não estão sob pressões seletivas diferenciais (BELL, 2001; CHAVE, 2004; HUBBELL, 2001). Dessa forma, a abundância de espécies varia ao acaso e não devido às diferenças na capacidade competitiva entre elas (ETIENNE; OLFF, 2004; HUBBELL, 2001). Contudo, isso não significa que interações ecológicas complexas não ocorram entre os indivíduos. Assume- se que elas acontecem, desde que todos os indivíduos de todas as espécies de um nível trófico obedeçam exatamente às mesmas regras (HUBBELL, 2001). Assim, a abundância de espécies resulta da combinação entre dispersão, especiação e deriva ecológica (MATTHEWS; WHITTAKER, 2014). Na ausência de especiação ou de imigração, a deriva deve levar todas as espécies, exceto uma, à extinção (CHESSON; HUNTLY, 1997; HUBBELL, 2001). Uma outra forma de estudar as metacomunidades foi proposta por Leibold; Mikkelson (2002) e modificada por Presley, Higgins, Willig (2010) e Presley, Mello, Willig (2019), a Análise de Elementos de Estrutura de Metacomunidades (EMS). O objetivo dessa proposta é identificar padrões de estruturas de distribuição de espécies em relação a um gradiente. Assim, a partir da avaliação de três elementos de metacomunidades – coerência, substituição de espécies e seus limites de distribuição – é possível identificar cinco padrões idealizados de estruturas espaciais de metacomunidades: aleatório, aninhado, uniformemente espaçado, Gleasoniano e Clementsoniano. A coerência indica se a distribuição das espécies é ou não contínua ao longo de um gradiente (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). A substituição de espécies reflete a tendência das espécies de se substituírem de um local a outro (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Os limites de distribuição avaliam o grau em que os limites de distribuição de diferentes espécies se agrupam (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Em um estudo pioneiro, Meynard et al. (2013) utilizaram a EMS junto com a Análise de Partição da Variância no mesmo conjunto de dados, demonstrando a complementaridade entre as duas ferramentas analíticas em relacionar os processos estruturadores propostos no âmbito de comunidades ecológicas e metacomunidades aos padrões observados. A EMS permite que alguns padrões observados sejam vinculados aos seus possíveis processos causais (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; MEYNARD et al., 2013). Contudo, a estrutura espacial das comunidades não é considerada, não permitindo investigações acerca dos processos de 12 dispersão (MEYNARD et al., 2013). Já a Análise de Partição da Variância, não permite inferir se ocorre substituição ou perda de espécies ao longo de gradientes, mas acessa a influência relativa das variáveis ambientais e da estrutura espacial nos dados da comunidade, permitindo avaliar a importância do ambiente e da dispersão (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992; COTTENIE, 2005; LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005; MEYNARD et al., 2013). Assim, o uso conjunto dessas análises fornece informações complementares sobre os processos subjacentes aos padrões de diversidade e pode levar a uma melhor compreensão das dinâmicas das metacomunidades, mas esta é uma abordagem ainda incipiente no campo da ecologia de comunidades. Organismos com ciclo de vida complexo, como os anfíbios, constituem bons grupos modelo para testar predições acerca de processos estruturadores de diversidade, uma vez que estão sujeitos a diferentes processos nos estágios larval e adulto (ALFORD, 1999; DELATORRE et al., 2015; PROVETE et al., 2014). A importância de fatores ambientais e espaciais na dinâmica de comunidades de anuros está bem documentada na literatura, sobretudo para indivíduos adultos (MARQUES; NOMURA, 2018). Contudo, esses fatores parecem afetar diferentemente comunidades de adultos e de girinos (MARQUES; NOMURA, 2018). Na planície alagável do Pantanal brasileiro, estudos recentes detectaram uma fraca relação entre variáveis ambientais e espaciais nas comunidades de anuros, sugerindo que processos estocásticos constituem a principal força influenciando a diversidade de espécies nesse sistema (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). O Pantanal é a maior extensão alagável contínua do planeta (Junk et al. 2011) e está inserido na bacia do rio Paraguai, região central da América do Sul. Esse bioma apresenta sazonalidade marcada, com um pulso anual de inundação na estação cheia intercalado por período de seca intensa (JUNK et al., 2006). Como resultado, ocorrem intensas variações sazonais em fatores físicos, químicos e biológicos, além da conectividade entre corpos d’água no período de inundação, o que pode exercer uma importante influência na dinâmica de metacomunidades de anuros neste local (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). Assim, os estudos desenvolvidos com comunidades de anuros adultos e girinos nessa região sugerem que a constante redistribuição de indivíduos em toda a paisagem em decorrência do pulso de inundação, juntamente com as flutuações ambientais imprevisíveis associadas, não permite uma organização determinística (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). Desse modo, processos estocásticos estariam determinando a estruturação das comunidades, em consonância com os pressupostos da Teoria Neutra (HUBBELL, 2001). Apesar dos trabalhos com comunidades de anuros no Pantanal terem detectado fraca influência de processos ambientais e 13 espaciais, nenhum trabalho foi desenvolvido para testar de fato processos estocásticos como estruturadores dessas comunidades, o que pretendemos testar no presente estudo. 14 Referências ALFORD, R. A. Ecology: Resource Use, Competition, and Predation. In: McDiarmid, R.W., Altig, R. (eds). Tadpoles: the biology of anuran larvae. Chicago: The University of Chicago Press, 1999. p. 240–278. BELL, G. Neutral macroecology. Science, v. 293, n. 5539, p. 2413–2418, 2001. BORCARD, D.; LEGENDRE, P.; DRAPEAU, P. Partialling out the Spatial Component of Ecological Variation. Ecology, v. 73, n. 3, p. 1045–1055, 1992. CHAVE, J. Neutral theory and community ecology. Ecology Letters, v. 7, n. 3, p. 241–253, 2004. CHESSON, P. Mechanisms of maintenance of species diversity. Annual Review of Ecology and Systematics, v. 31, p. 343–366, 2000. CHESSON, P.; HUNTLY, N. 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Ecology, v. 73, n. 6, p. 1984–2000, 1992. 17 Sazonalidade e história natural: a contribuição de processos determinísticos e estocásticos na estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal Resumo O estudo dos padrões de composição, abundância, distribuição e interação de espécies em comunidades biológicas é o alvo da ecologia de comunidades. Os estudos nesta área foram desenvolvidos em pequenas escalas espaciais por muito tempo, mas o conceito de metacomunidade possibilitou a incorporação dos efeitos de processos em escala regional. Dessa forma, foi possível integrar a avaliação da influência de processos determinísticos, relacionados ao nicho ecológico, e de processos estocásticos, relacionados à dispersão, na estruturação de metacomunidades. Neste estudo avaliamos a influência relativa de variáveis ambientais (processos determinísticos) e da probabilidade de imigração (processos estocásticos) sobre a estrutura de metacomunidades de girinos do Pantanal. Analisamos o conjunto de dados proveniente da amostragem de 74 corpos d’água lênticos em escala espacial ampla e em três escalas espaciais restritas: as sub-regiões do Miranda-Abobral, da Nhecolândia e de Porto Murtinho. Testamos a hipótese de que as metacomunidades estão sob forte influência de processos estocásticos devido à constante redistribuição de indivíduos pela paisagem, em decorrência do pulso de inundação. Esse fenômeno, associado ao hábito habitat-generalista dos indivíduos adultos das espécies levaria a ocupação de habitats de forma estocástica. Contrariando nossa predição, detectamos fraca, mas significativa influência do ambiente na abundância de espécies, indicando a influência de processos determinísticos relacionados ao nicho. Os descritores espaciais explicaram uma pequena fração da variação na abundância das espécies somente em escala ampla e em uma das escalas restritas (sub-região de Porto Murtinho), indicando fraca ou ausência de restrição à dispersão, reforçada pela correlação significativa com a probabilidade de imigração. A escala ampla e a sub-região do Miranda- Abobral apresentaram estrutura quasi-Clementsoniana, e as sub-regiões da Nhecolândia e de Porto Murtinho, estrutura Gleasoniana. Essas estruturas foram relacionadas a gradientes ambientais, reforçando a influência de variáveis determinísticas. A fraca explicação da variação na abundância das espécies pelo ambiente, pode estar associada ao hábito habitat-generalistas dos adultos da maioria das espécies, associado ao evento de inundação do Pantanal. O pulso de inundação parece promover uma redistribuição massiva de indivíduos pela paisagem, possibilitando que alcancem novos habitats ao longo do gradiente ambiental. O hábito habitat- generalista dos adultos da maioria das espécies possibilita o sucesso da colonização dos novos habitats. Entretanto, apesar desse aspecto da história natural dos adultos, os girinos parecem 18 responder mais fortemente às características ambientais locais por estarem restritos aos corpos d’água. Palavras-chave: Anura. Elementos de estrutura de metacomunidades. História natural. Pantanal. Partição da variância. Teoria neutra. 19 Introdução O estudo dos padrões de composição, abundância, distribuição e interação de espécies é o alvo da ecologia de comunidades (LEIBOLD et al., 2004; VELLEND, 2010). Por muito tempo, os estudos nesta área foram desenvolvidos em pequenas escalas espaciais, abordando processos guiados por fatores bióticos e abióticos locais, os quais refletem as características adaptativas das espécies (LEIBOLD et al., 2004; RICKLEFS, 1987; VELLEND, 2010). Posteriormente, o conceito de metacomunidade, um conjunto de comunidades locais potencialmente conectadas por dispersão de indivíduos (GILPIN; HANSKI, 1991; HOLYOAK; LEIBOLD; HOLT, 2005; WILSON, 1992), possibilitou considerar o papel da dispersão entre comunidades locais nos padrões de diversidade (LEIBOLD et al., 2004). Dessa forma, os efeitos de processos em escala regional foram incorporados, integrando a avaliação da influência de processos determinísticos, relacionados ao nicho ecológico, e de processos estocásticos, relacionados à dispersão, na estruturação de metacomunidades (HUBBELL, 2001; VELLEND et al., 2014). Em um estudo pioneiro, Meynard et al. (2013) demonstraram a complementaridade entre as duas ferramentas analíticas, a Análise de Elementos de Estrutura de Metacomunidades (EMS) e a Análise de Partição da Variância, em relacionar os processos estruturadores propostos no âmbito de comunidades e metacomunidades aos padrões observados. A EMS permite que alguns padrões observados sejam vinculados aos seus possíveis processos causais, mas não permite investigações acerca dos processos de dispersão, uma vez que a estrutura espacial das comunidades não é considerada (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; MEYNARD et al., 2013). Já a Análise de Partição da Variância não permite inferir se ocorre substituição ou perda de espécies ao longo de gradientes, mas acessa a influência relativa das variáveis ambientais e da estrutura espacial nos dados da comunidade, permitindo avaliar a importância do ambiente e da dispersão (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992; COTTENIE, 2005; LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005; MEYNARD et al., 2013). Assim, o uso conjunto dessas análises fornece informações complementares sobre os processos subjacentes aos padrões de diversidade e pode levar a uma melhor compreensão das dinâmicas das metacomunidades (MEYNARD et al., 2013), mas esta é uma abordagem ainda incipiente no campo da ecologia de comunidades. Diversos estudos desenvolvidos na região Neotropical demonstram que processos ambientais e espaciais podem ser fortes preditores de parâmetros de diversidade de anfíbios anuros, tanto considerando a fase adulta quanto a fase larvária, ainda que com resultados 20 divergentes (e.g., ALMEIDA et al., 2015; IOP et al., 2012; KNAUTH; MOREIRA; MALTCHIK, 2018; LEÃO-PIRES; LUIZ; SAWAYA, 2018; PROVETE et al., 2014). Alguns estudos detectaram maior influência de processos relacionados ao nicho (e.g., ALMEIDA et al., 2015; DORADO-RODRIGUES et al., 2015; PRADO; ROSSA-FERES, 2014), enquanto outros, da distância geográfica entre os habitats (e.g., PROVETE et al., 2014). Ainda que exista um consenso de que processos ambientais e espaciais interajam de inúmeras maneiras e determinem a dinâmica das comunidades (LEIBOLD; CHASE, 2018; VELLEND, 2010; VELLEND et al., 2014), alguns estudos detectaram comunidades sob o efeito apenas de variáveis ambientais (IOP et al., 2012), e comunidades em que nenhum dos processos explica a composição de espécies (DELATORRE et al., 2015; MELO et al., 2014). Essas diferenças levantam duas questões: (i) se os processos estruturadores de comunidades e metacomunidades podem afetar diferentemente as fases larval e adulta de organismos com ciclo de vida complexo, e (ii) se são idiossincráticos, ou seja, sistema-específicos. Em relação a esta última questão, estudos recentes detectaram uma fraca relação entre variáveis ambientais e espaciais nas comunidades de anuros na planície alagável do Pantanal brasileiro, sugerindo que processos estocásticos constituem a principal força influenciando a diversidade de espécies nesse sistema (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). O Pantanal é a maior extensão alagável contínua do planeta (JUNK; SILVA; CUNHA, 2011) e está inserido na bacia do rio Paraguai, região central da América do Sul. Esse bioma apresenta sazonalidade marcada, com um pulso anual de inundação na estação cheia intercalado por período de seca intensa (JUNK et al., 2006). Como resultado, ocorrem intensas variações sazonais em fatores físicos, químicos e biológicos, além da conectividade entre corpos d’água no período de inundação, o que pode exercer uma importante influência na dinâmica de metacomunidades de anuros neste local (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). Assim, os estudos desenvolvidos com comunidades de anuros adultos e girinos nessa região sugerem que a constante redistribuição de indivíduos por toda a paisagem em decorrência do pulso de inundação, juntamente com as flutuações ambientais imprevisíveis associadas, não permite uma organização determinística (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). Desse modo, processos estocásticos estariam determinando a estruturação das comunidades, em consonância com os pressupostos da Teoria Neutra, que se baseia na equivalência ecológica das espécies de um mesmo nível trófico (HUBBELL, 2001). Apesar dos trabalhos com comunidades de anuros no Pantanal terem detectado fraca influência de processos ambientais e espaciais, nenhum estudo foi desenvolvido para testar de fato os processos estocásticos como estruturadores dessas comunidades. 21 Neste estudo avaliamos a contribuição de processos determinísticos, relacionados ao nicho, e estocásticos, relacionados à probabilidade de imigração (HUBBELL, 2001), na estruturação de metacomunidades de girinos no Pantanal. Nossa hipótese é a de que as metacomunidades estão sob forte influência de processos estocásticos: (i) devido aos pulsos de inundação imprevisíveis, que levam à constante dispersão de indivíduos por toda a paisagem (DELATORRE et al., 2015); (ii) devido à possibilidade dessa dispersão ser sucedida de colonização, pois os adultos da maioria das espécies de anuros do Pantanal são habitat- generalistas, com modos reprodutivos generalizados ou adaptados à dessecação (PRADO; UETANABARO; HADDAD, 2005; UETANABARO et al., 2008). Em conjunto, a dinâmica do ambiente e as características de história de vida das espécies aumentariam a probabilidade de sucesso de colonização de novos habitats, justamente em um sistema onde a dispersão é facilitada, indicando ausência de seleção de habitat (SIMIONI, 2016) e, portanto, influência de processos neutros (LEIBOLD et al., 2004). 22 Metodologia Locais de estudo Este estudo foi desenvolvido com dados de caracterização ambiental (variáveis ambientais locais e da paisagem) e abundância de girinos de 74 corpos d’agua localizados no Pantanal, provenientes da base de dados do projeto SISBIOTA “Girinos de Anuros da Mata Atlântica, da Amazônia, do Pantanal, do Cerrado e de Zonas de Transição: Caracterização Morfológica, Distribuição Espacial e Padrões de Diversidade” (Processos: CNPq 563075/2010- 4 e FAPESP 2010/52321-7). Os dados foram obtidos entre novembro de 2014 e março de 2015, em três sub-regiões do Pantanal (HAMILTON; SIPPEL; MELACK, 1996; SILVA; ABDON, 1998): Miranda-Abobral, Nhecolândia e Porto Murtinho (Figura 1). O Pantanal é a maior planície alagável do mundo (JUNK; SILVA; CUNHA, 2011), e aproximadamente 90% de sua área total de 160.000 km² encontra-se em território brasileiro (JUNK et al., 2006). Esse bioma está inserido na Bacia Hidrográfica do Alto Paraguai e abrange parte dos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (JUNK et al., 2006). O clima da região é do tipo Tropical de Savana (Aw de Köppen), com temperatura média oscilando entre 21,4 °C em julho e 27,4 °C em dezembro, sendo comuns resfriamentos até 0 ºC por curtos períodos de tempo devido a massas de ar subpolares (JUNK et al., 2006; TARIFA, 1986). A sazonalidade é característica deste bioma, dividida entre uma estação seca (subdividida em vazante e seca) de maio a setembro e uma estação chuvosa (subdividida em enchente e cheia) de outubro a abril (JUNK et al., 2006). Como consequência, períodos úmidos e extremamente secos levam a inundações e secas extremas combinadas com grandes incêndios naturais, acidentais ou criminosos (JUNK et al., 2006; MARQUES et al., 2021). É importante salientar que, ao contrário do que se infere a partir da inundação sazonal, a precipitação no Pantanal é baixa, com média anual de 1000 mm no município de Corumbá, por exemplo (JUNK et al., 2006). Por essa razão, as cheias e alagamentos comuns da região ocorrem através da combinação de chuvas locais, transbordamento dos rios e dificuldade de escoamento das águas devido à posição e baixa declividade da planície pantaneira em relação aos canais fluviais que drenam os planaltos circunvizinhos (AMARAL FILHO, 1986; JUNK et al., 2006). Essa baixa declividade é responsável, ainda, por fazer com que o pulso de inundação leve um tempo para passar pelo Pantanal. Assim, a inundação da parte norte da planície coincide com a estação chuvosa, mas há um intervalo de cerca de três a quatro meses entre a estação chuvosa e a inundação da parte sul do Pantanal (JUNK et al., 2006). 23 A sub-região do Pantanal conhecida como Miranda-Abobral é caracterizada pela presença de campos inundáveis alternados com capões de mata (ADÁMOLI, 1986). Para representar esta área, foram amostrados 26 corpos d’água no entorno da Base de Estudos do Pantanal (BEP - UFMS), município de Corumbá (19º34’39”S, 57º01’44”W). A sub-região da Nhecolândia é caracterizada pela presença de baías (lagoas, tanto de água doce como de água salobra) e salinas (lagoas alcalinas) (ABDON; POTT; SILVA, 1998). A vegetação observada no entorno das baías pode ser cerradão e/ou cerrado, podendo ocorrer também faixas de campo entre a baía e a vegetação; enquanto as salinas se apresentam com uma faixa de cerradão ou mata bem próxima à lâmina d’água na época de cheia (ABDON; POTT; SILVA, 1998). Nesta sub-região, foram amostrados 20 corpos d’água nos arredores da Fazenda Barranco Alto, município de Aquidauana (19º34’37”S, 56º09’08”W). Por fim, na sub-região de Porto Murtinho predomina a vegetação chaquenha (savana estépica/chaco úmido) (SILVA; ABDON, 1998), tipo de vegetação herbácea/arbustiva, com menor densidade que a de cerrado (CONSERVAÇÃO INTERNACIONAL et al., 2009). Nesta localidade, foram amostrados 28 corpos d’água, no município de Porto Murtinho (21º41’56”S, 57º52’57”W). A distância em linha reta entre cada sub-região é de aproximadamente: 92 km entre Miranda-Abobral e Nhecolândia, 252 km entre Miranda-Abobral e Porto Murtinho e 295 km entre Nhecolândia e Porto Murtinho (Figura 1). As coletas foram realizadas no final de novembro de 2014 na sub-região da Nhecolândia, entre dezembro de 2014 e início de janeiro de 2015 na sub-região do Miranda- Abobral e em março de 2015 em Porto Murtinho (Figura 2). Ainda assim, todas as sub-regiões foram amostradas em um mesmo momento hidrológico (antes da inundação), pois em Porto Murtinho, a sub-região mais ao sul do Pantanal, a enchente pode levar de três a quatro meses após a estação chuvosa para chegar (GALDINO; RESENDE, 2000; JUNK et al., 2006). Método de amostragem e variáveis ambientais e espaciais Todas as amostragens seguiram um protocolo estabelecido pelo projeto SISBIOTA, com metodologia e esforço amostral padronizados. Cada poça foi amostrada uma única vez e em um mesmo momento hidrológico que as demais, no início do período de cheia, antes do pulso de inundação. Os girinos foram coletados com puçá de tela de arame (30 cm de diâmetro e malha de 3 mm²) passado ao longo de toda a área do corpo d’água pelo período máximo de uma hora. Se a poça apresentasse um tamanho que permitisse sua amostragem total antes do período máximo, a coleta se encerrava em um período de tempo menor. Em contrapartida, se a 24 poça fosse grande, eram selecionadas as áreas que mais diferissem umas das outras em termos de descritores ambientais (e.g., vegetação, profundidade, perfil da margem), de modo a representar ao máximo sua heterogeneidade ambiental, e era amostrada durante uma hora. Os girinos foram eutanasiados por imersão em solução anestésica de lidocaína e, posteriormente, colocados em uma solução fixadora composta por igual volume de formol a 15% e etanol a 70%. Todos os girinos coletados estão identificados e depositados na Coleção Científica DZSJRP Amphibia-Tadpoles, do Departamento de Ciências Biológicas da UNESP, câmpus de São José do Rio Preto. Este procedimento é importante para confirmar a identificação das espécies e também por possibilitar futuros estudos com os espécimes preservados. Para representar a estrutura ambiental local dos corpos d’água selecionamos nove descritores ambientais locais com reconhecida influência na composição de girinos (ETEROVICK; SAZIMA, 2000; SANTOS; ROSSA-FERES; CASATTI, 2007; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012): 1. área (A); 2. profundidade máxima (P); 3. presença de peixes predadores (Pe); 4. perfil da margem [tM – porcentagem da margem correspondente a margem em barranco (Mb), plana (Mp), inclinada (Mi) ou escavada (Me)]; 5. tipo de substrato [tS – porcentagem do substrato correspondente a argila (Sa), lama (Sl) ou folhiço (Sf)]; 6. porcentagem de vegetação no interior (VI – porcentagem da área total do corpo d’água recoberta por vegetação); 7. tipo de vegetação no interior [tVI – porcentagem da vegetação no interior correspondente a vegetação submersa (VIs), flutuante (VIf), herbácea ereta (VIe), arbustiva (VIat) ou arbórea (VIa)]; 8. porcentagem de vegetação nas margens (VM – porcentagem das margens recoberta por vegetação); 9. tipo de vegetação nas margens [tVM – porcentagem da vegetação nas margens correspondente a vegetação herbácea rasteira (VMr), herbácea ereta (VMe), arbustiva (VMat) ou arbórea (VMa)]. Para representar a paisagem, selecionamos três variáveis: 1. distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo (DA); 2. distância mínima até um habitat florestado (DF); 3. uso do solo em um raio de 500m [tU – porcentagem da paisagem recoberta por capoeira (UC), mata contínua (UM) ou pastagem (UP)]. As coordenadas geográficas (latitude e longitude) de cada corpo d’água foram obtidas em graus decimais pelo Sistema de Posicionamento Global (GPS) e foram utilizadas após transformação para o sistema Universal Transversa de Mercator (UTM) para avaliar o efeito dos processos espaciais, representando a relação espacial de distância geográfica entre os corpos d’água. 25 Análise dos dados Com base em uma proposta integrativa de estudo de metacomunidades (MEYNARD et al., 2013), analisamos o conjunto de dados em múltiplos aspectos. Avaliamos a importância de processos determinísticos relacionados ao nicho (CHESSON, 2000), bem como de processos probabilísticos propostos na Teoria Neutra da Biodiversidade e Biogeografia por Hubbell (2001), o que significa considerar os efeitos de processos estocásticos sob a suposição de que as espécies que competem por recursos semelhantes são equivalentes (HUBBELL, 2001). Investigamos também os padrões das metacomunidades testando elementos específicos da estrutura de metacomunidades (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Todas as análises foram realizadas no programa R versão 3.6.1 (R CORE TEAM, 2019). Primeiramente, excluímos as espécies registradas em apenas uma poça, tanto em escala espacial ampla (considerando as três sub-regiões) como para cada escala espacial restrita (cada uma das sub-regiões), pois elas podem levar a relações espúrias entre a composição e abundância de espécies e as variáveis preditoras (Tabela S1). Para avaliar se a organização estrutural (dados de abundância) e a composição de espécies (dados de presença e ausência) das metacomunidades de girinos são significativamente distintas entre cada sub-região, realizamos Análises de Variância Multivariada Permutacional (PERMANOVA) utilizando o pacote vegan versão 2.5-5 (OKSANEN et al., 2019). Aplicamos o índice de Bray-Curtis aos dados de abundância relativa, e o índice de Sorensen aos dados de presença e ausência. Analisar separadamente a composição e a abundância de espécies pode fornecer um melhor entendimento sobre a variação estrutural das comunidades, uma vez que esses dois aspectos podem implicar em cenários bastante diversos (MAASS et al., 2014). Variáveis ambientais, espaciais e estocástica Antes de avaliarmos a influência das variáveis na estruturação das metacomunidades, realizamos uma Análise de Componentes Principais (PCA) apenas com os conjuntos de variáveis ambientais cujos valores correspondem a características ambientais específicas representadas por valores complementares de porcentagem, ou seja, quando somados resultam em 100% (perfil da margem, tipo de substrato, tipo de vegetação no interior, tipo de vegetação nas margens e uso do solo no entorno da poça). O objetivo dessa análise foi retirar a multicolinearidade das variáveis, uma vez que a PCA transforma um conjunto de dados originais inter-relacionadas em componentes principais, um novo conjunto de variáveis não correlacionadas (JOLLIFFE, 2002). Dessa forma, utilizamos os escores do primeiro eixo da 26 PCA realizada para cada conjunto de variáveis complementares como variável preditora nas análises posteriores. Para os conjuntos de variáveis apontados como significativos nas análises seguintes, plotamos a PCA e realizamos Análise de Redundância (RDA) a fim de visualizar a relação das variáveis com os corpos d’água e com as espécies (Material Suplementar). Utilizamos os dados brutos para as variáveis ambientais que não são complementares (área, profundidade máxima, presença de peixes predadores, porcentagem de vegetação no interior, porcentagem de vegetação nas margens, distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo e distância mínima até um habitat florestado). Os descritores espaciais foram obtidos através do método Coordenadas Principais de Matrizes Vizinhas (PCNM), que utiliza coordenadas geográficas de sítios amostrais para gerar vetores no intuito de detectar e quantificar padrões espaciais em uma ampla gama de escalas, permitindo avaliar o efeito da distância entre os ambientes (BORCARD; LEGENDRE, 2002; OKSANEN et al., 2020). Esse método emprega uma medida de distância como parâmetro para definir quais locais podem estar ligados através da dispersão dos organismos, a distância de truncamento (BORCARD; LEGENDRE, 2002). Conforme o padrão, utilizamos a distância mais longa entre os pontos amostrais para mantê-los conectados (OKSANEN et al., 2020). Para representar os processos estocásticos, estimamos a probabilidade de imigração (m), que é a probabilidade de um indivíduo imigrar de uma outra comunidade (HUBBELL, 2001). Estimamos este parâmetro para cada poça com base na abordagem de Munoz, Couteron, Ramesh (2008), que utiliza a fórmula de Etienne (2007), a partir da matriz de abundância relativa de espécies completa, ou seja, incluindo as espécies registradas em apenas uma poça devido à sua importância em análises de migração. Espécies raras possivelmente indicam menores taxas de migração em relação a espécies abundantes. A avaliação da influência das variáveis ambientais locais, ambientais da paisagem, espaciais e estocástica na organização das metacomunidades estudadas foi efetuada por meio de Análises de Redundância (RDA). Primeiramente, para evitar a superestimação da explicação pelas variáveis preditoras, verificamos a multicolinearidade das variáveis a partir da Análise de Fator de Inflação da Variância (VIF – do inglês Variance Inflation Factor), sendo retiradas dos modelos preditivos variáveis com valores de VIF superiores a três, uma vez que são consideradas multicolineares (ZUUR; IENO; ELPHICK, 2010). Utilizamos a matriz de abundância de espécies como matriz dependente e realizamos a transformação de Hellinger para homogeneizar a variação entre as abundâncias, atribuindo menor peso a espécies raras (LEGENDRE; GALLAGHER, 2001). Repetimos a RDA para a escala ampla e para as escalas restritas para as matrizes independentes contendo: (i) variáveis ambientais locais e da paisagem; 27 (ii) descritores espaciais e (iii) variável estocástica. O valor de significância de cada modelo foi obtido por meio de uma Análise de Variância (ANOVA) com 100.000 permutações. Posteriormente, aplicamos o método Forward Selection para os modelos significativos para selecionar apenas as variáveis que explicaram significativamente a variação na abundância de espécies para serem empregados nas Análises de Partição da Variância (BLANCHET; LEGENDRE; BORCARD, 2008). Para avaliar a importância relativa das variáveis ambientais e espaciais realizamos a Análise de Partição da Variância (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992; LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005). Esta análise permite acessar a porcentagem da estrutura da comunidade que é explicada pelas: (i) variáveis ambientais (descritores ambientais independentemente de qualquer estrutura espacial, no caso, as características dos corpos d’água e da paisagem onde estão inseridos); (ii) variáveis espaciais (padrões espaciais na matriz de espécies que não são compartilhados pelos dados ambientais, ou seja, a localização geográfica dos corpos d’água); (iii) variáveis ambientais com influência do espaço (estruturação espacial nos dados de espécies compartilhada pelos dados ambientais, ou seja, variáveis ambientais espacialmente estruturadas); e (iv) quanto da estrutura da comunidade não tem relação com as características ambientais que foram incluídas na análise nem com a localização geográfica (resíduos) (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992). Realizamos a Análise de Partição da Variância separadamente para a escala ampla e escalas restritas. Por fim, verificamos se áreas próximas apresentam maior similaridade faunística por mediação da migração de indivíduos por meio do teste de Mantel Parcial. Correlacionamos a matriz de dissimilaridade de Bray-Curtis para dados de abundância relativa com a de distância euclidiana para dados de distribuição espacial dos corpos d’água condicionadas pela dissimilaridade de Gower para probabilidade de imigração. Repetimos a análise separadamente para a escala ampla e escalas restritas. O valor de significância foi obtido a partir de 100.000 permutações. Utilizamos os pacotes untb versão 1.7-4 (HANKIN, 2019) para estimar as probabilidades de especiação e de imigração; vegan versão 2.5-5 (OKSANEN et al., 2019) para o PCNM, RDA, Partição da Variância e Mantel Parcial; e adespatial versão 0.3-14 (DRAY et al., 2021) para a Forward Selection. 28 Estrutura das metacomunidades Para caracterizar a estrutura espacial das sub-regiões do Pantanal realizamos a Análise de Elementos de Estrutura de Metacomunidades (EMS – do inglês Elements of Metacommunity Structure), proposta por Leibold, Mikkelson (2002) e modificada por Presley, Higgins, Willig (2010) e Presley, Mello, Willig (2019), utilizando o pacote metacom versão 1.5.3 (DALLAS, 2020). A partir da avaliação de três parâmetros – coerência, substituição de espécies e os limites de distribuição – esta análise permite identificar cinco padrões idealizados de estruturas espaciais de metacomunidades: (i) aleatório, (ii) aninhado, (iii) uniformemente espaçado, (iv) Gleasoniano e (v) Clementsoniano. Primeiramente, é realizada uma ordenação na matriz de composição de espécies a partir dos escores do primeiro eixo gerado por uma Análise de Correspondência (CA) por média de reciprocidade, de modo a aproximar as espécies com distribuições semelhantes, assim como os locais com composição de espécies semelhantes, ou seja, classificar as espécies por incidência e os locais por riqueza de espécies (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). A segunda etapa da EMS consiste em avaliar a coerência da metacomunidade (coherence), ou seja, se todas as espécies da metacomunidade possuem distribuição contínua ao longo de um gradiente (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Para isso, o número de ausências embutidas na matriz ordenada é calculado e comparado com a média obtida pelo modelo nulo baseado em testes de permutação para avaliar se o número de ausências é menor, maior ou igual ao acaso (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). Utilizamos a função Coherence e o modelo nulo “r00”, que realiza aleatorizações nas linhas (sítios amostrais) e colunas (espécies) mantendo o número de presenças (OKSANEN et al., 2020; WRIGHT et al., 1998). Escolhemos o modelo “r00” por ser um modelo nulo que permite tanto que o número de localidades que cada espécie ocorre, quanto o número de espécies que ocorrem em cada localidade variem ao acaso (OKSANEN et al., 2020; WRIGHT et al., 1998), sendo o que melhor representa o modelo estocástico. A coerência revela se as espécies estão (1) agrupadas porque possivelmente estão seguindo o mesmo gradiente ambiental (coerência positiva, ou seja, quando existem menos ausências embutidas na matriz ordenada do que o esperado ao acaso), o que leva a um dos quatro padrões: aninhado, uniformemente espaçado, Gleasoniano ou Clementsoniano; ou (2) distribuídas de forma não coerente em relação ao principal eixo de mudança na composição de espécies (não há coerência, ou seja, o número de ausências embutidas não difere do esperado 29 ao acaso), resultando no padrão aleatório (ALVES-MARTINS et al., 2019; LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). A estrutura tabuleiro de xadrez faz parte do framework original proposto por Leibold, Mikkelson (2002), mas em um trabalho recente Presley, Mello, Willig (2019) ressaltaram que nenhum mecanismo ecológico explica o conceito de coerência negativa, sugerindo que tentativas de identificar a estrutura de tabuleiro de xadrez por meio da análise de coerência sejam abandonadas e que a avaliação de distribuições em tabuleiros de xadrez deva ser restrita a pequenos conjuntos de espécies ecologicamente semelhantes para as quais as interações interespecíficas podem levar à exclusão mútua, conforme proposto originalmente por Diamond (1975). A terceira etapa da análise determina se as espécies das metacomunidades coerentes estão aninhadas ou se substituem ao longo de um gradiente espacial ou ambiental (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Para isso, são contabilizados o número de substituições de espécies (species turnover) para cada par de locais e o número de substituições de locais para cada par de espécies (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). Posteriormente, estes valores são comparados com a média obtida pela aplicação de um modelo nulo baseado em testes de permutação de modo a verificar se o número de substituições é menor, maior ou igual ao acaso (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). Se o grau de substituição de espécies (1) for maior do que o esperado ao acaso (turnover positivo), indica que a maioria das espécies na metacomunidade se substituem ao longo de um gradiente, levando às estruturas Clementsoniana, Gleasoniana ou uniformemente espaçada; (2) for significativamente menor do esperado ao acaso (turnover negativo), indica que, ao invés de serem substituídas, as espécies sofrem uma perda progressiva entre as comunidades, formando uma estrutura aninhada (podendo, por sua vez, seguir um padrão hiperdisperso, aleatório ou agrupado); (3) não diferir do acaso, formam-se as quasi-estruturas (quasi-Clementsoniana, quasi-Gleasoniana, quasi-uniformemente espaçada ou quasi-aninhada) (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). O quarto passo é verificar se os limites de distribuição das espécies (boundary clumping) é maior, menor ou igual ao esperado ao acaso (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Para essa avaliação, é aplicado o índice de Morisita (MORISITA, 1971) e um teste χ2 para comparar o valor observado e valores esperados de acordo com um modelo nulo de limites de distribuição aleatórios (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002). Como resultado, é possível identificar se os limites de distribuição das espécies são (1) hiperdispersos, aleatórios ou agrupados, no caso de estruturas aninhadas, ou se seguem (2) um padrão uniformemente espaçado, Gleasoniano ou 30 Clementsoniano, no caso de estruturas não aninhadas (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). Utilizamos o default da função Metacommunity para a terceira (turnover) e quarta etapa (boundary clumping) (DALLAS, 2020). Por fim, calculamos a Correlação de Spearman entre os escores de localidades obtidos através da função OrderMatrix e todos os preditores ambientais para relacionar as estruturas de metacomunidades encontradas com os gradientes ambientais de cada escala (DALLAS, 2020; PRESLEY et al., 2009; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). 31 Resultados Girinos de 21 espécies de anuros foram registrados, sendo 16 espécies na sub-região do Miranda-Abobral, 17 na sub-região da Nhecolândia e 15 na sub-região de Porto Murtinho (Tabela S1). Aproximadamente metade das espécies pertence à família Hylidae (10 espécies), seis espécies pertencem à Leptodactylidae, três à Microhylidae e duas à Phyllomedusidae. A abundância e composição de espécies diferiu entre as sub-regiões do Miranda- Abobral e da Nhecolândia (abundância: F = 2,602; P = 0,002; composição: F = 6,032; P < 0,001), justamente as mais próximas entre si (92 km), e entre as sub-regiões da Nhecolândia e de Porto Murtinho (abundância: F = 4,750; P < 0,001; composição: F = 11,313; P < 0,001), as mais distantes entre si (295 km). As sub-regiões de Porto Murtinho e do Miranda-Abobral, com distância intermediária entre si (252 km), não diferiram nem em relação à abundância (F = 1,440; P = 0,116) nem em composição de espécies (F = 1,171; P = 0,340). Influência de variáveis ambientais, espaciais e estocástica A variação na abundância das espécies foi fracamente influenciada pelos processos ambientais, relacionados às variáveis locais e da paisagem, bem como pelos processos espaciais, relacionados à localização e distância geográfica entre os corpos d’água. Os processos estocásticos, relacionados à probabilidade de imigração, não influenciaram a variação na abundância das espécies nem em escala espacial ampla (considerando as três sub- regiões) nem em escala espacial restrita (considerando cada sub-região separadamente) (Tabela 1). Ainda, a similaridade da abundância de espécies entre os corpos d’água foi correlacionada à proximidade entre os mesmos, sendo mediada pela probabilidade de imigração de indivíduos (processos estocásticos) entre eles em todas as escalas. Em escala ampla, três variáveis ambientais locais, tipo de vegetação nas margens da poça (Figura S1A e S1B), profundidade máxima e área da poça, e uma variável ambiental da paisagem, distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo, tiveram influência significativa (Tabela 2; Figura 3A e 4B), explicando 10% da variação na abundância das espécies no Pantanal (Figura 3E). A influência do espaço, representada por três vetores espaciais, PCNMs 1, 3 e 5 (Tabela 2), embora significativa (Tabela 1; Figura 3C e 3D) explicou somente 2% da variação na abundância das espécies (Figura 3E). Considerando cada sub-região separadamente, uma variável local, tipo de vegetação no interior da poça (Figura S2A e S2B), e duas variáveis da paisagem, distância mínima até um habitat florestado e tipo de uso do solo em um raio de 500 m de cada poça (Figura S2C e S2D) 32 explicaram 17% da variação na abundância das espécies na sub-região do Miranda-Abobral (Tabela 2; Figura 4). Não houve influência dos descritores espaciais (Tabela 1; Figura 4C). Em Porto Murtinho, a fraca, mas significativa influência dos descritores espaciais (5% - Tabela 1; Figura 5), representada pelo PCNM 3 (Tabela 2), foi semelhante à influência do ambiente (4% - Figura 5C). Coerentemente, a sobreposição entre os componentes ambiental e espacial, ou seja, o gradiente ambiental espacialmente estruturado, explicou 2% da variação na abundância de espécies nesta sub-região (Figura 5C). Nem as variáveis ambientais, nem os descritores espaciais explicaram a variação na abundância das espécies na sub-região da Nhecolândia (Tabela 1). A similaridade da abundância de espécies entre os corpos d’água foi correlacionada à distribuição espacial dos mesmos por mediação da probabilidade de imigração de indivíduos entre eles tanto em escala ampla (r = 0,132; P < 0,001), como em todas as escalas restritas: Miranda-Abobral (r = 0,174; P = 0,023), Nhecolândia (r = 0,150; P = 0,034) e Porto Murtinho (r = 0,151; P = 0,020). Estrutura das metacomunidades As metacomunidades de girinos em escala ampla e na sub-região do Miranda-Abobral apresentaram estrutura quasi-Clementsoniana (Tabela 3; Figura 6). Em escala ampla, quatro variáveis ambientais locais, profundidade máxima, tipo de vegetação nas margens, tipo de substrato e perfil da margem da poça (Figura S1), e uma variável da paisagem, distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo, formaram o gradiente responsável pela estrutura encontrada (Tabela 4). Na sub-região do Miranda-Abobral somente a distância mínima até um habitat florestado foi correlacionada à estrutura da metacomunidade (Tabela 5). As metacomunidades das sub-regiões da Nhecolândia e de Porto Murtinho apresentaram estrutura Gleasoniana (Tabela 3; Figura 6). Para ambas as sub-regiões, a estrutura de metacomunidade foi correlacionada a variáveis ambientais locais: profundidade máxima, tipo de vegetação nas margens e área da poça (Tabelas 6 e 7; Figuras S3 e S4). 33 Discussão Contrariando nossas expectativas, as estruturas das metacomunidades de girinos do Pantanal foram influenciadas principalmente por processos determinísticos, relacionados às variáveis ambientais locais e da paisagem, mas também pela probabilidade de imigração, em todas as escalas espaciais. Características ambientais relacionadas à heterogeneidade de corpos d’água exercem reconhecida influência na distribuição de espécies de anuros (e.g., ALMEIDA et al., 2015; IOP et al., 2012; KNAUTH; MOREIRA; MALTCHIK, 2018; LEÃO-PIRES; LUIZ; SAWAYA, 2018; MENIN; WALDEZ; LIMA, 2011; PROVETE et al., 2014; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012). Em escala ampla, a variação na abundância das espécies foi influenciada pelo tipo de vegetação nas margens, profundidade máxima, distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo e área da poça. A estrutura quasi-Clementsoniana identificada nessa escala também foi associada aos três primeiros gradientes, além do tipo de substrato e perfil da margem. Semelhante à estrutura Clementsoniana, a estrutura quasi- Clementsoniana, indica que grupos de espécies possuem as mesmas necessidades de recursos e condições (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). A fraca, porém, significativa influência das variáveis ambientais, além de indicar ação de processos determinísticos relacionados às características do ambiente, é consistente com a estrutura identificada nessa escala. Quasi-estruturas têm as mesmas características básicas que as estruturas associadas, contudo a significância da substituição de espécies, que separa quasi- estruturas de estruturas estritas, pode indicar a força dos processos estruturantes (PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). Sendo assim, quasi-estruturas resultam de forças estruturantes mais fracas do que aquelas que atuam em estruturas estritas, nas quais a substituição de espécies é significativa (PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). A variedade de tipos de vegetação nas margens da poça e uma área de superfície maior (consequentemente maior perímetro) resultam em maior variedade de sítios de forrageamento, de vocalização, de desova e também de refúgio (AFONSO; ETEROVICK, 2007; KOPP; WACHLEVSKI; ETEROVICK, 2006; MOREIRA et al., 2010; SEMLITSCH, 2002; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012). Girinos de espécies arborícolas (Dendropsophus nanus, Pithecopus azureus e Scinax acuminatus) foram associados à vegetação herbácea ereta e arbustiva, enquanto os de Leptodactylus fuscus a corpos d’água com vegetação marginal rasteira, correspondendo ao hábito dos adultos de vocalizar sobre a vegetação herbácea ou solo descoberto, respectivamente (PRADO; UETANABARO; HADDAD, 2005; SILVA; 34 MARTINS; ROSSA-FERES, 2008). O perfil da margem também pode exercer um importante papel na reprodução dos anuros, de modo que uma maior porcentagem de margem plana no perímetro da poça pode facilitar o acesso ao corpo d’água e favorecer a ocorrência de espécies que se reproduzem em ambientes aquáticos rasos, como Physalaemus albonotatus e Pseudopaludicola spp. (DUELLMAN; TRUEB, 1986; PRADO; UETANABARO; HADDAD, 2005; SIMIONI, 2016; SOUSA; TERESA; ROSSA-FERES, 2011). A variedade de tipos de substratos pode estar relacionada à oferta de abrigo contra predadores entre folhas e detritos acumulados no fundo do corpo d’água (ALTIG; JOHNSTON, 1989). Além disso, substratos como lama e argila podem favorecer a ocorrência de girinos de coloração críptica, como os de L. fuscus. Entre as variáveis ambientais locais, a maior profundidade dos corpos d’água possibilita a ocupação por girinos de diferentes guildas ecomorfológicas, sobretudo girinos nectônicos, por oferecer maior coluna d’água (PROVETE et al., 2014; QUEIROZ; SILVA; ROSSA-FERES, 2015). Por fim, tendo em vista que o Pantanal passa por período de seca intensa entre pulsos de inundação (JUNK et al., 2006), o fato dos anuros apresentarem pele permeável e dependência de água para reprodução (DUELLMAN; TRUEB, 1986) explica a influência da distância mínima até um corpo d’água permanente mais próximo, que pode servir como abrigo durante a estação seca. É comum encontrar anuros entocados em buracos nas margens de rios nesta época (C. Prado, obs. pess.). Além disso, corpos d’água permanentes também pode funcionar como stepping stones (BAUM et al., 2004), permitindo o alcance de corpos d’água mais distantes. Na sub-região do Miranda-Abobral o tipo de vegetação no interior da poça, a distância mínima até um habitat florestado e o tipo de uso do solo explicaram parte da variação na abundância das espécies. Como em escala ampla, a moderada influência das variáveis ambientais é consistente com a estrutura quasi-Clementsoniana identificada para essa sub- região, que por sua vez foi relacionada à distância mínima até um habitat florestado, indicando ação de processos determinísticos. Semelhante à vegetação nas margens da poça, a variedade de vegetação no interior do corpo d’água também proporciona variados sítios de forrageamento e de vocalização para adultos, bem como áreas de refúgio contra predadores para os girinos (AFONSO; ETEROVICK, 2007; KOPP; WACHLEVSKI; ETEROVICK, 2006; MOREIRA et al., 2010; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012). O tipo de uso do solo no entorno da poça é uma variável que vem despertando a atenção dos pesquisadores devido à transformação das vegetações nativas em matrizes agropecuárias (JUSTINO; SANTOS; NOLL, 2016; PRADO; ROSSA-FERES, 2014; QUEIROZ; SILVA; ROSSA-FERES, 2015; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012), especialmente na região do Pantanal (GUERRA et al., 35 2020; LIMA et al., 2020; MARQUES et al., 2021). Essas transformações estão relacionadas a alterações na distribuição e tipo de vegetação, precipitação, temperatura, umidade do solo e evapotranspiração (FAGGIONI et al., 2020; MARQUES et al., 2021), variáveis que podem impactar negativamente a diversidade de anuros devido a suas características morfológicas e ciclo de vida, relacionadas à pele permeável e dependência de água para reprodução (DUELLMAN; TRUEB, 1986). Das espécies arborícolas, P. azureus exibiu uma forte associação com a paisagem recoberta por mata contínua, enquanto Boana raniceps foi associada à paisagem recoberta por capoeira. Por fim, a proximidade de fragmentos de mata pode favorecer a ocorrência não só de espécies arborícolas, como Scinax nasicus, D. nanus, P. azureus, S. acuminatus, B. raniceps e Trachycephalus typhonius, como também de populações de anuros de área aberta (SILVA; ROSSA-FERES, 2007). Por fim, fragmentos florestais podem ser importantes áreas para deslocamento de anuros, além de oferecer refúgio durante a estação seca, abrigos diurnos contra dessecação e predadores durante a estação reprodutiva e área de forrageio (OTTO; FORESTER; SNODGRASS, 2007; SILVA; ROSSA-FERES, 2007; SILVA; MARTINS; ROSSA-FERES, 2011). Indiretamente, a cobertura florestal pode ser forte preditora da ocorrência de anuros por manter os regimes hidrológicos e a qualidade da água nas zonas úmidas, que são críticos para a existência de muitos anfíbios (OTTO; FORESTER; SNODGRASS, 2007). A variação na abundância das espécies das sub-regiões da Nhecolândia e de Porto Murtinho não foi explicada por nenhuma variável ambiental. Contudo, as variáveis tipo de vegetação nas margens, área e profundidade máxima do corpo d’água foram correlacionadas à estrutura Gleasoniana encontrada para ambas as sub-regiões, podendo indicar ação de processos determinísticos. A estrutura Gleasoniana sugere respostas individuais das espécies ao ambiente, gerando estruturas com maior substituição de espécies, de modo que cada espécie tenha uma distribuição independente das demais ao longo do gradiente ambiental (LEIBOLD; MIKKELSON, 2002; PRESLEY; HIGGINS; WILLIG, 2010). De fato, assim como em escala ampla e na sub-região do Miranda-Abobral, espécies arborícolas (P. azureus e S. nasicus) foram associadas à presença de vegetação herbácea ereta e arbórea nas margens em ambas as sub- regiões, enquanto apenas L. fuscus apresentou forte associação à vegetação rasteira na sub- região da Nhecolândia. Nesta sub-região as lagoas são grandes e rasas, enquanto na sub-região de Porto Murtinho os corpos d’água são pequenos e profundos. Corpos d’água de maior área e/ou profundidade ampliam o espaço físico, o que geralmente é associado a uma maior heterogeneidade ambiental e a possibilidade de satisfazer os diferentes requisitos espécie- específicos (PROVETE et al., 2014; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012), o que 36 também pode explicar a estrutura Gleasoniana identificada em ambas as sub-regiões dada a sua indicação de respostas individuais das espécies. A importância relativa de processos ambientais locais e de processos espaciais pode ser influenciada pela escala espacial, pelo tipo de habitat, pelo tamanho do organismo, pelas estratégias e capacidades de dispersão, pelo comportamento reprodutivo (COTTENIE, 2005; FAGGIONI et al., 2020; LEIBOLD; CHASE, 2018; LEIBOLD; MIKKELSON, 2002) e outros atributos da história natural das espécies. A influência de variáveis ambientais nas metacomunidades de girinos do Pantanal indica a ação de processos determinísticos relacionados à teoria do nicho. Adicionalmente, é importante considerar que a influência de variáveis ambientais locais foi detectada mesmo em escala ampla, que abrange regiões com corpos d’água e vegetação com características distintas (ABDON; POTT; SILVA, 1998; ADÁMOLI, 1986; SILVA; ABDON, 1998). De fato, padrões de diversidade em escalas espaciais menores são melhor descritos por processos que ocorrem em escalas pequenas, como filtros ambientais, interações interespecíficas e deriva, enquanto os padrões em escalas espaciais mais amplas são melhor descritos por processos em escalas amplas, como a influência do pool regional de espécies, do clima e limitação de dispersão (FAGGIONI et al., 2020; JETZ; FINE, 2012; KEIL et al., 2012; LEIBOLD; CHASE, 2018). O porquê de as variáveis ambientais locais terem influenciado a estrutura da metacomunidade do Pantanal em escala espacial ampla permanece para ser investigado. Uma hipótese que explica tanto este padrão quanto a influência de variáveis ambientais nas demais escalas é a diferença no uso de habitat, alimentação e rede de interações biológicas entre os dois estágios da vida dos anfíbios. Normalmente, os girinos são restritos aos corpos d’água onde os adultos se reproduziram (MARQUES; NOMURA, 2018; PROVETE et al., 2014) e, dessa forma, podem ser mais fortemente influenciados pelas características locais (estrutura e características químicas dos corpos d’água, e predadores) que os adultos. Em uma área com formação vegetal aberta e clima fortemente sazonal, Santos, Rossa-Feres, Casatti (2007) mostraram que a ocorrência de girinos passa por dois filtros ambientais (sensu KEDDY, 1992): a seleção dos habitats de reprodução pelos adultos e a influência de características bióticas e abióticas dos corpos d’água. Como as amostragens no Pantanal foram efetuadas pouco antes do pulso de inundação, ou seja, antes da redistribuição dos girinos, essa é uma possível explicação para a influência de variáveis ambientais, inclusive de variáveis locais em escala ampla. Ainda, apesar de significativa, a fraca explicação da variação na abundância das espécies pelas características ambientais, semelhante aos resultados obtidos por Delatorre et al. (2015) e Simioni (2016) na mesma planície inundável, pode estar associada ao baixo requerimento de habitat pelos indivíduos adultos das espécies. 37 Provavelmente, isso decorre do fato de os adultos de grande parte das espécies apresentarem padrão de reprodução explosivo e serem considerados habitat-generalistas, apresentando modos reprodutivos generalizados ou adaptados à dessecação (MOREIRA et al., 2016; PRADO; UETANABARO; HADDAD, 2005; UETANABARO et al., 2008). Assim, nossos resultados decorrem da associação entre processos que atuam diferentemente sobre as fases larval e adulta: requisitos restritos dos girinos explicando a influência das variáveis ambientais, e hábitos habitat-generalista dos adultos relacionados à fraca explicação da variação na abundância das espécies pelas variáveis ambientais. Em alguns tipos de metacomunidade, processos de dispersão podem ser os determinantes mais importantes dos padrões de diversidade (COTTENIE, 2005). Apesar de significativos, os descritores espaciais explicaram uma pequena fração da variação na abundância das espécies, menor que a explicada pelas variáveis ambientais, e somente em escala ampla e na sub-região de Porto Murtinho. A fraca influência ou ausência de explicação do componente espacial puro indica fraca ou ausência de restrição à dispersão dos indivíduos, resultando em moderadas ou elevadas taxas de dispersão (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992; COTTENIE, 2005). O importante papel da dispersão nas metacomunidades do Pantanal é reforçado pela correlação significativa em todas as escalas espaciais testadas entre a similaridade da abundância de espécies e a proximidade dos corpos d’água, mediada pela probabilidade de imigração de indivíduos, possivelmente viabilizada pelo pulso de inundação. Isso significa que corpos d’água próximos apresentam abundância de espécies mais semelhante entre si do que entre corpos d’água distantes devido à dispersão, corroborando a hipótese de autocorrelação espacial (DINIZ-FILHO et al., 2012; PROVETE et al., 2014; SANTOS et al., 2009). Como resultado, os indivíduos podem alcançar novos habitats ao longo do gradiente ambiental, satisfazendo os requisitos específicos dos girinos de diferentes espécies (BORCARD; LEGENDRE; DRAPEAU, 1992; COTTENIE, 2005; SILVA; CANDEIRA; ROSSA-FERES, 2012). Além disso, como os adultos da maioria das espécies apresentam hábitos habitat-generalistas (MOREIRA et al., 2016; PRADO; UETANABARO; HADDAD, 2005; UETANABARO et al., 2008) a probabilidade de colonização dos novos habitats é grande. É improvável que a diferença temporal do período de coletas (novembro a março) tenha exercido alguma influência nos nossos resultados, pois, ainda que tenha havido um intervalo temporal entre as amostragens, todas as sub-regiões encontravam-se sob as mesmas condições sazonais: pouco antes do pulso inundação. A baixa declividade do terreno, tanto no sentido norte-sul quanto no sentido leste-oeste, faz com que a inundação da parte norte da planície 38 coincida com a estação das chuvas, mas leve cerca de três a quatro meses para chegar na parte sul, onde nossas amostragens de Porto Murtinho ocorreram (GALDINO; RESENDE, 2000; JUNK et al., 2006). A ausência de evidências robustas de processos baseados no nicho e de processos espaciais em metacomunidades de adultos e de girinos de anuros do Pantanal tem levado a proposição de que a estocasticidade seria a principal força estruturante neste bioma (DELATORRE et al., 2015; SIMIONI, 2016). Contrariando tal inferência, verificamos que as metacomunidades de girinos do Pantanal estão sob influência principalmente de fatores determinísticos e, em menor proporção, de fatores estocásticos. Em nosso estudo, a influência do ambiente e a fraca explicação da estrutura das metacomunidades pela organização espacial dos corpos d'água na paisagem indicam a atuação de processos determinísticos relacionados ao nicho e ausência de restrição à dispersão, que por sua vez é reforçada pela correlação com a probabilidade de imigração, prevista na Teoria Neutra (HUBBELL, 2001). O evento de inundação do Pantanal em associação com características de história de vida das espécies parecem ser as principais forças que estruturam as metacomunidades de girinos nessa região, promovendo uma redistribuição massiva de indivíduos pela paisagem e possibilitando que eles alcancem novos habitats ao longo do gradiente ambiental. Nosso estudo acrescenta evidências que, apesar dos adultos serem considerados habitat-generalistas, os girinos são influenciados pelas características do habitat. Dessa forma, a colonização de novos habitats, possibilitada pela ampla redistribuição de indivíduos pela paisagem durante o pulso de inundação, deve atender os requisitos específicos das formas larvais para ser bem-sucedida. Entretanto, uma melhor compreensão dos efeitos das dinâmicas sazonais na estrutura das metacomunidades de girinos do Pantanal deve vir de estudos com amostragens periódicas abrangendo os períodos anterior, durante e após o pulso de inundação anual. Além disso, seria interessante comparar os resultados obtidos a partir de áreas alagáveis com os de áreas próximas não alagáveis. 39 Referências ABDON, M. M.; POTT, V. J.; SILVA, J. S. V. Avaliação da cobertura por plantas aquáticas em lagoas da sub-região da Nhecolândia no Pantanal por meio de dados Landsat e Spot. Pesquisa Agropecuaria Brasileira, v. 33, p. 1675–1681, 1998. ADÁMOLI, J. Fitogeografia do Pantanal. In: Anais I Simpósio sobre recursos naturais e sócio-econômicos do Pantanal. Brasília: Departamento de Difusão Tecnológica - EMBRAPA, 1986. p. 105–106. AFONSO, L. G.; ETEROVICK, P. C. Spatial and temporal distribution of breeding anurans in streams in southeastern Brazil. Journal of Natural History, v. 41, p. 13–16, 2007. ALMEIDA, A. P. et al. Tadpole richness in riparian areas is determined by niche-based and neutral processes. Hydrobiologia, v. 745, p. 123–135, 2015. ALTIG, R.; JOHNSTON, G. F. 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